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Dissertação de Mestrado Integrado em Arquitectura

Apresentada à Faculdade de Arquitectura do Porto

ILHAS, DO LADO DE LÁ DA RUA


Reflexões sobre a Habitação Popular e Social e a sua Integração
na Cidade do Porto
Beatriz Gomes de Almeida

Orientada por: Professor Doutor Nuno Grande | FAUP | SET.2015 | Porto


FAUP, Setembro 2015
Mestrado Integrado em Arquitectura
Orientação: Professor Doutor Nuno Grande
AGRADECIMENTOS

Agradeço,

Ao Professor Doutor Nuno Grande, pelo seu acompanhamento cuidado, pela sua disponibilidade e pelo seu apoio
constante.

Ao Doutor Manuel Pizarro, Vereador do Pelouro da Habitação e Acção Social, pelo interesse demonstrado, pelo
tempo e informação partilhada.

Ao LahbSocial, em especial ao Professor Fernando Matos Rodrigues, pela colaboração e material facultado;

Ao Eng. José António Ferreira, do Gabinete de Estudos e Planeamento da DomusSocial, que se mostrou sempre
disponível para me receber e me actualizar sobre os desenvolvimentos dos projectos;

À minha mãe, pela sua imensa paciência e por toda a ajuda ;

Ao meu Pai, pela sua força; Aos dois, por me apoiarem e acompanharem sempre;

Ao Jota, aos meus irmãos e a todos os amigos que estiveram presentes e me acompanharam neste momento, um
imenso obrigada pela amizade e paciência que têm para me aturar;

Aos habitantes da Ilha da Bela Vista, e tantas outras Ilhas, por possibilitarem a invasão dos seus espaços e tão
amavelmente partilharem as suas histórias;
5

Resumo
Consequência de um enorme aumento demográfico na cidade do Porto, sur-
gem longos e estreitos corredores que dão, geralmente, a única fachada a pe-
quenas casas de um só piso, edificadas frequentemente com matéria-prima
fraca, a estes agrupamentos de fogos chamamos Ilhas.
Estes núcleos vieram dar alojamento à população rural que chegava à cidade
já sobrelotada, multiplicando-se rapidamente por serem considerados investi-
mentos de baixo risco, envolverem escassos recursos e ainda darem um novo
uso aos longos terrenos vazios nas traseiras das casas burguesas, terrenos com
fraco valor imobiliário. Tudo isto permitia aos seus proprietários cobrar rendas
baixas, transformando as Ilhas no abrigo das classes trabalhadoras mais po-
bres.
Este tipo de habitar tinha, no entanto, grandes problemas de salubridade que
iam desde a sobreocupação dos pequenos fogos à fraca ventilação do espaço
que era apenas de um modo geral feita pela única frente das casas.
Assim com mais de um século de existência em que estes espaços foram alvo
de contínuas acções, de um modo geral com o propósito da sua erradicação,
chegam aos dias de hoje aproximadamente mil Ilhas, muitas das quais se en-
contram em mau estado de conservação, representando por isso um problema
que merece ser estudado.
Com a análise desenvolvida procura-se perceber a evolução destes espaços,
entender a forma como marcam a cidade de hoje, bem como a forma como a
cidade do Porto lidou e lida com as Ilhas.

Palavras-Chave:
Ilhas do Porto| Habitação Social | Habitação popular | Políticas de Habitação
7

Abstract
“Ilhas” is the name given to the clusters created by the long and narrow corri-
dors that create the only facade of the small one floored houses, they appear in
Oporto as consequence of an enormous demographic growth in the city.
These complexes gave lodging to the rural population that arrived to the al-
ready overcrowded city. Being a low risk investment that involved very little
resources and gave new use to the long empty lands in the back of the bour-
geois houses this type of construction expanded all through the city. Having
these fields little market value it was possible for the proprietor to charge low
incomes, making the “Ilhas” the shelter of the lower working classes.
Similarly to other types of working classes houses, the “Ilhas” had many sani-
tary problems. Having a single front and being that front faced to the narrow
corridor it was only natural that these places had ventilation and insolation
problems, turning these clusters into dark and unhealthy places, focus of se-
veral diseases.
With more than a century of existence this spaces where continually object
of actions that mainly had as directive the demolition and extinction of these
spaces. Today the city counts almost a thousand “Ilhas”, most of them being in
bad condition making them a problem worth of some attention.
With the analyses presented here one tries to understand the history of these
places, how they are part of the contemporary city and how Porto has dealt
and is dealing with the “Ilhas.”

Key-words:
Oporto “Ilhas”| Social Housing | Popular Housing| Housing Polices
9

Sumário

AGRADECIMENTOS....................................................................................................................3
Resumo......................................................................................................................................5
Abstract.....................................................................................................................................7

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................13

1. A EUROPA PÓS-REVOLUÇÃO INDUSTRIAL: HABITAÇÃO OPERÁRIA.....................................17


1.1 NO REINO UNIDO......................................................................................................................... 23

1.2 BARCELONA.................................................................................................................................. 29

1.3 PARIS........................................................................................................................................... 33

1.4 BERLIM......................................................................................................................................... 43

2.O CASO PORTUGUÊS............................................................................................................57

3.HABITAÇÃO e HERANÇA INDUSTRIAL NO PORTO.................................................................85


3.1. O DESENVOLVIMENTO DAS ILHAS............................................................................................... 91

3.2. REFORMA HIGIENISTA............................................................................................................... 101

3.3 PORTO DOS BAIRROS CAMARÁRIOS.......................................................................................... 105

3.4. O PROCESSO SAAL..................................................................................................................... 113

2.5 AS ILHAS NA CIDADE CONTEMPORÂNEA................................................................................... 125

4. UM NOVO OLHAR SOBRE AS ILHAS...................................................................................139


4.1 A ILHA DA BELA VISTA: UM PROJECTO-PILOTO.......................................................................... 147

4.2 O PROJECTO............................................................................................................................... 153

4.3 A CÉLULA HABITACIONAL........................................................................................................... 157

4.4 DEPOIS DA ILHA DA BELA VISTA................................................................................................. 160

CONCLUSÃO:.........................................................................................................................163

Bibliografia............................................................................................................................169
Artigos.............................................................................................................................................. 171

Conferências, Conversas e Debates................................................................................................. 171

Índice de Imagens.................................................................................................................173
“A man’s house is his castle
— et domus sua cuique est tutissimum refugium.”

“A casa de um homem é o seu castelo


— e sua própria casa é o seu mais seguro refúgio”

Sir Edward Coke


13

INTRODUÇÃO

Em meados do século XIX, deu-se na cidade do Porto um enorme aumento demográfico, con-
sequência de grande crise na agricultura e do desenvolvimento Industrial no país entre outras
causas que serão mais desenvolvidas posteriormente.
Esta população, geralmente de origem rural, terá procurado abrigo no núcleo histórico da ci-
dade, que se encontrava ainda, maioritariamente, dentro dos limites da muralha fernandina.
Apesar das obras de expansão da cidade iniciadas, pelos Almadas, no final do século XVIII, o
Porto não se encontrava preparado para receber tal aumento de população geralmente po-
bre, e que vinha para a cidade trabalhar na indústria, pelo que teria baixo rendimento.
Rapidamente a cidade intramuros fica lotada, a burguesia muda-se para zonas mais livres da
cidade onde podia evitar a sobreocupação dos espaços e contacto próximo com esta popula-
ção, que considerava baixo nível.
À falta de espaço para crescer, a cidade dentro de muralhas passa a desenvolver-se vertical-
mente, tornando as ruas já estreitas mais sombrias e insalubres, acabando a situação por se
tornar insustentável.

“ Entre os bairros insalubres avulta sobretudo o do Barredo, que compactas fillas de


húmidos e escuros casinhotos se estende do môrro da Sé até à Ribeira (...) Em infectas
e tortuosas ruellas, que em certos pontos não recebem um único raio de sol, abrem-se
longos e escuros corredores, ao fundo dos quaes as escadas(...)”1

É assim neste cenário de sobrelotação humana da cidade murada que se começa a invadir
o interior dos quarteirões da cidade em expansão. Nascem as Ilhas do Porto. Estas, são de
um modo geral construídas para albergar a classe operária e outros trabalhadores da cidade.
As Ilhas encontram-se, por norma, nas traseiras das habitações burguesas do XIX, que defi-
nem a largura dos estreitos e profundos lotes da cidade. Estas acabam assim por funcionar
como estratégia de ocupação do interior dos quarteirões, e dão uso e rentabilidade a espaços
de baixo valor imobiliário. O baixo custo que a edificação destes espaços pedia, reflexo da
fraca qualidade na construção e do grande aproveitamento do solo, rapidamente mostrou
ser um investimento seguro para os seus promotores, visto existir uma enorme procura de
habitações de rendas baixas, por parte da população recém-chegada à cidade e com poucos
recursos.
Estas acabam, assim, por se tornar num tipo de habitação operária, básica e social, ainda que
privada. É com estas premissas que se inicia neste trabalho uma reflexão sobre estes espa-
ços, e sobre como, ao fim de século e meio de existência, estes integram e são integrados na
cidade de hoje.

As Ilhas surgem, no desenvolvimento do trabalho como objecto central do estudo, servindo


este de pretexto não só para entender o porquê do aparecimento destes núcleos no Porto,
através de alguns casos mais relevantes a nível Europeu que influenciaram não só a morfo-
logia das Ilhas, mas também as políticas habitacionais, que por sua vez terão permitido que
1 BARBOSA, António Pereira - Da Tuberculose no Porto. Porto: Typ. da Empreza “Artes & Letras”, 1906, p.
52-53
14
estas por um lado fossem esquecidas, por outro chegassem até aos dias que correm.
Na tentativa de perceber o percurso destes espaços e quais terão sido as suas influências, tor-
na-se pertinente desenvolver o estudo das habitações operárias que haviam sido construídas
um pouco por toda Europa. Em grande parte as Ilhas aparecem-nos com a sua forma bem
marcada, não só pela condição urbana da cidade, mas também no seguimento dos aconteci-
mentos a nível Europeu.
Será necessário também entender como é que estas, que terão sido consideradas a vergo-
nha da cidade durante aproximadamente um século, chegaram até aos dias de hoje com os
mesmos problemas que apresentavam na data em que terão sido edificadas. Neste contexto
desenvolve-se a questão política, que acaba por se tornar uma questão central desta disser-
tação já que se entende que as políticas habitacionais do pais, e do município se reflectiram
no estado em que encontram estes núcleos habitacionais.

O trabalho é então desenvolvido em quatro momentos distintos, que procuram sempre, de


algum modo, entender o momento que se segue, sendo o objectivo final perceber a realida-
de das Ilhas hoje e o seu significado para a cidade contemporânea.
Inicia-se assim a dissertação pelo estudo da habitação operária e social a sua evolução na eu-
ropa, procurando dar exemplos concretos de locais e situações que tenham de algum modo
influenciado o Porto e o aparecimento das Ilhas. Assim, com os exemplos escolhidos não se
pretendem ilustrar todas as formas de habitação operária, procura-se antes mostrar alguns
momentos que se consideram “chaves” da história deste tipo de habitação.
No capítulo seguinte procurou-se perceber o percurso das Políticas de Habitação em Portu-
gal. Procura-se fazer uma aproximação ao estado do país, de forma a tornar mais claro quais
foram as condições que permitiram que as Ilhas se desenvolvessem, fossem esquecidas e
também poupadas à destruição, que durante tanto tempo era vista como a única forma de
acção nestes espaços. Considera-se ser essencial perceber a evolução das políticas habitacio-
nais do País para melhor compreender a evolução que as Ilhas tiveram.
Entende-se então que é possível proceder ao estudo das Ilhas e analisar o seu aparecimento
no Porto. Assim num terceiro momento do trabalho procura-se perceber a história das mes-
mas, referem-se momentos chave para este tipo de habitação, relacionando-a com casos
anteriormente estudados, fazendo também um esforço por perceber as acções da autarquia,
em relação aos mesmos.
Finalmente chegamos ao momento actual, ao Porto hoje, às Ilhas hoje. Neste momento final
procura-se perceber para onde caminham as políticas de habitação da cidade em relação às
Ilhas, e o que a autarquia pretende fazer em relação a elas de modo a reavivar estes espaços
tão portuenses.
Com este trabalho procura-se assim de certa forma desmitificar as Ilhas do Porto, analisá-las
sem preconceitos, percebendo o que é bom e mau, ainda que se parta do pressuposto que
por mais que estejam escondidas do outro lado do muro são parte da cidade e a marcam e
caracterizam profundamente tornando-a única.
Figura 1 - Rua de Glasgow, Thomas Annan
17

1. A EUROPA PÓS-REVOLUÇÃO
INDUSTRIAL: HABITAÇÃO OPERÁRIA
Chama-se Revolução Industrial a todo o processo que se desenrolou entre 1760 e meados
do século XIX, período caracterizado pela modificação total dos processos de transformação,
produção, fabrico. A produção tradicional e artesanal foi sendo substituída pela produção
industrial, com a introdução da máquina no quotidiano do homem. O mundo mudou, o que
até agora era um processo lento e demorado, com pouca produção e caras mercadorias,
passaria a ser produzido em série, com um preço mais baixo e o homem começa aos poucos
a ser substituído pela máquina.
Esta revolução teve como ponto de origem o Reino Unido. Este tinha já sido o palco do apa-
recimento da manufactura, e é neste período também o local onde se assistiu a um maior
desenvolvimento desses novos meios de produção. Será também neste mesmo cenário, o
Reino Unido, que mais rapidamente a sociedade sentirá as vantagens e desvantagens desta
nova forma de produção ainda em desenvolvimento, a indústria.

“ The history of the proletariat in England begins with the second half of the last centu-
ry, with the invention of the steam-engine and of machinery for working cotton. These
inventions gave rise, as is well known, to an industrial revolution, a revolution which
altered the whole civil society; one, the historical importance of which is only now be-
ginning to be recognized. England is the classic soil of this transformation, which was
all the mightier, the more silently it proceeded; and England is, therefore, the classic
land of its chief product also, the proletariat.” 2

Até aqui os artesãos trabalhavam geralmente sozinhos, por vezes organizados também em
pequenos grupos que separavam diferentes etapas de execução. Frequentemente o traba-
lho era inteiramente manual, tendo, quando muito, o auxílio de instrumentos rudimentares
aos quais os artesãos chamavam máquinas, mas não passariam de ferramentas básicas de
trabalho. O artesão era responsável por todo o processo de produção, desde a obtenção da
matéria-prima até à venda do produto final. O seu trabalho era geralmente executado em
pequenas oficinas que muito frequentemente se encontravam na casa do próprio artífice.
Os artesãos viviam normalmente em ambientes rurais, na proximidade de uma cidade, onde
vendiam os seus artefactos quando terminados. Viviam do seu trabalho e viviam bem.

“ Because the home market was almost the only one, and the crushing power of com-
petition that came later, with the conquest of foreign markets and the extension of
trade, did not yet press upon wages.” 3

Engels4 deixa claro que o artesão vivia em boas condições, trabalhava, e ia vendendo o que
produzia sem a pressão da concorrência, que mais tarde apareceria. Arrendava a sua casa,

2 ENGELS, Fridriech; The Condition of the working-class in England 1844; manybook.net; 2005; Pág. 8
3 Idem; Ibidem; Pág. 9
4 Fridriech Engels, filosofo-politico, com pensamento revolucionário, braço direito de Karl Marx no
desenvolvimento e criação do Socialismo Cientifico, ou Marxismo, foi assim um grande estudioso e defensor das
classes trabalhadoras, deixando grandes testemunhos de análise social da época em que viveu. Como sequência
da sua ida para Manchester a trabalho, escreve a obra The Condition of the working-class in England 1844, onde
revela o seu grande choque com as condições de viva que vivem na capital industrial do mundo.
18
que por ser numa zona rural tinha espaço e condições dignas. Geralmente possuía um espaço
exterior onde plantava uma pequena horta nas suas horas livres, que eram tantas quantas
ele quisesse, uma vez que trabalhava por conta própria. Este pequeno terreno providencia-
va-lhe algum tipo de sustento. Respeitava o seu senhorio, a quem pedia conselhos, quando
surgia alguma disputa. Era, como Engels diz, homem de moral, vivia uma vida moral, seguia
os bons princípios, e temia acima de tudo a ira de Deus. Vivia confortavelmente, não traba-
lhava horas extra, e apenas fazia o que queria, trabalhava o seu jardim quando lhe apetecia,
e recebia o que precisava para continuar a sua vida confortavelmente. Raramente sabia ler e
escrever; vivia assim inocente na sua ignorância. Na introdução do seu livro The Condition of
the working-class in England, de 1844, Engels não nos faz este retrato do artesão de forma a
enaltecer o seu estilo de vida, de certa maneira Engels parece dividido entre o bom e o mau
da situação em que os artsãos viviam, por um lado “ficavam um grau acima na sociedade do
que o operário Inglês de hoje em dia” 5 (hoje referindo-se ao ano de 1844), por outro lado,
alguma coisa teria que acontecer para que os acordasse do seu estado quase vegetativo (in-
telectualmente).

“They were comfortable in their silent vegetation, and but for the industrial revolution
they would never have emerged from this existence, which, cosily romantic as it was,
was nevertheless not worthy of human beings. In truth, they were not human beings;
they were merely toiling machines in the service of the few aristocrats who had guided
history down to that time.” 6

Foi o aparecimento da máquina, como acima mencionado, que despoletou a industrialização


estandardizada e em série. As máquinas produziam mais, mais rápido e com menos mão-de-
-obra, consequentemente mais barato, e assim o pequeno artesão que produzia numa exígua
oficina não tem como competir com as novas fábricas. O artesão vê-se obrigado a mudar-se
para a cidade em busca do trabalho e sustento perdidos, e acabando por trabalhar com a
máquina, que o havia tirado do conforto da sua casa no campo. Engels continua a citação
acima transcrita dizendo que “ a revolução industrial levou simplesmente isso” (a existência
vegetativa do artesão) “até ao seu limite lógico, transformando os artesões em máquinas,
pura e simplesmente” 7. Isto posteriormente vai obrigar o artesão a tomar uma posição defi-
nitiva e pensante, digna de um Homem. Estas palavras de Engels por mais duras que sejam
não deixam de ser verdade, veja-se o caso de França: só quando o povo perdeu todos os seus
direitos, se revoltou e se tornou dono das suas ideias e da sua própria vida, até lá morriam de
fome, enquanto a realeza vivia no luxo em Versailles sobre a miséria do povo.
No Reino Unido, o homem perdeu também o controlo de todo o processo produtivo, e com
isso o controle do lucro, perdeu a sua autonomia, mudou-se para a cidade e deixou a sua
idílica casa de campo. Lá, foi forçado a procurar uma nova habitação, mas devido à pouca
oferta e à grande procura, os preços eram geralmente bastante inflacionados, acabando por
se instalar em habitações exíguas, sobrelotadas, antigas e com poucas condições.
A história da habitação do operário em Inglaterra acaba por não ser, muito diferente da de
muitos países e também de Portugal e do Porto.

5 Tradução de “Stood one step higher in society the English workman of to-day”; ENGELS, Fridriech; The
Condition of the working-class in England 1844; manybook.net; 2005 Pág. 10
6 Idem; Ibidem; Pág. 9
7 Tradução de, “The industrial revolution has simply carried this out to its logical end by making the
workers machines pure and simple” ENGELS, Fridriech; The Condition of the working-class in England 1844;
manybook.net; 2005; Pág 10
19
Uma das primeiras mudanças foi a divisão dos trabalhos, consequência da invenção de
spinning Jenny, por volta de 1764, criação de James Hargreaves, fiador, ainda um projecto
bastante rústico. Esta era manipulada por uma pessoa apenas e movia perto de 18 rodas de
fiar. Pela primeira vez passou a existir mais fio do que poderia ser tecido. O salário dos tece-
lões aumentou e o preço da matéria (o fio) desceu já que o custo da mão-de-obra diminuiu
também. O tecelão passou a dedicar todo o seu tempo ao tear, deixando de lado a agricultura.
A par destes desenvolvimentos surgem novos métodos e máquinas para a produção agrícola.
Os pequenos proprietários, não querendo investir nos novos métodos, foram ultrapassados
rapidamente pelos grandes proprietários e investidores, já que conseguiam mais produtos de
formas mais baratas. Arruinados, os pequenos proprietários vêem-se obrigados a vender os
seus terrenos, acabando por, geralmente, passar de proprietários a trabalhadores agrícolas.8
A indústria continuou a crescer, novas máquinas foram criadas, contribuindo para o cresci-
mento da indústria. Estas máquinas procuravam, por vezes, ultrapassar as antigas, outras
completar todo o processo de produção Industrial.9 Pequenos armazéns começaram a agru-
par várias máquinas, criando assim pequenas fábricas, que foram gradualmente aumentan-
do. Rapidamente Inglaterra passou a dominar os mercados internacionais.10 Surgiram assim
as primeiras indústrias.
Estes novos métodos foram “exportados” para os outros países, mas sempre com algum atra-
so de modo que a riqueza de Inglaterra foi sempre aumentando, bem como a sua classe ope-
rária. Foi o fim de qualquer resquício de estabilidade para esta classe.
O aparecimento de algumas indústrias promovia por vezes a existência de outras, como acon-
teceu no caso do aparecimento da máquina a vapor que elevou a procura e a produção do
ferro que, por sua vez, fez aumentar a indústria mineira em busca desse minério. Como ge-
ralmente o ferro era fundido com o uso de carvão, a busca deste último aumentou também
exponencialmente. Assim, as indústrias cresciam a par do capitalismo, o grande problema
deste sistema é que todas as indústrias dependem das outras, quando uma entrava em crise
todas as outras a seguiam.
Muitas das cidades, onde as diferentes indústrias se instalaram, sofreram grandes migrações
de população de origem rural, em busca de trabalho e habitação. Por vezes a própria fábrica
está na origem da cidade, uma grande fábrica instala-se numa pequena localidade, onde os
terrenos são baratos; grande número de trabalhadores da fábrica migram para esta zona,
ocupando todas as habitações disponíveis a preço acessível; e rapidamente a existência de
uma concentração de pessoas chama a atenção de pequenos serviços, padarias e mercados;
outras indústrias vão, por vezes, agregar-se à existente e, assim, uma pequena vila rapida-
mente se torna numa pequena cidade.
Por vezes o proprietário da fábrica promovia a construção de habitações para os seus operá-
rios o que lhes viria tirar qualquer controlo na sua vida, uma vez que os seus senhorios seriam
também os seus patrões. Qualquer ideia de desafio por parte do operário contra o patrão
poder-se-ia reflectir na falta de tecto sobre toda a sua família. Assim estes não eram escravos,
mas viviam impotentes, completamente manipulados pelos seus patrões.

«The well-disposed is important(…) Both shared the need to have docile people in their
houses, people who would give no trouble, behave quietly and look respectable, and,

8 ENGELS, Fridriech; The Condition of the working-class in England 1844; manybook.net; 2005;
9 Idem; Ibidem; Pág. 10-11
10 Idem; Ibidem; Pág. 5
20

Figura 2 - Desenho de Modelo de versão melhorada de Figura 3 - Capa Original do


Spinning Jenny Livro, de Freidrich Engels

Figura 4 - Gravura do Interior de uma pequena Fábrica


21
preferably, show gratitude(…) Farm works were evicted for belonging to the Agricul-
tural Labourers Union. Industrial strikes were easily broken by the threat of eviction.” 11

Com tudo isto, é fácil perceber como surge o problema da habitação nas cidades, principal-
mente sentido pela mais recente classe de trabalhadores fabris, por ser a que menos recursos
possui.

“… people regard each other only as useful objects; each exploits the other, and the
end of it all is, that the stronger treads the weaker under foot, and that the powerful
few, the capitalists seize everything for themselves, while to the weak many, the poor
scarcely a bare existence remains.” 12

É importante perceber que o problema surge não apenas da falta de habitações suficientes
(estas poderiam facilmente ser edificadas), mas acima de tudo, da ganância do homem capi-
talista. As habitações para as classes mais baixas não teriam lucros altos pelo que não seriam
vistas como bons investimentos, pelo que, estas habitações não eram edificadas. Isto reflec-
te-se no facto de, normalmente, a população mais pobre viver nas zonas mais antigas da
cidade, onde as casas se empilham, e as ruas são mais estreitas, usam-se antigas habitações
das classes mais altas, onde geralmente pouca ou nenhuma intervenção existe há muitos
anos. Quando tal acontecia, era frequente estas não serem ocupadas por fogo, mas antes por
divisão, onde o habitual é uma família inteira ocupar um único quarto.13
A baixa burguesia seria a principal investidora neste tipo de habitações para as classes po-
bres, quer no aluguer das antigas casas, quer na construção de novos blocos. Os poucos
recursos necessários representavam baixo risco, uma vez que existia mais procura do que
oferta. Por terem fundos limitados, e de forma a garantirem lucros mais rápidos, poupavam
nos materiais e qualidade geral da construção.

“Such arrangements naturally resulted in skimped materials even to the extent that the
collapse of new-built houses was not at all infrequent.” 14

Possivelmente como consequência de ter sido palco principal dos avanços da indústria, o
Reino Unido é dos primeiros países a sentir as grandes mudanças desta reestruturação da
sociedade. Apesar do estado de apatia quase total em que o antigo artesão se encontrava, o
operário passa a ser encarado como máquina, acabando por ser completamente desumani-
zado. Não terá sido, contudo o único local em que tal facto se vem a verificar.
Todos os países, à medida que foram sendo industrializados, sentiram, mais tarde ou mais
cedo, as consequências dessa industrialização. Sendo que o aspecto que mais nos importa
desenvolver é a habitação, ou antes, a falta dela para as classes trabalhadoras de cada nação.
Cada cidade industrial terá reagido de uma maneira diferente, perante o aparecimento deste
problema decorrente da revolução social e urbana que então se inicia.
A habitação do operário tem as mais diferentes formas. Por vezes são pequenos cottages, tão
típicos no Reino Unido, que evoluíram para as pequenas e insalubres back-to-back houses.
Outras vezes são usados os edifícios que as classes mais abastadas já não consideram dignos
do seu estatuto, por serem pequenos, velhos, por precisarem de intervenções que conside-

11 GAULDIE, Enid; Cruel Habitations: A history of the Working-Class Housing 1780-1918, 1974; Pág. 63
12 ENGELS, Fridriech; The Condition of the working-class in England 1844; manyook.net; 2005; Pág. 18
13 GAULDIE, Enid; Cruel Habitations: A history of the Working-Class Housing 1780-1918, 1974; Pág. 93
14 Idem; Ibidem; Pág. 93
22

Figura 5 - British Beehive, George Cruikshank, 1867


23
ram exageradamente caras, por preferirem mudar-se para uma área da cidade mais recente
e mais na moda, às vezes até para fugirem do movimento, barulho e poluição causados pela
mais recente fábrica do quarteirão, desvalorizando por isso o aluguer das habitações. Apesar
do preço do arrendamento descer, geralmente continua demasiado elevado para as poucas
posses da família operária. Assim, estas moradias deixavam de ser habitadas por uma família
apenas, surgindo então as também comuns habitações colectivas, que nas cidades de Barce-
lona e Paris, são por excelência a habitação do operário. Estas diferentes tipologias pouco ou
nada tinham em comum umas com as outras, sendo então a miséria em que os seus habitan-
tes viviam, e a sua pobreza as únicas particularidades que teriam em comum.
Estas diferenças das habitações pobres, geralmente acontecem também dentro do mesmo
país e, de umas cidades para as outras, e até na mesma cidade podemos encontrar diferentes
tipos de habitação de trabalhadores, como é até visível na pequena cidade do Porto, nas ruas
estreitas e escuras da zona da Sé, e as Ilhas que se espalham pelo resto da cidade.
As zonas industriais, rapidamente se enchem de força de trabalho e se tornam nas zonas mais
populosas e densas da cidade. A relação de proximidade entre habitação e indústria seria
fulcral, já que poderia melhorar ou piorar muito a já pouca “qualidade” (por falta de outro
termo) de vida da tal força de trabalho.
Todas as cidades teriam bairros pobres, onde a classe trabalhadora se atulhava, o seu tama-
nho varia, mas por maiores que estes bairros fossem, encontravam-se, sempre que possível,
escondidos das vistas das classes mais endinheiradas, de modo que estas quase não se lem-
brassem da sua existência.

1.1 NO REINO UNIDO


A zona St. Giles em Londres, seria um dos exemplos dessa segregação que se vivia na cidade
bem no coração da cidade, ladeado por Oxford Street, Trafalgar Square e Regent Street, este
pequeno bairro vizinho de uma das áreas mais frequentadas pela classe alta, não passava de
um emaranhado de toscas ruas mal cheirosas, ladeadas por altas casas com até 4 pisos. As
únicas pessoas que aí passavam pertenciam à classe de operários.

“ The houses are occupied from cellar to garret, filthy within and without, and their
appearance is such that no human being could possibly wish to live in them. But all this
is nothing in comparison with the dwellings in the narrow courts and alleys between
the streets, entered by covered passages between the houses, in which the filth and
tottering ruin surpass all description. ” 15

Estas zonas da cidade estariam lotadas, sobrelotadas. Veja-se outro exemplo ainda em Lon-
dres, nas zonas de Whitechapel e Bethnal Green, conhecidas zonas operárias, que teriam
índices demográficos altíssimos, (note-se que em apenas 365 metros quadrados chegava a
haver cerca de 12.000 habitantes, em apenas 1400 casas). 16 Donde podemos depreender que
tal feito era apenas conseguido em detrimento das condições de vida dos seus habitantes.
Em Inglaterra, segundo Engels nos transmite, a generalidade das grandes cidades tem bairros
operários idênticos. Geralmente, pequenas casas, com um ou dois andares (cottages) for-
15 ENGELS, Fridriech; The Condition of the working-class in England 1844; manybook.net; 2005; Pág.19
16 Idem; Ibidem; Pág. 25
24

Figura 6 - Bairro Pobre de Londres, Gustave Doré em 1872

Figura 7 - Dudley Street em Londres, Gustave Doré em 1872


25
mam longas filas, por vezes com caves usadas também para a habitação, apesar de contínuas,
raramente estas casas eram regulares, o limite da casa é composto por uma estreita rua, suja,
não pavimentada , sem canais de esgotos e que servia de estendal em dias de sol. A ventila-
ção destes espaços seria muito fraca devido à irregularidade e falta de planeamento com que
estes quarteirões eram construídos.17
Estes cottages, por vezes construídos num sistema de back-to-back houses por ser extrema-
mente baratos, já que possuíam apenas uma fachada livre, aproveitando as paredes laterais e
traseiras para a justaposição das casas. Eram como pequenos cottages construídos em longas
filas contínuas e formando, por vezes, através da sua repetição grandes bairros. Estas habita-
ções, apesar de economicamente terem as suas vantagens, pois com o aproveitamento má-
ximo do solo, e com os fracos materiais de construção usados, poupava-se em investimento
mas levavam noentanto à deterioração mais rápida das habitações, onde por vezes mal se
conseguia manter a água da chuva fora da casa, cujo pavimento interior frequentemente não
passava de simples tábuas sobre o terreno.

“During an investigation,“ (…) “, many rows of houses were found to have been built
over shallow drains covered only by the boards of the ground floor.” 18

Assim, pode-se concluir que as desvantagens que estes procedimentos teriam nas vidas de
quem aqui veio habitar seriam muitas. Por terem apenas uma única fachada, a ventilação dos
fogos era pouca ou nenhuma, situação que seria ainda agravada pela escassez de espaços
exteriores entre as diferentes fileiras de casas que tornavam a rua ou beco num sítio quase
tão pouco salubre como o interior das casas. Geralmente uma latrina servia uma fileira inteira
de casas e, estas raramente recebiam algum tipo de manutenção.
Segundo um estudo realizado em Manchester, por Newsholme’s Vital Statistics, num bairro
composto por 50% de casas deste tipo, a mortalidade era 11% superior à de outros bairros.19
Estas casas, organizadas back-to-back, e side-to-side, são talvez as que melhor representam
as habitações dos trabalhadores de Leeds, Manchester, Birmingham e Liverpool, entre muitas
outras.
As suas dimensões variavam, dependendo do tamanho do terreno adquirido, do seu preço
e das posses do seu promotor, bem como das do público que procurava albergar. Muitas ve-
zes, as casas que formavam a linha de frente da rua principal eram mais espaçosas e nobres,
quanto mais para o interior do bairro, mais pobres eram os materiais de construção, mais
estreitas e escuras as vielas, e menor o espaço ocupado por cada fogo.20 As ruas interiores
destes quarteirões não eram minimamente tratadas, o motivo é simples: das ruas, os senho-
rios não extrairiam qualquer tipo de lucro, pelo que viam o investimento nas mesmas como
perda de receita desnecessária. Os seus construtores pouco mais investiam do que o que era
estritamente necessário, muitas vezes consequência das escassas posses que tinham. O pou-
co investimento que este tipo de habitação exigia, aliado á enorme procura de casa, fazia com
que a pequena burguesia visse nestas habitações baratas um investimento seguro.

“Back-to-back speculative housing designed for accommodation of low-income-group

17 ENGELS, Fridriech; The Condition of the working-class in England 1844; manybook.net; 2005; Pág.19
18 Idem; Ibidem; Pág. 24
19 DYOS, Harold James; WOLF, Michael; The Victorian City: Images and Realities; 2nd Edition 1999; Pág.
22
20 BENEVOLO, Leonardo; História da Cidade; Edição Perspectiva; São Paulo; 1999; Pág. 567
26

Figura 8 - Vista Aérea de Hulme, na periferia de Manches- Figura 9 - Planta de Bairros Periféricos Ingleses
ter, e o intenso aproveitamento de solo no bairro operário segundo os regulamentos de 1875
edificado no inicio do século XX.

Figura 10 - Quarry hill, Leeds em 1901 Figura 11 - Quarteirões de casas back-to-back, em Eldon Street,
Leeds, s.d.

Figura 12 - Back-to-Back Houses, nas traseiras de George Street em Figura 13 - Beco de St. Peter Street em
Leeds, s.d 1901
27
families was, especially in the first half of the century, shoddily built, on insecure foun-
dations, of materials not even adequate for keeping out the rain. In some cases new
estates were built on sites still heaving with refuse, lightly cemented over to provide a
surface which, if temporarily flat and dry, soon split to produce settlement cracks, rising
damp, and unpleasant smells such arrangements naturally resulted in skimped materi-
als even to the extent that the collapse of new-built houses was not at all infrequent.” 21

Em Leeds, onde os primeiros cottages construídos back-to-back terão sido erguidos por volta
de 1786, e apesar de desde o início do século XX existirem leis que proíbem a edificação deste
tipo de habitações, estas foram edificadas até 1837, ao abrigo de uma cláusula que permitia
a sua edificação em ruas para onde já existisse aprovação.22
O exterior destas casas em Leeds não excederia, em média, os 4.57 x 4.57 metros, (15x15ft),
seriam compostas por uma cave, uma cozinha ou uma pequena zona de preparação de ali-
mentos e um quarto pequeno no sótão. Já em Liverpool, as dimensões destes espaços seriam
substancialmente mais reduzidas, chegando por vezes a ter de frente apenas 3 metros e, ge-
ralmente, não ultrapassando os 4, sendo compostas por um porão, uma sala no rés-do-chão,
e dois quartos no piso superior. Em Birmingham as casas seriam ligeiramente mais espaçosas,
e teriam mais um piso.23
Um pouco por toda a Inglaterra surgem também outras tipologias, como são exemplo os
Courts, de que a classe operária vai ser a principal ocupante. Uma das cidades em que esta
forma de habitação de trabalhadores esteve bastante presente foi também Liverpool, cidade
mercantil, que cresceu devido ao desenvolvimento do seu porto, que se encontrava numa
localização estratégica, num ponto central entre a Irlanda, Escócia e Gales, tornando-se por
tanto num dos principais interpostos comerciais internos do Reino Unido. Apesar desta ti-
pologia ter sido vastamente usada na habitação da classe operária, será importante ter em
mente que a sua existência era já comum na habitação das classes mais pobres em Liverpool,
mesmo antes da abertura das primeiras indústrias da cidade. Não terá sido, por isso uma
criação da industrialização.
Os Courts eram geralmente organizados por um pequeno espaço central e variariam entre
os 6 e os 9 metros (20-30ft) de comprimento e os 2,75 e os 4,5 metros (6-15ft) de largura.24
O acesso ao pátio era feito pelo que aparentava ser uma porta normal, esta iria contudo ter
directamente ao interior do pátio.25 Esta passagem era geralmente estreita e coberta. Por
cima encontrava-se o edifício de frente de rua, que teria uma área maior nos pisos que so-
brepunham a entrada, e assim daria à rua principal uma aparência mais regular e contínua.
Em torno deste pequeno pátio eram construídas duas filas de edifícios, que perfaziam 6 a
8 casas, com até quatro pisos. Cada bloco era ocupado por várias famílias, sendo que estas
normalmente ocupavam apenas um ou dois quartos de cada habitação. Estes edifícios seriam
construídos colados às traseiras das habitações que formavam o Court adjacente. Em alguns,
mas raros casos, estes Courts têm duas entradas, uma de cada lado, permitindo uma melhor
ventilação do espaço. Estes casos seriam contudo as excepções, sendo que geralmente o

21 GAULDIE, Enid; Cruel Habitations: A history of the Working-Class Housing 1780-1918, 1974; Pág. 93
22 FRASER, DEREK; A History of Modern Leeds; 1980, Manchester; Pág. 107
23 GAULDIE, Enid; Cruel Habitations: A history of the Working-Class Housing 1780-1918, 1974; Pág. 95
24 DUNCAN, W.H; Report on the Sanitary State of the Labouring Classes in the Town of Liverpool; in: Poor
Law Commissioners; Local Reports on the Sanitary Condition of the Labouring Population of England - Printed by
W. Clowes and Sons; London; 1842; Pág.284
25 TWISLETON, Edward; Ibidem; Pág. 151
28

Figura 14 - Vista do interior da muralha de Barcelona, antes do Plano Cerdá, 1855


29
pátio tinha uma única entrada, criando assim um beco sem saída, por vezes ainda, estes en-
contravam-se edificados abaixo do nível da rua aumentando, desta forma, os já gravíssimos
problemas de ventilação, quer dos pátios, quer das casas que aqui se encontravam. 26
Segundo o Local Report on the sanitary condition of Labouring Population realizado em 1842
estima-se que metade da população operária de Liverpool, cerca de 87.500 pessoas, viveria
em aproximadamente 2.400 Courts. Já em 1863 o Report to the Health Committee of the
Borough of Liverpool, afirma existirem 3.173 Courts com 18,610 casas, onde mais de 110.000
pessoas viveriam, tendo por isso uma enorme densidade populacional.27
Em cidades Escocesas, em geral, as habitações dos trabalhadores seriam mais altas, com cin-
co ou seis andares, e as ruas seriam tão estreitas que uma pessoa quase podia saltar de um
edifício para outro. A luz mal penetrava nestes espaços escuros, todas as noites imundices
e lixos eram lançados à sarjeta. O maior problema nesta situação não estaria no cheiro, mas
antes no perigo que representa para os habitantes. Isto, contudo, seria já uma característica
da generalidade dos bairros e ruas das classes mais pobres.

«The higher density of inhabitants made possible by high building, however, combined
with the meanness of lavatory and tap provision to make tenement living less comfort-
able than it might been.”28

Na Escócia, bem como Barcelona e Paris, as pessoas sobrepunham-se umas as outras, como
os pisos das suas casas.

1.2 BARCELONA
Este tipo de habitação colectiva permitia que a densidade populacional se tornasse mais
intensa, sendo o aumento desta densidade agravado pelo facto de os espaços de banho e
latrinas, serem tão tanto ou mais escassas que os dos Courts e casas Back-to-back.
Segundo os dados estatísticos de 184229, de um total de 186.214 pessoas que viviam em Bar-
celona, apenas 29.009 viveriam extramuros, podendo assim perceber-se que o espaço intra-
muros estariam sobrelotado com a restante população que perfazia um total de 157.205 ha-
bitantes. A densidade demográfica intramuros seria de cerca 13,50 m2 por pessoa, sem ruas
sem praças, espaços públicos, enquanto no seu exterior rondaria os 600m2 por habitante.
Apesar da elevada taxa de mortalidade das grandes cidades europeias, Barcelona teria uma
taxa de mortalidade mais elevada, o que é reflexo claro das condições de vida que existiam. A
esperança média de vida nesta época variava escandalosamente com a diferença das classes.
No estudo para o Ensanche de Barcelona, Ildefonso Cerdà verifica uma diferença de quase
20 anos na média de vida entre os homens de classes ricas para os das classes mais pobres,

26 DUNCAN, W.H; Ibidem; Pág. 280 a 290


27 NEWLANDS, James; Report to the Health Committee of Borough of Liverpool on the Sewerage, Paving,
Cleansing, and other Works, Under the Sanitary Act, from 1856 to 1862 inclusive; Henry Greenwood, Printer ;
Liverpool, 1863 Pág. 26
28 GAULDIE, Enid; Cruel Habitations: A history of the Working-Class Housing 1780-1918, 1974; Pág. 93
29 CERDÀ, Ildefonso; Ensanche de la ciudad de Barcelona, Memoria descriptiva de los trabajos facultati-
vos e estudios estadísticos hechos de Orden del Gobierno, y consideraciones que se han tenido presentes en la
formación del Ante-Proyecto Para el Emplazamiento y distribución de Nuevo Casario; 1855; Pág. 62
30

Figura 15 - Modelo típico das, casas edificadas em Bar- Figura 16 - Classe 4, encontravam-se geralmente em
celona, Classe 3, encontravam-se geralmente em ruas ruas com largura de 2, 5 a 3 metros.
com largura de 3 a 4 metros

Figura 17 - Proposta de Josep Fontseré i Mestre para a Figura 18 - Proposta Vencedora do concurso para
Expansão de Barcelona, 1959 a Expansão de Barcelona, por Antoni Rovira i Trias,
1859

Figura 19 - Projecto Final, Plano Cerdá, 1859


31
sendo que na pequena burguesia um homem chegaria em média a viver até aos 38.8 anos
enquanto nas classes insolventes não passaria dos 19 anos30. Esta era só ultrapassada por
Liverpool, onde a diferença seria idêntica, mas a esperança média de vida da classe trabalha-
dora não passaria dos 15 anos, uma realidade que seria verdadeiramente aterradora. A ver-
dade é contudo que tal não seria de admirar, considerando as condições miseráveis em que
as classes pobres viviam. Segundo W. Duncan, director do departamento médico e da saúde,
nos anos 40 do século XIX de Liverpool, a mesma seria de longe a cidade menos salubre de
toda a Inglaterra.
Voltando a centrar a nossa atenção em Barcelona, os seus edifícios do interior da muralha,
teriam cerca de 4 pisos, uma cave, e baixíssimo sótão. Os pisos do rés-chão e cave que, origi-
nalmente seriam ocupados por comércio eram, por vezes, usados como habitação, o sótão,
que supostamente serviria de arrumos, era também usado, frequentemente como quarto
de dormir, já que para mais não daria, devido à sua pouca altura, normalmente inferior a 1
metro.31 A altura das construções geralmente atingia os 19,5 metros. Só por si esta altura tem
pouca importância, hoje os arranha-céus enchem os skyline das mais variadas cidades do
mundo, e não as tornam menos habitáveis, ou salubres se forem cumpridos os regulamentos
que prevêem um distanciamento mínimo entre os edifícios, mas quando aliada à largura das
ruas, que existiam dentro de muros, esta altura passa a tornar-se num dos grandes problemas
da cidade. No interior da muralha essa largura poderia variar entre 1.5m e 9.35m. Conclui-se
assim que estas ruas mal viam a luz solar, as mais largas talvez tivessem 2 horas diárias de luz
solar a chegar ao pavimento nos meses de verão, sendo que nas mais estreitas nem os pisos
superiores veriam a luz do sol, que, como sabemos, é um bem essencial à saúde.32
À semelhança de várias cidades europeias, Barcelona inicia a sua jornada industrial, com
a sobreocupação do espaço interior das muralhas. Os trabalhadores e classes mais pobres
invadiam as antigas construções, e ocupavam todo o espaço livre, quando esta já ultrapassa
todos os limites mínimos de habitabilidade, Cerdà cria o anteprojecto que viria dar as bases
para o Ensanche de Barcelona, planeando a expansão da cidade para fora do espaço limitado
das muralhas.

“!Abajo las murallas!, porque asi convenia à la salud publica y à su porvenir moral y
material, hubiera tenido la prevision de preparar los trabajos para el dia en que se rea-
lizase tan deseado derribo. ” 33

Este plano surge como forma de expansão da cidade, numa altura em que a indústria se ins-
talava e começava a invadir Barcelona, procurava, entre outros aspectos expandir a cidade e
reforçar os meios de comunicação entre Barcelona e pequenas aldeias próximas, e dar me-
lhores condições de vida às classes trabalhadoras, começando pela habitação. Cerdà defen-
dia que, independentemente das classes, existiriam alguns requisitos mínimos que deveriam
ser respeitados: um mínimo de espaço, divisões, ventilação, permitindo assim uma vida mais
salubre e mais confortável.

“Esta idea de ciudad higiénica y funcional deberia permitir –según Cerdà – una condi-

30 Idem; Ibidem; Pág. 65


31 Idem; Ibidem; Pág. 64
32 Idem; Ibidem; Pág. 64
33 CERDÀ, Ildefonso; Ensanche de la ciudad de Barcelona, Memoria descriptiva de los trabajos facultati-
vos e estudios estadísticos hechos de Orden del Gobierno, y consideraciones que se han tenido presentes en la
formación del Ante-Proyecto Para el Emplazamiento y distribución de Nuevo Casario; 1855; Pág. 58
32

Figura 20 - Vista da Île-de-la-Cité, Fotografia de Bisson, anterior às demolições de Haussman, 1855


33
ción de igualdad entre los residentes que la usan.” 34

Assim, este plano era dominado por uma forte descaracterização das diferentes classes so-
ciais. Ele previa alturas mínimas de pisos, para que as divisões fossem amplas e arejadas,
bem como dimensões também mínimas das ruas, que deveriam estar organizadas de for-
ma ortogonal, o cheio e vazio estariam perfeitamente proporcionados, de forma a tornar o
espaço da rua, que até aqui na cidade intramuros seria tão insalubre como as sobrelotadas
casas, num espaço percorrível e também saudável, prevendo que num quarteirão, apenas
50% do espaço fosse edificado. Quando a justaposição das casas fechasse o quarteirão o seu
espaço interior seria como uma extensão do edifício, servindo para o uso dos vários habitan-
tes. Ainda assim, segundo o Anteprojecto, as manzanas deveriam evitar ser fechadas, já que
um espaço encerrado é sempre menos ventilado do que um aberto, sendo por isso menos
salubre. Assim os quarteirões deviam ser preferencialmente abertos para que os seus jardins
tivessem uma boa ventilação, renovação do ar, e entrada de luz. Em 1859 o Plano Cerdà é
aprovado, e assim acaba por ser edificado o Eixample, que traduzido do catalão seria a Exten-
são da cidade. Esta área seria quase duas vezes o tamanho de intramuros, e acabou por ser
largamente habitada pela classe burguesa, apesar dos diversos estudos realizados por Cerdà
para a utilização destes quarteirões novos da cidade para habitação operária.
Neste plano, o urbanista terá fortes influências do projecto Haussmaniano realizado em Pa-
ris, no Segundo Império, onde a situação seria tão má ou pior que a de Barcelona, as cons-
tantes revoluções, lutas entre liberais e monarquistas, destruíam a capital, que continuou a
desenvolver-se e a crescer sem qualquer tipo de estruturas para tal.

1.3 PARIS
A habitação em Paris no início do século XIX teria apenas dois ou três andares com longas e
estreitas ruas. Terá sido no primeiro quartel do século que a cidade antiga terá atingido to-
dos os seus limites, os poucos espaços, pequenos pátios foram preenchidos por oficinas ou
verdadeiras colmeias humanas e, como noutras cidades, quando o espaço horizontal estava
já completamente lotado, a cidade cresceu verticalmente, rompendo com a até então a uni-
dade e beleza da cidade parisiense da idade média.35

” Paris compte 500 000 personnes en 1800. Un million en 1846, 2 millions en 1879 ; en
trois quarts de siecle, la capitale quadruple ainsi le nombre de ses habitants.”36

Os edifícios tinham frequentemente frentes estreitas, 6 metros, e profundos lotes. Geralmen-


te o rés-do-chão continha pequenas lojas, dormindo os seus donos nos quartos logo acima;
os restantes pisos seriam ocupados por diversas famílias, e as águas furtadas, originalmente
usadas para armazém, acabam por ser usadas também para habitação de baixo custo.
As habitações eram ocupadas pelos recém-chegados a Paris, que preenchiam todo e qual-

34 BUSQUETS, Joan; Bercelona, La construcción urbanística de una ciudad compacta; Ediciones del
Serbal, Barcelona; 2004 ; Pág.131
35 JORDAN, David; Transforming Paris; Transforming Paris: The Life and Labours of Baron Haussman; Pág.
95
36 NOIRIEL, Gérald ; Les Ouvriers dans la societé française, XIX- XX Siécle, Èditions du Seuil, 1986, Pág. 26
34

Figura 21 - Planta com as demolições île-de-la-Cité

Figura 22 - Demolições Île-de-la-Cité, LL. Viollet, s.d


35
quer espaço vago, ficando os edifícios cheios de cima a baixo. Entretanto a cidade estava
repleta de dormitórios, espaços geralmente reservados a trabalhadores sazonais e homens
solteiros, que em 1850 passaram, frequentemente, a ser ocupados por famílias inteiras de
forma permanente. O sistema de esgotos e valas de escoamento não era de todo suficiente,
e o abastecimento de água era escasso.
Quem tivesse mais posses tinha por ventura a sorte de conseguir uma casa que se virava para
um espaço interior, um jardim central, que lhe permitia ignorar todos os problemas que exis-
tiam na cidade. Paris seria uma cidade onde a burguesia era classe dominante e as habitações
dos trabalhadores acabam a cargo dos capitalistas, uma vez que o Estado era incapaz de ver
a questão social como um problema seu.

“ They considered the relationships between workers and bosses as between individu-
als, a moral question in which the state should not intervene.” 37

“ L’habitat lui-même est bâti selon des logiques privées dans un but de spéculation im-
mobilière, en l’absence de toute intervention de l’État’. ” 38

Paris seria composto até à reforma de Haussmann por doze bairros, que estariam então so-
brelotados. Os terrenos mais próximos, na periferia de Paris, começam a ser procurados por
pequenos investidores que compram pequenas porções de terra para a construção de habi-
tação, não por motivos sociais, mas antes, porque a procura significava lucro e, pretendiam
retomar todo o investimento feito de forma rápida e segura, rentabilizando os pequenos
lotes o máximo possível.

“ A Belleville par exemple, des petits bourgeols acquièrent d’étroites parcelles rurales
pour les lotir, cherchant à rentabiliser le plus possible l’espace disponible. Ils construisent
de petits logements, destinés aux ouvriers et aux artisans, dans des immeubles de piètre
qualité donnant sur de minuscules cours, souvent sans lumière.” 39

Assim como a generalidade das cidades industriais, Paris tinha todas as condições para o
desenvolvimento de doenças, e epidemias, como tal, foi palco de mais de uns milhares de
mortes no que foi o segundo surto de cólera entre 1826-1841.
Paralelamente, geravam-se na cidade constantes revoltas, que devido à pequena dimensão
das ruas não eram fáceis de controlar, já que a polícia não tinha rápido nem fácil acesso aos
locais onde estas se desencadeavam. O Imperador queria pôr fim a estas revoltas por uma
questão de segurança própria, contudo Haussman procurou ir mais além, resolvendo tam-
bém, com o seu plano, alguns problemas sociais da cidade.40
Napoleão III terá concluído que a “cidade sofria de um aneurisma do coração”, e estaria bem
no centro, o órgão decrépito, sem grandes artérias que lá chegassem.41 Assim, inspirado pelas

37 JORDAN, David; Transforming Paris; Transforming Paris: The Life and Labours of Baron Haussman; The
Free Press, New York, 1995; Pág.95
38 CLERVAL, Anne; Paris sans le peuple: La gentrification de la capitale ; Éditions La Découverte ; Paris ;
2013. Disponivél em <http://books.google.pt> Acesso a 9 de Jun. 2015
39 Idem; Ibidem;
40 CHOAY, Françoise; The Modern City: Planning in the Nineteenth Century; George Brazillei; New York;
1969; Pág. 15
41 JORDAN, David; Transforming Paris; Transforming Paris: The Life and Labours of Baron Haussman; The
Free Press, New York, 1995; Pág. 37
36

Figura 23 - Demolições para abertura da Avenida da Ópera, Fotografia de Coll Viollet, 1878

Figura 24 - Esquemas de demolições para abertura das Ruas em Paris


37
ideias do Plano dos Artistas (plano do final do século XVIII que se propunha modernizar a
estrutura urbana da cidade, traçando linhas rectas por locais estratégicos que uniriam diver-
sos pontos da cidade), bem como continuando algum trabalho iniciado no tempo de Conde
Rambuteau (antecessor de Haussman no cargo de Perfeito do Sena de 1833 a 1850), o plano
de Haussman procurou abrir novas e largas ruas, promovendo a sua exposição solar e ven-
tilação, bem como deixando vias bem largas de forma a descongestionar o trânsito da zona
central e melhorando a circulação na cidade. Para o mesmo fim, seria também criado no limi-
te periférico da cidade, um largo anel, como rede viária suplementar. O seu projecto traçou
verdadeiros eixos que procuravam ligar a cidade de norte a sul. A sua criação, contudo, só foi
possível através da demolição de bairros e quarteirões inteiros, acabando por agravar a situa-
ção da habitação das classes mais pobres. Seria contudo uma vantagem para os senhorios, já
que existia menos oferta para mais procura para habitação, subindo a renda do imóvel.
Uma das zonas mais degradadas e completamente sobrelotada seria a da Île-de-la-Cité: as
ruas estreitas e escuras, não deixavam espaço sequer para se sentir a monumentalidade da
Catedral de Notre Dame, que apenas se percebia à distância. No seguimento do projecto do
Segundo Império, centenas de edifícios foram demolidos, milhares de pessoas terão sido
expulsas das habitações precárias onde viviam, sem terem novas para onde ir. Isto terá sido
contudo o maior erro de Haussmann segundo Françoise Choay:

“ Haussmann’s most serious error was to destroy irrevocably the tightly woven and
diversified fabric of the Île-de-la-Cité, whose new blocks of giant buildings condemned
it to death.” 42

Em várias outras cidades grandes planos como este, cheios de demolições, terão surgido.
Apesar disso, tal plano terá vingado melhor em Paris, que teria a seu favor duas leis, a de
1840, sobre a expropriação, criada para facilitar a expansão dos caminhos-de-ferro, bem
como a lei sanitária de 1850 que previa a demolição das habitações consideradas insalubres,
e ainda o decreto do Senado de 1852,43 que permitia ao poder executivo deliberar sobre os
terrenos a serem expropriados. Este conjunto de leis e decreto facilitava a demolição, e con-
sequentemente, a realização do plano de Haussman.

“A nova cidade, por feia e incómoda que seja é aceite como modelo universal porque
não tem alternativas.”44

Segundo Leonardo Benévolo, esta cidade “sobrepõe-se à cidade mais antiga, e tende a des-
trui-la”45, o que sobrevive dessa cidade são os grandes edifícios que ficam de pé, preservados
quase como se de museus se tratassem, e usados como inspiração, como modelos para os
novos edifícios burgueses.
As largas ruas abertas teriam fachadas idênticas e baseadas nos elementos clássicos, linhas
horizontais, varandas geralmente contínuas de um edifício para o outro, dando assim a toda
a cidade uma regularidade e fluidez monumental. O interior destes seria normalmente or-
ganizado de uma forma quase hierárquica. No rés-do-chão, como sempre, ficaria a loja, no
piso seguinte existiria o mezanino. Onde os tectos não seriam muito altos e o espaço seria

42 CHOAY, Françoise; The Modern City: Planning in the Nineteenth Century; George Brazillei; New York;
1969; Pág. 19
43 BENEVOLO, Leonardo; A cidade na História da Europa; Editorial Presença; Lisboa; 1995; Pág. 189
44 BENEVOLO, Leonardo; História da Cidade; Edição Perspectiva; São Paulo; 1999; Pág. 589
45 BENEVOLO, Leonardo; A cidade na História da Europa; Editorial Presença; Lisboa; 1995; Pág. 197
38

Figura 26 - Gravura de Edmund Texier, 1852 Figura 27 - Fachada e Corte dos novos edifícios de Paris, 1855

Figura 28 - New Harmony, 1817, de Robert Owen, Gravura de 1825

Figura 29 - Falanestério de Charles Fourier, Gravura do Plano Geral de Granger


39
frequentemente ocupado por oficinas e escritórios. Acima do mezanino surgia “o piano nobi-
le”, o andar nobre e rico, com pés-direitos mais altos, o piso mais cobiçado. Quanto mais se
subisse, piores seriam as condições: o segundo e terceiro pisos teriam os pés-direitos mais
baixos, mais subdivisões do espaço, na fachada menos trabalhos na pedra; o quinto andar
não teria qualquer tipo de decoração; uma única e contínua varanda, nas águas furtadas, ini-
cialmente destinadas a classes mais baixas, acabou por, quase exclusivamente, ser ocupada
pelos serviçais dos pisos inferiores.46
O edifício é assim estruturado de forma extremamente racional, nos pisos inferiores e mais
nobres as paredes seriam por uma questão estrutural mais largas e fortes, consequentemen-
te teriam mais isolamento, à medida que os pisos iam subindo, encurtavam-se pés-direitos,
estreitavam-se paredes e poupava-se no material que mais uma vez por uma questão estru-
tural, seria mais leve e frequentemente de qualidade mais fraca.
A verdade é que apesar do plano urbanístico de Haussman salvar a cidade infectada e doente,
de fazer, de certa forma, renascer a grandiosa e boa imagem da cidade que se tinha vindo a
perder desde o final do século anterior, e de trazer grandes benefícios, (desde a formação de
novas redes de esgotos ao melhoramento do abastecimento de água, por toda a cidade) este
plano não resolve, nem procura resolver o grave problema da habitação do operário.
Esta questão que vinha a agudizar-se há algumas décadas, contava já nesta altura com alguns
estudos e algumas propostas de solução, o maior obstáculo seria a falta de investidores, já
que estas geralmente eram caracterizadas por grandes empreendimentos. Apesar disso, Na-
poleão III acreditava ser, através da habitação, possível acabar com a pobreza dos operários,
pelo que, terá em 1848 investido dinheiro próprio na Societé des Cités Ouvrières de Paris para
a construção de um edifício que seria o primeiro de vários do género em Paris. Este era fun-
damentalmente inspirado nos trabalhos de Robert Owen, e Charles Fourier, sendo o conjunto
chamado La Cité Napoélon,
Robert Owen, seria um industrial Inglês cujo projecto, desenvolvido entre 1817 e 1820 terá
procurado desligar-se da cidade tradicional, propõe a construção de complexos em terrenos
agrícolas de 500 hectares onde habitariam 1.200 pessoas. Os edifícios teriam forma quadran-
gular, distinando-se 3 dos lados a casas individuais para casais e os seus filhos pequenos e o
quarto lado seria dormitório dos jovens, e zona de enfermarias. No interior encontrar-se-iam
os serviços públicos, escolas, bibliotecas, cozinha com restaurante, áreas recreativas, geral-
mente espaços verdes com os campos desportivos.47
Charles Fourier, seria um forte crítico da sociedade industrial, procurando criar um complexo
e novo sistema que viria reorganizar a sociedade. Como resultado da sua ideologia, temos
Phalange, que procurava reformular a organização da vida em sociedade, o Phalanstére, par-
te habitacional do projecto, a habitação de 1.620 pessoas de diferentes posições sociais. O
complexo estaria incluído num terreno de perto de 250 hectares, seria uma edificação única
em forma de U, com vários pátios interiores: um central com maior área e outros pátios
menores; o piso térreo seria interrompido por passagens para os pátios; no primeiro piso
encontrar-se-iam as galerias, as substitutas das ruas que procuravam ligar todo o edifício; os
dois pisos seguintes, estariam destinados aos adultos, o mezanino aos jovens, e o último a
visitas. Pode-se então perceber que aqui as pessoas viveriam em comunidade e harmonia.
Este projecto nunca terá sido edificado, mas serviu de inspiração para vários outros, como o
Familistério de Guise, edificado por Jean Baptite Godin para os seus operários, com edifícios
46 BENEVOLO, Leonardo; História da Cidade; Edição Perspectiva; São Paulo; 1999; Pág. 597
47 BENEVOLO, Leonardo; História da Arquitectura Moderna; Edição Perspectiva; São Paulo; 2001; Pág. 73-76
40

Figura 30 - Vista do Interior do Familistério de Guise, Figura 31 - La Cité Napoleão, fotografia do pátio
Jean- Baptiste Godin coberto

Figura 32 - Perspectiva do Phalanstère de Charles Fourier

Figura 33 - Vista de uma cidade operária de Paris, 1870


41
mais simples, mas onde cada família tinha a sua própria habitação particular. Aquele era com-
posto por um edifício principal com 3 blocos de 4 andares, os seus pátios cobertos por um
telhado de vidro, que protegia as ruas interiores. Como no Falanstério, os diferentes serviços
estavam separados em diversos edifícios adjacentes e o complexo era ladeado pela enseada
de um rio. 48
La Cité Napoleon era composta por 4 blocos de quatro pisos, cerca de duzentas unidades ha-
bitacionais, com aproximadamente 27m2, que continham um ou dois quartos e uma cozinha.
Cada piso teria um ponto de água, lavandaria, quartos de banho e fogão comuns, bem como
um espaço para as crianças. 49

“Les locataires de ces Cités auront des logements sains, bien aéres et sourtout à prix
au-dessous de ceux qu’ils paient pour une seule chambre dans les maisons insalu-
bres.” 50

No interior, um pátio, que à semelhança do Familistério era coberto, protegendo assim as


ruas também interiores. Esta solução permitia iluminar os espaços de circulação comuns, e
permitia também a existência de “duas frentes” no pequeno alojamento, aumentando a pos-
sibilidade de ventilação do mesmo, o que é um factor bastante importante, já que uma das
maiores preocupações destes complexos era a questão da higiene, que está frequentemente
ligada a problemas de ventilação.
Os estudos realizados sobre La Cité ao fim de alguns anos, apresentaram resultados bastante
positivos.

“ Le médecin observa qu’il n‘y avait pas de vacances, pas de loyers impayés, pas d’epi-
démies lors même que le quartier étant atteint, que l’asile d’enfants était plein, que le
lavoir ne désemplissait pas. Quant aux logements, on les trouvait très bons, «spacieux»
même, eu égard aux standards de l’époque qui, rappelons-le, étaient d’une chambre
unique pour les familles ouvrières. ”  51

A sociedade capitalista não deixou contudo que esta vingasse. Rapidamente apareceram crí-
ticas aos modos de vida: a separação da criança, que ficaria no infantário, e da mãe, que sairia
para o trabalho, não terá sido vista com bons olhos, assim como os grandes agrupamentos de
trabalhadores, que poderiam tentar organizar-se, ter ideias revolucionárias que a sociedade
capitalista não teria interesse em deixar explorar.
A verdade é que por esta altura, em Inglaterra já se haviam formado vários grupos de operá-
rios que procuravam lutar pelos seus direitos, e começava a desenvolver-se a ideia de “Clas-
ses Laboreuses, Classes Dangereuses”52. A intenção seria passar a imagem de que todos os
que pertenciam às classes trabalhadoras seriam perigosos, criminosos, enfermos, imorais,
mas a verdade é que se procurava abafar o movimento operário que começava nesta altura a
despoletar um pouco por todas as zonas industriais.

48 Idem; Ibidem; 176-178


49 GRANGER, Catherine ; Lempereur et les arts: La Liste Civile de Napoléon III; École nationale des
chartes; 2005; Pág.87
50 DUMONT, Marie-Jeanne ; Le Logement social à Paris 1850-1930: les habitations à bon marché ; Pierre
Mardaga éditeur; Liège; 1991 ; Pág.9
51 Idem; Ibidem; Pág. 11
52 Obra de Louis Chevalier, em que o autor estuda e descreve as condições e acontecimentos do século
anterior na capital de França, o título descreve o pensamento que havia na época sobre as classes operaria.
42

Figura 34 - Schlossbrücke de Schinkel, em Berlim, 1866


43
Segundo Marie-Jeanne Dumont, apesar das críticas, alguns mais visionários, como seria o
caso do doutor Taillefer, médico de La Cité Napoleon, acreditavam que este tipo de habita-
ções promovidas pelo Estado seria o fim das revoltas.
Contudo o plano inicial Da Societé des Cités Ouvrières de Paris, de edificarem uma Cité deste
tipo em cada arrondissement de Paris, acabou por não se concretizar sendo a Cité Napoléon
a primeira e a única a ser construída em Paris, constituindo um dos primeiros conjuntos de
habitações sociais de Paris.
Por esta altura, grande parte das cidades industriais haviam já percebido os riscos que as con-
dições de vida dos operários representavam, não só para a própria classe, mas para todas. Os
diversos surtos de epidemias haviam provado que todos eram afectados, pelo que, a classe
burguesa foi obrigada a encarar o problema, que tantas vezes procurava esconder do lado de
lá das ruas.

1.4 BERLIM
As cidades com desenvolvimento industrial mais tardio, como foi o caso da cidade do Porto e
Berlim poderiam ter beneficiado com a observação do que acontecia nas cidades mais avan-
çadas, mas a verdade é que tal, normalmente, não se verificava.
O crescimento demográfico de Berlim terá começado na segunda década do século XIX, sen-
do no último quartel do mesmo século que este se terá tornado mais significativo, uma vez
que a sua população terá quintuplicado, atingindo mais de 2.5 milhões de habitantes no final
do século. A verdade seria que até aos últimos 20 anos do século XIX, Berlim era considerada
uma cidade provinciana, e desactualizada.53

“ Even in the early 1880’s, foreign visitors commented on how provincial and back-
wards Berlin was.” 54

Como consequência do rápido crescimento demográfico, em Berlim também se viveram pe-


ríodos de sobrelotação das casas, e da cidade. As primeiras medidas adoptadas para solucio-
nar este problema terão sido criadas não pelos urbanistas, que propunham melhoramentos
na cidade, mas antes pelos burgueses, que promoveram a segregação das classes, destinan-
do diferentes quarteirões às diversas classes, à semelhança de tantas outras cidades já men-
cionadas, como o caso de Whitechappel, em Londres.
Apesar dos estudos feitos desde o início do século XIX para a expansão da cidade, como terá
sido o caso das alterações na cidade por Schinkel cuja acção mais significativa para o desen-
volvimento da mesma terá sido a edificação da Schloßbrücke, em 1821, permitindo a articula-
ção do lado Oeste com a zona medieval da cidade. Dando a Berlim um carácter mais unitário,
Schinkel terá acabado por ser o protagonista da edificação dos equipamentos e estruturas
que a cidade em crescimento necessitava. 55

53 BODENSCHATZ, Harald; Berlin Urban Design, A Brief History of a European City; DOM Publishers;
Berlin; 2013; Pág.
54 HESSLER, Martina; Berlins Culture of Change around 1900; in Urban Modernity: Cultural Innovation in
the Second Industrial Revolution; The MIT Press; Massachusetts; 2010; Pág. 170
55 Senate Department for Urban Development and Environment www.stadtentwicklung.berlin.de/
44
O primeiro plano de expansão extra-muros que não terá passado do papel, terá surgido por
volta 1830, e exprimiu a grande vontade que Berlim tinha de se tornar uma grande cidade
industrial.
Foi, no entanto, apenas em 1862 que terá sido criado o plano com maior relevância para
a cidade de Berlim, o Plano Hobrecht, que procurava equilibrar a segregação das classes.
Hobrecht no seu plano defendia a criação de blocos, em que todas as classes convivessem,
promovendo assim de certa forma uma proximidade entre as diferentes classes e, conse-
quentemente, troca de conhecimentos.

“From all that which will come out as comfortable relations between so differently so-
cialized people it allows the giver to ennoble himself on the situation. In between the
extremes of the social classes the poor from the second to fourth story will be nurtured
by the cultural life of the civil servants, artists, professors and teachers. This will come
out as beneficial to the society even when it would only be that the latter would have a
daily silent example in their sight of those which were mixed among them. ”

Este plano terá surgido pouco tempo depois dos já falados planos de Paris e Barcelona, e terá
sido influenciado pelos mesmos, à semelhança do Plano Cerdà, o Plano Hobrecht, seria um
plano de expansão da cidade e não de reconstrução urbana como o Plano de Haussman. Ape-
sar de ser um plano de expansão o plano de Berlim não se baseava num esquema geográfico,
este seguia a forma de anel. 56
O plano seria bastante esquemático, procurava dividir a cidade em largas parcelas de terreno
que podiam ser quase inteiramente construídas, o plano teria contudo pontos orientado-
res que deveriam ser seguidos e tidos em conta. Algumas destas indicações seriam que os
edifícios não deveriam ter mais de 20 metros de altura e teriam um máximo de seis pisos e
uma cave destinada à arrumação. Todas as habitações deveriam ter, pela frente ou por uma
travessa nas traseiras, um acesso, com pelo menos 5.35 metros, de forma a permitir que bri-
gadas de incêndio pudessem entrar. 57
A fachada principal seria geralmente contínua e reservada para habitações mais nobres, à
semelhança do que acontecia nos Courts no Reino Unido, e no interior encontravam-se as
habitações mais económicas.
O plano fez de Berlim o maior Mietskasernenstad, maior cidade de aluguer barracas/ caser-
nas. Com este plano, Hobrecht pretendia que a cidade pudesse ser habitada por até 1 milhão
de habitantes.
Um outro factor muito importante do plano, era o facto deste procurar também criar um
novo sistema de esgotos, de forma a que a cidade se tornasse mais limpa e saudável. O
sistema aplicado por Hobrecht viria a ser muito conhecido e copiado por diversas cidades
Europeias. As ideias base viriam dos planos de Paris e Londres. Assim, após o estudo cuidado
dos sistemas de esgotos doutras grandes cidades europeias, Hobrecht criou o seu próprio sis-
tema, estudando cuidadosamente a topografia da cidade, dividiu-a em 13 distritos, existindo
em cada um deles uma estação de bombagem, onde os esgotos desaguavam e de onde eram
bombeados para terrenos agrícolas que se encontravam nos arredores da cidade.
O plano procurava assentar na ideia de Saúde Pública, que hoje pode parecer uma ideia bas-

56 BODENSCHATZ, Harald; Berlin Urban Design, A Brief History of a European City; DOM Publishers; Ber-
lin; 2013, Pág.35-36
57 BODENSCHATZ, Harald; Berlin Urban Design, A Brief History of a European City; DOM Publishers; Ber-
lin; 2013 Pág. 36
45
tante óbvia, mas na altura estaria ainda apenas em desenvolvimento. Hobrecht procurou re-
solver com o seu plano dois grandes problemas da cidade e sociedade: por um lado procurou
acabar com os problemas sociais da cidade em crescimento, dos quais o primeiro aspecto a
chamar atenção seria a falta de habitação, por outro lado procurou resolvê-lo de maneira a
que a cidade se tornasse saudável. Terá sido um plano inovador por incluir no plano urbano o
sistema de esgotos, considerando que um não pode evoluir sem o outro.58
É pertinente perceber que todo este processo foi demorado, e foi longamente estudado, já
que estiveram vários interesses políticos e burgueses em causa. Proprietários não tinham
interesse em pagar as contas que viriam do novo sistema de esgotos, e os donos de terrenos
não queriam perder o acesso fácil ao fertilizante. Rodulf Virchow, interessado na medicina
social59 e político influente, acreditava que as decisões não deviam ser tomadas de acordo em
interesses políticos, mas antes em estudos cientificamente provados e conseguiu que a câ-
mara aprovasse o plano Hobrecht.60 Esta posição é notável, por colocar de lado os interesses
políticos, em favor dos interesses sociais, numa Europa que ainda maioritariamente respon-
dia apenas a interesses burgueses, em detrimento de um bem comum e viria a influenciar o
pensamento da sociedade Berlinense num curto espaço de tempo.

“Within a very short time period, Berlin became an essentially modern city, in which
science and technology would play a pivotal role in the economy, in politics, in creating
urban infrastructures, and in everyday life.” 61

No final do século, Berlim seria por excelência a cidade das ciências e tecnologias e, como tal,
seria uma cidade nova. Da antiga poucos sinais existiriam. Largas ruas haviam sido abertas,
destruindo as pequenas e tortuosas ruas medievais, bairros inteiros demolidos e reconstrui-
dos de formas modernas, usando novos materiais.62
Voltando a atenção para a questão da habitação, apesar das ideias de Hobrecht terem pre-
missas interessantes e correctas do ponto de vista teórico-social, do ponto de vista formal
não terá resolvido o problema da habitação da classe trabalhadora, uma vez que a alta den-
sidade com que estas eram construídas não permitia a boa ventilação dos espaços mais pe-
quenos e pobres.
Este plano foi durante as décadas seguintes objecto constante de críticas já que seria o res-
ponsável pelos pátios exíguos e pela densidade excessiva de edifícios e habitantes, vindo a
cidade a senti-la nos períodos que se seguiram e que se reflectiam nas más condições de
higiene da população. 63
Isto terá levado a população a fugir para a periferia próxima cuja distância havia sido encur-
tada devido às recentes linhas férreas, surgindo assim as primeiras Kolonien de Berlim, geral-
mente ocupadas por classes mais altas.
58 HESSLER, Martina; Berlins Culture of Change around 1900; in Urban Modernity: Cultural Innovation in
the Second Industrial Revolution; The MIT Press; Massachusetts; 2010; Pág. 176-177
59 Medicina social seria a ciência que estuda o impacto que condições sociais e económicas para a saúde,
e procura criar novas condições que tornem a sociedade mais saudável.
60 HESSLER, Martina; Berlins Culture of Change around 1900; in Urban Modernity: Cultural Innovation in
the Second Industrial Revolution; The MIT Press; Massachusetts; 2010; Pág.178
61 HESSLER, Martina; Berlins Culture of Change around 1900; in Urban Modernity: Cultural Innovation in
the Second Industrial Revolution; The MIT Press; Massachusetts; 2010; Pág. 168
62 Idem; Ibidem; Pág. 180
63 BODENSCHATZ, Harald; Berlin Urban Design, A Brief History of a European City; DOM Publishers; Ber-
lin; 2013, Pág. 35-36
46

Figura 35 - Planta de um Quarteirão Figura 36 - Aproximação a Grundriß Otawistraße 38

Figura 37 - Mietskaserne, em 1910 Figura 38 - Interior de uma casa em Elendsquartier, 1910

Figura 39 - Mapa de Berlim, de, W.B. Clarke, 1833


47
Uma vez que na transição do século, Berlim era considerada por excelência, a cidade da tec-
nologia e ciência, criam-se e estudam-se novas formas de construção, que procuravam re-
solver os problemas das insalubres Mietskasernen de Hobretch, e se desenvolveram de duas
maneiras: por um lado a migração da população para a periferia continua a aumentar, por
outro reformula-se a cidade de acordo com as suas novas necessidades.
Na procura de uma nova forma de construir, que traduzisse o modernismo alemão, nasce
a Deutscher Werkbund, associação composta por arquitectos, designers e industriais. Estes
procuravam conciliar de forma equilibrada a indústria e a arte, tentando recuperar a essência
das coisas, que se havia perdido neste novo mundo de indústrias e descobertas tecnológicas.
Estas deveriam ser aproveitadas para melhorar a condição de vida sem perder o bom gosto,
e se por um lado a associação procurava utilizar a indústria e sua estandardização, por outro
procurava também que estes mesmos produtos da indústria tivessem a sua própria indivi-
dualidade artística.
Este movimento, que no fundo procurava uma nova linguagem arquitectónica, tinha como
protagonistas alguns dos arquitectos mais significativos deste século, como é o caso de Mies
Van der Rohe, Walter Gropius, e Peter Behrens.
Em pouco tempo Berlim havia deixado para trás o seu carácter provinciano e passara a ser
conhecida pela grande metrópole que ainda hoje conhecemos como Greater Berlin.
A cidade desenvolvia-se de forma compacta, estrangulava o centro pré-industrial e permitiu
que se formasse o Wilhelmine Ring; nas áreas suburbanas surgiam novas zonas residenciais
da alta-burguesia em localizações favoráveis; e novas indústrias erguiam-se em algumas zo-
nas menos apetecíveis, geralmente acompanhadas da zona residencial de trabalhadores que
serviriam essas indústrias.64 Assim, contra todos os planos de Hobrecht, a cidade de Berlim
acabou por se segregar, e as diferenças das classes eram bem sentidas.
Alonguemo-nos um pouco mais com a história de Berlim por ser extremamente pertinente,
já que terá sido nesta metrópole que terão surgido as primeiras habitações sociais que viriam
influenciar a história da Habitação Operária da Europa em geral, de Portugal e do Porto, de
forma revolucionária.
Será então no final da primeira década do século XX que se perceberá em Berlim o caos
instalado na metrópole. Procurando antecipar o futuro, surge o concurso de ideias para a
Groß-Berlin, Grande Berlim, coordenado por Werner Hegemann, que propunha um projecto
a 100 anos para uma Berlim com até 10.000.000 de Habitantes. 65

“the overcoming of technical and economic aspects must not be separated in terms of
time form artistic aspects, both have to be tackled at the same time.”

A ideia seria de que apenas um projecto bem estruturado multidisciplinarmente poderia re-
solver os problemas das grandes cidades. Os resultados da Wettbewerb Groß-Berlin exposto
em 1910, favoreceram as propostas mais práticas, complementadas por informações mais
técnicas, em detrimento das teóricas.
Uma das propostas com mais impacto visual, a de Bruno Schimtz, ficou em apenas quarto
lugar, apesar de ter sido a que mais impacto teve num “futuro Berlim”, já que algumas ideias
suas vão reflectir-se nas propostas de Albert Speer em 1937.66 Esta proposta de Schimtz,

64 Idem; Ibidem; Pág. 29-30


65 VIEIRA, Eduardo; Berlim, Politicas Urbanas e Identidade; Dissertação de Mestrado, FAUP; 2010; Pág.35-36
66 WHYTE, Boyd; FRISB, David; Metropolis Berlin: 1880-1940; University of California Press; 2012; Pág.
48

Figura 40 - Proposta Vencedora de Herman Jensen para o concurso Groß-Berlin, em 1910

Figura 41 - Proposta de Bruno Schimtz, Groß-Berlin 1910 Figura 42 - Joseph Brix, para Groß-Berlin, 1910

Figura 43 - Perspectiva Aérea da proposta de Bruno Schimtz, para Groß-Berlin 1910


49
Blum, Havestat & Contag procura “moldar alguns aspectos da moderna metrópole numa for-
ma convincente”.
A proposta vencedora terá sido a de Herman Jansen, tendo mais tarde ficado conhecida como
Jansen Plan. Na sua proposta para Berlim, presta especial atenção à rede de transportes que
procurava ligar zonas periféricas com o centro, de forma a encurtar distâncias, de maneira a
dar a possibilidade de rápido acesso para os que viviam mais longe, tornando dessa forma
estas zonas de expansão mais apetecíveis. Nestas áreas as classes operárias teriam acessos
e casas com melhores condições, e preços mais baratos. Com isto, Jansen procurava iniciar
um processo de deslocação das massas do centro para a periferia. Tornou as parcelas do seu
quarteirão mais pequenas, de forma a evitar a criação de espaços interiores diminutos.67 Ber-
lim estaria organizada em torno de um pequeno anel interior, e um outro anel maior externo,
com espaços verdes ligados entre si por outros corredores radiais, onde a natureza predomi-
naria. É fácil perceber que a proposta de Jansen tem influências dos planos da Cidade Jardim,
quer de Ebenezer Howard quer de Theodor Fritsch.
Este modelo da cidade-jardim surge com Howard, e é publicado no ano de 1898 com o nome
de: “To-morrow: A Peaceful Path to Real Reform”, sendo mais tarde re-editado sob o nome
de “Garden Cities of To-morrow”, é fortemente influenciado pelos esquemas de Henry Owen
e Charles Fourier, e é o modelo racional da cidade, mais espaçoso, mais verde, mais saudável.
Para isso Howard propunha levar a cidade caótica e sobrelotada para o amplo e quase vazio
espaço rural, estudando, para conseguir tal coisa, o que levou as pessoas a mudar do campo
para a cidade.

“ What-ever may have been the causes which have operated in the past, and are op-
erating now, to draw the people into the cities, those causes may all be summed up as
‘atractions’,and it is obvious, therefore, that no remedy can possibly be effective which
will not present to the people, or at least to considerable portions of them, greater ‘at-
tractions’ than our cities now possess, so that the force of the old ‘attractions’ shall be
overcome by the force of new ‘attractions’ which are created.” 68

Assim se a cidade fosse um iman gigante, as pessoas seriam as agulhas atraídas pelo mesmo,
o que Howard tenta criar na sua proposta é um equilíbrio entre 3 imans que seriam Cidade,
Campo e Cidade Campo. O resultado seria uma Cidade Jardim, com um número máximo de
50,000 habitantes, esta estaria em perfeita harmonia, seria organizada com sistema radial de
circulação com largas vias, que se justapunham a largos cinturões verdes. Estas seriam auto-
-suficientes e quando atingissem o seu limite uma nova cidade jardim satélite seria criada,
ficando ligada à cidade original por diversos meios de transporte e assim continuaria a expan-
são da Cidade Jardim. A infra-estrutura de cada cidade permitiria que a população a vivesse
com os benefícios e a pureza do campo, dando a quem vive no campo outras oportunidades
para além de trabalhar na agricultura.
Este projecto utópico, influenciou fortemente a forma de pensar a cidade, foi posto em prá-
tica e evoluiu ao longo do século XX. Apesar de uma forma geral, a ideia quando posta em
prática ter sido um sucesso, surge o problema que já existiria no século anterior, falta de
investimento por parte dos empreendedores, e os seus resultados não chamaram suficiente-

49-51
67 BODENSCHATZ, Harald; Berlin Urban Design, A Brief History of a European City; DOM Publishers; Ber-
lin; 2013, Pág. 50
68 HOWARD, Ebenezer; Garden Cities of To-morow; Faber Editions; 1970; Pág.41-49
50

Figura 44 - Capa do Livro “Garden Cities of To- Figura 45 - Diagrama da expansão das cidades jardins,
morrow de Ebenezer Howard, 1902 de Ebenezer Howard, 1902

Figura 46 - Os 3 imans, de Ebenezer Howard, Figura 47 - Esquema de Organização de uma Cidade


1902 -Jardim, de Ebenezer Howard, 1902

Figura 48 - Diferentes níveis de expansão da Cidade do Futuro de Theodor Fischer


51
mente a atenção do governo inglês para que nele investisse também.
Theodor Fischer teria dois anos antes (1896) lançado a ideia de cidade-jardim, com o seu li-
vro: Die Stadt der Zukunft – Gartenstad, A Cidade do Futuro – Cidade Jardim, resumidamente
a grande diferença seria que Fischer propunha uma integração da cidade já existente e a sua
expansão, esta seria organizada por diferentes faixas radiais que representavam diferentes
zonas.
Apesar de Fischer ser contemporaneo de Jansen, não se poderá ter a certeza de qual das
Cidades Jardim terá influenciado mais Jansen, uma vez que a proposta de Fischer só se terá
tornado notória na Alemanha depois da de Howard, como o próprio indica no prefácio da
segunda edição do seu livro.69
Apesar do projecto para a Groß-Berlin ter começado a ser desenvolvido, a Primeira Grande
Guerra tornou impossível que este avançasse, em parte consequência do tratado de Versai-
lhes que apontava a Alemanha como a causadora da guerra e como tal teria a responsabi-
lidade de indemnizar as nações pelos prejuízos causados, gerando uma enorme estagnação
na economia do país. A falta de poder económico, aliada à campanha que havia sido feita
contra as Mietskasernen, que haviam sido completamente desacreditadas e expostas pelos
malefícios causados à população, levou à procura de terrenos na zona periférica, não só pelos
preços baixos dos terrenos mas também pela procura da agricultura de subsistência.70
A habitação continuaria então a ser a falha da cidade de Berlim que precisaria de 100.000
fogos os quais devido ao estado da economia ninguém tentava sequer edificar, sendo neces-
sária a intervenção do poder estatal.

“In the short period between the end of the First World War and Hitler’s rise to power,
an internationally recognised solution to the problems of the tenement-housing city
was built: a series of well-planned suburban social housing estates”71

Nestes agrupamentos de habitações sociais, os princípios da Deutscher Werkbund tiveram


um papel fundamental na idealização dos grandes complexos que viriam caracterizar o mo-
vimento das Neues Bauen, as Novas Construções, de certa forma inspiradas nas primeiras
Kolonien que tinham surgido na década anterior, nasceram as Siedlugen.72

“Il tentativo di riprendere la residenza come fattore determinante, come fatto urbano
tipico nella forma della città, viene ripreso nella costruzione delle Siedlungen operaie
negli anni seguenti la prima guerra mondiale.”73

As Siedlungen viriam revolucionar a estrutura residencial, e tornaram-se num dos trabalhos


mais salientes da Neues Bauen, acabando por representar não só um marco na história da
cidade de Berlim mas também da Arquitectura Moderna. De certa maneira esta nova forma
de habitar seria reflexo directo dos aspectos negativos das habitações anteriores dos seus re-

69 FISCHER, Theodor; Die Stadt der Zukunft – Gartenstad; Leipzi; 1912; http://www.cloud-cuckoo.net/
openarchive/Autoren/FritschT/Fritsch1912.htm
70 WHYTE, Boyd; FRISB, David; Metropolis Berlin: 1880-1940; University of California Press; 2012; Pág.49-
51
71 BODENSCHATZ, Harald; Berlin Urban Design, A Brief History of a European City; DOM Publishers; Ber-
lin; 2013, Pág.
72 Idem; Ibidem; Pág. 57
73 ROSSI, Aldo; L’architettura della Città; CittàStudi Edizioni; Torino; 2006; Pág. 85
52

Figura 49 - Hufeisensiedlung, Bruno Taut, 1925-1930 Figura 50 - Großsiedlung Onkel-Toms-Hütte, de Bruno


Taut, Hugo Härig, Otto Rudolf de 1926-32

Figura 51 - Cartaz da Exposição Die Wohnung, em Stuttgart 1927


53
sidentes.74 Arquitectos como J.J.P. Oud, Ernst May e Bruno Taut, terão, segundo José António
Bandeirinha:

“…dado corpo a uma nova forma de pensar a cidade e a habitação operária enquanto
expressão de uma regra, enquanto manifesto de uma incómoda contradição polariza-
da pela realidade em decomposição e pelo alcance palpável, embora fragmentário, de
focos de racionalidade “infiltrados” no modo de produção capitalista.”75

As Siedlungen dos Racionalistas, segundo Aldo Rossi, caracterizam-se por serem estruturas
independentes entre si e da rua, perdendo-se a noção tradicional de quarteirão. A sua forma
requer uma divisão totalmente livre do solo, dando grande importância à orientação solar
e áreas verdes, permitindo que os edifícios respirassem em vez de se sobreporem uns aos
outros como acontecia no desenvolvimento urbano típico do século XIX.76
Influenciados também pelos princípios do movimento Arbeitsrat für Kunst, iniciado no fim da
grande guerra, que no seu manifesto afirmava que “a arte e o povo devem formar uma enti-
dade. A arte não será mais um luxo para poucos, será desfrutada e vivenciada pelas grandes
multidões. O objectivo é a aliança das artes sob a égide de uma grande arquitectura”77, mos-
trando uma grande vontade de que a habitação e a boa arquitectura chegassem a todos. Os
princípios deste movimento anteciparam a teoria que viria a reflectir-se na Bauhaus, poucos
anos mais tarde.
Terá sido no contexto do Pós Primeira Guerra, que Martin Wagner fundou o GEHAG, Coopera-
tiva de habitação de Berlin, em 1924, do qual Bruno Taut é nomeado arquitecto chefe. Martin
Wagner, fortemente influenciado pelo Fordismo e Taylorismo, considerava a construção das
Siedlung impossível de conseguir se por trás não existisse todo um processo de racionaliza-
ção.

“ El oficio de la construcción es una labor de montaje. Lo que Ford logro en la industria


del automóvil también es posible en la construcción de la vivienda.”78

Wagner procurou criar uma forma de construir em série, aplicando assim a lógica industrial
na construção, de forma a reduzir o custo da obra, que consequentemente baixaria as ren-
das, e libertaria o centro. Uma das grandes preocupações de Taut era evitar que a pré-fabri-
cação das peças desse à obra um carácter demasiado estático. Estes complexos, como já foi
mencionado, serviriam de exemplo e base para o desenvolvimento da teoria da arquitectura
moderna, o uso da cor serviria por vezes para evitar a monotonia do bairro.
Dois dos exemplos mais conhecidos desta nova forma de construir são a Hufeisensiedlung,
de 1925, e a Onkel Toms Hütte, de 1926. Estas serviram a Taut e Wagner como meio de expe-
rimentação, uma forma de aplicar uma nova e económica técnica de construção. O GEHAG
terá sido responsável pela edificação de milhares de habitações, sendo o maior responsável
por grande parte das edificações durante a república de Wiemar.

74 HUE, Nobert; in WITTENVERG, Stella; Cuatro Siedlugen Berlinesas en La Republica de Weimar: Britz,
Onkel Toms Hütte, Siemensstadt, Weisse Stadt; Pág. 9
75 BANDEIRINHA, José António; O processo SAAL e a arquitectura no 25 de Abril de 1974 - Coimbra : Im-
prensa da Universidade; 2007; Pág. 249
76 ROSSI, Aldo; L’architettura della Città; CittàStudi Edizioni; Torino; 2006; Pág. 92
77 FRAMPTON,Keneth; História Crítica da Arquitectura Moderna; Martins Fontes; 2000; Pág. 141
78 HUE, Nobert; in WITTENVERG, Stella; Cuatro Siedlugen Berlinesas en La Republica de Weimar: Britz,
Onkel Toms Hütte, Siemensstadt, Weisse Stadt; Pág. 9
54
Aquando da exposição da Deutscher Werkbund em 1927, Die Wohnung, o Apartamento, pro-
curava ilustrar os desenvolvimentos da arquitectura e construção, na habitação, 17 arquitec-
tos apresentaram as suas propostas de arquitectura acessível, sendo que a de Taut terá sido
a mais despojada, e económica. Taut acabaria então a ser, por excelência, o Arquitecto do
Proletariado.
Um ano mais tarde fundou-se o CIAM onde a temática da habitação foi vastamente estudada
e explorada a ideia de Habitação Mínima para a existência.
Será na busca de construções económicas e salubres que os arquitectos procuram perceber
quais seriam as condições de existência mínima do Homem, a célula, questão que será deba-
tida nas décadas que se seguiram, nos Congressos Internacionais da Arquitectura Moderna,
os CIAM, e mais tarde pelo Team X continuando por grande parte do século.
Apesar dos esforços, as rendas para as habitações continuam a ser demasiado elevadas para
as classes trabalhadoras, pelo que terão sido ocupadas por uma classe média baixa. Harald
Bodenschatz refere que este modelo terá sido espalhado por toda a Europa, como modelo
de habitação social suburbano por ter uma qualidade mais elevada do que a generalidade
dos projectos de habitação social do Pós-Segunda Guerra Mundial. O GEHAG marca contudo
o interesse do Estado em resolver o problema da Habitação das classes menos abastadas.79

79 BODENSCHATZ, Harald; Berlin Urban Design, A Brief History of a European City; DOM Publishers; Ber-
lin; 2013, Pág. 57
Figura 52 - Largo do Limoeiro - Pátio do Carrasco, Armando Serôdo, 1968
57

2.O CASO PORTUGUÊS


Foquemo-nos um pouco no panorama geral da habitação do operário e das classes traba-
lhadoras de Portugal, onde encontramos como modelos mais notórios: os Pátios e Vilas em
Lisboa e as Ilhas do Porto. Ambos proliferaram como consequência da integração da indústria
no sistema económico do país, existindo contudo outros casos que, apesar do seu desen-
volvimento não ter sido tão evidente como o dos acima mencionados, serviram também de
abrigo às classes trabalhadoras, como seriam exemplo os casebres dos pescadores de Ovar
e Aveiro, por vezes de alvenaria, outras edificadas totalmente em madeira, que davam pelo
nome de Palheiros.80
Em 1890 é realizado o Inquérito Industrial, onde se procura fazer um estudo sobre as condi-
ções habitacionais dos menos abastados do país e se comparam as diferenças entre as habi-
tações do Norte e do Sul do país:

…«de um modo geral pode-se dizer que no litoral do Algarve a habitação do traba-
lhador, se não é confortavel, é todavia salubre. O uso de a pequeno trecho caiarem as
casas não pode deixar de ter uma boa influencia na hygiene da habitação. A este uso,
porém, que imprime um aspecto agradavel à casa lança uma nota alegre na paisagem,
não correspondendo ao cuidado asseio especial. A habitação nos districtos do norte é
mais caracteristica, especialmente nos de Viseu e Villa Real. Aqui ao contrário do que
sucede no Algarve, falta a cal e abunda a madeira...»81

Torna-se assim fácil de perceber que as madeiras do Norte rapidamente apodrecem, com
as águas das chuvas e a falta de tratamento, a falta de luz solar tornaria os espaços húmidos
quase inabitáveis. No Sul, pelo contrário, a escassez de aberturas permitia espaços frescos no
Verão e a alvenaria permitia espaços secos no Inverno.
No relatório de 1905 sobre as habitações operárias, António de Azevedo, higienista portu-
guês, chega a afirmar que “povoações existem que em nada deixam a desejar a muitas al-
deias da mais selvagem Africa”82, situação que se reflecte também em Lisboa e no Porto.
Quando se deu em Portugal o segundo momento de desenvolvimento industrial (o momento
de maior impacto na sociedade do país), em meados do século XIX, alguns dos países já se
encontravam num momento de reflexão sobre as condições das habitações da classe ope-
rária. (No caso do Reino Unido existiria já o Sanitary Report, que terá levado a criação do
Public Health Act em 184883. Esta preocupação terá rapidamente surgido também noutros
países como por exemplo em Franca, que evoluiu e se manifestou nas reformas higienistas
como a de Haussman em Paris). Contudo as ideias habitacionais que se importaram, a par da
industrialização tardia, terão sido desactualizadas, e frequentemente idênticas às de alguns
dos exemplos já enunciados no capítulo anterior.
Em Portugal, a habitação do operário manteve quase sempre um carácter rural, como se ve-
80 AZEVEDO, António; Habitações Operárias em Portugal: Relatório; Coimbra; Impressão da Universidade;
1905; Pág.2
81 Idem; Ibidem; Pág. 2
82 Idem; Ibidem; Pág.3
83 Public Health Act em 1848, este procurava conceder melhores condições sanitarias aos habitantes das
cidades mais populosas, através de um melhor fornecimento de agua, um melhoramentos da redes de esgos-
tos, para o qual terá sido criada uma regulamentação e um serviço que procurava impor a prática dessas novas
permissas, que consideradas essenciais para a sobrevivencia da populaçao das grands cidades.
58
rifica principalmente nos espaços comuns da Ilhas portuenses e dos Pátios lisboetas84, onde
proliferam casas térreas, unifamiliares, com um espaço comum exterior.
Em Lisboa, até meados do século XIX, a população mantinha-se mais ou menos estável, sen-
do aproximadamente de 170 mil habitantes, contudo terá sofrido um enorme crescimento
desde então até ao final do século, quando a cidade passaria a ter aproximadamente 350 mil
habitantes.85 À semelhança de outras metrópoles europeias, como Londres, París e Barcelo-
na, a falta de infra-estruturas levou inicialmente a uma sobre ocupação das zonas antigas da
cidade, que passavam a ser habitadas quase exclusivamente por classes menos abastadas.
Alfama terá sido uma das zonas mais afectada, sendo a mais habitada da cidade:

… «Quem se aventura pelo labyrinto de suas travessas, muitas d’ellas com pouco mais
e 2 metros de largura, arrisca-se a ficar perdido. Na maior parte d’essas travessas de
becos, o sol parece até que tem medo de entrar. É que os prédios, que se erguem de um
e outro lado, pretendem ir até elle - tão altos são!

Se entrâmos é bem pouco edificante o espectáculo, são dois, são três compartimentos
ao todo, e o menage é constituído por 6 e 7 pessoas! Que desalinho, que falta de ordem
e de asseio em toda a casa! Irmãos de ambos os sexos, o pai, a mãe dormem n’um só
quarto»... 86

Vendo a sobrelotação das zonas antigas da cidade, alguns senhorios tratam de construir e
alugar casas, de fraca qualidade, construídas nas traseiras de edifícios. Estas preenchem an-
tigos terrenos rurais que se situavam na proximidade de novas indústrias, estavam, por isso,
nos interiores de antigos palácios e conventos de ordens extintas, que se encontravam aban-
donados e passavam também a ser alugados quarto a quarto. A todo este tipo de intervenção
se chama Pátio, que assume as mais variadas formas, já que aproveita os espaços residuais já
existentes. 87 Encontram-se, Pátios com casas de um só piso, cercados de edifícios com vários
pisos, com pouca exposição e ventilação, ou ruínas de antigas casas senhoriais levemente
recuperadas, à semelhança das Mietskasernen de Hobretch caracterizadas por uma intensa
ocupação do solo. Têm os mais variados acessos, podendo estar dissimulados numa fachada
da rua, ou nas traseiras de um quarteirão.

«Geralmente recintos muito irregulares, nos quais se amontoam os diferentes morado-


res, em pequenas habitações de construção defeituosa e com uma capacidade muito li-
mitada, húmidas por se encostarem aos terrenos e por ter mezzaninos subterrâneos»88

Ainda que normalmente estes aproveitem edificados rurais e espaços residuais já pré-exis-
tentes, encontram-se alguns construídos de raiz, sendo geralmente confundidos com Vilas.
Estas (as Vilas) surgem apenas no final do século, já como consequência do Inquérito Indus-
trial, que terá ilustrado as péssimas condições em que viviam as classes trabalhadoras do

84 PEREIRA, Nuno Teotónio; Pátios e Vilas de Lisboa: a promoção privado do alojamento operário; in
Análise Social, vol. XXIX (127), 1994 (3º); Página 511
85 RODRIGUES, Teresa; Nascer e Morrer na Lisboa Oitocentista; Edições Cosmo; Lisboa; 1995; Pág. 48
86 SANTA-RITA; Guilherme; Habitações do Operário e Classes Menos Abastadas: Questões Sociais/Zé
Ninguém; Lisboa; Tip. Da Gazeta de Portugal; 1891; Página 78
87 PEREIRA, Nuno Teotónio; Pátios e Vilas de Lisboa: a promoção privado do alojamento operário; in
Análise Social, vol. XXIX (127), 1994 (3º); Página 511
88 PRADO, Ângelo de Sárrea; Ruiz, António J. Mimoso; Inquérito ao Pátios de Lisboa (1902); Lisboa; 1903;
Página 5
59
país, inquérito este iniciado no ano de 1881, promovido pelo governo de Fontes Pereira de
Melo. Este inquérito surge como um primeiro momento de reflexão sobre as habitações pre-
cárias em Portugal, e reflexo de uma crescente preocupação higienista em Portugal. 89
As Vilas, ao contrário do que acontece com os Pátios, são de forma geral construções de raiz,
edificadas já com o propósito de servirem a população das indústrias. As primeiras Vilas a
serem edificadas procuravam seguir um modelo adequado à vida familiar e salubre. Como
grande parte da habitação em Portugal, eram empreendimentos de iniciativas privadas. Al-
guns dos investidores procuraram então dar melhores condições à classe trabalhadora de
Lisboa. Rapidamente estes modelos adequados sofreram diminuição dos espaços, acabando
por perder os padrões originais, transformando as Vilas em parcos locais tão pouco saudáveis
como os Pátios.
As Vilas em Lisboa estão normalmente associadas às indústrias, encontram-se assim em zo-
nas fabris. A sua edificação está muitas vezes relacionada com o desejo do dono da indústria
em promover habitação para os seus operários, estando por isso associadas às novas zonas
de expansão da cidade oitocentista, onde as indústrias teriam melhores condições para se
instalar. Estas encontravam-se também por vezes em zonas beneficiadas pelas vias de trans-
portes, que se encontravam ainda em desenvolvimento, sendo por isso afectadas as mais
variadas zonas como: Alcântara, Campolide, Graça, Xabregas, entre outras…90
Tipicamente os Pátios têm uma relação com a rua semelhante à das Ilhas, os seus acessos
eram dissimulados na estrutura urbana já existente. Isto nem sempre se verifica em relação
às Vilas, estas apresentam as mais variadas formas de acesso, bem como as mais diferentes
formas de implantação, estando caracterizadas no ensaio de Nuno Teotónio Pereira.
Assim, segundo Teotónio Pereira, temos as “Vilas em Correnteza”, que seguiam em contínuo,
geralmente com 3 a 4 pisos. Este tipo de Vila formava, portanto, uma rua, poderia ter uma
variante tipo “Chalet Inglês”, que teria as 4 fachadas livres, geralmente encontrava-se em
zonas onde a segregação era tal que a frente de rua já não teria grande valor imobiliário, pelo
que se optava por construir mais habitação para as classes pobres.
Existiam também as “Vilas que formam pátios”, neste tipo existia uma exploração intensiva
do solo, formando um maior número de fogos, onde as habitações se organizavam em torno
de um pátio central, mais estreito e alongado tipo corredor (tendo neste caso uma aparência
muito idêntica à das Ilhas), outras vezes mais quadrangular e espaçoso, ocupando geralmen-
te todo o perímetro do lote. Nuno Teotónio Pereira refere esta forma como sendo a mais
generalizada da vila.
As “Vilas construídas atrás de prédios”, numa situação idêntica à dos Courts do Reino Unido,
(que se escondem nas traseiras de fachadas contínuas), mas também com uma relação di-
recta com as Ilhas (que se encontram nas traseiras das casas burguesas). À semelhança das
Ilhas, esta tipologia representa uma segregação de classes dentro do próprio lote. Na frente
de rua, o prédio destinado à pequena burguesia, ou uma classe média baixa, no interior as
habitações para operários, o acesso ao interior da Vila é feito das mais diversas maneiras,
sendo que, sem excepção, teria uma entrada sempre separada da do prédio de frente de Rua.
Um outro grupo seria o de” Vilas que formam ruas”, geralmente nas zonas próximas ao aces-

89 PEREIRA, Nuno Teotónio; Pátios e Vilas de Lisboa: a promoção privado do alojamento operário; in
Análise Social, vol. XXIX (127), 1994 (3º); Página 511
90 PEREIRA, Nuno Teotónio; Pátios e Vilas de Lisboa: a promoção privado do alojamento operário; in
Análise Social, vol. XXIX (127), 1994 (3º); Página 511
60

Figura 53 - Pátio do Gil Figura 54 - Vila Ramos

Figura 55 - Pátio do Batalha - Planta de Sobreloja Figura 56 - Interior do Pátio do Batalha

Figura 58 - Pátio do Alto de S. Francisco - Plan-


Figura 57 - Pátio do Alto do S. Francisco ta a Nivel dos Pátios

Figura 59 - Vila Bagatela Figura 60 - Pátio do Pimenta Figura 61 - Vila Martel


61
so das indústrias, estas são de construção simples quase tipo correnteza, formando rua. A
sua particularidade seria que estas ruas pertenciam à própria Vila, sendo por isso ruas par-
ticulares. Existiam ainda as “Vilas ligadas à produção”, como o nome indica estas estariam
directamente relacionadas com o recinto da fábrica.
Por último, as “Vilas de Escala Urbana”, organizadas num espaço privado que seria comum,
para lá da rua. Este tipo terá surgido como consequência do sucesso dos empreendimentos
anteriores, deixando os investidores com à-vontade para investir num complexo duma escala
maior. O complexo necessitaria já de uma estrutura viária. Nesta escala as Vilas passam a ser
encaradas como verdadeiros bairros de operários, pela escala que apresentavam, frequente-
mente exigiam um maior cuidado de planeamento, incluíam geralmente alguns equipamen-
tos colectivos associados ao conjunto de habitações. Estas Vilas tinham, muitas vezes um
carácter filantrópico, demonstrando por isso uma maior preocupação com o bem-estar dos
seus habitantes, que geralmente seriam os empregados das indústrias de quem as havia pro-
movido. Estas eram, contudo, organizadas das mais variadas maneiras, podendo ser grandes
complexos horizontais ou blocos em altura.91
Uma vez mencionadas as habitações operárias de Lisboa será pertinente lembrar as Ilhas do
Porto, que seriam os espaços onde se albergava a população operária, e não só, da cidade
nortenha. A sua forma alongada e estreita à semelhança dos lotes da cidade, compostas por
um ou mais reduzidos corredores ladeados de pequenas e baixas casas geralmente com um
só piso, cuja área estaria normalmente entre os 16 e 24 metros quadrados, as Ilhas serão
contudo uma tipologia a ser desenvolvida num próximo momento.
O problema habitacional em Portugal terá surgido, à semelhança do que aconteceu no resto
da Europa, com o desenvolvimento da indústria. Este, contudo, apenas será considerado um
problema nacional na última década do século XIX, aquando do surto epidémico da peste
bubónica que, como será adiante mencionado, terá tido grande impacto na população de
portuguesa, especialmente do Porto.
Alguns higienistas, anos antes, procuraram alertar a população para os problemas que casas
sem condições poderiam ter nas suas vidas. Mesmo depois de realizado, em 1881, o Inqué-
rito Industrial e os seus relatórios, não se terão tomado medidas significativas, apenas foram
criados alguns benefícios fiscais que procuravam promover a construção privada.
Caeiro da Mata diz-nos, no seu relatório oficial de 1909, que existiam cerca de 750 habita-
ções operárias em Lisboa e no Porto, e albergavam aproximadamente 5000 pessoas. Estas
habitações eram edificadas por ordem de alguns empresários que se preocupavam com as
condições de vida dos seus funcionários92, iniciativas como por exemplo a d’O Comércio do
Porto que será referida no capítulo que se segue.
Durante as primeiras décadas do século XX o problema habitacional terá continuado a au-
mentar, uma vez que a afluência de população pouco qualificada aos centros urbanos conti-
nuava também a crescer. Terá sido já na 1ª República que pela primeira vez o Estado procurou
intervir. Como se vai perceber, as acções iniciais do Estado não terão sido muito significativas
para a sociedade Portuguesa, demonstrando, ainda assim, início de um novo pensamento, de
uma, ainda que lenta, vontade de mudança.

91 PEREIRA, Nuno Teotónio; Pátios e Vilas de Lisboa: a promoção privado do alojamento operário; in
Análise Social, vol. XXIX (127), 1994 (3º); Página 512 a 521
92 NUNES SILVA, Carlos; Mercado e políticas públicas em Portugal: a questão da habitação em Portugal;
in Análise Social vol. XXIX (127), 1994 (3º);Pág. 658
62

Figura 62 - Desenhos de Projectos Tipo para Casas Económicas do Porto

Figura 63 - Vista Aérea do Bairro Gomes da Costa, Casas Económicas, 1950


63
A intervenção do Estado era tida como desnecessária, uma vez que “o serviço de construção
de habitações é estranho às atribuições normais das autarquias locais, porque nenhuma as-
similação é racionalmente admissível entre serviços de utilidade geral e a necessidade de ha-
bitação particular de uma pessoa ou uma família”93; por outras palavras, o Estado não consi-
derava que as condições de vida em que as classes mais pobres viviam fossem problema seu.
Em 1918 o Estado conclui que existia efectivamente uma necessidade de erradicar os bairros
insalubres, degradados e clandestinos. Para isso terá aprovado um orçamento que se desti-
nava à edificação de cerca de 1000 casas operárias que seriam construídas principalmente no
Porto e Lisboa, iniciando assim o programa das Casas Económicas.
Terá sido neste ano também, de 1918, que foi aprovada a Lei das Rendas ou do Inquilinato.
Com a cada vez maior afluência de pessoas às cidades, a procura havia-se tornado muito
maior que a oferta, pelo que os preços de arrendamento dos imóveis dispararam. Assim, a
Lei das Rendas implementou o congelamento das mesmas, sendo que estas passariam a só
poder ser aumentadas de 10 em 10 anos e num máximo de 10%. Isto, contudo, desmotivou
os investidores imobiliários, que viram os seus negócios estagnar, e os seus lucros reduzidos,
criando um grande desequilíbrio no mercado imobiliário. Esta lei, que procurava proteger os
arrendatários, teve, contudo, a longo prazo consequências gravíssimas, principalmente na
construção e conservação dos edifícios. O aumento das rendas, não podendo passar os 10%,
não acompanhava a inflação, pelo que os senhorios alegavam não ter fundos para eventuais
obras necessárias.94
Como resposta a este problema, a ditadura militar terá criado o Fundo Nacional de Constru-
ção, que propunha rendas económicas e promovia a construção da habitação; fez também,
no ano de 1928, a reforma da Contribuição Predial, que permitia a actualização das rendas,
excluindo do regime de rendas livres todos os imóveis que tivessem recebido ajudas de fun-
dos nacionais. Ainda nesse mesmo ano, o Estado procurou resgatar o programa das Casas
Económicas, iniciativa da 1ª República.95
Para reanimar este processo, foi necessário socializar os custos, criando incentivos acresci-
dos, aumentando as isenções de forma a atrair investidores. Tipologicamente estas casas
económicas seguiam o modelo inglês inspirado nas Cidades-Jardim. Assim estas seriam mo-
radias isoladas, unifamiliares, com um pequeno jardim. Tinham por isso uma baixa densidade
populacional. Os municípios ajudavam na realização deste programa com a cedência dos ter-
renos a preços baixos, ficavam ainda encarregues da urbanização e das infra-estruturas des-
tas habitações, bem como da assistência técnica sempre que necessário.96 Este modelo surge
da negação de um sistema mais rentável e económico a que o regime português de então
se opunha fortemente, o de Habitação Colectiva, que promovia grandes concentrações de
população, e já começava no resto da Europa, a ser encarada como a habitação do operário
por excelência97, como alguns casos já mencionados, começando nos Falanestérios de Charles
Fourier, num plano utópico, bem como a aplicação dos seus princípios em Guise, já do século
anterior, até aos já mais modernos Siedlungen. Com as casas unifamiliares, que promoviam

93 NUNES SILVA, Carlos; Mercado e políticas públicas em Portugal: a questão da habitação em Portugal;
in Análise Social vol. XXIX (127), 1994 (3º);Pág. 658
94 Idem; Ibidem; Pág. 658
95 Idem; Ibidem; Pág. 659
96 Idem; Ibidem; Pág. 660
97 DUARTE, Carlos dos Santos; in PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-
1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013; Pág. 194
64

Figura 64 - Bairro da Boavista, Fotografia Domingos Alvão, 1945

Figura 65 - Vista Aérea da construção do Bairro de Alvalade, Augusto Abreu Nunes, 1953

Figura 66 - Plano de Urbanização da Zona Sul da Avenida Alferes Malheiro, Projecto de Guilherme Faria da Costa, 1945
65
os valores tradicionais como a família, o Estado procurava prevenir amotinamentos, como os
que teriam acontecido já um pouco por toda a Europa, e ter mais controlo sobre a população.
Neste projecto das Casas Económicas estaria prevista a edificação de perto de 10 000 fogos,
ainda que o Porto e Lisboa tenham sido os grandes protagonistas deste programa, este tam-
bém se terá estendido a algumas outras capitais distritais. Surgem, então, bairros como o
da Ajuda e Encarnação em Lisboa, edificados no seguimento deste programa e seguindo os
princípios da publicação de Raul Lino, “ A Casa Portuguesa”.98
Em 1933, esta ideia é mais uma vez resgatada pelo Estado Novo, quando o governo redefiniu
parâmetros de intervenção Estatal na criação de habitações para os seus trabalhadores. Este
destinava-se essencialmente aos sócios das instituições de Previdência, funcionários públicos
(trabalhadores do Estado - civis e militares), deixando de lado mais uma vez as classes insol-
ventes. Para dar resposta a este problema, o Estado iniciou um programa de realojamento
das famílias residentes em bairros clandestinos, o das Casas Desmontáveis, que terá focado
a Câmara de Lisboa. Este programa terá mais tarde evoluído para o Programa de Casas para
Famílias Pobres.
Ainda assim, o resultado destas acções terá ficado mais uma vez longe de resolver o pro-
blema habitacional que se vivia no país, sendo isto apenas consciencializado aquando do 1º
Congresso Nacional de Arquitectura, no ano de 1948. Neste congresso foram tecidas diversas
críticas às escolhas do Regime, contudo, salienta-se uma: “Não se confundam casas baratas
com Casas Económicas”99 sendo que só uma delas poderia ser acedida pelas classes traba-
lhadoras. As “Casas Económicas“ que se andavam a construir tinham rendas impraticáveis
para quem realmente precisava delas, e um dos factores mais importantes para isso era o
espaço urbano necessário para edificação de moradias unifamiliares com jardim, que teriam
um aproveitamento de solo mínimo. Propôs-se por isso, como solução, uma grande mudança
de estratégia, mais especificamente a construção multifamiliar em altura, que deveria ser
integrada num plano racional e urbano. Este seguiria todos os princípios que asseguram as
condições mínimas de habitabilidade, com espaços arejados e verdes100, contudo, estas pro-
postas chocavam com os ideais do Estado Novo, o qual terá oferecido às grande resistência
às implementações.
A “revolução” na forma de pensar a habitação social em Portugal terá começado em 1944
quando a CML aprovou a construção do Bairro de Alvalade, com cerca de 230 hectares, que
viria albergar 45 000 pessoas. O bairro seria composto por blocos de habitação colectiva,
onde se procurava conjugar a tradicional ideia de cidade portuguesa, com os novos princí-
pios do urbanismo moderno, que já vinham a ser desenvolvidos no resto da Europa desde o
início dos anos 30. Cria-se assim um compromisso entre o urbanismo das vias principais e os
interiores dos quarteirões que, ao contrário do que acontece na típica casa portuguesa (que
se fecha sobre si mesma), são desprivatizados, procurando criar uma ligação destes espaços
à cidade.101
A grande dimensão deste empreendimento acabou por se revelar de forma negativa para a
cidade. À medida que o número de fogos aumentava no bairro, aumentava também o nú-
mero de barracas levantadas na sua periferia para abrigar os trabalhadores que chegavam às

98 Idem; Ibidem; Pág. 194


99 PEREIRA, Raul da Silva; Ibidem; Pág. 195
100 DUARTE, Carlos dos Santos; Ibidem; Pág. 195
101 DUARTE, Carlos dos Santos; Ibidem; Pág. 195
66

Figura 67 - Plano Geral do Bairro de Olivais-Sul, Casas de Renda Figura 68 - Fotografia do Bloco F, Bairro
Económica da FCP-HE, I plano do GTH, 1966 Olivais-Sul

Figura 69 - Plano Geral do Bairro de Olivais-Sul, Casas de Renda Figura 70 - Fotografia dos Olivais-Norte
Económica da FCP-HE, I plano do GTH, 1966 Nuno Teotónio Pereira

Figura 71 - 1º Plano Geral do Bairro de Ramalde, Porto, Projecto de Figura 72 - Bairro de Ramalde, de Fer-
Fernando Távora, Habitações Económicas - FCP nando Tavora

Figura 73 - Bairro de Barcelos, Perspectiva do anteprojecto, Nuno Te- Figura 74 - Bairro Barcelos, Projecto de
otónio Pereira, 1959, FCP - HE Nuno Teotónio Pereira s, FCP -, HE
67
dezenas à cidade para responder às necessidades de uma obra desta envergadura. 102
Dois anos mais tarde, em 1946, surgem as Habitações Económicas (HE) da Federação da Caixa
de Previdência. Estas estiveram em funcionamento por duas décadas e foram fundamentais
na revolução da política habitacional de Portugal. Mais tarde terão degenerado para o Fundo
de Fomento da Habitação (FFH).
Estas Habitações Económicas procuraram qualificar a habitação social do país, lideradas entre
outros por Nuno Teotónio Pereira, João Braula Reis e Alcino Soutinho, participaram na cons-
trução dos mais variados bairros como os dos Olivais, em Lisboa, ou o de Ramalde no Porto.
Por motivos práticos e económicos, as HE por vezes recorreram a projectos-tipo que seriam
rapidamente adaptados aos diferentes terrenos (geralmente cedidos pelo município) que
nem sempre teriam as condições ideais para receberem estas novas estruturas. A aplicação
destes projectos acabou por ser criticada, uma vez que a repetição exaustiva dos blocos cria-
va uma monotonia geral dos complexos edificados103, problema com que Bruno Taut se havia
já deparado e a que terá respondido, no início dos anos 20, nas concepções dos Siedlungen.
Apesar dos esforços e dos investimentos públicos, as acções da primeira metade do século,
face ao problema da habitação, seriam claramente insuficientes, visto que haviam sido edifi-
cados perto de 16 000 fogos sociais, número pouco significativo perante as necessidades do
país, que só em Lisboa e no Porto precisaria de mais de 72 000 fogos para que a erradicação
dos bairros de lata de Lisboa e das insalubres Ilhas do Porto. Importa perceber que destes 16
000 fogos, muitos haviam sido atribuídos a trabalhadores do Estado, resultando que poucos
se destinaram às populações mais pobres, que seriam as que de mais ajuda precisavam.104
Com a criação das HE constroem-se nos anos 50 mais de 11 000 habitações, 105 as suas inter-
venções visavam responder positivamente a uma política social de habitação e tinham em
conta diversos estudos cuidadosos que não se limitavam apenas aos interiores das habita-
ções. Existia uma preocupação com o todo, com a integração urbana dos blocos edificados,
que quando comparada com as iniciativas privadas (geralmente edificadas de forma pouco
cuidada e raramente com preocupações com a integração do complexo no espaço urbano da
cidade), evidenciava uma grande melhoria.
As HE procuravam conjugar o ambiente urbano e a habitação. Assim, em vez destas serem
consideradas como disciplinas distintas, são vistas como complementares, revolucionando
a forma de pensar a habitação social em Portugal. A ideia de integração dos complexos na
cidade seria fulcral para o projecto, uma vez que ajudava a promover uma melhor integração
das pessoas nessa mesma cidade, beneficiando de forma positiva aqueles que iriam habitar
os espaços construídos pelas HE.
Ainda assim, a generalidade dos órgãos do Estado, como já foi referido, demonstrou uma
grande resistência à aplicação deste novos princípios e ideias de habitação social, sendo esse
um dos grandes factores para a lenta evolução que estas tiveram no país, acabando, por
se tornar necessária a intervenção dos municípios que procuraram assumir os encargos das
urbanizações destes bairros sociais. Surge, deste modo, paralelamente ao programa das HE,
em 1956, o Plano de Salubrização das Ilhas do Porto, integrado no Plano de Melhoramentos
da Cidade. Este resultou na criação de pequenos núcleos habitacionais espalhados um pouco

102 Idem; Ibidem; Pág. 198


103 DUARTE, Carlos dos Santos; Ibidem; Pág. 198
104 NUNES SILVA, Carlos; Ibidem; Pág. 670
105 DUARTE, Carlos dos Santos; Ibidem; Pág. 199
68

Figura 75 - Estudo Habitação Evolutiva e


Adaptavel, LNEC

Figura 76 - Habitação Evolutiva, Desenhos de António Baptista Coelho, LNEC


69
por todo o município, como seria o caso do Bairro Fernão de Magalhães e do Bom Sucesso.
Paralelamente na capital, em 1959, cria-se o Gabinete Técnico da Habitação (GTH) de Lisboa.
O Gabinete pretendia pôr fim à crise habitacional dos subúrbios desta cidade, como viria a
ser exemplo o caso dos Olivais, de Nuno Teotónio Pereira, António Freitas e Nuno Portas.
Projecto onde, segundo a curta, mas precisa descrição de Carlos dos Santos Duarte:

«A prática e o juízo estético são secundarizados pela preocupação do diálogo, do re-


lacionamento, nomeadamente na existência de espaços intersticiais de convívio, lem-
brando os pátios alfacinhas. É o exemplo de uma modernidade renovada, em que a
visão universalista dá lugar ao reencontro com a tradição e a continuidade histórica
numa visão cultural e realista.»106

No mesmo ano da criação das HE, 1946, surge também o Laboratório Nacional de Engenharia
Civil, que nasce de uma consciencialização nacional das fragilidades que se viviam na constru-
ção em Portugal. Aparece, de certa forma, como consequência directa dos acontecimentos
do plano internacional, onde no pós-guerra se procuravam maneiras eficazes e económicas
de reconstruir as cidades devastadas, maneiras que rapidamente colocassem um tecto sobre
as populações que haviam perdido as suas casas e famílias.107 Assim, e ainda que Portugal se
tenha mantido fora da Segunda Grande Guerra, sabia-se que Portugal precisava de resolver
problemas idênticos, que se vinham a agravar desde o início do século.
Surge portanto em Portugal o LNEC, Laboratório Nacional de Engenharia Civil, à semelhança
do que terá acontecido no resto da Europa, onde se criam laboratórios mistos ou de Esta-
do que procuram resolver questões urbanísticas e construtivas, laboratórios como o British
Research Station, ou o Centre Scientifique et Techinque Du Bâtiment e Swedish Council for
Building.
Num período inicial, o LNEC esteve dirigido para a resolução de questões de controlo de
grandes obras públicas, surgindo apenas nos anos 60 uma fase mais interessante para o labo-
ratório a que Nuno Portas se refere como de “observação crítica”.108
No LNEC acreditava-se que o estudo exaustivo dos diferentes temas propostos pelo labora-
tório influenciaria de maneira positiva os programas, regulamentos e as políticas que seriam
adoptadas pelo Estado.
Os estudos do LNEC procuravam, então, ir mais além, procuravam sempre ir de encontro a
um grande plano em que cada parte funcionasse com o todo em perfeita harmonia, sendo a
interdisciplinaridade essencial para que se conseguisse obter resultados positivos.
Na questão da habitação, inicialmente, existe uma preocupação especial com a organização
interna do fogo, mas logo surgem questões quanto à durabilidade dos mínimos habitáveis e
dos modelos familiares da vida urbana, que estavam em constante mudança. Rapidamente
se começa a estudar para além do fogo, procura-se perceber a durabilidade funcional deste,
os custos de produção, organização dos edifícios colectivos, densidade de ocupação de terre-
no ideal, nascendo assim um conceito de “Habitação Evolutiva”.109
Neste processo de racionalização da habitação o LNEC expande a sua pesquisa para as for-
mas urbanísticas, procurando respostas no passado português, como foi o caso do estudo

106 DUARTE, Carlos dos Santos; Ibidem; Pág. 200


107 PORTA, Nuno; Ibidem; Pág. 101
108 PORTA, Nuno; Ibidem Pág. 101 a 102
109 PORTA, Nuno; in PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa:
Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013; Pág. 102
70

Figura 77 - Esquema de relações dos factores que condicionam o uso da casa e que a devem definir,
LNEC, 1977

Figura 78 - Esquemas com diferentes tipos de Ocupações possíveis, em lotes estreitos, médio e quadrados, LNEC,
1971

Figura 79 - Artigos sobre o Colóquio Sobre a Política de Habitação


71
das vantagens e desvantagens das casas-pátio que haviam sido esquecidas, ou dos acessos
em galeria. No entanto, estuda-se também o que ia acontecendo no plano internacional, im-
portando-se, por vezes, modelos de outros países com comprovado sucesso, mas nunca sem
antes fazer uma cuidadosa análise, que procurava perceber que alterações deviam ser feitas
para que estas se revelassem positivas para a população e para o país.110
Este laboratório esteve assim na frente da produção de vários documentos que se viriam a
reflectir na criação do Fundo do Fomento de Habitação (FFH), no ano de 1969, como “Política
da Habitação” ou “Habitação Evolutiva” de Nuno Portas e Francisco Silva Dias, apresentados
no Colóquio sobre Habitação em 1969.111
Os estudos do LNEC terão já de certa forma influenciado o plano intercalar de fomento (1965-
1967), onde foram previstas a edificação de 21671 fogos, dos quais mais de metade seriam
responsabilidade das HE e, cerca de 20% seriam assumidas pelas Câmaras de Lisboa e do
Porto.112
A Habitação terá sido integrada neste Plano Intercalar uma vez que e, ainda que, a despeito
de alguns esforços, realizados pelo Estado para acabar com a habitação precária, o número
de barracas no ano de 1963 tenha aumentado. O número de casas de lata ultrapassava os
50 000, se somarmos ainda o número de pessoas que vivia em regime de sublocação ao
número de prédios, só na capital, em que nem uma casa de banho existia, seriam mais de
100 000 as pessoas que viviam em condições miseráveis, provando mais uma vez que a res-
posta do Estado, face ao problema habitacional, não estaria perto de ser suficiente.113
Aos poucos abre-se espaço para movimentos que nem um regime político ditatorial conse-
guiria travar. Alguns documentos do LNEC foram postos à discussão pública, bem como vários
artigos de Francisco Keil do Amaral, Aquilino Ribeiro Machado e Nuno Portas, n’O Século,
Diário de Lisboa, e A Capital, e como resposta realizam-se diversos Colóquios e debates sobre
os problemas habitacionais. Colóquios como o do ano de 1967, sobre o Problema Habitacio-
nal, seguido, em 1969, pelo Colóquio sobre Urbanismo e também, no mesmo ano, o Colóquio
sobre a Política de Habitação, este último realizado no LNEC.114 Assim, a existência do proble-
ma e da sua consciencialização foi algo que nem o próprio regime político, com toda a sua
censura, foi capaz de controlar.
Todas estas acções terão ajudado a preparar terreno para as reformas criadas no ano 1969,
sendo a criação do Fundo de Fomento da Habitação115 a mais relevante no âmbito deste tra-
balho.
Terá sido na elaboração do relatório do III plano de fomento que se terá assumido que, para
dar resposta aos problemas habitacionais, seria necessária a criação de uma entidade que se
dedicasse inteiramente a esses problemas. Sendo essa entidade criada no ano de 1969, esta
seria o órgão de coordenação para a política de habitação, gerada no Decreto de Lei 49033,
de 28 de Maio.

110 Idem; Ibidem; Pág. 105


111 Idem; Ibidem; Pág. 103
112 PEREIRA, Raul da Silva; Ibidem; Pág. 192
113 PEREIRA, Raul da Silva; Ibidem; Pág. 191
114 PEREIRA, Raul da Silva; Ibidem; ; Pág. 191
115 Fundo de Fomento de Habitação, F.F.H, criado no ano de 1969, na sequência do «Colóquio sobre polí-
tica de habitação», que terá sido o primeiro debate público sobre as políticas de habitacionais do Estado Novo,
este organismo autónomo administrativa e financeira tinha como objectivo máximo fomentar a habitação social,
bem como a de integrar a política nacional de habitação com o planeamento urbano.
72

Figura 80 - Capa do Relato Final Figura 81 - Capa do Relatório de Figura 82 - Plano Intercalar de
do Colóquio sobre Politica de Execução do III plano de Fomento, Fomento 1965-1967
Habitação, 1969 1968

Figura 83 - Quinta da Fonsecas, Quinta da Calçada, projecto de Raul Hestnes Ferreira, Alçado, 1975

Figura 84 - Quinta da Fonsecas, Quinta da Figura 85 - Quinta da Fonsecas, Quinta da Calçada, Fotografia
Calçada, Estudo da Implantação, 1975 de José Pedro Cortes, 2014

Figura 87 - Quinta do Bacalhau, projecto de


Manuel Vicente, fotografia de 1998

Figura 86 - Esquema topográfico, Quinta do Bacalhau, 1979 Figura 88 - Quinta do Bacalhau, Alçados
73
O FFH seria responsável pela aquisição de terrenos e sua urbanização, construção das casas,
fiscalização da sua construção e seu arrendamento. Cabia-lhe também a função de coordenar
a distribuição de subsídios e dar assistência às câmaras municipais, sempre que necessário.

“ Era portanto um organismo vocacionado para a execução de uma política habitacio-


nal, numa perspectiva que já não se limitava à aplicação dos capitais das instituições
de previdência.”116

À semelhança do que teria acontecido ao longo dos anos nos planos de maior envergadura,
como no caso de Alvalade e dos Olivais em Lisboa e dos Bairros Camarários do Porto, as obras
realizadas pelo FFH procuravam a criação do espaço urbano como forma de integração social,
articulando duas disciplinas que até então seriam geralmente independentes uma da outra:
a política de gestão dos solos e a edificação de casas. Desejava-se desta forma que os seus
empreendimentos gerassem uma urbanização que oferecesse algo mais aos residentes, mais
do que casas, procuravam criar toda uma estrutura de equipamentos e serviços de forma a
garantir que toda a população encontrasse, a uma curta distância da sua residência, serviços
essenciais à sua vida.
A breve existência do FFH no plano das políticas habitacionais do país (aproximadamente 13
anos) não impediu a instituição de marcar profundamente o país. O FFH terá ficado respon-
sável por todas as funções relacionadas com a habitação do Ministério das Obras Públicas
e, também, encarregue do património do Fundo das Casas Económicas que acabou por ser
extinto.
Integrado no âmbito do FFH é importante não esquecer a Operação SAAL, iniciada no Verão
de 1974, com um despacho de Nuno Portas, na altura Secretário de Estado da Habitação do
governo provisório. A operação que surge no pós-25 de Abril, quando o país está em pleno
processo de modernização económica e acima de tudo social, onde a habitação assume gran-
de papel nas mudanças que ocorrem entre esses dois sectores, mas onde, acima de tudo, se
criam mudanças na forma de ver, pensar e construir a cidade.
O SAAL teria então como principal função acabar com a habitação precária, mostrava tam-
bém grande vontade de revolucionar o sistema urbano, explorando o direito do povo à cida-
de, independentemente da sua classe social, procurando com isto evitar o desenraizamento
da população, tentando nas suas intervenções, sempre que possível, manter a população na
sua zona de vida quotidiana.
A Operação SAAL dividia-se em brigadas técnicas, coordenadas por arquitectos responsáveis
pelas obras, que fariam o levantamento e estudo exaustivo do terreno, das necessidades de
quem ia habitar os espaços e da sua vontade. Em conjunto com as associações de moradores,
as brigadas e o arquitecto iam elaborando o projecto.
A operação terá procurado “em termos económicos, um investimento parcial de recursos
monetários das populações abrangidas nos custos da nova construção habitacional”117, sendo
que o Estado assegurava o investimento financeiro das diversas operações, principalmente
da parte urbana. Em contrapartida, os moradores participariam com parte dos encargos das
habitações.
Foi um momento importante, que fez ressaltar o papel social e político do arquitecto. A ope-

116 PEREIRA, Raul da Silva; Ibidem; Pág. 193


117 FERREIRA; Vítor Matias; in PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-
1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013; Pág. 206
74

Figura 89 - Planta da 2ª Fase da Cooperativa dos, Arquitectos, Projecto de Manuel Correia Fernandes

Figura 90 - Sache, 2ºFase, Projecto de Manuel Correia Figura 91 - Fotografia Sache, 1ª fase em Ramalde,
Fernandes Projecto de Manuel Correia Fernandes

Figura 92 - Bairro da Malagueira, 2011 Figura 93 - Bairro da Malagueira, 2011

Figura 94 - Bairro Da Malagueira, Projecto de Habitação Evolutiva, Plantas e Alçados, Projecto de Álvaro Siza,
1978
75
ração terá tido o seu fim nem dois anos (1974-1976) depois de ter iniciado a sua acção.
Aquando da interrupção do seu processo estariam em construção 2 259 fogos, e previa-se
que a construção de 5 741 se iniciasse até ao fim do primeiro trimestre de 1977. 118
Foi um período fundamental para relembrar o problema das Ilhas e, acima de tudo, para
repensar o papel que estas têm na cidade. Pela primeira vez elas não são encaradas como
mancha negra da cidade. Foi um momento em que existiu uma vontade de assumir a sua exis-
tência, de as expor ao meio urbano como parte da cidade, e não como pontos ou elementos
isolados dentro da cidade.
O FFH terá sido extinto em 1982, sendo no seu seguimento criado em 1984 o Instituto de
Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado (IGAPHE).
O IGAPHE ficou responsável pelo património habitacional do FFH com a função de o conser-
var, o gerir e, como o próprio nome diz, de o alienar. Deveria também servir de apoio técnico
às autarquias e promotoras de habitação social. O apoio técnico às autarquias seria funda-
mental, já que se caminhava para uma descentralização das políticas de habitação, ficando
estas cada vez mais a cargo dos municípios e menos do Estado.
No ano de 2002, o IGAPHE funde-se com o INH, Instituto Nacional de Habitação, como forma
de economia de meios, uma vez que o IGAPHE havia vendido grande parte do seu patrimó-
nio, deixaria de fazer sentido a existência dos dois organismos. O Estado terá apoiado, e in-
centivado até, a venda desse património, promovendo a compra de casa própria, facilitando
o crédito. Aquando dessa reorganização, o INH passa a chamar-se Instituto da Habitação e
Reabilitação Urbana (IHRU) que se encontra ainda hoje em funcionamento.
O IGAPHE, com participação das câmaras, procedeu à venda das habitações, para tal, gera-
ram-se condições de crédito, promovendo a compra de casa própria, política que passou a ser
encorajada pelo Estado desde a alteração do regime da propriedade horizontal.119 Esta altera-
ção, formada em Outubro de 1955, veio transformar a economia Portuguesa, já que permite
que unidades independentes de um mesmo edifício, ou condomínio, possam pertencer a
diferentes proprietários, possibilitando que a classe média deixasse de viver em regime de
arrendamento, para passar a ser proprietária. Desde então, foram surgindo apoios e incenti-
vos do Estado para a compra de casa própria.
Hoje o património do actual IHRU estará reduzido a cerca de 1/3 do seu património original
(39 197 para 12 559), cerca de 10 213 fogos foram vendidos aos ocupantes e os restantes
16 435 atribuídos às autarquias.120
Importa também falar do cooperativismo português, já que no final do século XX representa
uma nova forma de encarar a habitação com um carácter social.
Apesar das primeiras cooperativas em Portugal terem surgido logo no início do século, terão
até ao último quartel do século XX representado uma pequena parte da habitação edificada.
Segundo António Baptista Coelho estas terão tido o seu período de ouro entre 1974 e 1984,
por ter sido o decénio em que grande parte das cooperativas foram formadas.
À semelhança do SAAL, as cooperativas, surgem num período de agitação politica e económi-

118 BANDEIRINHA, José António; O processo SAAL e a arquitectura no 25 de Abril de 1974 - Coimbra : Im-
prensa da Universidade; 2007; Pág. 14
119 MENDES; Maria Clara; in BARROS, Carlos Pestana (coor.); A Habitação e a reintegração social em Portu-
gal; Lisboa: Editora Vulgata; 1997
120 CET-ISCTE/IRIC-UPORTO/A. MATEUS ASSOCIADOS; Contributos para o Plano Estratégico de habitação
2008/2013 – Documento Políticas de Habitação; 2007; Pág. 51
76

Figura 95 - Cooperativa Tripeira, Projecto de Noé Diniz Figura 96 - Cooperativa Santo Ildefonso, Projecto de
de 1984, Matosinhos Alfredo Resende em 1982, Porto

Figura 97 - Cooperativa Tripeira, Projecto de Noé Diniz Figura 98 - Cooperativa o Lar Familiar, Projecto de
em 1984, Matosinhos Mário Bonito de 1955, Porto
77
ca, pós revolução de Abril quando o país, a população, a forma de pensar habitação e urba-
nismo mudam. A difusão deste tipo de promoção foi apenas possível pela existência de uma
política habitacional mais liberal do que aquela que se tinha vindo a desenvolver até então,
tendo sido as cooperativas fortemente apoiadas pelo Secretário de Estado da Habitação dos
3 primeiros governos provisórios, Nuno Portas.121
Nestes anos de ouro, foram constituídas aproximadamente 400 cooperativas, sendo que,
quase 10 anos depois, metade delas ainda se encontrava activa. As cooperativas foram pro-
motoras, num primeiro momento, até 1980, de perto de 18 000 fogos, geralmente em regime
de propriedade colectiva, em que as cooperativas seriam responsáveis pelos mesmos até os
cooperadores liquidarem a divida, momento em que a propriedade lhes seria transmitida.122
Com o fim do FFH, em 1982, e a redução dos apoios estatais, dá-se um período de quebra
da construção de cooperativas. Num segundo momento, no final da década, as cooperativas
promovem a realização de 55 000 fogos, sendo que, grande parte destes são apenas conse-
guidos com pedido individualizado de empréstimos à banca.123
Procurou-se, assim, com o auxílio de várias entidades, lançar as iniciativas cooperativistas
(que eram movimentos autónomos) por todo o país, de forma a fazer chegar as cooperativas
a todos os locais onde existisse um défice habitacional.
Uma das características mais interessantes que as cooperativas exploram é a criação de com-
plexos habitacionais que não abrangiam apenas um grupo social,124 acreditando-se que inte-
grar implicava misturar; uma realidade bem diferente daquela que até aqui se tinha vivido
no país, onde os bairros sociais abrigavam apenas classes insolventes que acabam por entrar
numa espiral de exclusão e “guetização” desses espaços.125
Havia uma certa proximidade com a vontade do futuro habitante que se reflectia nos fogos, e
numa uma grande afinidade das habitações com a dinâmica familiar dos seus ocupantes. De
um modo geral, as cooperativas costumavam ainda revelar qualidade arquitectónica.
São criadas as Cooperativas de Habitação Económica, constituídas em grande parte entre
1976 e 1978, que contam com o apoio técnico financeiro do FFH.126 Estas terão rapidamente
sido agregadas à Federação Nacional de Cooperativas de Habitação Económica (FENACHE).
Algumas destas cooperativas seriam antigas associações de moradores surgidas no processo
SAAL e que, com o encerramento deste, se transformaram em cooperativas, continuando,
ainda assim, a receber apoios do FFH até à sua dissolução em 1982.
O movimento cooperativista teve numa fase inicial uma grande notabilidade em Lisboa, con-
tudo terá sido na área do grande Porto que este proliferou, sendo Matosinhos um “polo
incontornável do cooperativismo habitacional em Portugal.”127
O INH, criado em 1986, terá surgido como um meio para que o Estado pudesse intervir finan-
ceiramente no sector habitacional, particularmente na construção e apoio à habitação social.
Com a criação do IGAPHE e INH estabeleceu-se um regime de coordenação que procurava
que o poder estatal e o municipal cooperassem, algo que se vinha a preparar desde 1978
121 COELHO, António Baptista; in PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-
1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013; Pág. 134
122 Idem; Ibidem; Pág. 138
123 Idem; Ibidem; Pág.138
124 Idem; Ibidem; Pág.
125 PORTAS, Nuno; Ibidem; Pág. 107
126 COELHO, António Baptista; Ibidem ; Pág.137
127 COELHO, António Baptista; Ibidem; Pág. 137
78
com o 1º Governo constitucional em que se criaram condições para os serviços habitacionais
se transferirem para os municípios. A autarquia passaria então a tratar da administração,
gestão, conservação, bem como da distribuição dos fogos edificados com os fundos públicos.
Desde de que se deu esta descentralização dos serviços habitacionais para os municípios,
as políticas de habitação do país sofreram uma quebra de promoção enorme. Ainda assim,
alguns municípios tiveram mais atenção às carências habitacionais da sua população que
outros.
Em 1993 surge o PER, Programa Especial de Realojamento, o seu objectivo seria erradicar
as barracas habitadas por perto de 50 000 famílias de Lisboa e Porto, bem como resolver a
sobrelotação dos edifícios, que se estimava ser um problema de aproximadamente 300 000
fogos. O PER procurava ainda controlar o crescimento da construção clandestina que teria
representado 40% da construção nova do país nas duas décadas anteriores.128 Este era cons-
tituído por uma equipe multidisciplinar que se procurava articular com uma gestão local dos
bairros, o programa seria financiado parcialmente pelo IGAPHE e pelo INH.129
Este programa foi responsável pela construção de 31 000 fogos num intervalo de aproxi-
madamente 12 anos (1993-2005), contudo a quantidade não terá sempre acompanhado a
qualidade.130
Como a generalidade dos programas apoiados pelo Estado para a habitação social, estes no-
vos fogos são ocupados por um grupo social homogéneo, problema que o LNEC estudava na
década de 80, já que encarava a mistura de classes como fulcral para integração da população
na sociedade e teria encontrado nas cooperativas uma resposta positiva.
A homogeneidade social não era contudo o único aspecto negativo do PER, sendo outro o
facto de não existir qualquer cuidado de manter as massas na sua zona de conforto. Pode-se
assim concluir que o PER teria uma política habitacional mais próxima da dos Bairros Sociais,
do que da criada no SAAL, onde se havia procurado uma resposta muito mais positiva para a
população. 131
Mais tarde o PER ficou também responsável pelo financiamento da construção e pelo realo-
jamento da população que habita as barracas, concede também apoios para a reabilitação de
imóveis devolutos, se estes se destinarem a alojar famílias recenseadas no programa.
Em 1993 surge também o programa de Construções de Habitações Económicas. Este focou-se
principalmente no Porto e Lisboa, e terá aproveitado terrenos disponíveis do IGAPHE, tendo
muitas das habitações construídas no programa alojado famílias integradas no PER. 132
Visando substituir o PER, a longo prazo surge o PROHABITA, programa de financiamento para
acesso à habitação, criado no ano de 2004, não sendo na sua essência um programa de rea-
bilitação, encara a mesma como estratégia a adoptar em vez da construção de novos fogos. 133
Este terá sofrido em 2007 alterações, que criam uma maior articulação entre o Estado e as
famílias carenciadas que iriam beneficiar das habitações. Criam-se directrizes a seguir, princi-

128 CET-ISCTE/IRIC-UPORTO/A. MATEUS ASSOCIADOS; Contributos para o Plano Estratégico de habitação


2008/2013 – Documento Políticas de Habitação; 2007; Pág. 30
129 LIMA, Maria Eugénia; SAAL uma Politica Urbana Vanguardista; ISCTE; 2011; Pág. 36
130 CET-ISCTE/IRIC-UPORTO/A. MATEUS ASSOCIADOS; Contributos para o Plano Estratégico de habitação
2008/2013 – Documento Políticas de Habitação; 2007; Pág. 15 a 16
131 CACHADO; Rita in Análise Social, 206, xlviii (1.º), 2013, Pág.138-139
132 LIMA, Maria Eugénia; SAAL uma Politica Urbana Vanguardista; ISCTE; 2011; Pág. 36
133 CET-ISCTE/IRIC-UPORTO/A. MATEUS ASSOCIADOS; Contributos para o Plano Estratégico de habitação
2008/2013 – Documento Políticas de Habitação; 2007; Pág. 65
79
palmente nas áreas metropolitanas, onde a reabilitação urbana não deve ser encarada como
um acto pontual, acrescenta também aos seus objectivos a requalificação de bairros sociais
degradados e sem os equipamentos e os serviços necessários ao bom funcionamento dos
mesmos.
Esta integração da reabilitação urbana como uma medida necessária para a política da habi-
tação, inicia-se de forma a compensar a falha das intervenções públicas realizadas até então
que eram representadas, quase exclusivamente por novas construções.134
No ano de 1988, com intenção de combater as consequências dos congelamentos das ren-
das, surge o RECRIA, Regime Especial de Comparticipação de Imoveis Arrendados, que como
o próprio nome indica, se dedica à reabilitação dos fogos arrendados, que teriam as rendas
congeladas. Pressupunha, portanto, intervenção em edifícios que estavam geralmente ainda
em regime de propriedade vertical, excluindo os de propriedade horizontal e também mo-
radias. É, por isso, um programa direccionado para as cidades, principalmente para Lisboa.
Havia, em relação à multiplicidade territorial, um enorme desajuste da legislação, já que ex-
cluía quase por completo os meios rurais, onde a tipologia predominante seria a pequena
moradia.
De forma a compensar este desequilíbrio, cria-se no ano 1996 o Regime Especial de Com-
participação e Financiamento de Prédios Urbanos que prevê a intervenção em prédios de
propriedade horizontal. Contudo, a intervenção estaria limitada apenas a espaços comuns do
prédio, sendo que as restantes fracções poderiam ter apoios financeiros, mas este seria em
forma de empréstimo bonificado. Surge ainda em 1999 o SOLARH, inicialmente Programa de
Solidariedade e Apoio à Recuperação de Habitação, que criava apoios financeiros para a rea-
bilitação dos fogos, e o público-alvo seriam os proprietários insolventes. O primeiro critério a
ter em conta seria o rendimento do agregado, existe uma maior sensibilidade neste programa
face ao RECRIA, por se perceber que propriedade não é sinónimo de solvência económica,
e ainda por integrar a população do meio rural, que até então havia sido esquecida. Dois
anos mais tarde, o SOLARH passa a ser o Programa de Apoio Financeiro Especial Para a Rea-
bilitação de Habitação, altura em que passa a abranger fogos devolutos, o que remete para
existência de um senhorio. Este alargamento do programa veio assim resolver uma falha do
RECRIA, sendo esta a exclusão dos fogos vagos.135 Podemos assim concluir que estes progra-
mas se complementam e procuram gradualmente dar respostas às falhas que vão surgindo.
A desertificação das cidades, principalmente dos centros antigos, começa com o RECRIA a ser
foco das políticas de habitação. Até então estes haviam sido fortemente negligenciados e,
não sendo a acção do RECRIA suficiente, surgem mais dois “programas” que interessa men-
cionar: o Regime de Apoio à Comparticipação Habitacional em Áreas Antigas (REHABITA) e as
Sociedades de Reabilitação Urbana (SRU).
O REHABITA distingue-se dos anteriores porque a sua intervenção é direccionada para uma
escala mais urbana, as suas acções têm um carácter municipal e tentam a recuperação e re-
conversão urbanística de áreas consideradas críticas dos centros históricos. 136
As SRU’s “não sendo aliás um programa, mas sobretudo um (re)enquadramento jurídico e
institucional da intervenção pública municipal em matéria de reabilitação urbana”137, vieram
permitir que os municípios criassem as entidades responsáveis por intervir na reabilitação e
134 Idem; Ibidem; Pág. 43
135 Idem; Ibidem; Pág. 106 a 108
136 Idem; Ibidem; Pág. 108
137 Idem; Ibidem; Pág. 109
80
revitalização de áreas específicas da cidade, de maneira a captar e motivar o investimento de
privados nessa mesma área.

«A reabilitação urbana assume-se hoje como uma componente indispensável da po-


lítica das cidades e da política de habitação, na medida em que nela convergem os
objectivos de requalificação e revitalização das cidades, em particular das suas áreas
mais degradadas, e de qualificação do parque habitacional, procurando-se um funcio-
namento globalmente mais harmonioso e sustentável das cidades e a garantia, para
todos, de uma habitação condigna.»138

Em 2007 cria-se o Plano Estratégico de Habitação. Para a preparação deste, foram desenvol-
vidos diversos estudos e relatórios, em que se procura perceber as principais dificuldades e
necessidades do país para uma política de habitação eficaz. Nestes estudos conclui-se que
é preciso um controlo apertado da qualidade construtiva, desburocratização dos processos
ligados à construção de habitação, uma maior cooperação entre privados, municípios e Esta-
do, dar o crédito devido à reabilitação urbana, principalmente nas áreas centrais das grandes
cidades onde se verifica um enorme processo de desertificação habitacional e envelhecimen-
to, quer dos edifícios quer da população.139
Neste plano, o Estado deveria reforçar o seu papel no planeamento, regulação e fiscaliza-
ção de forma a acentuar a sua função de subsidiário e regulador, aliando-se a autarquias,
cooperativas e privados que passariam a ser os “fornecedores” directos da habitação para a
população mais carenciada, promovendo a colaboração público-privado. Privilegia-se o regi-
me de arrendamento de habitação pública e privada; a manutenção do esforço de produção
de habitações a custos controlados, por empresas e cooperativas e a utilização de estruturas
económicas e políticas de cidade de forma a gerar maiores reforços na habitação. 140 Sendo a
missão deste plano “garantir a todos os cidadãos o acesso a uma habitação condigna”… bem
como “promover a qualidade de vida urbana, e simultaneamente melhorar a capacidade das
cidades fixarem populações económica, social e culturalmente diversificadas. “141
No recente relatório Habitação em Portugal: evolução e tendências, realizado numa parceria
INE e LNEC, estima-se, com base nos dados dos censos 2011, que, quanto à carência habita-
cional quantitativa, calcula-se a falta de aproximadamente 132 656 fogos142 a nível nacional,
sendo que a existência de alojamentos vagos disponíveis é na generalidade superior ao nú-
mero de alojamentos vagos, verificando-se que a “carência habitacional quantitativa pode
ser considerada residual em Portugal”143, conclui-se que a taxa de sobrelotação, apesar de ter
diminuído, ainda ronda os 450 000 fogos, com carência de infra-estruturas básicas encontra-
ram-se cerca de 76 500 fogos e perto de um 1 milhão de edifícios necessitam de intervenção
(sendo que mais de 600 000 apenas necessitam de pequenas reparações). Os edifícios que
se encontram em pior estado de conservação são na generalidade anteriores a 1960.144 Ainda
138 Portal da Habitação in http://www.portaldahabitacao.pt/pt/portal/reabilitacao/sociedadesreabilita-
caourbana/menusru.html
139 CET-ISCTE/IRIC-UPORTO/A. MATEUS ASSOCIADOS; Contributos para o Plano Estratégico de habitação
2008/2013 – Documento Políticas de Habitação; 2007; Pág. 57
140 Idem; Ibidem; Pág.34
141 Idem; Ibidem; Pág 35
142 LNEC/INE; O Parque Habitacional e a sua Reabilitação – Análise e Evolução 2001-2011; Lisboa; 2013;
Pág.100
143 CET-ISCTE/IRIC-UPORTO/A. MATEUS ASSOCIADOS; Contributos para o Plano Estratégico de habitação
2008/2013 – Documento Políticas de Habitação; 2007; Pág 61
144 LNEC/INE; O Parque Habitacional e a sua Reabilitação – Análise e Evolução 2001-2011; Lisboa; 2013;
81
que de um modo geral o panorama nacional, face à habitação tenha melhorado, está ainda
assim abaixo das médias europeias.
Hoje nas políticas habitacionais procuram-se respostas para o problema, não só na nova
construção, mas também na reabilitação de edifícios recentes e históricos. É importante, por
isso, encontrar maneira de optimizar estas reabilitações a todos os níveis.
Pode-se assim concluir que as políticas de habitação em Portugal continuam com o mesmo
objectivo, “habitação para todos”. Há no entanto uma nova realidade social e económica, a
de um país que tem um excesso de parque habitacional não utilizado e procura sair de uma
crise económica, que já há algum tempo se adivinhava, que faz com que a concretização des-
se objectivo seja radicalmente diferente da que se tem observado até agora.

Pág. 151
“Casa onde entra o Sol não entra o médico”
Ditado Popular
Figura 99 - Entrada de uma Ilha, Rua de S. Victor, 2015
85

3.HABITAÇÃO e
HERANÇA INDUSTRIAL NO PORTO

Portugal, até muito, tarde teve a sua economia assente na actividade mercantil, embora gran-
de parte da população vivesse em zonas rurais e da agricultura. Terá sido numa época de tran-
sição em que população rural procurou nova vida na cidade, tendo esta sofrido uma enorme
enchente populacional para a qual não estava preparada. Foi neste panorama que surgiram
no Porto as Ilhas. Apareceram como forma de habitação operária, e acabaram por represen-
tar todas as classes trabalhadoras. Para se perceber o aparecimento desta nova tipologia, é
importante entender a situação em que Portugal se encontrava, já que são geralmente os
diferentes contextos que levam às diversas respostas por parte da sociedade. Este período
de afluência às cidades é caracterizado, entre outros aspectos, pela industrialização do país.

“Em 1814, de acordo com um inquérito realizado pela Real Junta de Comércio, existiam
no Porto 45 fábricas, mais concretamente quinze curtumes, doze manufacturas de te-
cidos de algodão, sete de seda, três fábricas de chapéus, duas de lanifícios, duas de
estamparias, duas fábricas de louça e duas fábricas de arame. Comparativamente, em
todo o país e no mesmo ano existiam 511 empresas industriais. Em 1822, segundo um
relatório ministral, existiam em Portugal 1031 unidades industriais, que empregavam
14.934 trabalhadores.” (…) “A duplicação do número de fábricas neste período de oito
anos documenta o esforço de desenvolvimento industrial verificado entre 1812 e 1826”
145

A industrialização de Portugal deu-se, quando comparada com o resto da Europa, já tardia-


mente, tendo o seu primeiro momento no período verificado entre 1812 e 1826 como refere
acima Manuel C. Teixeira146. Este primeiro surto de industrialização terá sido seguido por um
segundo entre 1835 e 1850, este último caracterizado pela introdução da máquina a vapor
em algumas indústrias. 147
Em meados do século XIX, Portugal encontrava-se em crise: estava ainda a recuperar das
invasões francesas, que haviam destruído muito território agrícola, (o que, aliado aos méto-
dos tradicionais e lentos usados neste sector, gerou uma grande crise na agricultura) e foram
também a causa da perda da exclusividade do comércio com o Brasil, gerando uma grande
crise económica no país.
Pode ainda atribuir-se às invasões, que espalharam os seus ideais liberais, o período de enor-
me instabilidade política, onde liberais lutavam contra absolutistas. Todos estes factores e
ainda a fraca industrialização de Portugal tornaram impossível que o país pudesse concorrer
com os outros países europeus, onde a revolução industrial já tinha começado havia mais de
50 anos. A produção do país era pouca, demorada e cara.

145 TEIXEIRA, Manuel C; Habitação popular na cidade oitocentista : as Ilhas do Porto; Lisboa : F.C.G..
J.N.I.C.T; 1996; Pág. 87
146 Manuel C. Teixeira, Professor Catedrático na Universidade Técnica de Lisboa, apresento a sua tese de
Doutoramento na Architectural Association School of Architecture Graduate School, sobre o As Ilhas do Porto,
para a qual realizou um exaustivo e preciso trabalho de investigação.
147 TEIXEIRA, Manuel C; Habitação popular na cidade oitocentista : as Ilhas do Porto; Lisboa : F.C.G..
J.N.I.C.T; 1996; Pág. 87-88
86
A primeira máquina a vapor só apareceu em Portugal por volta de 1835, iniciando-se então
um segundo momento de industrialização. Só depois deste data é que, lentamente, Portugal
conseguiu modernizar os seus métodos de produção. O primeiro troço da linha férrea é ape-
nas inaugurado em 1856, ligando Lisboa ao Carregado. Só a partir deste momento é que len-
tamente se vão tornando mais simples as trocas comerciais internas e com a vizinha Espanha.
Em 1863 era finalizada a linha de Leste que iria até à fronteira, o caminho de ferro chegou
ao norte do país já muito mais tarde, sendo inaugurada em 1875 a linha do Minho e Douro
seguida da linha da Póvoa. Todas estas novas ligações ao Porto foram de extrema importância
para o desenvolvimento desta cidade. Entre 1830 e 1850, o Porto era essencialmente uma
cidade mercantil, onde a indústria pouco se tinha desenvolvido. Pode-se assim perceber a
importância dos caminhos-de-ferro para a mudança social, económica e urbana que a cidade
vai sofrer no final do século XIX.148
A conclusão da Linha Norte-Sul com a construção da ponte Maria Pia, que unia o Porto à mar-
gem sul, foi também um factor de enorme importância para o desenvolvimento da cidade
do Porto, quer urbanística, quer socialmente. É fulcral notar aqui a mudança estrutural da
cidade: a ribeira perde parte do seu monopólio como interposto comercial para a zona de
Campanhã, criando-se um novo ponto de expansão da cidade portuense. O terminal da li-
nha dos caminhos-de-ferro de Campanhã confirmou esta área da cidade (Campanhã-Bonfim)
como uma importante zona industrial. Rapidamente esta área, que era até então composta
por baldios e terrenos agrícolas, foi invadida por indústrias, beneficiadas por fácil e rápido
acesso a toda a matéria que passa agora a ser recebida nesta zona da cidade.149
Apesar de a cidade ter iniciado o seu processo de expansão no século XVIII, com plano dos
Almada (João de Almada e Melo, Governador das Armas do Porto, e o seu sucessor Francisco
de Almada e Mendonça), que nasceu devido ao crescimento do comércio de Vinho do Por-
to.150 Aliado a um aumento demográfico pós terramoto de Lisboa. Contudo, com a crise que
se viveu na primeira metade do século XIX esse crescimento estagnou. O plano de expansão
caracterizado pela abertura da Rua dos Almada, seguida de 3 outras grandes ruas (a Rua de
Santa Catarina, a Rua de Cedofeita e a de Sto. Ildefonso) que irradiavam do velho núcleo da
cidade. Estes 4 novos eixos, juntamente com outros secundários que os uniam, faziam parte
da nova estrutura urbana da cidade e ocupavam uma área 3 vezes maior que a da cidade
antiga. Apenas os eixos principais foram sendo ocupados pela burguesia que procurava fugir
à sobrelotação existente no interior das muralhas, acabando por não se construir muito nas
ruas secundárias e deixando uma grande parte de terrenos por urbanizar em toda esta área.
151

Apesar de a indústria fazer já parte da economia portuguesa, a sua existência não é ainda
significativa. Assim, grande parte da produção em Portugal continuará a ser artesanal, execu-
tada em pequenas oficinas, por vezes integradas na habitação do próprio artesão.
O lento e tardio desenvolvimento da indústria em Portugal deu-se então mais intensamente
na segunda metade do século XIX, com Fontes Pereira de Melo, que procurou apoiar o de-
senvolvimento de novos meios de transporte, não só com a construção de vias férreas, mas
também com a abertura de estradas. Entre 1852 e 1884, os quilómetros de estradas passa-

148 TEIXEIRA, Manuel C; Habitação popular na cidade oitocentista : as Ilhas do Porto; Lisboa : F.C.G..
J.N.I.C.T; 1996; Pág. 5
149 Idem; Ibidem; Pág. 22 a 23
150 RAMOS, Luís A. De Oliveira (coord.); História do Porto - Porto; Porto Editora; 2000; Pág. 378
151 Idem; Ibidem; Pág. 378 a 379
87
ram de 218 para 9 155. Também se criaram novas formas de comunicação que acabaram por
unir o país de norte a sul, parecendo encurtar as distâncias, e fortalecer o país, propiciando
e fomentando a sua economia. A todo este período que se desenrolou a partir dos anos de
1850 chama-se o Período de Regeneração.152
As regiões em que este surto de desenvolvimento tecnológico mais se revelou foram Lisboa,
Setúbal e Barreiro, na zona Sul-Centro do país, e Porto e Guimarães, na zona Norte. O sector
que mais se desenvolveu foi: o sector têxtil de algodão e lanifícios (substituindo as indústrias
domiciliárias do linho), seguido do sector vidreiro e também da indústria do tabaco, cerâmi-
ca, moagem e conservas.153 No Porto, o sector industrial mais importante era o de fiação e te-
celagem, onde algumas das grandes fábricas terão chegado a ter perto 400 trabalhadores.154
Apesar de todas estas mudanças, não se pode afirmar que a actividade económica tenha
sido conduzida pela indústria. Esta tinha um desenvolvimento reduzido que não permitia
assegurar uma melhoria significativa da taxa de crescimento da economia, nem modificar a
estrutura económica do país.
Um último momento importante da industrialização foi o final do século XIX, prolongando-
-se até aos primeiros anos do século XX, momento esse que foi acompanhado por várias
transformações sociais, políticas e, mais importantes ainda, estruturais no sector industrial.
Deu-se um enorme crescimento das indústrias de base, que acabaram por conseguir ganhar
terreno, em detrimento da manufactura artesanal e familiar.
Contudo, este crescimento em Portugal conseguiu não ter surtos industriais muito pronun-
ciados, embora se tenha verificado um grande crescimento demográfico nas cidades em que
as industrias se desenvolviam.
No início de 1800, ainda grande parte da população portuense se encontrava dentro do pe-
queno núcleo central dentro das muralhas da cidade, ainda que seja já visível na planta de
Geoge Black algum transbordo. O centro encontrava-se já por esta altura lotado, e a situação
terá piorado com o agravamento na crise da agricultura começando a surgir grandes mi-
grações de população rural para as cidades e sobrelotando completamente o centro antigo
Porto. As pessoas vinham para a cidade em busca de oportunidades, salários estáveis e vidas
menos duras do que as que viviam nas zonas rurais.155
Estatisticamente, em apenas meio século, a população do portuense aumentou para mais
do dobro, tendo em conta que em 1838 o Porto teria à volta de 59.370 habitantes, em 1864
este número estaria já nos 86.761, e rapidamente passou para os 138.860 habitantes no ano
de 1890. Os cerca de 27.000 habitantes que chegaram entre 1838 e 1864 seriam de origem
humilde e rural e vieram para o Porto incentivados pelas indústrias crescentes.156
Tendo isto em conta é fácil perceber que a cidade não estivesse minimamente estruturada
para um crescimento demográfico tão elevado.
Apesar da estrutura de expansão criada pelos Almada no século anterior, a falta de recursos

152 TEIXEIRA, Manuel C; Habitação popular na cidade oitocentista : as Ilhas do Porto; Lisboa : F.C.G..
J.N.I.C.T; 1996; Pág. 85
153 PEREIRA, Nuno Teotónio; Pátios e Vilas de Lisboa: a promoção privado do alojamento operário; in
Análise Social, vol. XXIX (127), 1994 (3º); Pág. 509
154 TEIXEIRA, Manuel C; Habitação popular na cidade oitocentista : as Ilhas do Porto; Lisboa : F.C.G..
J.N.I.C.T; 1996; Pág. 90
155 RAMOS, Luís A. De Oliveira (coord.); História do Porto - Porto; Porto Editora; 2000 Pág. 382 a 383
156 TEIXEIRA, Manuel C; Habitação popular na cidade oitocentista : as Ilhas do Porto; Lisboa : F.C.G..
J.N.I.C.T; 1996; Pág. 19
Figura 100 - Vista Aérea do Porto, antes das demolições na Sé Figura 101 - Sobreocupação da
Cidade

Figura 102 - Desenvolvimento Urbanos no Final do Século XVII e inícios do XVIII, sobre a Planta Redonda de
George Black, 1833
89
desta população levou a que as pessoas arranjassem soluções de acordo com as suas posses,
geralmente acabando por se acumular em edifícios de 4 e 5 andares da cidade antiga, che-
gando a viver 7 ou 8 famílias, num pequeno espaço. Lá se cozinhava, lá se dormia, lá se vivia,
criando assim, verdadeiras “colmeias humanas” como Gaspar Martins Pereira157 refere.158
Surgem como alternativa as “casas de Malta”, onde por entre 40 a 120 reis se arrendava uma
cama em camarata e pouco mais. Esta era, geralmente, opção de trabalhadores que vinham
sozinhos para a cidade, deixando as suas famílias que iriam frequentemente visitar nos dias
de descanso.
Com todo este panorama, a burguesia que já havia começado a fugir para as zonas mais livres
e novas da cidade, muda-se em massa para as suas novas, espaçosas e belas casas burguesas,
onde podem viver de acordo com o seu nível social e onde evitavam o contacto com a reali-
dade precária das novas gentes da cidade, consideradas de baixo nível.
Até aqui, pode dizer-se que o Porto, se assemelhava a tantas outras cidades europeias, como
Barcelona onde a habitação operária era geralmente sinónimo de habitação colectiva, e os
operários invadiam os edifícios já construídos. A grande diferença é a maneira como a cidade
continua a desenvolver-se face à sobrelotação destes espaços. Nesta cidade, esta tipologia
foi de certa forma a escolhida para os novos edifícios. Em Barcelona a tipologia era usada
tanto para operários como para burgueses, mudavam apenas as dimensões dos espaços e a
qualidade da construção. Isto não quer dizer que estas habitações colectivas não fossem, por
vezes, construções mais deficientes que ocupavam, também por vezes, espaços de quintas
e pátios interiores de terrenos, mas nunca se desenvolveram a ponto de se tornarem uma
tipologia, não passando de uma excepção à regra.
Já no Porto, essa realidade foi bem diferente. Perante a lotação absoluta dos espaços para re-
ceber a população que vinha para trabalhar nas indústrias em crescimento na cidade, criou-
-se uma nova forma de habitação, exclusivamente para o operário e a população de baixo
rendimento.
Esta nova maneira de habitar (as Ilhas) não tinha nenhuma relação formal com o tipo ante-
rior, iniciou-se com a ocupação de terrenos e construções rurais que se encontravam na peri-
feria da urbe. Ocupava normalmente, o interior dos quarteirões, respeitava os estreitos lotes
com de 25 a 30 palmos que serviam de frente de rua prolongando-se por vezes até aos 100
metros de comprimento. Eram frequentemente compostos por vários corredores e múltiplos
alinhamentos de casinhas, muitas vezes agrupadas costas com costas, quando o empreendi-
mento ocupava a traseira de várias casas burguesas ou então, surgiam em baldios que eram
comprados com o propósito de criar este tipo de habitações.
A verdade é que o plano desenhado pelos Almadas tinha como estratégia a rua e, não o inte-
rior do quarteirão, pelo que surgem ruas rectilíneas, formando vastos quarteirões irregulares.
Dada a quantidade de terrenos que havia ainda por edificar para lá das ruas mais ou menos
preenchidas por casas burguesas, e verificada a grande eficiência deste modo de construir,
este tipo de habitação começou a multiplicar-se de modo a dar tecto à população operária,

157 Gaspar Martins Pereira é professor catedrático do departamento de História e de Estudos Políticos da
FLUP. Esteve na direcção do CITCEM - Centro de Investigação Transdisciplinar «Cultura, Espaço & Memória». Foi
desenvolvendo até hoje vários projectos de investigação sobre história contemporânea portuguesa, mais especi-
ficamente sobre a história da cidade do Porto no século XIX, e das suas famílias.
158 PEREIRA, Gaspar Martins; Percurso das Familias Trabalhadoras do Porto em Finais do Século XIX; Porto;
2010; Pág. 4 a 5
90

Figura 103 - Exemplos de diferentes tipo de Ilhas

Figura 104 - Disposição tipo de Ilha em relação à casa de frente


de rua
91
que continuava a chegar. 159
Esta nova forma de construir, em geral, não dava a cara à rua, foi quase usada como estraté-
gia de ocupação do interior do quarteirão. Quase como se a cidade fosse revestida por uma
máscara de belas casas burguesas que escondiam as traseiras pobres e mal tratadas. Quartei-
rões que, no Porto, devido não só aos grandes desníveis do terreno como também à falta de
planeamento, eram caracterizados por uma grande irregularidade.160
Os construtores deste novo tipo de habitações não faziam por isso, logo à partida, grandes
investimentos: os terrenos já seriam seus e normalmente não eram utilizados. Os proprietá-
rios viram assim uma maneira de rentabilizar esses terrenos. Era também um investimento
de baixo risco, já que a fraca qualidade das construções saía muito barata, e era certo que a
curto prazo seria recuperado, face à procura de casa que se verificava.161
Assim eram, então, as chamadas Ilhas do Porto, um tipo de habitação que geralmente era
composto por pequenas casas de uma frente só e um só piso, cujo acesso seria feito por um
corredor estreito e longo. Eram a habitação da classe trabalhadora do Porto. Os lares não
teriam mais do que 16 m2 e eram compostos por uma sala com a cozinha ao fundo e um
pequeno espaço que serviria de alcova.162

3.1. O DESENVOLVIMENTO DAS ILHAS


Chamamos hoje Ilhas a uma tipologia de bairros, geralmente operários. Ilhas porque, apesar
de deverem ser espaço de integração das pessoas na cidade, acabaram por ser espaços fe-
chados em si mesmos, como se cada uma fosse uma pequena aldeia. Tornaram-se espaços
encerrados e isolados dentro da cidade, comparáveis a conchas protectoras do que dentro
delas se encontra (Ilha).163
Segundo Gaspar Martins Pereira no recenseamento de 1832, existiriam já cerca de 200 “Ilhas
de pobreza”, localizadas nas mesmas áreas de expansão iniciadas no século XVIII, S. Victor,
Paraíso, Rua Bela da Princesa, Praça da Alegria, etc..164 Por seu lado, Manuel Teixeira dá a en-
tender que estes espaços são consequência do processo de industrialização da cidade, que se
deu na segunda metade do século XIX.
Não havendo consenso quanto a um momento específico do aparecimento da primeira Ilha,
pode-se apenas concluir que estas surgiram algures no séculos XIX e, quer tenham ou não
aparecido antes da industrialização da cidade do Porto, sabe-se com certeza que foi devido a
esse processo que elas se desenvolveram e espalharam por toda a cidade.
As Ilhas surgiram no Porto, e não noutro local, por aqui se encontrar um grande e complexo
conjunto de factores que propiciaram o seu aparecimento. Elas foram o reflexo da grande
procura e a escassa oferta de habitação barata. Foram também consequência da estrutura

159 TEIXEIRA, Manuel C; Habitação popular na cidade oitocentista : as Ilhas do Porto; Lisboa : F.C.G..
J.N.I.C.T; 1996; Pág. 54 a 56
160 Idem; Ibidem; Pág. 2
161 Idem; Ibidem; Pág. 149
162 Idem; Ibidem; Pág. 169 a 172
163 PEREIRA, Gaspar Martins; As Ilhas no percurso das famílias trabalhadoras do Porto em finais do século
XIX; Porto; 2010; Pág. 4
164 Idem; Ibidem; Pág. 3
92

Figura 105 - Fotografia do Bairro do Vilar Figura 106 - Bairro Alexandre Herculano, 2015

Figura 107 - Aproximação ao Bairro do Vilar, Telles Figura 108 - Aproximação ao Bairro Alexandre Hercula-
Ferreira,1895 no, Telles Ferreira, 1895

Figura 109 - Localização das Principais Ilhas do Porto, Telles Ferreira, 1895
93
urbana portuense, caracterizada por casas burguesas com frentes de 5 a 6 metros com tra-
seiras, que seriam os interiores de quarteirões imensos e sem qualquer função útil, mesmo a
condição económica de quem as edificava foi decisiva para a sua configuração final.
Como já foi mencionado, em Portugal, o crescimento industrial foi lento mas contínuo. Esta
característica verificou-se consequentemente no Porto, reflectiu-se numa classe industrial
que foi também crescendo progressivamente, ao contrário de outras cidades europeias que
foram caracterizadas, logo à partida, por uma forte e sólida classe industrial. Em Portugal,
como a indústria se encontrava associada a outras formas de produção pré-industriais, não
existiu nenhum período de ruptura súbita com o período anterior. Apesar disso, a expansão
da cidade não acompanhou o crescimento demográfico.
A população que vinha para trabalhar, naturalmente, tinha rendimentos muito baixos, com
recursos limitados que não lhe permitiam escolher as condições em que iria viver.
Esta realidade operária não chegou a tornar-se perfeitamente diferenciada na cidade do Por-
to, acabando por ser absorvida pela classe laboriosa já existente, não havendo, por isso,
zonas residenciais específicas. Estas foram edificadas onde havia procura, quer por parte do
proletariado, quer por lavadeiras, polícias, empregados do comércio, podendo-se, verificar a
difusão das Ilhas por toda a cidade e não apenas necessariamente em zonas industriais.
As Ilhas estão, portanto, espalhadas por toda a cidade, mas especialmente em torno de de-
senvolvimentos urbanos do século XVIII. Elas acabam por representar bem os recursos eco-
nómicos não só de quem as habita, mas também dos seus proprietários.

“As operações de pequena escala da maior parte dos seus construtores e os seus recur-
sos limitados constituíram as principais razões para a forma das Ilhas.” 165

As construções acabaram por ser executadas pela baixa classe média, que rapidamente viu
que este tipo de investimento comportava pouco risco, podendo verificar-se, assim sendo,
que esta tinha recursos de capitais limitados.
Não terá sido por pura ganância dos seus promotores, que não se preocupavam com as
condições de vida de quem nestes espaços habitava, que estes espaços se multiplicaram.
A verdade é que existiram algumas tentativas de empreendimentos idênticos que seguiam
os mesmos princípios base, mas procuravam dar mais dignidade aos seus habitantes. Estas
acabaram por se mostrar falhadas e foram a ruína dos seus investidores. São disso exemplo o
Bairro do Vilar, assim como o Bairro Alexandre Herculano.
De um modo geral, eram construídas gradualmente e cresceram no interior dos quarteirões
da habitação comum da classe média. Era uma solução bastante racional, já que promovia
uma utilização intensiva do solo e o uso de fracos materiais, minimizando os custos de cons-
trução. Por tudo isto foi replicada, mesmo quando os limites dos lotes não se impunham.
Edificadas em antigas zonas burguesas ou em locais ainda por urbanizar, as Ilhas eram sempre
implantadas em zonas sem interesse por parte da burguesia. Em certos casos até, o cresci-
mento de indústrias nas proximidades criava o desinteresse e consequentemente a desvalo-
rização da zona, transformando-se em local propício à construção deste tipo de habitação.
As áreas onde estas se implantaram eram as mais variadas, zonas como S. Victor, Paraíso, Pra-
ça da Alegria, Monte Belo, Rua Bela da Princesa, Largo da Fontinha, Rua do Breyner eram al-
gumas das zonas mais preenchidas com Ilhas na cidade. Noutras zonas mais periféricas, como
165 TEIXEIRA, Manuel C; Habitação popular na cidade oitocentista : as Ilhas do Porto; Lisboa : F.C.G..
J.N.I.C.T.. 1996.
94

Figura 110 - Ilha de Fernão Magalhães Figura 111 - Uma Ilha do Porto

Figura 112 - Interior de Ilha já demolida Figura 113 - Uma Ilha já demolida
95
Massarelos, Lordelo e Ramalde podemos também encontrar Ilhas, mas em menor densidade,
encontram-se estas últimas, geralmente, associadas directamente a indústrias.166
A área de S. Victor é talvez umas das áreas mais curiosas. No início do século XIX, tudo indica-
va que a Quinta da Fraga, actual zona de S. Victor, se viesse a tornar numa zona burguesa, já
que se encontrava no meio das duas zonas mais frequentadas pelas classes mais abastadas.
O Passeio das Fontainhas e o Jardim de S. Lazaro seriam “os jardins mais na moda e era aí que
a burguesia e a aristocracia da época davam seus passeios vespertinos e dominicais.”167 Terá
acabado, contudo, por se tornar no local por excelência das Ilhas da cidade. Segundo Manuel
Teixeira, o primeiro registo de Ilhas na área de S. Victor datará de 1844, sendo por isso, muito
provavelmente, um dos primeiros sítios em que esta tipologia acabou por se desenvolver.
A relação investimento/preço de rendas estava intimamente ligada. Um grande investimento
seria sinónimo de casa com mais qualidade, mas seria também sinónimo de rendas mais ele-
vadas que os operários não teriam condições de pagar.
No início do 1900 havia registo de cerca 10.100 fogos construídos em Ilhas, das quais 50%
foram edificadas no curto período de 12 anos, entre 1879 e 1890.168
Segundo Manuel Teixeira, foram apresentadas à Junta das Obras Públicas cerca de 2.709
casas para aprovação no período que se encontra entre 1864 e 1878, que não eram suficien-
tes para alojar as cerca de 19.000 pessoas que migraram para o Porto no mesmo intervalo
de tempo. Uma vez que o Porto não tinha a tradição de habitação colectiva, se essas 2.709
casas dessem tecto a 10.000 habitantes, sobrariam 9.000 que terão sido muito provavelmen-
te recebidas nas Ilhas, já que este tipo de construção não requeria aprovação municipal nem
licença de construção. Esta probabilidade é confirmada pelos dados dos Censos da População
onde se declara um aumento total de 3.526 fogos. Havendo uma diferença de cerca de 800
fogos entre os dois valores, tudo indica que esses fogos seriam a novas habitações construí-
das nas Ilhas.169
Nos períodos seguintes, o mesmo acontece. Assim de 1878 a 1890, cerca de 14.000 pessoas
habitariam as 4.700 casas com licença camarária, restando dos 33.000 novos habitantes cer-
ca de 19.000 para ocupar as 3.200 Ilhas que terão sido registadas posteriormente. Durante a
última década do século XIX, o número de edifícios novos era de 2.577. Considerando que a
taxa de crescimento demográfico tenha sido idêntica à do período entre 64 e 78 desse século,
existiriam cerca de 10.000 pessoas com novas habitações e cerca de 2.000 tectos terão sido
edificados para os restantes 9.000.170
Assim, se tomarmos estes números como certos, verificamos que de 71.821 recém-chega-
dos, cerca de 45% terá sido recebido em Ilhas e, por ventura, nalgumas quantas casas lotadas
nas edificações antigas da cidade.
Estas habitações com poucas condições acabaram por se tornar as casas de uma população

166 PEREIRA, Gaspar Martins; As Ilhas no percurso das famílias trabalhadoras do Porto em finais do século
XIX; Porto; 2010; Pág. 3
167 TEIXEIRA, Manuel C; Habitação Popular Na Cidade Oitocentista, As Ilhas Do Porto; Fundação Calouste
Gulbenkian Junta de Investigação Cientifica e Tecnológica; Lisboa; 1988; Pág. 236
168 MATOS, Fátima Loureiro de Matos; A Habitação no Grande Porto - Uma perspectiva geográfica da evo-
lução do mercado e da qualidade habitacional desde finais do séc. XIX até ao final do milénio; Doutoramento,
Faculdade de Letras da Universidade do Porto; 2001; Cap. 4.2.1; Pág. 15 (consulta online)
169 TEIXEIRA, Manuel C; Habitação popular na cidade oitocentista : as Ilhas do Porto; Lisboa : F.C.G..
J.N.I.C.T; 1996; Pág. 177 a 179
170 Idem; Ibidem; Pág. 162
96

Figura 115 - Ilha na Rua de S. Victor, 2015

Figura 114 - Ilha na Rua de S. Victor, 2015

Figura 117 - Bairro Alexandre Herculano, 2015

Figura 116 - Ilha, Rua de S. Victor, 2015

Figura 118 - Acesso para Ilha, Rua de S. Victor, 2015 Figura 119 - Ilha com dois pisos, Rua de S. Victor
97
crescente. Cerca de 32.000 novos habitantes da cidade, que chegaram entre 1864 e 1900,
encontraram nestes espaços alojamento, nova vida. Esta época é, portanto, o período con-
siderado de expansão das Ilhas, ainda que esta tipologia se tenha continuado a desenvolver
durante as primeiras décadas do século XX, embora com um crescimento mais moderado.171
Estes pequenos e escuros espaços eram geralmente fracamente ventilados, já que na maioria
das vezes teriam apenas uma porta, uma janela, e uma ou duas telhas deslocadas que re-
mediavam a falta da chaminé na pequena zona que serviria de preparação das refeições. No
exterior da casa, frequentemente ao fundo da Ilha, seriam encontradas as latrinas comuns
que serviriam as 10, 15 ou 20 famílias que lá habitavam. Por vezes tinham um poço, que aca-
bava por, muito frequentemente, estar contaminado pela proximidade das fossas e latrinas
da área.172 O próprio corredor que formava e organizava o espaço era por vezes invadido pelos
tanques, bancos e cadeiras de quem lá habitava. Era quase uma extensão da própria casa.
Aqui as pessoas também viviam, vizinhas comentavam vidas alheias e crianças corriam e
brincavam com outras ou com o que quer que apanhassem. Assim, nas Ilhas vivia-se de uma
maneira muito especial, acabando por transformar as vivências dos habitantes, a vizinhança
vivia como se de uma única e grande família se tratasse. Apesar dos corredores estarem ao ar
livre a maior parte deles eram tão estreitos que acabavam por se tornar também num espaço
escuro e tacanho.
É fácil perceber-se que apesar da proximidade das pessoas nestes espaços, e de geralmente
gostarem de viver nas Ilhas, as condições em que elas viviam não eram as mais saudáveis,
antes pelo contrário: estes espaços eram foco de epidemias, infecção e incêndios. Eram con-
sequências das condições precárias das habitações, mas também por uma grande falta de
preocupação com a higiene urbana, saneamentos, canalização de águas… De certa forma
pode dizer-se que o culminar desta situação aconteceu no final do século XIX, com o surto de
peste bubónica. 173
Seguindo as tendências europeias, começam aos poucos a desenvolver-se e a tomar medi-
das legislativas, um maior controlo das construções e das condições de habitabilidade face à
higiene urbana, como a criação de redes de esgotos, recolha de lixo, ... Em Inglaterra as preo-
cupações higienistas surgem em 1836, em França surgem um pouco mais tarde e são apre-
sentadas geralmente nos planos desenvolvidos por Haussman para Paris, entre 1853-1869.
Em Portugal só em inícios do século XX é que os problemas habitacionais e urbanísticos co-
meçaram a ser estudados. Contudo, medidas foram tomadas apenas mais tarde. A primeira
lei sobre este assunto, segundo Fátima Loureiro de Matos, terá surgido em Portugal por volta
de 1864 e visava limitar a altura dos edifícios. Mas não terá tido muita influência nas Ilhas, já
que estas teriam normalmente um só piso. Nos anos 80 do século XIX terão existido várias
propostas de lei que foram sendo rejeitadas. Propunham a implementação de condições mí-
nimas de higiene nas construções operárias.

“Desde a década de oitenta, multiplicam-se as referências produzidas pelas autorida-


des administrativas e policiais, médicos e higienistas, jornalistas e políticos, acentuan-
do o carácter patológico das Ilhas populares, encaradas como focos de infecção física,
que ameaçavam contagiar a cidade, e focos de infecção moral, punham em perigo os

171 Idem; Ibidem; Pág. 161 a 163


172 Inquérito de Imprensa; Citado em PEREIRA, Gaspar Martins; As Ilhas no percurso das famílias trabalha-
doras do Porto em finais do século XIX; Porto; 2010; Pág. 4
173 PEREIRA, Gaspar Martins; As Ilhas no percurso das famílias trabalhadoras do Porto em finais do século
XIX; Porto; 2010; Pág. 5 a 6
98

Figura 120 - Cordão Sanitário do Porto, 1899

Figura 121 - Desinfestação de uma ilha do Porto. Phot.ª Guedes, 1899


99
‘bons costumes’ e ‘família’”174.

Só em 1899 é que as entidades públicas se vêm obrigadas a tomar medidas extremas, aquan-
do do aparecimento da peste bubónica. Apesar desta se ter manifestado um pouco por toda
a Europa, terá sido o Porto a primeira cidade europeia a registar os casos da peste iniciada na
região de Yunnan, China. Também no Porto ela deixou mais marcas. Com cerca de 320 casos
e 132 mortes, esta terá sido a cidade europeia mais afectada pela peste. 175
Várias medidas de precaução foram tomadas, sendo que a mais dramática, na cidade do
Porto, terá sido o fecho da cidade, durante vários meses ficando sob um cerco militar o que
lhe trouxe graves consequências. Com os cuidados sanitários e o medo de contágio, o Porto
teve sérios problemas de abastecimento. O cordão sanitário que havia sido implementado
para proteger a restante população nacional, acabou por agravar a situação dos portuenses
que ficaram presos dentro do cerco sem qualquer tipo de comunicação com o resto do país.

“Principiou há dez dias esse espalhafatoso clamor de medidas sanitárias e não há


ainda um serviço que funcione regularmente; não há um plano de medidas sanitárias
sensatamente estabelecidas e criteriosamente posto em acção, nenhum benefício foi
concedido ao Porto senão este: - cortaram-lhe as comunicações, embargaram o seu
comércio, trucidaram-lhe a indústria.” 176

Só durante este surto, e com o choque da imposição do cordão sanitário, é que entidade
oficiais e classes mais elevadas se consciencializaram do problema das Ilhas, perceberam que
este lhes dizia também respeito e eram bem mais graves do que apenas o facto de serem “an-
tros de pessoas miseráveis” que não seguiriam os bons costumes. As Ilhas emergiram assim,
pela primeira vez, à face da cidade e foram expostas à luz dos seusmalefícios. Burgueses e
outras classes não puderam continuar a ignorar a sua existência, como haviam feito durante
as décadas anteriores.
Algumas precauções foram tomadas durante os anos que se seguiram, como o maior con-
trolo dos edifícios construídos, e regras exigindo a construção de fossas sanitárias nos novos
edifícios. Mais tarde, passa a ser instituído um sistema de vistorias e, ainda, a possibilidade
de expropriação de alojamentos insalubres. Iniciam-se inquéritos nas localidades mais popu-
losas do país, que visavam perceber o nível de salubridade.

“O R.G.S. (Regulamento Geral de Saúde) impõe como dever dos subdelegados de saú-
de, o vistoriar com a autoridade policial as habitações que pelas suas condições de
insalubridade exijam beneficiações, obras, ou demolição, e o proceder a visitas domici-
liárias, no caso de invasão ou ameaças de epidemia, ou motivo grave de saúde pública
(nº19 do art. 74)” 177

No Porto, a partir de 1905, surge um novo código que exige a aprovação da Delegação Distri-

174 PEREIRA, Gaspar Martins; As Ilhas no percurso das famílias trabalhadoras do Porto em finais do século
XIX; Porto; 2010; Pág. 5
175 O terceiro surto pandémico da peste apareceu mais de 200 anos depois do segundo surto de peste
negra, e é o primeiro que afecta efectivamente todo o planeta. Tomando assim escalas desmedidas.
176 Cit. Comércio do Porto a 29 de Agosto 1899; in Pontes, David, O Cerco da Peste no Porto, FLUP, Porto
2012 Pág. 72
177 GARRET, Almeida; Manual do Médico Sanitário; 1911; in SEIXAS, Paulo Castro; Higienistas: Textos
que Fizeram Cidade; in Literatura e Medicina. I Encontro de Estudos sobre Ciências e Culturas, ed. Isabel Patim
(Org.); Porto: Ed. Universidade Fernando Pessoa.
100

Figura 122 - Projecto do Bairro do Comércio do Porto, Monte Pedral, de Marques da Silva, 1899
101
tal do Conselho de Melhoramentos Sanitários para a construção e reconstrução de edifícios.
Nessa altura, os construtores passaram a ser obrigados a apresentar o projecto completo de
qualquer construção nova, independentemente da sua relação com a rua, passando então a
incluir as Ilhas. Assim, estas ou passavam a cumprir com as novas regras ou seriam construí-
das ilegalmente.
Apesar destas novas regras demonstrarem uma vontade, por parte do município, de melho-
rar as condições de habitabilidade na cidade, não propõem alternativas de alojamento para
as classes trabalhadoras, pelo que o número de Ilhas continua a aumentar no início do século
XX, ainda que agora ilegalmente.

3.2. REFORMA HIGIENISTA


As primeiras canalizações de água e esgotos terão sido iniciadas no ano de 1904, mas até
1925 o número de prédios privados que se encontravam ligados a esta rede era insignificante,
sendo apenas de 25. Foi desde então que a rede de águas da cidade se começou a estabele-
cer em grande escala, tendo em 1933, o número de prédios com água canalizada aumentado
para 2178.
As classes laboriosas continuariam a habitar, no entanto, em condições miseráveis, e encon-
travam-se no início dos anos 30 sem qualquer tipo de canalização. Como já se havia provado
por Pacheco Pereira e pelos Pinto Basto, com a construção do Bairro de Vilar e de Alexandre
Herculano, respectivamente, a iniciativa de dar condições mais dignas a esta classe de traba-
lhadores não poderia partir de fundos privados, pois eles exigiriam rendas mais altas, que os
habitantes das Ilhas não poderiam pagar e, consequentemente, os seus patrocinadores não
veriam o retorno do seu investimento, o que os levaria à falência. Percebe-se que as medidas
a serem tomadas para a construção de habitação económica teriam de partir de grandes ins-
tituições privadas com fundos suficientes para promover estas acções filantrópicas. O Estado
deveria apenas promover esse investimento privado, procurando assim melhorar as condi-
ções habitacionais das classes trabalhadoras.
O primeiro feito deste tipo, na cidade do Porto, terá sido realizado por parte do jornal O Co-
mércio do Porto, logo no ano do aparecimento da peste, com a criação de uma subscrição
pública que visava a construção de colónias operárias, como as do Monte Pardal, Lordelo,
Bonfim. Os fundos foram conseguidos através dos donativos de vários cidadãos, bem como
da contribuição de alguns elementos da comunidade portuense emigrada no Brasil.

“Os bairros não foram feitos para abrigar operários indigentes; foram construídos para
recolher mais hábeis, mais assíduos e mais morigerados operários, antes como prémio
aos seus méritos do que como auxílio às suas condições de existência” 178

Apesar das boas intenções, para além do nome de “Bairro Operário”, de operário pouco mais
tinham os bairros. É verdade que as rendas seriam bem mais baratas que as de casas idênti-
cas em situações e locais semelhantes. As suas rendas mensais que rondavam cerca de 1$500
reis que continuavam a ser, à vontade, 1$000 reis a mais do que os tecelões conseguiriam
pagar com os seus humildes salários. Acabaram, assim, a ser ocupadas por empregados pú-
blicos ou particulares de classes bem mais remuneradas.179

178 O Comércio do Porto, de 13 de Dezembro de 1903


179 MATOS, Fátima Loureiro de Matos; A Habitação no Grande Porto - Uma perspectiva geográfica da evo-
102

Figura 123 - Bairro do Bonfim, 2015 Figura 124 - Bairro do Bonfim - Monte das Antas, 2015

Figura 125 - Abertura da Rua Mouzinho da Silveira

Figura 126 - Ruas Mousinho da Silveira e das Flores, cerca de 1900


103
Várias vezes, já, se tinha discutido o conceito de o Estado estar presente e ser inclusivamente
responsável por estas habitações económicas. A ideia do Visconde de Guedes Teixeira180, que
visava mobilizar os bancos da cidade para a construção desses bairros operários, não teve
qualquer sucesso, tendo sido, apesar de tudo, um pensamento pioneiro, que ficou esquecido
no tempo. Já em 1901, Guilherme de Santa Rita181 propõe que 1/3 dos terrenos pertencentes
aos Conventos do Porto e Lisboa fossem cedidos para a construção de habitações económi-
cas. Foi, contudo, mais uma proposta esquecida.
Assim, apesar dos esforços para acabar com a edificação das Ilhas, o seu número continuou
a aumentar. Em 1899 estariam registadas cerca de 1048 Ilhas na cidade do Porto e 30 anos
depois, existiriam registadas 1301, perfazendo um total de 14676 casas. Por parte das classes
mais cultas (médicos, políticos, sociólogos) a palavra de ordem era “demolição”, como se
demolindo estas casas os seus habitantes fossem arranjar melhores habitações que ninguém
havia preparado para os receber, podendo, como aconteceu noutros locais, gerar piores si-
tuações, como os bairros de lata em Lisboa, ou as favelas nos arredores do Rio de Janeiro no
Brasil.
A tendência higienista e haussmaniana, terá vingado até à implementação da Primeira Repú-
blica Portuguesa e reflectir-se-á no Porto em acções como o encanamento do Rio da Vila, ain-
da hoje coberto pela rua Mouzinho da Silveira, bem como a abertura da Avenida dos Aliados.
Em 1909, Caeiro da Matta no seu livro Habitações Populares, constata que até aí, nem o Es-
tado nem as Câmaras Municipais haviam intervindo em prol das classes mais desfavorecidas.
Haveria já algumas medidas que promoviam o investimento privado, mas face ao desinteres-
se por parte dos investidores, as iniciativas acabaram por ser desenvolvidas pela Câmara.182
São disto exemplos o Bairro de Sidónio Pais, as colónias de Antero de Quental, Estêvão Vas-
concelos, Dr. Manuel Laranjeira e Viterbo Campos construídos entre 1914 e 1917 um total de
cerca de 345 casas. Apesar disso, as classes trabalhadoras continuaram a ocupar as Ilhas e os
edifícios sobreocupados do centro antigo.183
Tudo isto é agravado com a 1ª guerra mundial, que marca uma segunda fase de migração
de população rural para as cidades, acentuando a crise habitacional que teria começado em
meados do século anterior e ainda não havia sido resolvida. Daí que o número de Ilhas con-
tinue a aumentar.
A edificação das Ilhas torna-se tão comum que acaba por invadir zonas da cidade que esta-
riam preparadas para receber classes mais abastadas. A imagem da cidade na Europa era
cada vez pior. A condição em que a população mais pobre vivia já estaria abaixo dos limites
mínimos de habitabilidade, e a tendência seria para piorar, face à inflação que se sentiu du-
rante a 1ª guerra, uma vez que não terá sido acompanhada por aumentos salariais.

lução do mercado e da qualidade habitacional desde finais do séc. XIX até ao final do milénio; Doutoramento,
Faculdade de Letras da Universidade do Porto; 2001; Capítulo. 4.2; Pág. 25 (consulta online)
180 Visconde Guedes Teixeira (1843-1890), advogado, empresário agrícola e político, de 1883 a 1885 foi o
governador civil do Porto, escreve em 1885 uma – “Circular dirigida aos Bancos do Porto sobre a construção de
casas para operários na mesma cidade, procurava assim que os bancos mobilizassem fundos para a edificação de
habitações operaria.
181 Guilherme Augusto de Santa Rita, deputado do parlamento e proponente de legislação habitacional,
escritor de Habitação Operária e classes Menos Abastadas, 1891
182 MATOS; Fátima Loureiro de Matos; OS Bairros Sociais No Espaço Urbano; in Análise Social, vol. xxix
(127), 1994 (3º); Pág. 683
183 Idem; Ibidem; Pág. 684
104

Figura 127 - Bairro das Condominhas, Fotografia Alvão, sd.


105
Contudo, apenas com o fim da Primeira República Portuguesa, em 1926, é que se voltou ao
problema da habitação precária. Com a implantação do Estado Novo, foram criados novos
decretos que procuravam estimular mais uma vez a construção de habitação operária. Isen-
ções fiscais por períodos prolongados, bem como a expropriação mais expedita de terrenos
foram duas das mais importantes medidas tomadas. Ainda assim, não foi o suficiente para
que as entidades privadas se sentissem confiantes a fazer esse tipo de investimentos, já que a
isenção fiscal não seria suficiente para compensar um retorno baixo, face ao capital investido.
No ano de 1933, o governo cria o programa de habitações operárias. Estas deveriam ser
habitações unifamiliares, de um ou dois andares, cada uma teria o seu jardim, poderiam ser
geminadas ou independentes e procurariam ocupar bairros periféricos da cidade com o intui-
to de promover a sua expansão, bem como a criação de novos centros urbanos. Procurava-se
diluir, de certa forma a densidade populacional existente no centro da cidade.

3.3 PORTO DOS BAIRROS CAMARÁRIOS


No Porto, estes bairros foram edificados, espalhados pelas Condominhas, Ameal, Azenha,
Paranhos, Ramalde, Gomes da Costa e Ilhéu, apesar das rendas irem desde 80$ até 200$
reis, estas não se demonstravam suficientemente baixas para os trabalhadores que deveriam
ocupar estes espaços, já que, nas Ilhas as rendas mensais rondariam os 50$. Isto, aliado aos
difíceis acessos que estes bairros periféricos possuíam, fez com que, mais uma vez, estas ha-
bitações fossem ocupadas por uma classe média.
Considerando que entre 1935 e 1950 foram edificados um total de 12 bairros de casas econó-
micas, perfazendo um total de cerca 1662 fogos, é fácil perceber que estas não estavam perto
de substituir as aproximadamente 10 000 habitações que, segundo o resultado da análise do
inquérito às Ilhas de 1939, teriam de ser demolidas. Estas habitações eram mais consequên-
cia de preocupações políticas do que preocupações humanitárias e higienistas, tendo por
isso segundo Manuel C. Teixeira pressupostos “propagandísticos e ideológicos, e os principais
beneficiários não eram as classes mais pobres e carenciadas”184.
A Câmara do Porto, paralelamente à construção destes bairros, procurou tomar outras me-
didas que visavam reflexos directos nas Ilhas, bem como resolver os problemas dos que che-
gavam à cidade. Uma das medidas foi o inquérito promovido por Almeida Garrett, onde se
constatou que cerca de 30% das habitações visitadas não recebiam sol, e nem 1% teriam es-
gotos. Os resultados previam que fossem necessárias 16 000 novas habitações cuja constru-
ção, face aos baixos rendimentos da população, só seria possível com a edificação de blocos
habitacionais colectivos que, para minimizar a alteração da vida dessas pessoas, deveriam
ser próximos das áreas em que estas viviam. Assim, mantinham a vizinhança, distância para
o trabalho, o seu quotidiano. Todos estes ideais eram opostos aos do Estado Novo, uma vez
que seguindo a filosofia de Salazar, “a intimidade da vida familiar reclama aconchego, pede
isolamento, numa palavra, exige a casa independente, a nossa casa…”185 e seguiriam antes,
de certa forma, os ideais da cidade-jardim britânica, que seriam edificados em zonas periféri-
184 TEIXEIRA, Manuel C; Estratégias de Habitação em Portugal, in Analise Social, vol. XVIII (115),1992 (1º),
Pág. 83
185 O. Salazar, “Discursos e notas politicas”, Coimbra Editora, Coimbra, 1935, Vol. I; Citado em: SARAIA,
Luís; Ideologia e Habitação: Os modelos de habitação do Estado Novo; Sebentas de Arquitectura; universidade
Lusiada; Lisboa; 1999; Pág 38
106

Figura 128 - Projecto do Núcleo de Saldanha, Porto Figura 129 - Vista do Pátio do Bloco Saldanha, 2015

Figura 130 - Vista do Interior do Pátio do Bloco Figura 131 - Vista do Interior do Pátio do Bloco
Saldanha, 2015 Saldanha, 2015

Figura 132 - Bloco de Duque de Saldanha, Antes da Construção do Bloco que fecha o mesmo para a Rua, 1939
107
cas e pouco urbanizadas da cidade.
Desta forma, o município viu-se forçado a criar uma nova estratégia para tentar acabar com
as insalubres Ilhas da cidade. Em 1938 a municipalidade já teria iniciado a edificação do Bloco
de Saldanha. A estratégia seria construir os novos blocos de habitação o mais perto possível
das habitações a destruir, neste caso especifico as de S. Vítor, uma das zonas da cidade que
mais Ilhas possuía. Este bloco em forma de U teria cerca de 115 habitações, dividas por vários
andares, e seria composto ainda por um pátio interior.186 Este tipo de habitação colectiva era
como acima referido, contra os ideais do regime salazarista, visto como perigoso para a or-
dem social, pelo que, por não respeitar as normas exigidas pelo Estado, o município passou
a ser mais controlado.
A Câmara do Porto viu-se forçada a respeitar as normas impostas, sob pena de não ver finan-
ciadas as suas obras. O segundo bairro camarário edificado na cidade terá sido então o Bairro
de Rebordões, em 42, constituído por 145 casas geminadas, com dois pisos e edificado nos
limites da cidade. 187
A edificação do Bloco de Duque de Saldanha foi, contudo, um marco importante na história
da cidade, pois este terá sido aquele em que a Câmara assumiu o problema das Ilhas como
responsabilidade sua, e mostra também uma vontade de resolver directamente os seus pro-
blemas habitacionais.
Paralelamente, as iniciativas de habitação social do Estado foram poucas, mas existiram algu-
mas privadas, como a da empresa Azevedo, Sousa & Cia, que constrói cerca de 42 casas perto
da sua fábrica na Areosa, ou os dois edifícios colectivos patrocinados pelos CTT, em Ramalde.
Alguns dos bairros construídos desde então teriam por vezes edifícios plurifamiliares, segui-
riam, no entanto, os decretos do Ministério das Obras Públicas e ocupavam por isso, geral-
mente, terrenos mais periféricos. O ritmo a que estes eram edificados não estava mais uma
vez, perto de ser suficiente para as necessidades da cidade. Foi apenas nos anos 50, que por
consequência do surto demográfico, o Governo viu a necessidade de planos de expansão
urbana nacional. Aqui teriam que estar incluídos planos de melhoramento das cidades mais
populosas do país, em que o Porto estaria incluído e, nesse plano, é clara a importância da cri-
se habitacional que se vivia na cidade do Porto. As Ilhas seriam melhoradas, se possível, caso
contrário, eliminadas, e habitações dignas seriam providenciadas para receber os extractos
mais baixos da sociedade portuense.
O ideal, segundo o plano, seria a demolição das 12 000 casas insalubres que se encontravam
registadas, mas tal plano não era viável, pelo que se procuraram alternativas credíveis. Havia
que ter em conta que o objectivo primário desta acção seria dar condições dignas a 50 000
pessoas que habitavam estes espaços.188
A sobrelotação dos espaços era uma das causas de falta de condições mínimas. Assim, um
primeiro plano de salubrização das Ilhas passaria por procurar reduzir o número de pessoas
que viviam em cada Ilha e posteriormente reabilitar o espaço, criando saneamento privado,
canalização de água e instalação de electricidade, criando melhores condições.
Por cada duas casas alinhadas, uma terceira seria demolida, libertando assim uma empena
que levaria à casa mais sol e, também, a possibilidade de melhor ventilação. Isto verificou-se

186 MATOS; Fátima Loureiro de Matos; OS Bairros Sociais No Espaço Urbano; in Análise Social, vol. xxix
(127), 1994 (3º); Pág. 691
187 Idem; Ibidem; Pág. 691
188 PORTO, Câmara Municipal; Plano de salubrização das Ilhas; CMP Porto; Pág. 7
108

Figura 133 - Plano do Bairro Fonte da Moura Figura 134 - Bairro Fonte da Moura

Figura 135 - Vista Aérea do Bairro da Pasteleira

Figura 136 - Localização dos Bairros Camarários e demolições do Plano de Melhoramentos, 1956
109
pouco eficaz. A falta de apoio ao realojamento das pessoas provou que, apesar de melhorar
a situação da Ilha que estava a ser reabilitada piorou o panorama geral, já que estas pessoas
iriam realojar-se noutras Ilhas, geralmente próximas das que teriam sido obrigadas a aban-
donar. Se esse problema de realojamento tivesse sido resolvido, e se fossem seguidas as
consideradas condições mínimas de habitabilidade, teriam de ser edificadas cerca de 4000
casas para que o plano fosse um sucesso. Entre o inquérito e o aparecimento do Plano de
Melhoramentos, de 1956 os critérios seriam já outros, pelo que, para respeitar os mínimos
regulamentares cada duas casas de Ilha contiguas teriam que ser unidas numa casa única,
sendo portanto necessária a construção de 6000 novas habitações.189
O Plano de Melhoramento da Cidade de 1956 teria, então, prevista a construção de cerca de
6000 novos fogos, e introduz uma nova forma de estruturação urbana, o empreendimento,
que pela primeira vez se descola das formas urbanas tradicionais no Porto, as ruas e as Ilhas.
A grande diferença seria que estes não teriam uma relação directa com a rua. 190
Este Plano de Melhoramento da Cidade, terá sido criado como um projecto a 10 anos, e não
visava resolver o problema de insalubridade das Ilhas por inteiro, mas antes alterar radical-
mente a situação que se vivia. Neste plano estava prevista a construção de novas casas em
«bairros colectivos» na zona pericentral entre Lordelo e Campanhã, sendo o primeiro bairro
social de habitação plurifamiliar edificado no Viso. A construção em altura controlada é ne-
cessária, por ser uma solução mais económica. Essa, bem como a construção dos diferentes
blocos poder ser independente do alinhamento da rua, tirando assim um melhor partido
técnico e económico, dos terrenos disponíveis. Foram duas medidas necessárias, para tornar
viável todo o plano. Este teria dois lados muito positivos: por um lado, libertaria os terre-
nos centrais valorizados pelo potencial uso que poderiam ter, quer para fins comerciais quer
para serviços, por outro lado serviria como impulsionador de expansão da cidade por ocupar
maioritariamente zonas periféricas, para as quais seriam criadas novas redes de transportes
e serviços. 191 Não deixa contudo de ser um plano capitalista que procura, como foi menciona-
do, libertar terrenos que têm hoje mais valor desocupados do que com Ilhas.

“A solução da casa individual, sendo socialmente talvez a melhor, é incontestavelmente


a mais cara e,…, até na conservadora Inglaterra, a pressão económica tem conduzido
a abandonar a tradição.”192

As rendas das novas habitações seriam entre 90$ e 150$, e o investimento total seria de 270
000$. O Município iria aferir um empréstimo de 190 000$ a pagar em 30 anos, com juros de
2%, no máximo. Pela primeira vez, o Município procura ser merecedor do seu título de cida-
de, procurando melhorar as condições de saúde físicas e mentais da população, esperando
uma melhoria de aspectos de cariz moral.193
Apesar desta iniciativa ter como base uma boa intenção, a de melhorar a vida e as condições
de higiene da população que habitava as Ilhas, a maneira como foi levada a cabo não terá
sido a mais democrática.

189 PORTO, Câmara Municipal; Plano de salubrização das Ilhas; CMP Porto; Pág. 5 a 9
190 PORTO, Câmara Municipal; Plano de Melhoramentos 1956-66; PORTO;1966; Pág. 8
191 Idem; Ibidem
192 PORTO, Câmara Municipal; Plano de salubrização das Ilhas; CMP Porto; Pág. 16
193 MATOS; Fátima Loureiro de; A Habitação no Grande Porto - Uma perspectiva geográfica da evolução
do mercado e da qualidade habitacional desde finais do séc. XIX até ao final do milénio; Doutoramento, Faculda-
de de Letras da Universidade do Porto; 2001; Cap. 4.6; Pág. 12
110

Figura 137 - Capa do Plano de Melhoramentos Figura 138 - Bairro Fonte da Moura

Figura 139 - Plano Regular da Cidade do Porto - Planta Síntese 1952

Figura 140 - Planta Síntese do Plano Director do Porto, 1956


111
Quando uma Ilha era demolida, os seus habitantes eram recambiados para estes novos aloja-
mentos que haviam sido edificados na periferia. As pessoas viam-se assim obrigadas a alterar
forçosamente o seu quotidiano, obrigadas a abandonar as ruas que, por vezes, os tinham
visto nascer. Isto não era contudo o mais dramático, estas pessoas não tinham uma palavra a
dizer sobre a sua futura localização, geralmente as diferentes famílias da Ilha eram separadas
umas das outras, por vezes encontravam-se no mesmo empreendimento, mas sempre em
blocos afastados. A ideia seria evitar de certa forma o bairrismo, mas a verdade é que, com
estas novas locações, muitas pessoas perderam a sua família alargada, acabando por criar
nos moradores uma enorme sensação de desenraizamento e descontentamento, sendo obri-
gados a reestruturar agora a sua vida.
Ainda não foi referido, ou pelo menos não ainda na intensidade necessária, que, apesar das
péssimas condições de habitabilidade que se viviam nestas Ilhas, a população que lá habitava
era feliz. O facto do corredor da Ilha ser usado como extensão da casa, tornava-o quase como
a sala de convívio, onde a família alargada se reunia. Pelo facto de as Ilhas serem fechadas
à cidade, as pessoas viviam muito próximas umas das outras e criavam dinâmicas de vida
muito próprias, e muito humanas, ao contrário daquilo que se percebe quando se lêem os
inquéritos realizados desde o fim do século XIX, que nos chegam a fazer crer que aqueles
que ocupavam esses espaços não seriam mais do que miseráveis almas, que quase não eram
merecedoras do título de “humanos.”194 Quando na realidade humanidade não lhes faltaria,
por não terem muito eram humildes:

“ E, utilizando a consabida frase da minha avó: onde quatro passam fome, cabem cin-
co... E sempre havia uma malga de caldo para uma vizinha em maré de azar ou um
pedinte a quem era reconhecido o “estatuto” de pobre de pedir ...” 195

As pessoas, que tinham sido obrigadas a mudar para estes novos bairros, deveriam seguir um
conjunto de regras, um código camarário, que se não fosse cumprido era sinónimo de expul-
são. Quem fosse expulso, voltaria para a sua antiga Ilha, caso esta ainda existisse, se não, iria
ocupar uma outra qualquer, ou vaguear pelas ruas. Torna-se fácil perceber que alguns não
aceitariam estas mudanças de bom grado.
O Plano de Melhoramentos que acabou por ser desenvolvido em duas fases, uma primeira
donde resultam 6072 fogos e uma segunda que terá edificado 2179 novas habitações. O re-
sultado terá sido positivo, já que 20% da população fora realojada em casas com melhores
condições, em zonas periféricas. Durante os 17 anos de plano, foram edificados 8251 fogos,
tornando a cidade do Porto o maior senhorio da cidade e do país, segundo Fátima Loureiro.196
É na sequência deste Plano de Melhoramentos da Cidade que surge a necessidade do muni-
cípio de reestruturar o Gabinete de Urbanização da cidade. Isto porque, com a edificação dos
15 complexos residenciais previstos, 197 compostos geralmente por diversos blocos de habita-
ção colectiva, perdia-se a ideia de bairros-jardins que o estado havia apoiado até então, e que
estavam também na base do Plano Regulador da cidade de Almeida Garrett, realizado poucos
194 Azevedo, António de; Habitações Operárias em Portugal: Relatório; Impressão da Universidade; Coim-
bra; 1905; Pág. 3
195 COUTO, Júlio; in AVV; Ilhas; PANMIXIA, Associação Cultural; Porto; 2004; Pág. 10
196 MATOS, Fátima Loureiro de ; A habitação no grande Porto : uma perspectiva geográfica da evolução do
mercado e da qualidade habitacional desde finais do séc. XIX até ao final do milénio; Prova de Doutoramento;
Faculdade de Letras da Universidade do Porto; 2001
197 GRANDE, Nuno; em Jacques Gréber: Urbanista e Arquitecto de Jardins; Porto; Fundação de Serralves;
2011; Pág. 195
112

Figura 141 - Manifestação Porto, 1 de Maio, 1974


113
anos antes, em 1952. Este era “marcado por um imaginário ruralista”198, na tentativa de man-
ter o caracter bucólico da cidade, não dando resposta a novas realidades, como, por exemplo,
o continuo aumento da população e a cada vez maior presença do automóvel na cidade.
Assim, e após a aprovação do Plano de Melhoramentos, torna-se pertinente alterar o plano
geral da cidade, uma vez que este tinha princípios incompatíveis com os da cidade planeada
por Almeida Garrett. Para esta reorganização do plano, a camara terá convidado Auzelle para
coordenador da equipe.199
O Plano Director da Cidade ou Plano Auzelle procura criar uma articulação do centro conso-
lidado da cidade e os novos conjuntos habitacionais, evidenciando uma grande preocupação
na criação de infra-estruturas que permitam uma fácil mobilidade para a população.200 Au-
zelle assume o plano como subjectivo, na medida em que devia ser entendido como uma
guideline. A seu ver, o plano da cidade não deve ser estático, já que a cidade se encontra em
constante mudança e desenvolvimento, prevendo uma constante mudança das necessidades
da mesma. O desenho deste plano surge também de um debate constante, entre a equipa
de profissionais, já que várias propostas seriam estudadas para cada zona e posteriormente
seria produzido um projecto que conciliava o melhor das várias propostas apresentadas.201
O Plano Director é caracterizado por um zoneamento funcional. Na sua proposta, Auzelle
dá grande importância ao vazio, usando o desenho dos espaços abertos como elemento or-
ganizador da cidade, como acontece no caso da VCI, em cujo interior encontramos a cidade
consolidada e no exterior a cidade moderna e funcional, ou ainda a criação de vários novos
parques, ou vazios. Tanto o Plano de Melhoramentos, como de Auzelle acabam por ser inter-
rompidos pela Revolução de Abril, que pretendeu dar ao povo o poder de decisão.

3.4. O PROCESSO SAAL


Em Junho de 1974, o Secretário de Estado de Habitação e Urbanismo, Nuno Portas, cria os
Programas de Acções Prioritárias202 que deveriam ser consideradas pelo Fundo de Fomento
de Habitação, onde surgia o SAAL, Serviço Ambulatório de Apoio Local, por despacho conjun-
to dos Ministérios da Administração Interna e do Equipamento Social e do Ambiente, a 4 de
Agosto de 1974.

«o SAAL foi terreno para uma reflexão sobre a cidade e o estabelecimento de novas
metodologias de intervenção, que tendo como principio os mecanismos da democracia
directa, garantissem o direito à cidade e ao lugar, como travões à sua estratificação
classista e à especulação imobiliária, bem como o compromisso com todo o património
edificado e com os seus valores históricos e culturais associados.»203

O SAAL seria o corpo técnico especializado do F.F.H. e teria como principal função iniciar um

198 Idem; Ibidem; Pág. 191


199 Idem; Ibidem; Pág. 195
200 Idem; Ibidem; Pág. 195
201 Idem; Ibidem; Pág. 197 a 199
202 PEREIRA, Gaspar Martins; SAAL: um programa de habitação popular no processo revolucionário Histó-
ria. Revista da FLUP Porto, IV Série, vol. 4; 2014; Pág. 15
203 COSTA, Alexandre Alves; in: BANDEIRINHA, José António; O processo SAAL e a arquitectura no 25 de
Abril de 1974 - Coimbra : Imprensa da Universidade, 2007; Pág. 10
114
diálogo directo entre as Câmaras e as populações mal alojadas, dando assim aos habitantes
a possibilidade de colaborarem com papéis activos na transformação dos seus bairros, ini-
ciando-se desta maneira um processo de construção participativa, idêntico ao iniciado na
América Latina204.
Teve presente uma enorme influência de John Turner que procurava examinar as vantagens
e desvantagens da participação da população na produção das suas próprias casas.205 Turner,
como outros nesta altura, questiona o papel do arquitecto na sociedade, defende que as
habitações servem o acto de Habitar (housing as a verb), devem respeitar, acima de tudo, a
vontade de quem habita. Questiona ainda o conceito de dimensões mínimas de habitação,
assente na ideia de que, quando uma habitação é bem pensada para o seu utilizador pode,
por vezes, poupar espaço e, consequentemente, verbas, que as classes mais pobres não têm.
Defendendo “um sistema aberto onde o resultado final é o produto de um diálogo entre rule
makers (arquitectos) e os game players (habitantes), sem os quais não poderia existir liber-
dade.”206
John Turner procura ainda perceber os meios legais e todo o sistema governamental, que
é influenciado e corrompido pelas suas próprias agendas, deixando o problema da falta de
habitação esquecido ou tratando-o de forma leviana, como os casos das favelas, em que se
destroem as barracas sem que antes sejam criados novos alojamentos para os seus habitan-
tes, que consequentemente irão ocupar ou começar um novo bairro ilegal, com ainda menos
condições do que as que tinham no local anterior.
O processo do SAAL desenvolveu-se com base no simples despacho, que, segundo o próprio
Nuno Portas refere no seu artigo publicado na Revista Crítica de Ciências Sociais, foi uma
acção “mal definida à partida, como risco assumido e não como um defeito.”207 Assim, tudo
estava resolvido e nem sempre se sabia o passo seguinte a tomar, a revolução aconteceu, o
povo sentia, pela primeira vez em anos, a força que tinha. Ao mesmo tempo, não se sabia
quanto duraria este sentimento, se se fosse estudar tudo primeiro, para aplicar mais tarde,
provavelmente, nada teria acontecido.208 O SAAL pode ser encarado, então, como um serviço
SOS mais expedito, que estava ao serviço da população. O governo dispunha de mão-de-obra
especializada, de modo a que as condições de higiene mínimas fossem respeitadas, o restan-
te era discutido com as cooperativas e associações de moradores, de modo a encontrar as
soluções mais baratas e proveitosas para todos. Tudo o que fosse de ordem legal, era tratado
quando o tempo o permitisse.

«Tratou-se portanto de uma iniciativa do governo, que tinha um caracter experimental


uma vez que ela não dependia exclusivamente do governo, mas dependia sobretudo do
outro lado, dos destinatários, dos interessados.»209

204 BANDEIRINHA, José António; O processo SAAL e a arquitectura no 25 de Abril de 1974 - Coimbra : Im-
prensa da Universidade; 2007; Pág. 130 a 132
205 TURNER, Jonh F., e FICHER, Robert ; Freedom to Build; The Macmillan Company, New Yor; 1972; Pág.
VII
206 Idem; Ibidem; Pág. 172
207 Portas, Nuno; O Processo SAAL: Entre o Estado e o Poder Local; in: Revista Critica de Ciências Sociais
nº18/19/20 Fevereiro de 1986; Pág. 637
208 Neste seu artigo Nuno Portas deixa claro que o movimento não teria tido qualquer impacto se o pro-
cesso tivesse esperado pelos meios legais, geralmente seguidos. Note-se que pelas via geralmente seguidas uma
operação iniciada pelo F.F.H demorava uma média de 7 anos desde de que era tomada a posição política até ser
possível habitar as casas edificadas. E todo o movimento SAAL foi desenvolvido em apenas 2 anos.
209 Portas, Nuno; O Processo SAAL: Entre o Estado e o Poder Local; in: Revista Critica de Ciências Sociais
115
Nenhuma acção do SAAL seria iniciada, sem pedido formal prévio, por um grupo de mora-
dores que viria mais tarde a integrar uma Associação que faria parte activa de toda a acção,
desde a fase inicial de elaboração de um plano, até à fase final de construção. Estava muito
presente a ideia de pertença e de luta pelo direito à cidade, os moradores teriam o direito
a escolher permanecer nas zonas onde viviam, em vez de serem obrigados a deslocarem-se
para a periferia. No Serviço Ambulatório de Apoio Local, o povo era encarado pela primeira
vez como igual, como alguém com uma voz e direito a ser ouvido.

«Muito para além do recurso a modelos, e sem contudo abdicar deles, os arquitectos
das brigadas percorreram caminhos que permanentemente se bifurcavam, entre o ri-
gor pragmático da discussão do programa, com a participação do “povo” e a dimensão
empírica do objecto arquitectónico.»210

A ideia deste serviço de estado foi revolucionária, não só em Portugal, mas também no resto
da Europa, onde estes empreendimentos sociais eram feitos com base num plano inteira-
mente decidido pelo próprio estado, sendo a vontade dos futuros moradores, bem como
os seus recursos, inteiramente ignorados. Não se refere apenas a recursos monetários, mas
também a outro tipo de activos, como a mão-de-obra.211
Conclui-se que, para tal acontecer, não se poderia recorrer a um projecto-tipo que seria mul-
tiplicado de norte a sul do país, cada caso isolado teria de ser visto e estudado como único.
Isto implicaria, assim, a multiplicação dos técnicos que estariam envolvidos no processo.
No caso do Porto, por exemplo, muito desse apoio veio da forte ligação estabelecida com o
SAAL e a ESBAP, hoje divida na FAUP e FBAUP, (Faculdade de Belas Artes da Universidade do
Porto). Os diversos cursos encetaram uma enorme cooperação interdisciplinar, começando
logo, pela divulgação do programa com elaboração de cartazes que davam a cara ao movi-
mento, e às acções, numa altura em que a palavra de ordem era “CASAS SIM, BARRACAS
NÃO”.
Ainda sobre esta ligação SAAL-NORTE /ESBAP, Francisco Barata afirma :“todo este processo
de experimentação pedagógica foi fundamental para recuperação de uma postura respon-
sável, crítica e autónoma, face à aprendizagem. A contestação do modelo de ensino salaza-
rista-marcelista a que estivemos condicionados da primária à universidade, corresponde à
tomada de consciência de que não há aprendizagem sem liberdade de se criticar tanto aquilo
que se pretende ensinar, como as próprias opções metodológicas. Foi neste processo que se
reconquistou o respeito e atração pela ideia de Escola.”212 Sendo importante notar que este
momento acaba por se traduzir, muitas vezes, num primeiro contacto dos estudantes com a
prática de arquitectura.

«Esta dupla acção (ESBAP/SAAL-NORTE) foi extremamente rica para o conhecimento


da realidade social em que se trabalhava, da cidade e do próprio papel da arquitectura
e do arquitecto.»213

nº18/19/20 Fevereiro de 1986; Pág. 637


210 BANDEIRINHA, José António; O processo SAAL e a arquitectura no 25 de Abril de 1974 - Coimbra : Im-
prensa da Universidade; 2007; Pág. 259
211 PORTAS, Nuno; O Processo SAAL, Entre o Estado e o Poder Local; in Revista Crítica de Ciências Sociais,
nº18/19/20 Fevereiro 1986; Coimbra; Pág. 639
212 FERNANDES, Francisco Barata; Transformação e permanencia na Habitação Portuense; As Formas da
Casa na Forma da Cidade; Publicações FAUP; Porto; 1999; Pág. 6
213 Idem; Ibidem; Pág. 32
116

Figura 142 - Porto, Maio de 1975 Figura 143 - Manifestação do SAAL, 1 de Maio de Porto

Figura 144 - Cartazes de Manifestações do SAAL

Figura 145 - Simpósio SAAL, Porto, 1975


117
A maneira como o serviço estava organizado era benéfica quer para o Estado, quer para os
moradores.
Como cada caso era avaliado e estudado em conjunto com as associações de moradores,
quem executava os trabalhos eram geralmente pequenas empresas e pessoas locais, gerando
assim trabalho e novas oportunidades para quem estava desempregado, ajudando a econo-
mia local a começar a desenvolver-se.214 Refuta-se a ideia, segundo Nuno Portas, “ de que
todos os moradores que precisam de auxílio do estado não podem dar nenhuma espécie de
contribuição porque já são explorados”215.
Isto nem sempre será verdade, já que um individuo pode não ter poder económico e ter
outro tipo de activos para oferecer, veja-se o caso dos bairros de lata com mais ou menos
recursos, a população construía a sua própria casa. Este foi o género de acções que o SAAL
procurou promover de maneira mais controlada, de forma a garantir uma maior qualidade
da habitação.
Nos projectos do SAAL, os arquitectos eram vistos quase como meros tradutores dos desejos
e idealizações dos seus futuros moradores, criando-se, por isso, uma arquitectura interventi-
va com a participação do povo.
O SAAL terá intervindo na reabilitação de refúgios precários de Norte a Sul do País, sendo
clara uma maior intervenção nas cidades mais populosas, com grande ênfase na capital e no
Porto, já que aqui se encontravam os maiores centros de pobreza do país.
Em Lisboa, as zonas mais afectadas por este movimento foram os bairros de lata, bairros
ilegais que se haviam formado e multiplicado na periferia da cidade. Por serem na periferia,
encontravam-se geralmente em zonas ainda não urbanizadas, geralmente em terrenos com
baixo valor comercial, acabando por ser mais simples a construção de um novo bairro que iria
servir para alojar os habitantes das casas de lata.
No Porto, a situação é bastante diferente, é nas Ilhas que este serviço mais irá actuar, por
estas se encontrarem, normalmente, em zonas já estabilizadas da cidade e não da periferia,
como a generalidade dos bairros de lata em Lisboa. Obrigavam por isso a operações mais
complexas, técnica e criativamente, primeiro, porque não haveriam terrenos livres à espera
de serem edificados, segundo, porque mesmo quando existiam, o seu valor comercial era
bastante elevado por se encontrarem no centro da cidade.
Este movimento foi de extrema importância e verdadeiramente revolucionário, com a pro-
cura do “direito à cidade”. As Ilhas são vistas como história e parte integrante da cidade. No
SAAL, a sua existência não é encarada como a vergonha ou a cidade escondida para lá das
ruas. Neste processo, as Ilhas surgem à face da cidade, não encaradas como problema que
tem que se erradicar, como até aqui tinham sido encaradas. As Ilhas ganham, por isso, uma
visibilidade que nunca tinham tido.
Estas ideias, contudo, entravam por vezes em conflito com o município, como é o caso do Por-
to, por ter um plano aprovado, bem delineado, baseado em ideias defendidas e executadas
por toda a Europa, que previa a terciarização do centro da cidade, o Plano Auzelle.
O processo SAAL, defendia o direito à cidade, pelo que parte do plano Auzelle não seria con-
creterizado, já que a população permaneceria no centro da cidade, mantendo assim um ca-

214 BANDEIRINHA, José António; O processo SAAL e a arquitectura no 25 de Abril de 1974 - Coimbra : Im-
prensa da Universidade; 2007; Pág. 151
215 PORTAS, Nuno; O Processo SAAL, Entre o Estado e o Poder Local; in Revista Crítica de Ciências Sociais,
nº18/19/20 Fevereiro 1986; Coimbra; Pág. 641
118

Figura 146 - Projecto Bairro do Leal, de Sérgio Fernandez, 1974

Figura 147 - Bairro do Leal Antes da Intervenção em 1974 Figura 148 - Bairro do Leal, por André
Cepeda, 2014

Figura 149 - Bairro do Leal, 2015 Figura 150 - Bairro do Leal, 2015
119
racter residencial em zonas onde, no plano director, se instalavam serviços, aproveitando por
vezes espaços que haviam já sido demolidos para a realização de parques de estacionamento,
como aconteceu no bairro de S. Victor, bem como no bairro do Leal. Pode-se, assim, perceber
que as discussões seriam constantes.
O SAAL actuou por todo o país. A sua intervenção, ainda que curta no tempo, foi notável.
Desde 6 de Agosto de 1974, até 20 de Outubro de 1976, data da extinção do processo, “foram
recebidos no SAAL- NORTE 115 pedidos de intervenção em zonas de habitação degradada,
tendo sido satisfeitos 69, para o que foram construídas 48 brigadas técnicas. Nestas opera-
ções estava incluída uma população de 61.926 pessoas, correspondendo a 13.365 famílias.”216
No Norte do País mais de 50% dos pedidos foram atendidos, o que é, só por si, extraordinário.
Note-se que o estado, em 17 anos (1956-1974), terá construído 8251 fogos, o que significa
que um número idêntico de famílias terá visto a sua condição de vida melhorada de forma
mais ou menos forçada. Em apenas 2 anos, o movimento conseguiu que 13.365 famílias se
movimentassem para que suas condições de habitabilidade fossem melhoradas. 217
Apesar dos números avassaladores de pedidos e adesão ao movimento por parte das As-
sociações de Moradores, dos processos que tinham começado a desenvolver-se na data de
extinção do SAAL no Porto, apenas se tinha iniciado a construção de 374 fogos que corres-
ponderiam a 33 operações, em muitas das quais, apenas uma primeira fase terá sido cons-
truída.218 Encontravam-se, contudo, já concluídos os projectos de cerca de 1.179 fogos, que
esperavam apenas a entrega dos terrenos às Associações de Moradores. Os restantes pro-
cessos a que haviam sido dadas respostas encontravam-se em diferentes fases de desenvol-
vimento: 1.231 estariam, por exemplo, com o anteprojecto concluído, mais de 5.000 teriam
apenas realizados os estudos de implantação e urbanização, enquanto outros 1.100 teriam já
concluído todo o estudo prévio. Caso o processo não tivesse sido extinto, previa-se o início da
construção de mais de 1.700 fogos até ao final do primeiro trimestre de 1977. No entanto é
de notar que, apesar da interrupção do processo, alguns dos projectos terão sido concluídos,
ou até mesmo iniciados depois do fim do movimento.219
No Porto, o SAAL terá intervindo um pouco por toda a cidade: Lapa, Antas, Massarelos, Mi-
ragaia, Prelada, Sé e S. Victor são algumas das áreas donde surgiram pedidos por parte das
associações dos moradores. Assim, neste movimento de moradores do Porto estiveram en-
volvidos os mais variados tipos de habitação precária que abundavam na cidade, sendo im-
portante mencionar as Ilhas, as “casas-colmeia”220, (que se encontravam na zona mais antiga
da cidade como a Sé), os Bairros Camarários e as casas ocupadas. Cada conjunto de associa-
ções lutava pelo seu direito: o direito a não terem de cumprir o código camarário que ainda
estava em vigor, o direito a melhores condições, o direito à habitação, o direito à cidade.221

216 SERVIÇO AMBULATÓRIO DE APOIO LOCAL - Intervenção participada na Cidade: experiência SAAL:
Exposição . Porto ESBAP, 1977; Pag.10 http://www1.ci.uc.pt/cd25a/media/Pdf/SAALnorteDivIntJul77.pdf
217 Serviço de Apoio Ambulatório Local; Livro branco do SAAL / Serviço de Apoio Ambulatório Lo-
cal : 1974-1976; Conselho Nacional do SAAL; 1976; Pág.I
218 Idem; Ibidem; Pág. XXI
219 BANDEIRINHA, José António; O processo SAAL e a arquitectura no 25 de Abril de 1974 - Coimbra : Im-
prensa da Universidade; 2007; Pág. 214
220 PEREIRA, Gaspar Martins; Percurso das Familias Trabalhadoras do Porto em Finais do Século XIX; Por-
to; 2010; Pág. 4
221 BANDEIRINHA, José António; O processo SAAL e a arquitectura no 25 de Abril de 1974 - Coimbra : Im-
prensa da Universidade; 2007; Pág. 135
120

Figura 151 - Projecto de Intervenção do SAAL Miragaia, Figura 152 - Projecto de Intervenção do SAAL para
Fernando Távora, Não Construido Miragaia de Fernando Távora

Figura 153 - Fotografia da Maquete da Intervenção SAAL Miragaia Figura 154 - Projecto de Interven-
ção do SAAL para Miragaia

Figura 155 - Estudo para Projecto de Figura 156 - Estudo para Projecto de Recuperação das Ilhas, Alvaro
Recuperação das Ilhas, ALvaro Siza Siza

Figura 157 - Bairro das Antas, Cons- Figura 158 - Rigorosos para o Figura 159 - Implantação do Bairro
trução Bairro das Antas, Pedro Ramalho das Antas, Projecto de Pedro Ramalho
121
«Portas, intervenant sur la base d’une gauche élargie, fait appel aux meilleurs
architectes portugais et étrangers pour soutenir son action. Il se fixa pour objectif de
lutter contre la spéculation foncière en s’appuyant sur la nationalisation des Banques
et des Compagnies d’assurances qui possédaient d’importantes réserves foncières»222

Assim, o movimento vai adoptando diferentes estratégias, dependendo da zona onde inter-
vem. Na área da Sé e Miragaia, as intervenções foram encaradas como um programa de
regeneração urbana, onde se procurou conservar ruínas de interesse arqueológico, recupe-
rar velhos edifícios, e ainda criar mais serviços: balneários, lavadouros, salas polivalentes…
Noutras zonas, a estratégia seria diferente, adaptando-se ao seu local e à necessidade da sua
população, como se irá perceber.
Nas acções do SAAL-NORTE, o tema das Ilhas será constantemente revisitado, e estas ser-
viriam de inspiração para as intervenções, sendo como já foi mencionado, assumidas como
parte integrante da cidade. Interessa por isso analisar alguns casos, em que a memória destes
espaços escondidos da cidade se faça sentir intensamente.
Casos, como o do arquitecto Pedro Ramalho no projecto das Antas que procura respeitar a
estrutura das Ilhas que existiam na área, no que diz respeito aos cheios e vazios. Também no
bairro do Leal, Sérgio Fernandez, procura manter o espírito comunitário e as relações próxi-
mas de vizinhança que se viviam nesses espaços.
Opta-se, no entanto, por desenvolver duas operações que demonstraram a versatilidade de
todo o processo, com duas maneiras diferentes de apropriação do espaço envolvente, de
reviver as Ilhas e de as abrir à cidade, duas brigadas com o mesmo arquitecto responsável,
Álvaro Siza; uma na zona oriental da cidade, projecto que se encontra numa das áreas mais
ocupada por Ilhas, S. Victor; outra numa zona central de malha urbana mais moderna, o
Bairro da Bouça.
S. Victor segue o princípio de habitação unifamiliar, em banda, respeitando de certa forma
a tradição da habitação das classes trabalhadoras, existindo ainda uma intenção de salvar e
preservar a cidade e a sua malha.
Em Junho de 1975, inicia-se a obra com a abertura da estrada de acesso ao futuro bairro que
procura integrar as estruturas habitacionais pré-existentes.
Haveria no projecto 4 tipos de intervenção a fazer nesta acção do SAAL: nos terrenos livres
que se encontravam no interior do quarteirão, em alguns lotes também livres na periferia,
aproveitamento de fundações e paredes dos edifícios existentes, (antigas Ilhas que haviam
sido demolidas em metade do seu limite) e, finalmente, reabilitação e ocupação dos edifícios
vazios e abandonados que se encontravam.
Siza procura preservar a escala, a organização dos fogos, criar acessos idênticos. Todo este
processo revela também, não só por parte de Siza, mas também de outros arquitectos, uma
grande crítica ao urbanismo que vinha sendo feito ao longo do tempo. Uma critica aos gran-
des planos gerais pouco personalizados, que por não serem maleáveis, não têm a capacidade
de se adaptar às diferentes situações, sugerindo que um bom plano urbano tem uma grande
margem de aferimento, dando a possibilidade de se adaptar melhor à população e ao terre-
no. Sobre o assunto, diz Raul Hestnes Ferreira em L’architecture d’Aujourd’hui:

«on peut noter qu’ils correspondent plus à des stratégies individuelles liées à certaines

222 FERREIRA, Raul Hestnes; 25Avril 1974, Et Les Architectes; in L’Architecture d’Aujourd’hui nº185, Histo-
ries et tendencies del’architecture portugaise – La Passion d’Álvaro Siza ; 1977 ; Pág.59
122

Figura 160 - Rigorosos do projecto de S. Victor, Álvaro Siza Vieira, 1974

Figura 161 - Bairro Figura 162 - Traseiras do Bairro de S. Victor, Figura 163 - Bairro de S. Victor, 2015
S. Victor, 2015 2015

Figura 165 - Corte Bairro da Bouça,


Projecto de Álvaro Siza Vieira

Figura 164 - Planta da Bouça, Projecto de Álvaro Siza Vieira

Figura 166 - Bairro da Bouça, 2015 Figura 167 - Bairro da Bouça Figura 168 - Bairro
da Bouça
123
forces de gauche qu’à une politique globale définie avec les grands partis« 223

O projecto do Bairro da Bouça, iniciado em 1973, ao abrigo do F.F.H, com o pós-revolução de


Abril, terá passado para o processo SAAL, com o qual se deu início à primeira fase de constru-
ção. Com o desmantelamento da operação, a obra foi interrompida, sendo concluída apenas
nos anos 90.
No bairro da Bouça estava prevista a recuperação de cerca de 60 fogos na zona do monte
cativo e a construção de outras, aproximadamente, 70 habitações. Destas, apenas 57 foram
edificadas na primeira fase do processo.
Nesta intervenção, o arquitecto depara-se com um espaço complexo, próximo da linha ele-
vada de comboio, que se encontrava no lado Norte do terreno. O arquitecto opta, então, por
criar uma parede dupla de forma a proteger os habitantes dos incómodos sons do caminho-
-de-ferro, procura recriar a ideia da rua pedonal, tão típica das Ilhas. Os interiores dos fogos
em duplex que permitiam uma organização fácil, que separavam zonas privadas e comuns
da casa. Existe ainda uma sobreposição de fogos, com acesso directo ou galeria, de modo a
conferir uma maior sensação de independência aos seus moradores.
As casas, como nas Ilhas, por serem em banda, têm um grande aproveitamento do solo, tor-
nando-se por isso económicas. Os blocos são, como originalmente o eram nas Ilhas, transver-
sais à rua, permitindo um maior aproveitamento do quarteirão. A presença das habitações de
trabalhadores é também sentida neste projecto, na forma como estes fogos se empilham, na
forma como, no projecto, o arquitecto pretende fazer o remate de cada bloco com diferentes
serviços: uma lavandaria, um café, procurando desta forma, criar uma ligação entre a comu-
nidade, que aqui se viesse fixar, e o resto da cidade.
Com isto, Siza demonstra as suas ideias, a procura de uma arquitectura que tenta manter a
essência do local, usando materiais ou formas de construir tradicionais e vernaculares aliados
a ideias e técnicas modernistas, tornando-se uma “globalização multidireccional”, ou “regio-
nalismo aberto”, onde costumes, memória, inovação, passado e presente se encontram na
procura de uma arquitectura.224 O arquitecto vai atrás, à história da própria cidade e tam-
bém à história da arquitectura, procura momentos em que se viveram realidades idênticas,
apreende o necessário e aplica o que aprende de forma crítica. Com isto, Álvaro Siza encontra
a sua maneira de definir estratégias para a construção das habitações e do espaço urbano,
combinando memória, história e território.
Neste caso especifico, o arquitecto terá ido buscar algumas referências à habitação moder-
nista da Europa nos anos 20, dos Siedlungen, de Bruno Taut, podendo também ser vistas
algumas parecenças, como a organização da cozinha que apresenta semelhanças com o co-
nhecido projecto da cozinha de Frankfurt, de Ernest May.
Pretende-se com estes dois exemplos, mostrar que é possível tirar partido das Ilhas, de ma-
neira positiva. Aqui o arquitecto aprendeu com o que de bom a Ilha tinha para oferecer e pro-
curou liga-la à cidade contemporânea. Nestas novas habitações para as classes trabalhado-
ras, vivia-se também em ambiente de proximidade e com a rua pedonal pretende-se, como
nas Ilhas, que sirva como extensão da casa.
Reforça-se, contudo, a ideia de que esta atitude não terá sido tomada apenas por Álvaro Siza,
223 FERREIRA, Raul Hestnes; 25Avril 1974, Et Les Architectes; in L’Architecture d’Aujourd’hui nº185, Histo-
ries et tendencies del’architecture portugais – La Passion d’Álvaro Siza ; 1977 ; Pág. 59
224 Cit. SIZA, Álvaro; Conferência Casa das Artes; Prémio Carreira Trienal de Lisboa Millenium BCP 2013;
31 de Janeiro de 2014. Consultado a: 9 de Jun. 2015
124

Figura 169 - Ilha de Anibal Cunha, 2015


125
em geral todo o movimento se caracterizou por uma enorme procura de identidade, entendi-
mento social e histórico, dos tecidos urbanos que iriam receber as intervenções.

«Perseguiam objectivos que transcendiam o mero fornecimento de um alojamento


condigno e procuravam alicerçar as novas habitações num processo de identidade ad-
quirido ao longo do tempo» 225

O movimento SAAL foi de uma duração extremamente curta, mas deixou marcas profundas
na cidade, no país e na Europa, que o analisou; mudou a maneira de ver e pensar o planea-
mento urbano, levantou algumas das questões ainda hoje pertinentes sobre esse assunto,
mostra-nos também a importância do poder local e do Povo. A cidade é encarada como per-
tença de quem a vive e habita.
O SAAL apresenta a relevância que a população pode ter ao intervir activamente na urbani-
zação da cidade, deixando bem presente a ideia de que a cidade é de todos e é para todos
que se deve voltar.
Este movimento abriu as portas das Ilhas e colocou-as à vista de todos, sem os preconceitos
que as perseguiam anteriormente, impedindo, com isso, que fossem escondidas para lá das
ruas outra vez. As Ilhas aparecem-nos aqui como são, parte integrante da cidade, e uma he-
rança que não pode ser ignorada.

3.5 AS ILHAS NA CIDADE CONTEMPORÂNEA


De uma maneira geral a evolução da cidade foi, até ao SAAL, e nas décadas que o seguiram,
consequência do desenvolvimento capitalista, que se reflectia nos grandes planos urbanos.
Tendo o SAAL, sempre procurado contrariar essas tendências de forma crítica e cuidada, acre-
ditando que o plano devia ser constantemente aferido, “menos rígido, mais fragmentado,
mais pragmático”.226
Com o fim do processo SAAL, as Ilhas voltam a ser esquecidas e, se lembradas, seria sempre
no sentido de deslocar e desenraizar a vida dos que as habitavam.
Apesar do longo período em que esta tipologia voltou a estar esquecidas, importa perceber
quais foram as principais acções da autarquia face ao problema da habitação que, continuava
a existir e a aumentar na cidade do Porto.
Para dar resposta a alguns destes problemas, a câmara, nos anos 90, terá estado envolvida no
PER, Programa Especial de Realojamento, que, como já foi referido, procurou realojar perto
de 50 000 famílias que viviam em barracas, das quais perto de 15 000 seriam famílias per-
tencentes à área municipal do Porto e que se tinham fixado em bairros de lata clandestinos
e localizados essencialmente em Ramalde, Aldoar, Lordelo do Ouro, Paranhos e Campanhã.
Com o seu realojamento, procurava-se erradicar o problema das barracas, uma forma de ha-
bitação ainda mais precária que a das Ilhas, já que, por norma eram edificadas com materiais
improvisados. 227
225 BANDEIRINHA, José António; O processo SAAL e a arquitectura no 25 de Abril de 1974 - Coimbra : Im-
prensa da Universidade; 200; Pág.249
226 ALVES COSTA, Alexandre; in SARDO, Delfim (coor) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974-
1976; Porto; Fundação de Serralves; 2014; Pág.80
227 LUSA; Programa Especial de Realojamento deu casa a 35 mil famílias mas também criou guetos; RTP
126

Figura 170 - Espaço públicos intervencionados na zona da Sé e Barredo

Figura 171 - Operação de Renovação de Edificios do Barredo e Ribeira, 1975-1994


127
Os princípios do PER seriam logo à partida muito diferentes dos ideais do SAAL; enquanto um
preferia a reabilitação urbana e habitacional dos espaços e das casas, o outro via a erradica-
ção e realojamento como forma de acção.

«O SAAL é em tudo diferente do PER. Se o SAAL procurou, em muitos casos, reconstruir


e requalificar os bairros cujas casas tinham sido construídas pelos moradores de acor-
do com as suas possibilidades, o PER, face aos mesmos tipos de bairros de construção
informal, investiu no realojamento das populações em bairros sociais, muitas vezes
distantes da residência anterior. Se o SAAL investiu saber técnico, através de arquitetos
e engenheiros que se deslocavam ao terreno para, com os moradores, encontrarem
soluções de melhoria das condições habitacionais de acordo com os cânones da época,
procurando ao mesmo tempo respeitar os interesses dos moradores, o PER construiu
para realojar, em massa e a baixos custos, com a pretensão de acabar com as barracas,
objetivo primeiro do programa.»228

Apesar dos benefícios que o PER possa ter trazido para os habitantes das barracas, este pro-
grama terá, segundo a socióloga Isabel Guerra, criado “guetos estigmatizados”. Eram solu-
ções que já 20 anos antes a nível internacional, haviam mostrado ter “efeitos negativos e
perversos”(…) “nos processos de socialização” 229
Este programa terá negligenciado outras formas de habitação precária, como habitações so-
bre ocupadas ou em condições muito degradadas, sendo assim um programa restrito e limi-
tado baseado em alguma injustiça social, segundo a mesma socióloga.230
A reabilitação urbana e a importância do centro histórico foi algo que durante grande parte
do século foi ignorada por parte da autarquia e do Estado. Este tema terá sido já explorado no
processo SAAL (com o projecto de Miragaia por exemplo), a par do tema das Ilhas e do direito
à cidade. Ainda assim, terá sido apenas no trabalho desenvolvido no CRUARB, Comissariado
de Renovação Urbana da Área da Ribeira e Barredo, mais um dos Programas de Acção Prio-
ritário de Nuno Portas, projecto desenvolvido paralelamente ao SAAL (mas com o apoio do
mesmo), que a reabilitação urbana terá recebido alguma atenção.
Este comissariado tinha como objectivo resolver as problemáticas que décadas de abandono
e falta de atenção a estas áreas da cidade terão desenvolvido. A sua finalidade seria reabilitar
a zona mais antiga da cidade, tendo sido para isso desenvolvidos diversos estudos profundos
ao local. Para esse efeito, a função inicial do CRUARB seria, como o próprio nome indica, rea-
bilitar a zona da Ribeira e Barredo, passando também por acabar com as “colmeias”231, edifí-
cios onde grande número de famílias vivia sem qualquer tipo de condições. Para que tal fosse
possível, foram utilizadas várias estratégias como o realojamento da população, a demolição
de prédios devolutos, a reabilitação de grande parte do património.232

Noticias; 5 de Maio de 2013. Disponível em: < http://www.rtp.pt/noticias/> Consultado a: 9 de Jun. 2015
228 CACHADO, Rita Ávila; O Programa Especial de Realojamento - Ambiente histórico, político e social; in
Análise Social, 206, xlviii (1.º); 2013;Pág. 138
229 GUERRA, Isabel; Citada em: LUSA; Programa Especial de Realojamento deu casa a 35 mil famílias mas
também criou guetos; RTP Noticias; 5 de Maio de 2013. Disponível em: < http://www.rtp.pt/noticias/> Consulta-
do a: 9 de Jun. 2015
230 Idem; Ibidem
231 PEREIRA, Gaspar Martins; Percurso das Familias Trabalhadoras do Porto em Finais do Século XIX; Por-
to; 2010; Pág. 4
232 PINTO, Liliana; SANTOS, Teresa; Porto Património Mundial: A Classificação e Intervenção – “Encon-
tra-se o Título do Porto, Património Mundial” em Risco? PORTO, PATRIMÓNIO MUNDIAL; Actas do Seminário
Centros Históricos: Passado e Presente; Porto; Universidade do Porto, Faculdade de Letras, Departamento de
128

Figura 172 - Reabilitação de Casa na Ribeira Figura 173 - Projecto de Intervenção na zona da Sé

Figura 174 - Mapa dos Limites de Intervenção da, Porto Vivo


129
Todo o trabalho desenvolvido no âmbito da CRUARB terá sido fundamental para a classifica-
ção do Centro Histórico do Porto, como Património Cultural da Humanidade, pela UNESCO.
Toda a acção do comissariado procurou ser cuidadosa, de forma a manter o património,
quando possível, mas considerando sempre que uma cidade pode ser conservada, embora
precise também de evoluir e sofrer mudanças.
Assim, ainda que seja importante a protecção e conservação do centro histórico, é igualmen-
te importante que este não seja encarado como um museu, belo, bem tratado, parado no
tempo.

“..onde, o centro histórico se tornou apenas uma pequena parte da cidade e corre sé-
rios riscos de se tornar mais visitado que vivido, mais imagem que conteúdo.”233

A CRUARB terá sido, portanto o primeiro momento em que se procurou reavivar o centro.
Ainda que a sua existência tenha continuado até ao inicio do século XXI, e que a sua área de
acção tenha sido alargada a outras zonas do centro histórico onde se vivia também em situa-
ções precárias e de degradação extrema, não terá sido suficiente para travar a realidade que
se vive ainda hoje no centro antigo da cidade.
As próprias políticas de habitação que incentivavam a procura de casa própria em detrimento
do aluguer e dos realojamentos massivos em bairros camarários (que continuaram durante
as últimas décadas do século XX a ser vistas como a forma mais “eficaz” de providenciar
habitação digna para todos) potenciaram os problemas que são, ainda hoje, parte das pro-
blemáticas que a autarquia pretende resolver. Problemas que são mais regra que excepção
no centro histórico, como: o abandono do mesmo, criando um vazio no centro da cidade
(cidades donuts234); edifícios devolutos e degradados e poucos acessos, com uma população
envelhecida. Aos poucos, a população mais jovem sai do centro, fixando-se em áreas mais
apetecíveis da periferia da cidade (com melhores acessos e uma melhor relação qualidade-
-preço), gerando um enorme conflito entre centro-periferia, sendo que no Porto esta área
periférica é estendida às cidades vizinhas.235
O CRUARB é extinta em 2003, ano em que é como que substituída pela Porto Vivo, que sur-
ge como parte de um novo serviço do IHRU, as SRU’s. Estas procuravam política de gestão
da autarquia e servir de ligação do sector público com o privado, de forma a promover o
desenvolvimento em áreas centrais das cidades, que de uma maneira geral se encontravam
desvalorizadas.236
A ideia desta cooperação entre privado e público teria como objectivo valorizar as zonas de
forma equilibrada, estando a componente social associada à reabilitação e renovação dos
edifícios, componente esta que acabou por não se verificar, já que o sector público apenas
criou as condições necessárias para motivar o privado a investir.237

Ciências e Técnicas do Património; 2011; Pág. 224


233 FERNANDES, José Alberto Rio; in JORGE, Vítor Oliveira, coord. - Conservar para quê?; Universidade do
Porto. Faculdade de Letras. Departamento de Ciências e Técnicas do Património; Porto; 2004; Pág. 216
234 Idem; Ibidem; Pág. 220
235 Idem; A cidade os Municípios e as Políticas: o caso do Grande Porto; in Revista da Faculdade de Letras
da Universidade do Porto; série I; vol.13; 2003; Pág. 233
236 Idem; Centro Histórico e Urbanismo: Questões, Reflexões e Inquietações; a Propósito do Porto; in
Actas do Seminário Centros Históricos: Passado e Presente; Porto; Universidade do Porto, Faculdade de Letras,
Departamento de Ciências e Técnicas do Património; 2011; Pág. 19
237 Idem; Ibidem; Pág. 17
130

Figura 175 - Estado de conservação do edificado da zona protegida


131
Tudo isto gera duas novas realidades que importa mencionar: por um lado, gera-se o que José
Alberto Rio Fernandes chama de “política de tapete”, em que se renovam perfis e pavimentos
em jardins, ruas e praças, limpando a rua, simulando um avanço que por vezes é apenas apa-
rente; por outro lado, quando se cativa o interesse do sector privado (que apenas é cativado
se o empreendimento estiver orientado para uma classe mais elevada), começa-se a entrar
num processo de gentrificação, onde as ruas mais apetecíveis, com melhores acessos são
renovadas, enquanto nas traseiras destas perduram as precárias condições de habitabilidade
e os difíceis acessos.

“os dados existentes sugerem que é naif esperar uma ‘preocupação moral’ por parte do
sector privado na revitalização das áreas desvalorizadas. As decisões de investimento
do sector privado são fundamentadas em grandes medidas no interesse próprio e não
na filantropia.”238

Conclui-se assim, que é importante incentivar o investimento de privados, mas de maneira


a proteger o interesse público, tendo sempre em atenção o interesse social. José A. Rio Fer-
nandes defende, apoiado em diversos autores, que o “hibridismo social” possa ser a resposta
para a viabilidade da revitalização dos centros históricos, assente na ideia de que a mistura
de culturas, classes e ideias pode trazer benefícios a todos; é importante, contudo, evitar o
processo de gentrificação, ou pelo menos as suas consequências: o aumento do custo de
vida, que acabaria por desterrar as classes mais baixas.239 Se este equilíbrio fosse consegui-
do, poder-se-ia obter a abertura necessária para que a cidade não ficasse nem parada, nem
esquecida no tempo, remetendo-se aqui mais uma vez para a ideia de “cidade museu”, que
deve ser evitada a todo o custo já que rapidamente pode tornar-se numa cidade fantasma.
O hibridismo é assim a procura de um equilíbrio, entre: o passado e presente, tempo e espa-
ço, privado e público, e ainda habitantes e turistas.
Esta ideia de “hibridismo social” é assente numa ideia de diversificação social e integração de
pequena escala, defendida também por António Baptista Coelho. Este defende que a mistura
e articulação social de pequenos grupos leva a uma integração natural, principalmente quan-
do associada a uma participação dos habitantes, criando-se um sentido comunitário e uma
identidade local.240
Conclui-se que perceber as dinâmicas do centro histórico será essencial para resolver os pro-
blemas habitacionais da cidade, já que é aqui que mais edifícios se encontram vazios e de-
gradados.
Voltando a centrar as acções da Câmara, será importante referir a Porto 2001 S.A, criada no
âmbito do Porto Capital Europeia da Cultura 2001, que teve a função de planear, promover e
executar todas as acções que integraram o evento.
Esta sociedade foi criada com capitais exclusivamente públicos, do Estado e da câmara do
Porto. Entre os seus objectivos a Porto 2001 S.A terá procurado incluir objectivos de carác-
ter social. Assim a associação desenvolveu quatro pontos estratégicos que serviram de base
ao projecto a desenvolver para 2001, sendo eles: o Programa Cultural, as Intervenções em

238 Idem; Ibidem; Pág. 21


239 FERNANDES, José Alberto Rio; Centro Histórico e Urbanismo: Questões, Reflexões e Inquietações; a
Propósito do Porto; in Actas do Seminário Centros Históricos: Passado e Presente; Porto; Universidade do Porto,
Faculdade de Letras, Departamento de Ciências e Técnicas do Património; 2011; Pág.22
240 COELHO, António Baptista; Entre a Casa e Cidade, a Humanização do Habitar; in Ópusculo 18; Dafne
Editora; Porto; 2009; Pág.7
132

Figura 176 - Localização dos Nucleos da Ilhas do Porto, 2015

Figura 177 - Ilha de Anibal Cunha, 2015 Figura 178 - Ilha na rua de S. Victor, 2015

Figura 179 - Fachada da Rua de S.Victor com Acesso a uma Ilha, 2015
133
Infra-estruturas Culturais, a Requalificação Urbana e Ambiental da Cidade, e a Revitalização
Económica e Habitacional241. Os dois últimos teriam um carácter social, sendo que no primei-
ro destes, esse carácter passava pela articulação e coesão urbana, que previa intervenções
em bairros socias existentes em zonas de interesse. O último seria mais focado na habitação.
Ainda que tenham sido organizados vários estudos, se tenham delimitado zonas de interven-
ção e orçamentados gastos necessários, este último ponto não terá avançado devido a falta
de acordo entre as diferentes partes envolvidas no projecto, acabando por não ser realizado
de todo.242
Durante a primeira década do segundo milénio, a autarquia terá dedicado algum do seu tem-
po ao centro da cidade e à revitalização do mesmo com o apoio da SRU, mas terá dedicado
muitos esforços aos bairros sociais, que tinham sido construídos havia aproximadamente 40
anos, encontrando-se já degradados, e não dando mais resposta às necessidades de algumas
famílias. Assim, procurou-se resolver vários problemas da cidade contemporânea, excluindo
mais uma vez as Ilhas que não fizeram parte desses problemas a resolver, apesar do estudo
realizado em 2001 pela câmara a esta tipologia.
Nesse mesmo ano realiza-se o estudo socioeconómico das Ilhas. Note-se que haviam já pas-
sado quase 50 anos desde que tinha sido realizado o último estudo deste tipo de habitação.
Existiriam nessa altura cerca de 5 900 casas em Ilhas, das quais 88% estariam habitadas, o
que representaria uma população de aproximadamente 13 500 pessoas. Além disso, cerca de
6 500 indivíduos habitariam ”noutro tipo de Ilhas”, bairros operários, quintas e vilas. Assim,
apesar deste número já não representar uma terça parte da população, como em tempos
representara, retrata uma realidade ainda preocupante.
Em 2014 realiza-se outro estudo a pedido da câmara, conclui-se a existência de 4 901 aloja-
mentos em Ilhas e outras tipologias semelhantes, que perfazem aproximadamente 10 371
habitantes, dando-se por isso uma diminuição de aproximadamente 48% da população resi-
dente nestes espaços.
Apesar da diminuição desta população, verifica-se que estes espaços continuam a ser pro-
curados, já que, cerca de 28% dos seus habitantes estão aí instalados há menos de 10 anos,
e que esse número está em crescimento, visto que no estudo de 2001 era apenas de 19%.
Ainda assim, cerca de 65,3% da população habita os alojamentos há mais de 30 anos, sendo
por isso, pessoas profundamente enraizadas nestes locais.243
Um factor importante a ter em conta é a idade média da população das Ilhas, que será de
aproximadamente 53 anos, sendo que cerca de 37% da população tem mais de 65 anos 244,
mais 14% do que a média municipal registada nos censos 2011. Podemos concluir que as
Ilhas têm uma população envelhecida, 245 uma vez que as populações mais jovens se mudam
para a periferia, aliciadas pela oferta de boas habitações a preços acessíveis.246
Já no estudo realizado em 2001 se concluía que a possível deslocação desta população en-

241 Tribunal de Contas; Auditoria Casa da Música/Porto 2001, S.A; 2004; Pág. 13
242 Idem; Ibidem; Pág. 13
243 VÁZQUEZ, Isabel Breda; CONCEIÇÃO, Paulo (coord.); “Ilhas” do Porto, Levantamento e Caracterização;
Editado por Município do Porto; Porto; 2015; Pág. 74
244 Idem; Ibidem; Pág. 67
245 INE; Quadros Resumo, 1.2 População residente em 2001 e 2011, segundo os grupos etários e sua
evolução entre 2001 e 2011; http://censos.ine.pt, Consultado a 9 de Jun. 2015
246 VÁZQUEZ, Isabel Breda; CONCEIÇÃO, Paulo (coord.); “Ilhas” do Porto, Levantamento e Caracterização;
Editado por Município do Porto; Porto; 2015; Pág. 70
134
velhecida para outras zonas, que não as suas, poderia gerar graves problemas de integração
social.

“a forte presença de idosos nas “Ilhas” levanta problemas específicos em qualquer pro-
cesso de intervenção. Com efeito, no plano social são intensas as relações de vizinhan-
ça e solidariedade que a proximidade física e a convivência de muitos anos propiciam,
o que atenua as situações de solidão e isolamento associadas à velhice.”247

Cerca de 44% dos residentes são reformados e pensionistas, e 19% dos habitantes encon-
tram-se desempregados, podendo assim perceber-se que nas Ilhas se encontra uma popula-
ção de enorme vulnerabilidade social, com pouco ou nenhum poder económico.248
Apesar de grande parte dos fogos, aproximadamente 80%, ter sofrido intervenções nos últi-
mos 10 anos, (das quais 84% terão sido realizadas pelo próprio inquilino), 18,2% encontram-
-se em estado muito degradado ou ruina.249
Apesar das habitações em Ilhas estarem longe de cumprir os mínimos de habitabilidade con-
siderados aceitáveis, cerca de 59.9% da população aí residentes, quando inquirida sobre o
alojamento afirma estar satisfeita ou muito satisfeita com ele.250
Quando questionados sobre uma possível mudança de alojamento 53,6% aceitariam, em-
bora preferissem permanecer na mesma freguesia; ainda quanto a preferência em caso de
mudança, 60% escolheria ficar em casa reabilitada no mesmo local. 251
Isto reflecte que as pessoas gostam da sua zona de residência e de conforto, onde têm as suas
vidas organizadas e mantêm fortes ligações com a vizinhança, visto que 74.5% dos inquiridos
se encontram satisfeitos ou muito satisfeitos com os seus vizinhos.252
No estudo realizado no ano transacto, regista-se a existência de 957 núcleos habitacionais,
concluindo-se, portanto, que em 14 anos este número terá diminuído 19%, (já que em 2001
existiriam 1182).
Dos 957 núcleos registados no estudo de 2014, apenas meia dúzia pertencem à autarquia.
Este facto é um dos maiores problemas das Ilhas: por um lado, existe uma falta de interesse
por parte dos proprietários que há muito não vêem estes espaços como fonte de rendimen-
tos, já que grande parte dos inquilinos têm rendas baixas e antigas, (cerca de 62% dos resi-
dentes têm rendas inferiores a 100 €);253 por outro, elas pertencem a privados, de forma que
o município não tem responsabilidade, nem poder de acção sobre as propriedades. Ainda
assim, o município tem o dever de proteger os seus cidadãos e, idealmente, dotar todos de
habitação digna.
Pode-se assim afirmar que uma das grandes dificuldades de intervenção nos espaços das
Ilhas é a constante falta de coordenação entre as várias partes interessadas: proprietários,
inquilinos e também a autarquia.
Actualmente a câmara do Porto, está a desenvolver um projecto-piloto para a reabilitação da
Ilha da Bela Vista, na rua D. João IV. Este processo experimental de reabilitação urbana conta
247 PORTO, Câmara Municipal; As Ilhas do Porto – Estudo Socioeconómico; Pág.
248 VÁZQUEZ, Isabel Breda; CONCEIÇÃO, Paulo (coord.); “Ilhas” do Porto, Levantamento e Caracterização;
Editado por Município do Porto; Porto; 2015; Pág. 70
249 Idem; Ibidem; Pág. 77 e 79
250 Idem; Ibidem; Pág. 80
251 Idem; Ibidem; Pág. 86 a 88
252 Idem; Ibidem; Pág. 83
253 Idem; Ibidem; Pág. 75
135
com a participação da câmara através do Pelouro da Habitação e Acção Social, e Pelouro do
Urbanismo, o LAHB Social, (Laboratório de Habitação Básica e Social), órgão técnico criado
pela câmara para servir este mesmo propósito, envolvendo parcerias com ISSS, Instituto Su-
perior de Serviço Social, o Gabinete de Arquitectura IMAGO e a Associação de Moradores
da Bela Vista, e numa fase inicial muito ligada também à ESAP, Escola Superior Artística do
Porto. Na Ilha da Bela Vista, pretende-se que este seja um processo participativo, envolvendo
“todas as partes na discussão e problematização no sentido de encontrar um programa e um
projeto sustentável, eficiente e inclusivo de reabilitação.”254
A autarquia quer assim dar uma nova imagem às Ilhas, pretendendo que a Ilha da Bela Vista
seja um exemplo do que pode ser conseguido, não vendo as Ilhas como um “mal a erradicar”
são antes encaradas como lugares de oportunidades, não só para os residentes mas também
para o proprietário e para a cidade.
Manuel Pizarro, actual vereador do Pelouro de Habitação e Acção Social do Porto, assume
as Ilhas como sendo “um património identitário da cidade que seria grave desprezar”255, de-
monstrando uma nova visão da câmara face ao problema Ilhas.
Seria interessante procurar uma solução flexível e adaptável a cada um dos núcleos, abrindo
canais de conversação entre as partes, de forma que todos possam ver os seus direitos e de-
veres cumpridos. Soluções que procurem uma habitação de interesse social idêntica à que se
desenvolveu nos anos 70/80 onde a habitação era enquadrada com a vizinhança, bairro e a
cidade, não sendo algo isolado, mas como a parte de um todo.
Esta habitação de interesse social que segundo António Baptista Coelho deve ser caracteri-
zada entre outras coisas “por uma estimulante diversidade de soluções”…”nomeadamente a
adequação aos velhos e novos modos de vida e à aliança entre o habitar e a regeneração ur-
bana “256, onde se encontram diferentes modos de promoção de habitação (municipal, priva-
da e cooperativista), estes conjugados geram uma maior coesão social e, consequentemente,
potenciam “uma cidade mais amigável e humanizada”257

254 DomusSocial; Noticias; Disponivél em: http://www.domussocial.pt/noticias-domus, Consultado a: 9 de


Jun. 2015
255 Manuel Pizarro em: DIAS; Pedro Sales; Câmara do Porto investe 400 mil euros num laboratório para
reabilitar ilhas da cidade; Público; Disponível em: <http://www.publico.pt> Consultado a: 9 de Jun. 2015
256 COELHO, António Baptista; Opúsculo 18 - Entre Casa e Cidade, A Humanização do Habitar; Dafne Edito-
ra; Porto; 2009; Pág.6
257 Idem; Ibidem; Pág.6
Figura 180 - Fotografiado Interior da Bela Vista, de
139

4. UM NOVO OLHAR SOBRE AS ILHAS


De uma maneira geral, a procura de solução para os problemas habitacionais da cidade deu-
-se, quase sempre do geral para o particular, por grandes acções tipificadas que raramente se
adaptariam aos casos particulares.
Nas últimas décadas a autarquia portuense terá focado a sua atenção nos bairros camarários,
na sua recuperação e manutenção, procurando dar uma solução estandardizada para os vá-
rios problemas que se foram verificando; focando continuamente a sua atenção na periferia
da cidade, já que é lá que a generalidade destes bairros se encontram. Os estudos realizados
sobre as Ilhas, o de 2001 e o de 2011, serviriam apenas para dados estatísticos, acabando por
não dar uma resposta ou solução prática a estes espaços.
Hoje a autarquia, apesar de continuar a renovação destes bairros, alguns já com 50 anos, tem
demonstrado interesse em resolver outros problemas graves da cidade. Preocupa-se com a
desertificação do centro e tenta combatê-la, não apenas com a promoção da cidade como
ponto turístico, que apesar de alguns malefícios que traz, dinamiza a economia e os espaços
centrais, mas afirma que é preciso trazer os portuenses de novo para o centro, pondo assim
em perspectiva as políticas de habitação anteriores da câmara.

“Durante mais de um século o discurso sobre as Ilhas, justamente inspirado na falta de


condições de quase todas elas, assumiu que elas eram um mal a debelar. Desta visão
resultou a construção de dezenas de bairros municipais, onde habita hoje parte impor-
tante da população do Porto. Meio século passado sobre o apogeu dessa opção (…) é
imperioso questionar as políticas municipais de habitação.” 258

Nota-se assim, contudo, uma pequena mudança na atitude da Câmara, e percebe-se que a
renovação única e exclusiva das habitações municipais, ainda que dê dignidade e conforto
às classes desfavorecidas, não resolve por si só os problemas inerentes à pobreza e exclusão
social. Para os solucionar seria necessário criar meios que acompanhassem a população que
reside nesses espaços e as que lá se vão instalar. 259

“Toda a política habitacional de uma Cidade deve centrar-se também nos critérios da
participação, da contratualização e da inclusão das classes mais desfavorecidas, de
forma a possibilitar-lhes o direito à habitação e à vivência plena do território.” 260

Assim, em 2014 iniciou-se o projecto-piloto da reabilitação da Bela Vista, deixando a mesma


a cargo do LAHB Social, órgão técnico que havia sido criado, poucos meses antes, com esse
mesmo intuito.
Mostrando neste projecto experimental a vontade que a autarquia tem de dar novas res-
postas aos problemas de sempre, na Ilha da Bela Vista não só se evita o realojamento e a
destruição de uma comunidade, criada e mantida há mais 40 anos, como também se evita
o desenraizamento da sua população, que vai permanecer onde sempre viveu. Sendo de
grande importância perceber que são vários os casos em que os moradores só conseguem
ter vidas sustentáveis devido ao espírito de entreajuda que ali se vive, como são o caso de

258 Manuel Pizarro; in RODRIGUES, Fernando Matos; Ilha da Bela Vista; Edições Afrontamento; Porto;
2014; Pág. 5
259 MOREIRA, Rui; Porto, Nosso Partido – Manifesto Eleitoral, Autárquicas 2013; Pág. 9
260 Idem; Ibidem; Pág. 9
140

Figura 181 - Localização actual das Ilhas


141
alguns moradores com problemas de mobilidade que sobrevivem, relativamente a compras e
refeições, de vizinhos que se disponibilizam para os ajudar.
Para além da criação do LAHB Social, a autarquia terá também, em 2014, pedido ao IC, Insti-
tuto de Construção e ao Centro de Investigação do Território, Transportes e Ambiente, CITTA
da FEUP, um novo estudo sobre as Ilhas da Cidade, terá sido concluído e apresentado em
2015, que foi já anteriormente referido.
Ainda que este se tenha efectuado dentro dos mesmos moldes que os estudos anteriores,
este procurou não só contabilizar, número de Ilhas e habitantes e estado de conservação dos
fogos, mas visou também perceber várias abordagens possíveis e viáveis para acabar com
situações precárias que se encontram ainda em grande parte das Ilhas.
Neste estudo, foi, então, incluído um breve capítulo em que se propõem acções a desenvol-
ver por parte da Câmara, para iniciar um novo momento em que se põe de lado a ideia de
Ilhas como problema a erradicar, surgindo antes como parte da identidade da cidade que
integram.
Foram assim desenvolvidos cinco modelos estratégicos para as Ilhas: demolição e realoja-
mento da população, intervenção baseada nos proprietários existentes, alteração das rela-
ções de propriedade, modelo de saída e finalmente novos tipos de ocupação.261 Isto porque,
apesar de o ideal ser a reabilitação das Ilhas e de todos os seus espaços verifica-se que essa
opção nem sempre é uma solução viável.
Também a pedido da autarquia, e no seguimento deste estudo, que terá servido para perce-
ber exactamente qual a realidade do Porto face a estes núcleos, foi pedido às mesmas enti-
dades, IC e CITTA da FEUP, a elaboração de um Programa Estratégico para as Ilhas do Porto.
Este documento terá sido concluído no final de Julho deste ano, e todo o seu conteúdo é
ainda provisório, facto que é essencial ter em conta, estando por isso ainda sujeito a algumas
alterações e aguardando aprovação por parte da Câmara Municipal e de todas as entidades
que possam a vir estar envolvidas.
Neste Programa Estratégico procuram-se definir as condições necessárias para que a reabili-
tação das Ilhas seja possível, tentando desenvolver detalhes essenciais para que tal projecto
se torne viável: critérios que possibilitem a definição dos núcleos aptos para intervenção;
incentivos a criar para os privados; ressalvas a ter em conta para garantir o interesse público
e social aquando da intervenção em parceria com o proprietário; procedimentos e medidas a
tomar quando a alteração de propriedade for necessária; etc… 262
Este terá tido como ponto de partida os dados obtidos no estudo às Ilhas “Levantamento e
Caracterização” onde se definiram zonas de interesse, por aí se encontrarem grandes con-
centrações de núcleos, surgindo assim 14 Áreas Críticas, que abrangem 318 núcleos, cerca
de 1/3 do número total dos núcleos da cidade. Assim o Programa separa Áreas Críticas (AC)
e Núcleos Isolados e (NI). Esta separação será importante para a estruturação e organização
do plano estratégico. 263
No estudo “Ilhas do Porto: Levantamento e caracterização”, foi desenvolvido, para a caracte-
rização do estado dos núcleos, uma análise que procura identificar os tipos de situações pro-

261 VÁZQUEZ, Isabel Breda; CONCEIÇÃO, Paulo (coord.); “Ilhas” do Porto, Levantamento e Caracterização;
Editado por Município do Porto; Porto; 2015; Pág. 146
262 Em Conversa com José António Ferreira, do Gabinete de Estudos e Planeamento da Domus Social
263 CONCEIÇÃO, Paulo; VÀZQUEZ, Isabel Breda (coord); “Ilhas do Porto - Programa Estratégico; Julho 2015;
Pág. 3
142

Figura 182 - Tabela com dados sobre, o número de núcleos a intervencionar em


cada fase do Programa Estratégico

Figura 183 - Situações Problemáticas das Ilhas do Porto, 2015


143
blemáticas,sendo “definidos cinco tipos de problemas que afectam a qualidade dos núcleos
habitacionais.”264:o Tipo I, relacionado com a degradação do espaço; o Tipo, II com nível de
desocupação; Tipo III, com problemas de carência de acessibilidade interna ao núcleo, o Tipo
IV, núcleos que sobreponham dois dos casos anteriores (I, II ou III); Tipo V, a sobreposição
das três dimensões críticas. 265
Esta classificação será importante para o Programa Estratégico, já que num primeiro mo-
mento de acção o programa irá centrar os seus esforços na resolução dos problemas nas 14
AC, nos NI que apresentem mais riscos, representados pelos que se encontram no Tipo V e
nos núcleos em situação de risco isolados, prevê-se assim numa primeira fase a intervenção
em 372 núcleos.266 Num segundo momento, estarão envolvidos 256 núcleos isolados que se
enquadram nos problemas de Tipo IV, III, II e I. Finalmente restarão 329 núcleos que não se
enquadram nos tipos anteriores.
O programa está, então, organizado em 3 graus de prioridades que serão desenvolvidas em
acções de curto prazo para a 1ª prioridade (até 3 anos), médio na 2ª prioridade (4 a 7 anos) e
longo na 3ª prioridade (8 a 10 anos). 267
Este Programa Estratégico procurou não só, como foi acima referido, desenvolver os modelos
de intervenção,mas também como dar contornos mais práticos a cada uma dessas acções, de
forma a tornar viável a realização das mesmas. 268
Assim, o modelo de demolição e realojamento da população será aplicado em casos extre-
mos, considerados irresolúveis técnica e economicamente, em que os moradores se encon-
tram a viver em situações de risco, por vezes consequência da localização da Ilha, pelo estado
de conservação da habitação ou até dos acessos. 269 No Programa Estratégico foram indica-
dos para este modelo 77 núcleos, que representam 8% do número total, e afectaram cerca
de 3% das famílias que habitam estes espaços, já que dos 536 fogos que se estimam existir
nestes 77 núcleos apenas 152 se encontram habitados.270
Nos modelos que se seguem é necessário ter em conta um grande número de factores que
não estão ainda inteiramente apurados, começando pela procura dos proprietários dos es-
paços, nem sempre fáceis de encontrar já que de alguns destes núcleos não se encontram
os registos de propriedade, seguido da tentativa de perceber até que ponto é que estes têm
ou não capacidade de intervenção, e ainda se estão ou não interessados na realização da
mesma. Daí não existirem, ainda números concretos para a execução dos modelos que se
seguem.
A estratégia de intervenção baseada nos proprietários existentes, será aplicável em núcleos
que reúnam condições e tenham o potencial necessário para receberem obras de reabilita-
ção; depois de se verificar que o proprietário tem interesse e capacidade económica para
proceder às intervenções.
264 VÁZQUEZ, Isabel Breda; CONCEIÇÃO, Paulo (coord.); “Ilhas” do Porto, Levantamento e Caracterização;
Editado por Município do Porto; Porto; 2015; Pág. 91
265 Idem; Ibidem; Pág.94
266 CONCEIÇÃO, Paulo; VÀZQUEZ, Isabel Breda (coord); “Ilhas do Porto - Programa Estratégico; Julho 2015;
Pág. 9
267 Idem; Ibidem; Pág. 6
268 Em Conversa com José António Ferreira, do Gabinete de Estudos e Planeamento da Domus Social
269 VÁZQUEZ, Isabel Breda; CONCEIÇÃO, Paulo (coord.); “Ilhas” do Porto, Levantamento e Caracterização;
Editado por Município do Porto; Porto; 2015; Pág. 145
270 CONCEIÇÃO, Paulo; VÀZQUEZ, Isabel Breda (coord); “Ilhas do Porto - Programa Estratégico; Julho 2015;
Pág. 16
144
Para motivar os proprietários a investir, prevê-se a concepção de parcerias entre Estado e
privados, criando um conjunto de apoios e beneficios que por um lado, garantam interesse
social e público da intervenção, por outro consigam motivar o investimento dos senhorios.271
Alguns destes incentivos prevêem a criação de condições financeiras mais apetecíveis, apoia-
das, por vezes de na criação parecerias entre município e as entidades bancárias,272 segundo
o Vereador do Pelouro da Habitação, existirá eventualmente a possibilidade de a própria Câ-
mara se apresentar como fiador,273 bem como de eventuais concessões fiscais, que poderão
ir desde:

“possibilidades de isenção de IMT e de IMI, a dedução à colecta de parte dos encar-


gos relacionados com a reabilitação de imóveis, a aplicação de taxas reduzidas de IVA
em empreitadas de reabilitação urbana, e de taxas reduzidas sobre os rendimentos
prediais decorrentes do arrendamento e sobre mais-valias (...) Complementarmente,
estes benefícios podem ser articulados com a redução ou isenção das taxas municipais
aplicáveis.”274

Alguns destes incentivos podem ser mais facilmente obtidos, casos em que as Ilhas se en-
contrem em Áreas de Reabilitação Urbanas, ARU, para as quais já estão criados incentivos
idênticos.
O programa refere ainda a hipótese de criação de instrumentos de comparticipação a fundo
perdido, sendo desenvolvidos acordos com os proprietários que visam proteger o interesse
do próprio Município, relacionado maioritariamente com o uso dos espaços, e estabelecendo
limites a nível de rendas pedidas.275
Estes incentivos não se aplicam apenas a este modelo de intervenção, podendo também ser
aplicados no modelo de alteração de relações de propriedade, e em alguns casos na mudança
de usos também.
O modelo de alteração das relações de propriedade, será indicado em casos que se conside-
rem também resolúveis económica e tecnicamente, mas em que não se verifique interesse
nem disponibilidade por parte dos proprietários. Neste caso, a acção será desenvolvida por
terceiros, podendo esta ser executada por órgãos públicos ou sociais que expropriam os ter-
renos (à semelhança do que aconteceu na Ilha da Bela Vista), ou privados que adquiram o
núcleo. 276
No modelo de saída prevê-se o realojamento do agregado familiar que deseja a mudança de
residência, para outro tipo de habitações, já edificadas ou construídas de raiz. 277
Nos novos tipos de ocupação, prevê-se isso mesmo, utilização destes espaços para outro tipo
de programa que não a habitação.278 Esta última medida, ainda que não seja ideal, já que as

271 Idem; Ibidem; Pág. 146


272 CONCEIÇÃO, Paulo; VÀZQUEZ, Isabel Breda (coord); “Ilhas do Porto - Programa Estratégico; Julho 2015;
Pág. 21
273 Em Conversa com o Vereador do Pelouro da Habitação e Acção Social, Dr. Manuel Pizarro, na Camara
Municipal do Porto, Dia 11 de Agosto de 2015
274 CONCEIÇÃO, Paulo; VÀZQUEZ, Isabel Breda (coord); “Ilhas do Porto - Programa Estratégico; Julho 2015;
Pág. 21
275 Idem; Ibidem; Pág. 21
276 Idem; Ibidem; Pág. 146
277 VÁZQUEZ, Isabel Breda; CONCEIÇÃO, Paulo (coord.); “Ilhas” do Porto, Levantamento e Caracterização;
Editado por Município do Porto; Porto; 2015; Pág. 146
278 Idem; Ibidem; Pág. 146
145
Ilhas perderiam a função que sempre lhes esteve associada, a habitação, poderá ser interes-
sante na medida em que dará uma nova vida a núcleos que não corresponderiam nunca às
necessidades mínimas de habitabilidade, consideradas básicas da cidade contemporânea.
Quando tal se verificar, sugere-se a procura de novas funções, que o espaço da Ilha possa ter,
não se perdendo a totalidade daquilo que as Ilhas representam. Onde idealmente se procu-
rariam novos usos dos quais a estrutura Ilha seja uma vantagem, por exemplo a utilização das
Ilhas como residência de estudantes, mantendo esta a carga social que sempre teve: ser o
espaço de recepção de população na cidade do Porto.
Além de explorar estes modelos de acção, o Programa Estratégico procurou também fazer
uma avaliação dos investimentos a realizar, para os quais foi necessário fazer um dimensio-
namento da intervenção física.
Este iniciou-se com a análise do estado de conservação, ocupação e o cálculo das áreas brutas
das construções existentes, segue-se a criação da proposta de reabilitação que de um modo
geral vai considerar áreas mínimas de conforto. Assim o programa tem como objectivo a cria-
ção de alojamentos com áreas brutas entre 50 a 60 m2, quase o dobro da área média actual
que rondará os 30 m2 (área bastante superior à considerada anteriormente que rondaria os
16 m2, é no entanto importante ter em conta que no estudo de 2014 assim como no de 2001
são incluídos também as áreas de “outros tipos de Ilhas”: vilas, quintas e bairros operários),
procura-se contudo não só manter a área bruta original de cada Ilha, mas também assegurar,
por uma questão “de coesão social e sustentabilidade económica”279 a permanência dos seus
habitantes, sempre que possível.
Este objectivo só é viável pelo facto de apenas 60% dos 8 265 fogos se encontrarem ocupados
e por a generalidade dos núcleos familiares serem bastante reduzidos.
Existirão casos em que o número de fogos novos, com as medidas preconizadas, não satisfa-
rão as necessidades de fogos actuais do núcleo e número de habitantes, sendo estes casos,
contudo, compensados por outros em que existirá um excesso de alojamentos.
Finalmente estudam-se ainda os eventuais instrumentos financeiros que poderão estar en-
volvidos neste processo de reabilitação dos núcleos. 280
Tendo como primeira referência a programação dos sistemas financeiros do país dos Fundos
Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI), entre 2014 - 2020, e as suas temáticas, que
apresentam como prioridades de investimento objectivos que podem estar relacionados com
as intervenções propostas para as Ilhas, objectivos ligados à “eficiência energética, de melho-
ria do ambiente urbano e revitalização de cidades, de inclusão e inovação social, de regene-
ração em territórios urbanos desfavorecidos e de capacitação institucional.“ 281 Além destes
fundos, as intervenções em Ilhas que se localizem nas ARU’s, como já foi acima menciona-
do, podem tornar as reabilitações mais fáceis e vantajosas. Outros tipos de instrumentos e
apoios podem também ser tidos em conta, como é o caso do recente programa Reabilitar
para Arrendar - Habitação Acessível, que procura promover a reabilitação de edifícios com
mais de 30 anos que se destinem essencialmente à habitação onde será aplicado o regime de
renda condicionada.
Termina-se o estudo fazendo referência à necessidade de definição de mais ”programas na-

279 CONCEIÇÃO, Paulo; VÀZQUEZ, Isabel Breda (coord); “Ilhas do Porto - Programa Estratégico; Julho 2015;
Pág. 42
280 Idem; Ibidem; Pág. 43
281 Idem; Ibidem; Pág.57
146

Figura 184 - Vista Area da Ilha da Bela Vista


147
cionais enquadrados em desafios específicos de qualificação de alojamentos precários. Será
importante equacionar, também, um programa municipal especificamente dirigido para este
fim.” 282
Resumidamente este plano procura desenvolver lógicas de organização espacial, modelos
de acção, e desenvolver e apurar formas de cooperação entre as várias partes interessadas,
bem como os instrumentos financeiros donde se poderão eventualmente conseguir fundos.
Ressalvando ainda em vários momentos a importância da criação de uma “estrutura com
autonomia relativa”283 , que se dedique inteiramente à gestão das intervenções bem como ao
acompanhamento que um programa de tal dimensão necessita.
Deixa-se no entanto mais uma vez a indicação de que tal documento é ainda provisório, como
tal de modo algum deve ser encarado como um compromisso da Câmara, mas antes, como
uma vontade da mesma em preservar, reabilitar e integrar as Ilhas da cidade.

“Chegou a hora de olhar as Ilhas como uma oportunidade de regeneração urbana de


rosto humano, adaptada às necessidades das pessoas e às dificuldades dos nossos
dias.” 284

É então baseado nesta ideia de Ilha enquanto oportunidade, que o município avança com o
que se espera ser o primeiro passo concreto de muitos e se inicia o processo da Ilha da Bela
Vista, pretendendo com ele incentivar e mobilizar a revitalização das Ilhas, já não como locais
de miséria e degradação, mas antes “um modo portuense de ser, ao mesmo tempo rude e ca-
rinhoso, individualista e solidário, mas sempre esforçado, frontal e determinado.”285 Esta Ilha,
a Ilha da Bela Vista, surge neste trabalho como um primeiro e actualmente único exemplo
prático de uma mudança de atitude da autarquia em relação às Ilhas da cidade.

4.1 A ILHA DA BELA VISTA: UM PROJECTO-PILOTO


A Ilha da Bela Vista é uma das poucas Ilhas que pertencem à Câmara pelo que a autarquia
está a requalifica-la, pretendendo que seja exemplo do que pode ser feito nestes espaços que
marcam tão profundamente a malha da cidade do Porto, no sentido de despertar o interesse
dos cidadãos por estes espaços, que tantas vezes são esquecidos.
Assim, foi na Bela Vista que se estabeleceu o LAHB Social, que como o próprio nome indica
é um espaço experimental que tem como objecto de estudo a habitação básica e social. Este
órgão técnico terá sido estabelecido pela Câmara, procura ser multidisciplinar, antropólogos,
assistentes sociais, arquitectos, geógrafos trabalham em parceria, em conjunto com os que
habitam a Ilha de modo a encontrar uma solução, satisfatória para todos.
Interessa perceber um pouco da história desta Ilha, para se perceber como chega aos nossos
dias, e como foi a evolução deste espaço desde que foi edificado.

282 CONCEIÇÃO, Paulo; VÀZQUEZ, Isabel Breda (coord); “Ilhas do Porto - Programa Estratégico; Julho 2015;
Pág. 60
283 Idem; Ibidem; Pág. 62.
284 Manuel Pizarro; in RODRIGUES, Fernando Matos; Ilha da Bela Vista; Edições Afrontamento; Porto;
2014; Pág. 5
285 Manuel Pizarro; in RODRIGUES, Fernando Matos; Ilha da Bela Vista; Edições Afrontamento; Porto;
2014; Pág. 5
148

Figura 185 - Aproximação à Bela Vista, Telles Ferreira, 1895

Figura 186 - Processo SAAL na Ilha da Bela Vista


149
A Ilha surge na antiga rua duquesa de Bragança, hoje rua D. João IV, na grande via que se
estendia do centro, desde a Praça de S. Lázaro até ao Monte dos Congregados, para Norte.
Foi aberta ao público em meados do século XIX, altura em que foi cedido à Câmara o terreno
necessário para a abertura desta artéria, na condição do seu proprietário poder dividir os
terrenos rurais que a ladeavam em talhões, que poria à venda para a edificação de prédios.286
Com o crescimento que a cidade vivia na altura, rapidamente esses terrenos começaram a
ser construídos.
Terá sido nesta rua, por volta de 1878, num terreno com aproximadamente 33 metros de
frente por 77 metros de profundidade, que nasceu a Ilha da Bela Vista. Como aconteceu em
grande parte dos terrenos que estavam a ser construídos, o proprietário procurou maximizar
o uso do solo do seu terreno. Para tal, dividiu esta parcela de terreno em 5 lotes com frentes
de cerca de 6 a 6.5 metros. Na frente de rua, foram edificadas casas burguesas, e para acesso
ao terreno de trás um único corredor, independente, com perto de 2 metros de largura.287
No terreno das traseiras, 45 fogos foram edificados, organizados em 4 fileiras, que teriam
acesso por dois corredores, duas fileiras encostadas ao limite do terreno e outras duas eram
agregadas back-to-back, algumas das habitações seriam térreas, outras teriam dois pisos.
As casas têm planta aparentemente quadrada, e a sua área varia entre os 25 e 35 m2. 288
Esta Ilha é, portanto, um meio-termo entre a “Ilha” típica, geralmente composta por casas
térreas e um só corredor de acesso, e o já mencionado bairro Alexandre Herculano, de maio-
res dimensões.
Assim na Ilha da Bela Vista as áreas dos fogos são ligeiramente maiores do que a generalidade
dos fogos de outras Ilhas, bem como os corredores de acesso às habitações, que são também
notoriamente mais largos.
A edificação da Ilha prima, no entanto, a par da generalidade das Ilhas da cidade, pela fraca
qualidade construtiva e uso de materiais pouco eficientes. Isto, aliado à pouca manutenção
que estes espaços tiveram, a longo prazo, terão sido algumas das causas que levaram ao es-
tado de ruína, que se verifica hoje em grande parte das células habitacionais da Bela Vista.
Os materiais usados na sua construção foram a alvenaria de granito, nas paredes principais,
que podiam ser ou não rebocadas, na divisão das habitações foi usado o tabique e o pavimen-
to seria de madeira.289 As habitações de origem não teriam instalações sanitárias, estas foram
instaladas muito depois da sua edificação da Ilha, já no século XX: dois blocos cada um com
10 sanitas e 10 chuveiros para toda a população que ocupava o espaço.
A ventilação das células habitacionais seria bastante deficiente, já que todas as aberturas se
encontravam na única fachada livre do fogo, situação que se verifica ainda hoje. Estas abertu-
ras dão à fachada colorida o ritmo tão característico das Ilhas, “Porta-Janela-Porta- Janela”.290
Os espaços comuns da Ilha funcionam como extensão do escasso espaço interior, este vai
sendo apropriado por cada um dos habitantes das maneiras mais variadas, um tanque, vasos
de plantas e flores, que dão mais vida as estes espaços ou a cadeira à porta de casa onde os
moradores passam muitos dos seus dias. Assim o habitante da Ilha procura marcar o seu “EU”

286 SILVA, Germano; À descoberta do Porto: Rua duquesa de Bragança; Jornal de Noticias; 23 de Março de
2014
287 RODRIGUES, Fernando Matos; Ilha da Bela Vista; Edições Afrontamento; Porto; 2014; Pág. 21 a 22
288 Idem; Ibidem; Pág. 22 a 23
289 RODRIGUES, Fernando Matos; Ilha da Bela Vista; Edições Afrontamento; Porto; 2014; Pág. 22
290 Idem; Ibidem; Pág. 23
150

Figura 187 - Planta do Estado de Ocupação da Ilha da Bela Vista

Figura 188 - Planta de Usos, Ilha da Bela Vista


151
no Espaço-Ilha, como se refere Fernando Matos Rodrigues.

“Ocupar o território leva-nos para a ideia da marcação intimamente ligada ao tempo


de ocupação; uma espécie de território pessoal que introduz marcas carregadas de uso
e de apropriação do Espaço-Ilha,” … “ Cada um tem um ritmo e um tempo de acção
próprio e personalizado, identificado pelo outro que vive a seu lado ou que habita na
casa do outro corredor.”291

Ainda assim e como continua, Fernando Mato Rodrigues, “Não existem registos ou marca-
ções agressivas e marginais no Espaço-Ilha”292, demonstrando com isso a proximidade e res-
peito que se vive, nestes espaço que os habitantes partilham.
A Ilha da Bela Vista terá integrado o Processo SAAL, altura em que se terá formado a associa-
ção de Moradores da Bela Vista. Ainda que tenha sido feito o levantamento e iniciado o pro-
jecto, à semelhança do que aconteceu com tantas outras acções do SAAL, não se conseguiu
concluir, por causa da interrupção do processo em 1976.
A Bela Vista terá iniciado a sua operação, com uma brigada técnica coordenada pelo arqui-
tecto Mário Moura, a 3 de Abril de 1975; esta acabou por ser substituída, em Junho do ano
que seguinte, por uma nova brigada, visto verificar-se um atraso na proposta projectual para
a Ilha, sendo esta nova equipe liderada por Mário Trindade.293
Para elaboração do relatório pré-projectual, foi realizado um levantamento ao espaço, e à
população. Na altura a Ilha teria 158 habitantes que ocupavam 52 fogos, dos quais 30 e 27%
seriam indivíduos com mais de 50 e menos de 14 anos de idade, respectivamente.
Todos os fogos já tinham água e electricidade, mas nem todos beneficiavam de instalações
sanitárias próprias, e os que as tinham haviam à custa dos próprios moradores.
No projecto pretendia-se a construção de uma ala contínua de habitações que estabeleceria
uma ligação das habitações existentes com o bloco que seria edificado à face da rua. Bloco
este, que viria substituir as casas burguesas, e que não excederia os 3 pisos de altura, alber-
gando habitações, uma sala de reuniões e convívio da Associação de Moradores. Para além
do acesso existente seria criado um outro no lado Sul, “possibilitando várias opções de per-
curso entre os diversos sectores do bairro.” Estava ainda prevista a criação de uma plataforma
dupla num ponto de confluência entre a zona recuperada e a zona nova e ficaria também
livre bastante terreno para jardim, procurando-se com estes espaços promover as relações
de vizinhança.
Sobre as células que iriam ser reabilitadas, previa-se apenas o aproveitamento das paredes
de pedra, sendo o resto substituído por novos materiais, com melhor qualidade. Sempre que
possível usar-se-iam as caixilharias existentes, tentando assim manter o aspecto da frente
das habitações. Previa-se a substituição da cobertura por uma estrutura aligeirada coberta a
telha, acabando deste modo com as infiltrações constantes que ocorriam dentro dos fogos.294
Hoje, 40 anos depois, a realidade deste espaço é bastante diferente da que se vivia então,
o processo SAAL foi interrompido e os projectos para a Ilha não se realizaram, a Bela Vista
continuou esquecida nas traseiras da Rua D. João IV.

291 LahbSocial; Memória Descritiva e Justificativa - Renovação da Ilha da Bela Vista, Operação 2014-2015;
Porto; 2014; Pág. 15
292 Idem; Ibidem; Pág. 15
293 RODRIGUES, Fernando Matos; Ilha da Bela Vista; Edições Afrontamento; Porto; 2014; Pág.58
294 RODRIGUES, Fernando Matos; Ilha da Bela Vista; Edições Afrontamento; Porto; 2014; Pág. 62
152

Figura 189 - Projecto de Reabilitação da Ilha da Vista


153
Nos dias que correm encontramos o mesmo terreno, com uma área de 1.707 m2, e a mesma
área construída de 1.186. Das células habitacionais existentes apenas 12 se encontram hoje
habitadas, aí vivem apenas 21 pessoas, situação que quando comparada com a de 1976, per-
mite verificar que este último número representaria apenas 13% da população que habitava
a Ilha então.295
Conclui-se assim que grande parte das habitações se encontram vazias, em muitos casos
porque os seus habitantes se mudaram para os bairros camarários da periferia da cidade. Por
estarem, há longos anos, desabitadas, encontram-se em estado avançado de ruína, uma vez
que não terão recebido qualquer tipo de manutenção, ou reparação desde então.
Nas poucas casas habitadas, encontram-se também os mais variados problemas: falta de ven-
tilação e de luz no interior do fogo, já que de um modo geral existe apenas uma janela, acres-
cido de duas no piso superior no caso das habitações duplex; falta de instalações sanitárias e
cozinha; humidades e infiltrações permanentes, condenando os seus moradores “no século
XXI, a viver com a falta de condições das classes mais pobres dos séculos anteriores.”296
Muitos dos habitantes já idosos, sofrem de problemas de saúde, próprios da idade avan-
çada. Por vezes têm problemas de mobilidade, que são apenas atenuados pelos amigos da
vizinhança que os ajudam, e porque apesar da irregularidade do pavimento, a inclinação do
terreno não é muito notória.
É então com base em todos estes factores, tendo em atenção a memória da cidade, da Ilha,
bem como as necessidades dos aqui vivem que se desenvolve o projecto de Reabilitação da
Ilha da Bela Vista.

4.2 O PROJECTO
A reabilitação da Bela Vista, projecto que se encontra já na 1º fase de execução, procurou
considerar em primeiro lugar os habitantes da Ilha, as pessoas que aqui vivem de um modo
geral há mais de 40 anos, tornando este projecto participativo, onde profissionais, técnicos
e moradores trabalham em conjunto, de modo a encontrar soluções menos evasivas e mais
confortáveis para os que aí viviam.
Na memória descritiva do projecto de reabilitação da Ilha é claro que este visa manter e in-
centivar o espirito comunitário, que sempre existiu neste espaço. Foram para isso incluídos
no programa espaços comuns e de encontro, como praças, jardins, hortas sociais, lavandaria,
centro de convívio, associação de moradores, estando estes 3 últimos integrados num edifí-
cio colectivo, e onde se prevê também a inclusão das instalações do LAHB Social.
Este Laboratório foi criado como órgão complementar da DOMUS Social para este projecto
e pretende continuar a sua procura de soluções expeditas para os problemas de habitação
básica e social.
Esta complexidade programática promove a integração social dos futuros habitantes, tendo
em atenção aspectos sociais, económicos e ecológicos.
Os espaços de encontro contrariam de alguma maneira a ideia do corredor, que de um modo

295 LahbSocial; Memória Descritiva e Justificativa - Renovção da Ilha da Bela Vista, Operação 2014-2015;
Porto; 2014; Pág. 1
296 Idem; Ibidem; Pág. 6
154

Figura 190 - Esquemas Explicativos do Projecto de Reabilitação da Ilha da Bela Vista


155
geral é associado a local de passagem e movimento. Este, contudo, no espaço da Ilha sempre
funcionou como extensão da casa, função que será mantida, na reabilitação da Ilha, com a
integração de bancos na fachada das casas. Dando ao morador da Ilha como que mais um
nível no espaço do seu “eu” na Ilha.

“Este programa recupera o conceito de casa como espaço da intimidade e da do-


mesticidade, numa nova ideologia de habitar próprio das sociedades pós-contempo-
râneas. Um programa que permita experiencia individual e colectiva dentro e fora de
portas, que articule espaço ocupado com espaço habitado, que possibilite uma maior
interacção entre espaço interior e exterior, que casa e rua, largo e corredor sejam con-
dições positivas de inclusão e socialização alargada.”297

Dos espaços individuais da Ilha, serão reabilitados um total de 32 fogos. No projecto previu-
-se apenas o aproveitamento das paredes exteriores. Os interiores existentes eram os mais
variados, somas de pequenas obras executadas pelo próprio habitante, ao longo dos anos
não revelando qualquer economia de meios, estruturas e espaços. Isto verifica-se porque os
interiores eram resultado de pequenas obras ocasionais, executadas pelos próprios habitan-
tes, quando eram uma necessidade máxima, ou quando a sua situação económica o permitia.
Para a execução deste vasto programa - 32 células habitacionais, 20 hortas sociais, o edifício
comunitário e espaços de estar - foi necessário agregar ao espaço da Ilha original duas outras
Ilhas que estariam justapostas ao limite Sul. Nesta nova proposta a área da Ilha aumenta de
1.707 para 2365 m2, dando-se por isso um aumento de 39% do terreno original.298
Ambas as Ilhas se encontravam em estado total de ruína, das antigas casas que faziam dela
parte quase nada se distingue, pelo que será aí que se concentrarão as hortas sociais. Aqui
será também criado um novo ponto de acesso, que procura facilitar a chegada a este espaço,
permitindo aos moradores vários percursos dentro do espaço da Ilha.
Quem vem pelo novo ponto de entrada, a sul, depara-se com uma praça e espaço de recreio,
que promove a interacção entre as pessoas da Ilha e da cidade que continua para além dos
muros. Encontra-se também na praça um acesso ao edifício comum. Por uma escadaria (um
percurso dos possíveis acessos à Ilha) sobe-se até à Rua do Lado que estabelece a ligação aos
corredores de acesso aos habitáculos, a Rua de Cima e Baixo.
É desta praça, também, que parte o percurso principal de chegada à Ilha da Bela Vista, o
qual se faz por uma escadaria mais ampla que vence o desnível acentuado do terreno. Esta
escadaria procura ser um percurso de ligação entre as ruas internas da Ilha.299 Com estes ele-
mentos procura-se criar como que um filtro natural entre o espaço público e privado da Ilha.
Há no entanto um limite físico, que terá sido criado a pedido dos moradores, que prezam a
privacidade da sua vida quase comunitária.
A rematar o acesso norte criou-se também uma pequena praça, a praça da Magnólia, que
procura, criar um outro momento de encontro e pausa para os habitantes.
Os espaços exteriores são também reabilitados prevendo-se a regularização dos pavimentos.
De maneira quase nostálgica, mantêm-se os tanques da roupa, que são parte da identidade
das Ilhas. Adossado na fachada forma-se um banco corrido que remata o edificado. Preten-

297 LahbSocial; Memória Descritiva e Justificativa - Renovção da Ilha da Bela Vista, Operação 2014-2015;
Porto; 2014; Pág. 9
298 Idem; Ibidem; Pág. 27
299 LahbSocial; Memória Descritiva e Justificativa - Renovção da Ilha da Bela Vista, Operação 2014-2015;
Porto; 2014; Pág.
156

Figura 191 - Esquema Explicativo, Sector Técnico, Projecto de Reabiltação da Ilha da Vista
157
de-se com este banco convidar o habitante a permanecer no espaço comum da Ilha, man-
tendo no corredor de acesso aos fogos, o uso que sempre teve, promovendo dessa forma as
relações de vizinhança.
A volumetria das bandas habitacionais mantem-se idêntica à original, havendo um aumento
ligeiro da cércea dos edifícios para os 4.65 e 6.92 metros, de forma a tornar os espaços inte-
riores mais amplos e arejados.300

4.3 A CÉLULA HABITACIONAL


Para uma melhor ventilação das células foi também criado em cada uma um pequeno espaço
exterior, um saguão, que permite não só mais entradas de luz nos fogos, mas também uma
maior circulação de ar, resolvendo deste modo um dos maiores problemas das casas das
Ilhas.301
No Bloco central, onde as células habitacionais se encostam back-to-back, os fogos teriam de
origem apenas uma água, e a sua exposição solar seria bastante deficiente. Para dar resposta
a este problema, modificou-se a cobertura das bandas de habitação deste bloco, que passam,
então, a ter duas águas. Esta alteração permite não só uma melhor insolação da casa, como
também diluir o ligeiro aumento da cércea da construção, tornando também o alçado da Rua
do Lado mais suave e ligeiro.
O habitáculo desenvolve-se a partir de um bloco técnico, onde vamos encontrar o pequeno
pátio; é neste mesmo bloco que se situam todas as infra-estruturas necessárias para a habita-
ção, para a cozinha, banhos e ventilação do fogo. Este bloco técnico é um dos pontos fulcrais
do projecto, por aglomerar todo o programa de infra-estruturas condensa também os custos
de obra num único ponto, tornando assim a execução deste projecto, com fundos limitados,
mais económico. 302
Dentro do espaço individual procurou-se também criar um filtro entre zonas comuns e pri-
vadas. Assim, de um modo geral, encontram-se no piso de entrada as zonas sociais, como a
Sala a cozinha e instalação sanitária, num 1º piso as zonas privadas, com os quartos, no sótão
encontramos um pequeno espaço de arrumo. 303
As zonas sociais do fogo são abertas, em open-space, dando a sensação de um espaço mais
amplo, e permitindo um uso polivalente dos espaços.
Na futura Ilha vão encontrar-se dois tipos de habitação, que são consequência de um estudo
realizado no sentido perceber a melhor maneira de aproveitar o espaço escasso das células
habitacionais; tendo também em conta a vontade e as necessidades dos habitantes, que ti-
veram sempre uma voz ao longo do processo de reabilitação.304
Cada uma destas tipologias tem dois modelos de habitação desenvolvidos. No modelo A,
temos a Casa Colmeia e a Casa Camarária; no modelo B encontramos a Casa Mezzanine e a

300 Idem; Ibidem; Pág. 27


301 Idem; Ibidem; Pág. 24
302 LahbSocial; Memória Descritiva e Justificativa - Renovção da Ilha da Bela Vista, Operação 2014-2015;
Porto; 2014; Pág. 24
303 Idem; Ibidem; Pág. 24
304 LahbSocial; Memória Descritiva e Justificativa - Renovação da Ilha da Bela Vista, Operação 2014-2015;
Porto; 2014
158

Figura 192 - Desenho da Celula Habitacional - Tipologia B - Casa Mezzanine

Figura 193 - Desenho da Celula Habitacional - Tipologia B - Casa Alcova

Figura 194 - Desenho da Celula Habitacional - Tipologia A - Casa Colmeia

Figura 195 - Desenho da Celula Habitacional - Tipologia A - Casa Camarata


159
Casa Alcova. Estas estariam organizadas em Células Simples e duplex.305

…” a definição das respectivas tipologias foi consequência da participação e mediação


de todos os actores profissionais, institucionais e moradores envolvidos neste processo
de renovação da Ilha da Bela Vista tendo como referencia uma arquitectura básica e
social.”306

Estas diferem entre si na estrutura e organização do fogo. No tipo A temos as habitações com
2 pisos + sótão onde se encontra um +1, que pode servir de arrumos e é acedido por uma
escada em caracol, o tipo B funciona como Studio com mezanino. Dentro desta estrutura a
organização do piso inferior é de um modo geral idêntica, alterando-se apenas a organização
do espaço superior, e o número de quartos na habitação. Com isto, pretende-se que a célula
habitacional se adapte às necessidades do agregado familiar.
Assim, com a excepção da Casa Alcova, o piso inferior tem as zonas sociais, e zona de banho.
A porta dá para um pequeno espaço de entrada, de frente para a escada que se desenvolve
em U, e é iluminado pela janela que se abre para o saguão, e pela da janela da sala. No pa-
tamar das escadas encontra-se um curto espaço de estudo ou escritório, composto por uma
pequena secretária e cadeira. A sala abre-se para a zona da cozinha, que se organiza em L.
É neste piso que se encontra também o quarto de banho de pequena dimensão, no espaço
debaixo da escada de acesso ao piso superior.
A Casa-Colmeia (Tipo A) é um T2+1, os dois quartos encontram-se no 1ºpiso, um quarto maior
encontra-se na fachada principal, o segundo quarto, mais pequeno, abre-se para o pequeno
ságuão. A Casa-Camarata, tem no piso superior apenas um quarto aberto prevê a ocupação
livre do espaço, existindo a possibilidade de uso de beliches de maneira a optimizar o seu uso.
Na tipologia B a Casa-Mezzanine desenvolve-se como o próprio nome indica em mezanino,
sendo que a zona da entrada e de estar do piso inferior são beneficiadas por um pé direito
mais elevado. No quarto, na varanda interior do fogo, um móvel faz a guarda da varanda do
interior da célula.
Por último temos a Casa-Alcova, um T1 com mezanino, tendo assim duas áreas de dormir.
Esta habitação caracteriza-se por ter um quarto no piso inferior. Este fogo terá sido desenha-
do para moradores com problemas de mobilidade.
Nestas 2 tipologias, e 4 modelos de habitação, procurou-se que a pequena habitação funcio-
nasse como um todo, coerente e não apenas como soma das pequenas partes, daí a “utiliza-
ção de conceitos como espaço fluído e aberto”307; permitindo assim que dentro dos escassos
25 a 45 m2 o espaço reduzido não se sentisse como uma limitação.

“A compaticidade, a densidade, a maximização do pequeno lote em função de um


cliente de parcos recursos, resulta num espaço construído que sendo um problema se
pode transformar na solução para a renovação na diversidade social da cidade.”308

305 Idem; Ibidem;Pág. 20


306 Idem; Ibidem; Pág. 21
307 LahbSocial; Memória Descritiva e Justificativa - Renovação da Ilha da Bela Vista, Operação 2014-2015;
Porto; 2014; Pág. 25
308 Idem; Ibidem; Pág 22
160

4.4 DEPOIS DA ILHA DA BELA VISTA


O projecto de reabilitação da Ilha da Bela Vista encontra-se já em andamento, tendo sido já
realojadas as famílias que habitavam as casa a reabilitar numa primeira fase de execução. Te-
rão sido realojadas em fogos que se encontravam vagos dentro da Ilha e que terão recebido
as intervenções necessárias para receberem estes novos residentes temporariamente, até
que estes se mudem para a sua nova habitação.
Estima-se que a primeira fase de obras tenha uma duração de aproximadamente 7 meses e
comecem a 15 Setembro, a segunda fase prevê-se com uma duração de 12 meses, segundo o
plano de execução com início em Janeiro de 2016.
Espera-se ainda que este projecto que seja apenas um de vários a serem desenvolvidos pelo
LAHB Social, que terá já recebido outras propostas de intervenção em diversos núcleos de
Ilhas com problemas idênticos aos da Ilha da Bela Vista.
A par do LAHB Social, e segundo as palavras do Vereador do Pelouro da Habitação e Acção
Social, a Camara do Porto vai procurar continuar este trabalho nas Ilhas mostrando que estes
espaços podem ser sustentáveis e reabilitados de diferentes formas em que tanto proprietá-
rio como inquilino possam beneficiar, continuando a dar o exemplo e seguindo com a reabili-
tação de mais duas Ilhas (da escassa meia dúzia) que é pertença da Câmara: a Ilha do Cortes
com 6 a 8 alojamentos, na travessa de Requesende; e outro núcleo com 19 fogos, localizado
entre a rua João das Regras e a rua do Bonjardim, acontecendo este último projecto em cola-
boração com a Santa Casa da Misericórdia de Lamego, uma vez que esta é proprietária de um
outro núcleo também a reabilitar no mesmo quarteirão.309 1
Estes núcleos com escalas tão diferentes da Ilha da Bela Vista, procuram mostrar que a rea-
bilitação é muitas vezes possível, independentemente da dimensão do núcleo, do seu estado
de ocupação, de conservação e também da sua localização.
Com isto a autarquia visa também sensibilizar os portuenses para existência e possibilidade
de reabilitação destes espaços, procurando assim tornar mais simples a implementação do
Programa Estratégico para as Ilhas do Porto.
Deixa-se neste assunto a nota de que mais uma vez estes planos são apenas isso mesmo,
planos que serão desenvolvidos eventualmente, e que aguardam ainda confirmação.

309 Em Conversa com o Vereador do Pelouro da Habitação e Acção Social, Dr. Manuel Pizarro, na Camara
Municipal do Porto, Dia 11 de Agosto de 2015
163

CONCLUSÃO:

As Ilhas da cidade do Porto chegam-nos hoje como representação fidedigna do que foram,
por excelência, as habitações das classes trabalhadores do Porto, desde a segunda metade do
século XIX, altura em que este tipo de habitação terá proliferado um pouco por toda a cidade,
até aos dias de hoje.
Estas habitações que se encontram nas traseiras da cidade foram durante essas décadas e nas
que se seguiram o ponto de entrada na cidade, que receberia a população que aqui chegasse.
Acabaram assim por se tornar num espaço de transição entre a antiga vida rural e a nova vida
citadina dos seus moradores.
Acabam contudo por ser espaços fechados, tipo concha, que com os seus muros protegem os
seus habitantes de qualquer intrusão, que se tornam espaços perfeitamente marginais aos
olhos da cidade.
No presente trabalho, procurou-se perceber quais terão sido as influências que estes espaços
tiveram, e como terá surgido o seu desenvolvimento na cidade do Porto. Apesar das similari-
dades que estas possam ter com outras habitações operárias, a maneira como aproveitam o
solo interior dos extensos quarteirões tão característicos da cidade.
Pode-se perceber uma clara aproximação das Ilhas com as típicas back-to-back houses, que
tão bem caracterizam as habitações operárias de Inglaterra. Pode-se no entanto perceber
algumas diferenças entre estas duas tipologias. As Ilhas têm uma expressão claramente rural,
enquanto as back-to-back houses, são representações perfeitamente urbanizadas, que se in-
cluem em zonas e bairros da cidade por qualquer motivo sem interesse para as classes mais
abastadas reflexo directo dessa diferença são alturas dos edifícios: enquanto as back-to-back
houses urbanas chegam a ter 3 pisos de altura, as Ilhas têm geralmente apenas um piso tér-
reo.
A influência britânica terá vindo das relações comerciais estabelecidas pelo vinho do Porto e
de algumas famílias inglesas que aqui se fixaram.
Estas surgiram no Porto, também como consequência da desproporção que se verificava na
divisão dos lotes, que teriam de um modo geral até 7 metros de largura e se prolongavam por
vezes até aos 110 metros de comprimento.
Essencial para o presente trabalho foi também perceber como terão as Ilhas conseguido so-
breviver até aos dias de hoje, pelo que foi realizado um breve estudo que procurou fazer o
enquadramento das políticas sociais em Portugal e das acções (ou não acções) dos sucessivos
governos que acabaram por permitir que por um lado estes espaços fossem preservados até
hoje, mas que por outro se mantivessem cristalizadas no século XIX.
Conclui-se assim que, apesar da indústria chegar a Portugal com quase um século de atraso,
terá sido recebida em cidades tão pouco preparadas como o seriam as cidades de
Inglaterra aquando da Revolução Industrial. Em Portugal, como em outros países, a situação
foi sendo resolvida com a construção de habitações precárias promovidas por pequenos bur-
gueses que rapidamente se aperceberam que o negócio da habitação barata exigia poucos
investimentos e prometia um rápido retorno.
Depressa se ocupou todo o espaço livre das zonas antigas das cidades, quer do Porto quer de
164
Lisboa, num processo que se pode assemelhar ao de Paris e Barcelona, onde as estreitas ruas
estariam em tão más condições como as pequenas casas.
Num momento seguinte, em Lisboa, desenvolveram-se os pátios, que poderão ser associados
aos Courts, de Birmingham ou Liverpool, bem como com as Mietskasernen de Berlim. No
Porto, nasceram as Ilhas, com influências das Back-to-back houses de Leeds, Manchester e
tantas outras cidades inglesas.
No início de 1880 surgem as primeiras preocupações higienistas, no governo de Fontes Perei-
ra de Melo, que se vão traduzir no Inquérito Industrial, onde são estudadas, pela primeira vez
no país, as habitações precárias do operariado.
Será como consequência deste inquérito que em Lisboa começam a surgir as vilas, que ini-
cialmente seguiam as indicações do estudo, e teriam as condições consideradas mínimas da
época; no entanto, rapidamente, devido ao pouco controlo, começam a perder qualidade
construtiva e espacial, tornando-se quase tão precários como os Pátios.
No Porto, mais uma vez à semelhança do que se terá passado em muitas cidades europeias,
só após um avassalador surto de peste é que o Estado revela algum tipo de preocupações
higienistas mais concretas e, ainda assim, não suficientes, traduzindo-se basicamente na cria-
ção de benefícios fiscais, para quem investir em habitações baratas.
Como consequência, surgem as primeiras acções filantrópicas no Porto, promovidas pelo Co-
mércio do Porto. Muda-se também a legislação que passa a prever que toda a obra construída
apresente projecto para aprovação da Câmara, (até então apenas seria preciso registar edifí-
cios que davam a fachada à rua, pelo que não haveria registo da edificação das Ilhas e espaços
semelhantes que se encontrassem nas traseiras das casas de frente de rua) conseguindo com
isto controlar de alguma forma a construção das Ilhas.
O Estado terá, até muito tarde, ignorado a falta de habitação e a situação precária em que
grande parte da população vivia, baseando-se na ideia de que este seria um problema a re-
solver entre inquilino e proprietário, não considerando o facto do inquilino pouco ou nada
poder fazer, devido aos seus escassos recursos económicos.
Apenas no ano de 1918, o Estado aprova a Lei das Rendas, que procura pela primeira vez pro-
teger os direitos dos arrendatários, prevendo apenas aumentos de 10% nas rendas e apenas
de 10 em 10 anos. Esta lei acabou, no entanto, por desequilibrar o mercado imobiliário, que
se terá desvalorizado e criou, a longo prazo, graves consequências para o estado dos edifícios,
que não foram sujeitas a qualquer tipo de investimento na sua conservação.
Nesse mesmo ano, o Estado assume, quase 40 anos depois do Inquérito Industrial, que é ne-
cessário erradicar as Ilhas. Para tal, seria impreterível tomar medidas mais eficazes, iniciando
o primeiro de vários programas de habitação económica patrocinada pelo Governo.
Assim nasce o programa das Casas Económicas, onde se previa a edificação de 1000 fogos
para a população operária. Estas acabaram, no entanto, por ser atribuídas à classe média, já
que as rendas seriam demasiado altas para os operários pagarem. Este programa terá sido
resgatado no ano de 1927, altura em que se previu a edificação de aproximadamente 10 000
fogos. Em 1933 o programa renasce, sendo que nesta altura se assumiu que as casas eram
direccionadas para trabalhadores do Estado.
O Governo evita a construção de habitação colectiva em altura, apesar de representar um
sistema mais rentável e sustentável, por acreditar que grandes concentrações de população
poderiam de alguma forma promover a rebelia popular.
No Porto, em 1929, Almeida Garrett promoveu um Inquérito aos espaços das Ilhas. Face aos
165
resultados obtidos nesse inquérito, concluído em 1933, o Município procurou, por uma pri-
meira vez, respostas concretas para os problemas que estes espaços representariam para a
saúde pública da cidade de modo geral.
Pela primeira vez, também, procura-se resolver o problema da habitação de forma racional,
para que as habitações construídas pudessem ter rendas sustentáveis, para os habitantes a
que se destinavam. Nestes moldes foi então edificado o Bloco de Saldanha, em forma de U,
com cerca de 115 habitações. Este terá sido dos primeiros blocos de habitação colectiva pro-
movido por dinheiros públicos, neste caso pela Câmara.
Só nos anos 40 terão surgido de forma mais generalizada bairros de habitação colectiva, com
as Habitações Económicas, sendo este o primeiro momento no sentido de uma política social
de habitação positiva, programa iniciado em 1946 , extinto apenas em 1972.
Este programa habitacional, apesar de ter sido desenvolvido para todo o país, teve no Porto
acções demasiado reduzidas, pelo que o município terá desenvolvido, em 1956, paralelamen-
te o Plano de Melhoramentos da Cidade (que incluía o Plano de Salubrização das Ilhas), em
que se procurava, de uma maneira geral, acabar com estas habitações precárias das classes
pobres da cidade. Para tal, o Município propôs a edificação 6000 fogos, que serviriam para
albergar a população saída das Ilhas a serem destruídas.
Estas políticas habitacionais desenvolvidas entre o segundo e o terceiro quartel do século XX,
apesar de afectarem públicos diferentes, de se apropriarem de maneira distinta do território
e de serem tipologicamente incomparáveis (já que no segundo quartel o governo terá inves-
tido em moradias com jardim, com baixa densidade populacional e pouco aproveitamento
do solo, enquanto no terceiro investiu na habitação colectiva), têm em comum um factor
essencial: todas elas se focaram nos territórios periféricos da cidade, com poucos acessos e
fraca ligação através de transportes públicos, condenando assim, de modo geral, a população
que aí habitava ao isolamento.
Toda esta situação se terá agravado quando efectivamente as acções se focaram nas classes
mais desfavorecidas, que não teriam qualquer poder de compra e a quem era imposta uma
mudança de casa, de bairro, de vizinhos, para um ambiente onde estariam confinados a um
novo espaço, deixando para trás tudo o que sempre conheceram, e criando situações graves
de desenraizamento da população.
Note-se, no entanto, que se tivesse existido ao longo de todos estes anos uma política de re-
novação e reabilitação do centro histórico, as Ilhas teriam sido provavelmente, todas destruí-
das, já que até então estas terão sido sempre encaradas como habitação precária a erradicar.
As Ilhas tiveram, então, um primeiro momento de reconhecimento com o SAAL no pós 25 de
Abril, altura em que se lutou pelo direito à cidade e se conseguiu melhorar as condições de
vida de muitos portuenses, mantendo-os na sua zona de conforto.
Todo este processo terá apenas sido possível pelo período conturbado que a nível político se
vivia no país, sendo, no entanto também consequência de uma mudança de mentalidade,
preparada por parte dos profissionais da arquitectura e urbanismo ao longo dos anos que a
antecederam. Mudança essa, que terá sido generalizada apenas pela publicação de alguns ar-
tigos e estudos, muitos deles produzidos pelo LNEC, Laboratório Nacional de Engenharia Civil,
sobre os acontecimentos na Europa e no mundo que apreendiam as medidas que poderiam
ser aplicadas em Portugal.
Neste processo participativo, que foi o Serviço Ambulatório de Apoio Local, SAAL, pela pri-
meira vez as Ilhas foram entendidas como parte da cidade, que não precisa, nem deve ficar
166
escondida nas traseiras da cidade, onde sempre estiveram. Estas são, neste movimento, en-
caradas pelo que sempre foram: pequenos agregados de habitações, unidos por um corredor
ou espaço comum, onde os moradores se encontram e convivem. Terá sido sempre nesta
perspectiva que o SAAL terá intervindo nestes espaços.
Construindo quando necessário, reabilitando quando possível, cada espaço foi nestes projec-
tos desenvolvido de maneira que a equipa técnica e os moradores ficassem satisfeitos com
as mudanças.
O processo SAAL ainda que não tenha sido dirigido apenas para as Ilhas, até porque foi um
processo que se desenvolveu a nível nacional, terá sido de extrema importância para estas
começarem a ser encaradas sem os preconceitos que as haviam seguido até então. Todo este
processo surge incluído num conjunto de acções prioritárias promovidas pelo FFH, Fundo de
Fomento de Fomento da Habitação.
Ainda assim, e mais uma vez, as Ilhas voltarão a ser esquecidas com a interrupção do processo
SAAL seguindo-se no país um período ainda muito influenciado por ideias que promoveriam
a habitação de interesse social, e que se viria a reflectir na vasta construção de cooperativas.
Este foi um momento muito interessante, já que estas teriam não só uma enorme preocupa-
ção com o desenho dos espaços interiores do fogo mas também com os dos exteriores, não
estando a edificação de um complexo normalmente destinada apenas um grupo ou classe
social, promovendo a mistura de classes, evitando a segregação e a criação de guetos, como
acontece frequentemente nos bairros camarários (onde apenas habitam as classes insolven-
tes e consequentemente acabam por se tornar espaços de exclusão dentro da cidade).
As cooperativas eram, no entanto, um movimento autónomo, não sendo por isso uma po-
lítica de habitação promovida pelo Estado. Ainda assim, acabaram por ser talvez a solução
mais equilibrada, pelo facto de darem oportunidade a classes mais pobres de conseguirem
condições dignas, sem as separar do resto da cidade.
Ainda assim, no final do milénio, as políticas habitacionais voltam-se de novo para a edifica-
ção de bairros camarários, ocupados por classes sociais homogéneas, com programas como
o PER, que procurava erradicar os bairros de lata que haviam ao longo de todo o século sido
construídos, principalmente em Lisboa e no Porto.
Apenas mais tarde se nota uma preocupação por parte do Estado na recuperação do pa-
trimónio imobiliário, ficando o PER responsável pela reabilitação de imóveis devolutos, se
estes viessem a ser ocupados por famílias recenseadas no programa.
Só já na viragem do milénio o Estado começa a demonstrar alguma preocupação com os cen-
tros históricos das cidades e os seus problemas.
É o caso do Porto, onde por altura do Porto 2001 Capital Europeia da Cultura se começou a
perceber o quão desaproveitados e abandonados estes espaços centrais se encontravam. O
evento iniciou o debate mas não se conseguiu resolver os problemas levantados.
Foram criadas as SRU’s, no caso da cidade nortenha, a Porto Vivo, constituída em 2004, que
de alguma que tem como objectivo a resolução de alguns dos problemas acima referidos.
Estas sociedades que procuram criar as condições necessárias para motivarem o investimento
de privados nas áreas críticas da cidade, gerando uma cooperação público-privada, acabam
contudo por não conseguir de uma maneira geral proteger os interesses públicos que essa
cooperação deveria ter, acabando por se gerar um processo de gentrificação dessas áreas,
obrigando a população, chamemos-lhes “nativa”, desses locais a fugir aos novos e demasiado
altos preços que se passam a praticar nessas áreas.
167
As Ilhas são mais uma vez descuradas já que não integram os espaços de acção destes planos.
Ainda assim, foram realizados estudos a pedido do município, no ano de 2001, que terão sido
actualizados em 2011, mas que não levaram à criação de qualquer acção prática. Este esque-
cimento deve-se em grande parte ao facto destes núcleos serem, na sua maioria, privados e,
consequentemente, não serem considerados como responsabilidade da Câmara.
Como é notório, as Ilhas terão sido, desde a sua construção, espaços claramente negligencia-
dos, inicialmente pela maneira como foram edificadas (com fracos materiais, e pela falta de
cuidado com que os espaços eram desenhados), mais tarde, por se deixar que estes espaços
ficassem escondidos e fossem encarados como a vergonha da cidade.
Assim, durante mais de um século e meio de existência, as Ilhas terão recebido algum pro-
tagonismo em apenas quatro momentos: aquando da peste bubónica no final do século XIX,
onde pela primeira vez a cidade reconhece a existência destes espaços, como um problema,
mas nenhuma atitude se terá tomada; já muito mais tarde nos anos 50 do século XX, quando
é realizado o inquérito a estes espaços, promovido por Almeida Garrett, e se cria o Plano de
Salubrização das Ilhas, que pretendia destruir a grande parte destes espaços; entre 1974 e
1976 no processo SAAL, momento em que estas não serão propriamente protagonistas, mas
onde são encaradas sem preconceitos, e vistas como parte (física, cultural, e ideológica) da
cidade; por último, as acções promovidas pela Câmara Municipal da cidade de hoje, desen-
volvidas no capítulo anterior.
A verdade será que o facto de as Ilhas serem privadas pode ser um problema para a autar-
quia, dificultando de alguma forma uma possível acção, mas podem também e devem até,
ser encaradas como parte de uma possível solução do problema da habitação, envolvendo
menos custos por parte do Estado.
De certa forma, e na sequência da ideia de que as Ilhas são recuperáveis, a Câmara de hoje,
tem promovido acções que se mostram promissoras para estes núcleos. Terá não só desen-
volvido um estudo aprofundado sobre as Ilhas, mas também pedido um estudo detalhado de
formas de acção possíveis para promover a sua requalificação sempre que viável, tendo tam-
bém iniciado o processo de reabilitação da Bela Vista (umas das poucas que são propriedade
da autarquia), promovendo desta forma estes núcleos e mostrando que este tipo de projecto
é possível e viável, mesmo quando executado com um orçamento limitado, que no caso desta
Ilha, se prevê que, não passe dos 21 000€ por fogo tornando este um projecto-piloto e um
exemplo para toda a cidade.
Há uma clara mudança na maneira como a autarquia está a tratar este problema, mais apro-
ximada da metodologia do processo SAAL: prevê uma abordagem mais humana e sensível
com as pessoas que habitam estes espaços, consequentemente mais inclusiva e positiva para
a cidade total, a habitação básica e social no centro da cidade, algo que até hoje nunca se
verifica, reflectindo-se num grande abandono dos espaços do centro.
Termina-se assim este trabalho, deixando, em aberto o futuro das Ilhas que marcam profun-
damente, há mais de um século e meio, não só a estrutura urbana (escondida) da cidade, mas
o carácter da sua população humilde e simples, e também forte, lutadora, solidária e acima
de tudo muito humana.
169

Bibliografia
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(3º)

Conferências, Conversas e Debates


Frequentados no âmbito da Dissertação
Conversa com o Vereador do Pelouro da Habitação e Acção Social; Doutor Manuel Pizarro; Câmara
Municipal do Porto; 11 de Agosto de 2015
172
Conversas com Eng. José António Ferreira, do Gabinete de Estudos e Planeamento da DomusSocial; 9
de Julho de 2015 e 11 de Agosto de 2015;
Cultura em Expansão – Programa na Ilha da Bela Vista com participação dos residentes
18 OUT 2014

Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974-1976 | Serralves


01 NOV 2014 |Visita à exposição por Delfim Sardo (curador da exposição) e José António Bandeirinha
08 NOV 2014 |Álvaro Siza Conversa com a associação de moradores da Bouça
22 NOV 2014|Sérgio Fernandez conversa com a Associação de Moradores do Leal
13 DEZ 2014 |Pedro Ramalho conversa com a associação de moradores das Antas
17 JAN 2015 | Eduardo Souto de Moura conversa com a associação de moradores de S. Victor

Seminário do Rio Bom | LAHB Social


18 ABR 2015

Bairros do Porto - Memórias/Tempo de Futuro


05 AGO 2015 |Habitar no Porto - Trajetos do passado/Perspetivas do futuro
12 AGO 2015 | Sistemas de Informação Geográfica - instrumentos para a gestão
26 AGO 2015 |Tanta Gente Sem Casa
02 SET 2015 |Conversa e debate: “ReCOOPerar os bairros do Porto, fazer cidade com as cooperativas
09 SET 2015 | Precisamos de um novo SAAL?
173

Índice de Imagens
Figura 1 - Rua de Glasgow, Thomas Annan............................................................................................................ 16
San Francisco Museum of Modern Art; Online em http://amica.davidrumsey.com/

Figura 2 - Modelo de Spinning Jenny (melhorado)................................................................................................ 20


http://www.wikiwand.com/

Figura 3 - Capa Original do Livro, de Freidrich Engels............................................................................................ 20


https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Die_Lage_der_arbeitenden_Klasse_in_England

Figura 4 - Gravura do Interior de uma pequena Fábrica........................................................................................ 20


GAULDIE, Enid; Cruel Habitations: A history of the Working-Class Housing 1780-1918, 1974

Figura 5 - British Beehive, George Cruikshank, 1867............................................................................................. 22


The British Museum; http://www.bl.uk/collection-items/the-british-bee-hive

Figura 6 - Bairro Pobre de Londres, Gustave Doré em 1872.................................................................................. 24


BENEVOLO, Leonardo; História da Cidade; Edição Perspectiva; São Paulo; 1999; Pág. 560

Figura 7 - Dudley Street em Londres, Gustave Doré em 1872............................................................................... 24


BENEVOLO, Leonardo; História da Cidade; Edição Perspectiva; São Paulo; 1999

Figura 8 - Vista Aérea de Hulme, na periferia de Manchester, e o intenso aproveitamento de solo no bairro
operário edificado no inicio do século XX............................................................................................................. 26
http://www.exhulme.co.uk/

Figura 9 - Planta de Bairros Periféricos Ingleses segundo os regulamentos de 1875............................................ 26


Leodis - a photographic archive of Leeds < http://www.leodis.net/>
Figura 10 - Quarry hill, Leeds em 1901.................................................................................................................. 26
Leodis - a photographic archive of Leeds < http://www.leodis.net/>

Figura 11 - Quarteirões de casas back-to-back, em Eldon Street, Leeds............................................................... 26


Leodis - a photographic archive of Leeds < http://www.leodis.net/>

Figura 12 - Back-to-Back Houses, nas traseiras de George Street em Leeds.......................................................... 26


Leodis - a photographic archive of Leeds < http://www.leodis.net/>

Figura 13 - Beco de St. Peter Street em 1901........................................................................................................ 26


Leodis - a photographic archive of Leeds <http://www.leodis.net/>

Figura 14 - Vista do interior da muralha de Barcelona, antes do Plano Cerdá, 1855............................................ 28


http://www.labarcelonadeantes.com/

Figura 15 - Modelo típico de das, casas edificadas em Barcelona, Classe 3, encontravam-se geralmente em ruas
com largura de 3 a 4 metros.................................................................................................................................... 30
CERDÀ, Ildefonso; Ensanche de la ciudad de Barcelona, Memoria descriptiva de los trabajos facultativos e estudios
estadísticos hechos de Orden del Gobierno, y consideraciones que se han tenido presentes en la formación del
Ante-Proyecto Para el Emplazamiento y distribución de Nuevo Casario

Figura 16 - Classe 4, encontravam-se geralmente em ruas com largura de 2, 5 a 3 metros.................................. 30


CERDÀ, Ildefonso; Ensanche de la ciudad de Barcelona, Memoria descriptiva de los trabajos facultativos e estudios
estadísticos hechos de Orden del Gobierno, y consideraciones que se han tenido presentes en la formación del
Ante-Proyecto Para el Emplazamiento y distribución de Nuevo Casario

Figura 17 - Proposta de Josep Fontseré i Mestre para a Expansão de Barcelona, 1959........................................ 30


https://commons.wikimedia.org/wiki/File:EixampleBCN-projecteFontsere

Figura 18 - Proposta Vencedora do concurso para a Expansão de Barcelona, por Antoni Rovira i Trias, 1859..... 30
Museu d’Historia de la Ciutat, Barcelona online em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:EixampleBCN-pro-
jecteRovira

Figura 19 - Projecto Final, Plano Cerdá, 1859........................................................................................................ 30


http://www.wikiwand.com/es

Figura 20 - Vista da Île-de-la-Cité em 1855, Fotografia de Bisson, anterior às demolições de Haussman............ 32


http://vergue.com/pages/Ile-de-la-Cite-Haussmann

Figura 21 - Planta com as demolições île-de-la-Cité.............................................................................................. 34


174
PINON, Pierre; Atlas du Paris Haussmanien; Editions Parigramme;2002; Pág.140

Figura 22 - Demolições Île-de-la-Cité, LL. Viollet................................................................................................... 34


PINON, Pierre; Atlas du Paris Haussmanien; Editions Parigramme;2002; Pág. 16

Figura 23 - Demolições para abertura da Avenida da Ópera, Fotografia de Coll Viollet, 1878.............................. 36
PINON, Pierre; Atlas du Paris Haussmanien; Editions Parigramme;2002; Pág. 6

Figura 24 - Esquema de demolições para abertura das Ruas em Paris................................................................. 36


PINON, Pierre; Atlas du Paris Haussmanien; Editions Parigramme;2002; Pág.7

Figura 26 - Gravura de Edmund Texier, 1852......................................................................................................... 38


Figura 27 - Fachada e Corte dos novos edifícios de Paris, 1855............................................................................ 38
BENEVOLO, Leonardo; História da Cidade; Edição Perspectiva; São Paulo; 1999; Pág. 573

Figura 28 - New Harmony, 1817, de Robert Owen, Gravura de 1825.................................................................... 38


http://dizionaripiu.zanichelli.it/

Figura 29 - Falanestério de Charles Fourier, Gravura do Plano Geral de Granger.................................................. 38


http://fineartamerica.com/featured/fourier-phalanx-design-granger

Figura 30 - Vista do Interior do Familistério de Guise, Jean- Baptiste Godin......................................................... 40


https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Familistère_Central_Guise_Intèrieur.

Figura 31 - La Cité Napoleão, fotografia do pátio coberto................................................................................... 40


http://unpetitpoissurdix.fr/2014/08/24/la-cite-napoleon/

Figura 32 - Perspectiva do Phalanstère de Charles Fourier................................................................................... 40


- https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Familist%C3%A8re_1.jpg

Figura 33 - Vista de uma cidade operária de Paris, 1870....................................................................................... 40


Musee de la Ville de Paris, Musee Carnavalet, Paris, France. Online em: http://www.pbslearningmedia.org/re-
source/xir253257fre/workers-housing-estate-58-rue-rochecho-xir253257-fre/

Figura 34 - Schlossbrücke de Schinkel, em Berlim, 1866....................................................................................... 42


https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Berlin_Schlossbruecke_Schinkel_AE.jpg

Figura 35 - Planta de um Quarteirão..................................................................................................................... 46


Reitzig,Markus; Berlin-Wedding in der Zeit der Hochindustrialisierung (1885-1914); Berlin, 2004

Figura 36 - Aproximação a Grundriß Otawistraße 38............................................................................................ 46


Reitzig,Markus; Berlin-Wedding in der Zeit der Hochindustrialisierung (1885-1914); Berlin, 2004

Figura 37 - Mietskaserne, em 1910....................................................................................................................... 46


Deutsches Historisches Museum, Berlin; Online em: https://www.dhm.de

Figura 38 - Interior de uma casa em Elendsquartier, 1910.................................................................................... 46


Deutsches Historisches Museum, Berlin; Online em: https://www.dhm.de

Figura 39 - Mapa de Berlim, de, W.B. Clarke, 1833............................................................................................... 46


David Rumsey Historical Map Collection; Online em: http://www.davidrumsey.com/

Figura 40 - Proposta Vencedora de Herman Jensen para o concurso Groß-Berlin, em 1910................................ 48


Technische Universität Berlin Architekturmuseumin der Universitätsbibliothek; Online em: http://architekturmu-
seum.ub.tu-berlin.de/

Figura 41 - Proposta de Bruno Schimtz, Groß-Berlin 1910.................................................................................... 48


Technische Universität Berlin Architekturmuseumin der Universitätsbibliothek; Online em: http://architekturmu-
seum.ub.tu-berlin.de/

Figura 42 - Joseph Brix, para Groß-Berlin, 1910.................................................................................................... 48


Technische Universität Berlin Architekturmuseumin der Universitätsbibliothek; Online em: http://architekturmu-
seum.ub.tu-berlin.de/

Figura 43 - Perspectiva Aérea da proposta de Bruno Schimtz, para Groß-Berlin 1910.......................................... 48


Havestadt, Contag & Schmitz , Wettbewerb Groß-Berlin 1910. Neu-Berlin am Nordzentralbahnhof: Perspektiv-
ische Ansicht (Vogelschau) (wie Inv.Nr. 8009). Druck auf Papier, 57,40 x 155,50 cm (inkl. Scanrand). Architekturmu-
seum der Technischen Universität Berlin Inv. Nr. 8010.

Figura 44 - Capa do Livro “Garden Cities of Tomorrow de Ebenezer Howard, 1902............................................. 50


www.architectsjournal.co.uk/news/public-backs-garden-cities
175
Figura 45 - Diagrama da expansão das cidades jardins......................................................................................... 50
HOWARD, Ebenezer; Garden Cities of To-morow; Faber Editions; 1970; Pág. 54

Figura 46 - Os 3 imans........................................................................................................................................... 50
HOWARD, Ebenezer; Garden Cities of To-morow; Faber Editions; 1970; Pág. 46

Figura 47 - Esquema de Organização de uma Cidade-Jardim.............................................................................. 50


HOWARD, Ebenezer; Garden Cities of To-morow; Faber Editions; 1970; Pág. 53

Figura 48 - Diferentes níveis de expansão da Cidade do Futuro de Theodor Fischer............................................ 50


Figura 49 - Hufeisensiedlung, Bruno Taut, 1925-1930........................................................................................... 52
http://www.zeitlosberlin.com/

Figura 50 - Großsiedlung Onkel-Toms-Hütte, de Bruno Taut, Hugo Härig, Otto Rudolf de 1926-32...................... 52
http://ic.ucsc.edu/~jhfrisk/germ119/Architecture/architekturfuhrer/673.htm

Figura 51 - Cartaz da Exposição Die Wohnung, em Stuttgart 1927....................................................................... 52


http://catalog.quittenbaum.de/

Figura 52 - Largo do Limoeiro - Pátio do Carrasco, Armando Serôdo, 1968.......................................................... 56


Arquivo Municipalde Lisboa, Online em: aps-ruasdelisboacomhistria.blogspot.

Figura 53 - Pátio do Gil........................................................................................................................................... 60


http://olhai-lisboa.blogspot.pt/2011_08_01_archive.html

Figura 54 - Vila Ramos........................................................................................................................................... 60


Dias; Joaquim Mendonça; ed. lit; Roteiro cultural dos pátios e vilas da Sétima Colina / Lisboa 94-Capital Europeia
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Figura 55 - Pátio do Batalha - Planta de Sobreloja................................................................................................. 60


Dias, Joaquim Mendonça, ed. lit; Roteiro cultural dos pátios e vilas da Sétima Colina / Lisboa 94-Capital Europeia
da Cultura, Divisão de Reabilitação Urbana dos Pátios e Vilas; Lisboa: Contexto; 1994; Pág. 75

Figura 56 - Interior do Pátio do Batalha................................................................................................................. 60


Dias; Joaquim Mendonça; ed. lit; Roteiro cultural dos pátios e vilas da Sétima Colina / Lisboa 94-Capital Europeia
da Cultura; Divisão de Reabilitação Urbana dos Pátios e Vilas; Lisboa: Contexto; 1994

Figura 57 - Pátio do Alto do S. Francisco................................................................................................................ 60


Dias; Joaquim Mendonça; ed. lit; Roteiro cultural dos pátios e vilas da Sétima Colina / Lisboa 94-Capital Europeia
da Cultura; Divisão de Reabilitação Urbana dos Pátios e Vilas; Lisboa: Contexto; 1994

Figura 58 - Pátio do Alto de S. Francisco - Planta a Nivel dos Pátios...................................................................... 60


Dias; Joaquim Mendonça; ed. lit; Roteiro cultural dos pátios e vilas da Sétima Colina / Lisboa 94-Capital Europeia
da Cultura; Divisão de Reabilitação Urbana dos Pátios e Vilas; Lisboa: Contexto; 1994

Figura 59 - Vila Bagatela........................................................................................................................................ 60


Dias; Joaquim Mendonça; ed. lit; Roteiro cultural dos pátios e vilas da Sétima Colina / Lisboa 94-Capital Europeia
da Cultura; Divisão de Reabilitação Urbana dos Pátios e Vilas; Lisboa: Contexto; 1994

Figura 60 - Pátio do Pimenta.................................................................................................................................. 60


Dias; Joaquim Mendonça; ed. lit; Roteiro cultural dos pátios e vilas da Sétima Colina / Lisboa 94-Capital Europeia
da Cultura; Divisão de Reabilitação Urbana dos Pátios e Vilas; Lisboa: Contexto; 1994

Figura 61 - Vila Martel........................................................................................................................................... 60


Dias; Joaquim Mendonça; ed. lit; Roteiro cultural dos pátios e vilas da Sétima Colina / Lisboa 94-Capital Europeia
da Cultura; Divisão de Reabilitação Urbana dos Pátios e Vilas; Lisboa: Contexto; 1994

Figura 62 - Desenhos de Projectos Tipo para Casas Económicas do Porto............................................................ 62


Azevedo, Maria José, pref; Porto Câmara Municipal Pelouro da Habitação e Acção Social; Porto: Câmara Municipal
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Figura 63 - Vista Aérea do Bairro Gomes da Costa, Casas Económicas, 1950........................................................ 62


http://portoarc.blogspot.pt/2013/02/bairros-da-cidade-xxx.html

Figura 64 - Bairro da Boavista, Fotografia Domingos Alvão, 1945......................................................................... 64


PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
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Figura 65 - Vista Aérea da construção do Bairro de Alvalade, Augusto Abreu Nunes, 1953................................. 64
PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013
176
Figura 66 - Plano de Urbanização da Zona Sul da Avenida Alferes Malheiro, de Guilherme Faria de Costa, ........ 64
PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 67 - Plano Geral do Bairro de Olivais-Sul, Casas de Renda Económica da FCP-HE, I plano do GTH....... 66
PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
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Figura 68 - Fotografia do Bloco F, Bairro Olivais-Sul............................................................................................... 66


AMADO, Miguel Ribeiro; Densificação vs Retracção - Que Futuro Para os Olivais? A Revista do Conceito de Uni-
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Figura 69 - Plano Geral do Bairro de Olivais-Sul, Casas de Renda Económica da FCP-HE, I plano do GTH....... 66
PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 70 - Fotografia dos Olivais-Norte Nuno Teotónio Pereira........................................................................... 66


Boletim do GTH da CML, vol. 3, n.º 20, 1º semestre de 1971, Online em: http://infohabitar.blogspot.pt/

Figura 71 - 1º Plano Geral do Bairro de Ramalde, Porto, Projecto de Fernando Távora, Habitações Económicas -
FCP........................................................................................................................................................................... 66
Távora, Fernando, Lisboa: Editorial Blau, 1993

Figura 72 - Bairro de Ramalde, de Fernando Tavora.............................................................................................. 66


FERNADEZ, Sergio Percurso, Arquitectura Portuguesa, Lisboa, Livros Cotovia, 1993

Figura 73 - Bairro de Barcelos, Perspectiva do anteprojecto, Nuno Teotónio Pereira, 1959, FCP - HE.................. 66
PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 74 - Bairro Barcelos, Projecto de Nuno Teotónio Pereira s, FCP -, HE......................................................... 66


Arquivo Nuno Teotónio Pereira, fotografia original, Online em:http://infohabitar.blogspot.pt/

Figura 75 - Estudo Habitação Evolutiva e Adaptavel, LNEC................................................................................... 68


http://infohabitar.blogspot.pt/

Figura 76 - Habitação Evolutiva, Desenhos de António Baptista Coelho, LNEC..................................................... 68


http://infohabitar.blogspot.pt/

Figura 77 - Esquema de relações dos factores que condicionam o uso da casa e que a devem definir, LNEC...... 70
PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 78 - Esquemáticas com diferentes tipos de Ocupações possíveis, em lotes estreitos, médio e quadrados,
LNEC, 1971.............................................................................................................................................................. 70
PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 79 - Artigo sobre o Colóquio Sobre a Política de Habitação....................................................................... 70


PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 80 - Capa do Relato Final do Colóquio sobre Politica de Habitação, 1969............................................... 72


PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 81 - Capa do Relatório de Execução do III plano de Fomento, 1968........................................................... 72


PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 82 - Plano Intercalar de Fomento 1965-1967............................................................................................. 72


PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 83 - Quinta da Fonsecas, Quinta da Calçada, Alçado, 1975........................................................................ 72


SARDO, Delfim (coord.) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974- 1976; Porto; Fundação de Serralves;
2014; Pág. 198

Figura 84 - Quinta da Fonsecas, Quinta da Calçada, Estudo da Implantação, 1975............................................. 72


SARDO, Delfim (coord.) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974- 1976; Porto; Fundação de Serralves;
2014; Pág. 197
177
Figura 85 - Quinta da Fonsecas, Quinta da Calçada, José Pedro Cortes, 2014...................................................... 72
SARDO, Delfim (coord.) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974- 1976; Porto; Fundação de Serralves;
2014; Pág. 186

Figura 86 - Esquema topográfico do novo bairro.................................................................................................. 72


ARDO, Delfim (coord.) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974- 1976; Porto; Fundação de Serralves;
2014; Pág. 179

Figura 87 - Quinta do Bacalhau, Monte Coxo, 1998.............................................................................................. 72


SARDO, Delfim (coord.) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974- 1976; Porto; Fundação de Serralves;
2014; Pág. 51

Figura 88 - Alçados................................................................................................................................................ 72
SARDO, Delfim (coord.) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974- 1976; Porto; Fundação de Serralves;
2014; Pág.176

Figura 89 - Planta da 2ª Fase da Cooperativa dos, Arquitectos, Projecto de Manuel Correia Fernandes.............. 74
Informação Obtida pelo Autor, no decorrer do 3º Ano do Curso; Cadeira de Construção;

Figura 90 - Sache, 2ºFase, Projecto de Manuel Correia Fernandes....................................................................... 74


http://ciamh.up.pt/teca

Figura 91 - Fotografia Sache, 1ª fase em Ramalde, Projecto de Manuel Correia Fernandes, 1990....................... 74
http://infohabitar.blogspot.pt/2008_08_01_archive.html

Figura 92 - Bairro da Malagueira, 2011................................................................................................................. 74


Fotografia do Autor, 2011

Figura 93 - Bairro da Malagueira, 2011................................................................................................................. 74


Fotografia do Autor, 2011

Figura 94 - Bairro Da Malagueira, Projecto de Habitação Evolutiva, Plantas e Alçados, Projecto de Álvaro Siza,
1978........................................................................................................................................................................ 74
PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 95 - Cooperativa Tripeira, Projecto de Noé Diniz de 1984, Matosinhos..................................................... 76


PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 96 - Cooperativa Santo Ildefonso, Projecto de Alfredo Resende em 1982, Porto....................................... 76


PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 97 - Cooperativa Tripeira, Projecto de Noé Diniz em 1984, Matosinhos.................................................... 76


PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 98 - Cooperativa o Lar Familiar, Projecto de Mário Bonito de 1955, Porto................................................. 76


PORTAS, Nuno (coord); Habitação Para o Maior Número, os anos 1950-1980; Lisboa: Instituto da Habitação e da
Reabilitação Urbana; Câmara Municipal de Lisboa, 2013

Figura 99 - Entrada de uma Ilha, Rua de S. Victor, 2015........................................................................................ 84


Fotografia do Autor, 2015

Figura 100 - Vista Aérea do Porto, antes das demolições na Sé............................................................................ 88


http://www.portoantigo.org/

Figura 101 - Sobreocupação da Cidade................................................................................................................. 88


Figura 102 - Desenvolvimento Urbanos no Final do Século XVII e inícios do XVIII, sobre a Planta Redonda de
George Black, 1833................................................................................................................................................ 88
Planta Redonda de George Black, 1833, trabalhada pelo Autor

Figura 103 - Exemplos de diferentes tipo de Ilhas................................................................................................. 90


TEIXEIRA, Manuel; Habitação Popular na cidade Oitocentista – As ilhas do Porto; Lisboa: Fundação Calouste Gul-
benkian e Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica; 1996

Figura 104 - Disposição tipo de Ilha em relação à casa de frente de rua............................................................... 90


FERNANDES, Francisco Barata; Transformação e permanência na habitação portuense : as formas da casa na for-
ma da cidade Porto; Faup Publicações, 1999; Pág. 210
178
Figura 105 - Fotografia do Bairro do Vilar.............................................................................................................. 92
TEIXEIRA, Manuel; Habitação Popular na cidade Oitocentista – As ilhas do Porto; Lisboa: Fundação Calouste Gul-
benkian e Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica; 1996

Figura 106 - Bairro Alexandre Herculano, 2015..................................................................................................... 92


Fotografia do Autor, 2015

Figura 107 - Aproximação ao Bairro do Vilar......................................................................................................... 92


“Carta Topográphica da Cidade do Porto”, escala 1:5000, Telles Ferreira, 1895, Arquivo Municipal do Porto

Figura 108 - Aproximação ao Bairro Alexandre Herculano.................................................................................... 92


“Carta Topográphica da Cidade do Porto”, escala 1:5000, Telles Ferreira, 1895, Arquivo Municipal do Porto

Figura 109 - Localização das Principais Ilhas do Porto........................................................................................... 92


TEIXEIRA, Manuel; Habitação Popular na cidade Oitocentista – As ilhas do Porto; Lisboa: Fundação Calouste Gul-
benkian e Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica; 1996

Figura 110 - Ilha de Fernão Magalhães, 1974........................................................................................................ 94


SARDO, Delfim (coord.) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974- 1976; Porto; Fundação de Serralves;
2014; Pág. 82

Figura 111 - Uma Ilha do Porto.............................................................................................................................. 94


PEREIRA, Gaspar Martins; As Ilhas no percurso das famílias trabalhadoras do Porto em finais do século XIX – Porto;
2010

Figura 112 - Interior de Ilha já demolida............................................................................................................... 94


FERNANDES, Francisco Barata; Transformação e permanência na habitação portuense : as formas da casa na for-
ma da cidade Porto; Faup Publicações, 1999

Figura 113 - Uma Ilha já demolida......................................................................................................................... 94


FERNANDES, Francisco Barata; Transformação e permanência na habitação portuense : as formas da casa na for-
ma da cidade Porto; Faup Publicações, 1999

Figura 114 - Ilha na Rua de S. Victor, 2015............................................................................................................ 96


Fotografia do Autor, 2015

Figura 115 - Ilha na Rua de S. Victor, 2015............................................................................................................ 96


Fotografia do Autor, 2015

Figura 116 - Ilha, Rua de S. Victor, 2015............................................................................................................... 96


Fotografia do Autor, 2015

Figura 117 - Bairro Alexandre Herculano, 2015..................................................................................................... 96


Fotografia do Autor, 2015

Figura 118 - Acesso para Ilha, Rua de S. Victor, 2015............................................................................................ 96


Fotografia do Autor, 2015

Figura 119 - Ilha com dois pisos, Rua de S. Victor................................................................................................. 96


Fotografia do Autor, 2015

Figura 120 - Cordão Sanitário do Porto, 1899........................................................................................................ 98


Diário de Noticias, 30 ago. 1899, em ALMEIDA, Maria Antónia Pires de; As epidemias nas notícias em Portugal:
cólera, peste, tifo, gripe e varíola, 1854-1918; Hist. cienc. saude-Manguinhos vol.21 no.2 Rio de Janeiro Apr./June
2014

Figura 121 - Desinfestação de uma ilha do Porto. Phot.ª Guedes......................................................................... 98


http://monumentosdesaparecidos.blogspot.pt/

Figura 122 - Projecto do Bairro do Comércio do Porto, Monte Pedral, de Marques da Silva, 1899.................... 100
Desenho de Fundação Marques da Silva; Online em:https://fims.up.pt/

Figura 123 - Bairro do Bonfim, 2015...................................................................................................................10v2


Fotografia do Autor, 2015

Figura 124 - Bairro do Bonfim - Monte das Antas, 2015...................................................................................... 102


Fotografia do Autor, 2015

Figura 125 - Abertura da Rua Mouzinho da Silveira............................................................................................ 102


http://www.portoantigo.org/v

Figura 126 - Ruas Mousinho da Silveira e das Flores, cerca de 1900................................................................... 102
http://www.portoantigo.org/
179
Figura 127 - Bairro das Condominhas, Fotografia Alvão...................................................................................... 104
Centro Português de Fotografia

Figura 128 - Projecto do Núcleo de Saldanha, Porto........................................................................................... 106


Azevedo, Maria José, pref; Porto Câmara Municipal Pelouro da Habitação e Acção Social; Porto: Câmara Municipal
do Porto. Pelouro da Habitação e Acção Social, 1997

Figura 129 - Vista do Pátio do Bloco Saldanha, 2015........................................................................................... 106


Fotografia do Autor, 201

Figura 130 - Vista do Interior do Pátio do Bloco Saldanha, 2015............................................................... 106


Fotografia do Autor, 2015

Figura 131 - Vista do Interior do Pátio do Bloco Saldanha, 2015................................................................... 106


Fotografia do Autor, 2015

Figura 132 - Bloco de Duque de Saldanha, Antes da Construção do Bloco que fecha o mesmo para a Rua....... 106
Azevedo, Maria José, pref; Porto Câmara Municipal Pelouro da Habitação e Acção Social; Porto: Câmara Municipal
do Porto. Pelouro da Habitação e Acção Social, 1997

Figura 133 - Plano do Bairro Fonte da Moura...................................................................................................... 108


PORTO, Câmara Municipal; Plano de Melhoramentos para a Cidade do Porto; Porto; CMP 1956

Figura 134 - Bairro Fonte da Moura..................................................................................................................... 108


PORTO, Câmara Municipal; Plano de Melhoramentos para a Cidade do Porto; Porto; CMP 1956

Figura 135 - Vista Aérea do Bairro da Pasteleira.................................................................................................. 108


PORTO, Câmara Municipal; Plano de Melhoramentos para a Cidade do Porto; Porto; CMP 1956

Figura 136 - Localização dos Bairros Camarários e demolições do Plano de Melhoramentos, 1956.................. 108
PORTO, Câmara Municipal; Plano de Melhoramentos para a Cidade do Porto; Porto; CMP 1956

Figura 137 - Capa do Plano de Melhoramentos.................................................................................................. 110


PORTO, Câmara Municipal; Plano de Melhoramentos para a Cidade do Porto; Porto; CMP 1956.............................

Figura 138 - Bairro Fonte da Moura..................................................................................................................... 110


PORTO, Câmara Municipal; Plano de Melhoramentos para a Cidade do Porto; Porto; CMP 1956.............................

Figura 139 - Plano Regular da Cidade do Porto - Planta Síntese 1952................................................................. 110
http://portoantigo.taf.net/dp/taxonomy_menu/1?from=1118

Figura 140 - Planta Síntese do Plano Director do Porto....................................................................................... 110


Andresen, T., Sá, M. F. & Almeida, J. (coord.); Jacques Gréber, Urbanista e Arquitecto de Jardins,
Porto: Fundação de Serralves; 2011

Figura 141 - Manifestação Porto, 1 de Maio, 1974.............................................................................................. 112


SARDO, Delfim (coord.) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974- 1976; Porto; Fundação de Serralves;
2014; Pág. 47

Figura 142 - Porto, Maio de 1975........................................................................................................................ 116


Centro de Documentação 25 de Abril, Universidade de Coimbra, Online em: http://www1.ci.uc.pt/cd25a/wikka.
php?wakka=projSAAL

Figura 143 - Manifestação do SAAL, 1 de Maio de Porto..................................................................................... 116


SARDO, Delfim (coord.) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974- 1976; Porto; Fundação de Serralves;
2014

Figura 144 - Cartazes de Manifestações do SAAL................................................................................................ 116


Centro de Documentação 25 de Abril, Universidade de Coimbra, Online em: http://www1.ci.uc.pt/cd25a/wikka.
php?wakka=projSAAL

Figura 145 - Simpósio SAAL, Porto....................................................................................................................... 116


Centro de Documentação 25 de Abril, Universidade de Coimbra, Online em: http://www1.ci.uc.pt/cd25a/wikka.
php?wakka=projSAAL

Figura 146 - Projecto Bairro do Leal, de Sérgio Fernandez.................................................................................. 118


Figura 147 - Bairro do Leal Antes da Intervenção em 1974................................................................................. 118
SARDO, Delfim (coord.) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974- 1976; Porto; Fundação de Serralves;
2014; Pág.127

Figura 148 - Bairro do Leal, por André Cepeda, 2014.......................................................................................... 118


SARDO, Delfim (coord.) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974- 1976; Porto; Fundação de Serralves;
2014; Pág.127

Figura 149 - Bairro do Leal, 2015......................................................................................................................... 118


Fotografia do Autor, 2015

Figura 150 - Bairro do Leal, 2015......................................................................................................................... 118


Fotografia do Autor, 2015

Figura 151 - Projecto de Intervenção do SAAL para Miragaia, Não Construido................................................... 120
Exposição do Processo SAAL, Serralves 2014

Figura 152 - Projecto de Intervenção do SAAL para Miragaia.............................................................................. 120


Exposição do Processo SAAL, Serralves 2014

Figura 153 - Fotografia da Maquete da Intervenção SAAL em Miragaia............................................................. 120


Exposição do Processo SAAL, Serralves 2014

Figura 154 - Projecto de Intervenção do SAAL para Miragaia.............................................................................. 120


Exposição do Processo SAAL, Serralves 2014

Figura 155 - Estudo para Projecto de Recuperação das Ilhas, ALvaro Siza.......................................................... 120
Exposição do Processo SAAL, Serralves 2014

Figura 156 - Estudo para Projecto de Recuperação das Ilhas, ALvaro Siza.......................................................... 120
Exposição do Processo SAAL, Serralves 2014

Figura 157 - Bairro das Antas, Construção........................................................................................................... 120


SARDO, Delfim (coord.) O Processo SAAL: Arquitectura e Participação, 1974- 1976; Porto; Fundação de Serralves;
2014; Pág. 186

Figura 158 - Rigorosos para o Bairro das Antas................................................................................................... 120


Exposição do Processo SAAL, Serralves 2014

Figura 159 - Implantação do Bairro das Antas, Projecto de Pedro Ramalho....................................................... 120
Exposição do Processo SAAL, Serralves 2014

Figura 160 - Rigorosos do projecto de S. Victor, Álvaro Siza Vieira...................................................................... 122


Exposição do Processo SAAL, Serralves 2014

Figura 161 - Bairro S. Victor, 2015....................................................................................................................... 122


Fotografia do Autor, 2015

Figura 162 - Traseiras do Bairro de S. Victor, 2015.............................................................................................. 122


Fotografia do Autor, 2015

Figura 163 - Bairro de S. Victor, 2015.................................................................................................................. 122


Fotografia do Autor, 2015

Figura 164 - Planta da Bouça, Projecto de Álvaro Siza Vieira............................................................................... 122


https://portuguesearchitectures.files.wordpress.com/

Figura 165 - Corte Bairro da Bouça, Projecto de Álvaro Siza Vieira..................................................................... 122
https://portuguesearchitectures.wordpress.com

Figura 166 - Bairro da Bouça, 2015...................................................................................................................... 122


Fotografia do Autor, 2015

Figura 167 - Bairro da Bouça................................................................................................................................ 122


Fotografia do Autor, 2015

Figura 168 - Bairro da Bouça................................................................................................................................ 122


Fotografia do Autor, 2015

Figura 169 - Ilha de Anibal Cunha, 2015.............................................................................................................. 124


Fotografia de Rui Gomes de Almeida, Trabalhada pelo Autor, 2015

Figura 170 - Espaço públicos intervencionados na zona da Sé e Barredo........................................................... 126


ALFREDO, Julieta C. Cruz; Planeamento e Gestão em Zonas Históricas; FEUP; Porto; 1997

Figura 171 - Operação de Renovação de Edificios do Barredo e Ribeira, 1975-1994.......................................... 126


ALFREDO, Julieta C. Cruz; Planeamento e Gestão em Zonas Históricas; FEUP; Porto; 1997

Figura 172 - Reabilitação de Casa na Ribeira....................................................................................................... 128


Figura 173 - Projecto de Intervenção na zona da Sé............................................................................................ 128
Borges, ANTÓNIOR; Relatório final : projecto piloto urbano da Sé, Porto / texto e concepção António Borges ;
colaboração Jorge Repolho; Porto : Câmara Municipal, 1998

Figura 174 - Mapa dos Limites de Intervenção da, Porto Vivo............................................................................ 128
Figura 175 - Estado de conservação do edificado da zona a intervir................................................................... 130
SRU MAster Plan Volume I

Figura 176 - Localização dos Nucleos da Ilhas do Porto, 2015............................................................................. 132


VÁZQUEZ, Isabel Breda; CONCEIÇÃO, Paulo (coord.); “Ilhas” do Porto, Levantamento e Caracterização; Editado por
Município do Porto; Porto; 2015

Figura 177 - Ilha de Anibal Cunha, 2015.............................................................................................................. 132


Fotografia do Autor

Figura 178 - Ilha na rua de S. Victor, 2015........................................................................................................... 132


Fotografia do Autor

Figura 179 - Fachada da Rua de S.Victor com Acesso a uma Ilha, 2015.............................................................. 132
Fotografia do Autor

Figura 180 - Fotografiado Interior da Bela Vista, de............................................................................................ 138


RODRIGUES, Fernando Matos; Ilha da Bela Vista; Edições Afrontamento; Porto; 2014

Figura 181 - Localização actual das Ilhas............................................................................................................. 140


VÁZQUEZ, Isabel Breda; CONCEIÇÃO, Paulo (coord.); “Ilhas” do Porto, Levantamento e Caracterização; Editado por
Município do Porto; Porto; 2015, Pág. 158

Figura 182 - Tabela com dados sobre, o número de núcleos a intervencionar em cada fase do Programa Estratégi-
co........................................................................................................................................................................... 142
CONCEIÇÃO, Paulo; VÀZQUEZ, Isabel Breda (coord); “Ilhas do Porto - Programa Estratégico; Julho 2015; ......... 142

Figura 183 - Situações Problemáticas das Ilhas do Porto, 2015........................................................................... 142


VÁZQUEZ, Isabel Breda; CONCEIÇÃO, Paulo (coord.); “Ilhas” do Porto, Levantamento e Caracterização; Editado por
Município do Porto; Porto; 2015

Figura 184 - Vista Area da Ilha da Bela Vista........................................................................................................ 146


Material cedido pelo LAHB Social

Figura 185 - Aproximação à Bela Vista, Telles Ferreira, 1895.............................................................................. 148


“Carta Topográphica da Cidade do Porto”, escala 1:5000, Telles Ferreira, 1895, Arquivo Municipal do Porto

Figura 186 - Processo SAAL na Ilha da Bela Vista................................................................................................. 148


Material cedido pelo LAHB Socia

Figura 187 - Planta do Estado de Ocupação da Ilha da Bela Vista....................................................................... 150


Material cedido pelo LAHB Socia

Figura 188 - Planta de Usos, Ilha da Bela Vista.................................................................................................... 150

Figura 189 - Projecto de Reabilitação da Ilha da Vista......................................................................................... 152


Material cedido pelo LAHB Socia
Figura 190 - Esquemas Explicativos do Projecto de Reabilitação da Ilha da Bela Vista....................................... 154
Material cedido pelo LAHB Socia

Figura 191 - Esquema Explicativo, Sector Técnico, Projecto de Reabiltação da Ilha da Vista.............................. 156
Material cedido pelo LAHB Socia

Figura 192 - Desenho da Celula Habitacional - Tipologia A - Casa Colmeia......................................................... 158


Material cedido pelo LAHB Socia

Figura 193 - Desenho da Celula Habitacional - Tipologia A - Casa Camarata...................................................... 158


Material cedido pelo LAHB Socia

Figura 194 - Desenho da Celula Habitacional - Tipologia B - Casa Mezzanine..................................................... 158


Material cedido pelo LAHB Socia

Figura 195 - Desenho da Celula Habitacional - Tipologia B - Casa Alcova........................................................... 158


Material cedido pelo LAHB Socia
FAUP | 2015

Dissertação de Mestrado Integrado em Arquitectura

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