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Fichas de trabalho por domínio – Educação Literária

Ficha 5 | Os Sonetos Completos, de Antero de Quental

Lê o texto. Se necessário, consulta as notas.

Despondency 1

Deixá-la ir, a ave, a quem roubaram


Ninho e filhos e tudo, sem piedade…
Que a leve o ar sem fim da soledade2
Onde as asas partidas a levaram…

5 Deixá-la ir, a vela, que arrojaram3


Os tufões pelo mar, na escuridade,
Quando a noite surgiu da imensidade,
Quando os ventos do Sul se levantaram…

Deixá-la ir, a alma lastimosa,


10 Que perdeu fé e paz e confiança,
À morte queda, à morte silenciosa…

Deixá-la ir, a nota desprendida


Dum canto extremo4… e a última esperança…
E a vida… e o amor… deixá-la ir, a vida!
Antero de Quental, Os Sonetos Completos, Porto,
Porto Editora, 2016, p. 71

NOTAS
1
Despondency – desalento, desânimo.
2
soledade – solidão.
3
arrojaram – arrastaram.
4
extremo – último.
Fichas de trabalho por domínio – Educação Literária

1. Comenta a expressividade da anáfora “Deixá-la ir” no início de cada estrofe, relacionando-a com o título
do poema.

2. Explora o valor alegórico da “ave”, explicitando o desejo manifestado pelo “eu”, na primeira estrofe.

3. Explicita o estado de espírito do “eu”, tendo em conta a gradação que acentua o desprendimento
perante a vida, ao longo do texto.

4. Mostra o efeito expressivo da aliteração dos sons m, n e nh e das reticências.

5. Relaciona o valor simbólico de “escuridade” (verso 6) e “noite” (verso 7) com o apelo à morte, presente nos
versos 11, 13 e 14.

6. Analisa o poema quanto à estrutura externa, tendo em conta o número de estrofes e versos e a rima.
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Educação Literária

Ficha 5
1. O título sugere um estado de espírito de desalento,
desânimo. Já a anáfora aponta para a intensificação do
sentimento de desprendimento e de vazio, presente na “ave”
(v. 1), na “vela” (v. 5), na “alma” (v. 9) e na “nota desprendida”
(v. 12). Assim, existe uma correlação entre o título e a
anáfora.

2. A ave simboliza a liberdade. Contudo, no poema, trata-se


de uma liberdade perdida, com as “asas partidas” (v. 4), a
quem tudo “roubaram” (v. 1) e que o “eu” deseja que possa
partir, em “soledade” (v. 3).

3. O “eu” evidencia uma angústia existencial, que é dominada


pelo desalento e desesperança, por um sentimento de
abandono e, finalmente, um desejo de anulação. Essa
angústia inicialmente manifesta o desalento pela perda da
liberdade, a “ave”, pela letargia resultante da perda da “vela”,
pela “alma” que se entrega e perdeu a “fé”, pela nota musical
derradeira e, finalmente, pelo desprendimento face à “vida”,
numa gradação crescente que culmina num desejo de
anulação do “eu”.

4. A aliteração dos sons nasais, por exemplo, nas palavras


“quem”, “Ninho”, “fim”, “tufões”, “confiança”, “silenciosa” e
“desprendida”, contribui para um fechamento das vogais,
associado a estados de alma pessimistas. Por seu turno, as
reticências contribuem para um ritmo lento e arrastado do
texto, associado ao desprendimento e ao vazio.

5. A “escuridade” e a “noite” representam, simbolicamente, a


morte, sendo, por isso, outra forma de o “eu” mostrar que se
trata de uma ideia dominante ao longo de todo o soneto.

6. O poema é um soneto, composto por duas quadras e dois


tercetos. Quanto à rima, ela é emparelhada e interpolada nas
quadras e cruzada nos tercetos. O esquema rimático é abba/
abba/ cdc/ ede. A rima é predominantemente pobre, sendo
rica, apenas, nos versos 12 e 14, e é consoante.

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