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Tutoria dia 05/11

Tema: princípio da legalidade:

Hoje vamos analisar estes dois corolários:

 Nullum crimen, nulla poena sine lege certa (princípio da tipicidade)


 Nullum crimen, nulla poena sine lege scricta (proibição de analogia)

Princípio da tipicidade
Normas penais em branco:
Sentido amplo – normas constitucionais + inconstitucionais, são normas remissivas
para outras normas
Sentido estrito – são inconstitucionais, porque remetem para normas que não têm o
mesmo estatuto na hierarquia de normas que tem no topo a constituição são normas
emanadas por entidades que não têm competência ex.: regulamentos; ordens da
autoridade administrativa » o conteúdo ilícito e percetível só é inferido pela remissão
que fazem para uma norma hierarquicamente inferior emanada por entidades que não
têm competência para definir os crimes e as penas
Não pode haver crime, nem pena ou medida de segurança que não resulte de lei
prévia, escrita, certa e estrita estando consequentemente proibido o recurso à
analogia
MFP = o princípio da legalidade só é violado quando a possibilidade de compreensão e
controlo do desvalor no tipo legal deixou de existir. A técnica remissiva é legítima
quando não obstante a remissão, a norma penal contiver o critério de ilicitude (núcleo
essencial) de tal forma que o destinatário da norma penal em branco consiga
compreender qual:
1. O bem jurídico a tutelar
2. A ação desvaliosa que se pretende evitar
3. Resultado a prevenir
A norma complementar não pode assumir um papel criativo e inovador. Desrespeita o
princípio da legalidade quando esvazia o conteúdo precetivo. Sendo a norma penal em
branco uma norma incompleta, pois precisa de uma norma complementar ou
integradora para preencher o sentido normativo.
A análise de certa forma passa sempre por três grandes pilares:
1. Problema da violação do princípio da legalidade: reserva relativa de
competência legislativa da AR 165º c) e 29/1
2. Violação do princípio da legalidade na vertente da lei certa art. 29º/3 –
princípio da tipicidade (um esforço do intérprete para compreender a exata
extensão do proibido). A descrição da matéria proibida e da sanção
correspondente deve ser determinável
3. Princípio da culpa 27º + 1º e 2º CRP – o destinatário não ficará suficientemente
orientado sobre os limites do permitido, de forma a conformar o seu
comportamento com as exigências do direito
O princípio da legalidade pode estar em causa quando estamos perante um certo grau
de esvaziamento do conteúdo percetivo da norma penal.
Reserva de lei é uma reserva de segurança, certeza e previsibilidade dos destinatários
das normas e impede a arbitrariedade dos poderes legislativos não autorizados – é
este parâmetro que temos que ter em vista.
Para Gomes Canotilho o princípio da tipicidade implica que a lei especifique
suficientemente os factos que constituem o tipo legal de crime e que permita que haja
uma conexão entre o crime e a pena que lhe corresponde. Impede assim que o
legislador utilize fórmulas vagas na descrição dos tipos legais de crime ou que as penas
sejam indefinidas ou com uma moldura penal tão ampla que seja difícil determinar a
pena a aplicar num caso concreto. É um princípio que constitui uma garantia de
certeza e de segurança na determinação das condutas que realmente revelam para o
direito criminal

E o que é uma norma penal em branco?

 FD – são normas que cominam uma pena para comportamentos que não
descrevem, mas se alcançam através de uma remissão da norma penal para
leis, regulamentos ou atos administrativos. A parte sancionatória tem que estar
sujeita à reserva de lei
 Prof. regente – normas que estabelecem o conteúdo da sua previsão ou da sua
estatuição por remissão para outras normas constantes de leis
hierarquicamente inferiores como regulamentos ou leis do governo sem
autorização legislativa (estas definem os elementos de que vai resultar a pena
aplicável) *a prof. adota uma posição abrangente sendo norma em branco toda
aquela em que a definição da área de proteção é feita total ou parcialmente
por norma diferente da norma que contém a ameaça penal
 Critério orientador quanto à conformidade constitucional das normas penais
em branco poderá ser o seguinte: quando a remissão feita pela norma
sancionadora principal para a norma complementar tornar o tipo de ilícito
incaraterístico, dificultar o seu conhecimento pelos destinatários para além
do que é exigível a uma pessoa média ou implicar recurso a critérios
autónomos ou critérios novos de ilicitude, a remissão e concretização violam
o princípio da legalidade (exigência de lei penal expressa e certa). Nos demais
casos deverá se ponderar a situação em concreto e o grau de concretização
feito pela norma complementar. É também o que podemos retirar da
jurisprudência constitucional: a validade das normas penais em branco terá de
ser averiguada, em cada caso, em função do grau de precisão que for possível
atribuir aos respetivos pressupostos de punição

Jurisprudência:1

 No Acórdão n.° 427/95 o TC usou como critério o da


concretização técnica, informativa e não inovadora, segundo o qual a
norma em branco conteria todo o conteúdo da incriminação — o
desvalor da ação proibida, o desvalor do resultado lesivo e a
identificação do bem jurídico protegido — não deixando “(...) a
descoberto qualquer elemento essencial para a compreensão da
conduta proibida ou para o controlo democrático da incriminação”.
Estava em análise a norma do art. 4º/1 do DL nº192/89 de 8 de junho
que estipulava que os aditivos alimentares admissíveis nos géneros
alimentícios, os respetivos critérios de pureza e as condições da sua
utilização constarão de portaria conjunta.

Há uma norma incriminadora que proíbe em função da pureza a utilização de


aditivos alimentares »» isto é o núcleo do ilícito: é proibido que seja
apresentado ao público um produto alimentar com corantes, aditivos
independentemente de serem perigosos para a saúde.

Existia um regulamento que permitia que certos aditivos seriam permitidos –


no regulamento não estava o conteúdo essencial do proibido, no
regulamento estavam apenas as exceções

 Já o Acórdão n.° 534/98, de 7 de Agosto, assenta no que pode


denominar-se o critério do valor probatório da remissão: a norma
complementar — infra-legal — é entendida como encerrando um
(mero) juízo técnico análogo ao da prova pericial e por ter valor
meramente probatório não era imperativa para o julgador

A lei incriminava a posse de uma certa quantidade de estupefacientes e


remetia para uma portaria a determinação dos limites do princípio ativo
diário de substâncias

1
Existe mais jurisprudência sobre o assunto e isto é só uma pequena cábula, recomendo que leiam os
acórdãos para compreender melhor o que estava em causa e os critérios que daí resultaram
Analogia

1º/3 CP – proibido o recurso à analogia – se os tribunais pudessem utilizar a analogia,


formulariam noras incriminadoras que deixariam de ser objeto de controlo
democrático. Ver o artigo 29/3º CRP
Analogia é diferente de raciocínios analógicos na aplicação da lei penal, estes são para
a prof. MFP permitidos

Caso da frequência de 2021

Saber se o tribunal podia legitimamente decidir que se tinha verificado abuso de


inexperiência de A por parte de B mais velho, nos termos do art. 173º CP. Eles
tinham ido de férias durante uns tempos e ela era muito mais nova (14 anos, salvo
erro). B tinha 19 anos e estiveram fora uma semana.

Resolução:

1. Identificar o problema jurídico em causa – interpretação da lei


2. Identificar o comportamento e vermos se está previsto no título tal como foi
consagrado pelo legislador – o comportamento é a utilização do automóvel
3. Qual é o tipo de metodologia que vamos utilizar?
 Sabemos que a analogia é proibida e em relação à interpretação
extensiva isto é discutível. Num caso prático devem explicar o critério
que vão adotar e a solução, mas devem sempre explicar que na prática
é muito difícil estabelecer a fronteira entre analogia e interpretação
extensiva

4. Critério utilizado para definir a fronteira entre o critério da interpretação


permitida e interpretação proibida (analogia proibida art. 1/3º CP)

 Castanheira Neves – procuramos a norma do caso concreto e para isto o


texto legal é orientador, dá-nos uma espécie de pista. O julgador
identifica a norma e depois vai ver se não esbarra contra os limites
impostos pelas condições de validade
 MFP – sentido possível das palavras, para ser assegurado o controlo
democrático e segurança jurídica temos que perceber o que pode
resultar do texto da lei. A prof. parte da ideia de essência do proibido,
ou seja, pergunta qual é o bem jurídico que se pretende tutelar, utiliza
ainda o elemento histórico e sistemático

5. Utilizando o critério da professora no nosso caso – considerando que o texto é


o ato de comunicação para os cidadãos, através do sentido possível das
palavras seria permitido raciocínios analógicos porque encontramos
coincidência entre o caso concreto e a essência do proibido comunicado pelo
texto, ou seja, pelo art. 173º CP e por isso ainda se respeitava o princípio da
legalidade na vertente estrita art. 29/3. É fundamental neste ponto realçar a
questão da essência do proibido, devem perguntar “qual é o bem jurídico que a
norma pretende tutelar?”, ora no nosso caso é a autodeterminação sexual do
menor, pretende-se proteger a vítima em situações de situações em que há de
facto um abuso da sua inexperiência sexual. Acabei por entender que no caso
em concreto como já namoravam há algum tempo, Ana já tinha tido relações
sexuais antes (atenção que isto por si só não basta) e parecia compreender a
situação teríamos ainda que falar do art. 18/2º CRP sobre o princípio da
necessidade da pena, logo entendi que o tribunal ao condenar Bruno estaria a
violar o princípio porque não existia carência penal sendo que esta conclusão é
retirada de um esquema lógico de raciocínio

Caso prático 2 (aula prática)

Durante quase todos os dias do mês de outubro, A envia sms perturbadoras a B, sua
ex-namorada, censurando-a por ter rompido a relação de ambos e ter iniciado outra
com C.
Pratica A o crime previsto e punido no art. 190.º, n.º 2, do CP?

Nesta questão era relevante fazer a distinção entre a interpretação que é


permitida pelo direito penal e analogia que é proibida (art. 29º/1 e 3º CRP + art. 1º/1
CP) que não coincide necessariamente com a interpretação extensiva que aliás levanta
muita discussão apesar de não estar expressamente proibida pelo 1º/3 CP.
A distinção deve ser feita a partir do caso concreto – no caso parece que a
interpretação realizada pelo tribunal se mantém dentro dos limites da interpretação
permitida: sem ultrapassar os significados possíveis do texto legislativo ou o sentido
possível das palavras, sendo que faz todo o sentido porque ainda atende à ratio da
norma que é a tutela da reserva da vida privada, da paz e sossego. Ou seja, devemos
olhar para o texto porque é o ato de comunicação para os cidadãos »» o que temos é
um raciocínio analógico onde ainda encontramos coincidência entre o caso concreto e
a essência do proibido comunicável no texto

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