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FICHAMENTO: Karl Friedrich Philipp Von Martius.

Juntamente com a arquiduquesa da Áustria, Leopoldina casada com o príncipe-herdeiro de Portugal, Brasil
e Algarves, D. Pedro, futuro imperador do Brasil, viram o zoólogo Johann Baptist Von Spix e o botânico
Karl F.P. Von Martius.
Eles foram encarregados de estudar a flora e a fauna, as riquezas do subsolo e as populações primitivas
desta parte da terra, ainda mal conhecidas e que despertavam grande interesse no velho mundo.
(P. 12) Durante quarto anos recolheram, por todo o Brasil, exemplares da manufatura indígena e numerosas
espécies de animais e vegetais. Estudando e descrevendo todo esse material, publicaram juntos em
Munique nos anos de 1823 a 1831, a obra intitulada Reise in Brasilien (viagem pelo Brasil), em 3 volumes.
Spix faleceu em 1827, no curso da pubicação desse famoso relato. Martius sobreviveu por mais 40 anos e
de volta a Alemanha, foi nomeado professor da Universidade de Munique e, alguns anos depois diretor do
Jardim botânico da mesma cidade.
(P. 13) Von Martius teve ainda excepcional importância na historiografia brasileira. Num trabalho
publicado na revista do IHGB ensinou: Como se deve escrever a história do Brasil. Com esse trabalho abriu
caminho para os que construíram nossa historiografia, como Visconde de Porto Seguro e Francisco Adolfo
Varnhagen.
(P. 14) Von Martius nasceu em Erlanger, no dia 17 de abril de 1794 e faleceu em Munique em 13 de
dezembro de 1868.

(P. 17) A importância da obra de Martius para a historiografia brasileira.

Logo após a fundação do IHGB, os sócios empenharam-se a fundo no estabelecimento das linhas mestras
da elaboração da história do Brasil. E o instituto estabeleceu um prêmio de 300 mil réis a quem oferecesse
um plano de como se escrever a história do Brasil de tal modo que nele se compreendessem as partes
política, civil, eclesiástica e literária.
O trabalho escolhido foi o do dr Von Martius. Que ressaltava pela primeira vez a importância da
contribuição do negro e do índio na formação do espírito brasileiro.

(P. 27) Como se deve escrever a história do Brasil.

(P. 30) 1. Ideias gerais sobre a história do Brasil.

Qualquer um, que se encarregar de escrever a história do Brasil, jamais deverá perder de vista quais os
elementos que ai concorreram para o desenvolvimento do homem.
Elementos de natureza muito diversas convergiram, cada um a seu modo. São três raças: A cor de cobre ou
americana, a branca ou caucasiana, e por fim a preta ou etiópica.
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Da mescla dessas três raças formou-se a atual população, cuja história, por isso mesmo, tem um cunho
particular.
Cada uma das particularidades físicas e morais, que distinguem as diversas raças, oferece a este respeito um
motor especial, e tanto maior será a sua influência para o desenvolvimento comum, quanto maior for a
energia, o número e dignidade da sociedade de cada uma das raças.
(P. 31) Disso se segue necessariamente o português, que, como descobridor, conquistador e senhor,
poderosamente influiu naquele desenvolvimento. O português se apresenta como o motor essencial. Mas
seria um erro desprezar as forças dos indígenas e dos negros.
Jamais nos será permitido duvidar que a vontade da providência predestinou ao Brasil esta mescla. O
sangue português como um poderoso rio deverá absorver os pequenos confluentes das raças índia e negra.
(P. 32) As relações particulares, pelas quais o brasileiro permite ao negro influir no desenvolvimento da
nacionalidade brasileira, designa por si o destino do país, em preferência de outros estados do novo mundo
onde aquelas duas raças inferiores são excluídas do movimento geral.
Portanto devia ser um ponto capital para o historiador mostrar como no desenvolvimento do Brasil se
acham estabelecidas as condições para o aperfeiçoamento de três raças humanas, que nesse país são
colocadas uma ao lado da outra, de uma maneira desconhecida na história antiga, e que devem servir-se
mutuamente de meio e de fim.
(P. 33) O historiador, com quanto mais calor defender em seus escritos os interesses das raças, tanto maior
será o mérito que imprimirá à sua obra, a qual terá igualmente o cunho daquela filantropia nobre, que em
nosso século com justiça se exige do historiador

(P. 34) 2.Os índios (a raça cor de cobre) e sua história como parte da historia do Brasil.

O historiador brasileiro deverá encarregar-se da tarefa de investigar minuciosamente a vida e a história do


desenvolvimento dos aborígenes americanos.
(P. 35) Segundo Von Martius os indígenas brasileiros, não são o homem em estado primitivo e sim o
resíduo de uma civilização perdida.
Em primeiro lugar devemos considerar o indígena brasileiro, em suas manifestações exteriores, como ente
físico, e compará-lo com os povos vizinhos da mesma raça. O passo imediato nos levará à esfera da ama e
da inteligência destes homens.
Como documento mais geral e mais significativo deve ser considerada a língua dos índios.
(P. 36) A principal língua dos índios brasileiros é o tupi e é importante que o historiador à compreenda. E
sem dúvida as tribos que falam essa língua pertenceram a uma grande civilização perdida.
(P. 37) Deve-se estudar todas as lendas indígenas buscando nelas resquícios dessa grande civilização.
(P. 38) Até agora não se descobriram no Brasil vestígios de semelhantes construções. A circunstancias
porém de não terem achado ainda semelhantes construções no Brasil certamente não basta para duvidar que
também neste país reinava em tempos muito remotos uma civilização superior.
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(P. 40) 3. Os portugueses e a sua parte na história do Brasil.

Quando os portugueses chegaram ao Brasil acharam poucos indígenas, e puderam desenvolver-se quase
sem serem importunados pelos índios locais.
Estes só forçaram os colonos a acautelar-se contra as suas invasões hostis, criando o sistema de milícias.
Essas milícias foram importantes por dois motivos: 1º fortaleceram e conservaram o espírito aventureiro do
português. 2º favoreceram o desenvolvimento de instituições municipais livres de uma certa turbulência.
Por esse motivo os portugueses tiveram sucesso contra as invasões estrangeiras.
(P. 41) Nisso mesmo está o motivo dos portugueses avançarem, primeiro para o litoral e depois para o
interior do país pelo poder das armas contra os índios. Essa posição guerreira do português contribuiu para
a rápida descoberta do interior do país.
Hoje em dia as colonizações são empresas de particulares e nascem da necessidade do individuo melhorar
socialmente e economicamente. Mas nos primeiros tempos da colonização do Brasil eram continuação das
empresas dirigidas para a Índia, executada por príncipes e nobres que tomaram a nação portuguesa tão
famosa e rica.
(P. 42) O período da descoberta e colonização primitiva do Brasil não pode ser compreendido, se não em
seu nexo com as façanha marítimas, comerciais e guerreiras dos portugueses, o que de modo algum pode
ser considerado como fato isolado na história desse povo.
O historiógrafo do Brasil jamais deve perder de vista na história da colonização do Brasil, os movimentos
do comércio universal e deve incorporá-los a sua história. Jamais deve ser separada da história da
colonização do Brasil: O comércio do pau-brasil, o movimento mercantil dos metais e pedras preciosas e
das plantas uteis para a Europa.
(P. 43) O historiador deve estudar os costumes do homem português do séc. XV, depois passar para a
história da legislação e como as instituições foram aos poucos transplantadas para o Brasil. Depois
merecem análises as ordens eclesiásticas e monarca. Algumas dessas ordens acharam-se muitas vezes em
oposição com as municipalidades ou povoações, não poucas vezes em favor dos índios. Mas que no Brasil
não passaram de pequenos concílios.
(P. 44) Das ordens religiosas, a dos jesuítas representou o mais notável papel. Os jesuítas com suas missões
conseguiram possuir as mais variadas notícias sobre a vida doméstica e civil dos indígenas.
(P. 45) Em geral essas ordens não eram ruins ao Brasil, pois, muitas vezes elas eram os únicos motores de
civilização para um povo inquieto e turbulento (índios). A oposição dos colonos com estas ordens nascia do
conflito de interesses sociais. Daí emanou a supressão dos jesuítas no Brasil.
Outra tarefa do historiador é mostrar como no Brasil se desenvolveram as ciências e as artes como reflexo
da vida européia.
(P. 46) Enfim, a vida militar em Portugal também é de grande importância. Pois de que maneira o exército
português se preparou para atuar em um país tão diferente.
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(P. 47) O historiador encontrará no Brasil inúmeras narrações de viagens, de descobertas e incursões dos
diferentes pontos do litoral para os desertos longínquos do interior em busca de ouro, pedras preciosas e
escravos indígenas. Essas entradas foram executadas espontaneamente por pessoas, animadas pelo espírito
romanesco e aventureiro.

(P. 49) 4. A raça africana em suas relações com a história do Brasil.

Não há duvida que o Brasil teria tido um desenvolvimento muito diferente sem a introdução dos escravos
negros. Se para melhor ou pior, este problema se resolverá para o historiador, depois de ter tido ocasião de
ponderar todas as influências que tiveram os escravos africanos no desenvolvimento civil moral e político
da presente população.
Mas, no atual estado das coisas, o importante é indagar a condição dos negros importados, seus costumes,
suas opiniões civis, seus conhecimentos naturais, preconceitos e superstições, os defeitos e virtudes
próprias à sua raça em geral.
(P. 50) Nunca, portanto o historiador da Terra de Santa Cruz há de perder de vista que a sua tarefa abrange,
não somente descrever o desenvolvimento de um só povo, mas sim de uma nação cuja crise e mescla atuais
pertencem à história universal.
Nos pontos principais, a história do Brasil será sempre a história de um ramo de portugueses; mas se ela
aspirar a ser completa e merecer o nome de história pragmática, jamais poderão ser excluídas as suas
relações para com as raças índia e negra.

(P. 51) 5. Conclusão.

Sobre a forma que se deve ser uma história do Brasil, seja-me permitido comunicar algumas observações:
As obras até o presente publicadas sobre as províncias, em separado, são de apreço inestimável, contudo, se
ressentem demais de certo espírito de crônicas. Um grande número de fatos e circunstâncias insignificantes,
que com monotonia se repetem. Tudo isso, recebido em uma obra histórica, há de prejudicar o interesse da
narração e confundir o juízo claro do leitor sobre o essencial da relação. Tudo isso deverá, segundo a minha
opinião ficar excluído.
Aqui se apresenta uma grande dificuldade em conseqüência da grande extensão territorial brasileira, a
variedade da natureza que nos rodeia, aos costumes e usos e à composição da população de tão
disparatados elementos.
(P. 52) Para evitar este conflito, parece necessário que em primeiro lugar seja representado o estado do país
conforme o que tenha de particular em suas relações com a mãe pátria, e o resto do mundo. E depois,
passando para as partes do país que se diferem, realçando em cada uma delas o que houver de significante.
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(P. 53) Elas imprimiram à sua obra um atrativo particular para os habitantes das diferentes partes do país,
porque nestas diversas descrições locais reconhecerão a sua própria habitação, e se encontrarão a si
mesmos.
(P. 54) Por fim, uma observação sobre a posição do historiador do Brasil para com a pátria. A história é
uma mestra da vida, do futuro e do presente. Elas pode difundir entre os contemporâneos sentimentos e
pensamentos do mais nobre patriotismo. Uma obra histórica sobre o Brasil deve despertar e reanimar em
seus leitores brasileiros o amor à pátria.
Ainda reinam muitos preconceitos entra as diversas províncias e elas devem ser eliminadas. Cada uma das
partes do império deve tornar-se cara às outra.
Deve procurar-se provar que o Brasil alcançará o seu mais favorável desenvolvimento, se chegar, firmes os
seus habitantes na sustentação da monarquia, estabelecendo uma sábia organização entre as províncias. A
obra deverá ser escrita em estilo popular.

Munique, 10 de janeiro de 1843.

Bibliografia:
MARTIUS; Karl F. Philipp: “Como se deve escrever a história do Brasil” 1 ed em livro RJ IHGB, 1991.
(Obra completa). Pag 11-54

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