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FUNDAÇÃO ESCOLA SUPERIOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Curso Preparatório para o 5º Programa de


Residência Jurídica da DPERJ

Direitos Humanos
Professor Luís Henrique Linhares Zouein
FUNDAÇÃO ESCOLA SUPERIOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Curso Preparatório para o 5º Programa de


Residência Jurídica da DPERJ
Direitos Humanos: introdução ao Sistema
Interamericano.
Professor Luís Henrique Linhares Zouein
Introdução ao Sistema Interamericano de Direitos Humanos:
• Origem histórica (1948):
• Nona Conferência Internacional Americana, realizada em Bogotá.

• Carta da OEA (Carta de Bogotá) de 1948:


• Poucas disposições sobre direitos humanos.
• Art. 3.1 da Carta da OEA: “Os Estados americanos proclamam os direitos fundamentais da pessoa humana,
sem fazer distinção de raça, nacionalidade, credo ou sexo”.
• Não estabeleceu um rol significativo de direitos em espécie.
• Não previu, inicialmente, mecanismos de proteção.

• Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem (DADDH), também de 1948 – anterior à DUDH!
• Formalmente, não possui natureza de tratado.
• Não previu mecanismos de proteção.
• Prevê direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais em espécie.
• Opinião Consultiva n. 10 (Corte IDH), de 1989:
• (i) a Declaração Americana consiste em interpretação autêntica do sentido e alcance do conceito de
direitos humanos positivado na Carta da OEA;
• (ii) a Declaração é fonte de obrigações internacionais dos Estados-membros da OEA.
Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969):
• Editada em 1969.

• Entrada em vigor em 1978.

• Internalizada pelo Brasil em 1992.


• Posição do STF: status supralegal (DPESE / Cespe / 2022).

• Estrutura da CADH:
• Parte I: deveres dos Estados e direitos protegidos.
• Parte II: meios de proteção.

• Ressignificou a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

• Criou a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH).

• Incidência “de natureza convencional, coadjuvante ou complementar” (2º considerando da CADH).

• Existência de 2 “subsistemas”:
• Subsistema da OEA.
• Subsistema da CADH.
• Círculos concêntricos?
Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969):
• “Em primeiro lugar, trata-se de um sistema engendrado no seio da
própria OEA e que conta inclusive com a participação ativa de um órgão
principal da OEA, que é a Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
• Em segundo lugar, o financiamento do sistema da Convenção é feito pela
OEA e os membros do segundo sistema são, sem exceção, membros do
primeiro.
• Em terceiro lugar, as regras do primeiro sistema são subsidiariamente
aplicáveis ao segundo, de acordo com o disposto no artigo 29, ‘b’ da
Convenção Americana (...).
• Na realidade, temos dois círculos concêntricos: um círculo amplo
composto pelo sistema da Carta da OEA, com 35 Estados dessa
Organização; um círculo menor, composto por 23 Estados, que
ratificaram a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH).
• Os dois sistemas comungam, na essência, da mesma origem, a OEA. A
diferença está no compromisso mais denso firmado pelos integrantes
do segundo sistema, que conta inclusive com um tribunal especializado
em direitos humanos, a Corte Interamericana de Direitos Humanos”.
• RAMOS, André de Carvalho. Processo Internacional de Direitos Humanos: análise dos
mecanismos de apuração de violação de direitos humanos e a implementação das
decisões no Brasil. São Paulo: SaraivaJur, 2022, p. 221-222.
Órgão de proteção do SIDH:
PARTE II
MEIOS DA PROTEÇÃO

CAPÍTULO VI
ÓRGÃOS COMPETENTES

Artigo 33

• São competentes para conhecer dos assuntos relacionados com o cumprimento dos compromissos assumidos
pelos Estados Partes nesta Convenção:

• a. a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, doravante denominada a Comissão; e

• b. a Corte Interamericana de Direitos Humanos, doravante denominada a Corte.


Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH):
• Origem:
• Não surge com a redação originária da Carta da OEA (1948).
• Criada, inicialmente, em 1959, por meio de “mera resolução”, na Quinta Reunião de Consulta de Ministros
de Relações Exteriores, no Chile (sem base convencional).
• “Convencionalizada” em 1967, pelo Protocolo de Buenos Aires.
• Obs: entrada em vigor em 1970.
• Instalação “de fato” em 1979.

• Natureza jurídica: órgão administrativo ou “quase judicial”.

• Órgão intergovernamental autônomo e independente.


• “Em resumo, a Comissão é um órgão principal da OEA, porém autônomo, pois seus membros atuam com
independência e imparcialidade, não representando o Estado de origem.” (André de Carvalho Ramos)

• CIDH como o “Ministério Público Interamericano” (Siddharta Legale; André de Carvalho Ramos).
Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH):
• Funções:
• Art. 106 da Carta da OEA: “Haverá uma Comissão Interamericana de Direitos Humanos que terá por principal função promover o respeito e a defesa
dos direitos humanos e servir como órgão consultivo da Organização em tal matéria.” – DPERO / Cespe / 2023.
• Art. 41 da CADH:
• a. estimular a consciência dos direitos humanos nos povos da América;
• b. formular RECOMENDAÇÕES aos governos dos Estados membros, quando o considerar conveniente, no sentido de que adotem medidas
progressivas em prol dos direitos humanos no âmbito de suas leis internas e seus preceitos constitucionais, bem como disposições
apropriadas para promover o devido respeito a esses direitos;
• c. preparar os estudos ou relatórios que considerar convenientes para o desempenho de suas funções;
• d. solicitar aos governos dos Estados membros que lhe proporcionem informações sobre as medidas que adotarem em matéria de direitos
humanos;
• e. atender às consultas que, por meio da Secretaria-Geral da Organização dos Estados Americanos, lhe formularem os Estados membros sobre
questões relacionadas com os direitos humanos e, dentro de suas possibilidades, prestar-lhes o assessoramento que eles lhe solicitarem;
• f. atuar com respeito às petições e outras comunicações, no exercício de sua autoridade, de conformidade com o disposto nos artigos 44 a 51
desta Convenção; e
• g. apresentar um relatório anual à Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos.

• “Funções ambivalentes ou bifrontes” (Valerio Mazzuoli) ou “papel dúplice” (Caio Paiva):


• Órgão da OEA (art. 53.e da Carta da OEA).
• Órgão da CADH.

• Atribuição sobre todos países membros da OEA (art. 35 da CADH).

• Sede: Washington D.C (Estados Unidos).


O “mandato transformador da CIDH”:
• “i) a absoluta centralidade das vítimas (razão de ser do
sistema interamericano, o que justifica e legitima sua
existência mesma);
• ii) o corpus juris interamericano (como um patrimônio
civilizatório regional abarcando os estandares
interamericanos); e
• iii) o instituto da reparação integral (violações estruturais
apresentam causas estruturais, o que demanda a incidência
transformadora do sistema interamericano mediante
garantias de não repetição capazes de impulsionar
mudanças estruturais em políticas públicas e marcos
normativos).”
• PIOVESAN, Flávia. Comissão Interamericana de Direitos Humanos e seu mandato
transformador. In: (Orgs) Piovesan, Flávia; Legale, Siddharta. Os casos do Brasil na
Comissão Interamericana de Direitos Humanos (p. 27). NIDH - UFRJ. Edição do
Kindle.
Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH):
• Composição e requisitos (art. 34 da CADH):
• 7 membros.
• Não pode fazer parte da Comissão mais de um nacional de um mesmo Estado (art. 37.2 da
CADH).
• Requisito 1: alta autoridade moral.
• Requisito 2: reconhecido saber em matéria de direitos humanos.
• Obs: desnecessidade de formação jurídica.
• Ex: Paulo de Tarso Vannuchi, brasileiro, cientista político e jornalista

• Eleição e mandato dos comissionados:


• Lista de candidatos proposta pelos Estados-membros da OEA (art. 36.1 da CADH).
• Cada Estado pode propor ATÉ 3 candidatos, nacionais seus ou não, desde que de países
membros (art. 36.2 da CADH).
• Contudo, quando proposta lista tríplice, ao menos 1 deve ser nacional (art. 36.2 da CADH).
• Eleitos a título individual pela Assembleia Geral da OEA (Art. 36.1 da CADH).
• Mandato de 4 anos (art. 37.1 da CADH).
• Possibilidade de 1 única reeleição (art. 37.1 da CADH).

• A Comissão conta com uma Secretaria Executiva (art. 11 do Regulamento da CIDH).


• Dentre outras funções: receber e fazer tramitar as petições e comunicações dirigidas à CIDH (art.
13 do Regulamento da CIDH). Endereçamento!!!

• Possibilidade de instituir relatorias ou grupos de trabalhos específicos, por país ou por tema (art. 15
do Regulamento da CIDH).
Relatorias temáticas da CIDH:
1. Relatoria sobre os Direitos dos Povos Indígenas, criada em 1990;
2. Relatoria sobre Direitos da Mulher, criada em 1994;
3. Relatoria sobre os Direitos dos Pessoas Migrantes, criada em 1996;
4. Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão, criada em 1997; (DPEPB / FCC / 2022)
5. Relatoria sobre dos Direitos da Criança e Adolescentes, criada em 1998;
6. Relatoria sobre Defensores de Direitos Humanos, criada em 2001;
7. Relatoria sobre os Direitos das Pessoas Privadas de Liberdade, criada em 2004;
8. Relatoria sobre os Direitos dos Afrodescendentes e contra a Discriminação Racial, criada em
2005;
9. Relatoria sobre os Direitos de Pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans e Intersex, criada em
2014;
10. Relatoria Especial para Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais, criada em 2017;
11. Relatoria sobre Memória, Verdade e Justiça, criada em 2019;
12. Relatoria sobre os Direitos do Idoso, criada em 2019;
13. Relatoria sobre os Pessoas com Deficiência, criada em 2019.
Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH):
• Origem:
• Órgão criado pela CADH (1969).
• Nascimento em 1978 (com a entrada em vigor da CADH).
• Início efetivo dos trabalhos em 1982 (primeiras manifestações).

• Natureza jurídica: órgão jurisdicional.


• “Tribunal supranacional interamericano” (Valerio Mazzuoli).

• Missão convencional: “guardiã da Convenção Americana”.

• Órgão da CADH (não da OEA).

• Sede: São José da Costa Rica.


• Obs: “poderá realizar reuniões no território de qualquer Estado membro da
Organização dos Estados Americanos em que o considerar conveniente pela
maioria dos seus membros e mediante prévia aquiescência do Estado respectivo.”
(art. 58 da CADH)

• Necessidade de adesão expressa dos Estados à jurisdição da Corte IDH (art. 61 da


CADH).
• Jurisdição contenciosa FACULTATIVA.
• Adesão do Brasil à jurisdição da Corte IDH: 10 de dezembro de 1998.
• Obs: jurisdição consultiva a serviço de qualquer Estado da OEA (art. 64 da CADH).

• Jurisdição contenciosa vs. consultiva.


Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH):
• Composição e requisitos (art. 52 da CADH):
• 7 membros.
• Não deve haver dois juízes da mesma nacionalidade (art. 52.2 da CADH).
• Requisito 1: ser nacional de Estado-membro da OEA.
• Obs: país não precisa ser signatário da CADH.
• Requisito 2: ser jurista da mais alta autoridade moral.
• Obs: formação jurídica obrigatória.
• Requisito 3: reconhecida competência em matéria de direitos humanos.
• Requisito 4: “reúnam as condições requeridas para o exercício das mais elevadas funções judiciais, de acordo com a lei do Estado do qual sejam
nacionais, ou do Estado que os propuser como candidatos.”
• Ex: ter mais de 35 anos (art. 101 da CRFB).

• Eleição e mandato dos juízes:


• Lista de candidatos proposta pelos Estados-membros da OEA (art. 53 da CADH).
• Cada Estado pode propor até 3 candidatos, nacionais seus ou não, desde que de países membros (art. 53.2 da CADH).
• Contudo, quando proposta lista tríplice, ao menos 1 deve ser nacional (art. 53.2 da CADH).
• Eleitos a título pessoal (art. 52.1 da CADH) pela Assembleia Geral da OEA (Art. 53.1 da CADH).
• Opinião Consultiva n. 20/09: o juiz nacional do Estado demandado não deve participar do conhecimento de casos contenciosos originados de
petições individuais.
• Mandato de 6 anos (art. 54.1 da CADH).
• Possibilidade de 1 única reeleição (art. 54.1 da CADH).
Breves notas sobre devido processo interamericano:
• Quem pode levar casos à CIDH? Art. 44 da CADH:
• 1. Qualquer pessoa;
• 2. Grupo de pessoas;
• 3. Entidade não-governamental (legalmente reconhecida em um ou mais Estados da OEA).
• E a Defensoria Pública? Pro persona (art. 29 da CADH) c/c art. 134 da CRFB e 4º da LC n. 80/94.
• 4. Estado Parte contra outro Estado Parte, desde que ambos reconheçam esta possibilidade (art. 45 da
CADH).
• Procedimento individual perante a CIDH (obrigatório) vs. procedimento interestatal (facultativo).
• 5. *De ofício.

• Lembrete: para se levar um caso à CIDH, o Estado denunciado não precisa ser signatário da CADH.
• Estados signatários da CADH: principal fonte.
• Estados não signatários: Carta da OEA e Declaração Americana.

• Endereçamento: Secretaria Executiva (art. 26.1 c/c 29.1 do Regulamento da CIDH).


Breves notas sobre devido processo interamericano:
• Defesa do Estado (art. 30.2 do Regulamento da CIDH).

• Requisitos de admissibilidade (art. 46.1 da CADH):


• (i) esgotamento dos recursos internos (DPEPI / Cespe / 2022);
• Manifestação do caráter subsidiário do SIDH.
• Princípio do estoppel.
• (ii) prazo de 6 meses, “a partir da data em que o presumido prejudicado em seus direitos tenha sido notificado da decisão
definitiva”;
• Cuidado! Obrigações permanentes.
• (iii) ausência de litispendência ou coisa julgada internacional.
• Apenas mecanismos convencionais.

• Exceções (art. 46.2 da CADH):


• As disposições das alíneas a e b do inciso 1 deste artigo não se aplicarão quando:
• a. não existir, na legislação interna do Estado de que se tratar, o devido processo legal para a proteção do direito ou direitos
que se alegue tenham sido violados;
• b. não se houver permitido ao presumido prejudicado em seus direitos o acesso aos recursos da jurisdição interna, ou houver
sido ele impedido de esgotá-los; e
• c. houver demora injustificada na decisão sobre os mencionados recursos.
• A petição deverá ser apresentada dentro de um “prazo razoável” (art. 32.2 do Regulamento da CIDH).
Breves notas sobre devido processo interamericano: CIDH (art. 48 da CADH).
• Impedimento do comissionado se for cidadão do Estado objeto da consideração (art. 17.2 do Regulamento da CIDH).

• Possibilidade de proferir “medidas cautelares” (art. 25 do Regulamento da CIDH):


• Ausência de previsão convencional: vinculantes?
• Por iniciativa própria ou a pedido de parte (art. 25.1 do Regulamento).
• Requisitos:
• (i) Situações de gravidade;
• (ii) Urgência;
• (iii) Risco de dano irreparável;
• Às pessoas ou ao objeto de uma petição ou caso pendente nos órgãos do Sistema Interamericano.
• Possibilidade de medida cautelar autônoma.
• CIDH deve fiscalizar o cumprimento da medida cautelar deferida (art. 25.9 do Regulamento).
• CIDH pode requerer medidas provisórias à Corte IDH (art. 63.2 da CADH c/c artigos 25.12 e 76 do Regulamento da
CIDH).

• Decisão de admissibilidade (art. 36.1 do Regulamento da CIDH).


• E se a demanda for considerada inadmissível? IRRECORRÍVEL.
• Se admitida, a “petição” se torna um “caso”.
Breves notas sobre devido processo interamericano: CIDH (art. 48 da CADH).

• Possibilidade de solução amistosa (art. 48.1.f c/c 49 da CADH).

• Além da prova documental, admite-se a produção de prova testemunhal, por exemplo (art. 39.2 c/c art.
64 do Regulamento da CIDH).

• Relatório de mérito (art. 50 da CADH):


• Inicialmente, sigiloso (art. 50.2 da CADH) – “relatório preliminar” ou “primeiro informe”.
• A Comissão pode formular as proposições e recomendações que julgar adequadas (art. 50.3 da CADH).
• Possibilidade de publicação (art. 51.3 da CADH) – “relatório definitivo” ou “segundo informe”.
• Manifestação vinculante? O Caso Lula e a decisão do TSE (Barroso vs. Fachin).

• Mesmo nos casos submetidos à Corte por um Estado, exige-se etapa prévia perante a CIDH (art. 61.2 da
CADH).

• Quanto aos Estados signatários da CADH: remessa à Corte IDH.


Breves notas sobre devido processo interamericano:
• Somente os Estados Partes e a Comissão têm direito de submeter caso à Corte (art. 61.1 da CADH).
• Ausência de jus standi (vs. Sistema Europeu): apenas locus standi.

• Legitimidade passiva: SEMPRE um Estado.

• Escrito de “petições, argumentos e provas” (art. 40 do Regulamento da Corte IDH).

• Defensor Interamericano.

• CIDH como “fiscal da ordem jurídica interamericana” (art. 57 da CADH).

• Possibilidade de a Corte IDH proferir medidas provisórias (art. 63.2 da CADH).


• Requisitos:
• (i) extrema gravidade;
• (ii) urgência;
• (iii) para evitar danos irreparáveis às pessoas.
• De ofício ou à pedido da CIDH (art. 63.2).
Breves notas sobre devido processo interamericano:
• Defesa do Estado (“contestação”).
• Possibilidade de alegar preliminares. Ex: incompetência da Corte IDH (questão).

• Possibilidade de ingresso de amicus curiae (art. 44 do Regulamento da Corte IDH).

• Quórum de deliberação na Corte IDH: 5 juízes (art. 56 da CADH).


• Impedimento do juiz se seu Estado de origem for réu (Opinião Consultiva n. 20/09).
• Deliberações, em regra, secretas (art. 15 do Regulamento da Corte IDH).

• Sentenças vinculantes!
• Definitivas e inapeláveis (art. 67 da CADH).
• Art. 68.1 da CADH: “Os Estados Partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes.”
• E se o Estado não for parte? “Res interpretata”.
• Art. 1º, inciso III, c/c 4º, inciso II, da CRFB: primazia dos direitos humanos.
• Art. 7º do ADCT: “O Brasil propugnará pela formação de um tribunal internacional dos direitos humanos.”
• Boa-fé e pacta sunt servanda (Convenção de Viena e CADH).
• Recomendação n. 123/22 do CNJ: “observância dos tratados e convenções internacionais de direitos humanos em vigor no Brasil e a utilização da
jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH)” (art. 1º, inciso I);
• Recomendação n. 96/23 do CNMP: reconhece expressamente “o efeito vinculante das decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos, nos casos em
que o Brasil é parte” (art. 2º, inciso II).

• Exequibilidade interna das decisões da Corte IDH:


• Sentença estrangeira vs. internacional.
• Dispensa de procedimento homologatório pelo STJ (DPEPI / Cespe / 2022).
• Art. 68.2 da CADH: “A parte da sentença que determinar indenização compensatória poderá ser executada no país respectivo pelo processo interno vigente
para a execução de sentenças contra o Estado.”
Imperatividade das decisões da Corte IDH:
"Tal decisão é ato de soberania dos Estados. Porém, uma vez
reconhecida a competência da Corte, ela se torna obrigatória e
irrevogável, a não ser nas hipóteses previstas para denúncia do Pacto
de San José. Nos termos do artigo 68.1 combinado com o artigo 20
da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), os Estados
afirmam que cumprirão integralmente a sentença proferida pela
Corte IDH e nenhum argumento de direito interno, tais como
prescrição e decadência, pode ser utilizado para afastar essa
obrigação. O descumprimento de sentença pela Corte per se gera
responsabilidade internacional. Mesmo que um Estado resolva
denunciar a CADH para evitar a obrigação de implementação de uma
sentença determinada, as possíveis violações que tenham chegado à
Corte IDH antes da denúncia serão examinadas e, possivelmente, a
responsabilidade internacional do Estado será declarada”.
BERNARDES, Nina Márcia. Sistema lnteramericano de Direitos Humanos Como Esfera Publica
Transnacional: Aspectos Jurídicos e Políticos da Implementação de Decisões Internacionais.
Revista Internacional de Direitos Humanos. V 8. 15 de dezembro de 2011, p. 147
Ano: 2022 Banca: FCC Órgão: DPE-AP
• A função consultiva da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), conforme previsão da normativa
internacional na interpretação que lhe dá a própria Corte IDH, pode ser demandada,

• A) por Estado-membro da Organização dos Estados Americanos que não seja parte no Pacto de São José da Costa Rica, entre
outros legitimados, podendo versar sobre a compatibilidade de decisões das cortes constitucionais dos Estados
subordinados à sua jurisdição com a Convenção Americana e outros tratados de direitos humanos.
• B) pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e pelos comitês temáticos da Organização dos Estados Americanos,
entre outros legitimados, podendo versar sobre a interpretação da própria Convenção Americana sobre Direitos Humanos e
outros diplomas regionais, excetuada a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem.
• C) apenas pelos Estados-membros da Organização dos Estados Americanos subordinados à jurisdição da Corte IDH, podendo
versar sobre a compatibilidade entre a normativa interamericana de direitos humanos e qualquer de suas leis internas,
excluídas normas de natureza constitucional.
• D) pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, entre outros legitimados, podendo versar sobre todos os tratados
internacionais de proteção dos direitos humanos, mesmo aqueles concluídos fora do contexto da Organização dos Estados
Americanos, desde que eles sejam aplicáveis em pelo menos um dos Estados-membros da Organização.
• E) apenas pelos Estados subordinados à jurisdição da Corte IDH, pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e pela
própria Corte IDH, de ofício, podendo versar sobre a interpretação da Convenção Americana ou de outros tratados
concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos.
Ano: 2022 Banca: FCC Órgão: DPE-AP
• A FUNÇÃO CONSULTIVA da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), conforme previsão da normativa
internacional na interpretação que lhe dá a própria Corte IDH, pode ser demandada,

• A) por Estado-membro da Organização dos Estados Americanos que não seja parte no Pacto de São José da Costa
Rica, entre outros legitimados, podendo versar sobre a compatibilidade de decisões das cortes constitucionais dos
Estados subordinados à sua jurisdição com a Convenção Americana e outros tratados de direitos humanos.
• B) pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e pelos comitês temáticos da Organização dos Estados
Americanos, entre outros legitimados, podendo versar sobre a interpretação da própria Convenção Americana sobre
Direitos Humanos e outros diplomas regionais, excetuada a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem.
• C) apenas pelos Estados-membros da Organização dos Estados Americanos subordinados à jurisdição da Corte IDH,
podendo versar sobre a compatibilidade entre a normativa interamericana de direitos humanos e qualquer de suas
leis internas, excluídas normas de natureza constitucional.
• D) pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, entre outros legitimados, podendo versar sobre TODOS os
tratados internacionais de proteção dos direitos humanos, mesmo aqueles concluídos fora do contexto da
Organização dos Estados Americanos, desde que eles sejam aplicáveis em pelo menos um dos Estados-membros da
Organização. (assertiva a ser marcada)
• E) apenas pelos Estados subordinados à jurisdição da Corte IDH, pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e
pela própria Corte IDH, de ofício, podendo versar sobre a interpretação da Convenção Americana ou de outros
tratados concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos.
Competência consultiva da Corte IDH:
• Fundamento convencional da jurisdição consultiva (art. 64 da CADH):
• 1. Os Estados membros da Organização poderão consultar a Corte sobre a interpretação desta Convenção ou de outros tratados
concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos. Também poderão consultá-la, no que lhes compete, os
órgãos enumerados no capítulo X da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires.
• 2. A Corte, a pedido de um Estado membro da Organização, poderá emitir pareceres sobre a compatibilidade entre qualquer de
suas leis internas e os mencionados instrumentos internacionais.

• Legitimados:
• (i) Comissão;
• (ii) Estados-membros da OEA (incluindo aqueles que não sejam partes da CADH);
• (iii) assim como órgãos da OEA a respeito de matérias de sua competência.
• Obs: impossibilidade de iniciar OC de ofício.

• Parâmetro: QUALQUER tratada internacional de que os países membros sejam signatários (inclusive do sistema global).
• (i) CADH;
• (ii) outros tratados do Sistema Interamericano;
• (iii) outras convenções de direitos humanos que se apliquem nas Américas por terem sido retificados pelo Estado envolvido,
mesmo que Estados de outras regiões também sejam partes.

• “Controle prévio de convencionalidade.” (Siddharta Legale)


FUNDAÇÃO ESCOLA SUPERIOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Curso Preparatório para o 5º Programa de


Residência Jurídica da DPERJ
Aspectos sobre Justiça de Transição.

Professor Luís Henrique Linhares Zouein


Pergunta:
“Como devem as sociedades lidar com seus passados perversos?”
(Emilio Peluso Neder Meyer)
Introdução:
• Conceito:
• “A chamada ‘justiça de transição’ (transitional justice) é aquela situada no contexto da passagem de um regime autoritário para um
regime democrático, buscando confrontar um passado de abusos e violência com um futuro de esperança e respeito aos direitos
humanos. Trata-se do conjunto de mecanismos (judiciais e não judiciais) destinados a enfrentar o legado de violência em massa
cometida no passado, para o fim de responsabilizar os culpados e exigir a efetividade dos direitos à verdade, à memória, à justiça, à
reparação devida e às reformas institucionais.” (Valerio Mazzuoli)
• “Não se trata, portanto, de um conceito jurídico qualquer, mas que envolve uma complexa relação entre o passado e o futuro de
uma democracia.” (Emilio Peluso Neder Meyer)

• A Justiça de Transição na América Latina:


• “(...) o contexto vivido pela América Latina faz prosperar a concordância quanto à necessidade da Justiça de Transição: fato é que
diversos Estados da América Latina foram marcados por governos autoritários especialmente nas décadas de 1970 e 1980, aos quais
se sucederam processos de democratização; contexto que impôs e impõe desafios ligados aos direitos de memória, verdade e justiça
ainda nos dias atuais. É precisamente porque a América Latina ainda luta pela consolidação da democracia e da paz que se entende
que a Justiça de Transição se apresenta, regionalmente, como uma ‘demanda em ebulição’.” (Bernardo Gonçalves)

• A peculiaridade brasileira:
• “Entre as ditaduras do Cone Sul, o Brasil é o país que menos evoluiu em termos de justiça de transição. (...) o processo brasileiro,
desde o ponto de vista do Estado, segue privilegiando o tema das reparações (...). Contudo, é o único país do Cone Sul que ainda não
julgou criminalmente políticos. (...) os militares seguem comemorando a ‘Revolução de 64’ todo dia 31 de março, os desaparecidos
seguem desaparecidos e seus familiares sem nenhum acesso a qualquer informação sobre seu paradeiro. Práticas estas que seguem
presentes na violência policial contra pessoas que habitam os bairros mais pobres, como as favelas do Rio de Janeiro.” (Renata
Tavares)
Elementos, dimensões ou facetas da justiça de transição:
• 1. Direito à verdade;

• 2. Direito à memória;
• Direito ao luto?

• 3. Direito à reparação;

• 4. Direito à justiça;

• 5. Dever de reforma das instituições.


1 e 2. Direito à verdade e à memória:
• Conceito:
• “O direito à verdade e à memória nada mais é do que uma busca de toda informação ou esclarecimento de interesse
público para que a população saiba o que realmente aconteceu ou não durante o período do regime antidemocrático.”
(Caio Paiva)
• Obs: “(...) é possível afirmar que a busca pela verdade é a mais importante obrigação do Estado depois de períodos
autoritários.” (Renata Tavares)

• Destinatários do direito à verdade:


• “Não só, porém, as vítimas de violações a direitos humanos (ou seus familiares) têm o direito de saber a verdade histórica
dos atos contrários ao direito internacional cometidos por agentes do Estado, senão também toda a coletividade, pois este
é assunto de interesse público nacional.” (Valerio Mazzuoli)
• “Some-se a isto a necessidade histórica de um povo de saber como os governos autoritários transformaram as forças
estatais em uma máquina de violação sistemática de direitos humanos que não acabaram com as ditaduras.” (Renata
Tavares)

• O direito à verdade e à memória como formas de reparação:


• “(...) em situações de violações graves de direitos humanos, esses direitos se apresentam como uma forma de reparação, na
medida em que permitem o reconhecimento da importância valorativa das pessoas como indivíduos, vítimas e sujeitos de
direitos.” (Bernardo Gonçalves)
Direito à verdade e à memória:
• A verdade como medida de não-repetição:
• “(...) a busca pela verdade sobre as violações massivas de direitos humanos do passado permite à sociedade e às
suas gerações futuras que reconheçam e ofereçam resistência frente um possível retorno de práticas autoritárias
e abusivas.” (Bernardo Gonçalves)

• Direito à memória vs. direito ao esquecimento:


• “Assim, o direito à verdade e à memória retrata uma verdadeira luta contra o esquecimento”. (Caio Paiva)

• “(...) as atrocidades cometidas pelo Estado nesta época, ‘devem ser relembradas, recordadas e jamais esquecidas,
pois fazem parte da identidade constitucional brasileira’.” (Bernardo Gonçalves)

• Direito ao esquecimento: “Se ele existe, certamente não se refere ao conhecimento das graves violações contra
os direitos humanos. (...) Invocar o ‘direito ao esquecimento’ em um caso como este cria um perigoso precedente
que pode ser utilizado para quaisquer outras graves violações de direitos humanos que venham a ser praticadas,
e que, pela sua própria natureza demandam a sua memória, não para a perpetuação do ressentimento ou para o
alimento da vingança (...), mas sim para que, ao mesmo tempo, se faça a justiça (não vingança) a crimes
imprescritíveis e para que não se repitam.” (Cristiano Paixão Araújo Pinto, Marcelo Cattoni, Emilio Peluso Meyer,
José Carlos Moreira da Silva Filho e Marcelo D. Torelly)
Direito à verdade e à memória:
• Comissão Nacional da Verdade e a Lei n. 12.528/11:
• Art. 1º É criada, no âmbito da Casa Civil da Presidência da República, a Comissão Nacional da Verdade, com a finalidade de examinar e esclarecer as
graves violações de direitos humanos praticadas no período fixado no art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a fim de efetivar o
direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional.
• Art. 3º São objetivos da Comissão Nacional da Verdade:
• I - esclarecer os fatos e as circunstâncias dos casos de graves violações de direitos humanos mencionados no caput do art. 1º ; (...)
• VI - recomendar a adoção de medidas e políticas públicas para prevenir violação de direitos humanos, assegurar sua não repetição e promover a
efetiva reconciliação nacional; e
• VII - promover, com base nos informes obtidos, a reconstrução da história dos casos de graves violações de direitos humanos, bem como colaborar
para que seja prestada assistência às vítimas de tais violações.
• Art. 4º, § 4º As atividades da Comissão Nacional da Verdade não terão caráter jurisdicional ou persecutório.

• Publicidade dos julgamentos do STM durante o período ditatorial:


• “A decisão proferida no julgamento do RMS 23.036 não restringiu o acesso dos então impetrantes aos documentos e arquivos fonográficos relacionados
às sessões públicas de julgamentos do STM ocorridas na década de 1970, assentando que todos os julgamentos seriam públicos e que as gravações dos
áudios dessas sessões deveriam ser disponibilizadas aos impetrantes, também no que se refere aos debates e votos proferidos pelos julgadores.
Injustificável a resistência que o STM tenta opor ao cumprimento da decisão emanada deste Supremo Tribunal, que afastou os obstáculos erigidos para
impedir fossem trazidos à lume a integralidade dos atos processuais lá praticados, seja oralmente ou por escrito, cujo conhecimento cidadãos brasileiros
requereram, para fins de pesquisa histórica e resguardo da memória nacional. O direito à informação, a busca pelo conhecimento da verdade sobre sua
história, sobre os fatos ocorridos em período grave contrário à democracia, integra o patrimônio jurídico de todo cidadão, constituindo dever do Estado
assegurar os meios para o seu exercício. A autoridade reclamada deve permitir o acesso do reclamante aos documentos descritos no requerimento
administrativo objeto da impetração, ressalvados apenas aqueles indispensáveis à defesa da intimidade e aqueles cujo sigilo se imponha para proteção
da sociedade e do Estado, o que há de ser motivado de forma explícita e pormenorizada pelo reclamado, a fim de sujeitar a alegação ao controle judicial.”
(Rcl 11.949, rel. min. Cármen Lúcia, j. 16-3-2017, P, DJE de 16-8-2017)
Direito à verdade e à memória
“Em suma, garantir o direito à verdade é impedir o
revisionismo histórico e o negacionismo das graves
violações de direitos humanos, estancando todas as
dúvidas sobre como efetivamente os fatos
ocorreram e quem foram os seus responsáveis,
impedindo, enfim, qualquer tentativa de revisar
negativamente a história ou de apagar a verdade
comprovada dos fatos. Também tem por finalidade
abrir uma nova perspectiva para o futuro, para que
violações como as do passado não mais se repitam
adiante. Daí a importância em se assegurar o acesso
à informação, especialmente (mas não
exclusivamente) às vítimas e seus familiares, sobre
os fatos ocorridos e sobre quem os cometeu.”
(Valerio Mazzuoli)
3. Direito à reparação:
• Reparação pecuniária: “Especificamente no Brasil, o tema das reparações está muito bem desenvolvido.” (Renata
Tavares)

• IMprescritibilidade da pretensão indenizatória em virtude de danos decorrentes da perseguição política na época


da ditadura militar:
• Súmula n. 647 do STJ: “São IMPRESCRITÍVEIS as ações indenizatórias por danos morais e materiais decorrentes de
atos de perseguição política com violação de direitos fundamentais ocorridos durante o regime militar.”
• Obs: “É possível cumular a indenização do dano moral com a reparação econômica da Lei nº 10.559/2002 (Lei da
Anistia Política).” (Súmula 624-STJ)
• “Segundo entendeu o Tribunal, o art. 16 é um comando dirigido, antes e unicamente, à Administração
Pública, e não à jurisdição. Em outras palavras, esse dispositivo proíbe que o Poder Público pague,
administrativamente, a reparação econômica cumulada com outros pagamentos, benefícios ou indenização.
Além disso, a reparação econômica prevista na Lei nº 10.559/2002 não tem por objetivo indenizar danos
morais.” (Dizer o Direito)

• Modalidades de reparação não pecuniária:


• “O direito à reparação das vítimas pode ocorrer de inúmeras maneiras, tais como: a publicação da sentença da
Corte IDH no Diário Oficial da União como pedido de desculpas; a descoberta do que efetivamente ocorreu no
período do regime antidemocrático; a localização dos corpos das vítimas do delito de desaparecimento forçado
no período ditatorial; a concessão de indenizações para familiares das vítimas etc.” (Caio Paiva)
4. Conexão entre direito à justiça e leis de (auto)anistia:
• “É a partir desta dimensão que se discute a validade ou não da Lei de Anistia
brasileira.” (Caio Paiva)

• “O jurista argentino Juan Méndez, presidente do International Center for


Transitional Justice, observa, contudo, que na América Latina o termo
reconciliação tem sido adotado de forma deturpada: ele implicaria na
ausência de medidas. Isto transformaria a reconciliação em impunidade: o
Estado não poderia se arrogar na posição de vítima e oferecer um perdão a
quem só poderia fazê-lo por um ato personalíssimo. Como observa Jacques
Derrida, para além do fato do perdão ser da competência da pura
singularidade da vítima, uma anistia geral paralisa e confirma a vítima em
seu destino de vítima.” (Emilio Peluso Neder Meyer)
Caso Barrios Altos vs. Peru (2001):
• Incompatibilidade das leis de autoanistia com a CADH:
• “No Caso Barrios Altos, a Corte Interamericana enfrentou pela primeira vez a questão das leis
de autoanistia como um obstáculo àquele dever de investigar e punir, oportunidade em que
afirmou serem inadmissíveis ‘(...) as disposições de anistia, as disposições de prescrição e o
estabelecimento de excludentes de responsabilidade que pretendam impedir a investigação
e punição dos responsáveis por graves violações de direitos humanos, tais como tortura,
execuções sumárias, extralegais ou arbitrárias e desaparecimentos forçados, todas elas por
violar direitos inderrogáveis reconhecidos pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos’.”
(Caio Paiva)

• O obiter dictum sobre a inconvencionalidade da prescrição quando se tratar de crimes que


impliquem em graves violações de direitos humanos:
• “(...) as disposições sobre prescrição não podem impedir a investigação e a punição de
autores de crimes que implicam em graves violações de direitos humanos.” (Caio Paiva)
A (im)prescritibilidade dos crimes contra a humanidade:
• 1ª corrente: a imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade é norma de jus cogens.
• Neste sentido: Ministro Edson Fachin; Emilio Peluso Neder Meyer; André de Carvalho Ramos; Valerio Mazzuoli; Caio Paiva.
• Ex: Caso Favela Nova Brasília e a reabertura das investigações pelo MPERJ.
• As decisões da Corte IDH são vinculantes e é esta a posição do Tribunal Interamericano.
• Enunciado n. 27 da I Jornada de Direito e Processo Penal, organizada pelo Conselho da Justiça Federal (CJF): “São
imprescritíveis e insuscetíveis de anistia, graça ou indulto crimes que caracterizem graves violações de direitos humanos,
praticados por agentes públicos ou particulares, diante da Convenção Americana de Direitos Humanos e da pacífica
jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, de observância obrigatória por todos os órgãos e poderes do
estado brasileiro.”
• Status supralegal da CADH e os “efeitos paralisantes” sobre o art. 107, inciso IV, do Código Penal.
• A Constituição já prevê hipóteses de imprescritibilidade (art. 5º, incisos XLII e XLIV, da CRFB).
• Internalização do Estatuto de Roma (TPI) pelo Brasil, que prevê a imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade.
A (im)prescritibilidade dos crimes contra a humanidade:
• 2ª corrente: impossibilidade do reconhecimento da imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade.

• A posição do STF: “(...) A circunstância de o Estado requerente ter qualificado os delitos imputados ao extraditando como de lesa-
humanidade não afasta a sua prescrição, porquanto (a) o Brasil não subscreveu a Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de
Guerra e dos Crimes contra a Humanidade, nem aderiu a ela; e (b) apenas lei interna pode dispor sobre prescritibilidade ou
imprescritibilidade da pretensão estatal de punir”. (STF. Plenário. Ext 1362, Rel. Min. Edson Fachin, Rel. p/ Acórdão Min. Teori Zavascki,
julgado em 09/11/2016)

• A posição do STJ: “O disposto na Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade não
torna inaplicável o art. 107, inciso IV, do Código Penal. (...) considerou-se inaplicável o jus cogens, prevalecendo o entendimento no
sentido de que a qualificação do crime como de lesa-humanidade não afasta a sua prescrição, porquanto: (a) o Brasil não subscreveu
a Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade, nem aderiu a ela; e (b) apenas lei
interna pode dispor sobre prescritibilidade ou imprescritibilidade da pretensão estatal de punir (...). Não se coaduna com a ordem
constitucional vigente, admitir a paralisação da eficácia da norma que disciplina a prescrição, com o objetivo de tornar imprescritíveis
crimes contra a humanidade, por se tratar de norma de direito penal que demanda, da mesma forma, a existência de lei em sentido
formal. Ademais, se deve igual observância ao princípio da irretroatividade. Portanto, não é possível tornar inaplicável o disposto no art.
107, IV, do CP, em face do disposto na Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade,
sob pena de se vulnerar o princípio constitucional da legalidade e da irretroatividade, bem como a própria segurança jurídica, com
consequências igualmente graves, em virtude da mitigação de princípios relevantes à própria consolidação do Estado Democrático de
Direito.” (STJ. 3ª Seção. REsp 1.798.903-RJ, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 25/09/2019 - Info 659).

• A peculiaridade do Caso Bulacio vs. Argentina e o denominado NEOPUNITIVISMO (Daniel Pastor).


A posição do Supremo Tribunal Federal na ADPF n. 153 (abril de 2010):
• Argumento 1: “A chamada Lei da Anistia veicula uma decisão
política assumida naquele momento – o momento da
transição conciliada de 1979.”

• Argumento 2: “caráter bilateral da anistia, ampla e geral”.

• Argumento 3: “A Lei 6.683 é uma lei-medida”.

• Argumento 4: “Revisão de lei de anistia, se mudanças do


tempo e da sociedade a impuserem, haverá – ou não – de ser
feita pelo Poder Legislativo, não pelo Poder Judiciário.”

ADPF 153, rel. min. Eros Grau, j. 29-4-2010, P, DJE de 6-8-2010.


Caso Gomes Lund e outros (“Guerrilha do Araguaia”) vs. Brasil (novembro de 2010):
• “A Lei de Anistia brasileira (Lei n. 6.683/1979) foi declarada inválida
pela Corte Interamericana na sentença relativa ao caso ‘Gomes Lund
e outros Vs. Brasil’, de 24 de novembro de 2010. Naquela ocasião,
entendeu a Corte que a Lei de Anistia brasileira, ao acobertar os
crimes cometidos pelos agentes do Estado durante o período da
ditadura militar (1964-1985), não se compatibiliza com a Convenção
Americana sobre Direitos Humanos.
• A ação deflagrada na Corte Interamericana, relativa ao caso ‘Gomes
Lund’, dizia respeito à detenção arbitrária, tortura e
desaparecimento forçado de 70 pessoas, entre membros do PCdoB e
camponeses na região do Araguaia, decorrentes de operações do
Exército brasileiro empreendidas entre 1972 e 1975, com o objetivo
de erradicar a chamada ‘Guerrilha do Araguaia’ no contexto da
ditadura militar brasileira. Ressalte-se que dos 70 desaparecidos no
Araguaia, só foram encontrados quatro corpos, todos graças à ação
de parentes. Pela sentença da Corte Interamericana, o Estado
brasileiro tem o dever de apurar esses delitos, processar e, se for o
caso, punir todos aqueles que praticaram crimes em nome do
Estado durante o período de repressão.” (Valerio Mazzuoli)
Caso Gomes Lund e outros (“Guerrilha do Araguaia”) vs.
Brasil e a ADPF n. 320:
• “Irresignado com a postura do Estado brasileiro diante da inércia e do não
cumprimento da decisão proferida pela Corte IDH no Caso Gomes Lund e
outros vs. Brasil, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), ingressou no dia
15 de maio de 2014 com uma ADPF no STF para que a corte máxima do
Judiciário brasileiro reconheça a validade e o efeito vinculante da decisão
proferida pela Corte IDH no caso da Guerrilha do Araguaia.” (Caio Paiva)
Repercussões da teoria do duplo controle:
• “(...) não há conflito insolúvel entre as decisões do STF e da Corte IDH (...).
Adoto assim a teoria do duplo controle ou crivo de direitos humanos, que
reconhece a atuação em separado do controle de constitucionalidade (STF
e juízos nacionais) e do controle de convencionalidade internacional (Corte
de San José e outros órgãos de direitos humanos no plano internacional).
(...)
• Com base nessa separação é possível dirimir o conflito aparente entre uma
decisão do STF e da Corte de San José. Assim, ao mesmo tempo em que se
respeita o crivo de constitucionalidade do STF, deve ser incorporado o crivo
de convencionalidade da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Todo
ato interno (não importa a natureza ou origem) deve obediência aos dois
crivos. Caso não supere um deles (por violar direitos humanos), deve o
Estado envidar todos os esforços para cessar a conduta ilícita e reparar os
danos causados. No caso da ADPF 153, houve o controle de
constitucionalidade. No caso Gomes Lund, houve o controle de
convencionalidade. A anistia aos agentes da ditadura, para subsistir,
deveria ter sobrevivido intacta aos dois controles, mas só passou (com
votos contrários, diga-se) por um, o controle de constitucionalidade. Foi
destroçada no controle de convencionalidade.” (André de Carvalho Ramos)
Caso Herzog e outros vs. Brasil (2018):
• Segunda condenação do Estado brasileiro na jurisdição contenciosa da Corte IDH por
fatos ocorridos durante o período da ditadura militar:
• “A condenação do Brasil no Caso Herzog simboliza a segunda sentença exarada pela
Corte IDH em desfavor do Brasil envolvendo a temática da justiça de transição. A
Corte reafirmou a sua jurisprudência reconhecendo a inconvencionalidade da Lei de
Anistia brasileira e condenando o Estado brasileiro pelo conjunto de graves violações
de direitos humanos decorrentes da falta de investigação e punição dos responsáveis
pela morte de Vladimir Herzog.” (Caio Paiva)
• Crimes contra a humanidade e relativização do princípio do ne bis in idem:
• “(...) a Corte ressaltou novamente em sua jurisprudência o caráter relativo do
princípio do ne bis in idem quando diante de uma situação envolvendo a prática de
crimes contra a humanidade. (...) Nas situações em que o indivíduo não foi
devidamente julgado ou punido pela mesma ação ou pelo mesmo crime, em função
do abuso de poder ou da incorreta administração de justiça pelas autoridades
nacionais na ação do caso ou na instrução da causa, a comunidade internacional não
deve ser obrigada a reconhecer uma decisão decorrente de uma transgressão tão
grave do procedimento de justiça penal”. (Caio Paiva)
• Direitos Humanos e violência contra jornalistas e profissionais da imprensa no Estado
brasileiro:
• “Segundo a CIDH, a violência contra os profissionais do jornalismo possui um tríplice
efeito: a) viola os direitos das vítimas de se expressarem e divulgarem suas ideias,
opiniões e informações; b) gera um efeito silenciador e assustador na classe de
profissionais do jornalismo; e c) viola o direito dos indivíduos e da sociedade de
buscar e receber informações e ideias de qualquer tipo.” (Caio Paiva)
5. Dever de reforma das instituições:
• “Quanto à formatação democrática das instituições do Estado, a prática da justiça
de transição defende o AFASTAMENTO dos cargos ou funções públicas daqueles
indivíduos que apoiaram ou se envolveram, de alguma forma, com a ditadura.
Essa política é chamada de depuração ou lustração (vetting ou lustration), que gera
(i) a renovação dos quadros e das práticas estatais e (ii) a prevenção de novos
atentados ao Estado Democrático, pela sanção de afastamento aos que apoiaram
as iniciativas pretéritas.” (André de Carvalho Ramos)

• Consequência da insuficiência desta dimensão no Brasil:


• “(...) o alvo alterou-se: do esquerdista ou comunista ao traficante. Além disto,
observa-se uma crescente criminalização da atuação de movimentos sociais.”
(Bernardo Gonçalves)
“O papel da Defensoria Pública no processo de Justiça de Transição no Brasil” (Renata Tavares):
• Fundamento constitucional:
• Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-
lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a
promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e
coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição
Federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 80, de 2014) = art. 1º da LC n. 80/94.

• 1ª função: a defesa dos acusados pelos crimes contra a humanidade.


• “A função quase natural do Defensor nestes processos seria a defesa dos militares nos processos penais.”

• 2ª função: garantir o acesso à justiça das vítimas ou seus familiares na qualidade de “assistente de acusação”.
• “(...) com a nova lei [LC 132/09, que alterou a LC 80/94] se abre uma grande quantidade de possibilidades. Se os
imputados nos crimes contra a humanidade têm direito ao Defensor, também os familiares e as vítimas dos atos.
(...) a participação das vítimas e de seus familiares pode ocorrer por meia da atuação do ‘assistente de acusação’.
Mas também nos casos de omissão do Ministério Público a Defensoria pode atuar.”

• 3ª função: ajuizamento de ações cíveis declaratórias.


• “Outro campo de atuação importante são as ações declaratórias movidas por familiares das vítimas.”
“O papel da Defensoria Pública no processo de Justiça de Transição no Brasil” (Renata Tavares):

• 4ª função: atuação extrajudicial em comissões.


• “A instituição deve mirar também a atuação perante Comissões criadas pelo Poder Executivo (...). Muitas
vezes, o contato que os defensores têm com a população pode ajudar a esclarecer os acontecimentos deste
período.”

• 5ª função: a difusão e educação em direitos humanos.


• “(…) é importante também ressaltar que entre as novas atribuições da Defensoria está a difusão e
educação em direitos humanos. Neste aspecto, o Defensor deve procurar atuar junto com os movimentos
de direitos humanos, nos conselhos nacionais e regionais, nas escolas e em outras instâncias.”
• Art. 4º da LC 80/94: “São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras: (...) III – promover
a difusão e a conscientização dos direitos humanos, da cidadania e do ordenamento jurídico”.

• 6ª função: fomentar a figura do “Defensor Cidadão”.


• “Por fim, é preciso construir a figura do Defensor Cidadão. A ideia é reconstruir a memória dos períodos
arbitrários por meio de uma atuação institucional.”

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