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Aula 01

Atributos da Atenção Primária


à Saúde
MINISTÉRIO DA SAÚDE
Secretaria de Atenção Primária à Saúde
Departamento de Prevenção e
Promoção da Saúde

Projeto Cuida APS

Curso de Extensão EaD


Gestão dos Serviços da APS e o
Monitoramento do Cuidado das Pessoas
com Condições Crônicas

Aula 01
Atributos da Atenção Primária
à Saúde

Alexandre Sizilio

São Paulo – SP
2021-2023
Créditos

MINISTÉRIO DA SAÚDE HOSPITAL ALEMÃO OSWALDO CRUZ


Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Diretor Presidente:
Único de Saúde - PROADI/SUS José Marcelo de Oliveira
Projeto Cuida APS: Cuidado das Pessoas com Doenças Crônicas Diretora Executiva de Sustentabilidade e Responsabilidade Social:
Não Transmissíveis Ana Paula Neves Marques de Pinho
Diretora Executiva de Educação, Pesquisa, Inovação e
EQUIPES DIRETIVAS Saúde Digital:
MINISTÉRIO DA SAÚDE Maria Carolina Sanchez da Costa
Ministra da Saúde: Gerente de Projetos:
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Secretaria de Atenção Primária à Saúde:
Nésio Fernandes de Medeiros Junior GRUPO EXECUTIVO DO PROJETO
Departamento de Prevenção e Promoção da Saúde: Fernando Freitas Alves
Andrey Roosewelt Chagas Lemos Flávia Landgraf
Coordenadora-Geral de Prevenção às Condições Crônicas na Gilmara Lúcia dos Santos
Atenção Primária à Saúde: Lara Paixão
Gilmara Lúcia dos Santos Marcela Alvarenga de Moraes
Samara Kielmann
CONASEMS
Presidente:
FECS - FACULDADE DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
Wilames Freire Bezerra
Diretoria Acadêmica
Secretário Executivo:
Elaine Emi Ito
Mauro Guimarães Junqueira
Coordenação Geral de Pós-graduação:
Paula Zanelatto Neves
Secretaria Acadêmica e Apoio:
Bruna Aparecida de Souza Manoel

EQUIPE TÉCNICA DO HOSPITAL ALEMÃO OSWALDO CRUZ (HAOC)


Coordenadora: Gestão dos Processos de EaD:
Flávia Landgraf Débora Schuskel
Analistas: Gestão dos Processos do Curso:
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Tauana Sequalini Gestão do Ambiente Virtual de Aprendizagem:
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Equipe Técnico-pedagógica do Projeto: Produção Audiovisual:
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Cristian Fabiano Guimarães Analista de Suporte a Sistemas Educacionais:
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Flávio Adriano Melo Borges Design Instrucional:
Fernanda Ferreira Marcolino Camila Ferrarini Soares
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Lara Paixão Coordenação do Curso:
Luciana Soares de Barros Fernanda Rocco Oliveira (1ª Edição e 2ª Edição)
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Sueli Fátima Sampaio Autor:
Rosemarie Andreazza Alexandre Sizilio
Colaboradores: Revisão Técnica:
Adelson Guaraci Jantsch Fernanda Ferreira Marcolino
Alexandre Sizilio Fernanda Rocco Oliveira
Clarissa Willets Bezerra Iara de Oliveira Lopes
Daniela de Almeida Pereira
Patrícia de Sampaio Chueiri
Iara de Oliveira Lopes
Revisão de Conteúdo Digital:
Leonardo Graever
Fernanda Rocco Oliveira
Patrícia Sampaio Chueiri
Iara de Oliveira Lopes
Revisão Textual:
Emilene Lubianco de Sá

Aula 01 - Atributos da Atenção Primária à Saúde 03


Sumário

Aula 01 - Atributos da Atenção Primária à Saúde

Apresentação da Aula ................................................................................................................................................................................................. 05

Objetivo de Aprendizagem ................................................................................................................................................................................... 05

De onde viemos ........................................................................................................................................................................................................ 06

Atributos da Atenção Primária à Saúde ....................................................................................................................................................... 11

Considerações Finais ..................................................................................................................................................................................................... 15

Referências ............................................................................................................................................................................................................................ 16

O Autor ...................................................................................................................................................................................................................................... 17

Aula 01 - Atributos da Atenção Primária à Saúde 04


Projeto Cuida APS

Apresentação da Aula

Bem-vindos, colegas trabalhadores e trabalhadoras do SUS!

Hoje iniciamos uma viagem de descobertas, ou redescobertas, sobre o nosso


campo de atuação, a própria Atenção Primária à Saúde (APS). Nesta aula vamos discutir
sobre os princípios da APS na interface com o cuidado das pessoas com condições
crônicas, e refletir sobre os diferentes sistemas de APS do mundo.

Para que esse mergulho na APS seja proveitoso, convém saber primeiro de onde
viemos e por que estamos aqui. Acompanhem esse breve histórico sobre a formação da
Atenção Primária à Saúde.

Objetivo de Aprendizagem

Ao final desta aula, vocês serão capazes de:


✓ Conhecer os princípios da APS como fundamento para a
organização da oferta do cuidado em saúde.

Aula 01 - Atributos da Atenção Primária à Saúde 05


Projeto Cuida APS

De onde viemos

A ideia de um nível de atenção à saúde que representasse a porta de entrada para


o sistema de saúde e que unisse conceitos de hierarquização (ou seja, uma espécie de
pirâmide, partindo do nível de atenção mais geral para o mais especializado), e de
regionalização dos serviços de saúde (em que a gestão do nível mais geral de atenção
fosse realizada pelos governantes que estivessem mais próximos da população) surgiu no
Reino Unido, em 1920, com a publicação do Relatório Dawson1.

Saiba Mais
Para saber mais sobre o Relatório Dawson, clique aqui.

Esse relatório concebia o modelo de atenção em centros de saúde primários e


secundários, serviços domiciliares, serviços suplementares e hospitais de ensino. Os
Centros de Saúde Primários e os serviços domiciliares deveriam estar organizados de
forma regionalizada, de modo que a maior parte dos problemas de saúde deveriam ser
resolvidos por médicos com formação generalista. Os casos que o médico não tivesse
condições de solucionar com os recursos disponíveis nesse âmbito da atenção deveriam
ser encaminhados para os Centros de Atenção Secundária, onde haveria especialistas das
mais diversas áreas, ou então para os hospitais, quando existisse indicação de internação
ou cirurgia.

Essa organização caracterizava-se pela hierarquização dos níveis de atenção à


saúde. Os serviços domiciliares de um dado distrito deveriam estar baseados num Centro
de Saúde Primário, uma instituição equipada para serviços de medicina curativa e
preventiva, a qual seria conduzida por clínicos gerais daquele distrito, em conjunto com
um serviço de enfermagem eficiente e com o apoio de consultores e especialistas
visitantes. Ainda segundo o relatório britânico, os Centros de Saúde Primários variariam
em seu tamanho e complexidade, de acordo com as necessidades locais e com sua
localização na cidade ou no país. Mas, a maior parte desses centros seria formada por
clínicos gerais dos seus distritos e pelos pacientes pertencentes aos serviços chefiados por
médicos de sua própria região.

Aula 01 - Atributos da Atenção Primária à Saúde 06


Projeto Cuida APS

Essa concepção, elaborada pelo governo inglês, influenciou a organização dos


sistemas de saúde de todo o mundo, definindo duas características básicas da APS. A
primeira é a regionalização, isto é, os serviços de saúde deveriam estar organizados de
forma a atender as diversas regiões nacionais, através da sua distribuição, tendo em vista
as bases populacionais e as necessidades de saúde de cada região. A segunda
característica é a integralidade, fortalecendo a indissociabilidade entre ações curativas e
preventivas.

Centros de Saúde Primários deveriam resolver a maioria dos problemas de saúde


da população e funcionar como porta de entrada e núcleo do sistema, de forma
vinculada e com o suporte de centros de saúde secundários e hospitais de ensino. As
propostas do documento estiveram presentes na base da criação do Sistema Nacional de
Saúde da Inglaterra e inauguraram um conjunto de dimensões ainda centrais nas
discussões contemporâneas acerca da organização de sistemas de saúde com ênfase na
APS, como a atenção ao primeiro contato, a hierarquização dos níveis de atenção à saúde
e a regionalização a partir de bases populacionais2,3.

Apesar disso, somente na década de 1960 veríamos um movimento universal por


uma organização dos sistemas de saúde que englobasse uma visão mais voltada para as
necessidades da população e menos voltada para a demanda de serviços especializados.
Isso ocorreu devido a uma crise da medicina dita biomédica, na qual o aporte de
tecnologia dura e a especialização dos profissionais era imperativa3.

Olhando para o cotidiano da sua equipe, você consegue identificar quando


são utilizadas estas diversas tecnologias?

o Tecnologia leve: tecnologias de relações (produção de vínculo e das relações,


autonomização, acolhimento, gestão de processos de trabalho).

o Tecnologia leve-dura: saberes bem estruturados, que operam no trabalho em


saúde (como a clínica médica, a psicanalítica, a epidemiológica). A utilização de
um protocolo ou um guideline clínico ilustra essa tecnologia.

o Tecnologia dura: equipamentos tecnológicos, máquinas, normas, estruturas


organizacionais4.

Aula 01 - Atributos da Atenção Primária à Saúde 07


Projeto Cuida APS

Em 1978, a Declaração de Alma-Ata, documento produzido durante a convenção


de saúde mundial realizada na União Soviética, expressa essa necessidade urgente de
mudança dos sistemas de saúde. De acordo com a declaração:

Os cuidados primários de saúde são cuidados essenciais de saúde


baseados em métodos e tecnologias práticas, cientificamente bem
fundamentadas e socialmente aceitáveis, colocadas ao alcance universal de
indivíduos e famílias da comunidade, mediante sua plena participação e a
um custo que a comunidade e o país possam manter em cada fase de seu
desenvolvimento, no espírito de autoconfiança e automedicação. Fazem
parte integrante tanto do sistema de saúde do país, do qual constituem a
função central e o foco principal, quanto do desenvolvimento social e
econômico global da comunidade. Representam o primeiro nível de
contato dos indivíduos, da família e da comunidade com o sistema nacional
de saúde, pelo qual os cuidados de saúde são levados o mais proximamente
possível aos lugares onde pessoas vivem e trabalham, e constituem o
primeiro elemento de um continuado processo de assistência à saúde (p. 1)5.

Saiba Mais
Para saber mais sobre a Declaração de Alma-Ata, clique aqui.

No Brasil, com uma realidade social e política complexa no final dos anos 1970 e
início dos anos 1980, não foi permitida a implantação imediata desses conceitos. Durante
toda a década de 1970 já víamos algumas iniciativas para ampliar as práticas dos antigos
centros de saúde, utilizados apenas para a prestação de serviços como vacinação, e
transformá-los em centros de assistência comunitária à saúde. Podemos citar como
exemplos o projeto de saúde comunitária Murialdo, da Secretaria Estadual de Saúde do
Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, e o Programa de Interiorização das Ações de Saúde e
Saneamento (PIASS), no Nordeste, projetos que foram embrionários para um certo
pensamento sobre a saúde comunitária que seria encampada pela Reforma Sanitária na
década de 1980.

A VIII Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986, organiza em um


documento todas essas novas ideias sobre a organização e prática da saúde no país
dando subsídio para a Constituição de 1988, que é o fundamento legal do Sistema Único
de Saúde, regulamentado pela Lei Federal n.º 8.080/1990.

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Projeto Cuida APS

Fonte: Imagem - Webdoc Brasil, aqui tem SUS/Levante Filmes/Conasems©.

Apesar disso, apenas em 1994, temos a implantação de um programa visando a


ação assistencial no SUS e não apenas as reformas políticas e do direito à saúde.
Alavancado pelo sucesso do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) no
Nordeste, surge o Programa Saúde da Família (PSF). Pensado primeiramente como um
programa e depois institucionalizado como uma estratégia para a reordenação dos
serviços de saúde, o Programa Saúde da Família lançou as bases para a Atenção Primária
à Saúde que fazemos hoje no nosso país.

Minha Prática
Pode ser que muitos de vocês tenham vivido os momentos ou os anos
anteriores à configuração de um modelo de atenção primária. E é possível
que tenham participado ativamente dessa construção nesses últimos anos.
Como foi esse processo, essa vivência? Do que vocês se lembram? Quais
foram os maiores desafios?

Em 17 anos, desde a implantação do Programa Saúde da Família, houve grandes


avanços na melhoria dos indicadores de saúde do país, notadamente na mortalidade
infantil e na mortalidade por doenças cardiovasculares.

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Projeto Cuida APS

Saiba Mais
• Para saber mais sobre este assunto, leia: Mortalidade Infantil e
Saúde da Família nas Unidades da Federação Brasileira, 1998-
2088, clicando aqui.

• Artigo que compila duas evidências científicas e que revela


melhora de indicadores: Estratégia Saúde da Família, um forte
modelo de Atenção Primária à Saúde que traz resultados,
clicando aqui.
• Vídeo que mostra, de uma maneira divertida, a saga da
construção da saúde pública brasileira, desde o descobrimento
do país. Para assistir, clique aqui.

Fonte: Imagem - Webdoc Brasil, aqui tem SUS/Levante Filmes/Conasems©.

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Projeto Cuida APS

Atributos da Atenção Primária à Saúde

Depois desse breve resumo histórico sobre a construção da APS no nosso país, é
hora de explorarmos melhor o que significa Atenção Primária à Saúde.
Segundo a definição de Barbara Starfield, médica pediatra da Universidade Johns
Hopkins, nos EUA, e uma das mais importantes pesquisadoras sobre Atenção Primária, a
Atenção Primária à Saúde é:

aquele nível de um sistema de serviços de saúde que oferece a


entrada para todas as novas necessidades e problemas, fornece
atenção sobre a pessoa (não direcionada para a enfermidade) através
do tempo, fornece atenção para todas as condições, exceto as muito
incomuns e raras, e coordena ou integra a atenção fornecida por
outros serviços ou por terceiros (p. 28)6.

Esse entendimento sobre atenção primária é o norteador do nosso desenho de


APS brasileiro, e nos dá como objetivo alcançar, nesse nível de atenção, um cuidado em
saúde integral e acessível. Sendo assim, dessa definição tiram-se alguns atributos que um
serviço de saúde de atenção primária deve conter, que nada mais são do que os meios
para que possamos implementar esse serviço. Esses atributos são parte da nossa vida
cotidiana na prática da APS e muitas vezes não nos damos conta.
Vamos olhar para cada um deles e fazer um exercício de transpô-los para a
nossa prática.
Podemos dividir os atributos da APS em atributos essenciais e atributos
derivados.
Os atributos essenciais são:

Atenção ao Primeiro Contato:


Acessibilidade e utilização dos serviços de saúde pelos usuários a cada novo
problema ou a cada novo episódio de um mesmo problema. Aqui temos
que fazer uma consideração entre as diferenças entre acesso e
acessibilidade. O conceito de acesso traz consigo a ideia de não restringir a
entrada nos serviços de saúde, ao passo que a acessibilidade diz respeito à
oferta de serviços, à capacidade de produzir serviços e responder às
necessidades de saúde de uma determinada população. A acessibilidade
pode ser conceituada, portanto, como a capacidade do usuário de obter
cuidados de saúde sempre que necessitar e de maneira fácil e conveniente7.
No nosso sistema de saúde a APS é considerada a porta de entrada. Vamos

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Projeto Cuida APS

a um exemplo? No dia a dia de uma unidade de saúde, quando a equipe


acolhe o paciente sem consulta marcada ou vai até a casa de um usuário
que acabou de se acidentar e voltou do hospital, estamos garantindo
acessibilidade a esse paciente.

Longitudinalidade:
Pressupõe a existência de uma fonte regular de atenção e seu uso ao longo
do tempo, independentemente da presença de problemas específicos
relacionados à saúde ou do tipo de problema da pessoa. A longitudinalidade
proporciona diagnósticos e tratamentos mais precisos e, dessa forma,
menos encaminhamentos para especialistas focais. Além disso, reduz a
realização de procedimentos de alta complexidade. A longitudinalidade se
dá tanto na relação duradoura entre o paciente e os profissionais de saúde
implicados no seu cuidado quanto nessa mesma relação com a unidade de
saúde que presta o cuidado àquela pessoa (paciente). Então, quando a
equipe da Unidade de Saúde atende um paciente hipertenso por um
período de dez anos, mesmo tendo essa própria equipe iniciado sua
participação nessa Unidade de Saúde há menos de um ano e presta um
cuidado humanizado e mantenedor do vínculo com a equipe e o serviço,
estamos promovendo a longitudinalidade do cuidado. O registro em
prontuário também é, nesse sentido, uma excelente ferramenta para
garantir a longitudinalidade.

Integralidade:
A integralidade pode ser definida em quatro dimensões: primazia das ações
de promoção e prevenção, atenção nos três níveis de complexidade da
assistência médica, articulação das ações de promoção, proteção e
prevenção e abordagem integral do indivíduo e das famílias5. Talvez a
dimensão que mais se aproxime do cotidiano das equipes na APS seja a
última: realizar a abordagem integral do indivíduo e das famílias. As outras
dimensões estão mais ligadas à integralidade como princípio estruturante
do SUS, muito importante para a consolidação da APS. Nessa dimensão, a
integralidade do cuidado depende de uma nova definição de práticas,
estabelecendo vínculo, acolhimento e proporcionando autonomia ao
indivíduo, pontos de partida para qualquer intervenção, construindo a
possibilidade do cuidado centrado na pessoa. Na prática diária, quando as
equipes consideram a preocupação do indivíduo em estar sem dores de
cabeça para que possa tocar violão na festa do santo de sua devoção,
estarão exercendo um olhar integral à sua saúde.

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Projeto Cuida APS

Coordenação do Cuidado:
A coordenação do cuidado pode ser definida como a articulação entre os
diversos serviços e ações de saúde, de forma que estejam sincronizados e
voltados ao alcance de um objetivo comum, independentemente do local
onde sejam prestados. Tem como objetivo ofertar ao usuário um conjunto
de serviços e informações que respondam a suas necessidades de saúde de
forma integrada, por meio de diferentes pontos da rede de atenção à saúde.
Com um grande número de usuários do sistema de saúde com
necessidades de saúde complexas e recebendo cuidados em diversos
pontos da Rede de Atenção à Saúde, ter a APS como coordenadora é de
grande importância para que consigamos desenvolver os três atributos
descritos acima. Assim, quando os serviços organizam os
encaminhamentos dos usuários, por meio de estratégias para que os
serviços especializados se comuniquem com a equipe da atenção
primária, garantindo que essa equipe tome conhecimento dos
tratamentos a eles propostos e consiga fazer a gestão dessas prescrições
e tratamentos, estamos promovendo a coordenação do cuidado dos
indivíduos.

Além dos atributos essenciais descritos acima, temos alguns atributos também
importantes para o cuidado em saúde na atenção primária, porém não tão centrais como
os primeiros. Chamamos esses atributos de derivados, pois são oriundos dos atributos
essenciais, ou principais. São eles:

1. Orientação familiar: conhecimento dos fatores familiares relacionados à origem e ao


cuidado das doenças. Quando utilizamos um prontuário familiar ou fazemos uma
visita domiciliar estamos exercendo esse atributo.

2. Orientação comunitária: necessidades da comunidade, por meio de dados


epidemiológicos e pelo contato direto com a comunidade; envolve também o
planejamento e a avaliação conjunta dos serviços. A realização de um diagnóstico
territorial é um exemplo do exercício desse atributo.

3. Competência cultural: adaptação do profissional de saúde e dos serviços de saúde,


com o intuito de facilitar a relação com as populações culturalmente diversas.
Quando respeitamos as interdições das diferentes religiões do nosso país, por
exemplo, e adequamos nosso cuidado, estamos exercendo a competência cultural da
APS.

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Projeto Cuida APS

Conhecer e entender como se originou o nosso sistema de saúde, como e a partir


de quais princípios ele se organiza, é fundamental para que entendamos o nosso próprio
processo de trabalho. E esse entendimento é fundamental para que o façamos da melhor
forma possível.

Diversos estudos demonstram que um sistema de saúde com centralidade na


APS é mais custo-efetivo, ou seja, é capaz de otimizar os recursos gastos na saúde e até
poupar recursos. Um exemplo importante dessa custo-efetividade é o impacto das
chamadas doenças sensíveis à Atenção Primária no custo das internações no SUS.

Em estudo recente do Instituto Federal de Minas Gerais os pesquisadores


demonstraram que a maior parte das internações hospitalares em um município do
norte de Minas Gerais no período de 2017 a 2019 foram por condições sensíveis à atenção
primária como a insuficiência cardíaca e as doenças cérebro-vasculares e que uma APS
de melhor qualidade poderia ter evitado grande parte dessas internações com
consequente queda nos custos6.

Saiba Mais
Para saber mais sobre o estudo do Instituto Federal de Minas Gerais, leia
o artigo na íntegra clicando aqui.

Sabemos ainda que um sistema de saúde centrado na atenção primária


proporciona melhores índices de satisfação para os indivíduos e as comunidades. E que,
principalmente, é mais equitativo em todos os contextos, inclusive naqueles com grande
iniquidade e desigualdade social como o nosso7.

A APS deve, portanto, ser o primeiro contato de todos os indivíduos com o serviço
de saúde, independentemente de gênero, condição socioeconômica e cultural ou
problema de saúde que apresente (ou mesmo na falta de um). A APS também deve ser o
local de cuidado organizador do sistema como um todo, atuando com integralidade,
individual e coletivamente, garantindo a longitudinalidade do processo e trabalhando
como coordenador do cuidado em saúde, mesmo quando os indivíduos sob seu cuidado
estiverem também sob o cuidado dos níveis de atenção especializados.

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Projeto Cuida APS

Minissérie
Em nosso curso você vai conhecer (ou já conheceu) a
história da gerente Marilda na busca de uma APS que
valorize o primeiro acesso e a integralidade do
cuidado. É possível perceber o quando situações do
cotidiano provocam reflexões em Marilda que a
fazem mudar sua conduta junto com a equipe.
Procure observar ao longo dos episódios como isso
se dá. Será que você gestor(a) se identifica com
algumas dessas situações e reflexões de Marilda?
Você pode acessar a Minissérie por esse QR Code
(aponte a câmera do celular para visualizar) ou
clicando aqui.

Considerações Finais

Nesta aula foi possível perceber que os atributos da atenção primária não se
fecham em si mesmos, ou seja, o que garante a qualidade do cuidado em saúde na APS é
a ação conjunta e coordenada de todos os atributos discutidos.

Sempre que focamos apenas em um atributo deixamos de lado situações que


podem ter relação com algum outro que não prestamos atenção. E viver todos os
atributos de uma só vez é exatamente o que fazemos em nossa prática diária.

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Projeto Cuida APS

Referências

1. Ministry of Health. Consultative Council on Medical and Allied Services. Interim


report on the future provision of medical and allied services. London, 1920 [acesso
em 16 nov 2021]. Disponível em: https://www.sochealth.co.uk/national-health-
service/healthcare-generally/history-of-healthcare/interim-report-on-the-future-
provision-of-medical-and-allied-services-1920-lord-dawson-of-penn/.

2. Conill EM. Ensaio histórico-conceitual sobre a Atenção Primária à Saúde: desafios


para a organização de serviços básicos e da Estratégia Saúde da Família em
centros urbanos no Brasil. Cad. Saúde Pública. 2008;24(Sup1):S7-S27.
https://doi.org/10.1590/S0102-311X2008001300002.

3. Portela GZ. Atenção Primária à Saúde: um ensaio sobre conceitos aplicados aos
estudos nacionais. Physis Revista de Saúde Coletiva. Jan/mar 2017;27(2): 255-76.
https://doi.org/10.1590/S0103-73312017000200005.

4. Mehry EE. Um ensaio sobre o médico e suas valises tecnológicas: contribuições


para compreender as reestruturações produtivas do setor saúde. Interface
(Botucatu). Fev 2000;4(6). https://doi.org/10.1590/S1414-32832000000100009.

5. Declaração de Alma Ata sobre Cuidados Primários. Conferência Internacional


sobre Cuidados Primários de Saúde. Alma-Ata, URSS, 6-12 de setembro de 1978.

6. Oliveira, Thatiane Lopes et al. Fatores associados ao custo das internações


hospitalares por doenças sensíveis à Atenção Primária no Sistema Único de
Saúde. Ciência & Saúde Coletiva [online]. 2021; 26(10):4541-52.
https://doi.org/10.1590/1413-812320212610.10862021.

7. Starfield B. Atenção Primária: equilíbrio entre necessidade de saúde, serviços e


tecnologia. Brasília: UNESCO; Ministério da Saúde; 2002.

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Projeto Cuida APS

O Autor

Alexandre Sizilio

Médico graduado pela Faculdade de Medicina da Universidade de


São Paulo (FMUSP), com especialização em Ginecologia e
Obstetrícia pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo - HCFMUSP, especialização em Medicina
de Família e Comunidade pela Santa Casa de São Paulo. Mestre em
Saúde Coletiva. Doutor em ciências médicas, área de concentração
educação em saúde pela FMUSP. Atualmente é professor assistente
e pesquisador na Faculdade Israelita de Ciências da Saúde Albert
Einstein e foi assessor técnico no Projeto Cuida APS, Hospital
Alemão Oswaldo Cruz (HAOC), PROADI-SUS.

Aula 01 - Atributos da Atenção Primária à Saúde 17


Projeto Cuida APS

Este material integra a coleção de e-books do Curso de Extensão “Gestão dos Serviços da
APS e o Monitoramento do Cuidado das Pessoas com Condições Crônicas”. O curso faz
parte do conjunto de ofertas do Projeto Cuida APS: cuidado das pessoas com doenças
crônicas não transmissíveis (DCNT), iniciativa do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (HAOC) em
parceria com o Ministério da Saúde (MS) e Conselho Nacional de Secretarias Municipais de
Saúde (CONASEMS), estabelecida por meio do Programa PROADI-SUS, para o triênio de
2021-2023.

O curso teve elaboração e produção de seus materiais educacionais iniciada em 2021 e se


estendeu até a abertura da primeira oferta do curso, ocorrida entre julho de 2022 e janeiro
de 2023. Portanto, os referenciais técnico-políticos estiveram em consonância com o seu
momento de produção. Uma segunda oferta do curso foi realizada no período de junho a
novembro de 2023.

Os recursos gráficos e educacionais e a linguagem abordada foram escolhidos para atender


às necessidades formativas do público do curso. Todos os textos, imagens, vídeos e outros
materiais são protegidos por direitos autorais e outros direitos. O direito de propriedade dos
materiais é do Ministério da Saúde e poderão ser utilizados apenas para fins de forma
gratuita, condicionada à citação do autor, conforme licença Creative Commons.

Aula 01 - Atributos da Atenção Primária à Saúde 18

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