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ANA FLÂVIA TEODORO M.

OLIVEIRA

AUIISTAS

OS espaÇOS
eSCOlOres
adaptados
MERCHDO
LERAS
NE

Dedicatória

Ao menqueridopai, NicanorTeodoro (in memoriam),


Neste di cil momento de despedida, às vésperasdesta publicação- a
realização de um sonbo por nós partilhade, dedico este livro ao senbor,
que foi jornalista, eseritorepocta. Obrigada pelo exemplo debonestidade
e por ter sido men mestre na descoberta dos livros e do prazer pela arte
da escorita.

A todas as crianças e jovens autistas que precisamn com urgéncia de


espaços escolares pensados e adaptados de acordo com suas necessidades.

Estudantes autistas que ao longo dos anos foram negigenciados em sen


direito de ser e estar no ambiente escolar em condições de igualdade em
relação aos demais colegas.
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Agradecimentos

A Deus, por ser uma presença onstante emn minba vida, inspirando-me
a escrever este ivro com o desejo de tornar melbor a existéncia das pessoas
autistas nos espaços escolares.
Ao men marido, Lincoln, presença tão importante a0 longo desses vinte e
quatro anos de casados, pelas suas palavras generosas, seu estmulo, sen
amparo, sens abraços acolbedores– ingredientes indispensáveis para conclusão
deste liro. Agradeço muito, por ter sido sempree, incondicionalmente, aguele
que acreditou e acredita nos meus projetos, nos mens sonbos e no meu trabalbo.
Aos meus bos, Davi e Gabriel, presentes preciosos de Dens na minba
vida, porque jamais quaisquer dos mens sonbos seriam possiveis se en não
pudesse contar como amor e a compreensão de vocês.
Ao meu pai, Nicanor Teodoro (in memoriam), minba primeira e maior
inspiração para esrever, e à minba mầe, Maria das Graças, por ter imprimido
em mim a sensibilidade de olbar e considerar as necessidadesdo outro.
Às minbas irmā, Tina e Flá, e a0 men irmão, Cleiton, por estarem ao men
lado incondicionalmente e por sempre acreditarem nosmnenssonbos.
As muitas mães de autistas om as quais conviva, mulberes guerreiras,
lutadoras e fortes; estpecialmente agradeço a Rosalina Oiano, Amanda
Meneres Ferro, Aa Paula Ferrari, Sandra Andrade e Alessandra
Jacob, por serem inspiração para muitas mãæs qe precisam deforças para
prosseguir sua caminbada.
Ao meu amigo Mauricio, porfazer da arte uma forma de expressartodas
as possibilidades artisticas existentes no autismo, e ao men amigo Tiago
Florêncio de Abren, por usar ojornalismo para fazer conbecida a causado
autismo.
Ao meu grande e carissimo amigo autista Alvaro Oiano, por tantas wges
ter ido às minbas aulas na Uiversidade para partilbar sua bistória de
ida, por gjudar os mens alunos a se aproximarem das snasesperiências,
desconstruindo muitos estereótipos a respeito do autismo, por ser fonte de
inspiração para este iro e para vida de muitaspessoasantistas.
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Aos diversos pro ssionais envolvidos con a causa do autismo, especialmente
a Juliana Moura com o sen projeto "Pargue azul", a Kely Cristina Tobias
com os projetos na ára de Musicoterapia e autismo, e Viiane Braga,

Educadora Fisica, profssional amorosa e competente, por farer do sem


trabalbo uma missão para tornar a vida daspessoas amtistas mais feliz e

prazerosa.
Aos mens alunos e alunas da graduação e aos mens orientandos queridos, qw
partilbando os sens saberes ajudaram-me a construir os mens conbecimentos

a respeito do autisma. Agradego especialmente a querida auna Mayana


Godoy Favoretto pela ajuda preciosa na tradução de algumas imagens para
esse manuscrito.

Aos pro ssionais que zeram a cuidadosa e amorosa revisão dos originais
deste livro - Rosângela Dirina dosSantos e Adiano Dias de Andrade,
pela parceria precipua desde os tempos do doutorado.
À minba amiga Maria LLiảa Gurgel da Costa, da Universidade Federal
de Pernambuco (UFPE), por ter possibiltado os meus estudos na área do
autismo.
Àdhnica escola da Faculdade de Fonoaudiologia da UFPE, onde pude ter
um contato mais práximo com crianças autistas, pelo lugar especialque ocnpa
na minba onstrução como docente. Sem dúvida, as exsperiências vividas nesse

espaço académico foram sempre serão fonte de conbecimnento para meus

escritos a respeito do autismo.

Aos menscolegasqueridos da Facnldade de Educação (UFG), espeialmente


a0s mens congpanbeiros da área de Educação Especial, Ricardo Teixeira e

Edna Misseno, por tantas parcerias exitosas, carregadas de afeto, respeito e


muita discussão.
À minba amiga Keila Matilda, pelo incentivo à construção desta obra
durante todo o periodo de quarentena. Sem dúvida, sua amizade sincera

tornam os mens dias melbores n0 espaço académico, inspirando-me a

continuar a jornada.
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SUMÁRIO

PREFÁCIO 11
Carlo Schmidt

APRESENTAÇÃO 13
INTRODUÇÃO 15
Capítulo 1

AS EXPERIÊNCIAS SENSORIAIS
DOS AUTISTAS EO DESIGNESCOLAR 19
Capítulo 2
A CONSTRUÇÃO DE ESPAÇOS ESCOLARES
INCLUSIVOS PARA ESTUDANTES AUTISTAS 43
PARA NĀÃO CONCLUIR 93
REFERÊNCIAS 97
Apêndice 1

QUADRO DE REVISÃO DA LITERATURA 101


PREFÁCIO

No início da década de 1990, dois pesquisadores pioneiros no


autismo, os doutores Eric Schopler e Gary Mesibov, publicam um ivro
sobre pessoas com autismo de alto funcionamento. No sexto capítulo
desta obra, Temple Grandin narrou suas experiências do ponto de vista de
uma pessoa que vive o autismo. Lembro de ter cado muito impressionado
ao ler sobre como ela descreveu o incômodo que sentia com suas roupas,
relatando que precisava de três a quatro dias para se adaptar à dor e ao
desconforto causado pela textura. Interessante que nessa época, os
manuais diagnósticos vigentes não mencionavam quaisquer referências
que permitisse associar as alterações sensoriais ao autismo. Somente duas
décadas depois essa característica foi descrita como critério diagnóstico
para Transtorno do Espetro Autista. Atualmente estima-se que cerca de
80% das pessoas com essa condição se depara tais di culdades em seus
ambientes.
A partir da tomada de consciência que não são apenas as di culdades
de interação social que podem interferir na aprendizagem dos alunos com
autismo, mas especialmente as experiências sensoriais, tais caracteristicas
passam a tomar relevo ainda maior na educação inclusiva. Por outro lado,
o desconhecimento destes aspectos por parte dos atores das instituições
de ensino pode di cultar o processo ensino -aprendizagem e na trajetória
de escolarização desses alunos. Diversas autobiogra as podem con rmar
esta questâo, tais como os livros de Donna Williams, Temple Grandin ou
Daniel Tammet, o que torna a leitura deste livro extremamente importante.
Na presente obra, a professora Dra. Ana Flávia Teodoro Oliveira
se debruça sobre as experiências sensoriais no autismo pensando na
construção de ambientes escolares mais incusivos. Engana-se quem
espera encontrar aqui um manual que normatiza adaptações para escolas
que recebem alunos com autismo. Pelo contrário, há menos sobre
"normatizações" e mais sobre uma forma diferente e interessante de
percebermos o mundo à nossa volta a partir do olhar das pessoas com
autismo.
Para refetir sobre as experiências sensoriais das pessoas com
autismo, Ana convida seus leitores a conhecer quem narra estas

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experiências de um ponto de vista interno, pessoal, vivencial e complexO.
Nos presenteia com a perspectiva da professora inglesa Olga Bogdashina,
cujos estudos sobre os tipos de experiências senssoriais no autismo o
narram a partir do discurso das próprias pessoas com esta condição. Tal
escolha não se justi ca por pouco, já que a Dra. Bogdashina possui uma
ha com autismo e um ho com síndrome de asperget, o que a coloca
de forma pessoal e cotidiana em contato com o tema. O esclarecimento
sobre estes tipos especí cos de processatnento sensorial nos conduz a
uma perspectiva de ordem mais prática, calcada nos estudos de Magda
Mostafa sobre como a arquitetura pode contribuir para ambientes mais
inclusivos, considerando as especi cidades da percepção sensorial das
pessoas com autismo. Com isso, o segundo e ltimo capítulo resgata as
perspectivas anteriores e propõe um diálogo destas com as narrativas de
autistas que escreveram suas experiências em autobiogra as. Recheadas
com trechos compreensivos, retirados dos livros autobiográ cos, as
propostas sobre ambientes mais acolhedores levam o leitor a se solidarizar
com a importância de adaptações nos espaços escolares que minimizem o
isolamento de quem sofre por ser diferente.
O livro em integra teorias multidisciplinares sobre o fenômeno
da percepção no autismo tendo como nó central a narrativa pessoal de
quem vivencia estas experiências em seu dia a dia. Este formato de escrita
consegue transformar um tema tão complexo como a sensorialidade do
autismo em uma leitura que toca a pessoa que lê, sensibilizando o leitor
para valorizarmos a importância dessa questão na educação brasileira.
Desse modo, a obra pode ser facilnmente acessada tanto por pais,
educadores, pro ssionais de saúde, arquitetos e interessados tanto quanto
por pesquisadores e acadêmicos em geral.
Desejo de uma ótima leitura nesta aventura sensorial no mundo do
autismo!

Carlo Scbmidt

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EDITORA MERCADO DE LETRAS
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APRESENTAÇÃO

A questāo das diferenças sempre mobilizou minhas escolhas


acadêmicas e pro ssionais. O envolvimento com a problemática da
Educação Inclusiva permeou todo o meu processo de formaçãoe delineou,
também, meus primeiros passos no campo da pesquisa.
A preocupação com a formaçăo de professores também deu tônica
a todo esse processo, pois, em minha atuação docente, nos cursos de
graduação em Pedagogia e de Especialização em Educação Especial,
ministrando disciplinas relacionadas com a Educação Inclusiva, pude
perceber, por meio dos diálogos estabelecidos em sala de aula, enorme
di culdade e resistência de graduandos e professores do Ensino Básico
para ensinar estudantes que compõem o público-alvo da educação especial,
notadamente os autistas.
Por certo, penso que a atitude de resistência dos graduandos
e de muitos professores que já se encontram em sala de aula se deve,
especialmnente, ao desconhecimento em relação ao autismo, sobretudo,
porque muitos desses estudantes e pro ssionais jamais tiveram experiência
com esse grupo de alunos. Partindo dessa premissa, entendo que só será
possível aos diferentes atores das instituições de ensino compreender qual
é a escola que os autistas necessitame desejanmse for asseguradoo direito
de voz a esse grupo minoritário e em situação de desvantagem.
Nesse contexto, o livro considera que o ambiente sico da escola e
da sala de aula pode constituir-se numa ferramenta importante no processo
de ensino-aprendizagem dos estudantes autistas. Outrossim, é justamente
em razão dessa constatação que apresentamos um apanhado de pesquisas
nacionaise internacionais sobre como o design escolar pode atender às
necessidades e especi cidades desses sujeitos.

E exatamente por essa possibilidade de estabelecer um diálogo


entre os sujeitos autistas e a teoria do design sensorial, que se estabelece o
ineditismoe relevância desta obra. Vale ressaltar que, atualmente, não há
no mercado editorial brasileiro livro semelhante, voltado para o campo da
educação.

Nessa perspectiva, pensamos que o diálogo estabelecido entre as


autobiogra as de Temple Grandin, Donna Williams e Daniel Tammet e
os estudos sobre projetos arquitetônicos e design ambiental pode lançar
luz sobre muitas medidas a serem adotadas pelos gestores e professores

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no sentido de minimizar ou dirimit os eventuais problemas advindos da
vivência nos espaços escolares.
Além disso, penso que o livro, ao apresentar uma diversidade de
propostas e sugestões para adaptat o ambiente físico da escola, pode
servir de apoio para terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, psicólogos
e pro ssionais da área de arquitetura e design, no sentido de propor
soluções possíveis de tornar o cotidiano escolar mais agradável, seguro e
inclusivo para o estudante autista. É, também, uma leitura de interesse de
pais e familiares de indivíduos autistas, uma vez que as sugestões para o
ambiente escolar também suscitam importantes re exões sobre os demais
ambientes frequentados por esses estudantes.
Dessa forma, sublinhamos que esta obra não pretende ser um
manual de como adaptar escolas para autistas. No entanto, desejamos que
as re exões aqui dispostas sejam tomadas como um referencial acerca da
construção de espaços escolares que considerem as experiências sensoriais
no autismo, ou seja, um referencial sobre o planejamento de espaços sicos
capazes de apoiar o desenvolvimento das habilidades desses estudantes e
de minimizar os dé cits sensoriais.
Finalizo esta breve apresentação expressando o desejo de que
o leitor consiga perceber que, embora compartilhem o mesmo mundo
sico e lidem com a mesma estrutura material do seu entorno, o mundo
perceptivo das pessoas autistas é extraordinariamente diferente do das
pessoas não autistas, fazendo-os sentir, por vezes, que nasceram no
mundo errado. Essa é a impressão que podemos ter a partir, por exemplo,
do depoimento de Daniel Tammet (2007) sobre a sua escola:

Lembro que me sentava sozinho sob a sombra das árvores que pontilhavam
o perímetro do pátio de recreio da escola, observando, à distância, as
crianças correndo e gritando e brincando. Estou com 10 anos e sei que
sou diferente de uma maneira que não consigo expressar ou entender.
As crianças são ruidosas e agitadas, colidindo e se empurrando. [., Não
raramente sentia o desejo de sumir. Parecia não me adaptar a nenhum
lugar, como se tivesse nascido no mundo errado. (Tammet 2007, p. 67)

O planejamento de espaços com essa natureza não é tarefa fácil,


pelo contrário, é uma empreitada complexa, assim como complexo é o
autismo, porém é uma tarefa possível, contanto que os atores envolvidos
no processo (professores, gestores, arquitetos, designers, entre outros) se
aproximem da experiência do próprio autista, ouçam sua voz, sensibilizem-
se com a sua maneira de ser e estar no ambiente escolar.

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INTRODUÇÃO

Asúltimnasdécadas foram marcadas por um investimento exponencial


na Educação Inclusiva, quer em termos das práticas, quer em termos da
re exão teótica em diferentes domínios do conhecimento. Vários são os
debates em que as chamadas "minorias" ou grupos excluídos" iguram
como matéria de pauta. Não é excessivo relembrar que esses grupos
minoritários representam uma acentuada parcela da populaçāo mundial,
o que, por si só, já é razão su ciente para se pensar em uma educação
inclusiva.
Com efeito, o tema educação inclusiva tem se tornado uma das
prioridades das agendas internacional e nacional, sendo muitas as ações
realizadas no sentido de reestruturar a escola para lidar com a questão das
diferenças. Em consequência disso, há uma preocupação evidente com a
adaptação dos espaços escolares para atender ao grupo de pessoas com
de ciência, garantindo-lhes acessibilidade.
No entanto, na medida em que caminhamos rumo a uma educação
inclusiva, que garanta o direito de “todos" a uma educação em condições
de igualdade, parece ser inconcebível que a preocupação com a adaptação
dos espaços escolares se restrinja somente ao grupo de alunos com
de ciências sica, intelectual ou sensorial, entre outras. Circunscrever ou
imitar a discussāo sobre adaptação dos espaços escolares apenas para
esse grupo é desconsiderar as características que marcam o autismo e as
inúmeras particularidades provenientes do seu sistema perceptual, que
é extremamente susceptível às in uências diretas do ambiente que os
cercam.
No tocante à percepção, "um ou vários sistemas sensoriais podem ser
afetados de tal modo que as sensações diárias ou são percepcionadas como
insuportavelmente intensas ou não são aparentemente percepcionadas"
(Attwood 2010, p. 350). Nesse contexto, é possível veri car diversos
problemas sensoriais que afetam a vida escolar dessas pessoas. Vejamos,
abaixo, o depoimento de um autista acerca da sua percepção do ambiente.

Os corredores e as paredes de quase todas as escolas convencionais são um


constante tumulto de ecos de sons, luzes Auorescentes (uma peculiar fonte

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de pressão visual e auditiva para pessoas no espectro autista), campainhas
a tocar, pessoas esbarram umas contra as outras, cheiros de produtos etc.
Para qualquer pessoa com hipersensibilidades sensoriais e os problemas
típicos do espectro autista o resultado é que, muitas vezes, passamos a
maior parte do dia perigosamente no limite de uma sobrecarga sensorial.
(Sainsbury 2000, p. 101)

Indubitavelmente, todas essas reações sensoriais podem impedir


a compreensão do ambiente e, desta forma, desencadear descon ança,
medo, recusa/rejeição, evitaçāo, respostas bizarras ou agressivas, ritualismo
e estereotipias motoras, comunicação imprópria, além de condutas
obsessivas, fazendo com que o processo de adaptaçåo às situações seja
marcado por muito sofrimento (Giaconi e Rodrigues 2014).
Dessa forma, diante das características que marcam o autismo,
entendemos que um ambiente escolar adaptado pode contribuir para
promover a aprendizagem de forma signi cativa. Por outro lado, um
ambiente educacional mal planejado pode incapacitar sujeitos com
autismo, corroborando para situações de exclusão e desigualdade dentro
das instituições de ensino. Entretanto, diante de todo esse cenáio, torna-
se improvável tratar de ambientes adaptados para autistas sem discussão
mais aprofundada acerca das experiências perceptivas desses indivíduos.

Partindo dessa premissa, vem à tona algumas indagações que nos


parecem pertinentes sobre esse tema tão essencial na educação inclusiva e
que, mais adiante, procuraremos responder. Vejamo-las:

1. Como as pessoas autistas respondem perceptualmente ao


ambiente sensorial da escola ou das instituições de ensino?
2. Quais são as diretrizes da Arquitetura e do Design para a
construção de uma escola adaptada às necessidades dos
estudantes autistas?

Para conhecer as experiências sensoriais dos autistas, temos a

convicção plena de que é necessário, e de suma importância, dar voz aos

sujeitos autistas, às suas vivências, no intuito de que eles próprios possam


contar-nos as suas histórias. Só assim, teremos condições mais seguras

para desvelar, na integralidade, todos (ou quase todos) os aspectos que


envolvem a relação daqueles indivíduos com o ambiente à sua vota,
sobretudo, o escolat.

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Destarte, essas autobiogra as devem ser consideradas como
estratégias bastante promissoras e favoráveis às instituições de ensino para
que se adaptem adequadamente para receber os estudantes. Na realidade,
esse procedimento estratégico, além de descrever, analisar e compreender
as experiências sensoriais dos autistas enm relação ao ambiente escolar, pode,
de certa forma, romper com as relações de poder que, eventualmente,
silenciam ou interditam essas pessoas. Sobre isso e em consonância com
Bialer (2015) acreditamos que:

O saber dos autistas pode potencializar a circulação dos discursos na


escola, desmontando relações cristalizadas e viabilizando o surgimento de
inovações transformadoras das práticas escolares. Essa inclusão escolar,
ancorada na justaposição de vozes, de saberes advindos das diferenças
tem um potencial de abertura renovador, pois esse hibridismo alicerça
a possibilidade da potencialização de inovações produtoras de novas
relações com a educação, assim como com todas as outras práticas sociais
e culturais. (Bialer 2015, p. 490)

Á luz dessas considerações preliminares, visamos, neste livro,


empreender algumas análises de autobiogra as escritas por pessoas
autistas. Nosso propósito fundamental é descrever as possíveis experiências
sensoriais dos autistas, apresentando o modo com que esses sujeitos se
relacionam com o ambiente, especialmente a sala de aula, observando as
suas respostas emocionais, comportamentais e educacionais vivenciadas.

Para tanto, três autobiogra as foram selecionadas: a primeira


intitulada “Uma mnenina estranha" (1999, Editora Companhia das Letras)
escrita por Temple Grandim, em colaboração com Margaret M. Scariano,
mãe da autora; a segunda, intitulada “Meu mundo misterioso" (2012,
Editora Thesaurus), de autoria de Donna Williams; e a terceira, de Daniel
Tammet, com o texto Nascido em um dia azul" (2007, Editora Intrínseca).
Nossa escolha fundamenta-se sobretudo naquilo que as três
narrativas têm em comum, sobre a forma com que Temple Grandin,
Donna Willians e Daniel Tammet experenciam seus ambientes escolares
em termos sensoriais. A partir das análises e de discussões sobre tais
vivências, é possível perspectivar de que maneira um projeto arquitetônico
de um determinado ambiente impacta diretamente na percepção e
recepção (positiva ou negativa) sensorial, comportamentale educacional
de um(a) estudante autista.

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Entretanto, não nos interessa apernas analiso* e descrever as
relatos autobiográ cos,
experiênciassensoriais dos autistas a partir dos relato
mas,sobretudo, queremos confrontat esses dados co h estudos e pesquisas
zamos uma revisão
a respeito do designsensorial. Nessa perspectiva, realize.
teórico-crítica de literaturas nacionais e internacionais sobre as etrizes
fundamentaispara a construção de escolas ou ambiento cionais com
cessidades do
o fm de atender as especi cidades e necessidades do oestudante autista
Com efeito, pensamos que este livt ode apontar caminhos
no
olares para autistas.
sentido de promover adaptações dos ambientes escolares
modo, poderemos, de algurma maneira, contribuir para melhotar
tudantes e, sobretudo,
aqualidadede vida dessesestudantes sobretudo, propor
to soluções aue
dia a dia na escola mais suportável, agradávele seguro, garantio do-
Jhesapoio para lidar como caos VIvido em diferentes situacâ ções.
Partindo desses pressupostos, organizamnos esta obta dois
capítulos. No primeiro capítulo, inicialmente, apresentamos a teoria de
Bogdashina(2003[2016])acerca das experiências sensoriais dos attista,
destacando os diferentes estilos perceptuais apresentados bot
ses
individuos, como hipersensibilidade, hiposensibilidade, percepação gestalh
percepção fragmentada, percepção atrasada, distorcida e desligamento do
sistema. Em seguida, evidenciamos a teoria do DesignSensorial (The Seno
nsory
Design Theory), proposta por Mostafa (2008, 2014), e a abordagetm
neurotípica,sugerida por Henry (2011).
No segundo capítulo, estabelecemos primeiranmente algumas
considerações sobre as diretrizes metodológicas do trabalho. Em
sequência, apresentamos a análise empreendida, que consiste no diálogo
entre as narrativas autobiográ cas dos autistas acerca da sua relação com
o ambiente escolar e as propostas ou diretrizes 1denti cadas nas pesquisas
sobredesignde ambientes escolares para estudantes autistas. Por útimo.
chegamos à conclusão, elaborando uma breve síntese dos principais
achados analíticos.

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EDITORA MERCADO DE LETRAS
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Capitulo1
AS EXPERIÊNCIAS
SENSORIAIS DOS
AUTISTAS E O
DESIGN ESCOLAR

No contexto contemporâneo, o autismo é, sem dúvida, um dos


maiores desa os para a escola, possivelmente porque os indivíduos autistas
apresentam padrões de pensamentos, interesses e comportamentos muito
distintos se comparados aos estudantes com de ciência ou com quaisquer
outras necessidades especiais.

No campo especí co da educação e da educação especial, os


modelos tradicionais orientados para a questão da de ciência tentam
curar, consertar, reparar, remediar, melhorar as de ciências" das crianças.
Nesses modelos, os autistas são aproximados o máximo possível de uma
norma ou são ajudados a enfrentar as de ciências da melhor maneira
possírel (Ortega 2007).
Desse modo, os professores, muitas vezes, pautam-se num sabet
médico sobre o autismo, tentando explicá-lo, conhecê-lo, dominá-lo. Nesse
eixo, o olhar do docente volta-se para o que falta no sujeito com autismo,
tentando normalizá-lo em sala de aula. Quando isso não é possível, o
docente acaba encaminhando esse aluno para terapias e tratamentos dos
mais diversos possíveis.

No entanto, poucos pro ssionais tentam conhecer o autismo a partir


da perspectiva desses sujeitos, buscando compreender como sentem, o
que pensam, porque cam tão abalados diante de diversos ruídos, porque
choram quando a rotina da escola é modi cada, porque têm crises quando
a professora muda o penteado do cabelo ou a cor da roupa ou, ainda,
porque se desorganizam quando estão diante de determinadas fontes de
luz. Talvez falte a esses docentes um conhecimento mais aprofundado
a respeito das experiências sensoriais dos autistas e dos impactos delas
na forma como o indivíduo processa a informação e na naneira como
aprendem.

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 19


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Assim, compreendemos que os problemas relacionados percepção
sensorial não devem ser uma preocupação exclusiva dos fa res, mas
J também daeducação,sobretudo, porqueessa
precisa ser objeto de estudo também da educação, sobreh
disfuncåotraráefeitosimportantes sobre o comportatnento d
autista, podendo niveis de
conduzir a níveis de ansiedade
ansiedade e pånico intense
e pånio

(Attwood 2010b). conhecer as experiências


Diante do exposto, acreditamos que conhecer
sensoriais dos autistas, saber o que pensam ee sentem
sentem diante
diante de
de dete.
determinados

onais
estimulosdoambiente,podeser o prinero passo para que os profssi.
da área da educação adaptem a escola e o ambiente da sala de para

realmente incluir esses estudantes.


Nessa direção, o trabalho de Bogdashina (2003[2016)
das experiências sensoriais dos autistas pode trazer aos ptofors res
sauisadores da área da educação subsidios relevantes para conbo cer

melhor esses indivíduos, especialmente em razão da autoto car

compreender a sensorialidade a partir do próprio discurso das as

autistas, por meio de relatos autobiográ cos.


Ademais, a prerrogativa conceitual da autora nos ajuda a analisae
as experiências sensoriais desses sujeitos como "tipos de experiências
sensoriais" e não como "disfunção sensorial" (Bogdashina 200312016
p. 20). Vistos dessa forma, os estudos de Bogdashina (2003[2016)
embora fundamentados numa visão biomédica, conseguem sobrepujá-la
ao sublinhar que nem todas as experiëncias sensoriais dos autistas sän
disfuncionais ou defeituosas,mas sim diferentes, podendo ser consideradas
como pontos fortes e não como dé cits.
Assim, na primeira seção desse capitulo, apresentaremos a teoria
de Bogdashina (2003(2016|) acerca das diferentes experiências sensoriais
dos autistas, a partir de relatos autobiográ cos casos vivenciados e

apresentados pela autora. Em seguida, após as compilações da autora,


escrevemos uma segunda seção, cuja nalidade é apresentar os estudos a
respeito do designpara autistas.
Em boa verdade, trata-se de, nesse segundo momento do capítulo,
mostrar que a forma de organização do ambiente da escola pode trazer
respostas e mudanças signi cativas no comportamento do autista. Nesse
enfoque, penso que uma das possibilidades advindas da apresentação dos
estudos sobre designpara autista é provocar nos pro ssionais da educação
uma inversão de olhat, evidenciando que é a escola quem precisa mudar
para atender às necessidades do aluno autista, e não o contrário.

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Continuando o debate, na segunda seção deste capítulo,
apresentaremos o trabalho de Magda Mostafa (2014) sobre a teoria doDesign
Sensorial, cuja proposta estabelece que alterando-se o ambiente construído,
a partir de intervenções especí cas de design, o comportamento autista
também pode ser modi cado positivamente.
Entretanto, embora reconheçamos que o Design Sensorial é o mais
apropriado e viável para responder às necessidades e especi cidades dos
indivíduos autistas, não nos furtaremos da oportunidade de apresentar,
ainda que sucintamente, a abordagem do Desigu neurotípico, cuja proposta
é a de que, ao invés de controlar o estímulo em uma área, projetando-a
para não sobrecarregar os sentidos dos alunos, deve-se criar um ambiente
de vida real.

As experiências sensoriais no autismo:


o que nos revela a teoria de Bogdashina!

Embora as pessoas autistas vivanm no mesmo mundo sico e


lhdem com a mesma matéria prima, seu mundo perceptivo acaba sendo
surpreendentemente diferente do das pessoas não autistas. Dessa forma,
Bogdashina (2003[2016]) busca em seu trabalho distinguir algumas
características da percepção do autista com base em depoimentos de
indivíduos autistas de alto funcionamento e por meio da observação
cuidadosa das crianças autistas.
A estudiosa esclarece que os autistas podem experimentar os
estilos perceptivos em qualquer modalidade sensorial (auditiva, visual,
tátil, gustativa, olfativa, proprioceptiva e vestibular). Na perspectiva
assumida por Bogdashina (2003(2016|), os traços sensoriais podem ser
vistos nos aspectos cognitivos, sociais, de linguagem, e de comunicação
do sujeito com autismo, diferindo das abordagens convencionais, que por
vezes são reducionistas e simplistas ao tratar essa discussão a partir de
duas ou três questöes como, pot exemplo, apenas a hipersensibilidade e a
hipossensibilidade.
Assim, nas seções a seguir (subtópicos 1.1 a 1.6), resenhamos os
principais pontos teóricos abordados por Bogdashina (2003 [2016),
que mais diretamente nos interessam para o debate aqui empreendido.
Convém sublinhar que, para representar os estilos sensoriais, valemo-
nos das ilustrações retiradas da tese de Leestma (2015), que traduziu emn
imagens os diferentes estilos perceptivos identi cados no trabalho da
autora em questão.

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 21


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• A Hipersensibilidade

A hipersensibilidade signi ca sensibilidade aguda, elevada ou


excessiva diante de determinados estímulos. Nesse caso, por exemplo,
se o indivíduo autista for hipervisual signi ca que tem uma visāo mais
aguçada que outras pessoas. Como exemplo, Bogdashina (2003(2016]) cita
o caso de uma mắe que descrevia sua lha autista como uma criança que
via tudo de forma ampliada. A mãe em questão relatava que a garota era
capaz de enxergar cada o de cabclo como espaguete, razão pela qual
se interessava muito pelos cabelos das outras pessoas. Vejamos o estilo
perceptivo hipervisual na imagem a seguir.

FIGURA 1 -Uma visão neurotípica em


comparação com a hipersensível

Fonte: Leestma (2015, p. 20). Imagem: David Paul Leestma.

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EDITORA MERCADO DE LETRAS
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Os indivíduos com hiperaudição geralmente não suportam o barulho
da multidão e cam muito assustados com sons repentinos e improváveis,
como, por exemplo, um bebê chorando ou um telefone tocando. Essas
pessoas costumam tapar os ouvidos quando o barulho é doloroso ou
emitem sons repetitivos para bloquear sons perturbadores.
Os autistas com hipersensibilidade olfativa fogem do cheiro e se
afastam das pessoas, podendo insistir em usar as mesmas roupas o tempo
todo. Ademais, os autistas hipertáteis geralmente afastam-se para não
serem abraçados e alguns recusam a usar certas roupas, pois não suportam
determinadas texturas.
A hipersensibilidade vestibular é caracterizada por uma baixa
tolerância a qualquer atividade que envolva movimento ou uma rápida
mudança de posição do corpo, tendo di culdade em mudar de direção,
caminhar ou engatinhar em super cies irregulares. Já a hipersensibilidade
proprioceptiva caracteriza-se por uma postura corporal estranha e na
difculdade em manipular objetos pequenos (Bogdashina 2003(2016]).

•Ahipossensibilidade

O autista hipossensível a estímulos sensoriais apresenta uma


percepçāo oposta à do indivíduo hipersensível, em razão de não receber
informação sufciente para ser processada pelo cérebro. Assim, para
estimular seus sentidos, apresentam alguns comportamentos estranhos,
tais como: balançar as mãos ao redor do corpo ou balançá-las para frente
e para trás, fazer barulhos estranhos ou bater a mão na cabeça.

Os indivíduos autistas hipovisuais, muitas vezes, podem ter


di culdades para descobrir onde os objetos estão, pois como veem apenas
contornos, andam em torno de objetos, correndo a mão ao redor das
bordas para que possam reconhecê-los. Essas crianças geralmente såo
atraídas por luzes, ftando os olhos numa lâmpada brilhante ou no sol
por um longo período. Leestma (2015) ilustra a percepção de um autista
hipovisual na imagema seguir.

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 23


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FIGURA 2 -Uma visão neurotípica em
Comparação com a hipossensível

Fonte: Leestma (2015, p. 21). Imagem: David Paul Leestma.

As pessoas hipoauditivas parecem pracurarsons, inclinando o ouvido


contra equipamentos elétricos, além disso gostam do barulho das multidões
e do ruído das sirenes. Geralmente acham os lugares mais barulhentos
da casa agradáveis e muitas vezes criam sons para estimular sua audição,
batendo portas, tocando coisas, rasgando ou amassando papel na mão e
vocalizando.

Alguns autistas podem apresentar hipogosto/hipocheiro. Nessa


condição, as crianças mastigam e cheiram tudo o que podem, como
grama, massa de brincar e perfume. Ademais, geralmente lambem objetos,
brincam com fezes, comem alimentos mistos (por exemplo, doces e
azedos) e regurgitam.

Os hipotáteis parecem não sentir dor e evidenciam pouca


sensibilidade a temperaturas quentes ou frias. Assimn, podem não notar

24 EDITORA MERCADO DE LETRAS


uma ferida causada por objetos cortantes ou pontiagudos, sendo mais
propensos a autolesões.

Aqueles que apresentam hiposensibilidade vestibular buscam todo


tipo de movimento balançando e girando por muito tempo sem car
tontos ou enjoados. Além disso, apresentam movimentos de corpo para
frente e para trás ou se movem em círculos.

As crianças com hiposensibilidade proprioceptiva têm di culdade


em saber onde seus corpos estão no espaço e, por vezes, desconhecem
suas próprias sensações corporais (por exemplo, não sentem fome), tendo
uma maior tendencia a quedas.

•A percepçãogestalt

Há muitas evidências de que um dos problemas dos autistas é a


incapacidade de distinguir entre os estímulos de primeiro plano e de fundo,
não fazendo a discriminação entre estímulos relevantes e irrelevantes. Essa
forma perceptiva é denominada degestall.

Nesse tipo de percepção, a pessoa autista visualiza uma cena como


uma única entidade com todos os detalhes percebidos simultaneamente,
o que torna a experiência avassaladora, podendo provocar todo tipo de
distorção durante o processamento da informação. Essas distorções
incluem a percepção fragmentada, hipersensibilidade, futuação entre hiper
e hipossensibilidade, atraso no processamento, entre outros aspectos.

Uma pessoa que experimenta gestalt visual, por exemplo, apresenta


di culdade em focar em um único detalhe da cena, achando quase
impossível separá-la de todo o quadro. Por outro lado, alguns indivíduos
experimentam visualmente a tremulação de luzes uorescentes que tornam
o ambiente ao seu redor visualmente instável. A Figura 3, a seguir ilustra a
percepção degestalt visual.

Pessoas com percepão gestalt auditiva têm grande di culdade em


concentrar-se em um único estímulo auditivo. Assim, a voz de alguém
vai num pacote com todos os outros ruídos ambientais (ventiladores
trabalhando, portas se abrindo, alguém tossindo, carros passando etc.). Ao
tentar fazer algo em uma sala barulhenta e lotada, a criança pode se sentir
frustrada, sobretudo, por não compreender as instruções se mais de uma
pessoa estiver falando.

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 25


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FIGURA 3– Uma visão neurotípica em
comparação com a gestalt visual

Fonte: Leestma (2015, p. 23). Imagem: David Paul Leestma.

Na percepção gestalt tátil, o indivíduo é incapaz de distinguir entre


estímulos táteis de intensidade diferente como, por exemplo, toque leve
e áspero. Aqueles que apresentam percepção gestalt olfativa/gustativa
podem ser incapazes de distinguir odores ou gostos fortes e fracos, já
os que apresentam a percepção gestalt proprioceptiva são desajeitados e
movem-se rigidamente.
No nível conceitual, esse tipo de percepção leva à rigidez do
pensamento e à falta de generalização. Isso faz com que os autistas atuem
exatamente na mesma situação com exatamente o mesmo prompt, mas
não conseguem aplicar a habilidade se alguma coisa no ambiente (rotina,
prompt etc.) for ligeiramente alterada. Por exemplo, as crianças podem
realizar uma tarefa se estiverem sendo tocadas no ombro e falharem se
não tiverem recebido o prmpt.
Para ilustrar essa condição, Bogdashina (2003[2016|) apresenta
as narrativas do autista Mukhopadhyay sobre a di culdade em idar

26 EDITORA MERCADO DE LETRAS


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com alguma mudança na situação em que está acostumado. Vejamos o
depoimento do autista:

Uma habilidade aprendida não leva a outra, mesmo que seja semelhante à
habilidade aprendida. Por exemplo, conhecer a ortogra a de uma palavra
e ser capaz de recuperá-la imediatamente quando necessário pode não ser
uma boa ideia. Pode exigir a ajuda de uma condição familiar, isto é, como
a palavra ou frase foi aprendida e quais eram as condições do ambiente
quando o aprendizado ocorreu. (Mukhopadhyay 2004, apud Bogdashina
2003(2016, p. 67])

Sobre o exemplo anterior, a autora explica que as crianças autistas


precisam de mesmice e previsibilidade para se sentirem seguras em seu
ambiente. Assim, se algo não é o mesmo, muda toda a gestalt da situação e
os indivíduos autistas não sabem o que se espera que eles façam, gerando
confusão, frustração e ansiedade. Para se sentirem seguras, crianças autistas
criam comportamentos gestalt – rituais e rotinas, o que traz tranquilidade e
ordem à vida cotidiana, o que de outra forma é imprevisível e ameaçador.

• A percepção fragmentada

A percepção fragmentada é de nida como aquela que acontece em


bits, em que as coisas vão sendo processadas gradativamente, percebendo-se
as partes ao invés do todo. Logo, onde uma pessoa neurotípica vê uma sala,
uma pessoa autista vê uma maçaneta, a perna de uma mesa, uma moeda no
chão; ou onde uma pessoa neurotípica về uma multidāo, umn autista pode
enxergar braço, pessoa, boca, rosto, mão, assento, pessoa, olho.
Bogdashina (2003 (2016]) esclarece que a percepçāo fragmentada
causada pela incapacidade de "quebrar" a gestalt em partes integradas e
signi cativas se encaixa na teoria da coerência central fraca, proposta por
Uta Frith. A autora a rma que a teoria da coerência central fraca pode ser
aplicada em estágios posteriores do processamento perceptivo sensorial.
No caso de percepçăão visual fragmentada, o autista foca a atenção
nos aspectos menores dos objetos no ambiente, ao invé de atentar-
se para toda a cena. Nesse contexto, Bogdashina (2003(2016, p.73])
cita o caso de uma autista verbal de 13 anos, que comentava enquanto
desenhava: Vou desenhar uma igreja. Uma bandeira na igreja. Um
relógio – duas e vinte. E então eu vou desenhar uma grande janela na
igreja. Uma campainha que toca".

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 27


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Ainda no sentido de exempli car a percepção fragmentada
Bogdashina (2003[2016|) apresenta as narrativas dos autistas Willev e

Higashida. Vejamos os depoimentos abaixo:

Lembro-me de ser atraído por pedaços do rosto das pessoas. Eu poderia


ter gostado da cor dos olhos, da textura dos cabelos ou da retidão dos
dentes. (Willey 2004, apud Bogdashina 2003(2016, p. 72)

Os detalhes saltam diretamente para nós em primeiro lugar, e depois


apenas gradualmente, detalhe por detalhe, a imagem inteira utua em
foco. Qual parte da imagem inteira captura nossos olhos depende de
várias coisas. Quando uma coré vívida ou uma forma chama atenção, esse
é o detalhe quechamanoSsaatenção,e então nossoscoraçõcs se afogam
nela, e não podemos nos concentrar em mais nada. (Higashida 2013, apud

Bogdashina 2003 (2016, p. 73)

Essa forma de percepção, segundo a autora, pode resultar em


um foco de atenção extremamente estreito ou em recursos de memória
insu cientes para lidar com a tarefa, pois tudo parece ser conceitualmente
uma unidade separada e não relacionada. Leestma (2015), na gura a
seguir, exempli ca a percepção visual fragmentada.

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Aqueles que têm percepção auditiva fragmentada podem ouvir (com
signi cado) algumas palavras ao invés da frase inteira. Os que apresentam
uma percepção tátil fragmentada podem ter algumas partes do corpo
hipersensíveis quando usam qualquer coisa no pulso (relógio, pulseira),
mas hipossensíveis ao usar sapatos (não percebem problemas de sapatos
apertados até notar bolhas e sangue, por exemplo).

Nesa perspectiva, segundo Bogdashina (2003(2016), os autistas


que apresentam percepção tátil-olfativa podem se queixar de algumas
partes da roupa, cheiro de alguns pedaços de comida, ignorando outros.
Além disso, como conscquência da percepção fragmentada, os indivíduos
autistas exibem a necessidade de manter a igualdade, têm resistência à
mudança e apresentam ansiedade em lugares desconhecidos.

•A percepçãoatrasada

De acordo com Bogdashina (2003(2016|) como consequência


da percepção fragmentada, os indivíduos podem sofrer atrasos no
processamento (auditiva, visual, tátil, gustativa, olfativa, proprioceptiva e
vestibular), respondendo tardiamente aos estímulos. Vejamos o exemplo
do autista a seguir:

[..]Quando entro numa sala nova pela primeira vez e olho para uma porta,
reconheço-a como uma porta, apenas após alguns estágios. A primeira
coisa que vejo é a sua cor (amarela] le depois] passo a ver a forma da porta.
De qualquer maneira quando olho as dobradiças da porta, posso me distrair
com as funções das alavancas. No entanto, atraio minha atenção dali e me
pergunto sobre a função daquele objeto retangular grande e amarelo com
alavancas, me pergunto por que ele está aí. Eu respondo mentalmente
FIGURA 4: Uma
à pergunta: ele me permitiu entrar naquela sala e pode ser aberto ou
visão neurotipica
fechado. Eo que mais pode ser isto, além de uma porta. Minha rotulagem
em comparação
está completa, então passo para o próximo objeto. (Mukhopadhyay 2008,
com a percepção
fragmentada visual apud Bogdashina 2003(2016, p. 81)

A autora ressalta, ainda, que a percepção fragmentada requer uma


grande quantidade de tempo e esforço para interpretar o todo. Leestma
Fonte: Leestma (2015, p.
(2015) ilustra a percepção visual atrasada com a gura a seguir.
24). Imagem: David Paul
Leestma.

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 29


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FOTO 5 - Uma visão neurotípica em comparação
com a percepção visual atrasada

O atraso no processamento auditivo leva os indivíduos autistas a

precisar de algum tempo para processar uma pergunta e sua resposta.


Nesse tipo de percepçâo, é como se houvesse uma andição mental atrasada,

cujo efeito parece com um eco. Isso implica a importância de dar tempo
aos indivíduos comn autismo para capacitá-los a concluir seu trabalho

perceptivo com sucesso e experimentar o signi cado que está aguardando


no nal do longo caminho.

Por exemplo, o professor faz uma pergunta ao aluno e a criança

começa a processá-la, mas como pode haver um olhar vazio no rosto da


criança (como se a criança não tivesse ouvido a pergunta), enquanto ela se

concentra no processamento e prepara sua tesposta, o professor repete a


mesma pergunta mais alto, jogando efetivamente a criança de volta (porque
para a criança é uma nova pergunta que precisa ser processada). Seu

professor quer ajudar mais, portanto, reformula a pergunta, complicando


ainda mais a tarefa.

Nesse sentido, Bogdashina (2003[2016|) salienta que existem ária


consequências do processamento atrasado, destacando-se as seguintes:
ecolalias com uma voz monótona, aguda, parecida a de um papagaio;

30 EDITORA MERCADO DE LETRAS


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quaisquer experiencias podem
ser entendidas como novas e

desconhecidas, independente-
mente do número de vezes

que a pessoa experimentou a

mesma coisa; di culdades em


atividades esportivas, entre
outras.

Fonte: Leestma (2015, p. 25).


Imagem: David Paul Leestma.

• A percepção distorcida

Bogdashina (2003(2016|) sublinha que pode acontecer distorção


na percepção da forma, do espaço, do som etc., gerando sobrecarga
nervosa e de informação, denominando-a de percepção distorcida. No
campo visual, as distorções mais comumente relatadas são a percepção
de profundidade e espaço. Outrossim, podem apresentar distorções de
forma, tamanho e movimento, além de visão dupla, como se o mundo
fosse visto em segunda dimensåo, ver Figura 6, a seguir.

Bogdashina (2003 (2016|) cita algumas características dos indivíduos


autistas que apresentam esse tipo de percepção, a saber: tem medo de
altura, medo de escadas, escadas rolantes (visual, vestibular); têm
di culdade em julgar relações espaciais no ambiente; esbarram em pessoas
e objetos (visual, proprioceptivo); tèm problemas de pronúncia (auditivo);
atingem os olhos, ouvidos, nariz e a si mesmos quando estão angustiados;
têm di culdades em se vesti, usar botões, zíperes, amarrar os cadarços
(proprioceptivo); têm fracas habilidades motoras nas, como, por exemplo,
di culdade em usar lápis, tesoura, pente etc. (proprioceptivo).

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 31


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FIGURA 6 - Umavisãoneurotípicaem comparação
com a percepção visual distorcida

Fonte: Leestma (2015, p. 26). Imagem: David Paul Leestma.

• Desligamento do Sistema

o desligamento do sistema acontece quando a pessoa autista não


consegue lidar com a sobrecarga sensorial e acaba desligando todos os

canais sensoriais. Nesse caso, ocorre a suspeita de que as pessoas autistas

sejam surdas, pois não respondem aos sons. No entanto, sua audição
costuma ser ainda mais aguda que a média, mas eles aprendem a desligá-la

quando sofrem sobrecarga sensorial (Bogdashina 2003[2016).

Assim, quando a entrada sensorial se torna muito intensa e, muitas


vezes, dolorosa, desligar os canais sensoriais ajuda as crianças autistas a
se retirar para o seu próprio mundo. Vejamos o depoimento de Grandin:

32
EDITORA MERCADO DE LETRAS
Entradas auditivas e táteis geralmente me sobrecarregavam. Barulho alto
machucou meus ouvidos. Quando o ruído e a estimulação sensorial se

tornaram intensos demais, pude deslıgar a audição e me retirar para o meu


próprio mundo. (Grandin 2000, apnd Bogdashina 2003|2016, p. 105)

Ademais, encerramentos temporários podem afetar o toque,


paladar, olfato, visāo ou audiçāo, podendo ser parcial ou quase total para
qualquer sentido. Leestma (2015) ilustra o desligamento do sistema com
a gura a seguir.

FIGURA 7- Uma visão neurotípica emcomparação


Com o desligamento do sistema

Fonte: Leestma (2015, p. 27). Imagem: David Paul Leestma.

A autora explica, ainda, que, se esses problemas não forem tratados


desde tenra idade e que se não tiverem apoio adequado, essas crianças
podem permanecer retirados do mundo exterior até a idade adulta.

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 33


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Asexperiênciassensoriais eo design da escola:
A teoria do Design Sensorial e a Abordagem Neurotipica

tivas dos
Obviamente as experiências perceptivas dos autis
autistas, apresentadas
tas. an:
anteriormente a partir dos cstudos de Bogdashina (200 016),
podemcomprometer o aprendizadoea adaptaçãoao ambien: colar,
considerando que crianças com problemas sensoriais têmn poucas chae
com que
de relaxar o su ciente para aprender e isso faz com que o
o nto
prOcesso de

ensino-aprendizagem torne-se muito complexo.


Nesse contexto, é inegável que, para a maioria utistas,
dos an+
ambiente pode constituir-se numa terramenta mportante no processa de
ensino-aprendizagem. Outrossim, ć justamente em razão dessa constatx
que muitos autores têm desenvolvido pesqusas sobre como o deci
sign
escolar pode atender às necessidades e especi cidades desses sujcitoe O
surgimento desses diferentes estudos possibilitou a divisão do temn em
e a
duas vertentes: a Abordagem Neurotípica (Neuro-Typical Approach)
teoria do DesigySensorial (The Sensory Design Theory).

•AabordagemNeurotípica

A abordagem neurotípica fundamenta-se no “Princípio da


Normalização", de Wolfensberger, defensor da ideia de que pessoas com
de ciências deveriam ser introduzidas em ambientes os mais normais?»
possíveis. Nessa perspectiva, o espaço sico reproduz os ambientes
normalmente encontrados em situaçöes reais, ou seja, locais com grandes
níveis de estímulos sensoriais com o objetivo de estimular o autista a se
familiarizar com esses espaços e situações normalmente encontrados na

vida urbana. (Henry 2011).


Essa abordagem contrapõe-se à teoria do Design Sensorial.
argumentando que a pessoa autista precisa aprender em con gurações
do mundo real, pois, caso contrário, não será capaz de generalizar
suas habilidades em outros contextos fora da escola ou da sala de aula.
Para exempli car, os defensores dessa abordagem salientam que um
indivíduo que aprende a usar um banheiro numa situação particular pode
posteriormente não ser capaz de utilizá-lo em outras situações, devido à

di culdade em generalizar o aprendizado (Henry 2011).

EDITORA MERCADO DE LETRAS


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Os estudos sobre design centrados na perspectiva neurotipica
argumentam que um dos fatores impeditivOS para se utilizar o Design
Sensorial, é que as anormalıdades de processamento sensorial presentes
em
muitos indıviduos com autismo nào são universais, ou seja, nem todos
os individuos autistas possuem problemas sensoriais. (Henry 2011).

Por último, as instituições que seguem os preceitos da abordagem


neurotípica apresentam espaços que se assemelhamn à vida cotidiana: as
áreas de tränsito pareccm ruas e becos, salas de terapia se parecem com
salas de aula ou bibliotecas, a cafcteria parece um restaurante e assim por
diante (Henry 2011).

A escola apresentada na gura abaixo atende às necessidades dos


estudantes autistas de uma maneira diferenciada, trazendo as experiencias
do mundo real para o espaço escolar. Nesse contexto, os arquitetos,
fundamentando-se numa abordagem neurotípica, desenvolveram o
corredorprincipal da escola ( gura 8) como a réplica de uma rua americana,
incluindo comércio, bancos,shopping,entre outros estabclecimentos, além
de um apartamento, simulado com sala de estar, sala de jantare cozinha.

FIGURA 8: Main Street -


o corredor principal
da escola

CAA

Fonte: Henry (2012).


Fotogra a: Robert I. Faulkner
(USA Architects).

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 35


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• A teoria do Design Sensorial

ucacional
Ao ser convidada para projetar o primeiro centro eduea
para
autistas no Egito, a arquiteta Magda Mostafa (2008) co tou não haver
orteá-la na realização
nenhum conjunto de diretrizes quepudesse norteá-la tea:e daqucle

trabalho.
Diante desse contexto, n0 ano de 2002, a autora ini
seus
estudos, desenvolvendo a TheSensory esign Tbeory, ou, emn livre
vre traduçăo, :
pnceito do
teoria doDesignSensorial,baseando-se no conceito do ambiente
ambie. sensorial
como um dos principais protagonustas no processo de percepcão e
desenvolvimento de comportamento no autismo.
o estudo de Mostafa (2008) toi realizado em duas es Na
ot meio
primeira fase a autora determinou, por meio de um questionátio para
cuidadores de crianças autistas, o impacto dos elementos do projeto
arquitetônico no comportamento autista, buscando 1denti car os mais
in uentes. A segunda fase, baseada nos achados da primeira stou Os
elementosarquitetônicosde maiorclassı caçãoconclusiva en um os,
de intervenção sobre crianças autistas em seu ambiente escolar ssim,
indicadores comportamentais especihcos, ou seja, tempo de atenc
tempo de resposta e temperamento comportamenta, foram reados
para determinar o progresso de cada criança antes e pós-intervencão para
um grupo de controle e estudo.
Osachados preliminares do estudo foram traduzidos em ferramentas
arquitetônicas, denominada pela autora de matriz de design sensorial cuio
objetivo era organizar o ambiente arquitetônico e a complexa gama de
questões sensoriais autistas. O estudo considerou que embora fosse
impossível personalizar um ambiente público, como uma escola, para cada
usuário, seria possível estruturá-la para um agrupamento de alunos com
necessidades semelhantes.

Dessa forma, a partir do estudo foi desenvolvida uma ferramenta


organizacional (Quadro 1) correspondente às diversas necessidades
sensoriais autistas, representadas no eixo horizontal da matriz, com seu
tratamento arquitetônico adequado representado pelo eixo vertical da
matriz, apresentada a seguir.

36
EDITORA MERCADO DE LETRAS
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QUADRO 1- Diretrizes de Design Arquitetônicogeradas
pela Matriz de Design Sensorial

Diretriz de design Objetivo sugerido

1 Ambientes fechados 1. Reduzir a distração visual e acústica externa para


o hiperauditivo e hipervisual.
2. Fornecer estimulação tátil através de espaços
apertadose contenção para o hipotátil.
3. Criar foco visual em casos de interferência visual.
4. Reduzir os estímulos olfativos por meio da
ventilação para o hiperolfativo

2 Ambientes abertos 1. Aumentar as oportunidades de estimulação


acústica para o hipoauditivo.
2. Fornecer estimulação visual parao hipovisual.
3. Reduzira sensação de contenção para o hipotátil.

3 Tetos baixos e 1. Reduzir os ecos para os hiperauditivos.


proporções moderadas 2. Reduzir a distorção visual e as ilusões de espaço
para o hipervisual.
3. Promover o equilíbrio para a interferência-
proprioceptiva.
4. Criarum ambienteacusticamentemais controlável
para evitar a interferência de outros sons.

4 Tetos altos e 1. Aumentar os ecos e a estimulação auditiva para


proporções o hipoauditivo.
exageradas 2. Criar estimulaçăo visual para o hipovisual.
3. Estimular o sentido proprioceptivo de espaço
para o hiperproprioceptivo.

5 Uso de escala humana 1. Reduzir os ecos para o hiperauditivo.


reduzida 2. Criar um ambiente auditivo controlável para o
auditivo de interferência.
3. Criar umespaçocontrolável para o hipervisual.
4. Aumentaraestimulaçãotátil da proximidadecom
o limiteparao hipotátil.
5. Aumentar a estimulação proprioceptiva
da proximidade com os limites para o
hipoproprioceptivo.
6. Criar um ambientecontrolávelparao auditivo de
interferência e para o proprioceptivo.

6 Uso de escalaampla 1. Criarestimulação auditivaatravésde ecos para o


hipoauditivo.
2. Criar estimulaçãovisual através da ampliação
espacial para o hipovisual.
3. Para reduzir a superestimulação dos limites
Ou fronteiras espaciais para o hipertátil e o
hiperproprioceptivo.

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 37


7 Orientação em 1. Criar foco e atração para o hipovisual.
direção a vistas 2. Introduzir equilíbrio e direção para
externas e elementos hipoproprioceptivo.
de interesse

8 Uso do foco de 1. Aumentar a atenção e reduzir a distração para o


atividade para hiperauditivo e hipervisual.
organizar o espaço 2. Criar um ponto de referência comportamental
e geométrico para o hipoproprioceptivo e o
proprioceptivo de interferência.

9 Organização simétrica 1. Criar previsibilidade para o hipervisual.


2. Criar equilibrio acústico para o hiperauditivo.
3. Aumenta a sensação de equilíbrio para o
hipoproprioceptivo de interferência.
4. Criar um ambiente controlável para reduzir a
interferência visual.

10 Organizaçāo 1. Criar estimulação auditiva e visual para o


assimétrica hipoauditivo e hipovisual.
2. Criar estimulação proprioceptiva para os
hipoproprioceptivos

11 Uso do ritmo visual 1. Criar oportunidades de estimulação visual para o


ouespacial hipovisual.
2. Criar previsibilidade e coerência no ambiente
espacial para o hipovisual.

12 Espaço visualmente 1. Criar um espaço visualmente neutro para o


|harmonioso sem hipervisual.
contraste ou 2 Criar um espaço tátil neutro para o hipertátil.
discordância

13 Espaço visualmente 1. Criar estimulação visual para a hipovisuais.


desarmoniosos usando 2. Criar estimulação proprioceptiva para os
contrastes hipoproprioceptivos.

Uso de espaço 1. Criar orientação e estabilidade para os


dinâmico e hiperproprioceptivo.
estaticamente
equilibrados
15 Uso de espaços 1. Criar estimulação visual para o hipovisual.
desequilibrados ou
desbalanceados

16 Uso decores 1. Criarestimulaçãovisual para o hipovisual.


brilhantes
(resplandecentes)

17 Uso de cores neutras 1. Criar serenidade para o hipervisual.

18 Uso de cores quentes 1. Criar um ambiente psicologicamente caloroso


para o hipotátil.

38 EDITORA MERCADO DE LETRAS


19 Iluminação natural 1. Minimizar o brilho e distração visual para o
indireta s hipervisual.
2. É menos distrativa do que a luz arti cial, além
disso reduz oS zumbidos para o hiperauditivo.

20 |lluminaçāão natural 1. Cria estimulação visual para o hipovisual.


|direta e vistas

21 Ruído e ecos 1. Cria um ambiente propício para o hiperauditivo.


2. Remove a oportunidade de distração através de
ecos para o hipoauditivo.
3. Cria um fundo auditivo neutro evitando a
interferência auditiva.

22 Uso de texturas lisas 1. Acalma o hipotátil.


2. Cria eco e estimulação de reverberação para o
hipoauditivo.

23 Uso de texturas 1. Estimula o hipotátil.


ásperas

24 Ventilação cruzada 1. Reduzir cheiros e odores para o hiperolfativo.

25 Ventilação fechada 1. Pode ajudar a conter aromas durante a


aromaterapia para os hiperolfativos.

26 Compartimentação 1. Ajuda a orientar e ajustaro hipevisual.


organizada usando 2. Ajuda a estimular a ação o hipovisual.
pistas visuais 3. Ajuda a organizar a interferência visual.
4. Cria limites necessários para o hipotátil.

27 Organização 1. Ajuda a orientare ajustar o hipervisual.


espacial de acordo 2. Ajuda a organizar a interferência visual.
com características 3. Ajuda a orientar o hipoproprioceptivo.
sensoriais

28 Uso de padrões 1. Ajuda a orientare ajustar o hipervisual.


decirculação 2. Ajuda a organizar a interferência visual.
unidirecional para 3. Ajuda a criar previsibilidade em geral em todo o
capitalizar a rotina espectro, particularmente no hiperauditivo.

Fonte: Mostafa (2008, pp. 209-211).

A autora explicou que na matriz de design sensorial cada atributo

arquitetônico, como proporção, escala, simetria, cor, iluminação e textura,


foram analisados enm relação à sua capacidade de responder às diversas
necessidades sensoriais autistas.

Dessa maneira, a pesquisadora salientou que tais diretrizes são


recomendadas para arquitetos que projetam ambientes para usuários
autistas, em áreas como salas de aula. No entanto, Mostafa (2008) sublinha
que a sua aplicação pode ser bené ca cm quase todos os espaços utilizados

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 39


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pelo autista, particularmente naqueles lugares onde são exigidos longos
tempo de atenção, respostas rápidas e altos níveis de foco são necessários.
Os dados levantados apartir dessapesquisa serviram de fundamentos
para o desenvolvimento posterior do índice de Aspectos do AutismoTM
(Antism ASPECTSSTM Design Inde) e foram usados como base para a
realização do projeto da Escola Avançada para o Autismo no Egito.
Dentro do ASPECTSS são propostos critérios em relação à
acústica, sequência espacial, espaços de fuga, compartimentalização, zonas
de transiçâo, zoneamento sensorial e segurança. Abaixo apresentamos,
brevemente, a descrição desses critérios:

1. Acistica: Este critério propõe que o ambiente acústico


seja controlado para minimizar o ruído de fundo, o cco e a
reverberaçăo dentro dos espaços utilizados pelos individuos
com TEA. Nessa perspectiva, o nível de controle acústico deve
variar de acordo com o nível de foco exigido na atividade em
questāo dentro do espaço escolar.
2. Segueniamentoespaciak Este critério baseia-se na necessidade de
garantir aos autistas rotina e previsibilidade. Assim, os espaços
devem Auir de uma atividade para outra da forma mais tranquila,
com interrupção mínima e usando-se zonas de transição.
3. Espaços de fuga: O objetivo desses espaços é proporcionar
descanso ao usuário autista, diante da superestimulação do
ambiente. Essesespaços devem fornecer um ambiente sensorial
neutro com o mínimo de estímulo possível, podendo ser uma
pequena área dentro da sala de aula ou ainda uma sala tranquila
na escola.
4. Compartimentalização: Consiste em de nir e limitar o ambiente
sensorial de cada atividade, organizando uma sala de aula ou
mesmo um prédio inteiro em compartimentos. Para separar
esses ambientes, é possível utilizar móveis, diferentes cores
no piso, diferenças na elevação do piso, ou, ainda, através
de variações na iluminação. As qualidades sensoriais de cada
espaço devem ser usadas com o propósito de de nir sua função
e separá-lo de seu compartimento vizinho.
5 Zonas de transição: Essas zonas ajudam o usuário autista a
recalibrar seus sentidos à medida em que se movem de um
nível de estímulo para o próximo. Tais zonas podem assumir

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uma variedade de formas e pode ser qualquer coisa que permita
ao usuário organizar os seus sentidos antes de fazer a transição
de uma área de alto estímulo para uma de baixO estímulo.
6 Zoneamento sensoriak Este critério propõe que, ao serem
projetados para indivíduos com autismo, os espaços devem ser
organizados de acordo com sua qualidade sensorial, agrupando
os espaços de acordo como seu nível de estímulo em zonas de
alto estimulo e de baixo estimnlo.
7. Segurança: No projeto de ambientes para autistas, deve-se
considerar como ponto fundamental a segurança. Além
disso, projetar acessórios para proteção contra água quente e
evitar bordas e cantos a ados são exemplos de considerações
pertinentes pata o usuário autista.

A pesquisa da autora parte da premissa de que o comportamento


autista pode ser in uenciado favoravelmente pela alteração do ambiente
sensorial. Em outras palavras, quando os estímulos sensoriais são
projetados de uma maneira que atenda às necessidades especí cas dos
autistas, propicia-se melhoras para o seu comportamento. Além disso, um
ambiente favorável pode ajudá-los a desenvolver as habilidades de forma
mais e ciente.
Por último, após apresentar as duas abordagens teóricas a respeito
do design para usuários autistas, parece-nos necessário esclarecer em qual
estudo nos fundamentamos para dialogar com as biogra as analisadas.
Entāo, é importante registrar que a teoria do DesignSensorial (The Sensory
Design Theory), de Mostafa (2014), é a que nos parece responder de forma
mais contundente às especi cidades sensoriais dos autistas, especialmente
porque parte da premissa de que é preciso conhecer a sensorialidade dos
autistas e adaptar o ambiente para atendė-los e incluí-los.

AUTISTASE OS ESPAÇOSESCOLARESADAPTADOS 41
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Capítulo2
A CONSTRUÇÃO
DE ESPAÇOS
ESCOLARES
INCLUSIVOS
PARA AUTISTAS

A educação inclusiva representa um avanço considerável se


comparada às práticas segregacionistas, integracionistas excludentes
que, historicamente, marcaram a educação das pessoas com de ciência.
Embora haja algumas mudanças e avanços no que se refere à acessibilidade
eà adaptação do ambiente escolar para as pessoas com de ciência, poucos
estudos têm sido desenvolvidos no Brasil a respeito da construção de
ambientes escolares adaptados para os estudantes autistas.

De fato, há uma necessidade premente de pesquisas e estudos que


abordem as experiências sensoriais dos autistas diante do ambiente escolar.
A urgência de estudos que tratem dos problemas sensoriais no autismoé
referendada pela autista e pesquisadora Temple Grandin (2016), em obra
coescrita com Richard Panek (2016), ao criticar os pesquisadores que não
compreendem a relevância dessa discussão.

Para a autora, tudo leva a crer que os estudiosos não visualizem


a necessidade de pesquisas sobre a referida temática, talvez por não
conseguirem imaginar um mundo onde roupas que pinicam os fazem
sentir-se pegando fogo, ou onde uma sirene soa como se alguém estivesse
perfurando o seu crânio com uma furadeira, ou simplesmente porque não
conseguem olhar o mundo do ponto de vista dos autistas.
Neste sentido, partimos do pressuposto de que a adaptação dos
espaços escolares às pessoas autistas tem cado à margem de uma re exão
mais apurada em razão de que esse transtorno, em geral, não apresenta,
com maior visibilidade e nitidez os prejuízos cognitivos e sensoriais
entrevistos em outros tipos de defciência. Por conseguinte, tal aparente
invisibilidade acarreta inúmeros problemas para quem tem autismo,

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTAD0S 43


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levando os indivíduos a esforçarem-se demasiadamente para compreender
e adaptar-se ao ambiente à sua volta.
Justamente por isso, é urgente pensarmos e, até mesmo,
questionarmos as formas de organizaçāo das escolas regulares para que
possam atender e incluir, com e cácia , os estudantes autistas, levando se
em consideração um dos princípios fundamentais da educação inclusiva: a
escola deve estar preparada para receber o aluno e não o contrário.
Por certo, num contexto de inclusāo de um estudante autista, todos
os aspectos precisam ser considerados, sobretudo, porque esses individuos
têm uma experiência sensorial diferente ou incomum em relação ao
ambiente que os cerca. Esse argumento revela a importância do ambiente
escolar, no que se inclui o seu design, para a c cácia da inclusão de todos
os autistas. Sobre isso, Humphreys (2005) sublinha que a forma como o
desigu de um espaço é pensado e planejado pode fazer com que os autistas
respondam mais positivamente ao ensino.
Nesse aspecto, consideramos imprescindível que a escola, em
termos de ambientação, seja de interesse e preocupação de todos os
colaboradores (direção, coordenação, corpo docente) além dos arquitetos e
designersenvolvidos diretamente no plancjamento estrutural dos ambientes
em que se darão os processos de ensino-aprendizagem.
Nessa perspectiva, corroboram Sánchez, Vásquez e Serrano (2011)
ao a rmarem que a relação entre o indivíduo autista e o espaço ao seu redor
deve ser pauta de re exão não só da área de arquitetura, mas também de
outras áreas do conhecimento no sentido de promoverem, em conjunto,
maior bem-estar àqueles estudantes, devido às necessidades e di culdades
por eles encontradas no cotidiano.
A luz dessas considerações preliminares, visamos, nesta secção
capitular, empreender algumas análises de autobiogra as escritas por
pessoas autistas. Nosso propósito fundamental é descrever as possíveis
experiências sensoriais daqueles indivíduos, apresentando o modo com
que eles relacionan-se com o ambiente, especialmente a sala de aula,
observando as suas respostas emocionais, comportamentais e educacionais
vivenciadas.
Entretanto, como dito anteriormente, não nos interessa apenas
descrever as experiencias sensoriais dos autistas a partir dos relatos
autobiográ cos, mas, sobretudo, desejamos confrontar esses dados com
os estudos e pesquisas a respeito do design sensorial. Nessa perspectiva,
realizamos uma revisão teórico-crítica das literaturas nacionais e

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internacionais sobre as diretrizes fundamentais para a construção de escolas
ou ambientes educacionais com o m de atenderem às especi cidades e
necessidades do estudante autista.

Partindo dessas prerrogativas, selecionamos 16 pesquisas que


tratam especi camente do designsensoriala partir da perspectiva proposta
por Mostafa (2008), como vimos no primeiro capítulo. O estudo pioneiro
da autora serviu-nos de mote para a busca de dissertações, teses e artigos
cientí cos que trouxessem em sua discussão teórica os princípios relativos
à acústica, sequenciamento espacial, espaço de fuga, compartimentação,
espaços de transição, zoneamento sensorial e segurança, como ferramenta
para o desenvolvimento dedesigm.

Em nosso percurso analítico, optamos pela análise de conteúdo


proposta por Bardin (1977), assim defnida:

um conjunto de técnicas de análise das comunicaçõcs, visando, por


procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das
mensagens, obter indicadores quantitativos ou não, que permitam a
inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção
(variáveis inferidas) das mensagens. (p. 42)

Desse conjunto, priorizamos a análise categorial. Assim, a partir da


de nição da unidade de registro, iniciamos a “categorização", tendo pot
base inicial a teoria do design sensorial de Mostafa (2014) e, posteriormente, a
sugerida nos demais referenciais teóricos.
Por conseguinte, os 16 estudos foram organizados em duas categorias
principais. Na primeira, tratamos da Organização espacial (sequência
espacial, compartimentalização, instrução visual, espaços de retirada,
salas sensoriais, segurança). Na segunda, apresentamos o Controle dos
estímulos sensoriais (acústica, zonas de transição, zoneamento sensorial.
iluminação, cores).

Os ambientes escolares: organização e inclusão

Com o objetivo de melhorar a qualidade de vida dos estudantes


autistas, muitos pesquisadores, arquitetos e outros pro ssionais têm
desenvolvido estudos no sentido evidenciar a relevância do ambiente
construído sobre o desempenho escolar. Nesse aspecto, projetos e

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pesquisas foram e são desenvolvidos para a construçåo de ambientes
amigáveis ao autismo, com orientações e guias especi cos sobre o tema.
Dessa forma, empreenderemos, a scguir, uma análise dialógica entre
as pesquisas e propostas sobre odesignsensorialeas narrativas autobiográfcas
dos autistas acerca da sua relação con o ambicnte, apontando caminhos
possíveis para a construção de uma cscola realmente inclusiva.

•A sala de aula previsível: compartimentalizaçãoe instrução visual

Em virtude das experiências sensoriais incomuns, a organização


do ambiente sico das instituições de ensino é fundamental para o
desenvolvimento e aprendizagem dos alunos autistas. Uma das justi cativas
para essa organização é a percepção visual fragmentada, caracterizada por
apreender as partes ao invés do todo. Vejamos o depoimento de Williams
(2012) sobre isso:

Eu sempre soube que o mundo estava fragmentado. Minha mãe era um


cheiro e uma textura, meu pai era um tom e meu irmão mais velho era algo
que estava se movendo. (Williams 2012, p. 92)

Vi braço, pessoa, boca, rosto, mão, assento, pessoa, olho [..] eu estava
vendo dez mil fotos para a de outra pessoa. (Williams 2012, p. 92)

Uma das consequências dessa percepção fragmentada do autista é


a necessidade de manter as coisas no mesmo lugar, apresentando grande
resisténcia a mudanças. Tal fragmentação gera ansiedade em lugares e
situações desconhecidos (Bogdashina, 2003[2016|). Essa circunstáncia
peculiar diante da imprevisibilidade e da mudança pode ser observada,
por exemnplo,nos relatos de Williams (2012). Vejamo-los:

[..] Eu procurava simplesmente um mundo de coerência bem provido de


referências xas. A mudança constante que era preciso enfrentar por toda
parte nunca me dava tempo de me preparar. E por isso que eu encontrava
tanto prazer em fazer e refazer as coisas. (Williams 2012, p. 90)
O ano escolar e com ele a vida relativamente estável e bem organizada
estavam chegando ao m. A incerteza do amanhã já me angustiava.
(Williams 2012, p. 211)

Neste testemunho de Willians (2012), é notório o incômnodo advindo


das mudanças constantes enfrentadas diariamente em todos os lugares.

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Ademais, a autista relata ainda os momentos de angústia pela fnalização
do ensino médio ea possibilidade de mudança da rotina.
Por sua vez, Tammet (2007), também, faz referências à experiência
vivenciada quando as coisas ou os eventos aconteciam de forma imprevisível
na escola, fazendo-o experimentar uma sensação de ansicdade, sobretudo,
por não poder controlar as situaçöes da maneira quc gostaria.

Sentimentos de alta ansiedade eram comuns no horário da sala da escola.


Eu cava nervoso quando um evento escolar do qual todos deveriam
participar era anunciado em cima da hora, ou (sic) por mudanças nas
rotinas normais da turma. A previsibilidade era importante para mim, uma
forma de me sentir no controle de uma dada situação e de manter distante
a sensação de ansiedade, ao menos temporariamente. Nunca me senti à
vontade na escola e raramente estava feliz, exceto quando me deixavam
sozinho para fazer minhas próprias coisas. (Tammet 2007, p. 28)
A forte sensaçāo de ordem e rotina me acalmavae muitas vezes (sic) cumne
sentava no chão do auditóio de olhos fechados, balançando levemente
enquanto cantarolava para mim - algo que cu costumava fazer quando me
sentia relaxado e contente. (Tammet 2007, p. 50)

Ëpossível perceber ainda os problemas comportamentais resultantes


da mudança de rotina, quando Williams (2012) salienta que as alterações,
no ambiente, afetavam-na de maneira profunda, provocando crises de
raiva.

Eu era extremamente maníaca e não tolerava que se desarrumasse a


ordem estrita que eu fazia reinar ali. Explodia de raiva quando se deslocava
qualquer coisa sem motivo. (Williams 2012, p. 155)

Tammet (2007), também, asscgura sua contrariedade e o seu pânico


quando encontrava o seu cabide ocupado na escola.

Junto a0s portões de entrada da escola havia um vestiário para as crianças


deixarem os seus casacos antes de entrarem na sala de aula. [...] Tinha
tanto medo de perder meu casaco no meio dos outros, (sic) ou de apanhar
um agasalho parecido com o meu e levá-lo para casa por engano, que
passei a contar os ganchos para saber qual era o que estava com o meu
casaco. Caso eu chegasse e já encontrasse meu gancho ocupado, icava
contrariado e em pânico. (Tammet 2007, p. 49)

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 47


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Nesse aspecto, C. Williams e Wright (2008) explicam que o
comportamento do autista ć dirigido por um desejo de previsibilidade.
evitando a quebra de rotina. Conforme os estudiosos, a rotina ou ritual
compulsivo pode ser caracterizado "por uma séric de ações, geralmente
executadas na mesma ordem e oriundas de uma intensa necessidade de

repeti-las" (Williams e Wright 2008, p. 263).

Essa previsibilidade não diz respcito apenas à manutenção das coisas


em determinados lugares, asscgurando uma rotina, mas também se refere
ao reconhecimento dos lugares. E preciso ter em conta que, por vezes, as
pessoas autistas podem sentir-se confusas em relação à orientação espacial,
perdendo-se com muita facilidade, como cxempli ca Tammet (2007):

Cada dia de aula começava com a chamada na sala de aula, seguida das
aulas programadas para aquele dia em diferentes salas e prédios nas
dependências da escola. Infelizmente, como não tenho nenhum instinto
natural de orientação, era fácil me perder, mesmo em áreas onde eu tivesse
vivido muitos anos, exceto os trajetos cspecialmente aprendidos por pura
repetição. A solução para mim era seguir os colegas até as salas. (Iammet
2007, p. 65)

Para minimizarmos essas di culdades e outras não relatadas,


é importante que a escola adote, de forma sistemática e estratégica,

recursos favoráveis à ambientação escolar que promovam a sensação de


previsibilidade e segurança dos estudantes.

Na intenção de buscar alternativas estratégicas para promover a


aprendizagem dos autistas, dentro da sala de aula, vários estudos e pesquisas
têm sido desenvolvidos no sentido de organizar o ambiente de forma
previsível, utilizando-se pistas visuais. Por certo, o foco na organização
visual deve-se ao fato de que muitos autistas demonstram ser pensadores
imagéticos. Vejamos o depoimento de Grandin (1999):

Minha mente é totalmente visual, e (sic) tenho muita facilidade para tarefas
de natureza espacial, como desenhar. Já projetei grandes instalações de
aço e concreto para o mancjo de gado, mas tenho muita di culdade em
recordar um número de telefone ou fazer somas de cabeça. Se preciso me
lembrar de um conceito abstrato, eu "vejo" a página do livro ou visualizo
as minhas anotações mentais e "leio" as informações que se encontram
nelas. (Grandin e Scariano 1999, p. 133)

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Assim, para que as Chanças autistas tenham condicões de sit
Situar-
Cocilnente em um espaço previSivel, ou seja, tenham consciência
de onde se encontram, Giaconi e Rodrigues (2014) propõem uma
anização visual (sala de aula, banheiro, refeitório, ginásio, jardim,
disposição dos móveis e dos materiais), de todos os ambien
Para exempli car, as autoras sublınham que, no espaço de acesso à escola,
to autista necessita de pontos de reterencia visíveis e concretos que
dem ser otganizados de modo claro, em torno de uma série de obietos
(uma estátua, um aquario, um vaso etc.).
No tocante ao tema, a instituiçao apresentada na gura abaixo é um
bom exemplo.

FIGURA9- Portascodi cadas por cores

Fonte: Leestma (2015, p. 58). Imagem: Aitken Turnbull Architects.

De imediato, percebem-se que as portas de entrada da escola foram


codi cadas por cores. Para Leestma (2015), essa estratégia visual é positiva
epermite aos autistas lembrarem-se facilmente das suas salas ao retornarem
do pátio, haja vista as di culdades sensoriais daqueles estudantes.
Diretamente relacionado com a sala de aula, o espaço de circulação
externa (os corredores) deve ter igual prioridade de tratamento quando

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foco for a segurança e orientação espacial dos autistas. E a adoçào
de expedientes visuais ć, sem dúvida, uma aliada prática na condução de
comportamentos inesperados.
Sobre isso, Giaconi e Rodrigues (2014) destacam que linhas-guia
ou faixas coloridas podem ser úteis na organização dos corredores. Dessa
maneira, cores diferentes indicam os diversos caminhos para os vários
ambientes escolares. Assim, por exemplo, a linha verde conduz à sala de
aula, linha amarela ao refeitório e assim por diante.

Nesse contexto, a pesquisa de Yates (2016) traz como ilustração o


corredor de uma escola ( gura 10), com faixas coloridas (verdee azul)
usadas como dispositivos de localização para orientar os alunos em direção
a sua sala de aula ou a outros lugares da escola.

FIGURA 10- corredor da escola com faixas

Fonte: Yates (2016, p. 66). Imagem: Michelle Yates.

Outra proposta de organização visual do corredor da escola, segundo


Giaconi e Rodrigues (2014), trata-se da instalação, na porta de entrada de
cada espaço, de objetos ou de imagens demonstrativas das atividades a
serem realizadas naquele local. E o que exempli cam as imagens abaixo,
um vez que facilitam a identi cação dos ambientes pelos autistas:

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ELGURA 11 – Imagens para colocar nos dosdiversoOs ambientes da escola

USAR O BANHEIRO

LAVAR AS MÃOS

Gfumira

Fonte: https://br.pinterest.com/pin/43642 7020115753434/. Acesso em: 19/04/2020.

Quanto à organização da sala de aula, os pesquisadores propõem


diversas estratégias como, por exemplo, a compartimentalização dos
ambientes para delimitar diferentes áreas na sala de aula. Ademais, a
compartimentalização dos espaços, tem como nalidade evitar uma
sobrecarga perceptiva, já que muitos autistas têm uma carência especí ca
na integração e na organização das várias informações em um nível
unitário e central.

Sobre isso, Khare e Mullick (2009) a rmam que cada atividade a


ser realizada com a criança deve estar associada a um espaço delimitado,
criando-se espaços bem de nido para atividades de trabalho, de lazer,
lanche, entre outras.

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McAllister e Sloan (2016) asseveram que
que as
as crianças,
criancas. por serem
or isso,é
diferentes,aprendemem temposelugares diferentes. Por isso, éiinteressante
haver uma gama de opçôes nara para possibilitar
possiblitar uma aprendizagem mais
uma aprendizapem
signi cativa daqueles estudantes. Ainda, destacam os autores a in ia
de fornecer mais oportunidades de ambientes dentro da sala de aulapara
que o estudante tenha mais chances de escolher entre uma variedad de
diferentes ambientes de aprendizagem.
Para ilustrar a proposta dos autores, segue a imagem abaixo (foee
12) em que sâoapresentados diferentes espaços - individuais, em upla,
em grupo-separadospordivisórias,favorecendoacompartimentalizae
ção.
Nela, o espaço de trabalho individual é estruturado com uma escrivaninbo
virada para a parede e com uma estante do lado esquerdo onde serão
colocadas as atividades e materiais a serem utilizados naquele dia. o
espaço para o trabalho em grupo é constituido por uma mesa comn tro
cadeiras, sendo uma delas utilizadas pelo professor.

FIGURA 12 - Sala com diferentes espaços de trabalho compartimentados

Fonte: https://educationandbehavior.com/how-to-set-up-the-classroom-for-
Students-with-autism/. Acesso em: 13/04/2020. Imagem: Rachel Wise.

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EDITORA MERCADO DE LETRAS
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Essa divisão da sala em compartimentos pode ser feita usando
biombos ou divisórias, mas há de se levar em conta a exibilidade. Na
pesquisa realizada por McAllister (2014) os professores sublinharatm que
o uso de rodinhas nessas divisórias seria bastante funcional, possibilitando
o rearranjo da sala de aula quando necessário.
Além da compartimentalização, Giaconi e Rodrigues (2014)
propõem a utilização de pistas visuais de modo a facilitar compreensão
dos espaços, para que a criança possa predizer e entender o que está
acontecendo. Vejamos duas sugcstões das autoras:

FIGURA 13-Uso de tas para ajudar a criança a


compreender seu espaço de trabalho

Fonte: https://educationandbehavior.com/how-to-set-up-the-classroom-for-students-with-
autism/. Acesso em: 13/04/2020. Imagem: Rachel Wise.

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FIGURA 14 - Uso de tas coloridas para codi car as diferentes áreas da sala

Fonte:https://educationandbehavior.com/how-to-set-up-the-classroom-for-students-with-
autism/. Acesso em: 13/04/2016. Imagem: Rachel Wise.

Se, na primeira gura, o lugar de realização das tarefas é demarcado


por itas amarelas, na segunda, emprega-se o uso de tas coloridas no piso
para separar os diferentes espaços didáticos, além de os assentos serem
dispostos em colchonetes de diversas cores.

Por conseguinte, essas estratégias visam à facilitação visual,


garantindo ao autista um ambiente com informações su cientes para ele
movimentar-se de forma autônoma no ambiente, além de poder distinguir
e associar os vários espaços às suas funções. Sem dúvida, a organização
da sala, dessa maneira, contribui para facilitar o processo de adaptação às
situações, além de minimizar condutas desadaptadas de vários tipos.

Da mesma forma que o espaço precisa ser organizado de modo


visual, o tempo também requer esse tipo de arranjo, objetivando apoiar o
estudanteautista na percepção do que aconteceu antes, do agora vivenciado
e do que virá depois. Sobre esse aspecto, Giaconi e Rodrigues (2014),
propõem organizar de modo visual, previsível, estável e reconhecível
o tempo escolar, o que corresponde à cadência temporal das lições do
turno, calendário da semana, do mês (por exemplo, relógios murais diários,
cartazes semanais, cartazes mensais). Consideremos as ilustrações a seguir:

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FIGURA 15 - Agendavisual

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Fonte: https://www.autismspectrumteacher.com/setting-up-à-classroom-for-pupils-with-
autism/. Acesso em: 13/04/2020. Imagem: Steph Reed.

Como se pode ver, em ambas as guras ( gura 15), uma agenda


visual com as fotos (magens, palavras, objetos concretos) das crianças
indica todas as atividades a serem realizadas durante aquele período
escolar. O propósito é levá-las a compreender o passar do tempo na sala
de aula, representando e evocando em ordem, o passado e prevendo um
futuro próximo.
Sem dúvida, a organização visual da escola, com m de garantir a
previsibilidade, é aspecto fundamental a ser considerado no processo de
inclusão dos autistas, pois propicia um senso de clareza e de ordem, além
de contribuir para reduzir a tensão, a frustração e ansiedade em sala de aula.
No entanto, ao se tratar de escolas públicas com um número signi cativo
de alunos, com uma rotina pouco estruturada, torna-se imprescindível um
esforço de toda a equipe pedagógica para elaborar projetos de construção
de um ambiente, efetivamente, compatível com a realidade material e social
da escola, sem perder de vista as especi cidades dos estudantes autistas.

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 55


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• Espaços alternativos: de retirada ou espaço de escape

No contexto de inclusão, há de se ter em conta que, nem sempre, as


demandas sensoriais do ambiente poderão ser resolvidas em sala de aula.
De fato, em determinados momentos, o estudante autista precisará de um
espaço reservado para se acalmar e se sentir seguro. Sobre isso, vejamos o
depoimento de Grandin (2012):

Todos nós precisamos de lugares reservados. As crianças autistas também


necessitam de um lugar sccreto em que possam se esconder e refugiar-se
em seu mundo próprio. ...] As crianças autistas sentem a necessidade da
segurança de esconderijos próprios. Eu tinha os meus, e eram os lugares
onde podia pensar e recarregar as baterias. (Grandin e Scariano 1999, p. 144)

Na realidade, trata-se de o autista ter a seu alcance qualquer lugar a


lhe oferecer segurança, sendo estruturado de modo a assegurar a calma e
controle do comportamento. No caso de Williams (2012), esse espaço de
fuga é o pátio da escola, já no caso de Tammet (2007) era a sala de música,
como vemos a seguir:

Eu havia feito da classe o anexo do pátio de recreação e vice-versa. A


professora tomou rapidamente a precaução de não mais me deixar
ir à toalete, porque frequentemente, eu saía e não mais voltava. Saía
simplesmente para me distrair no pátio. Achava muito natural livrar-me
daquilo que me aborrecia. (Williams 2012, p. 149)
O Sr. Thraves podia ser excepcionalmente gentil comigo. Sempre que
eu cava ansioso ou a to na aula, levava-me à sala de música da escola
para me acalmar. Ele era músico e mitas vezes (sic) tocava violão para as
crianças durante as aulas. [.1 Eu gostava quando me deixavam ir àquela
sala para sentar ao piano e testar as teclas. Semnpre adorei música, pela
capacidade de aliviar qualquer ansicdade que porventura sentisse e me
deixar calmo e pací co por dentro. (Tammet 2007, p. 64)

Ao tratar do ambiente de escape, Leon (2016) esclarece que essa


área tem por objetivo prevenir e atuar na organização de problemas
de comportamento, como gritos, destruição de objetos, entre outros
comportamentos destrutivos muito observados nas pessoas autistas.
Neste mesmo sentido, a autora ilustra apresentando vários tipos de áreas
de escape, a ber:

[.] uma cabana com livrinhos,(ic) em que a criança que por cinco ou
dez minutos no periodo da escola ou no espaço de atendimento; que ela

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tenha esse momento como um pequeno descanso; ou uma poltrona com
fones de ouvido para ouvir música, ou um espaço onde a criança possa
manusear o iPad ou brincar com bolinhas de sabāo, apertar bolinhas de
borracha ou mesmo (sic) fazer algum tipo de relaxamento com técnicas
especí cas. (Leon 2016, p. 31)

Sobre esse assunto, Attwood (2010a) reitera que a área de escape


deve ter aspectos sensoriais calmantes e suaves, o que pode incluir a
simetria dos mobiliários, a cor das paredes e do carpete e a ausência de
sons, aromas ou experiencias táteis desagradáveis para a pessoa autista.
Por conseguinte, ao se construir um espaço ou ao utilizar um, já existente,
na instituição de ensino, é preciso levar em considcração o per l do aluno,
e tudo o que o acalme.
Para garantir este estado de calmaria, Mcalliste e Maguire (2012)
sublinham que o anmbiente de fuga deve ser tranquilo e silencioso, sendo
um lugar essencial para que a criança autista tenha temnpo para “recarregar
suas baterias" se estiver cansada ou se acalmar caso se sinta angustiada. Os
autores sublinham ainda que pode se instalar uma porta ou tela deslizante,
permitindoa abertura ou fechamento da área, conforme o desejado.
Nesse sentido, o espaço
de escape náo precisa ser
necessariamente uma sala
separada como vemos na
imagem (igura 16), mas pode
ser qualquer lugar que atenda às
demandas sensoriais da criança,
promovendo-lhe segurança.
Entretanto, importa dizer que
essa sensação de tranquilidade
e acomodação comportamental
dependerá do ambicnte e de
cada autista em particular.

FIGURA 16 - Espaçosde retirada/


escape fora do espaço da sala
de aula

Fonte: Khare e Mullick (2009,


p. 52). Imagem: Rachna Khare
e Abir Mullick.

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 57


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FIGURA 17- Espaçoderetirada/escapeorganizado
dentro da própria sala de aula

Fonte:https://sites.google.com/siteldesvendandooautismo/ Irsrc1284866454461/
teacch/DSCF9007JPG?height=400&width - 300. Acesso em: 20/03/2020.
Imagem: Cláudia Marcelino postada no site "Desvendando o autismo".

Como evidenciam os relatos autobiográ cos e as sugestões dos


pesquisadores emdesign,o espaço de fuga surge como um dado fundamental
ser observado e re etido, uma vez que pode propiciar ao autista a
segurança necessária e adequada ao seu conforto, calma e autocontrole.

Entretanto, há de se ter em atenção que esse ambiente de escape não


se torne segregador e venha a ser usado para retirat o autista de sala de
aula sempre que estiver “atrapalhando" o andamento das aulas. Por outras
palavras, a criação de um espaço de acolhimento do cstudante de TEA nos
momentos de maior tensāo e reposta negativa às atividades, não pode ser
tomado como um lugar de banimento, mas de efetiva inclusão escolar em
que o aluno tenha reais condições de reestabelecer-se e retornar à sala de
aula sem maiotes traumas.

58
EDITORA MERCADO DE LETRAS
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Dessa forma, a discussāo sobre a funcionalidade do espaço de fuga
deve se pautar nos debates a respeito das necessidades dos estudantes
autistas e dos riscos ao adotar uma postura discriminatória na utilização
dele.

• Salas Sensoriais

Os espaços de escape podem também ser organizados na forma de


salas ou espaços sensoriais. A organização de salas sensoriais justi ca-se
pelo grau acentuado de di culdade das crianças autistas em lidarem com as
demandas sensoriais desencadeadas por terceiros (pais, outros familiares,
professores etc) e por ambientes circundantes.

Sabemos que a hipersensibilidade ao toque sico, por exemplo, pode


constituir-se em um desencadeante de reações angustiantes, de fuga e, até
mesmo, agressivas. Grandin (1999), Willians (2012) e Tammet (2007) são
unânimes ao esclarecerem seus sentimentos de repudio, de medo diante de
um "simples abraço" ou de toque involuntário e inevitável nas brincadeiras
escolares. Tomemos os exemplos:

Jamais tolerei abraços muto apertados, que mne deixavam sufocada. Mas
adorava construir coisas – como réplica do Quarto distorcido. (Grandin e
Scariano 1999, p.143)
Jamais abracei meus pais, como também eles jamais me abraçaram. Eu
não gostava que alguém se aproximasse muito de mim, e não permitia
que ninguém me tocasse. Todo contato sico me era penoso e me
amedrontava. (\Williams 2012, p. 35)
E assim, cada manhã, com a sensibilidade de uma pedra, entregava-me
friamente à cerimônia dos abraços. Tentei muito explicar a mãe de minha
amiga o quanto estes apertos eram dolorosos, que um ferimento, uma
queimadura não me teriam feito mais mal, mas ela não dava o braço a
torcer. (Williams 2012, p. 133)
Quando às vezes chegava o momento das brincadeiras sociais, como
a dança das cadeiras, eu me recusava a participar. Assustava-me o
pensamento de outras crianças me tocando na disputa pelas cadeiras
restantes. (Tammet 2007, p. 34)

Em contrapartida, nem sempre a experiência táctilé desagradável


como se percebe na narrativa de Grandin (1999) ao demonstrar a sua
satisfação ao poder “construir coisas". A autista ainda esclarece, na citação
abaixo, o seu comportamento consciente em encontrar formas agradáveis

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 59


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de estímulo táctil, tais como: enrolar-se "num cobertor", ou pre
1onar
um cartaz sobre o seu corpo, ou a criação de uma "roupa in ável»
de construir um recinto acolhedor com a nalidade de experie
contato com os objetos.

Quando eu era criança, porém, como não tinha nenhum recurso mágico
que me consolasse, costumava me enrolar num cobertor, ou me cobrir
com as almofadas do sofá, para satisfazer meu desejo de estímulo táti.
[.] Às vezes pendurava cartazes de papclão à frente e atrás do meu corpo,
como um homem sanduíche, porque gostava da pressão dos cartazes
contra meu corpo. (Grandin e Scariano 1999, p. 143).
Quando quei grande demais para me enrolar num cobertor ou me enfar
debaixo das almnofadas do sofá, tentei imaginar outras maneiras de obter
uma estimulaçãoagradável. Talvez algum tipo de máquina. (..]O primeiro
modelo de máquina que imaginei era uma roupa in ável que exerceria
pressão sobre todo meu corpo, uma ideia inspirada nos brinquedos
inláveis, que às vezes eu cortava. (Grandin e Scariano 1999, pp. 39-40)
Outra ideia que tive, ainda na escola primária, foi construir um pequeno
recinto com mais ou menos um metro de largura e um metro de altura –
do tamanho certo para eu poder entrar e fechar a porta. [..] Talvez, se eu
tivesse uma máquina de reconfortar, poderia ter usado sua pressão e seu
calor, em vez de entregar-me a meus acessos de raiva. (Grandin e Scariano
1999, p. 40)

Outro relato ilustrativo de experiência positiva em termos das


sensaçõesvisuais, éo de Tammet (2007). Consideremo-lo:

Outra lembrança de meu tempo de maternal é observar uma das assistentes


soprar bolhas de sabāo. Muitas das crianças estenderam as mãos para
agarrá-las ou futuarem sobre suas cabeças. Eu não z nenhum esforço
para tocá-las, mas contemplei a forma, o movimento e o refexo da luz na
super cie úmida e brilhante. Gostei particularmente quando a assistente
soprou com força e produziu uma longa leiras de bolhas menores, uma
após a outra em rápida sucessão. (Tammet 2007, p. 29)
Sentado quieto e silencioso por horas a o, eu observava diligentemente
a aquarela de matizes e cores diferentes fuírem e re uírem através das

paredes e mobíiia do meu quarto com a passagem do dia; o fuxO do


tempo tornado visual. (Tammet 2007, p. 29)

Esse estado de bem-estar, descrito por Tammet (2007) e Grandin


(1999), sem dúvida, torna-se um facilitador para a recepção e aceitação

60 EDITORA MERCADO DE LETRAS


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J detetminadas atividades escolares, tendo em vista que o
obiente oferece-lhe percepçoes variadas e estimulado
sicos agradáveis.
Nesse sentido, a Vivência das experiências sensoriais agradáveis
torna-se uma estratégia de grande valia e seu encorajamento pode ser feito
neiras indo desde o uso de expedientes táteis, visuais, auditivos
e até mesmo, gustativoS. Nesse contexto. o professor pode organizar
espaços sensoriais utilizando recutsos diversos, de modo a atender as
necessidades perceptivas dos estudantes autistas.

Esses recursos podem ser simples tüneis de tecido ( gura 18), um


balanço ou rede de tecido ( gura 19) ou ainda um espaço construído
dento da própria sala de aula como vemos na ( gura 20), em que utilizou-
se uma estrututa de papelao em cujo interior estão dispostas almnofadas
para garantir o conforto do estudante.

FIGURA 18 – Túnel de Tecido exível

FIGURA 19- Balanço e rede


feitos de tecido

Fonte: https://ipinimg.com/originals/
ee/4d/82lee4d82619f32b6bcfe8
d02287a877fbb.jpg. Acesso em:
24/04/2020.

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FIGURA 20 - Espaçoderetirada/escapedentro da própria escola

COZY,
COVE
n!

Fonte: https://
educationandbehavior.com/
how-set-up-the-classroofor-
studentsstudents-with-autism/.
Acesso em: 24/04/2020.
Imagem: Rachel Wise.

Em se tratando de ambientes provedores de estímulos sensoriais


agradáveis e da área para descanso na escola, Faherty (2006) sublinha a
importância do professor incuir no seu planejamento pedagógico um
tempo para que o aluno autista possa usufruir da área de relaxamento,
tendo em vista que as visitas a esse espaço físico ajuda a prevenir a
sobrecarga sensorial, reduzindo a angústia e ansiedade.

A autora salienta que a distribuiçâo do horário e do tempo para


a área de descanso deve ser determinada através da observação atenta
do comportamento do aluno e da avaliação informal. Outrossim, sobre
a frequência dessas visitas, Faherty (2006) destaca que algumas crianças
precisam apenas de uma visita à área de descanso ao longo do dia, ao
passo que outras necessitamn de períodos frequentes de pausa, na ordem
de quatro a seis visitas ao longo do dia e alguns estudantes prccisarão desse
momento de descanso depois da realização de determinadas atividades
escolares.

62 EDITORA MERCADO DE LETRAS


Por certo, as áreas sensoriais têm o propósito de promnover a
regulação sensorial e a sensação de controle sobre a qualidade do espaço
ocupado, possibilitando a criança autista reconhecer, entender e gerenciar
seus próprios desa os sensoriais. Reconhecer a notoricdade desse espaço
nas instituições de ensino torna-se imperativo para que se promova a
inclusão daqueles estudantes na escola regular.

• Jardins sensoriais

Os jardins sensoriais tambémn se constituem numa proposta


interessante para trabalhar as diferentes percepções sensoriais dentro da
escola. Consideremos os relatos de Tammet (2017) sobre o jardim de sua
escola e as sensaçòes por ele provocadas:

Quando fazia tempo quente e seco lá fora, os supervisores nos deixavam


(sic) brincar no pequeno jardim anexo ao prédio do maternal. Havia um
escorrega e alguns balanços, assim como um monte de binquedos na
grama: bolas de cores vivas e instrumentos de percussão. Esteiras revestidas
de plásticos eram colocadas na parte baixa de baixo do escorrega e sob
os balanços, para o caso de alguma criança cair. Eu adorava caminhar
descalço sobre aquelas esteiras. No calor, meus pés suavam e grudavam
no plástico, e eu levantava o pé e abaixava de novo para recriar repetidas
vezes, a sensação pegajosa na sola dos pés. (Tammet 2017, p. 28)

Havia a caixa de areia onde eu passava longos períodos do dia pegando a


areia, fascinado pelos grãos individuais. [.] lembro que fcava observando
um tempāo o uxo granuloso de areia escorrendo, esquecendo as crianças
que brincavam à minha volta. (Tammet 2017, p. 27)

Ë indubitável que, para Tammet (2017), a ida ao jardim da escola


era um momento prazeroso. Mas o que tornava aquele lugar tão especial
e agradávelP Pela descrição, nota-se que o espaço era repleto de objetos
interessantes, com cores vibrantes e materiais de diferentes texturas
(plástico, areia etc.). Tudo isso proporcionava a Tammet experiências
sensoriais agradáveis.

Ainda que esse espaço escolar, descrito por Tammet (2017), não
tenha sido de nido como um ócus sensorial, o seu formato estrutural, bem
como os seus elemnentos constituintes, podem ser categorizados dentro de
um projeto de espaço sensorial de escape ou de m acolhedor.

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTAD0S 63


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Ao contrário dos jardins de exibiçăo tradicionai destinados
para serem vistos à distância, os jardins sensoriais sâo
para ser
experimentados com todos os sentidos. A diferença básica enteo
essesdois
espaços reside na escolha cuidadosa de todos os componentes
tes,(paisagisn
duro e macio, cores, texturas e vida selvagem), que devem
devem ser projetados
ontidos humanos.
para estimularem ao máximo os sentidos Tomemos o exem
humanos. Tome
mplo
a seguir:

FIGURA 21 - Jardim sensorial (1)

Fonte: Hussein, Abidinb e Omar (2013, pp. 543-544).

64
EDITORA MERCADO DE LETRAS
As quatro imagens (hgura 21) lustram um jardim dividido o
le visualizamosdiferentestipos deplantas,fontes,passarelas
outros clementos sensoriais, além de um instrumento musical que pode
Ser mla crianca. Mas, segundo o estudo dos autores, nào basta
construir um jardim sensorial, é preciso orientar e capacitar os
apc
innais sobre o seu uso didatico-pedagógico. (Hussein, Abidinb,
Omar 2013).

FIGURA 22- Jardimsensorial

salaPrgokä
Fonte: https://www.escolalapisdecor.com.br/. Acesso em: 18/04/2020. Imagem: Escola
Lápis de Cor.

Os espaços ao ar livre e jardins podem ser locais dentro da escola


para a criança relaxar e reduzir a tensāo. Dentre as atividades que podem ser
realizadas nesses ambientes, temos: atividades motoras, como equilibrio,
salto em trampolim e escalada e podem ser adequados para certas atividades

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 65


de integraçâo sensorial, como atividades táteis que envolvem areia e água.
Nessa perspectiva, os ambientes podem ser projetados e utilizados como
ferramentas de aprendizagem, tanto quanto os ambientes internos do
espaço escolar (Scott 2009).
Como vimos, há uma gama de possibilidades razoáveis e viáveis
de criaçào ou de adaptação de determinados espaços para amenizarem
eventuais comportamentos involuntários e agressivos dos autistas no
âmbito escolar. Por isso, mais do que o conhecimento dos váios tipos de
vivências sensoriais existentes, a escola e seus colaboradores, sobretudo, os
professores devem conceber os espaços “de refúgio" ou "de escape", sejam
elessalas sensoriais, jardins sensoriais, ou outros, como lugares estratégicos
e alternativos para desenvolver a aprendizagerm de forma prazerosa.
Evidentemente, os depoimentos dos autistas acerca de estímulos
sensoriais agradáveis e desagradáveis, demonstram a necessidade dea escola
ter condições de suporte para minorar as frustrações desencadeadas por
motivações diversas nos estudantes com TEA, além de uma quali cação
adequada dos educadores para agirem adequadamente em situações
adversasque, por ventura, venham ocorrer no trabalho como autista.
Obviamente, ao apresentarmos algumas estratégias sensoriais
possíveis de serem utilizadas na escola, não estamos de forma alguma
enfatizando ou indicando que o docente deva assumiro papel ou a função
de um terapeuta sensorial. Por certo, a seleção dos recursos a serem
utilizados nos espaços sensoriais deve ser feita de mancira multidisciplinar,
contando com váios pro ssionais, inchusive com o docente, que pode
valer-se dos mesmnos para possibilitar a aprendizagem signi cativa da
criança autista.

• Segurança na sala de aula

Ao se planejar a escolarização de estudantes autistas, a sala de aula


deve ser um ambiente a ser considerado com maior atenção, sobretudo
quanto à segurança das crianças, uma vez que os autistas podem ter
comportamentos inesperados e reagirem abruptamente. Vejamos esses
comportamentos no depoimento de Williams (2012).

A angústia que suscitava esta luta interior tornou-se insuportável. Eu


querida me comunicar. Em consequência da frustração, comecei a me
autoagredir, a esbofetear meus olhos, arrancar os cabelos. (Williams 2012,
p. 51)

66 EDITORA MERCADO DE LETRAS


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Eu rangia os dentes e me batia em todo o corpo para aliviar a do. (Williams
2012, p. 57)

A professora elevava a voz, a minha Ihe sobrepujava. Ela me mandava


sair, eu ia passear. Ela me colocava de castigo de costas para a parede, eu
me enfurecia e gritava: "Não"! Se ela tentasse se aproximar de mim, eu
me armava com uma cadeira como uma verdadeira selvagem. Se por sua
vez ela gritasse, eu quebrava a cadeira no châo ou a atirava através da sala.
(Williams 2012, p. 93)

Numa eventualidade, o autista pode sofrer acidentes ou provocá-


los, causando, até mesmo, prejuízos (lesões) sicos a si ou aos outros.
Vejamos a reaçāo de Tammet (2007) diante de uma repreensâo inesperada:

[] certa vez durante uma aula de ciências onde o Sr. Thraves ajudara um
dos alunos a preparar uma experiência envolvendo uma bola de massa
de modelar suspensa por um pedaço de barbante. Fascinado com aquela
visão incomum - e ignorando que fazia parte de uma experiência em
andamento – caminhei em sua direção e pus-me a tocar e puxar a massa
com os dedos. Nesse momnento o professor se aborreceu e me repreendeu,
mas eu nâo tỉnha a menor ideia do motivo de seu aborrecimento e quei
bem confuso e contrariado. Saí correndo da sala, batendo a porta com
tamanha força que o vidro da janela se espatifou. (Tammet 2007, p. 65)

Essa atitude reativa e de fuga da sala de aula também pode ser vista
na história de Williams (2012) e no comportamento de outras crianças,
expondo-as a perigos e riscos desnecessários.

Eu provia assim minha própria educação. Vagava muitas vezes pelos


arredores da escola. [.-] Eunào ia a lugar algum em particular. Simplesmente
ia. Subia as escadas das torres, brincava no elevador ou tentava encontrar
uma sauda para chegar ao teto. [.-] Minhas escapadelas obrigavam muitas
vezes meus professores a sairà minha procura. As vezes me apanhavam
de carro na rua e me reconduziam a sala sã e salva. (Williams 2012, p. 126)

Vogel (2008) assevera que, numa sala em que há crianças com


autismo, designers e professores precisam prestar atenção tanto aos
perigos sicos ( ação, escadas abertas, janelas não blindadas, piso solto,
tintas tóxicas, etc.), quanto à questão da segurança emocional, uma vez
que crianças com TEA são frequentemente propensas a convulsões e
comportamentos adversos, como a birra, o que pode, inclusive, levar a
lesões individuais ea terceiros.

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 67


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O autor sugere que as portas e janelas transparentes podem ser uma
boa estratégia para facilitar as transições e fazer com que a criança se sinta
segura. Se, para os jovens, isso fornece um lugar para acenat adeus aos pais.
para os alunos mais velhos, a transparência proporciona uma sensação de
proteçāo quando eles sabem que os outros podem ve-los.
A segurança e o conforto das crianças, de acordo com Mcallister
(2010), são de suma importância em qualquer sala de aula, sobretudo,
porque, muitas vezes, os autistas podem car angustiados ou agitados.
Quanto a isso, autor ainda alerta sobre alguns fatores complicadores
da segurança na escola apresentados por professores, entre os quais
destacam-se três mais preocupantes e que devem ser evitados dentro de
uma sala de aula. Em primeiro lugar, estão as arestas e ângulos a ados.
Em segundo, a quantidade de móreis no ambiente, tais como: estantes,
prateleiras. Estes devem ser limitados. Com isso, evitam-se oportunidades
inadequadas de escaladas. Em terceiro lugar, o autor aponta a distância dos
banheiros da sala como um ponto negativo à segurança dos alunos. Além
disso, a pesquisa mostra que os horários visuais tornam o ambiente menos
ameaçador, conforme os docentes entrevistados sublinharam.
Ao tratar também do tema da segurança da sala de aula, Beaver (2006)
chama atenção para as janelas e aconselha a instalação de mecanismos
para restringir sua abertura, bem como sugere que clas sejam trancadas
por dentro. Há de ressaltar que as janelas – com peitoril acessível- são
perigosas e podem di cultar o desenvolvimento das atividades na escola,
uma vez que a criança autista pode tentar escapar ou pode xar a atenção
ao que está acontecendo lá fora, distraindo-se.

Controle dos estímulos sensoriais

O conceito de design sensorial para autistas não diz respeito apenas


à organização da sala de aula, mas também inclui recomendações sobre
elementos sensoriais que, se não utilizados corretamente, podem afetar
a vida dos indivíduos com TEA. Aspectos ambientais ignorados ou
bloqueados pela maioria das pessoas, tais como: ruído de fundo, luz
cintilante ou uma cor brilhante, podem ser muito perturbadores para os
autistas.
Esses aspectos podem impedir a compreensão do ambiente e,
por conseguinte, desencadearem ansiedade, frustração, agressividade,

68 EDITORA MERCADO DE LETRAS


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teimosia e comportamentos inusitados, como gestos, sons ou movimentos
estranhos.
Para uma mais ampla compreensão do assunto, vale apresentar
algumas considerações dos estudiosos sobre a iluminação, acústica e cores
utilizadas nas instituições de ensino.

• Iluminação na sala de aula

Os alunos com TEA recebem e entendem o ambiente a sua volta


de maneira diferente dos alunos neurotípicos, enfrentando vários desa os
no ambiente educacional, o que os leva a uma luta constante para superar
diariamente as distrações.
Dentre as di culdades perceptivas identi cadas nos discursos
autobiográ cos dos autistas, destaca-se a hipersensibilidade visual. Vejamos
o depoimento de Williams quando iniciou seus estudos na Universidade.

Eu estava completamente desorientada. Os lugares eram imensos, com


muitas paredes, muita gente e muitas lâmpadas de neon. Eu passava meu
tempo a procurar os interruptores para apagá-los, pois a luz me adormecia.
(Williams 2012, pp. 215-216)

A sensibilidade a níveis especiais de iluminação, como a luz de neon,


por exemplo, deixava Williams (2012) desorientada, porque esse tipo
de luz a adormecia. Essa constatação é corroborada pelos estudos de
Bogdashina (2003[2016]) ao enfatizar que muitos indivíduos com autismo
experimentam hipersensibilidade visual aos seus ambientes.
Mas o que isso signi ca essencialmente? Na verdade, de acordo
com Bogdashina (2003[2016]) os indivíduos autistas costumam ter uma
percepção visual mais aguçada que outras pessoas. Disso resulta um
quadro de estresse ou de dor, principalmente, quando há exposição deles
a ambientes com luminação não apropriada ou com outros tipos de
estímulos não suportáveis à acuidade visual.
Para Yates (2016), os autistas percebem o espaço de forma diferente
dos outros indivíduos cuja percepção do mundo é neurotípica, ou melhor,
é “normal". Alguém com autismo pode ser exposto à mesma informação
sensorial, mas interpreta-la-á de outra maneira. Na verdade, o que muda
é sua experiência, como acontece, por exemplo, com Tammet (2007).
Consideremos o seu relato:

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 69


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Outra lembrança de meu tempo de maternal é observar uma das assistentes
soprar bolhas de sabāo. Muitas das crianças estenderam as mãos para
agarrá-las ou futuarem sobre suas cabeças. Eu não z nenhumn esforco
para tocá-las, mas contemplei a forma, o movimento eo re exo da luz na
super cie úmida e brilhante. Gostei particularmente quando a assistente
soprou com força e produziu uma longa leiras de bolhas menores, uma
após a outra em rápida sucessão. (Tammet 2007, p. 29)
Sentado quieto e silencioso por horas a o, eu observava diligentemente
a aquarela de matizes e cores diferentes uírem e re uírem através das
paredes e mobília do meu quarto com a passagem do dia; o uxo do
tempo tomado visual. (Tammnet 2007, p. 29)

É notório o estado de contemplação vivenciado por Tammet (2007)


ao demonstrar um interesse visual especí co pelos movimentos das bolhas
de sabão quando fazia o maternal e pelas cores do sol batendo na parede
do seu quarto.
Sobre a reação dos autistas diante de determinados es tímulos.
Williams e Wright (2008) asseveram que crianças autistas podem considerar
algumas experiências visuais como extremamente desagradáveis, como por
exemplo, luzes brilhantes ou intermitentes ou ainda cores uorescentes.
Contudo, algumas crianças podem se interessar por aspectos incomuns de
um movimento, ao passo que outras, por movimentos repetitivos, como
xempli cado a seguir:

• Observar certas partes do corpo enquanto elas se movem.


Olhar objetos de um ângulo incomum.
Observar o movimento dos créditos do início ao m do lme.
Observar fxamente bolas rolando em declives.
• Girar pedaços de barbante e observaro movimento.
[.] Brincar com brinquedos que têm movimnentos repetitivos (por
exemplo, jogo com bolinhas de gude).
Observar partes de um vídeo com padrões que elas gostam. [...] Elas
podem voltar a ta nestas partes e vê-las repetidas vezes.
Observar o giro dos ventiladores ou escovas em um lava-rápido.
(Williams e Wight 2008, p. 57)

De acordo com Bogdashina (2003(2016)) a hipersensibilidade


visual pode ser minimizada tomando-se algumas providências. Uma delas
é a possibilidade de oferecer algo para ser tocado quando as crianças
concentram- se nos estímulos visuais e sentem-se desconfortáveis. Por
outras palavras, a estratégia consiste em desviar a atenção do sistema

70 EDITORA MERCADO DE LETRAS


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.átil. Outra sugestão reside na tomada de consciência do
visual para o tátil.
as cotes e o padrão de suas roupas podem provocar
cducador de que
sisuais dolorosos à crtança. Assim, o uso de deternminada
eo desa
(estimulante desagradável) poderia ser evitado e, consequentemente, não
trazer rejuízos no processo de ensino-aprendizagem.
Além disso, merecem nfase os projctos de iluminaçăo, Estes
rem
sercuidadosamente plancjadose executados tendo como foco específco
o impacto negativo das luzes para o estudante hipersensívelaos
din
estímulos visuais.
A esse respeito, as considerações de Long (2010) ganban evo
expressivo quando destaca que o uso das luminárias Auorescentes pode
os sintomas em estudantes autistas, embora sejam de baixO
agravar
to Os efeitoscolateraisgravososdeste tipo deiluminaçãodevenm-se,
sobretudo, aos zumbidos e cintilação cíclica da luz gerados pelos re
inseridos nas luminárias.
No entanto, a autora assevera que não existe uma solução perfeita
nara a iluminação na sala de aula para estudante autista e somente a equipe
da escola, os educadores e os alunos que usam o espaço educacional
podem fornecer informações aos desgnersde iluminaçāo para ajudar a criar
uma sala de aula mais confortável.
Diante dessa questão, Long (2010) propõe uma iluminação natural
como a mais adequada, pois além de ajudar na compreensão visual do
espaço, cria um ambiente mais próximo da natuteza, trazendo maior
sensação de calma, reduzindo a frustração e ansiedade.
Sabedora das limitações que este tipo de projeto apresenta, a autora
faz algumas sugestões ou recomendações de designpara iluminação na sala
de aula quando a utilizaçaão da luz natural não for possível. Para entendệ-
las melhor, segue a tabela a seguir:

QUADRO2 - Recomendaçõesde design


e iluminação da sala de aula para alunos autistas

ITEM CONSIDERAÇÕES RECOMENDAÇÕES

Layoutdo Salas de aula devem ter Fornecer iluminação e controlar a luz


menos espaços fechados e separadamente para cada área. Tetos
espaço
sico Corredores mais curtos. |altos facilitam na melhor qualidade
da iluminação.

71
AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTAD0S
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Acabamento Acabamentospodem afetar oUtilizar acabamentos mais escuros
dasala brilho geral do espaço. para suavizara luz e eliminaro brilho
das superfícies, ou seja, selecionar
materiais menos re etivos.

Luminárias Luminárias que deixam Luminárias devem ter caixas


lâmpadas à mostra devem profundas e todos os equipamentos
ser evitadas.Distribuição devem ter coberturas e grelhas de
uniforme da luz deve proteção.
ser aplicada para reduzir
sombras.

Lâmpadas CRI alto de 85 ou mais, cor Lâmpadas incandescentes fornecem


quente e temperatura de CRI elevado e temperatura quente.
3000-3500K

Intensidade Alunos relataram o brilho Reduzir níveis de iluminação para


da luz visual como fonte de uma média de 25-35 fc em oposição
ansiedadee frustração. Níveis aos níveis tradicionais de 30-50 fc.
mais baixos de luz podem
atender melhor às suas
necessidades.

|Controle da Os níveis de luz precisam ser Todas as áreas de iluminação devem


|luz capazes de se ajustar ao usoter controle de intensidade.
da sala de aula ou ao nível de
conforto dos alunos.

Luz natural Proporciona conforto, dando Os vidros devem localizar-se no alto


uma sensação de ambiente ao das paredes.
ar livre.

Energia Quanto mais e ciente a Lâmpadas incandescentes são


lâmpada e o conjunto de ine cientes e gastam muita energia.
luminárias melhor.

Contraste Os índices de contraste devem |Os índices de contraste devem


atender às recomendações atender às recomendações prescritas
prescritas no Manual dono Manual do IESNA.
IESNA. Da superfície de trabalho para uma
superfície vertical em linha direta de
visāo, a razão de contraste deve ser
|limitada a uma diferença de 1 a 3.
Uma razão de 1 a 5 é aceitável para
superfícies verticais que não estejam
na linha davisão.

72 EDITORA MERCADO DE LETRAS


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Manutenção Lâmpadas com vida útil mais A vida útil da lâmpada PAR
longa incandescente varia de 1.200 a
20.000 horas e exige substituição
mais frequente. Por isso, deve-
se selecionar uma lâmpada
incandescente com vida útil mais
longa.

lluminaçāo Superfícies verticais devem ser Selecão de luminárias com uma


vertical uniformemente iluminadas distribuição mais ampla para evitar
quanto possível com sombracortes de luz nítidos e também
e contrastes limitados. fornecerá iluminação geral em
superfícies de parede.

lluminação Os alunos bene ciam-se de A iluminação da tarefa permitirá


de tarefas fontes individuais de luz que que níveis gerais de luz mais baixos
podem controlar. sejam aceitáveis.

Fonte: Long (2010, pp. 47-48) traduzido por Mayana Godoy Favoretto.

Assim como ensina Long (2010), Leestma (2010) enfatiza que a luz
natural deve ser fornecida em todos os ambientes e utilizada sempre que
possvel e também propõe diretrizes de design com a fnalidade de melhorar
a iluminação da sala de aula.

Por outro lado, o estudioso explica que, na ausência de luz natural,


a iluminação arti cial da sala de aula deve ser acompanhada do dimmers –
dispositivos que permitem o controle sobre a intensidade da luz.

Independentemente do tipo iluminação, Leestma (2010) faz


recomendações sobre as janelas para evitar distrações e reduzir a visäão
para o exterior. Segundo o pesquisador, elas podem ser colocadas acima
do nível dos olhos. Se isso não for viável, devem ser utilizados materiais
translúcidos, que permitam apenas a entrada de luz, bem como possam
bloqueara visão para fora da sala.
Com o m de favorecer a iluminação adequada da sala de aula em
que há estudantes autistas, Leestma (2010) apresenta um projeto dedesign,
conforme exempli ca a gura a seguir:

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 73


fi
fi
fi
fi
fi
FIGURA 23 - Concepções de design para melhora da
iluminação para o aluno com TEA

Janelas devem ser


Necessidade deluznah
atas para evitar a
abundanteatravésde
visão do lado de fora.
clarabóias,janelase
grelhas.

10

Luzes equipadas
com dimmers para
permitir o controle
da iluminação pelos
professores.
E Lâmpadas uorescentes
devem ser evitadas.
Lâmpadas voltadas para o teto
suavizama intensidade da
iluminação arti cial

Fonte: Leestma (2010, p.76) traduzido por Mayana Godoy Favoretto. Imagem: David
Paul Leestma.

Por seu turno, a pesquisa de Yate (2016) traz o exemplo ( gura


24) de projeto de iluminação das salas de aula da Chartwell School, nas
quais se emprega uma estratégia de iluminação diurna que inclui janelas de
perímetro combinadas com iluminação superior. As janelas do perímetro
fornecem conexão visual ao ar livre e à fonte primária de iluminação, mas
a profundidade de cada sala de aula requer uma fonte adicional de luz. As
claraboias proporcionam iluminação na parte de trás da sala e ajudam a
equilibrar os níveis de luz dentro do espaço, evitandoo brilho. Além disso,
os acabamentos interiores de cor clara ajudam a re etir a luz do dia dentro
do espaço em vez de absorvê-la.

74 EDITORA MERCADO DE LETRAS


fl
fi
fl
fi
FIGURA 24: lluminação superior e lateral
iluminaçāão superior
Tudaa equilibrar a
uminaçãoe evitar A iluminação
pntrastes dramáticos lateral fornece a
fonte primária de
m todo o espaço. A
araboiaé colocada iluminação, mas
dada à grande
maisperto da parede
profundidade da
aseirado que no
seção do espaço,
entro do espaço para
são necessárias
var a parede traseira
fontes adicionais
om luz, o que reduz
de iluminação.
contraste.

Os materiais de cor
clara ajudam a re etir
a luz em vez de
absorver a luz do dia
dentro do espaço.

Fonte: Yates (2016, p. 30). Imagem: Michelle Yates.

Sem sombras de dúvidas, a iluminaçāo deve ser considerada por


todos os sujeitos envolvidos no processo de inclusão do autista na sala de
aula, sobretudo, porque ela pode trazer efeitos calmantes, relaxantes, mas se
for inadequada pode causar angústia e dor para indivíduos hipersensíveis.
Embora a iluminação de uma sala de aula não seja responsabilidade direta
do professor repercutirá no trabalho realizado por ele com o autista, sendo
assim, faz-se necessário a esse pro ssional um conhecimento mínimo dos
efeitos desse elemento sobre a vida do seu aluno e as estratégias para
atenuá-los.

• Acústica na sala de aula

Alguns estudos, como por exemplo, os de Mostafa (2014) e Beaver


(2006) evidenciaram que, dentre os estímulos sensoriais do ambiente
construído, a acústica é o fator que mais in uencia o comportamento
autista, fazendo-se necessário o controle rigoroso desse aspecto nos
ambientes de aprendizagem.
Esses dados podem ser comprovados nas narrativas autobiográ cas
de Grandin (1999), quando observamos transtornos sensoriais
relacionados, principalmente, com ambientes ruidosos e a presença de
muitos alunos em sala de aula, como indicam os seguintes relatos:

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 75


fi
fl
fi
fi
Entrar para a Cherry Hill Grils School, com trinta a quarenta alunas em
cada turma e um professor diferente para cada matéria, foi umna experiência
traumática, que me deixou muito confusa. Fiquei perdida – desorientada
pela multidão agitada e ruidosa. (Grandin e Scariano 1999, p. 64)

Essa di culdade de Grandin é rati cada por sua mãe, Scariano ao


a rmar que:

Grupos grandes e barulhentos a deixam confusa. Quando precisa fazer


alguma coisa, geralmente gasta muita energia se queixando, rodando de
um lado para o outro, mas acaba se acomodando e trabalhando. (Grandin
e Scariano 1999, p. 54)

Essa mesma aversão ao barulho excessivo é também sentida por


Tammet (2007). Vejamos o que cle nos diz:

Aprender na sala de aula não foi fácil para mim - eu tinha di culdade em
me concentrar quando as outras crianças estavam conversando ou quando
pessoas andavam ou corriam pelos corredores lá fora. Acho muito di cil
ignorar o barulho externo e costumo tapar os ouvidos com os dedos para
me concentrar melhor. (Tammet 2007, p. 51)

Pelo relato de Tammet (2007) e Grandin (1999), vemos que a


concentração em sala de aula é di cultada pelo movimento e ruídos das
outras crianças, dentro e fora de sala de aula.

Bogdashina (2003(2016|) de ne esse tipo de percepção apresentada


nos exemplos acima, como do tipo gestalt, caracterizada pela di culdade
de concentração emn um estímulo auditivo, pois os ouvidos dos autistas
captam todos os sons com a mesma intensidade. Neste tipo de percepção,
o cérebro deles tentam processar todos os estímulos ao seu redor, mas com
o excesso de informação torna-se difícil saber a quais estímulos atender.
Outro fator de extrema tensão para Tammet eram as atividades
esportivas realizadas na escola, que reuniam "multidões de espectadores
ruidosos". Além disso, o ruído do simples escovar de dentes causava-lhe
sofrimento.

O dia anual dos esportes na escola eram fonte de grande tensão. [.] o dia
envolvia multidões de espectadores ruidosos de eventos como as corridas
de saco e ovo na colher, e a combinação de multidões e barulho era

76 EDITORA MERCADO DE LETRAS


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fi
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fi
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demais para mim. Meus pais geralmente me deixavam icar em casa, para
não correr o risco de um colapso. Se cu me sentisse esmagado por uma
situação, meu rosto cava bem vermelho e eu batia na lateral da cabeça
com força até doer bastante. A sensação de tensão dentro de mim era
tamanha que eu precisava fazer alguma coisa, qualquer coisa para liberá-la.
(Tammet 2007, pp. 4-65)
Eu considerava muitas coisas di ceis, como escovar os dentes. O rangido
dos dentes sendo escovados era sicamente doloroso, e depois de passa
pelo banheiro tinha que tapar os ouvidos com as mãos e esperar o barulho
passar antes de conseguir fazer qualquer coisa. (Tammet 2007, p. 78)

De forma similar, Grandin (2006) também evidencia o desconforto


em relação aos sons altos.

Quando eu era pequena, barulhos altos eram um problema, muitas


vezes me sentindo como a broca de um dentista atingindo um nervo.
Eles realmente causaram dor. Eu estava morrendo de medo dos balões
estourando, porque o som era como uma explosão no meu ouvido.
Pequenos barulhos que a maioria das pessoas pode desconectar me
levaram à distração. (Grandin 2006, p. 63)

As narrativas revelam que tanto Grandin (1999) quanto Tammet


(2007) apresentavam uma sensibilidade extrema a determinados sons.
Bogdashina (2003 [2016|) de ne a hipersensibilidade auditiva como sendo
uma sensibilidade elevada ou excessiva ao som. Nesse contexto, a acústica
deve ser entendida como fundamental nas projeções dos designs da sala
de aula.

Dentre os trabalhos sobre acústica e autismo, destaca-se o de


Neumann (2017). Em sua tese, um dos objetivos reside na identi cação
das principais fontes de ruídos, sejam as produtoras de sons mais irritantes,
sejam as de sons mais agradáveis. Para responder a esse objetivo, a autora
aplicou 50 questionários com os responsáreis por crianças com TEA - na
faixa etária de 3 e 18 anos.

A pesquisadora ressalta que os padrões de sensibilidade foram


buscados com o m de propor soluções através de projetos arquitetônicos
que ajudem aqueles alunos especí cos. Dessa forma, a autora sistematizou
os dados, apresentando-os em dois quadros, sendo o primeiro relativo aos
sons que mais irritam e o segundo faz referência aos sons que são mais
agradáveis para a criança. Vejamo-los:

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 77


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fi
fi
fi
fi
fi
fi
QUADRO3- Diagrama dos ruídos que mais irritam as crianças autistas
Características
Classif.Evento sonoro Imagem
gerais

Fogos de
artifício

Explosão de
6 Ruídos abruptos
bexiga

7Buzina

2 Liquidi cador

5 Aspirador de pó

Som constante
8Motocicleta de máquina
(Baixa freqüência)

10Caminhão

12 Helicóptero
fi
3 Gritos

Sofrimento alheio
(alta frequencia)

4Choro debebè

Conversa de
9 Contato social
pessoas

11 Cantar Parabéns

Fonte: Neumann (2017, p. 161).

QUADRO 4: Diagrama dos ruídos que mais agradam as crianças autistas


Caracteríisticas
ClassifEventOsonoro Imagem
gerais

1 Música agitada

2 Música calma Músicas e melodia,


contém variações

3CantarParabéns

4Palmas |Reforço social


5 Agua corrente

Canto dos Natureza, contém


6
pássaros variações.

11 Chuva

Helicóptero

8 Avião

9 Ventilador
Máquinas e
tecnologia

10 Ar condicionado

12 Toque celular

Fonte: Neumann (2017, p. 163).


A estudiosa chama atenção ainda para o fato de que é possível
veri car que alguns sons podem aparecer em ambas as listas e, por isso,
devem ser analisados com um maior cuidado e atenção. Além disso, os
achados da pesquisa apontaram que:

Liquidi cador,
Aspirador de pó, Os ruídos que irritam se mostraram
Motocicleta, bem equilibrados nos três pimeiros
Caminhāo,
grupos: ruídos de máquinas, com
Helicóptero
37,4%, ruídos abruptos, com 28,15%;
ruídos de sofrimento alheio, com 22,
RUÍDOS DE
8%. Já nos sons que agradam, a música
MÁQUINAS com sua melodia variada é a primeira

Constante, colocada com 54,7% das citações. Pode

grave, ser esta agitada, calma, ou o “Parabéns",

alto contanto que não esteja vinculada a


nenhumn evento social. Os ruídos de
37.4% máquinas vêm em segundo lugar, com
19,85%, uma vez que a tecnologia é

sempre um fator de atração. Além


Fogosde artifício, RUÍDOS disso, alguns dos elementos citados
Explosãode bexiga,
ABRUPTOS se relacionam com a obtenção de
Buzina
28.15% conforto térmico, como o ventilador e
o ar-condicionado, e, por isso, parecem
mais atrativos também. Pode-se
também citar os sons ambientais, que
foram citados por 16,85% das cianças,
RUÍDOS DE
que contém variações como a música,
SOFRIMENTO Gritos, além de agradarem pela beleza visual.
ALHEIO Choro de bebê
(Neumann 2017, p. 164)
agudo, alto
22,8% Para ilustrar os sons irritantes e

os agradáveis em termos percentuais,


SONS DE Neumann (2017) elaborou Os

CONTATO diagramas ao lado.


SOCIAL
11.65%

FIGURA 25 - Diagrama de resultado:


Sons que mais irritam
Conversa de pessoas,
Cantar parabéns
Fonte: Neumann (2017, p. 165).

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 81


fi
fi
FIGURA 26 Diagrama de resultado: Sons que mais agradam

Música calma,
Música agitada,
MÚSICA E Cantar parabéns

MELODIA
Contém
variações
54.7%

RUÍDOS DE
Helicóptero,
Avião, Ventilador,
MÁQUINAS
Ar condicionado,
Toque de celular
19,85%

SONS DA
NATUREZA
Água corrente,
Contém Canto de pássadros
Chuva
variações
16.85%

SONS DE
REFORÇO
SOCIAL
8.8%

Palmas

Fonte: Neumann (2017, p. 166).

82 EDITORA MERCADO DE LETRAS


No que se refere ao projeto acústico, Neumann (2017) apresentou
um conjunto de soluções especí cas para quali car a acústica da sala de
aula regular analisada em sua tese. A partir dos testes acústicos realizados,
a investigadora chegou às seguintes conclusões:

1. A sala de aula em formato retangular pode ser uma boa opção,


desde que apresente algumas características tais como volume
proporcional a uma caixa de sapato, com 33,5x 18,5 metros,
evitando formas quadradas ou muito compridas.
2 Os cantos da sala devem ser preferivelmente arredondados e
nenhuma fonte sonora ou ouvinte deve car posicionada nesse
local.
3 Materiais absorvedores devem ser evitados para conter sons
de retorno de voz do professor, e revestimentos re etores ou
difusores para espalhar e por consequencia homogeneizar o
som no ambiente.

Para além do exposto, a estudiosa explica que as salas de aula


circulares não são boas do ponto de vista da acústica, uma vez que todo
o som produzido re ete nas paredes e tende a focalizar no centro da
sala, causando grande irritação e desconcentração para os alunos autistas
que estejam sentados naquele local. Por outro lado, as salas de aula –
desprovidas de paredes – levam tais indivíduos a uma hiper estimulação
visual e sonora, afetando-lhes a concentração.

Como resultado de sua tese, Neumann (2017) construiu um quadro


especí co com indicações de projeções de sala de aula acusticamente
destinadas ao favorecimento do aprendizado das pessoas autistas. No
respectivo quadro, vinte e quatro parâmetros acústicos são indicados para
potencializar a concentração das crianças. Vejamo-lo:

QUADRO 5 - Projeções acústicas para sala de aula

PARÂMETRO INDICAÇÃẢO EXPLICAÇÃO

|Retangular, com cantos Devido à proximidade das paredes


Formato da sala arredondados. Evitar salas em laterais ocorrem distorções noscantos.
círculos e salas sem paredes, As formas circulares focalizam o som
para evitar a desconcentração. para o centro da sala, estabelecendo
|baixa homogeneidade sonora.

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 83


fi
fl
fl
fi
fi
fi
Os cantos devem ter ângulos Quanto mais próximas as paredes
Ångulo dos cantos no mínimo reto, de 90° ou laterais dos cantos, maior a

obtuso. Nunca apresentar um reverberação no ponto e as distorções


ângulo de canto agudo. Sonoras.

Deve ser proporcional Salas muito compridas di cultam


Volume da sala uma caixa de sapato, com a difusão sonora no fundo e salas
33,5 x 18,5 x 2,5 metros, ou quadradas nas laterais.
proporcional.
O alto falante não deve estar Aumenta a reverberação e as distorções
Posição dos alto- posicionado nos cantos da sonoras no canto. Este equipamento
falantes sala, e também deve estar vibra, mas o restante da sala nảo deve
desconectado da estrutura. sentir.
O professor, que é a fonte A abertura tanto pode permitir a
Posiçãodo sonora principal, não deve entrada de ruídos externos como
professor estar próximo de aberturas. 'perder' parte da voz, di cultando a
Compreensão dos alunos.

A parede atrás do professor O objetivo é enviar o som para a plateia,


Paredeatrásdo deve ser de material rígido e ou seja, para frente. Não é adequado o
professor re etor. uso de materiais absorvedores.

Deve ser composta de materil Para evitar o som de retorno que


Parede em frente absorvedor. atrapalha tanto o professor quanto os
ao professor alunos na linha central da sala.

Posição dos alunos Os ouvintes nunca devem se Para evitar a reverberação e distorções
posicionar nos cantos. dos cantos, evitando assim a hiper
estimulação sonora.
Disposição das Devem estabelecer uma Para evitar a reverberação na superfície
cadeiras distância de 0,5 metros das das paredes laterais, evitando assim a
paredes laterais. estimulação desigual entre as orelhas.

Posição das As aberturas não devem ser As fontes internas podem 'perder
aberturas próximas das fontes de ruídosintensidade, então das externas pode
internas e nem externas. permitir a entrada de poluição sonora.

Características das As aberturas devem possuir O objetivo é isolar os ruídos exteriores,


aberturas uma boa vedaçãosonora, com evitando sua entrada no ambiente.
vidro duplo ou lanminado e
|borracha nas frestas.

Presença de sons Sons musicais e da natureza sons de qualidade acalmam


|de qualidade |(pássaros, vegetação, água os alunos e podem aumentar a
corrente) são sempre positivos. concentração e potencializar
aprendizado.
Abertura de visuais Visual de paisagens naturais, Quando as aberturas não são tão
para o ambiente com a presença de vegetação grandes que causam distração, podem
externo e água corrente podem ser bené cas porque acalmanm.
tranquilizar os alunos.

84 EDITORA MERCADO DE LETRAS


fi
fi
fl
fi
Ausência de Evitar paredes paralelas. Basta As paredes paralelas aumentam a
paredes paralelas uma pequena inclinação de reverberação interna e a diferença
7% em uma lateral. entre a percepção do som direto e
re etido.
Revestimento O piso e meia parede sempre Para desconectar, é necessário o uso
antivibração em deve ser desconectado da de uma manta resiliente com uma
piso e meia parede estrutura rígida, para evitar curva contínua no rodapé. Deve subir
vibrações incômodas. até meia altura para evitar as vibrações
nos ombros ao encostar.
Revestimento para É necessário uso de materiais Os extremos agudos são muito
controle de altas para controle de ruídos em irritantes e devem ter seu nível de
|frequências altas frequências, acima de intensidade sonora controlado.
4.000 Hz

Elementos para Uso de 'concha acústica' Esta concha deve ser composta de
potencializar a voz ou estrutura auxiliar para material rigido e re etor a m de
do professor potencializar a voz do conduzir os sons para frente.
professor.

Elementos para |Uso de placa re etoras e As placas normalmente no teto


tornar os sons difusores sonoros. mandamo som para o fundo da sala, já
homogêneos os difusores espalham o som. Devem
ser feitos de material rígido.

Revestimento para Material absorvedores na parte O ruído de fundo não costuma ser
controle de ruído superior das paredes laterais e muito intenso, porém é constante e
de fundo de fundo podem controlar o causa grande irritação.
ruído de fundo padrão.

Divisória para As divisórias e fachadas O primeiro passo para um projeto


isolamento de externas devem barrar os acústico é isolar a poluição sonora da
ruídos externos ruídos exteriores. Para isso, é cidade. Os blocos azados devem ser
preciso materiais rígidos. preenchidos de graute ou areia.

Materiais para O tempo de reverberação deve Para controle do TR, deve-se utilizar
controle do tempo ser controlado para facilitar a materiais absorvedores na parte
dereverberação compreensão da fala. superior das paredes laterais e de
(TR) fundo.
Soluções para o |Sempre é desejável permitir Porém, não voltar as aberturas para
conforto térmico |formas passivas de perder fontes de ruídos externos, e caso
calor, como a ventilação o local seja muito ruidoso, utilizar
natural. chicana (ver dispositivos especiais).

Soluções para o A iluminaçāão deve ser Uma iluminação adequada possibilita o


conforto luminoso adequada à forma de utilização mínimo esforço siológico, permitindo
doespaçodeaprendizagem. maior concentração.

Soluções para a A ergonomia do mobiliário Uma mobiliário confortável possibilita


ergonomia deve ser adequada ao uso do um tempo maior de concentração nas
espaço de aprendizagem. atividades de aula.

Fonte: Neumann (2017, p. 430).

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 85


fi
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fl
fl
fl
Ainda sobre a queståo acústica, Mostafa (2008) sugere a criação de
uma série graduada de salas acústicas, modi cadas com o objetivo de evitar
o cfeito cstufa", onde uma criança torna-se dependente da qualidade
acústica ideal da sala céincapaz de funcionar e generalizar suas habilidades
fora dela. Esta série graduada, segundoa autora, permite que a criança use
a sala totalmente à prova de som durante a fase crítica de seu autismo,
quando tal intervençåo for a única mancira de iniciar a comunicação.

No entanto, tendo dominado um grupo fundamental de


habilidades de comunicação, a criança deve cntão ser movida para uma
sala moderadamente à prova de som, onde ela começará a desenvolver
habilidades de tragem de ruído de fundo. Isso deve continuar através
da série de salas disponíveis com o objetivo nal de funcionar em um
ambiente o mais acústico normal possível.
Por m, importa reiterar que a acústica de boa qualidade em uma
sala de aula é extremamente necessária ao desenvolvinento cscolar dos
autistas, tendo em vista que cles são sensíveis aos sons e, na maioria das
muitas vezes, são incapazes de discriminar diferentes ruídos.

Nesse ponto, a escola deve-se pautar nos princípios acústicos


levantados pelos estudiosos do assunto ao projetar seus ambientes,
sobretudo a sala de aula. Deste modo, a partir de uma base cientí ca e
estável, a inclusão realizar-se-á, favorecendo um ócns ameus onde as
pessoas autistas possam vivere aprender com tranquilidade.

• Zoneamento sensorial

Como discutido anteriormente, indivíduos com TEA podem ter


uma sensibilidade aumentada à informaçāo sensorial, particularmente
em relação aos sons. Para resolver os problemas relacionados à acústica,
Mostafa (2014a) propõe am design onde os espaços da escola são
organizados de acordo com sua qualidade sensorial. Nessa proposta, os
espaços são agrupados de acordo com o nível de estímulo permitido, ou
seja, organizados em zonas de "alto estímulo" e “baixo estímulo".
Mostafa (2008) exempli ca dizendo que, funções de alto estímulo
como música, arte, artesanato e terapia psicomotora, que exigem um alto
nível de alerta, podem ser agrupadas, enquanto funções de baixo estímulo
como fonoaudiologia e salas de aula gerais, que exigem um alto nível de

86 EDITORA MERCADO DE LETRAS


fi
fi
fl
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foco, podem ser agrupados em outro bloco. Os serviços, que, geralmente,
são de alto estímulo, incluindo banheiros, cozinhas, salas de funcionários
e administração, devem ser separados.

Na entrevista realizada por Mcallister (2010) com os professores dos


estudantes autistas, foi referendada a necessidade de um maior cuidado na
escolha da posição da sala de aula dentro da escola, sugerindo-se um lugar
longe de fontes de distrações auditivas, como salas de música, quadras de
jogos, entre outros.
A pesquisa de Mcallister e Sloan (2016) sublinha que os alunos
autistas, ao serem entrevistados sobre um design amigável na escola,
ressaltaram a importância de que a sala de recursos, vista pelos alunos
como sua casa dentro da escola", pudesse ser construída longe das partes
barulhentas da instituição de ensino, evidenciando a importância do
zoneamento sensorial.

• Zonas de transição

As zonas de transiçăo são lugares fundamentais para ajudar o


indivíduo autista a recalibrar seus sentidos à medida que passa de um
nível de estímulo para outro. O estudo de Mostafa (2014a) cria esse
conceitoe a rma que as zonas de transição são utilizadas para facilitar o
sequenciamento Espacial e o Zoncamento Sensorial. Segundo a autora,
tais zonas podem assumir uma variedade de formas, sendo qualquer coisa
a indicar uma mudança de uma zona sensorial de alto estímulo" para
uma zona sensorial de "baixo estímulo", contribuindo para o reequilíbrio
sensoral.
Sobre o zoneamento sensorial, Yates (2016) apresenta um esquema,
como vemos a seguir ( gura 27), em que a criança está primeiramente na
sala de aula ou no trabalho um a um (trabalho realizado com a participação
apenas do aluno autista e do professor), o que con gura uma zona sensorial
de baixo estímulo, depois encaminha-se para o Jardim (zona de transição)
e posteriormente para uma zona sensorial de alto estímulo (quadra de
basquete, sala de arte, banheiro, refeitório).

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 87


fi
fi
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FIGURA 27 - Sequenciamento ezoneanmentosensorial

Sequencong and sensory zonng

Transibon zone High sensory activities


Low sensory Activithes

classroom one-on one garden art services Kkhen

Wayfnding strategies
Landmarks

O
distnctve pavers fence hedge Wndow wal
or tles

Fonte: Yates (2016, p. 15). Imagem: Michelle Yates.

Vogel (2008) salienta que todas as pessoas autistas sentem-se mais


confortveis quando têm uma zona de transição entre espaços privados
e públicos. Assim como uma varanda separa a casa da rua, um espaço de
transição na forma de um corredor diferenciado separa a sala de aula do
corredor principal, fornecendo informações ambientais importantes para
uma posição segura e defensiva. Muitos adultos com TEA relataram que
ter um espaço apertado e contido nas proximidades (como um armário, ou
mesmo dois colchões verticais para encadernar o corpo entre) possibilita-
lhes uma sensação de controle e liberação.

Leestma (2015) assinala que, nas transições, entre áreas de alto


estímulo para áreas de baixo estímulo, deve haver um espaço limiar
que permita ao aluno recalibrar seus sentidos. O autor destaca ainda
que, sem o espaço de transição, o choque de ir de uma área de baixo
estímulo a estímulos elevados poderia levar o aluno a ter sérios problemas,
apresentando comportamentos de desadaptação. Além disso, o autor
acrescenta que os espaços de transição devem ativar todos os sentidos:
visão, som, olfato, toque e paladar e podem ser quaisquer coisas, uma vez
que o importante é possibilitar que os alunos antecipem o ambiente para
o qual estão indo.

88 EDITORA MERCADO DE LETRAS


Mcallister e Maguire (2012) explicam que a transição do exterior
para a sala de aula precisa ser considerada, pois, para o aluno com autismo,
a sala de aula é o lugar de rotina, segurança e tranquilidade. Por outro
lado, no exterior da sala de aula está o mundo do incidental, barulhento
e surpreendente, podendo tornar-se um ambiente potencialmente
inguietante. Sendo assim, para os autores é importante a criança car
temporariamente em uma área de transição, para sair, por exemplo, da
calma da sala para o playground barulhento, ou ao contrário.
Mcallister e Sloan (2016), ao realizarem uma pesquisa com estudantes
autistas solicitaram-Ihe que propusesscm mudanças na escola para que ela
pudesse ter um design amigável para autistas. Como resposta, muitas delas
destacaram a importância de se criar mais espaços de circulação para que
pudessem se preparar antes de ir para locais barulhentos ou para locais
cheios de agitação, como o refeitório, por exemplo.
Nessa pesquisa, alguns estudantes autistas também sugeriram um
espaço extra, fora do refeitório, para facilitar a espera ea preparação para
entrar na sala de aula, o que, segundo os autores, pode indicar um desejo
ou necessidade de ter um espaço adicional em árcas compartilhadas em
que se sinta confortável.
Mostafa (2008) sublinha ainda que, ao se deslocar para uma área
de alto estímulo sensorial ou dela partir, o uso de "zonas de transição"
sensoriais, na forma de jardins ou áreas curriculares sensoriais, podem
ajudar a preparar a criança para tal movimento com distração mínima.
Espera-se, segundo a pesquisadora, que tal arranjo permita à criança uma
forma de organizar-se sensorialmente, a m de tornar a transição dessas
diferentes zonas sensoriais mais uida, permitindo assim a melhoria das
habilidades de navegação.
O conhecimento sobre os espaços de transição pode ajudar o
professor a compreender a razão de tantos transtornos ao retirar o
estudante autista da sala de aula (zona de baixo estímulo) e levá-lo
diretamente para o parque ou para o recreio (zona de alto estímulo). Os
comportamentos de agressão, ansiedade alta, ataques de pânico podem
ser minimizados pelo uso de uma estratégia simples que consiste em levar
o aluno autista para uma zona de transição ou para um outro ambiente, a
m de prepará-lo para adentrar num lugar mais agitado. Como revelam as
pesquisas, essa pode ser uma estratégia simples, porém e caz e bené ca
para os alunos autistas.

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 89


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fl
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• As cores na sala de aula

A cor é um clemento essencial no designde interiores já que transmite


sensaçõcs diversas, sendo um dos primeiros aspectos percebidos no
ambiente.
Nesse prisma, Paron-Wildes (2008, apud Reeves 2012) a rma que
85% das crianças com TEA veem cores com maior intensidade do que
crianças ncurotípicas e 5% veem tons com menos intensidade. Para
crianças que vecm cores com uma intensidade maior, o vermclho aparece
Auorescente, e as crianças - que experimentam uma hipossensibilidade
visual -percebem tudo como cinza. Sobre a percepção das cores, vejamos
o depoimento de Williams (2012):

Essas luzes da rua eram amarelas com uma pitada de rosa, mas em um
estado de zumbido elas eram um amarelo-rosa intoxicante e iridescente.
Minha mente mergulhou cada vez mais fundo na cor, tentando sentir sua
natureza. Cada uma das cores ressoava sentimentos diferentes dentro de
mim e era como se me tocassem como um acorde, onde (sic) outras cores
tocavam uma nota cada vez. [..] desde que eu era uma criança envolvida
na percepção de partículas de ar em turbilhão, uma criança perdida na
repetição de um padrão de som ou uma adolescente olhando por horas as
bolas de bilhar coloridas, tentando entender a experiencia da cor especí ca
em que eu estava subindo. (Williams 2012, p. 19)

As narrativas de Williams (2012) descrevem os efeitos das cores


sobre os seus próprios sentimentos e relatam uma percepção visual
ambígua em que, em alguns momentos, essas cores produzem efeitos
extremamente agradáveis e fascinantes e, em outras situações, a cor gera
stress e descontentamento.

Sobre a escolha das cores para um projeto arquitetônico, Leestma


(2015) sugere a escolha de cores neutras, para não interferir no processo
de aprendizagem ou no cotidiano da criança autista. Dessa maneira, o
autor sugere o uso de cores frias, como azul, cinza e roxo cujo efeito é
calmante, além do uso de cores diferentes para separar áreas de atividades
e espaços dentro da sala de aula, facilitando a identi cação dos espaços
pelo aluno.
Leestma (2015) recomenda paredes com cores lisas e desprovidas de
padrões geométricos, papéis de parede e desenhos. Na ilustração a seguir
( gura 28), o autor apresenta concepções de design para o uso das cores
no ambiente escolar para alunos com TEA.

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FIGURA 28 - Concepções de design para o uso de cores
no ambiente escolar para alunos com TEA

Cores diferentes
devem ser usadas
A superfície das paredes para diferenciar
deve ser simpli cada e áreas ou atividades
livre de padrões e cores
complexas, as quais
podem distrair os
estudantes

1MF4E
Cores alegres podem ser
utilizadas de forma sutil, para
eliminar a impressăo de
Cores suaves devem ser utilizadas institucionalidade e criar um
em corredores longos. Cores frias ambiente mais acolhedor
como azuis, cinzas e roxos podem
trazer sensação de calma para
os alunos

Fonte: Leestma (2015, p. 78)


traduzido por Mayana Godoy Favoretto
Imagem: David Paul Leestma.

Sobre as cores, McCallister e Maguire (2012) enfatizam a importância


da não institucionalização do ambiente para que a sala de aula não se
pareça com uma clínica ou com um hospital, mas que seja um ambiente
acolhedor e agradável onde o aluno possa relaxar e sentir-se confortável.

Altenmüller-Lewis (2017) chama atenção para o fato de que as cores


neutras e calmantes e o uso de materiais naturais são mais adequados para
ambientes de aprendizagem amigáveis ao autismo ( gura 29).

AUTISTASE OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 91


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FIGURA 29 - Uso de cores e materiais naturais em sala de aula

Fonte: Altenmüller-Lewis
(2017, p. 226). Foto: Quinn
Evans Architects. / Courtesy
of the architects.

Nesse contex-
to, as cores não
podem mais serem
consideradas como
meros elementos
estéticos na esco-
la. principalmente
por provocarem
tantos sentimentos
desagradáveis na
pessoa Com TEA.
Por conseguinte, como o ambiente da escola está sempre imerso num
mundo colorido, é preciso prestar atenção não apenas na paleta de cores
dos espaços sicos, mas também nas cores da roupa e dos acessórios que
a professora e os colegas estão usando, que também podemn fornecer uma
atmosfera estimulante demais para aqueles estudantes.
Por certo, todos os aspectos tratados anteriormente nos estudos
analisados, apresentaram indicações simples para atender às especi cidades
dos estudantes autistas como necessidades de previsibilidade, de orientação
imediata, de facilitação na compreensão do ambiente, entre outras.
De fato, as pesquisas desenvolvidas a respeito do design respondem
de forma favorável às especi cidades e necessidades das pessoas autista.
Entretanto, à luz dos estudos analisados há de se considerar que todas
as propostas são igualmente relevantes também para àqueles que não
possuem nenhum transtorno.

92 EDITORA MERCADO DE LETRAS


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PARA NÃO CONCLUIR

A questāo das diferenças sempre nos mobilizou, marcou e marca


nossas escolhas acadêmicas e pro ssionais. O envolvimento com a
problemática do autismo aconteceu, sobretudo, em razão de perceber, por
meio dos diálogos estabelecidos com os alunos dos cursos de graduação
em Pedagogia e com professores que atuam em sala de aula, o despreparo
eo desconhecimento a respcito da inclusão dos estudantes autistas na
escola regular.
Dessa maneira, a intenção de escrever esse livro, veio primeiramente
do desejo de colocar à disposição do professor, ou de qualquer outro
pro ssional que se interesse por essa discussão, uma obra que pudesse
levá-los a conhecer o sujeito autista a partir de um discurso próprio,
revelando histórias contadas por "cles" c sobre eles".
Nesse sentido, essa obra busca inicialmente aproximar o leitor das
experiências vividas pelos autistas no decorrer de suas trajetórias escolares.
À vista disso, consideramos que, ao aproximar o leitor das narrativas
autobiográ cas, podemos em alguma medida, revelar os con itos, as
di culdades, os medos, as dores e alegrias vivenciadas por autistas em sala
de aula, em particular, nos ambientes das escolas regulares.
Assim, ao analisarmos as autobiogra as de pessoas com TEA,
pudemos evidenciar a diferenciação comportamental entre os indivíduos,
dependendo do tipo do ambiente circundante de cada um. Nessa
perspectiva, o imnpacto sobre os autistas varia de uma pessoa para outra
cujas reações e sentimentos podem ir da ansiedade, passando pelo medo,
podendo, até mesmo, chegar à agressividade.
Essa constatação evidencia, inicialmente, os impactos da sobrecarga
sensorial sobre a vida e o comportamento dos autistas. Nesse sentido,
a acústica, a iluminação, as cores, as texturas, além de outros aspectos,
devem ser considerados fundamentais pcla cscola no momento de se fazer
a inclusão dos estudantes com Autismo.

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 93


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Além dos incômodos provocados pelos efeitos sensoriais, os
discursos autobiográ cos revelam ainda outras condicionantes para
alteração comportamental dos indivíduos, dentre elas destacam-se: a falta
de previsibilidade, a mudança brusca de rotina e a novidade.

Se a ausência de previsāo dos acontecimentos gera insegurança


e temor no autista, pois ele sente-se impotente diante do controle da
situação con itante, a mudança brusca de rotina, por sua vez, leva-o a uma
total desorganizaçāo. Assim também ocorre quando surge a novidade. Por
isso, a escola deve considerar as situações expostas acima, não somente no
sentido de evitar surpresas, imas também sob a perspectiva de que o espaço
da sala de aula precisa ser pensando dentro de uma lógica de organização
que permita ao aluno autista localizar-se no espaço e no tempo.
Em suma, as três narrativas de Temple Grandin (1999), Tammet
(2007) e Williams (2012) demonstram o quanto as particularidades de um
determinado ambiente material podem in uenciar e impactar a vida dos
autistas. Isso implica, sem sombra de dúvida, interferências e signi cações
importantes na experiência cotidiana individual, podendo por um lado,
despertar bons sentimentos, prazer e relaxamento ou, por outro lado,
fazê-los vivenciar situações de total descontrole diante de determinados
lugares ou de elementos presentes nos mesmos.
Portanto, a construção ou adaptação do espaço escolar, para acolher
o estudante autista, justi ca-se não só para minimizar os seus dé cits, mas
também para propiciar-lhe segurança, calma e bem-estar. Dessa forma,
a escola tornar-se-á verdadeiramente um ambiente mais amigável, mais
aprazível. Para tanto, é necessário dar voz aos autistas e suas famílias e,
assim, assegurar-lhes condições ideais de igualdade e aprendizagem plenas.
Nesse sentido, os estudos analisados na revisão bibliográ ca,
ao tratar do ambiente sico para autistas abordam a necessidade de se
pensar na sequência espacial em sala de aula, na compartimentalização, na
criação de zonas de transição, no zoneamento sensorial e nos espaços de
retirada/ escapee salas sensoriais, evidenciando que odesign de interiores
nas instituições de ensino pode afetar positiva ou negativamente a vida e o
comportamento da criança autista.

Os resultados também sugerem que os alunos com autismo querem


maior escolha e oportunidades fora da sala de aula. Essa escolha pode
incluir uma variedade de ambientes diferentes para os alunos encontrarem-

94 EDITORA MERCADO DE LETRAS


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se. Partindo dessa premissa, o design pode, então, tentar fornecer mais
oportunidades para uma maior escolha do aluno entre uma variedade
de diferentes ambientes de aprendizagem em um ambiente escolar. Sem
dúvida, isso ajudaria a constituir um ambiente de aprendizagem mais
bené co e amigável ao autismo, preparando para a vida fora do ambiente
escolar (Mcallister e Sloan 2015).
Por conseguinte, a revisão permitiu-nos constatar que, para uma
escola ser verdadeiramente inclusiva no que diz respcito ao espaço sico,
é preciso que os professorese as pessoas com autismo ou, com qualquer
outra de ciência, tenham a oportunidade de informar os designers sobre
suas necessidades, pois como o indivíduo e o ambiente construído estão
intrincadamente ligados um ao outro, nenhum deles pode realmente ser
entendido sem a inclusão e consideração do outro.

Dessa mancira, o diálogo entre as autobiogra as e os estudos


sobre projetos arquitetônicos, além de apontarem para a signi cação e
relevância do desing ambiental escolar quanto aos problemas encontrados
pelos autistas, lançam luz sobre muitas medidas, que podem ser adotadas,
no intuito de dirimir os eventuais problemas advindos da vivência nos
espaços escolares. Só assim, será possível tornar a escola um espaço
potencializador de interação social e de aprendizagem de todos.
De fato, os estudos sobre design ambiental desvelam muitas
possibilidades de organizaçāo dos ambientes escolares apropriados para
o estudante autista. Contudo, não podemos deixar de sublinhar que no
decorrer do percurso analítico dessa pesquisa, identi camos um número
reduzido de estudos sobre designc autismo originários do Brasil. Ademais, os
poucos estudos nacionais sobre o assunto investigam escolas apresentadas
num contexto internacional ou analisam a realidade de escolas particulares
com bom poder aquisitivo.
Indubitavelmente, embora os estudos internacionais apresentem
uma gama de possibilidades razoáveis e viáveis a respeito da organização
de espaços escolares, faz-se necessário e urgente pesquisas nacionais
realizadas a partir da realidade social e econômica das escolas públicas do
nosso país.

Assim, esperamos que a leitura dessa obra, possa encorajar ou


motivar o professor, a família, os pro ssionais de diversas áreas, a pensar

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 95


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cm formas de adaptar e, especialmente, de tornar a escola mais aprazível
para o autista.
Finalmente, esperamos que o diálogo cstabelecido entre as
autobiogra as e os estudos bibliográ cos a respeito do design para autistas,
possibilite aos cducadores a compreensão do quanto, na verdade, são
diferentes as distintas formas e experiências perceptuais desses indivíduos,
assim como são distintas a sua forma de ser e estar no espaço da escola.
Isso implica, por certo, que a inclusāo ou adaptação do espaço escolar não
se faz somente por meio da aplicação de diretrizes de design arquitetônico,
mas se concretiza, especialmente por meio de um olhar atento ao que
esses estudantes têm a dizer, mesno que esse discurso não seja povoado
por palavras audíveis.

96 EDITORA MERCADO DE LETRAS


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AUTISTASE OS ESPAÇOSESCOLARES ADAPTADOS


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APÊNDICE 1 - QUADRO DE REVISÃO DA LITERATURA

QUADRO - Revisão da Literatura Internacional

AUTORES
/ANO TÍTULO OBJETIVOS

Beaver Projetando ambientes para Apresentar um relato sobre um


(2006) criançase adultos com tea conjunto de estratégias utilizadas
no desenvolvimento de um centro
residencial-educacional projetado para
estudantes autistas.

Vogel Projeto de sala de aula Desenvolver e apresentar oito padrões


(2008) para viver e aprender com de design para instalações educacionais,
autismo a partir de entrevistas realizadas com
pais, professoreseterapeutas, bem como
estudantes universitários e adultos com
autismo.

Mostafa Uma arquitetura para o Desenvolver um quadro preliminar de


(2008) autismo: conceitos de diretrizes de projeto arquitetônico para
intervenção de design para o autismo.
o usuárioautista

Khare e Incorporando a dimensão Apresentar os aspectos facilitadores do


Mullick comportamental no projeto ambiente educacional para crianças
(2009) de ambiente de com autismo e avaliar o impacto desse
aprendizagem inclusiva ambiente no desempenho funcional
parao autistas delas.

Projetando espaços de Analisar quatro escolas construídas


Scott aprendizagem para criançaspara crianças com TEA confrontando os
(2009) no espectro do autismo achados com o corpo de conhecimentos
existentes a respeito de concepções de
ambientes educacionais para autistas.

Long Projeto de iluminação em Realizar um estudo de caso numa escola


(2010) sala de aula para alunos em Manhatthan e posteriormente propor
com transtorno do espectroparâmetros e práticas de design que
Tese autista subsidiarão projetos de iluminação para
escolas que tenham estudantes com TEA.

Hussein, Pesquisa e prática na Analisar o comportamento ea percepção


Abidinb, criação de ambientes dos usuários autistas que utilizam um
|Omar multissensoriais ao ar jardim sensorial numa escola do Reino
(2013) livre: enfrentando desa os Unido.
futuros

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS


101
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MCAllister Considerações sobre Destacar as considerações de design
e Maguire design para a sala de aula especi camente para a sala de aula Key
(2012) do aluno com transtorno do Stage, onde estudam crianças de 5 a
espectro autista 8 anos, no sentido de construir de um
design amigável para o autista.

Mostafa Arquitetura para o autismo: Demonstrar a aplicação do índice


(2014a) aspectos do autismo" em ASPECTSS e princípios
seus sete
design escolar (Acústica, Sequenciamento Espacial,
|Fuga, Compartimentação, Espaços
de Transição, Zoneamento Sensorial
e Segurança) como ferramenta de
desenvolvimento de design.

Leestma Projetando para o espectro Analisar por meio de pesquisa


(2015) um modelo educacional bibliográ ca o design de doze escolas
para o usuário autista construídas para autistas e posteriormente
Tese apresentar diretrizes para a construção
de um ambiente escolar que facilite a
aprendizagem para os estudantes com
problemas sensoriais.

Ahlquist Arquiteturas sensoriais Descrever desenvolvimento do


(2015) sociais: articulando estru- protótipo StretchPLAY, com foco no
turas híbridas têxteis para design de ambientes táteis e responsivos
resposta multissensorial e para crianças com Transtorno do Espectro
pla colaborativo Autista e analisar o comportamento
sensorial de uma garota autista de 5 anos,
a m de adaptar as tecnologias como
resposta aos seus desa os sensoriais.

Yates Construindo escolas melho- Empreender uma revisão da literatura


(2016) res: um novo modelo para explorando as necessidades espaciais
inclusão do autismo em e sensoriais especí cas associadas ao
Tese seattle autismo e posteriormente testar os
princípios de design numa escola regular
de Seattle onde estudam crianças autistas
e crianças neurotípicas.

Mcallister Projetado pelos e para Analisar a percepção dos estudantes


e Sloan os alunos: uma escola autistas sobre os desa os enfrentados
(2016) amigável ao autismo para lidar com o seu entorno no ambiente
escolar.
Fonte: Elaboração própria.

102
EDITORA MERCADO DE LETRAS
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QUADRO Revisāo da Literatura Nacional.

Título Objetivos
Autores I
OBJETIVOS
ano
Neumann Projeto Acústico para Comprovar que é possivel quali car um
(2017) Transtornos Sensoriais. espaço através de projetos acústicos,
considerando às necessidades especí cas
dos usuários com TEA.
Giaconi e Organização do Analisar as principais abordagens sobre o
Rodrigues Espaço e do Tempo autismo, recolhendo elementos essenciais
(2014) na inclusão de sujeitos para uma proposta, ou linhas-guia, de
com autismo. inclusão de sujeitos com autismo na escola
regular.
Souza O espectro da escola ldenti car à luz da teoria da SintaxeEspacial,
(2019) neurodiversa: Uma que estuda a con guração dos espaços
análise dos espaços físicos e suas in uências nas relações sobre
de aprendizagem ele estabelecidas, os critérios arquitetônicos
voltados para pessoas utilizados na elaboração de espaços de
com Transtorno do aprendizagem voltados para pessoas com
Espectro Autista (TEA). TEA e como esses critérios se con guram
nos projetos das escolas analisadas.

Fonte: Elaboração própria.

AUTISTAS E OS ESPAÇOS ESCOLARES ADAPTADOS 103


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Esta obra foi impressa em papel offset 90 gs.
Instrução Normativa SRF n° 71 de 24 Agosto de
2001. Na capa foi utilizado Papel Supremo, 250
gs., laminação fosca. Impressão e acabamento
por processo digital book on demand a partir de
arquivos do editor.
A presente obra trata da construção de espaços escolares que considerem as
experiências sensoriais no autismo, ou seja, um referencial sobre o planejamento
de espaços físicos capazes de apoiar o desenvolvimento das habilidades desses
estudantes e de minimizar os dé cits sensoriais.
Em linguagem fácil e objetiva, a autora apresenta propostas de design e
arquitetura para organização do ambiente da sala de aula, dos espaços de
circulação na escola (corredores), além de sugestões para construção de espaços
de retirada, salas e jardins sensoriais utilizados para promover a calma e a
organização comportamental no autismo. O livro apresenta ainda uma série de
sugestões e indicações para o controle de estímulos sensoriais na escola, tratando
de questões importantes como: iluminação, acústica dentro e fora da sala de aula,
uso de cores apropriadas para serem utilizadas no espaço escolar, dentre outras.
Baseado em pesquisas nacionais e internacionais, o livro apresenta uma
diversidade de propostas e sugestões para adaptar o ambiente físico da escola,
podendo servir de apoio para gestores escolares, professores, terapeutas
ocupacionais, fonoaudiólogos e pro ssionais da área de arquitetura e design, no
sentido de propor soluções possíveis de tornar o cotidiano escolar mais
agradável, seguro e inclusivo para o estudante autista. É, também, uma leitura de
interesse de pais e familiares de indivíduos autistas, uma vez que as sugestões
para o ambiente escolar também suscitam importantes re exões sobre os demais
ambientes frequentados por esses estudantes.

Ana Flávia Teodoro M. Oliveira é graduada em Fonoaudiologia, pós-graduada em Educação Infantil, mestre e
doutora em Educação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Éprofessora da Faculdade de Educação
da Universidade Federal de Goiás (UFG), ministrando disciplinas na área de Educação Inclusiva. Pesquisadora
na área do Transtorno do Espectro Autista, com capítulos de livro sobre o tema, e artigos publicados em revistas
de Educação Especial no Brasil. Também é coordenadora do Núcleo de Acessibilidade da Faculdade de
Educação/UFG. Email para contato: ana avia1973 @ufg.br.

ISBN 978-65-86089-21-9

g7865860 89219
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