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MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR:

PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL?

MELRI A. TOPOROWICZ SOARES


Tecnóloga em Design de Móveis
Universidade Tecnológica Federal do Paraná/UTFPR
smelri@hotmail.com

MARILZETE BASSO DO NASCIMENTO


Professora – Universidade Tecnológica Federal do Paraná/UTFPR
marilzetenascim@utfpr.edu.br

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MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL?

RESUMO
O déficit habitacional no Brasil é um problema antigo, principalmente entre a po-
pulação de baixa renda. Programas habitacionais são criados com o objetivo de tentar solu-
cionar ou amenizar esta questão, porém estas moradias se tornam cada vez mais reduzidas, já
que se procura construir mais, e não melhor. Os móveis populares são vistos como produtos
que precisam ser baratos, mesmo que isso comprometa a durabilidade e a estética. Por outro
lado, a prática do design não é considerada pela maioria das indústrias do setor moveleiro. O
espaço reduzido destas habitações e a inadequada configuração do mobiliário comprometem
o conforto, o bem-estar, a autoestima, enfim, a qualidade de vida dos moradores. O presente
estudo tem como objetivo fazer um levantamento de moradias voltadas para população de
baixa renda no Paraná e do mobiliário popular encontrado no mercado para este público. O
estudo inicia com uma fundamentação teórica, abordando questões como habitação popu-
lar, conforto, antropometria e modularidade aplicada ao mobiliário. Na sequência, apresenta
uma pesquisa de campo, onde são levantados projetos de habitações populares, o mobiliário
voltado para o público de baixa renda e entrevistas com moradores destas casas. Finalmente,
apresenta uma comparação entre as moradias e o mobiliário disponível.
Palavras-chave: Moradia popular; mobiliário popular, conforto, mobiliário modulado.

ABSTRACT
The deficit habitacional into the Brazil that’s a problem antique, especially among
the populace of low income. Housing programs are created with the aim of trying to solve,
or soften, this issue, but these houses are becoming increasingly limited, as it seeks to build
more, not better. The popular furniture are seen as products that need to be cheap, even
if it reduce the durability and aesthetics. The practice of design is not considered by most
industries of furniture sector. The space reduced of these houses and inadequate configura-
tion of furniture are compromising the comfort, welfare, self-esteem, finally, the quality of
life of houses. This study aims to do a survey of housing geared to low-income population
in Paraná and furniture found in the popular market for this people. The study begins with
a theoretical basis, addressing issues such as housing popular, comfort, anthropometry and
modularity applied to furniture. Then, it presents a survey, which are raised in housing pro-
jects popular, the furniture turned to low-income public and interviews with users of these
homes. Finally, it presents a comparison between the houses and furniture available.
Keywords: Home popular, popular furniture, comfort, modular furniture.

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Melri A. Toporowicz Soares e Marilzete Basso do Nascimento

MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR:


PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL?
MELRI A. TOPOROWICZ SOARES / MARILZETE BASSO DO NASCIMENTO

1 INTRODUÇÃO

O déficit habitacional é um problema no Brasil. No Paraná, segundo Companhia de


Habitação do Paraná (COHAPAR, 2008) — o déficit é de 85,4% para quem tem renda men-
sal de até três salários mínimos. Com o objetivo de diminuir este déficit no Brasil, programas
de habitação popular deram prioridade aos segmentos da população de baixa renda e 60%
dos empreendimentos foram destinados a este público (IPEA, 2008).
Em fevereiro de 2008, a Cohapar lançou o programa “Mobiliário Popular”, cuja
ideia é criar uma linha de produção e financiamento de móveis adequados aos tamanhos das
casas, proporcionando produção em larga escala, o que permite a redução dos preços dos
móveis.
Com o aquecimento da construção civil no Brasil, houve aumento na geração de
emprego e renda para as classes C, D e E, que compõem a maior parte da população brasi-
leira e, consequentemente, a maior parte de consumidores de móveis populares no Brasil.
A iniciativa da Cohapar ocorreu devido à dificuldade das empresas em desenvolver
uma linha de produtos com medidas adequadas aos espaços reduzidos das habitações. A
condição para que o programa de financiamento do mobiliário seja efetivado é que os móveis
tenham pelo menos três anos de garantia (DUARTE, 2008).
A função da moradia é possibilitar abrigo, conforto e bem-estar ao morador, mas
devido à redução do tamanho das habitações, esta função pode estar sendo comprometida.
O espaço interno reduzido e a falta de móveis adequados comprometem o uso dos espaços
e objetos. Ao se deparar com estes problemas, as pessoas reorganizam os espaços conforme
suas necessidades e condições.

2 A HABITAÇÃO POPULAR E O MOBILIÁRIO POPULAR

A indústria brasileira de móveis é formada por mais de 16 000 micros, pequenas e


médias empresas que geram mais de 189 000 empregos, localizadas em sua maioria na Região
Centro-Sul do país, com alguns pólos moveleiros, como Bento Gonçalves (RS), São Bento
do Sul (SC), Arapongas (PR), Mirassol, Votuporanga e São Paulo (SP), Ubá (MG), Linhares
(ES) (ABIMÓVEL, 2008).
Uma característica do setor é o grande número de micro e pequenas empresas:
88,5% têm até 20 funcionários, sendo 57,5% até 4 funcionários. Apenas 13 empresas têm

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mais de 500 funcionários, que empregam 6,3% do total do setor. A média de funcionários
por estabelecimento formal é de 11, abaixo da média industrial, que é de 15 pessoas por
unidade (FINEP, 2007).
O mercado que abrange as classes C, D e E tem crescimento contínuo e movi-
mentou R$ 550 bilhões em 2007. Investir em produtos voltados à classe popular é uma das
estratégias adotadas para vencer a concorrência entre empresas (FIEP, 2008).

2.1 Móveis Populares

Com os espaços residenciais mais reduzidos existe a necessidade de buscar soluções


no design de mobiliário para garantir a melhor utilização destes espaços, com mobiliário
mais confortável, além de manter baixo custo. A diminuição do espaço, em contraste com o
aumento de atividades, requer propostas inovadoras no design de mobiliário. Algumas das
propostas desenvolvidas foram os armários e camas embutidos, e móveis específicos para
computador (VERÍSSIMO, 1999). Porém, soluções como estas, na maioria das vezes, não
são viáveis para a população de baixa renda. Sobre os móveis populares, Devides (2006)
comenta que:
Os móveis retilíneos populares, produzidos de maneira seriada, são exemplos de pro-
dutos distanciados das necessidades do usuário. Sua configuração final representa muito
mais as restrições impostas pelo modo de produção industrial, as limitações da matéria-
-prima utilizada e as buscas pelas soluções industriais mais vantajosas economicamente
para o mercado, do que um produto desenvolvido visando as necessidades práticas e so-
cioculturais do usuário, agravando-se porque, ao produto final acrescenta-se revestimen-
tos ou acabamentos brilhantes, aplica-se formas e acessórios extravagantes, evocados
no último instante, na tentativa de diferenciá-lo ou melhorá-lo perante a concorrência,
atribuindo este procedimento, mais ligado a ´cosmética´, o nome de design (DEVIDES,
2006, p. 14).

Para Folz (2003), a alternativa para baixar os custos do móvel foi o sacrifício da quali-
dade, economizando matéria-prima, substituindo materiais adequados por outros mais baratos,
utilizando acessórios menos resistentes, acabamento insatisfatório e pouco investimento em
design. Estes fatores exemplificados por Folz (2003) estão sintetizados no quadro 1.
Quadro 1 – Comparativo de materiais nos móveis.

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A primeira experiência em produção seria-


da foi a de Celso Martinez Carrera, que desenhou
uma linha de móveis em madeira vergada, que pos-
sibilitava a racionalização da produção e preços mais
acessíveis (DEVIDES, 2006). A cama patente (figu-
ra 1) foi uma experiência pioneira em mobiliário no
país e conquistou o mercado brasileiro. Os modelos
populares eram muito difundidos, tendo como prin-
cipais usuários a classe operária. Eram comerciali-
zados em lojas de departamentos e no interior do
país eram vendidas até mesmo em feiras e armazéns Figura 1 – Cama patente
(SANTOS, 1995). Fonte: Oliveira, 2008.
O design envolve aspectos como diminuição do uso de materiais, tempo de fabrica-
ção e ainda pode incorporar no produto: a multifuncionalidade; melhor adequação ao espaço
ao qual é destinado; dimensões e formas mais adequadas para suas funções, fatores que
beneficiam tanto o usuário como a indústria. Atualmente, a maioria das indústrias moveleiras
não incorpora o design na sua produção, vendo-o como algo dispensável (FOLZ, 2003).
Os espaços também estão sendo reduzidos em habitações de classe média, porém,
neste caso, há a solução de adequá-los por meio da aquisição de móveis projetados, modulados
ou sob medida. Essa solução é inviável economicamente para as camadas mais populares.

2.2 Moradia Popular

A habitação popular é definida por Folz (2002) como aquela voltada para a classe
trabalhadora que vive na cidade e que possui renda familiar de até cinco salários mínimos,
sejam estas moradias construídas por iniciativa pública ou privada. No Brasil, o conceito de
habitação evoluiu segundo as características socioculturais de cada período.
As transformações sociais decorrentes da Abolição da Escravatura e da Proclama-
ção da República também influenciam no modo de morar. Compactam-se os espaços, pois
não há mais o escravo para as tarefas consideradas servis, que passam a ser responsabilidade
direta ou indireta da mulher (VERÍSSIMO, 1999, p. 24).
A urbanização implicou no adensamento demográfico e, então, surgiram os corti-
ços, favelas e vilas de operários. Nos anos 1920, surgiram os edifícios de apartamentos, abri-
gando os segmentos mais baixos da população, que ocupam os conjuntos habitacionais. As
propostas de habitação popular surgiram depois que as favelas proliferaram, com o objetivo
de tentar erradicá-las (VERÍSSIMO, 1999).
Aparentemente, a política habitacional se concentra em procurar reduzir o déficit
habitacional, mas não considera as questões culturais e hábitos dos moradores, que também
são importantes para a estratégia de inclusão social, o que acaba interferindo no dia a dia além
de trazer prejuízo no que diz respeito ao conforto e ao bem-estar das famílias nas moradias.

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2.2.1 Conforto

Veríssimo (1999) define casa como: “[...] a casa é o reduto da família, portanto, seu
próprio espelho, refletindo também, numa maneira mais abrangente, a sociedade da qual essa
mesma família faz parte, ao mesmo tempo em que é sua geradora” (VERÍSSIMO, 1999, p.
21). A casa é onde vivemos e nos sentimos protegidos, por isso, o espaço deve contribuir
para o bem-estar de quem o ocupa e é fundamental a utilização de soluções eficientes para
promover o conforto.
Schmid (2005) comenta que: “A casa acolhe. Atende a um conjunto de necessidades
básicas de segurança, envolvimento, orientação no tempo e, principalmente, no espaço. É
como se oferecesse consolo interminável ao ser humano, lançado no mundo. E na casa, a
qualidade mais importante parece ser o conforto” (SCHMID, 2005, p. 13).
Rybczynski (1999) comenta que na Idade Média os pobres moravam mal e não
tinham água ou saneamento, praticamente não tinham móveis ou objetos pessoais, situação
que na Europa durou até o século XX. As casas eram tão pequenas que a vida familiar ficava
comprometida. Os casebres de um cômodo eram pouco mais que abrigos e falar de conforto
nestas circunstâncias era um absurdo, pois se tratava de sobrevivência.
Após o fim da Idade Média, a vida doméstica começou a mudar, e as comodidades
foram melhorando. Antes desse período, a casa não possuía divisões e a maioria das ativida-
des era realizada num mesmo ambiente. A sala principal ainda servia para diversas atividades,
mas já se cozinhava em um compartimento separado. Ainda havia quem dormisse na sala em
camas desmontáveis, mas já havia um quarto só para dormir. Outra mudança foi a separação
do local de trabalho e de morar, que tornou a casa um lugar mais privado (RYBCZYNSKI,
1999).
O conforto apresenta-se como um conceito que teve significados diferentes em
épocas diferentes. No século XVII significava privacidade, que levou à intimidade, que por
sua vez levou à domesticidade. O século XVIII passou a enfatizar o lazer e o bem-estar e o
século XIX enfatizou a eficiência e a conveniência. Assim, o conforto doméstico envolve os
seguintes atributos: conveniência, eficiência, lazer, bem-estar, prazer, domesticidade, intimi-
dade e privacidade, características que, juntas, contribuem para a atmosfera de tranquilidade
que é parte do conforto.
Como afirma Rybczynski (1999, p. 223), “O bem-estar doméstico é uma necessida-
de humana fundamental, que está profundamente enraizada em nós e precisa ser satisfeita”.
Assim, para atingir conforto e bem-estar nos interiores domésticos, uma questão importante
é a observação da antropometria, por isso, serão levantados os conceitos e as recomendações
encontradas na literatura relacionadas aos ambientes domésticos.

2.2.2 Antropometria

Desde o final do século XVIII havia estudos sobre a antropometria, mas somente
a partir dos anos 1940 é que a necessidade de estudos antropométricos se desenvolveu. A
Segunda Guerra Mundial trouxe grande impulso às pesquisas e ainda hoje a indústria militar
utiliza-se da antropometria (PANERO; ZELNIK, 2002).
Devido a variações existentes, é importante que os dados selecionados sejam ade-
quados ao usuário do espaço ou mobiliário a ser projetado.

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Se o projeto requer que o usuário alcance algo a partir de uma posição em pé ou


sentada, o dado percentil 5 deve ser utilizado. Este dado, referente ao alcance do braço, indica
que 5% da população terá uma distância menor de alcance, enquanto que 95%, ou a grande
maioria, terá maiores graus de alcance. [...] Em projetos onde a principal preocupação é o
espaço livre deve-se utilizar o maior percentil, ou seja, 95, devido a uma lógica muito sim-
ples. Se o projeto oferecer um espaço livre adequado para usuários com maiores dimensões
corporais, também oferecerá um bom espaço livre para usuários com menores dimensões
corporais (PANERO; ZELNIK, 2002, p. 37).
As atividades que ocorrem dentro de espaços residenciais são diversas e esta varie-
dade de funções, com a diminuição dos espaços residenciais, tornam necessário otimizar a
utilização do espaço, e que a interface entre o homem e o ambiente seja bem planejada, para
evitar situações de fadiga e acidentes (PANERO; ZELNICK, 2002).

2.2.3 Os ambientes das casas

A) Cozinha e área de serviço


A cozinha é a um dos am-
bientes mais propícios a acidentes, pois
utiliza gás, fogo e elementos pontiagu-
dos, o que torna necessário observar
uma circulação adequada (GURGEL,
2003).
Segundo Veríssimo (1999),
nos apartamentos, as cozinhas atingem
dimensões mínimas, onde a racionaliza-
ção deve ser máxima, e nestes espaços
reduzidos é preciso esforço e imagina- Figura 2 – Organização da cozinha em triângulo
ção para acomodar um pequeno refri- Fonte: Gurgel, 2003, p. 187.
gerador e um fogão.
De acordo com Gurgel (2003), a cozinha é uma estação de trabalho composta de
três atividades básicas: armazenar, preparar e cozinhar, que são representadas respectivamen-
te por geladeira, pia e fogão. A melhor forma de organizar as três atividades é a triangular
(figura 2). A soma entre as três distâncias deve ser inferior a 6,50 m e a distância entre a pia
e a geladeira deve ser a menor delas.
Uma organização espacial adequada pode estruturar a rotina diária, sem desperdício
de esforços físicos. Estudos para tornar a cozinha mais eficiente são parâmetros, como a
utilização de cozinhas menores, alturas certas das bancadas, localização correta de eletrodo-
mésticos e organização nas prateleiras para armazenagem (WEY, 2007).
Em 1950, Le Corbusier criou para a prefeitura de Marseille, 750 células habitacio-
nais, destinadas a acomodar a população operária da França. Cada célula continha cozinha de
4 m², com pia, fogão e geladeira. Mas o ápice da compactação das cozinhas ocorreu em 1963,
quando Joe Colombo desenvolveu uma minicozinha móvel, que consiste em duas chapas de
fogão elétrico, refrigerador, guarda-louças e gavetas, alojados em um metro cúbico (WEY,
2007).

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A cozinha mostra-se ao longo da história como um ambiente de grande importân-


cia. É nesse local que se procura inovar, promover melhorias continuamente e onde mate-
riais, ferragens e acabamentos são aplicados primeiramente.
Atualmente a cozinha está cada vez mais próxima da área de serviço (GURGEL,
2003). A proximidade entre estes ambientes não é uma solução adequada porque se perde
qualidade na função dos dois ambientes.
A tabela 1 apresenta as medidas indicadas por Panero, Zelnik (2002) e Neufert
(1976) para cozinha e área de serviço. Nestas indicações, são observados: altura adequada das
bancadas e os espaços de circulação e acesso.
Tabela 1 – Alcances e distâncias em cozinhas.

B) Sala estar/jantar
Nas moradias populares não há divisão entre a sala de estar e jantar e, geralmente,
as funções desses ambientes são compartilhadas no mesmo espaço, às vezes, conjugadas à
cozinha.
A sala foi alvo de transformações no decorrer dos séculos, mas não perdeu sua
característica principal, a de ser o centro social da casa , mesmo que agregada a sala de jantar.
Nesse ambiente se encontra o melhor mobiliário da casa, os utensílios mais aparatosos, sen-
do o espaço doméstico onde se admite o visitante (VERÍSSIMO, 1999).
As várias atividades e o mobiliário associados com espaços de estar, resultam em
diversos níveis de interface entre o corpo humano e os componentes físicos do espaço, como
é o caso da interface entre o corpo humano e cadeiras ou sofás (PANERO; ZELNICK,
2002).
Na sala de estar, as dimensões consideradas neste ambiente são relacionadas à cir-
culação e alcance, largura e movimentação corporal e aberturas de portas e gavetas.
Para as áreas de refeições, os dados mais relevantes são o espaço livre em volta da
mesa e o número de pessoas que vão utilizá-la. Para garantir boa interface entre corpo huma-
no e mesa para refeições, deve-se considerar as dimensões antropométricas, o corpo humano
e suas movimentações, a cadeira e a área individual de acesso à mesa (PANERO; ZELNICK,
2002).
A tabela 2 apresenta dimensões indicadas para a sala de estar e jantar.

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Tabela 2 – Distâncias, alcances e dimensões para sala estar/jantar.

Fonte: Adaptado de Panero e Zelnick, (2002).

C) Quarto
O quarto é um ambiente privativo, em que diversas atividades são realizadas, como
dormir, estudar, ver televisão e organizar os pertences (GURGEL, 2003).
Segundo Panero e Zelnik (2002), nos dormitórios deve-se observar a circulação em
volta da cama, o espaço para arrumá-la e para fazer a limpeza do quarto, espaço livre entre
aquela e a cômoda ou armário com portas e gavetas abertas, além de seu tamanho adequa-
do. Em casos em que se procura otimizar o espaço nos ambientes, utiliza-se gavetas sob as
camas, e neste caso é importante um espaço livre adequado para a abertura e acesso a estas
gavetas.
O beliche é outra opção para otimizar espaços. Na sua utilização é preciso conside-
rar o espaço livre necessário entre as duas camas para acomodar o corpo humano sentado.
A tabela 3 apresenta as medidas utilizadas em quartos, de acordo com Panero e Zelnik (2002),
Neufert (1976) e Gurgel (2003).

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Tabela 3 – Dimensões indicadas para dormitórios.

2.3 Modularidade Aplicada ao Mobiliário

Móveis adaptáveis para ambientes reduzidos podem ser alcançados por meio da
multifuncionalidade e modularidade. De acordo com Folz (2003), o móvel modulado apre-
senta vantagens para a indústria na produção, diminuindo o número de peças do móvel,
reduzindo o custo, e para o consumidor, que pode adaptá-lo melhor ao espaço que possui.
A partir da década de 1950, o móvel moderno iniciou a transição de uma produção
artesanal para uma produção seriada (DEVIDES, 2006). De acordo com Santos (1995), as
soluções industriais para produção em série no Brasil são marcadas pelas seguintes empresas:
Fábrica de Móveis Z, Ambiente Indústria e Comércio de Móveis S.A; Móveis Branco e Preto,
L’Atelier Móveis e a Unilabor Ind. de Artefatos de Ferro e Madeira Ltda.
Zanine Caldas, na Fábrica de Móveis Z, procurou baixar o custo do móvel por meio
da industrialização e a utilização da madeira compensada. Sua produção foi orientada pela
modulação e aproveitamento das chapas (SANTOS, 1995). Foi um tipo de produção que se
articulou bem com as condições industriais da época. Porém, os produtos desenvolvidos por
essa empresa não atingiram as classes mais populares.
A Unilabor, empresa criada em 1954, integrante da Comunidade de Trabalho Uni-
labor, projeto social-religioso, reuniu profissionais de diversas áreas, entre eles o designer
Geraldo de Barros, responsável pelo desenho da produção. A modulação era utilizada com o
objetivo de aumentar a produção e baixar o custo, desenvolvendo um mínimo de peças com
o maior número de combinações. A produção era voltada para a classe média (SANTOS,
1995).
A figura 3 apresenta uma estante e um buffet produzidos pela Unilabor. A linha é
composta por componentes produzidos separadamente e em escala, montadas com o nú-

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mero de prateleiras, gavetas e portas que o usuário define. Esses produtos demonstram a
preocupação em proporcionar flexibilidade ao móvel, em que o usuário pode interferir, per-
sonalizando de acordo com seu desejo.

Figura 3 – buffet e estante produzidos pela Unilabor


Fonte: MCB, 2008.

De acordo com Santos (1995), a produção de Michel Arnoult, na Mobília Contem-


porânea, é considerada exemplo da racionalização na produção de móveis no Brasil. A em-
presa lançou uma linha de móveis a preços médios, composta por elementos que permitiam a
qualquer um criar seu próprio ambiente. A flexibilidade dessa mobília se devia à aplicação de
uma medida comum de 45 cm, que permitia a combinação e o encaixe de vários elementos.
Outras variáveis importantes na produção da Mobília Contemporânea são: múltipla
função de uso de cada modelo e de cada peça; desmontabilidade total; reposição das peças;
homogeneidade na usinagem e acabamento e um móvel resistente aos modismos. Nesta
linha, cem peças podiam compor cinquenta e três móveis diferentes.
A mobília contemporânea se caracterizou pela preocupação com a modulação e o
móvel em série, e a sua principal característica é que apresenta a possibilidade de permanên-
cia no mercado, rejeitando a obsolescência do produto. Michel Arnoult acreditava ser negati-
va a tentativa de criar hábitos de compra de nação rica
em país pobre.
A empresa desenvolveu a poltrona Peg-Lev
(figura 4), construída em pau-ferro, com assento e en-
costo em couro natural, que seria comercializada em
supermercados, a preços acessíveis, e com montagem
simplificada, que poderia ser realizada pelo próprio
usuário.
Arnoult foi precursor do projeto de móveis
modulados e desmontáveis, defensor da democrati-
zação do design, tendo sonhado com o design bom
e barato, acessível a amplas camadas da população
(MCB, 2008).
Figura 4 — Poltrona desmontável linha Peg-Lev
Fonte: Folz, (2003, p. 79).

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Este contexto demonstra que na década de 1950 havia iniciativas de designers vol-
tados para a questão da modularidade, como forma de proporcionar maior flexibilidade, de
uso e produção, ao mobiliário. Porém, essas iniciativas obtiveram pouco sucesso em relação
ao mobiliário voltado para população de baixa renda, apesar de buscarem soluções mais
econômicas e redução no custo de fabricação.

3 PESQUISA – METODOLOGIA E PROCECIMENTOS

A coleta de dados para a pesquisa foi realizada em três fases durante o ano de 2008:
a primeira se refere ao levantamento de projetos de casas populares construídas pela Coha-
par; na segunda foi realizado o levantamento do mobiliário popular, por meio dos sites das
empresas e lojas de móveis; e na terceira foram realizadas as entrevistas com três moradores
de conjuntos habitacionais construídos pela Cohapar.
O termo moradia popular neste trabalho se refere às habitações destinadas às fa-
mílias de baixa renda – 2 a 4 salários mínimos – e às moradias com 40, 52 ou 63 metros
quadrados, financiadas por órgãos do poder público, como a Cohapar.

3.1 Levantamento e Análise de Plantas


de Casas Populares

O levantamento das plantas de


projetos de casas populares no Paraná
aconteceu com a coleta física ou digital
em construtoras de iniciativa pública e
privada. Esse levantamento consta de
um projeto da Cohapar e de outras duas
construtoras voltadas para moradias po-
pulares, localizadas em Curitiba ou região
metropolitana.

a) Projeto Cohapar
O primeiro projeto apresentado
é o da Cohapar, com planta de 40 m² (fi-
gura 5). A planta do projeto apresenta dois
quartos, cozinha, sala de estar/jantar e ba-
nheiro. Figura 5 – Planta casa popular 40 m² Cohapar
Nesse projeto, a cozinha locali- Fonte: Cohapar, (2008).
za-se próxima à sala e não há divisão entre
os ambientes. Possui metragem quadrada de aproximadamente 4,82 m² e acomoda fogão
de quatro queimadores, geladeira e pia com uma cuba, em um dos lados do ambiente, e um
armário na parede frontal. O espaço destinado à área de serviço está localizado do lado ex-
terno.
A sala possui metragem quadrada aproximada de 15 m². Esse ambiente é destinado
a ser sala de estar, jantar e circulação. De acordo com disposição dos móveis na planta, é

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possível colocar sofás de dois e três lugares, ou um sofá de canto, com quatro lugares. A mesa
está com um lado encostado na parede e possui cinco lugares. Uma das cadeiras está próxima
à estante, e não tem acesso confortável.
O quarto de solteiro possui aproximada-
mente 7 m² de área e o projeto sugere a colocação
de duas camas de solteiro e um armário de três
portas. As camas estão posicionadas junto à pare-
de e a circulação entre as camas é bastante limitada.
No quarto de casal, a metragem quadrada é um
pouco maior, aproximadamente 8,35 m². Confor-
me sugere o projeto, é possível colocar uma cama
de largura de 145 cm e comprimento de 200 cm,
duas mesas de cabeceira e um armário de três por-
tas.

b) Construtora “B”
O próximo projeto apresentado perten-
ce à outra construtora, também voltada para pro-
jetos habitacionais populares, de 36 m² (figura 6). Figura 6 – Planta casa popular 41m² - Construtora “B”
Assim como no projeto anterior, consta de dois Fonte: Folder AW Imóveis, (2008)m
quartos, sala estar/jantar, cozinha e banheiro.
A sala e a cozinha, juntas, possuem aproximadamente 15 m², acumulando funções
de sala de estar, jantar, cozinha e circulação. De acordo com o projeto, no lado esquerdo
desse ambiente é possível colocar um sofá de dois lugares, um balcão e um móvel para TV.
O projeto sugere a colocação de uma mesa redonda, de quatro lugares. O espaço
destinado à cozinha acomoda um balcão de pia com uma cuba e um armário. Esse projeto
não indica a colocação de fogão e geladeira, demonstrando que não foi considerada uma
disposição adequada dos eletrodomésticos básicos da casa. O projeto não apresenta uma área
destinada à área de serviço.
O quarto de solteiro possui aproximadamente 6,80 m² e o projeto sugere a colo-
cação de apenas uma cama de solteiro, uma mesa de cabeceira e um armário de três portas.
A cama está posicionada junto à parede e a circulação é bastante limitada entre a cama e o
armário.
No quarto de casal, a metragem quadrada é de aproximadamente 8,30 m². Confor-
me o que sugere o projeto, é possível colocar a cama de largura de 145 cm e comprimento
de 200 cm, duas mesas de cabeceira, uma cômoda em frente à cama e um armário de quatro
portas. Nesse ambiente, o maior problema de circulação está entre a cômoda e a cama.

c) Construtora “C”
O projeto apresentado a seguir pertence a uma terceira construtora e possui área
de 54 m² (figura 7). Esse projeto também consta de dois quartos, sala estar/jantar, cozinha e
banheiro. O espaço destinado à cozinha está separado da sala e possui metragem quadrada
de aproximadamente 6,5 m², contando com a área destinada à lavanderia, que está separada
por uma porta de correr. Esse espaço acomoda, segundo o projeto, fogão de quatro queima-
dores, geladeira e pia com uma cuba.

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MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL?

Figura 7 – Planta ap. 54 m² - Construtora “C”


Fonte: Casaredo, (2008).

As salas de jantar e estar estão numa mesma área, com metragem quadrada apro-
ximada de 15,5 m². De acordo com disposição dos móveis na planta, no lado do ambiente
destinado à sala de estar é possível colocar um sofá de três lugares, duas poltronas e um
móvel para TV. Para a área da sala de jantar, o projeto sugere a colocação de mesa retangular
para seis lugares. A organização sugerida no projeto não apresenta problemas de circulação.
O quarto de solteiro possui 7 m² de área e o projeto sugere a colocação de duas
camas de solteiro, uma mesa de cabeceira e dois armários de duas portas cada. As camas
posicionadas junto à parede permitem uma circulação central de apenas 50 cm. No quarto
de casal, a metragem quadrada é de 8,9 m². Conforme o projeto, é possível colocar cama
de largura de 145 cm e comprimento de 200 cm, duas mesas de cabeceira e um armário de
quatro portas. A circulação está de acordo com o mínimo indicado na literatura.
Com o levantamento de projetos habitacionais populares, nota-se que os ambientes
necessitam de soluções adequadas de mobiliário para otimizar os espaços e favorecer confor-
to aos usuários.

3.2 Levantamento de Mobiliário Popular

Para o levantamento de peças do mobiliário popular, foi necessário selecionar os


fabricantes encontrados no mercado. Para isso, optou-se por empresas localizadas no polo
moveleiro de Arapongas ou na região metropolitana de Curitiba. A seguir apresenta-se o
levantamento de mobiliário popular encontrado no mercado. Os dados considerados neste
levantamento foram: dimensões, materiais e acabamento dos produtos. Para a realização de
uma breve análise da forma desses produtos, foram colocadas também algumas imagens.

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Melri A. Toporowicz Soares e Marilzete Basso do Nascimento

3.2.1 Cozinha

Para as cozinhas populares, encontram-se os kits, que são compostos por balcão
(duas portas e um gaveteiro), armários compostos por paneleiro alto e armários superiores
com portas, ou os kits compactos, compostos geralmente por quatro portas e quatro gavetas
inferiores e quatro portas superiores, sendo uma delas mais alta (quadro 2).
Quadro 2 – Cozinhas.

As dimensões mais encontradas em mobiliário para cozinha são apresentadas na


tabela 4.
Tabela 4 – Comparativo entre móveis de cozinha.

O MDP (Medium Density Particleboard, ou Painel de Partículas de Média Densidade)


é a matéria-prima predominante e o MDF (Medium Density Fiberboard, ou Painel de Fibras de
Média Densidade) é encontrado em portas. O acabamento é realizado em impressão UV
(Ultravioleta). Em relação às cores, o branco é utilizado em todas as marcas na fabricação
da caixaria, e para as portas, é utilizada grande variação: verde, laranja, azul, tabaco, marfim,
pérola e branco.

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MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL?

3.2.2 Sala estar/jantar

Os quadros 3 e 4 apresentam o levantamento de estantes e racks.


Quadro 3 – Levantamento de estantes.

Quadro 4 – Levantamento de racks.

O mobiliário para sala, racks e estantes (quadro 4), apresentam semelhanças em ma-
téria-prima e acabamento, porém em relação à forma e à dimensão, é possível perceber varia-
ção maior. As estantes e racks possuem dimensões que variam conforme a tabela 5.
Tabela 5 – Comparativo entre as dimensões de racks e estantes

O principal material encontrado é o MDF e o MDP e o acabamento em impres-


são UV. Apenas um fabricante destaca o uso do tamburato (painel robusto, produzido com
camadas externas de partículas finas de madeira prensada, com espessura de 7 mm, e miolo
Honeycomb — colmeia de papel reciclado) em partes do móvel, tampos e prateleiras mais
espessas. No caso dos móveis em tamburato, as peças são revestidas em BP (acabamento
dado aos painéis de madeira, com melamina aplicada em baixa pressão).
Os sofás de dois lugares e de três lugares (quadro 5) apresentam dimensões que
variam na largura, na altura a variação é menor e a profundidade varia em um modelo, con-
forme apresenta a tabela 6.

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Quadro 5 – Levantamento sofás dois lugares.

Tabela 6 – Comparativo entre as dimensões de sofás.

Como matéria-prima para a fabricação das estruturas dos sofás, é utilizada madeira
maciça de pinus ou eucalipto. Para o revestimento são utilizados tecidos ou couro sintético.
As cores variam bastante: verde, mostarda, marrom, bege, laranja, azul, vermelho, preto e
branco.
Em relação às mesas, a maioria dos modelos encontrados possui estrutura tubular,
conforme mostra o quadro 6.
Quadro 6 – Levantamento de mesas quadradas.

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MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL?

As dimensões das mesas quadradas variam pouco, já as mesas retangulares e redon-


das apresentam maior variação, conforme apresenta a tabela 7.
Tabela 7 – Comparativo entre as dimensões de mesas

O material predominante na estrutura das mesas é o aço com acabamento em pin-


tura epóxi ou cromado. As cores ficam entre o branco e o metálico. Nos tampos, encontram-
-se vidro, granito ou MDF com impressão UV.
As cadeiras geralmente são vendidas em conjunto com as mesas, e assim, o material
mais utilizado também é o aço com pintura epóxi e as ponteiras em plástico. Os assentos
são em MDF com pintura UV ou revestidos em couro sintético. As cores dos assentos são
azul, verde, branco, laranja; mas a estrutura varia pouco, sendo branco ou cor metálica. Os
modelos são apresentados no quadro 7.
Quadro 7 – Levantamento de cadeiras.

As dimensões mais encontradas em cadeiras são apresentadas na tabela 8.


Tabela 8 – Comparativo entre as dimensões de cadeiras.

Tanto as mesas quanto as cadeiras apresentam pouca diferenciação formal entre os


fabricantes, com predominância de estrutura tubular.

3.2.3 Quartos

Com o levantamento de camas de casal, de solteiro e beliches, foi possível constatar


que os produtos apresentam semelhanças tanto na questão formal, quanto nas dimensões e
matéria-prima.
As camas de solteiro e casal possuem cabeceiras altas e peseiras baixas (quadro 8).
Alguns dos modelos de beliches (quadro 9) apresentam baús ou gaveteiro e outros possibili-
tam a compra opcional de uma cama inferior. As dimensões têm pouca variação, conforme

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mostra a tabela 9. A maior diferença encontrada em beliches é o comprimento, no modelo


com estante na cabeceira.

Quadro 8 – Levantamento de camas de solteiro.

Quadro 9 – Levantamento de beliches.

Tabela 9 – Comparativo entre as dimensões das camas.

A matéria-prima mais utilizada em camas é o MDF. Apenas um dos fabricantes


informou a utilização de MDP, combinado com o MDF. O acabamento é bastante similar
entre os fabricantes, processo de impressão UV nos padrões mogno, marfim, tabaco, maple
(padrão madeirado claro) e branco, e ainda, combinações entre os padrões, como tabaco e
branco ou tabaco e maple.
Os produtos tubulares foram encontrados em menor quantidade e utilizam o aço
SAE 1020 (tipo de aço com baixo teor de cabono). O acabamento, neste caso, é dado por
meio da pintura epóxi, que pode ser feita em branco, bege, marfim, vinho e preto.

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MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL?

O levantamento de roupeiros demonstrou que os produtos também apresentam se-


melhanças entre os fabricantes, na questão formal, dimensões, matéria-prima e acabamento
(quadro 10).
Os roupeiros de três portas de correr apresentam maior variação. As dimensões
mais encontradas são apresentadas na tabela 10.
Quadro 10 – Levantamento de roupeiros.

Tabela 10 – Comparativo entre as dimensões de roupeiros.

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Nota-se que a profundidade em todos os modelos de porta de abrir é a mesma,


470 mm. Nos armários de porta de correr, a profundidade é maior devido à necessidade de
trilhos ou canaletas para abertura das portas. Provavelmente o espaço interno dos armários
seja o mesmo.
A matéria-prima utilizada em roupeiros é o MDF e o MDP. O MDP é utilizado
no corpo dos armários e portas, e o MDF somente em portas e molduras. O acabamento
também é similar entre os fabricantes, que utilizam o processo de impressão UV, nos padrões
mogno, marfim, tabaco, maple e branco, e combinações entre os padrões, como tabaco e
Branco ou Tabaco e Maple. Nos armários de porta de correr encontram-se outros padrões
como rovere (padrão madeirado com veios evidentes) e areia.
Com o levantamento do mobiliário popular encontrado no mercado, nota-se pouca
variação entre os produtos e pouca relação com o que a antropometria indica.

3.3 Entrevista com usuários

Para a entrevista, foi desenvolvido um roteiro com perguntas relacionadas às pre-


ferências e necessidades do usuário. O roteiro passou por um pré-teste, foi reformulado e
então aplicado. Para a seleção dos entrevistados, o requisito era que fossem moradores de
empreendimentos da Cohapar.
A primeira entrevistada mora na cidade de Araucária, no conjunto habitacional
Jardim Planalto. Nesta casa moram quatro pessoas - pais e filho (12 anos) e filha (6 anos), e a
renda familiar é de 3 a 5 salários mínimos. A preferência dessa família em relação ao material
e acabamento é o padrão madeirado claro alto brilho, e para o sofá o revestimento escolhido
é o tecido. A sequência de requisitos na hora da compra é primeiro preço, seguido da qua-
lidade, dimensões e então a forma. A entrevistada acredita que o mobiliário encontrado no
mercado é adequado em relação às dimensões para o tamanho da casa, mas o único item
verificado na hora da compra de um móvel é a altura, porque consideram o pé direito da casa
baixo – 2,36 m.
O mobiliário e os eletrodomésticos ou eletrônicos encontrados na casa desta entre-
vistada são:
• Quarto de casal: roupeiro seis portas, cama casal.
• Quarto solteiro: beliche e roupeiro quatro portas.
• Cozinha: balcão de pia com uma cuba, armário superior e inferior de quatro por-
tas e quatro gavetas. Os eletrodomésticos são: geladeira duplex, fogão de quatro
queimadores, micro-ondas, liquidificador, batedeira, sanduicheira e cafeteira.
• Sala: sofá de três lugares, mesa de seis lugares, balcão, TV 20 polegadas, aparelho
de som.

Um ponto interessante observado foi que na época da entrevista a família havia


adquirido uma máquina de lavar roupas e como a área externa onde fica localizado o tanque
não era coberta, a máquina estava sendo utilizada na cozinha. A família havia improvisado
uma mangueira na pia da cozinha, que fornecia água à máquina e o escoamento era feito em
baldes. Essa situação permaneceu por três semanas, até que a cobertura externa fosse provi-
denciada.

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MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL?

A segunda entrevistada mora na cidade de Campina Grande do Sul. Nesta casa


moram quatro pessoas – pais e duas filhas, de 8 e 12 anos, e a renda familiar é de 1 a 3 salá-
rios mínimos.
A preferência dessa família em relação ao material e acabamento é o padrão uni-
color laqueado, e para o sofá o revestimento escolhido é o tecido. Para as camas, a prefe-
rência é o metal. A sequência de requisitos na hora da compra é primeiro preço, seguido de
qualidade, dimensões e então a forma. A moradora acredita que o mobiliário encontrado
no mercado é adequado em relação às dimensões para o tamanho da casa e não costuma
verificar na hora da compra se o mobiliário possui dimensões adequadas ao tamanho da
casa.
O mobiliário e os eletrodomésticos encontrados na casa desta entrevistada são:
• Quarto de casal: roupeiro quatro portas, cama casal.
• Quarto solteiro: cama casal e roupeiro duas portas.
• Cozinha e sala: poltrona, balcão de pia com três portas e uma cuba, armário
com quatro portas inferiores, quatro portas superiores e quatro gavetas e rack.
Os eletrodomésticos são: geladeira uma porta, fogão de quatro queimadores,
liquidificador, sanduicheira, TV de 14 polegadas.

Nessa casa não há um ambiente específico de sala, mas a família transformou o


espaço destinado à sala a um prolongamento da cozinha. Os roupeiros eram de modelo
antigo, que haviam sido doados. A cama de casal é utilizada no quarto das filhas devido ao
fato de a família considerar insegura a utilização de beliche.
A terceira entrevistada mora em Curitiba, no conjunto habitacional Moradias Rio
Bonito. Nessa casa moram três pessoas, casal e um bebê – 10 meses, e a renda familiar é de
1 a 3 salários mínimos.
A preferência dessa família em relação ao material e acabamento é o padrão uni-
color laqueado e para o sofá o revestimento escolhido é o tecido. Para as camas, a prefe-
rência é o metal. A sequência de requisitos na hora da compra é primeiro preço, seguido de
qualidade, forma e então as dimensões. A moradora acredita que o mobiliário encontrado
no mercado é adequado em relação às dimensões para o tamanho da casa e não costuma
verificar na hora da compra se o mobiliário possui dimensões adequadas ao tamanho da
casa.
O mobiliário e os eletrodomésticos encontrados na casa dessa entrevistada são:
• Quarto de casal: cama casal e berço.
• Quarto solteiro: roupeiro seis portas e cômoda.
• Cozinha: balcão de pia com uma cuba e duas portas, um kit compacto de seis
portas, três gavetas e um paneleiro. Os eletrodomésticos são: geladeira uma
porta, fogão de quatro queimadores e liquidificador.
• Sala: sofá de dois lugares, estante, TV de 14 polegadas.

Devido ao fato de a família preferir colocar o berço no mesmo quarto do casal,


não havia espaço suficiente para o armário neste ambiente, por isso no outro quarto não há
cama, somente roupeiro e cômoda.
Com as entrevistas foi possível perceber que alguns hábitos e preferências são

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semelhantes, como o fato de não observarem as dimensões do mobiliário em relação ao


espaço disponível na habitação, no ato da compra; a preferência por produtos com acaba-
mento em alto brilho, e que, sempre que necessário, fazem adaptações na disposição dos
móveis para melhorar o conforto.

4 DISCUSSÃO

4.1 Moradia

Em relação à distribuição do mobiliário sugerida no projeto da Cohapar, nota-se


que nem sempre é adequado, o que pode ser observado no quarto de solteiro, já que para
uma boa circulação, o espaço entre as camas, que deve ser de 91,4 cm, neste é de apenas 25
cm. Nesse ambiente, para o armário restaria apenas uma largura de aproximadamente 100
cm, provavelmente insuficiente para duas pessoas. O espaço do ambiente mostra-se restrito
para ser usado por duas pessoas, mesmo considerando apenas as atividades de dormir e
guardar roupas e outros pertences.
Com a utilização de beliche seria possível colocar um armário baixo, uma cômoda,
ou ainda uma mesa para estudos ou trabalho. A circulação ainda seria restrita, aproximada-
mente 65 cm, porém mais adequado que a proposta original. O beliche, apesar de ser aparen-
temente uma boa solução, tanto que é utilizado por uma das entrevistadas, para outra é uma
solução que não apresenta segurança.
No quarto de casal, o projeto da Cohapar sugere colocar uma cama de largura de
145 cm e comprimento de 198 cm, duas mesas de cabeceira e um armário de três portas.
Nesse caso, a circulação entre a cama e a parede frontal é limitada, apenas 43 cm, e de acordo
com a literatura, recomenda-se 60 cm. Nesses 43 cm de circulação, não foram considerados
o volume de colchas e de cabeceiras mais espessas. Além disso, o armário de três portas suge-
rido pode não ser suficiente para acomodar o vestuário e os demais pertences, como roupas
de cama, toalhas, objetos pessoais, etc.
A sala é o maior ambiente, mas também o que mais acumula funções, já que des-
tina-se a ser sala de estar, jantar, estudo e circulação. De acordo com o projeto, é possível
colocar sofás de dois e três lugares, ou um sofá de canto, com quatro lugares. A mesa para
cinco lugares está com um lado encostado na parede, e uma das cadeiras está próxima à
estante, o que dificulta o acesso. Nesta distribuição de móveis, o espaço entre o sofá de dois
lugares e o móvel para TV, seja uma estante ou rack, é de apenas 41 cm, o que não promove
boa circulação e caso o móvel tenha portas ou gavetas, a abertura e acesso são dificultado.s
A cozinha, localizada próxima à sala, possui dimensões reduzidas, 4,84 m². Consi-
derando que a cozinha possui largura de 201 cm, o balcão para pia encontrado no mercado
possui profundidade 48 cm, o menor fogão encontrado no mercado possui dimensões de
L = 498, H = 882 e P = 598 mm (Cônsul modelo Canela), a geladeira encontrada com
menores dimensões de L = 550, H = 1520 e P = 685 mm (Eletrolux RDE 30, 262 litros),
e o armário localizado na parede frontal possui profundidade de 36 cm, o espaço restante
destinado para circulação é de 95 cm. Esta distância não é suficiente, de acordo com Neufert
(1976), que indica 100 cm, e nem para Panero e Zelnik (2002), que indicam 152,7 cm de
distância mínima para a circulação em cozinha.

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MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL?

O fogão, o armário para pia e a geladeira devem possuir dimensões mínimas para
ser possível acomodá-los como foi sugerido. A parede em que estão localizados possui
240 cm, sendo a pia de 120 cm, o vão para fogão de 60 cm e o vão para geladeira também de
60 cm. Caso o móvel e os eletrodomésticos ultrapassem essas medidas, vão avançar sobre o
espaço destinado à circulação.

4.2 Mobiliário

O levantamento sobre mobiliário popular confirma as informações dos autores


citados. A dimensão dos móveis populares segue um padrão e não contempla as indivi-
dualidades e necessidades dos ambientes nos quais o móvel será inserido. Estas medidas
padrões encontradas no mobiliário são significativas no caso dos roupeiros, em que todos os
modelos, independente do fabricante, possuem 470 mm de profundidade, o que demonstra
a preocupação com o aproveitamento da chapa de MDF ou MDP, e não uma preocupação
com o uso do produto. A profundidade mínima para roupeiros, indicada na literatura, é de
508 mm.
Os móveis populares não são modulares, não apresentam flexibilidade ou multi-
funcionalidade. O máximo de multifuncionalidade encontrada está nos beliches, pois alguns
apresentam camas auxiliares, cômodas ou gaveteiros. Os móveis populares são standarts, e
não permitem flexibilidade de uso eficaz ou o uso racional do espaço.
Nesse contexto, para adequação do mobiliário às casas populares, a modularidade
e a multifuncionalidade poderiam tornar o mobiliário mais prático, flexível e funcional. A
utilização de larguras e profundidades diferentes melhoraria o aproveitamento do espaço. A
modularidade e a multifuncionalidade permitiriam maior flexibilidade de uso para os usuá-
rios, porém, sabe-se que o custo torna-se elevado.
Acredita-se que, como a Cohapar pretende trabalhar com empresas fabricantes de
mobiliário, este também deveria ser objeto de financiamento, assim, mesmo que se tornem
mais caros, a qualidade e durabilidade também seriam maiores, prolongando a vida útil dos
produtos e evitando o descarte precoce, além de promover maior conforto e qualidade de
vida para os usuários.
Outra solução para reduzir custos, sem comprometer a qualidade, seria desenvolver
um programa de venda de mobiliário com a moradia, como prever nichos nos quartos, que
seriam fechados com portas fixadas na parede, sem necessitar de laterais, e já seriam instala-
dos no ambiente. O morador só compraria a parte interna, conforme sua necessidade.
Ao comparar as dimensões indicadas na literatura com as dimensões encontradas
no levantamento de mobiliário popular no mercado nacional, pode-se observar que há algu-
mas divergências, que são mostradas na tabela 11.

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Tabela 11 – Comparação entre dimensões da literatura e mercado.

4.3 Entrevistas

Com as entrevistas foi possível perceber que as pessoas não costumam avaliar a
proporção dos móveis em relação ao espaço e acabam fazendo adaptações conforme sua
necessidade, como utilizar a sala como cozinha, ou utilizar cama de casal substituindo duas
camas de solteiro. Ao se perguntar sobre os fatores mais relevantes na hora da compra, o
item preço foi considerado o mais importante, seguido da qualidade nos três casos. O item
que se refere às dimensões adequadas do mobiliário ao espaço é o terceiro fator para duas
entrevistadas e o último para uma delas. A forma dos produtos é pouco considerada para
duas entrevistadas.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a pesquisa, confirma-se que o mobiliário encontrado para o público em ques-


tão realmente não favorece a organização espacial adequada das habitações, o que acaba
resultando em circulação restrita e falta de conforto. Como o nicho de mercado de móveis
populares está em expansão, esta é uma oportunidade para que os fabricantes realmente se
envolvam na busca de soluções mais adequadas.
O programa “Mobiliário Popular” ressalta a importância de desenvolver um mo-
biliário mais adequado a estas moradias, mas não comenta ou incentiva a preocupação com
as necessidades e preferências dos moradores, usuários desses produtos. Deveria haver mais
preocupação em adequar o mobiliário ao usuário, mais do que adequar o mobiliário à mo-
radia. Assim, o programa lançado pela Cohapar mostra-se mais uma boa oportunidade para
as indústrias futuras, parceiras da companhia, do que para os usuários, pois pouco se fala em
inovar e atender as suas reais necessidades e preferências.
Como foi apresentado na introdução, as classes C, D e E compõem a maior parte
da população, o que mostra que o público de móveis populares é bastante representativo.
Porém, o que parece é que a maior parte da população brasileira tem que se submeter aos
produtos existentes no mercado, todos bastante similares, já que pouca diferenciação existe
no mobiliário popular e parece não haver pesquisas sobre seus gostos ou necessidades.

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MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL?

Uma exigência da Cohapar para as empresas que pretendem formar uma parceria é
que estas deem garantia de três anos, pouco tempo tendo em vista as leis de defesa do con-
sumidor. As empresas voltadas para classe média apresentam, no mínimo, cinco anos. Essa
exigência da Cohapar não parece ser uma preocupação real com a qualidade e durabilidade
do mobiliário.
Um fator que demonstra a pouca preocupação das empresas com as necessidades e
preferências do usuário é a configuração retilínea do mobiliário e suas dimensões, que repre-
sentam mais as restrições de produção e aproveitamento de material, para baixar o custo – nem
sempre o preço final ao consumidor – e aumentar a competitividade. Esta busca em diminuir
o custo também acaba prejudicando a qualidade dos produtos e reduzindo a sua vida útil.
O custo do produto é o que mais importa para as empresas deste segmento de mo-
biliário. Porém para os usuários, é o valor das prestações que deve ser baixo, mesmo quando
o preço final é muito maior do que o valor real do produto. A partir desse fato, surge uma
questão:
Seria possível pensar em um programa de venda casada – moradia + mobiliário –,
procurando proporcionar um mobiliário adequado aos espaços e com qualidade, com o custo
diluído nas prestações da casa?
Decorrente dessa questão e considerando que a casa não é somente um abrigo, mas
um reduto da família (VERÍSSIMO, 1999), lugar em que a personalidade da família, seus
hábitos, costumes e crenças interferem no funcionamento (PALERMO et al., 2007), e que
portanto, a relação entre moradia e família deveria favorecer os sentimentos de pertencimen-
to, autoestima e bem-estar, surge outra questão:
Seria possível, com esse programa, desenvolver uma linha de mobiliário que pos-
sibilite ao usuário interagir com o produto? Ou seja, possibilitar que esse mobiliário possa
ser configurado de acordo com as necessidades do morador, respeitando seus costumes e
favorecendo o sentimento de pertencimento a este espaço?
Na década de 50, com designers como Michel Arnoult e Geraldo de Barros, já se
pensava no mobiliário modulado como alternativa para melhorar a relação entre os espaços
mais reduzidos e o mobiliário. Porém, até hoje esse problema não foi resolvido para as habi-
tações populares. O que estas iniciativas trouxeram como exemplo conceitual, principlamen-
te a de Michel Arnoult, foi a busca de um produto durável, com maior flexibilidade de uso,
que facilite a manutenção e evite o descarte precoce.
Segundo Folz (2003), a solução para melhorar o problema de falta de espaço nas
habitações populares é um mobiliário que dialogue com a casa e a família e que seja economi-
camente viável para este público. Nesse contexto, acredita-se que a modularidade ainda seria
a melhor alternativa, favoreceria este diálogo e até a identificação do usuário com o produto,
já que possibilitaria a composição de acordo com a necessidade do usuário, além de facilitar
a manutenção.
Nota-se, enfim, que o problema das moradias populares, tanto o déficit quanto o
conforto, é um problema antigo, mas que pouco mudou no decorrer da história, para aqueles
menos favorecidos.

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Melri A. Toporowicz Soares e Marilzete Basso do Nascimento

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