Mais do que discutir propriamente a eutanásia, quero
questionar o esforço dos médicos em chegar a uma situação como a de Terry Schiavo. Relato algumas realidades na vida da minha família: Primeiro: Meu sogro foi vítima de um tumor no cérebro, logo detectado como incurável. Foi operado e após diversas complicações pós-cirúrgicas devido ao violento tumor, entrou em coma, vegetando. Sei que os médicos fizeram um esforço sobre humano nas diversas ocasiões em que foi levado à sala cirúrgica e à UTI para preservar-lhe a vida, sabendo que não havia mais esperanças, devido ao tipo de tumor e devido à situação que era terminal. Mesmo assim conseguiram preservar-lhe a vida. Que tipo de vida significou ligado a tubos de alimentação e água durante os oito meses que lhe restaram presos a uma cama? Creio que aqui está o problema: Os médicos não devem lutar além de certo limite que eles próprios conhecem, para não induzir uma pessoa a chegar ao ponto em que meu sogro chegou. Segundo: Num curto espaço de tempo perdi meu cunhado e meu sobrinho, filho deste cunhado. Meu cunhado lutou com o câncer, melanoma, durante 22 anos. Foi um vitorioso. Quando, no final, o câncer o tomou novamente, atingindo inclusive os órgãos internos e a cabeça, a esposa dele (minha irmã) e eu fomos aos médicos e pedimos que não tivessem nenhuma atitude heróica de preservar aquela vida, mas que simplesmente aliviassem a sua dor, o que foi feito e ele adormeceu em paz depois de alguns dias. O meu sobrinho sofria de distrofia muscular, uma doença que vai paralisando os músculos até chegar ao coração ou ao pulmão. Atingiu a idade de 25 anos. Já é consenso médico que nestes casos não se faz traqueostomia, o que preservaria a vida do paciente indefinidamente enquanto o seu corpo vai ficando cada vez mais inerte. Quando se aproximou do final, três meses após o falecimento do seu pai, fizemos o mesmo pedido aos médicos de que nenhuma atitude heróica fosse tomada para sobrevivência, sabendo que a doença era terminal. E ele adormeceu em paz. Em ambos os casos os médicos perguntaram do porquê do nosso pedido. Como cristãos temos a certeza do perdão de Deus em Cristo e a esperança da vida eterna. Tanto meu cunhado como meu sobrinho tinham esta fé e esta certeza e queriam morrer em paz. Em ambos os casos, se os médicos tivessem tomado qualquer atitude maior, talvez um dos dois poderia estar ligados a tubos até hoje e ninguém teria coragem de desligar os tubos. Terceiro: Minha sogra foi operada do coração e quando estava para ter alta, muito fragilizada, sofreu uma parada cardíaca. Foram 45 minutos de procedimentos até ressuscitá-la. Sabe-se que após os primeiros minutos de parada cardíaca o cérebro fica sem oxigênio e sem condições de reagir posteriormente. Por que os médicos continuaram a luta? “Criaram” um ser que respirava através de aparelhos, mas que estava em coma profundo. Poderia ter se prolongado durante semanas aquela agonia para a paciente e para os familiares. Deus foi bondoso e após uma semana chamou minha sogra para a bendita eternidade. O meu alerta é no sentido de que não se criem situações em que máquinas prolonguem vidas que não podem mais ser prolongadas. Sei que há exceções, às vezes em caso de acidentes, de pessoas mais novas, em que todos os recursos devem ser usados e que estas máquinas salvaram pacientes. Mas há outros casos de doenças reconhecidas como terminais em que estes métodos não deveriam ser aplicados. Os médicos especialistas nestas áreas devem saber tomar a decisão certa. Já houve quem me argumentou que é por interesses financeiros que médicos e hospitais procuram preservar tais vidas. Não posso acreditar neste argumento, mas se for verdade, é muita crueldade e mais sangue frio que desligar uma máquina. Quanto à eutanásia propriamente dita, não podemos apoiar o que se chama de eutanásia ativa, isto é simplesmente encurtar a vida de alguém através de um medicamento ou desligando máquinas. Mas temos que repensar a chamada eutanásia passiva, que ao meu ver não chega a ser uma eutanásia, mas é sim deixar o livre curso da natureza atuar permitindo que a pessoa morra em paz e com dignidade, aliviando sempre que possível seu sofrimento. É o que se fazia antigamente enviando o doente terminal para casa, permitindo que falecesse na companhia dos seus queridos. E o que aconteceu recentemente com o Papa João Paulo II, que optou por morrer em casa na companhia de seus amigos fiéis, em vez de ser confinado numa CTI, entubado, etc. A fé cristã prepara para morte. Todo o que tem esta fé em Jesus não se amedronta diante da morte, mas se prepara para ela também diante de situações tão difíceis, na certeza de que está nos braços amorosos de nosso Deus.