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PRÁTICA COMO

COMPONENTE CURRICULAR

A Ética em Espinosa

MARCELO SOARES UCHÔA


RA 2008312
UNIDADE CHÁCARA SANTO ANTÔNIO

2021

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Sumário
MOTIVAÇÃO ......................................................................................................................................... 3

QUEM FOI BARUCH SPINOZA .............................................................................................................. 5

CONCEPÇÃO DE DEUS EM ESPINOSA ................................................................................................. 6

ASPECTOS DA ÉTICA EM ESPINOSA .................................................................................................... 9

CONSIDERAÇÕES ............................................................................................................................... 10

REFERÊNCIAS...................................................................................................................................... 11

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MOTIVAÇÃO
De todos os homens que insculpiram seus nomes na história do pensamento filosófico,
Espinosa é, seguramente, um dos mais fascinantes. Estudar Ética na perspectiva deste importante
pensador constitui terreno sólido e alicerce firme para todos aqueles que desejarem pavimentar, de
forma consistente, o enorme edifício do conhecimento filosófico sobre Ética. Como nos diz Bertrand,
“(...) Spinoza (1632-77) é o mais nobre e adorável de todos os grandes filósofos.” (RUSSELL, 2015).
Como sabemos, Ética constitui um dos assuntos mais discutidos e estudados no campo das
ciências humanas. Sendo a contribuição de Espinosa ímpar neste quesito, torna-se este autor
leitura obrigatória para todos os estudantes nas áreas de humanas, especialmente no campo da
Sociologia, do Direito e, é claro, da Filosofia.
Considerado por muitos a sua principal obra o opúsculo Ética, que foi publicado após a sua
morte, o próprio autor não pode contemplar o efeito incomum de suas colocações. Considerados
por muitos cristãos de sua época como um herege e ateu, Espinosa sofreu enorme preconceito por
ter uma visão bem peculiar sobre a divindade e seus atributos.
Associando Deus e Natureza de uma forma nunca proposta, Espinoza foi duramente criticado
e ferozmente perseguido pela ortodoxia eclesiástica de sua época. De origem judia, passou a ver a
religião de uma outra forma, uam vez que que excomungado pelos próprios judeus. Sua ideia de
Deus, apresentada de uma maneira completamente agnóstica ao pensamento da época, sua leitura
era entendida por muitos como uma demonstração explícita de panteísmo e uma negação aos
valores religiosos, o que lhe rendeu abominação por parte da igreja e perseguição pelos membros
da sociedade de sua época. Sua família, que trocou a Espanha pela Holanda (e pelo que tudo indica
o fez para fugir da inquisição) também sofreu as agruras religiosas da época.
A partir da ideia de Deus Espinoza desenvolve suas teorias filosóficas sobre Ética, sobre
Teoria Política (Tractatus theologico-politicus) e sobre Teologia (Tractatus politicus). Diz-nos assim
Bertrand: “O primeira consiste numa curiosa combinação de crítica bíblica e teoria política; o
segundo, somente em teoria política.” (RUSSELL, 2015), onde se observa um vasto campo de
atuação deixado por ele.
Dentro do contexto histórico em que Espinosa viveu, foi considerado mesmo um subversivo.
O catolicismo, que se espalhava pela Espanha, caracterizado pela intransigência, pela intolerância
e ferocidade litúrgica, gerou dualidade de forças entre os poderosos e os plebeus, e a arena judicial
daquela época, conforme asseverou o Prof. Fernando Oliveira, foi chamada de O Tribunal da Santa
Inquisição. Foi neste conturbado ecossistema coercitivo que Espinosa desenvolveu a sua tese
filosófica sobre Deus, Ética, Política e Sociedade.
Para os padrões do século 21, Espinoza viveu muito pouco, pois faleceu de tísica aos 43 anos
de idade, entretanto, seus enunciados ecoam até hoje, ensejando acuradas reflexões. Dialogando,
em certa medida, com o pensamento platônico, escreve assim, na obra Ética, o intrigante Espinoza:
“O sábio, na medida em que é considerado como tal, dificilmente tem o espírito perturbado; antes,
estando cônscio de si mesmo, de Deus e das coisas em razão de certa necessidade eterna, não
deixa nunca de ser, gozando sempre de verdadeira tranquilidade de seu ânimo.”.
Deste modo, e objetivando seguir as orientações expedidas pela disciplina Prática como
Componente Curricular (PCC), amealhamos do conteúdo deste segundo semestre de 2021,
algumas das empolgantes reflexões expedidas pela disciplina A ÉTICA EM ESPINOSA
evidenciadas pelos comentários do Prof. Dr. Fernando Oliveira.

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Agrupamos nossa síntese em três insumos: o primeiro deles corresponde à leitura do livro-
texto da disciplina A Ética em Espinosa, elaborado pelo Prof. Dr. Fernando Henrique Cavalcante de
Oliveira; o segundo diz respeito à leitura da obra História da Filosofia Ocidental, livro 3, A Filosofia
Moderna, de Bertrand Russell; e o terceiro são as anotações que fizemos durante os comentários
do professor Fernando Oliveira ao longo das vídeo-aulas na plataforma AVA.
Buscaremos uma narrativa carregada de interpretação pessoal, mas, ao mesmo tempo,
marcada pela fidelidade ao conteúdo acadêmico.
Como definitivamente não há obviedades quando se trata de analisar o pensamento de
Espinosa, deixaremos uma de suas intrigantes proposições, que trata das afecções e das suas
diversidades, onde assim o encontramos dizendo que “Duas ou mais coisa que sejam distintas,
distinguem-se entre si ou pela diversidade dos atributos das substâncias ou pela diversidade das
afecções das mesmas substâncias.”, demonstrando que Espinosa não deve mesmo ser só lido,
mas, sobretudo, convenientemente estudado, corroborando o provérbio mencionado pelo Prof. Dr.
Fernando Oliveira: “Espinosa não é para ser lido, mas para ser estudado, meditado.”.

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QUEM FOI BARUCH SPINOZA
Baruch Spinoza nasceu em Amsterdã no ano de 1632. De origem judia, seu pai chamava-se
Miguel de Espinosa, um comerciante judeu próspero. Sua mãe falece quando Espinosa contava 6
anos de idade. Sua família migrou para Portugal a fim de fugir da inquisição, tendo sido
considerados marranos, palavra que segundo o historiador Cecil Roth significa suíno (porco),
indicando que os judeus daquela época, convertidos ao cristianismo, não eram bem-vistos pela
comunidade cristã naquele século. Existe ainda uma outra tese para a expressão “marrã”,
constituída de tom irônico e em se referindo aos Mouros e aos Judeus, que à época eram
convertidos ao Cristianismo. Foi neste ambiente carregado de preconceitos nasceu Espinosa.
De acordo com as referências publicadas no Wikipédia, Espinosa era de estatura baixa, pele
“cor de oliva”, cabelos e sobrancelhas pretas, de modo que o indicavam como um judeu Sefardim
(judeus naturais da região a península Ibérica, região conhecida hoje como sendo entre a Espanha
e Portugal).
Antes de migrar para a Holanda, Espinosa viveu e estudou num bairro judeu de Amsterdã, o
que lhe rendeu bastante conhecimento sobre o Talmude (coleção de livros sagrados dos judeus), a
Bíblia e a Torá (os 5 primeiros livros do velho testamento). Entre os 20 e os 24 anos de idade
Espinosa estudou latim e ciências, o que possibilitou a ele conhecer diversos autores clássicos da
filosofia, como Cícero e Sêneca, além de Bacon, Hobbes e Descartes, sendo este último o que mais
influenciou Espinosa.
Aos 20 anos de idade Espinosa, já órfão de mãe, perde também o pai. Ele se afasta do legado
deixado pelo pai, quais sejam: as tradições religiosas do judaísmo e a compleição para o lucro,
muito comuns entre os judeus comerciantes, sobretudo à época. Desenvolve nesta época uma
espécie de oposição ao mundo judaico, passando a viver da arte de polir lentes, mas com bastante
dificuldade financeira.
Profissionalmente, ganhou a vida polindo lentes, ao que, além do título de filósofo recebe o
de artesão. Passou praticamente toda a sua curta vida em estado de modéstia, estabelecendo uma
total coerência entre o que ele apregoava e vivia. A este respeito, anota o Prof. Dr. Fernando
Oliveira: “Recusou também doações de amigos ricos, tendo aceitado apenas a de S. de Vries,
mesmo assim, reduzindo em muito seu valor.”. Há relatos de que o imperador Luís XIV teria
oferecido à Espinosa uma larga quantia para que ele (Espinosa) escrevesse um livro dedicado e
este, ao que Espinosa declina.
Há um momento na vida de Espinosa em que ele troca o seu prenome Baruch pela expressão
latina benedictus, justamente no período em que passou a andar malvestido e entre pessoas
pobres, distraindo o espírito entre o silêncio de suas reflexões e o fumo de seu cachimbo. Fez muitos
amigos por onde passou, pois que seu verbo era fácil e atraente, suas ideias agradáveis e gentis.
Espinosa faleceu no ano de 1677, aos 44 anos de idade, vitimado por tísica, uma espécie de
tuberculose pulmonar. Ele morava com a família em Haia, que tinha ido à igreja e o deixado com
um médico da família. Quando regressaram ele estava morto. Alguns historiadores indicam que foi
enterrado quase que no anonimato, sendo o seu sepultamento patrocinado por Leibniz.

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CONCEPÇÃO DE DEUS EM ESPINOSA
De todas as religiões milenares por sobre a face da Terra, o judaísmo é, com certeza, a
primeira religião monoteísta. De tradição milenar, imprimiu em Espinosa significativo impacto
reflexivo. A forma como foi educado, onde a visão de mundo era apresentada de forma
conservadora, contrastava com a lógica das causas buscada por Espinosa.
Ele acreditava num tipo de judaísmo que fosse menos ortodoxo, desvencilhado das
convenções e do conservadorismo, que afastavam as pessoas da análise dialética e reflexiva. De
fato, Espinosa, como nos lembra o Prof. Dr. Fernando Oliveira “[...] rompe com a metafísica antiga
e medieval, bem como com a metafísica cartesiana.”.
De toda a literatura filosófica deixada por Espinosa, o livro Ética é, fundamentalmente, um dos
mais importantes e a obra que melhor retrata esta ruptura. Foi tão contundente o livro que ele
mesmo solicitou só fosse publicado após a sua morte.
A filosofia de Espinosa, dentre outros elementos, traz uma visão de Deus nunca proposta. Foi
antagonista, embora influenciado por ele, do racionalismo de Rene Descartes, tendo criticado
duramente os dogmas religiosos. Também foi contra o moralismo religioso da época por o concebê-
lo como um simples verniz social; igualmente combateu o poder absolutista exercido pelos
governantes do seu século.
Espinosa produzir duras críticas ao status quo, ao mencionar que “O resultado de uma religião
estatal que não tem fundamentos racionais, um mero respeito pelos eclesiásticos, que envolve
adulação e mistérios, mas não uma verdadeira adoração a Deus.”, diz. Produziu, nesta direção,
mais reflexões de contestação, ao estabelecer que “Se puder ser demostrado que a Escritura não
é uma fonte de verdade natural, mas o portador de apenas uma simples mensagem moral (ame
seu próximo), então as pessoas verão que a fé é algo separado da filosofia.”. Menciona Espinosa
que a Bíblia ensina apenas obediência (a Deus), mas não conhecimento.
Concebendo o fato de que o egoísmo humano era o grande protagonista das adversidades
humanas, diz o Prof. Dr. Fernando Oliveira que “(...) a maioria dos distúrbios civis surgem de
disputas sectárias. O Perigo real para a república [diz] vem daqueles que adoram não Deus, mas
algumas palavras em uma página”.
O pensamento metafísico em Espinosa terá consonância com o Iluminismo do século 18,
onde a razão (espécie de antropocentrismo) dará lugar ao Teocentrismo vivenciado durante todo o
período medievo. Podemos destacar, em Espinosa, a ideia de Deus, de Natureza e de Ética.
Concebendo, de certa forma, uma visão monista “Deus ou Natureza”, Espinosa desenvolve
um sistema metafísico bem complexo, considerando as definições de “causa de si”, de “substância”
e de “atributo” os pilares para definir Deus. Ele o entende como sendo um ser absolutamente infinito;
uma substância composta por infinitos atributos, onde cada atributo identifica a essência eterna e
infinita de Deus. Para Espinosa, é na essência de Deus que tudo se explicar. Como, do ponto de
vista axiológico, todo efeito tem uma causa, tudo só é explicável por causalidade, sendo esta causa
a própria divindade (Deus). Por isso menciona que “Tudo o que é ou é em si, ou é em outro.”,
significando dizer que nada se explica a si mesmo como origem a não ser Deus. Exceção feita à
Deus, tudo o mais tem uma origem e portanto, é finito.
Importante considerar que, diferente do pensamento de Santo Agostinho, por exemplo, para
Espinosa não há verdade revelada. A razão para ele protagoniza o saber, isto é, a razão está no
lugar da revelação. Assim, Espinosa troca o dogma da igreja (revelação) pela reflexão
(conhecimento). Para Espinosa, Deus é a substância única e primeira; a natureza naturante (origem

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de tudo), sendo Deus a própria racionalidade e a causa de si mesmo; Para Espinosa, o Universo é
Deus.
Ainda sobre a metafísica de Espinosa, a lei divina deveria ser diferente da lei cerimonial. Para
el deveria existir três grandes divisões: a lei moral, a lei cerimonial e a lei divina.
A obra Ética de Espinosa está dividida em 5 grandes partes:
1) Deus (que quando trata da origem das coisas);
2) Natureza da mente (visão psicológica do homem);
3) Natureza dos afetos (que trata dos impulsos humanos);
4) Servidão humana (fala da escravidão);
5) Potência do intelecto (fala da liberdade).
Há alguns cuidados que precisamos tomar ao ler a obra Ética. São eles:
1º) Substância para Espinosa quer dizer Realidade;
2º) Perfeito, para ele, significa Completo;
3º) Ideal para Espinosa significa Objeto;
4º) Objetivamente deve ser entendido por subjetivamente;
5º) Formalmente quer dizer, para Espinosa, objetivamente.
Dentro da complexidade do texto de Espinosa, quando ele trata por exemplo do conceito de
Eternidade, sugerindo-a como sendo “A própria existência concebida da simples definição da coisa
eterna.”, remete-nos a ideia central de a existência de Deus explica tudo.
A matéria, segundo Espinosa, não explica o Espírito, isto é, um efeito imaterial não pode ter
causa material. Esta proposição é mencionada por ele ao afirmar que “coisas que não tem nada em
comum não podem ter a mesma origem, isto é, não podem ser origem de si.”, significando dizer que
Deus não se explica pela matéria. Segundo ele, podemos ter ideias verdadeiras de coisas não
existentes, assim, ainda que elas não existam em ato (fora do intelecto) sua essência pode ser
compreendida em outra coisa.
Assim, para Espinosa, Deus é uma substância composta por infinitos atributos, sendo cada
atributo de Deus possuidor de infinitas essências e exprimindo necessidades de eterno e de infinito
(e tudo o que é infinito é indivisível, logo, Deus é indivisível). Acrescenta ele dizendo que “Se
houvesse alguma substância além de Deus, ela haveria se explicar por algum atributo de Deus e
existiriam duas substâncias do mesmo atributo. O que é absurdo!”, significando dizer que tudo,
absolutamente tudo para Espinosa, é explicável em Deus; ou seja, Deus é o princípio de todas as
coisas.
Deus, para Espinosa, não tem forma humana, isto é, é não corpóreo, sem relação
antropomórfica. Para ele, Deus é transcendente, ou seja, está acima de tudo; diferente da visão
panteísta clássica, que entende Deus como sendo imanente, ou seja, que Deus está contido e
presente em tudo. Para o autor, o intelecto de Deus é a causa do nosso intelecto, sendo a existência
de Deus e a sua essência uma só e a mesma coisa e cada um de seus infinitos atributos capazes
de exprimir a sua essência.
Diferente do pensamento cristão (ou mesmo judeu) da época, para Espinosa só Deus não
possui origem, sendo absolutamente tudo comandado por Ele. Há duas divisões clássicas de
Natureza para Espinosa: a Natureza Naturante, que considera Deus como a causa de tudo); e a
Natureza Naturada, que considera a natureza como efeito, como obra de Deus; sendo tudo (sem
ser Deus) um efeito (e não causa).

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Esta forma de entender Deus, na perspectiva de Espinosa, tem impacto significativo pois,
segundo ele, não há propósitos divinos; segundo ele, estas são ficções antropomorfizantes, uma
espécie de humanização da divindade.
Alguns encaram Espinosa como sendo Panteísta, quando atribui Deus à Natureza. Há que se
considerar duas visões importantes sobre o Panteísmo. O primeiro deles é o Panteísmo Redutivo,
que busca explicar que Deus é tudo (a cadeira é Deus, o lápis é Deus, o carro é Deus etc.); o
segundo é o panteísmo imanentista, que pretende explicar que Deus está em toda parte. Nesta
perspectiva, a Natureza “contém” Deus, sendo esta compreensão sem consequências morais, o
que resulta de uma nova forma de compreensão ética.
O Prof. Dr. Fernando Oliveira nos chama à atenção sobre as correntes de opinião. Diz ele que
“Alguns argumentam que Espinosa não era um panteísta porque Deus deveria ser identificado
apensa com a substância e seus atributos[...]”, ao passo que “Outros estudiosos, por sua vez,
defendem que Espinosa era um panteísta porque ele identificava Deus como toda a natureza.”. O
tema é complexo e cheio de nuanças. O próprio Prof. Fernando diz que “Na medida em que o
panteísmo ainda é uma espécie de teísmo religioso, é um erro chamar Espinosa de panteísta.”.

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ASPECTOS DA ÉTICA EM ESPINOSA
A partir da visão particular de Espinosa, que demonstra na obra Ética a servidão como sendo
uma espécie de impotência humana para moderar (ou limitar) os afetos (afetações), a leitura do
éthos (grego), isto é, do conjunto de hábitos e costumes fundamentais do ser capaz de formar o
caráter de um indivíduo e de uma coletividade, toma dimensões bem particulares.
Para Espinosa, o perfeito (do Latim perfecit) significa aquilo que está completo; feito por
completo. Assim, por analogia, algo imperfeito significa aquilo que ainda não se completou, sendo
a perfeição uma forma de realidade. Um ponto importante nesta perspectiva é que, para Espinosa,
uma coisa perfeita nada tem a ver com o ponto de vista que apresentarmos sobre essa coisa. Da
mesma forma a noção de bem e de mal. Espinosa considera-os como sendo pontos de vista
humanos, sendo o conceito de bem vinculado ao de utilidade, ou seja, o bem é tudo aquilo que nos
aproxima do modelo de natureza humana a que nos propomos; e mal é tudo aquilo que impede a
reprodução desse modelo. O imperfeito, então, será tudo aquilo que convém menos com um
determinado modelo, de acordo com referencial ou convenções.
Quando se trata dos Afetos, Espinosa vai propor outra ruptura ao dizer que afetos são
relações. Afetos contrários, por exemplo, são paixões humanas, como a gula, a avareza etc. Assim,
para ele, não há nem bem nem mal. O que há para Espinosa são juízos de valor que fazemos sobre
os afetos (aquilo que tomamos como referência), onde pela imaginação construímos a nossa
realidade. Somos fortemente impactados por tudo aquilo que concebemos em nossa
mente/realidade. Para ele, os homens nascem em estado de servidão, sendo a razão o instrumento
necessário para conduzir o homem, a fim de não nos tornarmos “escravos” de nossas paixões (visão
Platônica). Segundo ele, o homem que está submetido aos afetos (escravos dele) não depende de
si (não possui autonomia), sendo assim, a servidão pode ser considerada como sendo uma espécie
de impotência para submeter os afetos.
Podemos dividir, segundo Espinosa, os Afetos em três perspectivas: os de inadequação
absoluta; os de adequação da razão; e os de adequação intelectual. Desta forma, para Espinosa,
não há nem bom nem mau, há somente o desafio em lidar com os afetos. Este pensamento
descontrói a visão religiosa de bem (desejo de se apropriar de coisas úteis) do de mal (desej o de
se apropriar de coisas prejudiciais). Para ele, o bem agrega, o mal distancia.
Dentro da visão peculiar de Espinosa sobre liberdade, encontramos a seguinte exortação:
“Um homem livre não pensa em coisa alguma, nem na morte. Sua sabedoria é uma meditação, não
em torno da morte, mas em torno da vida.”, significando dizer que, para Espinosa, o homem
(contrariando o pensamento de Santo Agostinho) o homem não tem livre-arbítrio, mas sim, a que a
liberdade humana está em agir a favor da própria essência, e não contra ela.
Para Espinosa a Ética não é exatamente um guia moral, mas sim, um amor intelectual, uma
forma de raciocínio em dimensão maior. Para ele, “[...] ninguém sente pena de uma criança por ela
não saber falar, andar, raciocinar e, por viver, enfim, tantos anos como que inconsciente de si
mesma.”; estabelecendo, com isso, a necessidade de o homem estabelecer considerações sobre o
(re)conhecimento da própria natureza (humana).
Considerando a virtude como sendo a busca da essência, diz Espinosa que “[...] quanto mais
alguém se empenha em conservar seu ser e tem poder para tal, mais é dotado de virtude.”.

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CONSIDERAÇÕES
Como escreveu Bertrand, “A vida de Spinoza foi muito simples.” (RUSSELL, 2015),
contrastando com o legado gigante deixado por este homem de vida singela e sem luxo. Quase que
no anonimato foi cercado por opressão e preconceitos, mesmo assim devolveu ao mundo
contribuições no campo da filosofia, da ética e da sociologia que muito nos iluminam a todos. Talvez
tenha sido mesmo uma ironia da sua história o fato de ganhar a vida polindo lentes. Objetos que
amparam a acuidade visual em várias perspectivas. Mas ele também poliu ideias, tendo as
materializado em livros; livros que não fez questão de colher ovações, uma vez que sugeriu, ele
mesmo, que uma de suas obras fosse publicada de forma póstuma.
A imortalidade da alma, muito discutida no campo da Teologia e da Espiritualidade, pode ser
facilmente apreciada nos livros e feitos de Espinosa. Ele se tornou imortal... Viveu de forma coerente
com o que falava e escrevia, agradando a todos que o conheciam, ainda que não se convencessem
de seus princípios. Agradava pelo simples, embora de pensamento complexo. Quase sem ambições
humanas, mostrou-se indiferente à posse material. Sua teoria política, a partir da ideia de Deus,
trouxe revoluções que até hoje ecoam entre nós.
A Ética de Espinosa, que começa na metafísica, passa pela psicologia e abraça a política,
modifica o pensamento de autores como Descartes e Hobbes. Bertrand diz que “A relação de
Spinoza com Descartes não se distingue, em alguns aspectos, da relação entre Plotino e Platão.”.
Para Espinosa, as leis que gerem o Cosmos (a Natureza) não se movimentam em favor do
bem particular de alguns. Para ele, há harmonia geral e pronto! Os chamados infortúnios são
dissonâncias naturais. Cada movimento considerado por nós como crueldade são, por exemplo,
parte das ações naturais da natureza. Ele parece nos convidar a pensar fora das relações causais,
onde o sofrimento momentâneo de alguns nada mais é do que uma ínfima forma de vida a reclamar
no Universo.
Sobre este ponto, ao encerrar o capítulo 10 que trata especificamente sobre Espinosa, diz
assim o autor: “Reflexões assim podem não bastar para constituir religião, mas, num mundo
doloroso, ajudam-nos a conservar a sanidade e servem como antídoto contra a paralisia do
desespero completo.”.

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REFERÊNCIAS

TEXTUAL
RUSSELL, Bertrand. História da filosofia ocidental – Livro 3: A filosofia moderna. Tradução Hugo
Langone. Ed.1. Rio de Janeiro: RJ, Nova Fronteira, 2015.
OLIVEIRA, Fernando Henrique Cavalcante de. A Ética em Espinosa. São Paulo: SP, Editora Sol,
2018.

SITE
https://pt.wikipedia.org/wiki/Baruch_Espinoza Acesso em 28 de novembro de 2021.

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