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LIRA, E. S.
ENRICONE, J. R. B.
creve que um amigo está batendo no outro, sores e sentir-se bem no ambiente escolar
no gramado, para ensinar a lutar e que isso não garantiu, para a população pesquisada, a
não deveria acontecer, pois é errado, e que melhora em seu desempenho escolar. O tipo
ele vai “apanhar” da sua mãe e que “se sua de vínculo estabelecido (positivos, negativos,
mãe não der educação seu pai dá”. Na história regulares ou confusos) parece não interferir
de aprendizagem refere, ainda, não gostar do significativamente na aprendizagem destes
ambiente escolar, sendo que frequenta a aula alunos.
porque os familiares obrigam. Não aparece o
O rendimento dos alunos se mostra abaixo
vínculo com a escola e o professor em relação
do esperado em diferentes disciplinas, porém
à aprendizagem. Neste caso, aprendizagem
percebe-se uma pequena diferença nas mé-
é o que aprendemos na vida com os amigos
e não na escola. dias das disciplinas que, conforme os alunos,
exigem mais estudo, esforço próprio, leitura
Observando os resultados, 12 alunos
e atenção para aprender como as disciplinas
apresentaram um vínculo positivo com a
de ciências, geografia, história, matemática
escola, com os professores e o conhecimento,
e português, e as disciplinas que exigem
4 alunos apresentaram um vínculo regular, 1
respostas mais pessoais, que envolvem a
aluno apresentou vínculo negativo e 1 aluno
expressão corporal, a expressão plástica,
apresentou vínculo confuso. Esses resultados
reflexões e linguagem, como as disciplinas
demonstram que a maioria dos alunos, parti-
de artes, educação física, ensino religioso e
cipantes da pesquisa, tem um bom vínculo,
espanhol. As disciplinas que para os alunos
gosta do ambiente escolar, dos professores e
exigem mais esforço são aquelas em que
de aprender.
eles apresentam médias de desempenho mais
Em relação ao desempenho escolar baixas, mesmo que os professores que minis-
dos educandos foi possível observar que tram essas disciplinas sejam considerados os
as médias dos alunos são homogêneas e o melhores professores. E as disciplinas ditas
rendimento como um todo é baixo, seja em menos exigentes em relação a conteúdos são
relação aos que construíram um bom vínculo aquelas que os alunos apresentam melhores
escolar ou não. médias e que os professores não são citados
Onze participantes que apresentam um nas entrevistas.
bom vínculo escolar possuem médias es-
colares de 3,6 a 7,9, rendimento abaixo do
esperado. Dois alunos que apresentam um O bom/mau professor na
vínculo regular apresentam médias entre 4,5 percepção do aluno e a
e 6,7, sem grande diferenciação com relação influência na aprendizagem
aos colegas e ainda com médias muito baixas.
O aluno que apresenta vínculo negativo tem Na tentativa de aprofundar o tema,
como seu desempenho final a média 4,2, ren- buscou-se definir com os alunos quais as ca-
dimento baixo, porém não muito diferente de racterísticas que, em sua percepção, definiam
alguns alunos categorizados como tendo um um bom professor ou um mau professor. Os
bom vínculo. O aluno com vínculo confuso alunos caracterizaram os professores de sua
apresenta um resultado final de média 5,8, preferência, ou seja, “os melhores profes-
resultado que não se diferencia dos outros sores” e “os professores que não gostam” e
participantes. Portanto, percebe-se que ter foram convidados a refletir sobre seu desem-
sentimentos positivos para com os profes- penho escolar com estes professores.
Percebe-se que grande parte dos alunos sair-se bem na disciplina do professor P1,
não tem consciência sobre o próprio desem- pois este professor seria um bom professor,
penho nas disciplinas escolares. Afirmam mas obteve média 2,0 em desempenho real; o
que “vão bem” na disciplina de um professor aluno afirma ter condições de passar de ano,
que gostam e consideram bom professor, e mas foi reprovado com um resultado muito
sua média de desempenho escolar real não abaixo da média. Afirmou também “ir mal”
corresponde a esta afirmação. Este desen- na disciplina do professor P2, do qual refere
contro entre o desempenho real e a percepção não gostar, e sua média de desempenho foi
dos alunos também aparece em relação ao de um e meio, muito semelhante à média na
mau professor. A1, por exemplo, afirmou disciplina do professor que refere gostar.
Outro exemplo é o caso do aluno A15 que resultados. Percebe-se, ainda, que as notas
refere ter bom desempenho na disciplina do mais baixas estão relacionadas à disciplina
professor P1, o qual mais gosta, obtendo uma ministrada pelo melhor professor na per-
média de 5,5. Refere também desempenho cepção dos alunos, inexistindo uma relação
ruim na disciplina do professor P2, que não entre esta percepção e um bom desempenho.
considera um bom professor, mas sua média Conforme já visto, os critérios utilizados para
é 5,3, não se diferenciando muito da primeira definir um bom professor são comportamen-
disciplina citada. Evidencia-se que os alunos tais e baseados na ideia de um menor nível
não têm consciência do seu real desempenho de exigência, portanto, pode-se compreender
nas disciplinas. Nestes casos, a avaliação que esta relação, que envolve um vínculo
sobre estar melhor ou pior nas disciplinas avaliado a partir da necessidade de não ser
parece estar relacionada ao sentir-se melhor exigido ou frustrado, não contribui para o
ou pior com o professor em sala de aula e não sucesso na aprendizagem e para a melhoria
aos resultados obtidos ao longo do ano. do desempenho escolar.
Entre os participantes da pesquisa, desta- A análise dos dados demonstra que os vín-
co dois alunos que conseguiram refletir mais culos escolares, investigados nesta realidade,
adequadamente sobre seus resultados e estão sejam eles positivos, negativos, regulares ou
cientes de seus desempenhos. O aluno A7 que confusos não estão interferindo significativa-
afirmou ter um melhor resultado na matéria mente na aprendizagem. É importante lem-
do professor P1, o qual considera um bom brar que os vínculos são importantes, porém
professor e, ter um desempenho médio, “dá nesta pesquisa não foi possível perceber uma
pra passar”, na disciplina do professor P2. relação direta com o desempenho escolar,
Sua avaliação corresponde ao desempenho demonstrando a complexidade dos processos
observado, pois, com o professor P1 sua de aprendizagem. Deste modo, o desempenho
média é 8,00 e na disciplina do professor P2 escolar, no contexto desta pesquisa, não está
sua média é 6,18. Pode-se inferir que este relacionado significativamente ao tipo de vín-
aluno possui a capacidade de avaliar seu de- culo estabelecido com o professor e a escola,
sempenho escolar de forma mais adequada. evidenciando que o vínculo com o saber e a
E o aluno A9, também, descreveu seu desem- aprendizagem não se estabelece apenas pelo
penho corretamente, referindo que na matéria vínculo com o professor.
dos professores P1 e P4 se sai bem, e gosta
dos professores, apresentando médias 8,55
e 7,65; e com o professor P2 que não gosta, Discussão
refere sair-se bem por gostar da disciplina na
qual obteve média 8,45. Desta forma, o aluno O atual contexto social apresenta uma
demonstra saber analisar seu desempenho cultura de incertezas e indeterminação. Exige
adequadamente. a formação de sujeitos críticos e reflexivos,
A partir dos dados pode-se afirmar que 16 construtores de sua aprendizagem e capazes
alunos demonstram dificuldades em avaliar de avaliar seu desempenho e suas possibi-
seus desempenhos de maneira adequada e lidades.
ainda não desenvolveram a capacidade de Neste tempo em que os jovens precisam
estimar como está seu desempenho escolar, ser reflexivos diante do acesso fácil à infor-
a noção clara de como estão em relação à mação, pesquisadores e dispostos a aprender,
aprendizagem, suas capacidades e limita- valorizando a participação do outro, “se
ções, aceitando médias baixas, como bons espalha entre eles que o bem que vale é o
seu próprio bem individual.” (GOMES e como relação com o mundo, com outros e
CASAGRANDE, 2002, p.4). consigo mesmos, o significado que atribuem
A análise dos depoimentos da pesquisa à escola, e como se constituem como sujeitos
mostra exatamente isso, os alunos avaliam em constante crescimento e aprendizagem.
positivamente as características do ambiente Não podemos como educadores acompanhá-
escolar que dizem respeito à permissividade, los se não compreender-mos seus processos
às tarefas mais fáceis, a ajuda do professor de construção pessoal e avaliação do próprio
e à aceitação das suas ideias. Não citam saber.
conteúdos, desejo de saber ou interesse pela
aprendizagem como algo positivo que acon-
tece na escola. Gostam do que lhes dá prazer As relações com o saber
imediato e não de esforço ou exigência.
O motivo para permanecer na escola e Educar-se, desenvolver-se, tornar-se cada
aceitar aprender, talvez seja a facilidade em vez melhor, mais sábio, mais inserido na so-
relação aos conhecimentos e às aulas, o que ciedade, é próprio do ser humano como ser
inibe aprendizagens significativas. A baixa inacabado que precisa constantemente apren-
tolerância e necessidade em poupar esforços der, desenvolver-se e constituir-se humano.
dificulta que os jovens possam desenvolver E este desenvolvimento é possível por meio
a capacidade de controlar sua aprendizagem de relações que este estabelece com o meio
e reconhecer seu real desempenho. onde está inserido.
Gomes e Casagrande (2002) afirmam, É necessário entender que para mobilizar-
em seus estudos, que no contexto social em se a aprender algo é preciso que o sujeito
que vivemos, o jovem, muitas vezes, vive invista nesta aprendizagem. O ser humano in-
sem projetos, sem ideais, a não ser cultuar veste em algo quando lhe tem sentido, quando
sua autoimagem e buscar satisfação aqui mexe com seus desejos. Conforme Charlot
e agora. Os valores antigos, as verdades e (2000, p.54), “ninguém poderá educar-me se
certezas já não servem mais para a resolução eu não consentir, de alguma maneira, se eu
dos problemas e os novos valores ainda não não colaborar, uma educação é impossível,
estão firmes o suficiente. se o sujeito a ser educado não investe pesso-
almente no processo que o educa”.
No contexto da pesquisa percebe-se que
o jovem precisa de auxílio para construir seu Como já visto, o fato de declarar que
conhecimento, sua aprendizagem, sua histó- sente-se bem no ambiente escolar, gosta dos
ria, ainda não consegue sentir-se desejoso por professores e dos colegas não é suficiente
aprender, ainda não avalia adequadamente para que o sujeito possa aprender, despertar
seus desempenhos e precisa de motivações o desejo de saber e ampliar suas capacidades.
externas ou auxílio do professor para com- Os alunos participantes da pesquisa demons-
preender se realmente aprendeu. tram gostar do ambiente escolar, porém se
Diante destes novos valores, Azevedo relacionam com o mesmo de forma superfi-
(1993 apud GOMES e CASAGRANDE, cial, estando mais satisfeitos quanto menor
p.5) afirma que “educar será capacitar pes- for o nível de exigência. Qualquer forma de
soas para situar-se responsavelmente no repreensão de seus comportamentos é visto
mundo: será viver a partir da história, será como algo negativo, o que representa baixa
criar história”. tolerância, preferindo que o ambiente escolar
adapte-se a suas necessidades. Demonstram
Desta forma, auxiliá-los é, primeiramente,
investigar seu relacionamento com o saber desejos de aceitação de suas dificuldades,
limitando-se em aprender apenas para passar ter uma boa profissão mais tarde, para agra-
de ano. dar o professor que considere simpático [...]
Cabe pensarmos que, talvez, o vínculo nesse caso, a apropriação do saber é frágil,
com o saber, que pode ser determinante do pois esse saber pouco apoio recebe do tipo
significado que o aprender tem na vida dos de relação com o mundo que lhe dá um sen-
alunos, pode ser mais importante que o vín- tido”. Portanto, para ocorrer a apropriação do
culo com a escola e os professores. Como saber, não basta ter um professor “querido”
parece que estes alunos não têm consciência ou “simpático”, é preciso que o saber tenha
e nem autonomia sobre seu próprio processo significado na vida dos alunos, estimulando
de aprendizagem, podem estabelecer uma a autonomia e desejo de aprender, aspectos
relação superficial com a mesma. Esta relação que apareceram de forma muito superficial
de “superficialidade” com o saber faz com no grupo estudado.
que signifiquem o vínculo com a escola e com Percebe-se, portanto, que existem as-
o professor como “quanto menos exigente pectos que são relativos ao sujeito que vão
melhor”, usando apenas critérios de manejos determinar o crescimento e o melhor apren-
comportamentais para avaliá-los. Para os dizado e rendimento escolar. Muitas vezes,
alunos, o bom desempenho está ligado ao para os alunos, o aprender é para conseguir
professor e o resultado final oferecido por ele, algo externo, ainda não despertaram para
ainda não compreenderam que sua vontade e motivos internos de satisfação e melhora de
sua colaboração são importantes no processo si mesmos.
de aprendizagem. Segundo Charlot (2000) só há saber se
Os resultados dos alunos não melhoram o sujeito estiver engajado em uma certa re-
quando estudam com o melhor professor e lação com o saber. Este é construído numa
não pioram quando estudam com o professor relação com outros, no confronto de ideias,
que dizem não gostar. Muitas vezes, as notas na comunicação. “A ideia de saber implica
são mais altas na disciplina que os alunos a de sujeito, de atividade do sujeito, de re-
afirmam que o professor é “chato”, “xinga”, lação do sujeito com ele mesmo, de relação
“não quer que converse na explicação”. É desse sujeito com outros” (CHARLOT, 2000,
possível dizer que a relação dos alunos com p.61), para construírem juntos e partilharem
o saber está alicerçada na facilidade, ou seja, esse saber.
gosto do que não me pede muito, do que não Se o saber é uma relação, é necessário
preciso me mover para aprender. que os alunos aprendam a relacionar o co-
Saber é uma conquista e como toda con- nhecimento, as informações que aprendem
quista é necessário desejar algo para chegar na escola, com as tarefas que devem resolver,
ao objetivo. Os participantes demonstraram precisam aprender a trocar ideias, partilhar e
preocupação de passar de ano, ter um futuro transformar essas relações em saberes. Para
melhor, poder trabalhar, mas desejos de cres- Charlot (2000), o saber é construído em uma
cimento pessoal e vontade de aprender por história coletiva que é a da mente humana e
prazer não apareceram. das atividades do homem e está submetido
Na ausência de uma adequada relação a processos coletivos de validação, capitali-
com o saber, a aprendizagem fica prejudi- zação e transmissão.
cada, pois, conforme Charlot (2000, p.64), Para os alunos participantes da pesquisa
em não se estabelecendo uma relação com o ainda, ao que parece, o saber não tem um
saber “o aluno aprenderá para evitar uma nota sentido, a importância maior é o conheci-
baixa ou uma surra, para passar de ano, para mento frágil que precisam depositar nas
provas e trabalhos. Eles ainda não adotaram A reflexão sobre os próprios processos de
uma relação de saber com o mundo, com os memória, atenção ou aprendizagem, assim
outros e consigo mesmos, uma relação de com os produtos de nosso processamento, nos
construção do saber que proporciona prazer proporciona metaconhecimento, um saber
e desejo de aprender. sobre o que sabemos, que pode nos ajudar a
Charlot (2000) nos faz pensar sobre o tomar consciência de nosso funcionamento
tipo de relação com o mundo e com o saber cognitivo [...] proporcionando melhores ins-
que a criança deve construir, para ter acesso trumentos cognitivos para intervir nesses pro-
ao pleno uso das suas potencialidades. Para cessos e modificá-los. (POZO, 2002, p.159).
o autor, o ser humano precisa compreender Diante dos resultados da pesquisa,
suas capacidades, sua identidade, sua repre- percebeu-se que os alunos participantes não
sentação para os demais e compreender seus estão conscientes de seu desempenho, pois
limites e habilidades, ou seja, ser capaz de não conseguem avaliar adequadamente seus
autoavaliar-se, em uma relação de aprendi- resultados. Muitas vezes, acreditam que
zado constante. conseguiram alcançar os objetivos, porém
Ter consciência dos próprios processos de apresentam médias baixas e até reprovação.
aprendizagem pode nos ajudar a tomar cons- Por vezes expressam a percepção de um de-
ciência de nosso funcionamento cognitivo e sempenho ruim em determinada disciplina,
nos proporciona instrumentos para intervir o que também não correspondeu a realidade
nesses processos, ou seja, o ser humano capaz observada. Estas distorções podem também
de gerenciar sua aprendizagem e relacionar- ser resultado de uma noção de que se não há
se com o mundo na busca de saber. E esta “cobrança” na sala de aula, eu estou indo bem
autonomia traz consigo o desejo de saber, e se, ao contrário, há exigência, eu vou mal. A
cujos efeitos sobre os resultados obtidos pa- “cobrança” ou exigência pode estar relacio-
recem ser mais sólidos e consistentes do que nada ao processo avaliativo. Em um processo
quando a aprendizagem se move por motivos avaliativo que não diagnostica onde estão as
externos. (POZO, 2002). dificuldades e/ou aprendizagens construídas,
os alunos têm mais dificuldade de perceber
seu próprio desempenho. Como vimos, a
Metacognição e aprendizagem maioria dos alunos relacionam desempenho
ruim com professor “chato” e “exigente” e
Tomar consciência do próprio desempe- bom desempenho com professores “legais”,
nho nas tarefas de aprendizagem é algo ne- que “desculpam quando não fazem os temas”
cessário para que o aprendiz possa melhorar e exigem menos disciplina. Os alunos parti-
suas capacidades, organizar estratégias de es- cipantes medem suas capacidades de apren-
tudo e conseguir alcançar as metas desejadas. dizagem pela tolerância do professor e não
Isso se conseguir estabelecer metas e desejar pelo seu desempenho. Pode-se afirmar que
aprender. Essa capacidade de tomar-se nas estes alunos não possuem a capacidade de
mãos e acompanhar o próprio desempenho metacognição, por não conseguir gerenciar
é algo que se conquista, a aprendizagem sua aprendizagem e depender dos resultados
precisa estar alicerçada na interação, no que os professores lhes fornecem como nota
professor incentivando o aluno a criar formas final. Se o aluno não sabe quais as suas poten-
de aprender, na criação de estratégias para cialidades e dificuldades no que diz respeito
resolver suas tarefas e na consciência do ao processo de aprendizagem, de que forma
aluno sobre suas dificuldades e por isso na espera-se que ele avance neste processo de
vontade de superá-las. forma mais autônoma? Sendo assim, fica
difícil que consigam compreender que a brincar. Hoje tudo é mais fácil, os brinquedos
aprendizagem é um processo que exige metas são comprados, é só ligar a televisão e se di-
e atenção aos próprios limites e capacidades. vertir com cenas que apenas olhamos. Então,
Para Pozo (2002), a aprendizagem não porque temos que estudar tanto, sofrer tanto
pode ser concebida como um simples ato para aprender algo, não poderia ser mais fácil
mecânico, de um simples exercício rotineiro, estudar? Isso faz com que os alunos entrem na
passou a ser cada vez mais um verdadeiro cultura da velocidade, da superficialidade, da
problema, diante do qual é preciso tomar facilidade e deixem de valorizar o esforço e a
decisões e elaborar estratégias. Além de ser busca pelo saber. Por isso conhecer as novas
necessário que os aprendizes disponham não demandas da educação para nos situarmos
apenas de recursos alternativos como também e criar formas de trabalho escolar pode nos
da capacidade de estratégia de saber quando dizer como ajudar a despertar no aluno o
e como devem utilizá-los. Para aprender é desejo de saber e o gosto pelo aprender de
preciso ter consciência das dificuldades e forma mais autônoma.
organizar estratégias para melhorar e superar Para Pozo (2002), se além de processos
estas dificuldades. eficazes, os alunos adquirem um conheci-
Aprender implica mudar e a maior parte mento estratégico para manejar e controlar
das mudanças em nossa memória precisa de sua atividade de aprendizagem terão mais
uma certa quantidade de prática, aprender, condições de aprender e compreender as si-
principalmente de modo explícito ou deli- tuações apresentadas em que precisam aplicar
berado, supõe um esforço que requer altas seus conhecimentos.
doses de motivação, no sentido mais literal Para isso, os aprendizes devem aprender a
de mover-se para a aprendizagem. (POZO, controlar e regular seus processos cognitivos,
2002, p.138). assim como a se habituar a pensar sobre seu
Isso sugere prática reflexiva e auto- próprio conhecimento, quer dizer, a exercitar
avaliação. Porém o tipo de prática realizado o metaconhecimento. Esse controle e esse
nas escolas ainda valoriza a quantidade de metaconhecimento serão aplicados, natural-
exercícios em pouco tempo e não a distri- mente, à “gestão” de técnicas e recursos de
buição destes no tempo com metodologias aprendizagem específicos, mas também a
diferenciadas. As práticas diversificadas outros resultados de aprendizagem implícitos
permitem que se avalie se realmente as ou explícitos. (POZO, 2002, p.79).
aprendizagens são consistentes e duradouras. Segundo o autor, quando os alunos
A prática pedagógica precisa estar organizada simplesmente entregam exercícios com o
de forma que possibilite as aprendizagens e objetivo de um resultado final, sem que
permita ao aluno criar estratégias de apren- tenham significado, não conseguem com-
dizagem frente aos conteúdos apresentados. preender suas dificuldades, como na fala de
Conforme o resultado que o professor deseja, A1 que afirma “vou bem, vou passar” e foi
precisa ativar determinados processos em reprovado. Por isso, a autoavaliação é muito
seus alunos, pois se queremos que os alunos importante para a capacidade de autocontrole
consigam avaliar suas capacidades e dificul- nas tarefas de aprendizagem. Ter consciência
dades adequadamente, precisamos dispor de dos conhecimentos e das metas que se quer
meios para isso. atingir é o primeiro passo para a mudança.
No passado, as crianças construíam seus O aluno precisa ter autonomia para perce-
brinquedos, criavam suas brincadeiras, ti- ber como poderia melhorar seus resultados,
nham que trabalhar e se esforçar para poder ter consciência antes disso de como está seu
desempenho e onde deveria melhorar, isso é mais adequadas para por em marcha esses
muito importante para não se limitar aos re- processos.” (POZO, 2002, p.89).
sultados oferecidos pelo professor. Para isso, Para Pozo (2002), existem outros aspectos
o aluno precisa aprender a ter consciência de que são auxiliares na aprendizagem: a moti-
seu processo, sendo que o professor precisa vação, motivo pelo qual se quer aprender, a
proporcionar meios para que o aluno possa atenção em relação o que realmente se quer
criar estratégias, planejar, corrigir os erros e aprender, a recuperação e a transferência
avaliar suas possibilidades. das representações existentes na memória,
O professor precisa considerar as tarefas e a consciência como controle dos próprios
de aprendizagem como problemas, incenti- mecanismos de aprendizagem. Os moti-
vando o aluno a planejar, avaliar e conduzir as vos podem ser externos, como o desejo de
próprias aprendizagens, variando as formas gratificação ou internos ao sujeito, como a
de ensino para que os alunos tenham que satisfação de aprender. Ao longo da pesquisa
mudar a forma de pensar e resolver as tarefas. foi possível perceber desejos de aprender
extrínsecos, quando os alunos expressaram
A fala de dois alunos participantes da
que precisam aprender para ser alguém e
pesquisa revela que conseguem observar
trabalhar, ou seja para futuramente ter uma
corretamente seus desempenhos “vou me-
profissão e sobreviver, mas motivos mais
lhor nesta disciplina” (A7) e “vou bem”
intrínsecos como o desejo de saber por sa-
(A9), ambos com médias acima de 7,00.
tisfação de aprender não apareceram. Criar
Percebe-se que estes alunos que conseguem
situações e estratégias para que a motivação
avaliar-se de maneira adequada estão com
intrínseca surja nos alunos é um dos grandes
melhores resultados, o que reforça a ideia
desafios da escola.
de que a capacidade de avaliar corretamente
a própria aprendizagem é importante para o
desempenho escolar. Considerações finais
Segundo Pozo (2002), a nova cultura da
aprendizagem propõe a passagem de um O objetivo do presente estudo configurou-
aprendiz passivo, “disposto a aprender de se por investigar os tipos de vínculos constru-
forma reprodutiva o que lhe é pedido, para ídos por alunos de quintas séries com o pro-
um aprendiz ativo e construtivo orientado fessor, o conhecimento e o ambiente escolar
para a busca do significado do que faz, diz e e sua influência na aprendizagem, analisando,
pensa, que se sustenta numa aprendizagem também, a imagem do bom/mau professor
cada vez mais metacognitiva e controlada.” na perspectiva dos alunos, comparando com
(Pozo, 2002, p.79). desempenho destes nas disciplinas.
A partir dos dados coletados com os par- A hipótese inicial era de que os vínculos
ticipantes da pesquisa é possível afirmar que positivos facilitariam a aprendizagem, pos-
para aprender apenas vínculos positivos com sibilitando um melhor resultado, enquanto
o professor e a escola não bastam, “o ideal é vínculos negativos poderiam prejudicar a
que o próprio aluno seja quem, de maneira aprendizagem e o rendimento dos alunos,
progressiva, acabe exercendo o controle de como também que um bom vínculo com
seus próprios processos, utilizando-os de determinado professor considerado o melhor
forma estratégica, mediante uma tomada professor, poderia ajudar o aluno a desejar
de consciência dos resultados que espera aprender e melhorar seus desempenhos.
da aprendizagem, dos processos mediante Analisando os dados foi possível observar
os quais pode alcançá-los e das condições quatro tipos de vínculos: positivos, negativos,
AUTORES
Eliana Sandri Lira – Pedagoga, Especialista em Psicopedagogia pela URI- Campus de Erechim,
Professora de Educação Infantil da Escola Municipal de Ensino Fundamental Osório Duque
Estrada – Cruzaltense. E-mail: esandri23@yahoo.com.br
Jacqueline Raquel Bianchi Enricone – Psicóloga. Mestre em Educação (UFRGS). Professora
da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões - Campus de Erechim.
E-mail: jenricone@uri.com.br
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