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Jonathan Edwards e a soberania de Deus no avivamento

Jonathan Edwards (1703-1758) foi um dos grandes líderes do


avivamento do século XVIII, que tem sido chamado pelos norte-
americanos de “Grande Despertamento”. Um estudo sério acerca deste
assunto terá de levar em conta o que ele fez e escreveu.

D. Martyn Lloyd-Jones (1899-1981) e J. I. Packer, ao escreverem


sobre Edwards, entendem que é na questão do avivamento que ele é
preeminentemente o mestre. Avivamento é um derramamento do
Espírito, e “se vocês quiserem saber algo sobre o avivamento
verdadeiro, Edwards é o homem que se deve consultar”, arremata
Lloyd-Jones.1
Em sua clássica obra A Treatise Concerning Religious
Affections (Tratado sobre Afeições Religiosas), Edwards nos fala
sobre a atuação do Espírito Santo, dando grande atenção à experiência
pessoal.2 O anseio de Edwards em diferenciar a experiência religiosa
verdadeira da falsa resultou de sua preocupação pastoral no contexto
do avivamento. Ele pregou uma série de sermões sobre 1 Pedro 1.8
tratando do assunto, em 1742-1743. O Tratado resultou da revisão do
texto desses sermões para publicação em 1746. Nesta obra, Edwards
argumentou que o cristianismo verdadeiro não se evidencia pela
quantidade ou intensidade das emoções religiosas, mas por um
coração transformado que ama a Deus e busca o seu prazer. Ele faz
uma análise rigorosa das diferenças entre a religiosidade carnal e
a verdadeira espiritualidade, que toca o coração com a visão da
excelência de Deus e liberta o homem do egocentrismo. Edwards
lutou em duas frentes: contra os adversários do avivamento e
contra os extremistas; contra o perigo de extinguir o Espírito e
contra o perigo de deixar-se levar pela carne e ser iludido por
Satanás.
Por um lado, tinha que argumentar contra aqueles que
descartavam todo o avivamento como histeria irracional; por
outro, tinha que argumentar contra aqueles que pareciam pensar
que tudo o que aconteceu no avivamento era “de Deus”, não
importa quão estranho, extremista ou desequilibrado isso fosse
(…).
Em sua tentativa de traçar um caminho intermediário entre esses
extremos, a um tempo similares e opostos, Edwards confrontou-se
com uma série de questões fundamentais.3
Nos seus escritos, Edwards avaliou a experiência religiosa à luz das
Escrituras e das suas convicções reformadas. O ponto de partida da
sua pregação e da sua teologia foi o Deus soberano, em sua majestade,
graça e glória. Edwards incluía uma ênfase na obra soberana e
graciosa de Deus, ao tratar do avivamento. Segundo ele, o avivamento
é uma visitação divina. É Deus vindo e agindo de maneira
poderosamente incomum entre o seu povo. Utilizando a analogia do
mar, o avivamento seria como as ondas do mar, que vêm e
quebram sobre a praia, e nós podemos visualizar a história
constatando essas ondas vindo e quebrando. De fato, a história dos
avivamentos seria a história do povo de Deus.
Num avivamento, ou experiência religiosa genuína, o critério principal
é este: se quem está no centro das atenções é Deus ou o ser humano.
Para que Deus esteja no centro é necessário, em primeiro lugar, que
haja nos corações um profundo senso de incapacidade, de dependência
de Deus, e de convicção da nossa pecaminosidade. Além disso, é
preciso que haja a consciência de que toda genuína experiência
religiosa é fruto da atuação do Espírito de Deus, que transforma e
santifica os pecadores, capacitando-os a amar e honrar a Deus em suas
vidas.

Portanto, todas as teorias de salvação que dão ênfase às obras


humanas ou à capacidade humana só desmerecem a grandeza do amor
de Deus revelado a nós em Cristo Jesus e tornado real em nossos
corações somente pela iluminação do Espírito Santo.4
The Distinguishing Marks of a Work of the Spirit of God (As Marcas
Distintivas de uma Obra do Espírito de Deus) é um pequeno mas
importante livro de Edwards baseado em um sermão que pregara em
Boston, durante o Grande Despertamento.5 Depois do sermão, ele fez
alguns acréscimos e publicou o livro em 1741. Trata-se de uma
exposição do capítulo 4 da Primeira Epístola de João, texto que nos
exorta a provarmos “os espíritos se procedem de Deus, porque muitos
falsos profetas têm saído pelo mundo fora”. De fato, no argumento de
Edwards, a palavra “evidência” seria preferível à palavra “marca”.
Edwards extrai dos escritos do apóstolo João um total de quatorze
sinais ou evidências que indicam a presença ou ausência do Espírito
de Deus numa pessoa, movimento ou igreja. A seguir, ele oferece
cinco conclusões práticas para a igreja, encerrando com sua ênfase
característica na humildade em todas as coisas do Espírito. Esta
questão lhe era crucial, pois sua igreja fora atingida pelo Grande
Despertamento nas décadas de 30 e 40 do século XVIII, e aquele
período foi de grande agitação e confusão, à medida que se faziam
todos os tipos de reivindicação espiritual.
Em seu livro Jonathan Edwards e o Avivamento Brasileiro, o qual
recomendo ao leitor, Luiz Roberto França de Matos (1956-2004), ao
analisar os escritos de Edwards, conclui sobre os “princípios úteis para
julgar se uma obra espiritual ou movimento religioso efetivamente
vem do Espírito”. Que princípios são esses? O autor resume-os como
segue:
1. Quaisquer manifestações exteriores resultantes de experiências
extraordinárias não são um sinal fidedigno de espiritualidade e não
asseguram uma obra genuína do Espírito.
2. Uma obra verdadeira do Espírito de Deus produzirá uma mudança
radical na natureza de uma alma individual, que irá expressar-se em
um comportamento e prática completamente novos, revelando-se
progressivamente a imagem de Jesus Cristo implantada no crente.6
Quanto ao avivamento, é ele um período marcante, quando Deus,
de forma rápida e impressionante, expande o seu Reino através de
um revitalizar da sua igreja; é obra poderosa do Espírito Santo no
meio de muita gente ao mesmo tempo. O avivamento é uma
intensificação do Cristianismo. Não é um outro tipo de
Cristianismo, mas uma intensificação do mesmo quando em
tempos normais. Não é diferente em essência; a diferença é de
grau e não de tipo. O Catecismo Maior de Westminster, na resposta
à pergunta de número 182, diz que o Espírito Santo nos ajuda
“operando em nossos corações, e despertando (embora não em
todas as pessoas, nem em todos os tempos, na mesma medida)
aquelas apreensões, afetos e graças que são
necessários…”.7Alguém recorreu à analogia entre uma “chuva
normal” e uma “chuva forte”. Num contexto de avivamento, os
crentes são mais zelosos, pecadores são atraídos, e mesmo os
incrédulos que não se convertem, se vêem convencidos da
verdade.
J. I. Packer diz que a “Escritura aponta para um processo
repetido muitas vezes, mediante o qual, seguindo-se à frieza,
descuido e infidelidade existentes dentre o povo de Deus, o próprio
Deus age soberanamente para restaurar o que estava prestes a
perecer”. E acrescenta: “E através do transbordamento
evangelístico consequente, [Deus] torna a estender ainda mais o
reino de Cristo”.8
Uma observação importante, que deve novamente ser enfatizada,
é que o avivamento vem exclusivamente de Deus. “Porventura,
não tornarás a vivificar-nos, para que em ti se regozije o teu
povo?” (Sl 85.6). O desejo do salmista está voltado para Deus, pois o
homem não pode operar esta façanha. É Deus quem pode vivificar. O
avivamento é uma obra soberana de Deus, pois “o vento sopra onde
quer” (Jo 3.8). Nós não podemos dar uma ordem para que haja um
avivamento, e ele não segue um modelo previamente fixado por
qualquer homem. Nós estamos amarrados à misericórdia de Deus.
“Pois assim como o Pai ressuscita e vivifica os mortos, assim também
o Filho vivifica aqueles a quem quer” (Jo 5.21). Isto não deveria
causar-nos desespero, mas fome, um apetite pela visitação de Deus.
Deveria nos levar à humilhação. Na compreensão de Edwards,
avivamento é algo que acontece, não é algo que se promove. O
homem não é o agente; ele é objeto dessa obra do Espírito. Deus é
absolutamente soberano em cada dádiva que concede. Isto é tão
verdadeiro acerca do avivamento como é de qualquer grande obra
redentora.

J. I. Packer colocou isto nas seguintes palavras:

O avivamento é Deus demonstrando a soberania de sua graça.


Avivamento é inteiramente obra da graça, pois sobrevém a igrejas e
cristãos que merecem apenas julgamento; e Deus o faz acontecer de
maneira a mostrar que sua graça foi decisiva nele. Os homens podem
organizar convenções e campanhas e buscar a bênção de Deus sobre
elas, mas o único organizador dos avivamentos é Deus, o Espírito
Santo. Repetidas vezes, o avivamento tem vindo de maneira súbita,
irrompendo frequentemente em lugares obscuros, através do
ministério de homens também obscuros. Na verdade, ele vem em
resposta à oração, e onde ninguém orou é provável que também
ninguém seja avivado; entretanto, a maneira pela qual a oração é
respondida será de forma a enfatizar a soberania de Deus como a
única fonte de avivamento, mostrando que todo o louvor e toda a
glória precisam ser dados somente a ele.9

Iain Murray, em seu excelente livro Pentecost Today, chama a


atenção para o fato de que a soberania de Deus no avivamento é
revelada em que Ele é soberano nos instrumentos que se propõe
utilizar neste sentido, em seus propósitos no avivamento, e com
relação ao tempo quando o avivamento começa.10
Roberts & Gruffydd, em seu livreto Avivamento e seus Frutos, quando
se referiram ao avivamento de 1762, no País de Gales, escreveram:
Avivamento, por definição, é o próprio princípio de vida da igreja. O
poder que produz a vida é o próprio princípio de sua vida. O poder
que traz à vida é o poder que sustém a vida. A igreja como um corpo
de crentes permanece numa contínua necessidade do vivificante
Espírito de Deus.11
Evans observa que “um dos fatos mais coagentes e convincentes que
serve para demonstrar a soberania do Espírito Santo em instaurar
reavivamentos é a maneira simultânea de manifestar Sua operação em
vários lugares e pessoas”.12 E o mesmo autor salienta o papel da
oração. Não obstante ser obra graciosa e soberana, o avivamento
sempre vem através da oração. Oração intensa e persistente. A correta
compreensão da doutrina da soberania de Deus não implica em
passividade da parte do povo de Deus. Edwards colocara isto da
seguinte maneira:
Quando Deus tem algo muito grande para realizar em favor da sua
igreja, a vontade dele é que isso seja precedido pelas orações
extraordinárias do seu povo, segundo manifestado por Ezequiel
36.37… E é revelado que, quando Deus está para realizar grandes
coisas para a sua igreja, ele começará derramando de maneira notável
o espírito de graça e de súplicas (Zc 12.10).13
“Aviva a tua obra, ó SENHOR, no decorrer dos anos, e, no decurso
dos anos, faze-a conhecida; na tua ira, lembra-te da misericórdia” (Hc
3.2). Isaías 64 é uma oração muito própria em favor de um
avivamento. Também o salmista ora: “Vivifica-me, SENHOR, por
amor do teu nome; por amor da tua justiça, tira da tribulação a minha
alma” (Sl 143.11). Além disto, a pregação da Palavra de Deus é
instrumento de Deus para reavivar seu povo. O SENHOR utiliza sua
própria Palavra (Sl 119.25; Ez 37.9). O Salmo 119 descreve a Palavra
de Deus como o meio para o reavivamento do povo de Deus: “Estou
aflitíssimo; vivifica-me, SENHOR, segundo a tua palavra” (Sl
119.107). O impulso do avivamento há de partir do Senhor, como
também o poder que acompanha a Palavra deve ser atribuído a Ele.
Enfim, se pudermos falar de uma metodologia em Edwards, esta era,
basicamente, orar por avivamento e expor a palavra da Escritura.

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