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A CONTABILIDADE COMO SISTEMA DE INFORMAÇÃO AO SERVIÇO DA GESTÃO

distinção não é muito clara (Horngren et al., 2006). Com efeito, a


contabilidade de custos, para além de fornecer informação para a

analisa e relata a informação financeira e não financeira respeitante


ao custo de aquisição ou uso dos recursos numa organiza-

objetivo fornecer informação aos utilizadores internos das organiza-


ções, ajudando-os a tomar as melhores decisões e a melhorar a
Gerir é tomar decisões e a contabilidade tem de ser um siste- eficiência e eficácia das operações existentes (Drury, 2005).
ma de informação ao serviço da gestão.
Na contabilidade financeira, os custos e proveitos são classifi-
cados por natureza, prevalecendo a ótica patrimonial e financeira.
recolha, classificação, interpretação e exposição de dados económi- As informações são monetárias, valorizam-se os fluxos externos,
coloca-se o enfoque nas relações com o exterior, é submetida a
vimento da própria sociedade ao longo dos séculos, designadamen- imperativos de ordem técnica, jurídica e fiscal, é obrigatória, utiliza a
te na satisfação de informações de carácter financeiro, determina- estrutura do SNC, baseia-se no registo histórico (regista o passado)
e o apuramento do resultado é anual e global.
p. 29).
Na contabilidade de gestão, os custos e proveitos são classifi-
Atendendo ao âmbito, objetivos e destinatários da informação cados de acordo com o destino (função, produto,...), prevalecendo a
contabilística identificamos duas grandes áreas disciplinares: ótica económica e produtiva. As informações são quantitativas e
físicas, valorizam-se os fluxos internos, coloca-se o enfoque no
Contabilidade de gestão (ou interna) visando apurar resulta- interior da organização, a sua implementação é livre e de acordo
dos não só globais mas, também, por produtos, serviços, com os objetivos da gestão e, por isso, a sua existência é facultativa
mercados, etc. utilizando um plano de contas elaborado pela empresa, apoia o
Contabilidade financeira (ou externa), relativa à instituição planeamento (gestão previsional), o apuramento do resultado é
no seu todo. mensal e parcial (por funções, atividades, centros de responsabili-

financeira e não financeira que ajuda os gestores a tomar decisões Sistemas contabilísticos
e a cumprir os objetivos da organização. Os gestores usam a infor-
mação da contabilidade de gestão para escolher, comunicar e im- A definição e implementação de um sistema de contabilidade
de custos deve possibilitar a resposta oportuna a diversas questões
centra-se nos relatórios internos, focaliza-se na informação futura tais como o registo, classificação e agregação dos custos fabris ou
de produção (industriais) e não fabris (não industriais), a afetação
planeamento e controlo de gestão e valorizar os produtos fabrica- ou imputação dos custos aos respetivos objetos (produtos) e apoiar
dos e em curso de fabrico, ou seja, análise dos custos (gastos), i.e., a contabilidade financeira (ou externa) na valorimetria de certas
classificação, imputação e controlo de gestão. Por outro lado, a rubricas do Balanço e das Demonstrações de Resultados por Natu-
rezas e por Funções.

Em Portugal, não existe normalização no âmbito da contabili-


A contabilidade financeira torna-se insuficiente para a gestão, dade de custos, competindo à empresa a elaboração do seu plano
na medida em que é necessário aguardar pelo fim de exercício para de contabilidade, segundo o qual, adota as soluções mais adequa-
valorizar as existências (inventários) finais e proceder às diversas das para dar resposta às suas necessidades de informação. No
regularizações para apurar o resultado líquido do exercício (do perí- caso de ser utilizada uma classe 9 contabilidade analítica1 são
odo). Os custos são apurados por natureza e não da forma que criadas contas que recolham a informação necessária ao apura-
mais interessa para efeitos de gestão, ou seja, por produtos, ativida- mento do custo de produção e de cada uma das rubricas.
de ou centros de responsabilidade. As informações fornecidas são
de fraca operacionalidade no controlo e planeamento e não têm em 1

conta as grandezas físicas. Com efeito, a contabilidade financeira to do seu âmbito disciplinar: Contabilidade Industrial, em França e noutros países Europeus, ou
Contabilidade de Custos para os anglo-saxónicos; depois Contabilidade Analítica de Exploração
tem por objetivo a análise da situação patrimonial e a formação do em França, na sequência do Congresso internacional de contabilidade de Paris em 1948, onde
resultado. foi decidido abandonar a designação de contabilidade industrial e consagrar a sua separação da

1974, passou denominar-


Utilizam-
da empresa que procede ao agrupamento dos custos e às classificações por funções ou por
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registados os custos e proveitos da contabilidade geral, conforme


as classes 6 e 3, mas numa posição invertida (refletida). Regra
geral, esta conta subdivide-se nas seguintes subcontas:
há dois sistemas de contas de ligação ou articulação:
911 Existências iniciais refletidas
sistemas monistas e sistemas dualistas. 913 Compras refletidas
914 Existências finais refletidas
Os sistemas monistas subdividem- 916 Gastos refletidos
913 Rendimentos refletidos
918 Resultados refletidos

Os sistemas dualistas apresentam as variantes:


ração entre as duas contabilidades - a Contabilidade Interna encon-
tra- Duplo contabilístico que apresenta como vantagens o facto
há uma ligação efetiva entre as duas contabilidades, i.e., podem de ser apropriado para empresas de grande dimensão, visa
debitar-se contas da contabilidade geral (financeira) por crédito em a descentralização e separação do trabalho contabilístico,
contas da contabilidade analítica e vice-versa, tratando-se de siste- permitindo uma melhor avaliação dos resultados e desvan-
mas integrados, com um único plano de contas, abrangendo as tajoso para empresas de reduzida dimensão, sendo suscetí-
classes de 1 à 8 (contabilidade geral/financeira) e classe 9 vel de provocar aumento dos custos administrativos e a
articulação entre as duas contabilidades pode ocasionar
ou monista moderado é caracterizado por a separação entre as certas dificuldades e
duas contabilidades não ser integral. As contas da Contabilidade
Interna aparecem sintetizadas no Razão Geral, através de uma Duplo misto que têm como vantagem o facto de, apenas a
contabilidade geral, utilizar a digrafia e a contabilidade analí-
(Caiado 1997, p. 407). O sistema monista apresenta vantagens por tica processar-se (parcialmente) através de mapas, qua-
ser apropriado para empresas de reduzida dimensão, verificando-se dros, tabelas de repartição e registos (extra digráfico) e não
uma centralização do trabalho contabilístico e, sendo contínuo o pelo sistema das partidas dobradas. A ligação entre os dois
fluxo contabilístico, há uma redução dos custos administrativos. subsistemas não é feita com o rigor do esquema das parti-
Como desvantagens, entre outras, aponta-se o facto de não ser das dobradas, mas sim de uma forma mais informal.
indicado para empresas de grande dimensão e, dado basear-se na
centralização, não permite uma divisão do trabalho. Funcionamento teórico em sistema dualista

Nos sistemas dualistas as duas contabilidades funcionam, Em linha com os autores anteriores, recorrendo a um simples
independentemente, uma da outra utilizando a digrafia. Porém, não exemplo, desenvolvemos um dos sistemas mais comum nas empre-
é possível o reconhecimento na contabilidade geral (classes 1 a 8) sas (sistema dualista-duplo contabilístico) como ligação entre as
por contrapartida direta em contas da contabilidade analítica (classe contabilidades financeira e analítica.
9) e vice-versa, ou seja, a contabilidade analítica tem necessidade
de criar uma conta ou contas especiais chamadas contas refletidas, Importa efetuar uma revisão deste sistema contabilístico come-
contas compensatórias ou contas de ligação, que são utilizadas çando pela representação digráfica do processo produtivo que,
sempre que há movimentos entre as duas contabilidades. depois de efetuada a necessária reclassificação dos custos, é ca-
racterizado, genericamente, pela articulação entre diversas Contas
Genericamente, na conta principal 91- Contas refletidas são como a figura seguinte documenta.

Figura - Relevação digráfica em sistema dualista duplo contabilístico


RELEVAÇÃO DIGRÁFICA EM SISTEMA DUALISTA DUPLO CONTABILÍSTICO
90x-Contas refletidas 93x-Armazém MP 94x-Produção 93x-Armazém PA 94x-CPV 97x-Vendas

92x-MOD

92x-Proveitos financ.
92x-GGF
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92x-Custos Distrib.
99x-Res. analíticos

92x-Outros Proveitos
92x-Reclass. custos
92x-Custos Admin.

92x-Custos Financ.

92x-Outros custos

Fonte: adaptado de Caiado, 1997, p. 410

Para descrever funcionamento teórico do sistema dualista - nha-se que o primeiro consome a matéria-
duplo contabilístico -, simulamos um processo produtivo tendo por de 2

base num conjunto de elementos informativos que servem de banco MPA foram de 10 000,00 e as de MPB de 5 000,00 . Os inventá-
de ensaio, com vista à articulação entre as contabilidades financei- rios iniciais de MPA de 2 000,00 e MPB de 1 000,00 e os consu-
ra/geral e analítica e o apuramento do custo industrial dos produtos mos de MPA e MPB de 3 000,00 e 4 000,00 , respetivamente.

Reconhecimento das compras de MP e imputação dos res-


Por simplicidade, admitimos que os gastos/custos são todos de petivos consumos diretos à produção:

Reconhecimento dos Gastos com o Pessoal, reclassificação da Mão de Obra Direta (MOD) e imputação à produção su-
pondo 3 299,00 para P1 e 9 000,00 para P2.
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Reconhecimento de gastos por natureza, todos de natureza e imputação à produção de P1 (2 400,00 de matérias sub-
fabril, designadamente, matérias subsidiárias (4 000,00 ), sidiárias, 1 650,00 de energia, 2 663,00 de MOI, 1
energia (3 000,00 ), Mão de Obra Indireta (MOI) (5 000,00 200,00 de depreciações e 600,00 , sendo os restantes
), depreciações (2 000,00 ) e outros Gastos Gerais de devidos a P2.
Fabrico (GGF) (1 000,00 ), correspondente reclassificação

Admitindo que, no início do Processo Produtivo (PP), não vamente. Admitindo que toda a produção foi vendida por 25
existiam unidades físicas (UF) de Produção em Curso de 000,00 e 22 000,00 (P1 e P2, respetivamente), os resul-
Fabrico (PCF) e que a Produção Terminada (Pt) de P 1 e P2 tados analíticos obtidos foram de 2 184,00 e 2 513,00 ,
tinha atingiu o valor de 22 816,00 e 19 483,00 , respeti- P1 e P2, respetivamente.
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Coelho, M. (2012). Contabilidade Analítica e de Gestão. Coim-


BIBLIOGRAFIA bra: Edições Almedina, 1ª Edição, ISBN: 978-972-40-5001-0;

Caiado, A. (1997). Contabilidade de Gestão. Lisboa: Vislis Drury, C. (2005). Management & Cost Accounting. Londres:
Editora, 1ª Edição; Thomson Learning, 6 ª Edição;

Caiado, A. (2015). Contabilidade Analítica e de Gestão. Lis- Horngren, C. T.; Foster, G.; Datar S. M. (2006). Cost Ac-
boa: Áreas Editora, 8ª Edição; counying: A Managerial Emphasis, 12ª Edition, Pearson-Prentice
Hall, Upper Saddle River, New Jersey, 2005, Copyright 2006;

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