Você está na página 1de 2

Entretanto, sua maior, mais contundente e mais impactante provocação, entre nós,

foi a denúncia pública do estado medíocre e apodrecido com que a vida intelectual
brasileira se encontra tanto no interior das universidades quanto nas fontes
editoriais e nos seminários de formação teológica e filosófica de muitas de nossas
instituições eclesiais. Não sabíamos ou não tínhamos noção do quadro doloroso em
que vivíamos em nossa vida cultural e formativa. Seu foguete demolidor dirigiu-se
em primeiro lugar à turma representada pela Sociedade Brasileira para o Progresso
da Ciência (SBPC). Basta, para se ter uma ideia, conferir a polêmica com os
editores da revista ‘Ciência Hoje’ no livro ‘Aristóteles em Nova Perspectiva’. Sua
denúncia nos mostrou que o ensino da filosofia e de outras áreas do saber está
integralmente preso ao ditame político ideológico esquerdista presente e atuante em
quase todas as faculdades ‘humanistas’ do Brasil, especialmente da USP (cf. Jardim
das Aflições), da PUC de SP e do RJ (leia-se O Imbecil Coletivo I e II). A mesma
denúncia mostrou quão envergado e deprimente está o quadro de nossas universidades,
de nossas escolas, de nossos meios editoriais, de nossos jornais e meios de
comunicação, quase totalmente contaminados de marxismo e, sobretudo, de
desonestidades intelectuais. Nem mesmo a teologia ficou livre desse imbróglio.
Impregnada de ‘libertação’, penetrou a alma de nossos estudantes, futuros prelados
e pastores. Segundo ele, essa teologia, com raízes no Vaticano II, tornou-se
prisioneira da mesma vertente. Exemplos são os mais conhecidos teólogos brasileiros
desse período: Leonardo Boff e Frei Betto. Por muito tempo foram inquestionados,
mas Olavo os desqualificou sob o ponto de vista intelectual e reafirmou sua tese de
que o estrago causado por essa teologia para a Igreja ainda não foi avaliado nem
suficientemente medido.

Em razão de sua atividade como escritor e professor, pudemos, por meio do seu
estímulo, ter acesso a obras antes sequer mencionadas nos meios editoriais e
universitários. Temos hoje a chance de ler autores como Eric Voegelin, Mortimer
Adler, Russel Kirk, Roger Scruton, Leopol Szondi, Nortrop Frye, Bernanos, Newman,
I. Conrad, Victor Frankl, Andrew Lobaczewski, René Girard, Thomas Sowell, Xavier
Zubiri, A. D. Sertillanges, Chesterton, Theodore Dalrymple, Louis Lavelle, B.
Lonergan, Mário Ferreira dos Santos, Otto Maria Carpeaux, Vicente Ferreira dos
Santos, Ângelo Monteiro, Meira Penna, Gustavo Corção, Leo Strauss e muitíssimos
outros. Em seus cursos, Olavo chamou-nos a atenção para o valor atualizado da
filosofia encontrada nas obras de Aristóteles, Platão, Agostinho, Tomás de Aquino,
S. Boaventura, Duns Scotus, Husserl, Leibniz, Schelling (e outros muitos), dos
grandes autores da literatura e historiadores (como Walter Scott), escritores
contemporâneos e modernos, sejam eles do Brasil ou do mundo. Nosso país estava
fechado à vastíssima obra de valiosos escritores simplesmente desconsiderados
porque não eram, nem são de esquerda.

Segundo Olavo, o pensamento brasileiro e mundial contaminou-se do que Julien Benda


designou ‘traição’, isto é, de emoção política que penetrou a mente de nossos
intelectuais e deu vazão ao ‘leimotiv’ estampado na filosofia de Marx: ‘o mundo não
é para ser conhecido e contemplado, mas, antes, para ser transformado’. Assim, o
terreno das ciências deixou de ser laboratório de pesquisas e de conhecimentos para
se tornar um campo de batalha política. Nossa vida educacional foi engolida pela
ansiedade primária de ‘transformação’ do mundo social, político, cultural,
econômico e religioso. Estamos, pois, encharcados de ‘anseios revolucionários’. Por
causa disso, segundo Olavo, não há mais, entre nós, possibilidades de debates
intelectuais honestos e científicos já que as paixões embotaram e distorceram nossa
razoável racionalidade, terminando por prevalecer sobre a objetividade dos fatos e
resultados. As discussões ligadas à política estreitamente ligada à sua militância,
se locupletaram e substituíram-se à busca honesta, livre e amorosa pelo saber.
Estamos entre os últimos lugares do mundo nos rankings educacionais. Tal é a
tragédia que se abateu sobre a educação brasileira, sobre nossas universidades,
sobre nosso mundo político, religioso e intelectual. Para servir de exemplo, foi
recente a observação de um professor que avaliou o trabalho de conclusão de curso
(feito a partir das obras de Olavo de Carvalho) de um estudante de filosofia: sua
pesquisa não deveria ter sido feita sobre esse autor porque o mesmo não pertence ao
quadro dos professores da academia filosófica universitária vigente. Ora, o
argumento é fajuto, rasteiro e desonesto. Com efeito, se fosse correto, deveríamos
excluir filósofos que não foram professores universitários, entre eles, K. Marx,
Engels, Rousseau, Saramago, Gabriel Marcel, Kierkegaard…. e muitos outros. Como se
conclui, prevalece ainda aqui e alhures a militância sobre a lógica, a verdade e a
racionalidade.

Se o conteúdo central do trabalho de Olavo é a afirmação da unidade do conhecimento


na unidade da consciência humana, resulta que esse princípio unitário essencial, é
a condição sem a qual seríamos ou estaríamos desintegrados de nós mesmos e do mundo
em que habitamos. A desintegração de nosso ser, portanto, começa na ausência da
verdadeira percepção de nosso eu e da realidade na qual ele está inserido. Em
outras palavras, toda vez que elaborarmos conhecimentos, doutrinas ou ideias nas
quais nós mesmos não estivermos dentro delas, significa então que nos colocamos
fora da própria doutrina que geramos e, dessa forma, instauramos em nossa atividade
intelectual aquilo que Olavo designou ‘paralaxe cognitiva’, isto é, um conhecimento
ou filosofia ficcional que conduz o próprio pensador que a produz (com seus
discípulos, por consequência), à esquizofrenia de si mesmo, à loucura, à estupidez,
à psicopatia. O que pode salvar nossas mentes das loucas ficções é sempre o esforço
honesto e sincero de retorno à observação do mundo real das coisas e do nosso eu
real. A nossa inteligência é que se alimenta do ser e não o inverso. Todos os
idealismos são ficcionais e terminam por levar seus condutores e protagonistas a
tentativas de forçosa e violenta implementação dos mesmos, na vida das pessoas. As
experiências mostram que tais idealismos conduziram seus agentes e vítimas a
experiências tristes, terríveis e chocantes que os totalitarismos históricos do
último século testemunharam. Como disse Eric Voegelin, o ‘iletramento espiritual’
das elites intelectuais do mundo moderno e contemporâneo engendrou e legitimou o
advento de psicopatas que, alçados a algum poder, foram capazes de, sem escrúpulos
e remorsos morais, matar e ferir aqueles que bem quisessem. O homem que eliminar
Deus da sua existência terminará por colocar-se no seu lugar e agirá como se divino
fosse.
A despeito de todas as opiniões divergentes quero expressar minha gratidão pelas
páginas que Olavo escreveu e pela intrepidez com que levou adiante a defesa de
valores e princípios nutrientes daquelas almas que desejam crescer e viver na
retidão, na sabedoria, na verdade. Muitos brasileiros encontraram em Olavo o
alimento intelectual que as universidades não ofereciam. Ele os nutriu e os ajudou
a viver melhor. Vinculada à grande tradição metafísica de Aristóteles, de Tomás de
Aquino e às fontes judaico-cristãs, a filosofia de Olavo de Carvalho guarda pilares
da sabedoria que já fora cultivada e buscada pelos gregos, mas que foi encontrada
na grande herança cristã. Seus textos e preleções contêm aqueles valores e
princípios que sustentaram as nobres e grandes civilizações. Nesse sentido
colaborou muito para o bem do nosso Brasil e do mundo. O Brasil não é só futebol,
carnaval, samba ou outra marca. Agora, sobretudo, é também Olavo Luiz Pimentel de
Carvalho. Dele nos orgulhamos.

Você também pode gostar