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Experimentando

AULAS CO-EDUCATIVAS EM EDUCACIO FISICA


CURRICULAR: SERA POSSIVEL?

Humberto Luis de Deus Imicio*

Introducio relacao homem-Mulher. A interpre-


t foi feita atrav6s de
Este trabalho 6 resumo de um analyse de contetido e 'cruzamento das
relatOrio de pesquisa realizado junto a respostas dos questionirios.
disciplina Voleibot (masculino e femi-
nino) do Department° de Recreacito
e Pritica DespottiVa da Uttivefittii* Mas qua!,
Federal de Sant" Catarinit (UPS4 0 PrObitins?
apresentado por oottstike .lip enoerra- Sob a "Esporte Para
mento da etapa•944 de. programa Tatios "foram reformulados os pro-
de fomento a pesquisa dstaominado gramas e os contendok da Educacao
"Bolsa de Iniciallao, Did i da- Fisica (EF) em toitos oS nitteis de en-
g6gica". Esta pesquisa atm no Brasil. IsW se deu na (10,cada
nos trayar uma primeiraSpOriEncia # 70. 0 esporte, na sus forma mais
em aulas coeducativas. *to estudo conhecida (esporte de rendimento),
optamos pelo n4todo explOrateirio,com passou a .ser o contend° principal das
base no eitudo de easo.,A cote:
aulas de EF e sua pritica foi incentive-
dodos foi efetuada coin a utilizacao de da pant alem dos Hittites escolares.
dois questionirios e obaervaclo de Caracterizado como uma manifesta-
aulas. Os questionirios foram aplica- cão reflexa de um possivel desenvol-
dos, urn no inicio do semestre e o outro vimento da flack), o esporte foi colo
no final. 0 primeiro questionirio bus- cado como objetivo a ser perseguido
cou o pensamento dos alunos da tur- por todos. Neste contexto politico-
ma sobre a prince desportiva conjun- hist6rico de nosso pais, foi implantada
ta. 0 segundo questionArio procurou a EF no 3° grau, denominada Pratica
identificar Os obsticuloa surgidos a desportiva. AlOm disso, como jit era
pritica desportiva conjunta, as pro- praxe nos outros niveis de ensino, as
postas para superi-los e os resultados turmas de pratica desportiva foram
alcancados. Tambetn, a partir das res- divididas por sexo. Durante muitos
postas ao segundo questionario, bus- anos as universidades omitiram -se de
cou-se identificar categorias, tais discutir os conteddos e mdtodos da
como companheirismo, rendimento e
• P6s-GraduandoemEducasSoFisica - UFSC
Dezembro, 1994 87

pratica desportiva. Na UFSC, esta Esporte,


pritica passou por uma reformulacio Esporte, Esporte....
nos riltimos anos, sendo submetida a
um processo de critica e superacdo. O esporte formal tem sido meio
Este processo buscou uma pratica da e fim das aulas de EF. Por que isto
atividade fisica enquanto manifesta- acontece se a cultura de movimentos
cdo sociocultural capaz de contribuir, do ser humano 6 muito mais ampla e
efetivamente, para o desenvolvimen- complexa que a simples pritica de
to pleno do cidaddo. Este novo pensar jogos prd-determinados? Parece-nos
refletiu-se em uma nova denomina- que foi uma das formas encontradas
clo: Educacio Fisica Curricular para inculcar e manter os valores e as
(EFC), e esta possibilitando unir ho- relacOes de poder intrinsecas das so-
mens e mulheres em uma pritica es- ciedades modernas. Esta questa°,
portiva COEDUCATIVA. analisada por BRACHT (1989), apre-
senta o esporte como sendo um fen6-
Mentiras ou Verdades? meno social corn influOncias nas rela-
c6es de poder de nossa sociedade. 0
O ser humano tern modelos a autor lista uma sdrie de firneOes para
seguir para incorporar-se ao modus o esporte: instrumento de repressio
vivendi da sociedade na qual esta in- de desejos; fenOmeno de manipula-
serido. Suas potencialidades podem cio, atraves da compensacao, socia-
ser incentivadas ou sancionadas de lizagão e integraclo por ele cumpri-
acordo corn os valores culturais a que das; desvia a agressividade para as
esta submetido. Segundo ROMERO ac6es desportivas; 6 um suposto
(1992:24), as caracteristicas que o igualador de chances atrav6s de re-
sujeito ira adotar "sera° aquelas soci- gras universais e adapta o homem as
almente aceitas por seu grupo, seja
normas de comportamento competi-
etnico, social ou religioso". A autora
tivo, basic° para a estabilidade do
tambern nos diz que muitos comporta-
mentos sio tipificados sexualmente e capitalism°. Entretanto, isto que
assumem significados diferentes para BRACHT apresenta nio justifies, por
homens e mulheres, sendo assim, de-. si s6, a separacdo de meninos e meni-
terminados psicologicamente. Em nas nas aulas de EF. Endo, de que
todo este contexto, a escola tem sido forma o esporte cumpre esta missio?
instrumento de caracterizaclo e per-
petuacão dos pap6is masculino e fe- Turmas Coeducativas:
minino. Existem vitias formas de
instrumentalizar e determinar os
nas Salas Sim,
comportamentos, um deles 6 o es- nas Quadras Nä°.
porte. "0 uso, quase exclusivo, do
esporte nas escolas tern sido im- As sociedades modernas são or-
portante mecanismo de reforgo ganizadas em funcio dos homens e
estereotipia sexual" (SARAIVA nap das mulheres. Isto se estende aos
KUNZ, 1993:108). Mas como a EF esportes e, consequentemente, a EF.
faz isto? Busquemos as respostas. 0 primeiro argumento utilizado para
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separar homens e mulheres 6 de que peragao foram: reducão da forca na


os primeiros são, fisicamente, mais cortada, por parte dos homens; nao
fortes. No entanto, nas sociedades haver bloqueio quando o ataque for
modernas, a forca bruta nap a mais feito por mulheres; colocar a rede em
uma necessidade e, muito menos, altura que permita um jogo satisfatdrio
ponto de sustentacito para as diferen- para todos, cooperactio e dialog°.
cas entre os sexos. Assim, verifica-
mos que as expectativas sociais com
relacio aos pipes masculino e femi-
"Nada do que foi
nino t6m determinado esta separa- Seri de Novo do Jeito
cio. No caso do esporte, o model° a que ji foi urn Dia..."
ser seguido 6 o masculino, forte, viril,
Apes quatro meses de aulas
de alta performance. Para Saraiva
coeducativas, os alunos responderam
Kunz (1993:111) "o esporte, como
ao segundo questionario, resultando
conteado da Bducacao fisica escolar,
no que segue: o dialog° pennanente,
tem influencia direta na sociabilizacio
especifica para as atividades corpo- proposto como forma de superar os
rais, esportivas e de lazer". obstitculos, foi perseguido e alcanga-
do; a (re)construclo do Voleibol en-
quanto pritica de lazer/prazer, bem
Analisando os como a ampliagio das relagOes
Questionirios sociais entre os sujeitos, foram pon-
(0 que- eles/elas tos atingidos; os alunos trunbem disse-
falaram no inicio) ram que as propostas do grupo para a
0 primeiro questionirio apresen- superacio dos problemas foram aca-
tou, como respostas mais marcantes, tadas e resultaram positivamente.
o seguinte: Os alunos acreditam na Com relacio a atitude, virios alunos
possibilidade da pritica desportiva deixaram claro que houve mudancas
coeducativa a niveis de lazer e esco- comportamentais, nao se dos indivi-
lar, mas nao a nivel competitivo. Al- duos, mas do grupo comp um todo. 0
guns alunos apontaram para a 'coope- companheirismo e a desobrigagao de vi-
raga° como aspecto que possibilitaria, teria foram apontados como essenciais
inclusive, a competicao nao sexista. para a supernal) dos obsticulos.
A maior parte dales indicou dois pos- Concluimos que
siveis obsticulos a pritica
coeducativa: a) o maior vigor fisico
"Se Deus e Menino
dos homens e, b) as diferencas de
e Menina..."
nivel tecnico entre homens e mulhe- As aulas coeducativas, no Bra-
res. Apenas um aluno indicou o pre- sil, slo ainda uma inovaclo e uma
conceito como fator de impedimento grande devida. A experiencia pela
pratica conjunta. As propostas de su- qual passamos, de observar homens e
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mulheres reconstruindo uma pratica vas, Na minha opiniao a Educavao


desportiva conjunta, apontou no sen- Fisica deve ser trabalhada de forma
tido de que isto nä° so a possivel, como que acabe com essas diferenvas".
desejado. Alternativas pedagOgicas
que auxiliem na instrumentalizacao
do ser humano para a transformaclo
Bibliografia
da sociedade, vem sendo, sistemati- BRACHT, Valter. Esporte e poder. 6°
camente, buscadas, e aula de EF Congresso Brasileiro de Ciencias
coeducativa é uma delas. Nas obser- do Esporte. Brasilia , 1989.
vacOes das aulas, percebemos que a (mimeo).
competicAo foi sendo substituida pela MOVIMENTO DE MULHERES.
brincadeira e o individualismo, pelo Projeto politico no campo popular
sentido de grupo, de coletivo. No cru- na Otica do genero: a construcio
zamento das respostas dos questiona- do sujeito. Contexto & Educav'do.
dos foi possivel perceber a inversAo 1993, abr/jun,30. 15-21
de alguns valores antes instituidos: a PARRA, Amparo. Educacão humana
disputa deu lugar a cooperaclo; a rai- nAo sexista por uma sociedade iguali-
va e o "estouro" deram vez ao prazer; aria. Contexto & Educavao. 1993, abr/
nas diferencas descobriu-se as igual- jun,30. 09-14
dades e, do jogo, reinventou-se o brin- ROMERO, Elaine. Diferencas entre
car. Assim, vemos mais uma vez, que meninos e meninas quanto aos es-
as praticas pedagOgicas tereOtipos: contribuicAo para uma
transformadoras sao possiveis e, alem politica de desmitificacão. Revista
disso, mostram-se importantes ferra- Brasileira de Clências do Esporte.
mentas para superar as desigualda- 1992 (1)14. 24-28
des instituidas em nossa sociedade. SARAIVA KUNZ, Maria do C. Quando
Neste sentido, o relato de urn estudan- a diferenva é urn mito: uma ancilise da
te de Biblioteconomia, sujeito desta socializacao especificapara as seros sob
experiencia, assume fundamental re- o ponto de vista do esporte e da educavao
levincia e serve, perfeitamente, para fisica. DissertacAo de Mestrado em
encerrar esta etapa: Educacdo. UFSC, Fpolis, 1993.
TRIVI1110S, A. intraducaa a pesquisa
" quem colocou os homens e as
em ciéncias sociais: a pesquisa qua-
mulheres juntos conseguiu o que
litativa em educacAo. Atlas, SP,
queria, atingiu seus objetivos. Todos
1987.
nos sempre pensamos no negativo,
que nao dci certo, que as dijerenvas VOTRE, SebastiAo. BOCCARDO,
s 'do muitas, que mulher é mais frcigil Ludmila M. FERREIRA NETO,
Amarillo. Pesquisa em educavao fi-
que homem. Eu nä° penso mais desta
sica. UFES, Secretaria de Produ-
forma, experiéncia prOpria, corn urn
clo e DifusAo Cultural, VitOria,
pouco de compreensao, vontade,
1993.
companheirismo e uniao, o ser.
humano consegue superar as diferen-

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