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ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico

ATENÇÃO FARMACÊUTICA EM PEDIATRIA, HERBIATRIA E GERIATRIA

Volume IV

Vitae Editora
Anápolis (GO), 2021
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E-book transcrito da aula do professor Edson Luiz

Professor no Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico. Graduado


em Farmácia pela Universidade Estadual de Londrina. Aperfeiçoamento em Farmacologia
na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Especialização em Fisiologia pela Universida-
de Federal do Paraná (UFPR). Mestrado em Fisiologia na Universidade Federal do Paraná
(UFPR). Doutoramento em Ciências Médico-Cirúrgicas na Universidade Federal do Ceará
(UFC). Professor de Graduação – Farmácia. Professor de Pós-graduação- Farmácia Clínica e
Prescrição Farmacêutica.

EXPEDIENTE:
Autor: ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico
Revisão Técnica: Farmacêutica Me. Juliana Cardoso
Produção: Vitae Editora
Edição: Egle Leonardi e Jemima Bispo
Colaboraram nesta edição: Erika Di Pardi e Janaina Araújo
Diagramação: Cynara Miralha

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ATENÇÃO FARMACÊUTICA EM PEDIATRIA, HERBIATRIA E GERIATRIA

FARMACOCINÉTICA PEDIÁTRICA
A partir deste ponto, destacam-se alguns aspectos importantes sobre a Farmacocinética,
ou seja, o que o organismo irá fazer com determinada substância. Analisando a questão
temporal já mencionada, apresenta-se, no quadro abaixo, as diferenças entre termos
(prematuro, termo, pós-termo, recém-nascido, infante, criança e adolescente).

ABSORÇÃO APÓS ADMINISTRAÇÃO ORAL


A absorção é uma etapa crucial que permite o acesso do fármaco para a corrente circulatória,
para que ele alcance os diferentes tecidos. Variações de pH interferem no grau de ionização
e de solubilização de fármacos para que, efetivamente, essa substância seja absorvida.
A absorção ainda é influenciada pela motibilidade gástrica e intestinal.

Em geral, o pH gástrico de um adulto gira em torno de 3 ou 3,5. Isso significa dizer que
as células parietais das glândulas gástricas, por meio da bomba de prótons, transferem H+,
ou seja, o próton, para a luz gástrica, fazendo com que o pH alcance esse valor. Contudo, o
ambiente gástrico é um ambiente ácido. Ao reportar para o mundo infantil, percebe-se que o
pH fica entre 6 e 8, ou seja, o recém-nascido tem pH alcalino, que sofre diminuição ao longo
do tempo.

A redução do pH gástrico e da secreção gástrica só alcançam o valor de um adulto a partir


do momento em que a criança completar um ano de vida.

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Caso pH não tenha alcançado os valores de um adulto, mediante uma substância que
gosta de ambiente com variações de pH, essa substância pode ser mais bem absorvida ou
não.

Observando a imagem abaixo, tem duas moléculas: Amoxicilina e Ampicilina. Essas


substâncias são antibacterianas do grupo dos betalactâmicos e, devido à presença desse
pH2, possuem maior resistência ao meio ácido, por isso são administradas por via oral. Caso
essas substâncias encontram um meio mais alcalino elas são absorvidas mais rapida-
mente. O pH mais elevado em um prematuro ou recém-nascido, antes dele aumentar os
primeiros meses de vida, vai favorecer o processo de absorção da substância. Um exemplo:
o farmacêutico recebe a prescrição e não orienta o cuidador sobre a necessidade de agitar o
frasco, o que promove uma melhor distribuição do produto. Se a agitação é inapropriada, a
dose inicialmente é menor e, ao chegar no final das administrações, a quantidade remanes-
cente no fundo do frasco é maior. Nesse sentido, a criança (que já propícia à maior absorção)
recebe uma dose maior, podendo desenvolver um evento adverso ao final do tratamento.

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Essas substâncias gostam e resistem aos ambientes ácidos, tendo a capacidade de sobreviver a
ambiente estomacal mais alcalino, ou menos ácido, sendo, portanto, rapidamente absorvidas.

O tempo de esvaziamento gástrico em prematuros e recém-nascido é prolongado. Logo,


diante de um fármaco inicialmente absorvido pelo epitélio gástrico, se o tempo de esvaziamento
é menor, a taxa de absorção será maior.

Menor motilidade gastrointestinal pode afetar o processo de absorção. Entre os meses


6 e 8 de idade, a motilidade gastrointestinal alcança níveis semelhantes aos de um adulto.

De modo geral, fármacos são absorvidos em neonatos e infantes mais lentamente que em
crianças e adultos.

A atividade das enzimas pancreáticas, processo de formação de bile, síntese dos ácidos
biliares e absorção intestinal são menores no nascimento.

A atividade da b-glucoronidase no intestino delgado de infantes é maior que em adultos.


Desse modo, a biodisponibilidade para fármacos que necessitam da circulação enterohepática
é maior (Cloranfenicol e Indometacina).

A absorção cutânea pode aumentar em neonatos e infantes, devido a menor espessura do


estrato córneo e maior perfusão cutânea.

A pele é dividida em dois segmentos: a derme e a epiderme. A epiderme é dividida em


quatro ou cinco camadas, sendo que quinta camada considerada a região palmo plantar.
Ou seja, a palma da mão e a sola do pé. Já nas demais áreas são quatro camadas. A camada
mais externa é chamada de estrato córneo, onde ocorre o processo de deposição da proteína
queratina. Essa camada mais externa da pele é mais delgada na criança.

A perfusão dérmica, ou seja, a passagem de sangue é maior. Se a criança tem o estrato


córneo mais delgado e uma perfusão maior, a taxa de absorção será maior. Portanto, risco
do desenvolvimento de eventos sistêmicos na criança é maior. Nesse momento destaca-se o
cuidado com a atenção voltada para as características fisiológicas e as características anatômicas.

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Devido ao menor fluxo sanguíneo nos músculos esqueléticos em neonatos e infantes, a
taxa de absorção por via muscular é menor.

ABSORÇÃO APÓS ADMINISTRAÇÃO ORAL

A administração de medicamento em colher para uma criança não é segura! É necessário


o uso de dosadores para que se tenha a quantidade precisa do fármaco. Por exemplo, se é
preciso administrar 4,5 ml, não é possível determinar isso com precisão em uma colher.
Se for feito por gotejamento, o conta gotas deve estar calibrado adequadamente e tenha-se a
ideia exata da densidade do medicamento. Por isso, o ideal é utilizar o dosador volumétrico.

Às vezes, a diferença de 4ml pode ser mais que suficiente para o desenvolvimento de um
evento adverso.

As formas farmacêuticas líquidas são mais apropriadas para crianças com idade inferior
a sete anos. A Farmacoterapia eficaz e segura requer a administração precisa de fármacos,
e muitas vezes, o frasco graduado que acompanha os medicamentos não oferece as condições
ideais para administração de líquidos. Nesse caso, o uso de uma seringa proporciona uma
administração controlada e segura à correta mensuração da dose.

ABSORÇÃO APÓS ADMINISTRAÇÃO INTRAMUSCULAR E SUBCUTÂNEA

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O processo depende, principalmente, do fluxo sanguíneo (adultos e crianças), não sendo
ideal para prematuros e recém-nascidos.

O fato de os prematuros apresentarem uma pequena massa muscular e uma pobre perfusão
sanguínea em vários músculos, em comparação com infantes e crianças, faz com que a
absorção de fármacos administrados por essa via seja errática.

Via intramuscular raramente é utilizada em prematuros e recém-nascidos enfermos, exceto


em casos de emergência ou quando a via intravascular é inacessível.

ABSORÇÃO APÓS ADMINISTRAÇÃO CUTÂNEA


Tal absorção em recém-nascidos, infantes e crianças é substancialmente maior em
comparação aos adultos. Portanto, o cálculo das doses deve ser baseado no FTU.

DISTRIBUIÇÃO DE FÁRMACOS
A distribuição de uma substância, por meio da corrente circulatória, é importante para
que o fármaco ocupe diferentes compartimentos, saia do compartimento central e distribua-se
para os compartimentos laterais ou compartimentos periféricos, onde efetivamente pode
ser seu sítio de ação. Isso depende das propriedades físico-químicas das substâncias e da
quantidade de proteínas plasmáticas hepaticamente produzidas, lembrando que ela tem
sua concentração passiva de ser aferida por meio de testes específicos.

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No exemplo acima, são apresentadas duas crianças que necessitam da substância teofilina.
Ao considerar o volume de distribuição parente, ele mostra a fração livre do fármaco e a
fração do fármaco que está ligada às proteínas plasmáticas. Para um infante, o VDA
(Volume de Distribuição Aparente) tem o valor de 1L por kg. Então, ele tem a dose de ataque
da teofilina de 5mg por kg e a dose de manutenção em 6mg por kg em 24h, dividida em
tomadas que podem ser de 6h – 6h ou 8h – 8h. A teofilina é uma substância mais hidrofílica,
com grupamentos na estrutura química que favorecem a sua solubilidade em meio aquoso.
Quando há o avanço na idade, o VDA para uma criança com seis anos de vida é de 0,48L
por kg. Ou seja, foi reduzido pela metade, no entanto, com essa redução, a dose de ataque
cai pela metade. Logo, a dose de ataque passa para 2,5, sendo que era 5.

A dose de manutenção cai uma unidade, passando a ser administrada de 6h – 6h. A dose
de manutenção fica em terno de 5mg/kg em doses administrada de 6h – 6h.

A própria estrutura química está intimamente relacionada com o volume de distribuição


aparente.

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Na imagem acima, existem duas crianças com tempos de vida diferentes e com taxas
de distribuição de gordura corporal distinta. Uma das crianças tem menor concentração
de gordura tecidual e outra possui maior quantidade de gordura tecidual. Ao analisar as
substâncias que são depositadas em tecidos adiposos, tais sustâncias não ficarão depositadas
em crianças com menor teor de gordura. Já em crianças com maior teor de gordura, essas
substâncias ficarão depositadas, ou seja, vai haver um maior volume de distribuição aparente.

Na prática, imagina-se uma dose de 20 mL de um fármaco administrado, estando


totalmente disponível no organismo. Essas 20ml irão se ligar às proteínas plasmáticas. Em
um adulto, devido a maior quantidade de proteínas plasmáticas, 10ml estão ligadas às proteínas
plasmáticas e 10ml não estão.

Em uma criança, a quantidade de proteínas plasmáticas é menor. Imagina-se que foi


administrada 20ml e todo esse conteúdo foi absorvido. Mas, a taxa ligada às proteínas
plasmáticas ficou em torno de 6ml, já os outros 14ml estão livres. O resultado dessa relação
é que a quantidade livre é maior e o risco de um desenvolvimento de toxicidade ou eventos
adversos é muito grande.

Isso justifica as ocasiões em que as crianças chegam ao ambiente hospitalar apresentando


manifestações de toxicidade de medicamentos. Isso ocorre quando, acidentalmente, administram
medicamentos em casa sem cuidado e orientação.

A variação das proteínas plasmáticas é distinta em crianças e adultos. Existe uma variação
para albumina e outra para a alfa-1-glicoproteína. A concentração de albumina é de 40g/L,
sendo que baixos níveis podem ser observados na gestação e condições patológicas (disfun-
ção renal e hepática). Já a alfa-1 glicoproteína apresenta valores normais de 400-1000 mg/L.
Ocorre aumento dessas proteínas em condições de inflamação, CA e estresse. Em condições
de disfunção hepática e renal ocorre a redução dessa proteína.

As concentrações de albumina e alfa-1 glicoproteína são reduzidas no neonato e infantes,


resultando em aumento da fração livre de fármacos. O aumento da fração livre pode expandir
a distribuição de fármacos nos tecidos e produzir efeitos adversos.

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BIOTRANSFORMAÇÃO
A taxa de biotransformação nos recém-nascidos e infantes é mais lenta que em adultos, pois
a atividade enzima nessas fases da vida gira em torno de 20-70% do adulto.

No caso do Paracetamol, existe uma sequência de eventos de biotransformação. No adulto,


há o risco da geração de um metabólito ou produto de transformação que tenha hepatoxicidade.
Já na criança, a reação majoritária em termos de atividade hepática, considerando essa via, é
a via de sulfatação. Para ela, o Paracetamol, administrado corretamente, terá o efeito analgésico,
antitérmico entre outros, sofrendo então a sulfatação e, posteriormente, será eliminado.
O adulto necessita da via de glucuronidação. Portanto, se essa via não conseguir transformar
todo o Paracetamol, existe o risco de hepatotoxicidade.

EXCREÇÃO

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A formação da urina depende da filtração glomerular, da secreção e da reabsorção tubular.
Em recém-nascidos, esses valores são menores e, à medida que os meses vão se passando, os
valores vão se estabilizando e alcançando a maturidade do processo de clearance.

DOSES EM PEDIATRIA
Existem alguns medicamentos na pediatria que são comumente empregados, como os
antimicrobianos, betalactâmicos, macrolídeos, medicamentos de uso tópico, anticonvulsivante
(em casos específicos), anti-hipertensivos (raramente utilizados), medicamentos para con-
trole de bronquite e asma, antitérmicos, antiparasitários, polivitamínicos, nutracêuticos,
anti-inflamatórios, entre outros. Nesse cenário, diante da necessidade de uma prescrição,
é preciso verificar a dose. Isso porque, muitos medicamentos não são testados em crianças,
apesar de todo o controle dos órgãos nacionais e internacionais sobre o uso de medicamentos
em crianças, que orientam para o uso off-label. Compete ao profissional farmacêutico a neces-
sidade de reavaliar o cálculo da dose, sempre orientado pela literatura específica.

Crianças são mais sensíveis que adultos em relação ao uso de medicamentos, pois apresentam
diferenças em relação à massa corporal, comprimento, condições físicas, sistemas imaturos e
padrão de metabolismo.

Ao administrar qualquer medicamento para infantes e crianças, deve ser marcante


a preocupação em relação ao medicamento e doses corretas. Lembrando que, medicamentos
em pediatria devem ser calculados com base na massa e, em certas condições, deve ser
considerado o BSA.

É necessário que haja dosadores específicos para que seja respeitada a dose segura para
a criança.

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CÁLCULO BASEADO NO BSA
O método de cálculo da dose com base na área de superfície corporal (BSA) é extensamente
empregado em dois tipos de pacientes: pacientes com câncer que recebem tratamento quimio-
terápico e pacientes pediátricos, com exceção dos recém-nascidos, cuja dose é, normalmente,
determinada com base em seu peso, considerando a idade e uma série de fatores bioquímicos,
fisiológicos, funcionais, patológicos e imunológicos.

Calcular dose é a regra básica para que haja precisão no tratamento e não ocorra nenhum
risco de administração inapropriada de medicamentos para crianças com idade entre 0 e 12
anos de vida.

Pacientes pediátricos apresentam rápidas e dinâmicas modificações físicas e fisiológicas ao


longo do tempo. Características peculiares relacionadas à maturidade fisiológica das crianças
alteram sua capacidade de absorção, metabolização e excreção dos medicamentos e constituem
informações importantes nem sempre consideradas nas decisões clínicas relacionadas à seleção
e à utilização dos fármacos.

As evidências de mudanças mais significantes são observadas em relação à farmacocinética,


pois estágios importantes, como a absorção e a metabolização de fármacos, podem ser
influenciados por variações de pH, tempo de esvaziamento gástrico, motilidade gastrintestinal,
deficiência enzimática e imaturidade hepática.

Aproximadamente 75% dos medicamentos não foram estudados nessa população.


Por motivos legais, éticos e econômicos, as crianças não são incluídas em ensaios clínicos
para desenvolvimento de novos medicamentos, sendo chamadas de “órfãos terapêuticos”.
Portanto, a eficácia e a segurança de muitos medicamentos não estão bem estabelecidas, sendo
que a maioria dos usos tem indicação off label, ou seja, medicamento prescrito de forma
diferente da preconizada em relação à faixa etária, dose e posologia, via de administração ou
indicação terapêutica para uso em criança.

O que deve ser lembrado na pediatria é que criança não é adulto em miniatura.

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