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DICIONÁRIO

CONTEMPORÂNEO DE
COOPERATIVISMO
O R G ANIZADORE S

MARCOS PAULO DHEIN GRIEBELER


PEDRO LUÍS BÜTTENBENDER
ROBERTO TADEU RAMOS MORAIS
JORGE LUIZ AMARAL DE MORAES
ARIOSTO SPAREMBERGER
NELSON JOSÉ THESING
© dos autores
Dicionário Contemporâneo de Cooperativismo
Organizadores: Marcos Paulo Dhein Griebeler, Pedro Luís Büttenbender,
Roberto Tadeu Ramos Morais, Jorge Luiz Amaral de Moraes, Ariosto Sparemberger,
Nelson José Thesing
Edição: Cezar Brites
Revisão e tradução: Vergara Santos Traduções e Revisão de Texto
Arte Capa: Araci F. P. Rodrigues

Agradecimentos às Cooperativas Sicredi União RS/ES e Sicredi Caminho das


Águas, pelas contribuições financeiras para viabilizar esta obra.

DOI: https://doi.org/10.29327/564874
Todos os direitos de publicação reservados à Editora Conceito. Não é permitida a reprodução
total ou parcial deste volume, sob quaisquer meios (eletrônico, digital ou mecânico), sem
permissão expressa dos autores.
Impresso no Brasil, 2022.

www.editoraconceito.com.br editoraconceito@yahoo.com.br

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COOPERATIVAS DE
CRÉDITO
Darlan Christiano Kroth 1
Enise Barth 2

Referem-se às cooperativas que possuem como principal ramo


de atividade, a intermediação de fundos monetários entre os
cooperados. Desta forma, essas cooperativas visam constituir fundos
(poupança) para emprestar (crédito) aos associados, em melhores
condições creditícias (em termos de acesso, prazos, taxas de juros e
garantias) que aquelas encontradas no setor bancário tradicional.
Podem ainda oferecer demais serviços financeiros/bancários aos
associados a custos mais baixos. Essa forma de operar (favorecendo a
oferta de crédito e serviços bancários) viabiliza investimentos
produtivos que por sua vez estimulam o desenvolvimento local e
regional.
Embora transacionem crédito (e realizem demais operações e
serviços bancários) as Cooperativas de Crédito (CC’s) são em sua
essência, distintas dos bancos tradicionais, principalmente em virtude
de: i) terem como finalidade social atender o interesse comum de seus

1 Doutor em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal do Paraná


(UFPR). Professor e Pesquisador do Curso de Administração e do Programa de
Pós-graduação em Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia
Ambiental (PPGCTA) da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Email:
dckroth@uffs.edu.br

2 Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa


Catarina (UFSC). Professora e Pesquisadora do Curso de Administração e do
Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Políticas Públicas (PPGPDD)
da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). E-mail:
enise.barth@gmail.com

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associados; ii) não visarem lucro; e, iii) pautarem-se pela autogestão.
Essas características estão garantidas por legislação própria e
justificam seu tratamento jurídico e tributário diferenciado em relação
aos bancos.
A atuação solidária e a necessidade de buscar a superação das
restrições ao crédito nas instituições convencionais, podem ser
consideradas as motivações para a origem das CC’s, ainda no século
XIX. As primeiras cooperativas de crédito foram criadas na Alemanha
entre 1847 e 1862. Desenvolveram-se ali dois tipos de cooperativas sob
a perspectiva da responsabilidade ilimitada dos sócios, os modelos
Delitzch-Shulze (ou “bancos do povo”) e Raifessen. Esses modelos logo
iriam se popularizar e se espalhar por outros países, como é o caso da
Itália em 1865 (modelo Luzzati, sob princípio da responsabilidade
limitada dos sócios) e em 1900 no Canadá (modelo Desjardins,
inspirado nos modelos europeus) (PINHEIRO, 2008).
Nesta evolução inicial sobressaem três elementos constitutivos
das CC’s: a organização social, o meio rural e as microfinanças. A
maioria das CC’s foram criadas a partir de associações e sindicatos de
trabalhadores urbanos e rurais. O meio rural se sobressaiu em virtude
da própria cultura cooperativista existente e das dificuldades
adicionais de pequenos agricultores acessarem crédito para financiar
sua produção. Já as microfinanças, decorre do fato que os
empréstimos eram de menor valor e em condições mais acessíveis.
(BÚRIGO, 2007).
Ao longo do século XX, principalmente após os anos 1960, as
CC’s observaram um significativo crescimento ao redor do mundo,
sendo que em alguns países, constituíram-se como um dos principais
agentes bancários, casos da França (Crédit Agricole, BPCE, Crédit
Mutuel), Holanda (Rabobank) e Alemanha (DZ Bank). Em 2020, os
países com maior expressão do cooperativismo de crédito eram:
França, China, Japão, Estados Unidos, Alemanha, Itália, Holanda,
Canadá, Áustria e Espanha. As características de atuação, regulação e
de configuração das CC’s, variam entre países e ao longo do tempo, em

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virtude de características culturais, socioeconômicas e políticas
(MEINEN; PORT, 2016; WOCCU, 2022).
Deve-se destacar que a expansão e a consolidação do
cooperativismo de crédito nas últimas décadas, acarretou em uma
segmentação na sua forma de atuar. Pode-se considerar duas vertentes
principais de atuação das CC’s na atualidade: i) cooperativismo
financeiro, em que as cooperativas tratam o crédito como uma
operação financeira convencional, seguindo o padrão utilizado no
sistema bancário tradicional. Nesta vertente, o valor emprestado deve
ser reembolsado, o risco da operação deve ser coberto por garantias e
a taxa de juros deve cobrir os custos de gestão, os riscos, e se possível,
proporcionar um retorno positivo à entidade; ii) cooperativismo de
crédito solidário, em que as cooperativas atuam na perspectiva
desenvolvimentista. O crédito é considerado como um meio para
viabilizar a produção per se e/ou novos projetos/empreendimentos.
Aqui a taxa de juros deve ser a mais baixa possível e o foco não é o
retorno com o crédito, mas sim sua viabilização (GENTIL;
NIEUWKERK, 1998; MEINEN; PORT, 2016).
No Brasil, o Banco Central (2022) define as CC’s como
“instituições financeiras que oferecem aos seus associados produtos e
serviços financeiros, de forma análoga a um banco comercial, contudo,
com natureza societária distinta”. Tal definição está alinhada com a
primeira vertente exposta no parágrafo anterior, o que indica uma
certa consolidação deste perfil de atuação no país. Todavia, ainda se
observa experiências de CC’s que lidam estritamente com microcrédito
e economia solidária (BACEN, 2022).
Em que pese tal posicionamento das CC’s brasileiras, sua forma
de atuação é muito distinta dos bancos tradicionais. As CC’s possuem
forte presença no interior do país, enfatizam o apoio a micro e
pequenos empreendimentos, tem menores exigências para acesso ao
crédito, menores tarifas e taxas de juros, o que permite gerar efeitos
ampliados sobre o desenvolvimento regional (JACQUES;
GONÇALVES, 2016).

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Em 2020, o Sistema Nacional de Crédito Cooperativo (SNCC), criado
pela Lei Complementar n. 130/2009, era composto por quatro
sistemas de três níveis e cinco sistemas de dois níveis. Os sistemas de
três níveis, representados por SICOOB, SICREDI, CRESOL e
UNICRED, contemplam as cooperativas singulares (1º nível), centrais
(2º nível) e confederações (3º nível) e concentram 70% das CC’s no
país. Já os sistemas de dois níveis envolvem cooperativas singulares e
centrais. Há ainda 222 cooperativas singulares que operam sem
vínculos com centrais e/ou confederações (BACEN, 2022).
O cooperativismo de crédito no Brasil tem sua origem no ano de 1902,
quando da criação da Caixa Rural de Nova Petrópolis (modelo
Raiffeisen), no Rio Grande do Sul. Até o ano de 1961 o número de CC’s
expandiu consideravelmente, chegando a 511 cooperativas. Desse ano
até final dos anos 1970, ocorre um declínio em virtude de medidas
restritivas implementadas pelo Governo Federal. Na década de 1980,
inicia uma fase de reativação das CC’s, principalmente vinculadas às
cooperativas agropecuárias, estabelecendo-se como seu braço
financeiro, dado a queda no crédito rural oficial (PINHEIRO, 2008).
Os anos 1990 foram caracterizados como uma nova fase de expansão
das CC’s, favorecidos por novas regulamentações que permitiram o
funcionamento das cooperativas de economia e crédito mútuo e rural
(1992) e a criação de bancos cooperativos (1995). Essas mudanças
somadas ao fato que as cooperativas passaram a ser o principal
parceiro dos bancos oficiais para operacionalização do PRONAF, criou
o impulso necessário para seu fortalecimento. No final da década de
1990, o número total de cooperativas chegou a 806, quase o dobro do
final da década de 1980 (BÚRIGO, 2007).
Esse fortalecimento e expansão das cooperativas permaneceu
em ritmo acelerado nos anos 2000, com diversas regulamentações que
foram viabilizando o aumento de associados (como a resolução que
permite a livre admissão no ano de 2003), a ampliação dos serviços
prestados através de maiores concessões aos bancos cooperativos e a
maior segurança para os cooperados, através da criação do Fundo

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Garantidor. Em 2007 haviam 1.461 CC’s no país. A partir de 2015
observou-se um movimento incorporações (aquisição de uma CC por
outra) visando obtenção de economias de escala, o que refletiu na
queda no número de cooperativas, totalizando 847 cooperativas em
2020. Apesar da redução de CC’s, o número de postos de atendimento
e agências cresceu, superando o número de agências dos bancos
tradicionais
Destaca-se que o período de 2015-2021, as CC’s observaram
crescimento acima do sistema bancário tradicional, atingindo 21% do
total de crédito rural do sistema financeiro nacional, o que indica que
o SNCC tem substituído o setor bancário na oferta desse produto. Esse
crescimento do SNCC também é um indicativo de que as CC’s estão
tomando espaço dos bancos tradicionais, principalmente no interior
do país, demonstrando que podem assumir maior protagonismo no
setor de crédito brasileiro nos próximos anos. No ano de 2020, as CC’s
estavam presentes em 2.788 municípios brasileiros, distribuídas nas
regiões sul (55%), sudeste (30%) e demais regiões (15%). Em muitos
municípios, a cooperativa é a única instituição financeira presente
fisicamente (BACEN, 2022).
Alguns temas que merecem atenção e permearão o escopo de atuação
das CC’s nos próximos anos, referem-se às novas tendências bancárias
(openbanking, fintechs, bancos digitais) que afetam a concorrência no
setor; limites e possibilidades de resgatar/fortalecer a vertente mais
afeita ao crédito solidário e de atuação como agente de
desenvolvimento local; formas de ampliar a gestão democrática e
efetivar a governança cooperativa; e, como aprofundar seu
protagonismo e contribuir em empreendimentos ambientalmente
sustentáveis.

REFERÊNCIAS

BANCO CENTRAL DO BRASIL. Cooperativas de crédito.


Disponível em:

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<https://www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/cooperativacredito
>. Brasília: 2022. Acesso em: 22fev2022.

BÚRIGO, F. L. Cooperativa de crédito rural: agente de


desenvolvimento local ou banco comercial de pequeno porte?
Chapecó-SC: Argos, 2007.

GENTIL, D.; NIEUWKERK, M. Microfinance: orientations


methodologiques. Bruxelles: Commission Européenne, 1998.

JACQUES, E. R.; GONÇALVES, F. O. Cooperativas de crédito no


Brasil: evolução e impacto sobre a renda dos municípios brasileiros.
Economia e Sociedade, 25(2), 489-509, 2016.

MEINEN, E.; PORT, M. Cooperativismo financeiro: percurso


histórico, perspectivas e desafios. Brasília: Confebras, 2014.

PINHEIRO, M. A. H. Cooperativas de crédito: história da


evolução normativa no Brasil. 6ª ed. Brasília: BCB, 2008.

WORLD COUNCIL OF CREDIT UNIONS (WOCCU). Statiscal


report. Washington: WOCCU, 2022. Disponível em:
<https://www.woccu.org/>. Acesso em: 21fev2022.

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