Tratamento de superfícies por jateamento.

Caio Cesar Antunes Cirino

a
Departamento de Engenharia, Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Campus Blumenau, 89036-002
Blumenau, SC, Brasil

Informações Resumo
O processo de jateamento é uma técnica
Avaliação proposta como parte da aprovação na amplamente utilizada para tratar superfícies,
disciplina de Engenharia de superfícies. removendo revestimentos indesejados, oxidação,
corrosão e outras impurezas. Além disso, através
Prof.Dr. Wanderson Santana da Silva
do jateamento abrasivo, ou shot peening, é possível
Palavras-chave: induzir encruamento no material e até
transformação de fases como a da martensita. A
Jateamento
partir disso, foram avaliados trabalhos que
Superfícies abordaram esses tópicos. Ainda, foram discutidas
Shot peening questões como os parâmetros de processo e como
eles influenciam no jateamento e nas características
Encruamento das superfícies.
Transformação de fase Dessa forma, fica evidente a importância
desse processo de conhecer todas as suas
possibilidades, visto que além de ser um processo
de limpeza mecânica também promove melhorias
significativas na resistência, durabilidade e vida útil
dos componentes.

capacidade de aderir adequadamente à superfície.

1. INTRODUÇÃO
Além disso, a criação de um perfil de rugosidade
A preparação da superfície pode ser adequado na superfície metálica também se
considerada como uma primeira e essencial etapa enquadra na preparação da superfície. Desta
do tratamento de uma superfície antes da forma procura-se criar condições favoráveis para
aplicação de qualquer revestimento protetivo [1]. uma boa adesão entre a superfície e o
Na prática, a preparação da superfície revestimento protetivo a ser aplicado,
abrange, por exemplo, a remoção de carepas de contribuindo para uma melhora na durabilidade
laminação e de tratamento térmico, ferrugem, desse revestimento [1].
escória de metais ou outros contaminantes. O A preparação da superfície pode ser
desempenho de um revestimento é realizada através de métodos químicos ou
significativamente influenciado por sua mecânicos, incluindo o uso de solventes,
materiais abrasivos para jateamento, calor, ácidos
e jatos de água. Existem também técnicas mais
tradicionais usando ferramentas manuais ou
elétricas [1].
O processo de jateamento é uma técnica
amplamente utilizada para preparar superfícies,
removendo revestimentos indesejados, oxidação,
corrosão e outras impurezas. É um método eficaz
para preparar superfícies antes da aplicação de
revestimentos, como pintura, e também para
restaurar a aparência e a funcionalidade de
materiais. Existem diversos tipos de jateamento
disponíveis, cada um com suas características e
aplicações específicas. Vamos discutir alguns
desses tipos a seguir:
Jateamento com areia: Também conhecido como
jateamento abrasivo, esse método utiliza partículas
de areia para remover revestimentos, tinta,
ferrugem e imperfeições da superfície. É um dos
métodos mais antigos e amplamente utilizados,
principalmente em aplicações industriais. O com alta pressão, removendo revestimentos,
jateamento com areia pode ser realizado tanto
manualmente quanto por meio de máquinas
específicas [2].
Jateamento com granalha de aço: Esse tipo de
jateamento utiliza partículas de aço, conhecidas
como granalha, para remover revestimentos e
contaminantes da superfície. É particularmente
eficaz na remoção de ferrugem e oxidação de
metais. A granalha de aço pode ser reutilizada
várias vezes, o que torna o processo econômico em
termos de custo [2].
Jateamento com microesferas de vidro: Nesse
método, pequenas esferas de vidro são projetadas
na superfície a ser tratada. Essas microesferas
atuam como agentes abrasivos suaves e são
eficazes na remoção de revestimentos, limpeza e
polimento de superfícies delicadas, como metais,
plásticos e cerâmicas. O jateamento com
microesferas de vidro resulta em um acabamento
uniforme [2].
Jateamento com bicarbonato de sódio: Também
conhecido como jateamento com soda, utiliza
bicarbonato de sódio como meio de jateamento. É
um método suave e não abrasivo, adequado para a
remoção de tinta em superfícies sensíveis, como
carros ou equipamentos eletrônicos. O jateamento
com bicarbonato de sódio é conhecido por sua
capacidade de limpar e desengordurar superfícies
sem causar danos [2].
Jateamento com água a alta pressão: Nesse tipo
de jateamento, a água é projetada na superfície
sujeira e contaminantes. É um método não abrasivo
e adequado para a limpeza de superfícies sensíveis,
como fachadas de edifícios, equipamentos elétricos
e até mesmo para limpeza industrial em geral. O
jateamento com água a alta pressão é eficaz na
remoção de sujeira e não gera resíduos sólidos [2].
Essas são apenas algumas das variedades de
jateamento disponíveis, cada uma com suas
próprias vantagens e aplicações específicas. A
escolha do método de jateamento adequado
dependerá das características da superfície a ser
tratada, do tipo de revestimento ou contaminante a
ser removido e das necessidades do projeto [2].
2. Revisão bibliográfica.
Neste trabalho focaremos no jateamento abrasivo a
seco devido a sua importância e aplicabilidade em
diversas áreas da indústria.
2.1 JATEAMENTO ABRASIVO
2.1.1 Limpeza abrasiva
Este método de limpeza, que pode ser
considerado um processo erosivo, utiliza um jato
de partículas abrasivas em alta velocidade
impulsionadas por uma corrente de
comprimido ou pela força de turbinas centrífugas
para erodir a superfície (substrato), removendo
impurezas, carepa de laminação, tintas e
ferrugem.
Amplamente utilizado na indústria,
particularmente eficaz na remoção da corrosão
por óxidos. Também é amplamente utilizado nos
setores médico e odontológico, principalmente,
antes da aplicação de revestimentos
pulverização térmica [3].
A erosão em termos tribológicos significa a
perda progressiva de material original de uma
superfície devido a ação impactante de partículas
sólidas, podendo ocorrer como um fenômeno
natural, como no deserto, quando a areia sob a
ação dos ventos, erodem rochas em monumentos
[4].
A limpeza abrasiva atualmente é um dos
métodos de preparação de superfície mais
utilizados em diversas áreas da indústria, por ser
um processo simples, eficiente e de baixo custo.
Seu início, segundo relatos históricos, foi quando
Benjamin Chew Tilghman, um militar americano
e inventor, observou no deserto a ação da areia
soprada pelo vento nas janelas [4].
Em 1870 ele registrou uma patente nos
Estados Unidos, inventando o processo de
jateamento abrasivo e detalhando muitas das
aplicações para as quais essa técnica seria
exclusivamente adequada, como afiar limas,
gravar garrafas, limpar caldeiras ou desgastar
madeiras [4].
Na indústria, o processo de jateamento
abrasivo é usado há muitos anos por ser uma
ar
técnica de preparação de superfície eficiente e
econômica, empregada para remover
incrustações e carepa de óxidos provenientes de
tratamento térmico, proporcionando um perfil de
superfície (rugosidade) adequado para a adesão
é
de novos revestimentos protetivos [5].
Na pulverização à plasma, o jateamento
abrasivo é o método padrão usado para preparar a
superfície do substrato antes da deposição do
de
revestimento, pois gera um perfil de rugosidade
adequado para garantir uma forte ligação
mecânica entre o revestimento e o substrato [5].
O jateamento abrasivo também é usado em
medicina e odontologia para melhorar a fixação
mecânica do implante através do aumento da
rugosidade superficial. Essa percepção se baseia
no fato de que o processo abrasivo remove
camadas contaminadas e a superfície rugosa
proporciona algum grau de intertravamento
mecânico com o adesivo, além disso, o
jateamento abrasivo a seco introduz alterações
físico químicas que alteram a energia e
molhabilidade da superfície [6].
O jateamento abrasivo, além do efeito de
limpeza superficial, produz deformação plástica
local e consequentemente refinamento de grãos
podem ocorrer na superfície, muitas vezes,
acompanhados por encruamento e tensões
residuais compressivas na camada deformada.
Tanto as tensões residuais compressivas quanto o
encruamento na superfície jateada podem
contribuir para a melhoria da resistência à fadiga
(se ultrapassarem o efeito negativo produzido
pelo aumento da rugosidade), pois tendem a
fechar as trincas e aumentar o limite de
escoamento local, respectivamente. A tensão
residual compressiva pode restringir a iniciação e
o crescimento de trincas por fadiga, e sua
intensidade é fortemente dependente das
propriedades do material, das condições do
processo de jateamento e do tamanho das
partículas abrasivas [7].
2.1.2 O processo de jateamento abrasivo a
seco.
Tradicionalmente, o jateamento abrasivo a
seco tem sido considerado um processo de "baixa
tecnologia", geralmente chamado de jateamento
de areia ou limpeza abrasiva. Devido a problemas
de saúde, causados pela silicose, doença
pulmonar irreversível e incurável, provocada
principalmente por meio da inalação de poeiras
que contenham finas partículas de sílica, o
jateamento abrasivo utilizando areia como
abrasivo foi proibido em 2004. Hoje em dia, no
entanto, a limpeza por jateamento abrasivo
utilizando materiais alternativos a areia é um
processo vital usado não apenas para remover
ferrugem, mas também para preparar superfícies
para adesão de revestimentos de alto desempenho
[1].
Embora, o jateamento abrasivo a seco seja
um processo de limpeza superficial à frio
relativamente simples e eficiente, realizado
através do impacto repetitivo de partículas
abrasivas aceleradas em alta velocidade em
direção a uma superfície alvo, ele também é um
processo erosivo que produz remoção de material
e deformação plástica não homogênea com alta
taxa de deformação na superfície alvo,
produzindo significativas alterações na
integridade da superfície atacada.
Através do mecanismo de erosão por
partículas sólidas, o jateamento abrasivo a seco
produz a remoção de material da superfície, e
simultaneamente induz deformação plástica
localizada na camada e na sub-camada
superficial, levando à formação de uma camada
compressiva com valor máximo próximo à
superfície, produzindo alterações na rugosidade
superficial, cuja magnitude depende do tamanho,
forma e energia cinética das partículas abrasivas
e induzindo mudanças microestruturais na
superfície jateada. O jateamento abrasivo altera a
dureza superficial da superfície atacada através
do encruamento produzido pelo trabalho à frio
[8].
No jateamento abrasivo a seco existem duas
formas principais para se acelerar as partículas
abrasivas em alta velocidade contra a superfície:
uma é através de rotores de turbinas centrífugas
que ejetam as partículas abrasivas contra a
superfície da peça ou componente, comumente
empregado na limpeza de perfis simples, devido
a sua baixa mobilidade.
Outro método muito utilizado emprega ar
comprimido para transportar as partículas
abrasivas através de uma mangueira até o bico de
jateamento onde as partículas abrasivas são
ejetadas em alta velocidade sobre a superfície
que se deseja preparar. Esse é o método ilustrado
da Figura 1.
Figura 1 - Processo de jateamento abrasivo a seco: a)
operador em trabalho; b) princípio de funcionamento do
processo [1].
Embora, existam similaridades entre o
processo de jateamento abrasivo a seco e o
processo de "shot peening", de acordo com
Hensel a principal diferença entre eles está na
qualidade da granalha utilizada e na falta de
controle das variáveis do processo de jateamento
abrasivo, que usualmente é aplicado
manualmente. O jateamento abrasivo a seco é
controlado principalmente pela aparência da
superfície (por exemplo, grau de limpeza e perfil
de rugosidade) [9].
O Shot Peening é um processo de trabalho a
frio onde a superfície de uma peça, ou parte dela
é bombardeada com esferas endurecidas, as quais
são classificadas pelo tamanho, composição
química e dureza. Cada granalha golpeia o
material sob tratamento como um minúsculo
martelo, provocando sobre a sua superfície um
pequeno sulco [21].
Considerando um fluxo contínuo de
aplicação das granalhas ocorre então uma
sobreposição destas regiões encruadas,
desenvolvendo-se uma camada regular de metal
com tensão residual compressiva. A metalurgia
mecânica estabelece que a propagação das trincas
necessita de tensões de natureza contrária
(tração), de maneira que as falhas por fadiga
mecânica ou por corrosão tem o seu avanço
prejudicado. Deste modo as tensões de
compressão, introduzidas na superfície pelo shot
peening, proporcionam aumentos consideráveis
na vida útil das peças tratadas [21].
2.1.3 Parâmetros de controle do processo
O jateamento abrasivo a seco é
principalmente controlado pela aparência visual
da superfície através do grau de limpeza e perfil
de rugosidade, embora, as principais normas
técnicas de inspeção visual, ISO 8501-1, SIS 05
59 00 e SSPC, não impõem uma partícula
abrasiva ou requeiram um perfil de rugosidade
específicos [10].
Quatro padrões visuais fotográficos para o
processo de limpeza por jateamento abrasivo,
conforme Figura 2 estão previstos por estas
normas, a seguir:
Grau Sa 1 - Jateamento Ligeiro
Dentro dos padrões fotográficos previstos de
jateamento abrasivo a seco, tem-se
primeiramente o jateamento ligeiro, o qual
remove do substrato apenas os óxidos e
partículas levemente aderidas, sendo por isso
muito aplicado em limpeza de peças e estruturas
para inspeção.
Grau Sa 2 - Jateamento Comercial
No jateamento dito comercial, há remoção de
grande parte da carepa de laminação, oxidações,
pinturas anteriores e materiais estranhos
indesejáveis. Contudo, permanecem ainda na
superfície listras ou manchas de oxidação, com a
superfície apresentando uma colaboração
acinzentada.
Grau Sa 2 1/2 - Jateamento ao Metal Quase
Branco
No jateamento ao metal quase branco, ocorre a
remoção de quase toda a totalidade da carepa de
laminação, oxidação, incrustações, matérias
estranhas, etc., restando apenas ligeiras manchas
ou listras. Neste padrão, 95% da área jateada
apresenta-se livre de resíduos visíveis ao olho nu,
com a superfície apresentando uma coloração
cinza claro.
Grau Sa 3 - Jateamento ao Metal Branco
Finalmente no jateamento ao metal branco,
ocorre a remoção da totalidade da carepa de
laminação, oxidação, incrustações, matérias
estranhas, etc., deixando-a completamente limpa,
com coloração cinza claro e uniforme, sem
qualquer mancha ou listra. Esse tratamento não
tem aplicação comum, visto a dificuldade de sua
obtenção, sendo recomendado para alguns
produtos específicos ou para superfícies expostas
a ambientes extremamente corrosivos [11].
Figura 2 - Padrão visual de limpeza superficial conforme
principais normas técnicas de inspeção visual.
2.1.4 Principais variáveis de processo
Os principais efeitos do jateamento abrasivo
na superfície atacada são alterações na textura
superficial (rugosidade), na microestrutura da
camada deformada (encruamento, mudança de
fase) e no seu estado de tensões residuais.
Todos esses efeitos são influenciados
diretamente pelos parâmetros do processo de
jateamento abrasivo como: ângulo de jateamento
(ou de impacto), distância de jateamento, pressão
de jato e tempo de processo, além da influência deformação plástica, conforme mostrado na
da partícula abrasiva (tamanho, forma, material) Figura 4 [13].
utilizada no jateamento.
O ângulo de jateamento (ou de impacto)
pode ser definido como o ângulo formado entre a
trajetória das partículas abrasivas e a superfície
do material alvo, e pode variar de 0 a 90◦,
conforme mostrado na Figura 3 [12].

Figura 4 - Mecanismo de remoção de material dúctil

A ação erosiva repetitiva das partículas

abrasivas na superfície levam à geração de uma
morfologia irregular na superfície jateada. Dessa
forma, as superfícies jateadas caracterizam-se por
não possuírem um padrão regular de rugosidade.
No jateamento de materiais dúcteis, realizado
Figura 3 - Componentes Vx e Vy do vetor velocidade das
com baixo ângulo de impacto das partículas
partículas abrasivas, e sua dependência com o ângulo de
jateamento (ou impacto) [12]. abrasivas, os principais mecanismos de remoção
de material da superfície são o micro-corte
O ângulo de contato influencia diretamente
("microcutting") e a cavagem ("ploughing").
no mecanismo de remoção de material da
O aumento no ângulo de impacto para
superfície onde mecanismos como micro-corte
próximo à 90◦ ocasiona uma mudança nos
("microcutting"), cavagem ("ploughing"),
mecanismos de remoção de material para
extrusão ("extrusion") e deformação plástica
remoção por indentação e extrusão, com a
estão ativos, em se tratando de materiais dúcteis.
geração de crateras mais profundas na superfície
No caso de materiais frágeis, o impacto das
jateada e aumento na rugosidade superficial. Em
partículas abrasivas irradiam rachaduras (trincas)
materiais dúcteis o desgaste erosivo aumenta até
em todas as direções, cuja interseção leva à
um valor máximo próximo ao ângulo de 30◦ , e
remoção do material por lascamento. De um
posteriormente começa a decrescer à medida que
modo geral, materiais frágeis oferecem menos
se aproxima do ângulo normal (90◦). A
resistência à erosão do que os materiais dúcteis.
intensidade e a profundidade máxima das tensões
A remoção de material dúctil por jateamento
residuais compressivas induzida na camada
abrasivo ocorre pelo deslocamento da partícula
deformada, também são influenciadas pelo
abrasiva ao longo da superfície, sendo que a
ângulo de impacto, isso é devido ao fato dessas
fratura é precedida por uma grande quantidade de
tensões estarem relacionadas com a quantidade
de deformação plástica induzida na superfície produzirem remoção de material e limpeza
jateada [12]. superficial [14].
Com o aumento do ângulo de jateamento, o
valor da componente vertical da velocidade da
partícula abrasiva aumenta, e dessa forma, a
partícula abrasiva com maior componente
vertical da velocidade (Vy) produz uma
indentação mais profunda e simultaneamente
deformação plástica mais significativa [13]. Figura 5 - Perfil obtido com cada formato de granalha
[Adaptado 14].
A escolha do tipo de abrasivo é fundamental e
depende do objetivo do jateamento. Diferentes A distância entre a pistola de jateamento e a

abrasivos, como areia, granalha de aço, óxido de superfície a ser tratada também é uma variável

alumínio, entre outros, possuem características importante. A distância ideal depende do tipo de

distintas, como tamanho, forma e dureza. Essas abrasivo, da pressão de jateamento e do objetivo

características afetam a capacidade de remoção de do tratamento. Uma distância inadequada pode

revestimentos, o perfil de ancoragem e a taxa de resultar em remoção insuficiente ou excessiva de

desgaste. É importante selecionar o abrasivo revestimentos, bem como em danos à superfície

adequado para obter os resultados desejados [14]. [15].

O tamanho das partículas abrasivas também É importante ressaltar que as variáveis

desempenha um papel importante. Tamanhos mencionadas acima podem variar dependendo do

menores proporcionam uma ação de jateamento tipo de equipamento de jateamento utilizado e das

mais suave, ideal para superfícies delicadas, especificidades da aplicação. Além disso,

enquanto tamanhos maiores oferecem maior poder recomenda-se sempre seguir as instruções e

de remoção. O tamanho do abrasivo escolhido recomendações dos fabricantes de equipamentos e

deve ser compatível com a aplicação e o perfil de abrasivos, bem como adotar as práticas de

ancoragem desejado. Os abrasivos esféricos segurança adequadas durante o processo de

possuem menor capacidade de corte, sendo jateamento abrasivo [15].

utilizados principalmente no processo de "shot

2.1.5 Jateamento abrasivo induzindo tensão
peening" para aumento da resistência à fadiga,
residual
enquanto os abrasivos angulares possuem maior
capacidade de corte (abrasividade), devido às No jateamento abrasivo a superfície
inúmeras arestas cortantes, e são utilizados em repetidamente bombardeada por granalhas de
operação de jateamento abrasivo com a função de elevada dureza produz severa deformação plástica
local, com alta taxa de deformação. Em principalmente pelo tamanho e velocidade da
consequência da deformação heterogênea, a zona granalha: quanto maior a granalha e/ou sua
plástica alonga-se nas vizinhanças da zona elástica velocidade, maior será é a tensão residual
e são geradas tensões residuais após a retirada do compressiva na superfície e mais profunda será sua
carregamento do sistema, como resultado do penetração na subcamada (zona afetada) [17].
desajuste entre a superfície plasticamente
2.1.6 Jateamento abrasivo induzindo
deformada e as subcamadas elasticamente
encruamento
deformadas.
O impacto repetitivo de granalhas de elevada
O perfil típico de tensão residual no
dureza superficial em alta velocidade sobre a
jateamento abrasivo é semelhante ao que ocorre no
superfície resulta em deformação plástica
processo de "shot peening" e pode ser representado
não-homogênea com alta taxa de deformação,
pela Figura 6 [16].
caracterizada por uma topografia ondulada e
encruamento por trabalho à frio (cold work) na
superfície e na subcamada deformada, aumentando
assim o limite de escoamento local do material
[18].

Quando um material é deformado

plasticamente por trabalho a frio, a energia
Figura 6 - Perfil típico da tensão residual no "shot peening"
mecânica que não é convertida em calor acaba
[Adaptado 16]
sendo armazenada, e assim, contribuindo para
De um modo geral, a tensão residual de aumentar sua energia interna. As distorções e
compressão máxima é geralmente encontrada desordem na estrutura cristalina do material são
abaixo da superfície e é maior do que a tensão características essenciais dessa deformação por
residual de superfície. No entanto, alguns autores trabalho a frio [19].
relataram uma tensão residual de compressão
A deformação plástica em materiais de
máxima localizada na superfície sob várias
estrutura cristalina ocorre por movimentos de
condições de "peening" [17].
discordâncias. Essa deformação, por sua vez,
As tensões residuais compressivas são resulta em um aumento da densidade de
equilibradas pela presença de tensões residuais de discordâncias na região deformada. Os defeitos de
tração. Alguns autores mostraram que o perfil de linha, também chamados de discordâncias, são
tensão residual é principalmente afetado pela defeitos que causam a distorção da rede cristalina
energia do jateamento, que é controlado em torno de uma linha e caracterizam-se por
envolver um plano extra de átomos [20]. envolvendo o jateamento abrasivo.

Assim, o trabalho à frio produzido pelo 3.1 Análise estrutural da aplicação do processo
jateamento abrasivo é uma consequência do de jateamento com granalhas de aço (shot
movimento de discordâncias armazenadas, e ao peening) em rotores hidrelétricos.
mesmo tempo, de novas discordâncias geradas e
Foram utilizadas duas pás da turbina
multiplicadas a partir de discordâncias, defeitos e
hidráulica (tipo Francis) montada na unidade
contornos de grão pré-existentes através do
geradora n°17 da Usina Hidrelétrica de Ilha
mecanismo de Frank-Reed [20].
Solteira. Foram preparadas para o jateamento com
O jateamento abrasivo altera a microestrutura granalhas de aço endurecido. Após a aplicação do
dos metais próximos à superfície e o grau de shot peening foi realizada a inspeção das
encruamento aumenta simultaneamente com o superfícies tratadas com método de tensometria por
impacto repetitivo do abrasivo na superfície ao raios-X, cujos resultados são mostrados na Tabela
longo do tempo de jateamento em função da 1 [22].
acúmulo de deformação plástica ("plastic strain")
Usando as mesmas condições de
na superfície e nas subcamadas deformadas [20].
processamento foi feito o jateamento das granalhas
2.1.7 Jateamento induzindo transformação de sobre uma superfície retificada de uma peça de aço
fase. ABNT 1010, sendo que a superfície retificada
oposta serviu de referência. Sobre cada uma foram
A literatura relata que a deformação plástica
realizadas 10 medidas de dureza Vickers, com
produzida por tratamentos de superfície, como o
carga padrão de 196N. Amostras metalográficas
jateamento abrasivo, pode induzir transformação
foram preparadas de modo convencional
de fase. Tosha et al. relataram transformação de
(lixamento e polimento mecânicos), sendo
fase induzida por deformação em aço inoxidável
utilizados os reativos de nital e Marshall para a
austenítico, após jateamento com granalha. Eles
revelação da microestrutura da peça de
estudaram o comportamento da transformação de
aço-carbono [22].
fase induzida por tratamento superficial em ligas
Fe-Ni. e relataram a transformação da fase Observando-se os resultados mostrados na
α′-martensita nas camadas superficiais do aço Tabela 1 verifica-se que o shot peening foi eficaz
inoxidável 316 (316LVM) após o jateamento da na geração de tensões superficiais de natureza
superfície [21]. compressiva em todos os pontos analisados por
raios-X. A dureza Vickers da peça de aço-carbono
3. ESTUDOS DE CASOS
variou de 1160 ± 34 MPa, na condição anterior ao
Serão discutidos alguns estudos de casos tratamento, para 1729 ± 258 MPa após o
jateamento das granalhas sobre a superfície da
peça, mostrando efetivamente a ocorrência do
endurecimento pela deformação plástica a frio
(encruamento). A Figura 7 apresenta exemplos
com evidências da ocorrência desta deformação
sobre grãos de ferrita existentes em uma camada de
material abaixo da superfície tratada [22].

Tabela 1 - Resultados de tensometria por raio-x em

diversos pontos analisados sobre as pás da turbina

Figura 7a - Superficie não jateada.

Nas figuras a seguir temos os exemplos da

microestrutura da peça de aço-carbono ABNT
1010. A superfície não tratada por shot peening é
mostrada em (a), onde verifica-se a ausência de
deformação. Na micrografia (b) observa-se a
estrutura preponderantemente ferrítica, com poucas
regiões de perlita, no meio da espessura da peça.
Em (c) é detalhada a superfície da peça submetida
Figura 7b - Superficie não jateada
ao jateamento de granalhas de aço, onde foi
possível constatar a existência de deformação
plástica em uma camada próxima à 50μm da
superfície tratada.

Figura 7c - Figura jateada

 Através das micrografias fica evidente como
o jateamento abrasivo pode induzir deformação
plástica na superfície em questão e,
consequentemente, um encruamento dessa
região.
3.2 Redução do percentual de austenita retida
pelo processo de shot peening.
O Shot Peening é muito utilizado para
melhorar da vida a fadiga, mas investigações
realizadas em uma grande variedade de materiais
apontam que tal processo também pode reduzir
ou evitar outros tipos de problemas como
fretting, corrosão por fadiga e fragilização por
hidrogênio. No processo de shot peening as
colisões das microesferas com a superfície da
peça proporcionam energia mecânica suficiente
para que ocorra a transformação da austenita
retida em martensita, dependendo da intensidade
da carga aplicada esta transformação poderá
ocorrer por deformação elástica (martensita de
tensão) e deformação plástica (martensita de
deformação) [23].
No processo de shot peening as colisões das
microesferas com a superfície da peça
proporcionam energia mecânica suficiente para
que ocorra a transformação da austenita retida em
martensita, dependendo da intensidade da carga
aplicada esta transformação poderá ocorrer por
deformação elástica (martensita de tensão) e
deformação plástica (martensita de deformação)
[23].
O material utilizado neste trabalho foi o aço
DIN 20MnCr5 que devido sua composição
química é classificado como aços para
cementação e/ou carbonitretação, possuindo
média temperabilidade de núcleo. A Figura 8
apresenta a amostra do material pesquisado neste
artigo.
Figura 8 - Material cementado a partir do qual foram
retirados os corpos de prova [23].
Para possibilitar o processo de verificação
da austenita retida, o aço utilizado foi cementado
em atmosfera à base de Metanol e Propano por
12 horas de cementação com potencial de
carbono 1,2%, e temperatura de 925 °C.
Realizada têmpera direta em óleo acelerado
Houghton KB (110°C/s) com posterior processo
de revenimento a temperatura de 180°C [23].
Após a cementação e o tratamento térmico
foram seccionados três corpos de prova por corte
(abrasão). Os corpos de prova ficaram divididos
em: a) 1° CP: utilizado como referência; b) 2°
CP: utilizada no processo de shot peening
dinâmico; c) 3° CP: utilizada no processo de shot
peening estático. Para cada CP foram retiradas
tréplicas para análise microestrutural e
microdureza.
No processo de shot peening dinâmico foi
utilizado o método que envolve a aceleração de
partículas de materiais com ar comprimido, em
um fluxo de ar de alta velocidade enquanto o
porta amostra com o corpo de prova rotacionava
em torno do seu próprio eixo. Para isto foi
utilizado o equipamento disponível na
Universidade Federal do Rio Grande com os
seguintes parâmetros de controle: - Tipo de Figura 9b - Microestrutura da camada cementada obtida
microesfera: microesfera de vidro impacto C da por microscopia eletrônica de varredura.
Foi encontrada microestrutura martensítica e
(Zirtec) peneira 150-250. - Vazão de operação:
presença de austenita retida, não sendo detectado
0,29 L/min. - Distância do bico ao material: 2,5
crescimento anormal de grão nas amostras, após
mm - Tempo de shot peening: 17 min - Rotação
a cementação e tratamento térmico. A presença
utilizada: 6 rpm [23].
de austenita retida ocasionou variações
Para o shot speening estático foi utilizado o
microestruturais, junto a superfície das amostras
mesmo método citado acima, porém com o corpo
cementadas associando-se este fato a utilização
de prova estático. Os parâmetros do equipamento
de potencial de carbono elevado na atmosfera
são os mesmos, com exceção da velocidade de
gasosa. As amostras de aços DIN 20MnCr5
rotação que neste caso não é aplicável [23].
apresentaram percentual médio de 32,32% de
As figuras 9a e 9b mostram a microestrutura
austenita retida, valores obtidos através do
das amostras após cementação e tratamento
programa Phase Analysis [23].
térmico.
Foi feita a análise microestrutural das
amostras para o processo de shot peening
dinâmico. As figuras 10a e 10b mostram a
microestrutura obtida.

Figura 9a - Microestrutura da camada cementada obtida

por microscopia óptica.

Figura 10a - Microestrutura obtida por microscópio óptico

após processo de shot peening dinâmico
Figura 10b - Microestrutura obtida por MEV após processo
Figura 11 - Microestrutura obtida por MO após processo de
de shot peening dinâmico
shot peening estático.
Não foram detectadas micro-trincas nas
amostras que receberam o processo shot peening
dinâmico. Não foram detectados carbonetos em
contornos de grão, após a aplicação do referido
processo mecânico. O percentual de austenita
retida na superfície da camada cementada após o
processo de shot peening em sistema rotativo
(dinâmico) sofreu uma redução de 32,32% para
22,1%. O percentual de austenita retida foi obtido
através do programa Phase Analysis [23]. Figura 11b - Microestrutura obtida por MEV após processo
Este resultado se deve provavelmente a de shot peening estático.

colisões das microesferas com a superfície da

peça proporcionando energia mecânica suficiente A transformação da austenita retida em

para que ocorra a transformação da austenita martensita ocorreu quase que totalmente em uma

retida em martensita, com intensidade da carga região bem superficial, com profundidade de

aplicada a esta transformação ocorrendo e pela 46,18 µm na camada cementada, decorrente da

deformação plástica (martensita de deformação) intensidade de deformação aplicada no processo

resultante do processo [23]. [23].

Foi feita a análise microestrutural das Também não foram detectadas micro trincas

amostras para o processo de shot peening nas amostras que receberam o processo de shot

dinâmico. As figuras 11a e 11b mostram a peening estático. Não foram detectados

microestrutura obtida. carbonetos em contornos de grão, após a

aplicação dos processos mecânicos. Os
percentuais de austenita retida no processo de
shot peening estático bem como a região
selecionada no programa mostraram uma redução
na austenita retida de 32,32% para 6,04%.
Este resultado se deve provavelmente
característica do processo, já que neste caso, a
amostra permanece o tempo todo estática,
recebendo a colisões das microesferas com a
superfície da peça e ocasionando uma maior
deformação plástica e consequentemente maior
energia para que ocorra a transformação da
austenita retida em martensita [23].
Ainda, foram realizados ensaios de
microdureza para corroborar a análise
microestrutural.
A Figura 12 apresenta uma média dos
resultados obtidos com 3 amostras feito os testes
de microdureza das amostras após a cementação,
têmpera e posterior revenimento.
Figura 12 - Representação gráfica da microdureza das
amostras cementadas e tratadas termicamente.
Os resultados obtidos através de gráficos
demonstram que os resultados de microdureza
começam de forma crescente até atingirem seu
resultado máximo (846 HV) com profundidade
de 0,8 mm. A variação da microdureza (156 HV)
mostrada no gráfico (indicada pela menor
amplitude entre o mínimo inicial e a máxima
dureza) ocorre pela estabilidade da austenita com
o aumento dos teores de carbono devido a
cementação.
O carbono em solução sólida contribui
aumentando a resistência ao cisalhamento da
austenita, desse modo, quantidades apreciáveis
de austenita não se transformaram, estando
presentes entre as ripas de martensita a
temperatura ambiente [23].
A Figura 13 exibe uma média dos resultados
obtidos dos testes de microdureza de 3 amostras
submetidas ao processo de shot peening
dinâmico.
Figura 13- Representação gráfica da microdureza das
amostras do processo de shot peening dinâmico.
Como pode ser observado nos gráficos
houve uma diminuição no valor de austenita
retida, comparado com as amostras de referência,
de 156 HV para 127 HV. Os ensaios de
microdureza corroboram e confirmam os
resultados obtidos na análise microestrutural
demonstrando a eficácia da utilização do
processo de shot peening para esta aplicação
[23].
A Figura 14 expressa os resultados obtidos
da média dos testes de microdureza das 3
amostras submetidas ao processo de shot peening
estático.
Figura 14 - Representação gráfica da microdureza das
amostras do processo de shot peening estático
Como pode ser observado nos gráficos
houve uma diminuição maior ainda no valor de
austenita retida, comparado com as amostras de
referência, de 156 HV para 92 HV no caso do
shot peening estático. Conforme já havia se
discutido na seção que trata da análise
microestrutural do shot peening estático, este
resultado também pode ser atribuído ao processo
em que a amostra permanece o tempo todo
estática, recebendo a colisões das microesferas
com a superfície da peça e ocasionando uma
maior deformação plástica [23].
4. CONCLUSÃO
O jateamento abrasivo é um processo
amplamente utilizado para melhorar
propriedades mecânicas e a resistência à fadiga de
componentes metálicos. Neste artigo, discutimos
os efeitos do jateamento abrasivo no contexto do
shot peening, enfatizando também a transformação
de fase induzida e o encruamento resultante do
jateamento.
Foi visto que o jateamento abrasivo promove
o encruamento do material, que é o aumento da
dureza e resistência mecânica através da
deformação plástica. O impacto das partículas de
grânulos no material provoca uma deformação
localizada e uma reorganização da estrutura
cristalina, resultando em uma maior densidade de
discordâncias. Esse encruamento fortalece o
material, tornando-o mais resistente ao desgaste, à
abrasão e à deformação permanente.
É importante ressaltar que o jateamento
requer um controle cuidadoso dos parâmetros do
processo, como o tipo e tamanho das partículas
abrasivas, a intensidade e a cobertura de
jateamento, a velocidade de impacto e a pressão. O
conhecimento e a compreensão desses parâmetros
são essenciais para obter os resultados desejados e
evitar danos indesejáveis ao material.
Uma das principais vantagens do jateamento
abrasivo é a capacidade de promover a
transformação de fase em materiais metálicos,
como a formação de martensita em aços, por
exemplo. A transformação de fase é resultado do
impacto das partículas de grânulos sobre a
superfície do material, causando deformação
plástica e introduzindo tensões residuais
as
compressivas. Essas tensões residuais ajudam a
melhorar a resistência à fadiga e a vida útil dos
componentes, prevenindo a propagação de trincas
e retardando o processo de falha.
Em conclusão, o jateamento abrasivo, com
destaque para o shot peening, é um processo eficaz
para melhorar as propriedades mecânicas e a
resistência à fadiga dos materiais metálicos. A
transformação de fase induzida pelo jateamento e o
encruamento resultante são mecanismos
fundamentais que contribuem para o
fortalecimento do material, a redução do desgaste e
a prevenção de falhas prematuras.
3. Referências
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