Você está na página 1de 66

DIREITOS

HUMANOS
SISTEMA INTERAMERICANO DE PROTEÇÃO
DOS
DIREITOS HUMANOS
SUMÁRIO

1. Considerações iniciais................................................................................................................................4
2. Histórico....................................................................................................................................................5
2.1 Carta Da OEA e a Declaração Americana De Direitos e Deveres do Homem..............................................5
2.2 Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (Pacto de São José Da Costa Rica 1969)...........................9
2.3 Protocola adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em matéria de Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de São Salvador)........................................................................12
2.4 Outros tratados do sistema interamericano:..........................................................................................13
3. Mecanismo de proteção do Sistema Interamericano................................................................................24
3.1 Comissão Interamericana de Direitos Humanos......................................................................................28
3.1.1 Comissão e o trâmite das petições individuais.....................................................................................29
3.1.2 Conciliação perante a Comissão...........................................................................................................30
3.1.3 Medidas cautelares perante a Comissão..............................................................................................30
3.1.4 Primeiro Informe e possível ação perante a Corte IDH.........................................................................31
3.1.5 Segundo informe.................................................................................................................................31
3.1.6 Os relatórios anuais e a relatoria para a liberdade de expressão..........................................................32
3.2 Corte Interamericana de Direitos Humanos............................................................................................32
3.2.1 Legitimidade ativa e passiva................................................................................................................33
3.2.2 Procedimento na Corte........................................................................................................................34
4. Principais casos envolvendo o Brasil na Comissão e na Corte Interamericana de Direitos Humanos..........38
4.1 Maria da Penha Maia Fernandes vs. BRASIL...........................................................................................38
4.2 José Pereira vs. BRASIL...........................................................................................................................39
4.3 Jailton Neri da Fonseca vs. BRASIL..........................................................................................................40
4.4 Caso dos Meninos Emasculados do Maranhão........................................................................................41
4.5 Ximenes Lopes vs. BRASIL.......................................................................................................................42
4.6 Simone André Diniz vs. BRASIL...............................................................................................................43
4.7 Nogueira de Carvalho e Outro vs. BRASIL...............................................................................................44
4.8 Escher e Outros vs. BRASIL.....................................................................................................................45
4.9 Garibaldi vs. BRASIL...............................................................................................................................46
4.10 Gome Lund vs. BRASIL (“Guerrilha do Araguaia”).................................................................................50
4.11 Índios do Rio Xingu vs. BRASIL (“Belo Monte”).....................................................................................55
4.12 Vladimir Herzog vs. Brasil.....................................................................................................................56
4.13 Fazenda Brasil Verde vs. BRASIL...........................................................................................................58
4.14 Favela Nova Brasília vs. BRASIL.............................................................................................................60
4.15 Povo Indígena Xucuru e seus membros vs. BRASIL................................................................................62
4.16 Luiza Melinho vs. BRASIL......................................................................................................................63
DISPOSITIVOS PARA CICLOS DE LEGISLAÇÃO................................................................................................65
BIBLIOGRAFIA UTILIZADA.............................................................................................................................66
ATUALIZADO EM 25/06/20201

SISTEMA INTERAMERICANO DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS 2

1. Considerações iniciais

Conforme já foi visto anteriormente, a proteção internacional dos direitos humanos estrutura-se ao
redor de sistemas, ou seja, de esquemas compostos por tratados e órgãos encarregados de aplicá-los.

#SELIGA:
SISTEMA GLOBAL SISTEMAS REGIONAIS
É conhecido como o sistema “internacional” Visam a promover os direitos humanos em
ou “universal” e visa abranger o mundo determinadas regiões do mundo, atentando
inteiro. É administrado fundamentalmente para as respectivas especificidades e
pela Organização das Nações Unidas (ONU) beneficiando-se da maior facilidade de
e seu principal órgão é o Alto Comissariado promover o consenso entre Estados. Os
das Nações Unidas para os Direitos mais conhecidos são o Europeu, o Africano
Humanos. e o Interamericano, do qual o Brasil faz
parte.
Seus documentos mais importantes são: O sistema interamericano é organizado pela
(i) Declaração Universal dos Direitos OEA – Organização dos Estados
Humanos, de 1948; Americanos. Seus principais órgãos são: (i) a
(ii) Pacto sobre Direitos Civis e Políticos e; Comissão e a (ii) Conselho Interamericano
(iii) Pacto sobre Direitos Econômicos, Sociais para o Desenvolvimento Integral.
e Culturais, de 1966

*#OUSESABER: O que se entende por europeização de sistema interamericano?

1
As FUCS são constantemente atualizadas e aperfeiçoadas pela nossa equipe. Por isso, mantemos um canal aberto de
diálogo (setordematerialciclos@gmail.com) com os alunos da #famíliaciclos, onde críticas, sugestões e equívocos,
porventura identificados no material, são muito bem-vindos. Obs1. Solicitamos que o e-mail enviado contenha o título do
material e o número da página para melhor identificação do assunto tratado. Obs2. O canal não se destina a tirar dúvidas
jurídicas acerca do conteúdo abordado nos materiais, mas tão somente para que o aluno reporte à equipe quaisquer dos
eventos anteriormente citados.
2
Bruna Daronch.
Inicialmente, importante destacar que, atualmente, existem três sistemas regionais em funcionamento: o
europeu, o interamericano e o africano. A coexistência destes sistemas de proteção fez surgir o que a doutrina
chamou de “Europeização” do Sistema Interamericano e a “Interamericanização´´ do Sistema Europeu. Em
breve síntese, estes fenômenos consistem no diálogo entre as cortes e enriquecem os julgamentos proferidos
pelos sistemas regionais. Segundo Flávia Piovesan, “O resultado é a transformação dos sistemas regionais por
meio da inovação jurisprudencial e do fortalecimento da capacidade de responder a desafios concernentes a
violações de direitos, propiciando proteção mais efetiva aos direitos das vítimas”. Assim, ante a ausência de
jurisprudência anterior em um dos sistemas de proteção, busca-se precedentes provenientes de outro
sistema, com o escopo de se manter a posição internacional adotada pelos demais órgãos regionais e, por
conseguinte, obter uma jurisprudência unitária globalmente. A Europeização do Sistema Interamericano,
portanto, consiste na utilização de alguns julgamentos da Corte Europeia de Direitos Humanos pela Corte
Interamericana de Direitos Humanos em algum dos seus julgamentos. Como exemplo, podemos citar o Caso
Atala Riffo y ninãs vs. Chile, submetido à Corte Interamericana em virtude de a Corte Suprema de Justiça do
Chile ter retirado o poder parental da Srª Karen Atala em razão de sua orientação sexual. Neste caso, ao
verificar que não possuía qualquer julgamento anterior relacionado aos direitos em análise, A Corte
Interamericana utilizou o precedente da Corte Europeia relativo ao caso Salgueiro da Silva Mouta vs. Portugal
(julgado em 21 de Março de 2000) e defendeu que a decisão da Corte Suprema do Chile resultou em
tratamento discriminatório, em interferência indevida na vida privada e familiar e em descumprimento aos
artigos 1, parágrafo 1 e 14 da Convenção Interamericana, os quais correspondem a cláusula aberta que inclui a
categoria da orientação sexual, preveem o princípio da igualdade e a proibição da discriminação.

Neste momento, será estudado com profundida o Sistema interamericano de proteção aos DH, um
dos tópicos mais importantes do edital: “Os sistemas regionais de proteção aos direitos humanos reforçam a
estrutura internacional. A doutrina indica como principais arranjos o Sistema Africano, o Europeu e o
Interamericano”.

O Sistema Interamericano é ADMINISTRADO PELA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS


(OEA). Seu principal tratado é a CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (Pacto de São José da Costa
Rica de 1969).

2. Histórico

2.1 Carta Da OEA e a Declaração Americana De Direitos e Deveres do Homem


A CARTA DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS (OEA) é o tratado que criou essa entidade,
sendo firmada em 1948. Embora ela não consagre expressamente a promoção dos direitos humanos como um
dos objetivos principais daquele organismo internacional, estabelece que “Os Estados americanos proclamam
os direitos fundamentais da pessoa humana, sem fazer distinção de raça, nacionalidade, credo ou sexo” (art.
3), proclamando, de modo genérico, o dever de respeito aos direitos humanos por parte de todo Estado-
membro da organização.

Já a DECLARAÇÃO AMERICANA DOS DIREITOS E DEVERES DO HOMEM foi aprovada pela Resolução
XXX, em Bogotá, em abril de 1948. Embora seja uma RESOLUÇÃO NÃO VINCULANTE, é o MARCO INICIAL NA
CONSTRUÇÃO DO SISTEMA INTERAMERICANO, enumerando especificadamente quais são os direitos
fundamentais que deveriam ser observados e garantidos pelos Estados.

#SELIGA: A Declaração Americana, que é anterior à Declaração Universal de Direitos Humanos,


expressamente reconheceu a universalidade dos direitos humanos, ao expressar que os direitos
essenciais do homem não derivam do fato de ser ele cidadão ou nacional de um Estado, mas, sim, de sua
condição humana (Preâmbulo da Declaração).

Além do mais, os Estados-membros da OEA estão vinculados ao cumprimento dos direitos


mencionados na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, que é considerada interpretação
autêntica dos dispositivos genéricos de proteção de direitos humanos da Carta da OEA, conforme decidiu a
Corte Interamericana de Direitos Humanos (Parecer Consultivo sobre interpretação da Declaração Americana
dos Direitos e Deveres do Homem – art. 64 da Convenção, 1989, § 45).

Atualmente, a OEA possui dois órgãos principais, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e
o Conselho Interamericano para o Desenvolvimento Integral, voltados à promoção de direitos humanos.
Incumbe à Comissão Interamericana de Direitos Humanos a tarefa principal de responsabilização dos Estados
por descumprimento dos direitos civis e políticos expressos na Carta e na Declaração Americana. Já o Conselho
Interamericano de Desenvolvimento Integral deve zelar pela observância dos chamados direitos econômicos,
sociais e culturais.

O próximo salto no desenvolvimento do sistema interamericano de proteção de direitos humanos foi


a aprovação do texto da Convenção Americana de Direitos Humanos em São José, Costa Rica, em 1969. A
Convenção, entretanto, só entrou em vigor em 1978, após ter obtido o mínimo de 11 ratificações. Essa
Convenção, além de adotar a já existente Comissão Interamericana de Direitos Humanos de novas atribuições,
criou a Corte Interamericana de Direitos Humanos, como o segundo órgão de supervisão do sistema
interamericano de direitos humanos.

Em relação aos direitos protegidos, a Convenção aprofundou a redação dos direitos enunciados na
Declaração Americana, vinculando os Estados (cabe lembrar que a Declaração Americana era tida como um
texto não vinculante por não ser um tratado propriamente dito).

A partir da entrada em vigor da Convenção, a Comissão passou a ter papel dúplice. Em primeiro
lugar, continuou a ser um órgão principal da OEA, encarregado de zelar pelos direitos humanos,
incumbido até do processamento de petições individuais retratando violações de direitos humanos protegidos
pela Carta da OEA e pela Declaração Americana. Em segundo lugar, a Comissão passou a ser também órgão da
Convenção Americana de Direitos Humanos, analisando petições individuais e interpondo ação de
responsabilidade internacional contra um Estado perante a Corte. Caso o Estado não tenha ratificado ainda a
Convenção (como os Estados Unidos) ou caso tenha ratificado, mas não tenha reconhecido a jurisdição
obrigatória da Corte, a Comissão, pode apenas acionar a Assembleia Geral da OEA.

Além da Convenção Americana de Direitos Humanos, o sistema interamericano conta com diversos
instrumentos internacionais que protegem direitos específicos. O mais importante deles é, sem dúvida, o
Protocolo Adicional à Convenção Americana de Direitos Humanos em matéria de Diretos Econômicos, Sociais e
Culturais (Protocolo de San Salvador), adotado em 1988 e ratificado pelo Brasil em 1996. Em uma região
marcada por desigualdades sociais e pelo contraste entre a riqueza ostensiva de poucos e a miséria de
milhões, o Protocolo Adicional veio ao encontro da necessidade de aferir o cumprimento dos direitos sociais
em sentido amplo pelo Estado.

Quanto aos demais instrumentos internacionais do sistema interamericano de direitos humanos,


cite-se, entre outros, a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir o Crime de Tortura, adotada em 1985
e ratificada pelo Brasil em 1989; o Protocolo Adicional à Convenção Americana de Direitos Humanos
relativo à Abolição da Pena de Morte, adotado em 1990 e ratificado pelo Brasil em 1996; a Convenção
Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, adotada em 1994 em Belém do
Pará (Brasil) e ratificada pelo Brasil em 1995, e a Convenção Interamericana sobre Desaparecimento
Forçado de Pessoas adotada em 1994 e ratificada pelo Brasil em 2016.

#ATENÇÃO #DEFENSORIAPÚBLICA:
Segundo André de Carvalho Ramos, entre as várias atuações específicas da OEA na área dos direitos humanos,
destaca-se a valorização do trabalho dos defensores públicos na promoção de direitos humanos.
Nesse sentido, foi editada pela OEA a Resolução n. 2.656/2011, intitulada “garantias de acesso à justiça: o
papel dos defensores públicos oficiais”, na qual se enfatizou a importância do trabalho realizado pelos
defensores públicos oficiais, em diversos países do Hemisfério, na defesa dos direitos fundamentais dos
indivíduos, que assegura o acesso de todas as pessoas à justiça, sobretudo daquelas que se encontram em
situação especial de vulnerabilidade.
A OEA recomendou, pela resolução, aos Estados (como o Brasil) que já disponham do serviço de assistência
jurídica gratuita que adotem medidas que garantam que os defensores públicos oficiais gozem de
independência e autonomia funcional. Também incentivou os Estados-membros que ainda não disponham da
instituição da defensoria pública oficial (o chamado “modelo brasileiro”) que considerem a possibilidade de
criá-la em seus ordenamentos jurídicos e ainda pugnou pela celebração de convênios para a capacitação e
formação de defensores públicos oficiais.
Em 2012, a OEA editou a Resolução n. 2.714, de 2012, ressaltando a necessidade dos Estados americanos em
assegurar o acesso à justiça, bem como garantir a independência e autonomia funcional da Defensoria Pública.
Apesar de não possuírem força vinculante, essas resoluções indicam a posição da OEA sobre as defensorias,
delineando o dever dos Estados de promover os direitos humanos por intermédio da adoção do modelo de
defensoria pública oficial.
#NOTÍCIADPU3 #CURIOSIDADE #SOBREAINSTITUIÇÃO:
Em 22/08/2016, a Defensora Pública Federal Isabel Penido de Campos Machado tomou posse no cargo de
Defensora Interamericana de Direitos Humanos, nesta segunda-feira (22), em solenidade realizada na sede da
Defensoria Pública da União (DPU), em Brasília. A solenidade ressaltou a importância da nomeação, uma vez
que é a primeira vez em que a DPU é representada no grupo de defensores públicos interamericanos da
Associação Interamericana de Defensorias Públicas (Aidef). [...] A posse fez parte da programação do I Curso
de Capacitação em Direitos Humanos - Sistema Interamericano, promovido pela Escola Superior da Defensoria
Pública da União (ESDPU). Além de contar com palestrantes internacionais e nacionais, cerca de 45 defensores
públicos de diversas unidades participam do evento. [...] A representação da DPU no IIDH pela primeira vez
também foi valorizada pela representante do instituto na América do Sul, Soledad García Muñoz: “A presença
da defensora Isabel Penido e este novo vínculo abrirão janelas de oportunidades para que a DPU se posicione
ainda mais como uma instituição referência para o sistema interamericano no âmbito internacional. Desejo
boa sorte”. [...] os defensores interamericanos atuam em casos de violação de direitos humanos perante a
Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, exercendo a função pelo prazo de três anos,

3
Notícia retirada no http://www.dpu.gov.br/noticias-defensoria-publica-da-uniao/32634-integrante-da-dpu-e-
empossada-defensora-interamericana-de-direitos-humanos-2. Acesso em 22/08/2016.
podendo ser reconduzidos por igual período. Cada país membro pode indicar apenas dois defensores públicos
para a função. O Brasil é representado, no âmbito da Aidef, pela Defensoria Pública da União (DPU), pelo
Colégio Nacional de Defensores Públicos-Gerais (Condege) e pela Associação Nacional de Defensores Públicos
(Anadep).

2.2 Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (Pacto de São José Da Costa Rica 1969)

Em seu preâmbulo, a Convenção ressalta o reconhecimento de que os direitos essenciais da pessoa


humana derivam não da nacionalidade, mas sim da sua condição humana, o que justifica a proteção
internacional, de natureza convencional, coadjuvante ou complementar da que oferece o direito interno dos
Estados. Ressalta-se também que o ideal do ser humano livre, isento do temor e da miséria, só pode ser
realizado se forem criadas condições que permitam a cada pessoa gozar não só dos seus direitos civis e
políticos, mas também dos seus direitos econômicos, sociais e culturais.

O Brasil aderiu à Convenção em 09 de julho de 1992, depositou a carta de adesão em 25 de


setembro de 1992, e a promulgou por meio do Decreto n. 678, de 6 de novembro do mesmo ano.

Formalmente, a Convenção Americana é composta por 82 artigos, divididos em três partes: Parte I
sobre os Deveres dos Estados e Direitos Protegidos; a Parte II sobre os “Meios de Proteção” e a Parte III, sobre
as “Disposições Gerais e Transitórias”. Vejamos os principais destaques4:

Consagra o direito à VIDA “desde o momento da concepção”, proibindo o aborto, como regra geral.

NÃO PROÍBE A PENA DE MORTE, mas VEDA O SEU RESTABELECIMENTO nos Estados onde tenha
sido abolida. De qualquer forma, a pena de morte não poderá ser imposta por CRIMES POLÍTICOS ou por
ilícitos de MENORES DE 18 ANOS.

Veda o tráfico de mulheres, proibindo que presos sejam postos à disposição de particulares,
companhias ou pessoas jurídicas de caráter privado (art. 6).

Permite a prisão por dívida de pensão alimentícia, mas apenas nesse caso.

#DEOLHONAJURISPRUDÊNCIA:
4
Recomenda-se a leitura integral da Convenção.
PRISÃO CIVIL. Depósito. Depositário infiel. Alienação fiduciária. Decretação da medida coercitiva.
Inadmissibilidade absoluta. Insubsistência da previsão constitucional e das normas subalternas. Interpretação
do art. 5º, inc. LXVII e §§ 1º, 2º e 3º, da CF, à luz do art. 7º, § 7, da Convenção Americana de Direitos Humanos
(Pacto de San José da Costa Rica). Recurso improvido. Julgamento conjunto do RE nº 349.703 e dos HCs nº
87.585 e nº 92.566. É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito. (RE
466343, Relator (a): Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/12/2008, REPERCUSSÃO GERAL -
MÉRITO DJe-104 DIVULG 04-06-2009 PUBLIC 05-06-2009 EMENT VOL-02363-06 PP-01106 RTJ VOL-00210-02
PP-00745 RDECTRAB v. 17, n. 186, 2010, p. 29-165)

#DEOLHONASÚMULA:
Súmula Vinculante 25: É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade de depósito.
Súmula 419 do STJ: Descabe a prisão civil do depositário judicial infiel.

Há um espaço específico para as GARANTIAS JUDICIAIS, quais sejam: julgamento célere,


imparcialidade, igualdade das partes, presunção de inocência, contraditório e ampla defesa; duplo grau de
jurisdição; legalidade, irretroatividade penal (salvo benéfica), direito à indenização por erro judiciário.

#ATENÇÃO: De todas essas garantias, apenas o direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior
(art. 8º, par. 2º, “h”) não encontra correspondente dentro do texto da Constituição Federal. A respeito,
ressalta Portela que o STF entendeu que tal garantia é parte da noção de garantia do devido processo legal e
“consubstancia direito que se encontra incorporado ao sistema pátrio de direitos e garantias fundamentais”,
prevalecendo sobre o art. 564 do CPP. Entretanto, dentro desse mesmo julgado (HC 88420/PR), o STF expressa
o entendimento de que o direito ao duplo grau de jurisdição ainda não se reveste de dignidade constitucional.

Os direitos civis congraçados são: direito de propriedade, liberdade de expressão, proibição da


censura prévia, exceto para proteger a infância e a adolescência, liberdade de expressão; proibição da
expulsão coletiva de estrangeiros.

Não se pode esquecer a previsão de direitos políticos (direito de votar e ser votado), proteção da
família e direito à nacionalidade.
#ATENÇÃO: Alguns direitos poderão ser suspensos em circunstâncias excepcionais? SIM! Em caso de
GUERRA ou de PERIGO PÚBLICO ou de OUTRA EMERGÊNCIA, estando em jogo a independência e segurança do
Estado, isso é possível. Mas se ligue: alguns direitos não podem ser suspensos:
(i) Direito ao reconhecimento da personalidade jurídica e ao nome;
(ii) Direito à vida e à integridade física;
(iii) Proibição da escravidão e da servidão;
(iv) Princípios da legalidade e retroatividade;
(vi) Liberdade de consciência e de religião, proteção da família, direitos da criança, nacionalidade e direitos
políticos

O Pacto prevê, ainda, a chamada CLÁUSULA FEDERAL (art. 28), que determina que as normas da
Convenção OBRIGAM O ESTADO INTEIRO, INCLUSIVE AS UNIDADES FEDERAS QUE O COMPÕEM. Essa
cláusula, em realidade, orienta qualquer norma internacional.

Por fim, de acordo com o Pacto, não se tolera o esquecimento penal de violações aos direitos
fundamentais da pessoa humana nem legitima leis nacionais que amparam e protegem criminosos que
ultrajaram, de modo sistemático, valores essenciais protegidos pela Convenção Americana de Direitos
Humanos.

O PACTO SE OCUPA POUCO DOS DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS, determinando


apenas que os Estados adotem providências no sentido de alcançar progressivamente a plena efetividade
desses direitos. A matéria é objeto do Protocolo Adicional à Convenção Interamericana (conforme será
estudado no próximo tópico).

#SELIGA:
 Comissão Interamericana de Direitos Humanos (obs.: possui papel dúplice
do sistema interamericano – órgão da OEA e órgão da Convenção
MEIOS DE PROTEÇÃO Americana, sede em Washington (sede da OEA).
 Corte Interamericana de Direitos Humanos, sede em San José da Costa
Rica, também chamada de “Corte de San José”.
2.3 Protocola adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em matéria de Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de São Salvador)

O Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos


Econômicos, Sociais e Culturais, conhecido como Protocolo de San Salvador, foi adotado pela Assembleia
Geral da OEA, em 17 de novembro de 1988, em São Salvador, sendo voltado aos direitos econômicos,
sociais e culturais garantidos no âmbito do sistema interamericano de proteção aos direitos humanos.

O Congresso Nacional brasileiro aprovou o ato por meio do Decreto Legislativo n. 56, de 19 de abril
de 1995. O Brasil aderiu ao Protocolo em 8 de agosto de 1996 e o ratificou em 21 de agosto de 1996, entrando
o ato em vigor para o Brasil em 16 de novembro de 1999. Finalmente, deu-se a promulgação por meio do
Decreto n. 3.321, de 30 de dezembro de 1999.

Em seu preâmbulo, o Protocolo ressalta a estreita relação existente entre os direitos econômicos,
sociais e culturais, os direitos civis e políticos, uma vez que as diferentes categorias de direito constituem um
todo indissolúvel que protege a dignidade humana. As duas categorias de direitos exigem uma tutela e
promoção permanentes, com o objetivo de conseguir sua vigência plena, sem que jamais possa ser justificável
a violação de uns a pretexto da realização de outros.

Sob o aspecto formal, o Protocolo é composto por 22 artigos, não divididos expressamente em
seções, mas que podem ser assim classificados: (i) obrigações dos Estados (arts. 1º a 3º), (ii) restrições
permitidas e proibidas e seu alcance (arts. 4º e 5º), (iii) direitos protegidos (arts. 6º a 18), (iv) meios de
proteção (art. 19), disposições finais (arts. 20 a 22). O Protocolo 5 prevê, resumidamente, os seguintes
aspectos:

 Princípios norteadores: Desenvolvimento e autodeterminação;


 Políticas de capacitação e orientação vocacional;
 Jornadas laborais de menor duração;
 Direito de promoção baseada na qualificação, competência e tempo de serviço;
 Seguridade social;
 Saúde;
 Direito ao meio ambiente sadio

5
Recomenda-se a leitura integral do Protocolo.
#SELIGA: Esse direito quase não é previsto no Sistema Global.

 Assistência especial à mãe; alimentação das crianças; programas de formação familiar;


 Educação gratuita e obrigatória pelo menos no nível básico;
 Normas específicas de proteção ao idoso, que inclui a alimentação e assistência médica especializadas,
programas de trabalho específicos e formação de organizações sociais para melhorar a qualidade de vida das
pessoas idosas;
 Proteção da velhice;
 Direitos dos deficientes.

MECANISMOS DE  Relatórios periódicos

MONITORAMENTO  Petições individuais para o caso de violação aos direitos sindicais e o direito
à educação.

2.4 Outros tratados do sistema interamericano6:

O Sistema Interamericano conta com outros tratados:

a) CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR E PUNIR A TORTURA (1989) 7 :

O conceito de tortura abrange “todo ato pelo qual são infligidos intencionalmente uma pessoa penas
ou sofrimentos físicos ou mentais, com fins de investigação, intimidação, ou qualquer outro fim, bem como a
aplicação de métodos tendentes a anular a personalidade da vítima, ou a diminuir sua capacidade física ou
mental, embora não causem dor física ou angústia. A tortura não é justificada em nenhuma hipótese.

#SELIGA:
Tortura na ótica da Convenção das Nações Tortura na ótica da Convenção
Unidas Interamericana de Direitos Humanos

Conceito: Qualquer ato pelo qual dores ou Conceito: Todo ato pelo qual são infligidos
sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são intencionalmente a uma pessoa penas ou
infligidos intencionalmente a uma pessoa a sofrimentos físicos ou mentais, com fins de
6
Recomenda-se a leitura integral de todas as convenções/tratados/protocolos aqui indicados.
7
Este tratado foi estudado de forma comparativa com a Convenção de Tortura das Nações Unidas nos comentários da
jurisprudência internacional da Corte Internacional de Justiça (CIJ).
fim de obter, dela ou de uma terceira pessoa, investigação criminal, como meio de
informações ou confissões; de castigá-la por intimidação, como castigo pessoal, como
ato que ela ou uma terceira pessoa tenha medida preventiva, como pena ou com
cometido ou seja suspeita de ter cometido; de qualquer outro fim. Entender-se-á também
intimidar ou coagir esta pessoa ou outras como tortura a aplicação, sobre uma pessoa,
pessoas; ou por qualquer motivo baseado em de métodos tendentes a anular a
discriminação de qualquer natureza; quando personalidade da vítima, ou a diminuir sua
tais dores ou sofrimentos são infligidos por capacidade física ou mental, embora não
um funcionário público ou outra pessoa no causem dor física ou angústia psíquica.
exercício de funções públicas, ou por sua
instigação, ou com o seu consentimento ou
aquiescência. Não se considerará como
tortura as dores ou sofrimentos que sejam
consequência unicamente de sanções
legítimas, ou que sejam inerentes a tais
sanções ou delas decorram.

#OBS1: Não se admite invocação de


circunstâncias excepcionais, tais como ameaça
ou estado de guerra, instabilidade política
interna ou qualquer emergência pública como
justificação da tortura. Não se admite,
também, a exculpante da “ordem hierárquica”
como justificação para o crime. Não há,
portanto, possibilidade de derrogar a
proibição contra a tortura.

#OBS2: Os atos oriundos de sanções legítimas


que causem sofrimento ou dores NÃO são
considerados tortura.

Elemento subjetivo: dolo. A tortura culposa Elemento subjetivo: dolo. A tortura culposa
não é punível. não é punível.

Finalidade específica: Obter confissão, Finalidade específica: Não há finalidade


informação ou ainda como forma de punição
ou discriminação (“dolo específico”). específica.

Modalidade omissão: NÃO está prevista na Modalidade omissão: Está prevista na


Convenção. Convenção.

Sujeito ativo: É o agente público ou particular Sujeito ativo1: Empregados ou funcionários


agindo em caráter oficial ou ainda por públicos que, no exercício de sua função,
instigação, consentimento ou aquiescência do ordenem a prática de ato de tortura ou,
agente público. ainda, instiguem ou induzam a ele,
cometam-no diretamente ou, podendo
#CONCLUSÃO: Para a Convenção da ONU, a
impedi-lo, não o façam.
presença do funcionário público como sujeito
ativo é obrigatória. Sujeito ativo2: As pessoas que, por
instigação dos funcionários ou empregados
públicos em apreço, ordenem sua prática,
instiguem ou induzam a ela, cometam-no
diretamente ou nele sejam cúmplices.

#CONCLUSÃO: Para a Convenção


Interamericana, o particular pode ser sujeito
ativo de tortura sem que esteja em
concurso com um agente público.

Resultado prático da tortura: O ato deve Resultado prático da tortura: O ato pode ou
causar dor ou sofrimento agudo, físico ou não resultar em pena ou sofrimento físico ou
mental. mental.

#ATENÇÃO: Também configura tortura o ato


que anule a personalidade da vítima ou
diminua a sua capacidade física ou mental,
mesmo que dele não decorra qualquer dor
física ou psíquica.

A Convenção contém mandado de criminalização da tortura e determina a adoção de medidas com


foco na pessoa vítima de tortura, oportunidade em que os Estados devem assegurar que qualquer pessoa que
denunciar ter sido submetida a tortura terá o direito de que o caso seja examinado de maneira imparcial. Se
houver denúncia ou razão fundada para supor que ato de tortura tenha sido cometido no âmbito de sua
jurisdição, o Estado deve garantir que suas autoridades procederão de ofício e imediatamente à realização de
uma investigação sobre o caso, iniciando, se for cabível, o respectivo processo penal.

Esgotado o procedimento jurídico interno do Estado, inclusive em âmbito recursal, o caso poderá ser
submetido a instâncias internacionais, cuja competência tenha sido aceita por esse Estado. Os Estados se
comprometem ainda a estabelecer, em suas legislações nacionais, normas que garantam compensação
adequada para as vítimas do delito de tortura.

Os arts. 11, 13 e 14 versam sobre a extradição. Os Estados Partes da Convenção devem tomar as
medidas necessárias para conceder a extradição de toda pessoa acusada de delito de tortura ou condenada
por esse delito, em conformidade com suas legislações nacionais sobre extradição e suas obrigações
internacionais na matéria.

Ademais, os delitos de tortura devem ser considerados incluídos entre os delitos que são motivo de
extradição em todo tratado de extradição celebrado entre Estados Partes e os Estados se comprometem a
incluir o delito de tortura como caso de extradição em todo tratado de extradição que celebrarem entre si no
futuro. Caso receba de outro Estado Parte, com o qual não tiver tratado, uma solicitação de extradição, todo
Estado que sujeitar a extradição à existência de um tratado poderá considerar a Convenção como a base
jurídica necessária para a extradição referente ao delito de tortura. Os Estados Partes que não sujeitarem a
extradição à existência de um ratado devem reconhecer esses delitos como casos de extradição entre eles,
respeitando as condições exigidas pelo direito do Estado requerido.

#SELIGA: No caso de o Estado não poder extraditar por algum motivo o torturador, deve, necessariamente,
julgá-lo em face do postulado do aut dedere, aut judicare.

A Convenção determina ainda que não se concederá a extradição nem se procederá à devolução da
pessoa requerida quando houver suspeita fundada de que sua vida corre perigo, de que será submetida à
tortura, tratamento cruel, desumano ou degradante, ou de que será julgada por tribunais de exceção ou ad
hoc no Estado requerente. Isso consagra o princípio do non-refoulement (ou proibição do rechaço), em caso
de tortura.
No art. 15, a Convenção determina que nada do que nela disposto pode ser interpretado como
limitação do direito de asilo, quando for cabível, nem como modificação das obrigações dos Estados Partes em
matéria de extradição.

#ATENÇÃO: Os Estados Partes se comprometem a informar a Comissão Interamericana de Direitos Humanos


sobre as medidas legislativas, judiciais, administrativas e de outra natureza que adotarem em sua
aplicação. A Comissão procurará analisar, em seu relatório anual, a situação prevalecente nos Estados-
membros da OEA, no que diz respeito à prevenção e supressão a tortura, em conformidade com suas
atribuições.

* #OUSESABER: Qual a diferença entre crime de tortura e crimes de maus tratos? O crime de maus tratos está
previsto no artigo 136 do Código Penal. Trata-se de crime de perigo que se consuma com a efetiva exposição
da vítima a perigo, que deve ser demonstrado, ou seja, é crime de perigo concreto. Por sua vez, o crime de
tortura, previsto na Lei 9.455/97, é crime de dano. Outra diferença que pode ser apontada é a finalidade. No
crime de maus tratos, há a finalidade de correção ou de disciplina, enquanto no crime de tortura o sujeito
ativo quer causar sofrimento ou dor para obter algum fim específico. Acrescente-se, ainda, que na tortura
exige-se intenso sofrimento físico ou mental da vítima.

b) CONVENÇÃO INTERAMERICANA SOBRE TRÁFICO INTERNACIONAL DE MENORES (1998):


Objetiva prevenir e reprimir o tráfico internacional de menor. Dentre diversas medidas, destaca-se:
garantia de que a prática seja causa de extradição; competência do local do fato, da residência da vítima ou do
local onde esteja o delinquente.

c) CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR, PUNIR E ERRADICAR A VIOLÊNCIA CONTRA A


MULHER (CONVENÇÃO DO BELÉM DO PARÁ, 1994):
A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher (Convenção
de Belém do Pará) foi concluída pela Assembleia Geral da OEA, em Belém do Pará, no Brasil, em 9 de junho de
1994, como resposta à situação de violência contra mulheres existente na América. O Brasil a assinou na
mesma data e o Congresso Nacional a aprovou por meio do Decreto Legislativo n. 107, de 31 de agosto de
1995.
Formalmente, esta Convenção é composta por 25 artigos, divididos em cinco capítulos: definição e
âmbito de aplicação (arts. 1º e 2º); direitos protegidos (arts. 3º a 6º); deveres dos Estados (arts. 7º a 9º);
mecanismos interamericanos de proteção (arts. 10 a 12); disposições gerais (arts. 13 a 25).
c.1) Definição de violência contra a mulher:
Segundo a Convenção, qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, que cause morte, dano ou
sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no privado

Essa violência contra a mulher abrange a violência física, sexual ou psicológica, quer tenha ocorrido
no âmbito da família ou unidade doméstica ou em qualquer outra relação interpessoal, em que o agressor
conviva ou haja convivido no mesmo domicílio que a mulher e que compreende, entre outros, estupro,
violação, maus-tratos e abuso sexual; quer no âmbito da comunidade e seja perpetrada por qualquer pessoa.

c.2) Direitos protegidos na Convenção:


(i) Direito de toda mulher ser livre de violência, tanto na esfera pública = quanto privada, o que inclui
o direito de ser livre de toda forma de discriminação e o direito de ser valorizada e educada livre de
padrões estereotipados de comportamento e práticas sociais e culturais baseadas em conceitos de
inferioridade ou subordinação.

(ii) Direito ao reconhecimento, gozo, exercício e proteção de todos os direitos humanos e às


liberdades consagradas pelos instrumentos regionais e internacionais sobre direitos humanos, os quais
compreendem: o direito a que se respeite sua vida e sua integridade física, psíquica e moral; o direito à
liberdade e à segurança pessoais; o direito a não ser submetida a torturas; o direito a que se respeite a
dignidade inerente a sua pessoa e que se proteja sua família; o direito à igualdade de proteção perante a
lei e da lei; o direito a um recurso simples e rápido diante dos tribunais competentes, que a ampare
contra atos que violem seus direitos; o direito à liberdade de associação; o direito à liberdade de
professar a religião e as próprias crenças, de acordo com a lei; e o direito de ter igualdade de acesso às
funções públicas de seu país e a participar nos assuntos públicos, incluindo a tomada de decisões.

c.3) Deveres do Estado:


No Capítulo III (arts. 7º a 9º), a Convenção apresenta os deveres dos Estados. Em primeiro lugar,
esclarece-se que os Estados Partes condenam todas as formas de violência contra a mulher e concordam em
adotar, por todos os meios apropriados e sem demora, políticas orientadas a preveni-la, puni-la e erradicá-la.
Nesse sentido, devem abster-se de prática de violência contra a mulher e velar para que as
autoridades, seus funcionários, pessoal e agentes e instituições públicas cumpram essa obrigação e devem
atuar com a devida diligência para prevenir, investigar e punir a violência contra a mulher.

Ademais, devem incluir em sua legislação interna normas penais, civis e administrativas que sejam
necessárias para tais fins, adotando as medidas administrativas apropriadas que venham ao caso.

Devem também adotar medidas jurídicas que exijam do agressor que se abstenha de fustigar,
perseguir, intimidar, ameaçar, machucar ou pôr em perigo a vida da mulher de qualquer forma que atente
contra sua integridade ou prejudique sua propriedade. Ainda, devem tomar medidas apropriadas para
modificar ou abolir leis e regulamentos vigentes, ou para modificar práticas jurídicas ou consuetudinárias que
respaldem a persistência ou a tolerância da violência contra a mulher. Têm ainda a obrigação de estabelecer
procedimentos jurídicos justos e eficazes, que incluam, entre outros, medidas de proteção, para que a mulher
vítima de violência doméstica tenha um julgamento oportuno e o acesso efetivo a tais procedimentos,
bem como a obrigação de estabelecer os mecanismos judiciais e administrativos necessários para assegurar
o acesso efetivo a ressarcimento, reparação do dano ou outros meios de compensação justos e eficazes (art.
7º).

#ATENÇÃO: Esses inúmeros deveres do Estado foram fundamentais para que o Brasil, finalmente, editasse
uma lei específica de combate à violência doméstica, a Lei n. 11.340/2006, também denominada “Lei Maria da
Penha”. Tal lei criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW) e da
Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher.

*#SELIGA: Quais são as principais inovações trazidas pela Lei Maria da Penha no ordenamento jurídico
brasileiro? A Lei, dentre outras providências:
(i) tipifica e define a violência doméstica e familiar contra a mulher;
(ii) estabelece as formas da violência doméstica contra a mulher como física, psicológica, sexual, patrimonial e
moral;
(iii) determina que a violência doméstica contra a mulher independe de sua orientação sexual;
(iv) determina que a mulher somente poderá renunciar à representação perante o juiz; proíbe a pena de multa
isolada ou cestas básicas;
(v) veda a entrega da intimação pela mulher ao agressor, devendo ser feita por policial ou oficial de justiça;
(vi) prevê que a ofendida seja notificada dos atos processuais, em especial quando do ingresso e saída da
prisão do agressor;
(vii) estabelece que a mulher deverá estar acompanhada de advogado (a) ou defensor (a) em todos os atos
processuais;
(viii) Retira dos juizados especiais criminais a competência para julgar os crimes de violência doméstica contra
a mulher;
#DEOLHONAJURISPRUDÊNCIA: Súmula 536-STJ A suspensão condicional do processo e a transação penal não
se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha.
(ix) altera o Código Penal para acrescentar uma agravante quando o agressor comete o crime com violência
doméstica e familiar contra a mulher;
(x) aumenta a pena máxima e diminui a pena mínima do crime de lesão corporal. Traz uma majorante quando
a vítima for portadora de deficiência física;
(xi) Altera o Código de Processo Penal para possibilitar ao juiz a decretação da prisão preventiva quando
houver riscos à integridade física ou psicológica da mulher;
(xii) Altera a Lei de Execuções Penais para permitir ao juiz que determine o comparecimento obrigatório do
agressor a programas de recuperação e reeducação;
(xiii) determina a criação de juizados especiais de violência doméstica e familiar contra a mulher com
competência mista para abranger as questões criminais e cíveis decorrente da violência contra a mulher;
(xiv) prevê um capítulo específico para o atendimento pela autoridade policial; permite a autoridade policial
prender o agressor em flagrante sempre que incorrer em quaisquer das formas de violência doméstica contra
a mulher;
(xv) prevê um capítulo sobre a fase do processo judicial;
(xvi) possibilita ao juiz conceder, no prazo de 48h, medidas protetivas de urgência (suspensão do porte de
armas do agressor, afastamento do agressor do lar, distanciamento da vítima, dentre outras), dependendo da
situação.

*#ATENÇÃO: A Lei nº 13.641/2018 alterou a Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), para
tipificar o crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência.

c.4) Mecanismos de proteção:

MECANISMOS DE  Informes à Comissão Interamericana de Mulheres


 Pedido de opinião consultiva sobre a interpretação da Convenção à Corte
Interamericana de Direitos Humanos.
 Petição de qualquer pessoa, grupo de pessoas, ou entidade não
PROTEÇÃO governamental legalmente reconhecida em um ou mais Estados-membros
da Organização, à Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
 Caso cabível, a Comissão pode processar o Estado infrator perante a Corte
IDH.

c.5) Disposições gerais:


Os arts. 13 e 14 determinam que as disposições da Convenção não poderão ser interpretadas como
restrição ou limitação à legislação interna dos Estados Partes que preveja iguais ou maiores proteções
e garantias aos direitos da mulher e salvaguardas adequadas para prevenir e erradicar a violência
contra a mulher, nem à Convenção Americana sobre Direitos Humanos ou a outras convenções
internacionais sobre a matéria que prevejam iguais ou maiores proteções relacionadas com este tema.

Novamente, o princípio da norma mais favorável ao ser humano é adotado em um tratado


internacional. O art. 23 determina que o Secretário-Geral apresente um informe anual aos Estados-membros
da OEA sobre a situação da Convenção, inclusive quanto a assinaturas, depósitos de instrumentos de
tipificação, adesão ou declarações e reservas.

O art. 24, finalmente, permite que os Estados denunciem a Convenção mediante depósito de
instrumento na Secretaria Geral da OEA, mas ressalva que a Convenção vigorará indefinidamente.

d) CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE


DISCRIMINAÇÃO CONTRA PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA (1996):
A Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as
Pessoas Portadoras de Deficiência foi adotada pela Assembleia Geral da OEA em 7 de junho de 1999, na
Cidade da Guatemala, Guatemala, tendo como objetivo prevenir e eliminar todas as formas de discriminação
contra as pessoas com deficiência e propiciar sua plena integração à sociedade.

O Brasil a assinou um dia depois, em 8 de junho de 1999. O Congresso Nacional a aprovou por meio
do Decreto Legislativo n. 198, de 13 de junho de 2001, e a ratificação se deu em 15 de agosto de 2001. A
Convenção entrou em vigor em 14 de setembro de 2001 e, finalmente, foi promulgada, por meio do Decreto
n. 3.956, de 8 de outubro de 2001.
Sob o aspecto formal, a Convenção é composta por 14 artigos, não divididos em seções ou capítulos
específicos. Em seu preâmbulo, a Convenção já reafirma que as pessoas com deficiência têm os mesmos
direitos humanos e liberdades fundamentais que outras pessoas, os quais emanam da dignidade e igualdade
inerentes a todo ser humano. Possuem, assim, o direito de não serem submetidas à discriminação com base
na deficiência.

d.1) Definição de pessoa com deficiência: Trata-se da pessoa que possui restrição física, mental ou
sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades
essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social.

#SELIGA: Apesar de a Convenção Interamericana utilizar a expressão “portador de deficiência”, anote-se que,
após anos de discussão, a expressão utilizada atualmente é pessoa com deficiência, como se vê na Convenção
da ONU de 2006.

d.2) Definição de discriminação contra pessoa com deficiência: Toda diferenciação, exclusão ou
restrição baseada em deficiência, antecedente de deficiência, consequência de deficiência anterior ou
percepção de deficiência presente ou passada, que tenha o efeito ou propósito de impedir ou anular o
reconhecimento, gozo ou exercício por parte das pessoas portadoras de deficiência de seus direitos
humanos e suas liberdades fundamentais.

Cabe destacar que a discriminação pode ser feita de várias maneiras:

(i) Discriminação direta: Propõe certas normas ou ações tendentes a estigmatizar o diferente ou
simplesmente excluir o indivíduo de certos direitos. Refere-se às regras e códigos instituídos para salvaguardar
espaços de poder, ou seja, a exclusão explícita de um grupo social, em razão de seu sexo, raça, religião, idade.
Tem, como consequência, a manutenção dos membros de um determinado grupo em situação desvantajosa
ou desfavorável.

(ii) Discriminação indireta: Consiste na imposição de normas e regras que em primeira instância
parecem inofensivas, mas que na prática não são, e ainda mais, trazem consequências nefastas e negativas,
afetando os direitos das pessoas. Um exemplo claro desse tipo de discriminação acontece com os
proprietários de casas noturnas que colocam cartazes na porta de seus estabelecimentos com frases abusivas:
“Proibido entrar de tênis”. Outro exemplo seria um anúncio solicitando empregadas com “boa aparência”.
(iii) Autodiscriminação: Consiste em uma espécie de vigilância internalizada para assegurar que
agimos de acordo com os parâmetros delimitados pela manifestação encoberta ou indireta. Constitui-se de
mecanismos internos de repressão que modelam nossos desejos, expectativas, anseios e motivações, de
forma que algumas opções educacionais ou profissionais tornam-se impulsivas e, outras, fortemente
orientadas. Exemplo: foi difícil para as primeiras juízas de futebol e para as primeiras motoristas de ônibus ou
táxi imaginarem-se exercendo essas profissões. Por outro lado, o custo interno de optar por enfermagem ou
magistério é relativamente inferior, mesmo que se conheçam as limitações de remuneração e as condições de
trabalho dessas profissões. Os mecanismos de repressão internos que derivam da autodiscriminação tornam-
se tão naturais que, muitas vezes, interpretam-se como autodeterminação, escolhas pautadas pelas normas
sociais, mesmo as tácitas.

#ATENÇÃO: Não constitui discriminação a diferenciação ou preferência adotada pelo Estado para promover a
integração social ou o desenvolvimento pessoal dessas pessoas, desde que a diferenciação ou preferência não
limite em si mesma o seu direito à igualdade e que as pessoas com deficiência não sejam obrigadas a aceitar
tal diferenciação ou preferência. Ademais, também não constituirá discriminação a previsão, pela legislação
interna, de declaração de interdição, quando for necessária e apropriada para o bem-estar da pessoa com
deficiência.

#SELIGA: O mesmo dispositivo abre margem para a adoção de ações afirmativas em benefício das pessoas
com deficiência. Segundo Daniel Sarmento, ações afirmativas consistem em medidas públicas ou privadas, de
caráter coercitivo ou não, que visam promover a igualdade substancial, através da discriminação positiva de
pessoas integrantes de grupos que estejam em situação desfavorável, e que sejam vítimas de discriminação e
estigma social. Elas podem ter focos muito diversificados, como mulheres, os portadores de deficiência, os
indígenas ou os afrodescendentes, e incidir nos campos mais variados, como educação superior, acesso a
empregos privados ou a cargos públicos, reforço à representação política ou preferências na celebração de
contrato.

#DEOLHONAJURISPRUDÊNCIA: O STF entende que “A reparação ou compensação dos fatores de desigualdade


factual com medidas de superioridade jurídica constitui política de ação afirmativa que se inscreve nos
quadros da sociedade fraterna que se lê desde o preâmbulo da Constituição de 1988."
d.3) Criação de Comissão para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas
Portadoras de Deficiência: É constituída por um representante designado por cada Estado Parte. Os Estados
se comprometeram a, na primeira reunião da Comissão, apresentar um relatório ao Secretário-Geral da OEA.
Essa reunião ocorreu entre 28 de fevereiro e 1º de março de 2008, no Panamá, quando foi aprovado o
Regulamento da Comissão.

Após essa primeira reunião, os Estados Partes da Convenção se comprometeram a apresentar


relatórios a cada quatro anos, que devem incluir as medidas que os Estados-membros tiverem adotado
na aplicação da Convenção, qualquer progresso alcançado na eliminação de todas as formas de discriminação
contra as pessoas com deficiência, bem como toda circunstância ou dificuldade que afete o grau de
cumprimento de obrigação decorrente da Convenção.

Com efeito, a Convenção explicita que a Comissão será o foro encarregado de examinar o progresso
registrado na sua aplicação e de trocar experiências entre os Estados Partes. Os relatórios que a Comissão vai
produzir devem refletir os debates, incluindo informações sobre as medidas que os Estados Partes tenham
adotado para aplicar a Convenção, o progresso alcançado na eliminação de todas as formas de discriminação
contra as pessoas com deficiência, as circunstâncias ou dificuldades que tenham tido na implementação
da Convenção, bem como as conclusões, observações e sugestões gerais da Comissão para o seu
cumprimento progressivo.

d.4) Mecanismos de monitoramento:

 Relatórios periódicos ao Secretário-Geral da OEA.

MECANISMOS DE  Comissão para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra

MONITORAMENTO Pessoas Portadora de Deficiência é encarregada de examinar o progresso


registrado na aplicação da Convenção e de trocar experiência entre os
Estados, produzindo relatórios.

e) PROTOCOLO À CONVENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS HUMANOS REFERENTE À ABOLIÇÃO


DA PENA DE MORTE:
Os Estados Partes não podem aplicar em seu território a pena de morte a nenhuma pessoa
submetida a sua jurisdição. Não se admite reserva, salvo para o direito de aplicar a pena de morte em tempo
de guerra, de acordo com o Direito Internacional, por delitos sumamente graves de caráter militar, conforme
foi feito pelo Brasil.
3. Mecanismo de proteção do Sistema Interamericano

O Pacto de São José possui dois principais órgãos (art. 33): a Comissão e a Corte Interamericanas.
Além disso, no âmbito da OEA, a própria Assembleia Geral e a Secretaria –Geral podem intervir em caso de
violações graves.
#SELIGA: A Convenção Americana de Direitos Humanos consagrou um procedimento bifásico de promoção
dos direitos protegidos: há uma etapa indispensável perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos
(Comissão IDH) e uma eventual segunda etapa perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte
IDH).

#TABELALOVERS:
COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS
HUMANOS
É órgão da OEA. É órgão autônomo.
É sediado em Washington, capital dos EUA. É sediada em São José, Costa Rica.
Não é órgão jurisdicional. É ÓRGÃO JURISDICIONAL.
Composta por 7 (SETE) MEMBROS, pessoas de alta Composta por 7 (SETE) JUÍZES, nacionais dos
autoridade moral e de conhecimento na área, com Estados-membros da OEA eleitos a título pessoal
MANDATO DE 4 ANOS c/ 1 reeleição. dentre juristas da mais alta autoridade moral. São
#OBS.: Além dos 7 juízes, determinado caso pode ter eleitos por voto SECRETO da MAIORIA ABSOLUTA
um “juiz ad hoc” na jurisdição contenciosa, caso o dos Estados-partes, para MANDATO DE 6 (SEIS)
Estado Réu não possua um juiz de sua nacionalidade ANOS c/ 1 reeleição.
em exercício na Corte. A Corte IDH restringiu em
2009 – por meio de Opinião Consultiva n. 20 – a
interpretação do art. 55 da Convenção, que trata do
juiz ad hoc, eliminando tal figura nas demandas
iniciadas pela Comissão a pedido de vítimas e
mantendo-o somente para as demandas
originadas de comunicações interestatais.
#OBS.: Também em 2009, na mesma Opinião
Consultiva n. 20, a Corte restringiu a possibilidade do
juiz que porventura possuir a mesma nacionalidade
do Estado Réu atuar no caso. Somente o fará nas
demandas interestatais. Nas demandas iniciadas
pela Comissão a pedido das vítimas, o juiz da
nacionalidade do Estado Réu deve se abster de
participar do julgamento, tal qual ocorre com o
Comissário da nacionalidade do Estado em exame,
que não pode participar das deliberações da
Comissão.
Não pode haver mais de um juiz nacional do mesmo
ente estatal.
#ATENÇÃO! OS JUÍZES PODEM CONHECER FEITOS
RELATIVOS A SEUS ESTADOS DE ORIGEM (SÃO
Não Pode haver mais de um nacional do mesmo INDEPENDENTES), caso em que o outro Estado
ente estatal. poderá designar um JUIZ AD HOC para integrar a
Corte e participar do exame desse caso específico.
E mais: se nenhum dos juízes for de nacionalidade
do Estado envolvido, cada Estado poderá também
escolher um juiz ad hoc.
COMPETÊNCIAS: formular recomendações; preparar
estudos; solicitar informações aos Estados; atender COMPETÊNCIA: processar e julgar qualquer caso
às consultas dos Estados; prestar assessoramento; relativo à interpretação e à aplicação das disposições
apresentar relatório anual à Assembleia Geral da do Pacto de São José; apreciar consultas; emitir
OEA. pareceres; realizar controle de convencionalidade.
Os Estados deverão submeter anualmente à Sua competência é CONTENCIOSA E CONSULTIVA
comissão cópias os relatórios que fornecerem a (arts. 61-64).
outros órgãos da OEA.
A comissão pode receber PETIÇÕES INDIVIDUAIS
relativas a violações do ESTADO.
-
#OBS.: Há também a possibilidade de recebimento
de petições INTERESTADUAIS.
Legitimidade para seu acionamento: Somente os ESTADOS-PARTES e a COMISSÃO podem
 Estados; submeter casos à Corte.
 Órgãos da OEA; Além disso, SOMENTE ESTADOS PODEM SER RÉUS.
 Qualquer pessoa;
 ou grupo;
Assim, o indivíduo não tem legitimidade ativa nem
 ou entidade não governamental legalmente
passiva na Corte.
reconhecida em um ou mais Estados-
membros da OEA.
ATENÇÃO: A CLÁUSULA QUE PREVÊ O DIREITO DE
ATENÇÃO: a Corte somente pode atuar APÓS A
PETIÇÃO INDIVIDUAL É OBRIGATÓRIA, AO PASSO
APRECIAÇÃO DA SITUAÇÃO PERANTE A PRÓPRIA
QUE A CLÁUSULA DE COMUNICAÇÕES
COMISSÃO!
É FACULTATIVA.
REQUISITOS: REQUISITOS:
 Esgotamento dos recursos internos, salvo  Aceitação da competência;
ineficácia ou inércia;  Prévia avaliação pela Comissão;
 Petição apresentada dentro do prazo de 6  Quórum para deliberação: 5 juízes.
(seis) meses após a notificação da decisão #OBS.: o Brasil reconheceu a competência
interna definitiva; obrigatória da corte por prazo indeterminado e fatos
 Matéria não pendente em outro órgão ocorridos após 1998. Esse reconhecimento foi feito
internacional. SOB RESERVA DE RECIPROCIDADE.
ATENÇÃO: NÃO É NECESSÁRIO O ENDOSSO DO A sentença é obrigatória e INAPELÁVEL. Todavia, no
ESTADO OU A COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE caso de divergência, cabe pedido de esclarecimento,
VÍTIMA. DENTRO DO PRAZO DE 90 DIAS.
O exame do caso gera um relatório (solução ALÉM DISSO, É DISPENSADA A HOMOLOGAÇÃO DA
amistosa), a partir do qual são elaboradas SENTENÇA NA CORTE PARA FINS DE APLICAÇÃO NO
recomendações, ou encaminhamento do caso à BRASIL.
Corte (a própria comissão pode remeter à corte). #OBS.: no “Caso Júlia Gomes Lund e outros”, a Corte
Se nenhuma das alternativas do relatório vier a decidiu que “As disposições da Lei de Anistia
ocorrer em TRÊS MESES, a Comissão novamente fará brasileira que impedem a investigação e sanção de
as recomendações e fixará novo prazo. Após esse graves violações de direitos humanos são
prazo, a comissão decidirá, pelo voto da MAIORIA incompatíveis com a Convenção Americana,
ABSOLUTA, se o Estado tomou ou não as medidas. carecem de efeitos jurídicos e não podem consistir
Atenção: a Comissão poderá remeter o caso à Corte em obstáculo às investigações dos fatos e
INDEPENDENTEMENTE DE QUALQUER AÇÃO DOS responsáveis [...]”. Consequentemente, foi criada a
ESTADOS OU DOS EVENTUAIS INTERESSADOS. Comissão Nacional da Verdade.
#OBS.: o Brasil formulou RESERVAS ao Pacto de São Por outro lado, o STF entendeu que a Lei de Anistia é
José, no que concerne ao direito automático de a
comissão fazer visitas e inspeções in loco. constitucional.

#JÁCAIUEMPROVA:
#DPU. Compõem o Sistema Interamericano de Direitos Humanos a Assembleia Geral da OEA, a Corte e a
Comissão Interamericana. ERRADO.
#DPU. Qualquer pessoa pode apresentar petição à comissão, desde que o pleito obtenha endosso do seu
Estado. ERRADO.
#IRBr. As decisões da Corte são apeláveis. ERRADO.

Após os aspectos gerais de cada um dos órgãos, vejamos as especificidades e os aprofundamentos


necessários:

3.1 Comissão Interamericana de Direitos Humanos

A Comissão é um órgão principal da OEA, porém autônomo, pois seus membros atuam com
independência e imparcialidade, não representando o Estado de origem.

Em relação à Convenção Americana de Direitos Humanos, a Comissão pode receber petições


individuais e interestatais contendo alegações de violações de direitos humanos. O procedimento individual é
considerado de adesão obrigatória e o interestatal é facultativo. A Convenção Americana de Direitos Humanos
dispõe que qualquer pessoa – não só a vítima – pode peticionar à Comissão, alegando violação de direitos
humanos de terceiros. Caso a o caso seja arquivado (demanda inadmissível, ou quanto ao mérito, infundada)
não há recurso disponível à vítima.

Importante que nessa análise, a Comissão analisa tanto a admissibilidade da demanda (há requisitos
de admissibilidade, entre eles, o esgotamento prévio dos recursos internos) quanto seu mérito.

Outra hipótese de ser o caso apreciado pela Comissão ocorre se algum Estado, no exercício de uma
verdadeira actio popularis, ingressar com a ação contra o Estado violador. Mesmo nesse caso, o
procedimento perante a Comissão é obrigatório.

*#ATENÇÃO8: Em esfera regional interamericana, apesar de haver ratificado a Convenção Americana de


Direitos Humanos, o Estado brasileiro não autorizou a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) a
8
Mais informações em: http://www.dhnet.org.br/dados/cartilhas/dh/onu/sddh/.
examinar comunicações interestatais, a fim de que um Estado-parte possa alegar que outro tenha cometido
violação a direito assegurado pela Convenção. Dessa forma, o Estado brasileiro somente poderá sofrer
denúncias de violações por meio das petições individuais, por força do que dispõe o art. 44. da Convenção
Americana, ao qual fizemos referência no capítulo anterior.

3.1.1 Comissão e o trâmite das petições individuais

A Comissão é provocada por meio de uma petição escrita, que pode ser de (i) autoria da própria
vítima, (ii) de terceiros, incluindo as organizações não governamentais (demandas individuais), ou ainda (iii)
oriunda de outro Estado (demandas interestatais, de impacto reduzido – até hoje, apenas 2 casos). Em sua
petição internacional, o representante deve apontar os fatos que comprovem a violação de direitos humanos
denunciada, assinalando, se possível, o nome da vítima e de qualquer autoridade que tenha tido
conhecimento da situação.

#SELIGA: Condições de admissibilidade.


(i) O esgotamento dos recursos locais;
(ii) Ausência do decurso do prazo de seis meses, contados do esgotamento dos recursos internos, para a
apresentação da petição;
(iii) Ausência de litispendência internacional, o que impede o uso simultâneo de dois mecanismos
internacionais de proteção de direitos humanos; e
(iv) Ausência de coisa julgada internacional, o que impede o uso sucessivo de dois mecanismos internacionais
de proteção de direitos humanos.

O esgotamento dos recursos internos exige que o peticionante prove que tenha esgotado os
mecanismos internos de reparação, quer administrativos, quer judiciais, antes que sua controvérsia possa ser
apreciada perante o Direito Internacional. Fica respeitada a soberania estatal ao se enfatizar o caráter
subsidiário da jurisdição internacional, que só é acionada após o esgotamento dos recursos internos.

#ATENÇÃO: Estados têm o dever de prover recursos internos aptos a reparar os danos porventura causados
aos indivíduos. No caso de inadequação destes recursos, o Estado responde duplamente: pela violação inicial e
também por não prover o indivíduo de recursos internos aptos a reparar o dano causado.

#SELIGA: Dispensa de prévio esgotamento dos recursos internos.


(i) não existir o devido processo legal para a proteção do direito violado;
(ii) não se houver permitido à vítima o acesso aos recursos da jurisdição interna, ou houver sido ele impedido
de esgotá-los;
(iii) houver demora injustificada na decisão sobre os mencionados recursos (artigo 46.2);
(iv) o recurso disponível for inidôneo (por exemplo, o recurso não é apto a reparar o dano);
(v) o recurso for inútil (por exemplo, já há decisão da Suprema Corte local em sentido diverso) ou
(vi) faltam defensores ou há barreiras de acesso à justiça.
(vi) atualmente, a Corte IDH consagrou o entendimento que a exceção de admissibilidade por ausência de
esgotamento dos recursos internos tem que ser invocada pelo Estado já no procedimento perante à Comissão
Interamericana de Direitos Humanos. Assim, se o Estado nada alega durante o procedimento perante a
Comissão, subentende-se que houve desistência tácita dessa objeção. Após, não pode o Estado alegar a falta
de esgotamento, pois seria violação do princípio do estoppel, ou seja, da proibição de se comportar de modo
contrário a sua conduta anterior (non concedit venire contra factum proprium).

3.1.2 Conciliação perante a Comissão

Passada a fase da admissibilidade da petição perante a Comissão Interamericana de Direitos


Humanos, ingressa-se na fase conciliatória. Caso tenha sido obtida a solução amigável entre a vítima e o
Estado infrator, a Comissão elabora seu relatório, contendo os fatos e o acordo alcançado, sendo o mesmo
remetido ao peticionário, aos Estados e também ao Secretário-Geral da OEA.

3.1.3 Medidas cautelares perante a Comissão

O novo regulamento da Comissão, reformado em 2013, prevê a oitiva do Estado antes da edição de
medidas cautelares pela Comissão, para prevenir danos irreparáveis ou perecimento de direito. Contudo, em
casos de gravidade e urgência, a Comissão ainda pode adotar medidas cautelares sem ouvir o Estado para
evitar dano irreparável referente a um caso.

#DEOLHONAJURISPRUDÊNCIA: Em março de 2011, a Comissão adotou medida cautelar requerendo a


suspensão da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, a principal obra de fornecimento de energia do
Brasil nos últimos anos, por ofensa a diversos direitos dos povos indígenas. Após veemente recusa do Estado
brasileiro em cumprir tal deliberação, a Comissão modificou sua posição e decidiu que a obra poderia
continuar desde que fossem tomadas cautelas na preservação dos direitos até deliberação final da Comissão.
O episódio mostrou que a ausência de previsão expressa das medidas cautelares da Comissão na
Convenção Americana de Direitos Humanos faz com que os Estados Partes da Convenção não aceitem sua
força vinculante. Por outro lado, a Comissão pode requerer medidas provisórias à Corte IDH, que possuem –
de modo expresso – previsão na Convenção.

3.1.4 Primeiro Informe e possível ação perante a Corte IDH

No caso de constatação de violação de direitos humanos, a Comissão elabora o chamado Primeiro


Informe ou Primeiro Relatório, encaminhando-o ao Estado infrator. Cabe ao Estado cumprir as recomendações
desse primeiro relatório, que é confidencial.

Se em até três meses (possibilidade de prorrogação) após a remessa ao Estado do primeiro relatório
da Comissão, o caso não tiver sido solucionado (reparação dos danos pelo Estado), pode ser submetido à
Corte, se (i) o Estado infrator houver reconhecido sua jurisdição obrigatória e (ii) se a Comissão entender tal
ação conveniente para a proteção dos direitos humanos no caso concreto.

Se o Estado não tiver reconhecido ainda a jurisdição da Corte (ou os fatos e repercussões dos fatos
forem anteriores ao reconhecimento – vários Estados só aceitam a jurisdição da Corte para os casos futuros) e
não tiver cumprido o Primeiro Informe, deve a Comissão Interamericana de Direitos Humanos elaborar um
segundo informe.

3.1.5 Segundo informe

Esse Segundo Informe é público (diferentemente do Primeiro Informe, que é confidencial, restrito às
partes) e só é elaborado na ausência de ação judicial perante a Corte. Este informe também contempla
recomendações ao Estado violador, com prazo para que as medidas requeridas sejam efetuadas. Após o
decurso desse prazo, a Comissão agrega a informação sobre o cumprimento das medidas requeridas,
publicando o Segundo Informe. No caso de descumprimento do Segundo Informe, a Comissão Interamericana
de Direitos Humanos encaminha seu relatório anual à Assembleia Geral da OEA, fazendo constar as
deliberações não cumpridas pelos Estados para que a OEA adote medidas para convencer o Estado a
restaurar os direitos protegidos.
#SELIGA:
Primeiro Informe Segundo Informe
Confidencial entre as partes Público

3.1.6 Os relatórios anuais e a relatoria para a liberdade de expressão

*Segundo André de Carvalho Ramos, a Organização dos Estados Americanos criou, ao longo dos
anos, Relatorias sobre temas de direitos humanos, vinculadas à Comissão Interamericana de Direitos
Humanos. A mais importante dessas Relatorias é a Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão, criada em
1997 e com caráter permanente, independência funcional e estrutura própria (que inclusive conta com
financiamento externo).

A criação dessa Relatoria permanente busca incentivar a plena liberdade de expressão e informação
nas Américas, direito essencial para o enraizamento da democracia em Estados de passado ditatorial recente
(a maior parte dos Estados americanos vivenciaram períodos longos de ditaduras no século XX).

Cabe à Relatoria:
(i) elaborar relatório anual sobre a situação da liberdade de expressão nas Américas e apresentá-lo à
Comissão para apreciação e futura inclusão no Relatório Anual da Comissão IDH à Assembleia Geral da OEA;
(ii) preparar relatórios temáticos;
(iii) obter informações e realizar atividades de promoção e capacitação sobre a temática;
(iv) acionar imediatamente a Comissão a respeito de situações urgentes para que estude a adoção de
medidas cautelares ou solicite a adoção à Corte Interamericana de Direitos Humanos; e
(v) remeter informação à Comissão para instruir casos individuais relacionados com a liberdade de
expressão.

Apesar de não possuírem força vinculante e serem considerados meras recomendações, os relatórios
temáticos são amplamente divulgados e podem servir para que a Comissão IDH venha a processar os Estados
infratores perante a Corte IDH.

3.2 Corte Interamericana de Direitos Humanos


O segundo órgão da Convenção Americana de Direitos Humanos, a Corte Interamericana de Direitos
Humanos (Corte IDH), é uma instituição judicial autônoma, não sendo órgão da OEA, mas sim da Convenção
Americana de Direitos Humanos.

Possui jurisdição contenciosa e consultiva, podendo emitir pareceres ou opiniões consultivas, não
vinculantes.

*#JÁCAIUEMPROVA: A banca FCC, na prova da DPE/BA de 2016, considerou correta a seguinte alternativa: “A
competência consultiva do sistema regional interamericano de proteção aos direitos humanos é uma das
competências da Corte Interamericana e refere-se à faculdade de qualquer membro da OEA solicitar o parecer
da Corte relativamente à interpretação da Convenção ou de qualquer outro tratado relativo à proteção
dos direitos humanos nos Estados Americanos”.

*#ATENÇÃO: A não vinculação é a regra geral. No entanto, cabe salientar que há posicionamento doutrinário,
em destaque o da Flávia Piovesan, defendendo que os pareceres consultivos teriam caráter vinculante, em
relação às partes que o aceitem a jurisdição da Corte.

#JÁCAIUEMPROVA: Na prova da DPE-BA, a banca FCC considerou ERRADA a seguinte alternativa: A


competência consultiva do sistema regional interamericano de proteção aos direitos humanos: é uma
consulta, e, portanto, o resultado de tal comportamento não vincula os estados-membros.
#ATENÇÃO: Não é obrigatório o reconhecimento de sua jurisdição contenciosa: o Estado pode ratificar a
Convenção Americana e não reconhecer a jurisdição da Corte IDH, que é cláusula facultativa da Convenção.
Esse reconhecimento será feito por declaração específica (art. 62 da Convenção).
#CURIOSIDADE: A jurisdição da Corte para julgar pretensas violações em face do Pacto de São José foi
admitida, até o momento, por 21 Estados (inclusive o Brasil em 1998), entre os 23 contratantes do Pacto
(Venezuela retirou-se da Convenção em 2012), exercendo a Corte IDH jurisdição sobre cerca de 550 milhões
de pessoas.

3.2.1 Legitimidade ativa e passiva

ATIVA: Somente Estados que tenham reconhecido a jurisdição da Corte e a Comissão podem
processar Estados perante a Corte Interamericana. Assim, os indivíduos dependem da Comissão ou de outro
Estado (a denominada “actio popularis”) para que seus reclamos cheguem à Corte IDH.
PASSIVA: Já a legitimidade passiva é sempre do Estado: a Corte IDH não é um Tribunal que julga
pessoas. A Corte julga, assim, uma ação de responsabilidade internacional do Estado por violação de direitos
humanos.

*#OUSESABER: O que se entende por efeito bumerangue no âmbito da violação de direitos humanos?
O artigo 61 da Convenção Americana de Direitos Humanos dispõe que somente os Estados Partes e a
Comissão Interamericana de direitos humanos têm legitimidade de submeter um caso à decisão da corte. No
sistema interamericano de direitos humanos, não há o direito de petição individual da vítima à Corte IDH, mas
somente à Comissão (art. 44, CADH). Esta, por sua vez, tem legitimidade para, após o procedimento de
apuração das violações de direitos humanos, submeter um caso à Corte. Assim, as petições das vítimas
precisam passa primeiro pela Comissão. Por outro lado, os Estados Partes também poderiam acionar a Corte,
entretanto, essa previsão carece de efetividade por conta do receio do efeito bumerangue que uma denúncia
poderia causar, desestabilizando as relações diplomáticas entre os Estados. Conforme descreve André de
Carvalho Ramos “Todos os casos até o momento (2015) foram propostos pela Comissão. Os Estados temem,
obviamente, o efeito bumerangue e abalos em suas relações diplomáticas (e interesses econômicos) caso
processem um outro Estado por violação de direitos humanos” (Processo Internacional de Direitos
Humanos. 5ª Ed. Saraiva. 2016, p. 248).

3.2.2 Procedimento na Corte

PRIMEIRO PASSO:

Petição inicial e defensor público interamericano (#DEFENSORIA): A ação é iniciada pelo envio do
Primeiro Informe da Comissão à Corte. As vítimas ou seus representantes são intimados a apresentar a petição
inicial do processo internacional no prazo de dois meses. Após, todas as etapas processuais são focadas naS
vítimas e no Estado Réu e, secundariamente, na Comissão como fiscal da lei (custos legis).

Há ainda o “Defensor Interamericano” que deve representar judicialmente às vítimas sem recursos
(até 2009, a representação era feita pela própria Comissão). A OEA fez convênio com a Associação
Interamericana de Defensorias Públicas, que possui uma lista de defensores públicos nacionais especializados
no sistema interamericano (que conta, inclusive, com defensores públicos brasileiros). Dessa lista, há a
nomeação de um Defensor Público Interamericano às vítimas ou representantes que não possuam ainda
representação jurídica, para atuar nos processos perante a Corte IDH.
SEGUNDO PASSO:

Contestação, exceções e provas: O Estado Réu é notificado para oferecer sua contestação no prazo
idêntico de dois meses. O Estado demandado pode não impugnar os fatos e as pretensões, acatando sua
responsabilidade internacional. Nesse caso, a Corte estará apta a sentenciar. Caso queira contestar, deve já
indicar as provas (inclusive as periciais), bem como os fundamentos de direito, as observações às reparações e
às custas solicitadas, bem como as conclusões pertinentes.

Na própria contestação, o Estado deve, caso queira, apresentar suas exceções preliminares. São
exceções preliminares toda a matéria que impeça que a Corte se pronuncie sobre o mérito da causa, como,
por exemplo, ausência de esgotamento prévio dos recursos internos.

Ao opor exceções preliminares, deverão ser expostos os fatos, os fundamentos de direito, as


conclusões e os documentos que as embasem, bem como o oferecimento de provas. A apresentação de
exceções preliminares não suspenderá o procedimento em relação ao mérito, nem aos prazos e aos termos
respectivos. A Comissão, as supostas vítimas ou seus representantes poderão apresentar suas observações às
exceções preliminares no prazo de 30 dias, contado a partir do seu recebimento.

Quando considerar indispensável, a Corte poderá convocar uma audiência especial para as exceções
preliminares, depois da qual sobre estas decidirá.

Ao fim desse contraditório, a Corte decidirá sobre as exceções preliminares, podendo arquivar o caso
ou ordenar o seu prosseguimento. Porém, há vários casos nos quais a Corte prefere adotar uma única
sentença, contendo as exceções preliminares, o mérito e, inclusive, as determinações de reparações e as
custas. Assim, as exceções preliminares ficam no feito, que segue normalmente com a produção probatória,
para serem decididas ao final em conjunto com o mérito.

Quanto às provas, são admitidos todos os modos de produção previstos também no direito
brasileiro, como as provas testemunhais, periciais e documentais. As provas produzidas pela Comissão em
seu procedimento próprio só serão incorporadas ao processo perante a Corte IDH se foram produzidas em
procedimento que foi fruto do contraditório. A fase probatória encerra-se com a apresentação de alegações
finais escritas pelas vítimas, Estado demandado e também a Comissão.
#SELIGA: Possibilidade de amicus curae, que consiste em um ente que não é parte na disputa e que oferece a
determinada Corte Internacional uma perspectiva própria, argumentos ou determinado saber
especializado, que poderão ser úteis na tomada de decisão.
A petição escrita do amicus curiae na jurisdição contenciosa poderá ser apresentada a qualquer momento do
processo até a data limite de 15 dias posteriores à celebração da audiência de coleta de testemunhos. Nos
casos em que não se realize audiência, deverá ser remetido dentro dos 15 dias posteriores à resolução
correspondente na qual se outorga prazo para o envio de alegações finais. Após consulta à Presidência, o
escrito de amicus curiae, junto com seus anexos, será posto imediatamente em conhecimento das partes para
sua informação.

*#OUSESABER #DEFENSORIA: É possível amicus curae no sistema Interamericano de Direitos Humanos? Não
somente é possível, como a DPU, em parceria com entidades da sociedade civil, acaba de protocolar junto à
Corte Interamericana petição de amici curiae. O documento tem como objetivo expor as dificuldades de
acesso das pessoas trans aos direitos humanos no Brasil, em especial, no que diz respeito à retificação do
nome e do sexo no registro civil. O memorial foi elaborado em resposta a convocatória da Corte IDH para
colher manifestações sobre o tema, aberta após uma solicitação da Costa Rica ao tribunal. “No documento
enviado à Corte Interamericana de Direitos Humanos, a DPU defendeu que se adote 1o paradigma da
desbiologização da identidade1, e ressaltou que o memorial ‘não se perfaz como um burocrático parecer
técnico, mas, sobretudo busca incorporar as reivindicações e representações que espelham um histórico de
lutas pelo reconhecimento de direitos de vários segmentos LGBTI’”.
*#DICADELEITURA: Para maiores detalhes, ver:
http://www.dpu.def.br/noticias-defensoria-publica-da-uniao/233-slideshow/35633-dpu-protocola-memorial-
de-amicus-curiae-a-corte-idh-em-favor-de-pessoas-trans. Em tal link é possível ver até mesmo a petição sobre
a matéria.

TERCEIRO PASSO:

A Corte, nos casos sob sua apreciação, poderá tomar as medidas provisórias que considerar
pertinentes para, em casos de extrema gravidade e urgência, evitar danos irreparáveis às pessoas (leia-se:
medidas cautelares). A Corte, nos casos sob sua análise, pode agir ex officio ou ainda por provocação das
vítimas ou representantes.
Tratando-se de casos ainda não submetidos à sua consideração, a Corte só poderá atuar por
solicitação da Comissão. O Estado deve cumprir as medidas provisórias e informar periodicamente a Corte IDH.
A Corte incluirá em seu relatório anual à Assembleia Geral uma relação das medidas provisórias que tenha
ordenado durante o período do relatório e quando tais medidas não tenham sido devidamente executadas.

QUARTO PASSO:

Desistência, reconhecimento e solução amistosa: O processo na Corte pode ter três destinos:
a) Solução amistosa, que consiste no acordo entre as vítimas e o Estado Réu, fiscalizado pela Corte,
que pode – ou não – homologá-lo;
b) Desistência por parte das vítimas, mas a Corte, ouvida a opinião de todos os intervenientes no
processo, decidirá sobre sua procedência e seus efeitos jurídicos;
c) Reconhecimento do pedido (total ou parcial), pelo qual o Estado Réu acata as pretensões das
vítimas, cabendo à Corte decidir sobre os efeitos do reconhecimento.

Nas três situações, não há automatismo na eventual extinção do processo. A natureza das obrigações
em jogo exige que a Corte zele pela indisponibilidade dos direitos humanos, mesmo na existência de um
acordo. Por isso, mesmo em presença desse tipo especial de vontade das partes (desistindo, reconhecendo ou
mesmo entrando em acordo), a Corte IDH poderá decidir pelo prosseguimento do exame do caso.

QUINTO PASSO:

Sentença: A Corte IDH pode decidir pela procedência ou improcedência, parcial ou total, da ação
de responsabilização internacional do Estado por violação de direitos humanos, abrangendo obrigações
de dar, fazer e não fazer.

Há o dever do Estado de cumprir integralmente a sentença da Corte, conforme dispõe


expressamente o art. 68.1 da seguinte maneira: “Os Estados Partes na Convenção comprometem-se a cumprir
a decisão da Corte em todo caso em que forem partes”. É tarefa do Estado escolher o meio de execução, que
em geral depende do tipo de órgão imputado (por exemplo, se judicial ou não) e de seu status normativo.

Importante ressaltar também que essa aparente liberdade dos Estados em definir os meios internos
de execução de sentença internacional foi reduzida pela Convenção Americana de Direitos Humanos, no art.
68.2, o qual dispõe que, no tocante a parte da sentença relativa à indenização compensatória, esta seria
executada de acordo com o processo interno de execução de sentença contra o Estado.

No caso de não cumprimento sponte própria das decisões da Corte Interamericana de Direitos
Humanos, o art. 65 da Convenção Americana de Direitos Humanos possibilita à Corte Interamericana de
Direitos Humanos a inclusão dos casos em que o Estado não tenha dado cumprimento a suas sentenças no seu
relatório anual à Assembleia Geral da OEA. Além disso, a Corte IDH exige que o Estado condenado apresente
relatórios periódicos de cumprimento da sentença. Quando considere pertinente, a Corte poderá convocar o
Estado e os representantes das vítimas a uma audiência para supervisar o cumprimento de suas decisões,
ouvindo-se a Comissão.

SEXTO PASSO:

A sentença da Corte IDH é definitiva e inapelável. Em caso de divergência sobre o sentido ou alcance
da sentença, cabe à parte (vítima ou Estado) ou ainda à Comissão interpor recurso ou pedido de interpretação
(semelhante aos nossos embargos de declaração) cujo prazo para apresentação é de 90 dias a partir da data
da notificação da sentença.

Além disso, a Corte poderá, por iniciativa própria ou a pedido de uma das partes, apresentado no
mês seguinte à notificação, retificar erros notórios, de edição ou de cálculo.

4. Principais casos envolvendo o Brasil9 na Comissão e na Corte Interamericana de Direitos Humanos 10

4.1 Maria da Penha Maia Fernandes vs. BRASIL

CASO: Mesmo após 15 anos de trâmite criminal, a Justiça do Ceará/CE não conseguiu a condenação
definitiva de seu marido-agressor (paraplégica e eletrocutada).

Comissão [2001]: Foram emitidas várias recomendações (que inclusive resultaram na edição da Lei n.
11.340/06):
a) Completar rápida e efetivamente o processo penal;
b) Proceder a uma investigação séria, imparcial e exaustiva;
9
As demais decisões da Corte IDH estão em um arquivo extra.
10
Não se deve deixar de lado os precedentes das Cortes Internacionais. Conforme será visto nos julgados comentados,
este assunto está despencando em prova. Vamos fazer a diferença no concurso e acertar essas questões.
c) Reparação simbólica e material à vítima;
d) Capacitação e sensibilização dos funcionários judiciais/policiais; simplificar os procedimentos
penais; formas de solução de conflitos familiares alternativas às judiciais; multiplicar o número de delegacias
policiais especiais; apoio ao MP; e planos pedagógicos em unidades curriculares.

#ATENÇÃO:
 Embora as agressões tenham sido praticadas em momento anterior (sob vigência apenas da
Declaração Americana), a causa foi examinada sob o marco da Convenção Americana e da Convenção de
Belém do Pará, tendo em vista que a denegação de justiça foi contínua.
 Primeira vez que a Comissão aplicou a Convenção de Belém do Pará11.
 Afastou-se a denominada "cláusula federal".

#JÁCAIUEMPROVA #DPE-SP/2012: Em relação ao caso da Senhora Maria da Penha Maia Fernandes, que
transcorreu perante o Sistema Interamericano, a “Comissão Interamericana de Direitos Humanos reconheceu
que o Estado brasileiro descumpriu o dever de garantir às pessoas sujeitas à sua jurisdição o exercício livre e
pleno de seus direitos humanos e recomendou o Brasil simplificasse os procedimentos judiciais penais”.

4.2 José Pereira vs. BRASIL

CASO: José Pereira ficou gravemente ferido ao tentar escapar de uma Fazenda onde era submetido a
trabalho escravo.

Comissão [2003]:
- Alegava-se violação a diversos direitos, dentre eles direito ao trabalho e a uma justa remuneração,
direto contra a detenção arbitrária, e contra a escravidão.
- A Comissão homologou um "Acordo de Solução Amistosa" entre as partes, erigindo obrigações
como (a) criação da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (CONATRE), fortalecimento do
MPT, e - principalmente - a obrigação de o Brasil estabelecer a competência da Justiça Federal para
julgamento de crime de redução à condição análoga à de escravo.

#SELIGA:

11
Já a Corte, aplicou pela primeira vez a Convenção de Belém do Pará no caso Presídio Miguel Castro Vs. Peru.
- Primeira vez em que houve solução amistosa após o relatório de mérito do caso ("Meninos Emasculados"
ocorreu em momento anterior, após a admissibilidade, mas antes do relatório de mérito).
- Atualmente, o STF efetivamente reconhece como de competência federal o crime de redução à condição
análoga de escravo (art. 149, CP), por se enquadrar como crime contra a organização do trabalho.

#ATENÇÃO: EC 81/2014 alterou o art. 243, da CF, para dispor que tanto a cultura ilegal de plantas
psicotrópicas quanto a exploração de trabalho escravo gera a expropriação da propriedade rural/urbana, que
será destinada à reforma agrária e a programas de habitação popular.

#DEOLHONAJURISPRUDÊNCIA: STF, na ADI 5209, concedeu liminar suspendendo uma Portaria Interministerial
que estabelecia regras sobre a "Lista Suja do Trabalho Escravo" (lista de empresas que submetem seus
trabalhadores a formas degradantes/escrava de trabalho), por ausência de lei que confira esse poder ao
Ministério do Trabalho e Emprego. *Em 23 de dezembro de 2014 a Ministra Cármen Lúcia suspendeu a liminar
dos efeitos da Portaria 2/2011 e da Portaria 540/2004, sem prejuízo da continuidade das fiscalizações
efetuadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego.

Adverte Muzzoli que “atualmente, o que se presencia em muitos países do Continente Americano é
uma nova e mais requintada forma de escravidão e servidão. Tal pode ser chamado de neoescravismo,
enquanto nova forma de comercialização de corpos humanos, caracterizando-se fundamentalmente pela falta
de opção que tem grande parcela da população de encontrar trabalho digno fora de um sistema que os
aprisiona com promessas de melhoria da qualidade de vida e bons salários”.

Além da obrigação de seguir o comendo previsto no art. 6º da CADH (proibição da escravidão e da


servidão), importante lembrar que o Brasil também é parte da Convenção 105 da OIT, sobre a abolição do
trabalho forçado.

#JÁCAIUEMPROVA #POLÍCIA CIVIL/2014: A Banca considerou correta a seguinte alternativa: “José Pereira foi
um marco para a defesa dos direitos humanos no Brasil, pois, pela primeira vez, o Estado assumiu, perante o
sistema interamericano de proteção de direitos humanos, a responsabilidade por atos praticados por
particulares”.

4.3 Jailton Neri da Fonseca vs. BRASIL


CASO: Mencionado adolescente foi preso e executado durante invasão da PM a uma favela. Os PMs
acabaram sendo absolvidos pela Justiça Militar (in dubio pro reo).

Comissão [2004]:
- Comissão considerou que as investigações foram insuficientes, sobretudo quando fora privado de
sua liberdade sem motivo, não teve direito de recorrer, e também não foi apresentado imediatamente a um
juiz.
- Recomendações:
a) Danos morais/materiais;
b) Realizar investigação completar-imparcial-efetiva;
c) Investigação por órgãos não-militares;
d) Modificar normas internas, para afastar competência militar para casos de violações de DH's
cometidas por PM (deve ser pela PC);
e) Medidas de educação para evitar ações de discriminação racial.

#DEFENSORIA #VAICAIRNAPROVA: Primeiro caso brasileiro sobre violação do direito à Audiência de Custódia
previsto no art. 7.5 da Convenção Americana: “A Comissão concluiu que Jailton Neri da Fonseca foi privado de
sua liberdade de forma ilegal, sem que houvesse existido causa alguma para sua detenção nem alguma
situação de flagrante. Não foi levado sem demora ante um juiz. Não teve direito de recorrer a um Tribunal
competente a fim de que este determinasse sem demora a legalidade de sua detenção ou ordenasse sua
liberdade, dado que foi assassinado imediatamente após sua detenção. O único propósito de sua detenção
arbitrária e ilegal foi matá-lo”.

#JÁCAIUEMPROVA #DPE-CE/2014: Para efetivar garantia existente na Convenção Americana de Direitos


Humanos, o sistema processual infraconstitucional deve prever a “audiência de custódia”.

4.4 Caso dos Meninos Emasculados do Maranhão

CASO: Entre 1991 e 2003, 28 meninos entre 8 e 15 anos foram encontrados mortos e com os órgãos
genitais mutilados, e diante da ineficácia da Justiça maranhense o caso foi levado à Comissão (em nome das
vítimas Raniê Siva Cruz, Eduardo Rocha da Silva e Raimundo Nonato da Conceição Filho).

Comissão Internacional de DH [2005]:


O próprio governo brasileiro reconheceu a responsabilidade e propôs solução amistosa, tendo o
acordo sido feito nos seguintes termos:
i) Reconhecimento e Responsabilidade: Maranhão reconheceu a insuficiência de sua
investigação. Comprometeu-se em realizar cerimônia pública por ocasião da inauguração do Complexo
Integrado de Proteção à Criança e ao Adolescente.
ii) Julgamento e Punição do Responsáveis.
iii) Medidas de Reparação: simbólica (instalação de placa de homenagem) e material (inserção
das famílias em programas sociais + $500/mês por 15 anos).
iv) Medidas de Não-Repetição: criação de diversos programas, inclusive escolar e de capacitação
policial (além de reestruturação da DEPOL responsável), bem como a reativação da Defensoria Pública local.
v) Mecanismo de Seguimento: Conselho Estadual de DH, Conselho Estadual de Direitos da
Criança e do Adolescente, e representantes dos peticionários devem se reunir a cada 4 meses para
monitoramento do acordo, e elaboração de relatórios.

#SELIGA:
- Primeira vez que o Brasil assumiu responsabilidade internacional após a admissibilidade e ates da deliberação
final.
- Impossibilidade de o Estado invocar a "Cláusula Federal" sob a tentativa de afastar a responsabilidade por
suposta ausência de competência federal para o caso. Assim, segundo André de Carvalho Ramos, a Federação
responde pela conduta de seus entes internos. Nota-se que a não aceitação dessa cláusula decorre
diretamente de ser o Estado uno perante o Direito Internacional. A ausência de ‘competência federal’ é
matéria de direito interno e não de Direito Internacional. Alegar a obediência ao Direito interno (por exemplo,
o governo federal afirma não poder ‘invadir’ esfera de atribuição de outro ente federado) não é aceito como
excludente da responsabilidade internacional.
#CONCLUSÃO: Nos tratados de direitos humanos, observa-se a regra pela qual um Estado Parte, ao aderir ao
tratado, deve ter ciência da impossibilidade de se escusar, com base em sua forma interna de organização, de
pretensas violações de direitos humanos.

Paradiplomacia: Trata-se da possibilidade de participação nas negociações internacionais de entes


que não sejam o Ministério das Relações Exteriores. Neste caso específico, o Presidente Lula autorizou o
Estado do Maranhão a negociar diretamente no plano internacional da Comissão Interamericana de Direitos
Humanos.
4.5 Ximenes Lopes vs. BRASIL

CASO: Portador de deficiência mental que foi morto em unidade médica (Ceará), em decorrência de
maus tratos (o próprio médico do local deixou de informar as lesões do cadáver).
CIDH [2006]:
 Brasil foi condenado por violação ao direito à vida/integridade (tanto da vítima quanto dos
familiares), e também por ofensa às garantias judiciais (demora/ineficiência).
 Condenou-se a indenizar e investigar, perseguir em juízo e punir os responsáveis.
 Firmou-se que toda entidade (pública/privada) que esteja autorizada a atuar com capacidade
estatal (ex: SUS) se enquadra na hipótese de responsabilidade por fatos diretamente imputáveis ao Estado.

#SELIGA:
Registre-se, inicialmente, que o Brasil reconheceu parcialmente sua responsabilidade internacional,
cumprindo parte das recomendações expedidas pela Comissão.
#CASOEMBLEMÁTICO: Primeira condenação sofrida pelo Brasil na CIDH.
- Primeiro caso envolvendo violações de DH's de pessoa com deficiência mental (instalando-se a política
antimanicomial).
- Estabeleceu-se que a Convenção Interamericana sobre os Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência
(Convenção de Guatemala) pode ser utilizada como vetor interpretativo dos direitos do PSJCR (tornando
possível processar um Estado-signatário daquela perante a CIDH).
- Criou-se, portanto, a denominada "supervisão por ricochete", consistente no fato de que caso o Brasil
desrespeite a Convenção da Guatemala, pode tal desrespeito ser considerado uma violação de algum dos
direitos genéticos do Pacto de São José e, com isso, ser desencadeado o mecanismo de controle do pacto,
mediante petição na Comissão e, após o trâmite adequado, ação perante a Corte.
#JÁCAIUEMPROVA:
#DPE-SP/2013: A banca FCC considerou errada a seguinte alternativa “A demanda perante a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos pode ser resolvida por meio de solução amistosa entre a vítima e o
Estado infrator, como ocorreu no Caso Damião Ximenes Lopes e Caso dos Meninos Emasculados, ambos tendo
o Brasil como infrator”. A alternativa possui equívoco ao mencionar o Caso Damião Ximenes, já que este não
obteve sucesso nas conciliações.
#AGU/2005: A banca CESPE considerou correta a seguinte alternativa: “No caso Damião Ximenes Lopes, uma
eventual exceção preliminar de não esgotamento de recursos internos deveria ter sido interposta pelo Brasil
na fase de admissibilidade da denúncia perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, sem o que se
presumiria a renúncia tática, por parte do Estado demandado, a esse meio”. Isso porque, segundo André de
Carvalho Ramos, caso não haja essa alegação perante a Comissão, haveria uma espécie de preclusão em face
do princípio do stoppel (non venire contra factum proprium).
#AGU/2005: A banca CESPE considerou errada a seguinte alternativa: “No caso Damião Ximenes Lopes, a
forma federativa do Estado Brasileiro não é causa de isenção de responsabilidade internacional do Estado do
Ceará, o qual deve participar do processo perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos como
litisconsórcio da União”. O erro está na segunda parte quando se afirmou da necessidade de litisconsórcio. Isso
porque a União responderá sozinha pela conduta de um Estado-membro.
#AGU/2005: A banca CESPE considerou correta a seguinte alternativa: “No caso Damião Ximenes Lopes, os
familiares ou seus representantes devidamente creditados podem apresentar suas solicitações, argumentos e
provas de forma autônoma, durante todo o processo, perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos”. A
afirmativa está em consonância com o art. 25.1 da CADH. Com isso, conclui-se que as pessoas físicas não
podem dar início ao processo na Corte, mas podem apresentar provas e argumentos após a sua instauração
pelos legitimados.

4.6 Simone André Diniz vs. BRASIL

CASO: Patroa publicou anúncio em jornal procurando empregada doméstica de "cor branca", e por
essa razão recusou o interesse de Simone André Diniz. Ainda assim, o MP requereu o arquivamento do
respectivo IP.

Comissão [2006]: A Comissão fez diversas recomendações ao Brasil: (a) indenização material/moral,
(b) reconhecimento público da responsabilidade internacional, (c) apoio financeiro à vítima para que possa
fazer curso superior, (d) investigação completa, (e) educação dos funcionários da justiça/polícia, (f) evitar
publicidade de denúncias de cunho racista; (g) organizar seminários estaduais com representantes do PJ, MP e
Secretárias de Segurança Pública locais; (h) solicitar aos governos estaduais a criação de delegacias
especializadas na investigação de crimes raciais; solicitar aos MPEs e criação de Promotorias especializadas.

#SELIGA: Este caso se tornou paradigma do "Racismo Institucional" (praticado por autoridades estatais).
Segundo a doutrina, o racismo deve ser reconhecido também como um sistema, uma vez que se organiza e se
desenvolve através de estruturas, políticas, práticas e normas capazes de definir oportunidades e valores
para pessoas e populações a partir de sua aparência, atuando em diferentes níveis: pessoal, interpessoal
e institucional, excluindo seletivamente grupos racialmente subordinados - negros, indígenas, ciganos, para
citar a realidade latino-americana e brasileira da diáspora africana.
Primeira vez que a Comissão responsabilizou alguém por racismo. O caso não pôde ser submetido à Corte por
ter ocorrido em 1997, ou seja, antes do Brasil reconhecer a competência contenciosa da Corte IDH (1998)

4.7 Nogueira de Carvalho e Outro vs. BRASIL

CASO: Acerca do assassinato de Gilson Nogueira de Carvalho (ativista de direitos humanos), o único
processado restou absolvido pelo Tribunal do Júri. Em dezembro de 1997, algumas entidades de proteção dos
direitos humanos apresentaram denúncia perante a CIDH contra o Brasil, alegando que o país seria
responsável pela morte de Gilson Nogueira de Carvalho, um advogado ativista de direitos humanos,
assassinado em outubro de 1996.

Os peticionários alegaram que o direito à vida da vítima não foi garantido e que o Estado Brasileiro
não havia realizado uma investigação séria sobre sua morte. Em 2000, o Estado informou à CIDH que o
processo sobre a morte da vítima já se encontrava na fase de pronúncia. Em 2005, o Estado informou à CIDH,
que o único acusado pela morte da vítima havia sido absolvido pelo Tribunal do Júri. No mesmo ano,
entendendo que o Brasil não teria cumprido com as recomendações emitidas, a CIDH apresentou o caso à
CorteIDH.

CorteIDH [2006]:
 A Corte rejeitou a preliminar de não-esgotamento dos recursos internos, pois não arguida pelo
Brasil perante a Comissão, tendo como fundamento o princípio do stoppel.
 Também rejeitou a preliminar de incompetência ratione temporis. Embora tenha concordado
que a morte ocorreu antes do reconhecimento de sua competência contenciosa, decidiu que é competente
para examinar as ações/omissões relacionadas com violações contínuas/permanentes, que tiveram início
antes do reconhecimento e persistem ainda depois.
 *Considerou que o Brasil não falhou na investigação, tendo havido, no seu entender, a
adoção de diversas medidas policiais e judiciais a partir de 1998, ou seja, desde a data do reconhecimento da
competência da Corte. Assim, a Corte não reconheceu a violação dos direitos à proteção e às garantias
judiciais consagradas nos arts. 8 e 25 da CADH, determinando, por unanimidade, o arquivamento do feito.

#SELIGA:
- Caráter subsidiário da jurisdição da Corte, não lhe competindo substituir a jurisdição interna em favor de um
resultado melhor ou mais eficaz (a Corte examina a obrigação de meio e não de resultado).
*Ademais considerando que os supostos responsáveis pela morte de Nogueira de Carvalho foram absolvidos
pelo Tribunal do Júri, realmente seria inusitado que a CorteIDH condenasse o Estado brasileiro pela
impunidade, pois teríamos aqui uma responsabilização estatal por ato praticado por particular- ainda que
exercendo uma função pública- em que não seria possível exigir do Estado uma intervenção direta ou indireta
para que fosse obtido outro resultado, levando-se em conta a soberania dos veredictos.
- Primeiro caso da Corte sobre violações contra defensores de DH's.
- Luiz Flávio Gomes atuou como perito, e se manifestou pela negligência do Brasil.
- Brasil cumpriu algumas recomendações emitidas pela Comissão, destacando-se a criação da Política Nacional
de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos (PNPDDH) - Decreto n. 6.044/2007.

4.8 Escher e Outros vs. BRASIL

CASO: Atendendo a requerimento da PM, uma juíza do Paraná autorizou a interceptação telefônica
de membros de Cooperativa e Associação, sob o argumento de manterem relação com o MST, para a prática
de crimes. A decisão não foi fundamentada, teve fragmentos veiculados no Jornal Nacional e em coletiva de
imprensa do Secretário de Segurança do Estado. MP somente tomou conhecimento 1 ano depois e requereu a
nulidade das interceptações, que foram negadas pela Justiça.

CIDH [2009]: Embora a proteção das conversações telefônicas não esteja expressamente prevista na
CADH, a Corte conferiu interpretação extensiva a seu texto (proteção à privacidade) e condenou o Brasil.

#SELIGA:
- Registre-se, inicialmente, que o Brasil não cumpriu recomendações expedidas pela Comissão.
- Assentou a ilegitimidade da PM para requerer interceptação telefônica (ao contrário do STF/STJ).
- O prazo outorgado em meses deve ser contabilizado como "mês-calendário", pouco importando se terminar
em final de semana (!!). Contudo, neste caso, a Corte relevou a intempestividade e aceitou a petição da vítima
por mera liberalidade.12
- A exceção de ausência de esgotamento prévio dos recursos internos deve ser oposta já na etapa da Comissão
(sob pena de desistência tácita, não podendo ser posteriormente invocada perante a Corte) → Princípio do
Stoppel.
- Lembre-se que este caso enuncia um exemplo de eficácia horizontal dos DH's contra a tortura.

12
Art. 25.1 da CADH - "Depois de notificado [...] as supostas vítimas/representantes poderão apresentar de forma
autônoma o seu escrito de petições, argumentos e provas e continuarão atuando dessa forma durante todo o processo
[perante a Corte]".
#JÁCAIUEMPROVA:
#DPE-RO/2012: CESPE considerou correta a seguinte alternativa: “Nos termos de precedente da Corte, a
comunicação telefônica é abrangida pela garantia de proteção à privacidade prevista na Convenção Americana
sobre Direitos do Homem, ainda que esta não preveja expressamente o sigilo desse tipo de comunicação.
#MPT/2009: No caso Escher e Outros vs. Brasil, a Corte Interamericana de Direitos Humanos concluiu ter
havido violação da Convenção Americana de Direitos Humanos por parte do Estado Brasileiro, devido à
transgressão da proteção à honra, à vida privada e à reputação, pela interceptação, gravação e divulgação das
conversas telefônicas dos autores.

4.9 Garibaldi vs. BRASIL

CASO: Durante despejo extrajudicial/forçado de acampamento do MST, capatazes de uma fazenda


assassinaram Sétimo Garibaldi, e o IP acabou arquivado.

CIDH [2009]:
 Acolheu parcialmente a preliminar da incompetência ratione temporis, pois a morte ocorreu
antes do reconhecimento pelo Brasil da jurisdição da Corte, mas julgou as violações às garantias judiciais aos
direitos dos familiares.
 Decidiu, assim, que fora violado o direito dos familiares de verem a morte devidamente
investigada e julgada.
 Recomendou melhorias no sistema de investigação (desarquivamento do IP do caso) +
publicação da sentença + indenização + custas.
 A CIDH determinou, inclusive, que o Paraná revogasse a lei que conferiu à juíza do caso o título
de cidadã honorária.

#SELIGA: O foco do caso é a inefetividade do sistema de investigação atual brasileiro, ordenando que o Brasil
observasse os prazos do art. 10 do CPP.

#ATENÇÃO: Reiterou a existência dos quatro Elementos para aferir a duração razoável do processo:
1) Complexidade do caso13;
2) Atividade processual do interessado;
13
Exs: pluralidade de réus, expedição de cartas precatórias, diversas medidas liberatórias, existência de outros processos
criminais em andamento (STF - HC 113.189, T2 - 2013)
3) Conduta das Autoridades Judiciais;
4) Efeito gerado na situação jurídica da pessoa envolvida no processo.14

Vale ressaltar que o sistema europeu de proteção dos direitos humanos e o próprio STF já fixaram
elementos para aferir a razoável duração do processo. Vejamos a comparação dos critérios:

#SELIGA:
Sistema Interamericano Sistema Europeu STF
1) Complexidade do caso; 1) Complexidade do caso; 1) Pluralidade de réus;
2) Atividade processual do 2) Comportamento das 2) Expedição de cartas
interessado; partes; precatórias;
3) Conduta das Autoridades 3) Comportamento da 3) Ajuizamento de inúmeras
Judiciais; autoridade judicial. medidas liberatórias;
4) Efeito gerado na situação 4) Existência de outros
jurídica da pessoa envolvida processos criminais em
no processo andamento.

#ATENÇÃO: Apesar dos critérios não serem idênticos, pode-se afirmar que não há qualquer divergência e
incompatibilidade entre a jurisprudência internacional e doméstica, pois quanto maior a proteção dos direitos
do acusado, maior a perfectibilização do princípio do pro homine. Logo, os três critérios são considerados
válidos.
- STJ já trancou IP por violação ao prazo razoável (HC 144.593)
- Caso Garibaldi ocorreu no mesmo Estado que o caso Escher - Paraná/PR.

*[Atualizado em 25/06/2020] #OLHAOGANCHO: “O descumprimento da decisão da Corte IDH pelo Brasil:


um breve comentário ao REsp 1.351.177. O Ministério Público do Estado do Paraná, cumprindo com o seu
papel de ativador do controle de convencionalidade e de busca pelo cumprimento das decisões da Corte IDH,
requereu o desarquivamento do inquérito policial, apontando ter sido o Estado brasileiro condenado pela
Corte Interamericana a investigar e punir os autores do assassinato de Sétimo Garibaldi109. O pedido do
MPPR foi acolhido pelo juízo de Loanda/PR. No entanto, em habeas corpus impetrado pela defesa do
investigado, o TJPR concedeu a ordem sob o argumento de que as novas provas produzidas não seriam
substancialmente novas para determinar o desarquivamento da investigação nos termos do art. 18 do CPP

14
"Efeitos materiais/morais e de outra natureza que a detenção produz no detido quando ultrapassarem as normas e
consequências da mesma" - Caso Neumeister (sistema europeu).
(“Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a
denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia”) e da
Súmula 524 do STF (“Arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do promotor de
justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas”). Contra o acórdão do TJPR, o MPPR interpôs
recurso especial para o STJ, que entendeu por manter a investigação arquivada. Vejamos a ementa do REsp
1.351.177, rel. min. Ericson Maranho (desembargador convocado), rel. p/ acórdão min. Sebastião Reis Júnior,
6ª Turma, j. 15.03.2016:
“1. Feita a comparação do conteúdo dos artigos apontados como violados com o teor do acórdão recorrido,
constata-se que, por um lado, apenas a matéria do art. 18 do Código de Processo Penal foi objeto de debate. E,
por outro, nos embargos declaratórios opostos pelo Parquet, não se postulou o pronunciamento da Corte es-
tadual acerca dos arts. 647 e 648 do Código de Processo Penal e do art. 68, 1, c/c o art. 28, 2, da Convenção
Americana de Direitos Humanos. Sendo assim, em relação aos aludidos temas, tem incidência a Súmula 356/
STF.
(...)
3. Em nenhum momento se discutiu a existência ou não de justa causa para a propositura da ação penal, mas,
sim, se haveria novas provas que autorizariam a reabertura do inquérito anteriormente arquivado, matérias,
portanto, distintas. Nesse ponto, a pretensa violação dos aludidos artigos teria surgido quando o Tribunal de
origem supostamente efetuou uma cognição aprofundada nas provas, fora dos limites da via do habeas cor-
pus, e concedeu a ordem. Em outras palavras, nesse caso, a ofensa teria ocorrido quando da prolação do
acórdão recorrido.
(...)
5. Se as instâncias ordinárias, soberanas na análise da matéria de cunho fático-probatória, a partir da
verificação do conteúdo das provas que deram ensejo à reabertura do inquérito, concluíram que não
trouxeram elas elemento novo às investigações, é inviável concluir de modo diverso sem que se proceda à
revisão desse mesmo conteúdo. Aplicação da Súmula 7/STJ.
(...)
8. No caso concreto, não se debate se determinado tipo de prova pode ser juridicamente utilizado como meio
probatório para dar reabrir a persecução penal. O que se pretende é que esta Corte verifique se o conteúdo do
conjunto probatório traria elementos inéditos que se caracterizassem como prova nova, nos termos do art. 18
do Código de Processo Penal. Isso não é valoração jurídica da prova, mas reexame do acervo probante, vedado
pela Súmula 7/STJ”.
A decisão do STJ não surpreende porque repete um padrão do Poder Judiciário brasileiro – verificado, por ex-
emplo, também no Caso Gomes Lund – de não cumprir adequadamente as sentenças da Corte IDH que não se
limitam a fixar medidas de reparação pecuniárias, mas sim obrigações de fazer como a de investigar e punir. A
Corte IDH já possui uma jurisprudência consolidada no sentido de não admitir a invocação pelo Estado de qual-
quer obstáculo de direito interno para descumprir a investigação de investigar e punir autores de violações de
direitos humanos. Por isso, o art. 18 do CPP e a Súmula 524 do STF deveriam ceder diante do pronunciamento
da Corte IDH no Caso Garibaldi, devendo-se reabrir a investigação mesmo na ausência de provas substancial-
mente novas. Teríamos na hipótese, então, o exercício do controle de convencionalidade do art. 18 do CPP e
da Súmula 524 do STF para conferir a eles uma interpretação conforme o art. 68 da CADH, segundo o qual “Os
Estados Partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem
partes”.
O min. Rogerio Schietti Cruz, vencido no julgamento do REsp 1.351.177, apresentou no seu voto uma reflexão
importante que deveria ser melhor acolhida pelo Poder Judiciário brasileiro:
“Creio desnecessário dizer o quão constrangedor é para o sistema judiciário brasileiro ver apontada, em âm-
bito internacional, a incúria com que, conforme afirmado, se houveram as autoridades responsáveis pela inves-
tigação de um crime de homicídio, classificado por nossa Constituição da República como hediondo.
(...) Acredito, entretanto, ser ainda mais constrangedor perceber que, mesmo após o reconhecimento formal
dessas inúmeras falhas e omissões estatais na condução das investigações relativas ao caso de homicídio de
um nacional, não houve qualquer esforço do Judiciário brasileiro em dar efetivo cumprimento à sentença pro-
ferida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.
(...) a decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná ora examinada é uma demonstração de como esta -
mos ainda distantes de internalizar a regra do controle de convencionalidade, que há de caminhar pari passu
com o controle de constitucionalidade de toda norma do direito positivo, obrigação a que se sujeita todo mag -
istrado ou órgão jurisdicional, de qualquer grau ou instância.
É mais preocupante ainda a situação brasileira ante a percepção de que vários outros países que integram o
sistema interamericano de proteção dos direitos humanos adotam comportamento judicial diferente. (...)
A conclusão principal, a meu ver, é inexorável: se o Brasil ratificou a Convenção Interamericana de Direitos Hu-
manos e a introduziu no direito positivo pátrio com, no mínimo, o mesmo nível hierárquico do Código de Pro-
cesso Penal – não desconheço o caráter supralegal (posto que infraconstitucional) reconhecido pelo Supremo
Tribunal Federal aos tratados e convenções internacionais (...) –, todo o sistema judicial, desde o magistrado
de primeiro grau até os membros da Suprema Corte, deve se conformar à ideia de que o controle de constitu-
cionalidade implica necessariamente um controle de convencionalidade, os quais hão de ser exercidos de
forma intercomplementar.
(...) Penso que a forma venceu a substância. O apego a uma regra de natureza procedimental – produção ou
não de prova com conteúdo substancialmente novo – superou a constatação, pelo próprio TJPR, de que os ele-
mentos colhidos no inquérito policial conferiam justa causa à ação penal. Preferiu-se a proteção, em tom abso-
luto, a quem nem sequer havia sido ainda formalmente acusado, em prejuízo da apuração de grave crime, re -
lacionado a conflito agrário, mesmo ciente de que a Corte Interamericana de Direitos Humanos reconhecera
inúmeras omissões e falhas na condução das investigações que culminaram no arquivamento do inquérito poli-
cial”.
O acórdão do REsp 1.351.177 transitou em julgado no dia 15.08.2016 e o Brasil não deu cumprimento integral
à sentença da Corte IDH proferida no Caso Garibaldi, o que pode lhe acarretar uma nova condenação perante
a Corte, agora por violar o art. 68 da CADH.”15

4.10 Gome Lund vs. BRASIL (“Guerrilha do Araguaia”)

CASO: Durante os anos de 1972 e 1975, vários camponeses e integrantes do Partido Comunista
Brasileiro (PCB), foram torturados e desaparecidos pela então ditadura militar, acusados de comporem o
movimento de resistência intitulado "Guerrilha do Araguaia", em Tocantins/TO. Posteriormente adveio a Lei
n.º 6.683/79, que concedeu Anistia, tendo o STF reconhecido sua recepção pela CF/88 na ADI-153 (2010 - 7
meses antes da CIDH)
- Brasil ignorou por várias vezes o relatório da Comissão.

CIDH [2010]:
 Brasil foi condenado por lesões aos direitos de reconhecimento da personalidade jurídica, à
integridade pessoal, à liberdade pessoal, à liberdade de pensamento/expressão, e à proteção judicial.
 A Corte reafirmou sua jurisprudência pela incompatibilidade de toda e qualquer anistia de
graves violações de DH's frente à CADH (e não somente a autoanistia/amnésica).
 Condenações:
a) Investigar e responsabilizar penalmente os envolvidos; ("Doutrina Velásquez Rodriguez")
b) Brasil não poderá aplicar a lei de anistia (ou qualquer excludente similar);
c) Os responsáveis devem ser julgados pela jurisdição ordinária (e não militar);
d) Brasil deve encontrar os restos mortais (e custear funerais);
e) Atendimento psicológico/psiquiátrico;
f) Publicação da sentença da Corte;
g) Ato público de reconhecimento de responsabilidade;
h) Curso permanente sobre DH's nas Forças Armadas;
i) Tipificar o delito de desaparecimento forçado;

15
Fonte: Jurisprudência Internacional de Direitos Humanos, 3ª Edição, 2020, Editora CEI, CAIO PAIVA e THIMOTIE
ARAGON.
j) Criar uma Comissão da Verdade;
k) Indenizações.

#SELIGA: Justiça de Transição ("transitional justice"): Trata-se de um conjunto de mecanismos


judiciais/extrajudiciais utilizados por uma sociedade como um ritual de passagem à ordem democrática, após
graves violações de direitos humanos por regimes ditatoriais, de forma que assegure a responsabilidade dos
violadores, o resguardo da justiça e a busca da reconciliação.

#OLHAOGANCHO: São quatro as facetas/dimensões da Justiça de Transição:


(i) Direito à memória e à verdade16;
(ii) Direito à reparação das vítimas/familiares;
(iii) Dever de responsabilização dos perpetradores das violações;
(iv) Formatação democrática das instituições protagonistas da ditadura;

Critérios para compatibilizar o aparente conflito entre as decisões do STF e Corte IDH:
1.º) Diálogo das Cortes: Entendimento dos tribunais nacionais alinhados com a jurisprudência
internacional (para que eles andem “lado a lado”). Trata-se de um critério de natureza preventiva.
2.º) Teoria do Duplo Controle/Crivo: Enquanto o STF emite sua decisão em conformidade com o
controle de constitucionalidade, a Corte IDH exerce o controle de convencionalidade (autêntico/definitivo).

Destaque-se que, em maio/2014, o PSOL ajuizou a ADPF-320 para obter do STF o reconhecimento da
validade e do caráter vinculante da decisão proferida no Caso Gomes Lund (logo, não há bis in idem com a
anterior ADPF-153, que tinha objeto distinto).

Doutrina Velásquez Rodrigues: O Estado dever reprimir penalmente as violações de direitos


humanos, sob pena de ser responsabilizado tanto pela violação em si, quando pela impunidade gerada 17.

O dever de investigar-punir é norma de jus cogens, combatendo a reincidência/impunidade


("garantias de não-repetição").

16
#FICADEOLHO: Caiu na 2ª fase da DPU – 2017 (CESPE).
17
Velásquez Rodriguez Vs. Honduras foi o 1º caso julgado pela Corte IDH (e juntamente com Fairén Garbi e Godínez Cruz,
formam os "Três Casos Hondurenhos", sobre desaparecimento forçado).
Mandado internacional implícito de criminalização: referente ao comando de tipificação do crime de
desaparecimento forçado (dupla dimensão dos direitos humanos + princípio da proibição da proteção
insuficiente), podendo ser de dois tipos: (i)"Expresso": quando constar de tratado; (ii) "Implícito": quando
constar de decisão de tribunal internacional.18

Elementos do desaparecimento forçado:


1) Privação da liberdade;
2) Intervenção direta de agentes estatais (ou aquiescência destes);
3) Negativa de reconhecer a detenção e de revelar o paradeiro da pessoa interessada.
#OBS1: O fato de o Brasil ainda não ter referido crime tipificado, não impede sua condenação
internacional por sua prática.

#OBS2: O ônus de provar que o indivíduo não está desaparecido é do Estado.

#OBS3: Embora ainda não tipificado no Brasil, o STF entende possível extraditar pessoas pela prática
de mencionado delito, sustentando que o Princípio da Dupla Incriminação resta atendido com o art. 148, § 1º,
III, do CP (sequestro qualificado).19

#OBS4: o Brasil ratificou a Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas Contra o
Desaparecimento Forçado/ONU e a Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado/OEA.

#OBS5: A prática generalizada de desaparecimento forçado constitui crime contra a humanidade (e


assim, norma de jus cogens - imprescritíveis).

Cláusula Ratione Temporis: em regra, a Corte IDH não pode julgar fatos ocorridos antes da adesão
do Estado à sua jurisdição contenciosa (salvo se o fato tiver natureza permanente).
- Quando o Brasil reconheceu a competência da Corte IDH (dezembro/1998), já havia precedente
("Caso Blake" - janeiro/1998) da Corte reconhecendo que a obrigação de investigar-responsabilizar autores de
desaparecimento forçado possuía caráter permanente (inclusive, os corpos das vítimas do caso Gomes Lund
continuam desaparecidos, e os responsáveis impunes).

18
ACR defende que o mandado implícito é aquele que impõe obrigação de investigar-perseguir-punir (não se referindo à
fonte).
19
Por força da expressa previsão do art. 13, da Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas Contra o
Desaparecimento Forçado, o desaparecimento forçado não pode ser considerado crime político (para fins de impedir a
extradição).
Teoria da Quarta Instância: não é admitida pela Corte IDH, porquanto não age como instância
revisora de julgamentos locais, inexistindo qualquer hierarquia frente ao STF, devendo haver uma relação de
diálogo e complementariedade recíproca. Assim, pode-se concluir que a Corte não possui o intuito de revisar
as decisões das Cortes internas, mas apenas de realizar o chamado controle de convencionalidade em face da
Convenção Interamericana de Direitos Humanos.

#DEOLHONAJURISPRUDÊNCIA:
- A remuneração recebida a título de anistia política não configura verba salarial (mas apenas indenizatória),
podendo ser penhorada.
- STJ já entende que a Lei da Anistia não pode ser estendida à esfera cível (possibilidade de pleitear
indenização).
- A Comissão da Verdade, criada pela Lei 12.528/2011, tem como objetivo examinar graves violações de
direitos humanos a fim de efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação
nacional. Em dezembro/2014, apresentou relatório final (sem caráter jurisdicional/persecutório).
- O fato de um Estado-parte ser signatário das Convenções de Genebra sobre DI Humanitário (sistema global)
pode - sim - servir como fundamentação para sua condenação pela Corte IDH (sistema regional), pois a Corte
IDH pode examinara qualquer tratado aplicável no continente americano (e não apenas tratados que possuem
vigência de seus efeitos atreladas às Américas).
- A Corte IDH não é propriamente um tribunal de natureza "cível", eis que julga fatos envolvendo matéria
criminal.
#OBS: no Caso Velasquez Rodriguez a Corte IDH reconheceu que o Estado pode ser responsabilizado por atos
ultra vires (excesso/desvio do agente público) e atos de particulares (quando o Estado se omitir
injustificadamente).

#JÁCAIUEMPROVA:
#AGU/2012: A banca CESPE considerou correta a seguinte alternativa: “Na sentença do caso Gomes Lund
versus Brasil, a Corte Interamericana de Direitos Humanos estabeleceu que o dever de investigar e punir os
responsáveis pela prática de desaparecimentos forçados possui caráter de jus cogens”.
#DPE/2010: A banca FCC considerou correta a seguinte alternativa sobre as leis de autoanistia: “O Estado
parte na Convenção Americana de Direitos Humanos tem o dever de punir os responsáveis por crimes que lesa
a humanidade, não podendo aventar a prescrição criminal para deixar de fazê-lo, mesmo que os fartos tenham
ocorrido há mais de vinte anos”.
#MPF/2008: A banca própria do concurso considerou errada a seguinte alternativa: “A justiça transacional
pode justificar a validade interna e externa de leis sobre anistia, se tiverem sido incorporadas ou
expressamente mantidas pela Constituição”. Isso porque a Justiça de transição não justifica a validade sobre
leis, na medida em que a Corte IDH não admite a impunidade de violadores de direitos humanos durante a
ditadura militar.
#MPF/2015: A Banca própria considerou errada a seguinte alternativa: “O costume internacional e as
resoluções vinculantes do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas são incorporadas
internacionalmente no direito brasileiro por intermédio de decreto presidencial”. Isso porque o costume é
aplicado diretamente no ordenamento jurídico brasileiro sem qualquer processo formal de incorporação.
*#DPEAC/2017: A banca cespe considerou errada a seguinte alternativa: Embora de difícil efetivação, em
razão das frequentes crises migratórias, o direito a migrar está previsto na Convenção Americana de Direitos
Humanos.
*#DPEAC/2017: A banca cespe considerou correta a seguinte alternativa: A Corte decidiu que, embora a
Convenção Americana de Direitos Humanos proteja a vida em geral, os embriões não podem ser considerados
pessoas.

4.11 Índios do Rio Xingu vs. BRASIL (“Belo Monte”)

CASO: Brasil foi denunciado à Comissão Interamericana por não respeitar direitos indígenas na
construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte (Bacia do rio Xingu, em Altamira/PA).

Comissão [2011]20:
 Outorgou Medida Cautelar (a) determinando suspensão do processo de licenciamento; (b)
impedindo continuidade das obras; e (c) assegurando consulta às comunidades indígenas afetadas.
 Brasil descumpriu (entende não ter efeito vinculante).
 Em seguida, a Comissão voltou atrás e flexibilizou os comandos das medidas cautelares
(inclusive, deixou a questão do licenciamento de fora).

#SELIGA:
- As Cortes Internacionais chamam o mínimo existencial de "minimum core obligation".
- Segundo o art. 169 da OIT, a população indígena possui o direito de consulta e participação antes da
imposição e qualquer tipo de política pública que os possa afetar. No entanto, há polêmica sobre a força dessa
consulta:
20
PS: não houve referendo pela Corte.
 1ª posição) consulta à população indígena tem caráter vinculante (jurisprudência internacional -
Convenção/OIT-169).
 2ª posição) consulta à população indígena tem caráter não-vinculante (jurisprudência nacional - STF-
Raposa Serra do Sol).
- Reconhecimento da proteção ao meio ambiente como obrigação Erga Omnes:
 Origem obter dictum no Caso Barcelona Traction (CIJ/1970).
 Protege valores de todos os Estados da comunidade internacional, fazendo nascer o direito de qualquer um
de seus membros em ver respeitada tal obrigação.

#OLHAOGANCHO: O que se entende por “greening” (esverdeamento)? Ocorre quando se tenta proteger
direitos humanos de cunho ambiental nos sistemas regionais de direitos humanos, que são sistemas aptos -
em princípio - a receber queixas e petições que contenham denúncias de violação de direitos civis e políticos.
O caso Belo Monte acaba por tutelar, ainda que de forma indireta ou por “ricochete”, interesses ambientais.
Por isso, a doutrina diz que, no caso Belo Monte, houve um verdadeiro “esverdeamento do direito à vida” ou
ainda um “esverdeamento do direito à integridade física das comunidades indígenas”.

#JÁCAIUEMPROVA:
#DPE-AM/2013: A banca FCC considerou correta a seguinte alternativa: “A outorga de medida cautelar a favor
dos membros das comunidades indígenas da bacia do Rio Xingu, relativa à usina hidroelétrica Belo Monte, no
Estado do Pará, foi expedida pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e solicitou a adoção de
medidas para proteger a vida, a saúde, integridade pessoal dos membros das comunidades indígenas em
situação de isolamento voluntário”.
#DPE-SP/2013: A banca FCC considerou errada a seguinte alternativa: “A Corte Interamericana de Direitos
Humanos adotou as medidas provisórias da Usina Belo Monte no Pará, determinando a suspensão da obra
para preservação dos direitos dos povos indígenas (vida, saúde e integridade pessoal e cultural) em situação
de isolamento voluntário na bacia Xingu. No entanto, após informações do governo brasileiro, a Corte
modificou sua decisão determinando que fossem tomadas medidas de preservação dos direitos sem a
suspensão da obra”. Na realidade, o único erro da alternativa é a que a referida medida cautelar foi
determinada pela Comissão e não pela Corte (#pegadinhaFCC).

4.12 Vladimir Herzog vs. Brasil


Caso: No dia 24 de outubro de 1975, o jornalista Vladimir Herzog compareceu ao DOI/CODI de São
Paulo para prestar declarações e, após ter sido arbitrariamente detido, foi executado. A morte de Herzog foi
apresentada à família e à sociedade como um suicídio. A investigação realizada pelo Estado Brasileiro por
meio do Inquérito Militar concluiu pela ocorrência de suicídio. Após ação proposta pela família da vítima, em
1992, o Ministério Público de São Paulo requisitou a reabertura das investigações, tendo o Tribunal de Justiça
concluído que a Lei de Anistia era um óbice para a realização das investigações. Em 2008, houve nova tentativa
para investigar o caso. Contudo, o procedimento foi novamente arquivado, sob o argumento de que os crimes
estariam prescritos.

Em 2016, após fracassar na tentativa de solucionar o caso, a Comissão Interamericana enviou o caso
à Corte, sendo recentemente condenado (2018).

Importante:
 No dia 24 de setembro de 2012, a 2. Vara de Registros Públicos do TJ/SP decidiu que o registro
de óbito de Vladimir deveria ser retificado. O juiz aceitou o pedido da Comissão Nacional da Verdade para que
constasse no assento que a morte do jornalista “decorreu de lesões e maus-tratos sofridos em dependência do
II Exército – SP”. Assim, visando aperfeiçoar o direito à verdade e à memória, o Poder Judiciário afastou a tese
de que a morte seria decorrente de suicídio por asfixia mecânica por enforcamento.

Corte [2018]:
 Corte determinou que os fatos ocorridos contra o jornalista Vladimir Herzog devem ser
considerados crime contra a humanidade, de acordo com a definição do direito internacional;
 Brasil não pode invocar prescrição ou aplicar o princípio ne bis in idem, a Lei de Anistia ou
qualquer outra disposição similar do direito interno para escusar-se de seu dever de investigar e punir os
responsáveis pelos crimes de que foi vítima Vladimir Herzog. Esses delitos foram “cometidos em um contexto
sistemático e generalizado de ataques à população civil”;
 Na sentença, a Corte ordenou, por unanimidade, várias medidas de reparação, entre elas o
dever do Estado brasileiro de retomar a investigação criminal e de dar início a ação penal sobre os fatos
ocorridos em 25 de outubro de 1975, com o fim de identificar, processar e, em sendo o caso, punir as pessoas
responsáveis pela tortura e pelo homicídio do jornalista Vlado Herzog;
 Quanto à falta de tipificação dos crimes contra a humanidade, a Corte pontuou que a
proibição dos delitos de direito internacional ou contra a humanidade já era considerada parte do direito
internacional geral pela própria Convenção sobre Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e Contra a
Humanidade, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 26 de novembro de 1968 (doravante
denominada “Convenção de 1968” ou “Convenção sobre Imprescritibilidade”). Levando em conta a resolução
2338 (XXII) da Assembleia Geral das Nações Unidas, a interpretação que se infere do Preâmbulo da Convenção
de 1968 é que a imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade surge da falta de limitação temporal nos
instrumentos que se referem a seu indiciamento, de tal forma que essa Convenção somente reafirmou
princípios e normas de direito internacional preexistentes. Assim, a Convenção sobre Imprescritibilidade tem
caráter declarativo, ou seja, acolhe um princípio de direito internacional vigente anteriormente à sua
aprovação; E concluiu: a proibição dos crimes contra a humanidade é uma norma imperativa de direito
internacional (jus cogens), o que significa que essa proibição é aceita e reconhecida pela comunidade
internacional de Estados em seu conjunto como norma que não admite acordo em contrário e que só pode
ser modificada por uma norma ulterior de direito internacional geral que tenha o mesmo caráter. Assim,
delitos contra a humanidade devem ser considerados imprescritíveis.

*[Atualizado em 25/06/2020] #OLHAOGANCHO: “Crimes contra a humanidade e relativização do princípio


do ne bis in idem. Segundo definição da própria Corte IDH: “O princípio de ne bis in idem é uma pedra angular
das garantias penais e da administração da justiça, segundo o qual uma pessoa não pode ser submetida a novo
julgamento pelos mesmos fatos” (§ 270). Ao julgar o Caso Herzog, a Corte ressaltou novamente em sua
jurisprudência o caráter relativo do princípio do ne bis in idem quando diante de uma situação envolvendo a
prática de crimes contra a humanidade28. Sobre a relativização ao ne bis in idem, esclarece a Corte IDH que:
“A exceção a esse princípio, assim como no caso da prescrição, decorre do caráter absoluto da proibição dos
crimes contra a humanidade e da expectativa de justiça da comunidade internacional. Isso se explica, como
especificou a Comissão de Direito Internacional, pelo fato de que ‘um indivíduo pode ser julgado por um
tribunal penal internacional por um crime contra a paz e a segurança da humanidade resultante da mesma
ação que foi objeto do processo anterior em um tribunal nacional, caso o indivíduo tenha sido julgado pelo
tribunal nacional por um crime ‘ordinário’, em vez de sê-lo por um crime mais grave previsto no código’. Nesse
caso, o indivíduo não foi julgado ou punido pelo mesmo crime, mas por um ‘crime mais leve’ que não
compreende em toda a sua dimensão sua conduta criminosa. Assim, ‘um indivíduo poderia ser julgado por um
tribunal nacional por homicídio com agravantes e julgado uma segunda vez por um tribunal penal
internacional pelo crime de genocídio baseado no mesmo fato’. Nas situações em que o indivíduo não foi
devidamente julgado ou punido pela mesma ação ou pelo mesmo crime, em função do abuso de poder ou da
incorreta administração de justiça pelas autoridades nacionais na ação do caso ou na instrução da causa, a
comunidade internacional não deve ser obrigada a reconhecer uma decisão decorrente de uma transgressão
tão grave do procedimento de justiça penal” (§271).”21

21
Fonte: Jurisprudência Internacional de Direitos Humanos, 3ª Edição, 2020, Editora CEI, CAIO PAIVA e THIMOTIE
ARAGON.
*[Atualizado em 25/06/2020] #OLHAMAISUMGANCHO: “Criação do instituto Vladimir Herzog e
“comemorações” ao aniversário da ditadura militar no Brasil. Em 25 de julho de 2009, foi criado no Estado
brasileiro uma instituição privada sem fins lucrativos chamada “Instituto Vladimir Herzog”, com o objetivo de
resguardar a memória do jornalista e promover ações que despertem a atenção da sociedade brasileira em
relação aos problemas econômicos e sociais do Brasil, sempre à luz das consequências causadas pela ditadura
militar. No dia 29 de março de 2019, o Instituto Vladimir Herzog, em conjunto com a Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB), enviou denuncia à Organizações das Nações Unidas (ONU) contra o Presidente Jair Bolsonaro
após a decisão do Chefe do Executivo nacional em orientar aos estabelecimentos militares de todo país que
comemorassem, no dia 31 de março de 2019, os 55 (cinquenta e cinco anos) do início da ditadura militar no
Brasil.”22

4.13 Fazenda Brasil Verde vs. BRASIL

O caso refere-se à propriedade Fazenda Brasil Verde, localizada no estado do Pará (BR-155, entre os
municípios de Marabá e Redenção), na qual se constatou a partir de 1988 uma série de denúncias perante a
Polícia Federal e o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH – agora transformado, a partir
da Lei nº 12.986/2014, em Conselho Nacional dos Direitos Humanos) de prática de trabalho escravo nesta
fazenda.

O Brasil foi condenado pela Corte IDH por violação dos direitos dos indivíduos de não serem
submetidos a qualquer forma de escravidão ou servidão, bem como de não serem submetidos ao tráfico de
pessoas (art. 6.1). Consignou a Corte ainda a condição de discriminação estrutural histórica em razão da
condição econômica. A Corte julgou o Brasil ainda incurso na violação do direito ao reconhecimento da
personalidade jurídica (art. 3); do direito à integridade pessoal (art. 5); do direito à liberdade pessoal (art. 7);
do direito à proteção da criança (art. 19), do direito à honra e à dignidade (art. 11); do direito de circulação e
residência (art. 22); Em razão da letargia na apuração dos fatos praticados e da reiteração da conduta por
parte dos acusados, o Brasil foi condenado por violar a o direito à razoável duração do processo (art. 81.) e a
garantia de proteção judicial prevista no art. 25 da CADH. Como mandamentos da sentença, a Corte estipulou
que o governo brasileiro deveria:
a) publicar a sentença condenatória;
b) reiniciar, com a devida diligência, as investigações e os processos penais sobre os fatos ocorridos
em março de 2000, identificando, processando e responsabilizando os autores;

22
Fonte: Jurisprudência Internacional de Direitos Humanos, 3ª Edição, 2020, Editora CEI, CAIO PAIVA e THIMOTIE
ARAGON.
c) adotar medidas para que a prescrição não seja aplicada ao crime de submissão à escravidão e fatos
análogos;
d) ressarcir às vítimas os danos morais sofridos, por meio de verbas indenizatórias, e arcar com as
custas e gastos do processo.

Ocorre que, no julgamento, a Corte Interamericana apenas considerou fatos ocorridos após 10 de
dezembro de 1998, quando o Brasil depositou junto à Secretaria-Geral da OEA a Declaração de aceitação da
competência obrigatória da Corte. Trata-se, nesta hipótese, de exceção de competência ratione temporis,
segundo a qual a Corte não pode julgar fatos anteriores ao reconhecimento da competência obrigatória, isto
é, ocorridos à época na qual o Estado ainda não havia reconhecido a competência obrigatória da Corte e se
submetido à sua jurisdição. Conforme art. 62.3 da Convenção Americana de Direitos Humanos, “a Corte tem
competência para conhecer de qualquer caso relativo à interpretação e aplicação das disposições desta
Convenção que lhe seja submetido, desde que os Estados Partes no caso tenham reconhecido ou reconheçam
a referida competência, seja por declaração especial, como preveem os incisos anteriores, seja por convenção
especial”.

*#OUSESABER: A Defensoria Pública da União encaminhou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos


um pedido de medidas de proteção cujo objetivo é evitar o despejo de indígenas da etnia Tapeba, que vivem
em Caucaia, na Grande Fortaleza, Estado do Ceará. Conforme apurado pela Defensoria Pública,
aproximadamente 80 famílias da região estão ameaçadas de despejo em razão de decisão judicial que defere
liminar em ação de reintegração de posse movida contra os integrantes da etnia. Cumpre ressaltar que a
comunidade indígena Tapeba luta pela garantia de demarcação do território há mais de 30 anos, tendo os
primeiros estudos para delimitação da área de uso tradicional iniciado ainda na década de 1980.
Durante esse período, a etnia tem sido vítima de recorrentes processos judiciais e administrativos que
impedem a conclusão da demarcação, negando ao povo indígena a possibilidade de viver com segurança e
dignidade nas terras tradicionais. Agora, se não bastasse a letargia dos entes públicos para a homologação das
suas terras, os indígenas correm sério risco de serem expulsos do local graças à liminar judicialmente
concedida. Importante lembrar que já há precedente da Corte Interamericana de Direitos Humanos
condenando o Brasil por desrespeito aos direitos humanos dos povos indígenas, decorrente da irrazoável
demora no processo de demarcação de suas terras: o caso Povo Indígena.

4.14 Favela Nova Brasília vs. BRASIL


*[Atualizado em 25/06/2020]
O Estado brasileiro foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Favela
Nova Brasília, comunidade do Rio de Janeiro que foi palco de massacres perpetrados por agentes das forças
policiais em duas incursões realizadas nos anos de 1994 e 1995.

De acordo com o processo, fora apurada a ocorrência de 26 homicídios e 03 estupros, cujos autores
não foram identificados e responsabilizados pela Justiça brasileira, gerando incontáveis danos psicológicos e
morais nas vítimas e seus familiares. Na sentença de 16 de fevereiro de 2017, a Corte declarou o Brasil
internacionalmente responsável pela violação das garantias judiciais, da imparcialidade e efetividade da
jurisdição, e da razoável duração do processo. O Brasil ainda foi condenado por violação ao direito à
integridade pessoal.

#SELIGA:23 “Dos pontos resolutivos da sentença, ressaltamos os seguintes:


1. O Estado é responsável pela violação do direito às garantias judiciais de independência e imparciali-
dade da investigação, devida diligência e prazo razoável, estabelecidas no art. 8.1 da CADH em relação ao art.
1.1 do mesmo instrumento.
2. O Estado é responsável pela violação do direito à proteção judicial, previsto no art. 25 da CADH em re -
lação aos artigos 1.1 e 2 do mesmo instrumento.
3. O Estado é responsável pela violação dos direitos à proteção judicial e às garantias judiciais, previstos
nos artigos 25 e 8.1 da CADH em relação com o art. 1.1 do mesmo instrumento, e artigos 1º, 6º e 8º, da Con -
venção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, assim como o art. 7º da Convenção de Belém do Pará.
4. O Estado é responsável pela violação do direito à integridade pessoal, previsto no art. 5.1 da CADH em re -
lação ao art. 1.1 do mesmo instrumento.
5. O Estado não violou o direito de circulação e de residência, previsto no art. 22.1 da CADH.

Finalmente, a Corte Interamericana fixou as seguintes medidas de reparação:


1. O Estado deve conduzir de forma eficaz a investigação em curso sobre os fatos relacionados com as
mortes ocorridas na incursão de 1994, com a devida diligência e em prazo razoável para identificar, processar
e, se for o caso, punir os responsáveis. A respeito das mortes ocorridas na incursão de 1995, o Estado deve ini-
ciar ou reativar uma investigação eficaz sobre os fatos. Além disso, o Estado, através do Procurador-Geral da
República, deve analisar se os fatos referentes às incursões de 1994 e 1995 devem ser objeto de solicitação de
incidente de deslocamento de competência.
2. O Estado deve iniciar uma investigação eficaz a respeito dos fatos relacionados à violência sexual.

23
Fonte: Jurisprudência Internacional de Direitos Humanos, 3ª Edição, 2020, Editora CEI, CAIO PAIVA e THIMOTIE
ARAGON.
3. O Estado deve oferecer gratuitamente, através de suas instituições de saúde especializadas e de forma
imediata, adequada e efetiva, o tratamento psicológico e psiquiátrico que as vítimas necessitarem e pelo
tempo que seja necessário, inclusive o fornecimento gratuito de medicamentos.
4. O Estado deve realizar um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional em re-
lação aos fatos objeto do presente caso e sua posterior investigação, e durante esse ato público deverão ser
inauguradas duas placas em memória das vítimas na praça principal da Favela Nova Brasília.
5. O Estado, dentro do prazo de um ano contado a partir da notificação da presente sentença, deve esta -
belecer os mecanismos normativos necessários para que em suspeitas de mortes, tortura ou violência sexual
decorrentes de intervenção policial, em que prima facie apareça como possível imputado um agente policial,
desde a notitia criminis se encarregue a investigação a um órgão independente e diferente da força pública en-
volvida no incidente, tais como uma autoridade judicial ou o Ministério Público, assistido por pessoal policial,
técnico criminalístico e administrativo alheio ao corpo de segurança ao qual pertença o possível acusado ou
acusados.
6. O Estado deve adotar as medidas necessárias para que o Estado do Rio de Janeiro estabeleça metas e
políticas de redução da letalidade e da violência policial.
7. O Estado deve implementar, em prazo razoável, um programa ou curso permanente e obrigatório so-
bre atenção a vítimas de violência sexual, dirigido a todos os níveis hierárquicos das Polícias Civil e Militar do
Rio de Janeiro e a funcionários de atenção de saúde. Como parte desta formação, deve-se incluir a presente
sentença, a jurisprudência da Corte Interamericana sobre violência sexual e tortura, assim como os parâmet-
ros internacionais em matéria de atenção a vítimas e investigação desse tipo de casos.
8. O Estado deve adotar as medidas legislativas ou de outra índole necessárias para permitir às vítimas de
delitos ou seus familiares a participarem, de maneira formal e efetiva, na investigação realizada pela polí-
cia ou pelo Ministério Público.
9. O Estado deve adotar as medidas necessárias para uniformizar a expressão “lesão corporal ou homicí-
dio decorrente de intervenção policial” nos documentos e investigações realizadas pela polícia ou pelo Min-
istério Público em casos de mortes ou lesões provocadas pela atuação policial. O conceito de “oposição” ou
“resistência” à atuação policial deve ser abolido.”

4.15 Povo Indígena Xucuru e seus membros vs. BRASIL


*[Atualizado em 25/06/2020]

No Caso dos Povos Indígenas Xucuru, a CorteIDH firmou o entendimento de que no Brasil existe uma
morosidade por parte do aparelhamento estatal em demarcar e reconhecer as terras dos povos indígenas.
A Comissão Interamericana denunciou o Brasil à Corte por essa morosidade em 2016, alegando
violação ao direito de propriedade e integridade pessoal desses povos, uma vez que a relação com a terra esta
intrinsecamente ligada ao reconhecimento pessoal e à subsistência cultural dos povos indígenas.

#SELIGA: O procedimento de reconhecimento e demarcação dessas terras começou em 1989 e foi até 2005.
“Em outubro de 2015, a CIDH concedeu ao Brasil um prazo de dois meses para in formar sobre o avanço no
cumprimento de recomendações, entre elas adotar as medidas necessárias para completar o saneamento e
colocar um ponto final em processos judiciais contra líderes indígenas. O Brasil não ofereceu essas
informações. O caso chegou até a jurisdição contenciosa da Corte IDH.
Na jurisdição da Corte, a CIDH alegou que o Estado brasileiro violou a CADH em virtude do não
reconhecimento como terra indígena do local habitado pela comunidade indígena Xucuru, bem como em
razão da demora injustificada no processo administrativo e judicial de demarcação de terras indígenas. O
Estado brasileiro aduziu que não violou nenhum dispositivo da CADH.”24

O Brasil foi condenado pela CorteIDH por violar o dever de respeitar, as garantias judiciais, o direito à
propriedade e a proteção judicial, de acordo com as obrigações internacionais veiculadas na Convenção
Americana de Direitos Humanos.

4.16 Luiza Melinho vs. BRASIL


*[Atualizado em 25/06/2020]

Em 2016, a Comissão Interamericana aprovou um relatório de admissibilidade do caso com


fundamento na violação, pelo Estado brasileiro, de direitos humanos ao negar a realização de cirurgia de
afirmação sexual no âmbito do SUS (ou custeada por hospital privado) à Luiza Melinho. Tal conduta, segundo a
Comissão, violou a dignidade de Luiza e colocou em risco sua vida e integridade física.

#OLHAOGANCHO:25 “Oferecimento da cirurgia de afirmação sexual pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Conforme o entendimento da Corte IDH, “O reconhecimento da afirmação da identidade sexual e de gênero
como uma manifestação da autonomia pessoal é um elemento constituinte e constitutivo da identidade das
pessoas que se encontra protegido pela Convenção Americana em seus artigos 7º e 11.2” (OC-24/2017, § 101-
d). Em seu relatório de admissibilidade no Caso Luiza Melinho, a CIDH também afirmou que “(...) a orientação
24
Fonte: Jurisprudência Internacional de Direitos Humanos, 3ª Edição, 2020, Editora CEI, CAIO PAIVA e THIMOTIE
ARAGON.
25
Fonte: Jurisprudência Internacional de Direitos Humanos, 3ª Edição, 2020, Editora CEI, CAIO PAIVA e THIMOTIE
ARAGON.
sexual, a identidade de gênero e a não discriminação por motivos de gênero são componentes fundamentais
da vida privada das pessoas” (§ 149). Assim, embora a Corte IDH tenha estabelecido na OC-24/2017 que o pro -
cedimento de solicitação de mudança de nome, adequação da imagem e retificação da referência ao sexo ou
gênero nos registros e documentos de identidade não exige a intervenção cirúrgica para adaptar a aparência
físico-biológica da pessoa à sua realidade psíquica, espiritual e social (§ 146), quando a pessoa trans prefira a
realização da cirurgia de afirmação sexual, esta deve ser oferecida pelo sistema público de saúde. Este é o en -
tendimento que nos parece que a CIDH irá adotar quando da aprovação do relatório de mérito no Caso Luiza
Melinho.
Sobre o tema, consideramos oportuno transcrever a ementa de julgamento do TRF4, em ação civil pública
ajuizada pelo Ministério Público Federal, na qual, com atribuição de eficácia nacional ao provimento decisório,
o Poder Judiciário obrigou a União a incluir na tabela do SUS os procedimentos médicos de transgenitalização
(também chama de cirurgia de afirmação sexual ou de cirurgia de redesignação sexual):
“(...)
1. A exclusão da lista de procedimentos médicos custeados pelo Sistema Único de Saúde das cirurgias de trans -
genitalização e dos procedimentos complementares, em desfavor de transexuais, configura discriminação
proibida constitucionalmente, além de ofender os direitos fundamentais de liberdade, livre desenvolvimento da
personalidade, privacidade, proteção à dignidade humana e saúde.
2. A proibição constitucional de discriminação por motivo de sexo protege heterossexuais, homossexuais, tran-
sexuais e travestis, sempre que a sexualidade seja o fator decisivo para a imposição de tratamentos desfa-
voráveis.
3. A proibição de discriminação por motivo de sexo compreende, além da proteção contra tratamentos desfa-
voráveis fundados na distinção biológica entre homens e mulheres, proteção diante de tratamentos desfa-
voráveis decorrentes do gênero, relativos ao papel social, à imagem e às percepções culturais que se referem à
masculinidade e à feminilidade.
4. O princípio da igualdade impõe a adoção do mesmo tratamento aos destinatários das medidas estatais, a
menos que razões suficientes exijam diversidade de tratamento, recaindo o ônus argumentativo sobre o cabi-
mento da diferenciação. Não há justificativa para tratamento desfavorável a transexuais quanto ao custeio
pelo SUS das cirurgias de neocolpovulvoplastia e neofaloplastia, pois (a) trata-se de prestações de saúde ade-
quadas e necessárias para o tratamento médico do transexualismo e (b) não se pode justificar uma discrimi-
nação sexual (contra transexuais masculinos) com a invocação de outra discriminação sexual (contra transexu-
ais femininos).
5. O direito fundamental de liberdade, diretamente relacionado com os direitos fundamentais ao livre desen-
volvimento da personalidade e da privacidade, concebendo os indivíduos como sujeitos de direito ao invés de
objetos de regulação alheia, protege a sexualidade como esfera da vida individual livre da interferência de ter-
ceiros, afastando imposições indevidas sobre transexuais, mulheres, homossexuais e travestis.
6. A norma de direito fundamental que consagra a proteção à dignidade
humana requer a consideração do ser humano como um fim em si mesmo, ao invés de meio para a realização
de fins e de valores que lhe são externos e impostos por terceiros; são inconstitucionais, portanto, visões de
mundo heterônomas, que imponham aos transexuais limites e restrições indevidas, com repercussão no acesso
a procedimentos médicos.
(...)
10. A inclusão dos procedimentos médicos relativos ao transexualismo, dentre aqueles previstos na Tabela SIH-
SUS, configura correção judicial diante de discriminação lesiva aos direitos fundamentais de transexuais, uma
vez que tais prestações já estão contempladas pelo sistema público de saúde.
11. Hipótese que configura proteção de direito fundamental à saúde derivado, uma vez que a atuação judicial
elimina discriminação indevida que impede o acesso igualitário ao serviço público.
12. As cirurgias de transgenitalização não configuram ilícito penal, cuidando-se de típicas prestações de saúde,
sem caráter mutilador.
13. As cirurgias de transgenitalização recomendadas para o tratamento do transexualismo não são procedi-
mentos de caráter experimental, conforme atestam Comitês de Ética em Pesquisa Médica e manifestam Res -
oluções do Conselho Federal de Medicina.
14. A limitação da reserva do possível não se aplica ao caso, tendo em vista a previsão destes procedimentos
na Tabela SIH-SUS vigente e o muito reduzido quantitativo de intervenções requeridas.
(...)
17. Conforme precedentes do Supremo Tribunal Federal e deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, é pos-
sível a atribuição de eficácia nacional à decisão proferida em ação civil pública, não se aplicando a limitação do
artigo 16 da Lei nº 7.347/85 (redação da Lei nº 9.494/97), em virtude da natureza do direito pleiteado e das
graves consequências da restrição espacial para outros bens jurídicos constitucionais.
18. Apelo provido, com julgamento de procedência do pedido e imposição de multa diária, acaso descumprido
o provimento judicial pela Administração Pública” (Apelação Cível nº 2001.71.00.026279-9, rel. desembar-
gador federal Roger Raupp Rios, 3ª Turma, j. 14.08.2007).
Finalmente, embora nos pareça mais adequado aguardar o posicionamento da CIDH sobre o mérito do Caso
Luiza Melinho para aprofundar em outros assuntos envolvendo a cirurgia de afirmação sexual, já nos anteci-
pamos para indicar que o período pré-operatório (prazo mínimo, prazo máximo, exceções etc.) certamente
será objeto de apreciação pela CIDH, conforme se vê no trecho abaixo, extraído do relatório de admis -
sibilidade do Caso Luiza Melinho:
“(...) a CIDH observa que a resolução do CFM-BR estabelece que a supervisão médica deve ser conduzida
durante um período mínimo de dois anos, sem estabelecer um prazo máximo para esta supervisão e sem
permitir que o prazo seja menor em circunstâncias particulares. Neste sentido, a CIDH anota que no caso
Schlumpf v. Suíça o Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH), ao analisar a imposição de prazos para a
realização de uma cirurgia de afirmação sexual sem levar em conta as circunstâncias individuais de cada caso,
afirmou que a imposição destes prazos pode conduzir a uma violação do direito à vida privada” (§ 53).”

DISPOSITIVOS PARA CICLOS DE LEGISLAÇÃO

DIPLOMA DISPOSITIVO
Convenção Americana sobre Direitos Humanos Integralmente
(Pacto de São José da Costa Rica – Decreto 678/92)
Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Arts. 1, 2, 3, 4, 5 e 12.
Tortura

BIBLIOGRAFIA UTILIZADA

Apostila Lordelo.

Foca no Resumo.

Paulo Henrique Gonçalves Portela.

André de Carvalho Ramos.

Informativos STF e STJ do Dizer o Direito.

Resumo do TRF5.

Resumos do Ponto a Ponto Concursos (Danilo Guedes).

Jurisprudência Internacional de DH de Caio Paiva e Thimotie Aragon Heemann.

Você também pode gostar