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O Inspetor Geral

Texto adaptado: Mauricio Maculan


Adaptação de O Inspetor Geral de Nicolai Gógol

Personagens

Personagens Atores/atrizes
Anton Antonovitch – Governador
Ivana Kuzmitch – Chefe dos correios
PietrA Ivanovitch – Assessora
Stepan Ilitch – Inspetor

Figurino:
Governador:
Chefe dos Correios:
Assessora:
Inspetor:
Caracterização: Maquiagem bem marcada nos personagens, exceto no Assesor.

CENA I

Cenário: Gabinete do governador. Sala do acessor. Divisão em duas telas inicialmente.


(O governador amarando a gravata. A acessora arrumando o cabelo. O governador amarrando o cadarço
do sapato. A acessora passando pó no rosto. O governador colocando o relógio. A acessora separando
cartas. O governador contando dinheiro. A acessora soltando um punhado de papeis onde esta escrito
“O Inspetor Geral”).
Cena incia apenas com o Governador em tela, acessora em Off.
Governador – Pietro, chamei-o aqui para lhes dar uma notícia muito desagradável. Está para chegar
em nossa vila um funcionário vindo da capital.
Assessor – O quê? Um funcionário vindo da capital?
Governador – Exatamente um funcionário vindo da capital. Chamam ele de Inspetor, viaja em segredo
e, para cúmulo dos males, em missão secreta.
Assessor – De fato a notícia é desagradável.
Governador – Eu já pressentia isso. Durante toda a noite sonhei com ratazanas enormes; palavras de
honra que nunca vi bichos tão descomunais. Elas se aproximam de mim, me cheirava estranhamente e
se afastavam cautelosamente, pretas, grandes... Vou ler para o senhor uma carta que recebi de Andrei.
Ouça bem: “Querido amigo, compadre e benfeitor...” (Pula alguns trechos murmurando qualquer coisa.)
Ah, está aqui: “Apresso-me a informá-lo da chegada de um funcionário especializado, que leva
instruções para inspecionar toda a província e especialmente o nossa vila”. (Levanta o dedo com um
gesto significativo.) “Essa informação me veio de fonte segura, embora esse inspetor esteja viajando em
segredo. Como sei que você, meu caro Governador, é um homem inteligente que não gosta de deixar
escapar o que lhe cai nas mãos...” (Interrompendo.) Bem, aqui vêm coisas sem importância: tá, tá, tá, tá,
tá... “O meu conselho é que se deve tomar todas as precauções porque esse funcionário poderá chegar
a qualquer momento, se é que já não chegou aí e se encontra escondido. Ontem eu...”. Bem, aqui vêm
assuntos de família... “Minha irmã Anna veio visitar-nos ontem com seu marido. Ivan Kirilitch engordou
muito e continua tocando violino...”, etc. Por aí veja você como estão as coisas.
Assessor – Mas o que será que aconteceu, o que esse inspetor vem fazer aqui em nossa vila?
Governador – Ora, ora, ora, mas está claro o objetivo da sua vinda.
Assessor – É?
Governador – Todos já sabemos o que ele vem fazer aqui. Não é mesmo?
Assessor – É verdade... quer dizer... o... o... o que realmente ele vem fazer aqui?
Governador – O motivo é sutil e de índole política. Eu me explico: O Reino de Borbolin... está passando
por uma investigação de má administração. Há boatos de desvio de dinheiro público na compra de
medicamentos, em obras públicas e atraso no pagamento do salários de funcionários públicos.
Assessor – (Incrédulo) Eu não acredito. Eles desconfiam que o dinheiro do povo não está sendo bem
administrado? Mas, o Ministério é muito astuto e não escapam nada ao seu olhar nem aos povoados
mais distantes das fronteiras.
Governador – Escapando ou não escapando, o senhor esta avisado. Da minha parte, já tomei as
providências do que é necessário ser feito. Fiz cá umas anotações que você, meu fiel assessor deve
cumprir: O primeiro lugar que o inspetor deve querer visitar é o hospital. Deste modo seria interessante
torná-lo um pouco mais decente: trocar as roupas sujas dos doentes, trocar as máscaras cirurgicas dos
funcionários para que não fiquem parecendo limpadores de chaminé, como de costume. O que mais a
gente poderia fazer para melhorar aparência?
Assessor – Que tal nós pedirmos ao povo, o que eles querem de melhor na saúde?
Governador – Deus que me livre. Você tem cada ideia de jerico. O povo não sabe o quequé.
Assessor – Não custa perguntar.
Governador – Está bem, peça ao povo...
“(Vídeos de entrevista com o público criança)
Assessor – O que você acha que tem que melhorar na saúde, nos postos de pronto atendimentos e hospitais?
Público - ____________________________________________________________.”
Governador – Escutou... (repetir o que a criança falar). Que ideia você teve de pedir ao povo. O povo
entende algo de administração? Não, não entende nada de administração. Vamos gastar uma fortuna
para fazer isso.
Assessor: O que o senhor pensa em fazer para melhorar a aparência do hospital?
Governado – Mandar os doentes para casa. Tem doente demais. Dá até uma má impressão do lugar.
Você vai no hospital e só tem doente. Temos que deixar a natureza fazer o seu trabalho. Quando tem
que morrer, morre mesmo. E quando tem que ficar vivo, não tem Cristo que o impeça.
Assessor – Não sei se isso é certo.
Governador – É claro que é certo. Faça o que eu mandei. Voltemos aos assuntos da ordem... é necessário
falar com o senhor juiz, também. Não podemos permitir que na sala de audiências do tribunal sejam
criadas galinhas, patos, galos e outras aves, não que ele não possa criá-las. Mas, é que no local é
indecoroso fazê-lo.
Assessor – Hoje mesmo darei ordem para que seja feita a prisão do galo da sala do tribunal.
Governador – Ótimo. Diga a ele que ele poderá continuar recebendo os presentinhos daqueles que vão
a julgamento. No entanto deve recebe-los em casa.
Assessor – Nobre Governador: mas isso não é suborno?
Governador – Ora, essa. Um ‘pecadilho”, quem não os têm? Eu por exemplo, aceito uns presentinhos em
troca de alguns favores.
Assessor – Senhor, isso é suborno, corrupção...
Governador – Deus perdoa tudo. Vou a igreja todo santo domingo e me confesso. (Voltando a seriedade
do assunto) Resolva o problema do galo e tudo estará em ordem. Também acho pouco provável que o
inspetor vá ao tribunal, afinal ninguém se mete naquele lugar. Preciso que mande varrer as ruas da vila,
deixar tudo limpo.
Assessor – Claro, perfeitamente.
Governador – Temos também que enviar alimentos para a escola, afinal se recordo bem. Faz algum
tempo que as crianças não recebem merenda.
Assessor – É que o senhor usou o dinheiro da merenda para comprar uma caminhonte nova para
senhor.
Governador – Não me recordo disso. Enfim, Pietra, não vá se confundir e esquecer alguma coisa
importante.
Assessor – Não! Eu vou me lembrar de tudo. Eu juro vou me lembrar de tudo.
Governador – Agora me ligue com a chefe dos correios, preciso descascar um abacaxi.
Assessor – A Senhora Ivana está na video chamada.

CENA II
Chefe dos Correios – O que que aconteceu: que funcionário é esse que vem ai?
Governador – O que já ouviu a respeito?
Chefe dos Correios – Para falar a verdade: não ouvi nada. Andei dando uma olhada em algumas cartas
que chegaram e percebi um certo nervosismo das autoridades.
Governador – E qual é sua opinião sobre o que este funcionário vem fazer em nossa vila?
Chefe dos Correios – Bom, está ocorrendo uma investigação no reino e escândalos de corrupção estão
surgindo por todos os lados.
Governador – Exatamente. Foi o que pensei. Mas, diga-me como vão as coisas para o seu lado, o que lhe
preocupa?
Chefe dos Correios – O que que interessa isso? E para o seu lado como é que vão, Senhor Governador?
Governador – Eu não diria que sinto terror, mas um pouco de medo... Os comerciantes me causam
algumas dificuldades. Dizem que eu tiro muito dinheiro!... E eu só Deus sabe, quando aceitava alguma
coisa de algum deles, era sem ódio nem maldade. (Leva-o para o canto, conduzindo pelo braço) Eu acho
que... olha será que houve denúncia contra mim? Por que mandariam pra cá um insvestigador? Ouça
Ivana, para o bem de todos, não poderia abrir as cartinhas que entram e saem de sua repartição? Assim,
só para passar os olhos, ver se há uma denunciazinha e depois, então, se não houver, pode-se fechar a
cartinha novamente, ou entregar assim mesmo, aberta...
Chefe dos Correios – Não me dê lições. Há muito tempo que eu faço isso. Não por cautela, mas por
simples curiosidade. Gosto muito de saber o que se passa pelo mundo. E essa leitura é interessantíssima.
Há cartas que se lêem com deleite; contam histórias bonitas, mais belas do que as do jornal.
Governador – Então me diga não leu nada sobre o inspetor?
Chefe dos Correios – Não. Mas é uma pena que o senhor não leia essas cartas. Há passagens preciosas.
Ainda a pouco, para não ir muito além, um suboficial escreveu a um amigo, descrevendo um baile
usando uma linguagem mais florida, vou ler para o senhor: “aqui a vida flui no sétimo céu, meu querido
amigo. Jovens formosas, soa a música e se baila com entusiasmo”... E com emoção escreveu isso. Até
guardei a carta comigo. Quer que eu continue a leitura?
Governador – Não, não estou com cabeça para bailes. Mas, me faça um favor. Se por casualidade, cair
nas mãos alguma queixazinha, ou uma delaçãozinha, rasgue sem a menor consideração.
Chefe dos correios - Isso não está me cheirando bem.
Governador – Isso não é nada, não é nada. Não se vai rasgar a carta em público. E afinal de conta esse
inspetor está me tirando o sono. Estou sempre esperando que a porta se e....

CENA III
Entra o assessor de volta a tela.
Assessor – Uma novidade inesperada.
Todos – O que foi que aconteceu?
Assessor – Estou chegando do hotel. Hospedou-se um homem jovem bem apessoado, com trajes civis,
que age de forma estranha. Perguntei ao hoteleiro e ele me respondeu que é um jovem funcionário da
Capital.
Governador – Que funcionário?
Assessor – O Inspetor.
Governador – (Começa a rir.) O Inspetor... não pode ser ele.
Assessor – É ele sim, é ele. Não paga pela hospedagem, pois os custos estão na conta do reino. E tem o
fato de que fica observando tudo ao redor.
Governador – Meu Deus: Tende piedade de nós, pecadores. Em que quarto está hospedado?
Assessor – Quarto número 5.
Governador – Há quando tempo ele está hospedado aqui?
Assessor – Há duas semana, chegou no dia de São Basílio
Governador – Duas semanas. Santo Deus! Me salva eu te imploro! Nessas duas semanas espancamos a
viúva do subtenente, não demos comida aos presos e as ruas estão do que um chiqueiro, uma imundície,
uma sujeira. Que vergonha! Que desastre!
Chefe dos Correios – Senhor Governador: Não seria conveniente que nós fossemos ao hotel?
Governador – Ótima ideia. Pietra, busque o automóvel do gabinete.
Assessor – Senhor, o automóvel está emprestado a sua filha que foi a um baile na semana passada e não
devolveu.
Governador – Verdade. Então solicite ao Chefe de polícia que seus homens varam a rua até o hotel para
que eu possa chegar e causar uma boa impressão. Depressa. Espere... Veja o que tem a fazer: chame o
Sargento e mande-o ficar bem no meio da ponte. Ele é bastante alto e causará uma ótima impressão.
Mande imediatamente derrubar aquela cerca velha da casa do sapateiro e ponham lá algumas vigas,
pedras, para dar a impressão que se está construindo. Quanto mais obras públicas existam, mais se nota
a atividade do Governador. Ai, meu Deus: agora me lembro! Junto à cerca há um montão de lixo que
daria para encher quarenta carroças. Cidade desgraçada! É bastante levantar um monumento ou uma
simples cerca para que imediatamente joguem um monte de lixo em volta! (Suspira) E se o inspetor que
acaba de chegar perguntar aos funcionários públicos se estão contentes, todos deverão responder:
“contentíssimos: Excelência”. E aquele que não estiver contente, vai ter razões de sobra depois para não
estar. Ai, pobre de mim, pecador, pecador! (Em lugar de chapéu, pega uma caixa de papelão.) Fazei com
que tudo isso termine logo, Deus meu, e vos oferecerei uma vela tão grande como ninguém jamais viu.
E obrigarei que cada um desses estúpidos comerciantes me mande dez quilos de cera. Ah, meu Deus,
meu Deus. A caminho, Ivana. (Em lugar do chapéu quer colocar na cabeça a caixa de papelão.).
Chefe dos Correios –Anton, isso é uma caixa, não um chapéu.
Governador - Uma caixa? Diabo! Ah, e se perguntarem por que não reconstruímos a capela do hospital
com a subscrição das caixas de caridade feita alguns anos atrás, não se esqueçam de dizer que
começamos a reconstrução, mas que a capela pegou fogo. Sobre isso eu já apresentei um relatório. Não
se esqueça, porque, senão, pode aparecer por aí algum imbecil que irrefletidamente afirme que as obras
nem mesmo começaram. E diga aos oficiais que contenham um pouco os punhos: para pôr ordem ele
costuma esmurrar o olho de todo mundo, culpado ou inocente. Vamos, vamos Ivana. (Finge que sai, mas
não sai.) Ah, e não deixe que os soldados saiam de cuecas para a rua como eles costumam fazer. Às vezes
esses marotos põem a túnica em cima do corpo e saem sem nada por baixo.
(O inspetor entra na vídeo chamada).
Governador – Mas, quem esta entrando na reunião agora? (Lendo na tela ) Inspetor Geral... Minhas
saudações e meus melhores augúrios!
Inspetor – (Sério) Como vai senhor governador?
Governador – Como Deus manda, com uma saúde de ferro.
Inspetor – (Em tom calmo) Ao contrário do povo a quem o senhor representa.
Governador – Eu não entendo. Sou o Governador dessa cidade e como tal zelo pelo bem do povo, a quem
garanto um vida digna.
Inspetor – Dignidade? Creio que não isto que constatei nestes dias que estive de passagem em sua
cidade.
Governador – ( Tremendo ) Tenha piedade, não me desgrace! Eu tenho mulheres e filhos. Não faça de
mim um homem infeliz pelo da vida...
Inspetor – Não, eu não quero.
Governador - (Tremendo) – Tudo isso aconteceu por inexperiência! Eu juro: foi por simples
inexperiência! O senhor deve compreender. O salário que o Governo paga não dá nem para o chá e o
açúcar. Se houve suborno foi por uma ninharia. Alguma coisa para a mesa, uma cortezinho de pano para
se fazer uma roupa. E quanto a esses boatos de que eu mandei açoitar a viúva do subtenente, aquela
que faz contrabando, isso é uma calúnia! Juro por Deus! Uma calúnia. Pura invenção desses desalmados
que me perseguem. São tão perversos que seriam capazes de me enterrar vivo!
Inspetor – Isso para mim é novo.
Governador – Senhor, estou a sua inteira disposição. Podemos negociar um preço.
Inspetor – Está tentando me corromper, me subornar?
Governador – Depende do ponto de vista.
Inspetor – Como administrador dos recursos públicos é sua função manter a cidade limpa, conservar as
ruas, planejar ações para melhorar a qualidade de vida da população e principalmente ouvir o que as
necessidades das pessoas e solucionar suas mazelas. Tudo o que o senhor não faz. Então eu o destituo
do posto de Governador e o levarei até o Rei para prestar esclarecimento e posteriormente ser julgado
pelos crimes de corrupção.
(A ligação do governador caí).
Assessor – Mas, quem governará a vila?
Inspetor – Quem o povo escolher. Faremos uma eleição e o mais votado governará por um período até
ser feita outra eleição. Quem se candidata?
Assessor – Gostaria de me candidatar.
Chefe dos Correios – Eu também.
Inspetor – Ótimo temos dois candidatos. Quais são suas propostas?
Assessor – Bom, eu me comprometo em ouvir a população afim de garantir qualidade de vida a todos,
com saúde, boa educação, segurança e cultura.
Chefe dos Correios – Eu me comprometo em... mandar uma carta com uma quantidade de dinheiro bem
generosa para quem votar em mim.
Inspetor – Senhores e senhoras, peço a todos que pensem bem em quem querem governando a vila de
vocês. Este senhor ofereceu saúde, educação, cultura e segurança a vocês, além de se comprometer em
ouvi-los para encontra soluções aos seus problemas. Já esta senhora prometeu-lhes um envelope com
dinheiro, embora o dinheiro resolva alguns problemas momentâneos, esse dinheiro acabará e vocês
não terão segurança, saúde, cultura, nem mesmo educação. Então peço que apontem a câmera do seu
celular para o Qrcode que aparece na sua tela e deixe o seu voto. Lembre-se de votar consciente, pois o
seu futuro esta nas decisões que você toma hoje.
(Surge na tela um QRCode que direciona para uma página de votação, com o nome dos candidatos e
suas propóstas de trabalho).
Observação: No dia da apresentação será revelado o resultado da votação.

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