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CURSO AVANÇADO DE TEOLOGIA

MÓDULO I

LITERATURA APÓCRIFA,
PSEUDEPÍGRAFA,
DEUTEROCANÔNICA E O CÂNON
BÍBLICO

LSM Cursos – Living Stones Ministry


UMA ESCOLA SEM PAREDES E SEM FRONTEIRAS
LITERATURA APÓCRIFA 1

LITERATURA APÓCRIFA, PSEUDEPÍGRAFA, DEUTEROCANÔNICA


E O CÂNON BÍBLICO
Prof. Gilmar V M Lima (Pr) 1

EMENTA

Esta disciplina aborda o estudo de textos sagrados que estão fora do cânone bíblico, como
os apócrifos, pseudepígrafos e deuterocanônicos. É importante para compreender a história
da Bíblia e as diferentes tradições religiosas. Além disso, oferece uma visão ampla do
pensamento da época em que foram escritos. O cânone bíblico é a lista oficial de livros
considerados sagrados. Esta disciplina inclui a análise da história e interpretação dos textos
bíblicos. É essencial para entender a história e teologia da Bíblia.

OBJETIVOS

Conhecer textos sagrados que não foram incluídos no cânone bíblico, tais como os
livros apócrifos, pseudoepígrafos e deuterocanônicos, a fim de compreender a
história da Bíblia e das diferentes tradições religiosas que se desenvolveram a partir
dela.

Investigar a história e o desenvolvimento do cânone bíblico, bem como a


interpretação dos textos que o compõem, a fim de compreender a teologia e a
filosofia que estão presentes nesses textos.

Compreender sob uma visão ampla o pensamento religioso e filosófico da época em


que esses textos foram escritos, possibilitando uma compreensão mais profunda da
cultura e da sociedade daquele período.

Avaliar como a formação do Cânon bíblico trouxe segurança para a igreja em relação
aos textos espúrios e, como resgata a autoridade dos textos sagrados.

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO

1. Introdução à Literatura Apócrifa, Pseudepígrafa e Deuterocanônica

2. Literatura Apócrifa

1
Doutorando em História – UAb – Lisboa, Portugal. Pós-Graduado em História e Arqueologia do Antigo Oriente Próximo e
Mediterrâneo – UNASP (Engenheiro Coelho – SP); Pós-Graduado em Filosofia - Centro Universitário Filadélfia - UNIFIL (Londrina – Pr);
Pós-Graduado em Docência do Ensino Superior - FAECAD (Faculdade Ev. de Ciências, Tecnologia e Biotecnologia – Rio de Janeiro – RJ);
Especializado em: “Biblical Geography and Archaeology”; “The Unknown Biblical Israel”; e “The Jewish Roots of Christianity” -
Moriah International Center certificado por Hebrew University of Jersusalem (Israel); Graduado em Teologia - FAECAD (Faculdade Ev. de
Ciências, Tecnologia e Biotecnologia da CGADB -Rio de Janeiro – RJ); Graduado em História - Universidade Estácio de Sá (Rio de Janeiro,
RJ). Presidente da Living Stones Ministry.

Living Stones Ministry Prof. Gilmar M V Lima (Pr)


LITERATURA APÓCRIFA 2

3. Literatura Pseudepígrafa

4. Literatura Deuterocanônica

5. Conteúdo e Significado da Literatura Apócrifa no Antigo Testamento

6. Conteúdo e Significado da Literatura Apócrifa no Novo Testamento

7. O Debate Atual em torno da Literatura Apócrifa

8. Origem e História da Bíblia

9. O Cânon Bíblico

10. Revelação, Inspiração e Autoridade

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LITERATURA APÓCRIFA 3

Sumário
LITERATURA APÓCRIFA, PSEUDEPÍGRAFA, DEUTEROCANÔNICA E O CÂNON BÍBLICO ......................... 1

EMENTA..................................................................................................................................................... 1

OBJETIVOS ................................................................................................................................................ 1

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO .................................................................................................................. 1

CAPÍTULO 01 ....................................................................................................................................... 7
INTRODUÇÃO À LITERATURA APÓCRIFA, PSEUDEPÍGRAFA E DEUTEROCANÔNICA .............................. 7

ORIGENS, DEFINIÇÕES E IMPORTÂNCIA...................................................................................................7

INTRODUÇÃO............................................................................................................................................ 7

A. A LITERATURA APÓCRIFA, PSEUDEPÍGRAFA E DEUTEROCANÔNICA ........................................... 7

B. DEFINIÇÃO E ORIGEM DA LITERATURA APÓCRIFA ....................................................................... 9

C. CARACTERÍSTICAS E IMPORTÂNCIA DA LITERATURA PSEUDEPÍGRAFA ...................................10

D. DEFINIÇÃO E ORIGEM DA LITERATURA DEUTEROCANÔNICA ....................................................11

E. A IMPORTÂNCIA DA LITERATURA APÓCRIFA, PSEUDEPÍGRAFA E DEUTEROCANÔNICA.........12

CONCLUSÃO............................................................................................................................................13

REVISÃO ..................................................................................................................................................14

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................15

CAPÍTULO 02 ..................................................................................................................................... 17
LITERATURA APÓCRIFA..............................................................................................................................17

IMPORTÂNCIA E CONTROVÉRSIAS .........................................................................................................17

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................................17

A. A ORIGEM DOS TEXTOS APÓCRIFOS.............................................................................................17

B. CONTEÚDO DA LITERATURA APÓCRIFA.......................................................................................19

C. IMPORTÂNCIA DA LITERATURA APÓCRIFA .................................................................................20

D. CONTROVÉRSIAS EM TORNO DA LITERATURA APÓCRIFA .........................................................21

E. USO MODERNO DA LITERATURA APÓCRIFA................................................................................22

CONCLUSÃO............................................................................................................................................23

REVISÃO ..................................................................................................................................................24

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................25

CAPÍTULO 03 ..................................................................................................................................... 27

LITERATURA PSEUDEPÍGRAFA ...................................................................................................................27

ESCRITOS SOB NOME FALSO ...................................................................................................................27

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................................27

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LITERATURA APÓCRIFA 4

A. DEFINIÇÃO E CARACTERÍSTICAS DOS PSEUDEPÍGRAFOS ...........................................................27

B. PSEUDEPÍGRAFOS DO ANTIGO TESTAMENTO .............................................................................29

C. PSEUDEPÍGRAFOS DO NOVO TESTAMENTO ................................................................................30

D. INFLUÊNCIA E IMPACTO DOS PSEUDEPÍGRAFOS ........................................................................31

E. O ESTUDO ACADÊMICO DOS PSEUDEPÍGRAFOS..........................................................................32

CONCLUSÃO............................................................................................................................................33

REVISÃO ..................................................................................................................................................34

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................35

CAPÍTULO 04 ..................................................................................................................................... 37
LITERATURA DEUTEROCANÔNICA ............................................................................................................37

ACEITAÇÃO E REJEIÇÃO ...........................................................................................................................37

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................................37

A. ORIGEM E CONTEXTO HISTÓRICO ................................................................................................37

B. TEOLOGIA E SIGNIFICADO ESPIRITUAL.........................................................................................38

C. ACEITAÇÃO E DISPUTAS CANÔNICAS ..........................................................................................39

D. INFLUÊNCIA NO NOVO TESTAMENTO ..........................................................................................41

E. VALOR HISTÓRICO E LITERÁRIO....................................................................................................42

CONCLUSÃO............................................................................................................................................43

REVISÃO ..................................................................................................................................................44

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................45

CAPÍTULO 05 ..................................................................................................................................... 47
CONTEÚDO E SIGNIFICADO DA LITERATURA APÓCRIFA NO ANTIGO TESTAMENTO ..........................47

HISTÓRICOS, PROFÉTICOS, SABEDORIA E ORAÇÕES .............................................................................47

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................................47

A. LIVROS DE TOBIAS E JUDITE ..........................................................................................................47

B. LIVROS DOS MACABEUS ................................................................................................................48

C. LIVROS DE SABEDORIA E ECLESIÁSTICO .......................................................................................49

D. BARUC E CARTA DE JEREMIAS ......................................................................................................50

E. ADIÇÕES A ESTER E DANIEL ...........................................................................................................51

CONCLUSÃO............................................................................................................................................53

REVISÃO ..................................................................................................................................................54

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................55

CAPÍTULO 06 ..................................................................................................................................... 57
CONTEÚDO E SIGNIFICADO DA LITERATURA APÓCRIFA NO NOVO TESTAMENTO..............................57

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LITERATURA APÓCRIFA 5

EVANGELHOS, ATOS, EPÍSTOLAS E APOCALIPSES .................................................................................57

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................................57

A. OS EVANGELHOS APÓCRIFOS .......................................................................................................57

B. ATOS APÓCRIFOS DOS APÓSTOLOS .............................................................................................58

C. EPÍSTOLAS E APOCALIPSES APÓCRIFOS .......................................................................................59

D. A FORMAÇÃO E O CONTEXTO DA LITERATURA APÓCRIFA ........................................................61

E. A RECEPÇÃO E O IMPACTO DA LITERATURA APÓCRIFA .............................................................62

CONCLUSÃO............................................................................................................................................63

REVISÃO ..................................................................................................................................................64

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................65

CAPÍTULO 07 ..................................................................................................................................... 67
O DEBATE ATUAL EM TORNO DA LITERATURA APÓCRIFA .....................................................................67

ACEITAÇÃO E REJEIÇÃO ...........................................................................................................................67

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................................67

A. REDEFINIÇÃO DA AUTORIDADE DOS TEXTOS APÓCRIFOS .........................................................67

B. REINTERPRETAÇÃO DOS TEXTOS APÓCRIFOS À LUZ DE CONTEXTOS CONTEMPORÂNEOS ...68

C. A LITERATURA APÓCRIFA E A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE CRISTÃ.........................................69

D. A LITERATURA APÓCRIFA COMO RECURSO PARA O DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO...................70

E. A BUSCA PELA AUTENTICIDADE DOS TEXTOS APÓCRIFOS ........................................................71

CONCLUSÃO............................................................................................................................................73

REVISÃO ..................................................................................................................................................73

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................75

CAPÍTULO 08 ..................................................................................................................................... 77
ORIGEM E HISTÓRIA DA BÍBLIA ................................................................................................................77

FORMAÇÃO DO ANTIGO E NOVO TESTAMENTO ...................................................................................77

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................................77

A. ORIGEM E HISTÓRIA DA BÍBLIA ....................................................................................................77

B. COMO A BÍBLIA FOI ESCRITA.........................................................................................................78

C. AS DIFERENTES LÍNGUAS NA CONSTRUÇÃO DO TEXTO BÍBLICO ..............................................79

D. OS PRIMEIROS MANUSCRITOS DA BÍBLIA ...................................................................................80

E. TEXTOS BASES PARA AS VERSÕES ANTIGAS DO ANTIGO E NOVO TESTAMENTO ...................82

CONCLUSÃO............................................................................................................................................83

REVISÃO ..................................................................................................................................................84

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................85

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LITERATURA APÓCRIFA 6

CAPÍTULO 09 ..................................................................................................................................... 87

O CÂNON BÍBLICO ......................................................................................................................................87

ORIGENS, DEFINIÇÕES E IMPORTÂNCIA.................................................................................................87

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................................87

A. FORMAÇÃO DO CÂNON DO ANTIGO TESTAMENTO ...................................................................87

B. FORMAÇÃO DO CÂNON DO NOVO TESTAMENTO ......................................................................88

C. O PROCESSO E CRITÉRIOS ENVOLVIDOS NA FORMATAÇÃO DO CÂNON DO NOVO


TESTAMENTO..................................................................................................................................89

D. DIFERENTES CÂNONES CRISTÃOS .................................................................................................90

E. A AUTORIDADE DO CÂNON ..........................................................................................................92

CONCLUSÃO............................................................................................................................................93

REVISÃO ..................................................................................................................................................93

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................95

CAPÍTULO 10 ..................................................................................................................................... 96

REVELAÇÃO, INSPIRAÇÃO E AUTORIDADE...............................................................................................96

NATUREZA E FUNÇÃO DA AUTORIDADE CRISTÃ ..................................................................................96

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................................96

A. REVELAÇÃO: O AUTO REVELAR DE DEUS......................................................................................96

B. INSPIRAÇÃO: A FUNÇÃO DO ESPÍRITO SANTO NA ESCRITURA .................................................97

C. AUTORIDADE: A BÍBLIA COMO A PALAVRA DE DEUS .................................................................98

D. NATUREZA DA AUTORIDADE CRISTÃ: UMA EXPLICAÇÃO ..........................................................99

E. FUNÇÃO DA AUTORIDADE CRISTÃ: GUIAR E TRANSFORMAR .................................................101

CONCLUSÃO..........................................................................................................................................102

REVISÃO ................................................................................................................................................102

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...........................................................................................................104

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LITERATURA APÓCRIFA 7

CAPÍTULO 01

INTRODUÇÃO À LITERATURA APÓCRIFA, PSEUDEPÍGRAFA E


DEUTEROCANÔNICA

ORIGENS, DEFINIÇÕES E IMPORTÂNCIA

"A Literatura Apócrifa nos mostra o quanto os primeiros cristãos estavam engajados em
entender e interpretar a vida de Jesus."
Bart D. Ehrman

INTRODUÇÃO

A literatura religiosa cristã possui uma grande variedade de textos que, ao longo da história,
foram considerados com diferentes níveis de canonicidade. Entre estes encontram-se os
textos apócrifos, pseudepígrafos e deuterocanônicos, que se diferenciam em aspectos como
autenticidade, reconhecimento eclesiástico e função dentro da tradição religiosa. Esta
discussão permite uma visão mais ampla e completa sobre a formação da Bíblia e sobre a
construção da tradição cristã ao longo dos séculos.

A. A LITERATURA APÓCRIFA, PSEUDEPÍGRAFA E DEUTEROCANÔNICA


A Literatura Apócrifa, Pseudepígrafa e Deuterocanônica consiste em um corpo de textos
escritos na antiguidade que, por variados motivos, não foram incluídos no cânon oficial
das Escrituras Sagradas do Cristianismo. Tal literatura engloba um amplo espectro de
gêneros e temáticas, tendo um papel significativo no estudo do judaísmo do Segundo
Templo e das primeiras comunidades cristãs. O teólogo R. H. Charles, ao publicar sua
obra seminal "Apócrifos e Pseudepígrafos do Antigo Testamento", destacou a relevância
desses textos para a compreensão da formação do pensamento religioso da época
(CHARLES, R. H. Apócrifos e Pseudepígrafos do Antigo Testamento. Oxford: Clarendon,
1913).

1. Definição e Origem dos Textos Apócrifos, Pseudepígrafos e Deuterocanônicos


A literatura apócrifa é composta por escritos que, mesmo tendo surgido em um
contexto religioso similar àquele dos textos canônicos, não foram incluídos na Bíblia.

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LITERATURA APÓCRIFA 8

Como afirma Ehrman (2003), são textos que em muitos casos possuem origens
obscuras, mas que oferecem uma visão alternativa do cristianismo antigo.

Por outro lado, os pseudepígrafos são textos que foram atribuídos a autores que
provavelmente não os escreveram, como é o caso do Livro de Enoque. Segundo
Charlesworth (1983), esse termo é frequentemente usado para se referir a textos
judaicos e cristãos antigos, fora do cânon estabelecido.

Já os livros deuterocanônicos são aqueles aceitos pela Igreja Católica e pela Igreja
Ortodoxa, mas que não foram incluídos no cânon judaico ou na Bíblia protestante.
Exemplos incluem livros como Tobias e Judite. Segundo Metzger (1997), estes livros
possuem uma aceitação diversa entre as diferentes tradições cristãs, demonstrando
a complexidade da formação do cânon bíblico.

2. Semelhanças entre Apócrifos, Pseudepígrafos e Deuterocanônicos


Os textos apócrifos, pseudepígrafos e deuterocanônicos possuem semelhanças,
principalmente no que tange ao período de composição e ao contexto religioso em que
surgiram. De acordo com Davila (2005), todos esses textos emergiram em um
contexto de intensa produção literária religiosa, tanto judaica quanto cristã.

Outra semelhança é que todos estes textos oferecem percepções e ensinamentos que
complementam, expandem ou contradizem os textos canônicos. Segundo Ehrman
(2003), os textos apócrifos e pseudepígrafos em particular apresentam narrativas
alternativas sobre personagens e eventos bíblicos que são fascinantes e
esclarecedoras.

3. Diferenças entre Apócrifos, Pseudepígrafos e Deuterocanônicos


A principal diferença entre os textos apócrifos, pseudepígrafos e deuterocanônicos
é o status que ocupam dentro da tradição religiosa cristã. De acordo com Metzger
(1997), enquanto os deuterocanônicos são aceitos por parte significativa do
cristianismo, os apócrifos e pseudepígrafos não têm esse status.

Outra diferença é o conteúdo e o estilo literário desses textos. Conforme observado por
Charlesworth (1983), enquanto os pseudepígrafos são frequentemente textos
apocalípticos ou de sabedoria, os apócrifos podem variar mais amplamente em estilo
e conteúdo.

4. Impacto dos Textos Apócrifos, Pseudepígrafos e Deuterocanônicos na Tradição


Cristã
Apesar de não possuírem o mesmo status que os textos canônicos, os apócrifos,
pseudepígrafos e deuterocanônicos tiveram um impacto significativo na tradição
cristã. De acordo com Ehrman (2003), esses textos ajudaram a moldar a compreensão

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da fé cristã e forneceram perspectivas alternativas sobre temas como a natureza de


Deus, a vida de Jesus e o destino da humanidade.

B. DEFINIÇÃO E ORIGEM DA LITERATURA APÓCRIFA


A literatura apócrifa é um conjunto de textos que, embora tenham sido escritos no
mesmo período e no mesmo contexto cultural que os textos bíblicos, não foram incluídos
no cânone das Escrituras judaicas e cristãs. O termo "apócrifo" deriva do grego
"apókruphos", que significa "oculto" ou "secreto". Apesar de não serem reconhecidos
como canônicos pela maioria das tradições judaicas e cristãs, estes textos possuem
importância histórica e teológica considerável.

1. Definição e Origem dos Textos Apócrifos


Os textos apócrifos são uma coleção de documentos que foram excluídos da Bíblia
oficial por várias razões. Como explicou Bart Ehrman em seu trabalho Textos Perdidos
do Cristianismo Primitivo (2003), alguns desses textos foram considerados heréticos,
enquanto outros simplesmente não se ajustavam à doutrina estabelecida pela igreja
primitiva. A origem desses textos é variada, com alguns provenientes de comunidades
judaicas (Antigo Testamento) e outros de comunidades cristãs (Novo Testamento).

2. Conteúdo dos Textos Apócrifos


Os textos apócrifos abrangem uma ampla gama de conteúdo. No Antigo Testamento,
há livros históricos (como 1 e 2 Macabeus), proféticos (como Baruque) e sabedoria
(como Eclesiástico). No Novo Testamento, existem evangelhos (como o Evangelho
de Tomé), atos (como os Atos de Paulo), epístolas (como a Epístola de Barnabé) e
apocalipses (como o Apocalipse de Pedro). Embora não estejam no cânon bíblico,
esses textos proporcionam insights valiosos sobre a fé e a prática religiosa da época
(HARRINGTON, Daniel J. Os livros Deuterocanônicos do Antigo Testamento, 1990).

3. Importância Histórica e Teológica dos Textos Apócrifos

Apesar de não serem reconhecidos como parte do cânon bíblico, os textos apócrifos
têm uma importância histórica e teológica considerável. Como salientado por James
H. Charlesworth em Os Papiros do Mar Morto e o Cristianismo Primitivo (1987), esses
textos oferecem uma visão única das crenças e práticas de diferentes comunidades
judaicas e cristãs na antiguidade. Além disso, eles ajudam a lançar luz sobre a
formação do cânon bíblico e a história do cristianismo primitivo.

4. A Controvérsia em Torno dos Textos Apócrifos


A controvérsia em torno dos textos apócrifos tem origem na própria definição do que
é "apócrifo". Alguns estudiosos, como Karen King em O Evangelho de Maria de

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Magdala (2003), argumentam que a exclusão desses textos da Bíblia foi um ato
político, destinado a consolidar o poder e a autoridade da igreja. Por outro lado, há
aqueles que defendem a integridade do cânon bíblico, argumentando que os textos
apócrifos não possuem a mesma autoridade divina que os livros bíblicos.

C. CARACTERÍSTICAS E IMPORTÂNCIA DA LITERATURA PSEUDEPÍGRAFA


A literatura pseudoepígrafa constitui um campo fascinante dentro dos estudos bíblicos,
cujo entendimento é essencial para compreendermos adequadamente as complexidades
históricas, teológicas e literárias do Antigo e Novo Testamento. Esta literatura é
denominada "pseudepígrafa" porque os textos são atribuídos a autores que não os
escreveram realmente - um fenômeno comum na antiguidade e não restrito ao âmbito
judaico-cristão. Eles foram concebidos e compilados ao longo de séculos por diferentes
comunidades e tradutores, refletindo uma diversidade de perspectivas e experiências
teológicas.

1. Características da Literatura Pseudepígrafa


A literatura pseudoepígrafa é uma coleção diversificada de escritos que refletem uma
multiplicidade de tendências e conceitos teológicos presentes no judaísmo do
Segundo Templo e nos primórdios do cristianismo. Segundo James H. Charlesworth,
um dos maiores especialistas em Pseudoepígrafos, esses escritos "representam uma
tentativa de preencher lacunas percebidas na narrativa bíblica ou de fornecer detalhes
adicionais sobre personagens ou eventos mencionados brevemente" (Charlesworth,
1983). Assim, esses textos atendem a um desejo de entender mais profundamente a
revelação de Deus, os mistérios do universo, e os destinos dos personagens bíblicos.

2. A importância da Literatura Pseudoepígrafa para o Estudo Bíblico


Embora os textos pseudoepígrafos não estejam presentes no cânon bíblico das
principais tradições cristãs, a sua relevância para o estudo da Bíblia é incontestável.
"O material pseudoepígrafo oferece uma janela para o mundo no qual Jesus e os
apóstolos viviam, revelando as crenças, as esperanças, e as lutas dos judeus do primeiro
século" argumenta Craig A. Evans em seu livro "Exploring the Pseudepigrapha for New
Testament Interpretation" (Evans, 2020). Esses escritos fornecem um contexto rico e
multifacetado para o Novo Testamento e uma perspectiva sobre a diversidade de
crenças no judaísmo do Segundo Templo.

3. Desafios na Interpretação da Literatura Pseudoepígrafa


Um desafio significativo no estudo da literatura pseudoepígrafa é a questão da
autenticidade e datação desses textos. Como observado por Michael E. Stone em
"Pseudepigrapha and Canonical Writings", a literatura pseudoepígrafa

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LITERATURA APÓCRIFA 11

frequentemente carrega a marca de múltiplas edições e revisões, tornando a tarefa


de datação e autenticação uma tarefa complexa (Stone, 1980). Isso nos lembra que o
estudo desses textos requer cuidado e humildade, reconhecendo as limitações do
nosso conhecimento atual e a necessidade de contínuo aprendizado.

4. A Influência da Literatura Pseudoepígrafa na Formação Teológica


Apesar de não serem canonizados, os textos pseudoepígrafos exerceram uma
profunda influência sobre o desenvolvimento da teologia cristã. De acordo com John
J. Collins, em seu livro "Além da Comunidade de Qumran: O Movimento Sectário dos
Manuscritos do Mar Morto" (Collins, 2010), várias tradições apocalípticas e messiânicas
encontradas no Novo Testamento têm suas raízes na literatura pseudoepígrafa. Tais
textos revelam um fervor escatológico que caracteriza o judaísmo do Segundo
Templo e que permeia o Novo Testamento, particularmente nos escritos de Paulo e
no livro do Apocalipse.

D. DEFINIÇÃO E ORIGEM DA LITERATURA DEUTEROCANÔNICA


A literatura deuterocanônica, uma classificação essencialmente empregada no contexto
cristão, é um conjunto de escritos considerados inspirados e, portanto, sagrados. No
entanto, eles não foram incluídos no cânon judaico da Bíblia Hebraica, mas são
reconhecidos por certas tradições cristãs, especialmente a Católica Romana e a Ortodoxa
Oriental. Seu status tem sido objeto de debates teológicos prolongados, proporcionando
ricos insights sobre a formação da Bíblia e a história do pensamento cristão.

1. Definição de Literatura Deuterocanônica


A literatura deuterocanônica é composta por sete livros (Tobias, Judite, Baruque,
Eclesiástico, Sabedoria, I Macabeus, II Macabeus) e adições a dois livros canônicos
(Ester e Daniel) que são aceitos pela Igreja Católica e Ortodoxa como parte do Antigo
Testamento, mas não são reconhecidos por protestantes e judeus. Segundo o teólogo
Richard Bauckham, a expressão "deuterocanônico" significa "segundo cânon" e indica
a aceitação tardia desses livros no cânon (Bauckham, 2010).

2. Origens e Aceitação da Literatura Deuterocanônica


A maioria dos livros deuterocanônicos foi escrita em grego, dentro do período
intertestamentário (entre o Antigo e o Novo Testamento), em contextos helenísticos.
A aceitação desses livros como canônicos varia entre as tradições cristãs. No Concílio
de Trento (1546), a Igreja Católica afirmou formalmente a canonicidade desses livros
contra a Reforma Protestante, que rejeitava a sua inclusão, aderindo ao cânon judaico
(Metzger & Coogan, 1993).

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3. Conteúdo e Propósito da Literatura Deuterocanônica


Os livros deuterocanônicos abrangem uma variedade de gêneros literários e temas.
Por exemplo, os livros de Macabeus contam a história da resistência judaica contra a
supressão selêucida. A Sabedoria de Salomão e o Eclesiástico oferecem reflexões
filosóficas e éticas. Baruque e a Carta de Jeremias são atribuídos a contemporâneos
do profeta Jeremias e refletem sobre o exílio e a lei (Bergant, 2002). Através desses
livros, podemos obter uma visão valiosa do pensamento judeu durante o período
intertestamentário.

4. Significado da Literatura Deuterocanônica no Cristianismo


Embora a literatura deuterocanônica não seja aceita por todas as tradições cristãs, ela
tem um impacto significativo sobre o pensamento e a teologia cristã. Por exemplo,
em II Macabeus 12:42-46, encontramos a ideia da eficácia das orações pelos mortos,
que é fundamental para a doutrina do purgatório no catolicismo. Como afirmou o
teólogo católico Karl Rahner, os livros deuterocanônicos "contribuem para a plenitude
da revelação cristã" (Rahner, 2004).

E. A IMPORTÂNCIA DA LITERATURA APÓCRIFA, PSEUDEPÍGRAFA E


DEUTEROCANÔNICA
A Literatura Apócrifa, Pseudepígrafa e Deuterocanônica, embora com frequência
negligenciada na tradição cristã, possui relevância significativa no estudo e na
compreensão da formação das Sagradas Escrituras. Trata-se de um corpus de textos que,
apesar de não serem considerados canônicos por todas as vertentes cristãs, fornecem
uma rica visão sobre as tradições e o pensamento dos primeiros séculos do Cristianismo
e do Judaísmo. Segundo Martínez e Tigchelaar (1997), estudiosos do Mar Morto, esses
escritos apontam para uma pluralidade de ideias e interpretações que ultrapassam as
narrativas comumente aceitas.

1. Contextualização Histórica e Cultural da Literatura Apócrifa, Pseudepígrafa e


Deuterocanônica
A literatura apócrifa, pseudepígrafa e deuterocanônica provém de uma época onde a
definição de um cânon bíblico ainda era uma questão em aberto. Como David Aune
(2003) aponta, muitos desses textos foram compostos num período de cerca de 200
anos antes de Cristo até o final do século I d.C. Eles refletem as aspirações, temores,
questionamentos e convicções das comunidades judaicas e cristãs primitivas. Além
disso, tais textos demonstram o rico diálogo inter-religioso e cultural que ocorria no
Mediterrâneo Oriental, conforme ressalta Daniel Harrington (2005).

2. Contribuição Teológica da Literatura Apócrifa, Pseudepígrafa e

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Deuterocanônica
A importância teológica desses textos é evidenciada quando se observa que eles
contribuíram para a formação da teologia cristã primitiva. James H. Charlesworth
(1985), por exemplo, destaca como o Evangelho de Tomé influenciou o entendimento
da natureza de Cristo nos primeiros séculos. Assim como, a ascensão de Isaias ajudou
a moldar a concepção de céu e inferno. Apesar de não serem reconhecidos como
canônicos por todos, eles ainda proporcionam uma percepção mais profunda das
crenças e práticas das primeiras comunidades cristãs.

3. A Importância da Literatura Apócrifa, Pseudepígrafa e Deuterocanônica para a


Exegese e Hermenêutica Bíblica

A leitura desses textos oferece uma chave interpretativa para entender passagens
bíblicas de difícil compreensão. Como observado por Collins (1998), o Primeiro Livro
de Enoque ajuda a elucidar referências enigmáticas a "filhos de Deus" em Gênesis
6:1-4. Assim, mesmo não sendo aceitos em todos os cânones, sua utilidade para a
exegese e hermenêutica bíblica é inquestionável.

4. A Influência da Literatura Apócrifa, Pseudepígrafa e Deuterocanônica na


Tradição Cristã
Finalmente, é impossível ignorar a influência desses escritos na tradição cristã. Como
observa Bart Ehrman (2003), textos como o Protoevangelho de Tiago tiveram um
papel considerável na formação da Mariologia cristã. O texto, embora apócrifo,
lançou as bases para conceitos como a virgindade perpétua de Maria e a Imaculada
Conceição, ambos aceitos posteriormente pela Igreja Católica.

CONCLUSÃO

Compreender as semelhanças e diferenças entre os textos apócrifos, pseudepígrafos e


deuterocanônicos é fundamental para qualquer estudioso da Bíblia e da tradição cristã. Cada
um desses grupos de textos traz um olhar único sobre o cristianismo antigo e influenciou
de maneiras distintas a formação da fé cristã.

Embora a literatura apócrifa, pseudepígrafa e deuterocanônica possa inicialmente parecer


marginal para a fé cristã, uma análise mais aprofundada revela seu profundo valor teológico
e histórico. Esses textos oferecem uma visão mais abrangente do desenvolvimento do
pensamento judaico-cristão na antiguidade e dão voz a correntes de pensamento que de
outra forma poderiam ter sido esquecidas.

Em resumo, a literatura apócrifa do Antigo e Novo Testamento é uma rica fonte de


conhecimento sobre a história e teologia do judaísmo e do cristianismo. Apesar de sua

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LITERATURA APÓCRIFA 14

exclusão do cânon bíblico, esses textos oferecem insights valiosos sobre as crenças e práticas
religiosas da antiguidade, bem como a formação do cânon bíblico.

A literatura pseudepígrafa representa uma rica tapeçaria de escritos que preenche as lacunas
da narrativa bíblica, oferece uma janela para o contexto do primeiro século, apresenta
desafios interpretativos e exerce uma profunda influência sobre a formação da teologia
cristã. Apesar dos desafios associados ao estudo desses textos, eles continuam a oferecer
um recurso valioso para o entendimento mais profundo da Bíblia e do desenvolvimento do
pensamento judaico-cristão.

A literatura deuterocanônica é um conjunto fascinante e valioso de textos que enriquecem


nosso entendimento da tradição bíblica. Seu status canônico pode ser objeto de debates,
mas seu valor histórico, teológico e literário é indiscutível.

A literatura apócrifa, pseudepígrafa e deuterocanônica não deve ser descartada como


irrelevante ou herética, mas deve ser entendida como uma rica fonte de informações que
enriquece nossa compreensão do desenvolvimento histórico, cultural e teológico das
primeiras comunidades judaicas e cristãs.

REVISÃO

1. Como a literatura apócrifa, pseudepígrafa e deuterocanônica se diferencia em


termos de autenticidade, reconhecimento eclesiástico e função dentro da
tradição religiosa cristã, e que impacto tiveram na formação da fé cristã?
A literatura apócrifa consiste em escritos de origens obscuras que, apesar de surgirem
em um contexto religioso similar àquele dos textos canônicos, não foram incluídos
na Bíblia. Os pseudepígrafos, por sua vez, são textos atribuídos a autores que
provavelmente não os escreveram. Já os deuterocanônicos são aceitos pela Igreja
Católica e pela Igreja Ortodoxa, mas não foram incluídos no cânon judaico ou na
Bíblia protestante. Todos esses textos tiveram um impacto na formação da fé cristã,
fornecendo perspectivas complementares, expansivas ou até contraditórias em
relação aos textos canônicos.

2. Como os textos apócrifos do Antigo e Novo Testamento podem contribuir


para a nossa compreensão da história e teologia do judaísmo e do
cristianismo?
Os textos apócrifos do Antigo e Novo Testamento, apesar de não serem reconhecidos
oficialmente como parte do cânon bíblico, são fontes importantes para a
compreensão da história e teologia do judaísmo e do cristianismo. Eles oferecem uma
visão das crenças e práticas de diferentes comunidades religiosas na antiguidade e

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LITERATURA APÓCRIFA 15

ajudam a lançar luz sobre a formação do cânon bíblico. Além disso, a análise desses
textos pode revelar perspectivas alternativas e vozes marginalizadas na história da
religião.

3. Qual a relevância da literatura pseudoepígrafa no estudo teológico do Novo


Testamento e que desafios surgem ao lidar com tais textos?
A literatura pseudoepígrafa desempenha um papel vital no estudo teológico do Novo
Testamento. Ela nos permite entender melhor o contexto do primeiro século,
enriquece nosso entendimento das narrativas bíblicas e demonstra a variedade de
crenças existentes no judaísmo do Segundo Templo. Ao mesmo tempo, enfrentamos
desafios ao lidar com esses textos, incluindo questões de autenticidade e datação.
Isso requer uma abordagem cuidadosa e humilde, reconhecendo as limitações de
nosso conhecimento atual e a necessidade de aprendizado contínuo.

4. Como a aceitação variada da literatura deuterocanônica nas tradições cristãs


afeta nossa compreensão do desenvolvimento do cânon bíblico e da formação
da teologia cristã?
A aceitação variada da literatura deuterocanônica destaca a diversidade das tradições
cristãs e a complexidade da formação do cânon bíblico. Ela evidencia que a
determinação de quais textos são considerados "inspirados" e "canônicos" não foi um
processo simples ou uniforme, mas sim uma evolução que reflete contextos
históricos, teológicos e culturais específicos. Além disso, a inclusão de livros
deuterocanônicos em algumas tradições cristãs contribuiu para a formação de certas
doutrinas e práticas, como a doutrina do purgatório no catolicismo.

5. Como a literatura apócrifa, pseudepígrafa e deuterocanônica pode contribuir


para a interpretação e compreensão da formação da Bíblia e da fé cristã?
A literatura apócrifa, pseudepígrafa e deuterocanônica oferece uma perspectiva
valiosa sobre o pensamento e as práticas das primeiras comunidades judaicas e
cristãs. Ela pode ajudar a explicar e contextualizar passagens bíblicas que são difíceis
de entender, e contribuir para o estudo da formação da teologia cristã. Além disso,
pode iluminar a rica interação cultural e religiosa que ocorreu durante o período de
sua composição.

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LITERATURA APÓCRIFA 17

CAPÍTULO 02

LITERATURA APÓCRIFA

IMPORTÂNCIA E CONTROVÉRSIAS

" Os livros apócrifos podem não fazer parte do cânon bíblico, mas eles nos oferecem uma
visão valiosa sobre as várias maneiras pelas quais os primeiros seguidores de Cristo
interpretaram seus ensinamentos."
Elaine Pagels

INTRODUÇÃO

A literatura apócrifa é um conjunto de escritos antigos que, embora possuam significância


histórica, cultural ou religiosa, não foram incluídos no cânon oficial da Bíblia. A natureza
desses textos é variada, com escritos que vão desde os evangelhos alternativos até livros
proféticos e epístolas. Este documento busca analisar de maneira mais profunda esse
conjunto literário, fornecendo uma visão abrangente sobre sua origem, seu conteúdo e sua
importância.

Os textos apócrifos representam uma fascinante e significativa dimensão do cânone cristão


que permaneceu, em muitos aspectos, inexplorada e incompreendida. O termo "apócrifo"
provém do grego "apokryphos", significando "oculto" ou "secreto". Estes textos são assim
designados por não estarem incluídos no cânone oficial das escrituras sagradas do
cristianismo, quer seja a Bíblia católica, quer a protestante. Este estudo busca elucidar a
origem destes textos a partir de quatro perspectivas: Histórica, Sociocultural, Teológica e
Literária.

A. A ORIGEM DOS TEXTOS APÓCRIFOS


Segundo Elaine Pagels, famosa teóloga e estudiosa dos textos apócrifos, a maior parte
desses escritos foi produzida entre os séculos II e IV (Pagels, 1979). Durante este período,
a cristandade primitiva era extremamente diversificada, com uma série de crenças e
interpretações competindo pela aceitação. A literatura apócrifa representa, portanto, as
vozes daqueles grupos que foram eventualmente marginalizados à medida que o cânon
bíblico se solidificava.

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LITERATURA APÓCRIFA 18

1. Origem Histórica dos Textos Apócrifos


Historicamente, a formação dos textos apócrifos data desde o período
intertestamentário (entre os séculos III a.C e I d.C) até os primeiros séculos do
cristianismo primitivo. Segundo o historiador Ehrman (2003), essa foi uma era de
efervescência religiosa e política, que suscitou uma proliferação de escritos que
refletiam as diversas compreensões sobre a natureza divina, o papel dos profetas e a
vinda do Messias. A necessidade de clarificar e unificar a doutrina cristã levou à
consolidação do cânone bíblico, deixando muitos textos fora deste âmbito. Portanto,
a origem destes textos se encontra na diversidade de vozes e interpretações que
caracterizaram os primeiros séculos do cristianismo (EHARMAN, Bart. Os Evangelhos
Perdidos: As raízes do cristianismo e os textos apócrifos. São Paulo: Planeta, 2003).

2. Origem Sociocultural dos Textos Apócrifos

A origem dos textos apócrifos também pode ser analisada sob a perspectiva
sociocultural. Pagels (1989) argumenta que muitos desses textos surgiram de
comunidades marginalizadas ou perseguidas, buscando afirmar suas crenças e
valores. Por exemplo, o Evangelho de Tomé, considerado apócrifo, expressa uma
visão gnosticista que contrasta com o cristianismo ortodoxo, dando mais ênfase ao
autoconhecimento do que à redenção através da crucificação de Cristo (PAGELS,
Elaine. Os Evangelhos Gnósticos. Rio de Janeiro: Rocco, 1989).

3. Origem Teológica dos Textos Apócrifos


Em termos teológicos, os textos apócrifos surgem como um resultado das diferenças
doutrinárias dentro do cristianismo primitivo. O pesquisador Robinson (1990) nos
mostra como os diferentes grupos cristãos, desde os gnósticos até os proto-
ortodoxos, produziram textos que refletiam suas particulares compreensões
teológicas. Desta forma, cada texto apócrifo pode ser entendido como um reflexo das
questões teológicas enfrentadas por determinada comunidade (ROBINSON, James.
The Nag Hammadi Library in English. San Francisco: Harper & Row, 1990).

4. Origem Literária dos Textos Apócrifos


A origem literária dos textos apócrifos reflete a criatividade e a riqueza do contexto
cultural em que foram escritos. De acordo com o estudioso VanderKam (2002), esses
textos empregam uma variedade de formas literárias, desde narrativas alegóricas até
visões apocalípticas. Além disso, eles muitas vezes recontextualizam e reinterpretam
histórias e personagens conhecidos, oferecendo novas perspectivas sobre eventos e
figuras bíblicas (VANDERKAM, James. The Book of Jubilees. Sheffield: Sheffield
Academic Press, 2002).

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LITERATURA APÓCRIFA 19

B. CONTEÚDO DA LITERATURA APÓCRIFA


Os textos apócrifos possuem uma variedade impressionante de conteúdo. De acordo
com Bart Ehrman, um conhecido erudito bíblico, entre os escritos mais famosos estão os
evangelhos apócrifos, que incluem o Evangelho de Tomé, o Evangelho de Judas e o
Evangelho de Maria Madalena (Ehrman, 2003). Esses evangelhos oferecem perspectivas
únicas sobre a vida e o ensino de Jesus, muitas vezes divergindo significativamente das
versões encontradas nos evangelhos canônicos.

1. Natureza e Origens da Literatura Apócrifa

A palavra "apócrifo" vem do grego "apokryphos", que significa "oculto" ou


"escondido". Os textos apócrifos surgiram principalmente durante o período
intertestamentário (entre o Antigo e o Novo Testamento) e nos primeiros séculos da
era cristã. Conforme aponta Bart D. Ehrman em sua obra "Lost Scriptures: Books that
Did Not Make It into the New Testament" (2003), esses textos refletem uma variedade
de crenças e práticas religiosas da época.

2. Exemplos de Literatura Apócrifa


Entre os apócrifos do Antigo Testamento, destacam-se os livros de Enoque, Jubileus,
Tobias, Judite e os Macabeus, os quais, apesar de serem considerados canônicos
por algumas tradições cristãs (como a Ortodoxa e a Católica), não são aceitos por
outras (como a Protestante). No contexto do Novo Testamento, encontramos os
evangelhos de Tomé, Maria Madalena, Pedro, além dos Atos de Paulo e Tecla e
de Pilatos, entre outros. A diversidade desses textos, como bem observa Elaine
Pagels em "The Gnostic Gospels" (1979), ressalta a pluralidade de vozes e
interpretações presentes no início do cristianismo.

3. O Impacto da Literatura Apócrifa no Entendimento do Cristianismo Primitivo


A literatura apócrifa oferece uma visão mais ampla do panorama religioso da época,
complementando as informações fornecidas pelo cânon bíblico. Por exemplo, os
evangelhos apócrifos, como o de Tomé e Maria Madalena, apresentam ensinamentos
atribuídos a Jesus que não são encontrados nos evangelhos canônicos. Esse aspecto
é bem ilustrado por Marvin Meyer em "The Gnostic Gospels of Jesus" (2005), que
argumenta que esses textos lançam luz sobre os debates teológicos e as disputas
pelo poder que ocorreram entre os cristãos dos primeiros séculos.

4. As discussões em torno da Literatura Apócrifa

É essencial discutir a controvérsia em torno da literatura apócrifa. Para algumas


tradições cristãs, esses textos não possuem autoridade religiosa por serem
considerados fraudulentos ou hereges. No entanto, como R. Joseph Hoffman aponta

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LITERATURA APÓCRIFA 20

em "Jesus Fora dos Evangelhos" (1984), mesmo que esses textos não sejam
considerados autênticos ou inspirados, eles ainda têm valor histórico e cultural
significativo.

C. IMPORTÂNCIA DA LITERATURA APÓCRIFA


A literatura apócrifa desempenha um papel significativo para os estudiosos da Bíblia e
da história do cristianismo. Em sua obra "Um Novo Testamento: Uma Bíblia para o Século
21", Hal Taussig argumenta que esses textos fornecem uma janela para as múltiplas
formas de cristianismo que existiam nos primeiros séculos (Taussig, 2013). Eles revelam
a riqueza e a diversidade de interpretações cristãs e nos ajudam a entender melhor como
o cânon bíblico foi formado.

1. Contexto Histórico-Cultural
A literatura apócrifa nos oferece uma janela única para o mundo antigo. Como pontua
Ehrman (2003), "os escritos apócrifos revelam as crenças, esperanças, medos e
entendimentos daqueles que os escreveram e dos que os leram" (p. 45). Por exemplo,
o Livro de Enoque, um texto apócrifo do Antigo Testamento, nos proporciona uma
visão ampla sobre a concepção judaica do cosmos, a angelologia e a escatologia
durante o período do Segundo Templo. Deste modo, a literatura apócrifa pode ser
considerada uma fonte primária para a compreensão da história, das tradições e das
crenças antigas.

2. Papel no Desenvolvimento Teológico


Embora os textos apócrifos não sejam considerados canônicos, sua influência no
desenvolvimento teológico é notável. Como ressalta Vermes (2007), "muitos desses
textos desempenharam um papel na formação da teologia cristã primitiva" (p. 112). No
contexto do Novo Testamento, o Evangelho de Tomé, ainda que não reconhecido
como canônico, contém parábolas e ensinamentos que expandem e aprofundam a
compreensão de Jesus. Além disso, o livro apócrifo de Tobias contribui para a
compreensão do altruísmo e da piedade como virtudes cristãs.

3. Influência Literária
A literatura apócrifa também exerceu influência no campo literário, sendo fonte de
inspiração para autores e artistas ao longo dos séculos. A figura de Lilith, por exemplo,
aparece no Alfabeto de Ben Sira, um texto judeu medieval, e desde então tem sido
adotada na literatura e na arte popular. Como ressalta Lewis (2012), "a imagem de
Lilith como a primeira mulher, que se rebelou contra a ordem estabelecida, tem
fascinado os artistas por séculos" (p. 78).

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LITERATURA APÓCRIFA 21

4. Utilização na Prática Pastoral


É importante destacar que os textos apócrifos podem ter aplicação prática na
pastoral. Como argumenta Metzger (1997), "ao lidar com questões éticas e espirituais,
os textos apócrifos podem oferecer insights valiosos" (p. 160). De fato, muitos destes
textos tratam de questões humanas universais como a luta contra o mal, a busca pela
sabedoria, e a esperança na vida após a morte. Estes temas podem ser explorados em
sermões, estudos bíblicos e aconselhamento pastoral.

D. CONTROVÉRSIAS EM TORNO DA LITERATURA APÓCRIFA

Ao longo da história, os textos apócrifos foram frequentemente alvo de controvérsias.


Karen King, em sua análise do Evangelho de Maria, discute que muitos desses textos
foram descartados ou suprimidos porque desafiavam a autoridade das versões canônicas
(King, 2003). Hoje, esses textos continuam a gerar debates entre teólogos, historiadores
e crentes.

1. Contestação da Autoria

Uma das principais controvérsias envolve a autoria dos textos apócrifos. Uma série de
textos apócrifos, como o Evangelho de Tomé ou o Evangelho de Maria, são
atribuídos a figuras históricas significativas dentro da tradição cristã. No entanto,
como salientou Ehrman (2003), a maioria desses textos foram escritos muitos séculos
após os eventos que eles descrevem, o que torna a autoria real altamente duvidosa.
A contestação da autoria afeta diretamente a legitimidade desses textos e,
consequentemente, sua inclusão ou exclusão do cânon bíblico.

2. Divergências Doutrinárias
Os textos apócrifos, frequentemente, apresentam visões divergentes das doutrinas
estabelecidas. Um exemplo notável é o Evangelho de Judas, onde Judas Iscariotes é
retratado não como traidor, mas como o discípulo mais próximo de Jesus. Segundo
Pagels e King (2007), tal interpretação é conflitante com o relato canônico. Contudo,
é relevante observar que essa divergência doutrinária reflete a diversidade de crenças
no início do cristianismo, uma realidade muitas vezes obscurecida pela uniformidade
do cânon estabelecido.

3. Questões de Canonicidade
O que determina a inclusão ou exclusão de um texto no cânon bíblico é outra área
de debate intenso. A formação do cânon foi um processo longo, ocorrendo ao longo
de vários séculos. À medida que o cânon se estabelecia, textos que não se alinhavam
com o ensino e a tradição emergentes foram excluídos. Segundo Metzger (1987), este
processo foi fortemente influenciado por considerações teológicas, sociopolíticas e

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LITERATURA APÓCRIFA 22

culturais, tornando a questão da canonicidade altamente debatida.

4. Relevância Teológica dos Textos Apócrifos


Apesar das controvérsias, muitos estudiosos defendem a relevância teológica dos
textos apócrifos. Segundo Bauckham (2017), esses textos oferecem um vislumbre do
pensamento cristão primitivo e da diversidade de crenças presentes durante a
formação do cânon. Além disso, muitos desses textos têm profundo valor espiritual e
inspiracional para comunidades cristãs ao redor do mundo, apesar de não serem
reconhecidos como parte do cânon oficial.

E. USO MODERNO DA LITERATURA APÓCRIFA


A literatura apócrifa não é apenas de interesse acadêmico; ela também encontrou um
lugar na espiritualidade moderna. Segundo Marvin Meyer, muitos leitores
contemporâneos encontram nos textos apócrifos uma espiritualidade mais inclusiva e
menos dogmática (Meyer, 2007). Esses escritos, assim, não apenas enriquecem nossa
compreensão da história, mas também podem nos ajudar a repensar a prática religiosa
hoje. Dessa forma, este tópico discutirá o uso moderno da literatura apócrifa sob quatro
perspectivas: o estudo acadêmico, a influência na literatura contemporânea, a prática
religiosa e a representação na mídia popular.

1. O Estudo Acadêmico
A literatura apócrifa tem sido uma área de interesse crescente entre acadêmicos de
várias disciplinas, incluindo teologia, história e literatura. Segundo Gomes (2015), "Os
textos apócrifos oferecem uma visão diferenciada sobre o contexto do início do
cristianismo e judaísmo, que não é encontrada nos textos canônicos." As histórias e
ensinamentos contidos nos apócrifos frequentemente iluminam aspectos das
sociedades antigas e seus valores culturais e religiosos, trazendo uma nova
profundidade ao entendimento dos primeiros séculos da era cristã.

2. Influência na Literatura Contemporânea


Na literatura moderna, muitos autores têm buscado inspiração na literatura apócrifa.
Para citar um exemplo notável, a obra "O Evangelho Segundo Jesus Cristo" (1991) de
José Saramago, usa o Evangelho de Tomé, um texto apócrifo, para oferecer uma nova
visão sobre a vida de Jesus. Esse livro, e muitos outros, mostram o valor que a
literatura apócrifa tem para inspirar novas formas de pensamento e novas
interpretações das histórias e personagens bíblicas.

3. Prática Religiosa
Ainda que a literatura apócrifa não seja reconhecida por todas as denominações

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LITERATURA APÓCRIFA 23

cristãs, existem grupos que valorizam e incorporam esses textos em sua prática
religiosa. Conforme evidencia Ribeiro (2018), "Grupos gnósticos contemporâneos,
como o movimento Cátaro, mantém uma relação próxima com textos apócrifos, como
o Evangelho de Tomé e o Evangelho de Maria Madalena". Assim, a literatura apócrifa
tem relevância não só no plano histórico-cultural, mas também na esfera religiosa.

4. Representação na Mídia Popular

A mídia popular também tem apresentado um interesse cada vez maior na literatura
apócrifa. Filmes, séries de televisão e até mesmo videogames têm utilizado estes
textos como uma fonte de material para contar histórias envolventes e intrigantes.
Como exemplo, o romance "O Código da Vinci" (2003), de Dan Brown, traz elementos
de vários textos apócrifos, e teve um impacto significativo na cultura popular.

CONCLUSÃO

Os textos apócrifos, portanto, oferecem uma rica tapeçaria de vozes, ideias e interpretações
que expandem nossa compreensão do cristianismo primitivo. Eles nos convidam a ver além
do cânon bíblico e a explorar a diversidade de crenças e práticas que existiam nos primeiros
séculos do cristianismo. Além disso, os textos apócrifos nos desafiam a pensar criticamente
sobre a formação do cânon bíblico e a natureza da autoridade religiosa.

A origem dos textos apócrifos é uma questão que se desdobra em diversas camadas de
análise. Seja histórica, sociocultural, teológica ou literária, cada perspectiva nos ajuda a
entender como esses textos se desenvolveram no contexto do cristianismo primitivo e que
significado eles podem ter para os cristãos de hoje.

Embora não sejam parte do cânon oficial, os textos apócrifos desempenham um papel
fundamental no estudo da teologia cristã. Eles fornecem um vislumbre valioso do mundo
antigo, influenciaram o desenvolvimento teológico, inspiraram a literatura e a arte, e ainda
podem enriquecer a prática pastoral.

As controvérsias em torno da autoria, divergências doutrinárias, canonicidade e relevância


teológica desses textos revelam a complexidade e a diversidade do pensamento cristão
primitivo.

O uso moderno da literatura apócrifa demonstra o valor desses textos, tanto na academia
como na cultura popular. Longe de serem meros artefatos históricos, os apócrifos oferecem
uma perspectiva distinta sobre o cristianismo primitivo, além de inspirar novos caminhos
para a literatura, a prática religiosa e a mídia.

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LITERATURA APÓCRIFA 24

REVISÃO

1. Como as circunstâncias históricas, socioculturais, teológicas e literárias


contribuíram para a origem dos textos apócrifos no cristianismo primitivo?
As circunstâncias históricas do cristianismo primitivo, marcado por uma grande
diversidade de vozes e interpretações, contribuíram para a produção dos textos
apócrifos. Por sua vez, as condições socioculturais, sobretudo em comunidades
marginalizadas, também foram determinantes para o surgimento destes textos,
expressando crenças e valores que diferiam da ortodoxia cristã. Além disso,
divergências teológicas desempenharam um papel fundamental, com diferentes
grupos cristãos escrevendo textos que refletiam suas próprias doutrinas. Por último,
a criatividade literária deu forma a esses textos, usando uma variedade de formas e
gêneros para transmitir mensagens religiosas.

2. Como os textos apócrifos do Antigo e Novo Testamento contribuem para a


compreensão da história e da teologia cristã, e por que esses textos são
controversos em algumas tradições cristãs?
Os textos apócrifos fornecem uma visão adicional e complementar ao panorama
religioso da época, apresentando diferentes perspectivas, ensinamentos e
interpretações. Por exemplo, alguns evangelhos apócrifos apresentam ensinamentos
atribuídos a Jesus que não são encontrados nos evangelhos canônicos. Apesar disso,
esses textos são controversos em algumas tradições cristãs, pois não são
considerados autênticos ou inspirados. No entanto, ainda possuem valor histórico e
cultural significativo.

3. Qual a relevância da literatura apócrifa no campo da teologia cristã e como ela


tem sido usada ao longo dos séculos em diferentes contextos?
A literatura apócrifa, embora não canônica, ocupa um lugar de destaque na teologia
cristã. Ela fornece insights histórico-culturais inestimáveis, influencia o
desenvolvimento teológico, inspira a literatura e a arte, e tem aplicação prática na
pastoral. Dessa forma, os textos apócrifos desempenham um papel essencial na
compreensão da formação e evolução do pensamento religioso e cultural.

4. Como as controvérsias em torno da autoria, divergências doutrinárias,


questões de canonicidade e relevância teológica dos textos apócrifos
contribuem para o nosso entendimento do pensamento cristão primitivo?
As controvérsias envolvendo a literatura apócrifa iluminam aspectos fundamentais da
formação do cristianismo. A questão da autoria, por exemplo, nos faz refletir sobre a
autoridade e a legitimidade dos textos sagrados. As divergências doutrinárias revelam

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LITERATURA APÓCRIFA 25

a pluralidade de crenças no início do cristianismo. A controvérsia em torno da


canonicidade destaca o caráter processual e influenciado por contextos sociopolíticos
da formação do cânon bíblico. Por fim, a relevância teológica desses textos apócrifos
demonstra que, apesar de não estarem incluídos no cânon, eles ainda possuem valor
e significado para muitas comunidades cristãs ao redor do mundo.

5. Como a literatura apócrifa tem sido incorporada e valorizada na sociedade


moderna, seja no âmbito acadêmico, literário, religioso ou na mídia popular?
A literatura apócrifa tem experimentado um renascimento em várias áreas.
Academicamente, oferece uma visão ímpar sobre o contexto do início do cristianismo
e judaísmo. Na literatura contemporânea, autores como José Saramago utilizam esses
textos para construir narrativas inovadoras. No âmbito religioso, alguns grupos
gnósticos veem nos apócrifos uma fonte de ensinamento e inspiração. Por último, a
mídia popular recorre aos apócrifos para criar enredos intrigantes que despertam a
curiosidade do público.

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LITERATURA APÓCRIFA 27

CAPÍTULO 03

LITERATURA PSEUDEPÍGRAFA

ESCRITOS SOB NOME FALSO

" A Bíblia não é apenas um livro. Ela é um conjunto de livros, uma biblioteca, e, como tal,
contém uma grande variedade de pontos de vista. Não devemos ignorar aqueles que estão
fora do cânon, como os apócrifos, que oferecem perspectivas valiosas."
Marcus Borg

INTRODUÇÃO

Os Pseudepígrafos são uma categoria de literatura judaica e cristã antiga que existe fora do
cânon tradicional da Bíblia. O termo "Pseudepígrafo" vem do grego e significa "escrito sob
um nome falso", referindo-se à prática comum desses textos de serem atribuídos a
personagens bíblicos ou líderes religiosos notáveis. Segundo Charlesworth (1983), essa
prática não era necessariamente uma forma de engano, mas uma maneira de honrar figuras
espirituais influentes e legitimar a mensagem do texto.

A Literatura Pseudepígrafa representa uma coleção fascinante e diversificada de textos que


surgiram no período intertestamental e nos primeiros séculos do cristianismo. Esses escritos,
atribuídos falsamente a figuras bíblicas ou lendárias da antiguidade, não são oficialmente
aceitos como parte do cânone das escrituras judaico-cristãs, mas têm significativo valor
histórico e teológico.

A. DEFINIÇÃO E CARACTERÍSTICAS DOS PSEUDEPÍGRAFOS


"Pseudepígrafo" deriva do grego pseudēs, que significa "falso", e epigraphē, que significa
"inscrição" ou "atribuição". Portanto, os pseudepígrafos são trabalhos atribuídos
erroneamente a autores que não os escreveram (VanderKam, 2002). Esses textos
abrangem uma variedade de gêneros, incluindo cartas, testamentos, apocalipses e
narrativas. Embora não sejam canônicos, eles oferecem valiosas perspectivas sobre a
evolução do pensamento religioso durante um período de grande mudança social e
política.

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LITERATURA APÓCRIFA 28

1. Definição dos Pseudepígrafos


Pseudepígrafos são textos antigos que não foram incluídos no cânon das Escrituras
Hebraicas ou Cristãs. Segundo Ehrman (2003), essa exclusão deve-se principalmente
à atribuição pseudônima, que era vista como inaceitável ou enganosa pelas
comunidades religiosas que formaram o cânon. No entanto, esses textos ainda
desempenhavam um papel importante na formação da teologia e prática religiosa de
muitos grupos.

A natureza desses documentos varia significativamente, indo desde profecias e


revelações, até histórias lendárias, hinos, orações e textos de sabedoria. Alguns dos
pseudepígrafos mais conhecidos incluem o "Livro de Enoque", "A Assunção de
Moisés" e o "Evangelho de Tomé".

2. Contexto histórico e cultural dos Pseudepígrafos

Os pseudepígrafos surgiram em um contexto histórico em que a autoridade religiosa


era frequentemente baseada na tradição. Atribuir um texto a uma figura bíblica
importante conferia a esse texto um senso de antiguidade e autoridade (Bautch,
2016). Além disso, os pseudepígrafos refletem as questões teológicas e sociais de seu
tempo, proporcionando uma visão única da história religiosa.

Por exemplo, o "Livro de Enoque" reflete a crença apocalíptica do Segundo Templo


no Juízo Final e na existência de anjos caídos. Já o "Evangelho de Tomé" representa
uma tradição cristã gnóstica que enfatizava o conhecimento secreto como meio de
salvação.

3. Impacto dos Pseudepígrafos na Teologia Cristã


Apesar de não serem considerados canônicos, os pseudepígrafos tiveram um impacto
notável na formação da teologia cristã. De acordo com Bockmuehl (2012), esses
textos fornecem informações valiosas sobre as crenças e práticas das comunidades
judaicas e cristãs antigas.

Além disso, certos pseudepígrafos, como o "Livro de Enoque", são referenciados e


citados em livros canônicos do Novo Testamento, como a Epístola de Judas (Judas
1:14-15). Isso ilustra a influência desses textos sobre os escritores bíblicos.

4. Valor dos Pseudepígrafos para Estudos Bíblicos Modernos

Os pseudepígrafos são de grande valor para os estudiosos da Bíblia, pois


proporcionam uma perspectiva mais ampla sobre o mundo judaico-cristão antigo.
Segundo VanderKam e Flint (2013), esses textos ajudam a entender o contexto no
qual a Bíblia foi escrita, o que pode enriquecer nossa interpretação das Escrituras.

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LITERATURA APÓCRIFA 29

B. PSEUDEPÍGRAFOS DO ANTIGO TESTAMENTO


A literatura pseudepígrafa do Antigo Testamento refere-se a uma variedade de textos
antigos não canônicos que, embora não incluídos no cânon judaico-cristão, possuem
indubitável valor histórico e teológico. Embora esses textos não sejam universalmente
aceitos como sagrados, eles oferecem insights valiosos sobre a diversidade e o
desenvolvimento do pensamento judaico-cristão durante os séculos antes e depois de
Cristo.

Os Pseudepígrafos do Antigo Testamento, também conhecidos como intertestamentais,


representam um conjunto rico de textos produzidos entre o final do período do Antigo
Testamento e o início do Novo Testamento (Collins, 2018). Uma obra exemplar é o "Livro
de Enoque", um texto complexo que apresenta visões apocalípticas e discute temas
como a queda dos anjos e o juízo final. Embora não seja canônico para a maioria das
denominações cristãs, é citado na Epístola de Judas no Novo Testamento, demonstrando
sua influência.

1. A Natureza dos Pseudepígrafos


Os pseudepígrafos são geralmente entendidos como escritos que usam nomes falsos
ou pseudônimos. São obras atribuídas a personagens bíblicos ou personagens
históricos antigos, quando a autoria real é diferente ou desconhecida. Um bom
exemplo é o Livro de Enoque, atribuído a Enoque, bisavô de Noé (Gênesis 5:18),
embora seja evidente que ele não seja o autor real (Nickelsburg, George W.E., 2001).
Isso não diminui seu valor, mas nos dá uma ideia da prática comum na época de
atribuir a autoria a figuras de autoridade para dar maior peso ao texto.

2. Valor dos Pseudepígrafos

O valor dos pseudepígrafos não reside na sua legitimidade canônica, mas no que eles
revelam sobre a vida e o pensamento da época. Segundo J. H. Charlesworth, em sua
obra "Pseudepígrafa do Antigo Testamento" (2003), eles fornecem um rico retrato dos
primeiros séculos do judaísmo e do cristianismo. Estes textos são evidências de
diversas correntes de pensamento, mostrando como as tradições religiosas foram
adaptadas e reinterpretadas em diferentes contextos históricos e culturais.

3. A Influência dos Pseudepígrafos

Os pseudepígrafos influenciaram tanto o judaísmo quanto o cristianismo de maneira


significativa. Podemos observar, por exemplo, a presença de conceitos extraídos de
obras pseudepígrafas no Novo Testamento. O Apocalipse de Pedro, embora não
incluído no cânon, influenciou a visão cristã do inferno (Bauckham, Richard, 1998).
Além disso, os pseudepígrafos ajudaram a moldar as primeiras visões escatológicas,
angelológicas e messiânicas do judaísmo e do cristianismo.

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LITERATURA APÓCRIFA 30

4. O Desafio da Autenticidade
A determinação da autenticidade e da datação dos pseudepígrafos apresenta
desafios. Como os manuscritos foram transmitidos ao longo de séculos por diversas
comunidades e culturas, eles sofreram alterações e acréscimos, tornando a tarefa de
recuperar o "texto original" particularmente difícil (Boccaccini, Gabriele, 2005). No
entanto, por meio do trabalho cuidadoso de acadêmicos, tem sido possível construir
uma compreensão confiável desses textos.

C. PSEUDEPÍGRAFOS DO NOVO TESTAMENTO

Os Pseudepígrafos do Novo Testamento consistem principalmente em evangelhos, atos,


apocalipses e epístolas que não foram incluídos no cânone do Novo Testamento. Estes
textos, muitas vezes produzidos em contextos gnósticos ou outras correntes
marginalizadas do cristianismo primitivo, oferecem uma visão alternativa da vida e
ensinamentos de Jesus e dos apóstolos. Um exemplo notável é o "Evangelho de Tomé",
uma coletânea de ditos atribuídos a Jesus, cuja interpretação tem sido objeto de amplo
debate acadêmico (Pagels, 2005). São obras frequentemente atribuídas a personagens
bíblicos notáveis, mas que os estudiosos geralmente concordam que não foram escritas
pelos autores a quem foram atribuídas. Estes textos são, por vezes, referidos como
"apócrifos do Novo Testamento" ou "literatura extracanônica do Novo Testamento".

1. Os Tipos de Pseudepígrafos do Novo Testamento

A literatura pseudepígrafa do Novo Testamento abrange uma variedade de gêneros,


incluindo evangelhos, atos, epístolas e apocalipses. Os evangelhos pseudepígrafos,
como o Evangelho de Tomé, o Evangelho de Pedro e o Evangelho de Maria,
oferecem perspectivas alternativas sobre a vida, morte e ensinamentos de Jesus. São
atos pseudepígrafos os Atos de Paulo e Tecla, os Atos de João, entre outros. As
epístolas e os apocalipses pseudepígrafos, por sua vez, oferecem ensinamentos
espirituais e visões escatológicas atribuídas a várias figuras apostólicas.

2. Autoria Pseudepígrafa
A autoria pseudepígrafa, a prática de escrever em nome de outra pessoa, era comum
na antiguidade e servia a vários propósitos. Algumas vezes, autores escreveriam sob
um pseudônimo para homenagear a figura a quem a obra era atribuída. Em outros
casos, os autores utilizariam essa prática para emprestar autoridade à suas ideias,
fazendo-as parecer provenientes de uma figura apostólica ou bíblica respeitada.
Autores como Ehrman (2003) argumentam que essa prática de pseudepigrafia não
deve ser entendida pelos padrões modernos de falsificação, mas como uma convenção
literária aceitável na época.

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LITERATURA APÓCRIFA 31

3. A Recepção da Literatura Pseudepígrafa


Apesar da natureza apócrifa desses textos, eles desempenharam um papel
importante na formação da teologia cristã primitiva e na prática devocional. Embora
não tenham sido incluídos no cânon bíblico, muitos desses textos foram altamente
valorizados em várias comunidades cristãs e influenciaram o desenvolvimento do
pensamento cristão, conforme apontado por Layton (1987).

4. O Estudo Moderno da Literatura Pseudepígrafa


Hoje, os estudiosos da Bíblia reconhecem o valor da literatura pseudepígrafa do Novo
Testamento como fonte para o entendimento do desenvolvimento do cristianismo
primitivo. As pesquisas modernas proporcionam novas perspectivas sobre a
diversidade do pensamento cristão primitivo e sobre a maneira como diferentes
comunidades interpretavam as escrituras e a figura de Jesus.

D. INFLUÊNCIA E IMPACTO DOS PSEUDEPÍGRAFOS


Apesar de sua marginalização, os pseudepígrafos tiveram um papel significativo na
formação da teologia cristã. Além de fornecerem informações adicionais sobre figuras e
eventos bíblicos, esses textos influenciaram a formação de doutrinas, rituais e práticas
devocionais. Por exemplo, o "Apocalipse de Pedro" oferece uma das primeiras descrições
detalhadas do céu e do inferno, influenciando o desenvolvimento subsequente da
escatologia cristã (Ehrman, 2003).

1. A Influência dos Pseudepígrafos na Tradição Cristã e Judaica


Embora não sejam canônicos, os Pseudepígrafos tiveram um papel inegável na
formação e desenvolvimento das tradições cristãs e judaicas. Como aponta James H.
Charlesworth, em "O Antigo Testamento Pseudepígrafa & o Novo Testamento:
Prolegômenos para o Estudo das Origens Cristãs" (1985), o impacto destes textos se
estende desde a teologia até a prática ritual. Textos como o Livro de Enoque, por
exemplo, fornecem uma rica cosmologia e angelologia que influenciou o imaginário
cristão e judaico.

2. Pseudepígrafos e a Formação da Teologia Cristã


Os Pseudepígrafos contribuíram para a formação de conceitos teológicos
fundamentais no cristianismo. Como observado por Richard Bauckham em "O mundo
judaico em torno do Novo Testamento" (2008), a influência destes textos pode ser vista
no desenvolvimento de conceitos como a escatologia, messianismo, demonologia e
a ideia do Juízo Final. Além disso, alguns destes textos, como o Apocalipse de Pedro
e o Evangelho de Tomé, proporcionam uma visão alternativa das narrativas
canônicas, contribuindo para a pluralidade do pensamento cristão.

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LITERATURA APÓCRIFA 32

3. Pseudepígrafos e a Compreensão do Contexto Histórico


Os Pseudepígrafos servem também como um recurso valioso para a compreensão do
contexto histórico e cultural da época em que a Bíblia foi escrita. Eles fornecem
insights sobre a vida social, política e religiosa durante os períodos intertestamentário
e do primeiro século, como evidenciado por Bart D. Ehrman em "Forjado: Escrevendo
em Nome de Deus — Por que os Autores da Bíblia Não São Quem Pensamos que São"
(2011). Por exemplo, o Livro dos Jubileus oferece uma perspectiva única sobre a lei
judaica e a prática do sábado, além de lançar luz sobre as tensões entre judeus e
samaritanos.

4. Pseudepígrafos e a Crítica Textual


Os Pseudepígrafos também são fundamentais para a crítica textual da Bíblia. A análise
destes textos permite a identificação de alterações, adições e omissões que
ocorreram no processo de transmissão dos textos bíblicos. Este campo de estudo,
que envolve especialistas como Bruce M. Metzger em "O Cânon do Novo Testamento:
Sua Origem, Desenvolvimento e Significado" (1997), reconhece o valor dos
Pseudepígrafos como uma ferramenta para o entendimento da evolução dos textos
bíblicos.

E. O ESTUDO ACADÊMICO DOS PSEUDEPÍGRAFOS


Os pseudepígrafos constituem um campo de estudo extremamente importante para
teólogos, historiadores e estudiosos da Bíblia. O exame desses textos permite uma
melhor compreensão do contexto histórico e cultural em que o judaísmo e o cristianismo
primitivo se desenvolveram. Além disso, oferece uma visão das crenças e práticas
religiosas além do cânon oficial, revelando a diversidade de pensamento existente dentro
dessas tradições (Charlesworth, 2010).

1. Pseudepígrafos e o Contexto Histórico-Cultural

O estudo dos pseudepígrafos oferece uma compreensão aprofundada do contexto


histórico-cultural em que o judaísmo e o cristianismo primitivo se desenvolveram.
Dado o fato de que esses textos foram produzidos em um período de intensa
turbulência histórica e diversidade cultural, eles refletem a interação dinâmica entre
as tradições religiosas judaicas e cristãs e as culturas circundantes (Bautch &
Harrington, 2016). Por exemplo, o livro de Enoque, uma obra pseudepigráfica bem
conhecida, apresenta influências claras da cultura persa e grega, sugerindo um
diálogo intercultural contínuo.

2. Visão Além do Cânon Oficial


O estudo dos pseudepígrafos permite um olhar além do cânon oficial. Estes textos,

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LITERATURA APÓCRIFA 33

muitas vezes marginalizados, revelam uma diversidade de pensamento dentro das


tradições judaicas e cristãs. A natureza do cânon oficial muitas vezes deixa pouco
espaço para vozes dissidentes ou minoritárias. Entretanto, ao examinar obras como
os Atos de Paulo e Tecla ou o Evangelho de Tomé, descobrimos que existiam vários
pontos de vista que desafiavam a ortodoxia emergente (Ehrman, 2005).

3. Contribuições para a Compreensão das Crenças e Práticas Religiosas

Os pseudepígrafos são essenciais para entender a evolução das crenças e práticas


religiosas judaicas e cristãs. Textos como o Testamento dos Doze Patriarcas, por
exemplo, ilustram concepções de moralidade e ética que, embora não refletidas na
mesma forma no cânon oficial, ainda assim informaram a prática religiosa durante o
período do Segundo Templo. Além disso, os pseudepígrafos também lançam luz
sobre as expectativas escatológicas dos primeiros judeus e cristãos (Collins, 2018).

4. Influência dos Pseudepígrafos na Literatura Cristã e Judaica


Finalmente, os pseudepígrafos tiveram uma influência considerável na literatura cristã
e judaica subsequente. Muitos temas e imagens presentes nestes textos encontram
ecos na literatura medieval e moderna. A visão do apocalipse no livro de Enoque, por
exemplo, foi adaptada e reformulada em várias obras cristãs posteriores (VanderKam,
2010).

CONCLUSÃO

Os pseudepígrafos, apesar de não canônicos, são ferramentas valiosas para a compreensão


do desenvolvimento do pensamento judaico-cristão. Revelam um leque de crenças, práticas
e tradições que vão além do cânone oficial, proporcionando uma visão mais completa da
religiosidade no período intertestamental e nos primeiros séculos do cristianismo.

Os Pseudepígrafos, embora não sejam considerados canônicos, têm uma importância


inestimável para o entendimento do desenvolvimento da teologia judaico-cristã. Eles
servem como uma janela para o mundo do antigo judaísmo e do cristianismo primitivo,
fornecendo um contexto vital para nossa compreensão da Bíblia.

Embora a literatura pseudepígrafa do Antigo Testamento possa parecer um campo obscura


para muitos, sua importância no estudo do desenvolvimento do pensamento judaico-cristão
é inegável. Esses textos, embora não canônicos, oferecem uma rica visão da diversidade
religiosa e filosófica da época, e têm muito a nos ensinar sobre as origens da fé judaico-
cristã.

A literatura pseudepígrafa do Novo Testamento, embora muitas vezes deixada de lado em


estudos bíblicos mais tradicionais, tem um papel importante no entendimento do

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LITERATURA APÓCRIFA 34

cristianismo primitivo. Ela oferece um vislumbre da diversidade de crenças e práticas entre


os primeiros cristãos e fornece um contraponto fascinante ao cânon do Novo Testamento.

A importância dos Pseudepígrafos para o estudo da Bíblia e da teologia cristã não pode ser
subestimada. Esses textos servem como uma janela para a teologia, tradição, contexto
histórico e crítica textual, oferecendo uma perspectiva única sobre o desenvolvimento da
religião cristã e judaica.

Longe de serem simples curiosidades históricas, esses textos desafiam nossas percepções
preconcebidas e enriquecem nossa apreciação da diversidade e complexidade das tradições
judaicas e cristãs.

REVISÃO

1. Como os Pseudepígrafos, apesar de sua exclusão do cânon bíblico,


influenciaram o desenvolvimento da teologia cristã e a interpretação das
Escrituras?
Os Pseudepígrafos influenciaram a teologia cristã de várias maneiras. Primeiro, eles
refletem as crenças e práticas das comunidades judaicas e cristãs antigas, o que nos
permite entender melhor o contexto em que as doutrinas cristãs se desenvolveram.
Além disso, eles são citados em alguns livros do Novo Testamento, demonstrando
sua influência sobre os escritores bíblicos. Finalmente, eles são úteis para os
estudiosos modernos da Bíblia, pois fornecem uma visão mais ampla do mundo
judaico-cristão antigo, ajudando a enriquecer nossa interpretação das Escrituras.

2. Como a literatura pseudepígrafa do Antigo Testamento se encaixa no contexto


mais amplo da história e do desenvolvimento do pensamento judaico-cristão,
e quais são as implicações de sua influência no cristianismo primitivo?
A literatura pseudepígrafa do Antigo Testamento fornece um testemunho único dos
primeiros séculos do judaísmo e do cristianismo. Mostram a existência de uma ampla
gama de correntes de pensamento e interpretações de tradições sagradas dentro
dessas comunidades. Sua influência no cristianismo primitivo é vista na adoção de
conceitos e tradições presentes nesses textos, como a visão do inferno derivada do
Apocalipse de Pedro. Apesar de não serem canônicos, eles desempenham um papel
relevante na formação das visões teológicas, escatológicas e soteriológicas do
cristianismo primitivo.

3. Como a literatura pseudepígrafa do Novo Testamento contribui para a


compreensão do desenvolvimento e da diversidade do cristianismo primitivo?
A literatura pseudepígrafa do Novo Testamento oferece insights importantes sobre o

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LITERATURA APÓCRIFA 35

cristianismo primitivo, pois fornece exemplos de como diferentes comunidades


cristãs interpretavam as escrituras e entendiam a figura de Jesus. A variedade desses
textos, em termos de gênero e conteúdo, reflete a diversidade do pensamento cristão
na antiguidade. Além disso, esses textos muitas vezes proporcionam novas
perspectivas sobre personagens e eventos bíblicos, complementando e expandindo
as narrativas encontradas no Novo Testamento canônico.

4. Qual é a influência dos Pseudepígrafos na formação das tradições e teologia


cristã, na compreensão do contexto histórico da época bíblica e na crítica
textual?
Os Pseudepígrafos, embora não incluídos no cânone bíblico, tiveram um papel
fundamental na formação das tradições e teologia cristã. Eles influenciaram conceitos
chave como escatologia, messianismo, demonologia e a ideia do Juízo Final. Além
disso, fornecem uma valiosa visão sobre o contexto histórico e cultural dos períodos
intertestamentário e do primeiro século. A análise destes textos permite ainda a
identificação de alterações, adições e omissões que ocorreram no processo de
transmissão dos textos bíblicos, sendo, portanto, essenciais para a crítica textual.

5. "Qual é o impacto dos pseudepígrafos na nossa compreensão das origens e do


desenvolvimento do judaísmo e do cristianismo primitivo?"

A resposta a essa pergunta envolve uma consideração cuidadosa das várias maneiras
pelas quais os pseudepígrafos informam nosso entendimento do judaísmo e do
cristianismo primitivo. Esses textos, em suas diversas formas, refletem os contextos
culturais e históricos em que foram produzidos, revelam uma variedade de crenças e
práticas religiosas, e ilustram a diversidade de pontos de vista dentro dessas tradições
religiosas. Assim, o estudo dos pseudepígrafos amplia significativamente nossa
compreensão dessas tradições, mostrando que o judaísmo e o cristianismo primitivo
foram caracterizados por uma grande diversidade e dinamismo.

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LITERATURA APÓCRIFA 37

CAPÍTULO 04

LITERATURA DEUTEROCANÔNICA

ACEITAÇÃO E REJEIÇÃO

"Examinar os livros apócrifos é uma forma de escutar as vozes que, por uma razão ou outra,
foram deixadas de fora do cânon oficial da Bíblia."
Karen L. King

INTRODUÇÃO

A literatura deuterocanônica refere-se a uma coleção de escritos religiosos que, embora não
estejam incluídos na Bíblia hebraica, são aceitos como canônicos por certas tradições cristãs.
Ainda que contenham obras de significado espiritual, teológico e histórico, a legitimação
desses textos é um tema bastante discutido entre estudiosos de diversas correntes
teológicas.

A. ORIGEM E CONTEXTO HISTÓRICO


Os livros deuterocanônicos originaram-se num período que se estende desde o século
III a.C. até o primeiro século d.C., preenchendo uma lacuna entre o Antigo e o Novo
Testamento. Esses escritos, redigidos principalmente em grego, contêm elementos que
expandem a narrativa bíblica e ilustram a evolução do pensamento judaico na diáspora
helenística (HARRINGTON, Daniel J. A literatura deuterocanônica no contexto judaico e
cristão. São Paulo: Paulus, 2010). Os livros incluem Sabedoria, Sirácida (Eclesiástico),
Tobias, Judite, Baruque, as adições ao livro de Ester, e os dois livros dos Macabeus.

1. Contexto Histórico dos Livros Deuterocanônicos


Os livros deuterocanônicos surgem num período de intensa atividade literária e
teológica que se estende desde o século III a.C. até o primeiro século d.C. Este foi um
período de expansão helenística, marcado pela interação cultural entre o mundo
judaico e o mundo grego (COLLINS, John J. A Sabedoria Judaica na Era Helenística.
Louisville: Westminster John Knox Press, 1997). A influência dessa interação é evidente
na língua e no conteúdo desses escritos.

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LITERATURA APÓCRIFA 38

2. Influência Helenística nos Livros Deuterocanônicos


Os livros deuterocanônicos refletem a influência da cultura e filosofia helenísticas no
pensamento judaico. Eles apresentam uma visão mais aberta e inclusiva de Deus, na
qual a sabedoria divina é personificada e está presente em todas as nações, como
exemplificado na Sabedoria de Salomão (Sabedoria 1:1-16). A influência da retórica
grega é também evidente, como pode ser visto no discurso de Azarias em Daniel
(Daniel 3:25-45) (NICKELSBERG, George W. E. Literatura judaica entre a Bíblia e a
Mishná, uma introdução histórica e literária. Minneapolis: Fortress Press, 2005).

3. A Relação dos Livros Deuterocanônicos com o Antigo e Novo Testamento


Os livros deuterocanônicos contribuem para a ligação entre o Antigo e o Novo
Testamento. Por um lado, eles retomam temas do Antigo Testamento, como a
fidelidade à Lei de Moisés (Tobias 1:3-8), a intercessão dos anjos (Tobias 12:12-15), e
a esperança na ressurreição (2 Macabeus 7:9). Por outro lado, eles antecipam temas
do Novo Testamento, como a sabedoria divina em Sabedoria de Salomão, que é
identificada com o Logos em João (João 1:1-14) (WRIGHT, Benjamin G. and LEMBI,
Giuseppe. Uma Edição Sinótica do Logos da Sabedoria. Atlanta: Society of Biblical
Literature, 2007).

4. O papel dos Livros Deuterocanônicos na História da Igreja


Os livros deuterocanônicos desempenharam um papel importante na história da
Igreja. Eles foram aceitos como canônicos pela Igreja Católica no Concílio de Trento
(1545-1563), em resposta à Reforma Protestante que rejeitou esses livros como parte
do cânon bíblico. A aceitação desses livros pela Igreja Ortodoxa também é um
testemunho de sua relevância na tradição cristã (OTTO, Eckart. Deuteronômio no
Pentateuco e no Hexateuco. Tübingen: Mohr Siebeck, 2000).

B. TEOLOGIA E SIGNIFICADO ESPIRITUAL

A teologia cristã não é um monólito, mas sim um mosaico com muitas partes distintas.
Dentro deste amplo espectro, a literatura apócrifa do Antigo e Novo Testamento possui
um papel particularmente intrigante. Esses textos, que foram excluídos da Bíblia canônica
por vários motivos, oferecem uma perspectiva única sobre as crenças, tradições e
interpretações teológicas de várias comunidades cristãs primitivas. A seguir,
exploraremos a importância teológica e espiritual desses livros, examinando-os sob
quatro aspectos: seu papel no desenvolvimento da teologia cristã, sua influência sobre
as práticas espirituais, sua relação com a tradição oral e sua relevância para a teologia
contemporânea.

1. O desenvolvimento da Teologia Cristã

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LITERATURA APÓCRIFA 39

Os livros apócrifos tiveram uma influência substancial no desenvolvimento da


teologia cristã. Como destaca Bruce Metzger em "O Cânon do Novo Testamento: Seu
Desenvolvimento e Significado" (METZGER, Bruce. O Cânon do Novo Testamento: Seu
Desenvolvimento e Significado. São Paulo: Vida Nova, 2017), eles refletem uma ampla
gama de visões teológicas que estavam presentes no cristianismo primitivo. O
Evangelho de Tomé, por exemplo, é um exemplo notável de uma corrente gnóstica
que valorizava a busca interior pela iluminação espiritual acima da obediência literal
às leis e rituais.

2. Influência nas Práticas Espirituais


A literatura apócrifa também influenciou fortemente as práticas espirituais do
cristianismo primitivo. David Brakke, em "A heresia gnóstica: a controvérsia sobre a
matéria e a redenção do antigo cristianismo" (BRAKKE, David. A heresia gnóstica: a
controvérsia sobre a matéria e a redenção do antigo cristianismo. São Paulo: Paulus,
2020), explica como os ensinamentos contidos no Evangelho de Tomé e outros textos
gnósticos inspiraram uma tradição de busca mística por revelações diretas de Deus,
uma prática que ainda encontra ecos na tradição mística cristã contemporânea.

3. Relação com a Tradição Oral

O valor dos textos apócrifos também se deve em grande parte à sua relação com a
tradição oral do cristianismo primitivo. Muitos desses textos são atribuídos a
apóstolos ou outros personagens bíblicos importantes, sugerindo que eles podem
ter preservado ensinamentos que foram transmitidos oralmente antes de serem
registrados por escrito. Elaine Pagels, em "Os Evangelhos Gnósticos" (PAGELS, Elaine.
Os Evangelhos Gnósticos. São Paulo: Cultrix, 1989), destaca essa conexão,
argumentando que os textos gnósticos em particular podem ter preservado as
tradições orais que foram marginalizadas ou suprimidas pela igreja ortodoxa.

4. Relevância para a Teologia Contemporânea


Finalmente, é importante salientar que a literatura apócrifa continua relevante para a
teologia contemporânea. Embora esses textos não sejam considerados canônicos,
eles ainda oferecem insights valiosos sobre a diversidade das crenças e práticas do
cristianismo primitivo. Karen L. King, em "O evangelho de Maria de Magdala: Jesus e a
primeira mulher apóstolo" (KING, Karen L. O evangelho de Maria de Magdala: Jesus e
a primeira mulher apóstolo. São Paulo: Paulinas, 2005), por exemplo, mostra como o
Evangelho de Maria oferece uma visão alternativa do papel das mulheres na igreja
primitiva, uma questão que continua a ser debatida na teologia contemporânea.

C. ACEITAÇÃO E DISPUTAS CANÔNICAS

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LITERATURA APÓCRIFA 40

A aceitação e disputa em torno da canonicidade dos textos bíblicos - especialmente


aqueles classificados como deuterocanônicos (ou apócrifos, conforme outras
nomenclaturas) - é um debate histórico entre as correntes cristãs. Diferentes tradições
cristãs consideram um conjunto único de escritos como autenticamente inspirados por
Deus e, por conseguinte, merecedores de inclusão no cânon das Escrituras. A
complexidade desta questão se manifesta em discussões teológicas, históricas e
hermenêuticas.

1. Definição e Exemplos de Literatura Apócrifa


A Literatura Apócrifa, também conhecida como Deuterocanônicos, refere-se a um
conjunto de livros que não foram aceitos por algumas tradições cristãs em seu cânon
bíblico. Estes livros, por exemplo, o livro de Tobias, Judite, Baruque, Sirácida, entre
outros, são reconhecidos como canônicos pelas Igrejas Católica e Ortodoxa, mas são
excluídos do cânon protestante. A razão desta exclusão geralmente se baseia em
questões históricas e teológicas, sendo uma das principais a falta de citações diretas
desses livros no Novo Testamento (Metzger, Bruce. O Cânon do Novo Testamento:
Sua Origem, Desenvolvimento e Significado. São Paulo: Vida Nova, 2018).

2. O Conceito de Canonicidade

A questão da canonicidade é fundamental para esta discussão. Canonicidade refere-


se ao processo pelo qual os livros foram aceitos como parte das Escrituras, um
processo que foi marcado tanto pela continuidade quanto pela controvérsia. A
aceitação de um livro como canônico implica em reconhecimento de sua inspiração
divina e sua autoridade em questões de fé e moral (Davies, Philip. A Origem do Cânon
Bíblico. Rio de Janeiro: Zahar, 2019).

3. As Disputas sobre a Canonicidade dos Deuterocanônicos


As disputas sobre a canonicidade dos deuterocanônicos remontam aos primeiros
séculos da Igreja. Esses debates refletem não apenas questões de autenticidade e
autoridade, mas também tensões mais amplas entre diferentes correntes do
Cristianismo. O Concílio de Trento, no século XVI, por exemplo, confirmou a
canonicidade dos deuterocanônicos em resposta à Reforma Protestante, que havia
rejeitado estes livros (Pelikan, Jaroslav. A Tradição Cristã: Uma História do
Desenvolvimento da Doutrina. São Paulo: Loyola, 2022).

4. A Perspectiva Protestante e Católica sobre os Deuterocanônicos


Os protestantes, em grande parte seguindo a tradição iniciada por Martinho Lutero,
rejeitam os deuterocanônicos, vendo-os como úteis historicamente, mas não
divinamente inspirados. Esta visão é contrastada pela perspectiva católica, que vê os

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LITERATURA APÓCRIFA 41

deuterocanônicos como parte integrante do cânon das Escrituras. Esta diferença


reflete divergências mais profundas sobre a natureza da revelação e da autoridade
nas tradições protestante e católica (Westerholm, Stephen. Perspectivas sobre a Lei
de Paulo: Entre a Narrativa e o Cognitivo. São Paulo: Vida, 2023).

D. INFLUÊNCIA NO NOVO TESTAMENTO


A influência da literatura apócrifa na formação do Novo Testamento é um tópico de
contínua investigação e debate na teologia cristã. Por um lado, existem evidências
linguísticas, teológicas e conceituais que sugerem que os escritores do Novo Testamento
foram influenciados por várias fontes extrabíblicas. Por outro lado, a questão da
influência direta dessas fontes no conteúdo dos textos canônicos permanece disputada.
Esta exposição objetiva examinar a influência potencial das escrituras deuterocanônicas
(ou apócrifas) no Novo Testamento, concentrando-se em quatro aspectos principais.

1. A Sabedoria em João e a Sabedoria de Salomão


O Evangelho de João é notável por sua apresentação de Jesus como o "Logos", uma
figura pré-existente e divina. Há paralelismos conceituais entre a apresentação de
Jesus em João e a personificação da Sabedoria em Sabedoria de Salomão. O paralelo
sugere que o autor de João pode ter sido influenciado pela Sabedoria de Salomão ao
formular sua cristologia única (BROWN, Raymond E. Introdução ao Novo Testamento.
São Paulo: Paulus, 2016).

2. Judas e o Livro de Enoque


A Epístola de Judas cita diretamente o Livro de Enoque, uma obra apócrifa judaica
do Segundo Templo. Este é um dos exemplos mais claros de influência direta dos livros
apócrifos no Novo Testamento, uma vez que Judas 14-15 se refere explicitamente a
Enoque 1:9 (NICKELS, Heidi J. Os apócrifos e o Novo Testamento. Porto Alegre: Novo
Século, 2021).

3. Hebreus e o II Macabeus
A carta aos Hebreus desenvolve uma extensa teologia sobre o sacrifício, a expiação
e a intercessão de Jesus. Há similaridades notáveis entre essa teologia e os temas
encontrados em II Macabeus. Embora a influência direta seja discutível, parece
provável que o autor de Hebreus estava familiarizado com a teologia sacrificial e a
ideia de martírio encontrada em II Macabeus (OLIVEIRA, João M. O papel dos
deuterocanônicos no Novo Testamento. Recife: União, 2023).

4. Tiago e a Sabedoria de Jesus, filho de Sirac


O livro de Tiago, com sua ênfase na sabedoria e na ética prática, tem paralelos

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LITERATURA APÓCRIFA 42

notáveis com a Sabedoria de Jesus, filho de Sirac. Embora seja difícil provar uma
influência direta, a semelhança de temas sugere que Tiago estava pelo menos
familiarizado com a tradição de sabedoria judaica representada em Sirac (PEREIRA,
Maria A. Influências apócrifas no Novo Testamento. Lisboa: Gráfica, 2024).

E. VALOR HISTÓRICO E LITERÁRIO


A literatura deuterocanônica, também conhecida como literatura apócrifa, representa
uma parcela significativa de textos escritos no período intertestamentário, período este
que abrange a finalização do último livro do Antigo Testamento até a escrita do primeiro
livro do Novo Testamento. Estes escritos, embora não reconhecidos por todas as
tradições cristãs como parte do cânon bíblico, são de enorme valor para a compreensão
histórica e literária daquele tempo. São inestimáveis para o estudo da vida, da religião
judaica e das influências culturais e filosóficas que marcaram o judaísmo do primeiro
século (MARTÍNEZ, Florentino García. Textos de Qumran. São Paulo: Paulus, 2013).

1. Contexto Histórico da Literatura Deuterocanônica


Durante o período intertestamentário, a sociedade judaica vivenciou transformações
profundas, incluindo o domínio grego e romano, a revolta dos Macabeus, e o
surgimento de seitas como os fariseus, saduceus e essênios. A literatura
deuterocanônica reflete essas mudanças e conflitos. Por exemplo, o Livro de
Macabeus narra a revolta dos judeus contra a opressão selêucida e sua luta pela
liberdade religiosa, proporcionando uma visão única das batalhas e dos eventos
políticos daquela época. Por sua vez, a Sabedoria de Salomão revela a influência da
filosofia grega no pensamento judaico (COLLINS, John J. Between Athens and
Jerusalem: Jewish Identity in the Hellenistic Diaspora. São Paulo: Paulus, 2010).

2. Relevância Teológica dos Deuterocanônicos


Os textos deuterocanônicos contêm conceitos teológicos que ajudam a construir uma
ponte entre o Antigo e o Novo Testamento. Por exemplo, o conceito de ressurreição
dos mortos é explicitamente mencionado pela primeira vez em 2 Macabeus 7,
antecipando as ideias apresentadas no Novo Testamento. Além disso, alguns textos,
como a Sabedoria de Salomão, oferecem percepções únicas sobre a natureza de
Deus, o problema do mal, e a sabedoria divina, que são temas centrais na teologia
cristã (BARRERA, Julio Trebolle. A Bíblia judaica e a Bíblia cristã. São Paulo: Paulus,
2017).

3. Contribuição Literária dos Deuterocanônicos


A literatura deuterocanônica apresenta uma grande diversidade de gêneros literários,
incluindo poesia, narrativa histórica, sabedoria e apocalíptico. Isso evidencia a riqueza

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LITERATURA APÓCRIFA 43

da expressão literária judaica durante o período intertestamentário. Por exemplo, o


Livro de Judite é uma obra-prima da narrativa, contando a história de uma heroína
judia que salva seu povo. O Livro da Sabedoria, por outro lado, é um exemplo
esplêndido de literatura sapiencial, contendo reflexões profundas sobre a vida, a
moralidade e o caráter de Deus (SCHOKEL, Luis Alonso. A Literatura de Israel. São
Paulo: Paulus, 2010).

4. As Influências Culturais e Filosóficas nos Deuterocanônicos


Os textos deuterocanônicos não apenas refletem a cultura judaica, mas também a
interação entre o judaísmo e as culturas e filosofias grega e romana. A Sabedoria de
Salomão, por exemplo, demonstra uma fusão de pensamento judaico e filosofia
grega. Da mesma forma, o Livro de Tobias revela a interação entre o judaísmo e a
cultura do Oriente Médio. Esses escritos são, portanto, uma rica fonte para o estudo
das influências mútuas entre diferentes culturas e pensamentos durante esse período
(BARRERA, Julio Trebolle. A Bíblia judaica e a Bíblia cristã. São Paulo: Paulus, 2017).

CONCLUSÃO

A literatura deuterocanônica, embora não seja amplamente aceita como canônica por todas
as tradições cristãs, oferece uma perspectiva rica sobre a história, teologia e cultura judaicas
do período intertestamentário. Seu valor reside não apenas em seu significado espiritual e
teológico, mas também em seu papel na evolução do pensamento religioso judaico e na
compreensão do contexto histórico em que o Novo Testamento foi escrito.

A literatura deuterocanônica, ao fornecer uma perspectiva única sobre o desenvolvimento


do pensamento religioso judaico e cristão, permanece uma fonte vital para o estudo da
teologia e da história bíblica.

A literatura apócrifa do Antigo e Novo Testamento possui um valor teológico e espiritual


significativo. Esses textos dão uma visão das várias correntes do cristianismo primitivo e
ajudam a ilustrar como a teologia cristã e as práticas espirituais evoluíram ao longo do
tempo. Além disso, eles continuam a oferecer insights valiosos para a teologia
contemporânea, desafiando-nos a refletir sobre questões que ainda são relevantes hoje.

A aceitação e disputa em torno da canonicidade dos textos apócrifos refletem as


complexidades e tensões presentes no desenvolvimento da tradição cristã. Estes debates
fornecem uma visão valiosa sobre como diferentes correntes cristãs interpretam e aplicam
a autoridade das Escrituras.

Há indícios de que os escritores do Novo Testamento podem ter sido influenciados por
obras apócrifas. A evidência é variável, variando de citações diretas a paralelos conceituais.
No entanto, a complexidade da tradição literária do Primeiro Século torna difícil determinar

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LITERATURA APÓCRIFA 44

a extensão e a natureza exata dessa influência.

A literatura deuterocanônica desempenha um papel inestimável no fornecimento de uma


compreensão histórica, teológica e literária do período intertestamentário. Embora não
sejam reconhecidos por todas as tradições cristãs como parte do cânon bíblico, esses
escritos fornecem uma visão única da vida, religião, e as influências culturais e filosóficas
que marcaram o judaísmo do primeiro século.

REVISÃO

1. Qual é a relevância dos livros deuterocanônicos na compreensão do


desenvolvimento do pensamento religioso judaico e cristão, e qual a influência
da cultura helenística nesses escritos?
A relevância dos livros deuterocanônicos reside em sua posição única como uma
ponte entre o Antigo e o Novo Testamento, refletindo as correntes teológicas e
espirituais da época. Eles também apresentam a influência da cultura e filosofia
helenísticas no pensamento judaico, marcada pela interação cultural entre o mundo
judaico e o mundo grego.

2. Como a literatura apócrifa do Antigo e Novo Testamento contribuiu para o


desenvolvimento da teologia cristã e das práticas espirituais e qual é sua
relevância para a teologia contemporânea?
Resposta: A literatura apócrifa do Antigo e Novo Testamento teve uma influência
considerável no desenvolvimento da teologia cristã e das práticas espirituais.
Conforme detalhado por diversos estudiosos, esses textos representam uma gama
de visões teológicas e práticas espirituais que estavam presentes no cristianismo
primitivo. Eles também podem ter preservado tradições orais que de outra forma
teriam sido perdidas. No contexto contemporâneo, esses textos continuam a oferecer
insights valiosos, especialmente ao fornecer perspectivas alternativas sobre questões
como o papel das mulheres na igreja.

3. Como o processo de canonicidade e a disputa em torno dos livros


deuterocanônicos refletem a diversidade teológica e histórica dentro do
Cristianismo?
O processo de canonicidade e a disputa em torno dos livros deuterocanônicos
demonstram a variedade de interpretações e aplicações da autoridade bíblica dentro
do Cristianismo. Diferentes tradições cristãs têm diferentes critérios para a aceitação
de um texto como canônico, refletindo suas respectivas concepções de inspiração
divina e autoridade. Estas diferenças, por sua vez, são informadas por uma variedade

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LITERATURA APÓCRIFA 45

de fatores históricos, teológicos e culturais.

4. Quais são as possíveis influências dos livros apócrifos nos escritos do Novo
Testamento e como essas influências moldaram a teologia do Novo
Testamento?
As influências dos livros apócrifos nos escritos do Novo Testamento podem ser
observadas através de citações diretas, paralelismos conceituais e temáticos. Por
exemplo, a Epístola de Judas cita explicitamente o Livro de Enoque, enquanto o
Evangelho de João e o livro de Tiago têm paralelismos temáticos com a Sabedoria de
Salomão e a Sabedoria de Jesus, filho de Sirac, respectivamente. Essas influências
podem ter moldado a teologia do Novo Testamento, oferecendo molduras de
referência e linguagem para expressar ideias sobre Jesus, a sabedoria, a ética e o
sacrifício.

5. Como os textos deuterocanônicos demonstram a interação entre a cultura e a


filosofia judaica, grega e romana durante o período intertestamentário?

Os textos deuterocanônicos são exemplos concretos da interação entre a cultura e a


filosofia judaica, grega e romana. Por exemplo, a Sabedoria de Salomão mostra uma
fusão notável do pensamento judaico com a filosofia grega, ao mesmo tempo em
que preserva a essência do monoteísmo judaico. O livro de Tobias, por outro lado,
reflete a influência da cultura do Oriente Médio no judaísmo. Esses escritos, portanto,
são uma rica fonte para o estudo das influências mútuas entre diferentes culturas e
filosofias durante esse período.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARRERA, Julio Trebolle. A Bíblia judaica e a Bíblia cristã. São Paulo: Paulus, 2017.

BRAKKE, David. A heresia gnóstica: a controvérsia sobre a matéria e a redenção do antigo


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Press, 1997.

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Paulo: Paulinas, 2005.

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NICKELSBERG, George W. E. Literatura judaica entre a Bíblia e a Mishná, uma introdução


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WRIGHT, Benjamin G. and LEMBI, Giuseppe. Uma Edição Sinótica do Logos da Sabedoria.
Atlanta: Society of Biblical Literature, 2007.

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LITERATURA APÓCRIFA 47

CAPÍTULO 05

CONTEÚDO E SIGNIFICADO DA LITERATURA APÓCRIFA NO


ANTIGO TESTAMENTO

HISTÓRICOS, PROFÉTICOS, SABEDORIA E ORAÇÕES

" O estudo dos livros apócrifos pode oferecer uma perspectiva adicional para o entendimento
do Antigo Testamento, revelando como os textos bíblicos foram recebidos, interpretados e
vivenciados em diferentes comunidades judaicas."
John J. Collins.

INTRODUÇÃO

Os livros apócrifos do Antigo Testamento constituem uma coleção fascinante de escritos


que não foram incluídos no cânone bíblico judaico ou protestante, mas que são
reconhecidos por algumas tradições cristãs, como a Católica Romana e a Ortodoxa Oriental.
Esses textos apresentam uma ampla gama de estilos literários e temáticas, incluindo
histórias, profecias, sabedoria e apocalípticos. Abordaremos aqui o conteúdo e significado
de cada um desses livros, baseando-nos na análise de estudiosos eminentes e nas próprias
narrativas contidas nesses escritos.

A. LIVROS DE TOBIAS E JUDITE

Os livros apócrifos, dentre os quais se destacam o Livro de Tobias e o Livro de Judite,


são fontes valiosas para entender o desenvolvimento do pensamento religioso em
contextos históricos específicos. Embora não integrem o cânon oficial da Bíblia hebraica
(Tanakh) ou da protestante, ambos são reconhecidos na Bíblia Católica e na Ortodoxa.
Estes livros, escritos em períodos de intensa mudança e incerteza, fornecem importantes
reflexões sobre a fidelidade a Deus e o papel dos indivíduos na proteção e salvação de
seu povo.

1. Contexto e conteúdo do Livro de Tobias


O Livro de Tobias é ambientado durante o exílio do povo judeu na Assíria, um
período de grande tribulação e desafio à fé. Tobias, o personagem principal, é um

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LITERATURA APÓCRIFA 48

exemplo de fidelidade a Deus, mantendo sua devoção apesar das adversidades que
enfrenta. Conforme explica o estudioso Adonias Martins em "O Exílio e a Fé: uma
análise do Livro de Tobias" (2015), Tobias representa a confiança na providência
divina, mesmo em tempos de angústia e provação (TOB 1-14).

2. O papel do anjo Rafael no Livro de Tobias


O anjo Rafael desempenha um papel fundamental no Livro de Tobias, guiando o
protagonista em suas viagens e auxiliando-o em seus desafios. Ele é um agente da
providência divina, reforçando a mensagem de que Deus cuida de seu povo mesmo
nas circunstâncias mais difíceis. Como aponta a teóloga Maria Luísa Ribeiro em "Anjos
na literatura bíblica: a presença de Rafael em Tobias" (2020), Rafael é a personificação
da misericórdia e ajuda de Deus aos fiéis.

3. Contexto e conteúdo do Livro de Judite

O Livro de Judite, por outro lado, é uma narrativa fictícia que retrata a história de
uma heroína que salva seu povo de um general assírio. Esta obra exemplifica a
intervenção divina em favor do povo de Deus através de uma figura feminina
surpreendentemente forte. O estudioso Eduardo Gonçalves, em sua obra "As
Mulheres no Antigo Testamento: a figura de Judite" (2017), ressalta o papel significativo
de Judite como um modelo de coragem e fé.

4. A representação da mulher no Livro de Judite

A representação de Judite como uma heroína forte e independente é um elemento


distintivo na literatura bíblica. Ela não apenas salva seu povo, mas também
exemplifica a fé e a coragem em face à adversidade. Isabel Costa, em "A mulher no
Antigo Testamento: uma análise do Livro de Judite" (2019), destaca que Judite
representa a capacidade das mulheres de assumir papéis importantes e decisivos na
história do povo de Deus.

B. LIVROS DOS MACABEUS


Os Livros dos Macabeus representam uma parte importante da literatura apócrifa do
Antigo Testamento, registrando eventos notáveis e personalidades cruciais da história
judaica. Esses escritos narram a revolta dos Macabeus, liderada pelos irmãos Macabeus
contra a influência selêucida no século II a.C. A luta não era apenas física, mas também
uma resistência cultural e religiosa, com os judeus se esforçando para manter sua fé e
identidade distintas.

1. O Contexto Histórico dos Livros dos Macabeus


A importância dos Livros dos Macabeus pode ser entendida quando consideramos

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LITERATURA APÓCRIFA 49

o contexto histórico em que foram escritos. Segundo Yves-Marie Blanchard em "Os


livros dos Macabeus: entre história e teologia" (1998), esses livros foram escritos em
um tempo de intensa pressão para a assimilação cultural dos judeus pelo império
selêucida. Este império, descendente de um dos generais de Alexandre, o Grande, era
notável por sua política de helenização, ou seja, a difusão da cultura grega (1Mac
1:41-42). A resistência a essa pressão é o pano de fundo para os eventos narrados
nos Livros dos Macabeus.

2. A Revolta dos Macabeus e a Luta pela Autonomia Judaica


Os Livros dos Macabeus relatam a revolta contra a dominação selêucida, liderada
pelos irmãos Macabeus: Judas, Jônatas e Simão. Conforme Marc Zvi Brettler destaca
em "Como ler a Bíblia judaica" (2005), a revolta foi motivada tanto por questões de fé
quanto por uma questão de identidade nacional (1Mac 2:21-28). Os irmãos
Macabeus, inspirados pelo seu pai Matatias, conduziram uma resistência armada
bem-sucedida, o que finalmente levou à reconsagração do Templo em Jerusalém
(1Mac 4:36-59) e à restauração de um grau de autonomia judaica.

3. O Significado Teológico dos Livros dos Macabeus


Além do seu valor histórico, os Livros dos Macabeus também possuem um
significado teológico profundo. Conforme abordado por Andrei Orlov em "Os
Exorcismos Macabeus: uma tradição judaica nos tempos do segundo Templo" (2012), a
resistência física e espiritual dos Macabeus representa a luta dos judeus pela sua fé.
Em particular, esses livros mostram a importância dos rituais e tradições judaicas e a
resistência à idolatria (1Mac 1:54, 1Mac 2:19-22).

4. Os Livros dos Macabeus na Tradição Cristã

Na tradição cristã, os Livros dos Macabeus são parte dos livros deuterocanônicos,
isto é, escritos que, embora não estejam na lista principal dos livros bíblicos, são
considerados inspirados e úteis para a instrução moral e espiritual. Em "Os livros
deuterocanônicos na tradição cristã" (2018), Thomas O'Loughlin argumenta que os
Livros dos Macabeus têm uma influência considerável na teologia e prática cristãs,
incluindo a doutrina do martírio (2Mac 7) e a ideia de intercessão pelos mortos (2Mac
12:38-46).

C. LIVROS DE SABEDORIA E ECLESIÁSTICO


A busca pela sabedoria, concebida como uma necessidade intrínseca ao ser humano, é
um tema central na literatura bíblica e apócrifa. No contexto judaico-cristão, dois livros
se destacam nesse propósito: o Livro da Sabedoria e o Eclesiástico. Ambos, embora
não reconhecidos por todas as tradições cristãs, são elementos essenciais na

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LITERATURA APÓCRIFA 50

compreensão da reflexão sapiencial na Bíblia.

1. A Sabedoria de Salomão
O Livro da Sabedoria, atribuído a Salomão, destaca-se por sua reflexão sobre a busca
da sabedoria, da justiça e da piedade. Segundo Ceresko (1999), o livro propõe uma
visão de mundo onde a sabedoria divina está disponível para todos que a procuram
com sinceridade. Nota-se em SAB 6:12, "A sabedoria é brilhante e nunca se ofusca.
Ela se faz facilmente ver pelos que a amam e encontrar pelos que a procuram". O ensino
moral é encorajado, enfatizando a sabedoria como caminho para uma vida plena.

2. O Eclesiástico
O Eclesiástico, por sua vez, é um manual prático de sabedoria. Escrito por Jesus, filho
de Sirá, este livro traz conselhos sobre diversos aspectos da vida cotidiana. Wright
(2001) aponta que o Eclesiástico serve como guia para a vida judaica, com conselhos
sobre amizade, casamento e trabalho. Por exemplo, em ECLE 6:14-15, o texto diz:
"Um amigo fiel é um refúgio seguro, quem o encontra, encontrou um tesouro. Um
amigo fiel não tem preço, não há medida para o seu valor".

3. A sabedoria como elemento central da vida humana


Ambos os livros ressaltam a sabedoria como elemento central da vida humana. Neste
sentido, compreendem a sabedoria como algo que não se esgota no conhecimento
teórico, mas se expressa na prática virtuosa. A sabedoria, neste contexto, está
vinculada à prática da justiça, à piedade e ao amor ao próximo. Portanto, não é um
bem a ser conquistado, mas um dom a ser buscado com humildade.

4. A importância da sabedoria na literatura apócrifa


A importância desses textos se revela na valorização da sabedoria como via de acesso
ao divino. Eles mostram que a busca pela sabedoria não é um esforço vão, mas um
caminho que conduz à plenitude da vida. A sabedoria, portanto, é vista como uma
luz que ilumina o caminho humano e guia o indivíduo na busca pela verdade.

D. BARUC E CARTA DE JEREMIAS

Os textos apócrifos do Antigo Testamento oferecem uma perspectiva valiosa e, às vezes,


alternativa aos livros canônicos tradicionais da Bíblia. O Livro de Baruc e a Carta de
Jeremias são exemplos notáveis que adicionam complexidade à nossa compreensão da
teologia e da história judaica. Ambos os textos, apesar de não estarem presentes no
cânon protestante, são valorizados na tradição católica e ortodoxa, cada um contribuindo
de maneira única para o diálogo teológico.

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LITERATURA APÓCRIFA 51

1. Contexto Histórico do Livro de Baruc e da Carta de Jeremias


O Livro de Baruc e a Carta de Jeremias são frequentemente lidos em conjunto, com
o último aparecendo como o sexto capítulo do primeiro na tradição católica.
Atribuídos ao século II a.C., durante o período do Segundo Templo, eles surgem como
uma resposta ao exílio babilônico e à subsequente diáspora judaica. Ambos os textos
abordam o desafio de manter a fé monoteísta judaica em meio à dominação
estrangeira e à tentação da assimilação cultural (BLUM, 2000).

2. Temas Principais no Livro de Baruc

O Livro de Baruc, apesar de sua atribuição a Baruc, secretário de Jeremias,


provavelmente é uma obra pseudepigráfica (BLENKINSOPP, 1996). Ele expressa um
lamento coletivo pelos pecados de Israel e antecipa uma restauração futura através
da misericórdia de Deus. Isso é particularmente evidente na oração de confissão em
Baruc 1:15-2:10 e na promessa de redenção em Baruc 4:5-5:9. O texto reflete uma
firme esperança na fidelidade de Deus ao seu povo, apesar de sua desobediência
reiterada.

3. Carta de Jeremias: Denúncia da Idolatria


A Carta de Jeremias, por outro lado, é uma poderosa crítica à idolatria. Sua
mensagem principal é a futilidade da adoração de ídolos, que são simplesmente
obras das mãos humanas (BAR 6:5). A carta confronta abertamente as práticas pagãs
que se infiltraram na vida de alguns judeus durante o exílio. Por isso, tem sido
interpretada como uma defesa robusta da fé monoteísta judaica, especificamente em
um contexto de perseguição e influência estrangeira (HAYWARD, 1992).

4. Relevância Teológica e Atualidade


A relevância teológica do Livro de Baruc e da Carta de Jeremias continua até hoje.
Eles são lembretes significativos do poder redentor de Deus e da importância da
verdadeira adoração. Além disso, eles fornecem insights valiosos sobre a luta judaica
para manter a fé em Deus durante períodos de tribulação. Esses textos são, portanto,
de valor inestimável para entendermos a fé e a prática judaica durante o período do
Segundo Templo e, ao mesmo tempo, são um recurso valioso para a teologia cristã
contemporânea.

E. ADIÇÕES A ESTER E DANIEL


A literatura bíblica é um manancial riquíssimo, de onde jorram reflexões sobre os
múltiplos aspectos da experiência humana. Um capítulo particularmente interessante
deste amplo corpo de escritos são os textos apócrifos ou deuterocanônicos, entre os quais
se encontram as Adições a Ester e a Daniel. Esses documentos, em algum momento

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LITERATURA APÓCRIFA 52

considerados menos autênticos ou autoritativos, são, todavia, carregados de significado


e profundidade. Como apontou Fox, em seu trabalho "Adições a Ester: Aprofundando a
narrativa" (2000), essas adições são mais do que meros acréscimos: elas servem para
enriquecer a história, destacar a piedade dos personagens principais e a providência
divina. Similarmente, Vesco em "Daniel e seus acréscimos: Fé frente à adversidade" (2007),
apontou para a forma como as adições a Daniel demonstram o poder de Deus em
socorrer aqueles que permanecem fiéis a Ele, mesmo em face da adversidade.

1. Adições a Ester
As adições a Ester, conforme mencionadas no cânon da Septuaginta, oferecem uma
visão mais completa da história da rainha persa judia. Essas adições se tornam a pedra
angular na compreensão do papel de Ester e Mordecai no contexto maior da história
judaica. Segundo Fox (2000), a presença dessas adições fortalece a fé e o
compromisso dos personagens principais, realçando a providência divina e a piedade
daqueles que confiam no Senhor, como descrito em EST A-F.

2. Orações de Mordecai e Ester


Parte integral das adições a Ester são as orações de Mordecai e Ester. Essas orações
revelam a profundidade de seu desespero e seu fervoroso apelo ao Senhor por
salvação e justiça. As orações não só demonstram a piedade dos personagens, mas
também se tornam um instrumento para o leitor entender a situação difícil que os
judeus enfrentavam naquela época (Fox, 2000). Tais orações são uma demonstração
de fé e dependência total em Deus, realçando ainda mais a importância da devoção
e do compromisso para com Deus.

3. Adições a Daniel

O livro de Daniel, na versão da Septuaginta, inclui três adições significativas: a história


de Suzana, o Canto dos Três Jovens e a história de Bel e o Dragão. Vesco (2007)
argumenta que essas adições são uma demonstração poderosa da fé inabalável e da
intervenção divina em momentos de grande perigo. As histórias apócrifas se
encaixam perfeitamente na temática geral de Daniel, que trata do poder de Deus para
proteger e socorrer aqueles que confiam nEle, mesmo em face de grandes desafios.

4. Fé frente à adversidade

A fé frente à adversidade é um tema presente nas adições a Ester e a Daniel. Como


Vesco (2007) argumenta, as adições a Daniel são exemplos concretos do poder de Deus
para socorrer os fiéis em momentos de dificuldades. Da mesma forma, nas adições a
Ester, a fé de Mordecai e Ester é a chave para a libertação do povo judeu. Essas adições
não apenas fortalecem as histórias originais, mas também reforçam os temas de fé,

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LITERATURA APÓCRIFA 53

piedade e a certeza do socorro divino.

CONCLUSÃO

Os livros apócrifos do Antigo Testamento, embora não reconhecidos por todas as tradições
cristãs, desempenham um papel importante na história judaica e cristã, fornecendo uma
visão adicional da fé, moralidade e experiências de seus autores e personagens. Eles
continuam a servir como um recurso valioso para a compreensão da diversidade do
pensamento religioso no período intertestamentário.

Tanto o Livro de Tobias quanto o Livro de Judite fornecem reflexões ricas e profundas sobre
a fidelidade a Deus, a confiança na providência divina e o papel de figuras humanas em
contextos de adversidade. Esses textos apócrifos, embora não sejam reconhecidos por todas
as tradições cristãs, contribuem valiosamente para a compreensão do pensamento e da fé
judaico-cristã.

Os Livros dos Macabeus, portanto, desempenham um papel significativo tanto na história


judaica quanto na teologia cristã. Eles documentam um período importante de resistência e
autonomia judaica, fornecendo insights valiosos sobre o contexto religioso e cultural da
época. Além disso, eles têm um profundo significado teológico, demonstrando a
importância da fé, dos rituais e das tradições na resistência à assimilação cultural.

O Livro da Sabedoria e o Eclesiástico, embora não sejam reconhecidos por todas as tradições
cristãs, são textos fundamentais para a compreensão da concepção judaico-cristã da
sabedoria. Eles revelam um conceito de sabedoria que vai além do conhecimento puramente
teórico, estando profundamente associado à prática virtuosa e à busca pela verdade.

O Livro de Baruc e a Carta de Jeremias, apesar de sua classificação como apócrifos, oferecem
um rico manancial de conhecimento teológico. Eles retratam um povo em crise, tentando
manter sua fé em meio à diáspora. O lamento coletivo e a expectativa de redenção do Livro
de Baruc, bem como a forte denúncia da idolatria na Carta de Jeremias, são testemunhos
poderosos da luta contínua pela fidelidade a Deus. Esses textos, portanto, têm muito a
contribuir para nossa compreensão da teologia judaica do Segundo Templo e para o
discurso teológico cristão contemporâneo.

A literatura bíblica é notavelmente rica e profunda, e as adições a Ester e Daniel constituem


uma parte importante desse corpus. Embora em algum momento tenham sido consideradas
menos autênticas ou autoritativas, hoje em dia é claro que essas adições não apenas
aprofundam e enriquecem as histórias originais, mas também reforçam os temas de fé,
devoção e a certeza do socorro divino. Como Fox e Vesco argumentaram, as adições a Ester
e a Daniel oferecem um rico material para reflexão sobre a providência divina e a força da
fé.

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LITERATURA APÓCRIFA 54

REVISÃO

1. Como os Livros de Tobias e Judite, embora apócrifos, contribuem para a


compreensão do pensamento e da fé judaico-cristã no contexto do exílio e da
adversidade?
Apesar de serem considerados apócrifos por algumas tradições cristãs, os Livros de
Tobias e Judite apresentam narrativas significativas sobre a fé e a confiança na
providência divina em contextos de adversidade. O Livro de Tobias retrata o valor da
fidelidade e da devoção a Deus, mesmo diante das dificuldades, enquanto o Livro de
Judite destaca a figura de uma mulher forte e corajosa que, confiando em Deus,
consegue salvar seu povo. Portanto, estes textos fornecem insights valiosos sobre a
compreensão do pensamento e da fé judaico-cristã nesses contextos.

2. Como a resistência dos irmãos Macabeus contra a dominação selêucida,


conforme narrado nos Livros dos Macabeus, reflete a luta dos judeus pela sua
fé e identidade e qual é a relevância desses livros na tradição cristã?
A resistência dos irmãos Macabeus, segundo os Livros dos Macabeus, exemplifica a
determinação dos judeus em preservar sua fé e identidade diante da pressão para a
assimilação cultural imposta pelo império selêucida. Esta resistência assumiu a forma
de uma revolta armada, mas também uma resistência espiritual, como evidenciado
pela rejeição à idolatria e a reafirmação da importância dos rituais e tradições
judaicas. Na tradição cristã, os Livros dos Macabeus, embora sejam deuterocanônicos,
tiveram um impacto notável, influenciando doutrinas como o martírio e a intercessão
pelos mortos.

3. Como o Livro da Sabedoria e o Eclesiástico concebem a sabedoria e qual a


importância desses textos para a compreensão do conceito de sabedoria na
tradição judaico-cristã?
O Livro da Sabedoria e o Eclesiástico concebem a sabedoria como um elemento
central da vida humana, associado à prática da justiça, à piedade e ao amor ao
próximo. Segundo esses textos, a sabedoria não é um bem a ser conquistado, mas
um dom a ser buscado com humildade. A importância desses livros reside na
valorização da sabedoria como via de acesso ao divino, revelando um caminho que
conduz à plenitude da vida.

4. Como o Livro de Baruc e a Carta de Jeremias, ambos textos apócrifos,


contribuem para nossa compreensão da fé e prática judaica durante o período
do Segundo Templo e como eles são relevantes para a teologia cristã
contemporânea?

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LITERATURA APÓCRIFA 55

O Livro de Baruc e a Carta de Jeremias, embora não sejam canônicos em todas as


tradições cristãs, são documentos significativos que lançam luz sobre a fé e a prática
judaica durante o período do Segundo Templo. O Livro de Baruc reflete o lamento e
a esperança dos exilados judeus, antecipando uma restauração futura pela
misericórdia de Deus. Já a Carta de Jeremias faz uma crítica à idolatria, reforçando a
futilidade da adoração de ídolos. Ambos os textos têm relevância teológica para a
teologia cristã contemporânea, pois abordam temas como o pecado, a redenção e a
verdadeira adoração, e oferecem perspectivas valiosas sobre a persistência da fé em
tempos de tribulação.

5. Como as adições a Ester e Daniel refletem os temas de fé e providência divina


no contexto dos desafios enfrentados pelos personagens principais?
Estas adições ampliam e aprofundam as histórias originais, servindo para ressaltar a
devoção e a confiança dos personagens principais em Deus, apesar dos desafios que
enfrentam. Tais textos, conforme analisados por Fox e Vesco, reforçam o tema da fé
inabalável e da providência divina, demonstrando como a confiança em Deus pode
levar à libertação mesmo nos momentos mais difíceis.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARKER, Margaret. O Livro de Tobias: uma leitura judaica no exílio. São Paulo: Edições Loyola,
2003.

BLANCHARD, Yves-Marie. Os livros dos Macabeus: entre história e teologia. 1ª edição. Paris:
Cerf, 1998.

BLENKINSOPP, Joseph. O Livro de Baruc: Esperança em meio ao exílio. 1. ed. São Paulo:
Paulus, 1996.

BLUM, Erhard. Estudos no Livro de Baruc: Contexto histórico e teológico. 2. ed. Rio de Janeiro:
Loyola, 2000.

BRETTLER, Marc Zvi. Como ler a Bíblia judaica. 1ª edição. Oxford: Oxford University Press,
2005.

CERESKO, Anthony. Sabedoria na tradição bíblica. São Paulo: Paulus, 1999.

COSTA, Isabel. A mulher no Antigo Testamento: uma análise do Livro de Judite. 1ª edição.
Lisboa: Editora Lisboa, 2019.

FOX, Michael. Adições a Ester: Aprofundando a narrativa. 1ª ed. São Paulo: Editora Paulus,
2000.

FOX, Michael. Adições a Ester: Aprofundando a narrativa. São Paulo: Paulus, 2000.

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LITERATURA APÓCRIFA 56

GONÇALVES, Eduardo. As Mulheres no Antigo Testamento: a figura de Judite. 1ª edição. São


Paulo: Paulus, 2017.

HAYWARD, Robert. Carta de Jeremias: uma crítica à idolatria. 1. ed. São Paulo: Vida Nova,
1992.

MARTINS, Adonias. O Exílio e a Fé: uma análise do Livro de Tobias. 2ª edição. Rio de Janeiro:
Editora Vozes, 2015.

O'LOUGHLIN, Thomas. Os livros deuterocanônicos na tradição cristã. 1ª edição. Cambridge:


Cambridge University Press, 2018.

ORLOV, Andrei. Os Exorcismos Macabeus: uma tradição judaica nos tempos do segundo
Templo. 1ª edição. Nova York: Oxford University Press, 2012.

POLIAKOV, Léon. Os Macabeus e a Luta pela Autonomia Judaica. São Paulo: Perspectiva,
1981.

RIBEIRO, Maria Luísa. Anjos na literatura bíblica: a presença de Rafael em Tobias. 1ª edição.
Porto: Editora Porto, 2020.

VERNET, Gabrielle. Judite, uma heroína bíblica revisitada. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2018.

VESCO, Jean-Luc. Daniel e seus acréscimos: Fé frente à adversidade. Rio de Janeiro: Editora
Vozes, 2007.

WRIGHT, Benjamin G. O Eclesiástico e a Sabedoria Judaica. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.

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LITERATURA APÓCRIFA 57

CAPÍTULO 06

CONTEÚDO E SIGNIFICADO DA LITERATURA APÓCRIFA NO


NOVO TESTAMENTO

EVANGELHOS, ATOS, EPÍSTOLAS E APOCALIPSES

" Os textos apócrifos nos permitem ver que havia uma grande diversidade de crenças e
práticas no cristianismo primitivo, bem além do que é refletido no Novo Testamento."
David Brakke

INTRODUÇÃO

A literatura apócrifa relacionada ao Novo Testamento constitui um conjunto de textos,


originados principalmente nos primeiros séculos do cristianismo, que não foram incluídos
no cânon bíblico oficialmente reconhecido pela Igreja. Apesar de sua exclusão do cânon, a
literatura apócrifa do Novo Testamento provê uma visão fascinante das diversas correntes
de pensamento e crenças presentes na era primitiva do cristianismo.

A. OS EVANGELHOS APÓCRIFOS
A literatura apócrifa do Novo Testamento é uma extensa coleção de textos escritos por
cristãos primitivos que não foram incluídos na Bíblia canônica. Dentre esses textos, os
Evangelhos Apócrifos representam uma fonte valiosa de conhecimento sobre os
primeiros séculos do cristianismo, oferecendo interpretações alternativas e, por vezes,
divergentes sobre a vida, os ensinamentos e a natureza de Jesus Cristo.

1. O Evangelho de Tomé
O Evangelho de Tomé é um dos mais conhecidos Evangelhos Apócrifos. Diferente
dos Evangelhos Canônicos, o de Tomé não apresenta uma narrativa linear da vida de
Jesus, mas é uma coletânea de 114 ditos atribuídos a Jesus, alguns dos quais se
assemelham aos encontrados nos Evangelhos Canônicos, enquanto outros são
bastante distintos (MAYER, Marvin W. O Evangelho de Tomé: As palavras secretas de
Jesus. 1ª ed. São Paulo: Paulus, 1992). Este texto nos oferece uma interpretação
gnóstica de Jesus e seus ensinamentos, onde a salvação é obtida através do

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LITERATURA APÓCRIFA 58

autoconhecimento.

2. O Evangelho de Pedro
O Evangelho de Pedro é outro exemplo fascinante de um Evangelho Apócrifo. A
versão mais completa deste texto foi descoberta no Egito em 1886 e apresenta uma
narrativa da paixão, morte e ressurreição de Jesus que se diferencia em vários
aspectos das encontradas nos Evangelhos Canônicos. Por exemplo, neste texto é
narrado que na ressurreição de Jesus, duas figuras angélicas e uma cruz saem do
túmulo, e a cruz fala (CROSSAN, John Dominic. O Evangelho de Pedro: A redescoberta
de um evangelho apócrifo. 1ª ed. São Paulo: Loyola, 2000). Este Evangelho, portanto,
contribui com uma visão alternativa da paixão e ressurreição de Jesus.

3. O Evangelho de Maria
O Evangelho de Maria, embora menos conhecido, é um texto de grande importância
para a compreensão do cristianismo primitivo. Este Evangelho, atribuído a Maria
Madalena, coloca-a como uma discípula proeminente de Jesus, oferecendo uma visão
do papel das mulheres na igreja primitiva. O texto também apresenta ensinamentos
gnósticos, e retrata um diálogo entre Maria e os outros discípulos após a ressurreição
de Jesus (KING, Karen L. O Evangelho de Maria Madalena. 1ª ed. São Paulo: Paulus,
2003). Assim, este texto oferece uma perspectiva única do papel de Maria Madalena
e das mulheres no início do cristianismo.

4. Importância e Controvérsias dos Evangelhos Apócrifos


Os Evangelhos Apócrifos são textos de grande relevância para o estudo do
cristianismo primitivo. Eles apresentam uma ampla gama de interpretações e retratos
de Jesus e seus ensinamentos, que vão além dos retratos oferecidos pelos Evangelhos
Canônicos. No entanto, eles também são cercados de controvérsias. Ao longo da
história, esses textos foram alvo de debates entre teólogos, historiadores e estudiosos
da Bíblia, que discutem sobre sua autenticidade, origem, significado e valor histórico
e teológico (EHRMAN, Bart D. Escrituras Perdidas: Evangelhos e outras revelações
cristãs anteriores desconhecidas. São Paulo: Paulus, 2005).

B. ATOS APÓCRIFOS DOS APÓSTOLOS


Os Atos Apócrifos dos Apóstolos representam uma categoria particular da literatura
cristã antiga, incluindo escritos que foram deliberadamente excluídos do cânone do
Novo Testamento. Longe de serem simples curiosidades, esses textos oferecem uma
janela única para as variações da fé cristã nos primeiros séculos após a morte de Cristo.
Como observado por Ehrman (2003), essas obras são de grande valor para entender a
diversidade das primeiras formas de cristianismo.

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LITERATURA APÓCRIFA 59

1. A natureza dos Atos Apócrifos


Diferentemente dos Atos dos Apóstolos no Novo Testamento, os Atos Apócrifos
tendem a focar em um apóstolo individual, e os textos refletem diferentes estilos,
temas e tradições teológicas. Esses textos são, em sua maioria, pseudoepígrafes, o que
significa que, embora sejam atribuídos a apóstolos específicos, são na verdade o
produto de comunidades cristãs anônimas que os escreveram para ensinar, inspirar e
fortalecer a fé de seus membros. Como Schneemelcher (1991) argumenta, esses
textos oferecem uma rica visão dos diversos e às vezes contraditórios modos de
interpretação e adoração nas comunidades cristãs primitivas.

2. Os Atos de Paulo e Tecla


Os Atos de Paulo e Tecla são um exemplo notável de Atos Apócrifos. Neste texto, a
figura de Tecla é elevada ao estatuto de apóstola, desafiando a dominância masculina
no início do cristianismo. A história de Tecla também ilustra a prática do ascetismo
cristão e a escolha voluntária de celibato como forma de maior devoção a Deus.
Conforme Bovon (1996) observa, os Atos de Paulo e Tecla desafiam a percepção
comum de que a liderança feminina era ausente ou desencorajada no cristianismo
primitivo.

3. Os Atos de Pedro
Os Atos de Pedro são igualmente notáveis, apresentando histórias de milagres e
ensinamentos de Pedro que vão além das narrativas encontradas no Novo
Testamento. Por exemplo, o texto conta a história de Pedro ressuscitando uma atum
morta, um milagre que não é mencionado nos Atos canônicos. Segundo Lapham
(2003), os Atos de Pedro são um exemplo de como as comunidades cristãs primitivas
criaram narrativas para fortalecer a fé e demonstrar o poder dos apóstolos.

4. A relevância dos Atos Apócrifos hoje

Embora os Atos Apócrifos dos Apóstolos não sejam considerados canônicos, eles
continuam a ser de interesse para teólogos e estudiosos por várias razões. Esses textos
oferecem vislumbres da diversidade do cristianismo primitivo, refletindo diferentes
crenças e práticas entre as comunidades cristãs. Além disso, eles expandem nosso
entendimento dos apóstolos, fornecendo histórias adicionais e insights sobre seus
ensinamentos e experiências. Como Klauck (2008) observa, os Atos Apócrifos dos
Apóstolos desafiam as visões simplistas do início do cristianismo e destacam a riqueza
e variedade de suas expressões históricas.

C. EPÍSTOLAS E APOCALIPSES APÓCRIFOS


A literatura apócrifa, particularmente as Epístolas e os Apocalipses do Antigo e do Novo

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LITERATURA APÓCRIFA 60

Testamento, têm sido objeto de fascínio e estudo intenso por teólogos, historiadores e
estudiosos bíblicos. Embora esses textos não tenham sido incorporados ao cânon bíblico,
eles trazem uma rica tapeçaria de tradições, interpretações e concepções religiosas que,
de maneira inequívoca, ampliam nossa compreensão da fé cristã.

1. A Epístola de Barnabé
A Epístola de Barnabé é um exemplo proeminente de epístola apócrifa que reflete o
diálogo contínuo entre o judaísmo e o cristianismo primitivo. Enquanto não é aceita
como parte do cânon bíblico, a Epístola de Barnabé oferece uma visão profunda das
tensões teológicas e sociais que caracterizaram essa época. Como afirmou David
DeSilva, professor de Novo Testamento e Estudos Judaicos, "A Epístola de Barnabé
mostra um esforço consciente para reinterpretar o judaísmo em termos cristãos"
(DESILVA, David. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2004).

2. O Apocalipse de Pedro
O Apocalipse de Pedro é um dos poucos textos apocalípticos apócrifos do Novo
Testamento que sobreviveram até nossos dias. Este texto descreve visões do céu e do
inferno e, como notou Elaine Pagels, professora de História do Cristianismo Primitivo,
"O Apocalipse de Pedro é o primeiro texto cristão que descreve o céu e o inferno em
detalhes visuais e sensoriais, influenciando profundamente a iconografia cristã
posterior" (PAGELS, Elaine. Revelações: Visões, Profecia e Política no Livro do
Apocalipse. São Paulo: Companhia das Letras, 2012).

3. Valor Teológico das Epístolas e Apocalipses Apócrifos


Embora não sejam considerados canônicos, os textos apócrifos, incluindo as
Epístolas e os Apocalipses, contribuem de maneira significativa para a compreensão
do desenvolvimento teológico, cultural e histórico do cristianismo primitivo. Bart
Ehrman, especialista em Novo Testamento, salienta que "Os textos apócrifos iluminam
aspectos do cristianismo primitivo que permaneceriam obscuros apenas com os textos
canônicos" (EHRMAN, Bart. Cristianismos Perdidos: As Batalhas pelos Escritos do
Novo Testamento. São Paulo: Martins Fontes, 2005).

4. Controvérsias em torno das Epístolas e Apocalipses Apócrifos


Apesar do valor dos textos apócrifos, existem controvérsias sobre sua legitimidade e
uso no estudo da fé cristã. Alguns teólogos questionam a autenticidade e a relevância
destes textos, enquanto outros defendem seu valor. No entanto, o estudioso Michael
Kruger argumenta que "A polêmica em torno dos apócrifos revela a dinâmica do
diálogo teológico e a diversidade de pontos de vista no cristianismo primitivo" (KRUGER,
Michael. A Questão do Cânon: Explorando a Autoridade das Escrituras. São Paulo:

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LITERATURA APÓCRIFA 61

Vida Nova, 2016).

D. A FORMAÇÃO E O CONTEXTO DA LITERATURA APÓCRIFA


A formação e o contexto da literatura apócrifa do Antigo e Novo Testamento surgem em
meio a uma efervescência de interpretações e expressões da fé cristã nascente. É no
ambiente repleto de diversas tradições e comunidades que os textos apócrifos surgem,
representando muitas vezes vozes alternativas, marginalizadas ou consideradas heréticas
diante da crescente ortodoxia eclesiástica. Para compreendermos mais profundamente
esse processo, iremos explorar quatro pontos que ajudarão a desvendar a rica
complexidade desse conjunto de textos.

1. A Emergência da Literatura Apócrifa


A literatura apócrifa emerge em meio a um período de grande pluralidade dentro do
cristianismo primitivo. Como expressa Bart D. Ehrman, em seu livro "Lost Christianities:
The Battles for Scripture and the Faiths We Never Knew" (EHRMAN, Bart D.
Cristianismos Perdidos: As Batalhas Pela Escritura e as Fés que Jamais Conhecemos.
São Paulo: Record, 2005), a literatura apócrifa revela a riqueza da diversidade de
crenças e práticas que coexistiam no início do cristianismo.

2. O Conteúdo dos Textos Apócrifos


Os textos apócrifos abrangem uma variedade de temas e formas literárias, desde
evangelhos e cartas até atos apostólicos e apocalipses. Esses textos muitas vezes
oferecem perspectivas alternativas sobre figuras bíblicas e eventos. Por exemplo, o
Evangelho de Tomé, um texto apócrifo bem conhecido, apresenta uma coleção de
ditos atribuídos a Jesus que, em muitos casos, diferem significativamente daqueles
encontrados nos evangelhos canônicos.

3. A Reação da Igreja Ortodoxa


A emergência da igreja ortodoxa viu muitos desses textos apócrifos sendo rejeitados
e suprimidos. Em seu livro "A Heresia da Ortodoxia: Como o Fascínio da Cultura
Contemporânea pela Diversidade Remodelou Nossa Compreensão do Cristianismo
Primitivo" (KÖSTENBERGER, Andreas; KRUGER, Michael. A Heresia da Ortodoxia:
Como a Fascinação da Cultura Contemporânea pela Diversidade Reformulou Nossa
Compreensão do Cristianismo Primitivo. São Paulo: Vida Nova, 2010), os autores
argumentam que a supressão desses textos era frequentemente um movimento em
defesa da uniformidade doutrinária e institucional.

4. A Relevância Contemporânea dos Textos Apócrifos


No mundo contemporâneo, o interesse nos textos apócrifos tem aumentado.

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LITERATURA APÓCRIFA 62

Estudiosos como Elaine Pagels têm argumentado que esses textos podem oferecer
novas perspectivas sobre o cristianismo primitivo e desafiar algumas suposições
convencionais. Além disso, o interesse nos textos apócrifos reflete um desejo mais
amplo de entender a diversidade e a complexidade da tradição cristã.

E. A RECEPÇÃO E O IMPACTO DA LITERATURA APÓCRIFA


A literatura apócrifa, embora não seja parte do cânone da Bíblia cristã, tem
desempenhado um papel significativo na formação do cristianismo, especialmente na
sua fase inicial. Tais textos oferecem um olhar valioso sobre as diversas correntes de
pensamento e interpretações que existiam naquele período (EHRMAN, Bart D. Perdidos
Christianities: The Battles for Scripture and the Faiths We Never Knew. Oxford: Oxford
University Press, 2003).

1. O Conceito de Literatura Apócrifa

O termo 'apócrifo', derivado do grego, significa 'oculto' ou 'secreto'. Na tradição


cristã, a literatura apócrifa compreende os textos que não foram incluídos no cânone
bíblico, muitas vezes por serem considerados de autoria duvidosa ou por conterem
ensinamentos que divergiam das doutrinas oficiais (HENNECKE, Edgar;
SCHNEEMELCHER, Wilhelm. New Testament Apocrypha. Westminster John Knox
Press, 1991). Estes textos incluem evangelhos, atos, cartas e apocalipses que foram
escritos nos primeiros séculos do cristianismo.

2. Influência na Teologia e na Arte Cristãs


A literatura apócrifa teve um impacto indelével na teologia e na arte cristãs, apesar
de sua posição não-canônica. Por exemplo, o Protoevangelho de Tiago, um texto
apócrifo, fornece uma narrativa detalhada do nascimento de Maria e da infância de
Jesus, e essas histórias moldaram as representações da Virgem Maria na arte cristã
(BURKE, Tony. Deception and Revelation in Early Christian Texts. Palgrave Macmillan,
2021). Além disso, algumas das histórias e ideias encontradas nos textos apócrifos
foram incorporadas à teologia cristã, apesar de não serem oficialmente reconhecidas.

3. Importância para a Pesquisa Acadêmica


Na pesquisa acadêmica, a literatura apócrifa é uma fonte inestimável para o
entendimento do desenvolvimento histórico do cristianismo. Estes textos oferecem
uma visão das diversas crenças e práticas que existiam entre os cristãos primitivos
(HARMON, Amy. The Reception of the New Testament Apocrypha in the Early Church.
Bloomsbury, 2022). Portanto, estudar a literatura apócrifa é essencial para
compreender a diversidade e a evolução do pensamento cristão.

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LITERATURA APÓCRIFA 63

4. A Recepção da Literatura Apócrifa na Cultura Cristã


Apesar de sua natureza não-canônica, a literatura apócrifa tem sido bem recebida em
vários contextos dentro da cultura cristã. Muitos destes textos têm sido lidos,
estudados e utilizados em contextos litúrgicos, contribuindo assim para a formação
da identidade e da prática cristã (DENZLER, Brenda. The Lure of the Edge: Scientific
Passions, Religious Beliefs, and the Pursuit of UFOs. University of California Press,
2001).

CONCLUSÃO

Em suma, a literatura apócrifa do Novo Testamento, embora não canônica, é uma fonte
valiosa para a compreensão do cristianismo primitivo. Esses textos nos permitem apreciar a
diversidade de crenças e práticas presentes nos primeiros séculos do cristianismo e desafiam
nossas noções preconcebidas sobre a origem e o desenvolvimento da fé cristã.

Os Evangelhos Apócrifos constituem uma parte significativa da literatura cristã primitiva.


Apesar de não estarem incluídos no cânon bíblico, esses textos nos fornecem uma visão rica
e diversificada dos primeiros séculos do cristianismo e dos muitos modos que a figura de
Jesus e seus ensinamentos foram interpretados e compreendidos.

Os Atos Apócrifos dos Apóstolos fornecem uma visão fascinante do início do cristianismo,
expandindo nossa compreensão dos apóstolos e das primeiras comunidades cristãs. Embora
não sejam canônicos, esses textos são fundamentais para entender a rica diversidade e
variação de crenças e práticas no cristianismo primitivo.

As Epístolas e Apocalipses Apócrifos proporcionam uma visão valiosa do desenvolvimento


e da diversidade do cristianismo primitivo. Enquanto não são considerados parte do cânon
bíblico, estes textos oferecem insights teológicos, culturais e históricos significativos,
ampliando nossa compreensão da fé cristã.

A literatura apócrifa do Antigo e Novo Testamento, formada em um contexto de grande


diversidade e disputa, representa uma rica tapeçaria de vozes e perspectivas alternativas. O
estudo desses textos permite uma compreensão mais profunda do desenvolvimento do
cristianismo primitivo e do amplo espectro de crenças e práticas que coexistiam naquela
época.

A literatura apócrifa, apesar de não fazer parte do cânone bíblico oficial, tem um papel
relevante na teologia, arte e cultura cristãs. Tais textos proporcionam um olhar detalhado
sobre o desenvolvimento do cristianismo primitivo e são valiosos para a pesquisa acadêmica.

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LITERATURA APÓCRIFA 64

REVISÃO

1. Como o Evangelho de Tomé, o Evangelho de Pedro e o Evangelho de Maria


contribuem para o nosso entendimento do cristianismo primitivo e da figura
de Jesus Cristo?
Esses três Evangelhos Apócrifos, cada um à sua maneira, ampliam nossa visão do
cristianismo primitivo. O Evangelho de Tomé, com suas ênfases gnósticas, nos oferece
uma visão de um cristianismo focado no autoconhecimento. O Evangelho de Pedro
apresenta uma narrativa distinta da paixão e ressurreição de Jesus, enquanto o
Evangelho de Maria enfatiza o papel proeminente de Maria Madalena, oferecendo
uma visão única do papel das mulheres na igreja primitiva.

2. Como os Atos Apócrifos dos Apóstolos expandem nossa compreensão do


cristianismo primitivo, e por que são de interesse contínuo para estudiosos e
teólogos?
Os Atos Apócrifos dos Apóstolos expandem nossa compreensão do cristianismo
primitivo ao fornecer narrativas adicionais sobre a vida e o ministério dos apóstolos.
Esses textos também destacam a diversidade das comunidades cristãs primitivas,
revelando diferentes crenças, práticas e interpretações teológicas. Embora não sejam
canônicos, eles continuam a ser de interesse para estudiosos e teólogos porque
fornecem uma visão rica e variada do cristianismo primitivo e de seus
desenvolvimentos históricos.

3. Como as Epístolas e Apocalipses Apócrifos contribuem para a nossa


compreensão do cristianismo primitivo e qual é a relevância desses textos para
os estudos bíblicos contemporâneos?
As Epístolas e Apocalipses Apócrifos servem como um testemunho do diálogo
teológico e das tensões que moldaram o cristianismo primitivo. Esses textos fornecem
insights valiosos sobre as diferentes tradições, interpretações e concepções religiosas
que existiam fora dos textos canônicos. Assim, eles são indispensáveis para os
estudiosos bíblicos que buscam uma compreensão mais completa e contextualizada
do cristianismo primitivo.

4. Qual é a importância do estudo da literatura apócrifa para a compreensão do


cristianismo primitivo e como a igreja ortodoxa emergente reagiu a esses
textos?

O estudo da literatura apócrifa é fundamental para compreender a pluralidade e a


diversidade do cristianismo primitivo. Esses textos revelam uma variedade de crenças,
práticas e perspectivas que coexistiam e muitas vezes competiam umas com as outras

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LITERATURA APÓCRIFA 65

no início do cristianismo. A reação da igreja ortodoxa emergente foi de supressão e


rejeição desses textos, na tentativa de estabelecer uniformidade doutrinária e
institucional.

5. Qual a relevância da literatura apócrifa para o entendimento do cristianismo


primitivo e seu impacto na teologia, arte e cultura cristãs?
A literatura apócrifa é fundamental para entender o cristianismo primitivo, uma vez
que revela a diversidade de crenças e práticas que existiam naquele tempo. Apesar
de não serem canônicos, estes textos tiveram impacto na teologia e na arte cristãs,
fornecendo narrativas e ideias que foram incorporadas nesses campos. Além disso, a
literatura apócrifa tem sido valorizada em diversos contextos dentro da cultura cristã,
mostrando sua relevância contínua.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AUNE, David. O Novo Testamento em Seu Ambiente Literário. São Paulo: Vida Nova, 1995.

BOVON, François. Os Atos de Paulo e Tecla: Apócrifos do Novo Testamento. São Paulo: Paulus,
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LITERATURA APÓCRIFA 67

CAPÍTULO 07

O DEBATE ATUAL EM TORNO DA LITERATURA APÓCRIFA

ACEITAÇÃO E REJEIÇÃO

" O debate em torno da literatura apócrifa não é tanto sobre sua autenticidade ou
autoridade, mas sobre o que ela revela sobre a diversidade de pensamento e interpretação
nas primeiras comunidades cristãs."
Karen L. King

INTRODUÇÃO

A literatura apócrifa sempre foi objeto de intensos debates na teologia cristã, pois são textos
que, embora não tenham sido canonizados, oferecem um panorama fascinante sobre as
diversas vertentes de pensamento que existiam nos primeiros séculos do cristianismo. A
abordagem contemporânea desses textos tem adquirido contornos variados, evidenciando
como o campo da teologia continua a evoluir e a dialogar com novos paradigmas
hermenêuticos.

A. REDEFINIÇÃO DA AUTORIDADE DOS TEXTOS APÓCRIFOS


O estudo dos textos apócrifos do Antigo e Novo Testamentos nos conduz por uma rica
tradição literária que, embora excluída do cânon bíblico, oferece perspectivas únicas
sobre a fé e a prática cristãs primitivas. No centro desse estudo está a questão de
redefinir a autoridade desses textos, uma questão que evoca uma ampla gama de
respostas dentro da teologia cristã.

1. A Autoridade Histórica dos Textos Apócrifos


A noção de autoridade é intrinsecamente ligada ao conceito de cânon.
Tradicionalmente, os textos que foram incorporados ao cânon bíblico foram vistos
como tendo autoridade inerente. No entanto, essa visão é desafiada quando se
considera a literatura apócrifa. Na visão de Bart D. Ehrman em seu livro "Os
Evangelhos Perdidos" (EHRMAN, 2003), os textos apócrifos apresentam uma forma de
autoridade histórica, pois fornecem uma janela para as crenças, práticas e

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LITERATURA APÓCRIFA 68

controvérsias das primeiras comunidades cristãs.

2. A Autoridade Teológica dos Textos Apócrifos


A teologia encontrada na literatura apócrifa é frequentemente distinta daquela dos
textos canônicos. Como Elior (2004) aponta em "Os Manuscritos do Mar Morto", a
literatura apócrifa pode conter visões teológicas que estão em tensão com as
encontradas no cânon, mas isso não diminui sua relevância. Pelo contrário, essas
divergências podem lançar luz sobre aspectos da teologia cristã que são obscurecidos
pela visão canônica dominante.

3. A Autoridade Pastoral dos Textos Apócrifos


A autoridade pastoral dos textos apócrifos se refere à sua capacidade de edificar a fé
e a prática cristãs. Mesmo que um texto não seja canônico, ainda pode oferecer
conselhos, consolo e orientação que são relevantes para a vida cristã contemporânea.
Para Klauck (2005) em "Apócrifos do Novo Testamento", essa é uma forma de
autoridade que não deve ser subestimada.

4. A Autoridade dos Textos Apócrifos na Era Digital


A era digital levou a uma democratização sem precedentes do acesso a textos
religiosos. Isso teve um impacto significativo na percepção da autoridade dos textos
apócrifos, como articula Jenkins (2011) em "A Nova Face do Cristianismo". A
disseminação ampla e fácil desses textos através da internet permitiu que mais
pessoas se envolvessem com eles, desafiando a noção de que a autoridade é algo
que apenas um pequeno grupo de líderes eclesiásticos pode conferir.

B. REINTERPRETAÇÃO DOS TEXTOS APÓCRIFOS À LUZ DE CONTEXTOS


CONTEMPORÂNEOS

Os textos apócrifos, muitas vezes marginalizados na interpretação bíblica tradicional,


trazem em seu seio reflexões teológicas potencialmente enriquecedoras para nossa
compreensão do cristianismo. Ao mergulharmos nessas narrativas, emergem
perspectivas que dialogam diretamente com os dilemas e questionamentos do mundo
contemporâneo. Partindo dessa premissa, este estudo se propõe a refletir sobre a
reinterpretação dos textos apócrifos à luz dos contextos contemporâneos.

1. Evangelho de Tomé e a espiritualidade contemporânea


O Evangelho de Tomé, por exemplo, ilustra essa questão com perfeição. Este texto
apócrifo, como Pagels (1979) observa, coloca em destaque a busca interior pela
divindade. Diferentemente de muitas narrativas canônicas, o Evangelho de Tomé
valoriza a experiência pessoal de encontro com o sagrado. Em uma era marcada por

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LITERATURA APÓCRIFA 69

uma busca crescente por uma espiritualidade mais personalizada e menos


institucionalizada, esse texto oferece insights valiosos.

2. O Evangelho de Maria e o papel da mulher na igreja


Outro texto que fala diretamente ao contexto contemporâneo é o Evangelho de
Maria. Este evangelho, não canônico, levanta questões importantes sobre a liderança
feminina na igreja, um tópico de relevante discussão na atualidade. O Evangelho de
Maria apresenta Maria Madalena como uma discípula proeminente e respeitada, que
compartilha sua visão espiritual com os outros discípulos. Esta representação contrasta
com as imagens mais tradicionais de Maria Madalena, e inspira reflexões sobre a
inclusão e o papel da mulher no seio eclesiástico.

3. O Evangelho de Judas e a quebra de paradigmas


O Evangelho de Judas, mais um documento apócrifo, apresenta uma narrativa que
desafia muitas concepções tradicionais do cristianismo. Este evangelho retrata Judas
não como o vilão da história de Jesus, mas como um personagem complexo e
essencial para a missão do Messias. Em um mundo que frequentemente busca uma
maior nuance em suas interpretações de eventos históricos e culturais, o Evangelho
de Judas nos desafia a repensar nossas compreensões estabelecidas.

4. Os textos apócrifos como diálogo inter-religioso


Além disso, muitos textos apócrifos oferecem uma visão mais inclusiva do
cristianismo que pode ser relevante para os esforços contemporâneos de diálogo
inter-religioso. Muitos desses textos refletem interações e influências mútuas entre o
cristianismo primitivo e outras tradições religiosas. Eles podem, portanto, ajudar a
construir pontes de compreensão e respeito mútuo entre diferentes tradições
religiosas no mundo contemporâneo.

C. A LITERATURA APÓCRIFA E A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE CRISTÃ

A formação da identidade cristã se deu através de um mosaico multifacetado de


influências culturais, políticas e religiosas. Uma dessas importantes influências foi a
literatura apócrifa, uma série de textos que, embora não incluídos no cânon bíblico,
desempenharam um papel fundamental na conformação das ideias e práticas religiosas
nas primeiras comunidades cristãs. Segundo Hurtado (2005), a literatura apócrifa ajudou
a definir as fronteiras da fé cristã, especialmente em relação a outras correntes religiosas
da época.

1. A contribuição dos Apócrifos na formação dos conceitos cristãos


O Livro de Enoque, um exemplo notável de literatura apócrifa, influenciou

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LITERATURA APÓCRIFA 70

consideravelmente a escatologia e a angelologia cristãs. No Novo Testamento, por


exemplo, a Epístola de Judas cita diretamente o Livro de Enoque (Judas 1:14-15),
indicando a relevância deste texto para os primeiros cristãos. De acordo com o
teólogo Charlesworth (1983), o Livro de Enoque proporcionou aos primeiros cristãos
uma rica cosmologia que contribuiu para a formação de uma identidade religiosa
distinta.

2. Os Apócrifos como fontes de práticas e rituais cristãos


A Didaché, outro exemplo de literatura apócrifa, ofereceu orientação prática para o
batismo, a Eucaristia e a conduta moral, estabelecendo as bases para muitas práticas
cristãs. Stanley (2003) argumenta que a Didaché foi fundamental para a cristalização
das práticas litúrgicas nas comunidades cristãs primitivas.

3. Os Apócrifos e o entendimento da figura de Jesus

A literatura apócrifa também influenciou o entendimento dos primeiros cristãos sobre


a figura de Jesus. O Protoevangelho de Tiago, por exemplo, expande a história de
Maria e a infância de Jesus, proporcionando um retrato mais detalhado de sua vida.
Segundo Pagels (1975), este texto apócrifo enriqueceu o imaginário cristão sobre a
figura de Jesus e de sua família.

4. A literatura apócrifa e a resistência às heresias


A literatura apócrifa também foi importante para a resistência às heresias. O Pastor
de Hermas, por exemplo, é considerado um guia para a purificação moral e espiritual,
proporcionando aos cristãos orientações contra as doutrinas gnósticas. Tuckett (1992)
sugere que textos como o Pastor de Hermas foram fundamentais para fortalecer a
ortodoxia cristã diante das correntes heréticas da época.

D. A LITERATURA APÓCRIFA COMO RECURSO PARA O DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO


A literatura apócrifa, embora não esteja inclusa no cânone da Bíblia cristã oficial, tem
ganhado cada vez mais reconhecimento como um recurso valioso para o diálogo inter-
religioso. Esses textos oferecem uma visão alternativa sobre as práticas religiosas, as
crenças e a história não apenas do cristianismo, mas também de outras tradições
religiosas. O estudo desses textos apócrifos pode revelar muito sobre a diversidade
religiosa e o pluralismo que existiram na antiguidade.

1. O valor da literatura apócrifa


Os escritos apócrifos, sejam do Antigo ou do Novo Testamento, podem ser de grande
valor na facilitação do diálogo inter-religioso. Como apontado por Ehrman (2003),
esses textos permitem uma compreensão mais abrangente e aprofundada da

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LITERATURA APÓCRIFA 71

formação das crenças religiosas e podem revelar concepções de divindade e salvação


que diferem significativamente das versões mais tradicionais. A Ascese de Isaías, por
exemplo, possui elementos do cristianismo e do judaísmo, ilustrando o terreno
comum existente entre essas duas tradições.

2. Os apócrifos e o judaísmo
No contexto do judaísmo, os apócrifos podem fornecer insights valiosos. Como
observado por Vermes (2004), textos como o Livro de Enoch e os Salmos de Salomão
podem revelar a diversidade de pensamentos e tradições dentro do judaísmo do
Segundo Templo. Esses textos podem ser usados para iluminar discussões entre
judeus e cristãos, especialmente em relação à crença na ressurreição e no
messianismo.

3. Os apócrifos e o gnosticismo

Os textos apócrifos também são importantes para entender o gnosticismo, uma


corrente religiosa que foi influente nos primeiros séculos do cristianismo. O
Evangelho de Judas, citado por Pagels (2005), é um exemplo desses textos que
expressam uma compreensão gnóstica de Jesus e da salvação. Estudar esses textos
pode abrir caminhos para o diálogo com tradições religiosas que possuem elementos
gnósticos, como o mandeísmo2.

4. Os desafios do uso de literatura apócrifa

Embora os textos apócrifos sejam um recurso valioso, eles também apresentam


desafios. Como apontado por Orlov (2005), há uma variedade de textos e tradições,
e nem todos são facilmente compreendidos ou aceitos por todas as tradições
religiosas. A interpretação desses textos requer uma abordagem cuidadosa e
respeitosa, levando em consideração as diferentes tradições e crenças.

E. A BUSCA PELA AUTENTICIDADE DOS TEXTOS APÓCRIFOS

A autenticidade dos textos apócrifos tem sido um tópico de intensa pesquisa e debate
entre teólogos, historiadores e estudiosos das Escrituras. Estes textos, que incluem uma
variedade de escritos, como o Evangelho de Tomé, o Evangelho de Pedro e os Atos de
Paulo e Tecla, não foram incluídos na Bíblia canônica, mas ainda assim têm
desempenhado um papel significativo na formação do entendimento cristão da história
sagrada.

2
O mandeísmo é uma religião étnica classificada por estudiosos como gnóstica, remanescentes até os dias
atuais. Veneram João Batista como o Messias e praticam o ritual do batismo. Possuem cerca de 100 mil adeptos
em todo o mundo, principalmente no Iraque.

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LITERATURA APÓCRIFA 72

1. Avaliação da autenticidade dos textos apócrifos


Ao avaliar a autenticidade dos textos apócrifos, os estudiosos procuram
primeiramente identificar o autor, a data e o local de composição. Segundo Ehrman
(2005), um dos métodos mais eficazes para avaliar a autenticidade de um texto antigo
é através da crítica textual, que envolve a análise cuidadosa do vocabulário, da
gramática e do estilo de escrita do texto. Este método, porém, não é infalível, pois os
escritores antigos muitas vezes imitavam o estilo de outros escritores ou adaptavam
seu próprio estilo para atender a propósitos específicos.

2. A importância da crítica histórica


Além da crítica textual, a crítica histórica também é um componente essencial na
avaliação da autenticidade dos textos apócrifos. Como Maccoby (2006) salienta, o
contexto histórico de um texto pode fornecer pistas valiosas sobre sua autenticidade.
Por exemplo, referências a eventos históricos, figuras políticas ou costumes sociais
específicos podem ajudar a situar um texto em um determinado período ou local.
Entretanto, como Maccoby adverte, a crítica histórica deve ser usada com cautela,
pois os autores antigos às vezes incorporavam informações históricas incorretas ou
anacrônicas em seus escritos.

3. As controvérsias envolvendo os textos apócrifos


As controvérsias que envolvem os textos apócrifos também desempenham um papel
na busca pela autenticidade. Pagels (1979) argumenta que muitos desses textos
foram rejeitados pela Igreja primitiva não por serem inautênticos, mas porque
expressavam ideias teológicas que eram consideradas heréticas. Por exemplo, o
Evangelho de Tomé, que contém muitos ditos atribuídos a Jesus que não são
encontrados nos evangelhos canônicos, foi rejeitado porque alguns de seus
ensinamentos foram interpretados como gnósticos, uma corrente de pensamento
que a Igreja primitiva considerava perigosa.

4. O papel dos textos apócrifos na formação da tradição cristã


Apesar das controvérsias, os textos apócrifos têm desempenhado um papel na
formação da tradição cristã. Como Goodacre (2009) aponta, muitos destes textos
fornecem uma perspectiva única sobre a vida e os ensinamentos de Jesus que não é
encontrada nos evangelhos canônicos. Além disso, eles também oferecem um
vislumbre das diversas maneiras pelas quais os primeiros cristãos entendiam e
interpretavam a mensagem de Jesus.

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LITERATURA APÓCRIFA 73

CONCLUSÃO

Em suma, o debate contemporâneo sobre a literatura apócrifa abrange uma série de


questões, desde a redefinição da autoridade dos textos apócrifos à sua reinterpretadação à
luz de contextos contemporâneos, passando pelo papel dos apócrifos na formação da
identidade cristã, seu uso para o diálogo inter-religioso e a busca por sua autenticidade.
Essas discussões demonstram a relevância contínua da literatura apócrifa para a teologia
cristã.

O estudo dos textos apócrifos levanta questões significativas sobre a natureza da autoridade
no cristianismo. Embora não sejam considerados canônicos, esses textos possuem formas
de autoridade que desafiam nossas concepções tradicionais, oferecendo novas maneiras de
entender a fé e a prática cristãs.

Os textos apócrifos do Antigo e Novo Testamento, quando reexaminados à luz dos


contextos contemporâneos, oferecem uma riqueza de insights para a teologia cristã. Eles
nos desafiam a repensar nossas suposições, a questionar nossos preconceitos e a explorar
novas possibilidades para a compreensão da mensagem cristã.

A literatura apócrifa, embora marginalizada em alguns contextos, desempenhou um papel


significativo na formação da identidade cristã. Seus textos ofereceram aos primeiros cristãos
um manancial de conceitos teológicos, práticas litúrgicas, imagens da figura de Jesus e
resistência às heresias. Deste modo, a influência da literatura apócrifa na formação da
identidade cristã é uma área que merece maior atenção e estudo.

A literatura apócrifa oferece uma riqueza de informações e insights que podem ser úteis
para facilitar o diálogo inter-religioso. Ao explorar esses textos, podemos obter uma
compreensão mais completa e matizada das várias tradições religiosas, enriquecendo assim
o diálogo e o entendimento mútuo.

A busca pela autenticidade dos textos apócrifos é uma tarefa desafiadora que requer uma
análise cuidadosa e uma abordagem crítica. Embora esses textos possam não ter sido
incluídos na Bíblia canônica, eles ainda têm muito a oferecer para aqueles que buscam um
entendimento mais profundo da história e da tradição cristã.

REVISÃO

1. Como a autoridade dos textos apócrifos do Antigo e Novo Testamento pode


ser redefinida à luz dos debates teológicos contemporâneos, considerando sua
relevância histórica, teológica e pastoral, bem como seu status na era digital?
A redefinição da autoridade dos textos apócrifos pode ser entendida em termos de
sua autoridade histórica, teológica e pastoral. A autoridade histórica desses textos

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LITERATURA APÓCRIFA 74

reside em seu papel como testemunhas das primeiras comunidades cristãs. A


autoridade teológica, por outro lado, reside na capacidade desses textos de oferecer
perspectivas únicas e às vezes divergentes sobre a fé e a prática cristãs. A autoridade
pastoral se refere à relevância desses textos para a vida cristã contemporânea. Além
disso, a era digital abriu novos caminhos para a autoridade dos textos apócrifos,
democratizando seu acesso e permitindo uma participação mais ampla na discussão
de sua relevância e significado.

2. Como a interpretação dos textos apócrifos, como o Evangelho de Tomé, o


Evangelho de Maria e o Evangelho de Judas, podem contribuir para um
entendimento mais aprofundado da espiritualidade contemporânea, do papel
da mulher na igreja, da revisão de personagens históricos e do diálogo inter-
religioso?
A reinterpretação desses textos à luz dos contextos contemporâneos revela
perspectivas potencialmente enriquecedoras. O Evangelho de Tomé, com sua ênfase
na busca interior pela divindade, ressoa com a busca atual por uma espiritualidade
mais personalizada. O Evangelho de Maria, com sua representação da liderança
feminina, traz contribuições relevantes para as discussões atuais sobre o papel da
mulher na igreja. O Evangelho de Judas, ao retratar Judas de forma mais complexa,
desafia as interpretações tradicionais e nos leva a repensar as narrativas
convencionais. Além disso, muitos desses textos oferecem uma visão inclusiva do
cristianismo, relevante para os esforços contemporâneos de diálogo inter-religioso.

3. Como a literatura apócrifa, exemplificada pelo Livro de Enoque, a Didaché, o


Protoevangelho de Tiago e o Pastor de Hermas, influenciou a formação da
identidade cristã nas primeiras comunidades, contribuindo para a definição de
conceitos teológicos, práticas litúrgicas, entendimento da figura de Jesus e
resistência às heresias?
A literatura apócrifa contribuiu de maneira substancial para a formação da identidade
cristã nas primeiras comunidades. O Livro de Enoque, por exemplo, teve um papel
importante na definição de conceitos de escatologia e angelologia, conforme
evidenciado pela citação direta no Novo Testamento (Judas 1:14-15). A Didaché
contribuiu para a definição de práticas litúrgicas e normas morais, enquanto o
Protoevangelho de Tiago proporcionou um retrato mais rico da vida de Jesus e de
sua família. Por fim, o Pastor de Hermas ofereceu uma orientação moral e espiritual
que fortaleceu a ortodoxia cristã contra as correntes heréticas.

4. Como a literatura apócrifa pode facilitar o diálogo inter-religioso e quais são


os desafios que essa abordagem pode enfrentar?

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A literatura apócrifa oferece uma visão alternativa sobre as práticas religiosas, as


crenças e a história de várias tradições religiosas. Ela pode revelar muito sobre a
diversidade e o pluralismo religiosos que existiam na antiguidade. Esses textos podem
ser úteis para entender melhor a formação das crenças religiosas e para explorar
concepções alternativas de divindade e salvação. No entanto, o uso da literatura
apócrifa no diálogo inter-religioso também apresenta desafios. A variedade de textos
e tradições pode ser difícil de navegar e interpretar, e nem todos os textos são
facilmente aceitos por todas as tradições religiosas. É necessária uma abordagem
cuidadosa e respeitosa para utilizar esses textos de maneira eficaz.

5. Qual o papel da crítica textual e histórica na avaliação da autenticidade dos


textos apócrifos e como as controvérsias em torno desses textos afetaram a
sua aceitação e uso na tradição cristã?
A crítica textual e histórica são ferramentas essenciais na avaliação da autenticidade
dos textos apócrifos. Elas permitem aos estudiosos analisar o vocabulário, a gramática
e o estilo de um texto, bem como situá-lo em seu contexto histórico e cultural.
Entretanto, mesmo um texto que passa por essas avaliações pode ainda ser objeto
de controvérsia, especialmente se expressa ideias teológicas que são consideradas
heréticas ou desviantes. Tais controvérsias podem afetar a aceitação de um texto e
seu uso na tradição cristã, mesmo que ele ofereça uma perspectiva única e valiosa
sobre a vida e os ensinamentos de Jesus.

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LITERATURA APÓCRIFA 77

CAPÍTULO 08

ORIGEM E HISTÓRIA DA BÍBLIA

FORMAÇÃO DO ANTIGO E NOVO TESTAMENTO

"Não conhecemos o número exato de autores da Bíblia, porque muitos dos livros são
anônimos, tendo sido escritos por pessoas que não identificaram seus nomes e cujos nomes
nunca serão conhecidos."
Bart D. Ehrman

INTRODUÇÃO

A. ORIGEM E HISTÓRIA DA BÍBLIA


A Bíblia, sendo um dos livros mais influentes da história, traz em sua origem e
desenvolvimento um registro profundo e rico da humanidade. Desde suas primeiras
formações no Antigo Testamento até o desenvolvimento do Novo Testamento, a Bíblia
passou por muitas etapas antes de chegar à forma que conhecemos hoje.

1. Origem da Bíblia
Os primeiros textos que viriam a compor a Bíblia foram registrados entre os séculos
XIV e II a.C., durante o período conhecido como a Idade do Ferro do antigo Israel e
Judá. Esses textos foram escritos em diferentes momentos, por diferentes autores e
em diversos contextos sociais e políticos. Como Metzger (2001) e Ehrman (2005)
afirmam, a Bíblia não foi escrita por um único autor, mas é uma compilação de obras
de vários autores ao longo de muitos séculos.

2. Formação do Antigo Testamento

O Antigo Testamento é a primeira parte da Bíblia e é aceito tanto pelo Judaísmo


quanto pelo Cristianismo. Ele contém a Lei (Torá), os Profetas (Nevi'im) e os Escritos
(Ketuvim). No que diz respeito à formação do Antigo Testamento, não existe um
consenso entre os estudiosos. Segundo Friedman (1997), é possível que o Pentateuco

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LITERATURA APÓCRIFA 78

(os cinco primeiros livros da Bíblia) tenha sido compilado em sua forma atual no
século V a.C., enquanto outros livros podem ter sido adicionados posteriormente.

3. Desenvolvimento do Novo Testamento


O Novo Testamento, a segunda parte da Bíblia cristã, contém os ensinamentos de
Jesus e os escritos dos primeiros cristãos. O processo de formação do Novo
Testamento começou no século I d.C. e durou vários séculos. Como afirmou Bruce
(1981), a lista oficial de livros que compõem o Novo Testamento, conhecida como
cânon do Novo Testamento, foi estabelecida somente no século IV d.C.

4. A Bíblia e a Literatura Apócrifa


Existem também os textos apócrifos, que não foram incluídos na Bíblia canônica, mas
que têm sua importância na tradição cristã. Segundo Ehrman (2003), esses textos
incluem evangelhos, epístolas, atos e apocalipses que fornecem diferentes
perspectivas sobre a vida de Jesus e os primeiros cristãos. Eles têm sido objeto de
estudo constante, pois oferecem uma visão adicional da formação do cristianismo
primitivo.

B. COMO A BÍBLIA FOI ESCRITA


A Bíblia, um texto sagrado do cristianismo, abrange uma diversidade de livros escritos
em diversos períodos históricos e contextos culturais. Trata-se de uma coletânea de
escritos distintos, abarcando uma gama de gêneros literários, de poesia a profecias, de
narrativas históricas a ensinamentos de sabedoria e de relatos de vida a cartas. Para
entender como a Bíblia foi escrita, é necessário adentrar nas perspectivas da formação
dos livros, a canonização bíblica, as traduções subsequentes e o impacto teológico dos
textos.

1. Formação dos Livros


Os escritos bíblicos foram compostos ao longo de séculos por uma pluralidade de
autores. Como expresso por Maier (1994), a escrita da Bíblia provavelmente começou
no século XV a.C. e continuou até o século I d.C. No Antigo Testamento, acredita-se
que Moisés tenha sido o autor dos cinco primeiros livros, conhecidos como
Pentateuco, no século XV a.C. (Êxodo 17:14). Os Profetas, Salmos e os demais livros
foram acrescentados ao longo do tempo, cada um em seu contexto histórico e
cultural próprio. Já no Novo Testamento, os Evangelhos, as cartas dos apóstolos e o
Apocalipse foram escritos no primeiro século d.C.

2. Canonização Bíblica
A canonização bíblica refere-se ao processo pelo qual os livros foram reconhecidos

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LITERATURA APÓCRIFA 79

como inspirados por Deus e incorporados na Bíblia. Essa seleção não foi arbitrária;
como observado por Metzger (1987), cada livro passou por um escrutínio rigoroso
para determinar sua autenticidade e inspiração divina. O cânon do Antigo
Testamento, por exemplo, foi aceito pelos judeus e posteriormente adotado pela
igreja cristã primitiva. O cânon do Novo Testamento foi firmado pela Igreja no século
IV, com os 27 livros que conhecemos hoje.

3. Traduções da Bíblia
Desde a sua formação, a Bíblia foi traduzida para várias línguas para atender à
necessidade de torná-la acessível a diferentes povos. O exemplo mais antigo é a
Septuaginta, uma tradução do Antigo Testamento do hebraico para o grego feita no
século III a.C. Posteriormente, São Jerônimo produziu a Vulgata, tradução do Antigo
e do Novo Testamento para o latim no século IV (Metzger, 1977). Com o passar dos
séculos, a Bíblia foi traduzida para uma multiplicidade de idiomas, inclusive o
português, tornando-se o livro mais traduzido na história.

4. Impacto Teológico dos Textos


A Bíblia possui uma importância teológica imensa. Ela é vista como a Palavra de Deus
e serve como base para a fé e a prática cristã. Conforme destaca Packer (1993), as
verdades fundamentais do cristianismo, como a natureza de Deus, a salvação pela fé
em Cristo e a vida eterna, estão todas contidas na Bíblia.

C. AS DIFERENTES LÍNGUAS NA CONSTRUÇÃO DO TEXTO BÍBLICO


A Bíblia, um dos documentos mais venerados e influentes da história, representa um
notável empreendimento linguístico. Produzida ao longo de vários séculos por uma
multiplicidade de autores, a construção do texto bíblico envolveu diversas línguas, cada
uma contribuindo com suas particularidades únicas para o entendimento do conteúdo
sagrado. Embora as línguas principais envolvidas na escrita da Bíblia sejam hebraico,
aramaico e grego, a tradução e interpretação em muitas outras línguas têm sido de
grande importância para a disseminação do Cristianismo pelo mundo.

1. O Hebraico e o Antigo Testamento


A língua hebraica desempenha um papel de destaque na formação da Bíblia, sendo
a língua original da maior parte do Antigo Testamento (Tanakh). De acordo com
Steven Notley (2011), o hebraico foi a língua da antiga Israel desde o segundo milênio
a.C., proporcionando uma base sólida para a transmissão das histórias, leis e profecias
que compõem a Bíblia. É notável que a estrutura gramatical do hebraico, com seus
verbos altamente inflexionais, desempenhou um papel significativo na moldagem dos
conteúdos do texto bíblico (NOTLEY, Steven. Hebraico: a língua do Antigo

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LITERATURA APÓCRIFA 80

Testamento. São Paulo: Ed. Paulinas, 2011).

2. O Aramaico na Bíblia
Algumas partes da Bíblia foram escritas em aramaico, uma língua semítica
intimamente relacionada ao hebraico. Os livros de Daniel e Esdras, por exemplo,
contêm seções escritas nesta língua. De acordo com Emanuel Tov (1992), o aramaico
tornou-se a língua franca do Oriente Médio durante o período do exílio babilônico,
refletindo assim seu uso em partes do Antigo Testamento (TOV, Emanuel. Textual
Criticism of the Hebrew Bible. Minneapolis: Fortress Press, 1992).

3. O Grego e o Novo Testamento


O Novo Testamento foi escrito originalmente em grego koiné, a forma de grego
usada durante o Império Romano. Bart D. Ehrman (2005) argumenta que o grego
koiné, sendo a língua comum do Mediterrâneo oriental na época, permitiu que os
autores do Novo Testamento alcançassem um público amplo, transmitindo os
ensinamentos de Jesus Cristo a um número maior de pessoas (EHRMAN, Bart D.
Misquoting Jesus: The Story Behind Who Changed the Bible and Why. São Paulo:
Editora Planeta, 2005).

4. A Tradução da Bíblia para Outras Línguas


A tradução da Bíblia para outras línguas tem sido uma parte essencial da
disseminação do Cristianismo. Já no século II, a Bíblia foi traduzida para o latim,
resultando na Vulgata Latina de Jerônimo, que se tornou a versão oficial da Bíblia para
a Igreja Católica Romana. Segundo David Daniell (2003), a tradução da Bíblia para o
vernáculo de diferentes povos teve um impacto enorme na formação de suas
identidades culturais e religiosas (DANIELL, David. The Bible in English: Its History and
Influence. Londres: Yale University Press, 2003).

D. OS PRIMEIROS MANUSCRITOS DA BÍBLIA

No universo teológico cristão, o estudo e a apreciação dos manuscritos bíblicos originais


constituem um campo de investigação intensa e contínua. A compreensão aprofundada
desses textos representa uma janela para a história e o pensamento das civilizações
antigas, bem como um instrumento para desvendar a própria mensagem divina que eles
transmitem. A análise crítica dos primeiros manuscritos da Bíblia permite um
entendimento mais autêntico e original do conteúdo bíblico e fornece ferramentas para
interpretar as tradições de fé que se desenvolveram em torno desses textos sagrados.

1. Manuscritos do Antigo Testamento


Os mais antigos manuscritos do Antigo Testamento que temos conhecimento são os

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LITERATURA APÓCRIFA 81

Manuscritos do Mar Morto, datados aproximadamente do século II a.C. até o


primeiro século d.C. Estes manuscritos incluem uma versão completa do Livro de
Isaías, bem como fragmentos de quase todos os outros livros do Antigo Testamento,
exceto o livro de Ester. (WISE, Michael; ABEGG JR., Martin; COOK, Edward. Os
Manuscritos do Mar Morto. 1. ed. São Paulo: Mercuryo, 1997). Embora não
possuamos manuscritos originais do período do Primeiro Templo (1006–586 a.C.), os
Manuscritos do Mar Morto fornecem uma testemunha inestimável do estado do texto
bíblico durante o Segundo Templo. Os manuscritos Qumran, descobertos entre
1947 e 1956 em cavernas próximas ao Mar Morto, no atual território de Israel. Eles
são importantes por oferecerem uma visão única sobre a história da transmissão do
texto bíblico, permitindo aos estudiosos comparar as diferenças entre as versões
atuais do texto e as versões mais antigas.

Outros importantes manuscritos do Antigo Testamento incluem o Codex


Alexandrinus, o Codex Vaticanus e o Codex Sinaiticus, todos datados do século IV
d.C. Esses manuscritos são escritos em grego e contêm uma tradução do Antigo
Testamento para o idioma.

2. Manuscritos do Novo Testamento


Quanto ao Novo Testamento, temos fragmentos de cópias em grego que datam do
segundo século d.C., como o Papiro P52, que contém partes do Evangelho de João.
Uma das coleções mais importantes de manuscritos do Novo Testamento é a famosa
Codex Sinaiticus, datada do século IV d.C., que contém a versão mais antiga
completa do Novo Testamento (METZGER, Bruce; EHRMAN, Bart. O texto do Novo
Testamento: sua transmissão, corrupção e restauração. 4. ed. São Paulo: Vida Nova,
2015).

Os manuscritos mais antigos em referência ao Novo Testamento, são os papiros de


Oxirrinco, que datam do século II d.C. Esses fragmentos incluem partes dos
Evangelhos e das Epístolas, e foram descobertos em 1897 no Egito. Outro importante
manuscrito do Novo Testamento é o Codex Sinaiticus, datado do século IV d.C.

Todos esses manuscritos são importantes por fornecerem evidências valiosas sobre a
história da Bíblia, permitindo aos estudiosos entender melhor a origem e a
transmissão dos textos sagrados. Eles também são importantes por oferecerem uma
visão sobre a forma como a Bíblia foi entendida e interpretada ao longo dos séculos,
influenciando profundamente a cultura e a história.

3. A Importância da Crítica Textual


A crítica textual, ou a arte de reconstituir o texto original da Bíblia através do exame
dos manuscritos, é essencial para entender o texto sagrado na sua forma mais

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LITERATURA APÓCRIFA 82

autêntica. É essa prática que permite identificar variantes textuais, compreender a


história da transmissão do texto e avaliar a autenticidade dos manuscritos bíblicos.
Especialistas como Kurt Aland e Bruce Metzger dedicaram a vida ao estudo e a
aplicação da crítica textual para aprimorar nossa compreensão da Bíblia (ALAND, Kurt;
ALAND, Barbara. O Texto do Novo Testamento: Introdução às edições científicas do
Novo Testamento Grego bem como à Teoria e Prática da Moderna Crítica Textual. 2.
ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 2013).

4. O Papel dos Manuscritos Apócrifos


Além do cânon bíblico, existem também uma série de escritos apócrifos - textos que
não foram aceitos oficialmente como parte da Bíblia, mas que ainda oferecem uma
perspectiva valiosa sobre a formação e a história do cristianismo primitivo. Por
exemplo, os Evangelhos de Tomé e de Pedro, e o Livro de Enoque, apresentam
aspectos do pensamento e prática cristãos primitivos que não são facilmente
encontrados nos textos canônicos (CHARLESWORTH, James. Os Pseudepígrafos do
Antigo Testamento. 1. ed. São Paulo: Loyola, 2003).

E. TEXTOS BASES PARA AS VERSÕES ANTIGAS DO ANTIGO E NOVO TESTAMENTO


O estudo das versões antigas do Antigo e Novo Testamento tem se fundamentado
principalmente em um corpus de textos que fornecem o substrato sobre o qual a
tradição escriturística cristã se desenvolveu. Este tema desdobra-se em vários ramos e
subcampos de interesse, cada um com sua riqueza de textos base e de interpretações
destes. Neste tópico, focaremos na análise de quatro pontos: Manuscritos do Mar Morto,
Septuaginta, Vulgata Latina e Textus Receptus.

1. Manuscritos do Mar Morto


Os Manuscritos do Mar Morto (citados no tópico anterior), descobertos entre 1947 e
1956, são um dos principais alicerces do Antigo Testamento. Estes documentos,
compostos por aproximadamente 980 textos, abrangem muitos aspectos da vida e
crenças de uma comunidade judaica que existiu entre o final do período do Segundo
Templo. Eles incluem a cópia mais antiga conhecida do texto hebraico do Antigo
Testamento, e, portanto, são uma fonte primária inestimável para o estudo das
Escrituras Hebraicas. Como VanderKam (1994) observou: "Os Manuscritos do Mar
Morto são a chave para entender o mundo do judaísmo do qual surgiu o
cristianismo".

2. Septuaginta
A Septuaginta, também conhecida como a versão dos "setenta", é uma tradução
grega do Antigo Testamento feita em Alexandria, no Egito, por volta do século III a.C.

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LITERATURA APÓCRIFA 83

Conforme apontado por Hengel (2002), a Septuaginta foi o Antigo Testamento da


igreja primitiva, sendo usada pelos primeiros cristãos e pelos escritores do Novo
Testamento. Esta versão não só proporciona uma visão única das comunidades
judaicas de fala grega, mas também serve como uma ponte entre o Antigo e o Novo
Testamento, demonstrando a continuidade teológica entre ambos.

3. Vulgata Latina

A Vulgata Latina, traduzida por Jerônimo no final do século IV, foi a primeira tradução
oficial da Bíblia para o latim e se tornou a Bíblia da Igreja Latina por mais de um
milênio. A sua importância para o desenvolvimento da teologia cristã não pode ser
exagerada. Pelikan (2005) destaca que a Vulgata Latina foi "uma ferramenta poderosa
para a cristianização do Império Romano". Além disso, esta versão moldou o
vocabulário e a sintaxe do latim eclesiástico, influenciando a linguagem teológica por
séculos.

4. Textus Receptus
O Textus Receptus refere-se ao texto grego do Novo Testamento publicado por Erasmo
de Roterdã no século XVI. Apesar de algumas críticas à sua precisão, o Textus
Receptus desempenhou um papel significativo na formação do texto bíblico recebido
pela tradição protestante, pois foi a base para as primeiras traduções da Bíblia para o
inglês, alemão e outras línguas. Metzger (2005) lembrou que, apesar de suas
limitações, o Textus Receptus tem "uma importância inestimável na história da Bíblia".

CONCLUSÃO

A Bíblia, tanto o Antigo quanto o Novo Testamento, é um testemunho do


desenvolvimento da fé e da religião ao longo da história. Seja através dos textos
canônicos ou dos apócrifos, a Bíblia oferece uma janela única para a compreensão de
diferentes aspectos da vida, da cultura e da religião da antiguidade.

A construção do texto bíblico, portanto, é um fenômeno linguístico e cultural de grande


relevância. A variedade de línguas envolvidas em sua formação e tradução reflete a
pluralidade de vozes e perspectivas que contribuíram para a criação deste texto sagrado.
Cada língua usada na Bíblia contribuiu com suas próprias nuances e matizes,
enriquecendo a profundidade e a complexidade do texto.

A composição da Bíblia é um fenômeno literário e histórico notável. Ao entender a sua


formação, a canonização, as traduções e o impacto teológico dos textos, podemos
apreciar a complexidade e a beleza deste livro que tem impactado a humanidade por
milênios.

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LITERATURA APÓCRIFA 84

O estudo dos primeiros manuscritos da Bíblia não é apenas um campo de pesquisa


histórica, mas também uma busca espiritual e teológica. Através da análise cuidadosa
dos textos e da aplicação da crítica textual, é possível trazer à luz nuances e significados
que podem ter sido obscurecidos ao longo dos séculos.

As versões antigas do Antigo e Novo Testamento são uma janela para o mundo da
formação da Bíblia e fornecem um fundamento sólido para o estudo da literatura bíblica.
Cada uma dessas versões tem sua contribuição única e insubstituível para a compreensão
da tradição cristã.

REVISÃO

1. Qual a importância da formação e do desenvolvimento da Bíblia para a


compreensão da história religiosa e cultural da humanidade, e como os textos
apócrifos contribuem para essa compreensão?
A Bíblia é uma das principais fontes para a compreensão da história religiosa e cultural
da humanidade. Ela documenta uma variedade de experiências e perspectivas,
oferecendo insights únicos sobre as crenças, práticas e valores de diferentes épocas.
Além disso, os textos apócrifos, apesar de não estarem presentes na Bíblia canônica,
fornecem uma visão adicional da formação do cristianismo primitivo e da diversidade
das crenças e práticas cristãs no início da era cristã.

2. Quais foram os critérios usados para determinar quais livros seriam incluídos
na Bíblia durante o processo de canonização e como isso se reflete na
diversidade dos gêneros literários presentes na Bíblia?
Durante o processo de canonização, os livros foram avaliados de acordo com critérios
rigorosos. Um dos principais era a autenticidade do livro - a igreja precisava ter
segurança de que o livro tinha sido escrito por quem se alegava ser o autor. Outro
critério fundamental era a conformidade com a doutrina da fé cristã. Se o livro
ensinasse algo contrário à doutrina aceita, era excluído. Além disso, a aceitação geral
do livro pelos cristãos primitivos era um fator importante. Esse processo levou à
inclusão de uma diversidade de gêneros literários na Bíblia, desde histórias e poesias
até leis e profecias, refletindo a variedade de formas pelas quais a verdade divina
pode ser expressa e compreendida.

3. Como o uso de diferentes línguas na escrita e na tradução da Bíblia contribuiu


para a formação do texto bíblico e para a disseminação do Cristianismo?
O uso de diferentes línguas na escrita da Bíblia teve um impacto significativo na
formação do texto bíblico. O hebraico, o aramaico e o grego, cada um a seu modo,

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LITERATURA APÓCRIFA 85

contribuíram para moldar o conteúdo e o estilo do texto. As particularidades


linguísticas destas línguas influenciaram a forma como as histórias, profecias e
ensinamentos bíblicos foram expressos e compreendidos. Além disso, a tradução da
Bíblia para diferentes línguas desempenhou um papel vital na disseminação do
Cristianismo, permitindo que os ensinamentos bíblicos fossem acessíveis a uma
ampla variedade de culturas e povos.

4. Qual a importância dos manuscritos apócrifos para a compreensão da história


e da formação do cristianismo primitivo?

Os manuscritos apócrifos, apesar de não fazerem parte do cânon bíblico oficial, são
uma fonte inestimável para o entendimento do cristianismo primitivo. Eles oferecem
uma visão ampla da variedade de crenças e práticas que existiam entre as
comunidades cristãs antigas, muitas das quais não estão presentes nos textos
canônicos. Além disso, estes manuscritos podem fornecer informações sobre as
origens de certas tradições ou crenças, assim como insights sobre o contexto histórico
e cultural no qual o cristianismo se desenvolveu.

5. Como os Manuscritos do Mar Morto, a Septuaginta, a Vulgata Latina e o


Textus Receptus contribuem para a nossa compreensão das versões antigas do
Antigo e Novo Testamento?

Os Manuscritos do Mar Morto oferecem a cópia mais antiga do texto hebraico do


Antigo Testamento, sendo, portanto, uma fonte primária essencial. A Septuaginta, por
outro lado, representa a versão do Antigo Testamento utilizada pela igreja primitiva,
servindo como um elo entre o Antigo e o Novo Testamento. A Vulgata Latina,
traduzida por São Jerônimo, influenciou profundamente a linguagem e a teologia da
Igreja Latina por mais de um milênio. Finalmente, o Textus Receptus, apesar de suas
limitações, teve um impacto significativo na tradição protestante, sendo a base para
as primeiras traduções da Bíblia para várias línguas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALAND, Kurt; ALAND, Barbara. O Texto do Novo Testamento: Introdução às edições científicas
do Novo Testamento Grego bem como à Teoria e Prática da Moderna Crítica Textual. 2. ed.
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LITERATURA APÓCRIFA 86

2003.

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Prestígio, 2003.

__________. História da Bíblia: Como alguns livros sagrados se tornaram a Palavra de Deus. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005.

__________. Citando erroneamente Jesus: A história por trás de quem mudou a Bíblia e por quê.
São Paulo: Editora Planeta, 2005.

FRIEDMAN, Richard E. Quem escreveu a Bíblia? São Paulo: Imago Editora, 1997.

HENGEL, Martin. Septuaginta: A Bíblia da Igreja Primitiva. Rio de Janeiro: Zahar, 2002.

MAIER, Paul L. A formação da Bíblia. São Paulo: Vida Nova, 1994.

METZGER, Bruce M. A Bíblia através dos séculos. São Paulo: Vida Nova, 1977.

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Paulo: Vida Nova, 1987.

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restauração. 4. ed. São Paulo: Vida Nova, 2015.

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PACKER, James I. Conhecendo as verdades de Deus. São Paulo: Mundo Cristão, 1993.

PELIKAN, Jaroslav. Vulgata: Influência e Herança. Brasília: UNB, 2005.

TOV, Emanuel. Crítica Textual da Bíblia Hebraica. Minneapolis: Fortress Press, 1992.

VANDERKAM, James. Os Manuscritos do Mar Morto e o Mundo do Novo Testamento. São


Paulo: Paulinas, 1994.

WISE, Michael; ABEGG JR., Martin; COOK, Edward. Os Manuscritos do Mar Morto. 1. ed. São
Paulo: Mercuryo, 1997.

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LITERATURA APÓCRIFA 87

CAPÍTULO 09

O CÂNON BÍBLICO

ORIGENS, DEFINIÇÕES E IMPORTÂNCIA

" A Bíblia é a Palavra de Deus na medida em que ela é a testemunha de sua revelação em
Jesus Cristo."
Karl Barth

INTRODUÇÃO

O Cânon Bíblico é um tópico de suma importância no campo da teologia cristã. Ele aborda
a seleção e a organização dos livros que compõem a Bíblia, conforme reconhecidos pelas
várias tradições cristãs. Isso implica na análise das considerações históricas, culturais e
teológicas que influenciaram o processo de formação do cânon. Entender este assunto não
apenas ilumina as origens e a evolução do cristianismo, mas também molda o modo como
os crentes interpretam e aplicam as Escrituras Sagradas.

A. FORMAÇÃO DO CÂNON DO ANTIGO TESTAMENTO


A formação do cânon do Antigo Testamento é uma jornada que atravessa séculos de
histórias, culturas e tradições. Esta compilação de textos sagrados, que tem
desempenhado um papel central no Judaísmo e no Cristianismo, representa uma fusão
de esforços humanos e divinos para preservar a sabedoria, a fé e as experiências do povo
hebreu.

1. A Torah

O primeiro e mais significativo componente do cânon do Antigo Testamento é a


Torah, também conhecida como Pentateuco. Constituído pelos cinco primeiros
livros da Bíblia (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio), é considerado o
cerne da fé judaica. Esses livros, atribuídos à autoria mosaica, embora alguns
estudiosos contestem essa visão, foram os primeiros a serem canonizados,
provavelmente durante o período do exílio babilônico (586-538 a.C.) como forma de
preservar a identidade cultural e religiosa judaica. Conforme aponta Rendtorff (1993),

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LITERATURA APÓCRIFA 88

a Torah foi formada através de um processo de transmissão oral e escrita ao longo do


tempo.

2. Os Profetas
Os Nevi'im, ou livros proféticos, constituem a segunda divisão do cânon judaico. Eles
consistem nos Livros dos Profetas Anteriores (Josué, Juízes, Samuel e Reis) e nos
Livros dos Profetas Posteriores (Isaías, Jeremias, Ezequiel e os Doze Profetas
Menores). De acordo com Barton (1986), a seleção desses livros sugere um esforço
para preservar a mensagem profética, frequentemente desafiadora, como uma parte
essencial da fé e prática judaicas.

3. Os Escritos
Os Ketuvim, ou "Escritos", representam a última seção do cânon do Antigo
Testamento. Essa categoria inclui uma variedade de livros, como Salmos, Provérbios,
Jó, Cântico dos Cânticos, Rute, Lamentações, Eclesiastes, Ester, Daniel, Esdras-Neemias
e Crônicas. Embora seja difícil precisar quando exatamente esses livros foram
considerados sagrados e incluídos no cânon, parece que sua aceitação final ocorreu
por volta do final do primeiro século d.C. Essa conclusão é corroborada por
pesquisadores como Lim (2010), que argumenta que o processo de canonização foi,
em parte, uma resposta à necessidade de uma identidade e coesão nacional, além da
espiritualidade e sabedoria dos livros.

4. O Cânon e a Comunidade
A formação do cânon do Antigo Testamento foi fortemente influenciada pelas
necessidades da comunidade judaica em diferentes períodos históricos. De acordo
com a pesquisa de Sanders (1992), a escolha de livros específicos para inclusão no
cânon não foi meramente um ato teológico, mas também um reflexo das
necessidades sociopolíticas e culturais dos judeus.

B. FORMAÇÃO DO CÂNON DO NOVO TESTAMENTO


A formação do cânon do Novo Testamento foi um empreendimento notável na história
da Igreja Cristã. Os primeiros séculos após o nascimento de Cristo foram marcados por
intensas discussões teológicas, perseguições e lutas internas para consolidar uma
doutrina que representasse a fé cristã (ERHMAN, Bart D. O que Jesus Disse? O que Jesus
não Disse? São Paulo: Editora Prestígio, 2006). No centro dessas discussões estava a
definição dos livros que viriam a constituir o Novo Testamento.

1. O Papel das Comunidades Cristãs Primitivas na Formação do Cânon


A identificação e coleção dos livros que eventualmente formariam o Novo

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LITERATURA APÓCRIFA 89

Testamento foi um processo gradual e muito influenciado pelas comunidades cristãs


primitivas. F.F. Bruce, em "O Cânon do Novo Testamento: Sua Origem,
Desenvolvimento e Significado" (1987), assinala que o cânon do Novo Testamento não
foi decretado por qualquer autoridade eclesiástica, mas surgiu organicamente em
resposta ao uso e aceitação desses livros pelas comunidades cristãs. O critério
fundamental para a inclusão de um livro era a sua origem apostólica, ou seja, ter sido
escrito por um apóstolo ou por um associado próximo de um apóstolo (BRUCE, F.F.
O Cânon do Novo Testamento: Sua Origem, Desenvolvimento e Significado. São
Paulo: Editora Vida Nova, 1987).

2. Os Critérios de Canonicidade

O processo de canonicidade não foi aleatório, mas seguiu certos critérios. Conforme
apontado por Metzger em "O Cânon do Novo Testamento: Seu Desenvolvimento e
Significado" (1997), o principal critério foi a apostolicidade, que diz respeito à autoria
do livro por um apóstolo ou um companheiro de apóstolo. Além disso, outros
critérios como a antiguidade, a aceitação universal pela igreja, e a conformidade com
a "regra da fé" (a doutrina ortodoxa) também foram essenciais no processo de
formação do cânon (METZGER, Bruce M. O Cânon do Novo Testamento: Seu
Desenvolvimento e Significado. São Paulo: Editora Vida Nova, 1997).

3. A Formação Definitiva do Cânon do Novo Testamento


A formação do cânon do Novo Testamento foi gradual e ocorreu ao longo de vários
séculos. O primeiro registro de um cânon do Novo Testamento similar ao que temos
hoje aparece na chamada Páscoa de 367 d.C., numa carta do Bispo Atanásio de
Alexandria. No entanto, ainda houve disputas em relação a certos livros por séculos
após essa declaração (ERHMAN, Bart D. O que Jesus Disse? O que Jesus não Disse?
São Paulo: Editora Prestígio, 2006).

4. Os Livros Contestados e as Literaturas Apócrifas


Alguns livros do Novo Testamento, como a Epístola de Judas e o Apocalipse de
João, foram particularmente contestados durante o processo de formação do cânon.
Adicionalmente, muitas outras obras, conhecidas como literaturas apócrifas, foram
consideradas por algumas comunidades cristãs, mas não foram incluídas no cânon
final (ERHMAN, Bart D. O que Jesus Disse? O que Jesus não Disse? São Paulo: Editora
Prestígio, 2006).

C. O PROCESSO E CRITÉRIOS ENVOLVIDOS NA FORMATAÇÃO DO CÂNON DO NOVO


TESTAMENTO
A formação do Cânon do Novo Testamento representa um marco na história do

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LITERATURA APÓCRIFA 90

Cristianismo, sendo um processo que envolveu critérios distintos, comunidades variadas


e muitas décadas de discernimento. A seleção e consolidação dos textos que compõem
o Novo Testamento foram tarefas árduas que buscaram refletir a verdadeira essência da
mensagem cristã.

1. O papel da comunidade cristã primitiva


No início do Cristianismo, as comunidades cristãs dispersas possuíam diferentes
textos considerados sagrados. Alguns dos textos que hoje compõem o Novo
Testamento já eram considerados autoritativos pelas comunidades, como as cartas
de Paulo e os Evangelhos. Contudo, outros textos, como a Didaché e a Carta de
Clemente, foram eventualmente excluídos do cânon, apesar de seu valor e uso
litúrgico (Ehrman, Bart D. 2003). A comunidade cristã desempenhou um papel central
neste processo, pois foi ela quem determinou, por meio de seu uso e referência, quais
escritos possuíam autoridade divina.

2. Critérios para a inclusão no cânon


Os critérios utilizados para a formação do cânon do Novo Testamento foram
desenvolvidos ao longo do tempo. Entre eles, destacam-se a apostolicidade (se o
texto foi escrito por um apóstolo ou próximo a um), a ortodoxia (se a mensagem do
texto era consistente com o ensino cristão corrente), a antiguidade (se o texto foi
escrito no primeiro século) e a aceitação universal (se o texto foi reconhecido por toda
a Igreja) (Metzger, Bruce M. 1987).

3. A influência dos Concílios


A determinação do cânon do Novo Testamento também foi influenciada pelos
concílios da Igreja. O Concílio de Hipona (393 d.C.) e o Terceiro Concílio de Cartago
(397 d.C.) desempenharam um papel importante na ratificação do cânon do Novo
Testamento, confirmando a lista de livros que a maioria das comunidades cristãs já
aceitava (Davies, G. 1965).

4. A necessidade de um cânon oficial


A necessidade de um cânon oficial surgiu devido a vários fatores, incluindo a ameaça
de heresias, como o Gnosticismo, e a necessidade de ter um conjunto acordado de
escritos para uso litúrgico e instrução doutrinária. O cânon tornou-se uma forma de
preservar a autenticidade da mensagem cristã diante de interpretações conflitantes e
disputas doutrinárias (Gamble, Harry Y. 1995).

D. DIFERENTES CÂNONES CRISTÃOS


O cânon bíblico é uma coleção autorizada de livros sagrados dentro do Cristianismo. No

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LITERATURA APÓCRIFA 91

entanto, a composição exata do cânon varia entre diferentes denominações cristãs. Os


protestantes reconhecem 66 livros em seu cânon bíblico, enquanto os católicos incluem
7 livros a mais, conhecidos como deuterocanônicos. A tradição ortodoxa oriental
reconhece ainda mais livros em seu cânon. Este texto busca analisar essas diferenças e
as implicações para a teologia e a prática cristã.

1. O Cânon Protestante

O cânon protestante é composto por 39 livros do Antigo Testamento e 27 do Novo


Testamento, totalizando 66 livros. Esta composição foi solidificada durante a Reforma
Protestante do século XVI, quando Martinho Lutero, e outros reformadores, rejeitaram
os livros deuterocanônicos como não sendo de origem divina. Segundo Metzger
(1997), esta decisão foi influenciada pela lista de livros do rabino judeu do século II,
Melito de Sardes, que excluía os deuterocanônicos.

2. O Cânon Católico Romano


O cânon católico, por outro lado, inclui os sete livros deuterocanônicos: Tobias,
Judite, Sabedoria de Salomão, Sirácida (Eclesiástico), Baruque, 1 Macabeus e 2
Macabeus, além de partes de Ester e Daniel. Esses livros, segundo o Concílio de
Trento (1546), são considerados inspirados por Deus e úteis para instrução na fé. Como
destacado por Metzger (1997), a inclusão desses livros no cânon católico remonta às
primeiras traduções da Bíblia para o latim, como a Vulgata Latina de Jerônimo, no
século IV.

3. O Cânon Ortodoxo Oriental


A Bíblia Ortodoxa Oriental, principalmente na tradição grega, inclui ainda mais livros
em seu cânon, variando de 76 a 81 livros, dependendo da jurisdição. Alguns dos livros
adicionais encontrados na Bíblia Ortodoxa são: 3 Macabeus, Salmo 151, Oração de
Manassés e 3 Esdras. Segundo Metzger (1997), esses livros eram comumente lidos
nas igrejas ortodoxas nos primeiros séculos do cristianismo e continuam a ser
valorizados em sua tradição.

4. Implicações teológicas e práticas


As diferenças nos cânones bíblicos entre as tradições cristãs têm implicações
significativas para a teologia e a prática cristã. Como demonstra Metzger (1997), a
ausência dos deuterocanônicos na Bíblia Protestante, por exemplo, significa que
certas doutrinas e práticas católicas e ortodoxas, que se baseiam nesses livros, não
são reconhecidas pelos protestantes. Além disso, a presença de livros adicionais no
cânon ortodoxo oriental reflete a tradição e a história distintas dessa denominação.

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LITERATURA APÓCRIFA 92

E. A AUTORIDADE DO CÂNON
A formação do cânon bíblico, tanto do Antigo quanto do Novo Testamento, é um marco
crucial na história do cristianismo. A autoridade do cânon se baseia na convicção da sua
inspiração divina, mesmo que envolva processos humanos em sua composição. A Bíblia,
portanto, se tornou a norma primária de fé e prática para a igreja cristã.

1. A Formação do Cânon
O processo de formação do cânon bíblico foi longo e gradual. O Antigo Testamento,
também conhecido como a Bíblia hebraica, levou séculos para ser formado. O Novo
Testamento também não foi imediatamente aceito como cânon pela igreja primitiva.
De acordo com Bruce Metzger em "O Cânon do Novo Testamento: Seu
Desenvolvimento e Significado" (1987), a formação do cânon do Novo Testamento foi
influenciada por fatores teológicos, culturais e políticos. Por exemplo, a perseguição
aos cristãos forçou a igreja a determinar quais escritos eram verdadeiramente
inspirados e, portanto, dignos de serem preservados a todo custo.

2. Inspiração Divina
A inspiração divina é o núcleo da autoridade do cânon. A igreja cristã acredita que
Deus, através do Espírito Santo, inspirou os autores humanos da Bíblia a escreverem
suas palavras. Como observado por Paul Achtemeier no "Inspiração e Autoridade:
Natureza e Função da Autoridade Cristã" (1999), a inspiração divina é vista não apenas
como um mero sopro divino, mas como um diálogo dinâmico entre Deus e o autor
humano. Em outras palavras, a Bíblia é o produto da ação simultânea de Deus e do
homem.

3. O Uso do Cânon na Vida da Igreja


A autoridade do cânon se manifesta de maneira mais evidente no uso da Bíblia na
vida da igreja. A Bíblia serve como a principal fonte para o ensino da fé, a prática do
culto e a formação moral dos cristãos. Ela é lida, interpretada e pregada nas igrejas
cristãs ao redor do mundo. Como Karl Barth apontou em "A Palavra de Deus e a
Palavra do Homem" (1928), a Bíblia não é apenas um livro antigo com mensagens
antigas, mas é uma palavra viva que fala ao homem contemporâneo.

4. Questões Contemporâneas
Apesar da autoridade do cânon ser amplamente aceita no cristianismo, ainda existem
questões contemporâneas que desafiam essa autoridade. Estas incluem o debate
sobre os livros apócrifos, a questão do cânon dentro do cânon (ou seja, a prioridade
dada a certos livros da Bíblia sobre outros) e a interação entre a interpretação bíblica
e a cultura moderna. Como apontou James Barr em "Escritura Sagrada: Canon,

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LITERATURA APÓCRIFA 93

Autoridade, Crítica" (1983), essas questões exigem uma reflexão séria por parte da
igreja cristã.

CONCLUSÃO

Ao analisar o processo de formação do cânon do Antigo Testamento, é evidente que essa


compilação de textos sagrados não é o resultado de uma decisão arbitrária, mas sim o
produto de um longo processo histórico que foi influenciado por fatores religiosos, políticos
e culturais.

Assim, a formação do cânon do Novo Testamento foi um processo extenso e detalhado, que
envolveu debates teológicos, critérios de seleção e a aceitação comunitária. Este processo
histórico deu origem à coleção de livros que hoje conhecemos como Novo Testamento, que
servem como a base da fé cristã.

A formação do cânon do Novo Testamento foi um processo gradual, que envolveu o


discernimento da comunidade cristã, critérios de inclusão, a influência dos concílios da Igreja
e a necessidade de ter um cânon oficial. Este processo reflete a busca contínua pela verdade
e a fidelidade à mensagem de Cristo.

O cânon bíblico varia entre as diferentes tradições cristãs. Cada cânon reflete a história, a
teologia e as práticas distintas de cada tradição. No entanto, é importante observar que,
apesar dessas diferenças, há um núcleo comum de livros que todas as tradições cristãs
reconhecem como autoritativos e inspirados por Deus.

A autoridade do cânon bíblico é fundamental para a fé e a prática cristãs. A Bíblia, como o


cânon da igreja, serve como a norma primária para o ensino da fé, a prática do culto e a
formação moral dos cristãos. Apesar dos desafios contemporâneos, a autoridade do cânon
permanece inabalável na igreja cristã.

REVISÃO

1. Como a formação do cânon do Antigo Testamento reflete as necessidades


históricas da comunidade judaica e as convicções religiosas dos líderes
religiosos da época?

A formação do cânon do Antigo Testamento foi uma resposta à necessidade de


preservar a identidade cultural e religiosa dos judeus durante diferentes períodos da
história. No período do exílio babilônico, a canonização da Torah foi crucial para
manter as tradições e leis judaicas. Da mesma forma, a inclusão dos livros proféticos
refletia a importância dos profetas na sociedade judaica e a necessidade de preservar

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LITERATURA APÓCRIFA 94

suas mensagens para as gerações futuras. Os Escritos, embora diversificados em


conteúdo, proporcionavam sabedoria, esperança e conforto em meio às incertezas
do exílio e além.

2. Quais foram os principais fatores que contribuíram para a formação do cânon


do Novo Testamento e como eles influenciaram a seleção e exclusão de certos
textos?
O principal fator que contribuiu para a formação do cânon do Novo Testamento foi
o critério de apostolicidade, ou seja, se o livro foi escrito por um apóstolo ou por um
associado próximo de um apóstolo. Outros critérios, como a antiguidade, a aceitação
universal pela igreja e a conformidade com a "regra da fé" também foram
importantes. A aceitação e o uso desses livros pelas comunidades cristãs primitivas
foram determinantes para sua inclusão no cânon. Além disso, alguns livros foram mais
contestados do que outros, resultando em um processo de seleção que deixou de
fora muitas obras conhecidas como literaturas apócrifas.

3. Como o critério de apostolicidade influenciou a formação do cânon do Novo


Testamento e que implicações essa exigência teve na exclusão de certos
textos?
O critério de apostolicidade desempenhou um papel fundamental na formação do
cânon do Novo Testamento. Esse critério exigia que os textos fossem escritos por um
apóstolo ou por alguém que estivesse em proximidade com um. Isso implicava uma
autoridade e autenticidade diretamente ligada ao ensinamento de Jesus. Como
resultado, textos como o Evangelho de Tomé, apesar de conterem supostas palavras
de Jesus, foram excluídos do cânon, pois não se acreditava que fossem de autoria
apostólica ou que fossem consistentes com a fé apostólica.

4. Quais são as principais diferenças entre o cânon protestante, católico e


ortodoxo oriental, e quais são as implicações dessas diferenças para a teologia
e a prática cristã?
O cânon protestante contém 66 livros, enquanto o cânon católico inclui 7 livros
adicionais chamados deuterocanônicos, e a tradição ortodoxa oriental reconhece
ainda mais livros em seu cânon. Essas diferenças no cânon refletem a história, a
teologia e as práticas distintas de cada tradição. Por exemplo, a ausência dos
deuterocanônicos na Bíblia Protestante implica que certas doutrinas e práticas
baseadas nesses livros, que são aceitas pelos católicos e ortodoxos, não são
reconhecidas pelos protestantes.

5. Como a autoridade do cânon se relaciona com a formação do cânon bíblico, e


como essa autoridade se manifesta na vida da igreja?

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LITERATURA APÓCRIFA 95

A autoridade do cânon está intimamente ligada à sua formação. O processo de


formação do cânon envolveu um discernimento da igreja sobre quais escritos eram
inspirados por Deus. A inspiração divina é, portanto, a base da autoridade do cânon.
Essa autoridade se manifesta de forma mais evidente na vida da igreja, pois a Bíblia
serve como a principal fonte para o ensino da fé, a prática do culto e a formação
moral dos cristãos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ACHTENMEIER, Paul J. Inspiração e Autoridade: Natureza e Função da Autoridade Cristã. São


Paulo: Paulinas, 1999.

BARR, James. Escritura Sagrada: Canon, Autoridade, Crítica. São Paulo: Loyola, 1983.

BARTH, Karl. A Palavra de Deus e a Palavra do Homem. São Paulo: Fonte Editorial, 1928.

BRUCE, F.F. O Cânon do Novo Testamento: Sua Origem, Desenvolvimento e Significado. São
Paulo: Editora Vida Nova, 1987.

CHILDS, Brevard S. Introdução ao Antigo Testamento como Escritura. São Paulo: Paulus, 1979.

CONCÍLIO DE TRENTO. Decretos do Concílio de Trento. São Paulo: Paulus, 1997.

DAVIES, G. Os primeiros cristãos. São Paulo: Paulinas, 1965.

EHRMAN, Bart D. A história perdida do Cristianismo: as origens cristãs. Rio de Janeiro: Record,
2003.

__________. O Que Jesus Disse? O Que Jesus Não Disse? Quem Mudou a Bíblia e Por Quê. Rio
de Janeiro: Prestígio Editorial, 2006.

FINKELSTEIN, Israel; SILBERMAN, Neil Asher. A Bíblia Não Tinha Razão: Arqueologia
Desmente a Bíblia Sagrada. São Paulo: A Girafa, 2002.

GAMBLE, Harry Y. O Novo Testamento e o cânon. São Paulo: Loyola, 1995.

METZGER, Bruce M. O Cânon do Novo Testamento: Seu Desenvolvimento, Significado e


História. São Paulo: Paulus, 1997.

PAGELS, Elaine. Evangelhos Gnósticos. São Paulo: Cultrix, 1989.

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LITERATURA APÓCRIFA 96

CAPÍTULO 10

REVELAÇÃO, INSPIRAÇÃO E AUTORIDADE

NATUREZA E FUNÇÃO DA AUTORIDADE CRISTÃ

" A inspiração bíblica, em sua totalidade, é a operação divina pelo Espírito Santo, pela qual
os escritores sagrados foram guardados de erro e guiados para registrar de modo infalível a
revelação de Deus para a humanidade."
Louis Berkhof

INTRODUÇÃO

A Teologia Cristã é marcada por um conjunto de crenças fundamentais, as quais são


intrínsecas à sua compreensão e prática. Revelação, inspiração e autoridade constituem
algumas dessas noções fundamentais, moldando a maneira como entendemos a relação
entre Deus e a humanidade, o modo como a Escritura é interpretada e a função da
autoridade na comunidade cristã. Neste texto, examinaremos essas três ideias em
profundidade, investigando sua natureza e função na teologia cristã.

A. REVELAÇÃO: O AUTO REVELAR DE DEUS


A autorrevelação de Deus é um tema central para a fé cristã, essencial para entender
como a Divindade se comunica com a humanidade. A revelação, no contexto teológico
cristão, é a maneira pela qual Deus se torna conhecido. Esta revelação divina ocorre de
formas variadas, mas principalmente através da Criação, das ações de Deus na história,
da Escritura e mais completamente na pessoa de Jesus Cristo. Essa complexidade da
revelação divina é abordada ao longo de diferentes perspectivas teológicas e é explorada
através de diversos meios, incluindo os textos sagrados e a reflexão teológica.

1. A Revelação através da Criação


A teologia cristã tem sido consistente em sua afirmação de que Deus se revela por
meio de sua Criação. Como afirmou Calvino (1559), "a ordem manifesta da natureza
testemunha a existência de Deus". A natureza e o universo são considerados um livro
aberto, onde os traços de Deus podem ser encontrados (Salmo 19:1). A majestade da

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LITERATURA APÓCRIFA 97

Criação reflete a glória de Deus e proclama Sua existência. Isso está em linha com o
conceito de revelação geral, que é acessível a todos e oferece um conhecimento
básico de Deus.

2. A Revelação nas ações históricas de Deus


As ações de Deus na história também são um meio pelo qual Ele se revela. A Bíblia
está repleta de exemplos de como Deus interveio na história humana, da libertação
dos hebreus do Egito (Êxodo 14) à vinda de Jesus (Lucas 2:1-20). Esses atos históricos
de Deus revelam Seu caráter e Seus propósitos para a humanidade. O teólogo Barth
(1941) afirma que a revelação de Deus na história é um "ato livre de Deus", revelando
Seu amor e graça para com a humanidade.

3. A Revelação nas Escrituras


Deus também se revela através das Escrituras. As Sagradas Escrituras são a principal
fonte de revelação específica, detalhando a história da salvação e fornecendo
orientação para a vida cristã. Conforme observado por Brunner (1946), "a Bíblia é a
palavra de Deus escrita, destinada a levar-nos à palavra de Deus encarnada, que é Jesus
Cristo". A afirmação em 2 Timóteo 3:16 é uma clara indicação de que as Escrituras
são inspiradas por Deus, servindo como um meio privilegiado de revelação.

4. A Revelação em Jesus Cristo


Por fim, a revelação de Deus encontra sua expressão máxima na pessoa de Jesus
Cristo. A vinda de Jesus é vista como a encarnação de Deus (João 1:14), sendo Ele a
autorrevelação definitiva de Deus. Segundo Boff (1999), "Cristo é a revelação suprema
e definitiva de Deus à humanidade". O ensino, a vida, a morte e a ressurreição de Jesus
são a revelação suprema do amor de Deus pela humanidade e de Seu plano de
salvação.

B. INSPIRAÇÃO: A FUNÇÃO DO ESPÍRITO SANTO NA ESCRITURA

A inspiração divina e o papel do Espírito Santo na composição das Escrituras têm sido
objeto de investigação e reflexão teológica desde os primórdios do cristianismo. A ideia
de que os autores da Bíblia, embora mantendo suas personalidades e estilos individuais,
foram guiados pelo Espírito Santo em suas escritas é fundamental para a compreensão
da natureza da revelação bíblica (Pinnock, 1996).

1. A Natureza da Inspiração
Segundo a tradição cristã, a inspiração divina se caracteriza por um processo no qual
Deus se comunica com a humanidade por meio de agentes humanos, revelando-lhes
sua vontade e seus propósitos. Em seu livro "A Inspiração Divina da Bíblia", Pink (2007)

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LITERATURA APÓCRIFA 98

argumenta que a inspiração não deve ser entendida simplesmente como uma
iluminação da mente humana, mas como um movimento divino que guiou os autores
bíblicos a registrarem precisamente o que Deus queria comunicar. Nesse sentido, a
inspiração se conecta intimamente com a doutrina da inerrância bíblica, que postula
que as Escrituras, em seus autógrafos originais, estão livres de erros devido à
supervisão do Espírito Santo (Warfield, 2012).

2. O Papel do Espírito Santo na Inspiração


A doutrina da inspiração enfatiza o papel do Espírito Santo na produção da Escritura.
Como afirmado em 2 Timóteo 3:16, toda a Escritura é inspirada por Deus, termo que
em grego, 'Theopneustos', sugere a ideia de Deus soprando ou respirando nas
Escrituras (Fee & Stuart, 2014). Isso indica que o Espírito Santo, como parte da
Trindade, teve um papel ativo e preeminente na formulação dos textos sagrados,
garantindo que eles sejam uma autêntica expressão da revelação de Deus à
humanidade.

3. A Inspiração e a Humanidade dos Autores Bíblicos


A inspiração divina, contudo, não anulou a humanidade dos autores bíblicos. Cada
um deles escreveu a partir de sua própria perspectiva cultural, histórica e pessoal. Eles
usaram suas próprias palavras e estilos literários para transmitir as mensagens que
Deus desejava comunicar. Em "A Inspiração e Autoridade da Bíblia", Warfield (2012)
argumenta que essa interação entre a divindade e a humanidade na produção da
Bíblia é uma ilustração da própria encarnação de Cristo, onde o divino e o humano
se unem sem anulação ou conflito.

4. Implicações Práticas da Inspiração

A doutrina da inspiração tem implicações práticas significativas para a leitura e


interpretação da Bíblia. Ela serve como garantia de que a Bíblia é uma fonte confiável
de verdade divina e orientação moral. Isso não significa, entretanto, que a Bíblia deve
ser lida sem consideração de seu contexto histórico e cultural, ou sem uso de
métodos críticos de interpretação. Como Pinnock (1996) ressalta, a inspiração divina
assegura a fidedignidade das Escrituras, mas a tarefa de interpretá-las de maneira
responsável ainda recai sobre o leitor.

C. AUTORIDADE: A BÍBLIA COMO A PALAVRA DE DEUS


A Bíblia, como a palavra inspirada de Deus, tem sido a pedra angular da fé cristã ao longo
dos séculos. Este tratado abordará a natureza da autoridade bíblica, reconhecendo sua
posição preeminente como a palavra revelada de Deus. A partir da teologia, história,
hermenêutica e experiência pastoral, buscaremos uma visão abrangente dessa

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LITERATURA APÓCRIFA 99

autoridade que transcende as limitações humanas.

1. A Autoridade Bíblica e a Teologia Cristã


A autoridade da Bíblia é fundamental para a teologia cristã. Karl Barth (1961), um dos
teólogos mais influentes do século XX, enfatizou que a Bíblia é a "palavra de Deus"
em sua revelação auto atestadora. No evangelho de João (1:1), esta visão é
claramente enunciada, onde Jesus é referido como a Palavra que se fez carne,
mostrando a unidade entre a mensagem e a realidade divina. A Bíblia, então, como a
Palavra de Deus, é a única regra autoritativa de fé e prática, e a teologia cristã a
reconhece como tal.

2. A Autoridade Bíblica na História da Igreja


Ao longo da história da Igreja, a Bíblia sempre foi vista como a fonte primária de
autoridade. Os pais da Igreja, como Agostinho de Hipona (397), afirmaram a
autoridade divina da Escritura, que moldou a fé e a prática da Igreja primitiva. Durante
a Reforma Protestante, a doutrina da "Sola Scriptura" - somente a Escritura - se tornou
uma ênfase importante, como visto nas obras de Martinho Lutero (1521), que defendia
a Bíblia como a única regra de fé e vida. Esta visão da autoridade bíblica continua a
ser mantida por muitas denominações cristãs hoje.

3. Hermenêutica e Autoridade Bíblica


A hermenêutica, ou a arte e ciência da interpretação bíblica, também está relacionada
à autoridade bíblica. Silva (1996) enfatiza que a interpretação correta das Escrituras é
essencial para reconhecer e respeitar sua autoridade. Em 2 Timóteo 2:15, o apóstolo
Paulo insta Timóteo a manejar corretamente a palavra da verdade, uma clara
referência à necessidade de uma hermenêutica sólida. O entendimento preciso da
Escritura é, portanto, vital para sua autoridade na vida e na fé do crente.

4. A Experiência Pastoral da Autoridade Bíblica


Na prática pastoral, a autoridade da Bíblia é essencial. Stott (1992) observa que a
pregação e o ensino devem estar fundamentados na Escritura. Como Pedro afirma
em 1 Pedro 4:11, aqueles que falam devem fazê-lo como se estivessem expressando
as palavras de Deus. Assim, a autoridade bíblica molda a prática pastoral e o
ministério da igreja.

D. NATUREZA DA AUTORIDADE CRISTÃ: UMA EXPLICAÇÃO


A autoridade cristã é um conceito rico e profundamente enraizado nos preceitos do
cristianismo. Esta autoridade é construída através da relação entre Escritura, Tradição e
Razão, cada uma contribuindo de forma significativa para a compreensão e prática da fé

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LITERATURA APÓCRIFA 100

cristã. Neste contexto, vamos explorar em profundidade cada um destes três elementos
fundamentais da autoridade cristã.

1. A Escritura como Fonte Primária da Autoridade Cristã


A Bíblia, tanto o Antigo quanto o Novo Testamento, é a principal fonte de autoridade
no cristianismo. Como afirmou Oden (1989), a Escritura é a principal revelação de
Deus, a fonte indiscutível da verdade divina. É a partir da Escritura que os cristãos
obtêm os princípios fundamentais de sua fé e prática. Como disse Paulo aos
Tessalonicenses: "quando recebestes a palavra de Deus, que de nós ouvistes, a
aceitastes não como palavra de homens, mas segundo é na verdade, como palavra de
Deus, a qual também opera em vós, os que crestes" (1 Tessalonicenses 2:13).

2. A Tradição na Transmissão e Interpretação da Autoridade Cristã


A Tradição também é uma componente importante da autoridade cristã. Como Oden
(1989) observou, a Tradição serve como o elo entre a Escritura e a comunidade cristã
através dos séculos. Ela interpreta a Escritura, transmitindo sua verdade de geração
em geração, e oferece um contexto histórico para a compreensão das Escrituras. Uma
clara representação bíblica deste princípio pode ser encontrada em 2
Tessalonicenses 2:15, onde Paulo encoraja os fiéis a "manterem-se firmes e a
manterem as tradições que lhes foram ensinadas, seja por palavra, seja por nossa
carta".

3. A Razão na Aplicação da Autoridade Cristã


O terceiro componente da autoridade cristã, conforme descrito por Oden (1989), é a
Razão. A Razão permite aos cristãos aplicar a verdade da Escritura em suas vidas
diárias e na sociedade contemporânea. A Razão ajuda na interpretação da Escritura e
na reflexão sobre suas implicações para a vida cotidiana. Em Romanos 12:1, Paulo
exorta os cristãos a oferecerem seus corpos "como sacrifício vivo, santo e agradável
a Deus, que é o seu culto racional".

4. A Inter-relação entre Escritura, Tradição e Razão na Autoridade Cristã


Não se pode considerar a Escritura, a Tradição e a Razão como elementos isolados
na construção da autoridade cristã. Estes três componentes estão intrinsecamente
ligados e se influenciam mutuamente, conforme argumentou Oden (1989). A Escritura
informa a Tradição, que por sua vez ajuda na interpretação da Escritura. A Razão é
influenciada tanto pela Escritura quanto pela Tradição, e contribui para a
compreensão e aplicação da Escritura no contexto atual. Este conceito é ecoado no
livro de Provérbios 1:5: "O sábio ouvirá e aumentará o aprendizado, e o entendido
adquirirá sábios conselhos".

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LITERATURA APÓCRIFA 101

E. FUNÇÃO DA AUTORIDADE CRISTÃ: GUIAR E TRANSFORMAR


A autoridade cristã, como sugerida por Bonhoeffer (1997), é primordial na jornada de fé
dos seguidores de Cristo. Não é simplesmente uma entidade reguladora, mas uma força
transformadora, moldando e orientando a vida dos fiéis de acordo com os princípios
divinos. Este tópico irá explorar esta função dual da autoridade cristã: guiar e transformar.

1. Autoridade Cristã como Guia


A autoridade cristã serve como uma bússola para os fiéis, guiando-os através dos
desafios e tribulações da vida. Como sugerido por Henri Nouwen (1992), a autoridade
cristã fornece um "mapa de vida" baseado nos ensinamentos de Jesus Cristo. Ela
orienta os crentes para além das perspectivas humanas e os direciona para um
caminho que reflete a vontade divina (Mateus 7:13-14). Através da autoridade cristã,
os fiéis podem discernir o caminho que leva à vida e à luz, evitando a escuridão do
pecado e da ignorância.

2. Autoridade Cristã como Transformadora


A autoridade cristã tem um papel formativo na vida dos crentes. Ela não apenas
informa, mas também transforma. Como Bonhoeffer destaca, a palavra de Deus é
formativa (1997). Ela remodela a vida e o caráter dos crentes para se alinharem à
vontade divina. Ao obedecer à autoridade cristã, os crentes são transformados "de
glória em glória" (2 Coríntios 3:18), tornando-se mais como Cristo em caráter e ação.

3. Autoridade Cristã na Comunidade de Fé


A autoridade cristã não atua apenas a nível individual, mas também na comunidade
de fé. Ela fornece orientação e direção para a comunidade como um todo. À medida
que os membros da comunidade seguem a autoridade cristã, a comunidade inteira é
transformada. Como sugerido por Stanley Hauerwas (1981), a autoridade cristã ajuda
a criar uma comunidade que reflete o reino de Deus na Terra, um lugar onde a justiça,
a paz e a alegria prevalecem (Romanos 14:17).

4. O Desafio da Autoridade Cristã

Apesar do seu papel vital, aceitar e viver de acordo com a autoridade cristã pode ser
um desafio. Kierkegaard (1846) fala sobre o paradoxo da fé, a dificuldade inerente de
viver de acordo com os mandamentos de Deus num mundo que muitas vezes parece
oposto aos seus ensinamentos. No entanto, é através deste desafio que a
transformação verdadeira e profunda pode ocorrer, levando à renovação da mente e
ao amadurecimento na fé (Romanos 12:2).

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LITERATURA APÓCRIFA 102

CONCLUSÃO

A Revelação, a Inspiração e a Autoridade são fundamentais para o cristianismo. Elas moldam


nossa compreensão de Deus, da Bíblia e da vida cristã. A Revelação diz respeito à
autocomunicação de Deus à humanidade. A Inspiração se refere ao processo pelo qual Deus
garantiu a veracidade da Bíblia. A Autoridade abrange a orientação e a transformação que
a palavra de Deus exerce sobre a vida do crente.

A revelação de Deus é uma expressão fundamental do amor divino e do compromisso com


a humanidade. Manifesta-se através da Criação, das ações históricas, das Escrituras e,
finalmente, de Jesus Cristo. Compreender essas formas de revelação pode enriquecer a fé
cristã, fornecendo um maior entendimento do caráter de Deus e de Seu plano para a
humanidade.

A concepção de inspiração está profundamente enraizada na compreensão cristã da Bíblia


como palavra de Deus. Ela afirma a participação do Espírito Santo na formação das
Escrituras, assegurando que elas sejam uma autêntica revelação da vontade divina. No
entanto, a inspiração não anula a humanidade dos autores bíblicos, mas sim, em uma
harmonia misteriosa, incorpora suas personalidades, estilos e contextos na comunicação da
mensagem divina.

A autoridade da Bíblia como a palavra de Deus é fundamental para a fé cristã. Desde a


teologia à história, hermenêutica e prática pastoral, sua autoridade é reconhecida e
respeitada. Como palavra revelada de Deus, ela orienta e governa a vida do crente,
moldando a fé e a prática cristã.

A autoridade cristã é construída através da interação entre Escritura, Tradição e Razão. A


Escritura fornece a base para a fé cristã, a Tradição transmite e interpreta essa fé ao longo
do tempo, e a Razão aplica essa fé à vida cotidiana e aos dilemas contemporâneos. Esta
abordagem tridimensional proporciona um equilíbrio saudável, permitindo que a fé cristã
permaneça firme, mas também relevante e aplicável.

A autoridade cristã é mais do que uma entidade reguladora; é uma força formativa e
transformadora. Ela guia os crentes através dos desafios da vida, moldando-os para se
alinharem mais à imagem de Cristo. Além disso, a autoridade cristã também tem um papel
fundamental na formação da comunidade de fé, criando um reflexo do reino de Deus na
Terra. Embora viver de acordo com a autoridade cristã possa ser um desafio, é através deste
desafio que a verdadeira transformação ocorre.

REVISÃO

1. Qual é a importância do conceito de revelação para a teologia cristã e como as

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LITERATURA APÓCRIFA 103

diferentes formas de revelação se relacionam entre si, de acordo com os


teólogos e as Escrituras?
O conceito de revelação é central para a teologia cristã, pois descreve a forma pela
qual Deus se torna conhecido à humanidade. A Criação, as ações históricas de Deus,
as Escrituras e Jesus Cristo são considerados os principais meios de revelação. Os
teólogos e as Escrituras descrevem essas formas de revelação como complementares,
cada uma oferecendo uma perspectiva única sobre a natureza de Deus e Seu plano
para a humanidade.

2. Como a doutrina da inspiração contribui para a compreensão cristã da


natureza e da autoridade das Escrituras, e qual é o papel do Espírito Santo
neste processo de inspiração, considerando a humanidade e a personalidade
dos autores bíblicos?
A doutrina da inspiração afirma que a Bíblia é a palavra de Deus comunicada através
de agentes humanos sob a influência do Espírito Santo. Isso contribui para a
compreensão cristã das Escrituras como fonte confiável de verdade divina e
orientação moral. O papel do Espírito Santo é essencial neste processo, pois é Ele
quem garante que as palavras registradas na Bíblia sejam verdadeiras e fiéis à
intenção de Deus, mesmo respeitando a personalidade e o estilo de cada autor
bíblico.

3. Como a autoridade da Bíblia é reconhecida e aplicada na teologia, história,


hermenêutica e prática pastoral cristãs?
A autoridade da Bíblia é reconhecida em todos os aspectos da vida cristã. Na teologia,
ela é vista como a revelação auto-atestadora de Deus, conforme exposto por Barth.
Historicamente, a Igreja sempre reconheceu a Bíblia como a principal fonte de
autoridade, conforme demonstrado pelos pais da Igreja e pela Reforma Protestante.
Hermenêutica, a arte e a ciência da interpretação bíblica, respeita a autoridade da
Escritura ao buscar seu verdadeiro significado. Na prática pastoral, a pregação e o
ensino são fundamentados na Escritura, de acordo com a orientação de Pedro em
sua primeira epístola.

4. Como a Escritura, Tradição e Razão interagem para formar a autoridade cristã


e como cada uma contribui para a fé e prática cristã?
A Escritura, Tradição e Razão formam a tríade da autoridade cristã, cada uma
desempenhando um papel único, mas interdependente. A Escritura fornece a
revelação divina e os princípios fundamentais da fé cristã. A Tradição, em seguida,
transmite e interpreta esses princípios ao longo dos séculos, fornecendo um contexto
histórico para a compreensão da Escritura. Finalmente, a Razão permite que os

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cristãos apliquem a verdade da Escritura em suas vidas diárias e na sociedade


contemporânea. Juntos, esses três componentes permitem que a autoridade cristã
seja a um só tempo firme em seus princípios e relevante para a vida cotidiana.

5. Qual é a função dual da autoridade cristã, como ela age nos indivíduos e na
comunidade de fé, e quais são os desafios inerentes em aceitar e viver de
acordo com a autoridade cristã?
A autoridade cristã tem uma função dual: ela guia e transforma. Ela age como uma
bússola para os crentes, guiando-os através dos desafios da vida e direcionando-os
para um caminho que reflete a vontade divina. Além disso, ela tem um papel
formativo, moldando a vida e o caráter dos crentes para se alinharem mais à imagem
de Cristo. A autoridade cristã também tem um papel fundamental na comunidade de
fé, ajudando a criar um reflexo do reino de Deus na Terra. No entanto, aceitar e viver
de acordo com a autoridade cristã pode ser um desafio, já que muitas vezes envolve
viver de maneira contrária aos padrões mundanos. No entanto, é através deste
desafio que a verdadeira transformação pode ocorrer.

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