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COMENTÁRIO DO WILLAN HENDRIKSEN

Outro ponto, já implícito no anterior, é agora trazido a lume de forma mais


definida, ou seja, que a pessoa que, em razão de sua falta de confiança no Pai
celestial, dedica seu tempo e dons a acumular tesouros terrenos, portanto a cultuar
a Mamon, confunde os valores. Tal pessoa está “toda confusa” com respeito a
prioridades. Ela não consegue discernir as coisas de importância primária e as de
importância secundária (ver alínea c., na p. 424). Diz Jesus: 25. Portanto, vos
digo: Não fiqueis ansiosos pela vossa vida, sobre o que vades comer ou o que
vades beber, nem pelo vosso corpo, sobre o que vades vestir. Não é a vida
mais importante que comida e o corpo mais importante que roupas?
A palavra “portanto” mostra que existe uma conexão com o precedente. Com
base no que já foi expresso e em conexão com o que será expresso, provavelmente
o sentido seja o seguinte: uma vez que os tesouros terrenos e transitórios não
satisfazem, e descansar o coração neles implica dispensar os deleites perenes do
céu (v. 19–21), e visto que o anseio pelas riquezas terrenas ofusca a visão mental
e moral (v. 22, 23) e, finalmente, em virtude da escolha que se deve fazer entre
Deus e Mamon (v. 24), não prossigais pondo o vosso coração em Mamon, ou seja,
nas coisas terrenas, tais como comida e bebida, para manter-vos vivos, ou na
vestimenta, para manter-vos vestidos. E depois de tudo, é o vosso Pai celestial
quem vos deu a vida e o corpo, e será ele quem vos há de sustentar. Quem vos
muniu do maior, ou seja, vida e corpo, não vos fornecerá também o menor, ou seja,
comida, bebida e roupa? Não é a vida mais importante que a comida, e o corpo
mais importante que a roupa? Então, não confundais as prioridades!
Portanto, o que temos aqui é um argumento do maior até ao menor, algo no
estilo de Rm 8.32: “Aquele que não poupou a seu próprio Filho, antes por todos nós
o entregou, porventura não nos dará graciosamente com ele todas as coisas?”
“Não fiqueis ansiosos”, diz Jesus. Uma vez que aqui se usa o imperativo
presente, o significado parece ser: “Não tenhais esse mau hábito”. Contudo,
também pode ser: “Se já caístes nisto, então desfazei esse hábito: deixai de
preocupar-vos”. Compare-se com o v. 31, onde a exortação é: “Não fiqueis
preocupados”. A palavra usada no original para ficar ansioso [preocupar-se]
significa distraído, como, por exemplo, Marta, cuja atenção estava dividida a tal
ponto que ela, por um momento, se esqueceu de “uma coisa necessária” (Lc 10.38–
42; note-se o v. 41: “andas inquieta e te preocupas com muitas coisas”.)
Outra razão para evitar-se a ansiedade é que ela é irracional (ver Mat. 6.19–34,
alínea d.). Jesus acabara de advertir (v. 25) sobre preocupar-se indevidamente com
os meios de manutenção da vida, ou seja, comida e bebida. E assim, apontando
para o alto, talvez para um bando de pássaros, ele prossegue: 26. Olhai para as
aves do ar. Elas não semeiam, nem colhem, nem ajuntam em celeiros; todavia
o vosso Pai celestial as alimenta. Vós sois de mais valor do que elas, não é
verdade? O céu palestino e o de outros países vizinhos estão sempre cheios de
pássaros. A Escritura menciona muitos deles. No pequeno espaço de sete
versículos (Lv 11.13–19) são mencionados não menos de vinte espécies: águia,
quebrantosso, águia marinha, milhano, falcão, corvo, avestruz, coruja, gaivota,
gavião, mocho, corvo marinho, íbis, gralha, pelicano, abutre, cegonha, garça,
poupa, morcego. Na velha dispensação, todos esses pássaros eram considerados
“impuros”. Em Lv 12.6 são mencionados o pombo e a rola (cf. Lc 2.24); o pardal e
a andorinha, no Sl 84.3; para o primeiro, ver Mt 10.29,31; Lc 12.6,7. Além da rola e
da andorinha, Jr 8.7 menciona o grou. Na passagem paralela a Mt 6.26, Jesus
chama a atenção de seus ouvintes para o (já mencionado) corvo (Lc 12.24). O
quintal com suas aves domésticas não é negligenciado; lembre-se da belíssima
passagem com referência à galinha e seus pintainhos (Mt 23.37), e o papel exercido
pelo galo no relato da negação de Pedro (Mt 26.34ss, e passagens paralelas). A
águia, referida não só em Lv 11, mas também em diversas outras passagens do
Antigo Testamento (inclusive as bem conhecidas de Dt 32.11; Sl 103.5 e Ez
17.3,11), volta a figurar nas páginas do Novo Testamento (Mt 24.28; cf. Lc 17.37;
Ap 4.7; 12.14). Já nos familiarizamos com a pomba em nosso estudo do batismo de
Jesus (ver a exposição de 3.16).
Para uma lista completa das aves mencionadas na Escritura e sua descrição,
que alguém recorra à obra agradavelmente interessante, All the Birds of the Bible
[Todas as aves da Bíblia], de A. Parmelee, Nova York, 1959. Esse autor denomina
a região em que o Sermão do Monte foi pronunciado “a encruzilhada das aves
migratórias”. Seria o caso, no exato momento em que nosso Senhor pronunciava
as palavras de 6.26, que um bando de aves aladas singrava os ares? É plenamente
possível.
O que Jesus está dizendo aqui é que as aves do ar não semeiam, nem colhem,
nem ajuntam em celeiros, contudo são alimentadas e conservadas vivas pelo
Criador. Essa passagem não deve ser mal interpretada como se estivesse
estimulando a ociosidade. E nem poderia ser esse o caso, porquanto o Senhor sabia
muito bem que seus ouvintes estavam conscientes do fato de que as aves adultas
de forma alguma são indolentes. Elas lutam pela vida. Não ficam quietas em algum
galho de árvore à espera que algum alimento lhes caia no bico. Não, elas vivem
muito ocupadas. Elas recolhem insetos e vermes, preparam seus ninhos, cuidam
de seus filhotes e os ensinam a voar, etc. Pode-se até mesmo atribuir-lhes um certo
grau de “preocupação” pelas contingências iminentes, especialmente as aves
migratórias, pois, segundo os ditames da estação, estas viajam para regiões mais
quentes ou mais frias. Não obstante, duas coisas deve-se ter em mente. Primeiro,
as aves não têm culpa de exagerar em fazer algo bom. Não são como o rico
insensato da parábola (Lc 12.16–21). Em segundo lugar, quando essas aves
preparam seus ninhos, treinam seus filhotes, imigram, etc., elas agem
“instintivamente”. E com isso não estamos na realidade querendo dizer que o seu
Criador, ao dotá-las desses instintos, está cuidando delas, enquanto elas mesmas
simplesmente estão respondendo a certos estímulos?
Já com os homens a história é completamente outra. São eles, não as aves, que
não só semeiam, colhem e ajuntam em depósitos, mas também que, enquanto se
envolvem em tudo isso, amiúde são dominados por terríveis pressentimentos,
ignorando em grande escala as promessas de Cristo! Enquanto as aves vivem
“despreocupadamente”, os homens são dominados pela aflição.
O argumento de Cristo – do menor para o maior, contraste-se com o v. 25 –
equivale ao seguinte: se as aves, que não podem, em qualquer sentido real, fazer
planos para o futuro, não têm razão de preocupar-se, muito menos vós, meus
seguidores, dotados de inteligência, de modo que podeis pensar no futuro, não
devíeis ser dominados por ansiedade. Além disso, se Deus faz provisão mesmo
para essas criaturas inferiores, quanto mais não terá ele cuidado de vós, que fostes
criados à sua própria imagem! E mais especialmente, se aquele que as alimenta é
“o vosso Pai celestial”, porém para com elas é apenas o seu Criador, então quão
completamente irracional é a vossa ansiedade. “Vós sois de muito mais valor do
que elas, não é verdade?”, pergunta o Senhor de uma forma que no original
pressupõe uma resposta unicamente afirmativa.
A irracionalidade da ansiedade se faz igualmente evidente do que vem em
seguida: 27. E quem dentre vós é capaz, estando ansioso, de acrescentar
(ainda que seja) um cúbito à extensão de sua vida? A palavra traduzida por
“extensão de vida” (grego: helikia) pode referir-se à idade, à altura ou à estatura.
Assim como Zaqueu era pequeno em estatura (Lc 19.3), porém Sara tinha passado
da idade em que podia conceber (Hb 11.11). O cego de nascença, curado por
Cristo, atingira a idade de maturidade legal (Jo 9.21,23). Aqui em Mt 6.27 (cf. a
passagem paralela, Lc 12.25), a Edição Revista e Corrigida traz “estatura”; a Edição
Revista e Atualizada traz “curso”; a Bíblia de Jerusalém traz “duração”. Porém, no
presente contexto, “estatura” não pode ser correto, por duas razões: a. acrescentar
essa soma equivaleria a “coisas mínimas” (Lc 12.26), porém crescer realmente 18
polegadas ou 46 centímetros não pode ser considerado uma realização sem
importância; e b. quem, exceto uma pessoa anormalmente pequena, se
impacientaria com o desejo de acrescentar tal soma à sua estatura?
Então, o verdadeiro significado é este: “Quem, dentre vós, por mais preocupado
que esteja, pode alongar a extensão de sua vida por um pouco que seja?” (ver
Atualizada e Bíblia de Jerusalém.) Durante o seu aniversário, alguém poderia dizer:
“Hoje eu alcancei um novo marco em minha vida”. Em seu septuagésimo
aniversário, esse indivíduo terá alcançado o seu septuagésimo marco. Se o marco
é de milhas ou quilômetros, acrescentar um cúbito a 70 quilômetros ou a 70 milhas
nem mesmo vale a pena fazer-lhe menção. Seria uma coisa mínima, porém mesmo
esse pouco ninguém pode alcançar através da preocupação ansiosa. Uma pessoa
poderia “preocupar-se até a morte”; porém não pode preocupar-se e com isso atingir
uma maior extensão em sua vida. Ver também Sl 39.4–6.
O Senhor agora lança mão de outro exemplo da natureza. Fazendo um paralelo
com o que disse sobre as aves (v. 26), ele agora faz alusão aos lírios (v. 28–30).
Em linha com o seu ensino sobre a provisão divina de alimentos para que uma
pessoa possa conservar a vida, ele agora demonstra que Deus também é quem
provê roupa para cobrir o corpo dessa mesma pessoa. Deve-se notar que nos v.
26–30, tomados em sua inteireza, temos uma elucidação e elaboração ordenadas
do v. 25. Então Jesus prossegue falando da irracionalidade da preocupação (ver
Mat. 6.19–34, alínea d), a fim de que os homens possam depositar sua plena
confiança no Pai celestial.
Diz ele: 28, 29. Além disso, por que viverdes ansiosos pela roupa?
Considerai os lírios do campo, como crescem; não labutam nem tecem; eu,
porém, vos digo que nem mesmo Salomão em todo o seu esplendor se
adornou como um destes.
“Considerai” – ou seja, observai cuidadosamente, estudai detidamente – “os
lírios do campo”, diz Jesus, enquanto pergunta aos seus ouvintes: “Por que ficar
ansioso pela roupa?” Não se pode determinar com precisão que espécie de flor
nosso Senhor tinha em mente enquanto se referia aos “lírios do campo”. Eis
algumas suposições: narciso, jacinto, lírio silvestre, gladíolo. Goodspeed traduz
(para o inglês) “flores silvestres” (“ver como as flores silvestres crescem”). À luz do
contexto (note-se a “erva do campo […]”) é bem provável que Jesus, em vez de
referir-se a algum tipo particular de flor, estivesse pensando em todas as lindas
flores que vicejavam e aumentavam o esplendor da paisagem nessa época do ano.
“Como crescem”, segundo o contexto, deve significar: sem qualquer trabalho de
sua parte, sem receberem qualquer cuidado da parte de algum ser humano, “quão
fácil e livremente, porém quão deslumbrantemente”. Mesmo quando os “lírios” não
fiam uma só fibra, no entanto nem mesmo Salomão, em todo o seu esplendor – ao
qual já se fez sobejas referências; ver a exposição de 1.7 e p. 216, 217 –, se adornou
como qualquer deles. Não é verdade, pelo menos nesse aspecto, ou seja, que o
vestuário mais fino de Salomão, na melhor das hipóteses, era apenas uma imitação
e um derivado do que na natureza vem das mãos do Criador? A beleza prístina não
pode ser igualada!
Entretanto, o irromper simultâneo das flores na primavera do ano se desvanece
de forma igualmente repentina: hoje estas flores estão cheias de vida e adornam os
campos; amanhã esta “erva do campo”, ou seja, a soma total das plantas não
cultivadas (em contraste com as cultivadas), serve de combustível para o uso
doméstico, numa terra onde não existia abundância de combustíveis.
A lição é a seguinte: 30. Ora, se Deus assim veste a erva do campo, que hoje
está viva e amanhã é lançada na fornalha, com certeza não vos vestirá a vós,
oh, homens de pequena fé?! Deparamo-nos, aqui, com um argumento duplo, ou
seja:
a. do menor para o maior: se Deus toma providência em favor da erva que é de
curta duração, certamente que providenciará em favor de seus filhos, cujo destino
é a glória eterna.
b. do maior para o menor: se Deus adorna as flores silvestres com roupagens
tão belas, então ele certamente vestirá seus filhos com o vestuário ordinário de que
necessitam.
Jesus denomina os seus preocupados seguidores de “homens de pequena fé”.
As diversas passagens nas quais ele faz uso dessa descrição, em seus contextos,
são as seguintes:
Mt 6.30 e seu paralelo em Lc 12.28 (preocupação pelo vestuário)
Mt 8.26 (o medo dos discípulos de perecerem afogados numa tempestade no
mar)
Mt 14.31 (o medo semelhante de Pedro)
Mt 16.8 (a falha dos discípulos de não se lembrarem da lição que receberam em
conexão com o poder miraculoso de Cristo).
Com base nessas passagens, parece que a descrição se refere ao fato de que
as pessoas assim caracterizadas não estavam recebendo de coração o consolo que
poderiam ter obtido da presença, das promessas, do poder e do amor de Cristo.
No v. 31 Jesus resume a lição referente ao caráter pecaminoso e irracional da
ansiedade com relação à comida e vestuário: 31. Portanto, não fiqueis ansiosos,
dizendo: O que iremos comer? ou, O que iremos beber? ou, O que iremos
vestir? Como se notou anteriormente (ver a exposição do v. 25), há uma ligeira
mudança. Não só se deve evitar ansiedade habitual, mas até mesmo o primeiro
passo que conduz a esse hábito deveria ser excluído; daí, “Não vos torneis (ou: Não
venhais a ser) ansiosos”.
No v. 32 são acrescentadas as razões para a exortação “Não vos torneis
ansiosos”. São as seguintes: 32. Porque por todas estas coisas anseiam os
gentios; além disso, vosso Pai celestial sabe que tendes necessidade de tudo
isto. Naturalmente que os gentios, que não reconhecem um Pai celestial e estão
em completa ignorância com relação à promessa de realidades muito superiores
(ver Ef 1.3; 2.11,12), descansam o seu coração e preocupação na comida e
vestuário. As coisas materiais se constituem no objeto de seu desejo consumidor.
Em razão de os seguidores de Cristo serem completamente diferentes (Mt 6.7; Ef
4.17–24), eles devem também seguir um rumo diferente: devem ser distintos e não
descer ao nível dos gentios. Devem confiar e não ter medo.
Estreitamente ligada com a primeira está a segunda razão para a admoestação
“Não vos torneis ansiosos”, ou seja, “Vosso Pai celestial sabe que tendes
necessidade de tudo isso”; sim, ele sabe disso “mesmo antes de lhe pedirmos” (v.
8). Isso é tudo quanto é necessário, porque tão grande é o amor desse Pai para
com seus filhos, que esse mesmo conhecimento de suas necessidades garante que
ele também proverá o necessário (cf. Ef 3.20).
Um mandamento positivo indica um clímax que reforça a lição de que alguém
deveria depositar sua total confiança no Pai celestial: 33. Entretanto, buscai antes
o seu reino e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão concedidas como
uma dádiva especial. Em contraste com os gentios, que buscam
desesperadamente comida, bebida, vestuário, etc., os seguidores de Cristo são
concitados a buscar antes de tudo o seu reino e a sua justiça (de Cristo). O verbo
buscar subentende uma vida absorvida na busca, em um esforço perseverante e
estrênuo para se obter alguma coisa (cf. 13.45). A forma do verbo usado também
permite a tradução: “Estai buscando constantemente” (cf. Cl 3.1). Note-se: buscai
primeiro; ou seja, dai a Deus a prioridade que lhe é devida (2Co 4.18).
O objeto dessa busca é “o seu reino e a sua justiça”. Os ouvintes são exortados,
pois, a reconhecer Deus como Rei em seu próprio coração e vida, e a fazer tudo
quanto for possível para fazê-lo também reconhecido no coração e vida de outros,
e em toda esfera da vida: a educação, o governo, o comércio, a indústria, a ciência,
etc. Para o conceito “reino do céu”, ver p. 308, 309. É natural que quando Deus é
reconhecido como Rei, a justiça prevaleça. Para esse conceito, ver a exposição de
5.6 e 5.48. Estes dois elementos (reino e justiça) vão sempre juntos. De fato, “o
reino de Deus é [significa, implica] justiça” (Rm 14.17), uma justiça tanto imputada
quanto comunicada aos homens, uma justiça que é uma posição legal e, ao mesmo
tempo, uma conduta ética.
Ora, é verdade que esse reino e sua justiça são dons graciosamente concedidos.
Eles são seu reino e sua justiça. Eles são, contudo, objetos de uma busca contínua
e diligente; de um esforço incessante e árduo com o fim de obtê-los. Esses dois
elementos não são contraditórios. Um exemplo extraído da natureza o esclarecerá.
Uma árvore não tem o poder de por si mesma se sustentar. Suas raízes são, por
assim dizer, mãos estendidas para o ambiente. Ela depende do sol, do ar, das
nuvens e do solo. Nem sequer tem força para absorver os nutrientes de que precisa.
O sol é a fonte de sua energia. Porém, com isso quer-se dizer que a árvore é inativa?
De modo algum. Suas raízes e folhas, embora grandemente receptivas, estão
muitíssimo ativas. Por exemplo, tem-se estimado que a quantidade de esforço
realizado por uma certa árvore grande num só dia para fazer subir água e minerais,
do solo às folhas, é a mesma quantidade de energia gasta por uma pessoa que
carrega trezentos baldes d’água, dois de cada vez, subindo uma escada de uns 3,
5 metros. As folhas também são fatores virtuais. Elas também vivem em tremenda
atividade.
O mesmo vale também com respeito aos cidadãos do reino. Eles recebem o
reino como uma dádiva. Contudo, depois de receberem o novo princípio de vida, os
receptores se tornam muito ativos. Trabalham com muito empenho, não por meio
de algo que haja neles mesmos, mas pelo poder que lhes está sendo
constantemente fornecido pelo Espírito do Senhor. Eles “desenvolvem a sua própria
salvação”, e são capazes de fazer isso em virtude de que “é Deus quem opera neles
tanto o querer como o realizar, segundo o seu beneplácito” (Fp 2.12,13; ver também
Mt 7.13; cf. Lc 13.24; 16.16b). Confiam nas promessas de Deus, oram, divulgam a
mensagem da salvação e, movidos de gratidão, realizam boas obras para o
benefício dos homens e para a glória de Deus.
A recompensa da graça: “e todas estas coisas vos serão concedidas como uma
dádiva especial”. Enquanto eles concentram sua atenção no reino e sua justiça, o
dom de Deus a eles destinado, seu Pai celestial vela para que tenham comida,
bebida e vestuário. Para uma elucidação mais clara, ver 1Rs 3.10–14; Mc 10.29,30;
e 1Tm 4.8.
Com base em tudo o que ficou dito até aqui, a conclusão é: 34. Portanto, não
fiqueis aflitos pelo amanhã, porque o amanhã, por si mesmo, terá suas
aflições. Cada dia, por si mesmo, tem bastante problema. Ver Mat. 6.19–34,
alínea d. Prover para amanhã [futuro] é uma coisa. Até certo ponto isso não pode
ser condenado. Ver Lc 16.8,9, mas observe-se também o v. 13. Encher-se de
ansiedade pelo dia de amanhã é sempre um mal. A única maneira correta de prover
para o amanhã sem ao mesmo tempo se preocupar é cuidar para que hoje se
obedeça a admoestação do v. 33 (“Porém, buscai primeiro o seu reino e a sua
justiça”).
Jesus apresentou todas as razões que provam por que se preocupar com o
amanhã é errôneo e irracional. Ver o sumário da p. 420. O hoje nos foi dado.
Portanto, com gratidão deveríamos fazer neste dia o que Deus nos pede. “Se hoje
ouvirdes a sua voz” (Sl 95.7). No que concerne ao dia de amanhã, aqui
personificado, deixemo-lo em repouso. Deixai que ele “se preocupe por si mesmo”,
disse Jesus, diremos nós, “com um toque de humor”? Quando o amanhã chegar,
haverá novos problemas, mas haverá também novas forças. Deus nos muniu de
forças, hoje, para enfrentarmos as dificuldades de amanhã. Quando refletimos
sobre o fato de que “cada dia, por si mesmo, tem bastante problemas” (ou: “Basta
ao dia o seu próprio mal” – Atualizada) nos vem imediatamente à lembrança Lm
3.22,23: “As misericórdias do SENHOR são a causa de não sermos consumidos,
porque as suas misericórdias não têm fim; renovam-se a cada manhã”.
Os Dez Mandamentos foram escritos em duas tábuas (Dt 5.22). Jesus sumariou
essa lei nas conhecidas palavras de Mt 22.37–39: “Amarás ao Senhor teu Deus de
todo o teu coração […] e amarás ao teu próximo como a ti mesmo”. De forma
semelhante, a Oração do Senhor contém dois grupos de petições, cujo primeiro
grupo refere-se a Deus, e o segundo, ao homem. Assim também se dá com o
Sermão do Monte considerado como um todo. Tendo sumariado o dever do homem
para com Deus (cap. 6), em seguida declara sua obrigação para com o próximo
(7.1–12).1

COMENTÁRIO DO SINCLAIR FERGSON

A PRESCRIÇÃO DE JESUS
A ansiedade, temos visto, é um sintoma de profunda doença espiritual. A teoria,
no entanto, não nos torna capazes de curá-la. Jesus fala sobre a cura: “Eu vos digo,
não andeis ansiosos” (6.25).
Em si mesma, esta é uma cura inconcebível! Imagine receber a notícia de que
você se encontra gravemente doente. Como você reagiria, se o seu médico
dissesse “Não se preocupe”? Você provavelmente responderia: “Só se você me
disser que existe uma cura para a minha doença, daí sim conseguirei parar de me
preocupar”.
O diagnóstico é insuficiente, se não prover tratamento. Por isso a exortação de
Jesus “Não andeis ansiosos” é posta sob o contexto de um ensinamento específico,
que nos ajudará a eliminar a ansiedade que paralisa nossa vida. O ensino em
Mateus 6.25–34 é estabelecido para atuar como um antídoto contra a preocupação.
Em essência, Jesus está nos dizendo: “Sente-se. Há uma série de questões
sobre as quais você precisa pensar e ponderar”. A necessidade de pensar e
ponderar é o trecho de destaque, pois a cura do espírito doente — o processo que
a Escritura chama de “santificação” — se inicia na mente. A transformação de nosso
caráter começa com a transformação da nossa mente (Rm 12.2). É quando
pensamos com a mente já instruída por Cristo que começamos a viver para o reino
de Deus com saúde espiritual.
Mas onde encontraremos a instrução? Nosso presente estudo sobre o Sermão
do Monte nos dá a resposta. Deus transforma nossa vida pela renovação da mente
enquanto estudamos e nos submetemos ao ensino da Escritura! Nela, o Espírito de
Deus abre os nossos olhos para compreendermos as coisas espirituais. Agora,
recebemos uma perspectiva correta (a perspectiva de Deus) do mundo e de como
se deve agir estando nele. A Escritura tem o propósito extremamente prático para
o “ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de
que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra”
(2Tm 3.16–17).
Particularmente aqui, nesta porção da Escritura, uma série de diretrizes nos é
dada com a intenção de renovar-nos a mente, de modo que nossas vidas tornem-

1
William Hendriksen, Mateus, trans. Valter Graciano Martins, 2a edição em português., vol. 1,
Comentário do Novo Testamento (Cambuci; São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2010), 431–440.
se consistentes com o reino de Deus. Esse é o antídoto de Jesus contra a
ansiedade.
1. Olhe para a vida como um todo. Já notou o que acontece quando você fica
ansioso por algo? É um sentimento que passa a dominar seus pensamentos, você
vê tudo à luz da ansiedade. Parece (a seus olhos) que tudo depende de solucionar
a situação, e, de fato (para você), tudo em sua vida parece estar ligado ao problema.
Você entra em um ciclo vicioso. Quando ansioso pelo que comer, beber, ou
pelas roupas para vestir, você não demorará a sentir como que toda a sua vida e
felicidade dependem disso. Os servos que deveriam servir de suplemento agora
são mestres.
O cristão não é indiferente à comida, à bebida ou à vestimenta. São
necessidades legítimas para se viver neste mundo e em sociedade, mas que jamais
reinam sobre o cristão. Ele já aprendeu que não precisa comer nos restaurantes
mais modernos da cidade ou cozinhar os alimentos mais elegantes com o objetivo
de aproveitar a vida ao máximo. Ele tampouco precisa de roupas da última moda
para sentir-se “aceito” onde realmente importa. Jesus lhe ensinou que a vida “é mais
do que comida e o corpo é mais do que roupas”.
Abra uma revista sofisticada e leia as propagandas. O que grande parte delas lhe
diz? A vida é centrada em comida, bebida e roupas. Isso se confirma ao olharmos
para a maioria das revistas sofisticadas. Quase sem exceção, as propagandas
proclamam as virtudes da comida, da bebida e da vestimenta, de uma forma ou de
outra. Alguns anúncios chegam a anunciar a marca de comida para gatos que fará
seu felino ficar mais atraente!
O que aconteceu? As necessidades básicas da vida — os servos da vida, por
assim dizer — tornaram-se nossos senhores. Porém, Jesus diz, há mais na vida do
que a comida. A pessoa cujo ser é manifesto por meio de um corpo é muito mais
importante do que as roupas que veste.
Como, então, devemos pensar a respeito destas coisas? Jesus pede que
olhemos para a vida como um todo. Os pássaros e os lírios do campo demonstram
quão maravilhoso criador e provedor Deus é. E, se Ele lhes provê mantimento com
cuidado paterno e afetuoso, quanto mais não proverá àqueles que comprou pelo
preço infinito da morte de Seu filho (Rm 8.32)? Você não crê que o Senhor o suprirá
de tudo aquilo de que você necessita na vida?
Você ao menos já se valeu deste argumento? Deveria, e com frequência — mas
não com um espírito na verdade insatisfeito! Seu Pai conhece as suas
necessidades. Ele o ama. Ele suprirá todas as suas necessidades.
2. Olhe para a natureza da vida. “Qual de vós, por ansioso que esteja, pode
acrescentar um côvado ao curso da sua vida?”, Jesus pergunta (6.27). Ninguém
pode, obviamente. Mas o que Jesus deseja ressaltar? Que simplesmente “a
ansiedade nunca levou ninguém a lugar algum”? Qualquer um com um pouco de
bom senso poderia ter dito isso.
O argumento de Jesus, porém, é mais profundo. Ele esteve ensinando a respeito
da provisão do Pai sobre nossa vida. E, agora, dá ênfase à natureza da vida cristã:
“Sua vida está nas mãos daquele que é seu Pai. Ele a criou. Ele, desde o princípio,
conhece seu fim. Ele traça cada passo do caminho para cumprir o propósito que
tem para você e através de você. Você terá tudo do que precisa para cumpri-lo; e,
estando cumprido, você será levado para casa para estar com ele. Por que se
preocupar, quando Ele tem sua vida na palma das mãos? Sua ansiedade é um sinal
de que você não o conhece suficientemente, de que você não confia nele, ou de
que não se entregou a Ele como é devido”.
Somos presos à ansiedade quando insistimos em fugir das mãos do Pai e tomar
nosso nosso próprio rumo. O segredo para sermos libertos da ansiedade é a
liberdade de nós mesmos e o abandono de nossos próprios planos. Mas esse
espírito surge somente ao termos nossa mente repleta do conhecimento de que
podemos confiar, sem restrições, em nosso Pai, de que Ele nos proverá tudo aquilo
de que precisamos.
É por esta razão que a Bíblia tem tanto a dizer a respeito do reinado soberano
de Deus. Em meio a argumentos teológicos, geralmente perdemos de vista esse
fato. Mas todo o Sermão do Monte está ligado ao fato de que Deus governa este
mundo, que Seus planos são perfeitos e que Seus propósitos serão cumpridos.
Nossas petições para que a Sua vontade seja cumprida tanto na terra como nos
céus, e para que Seu reino venha, têm por objetivo reivindicar que Sua promessa
um dia seja cumprida. Elas manifestam nosso compromisso pessoal com toda e
qualquer que seja a vontade de Deus para a nossa vida. Somente aqueles que se
deleitam nessa espera podem dizer de si mesmos: “Nossa vida é imortal até que o
nosso trabalho por Deus esteja terminado”.
É Deus, nosso Pai, quem estabelece os limites da vida, é Ele quem prepara as
boas obras com antecedência, para que as cumpramos (Ef 2.10), quem promete
que, se vivemos de acordo com o Seu plano, nada nos faltará. Quando
compreendemos isso, então também compreendemos quão inútil é a ansiedade e
o propósito de confiarmos tudo a Ele.
3. Olhe para a generosidade do Senhor. Vimos anteriormente, ao estudar o ensino
de Jesus acerca da hipocrisia, que um elemento característico dos fariseus era a
desconfiança sinistra da graça do Pai. Como o filho mais velho na parábola do filho
pródigo, os fariseus pensavam que estavam se “escravizando para Deus”. Tratava-
se de um eco da primeira tentação, que ocorreu no Jardim do Éden, quando
Satanás insinuou que Deus havia sido mesquinho, de fato cínico, na maneira em
que Ele havia disposto Adão e Eva no jardim, havendo os proibido da diversão (Gn
3.1–5).
O diabo obteve sucesso em arrancar a alegria de Eva deixando-a desconfiada
da provisão generosa do Pai. Mas ela não estava sozinha no interesse e no duvidar
da graça do Pai. Os homens, por natureza, duvidam dela, pois Satanás tem obtido
êxito em persuadi-los de que a presença de Deus arruinará suas vidas para sempre.
Boa parte das ansiedades por que passamos — e nossa relutância em tomar o
remédio divino prescrito — florescem dessa suspeita básica. Mas Jesus as destrói
em Mateus 6.24–30. Nenhum cristão que sente o devido prazer pelo que Ele diz
deveria ser enganado novamente.
“Veja como o pai cuida dos pássaros”, diz Jesus. “Ele lhes fornece provisão.
Quanto a vocês, vocês são muito mais importantes do que os pardais”. Isso é,
tecnicamente, conhecido como um argumento a minore ad maius (“do menor para
o maior”). Se X é verdade, quanto mais verdadeiro é Y. Se o Pai se preocupa com
passarinhos, quanto mais se preocupará com o Seu povo, que foi criado para
demonstrar a Sua glória e oferecer-lhe louvores?
Jesus também diz “Observai o lírio dos campos. Eles não trabalham para
produzir beleza. Mas nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer
deles”. Não é esta a verdade? Observe as flores — a delicadeza das cores, as
magnificentes combinações de tonalidade e sombra. Nós elogiamos designers que
conseguem aproximar a beleza e a originalidade da natureza em suas “criações”.
“Ora”, diz Jesus, “se Deus tem cuidado tão generosamente dessas criaturas de uma
estação, ‘que hoje existem e amanhã são lançadas no forno’ [6.30], quanto mais Ele
suprirá suas necessidades!”
A lógica é irrefutável. Deixe-a dominar a sua mente e você estará livre de buscar
o que pagãos infiéis buscam (6.32). Note a linguagem de Jesus aqui. Ele diz que os
pagãos “correm atrás de todas essas coisas”. Eles não conhecem nada além digno
de ser alcançado. Mas o cristão “busca” ao Senhor (Sl 42.1)! Quão estúpido é
buscar a dádiva, quando é possível buscar o Doador.
4. Busque primeiro o reino de Deus. A ansiedade nunca pode ser curada, enquanto
obtemos mais do que já temos. Muitas pessoas cometem esse erro fatal. A
ansiedade só pode ser curada pela certeza de que todas as nossas necessidades
serão supridas pelo nosso Rei. Por essa razão, a maior motivação em nossa vida
deveria ser viver sob a autoridade do Rei e ver Seu reino propagado de todas as
formas possíveis — moral, social e geograficamente, bem como pessoal, interna e
espiritualmente. Quando nosso coração está posto na reta justiça que permeia
nossa vida, temos as prioridades ajustadas na ordem correta, e, por conseguinte,
descobrimos duas coisas:
Em primeiro lugar, entendemos que Deus nos dará tudo do que precisamos. Ele
nunca falhou para com um de Seus filhos.
Em segundo lugar, muitas das coisas que pensávamos precisar, descobrimos
agora que não precisamos e que não as queremos. Por fim, no lugar da ansiedade,
encontramos contentamento.
Vivemos em dias de grande ansiedade e incerteza. Os próprios fundamentos da
vida, às vezes, parecem estar à beira do colapso. Não é de se admirar que estamos
ansiosos. Mas por que deveríamos estar, quando Deus, que governa todas as
coisas, tornou-se nosso Pai? Não é racional ou justificável estar ansioso quando Ele
prometeu suprir todas as nossas necessidades.
Se, diante do ensino de Jesus, permanecemos ansiosos, é porque não o
compreendemos ou porque nele ainda não confiamos. Em ambos os casos, a culpa
é nossa, não dele. Pois ele não só diagnostica a causa da ansiedade: Ele também
provê a cura. Ele é a cura.
Você ainda está em processo de cura?2

2
Sinclair Ferguson, O Sermão do Monte, trans. Elmer Pires, 1a edição. (São Paulo: Editora Trinitas,
2019), 202–209.
COMENTÁRIO DO R. C. SPROUL
NÃO ANDEIS ANSIOSOS
Mateus 6.25–34
Por isso, vos digo: não andeis ansiosos pela vossa vida, quanto ao que
haveis de comer ou beber; nem pelo vosso corpo, quanto ao que haveis de
vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e o corpo, mais do que as vestes?
Observai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em
celeiros; contudo, vosso Pai celeste as sustenta. Porventura, não valeis vós
muito mais do que as aves? Qual de vós, por ansioso que esteja, pode
acrescentar um côvado ao curso da sua vida? E por que andais ansiosos
quanto ao vestuário? Considerai como crescem os lírios do campo: eles não
trabalham, nem fiam. Eu, contudo, vos afirmo que nem Salomão, em toda a
sua glória, se vestiu como qualquer deles. Ora, se Deus veste assim a erva
do campo, que hoje existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós
outros, homens de pequena fé? Portanto, não vos inquieteis, dizendo: Que
comeremos? Que beberemos? Ou: Com que nos vestiremos? Porque os
gentios é que procuram todas estas coisas; pois vosso Pai celeste sabe que
necessitais de todas elas; buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua
justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas. Portanto, não vos
inquieteis com o dia de amanhã, pois o amanhã trará os seus cuidados; basta
ao dia o seu próprio mal.

Quando eu era jovem, vi meu pai morrer aos poucos. Ele teve quatro derrames
graves, o que o deixou completamente incapacitado e fez com que passasse os
últimos três anos de vida sentado em uma cadeira, inapto a trabalhar ou produzir
qualquer renda. Ainda posso ouvi-lo dizer, com a voz grossa por causa da paralisia
que os derrames lhe causaram: “Não se preocupe com o amanhã, com o que comer,
com o que beber ou com o que vestir.” Ele viveu e morreu segundo essas palavras,
mas eu as odiava com todas as minhas forças. Até hoje, como cristão, tenho
problemas com esse texto, pois é como se Jesus falasse comigo diretamente: “Se
você acredita mesmo na providência divina como diz acreditar, por que é tão
ansioso?”

A futilidade da preocupação
É óbvio que aqui Jesus está ensinando a doutrina da providência ao seu povo.
Quando falamos teologicamente sobre a providência de Deus, falamos sobre os
meios pelos quais ele governa o universo inteiro; os meios pelo quais, em sua
soberania, ele não permite que molécula alguma vagueie fora de sua autoridade
soberana. A palavra providência vem da raiz pronoeō, que originalmente significava
“ver antes” ou “ver de antemão”. No entanto, providência refere-se a algo muito além
do conhecimento que Deus tem do futuro. Essa palavra refere-se à provisão divina
para o futuro, ao plano perfeito de Deus que não falha e que inclui cada um de nós
e tudo o que nos diz respeito, até mesmo os fios de cabelo em nossa cabeça. “Este
é o mundo de nosso Pai”, diz o hino, e não há ninguém que eu preferisse ver
governando este mundo do que o próprio Deus onipotente, que faz bem todas as
coisas.
Jesus estava ciente disso, e de forma muito mais profunda do que nós. Ele
entendia as implicações práticas da soberania de Deus e da providência divina. Ele
nos advertiu contra servir a dois senhores e amontoar tesouros na terra, e, em vez
disso, instruiu-nos a buscar os céus e o reino de Deus. Por este motivo, começou
esta parte apresentando uma conclusão: “Por isso, vos digo: não andeis
ansiosos pela vossa vida, quanto ao que haveis de comer ou beber; nem pelo
vosso corpo, quanto ao que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o
alimento, e o corpo, mais do que as vestes?” (v. 25).
Uma das coisas que Jesus ressalta nesta admoestação contra a ansiedade é a
inutilidade de tal sentimento. Toda a preocupação do mundo não seria capaz de
mudar absolutamente nada. Tudo o que conseguimos fazer quando nos
preocupamos é ficar angustiados, e as únicas mudanças acarretadas pela
preocupação são alterações negativas em nossa saúde. Jesus disse que é tolice se
preocupar, pois este é um comportamento inútil.
Ele prossegue dizendo que a ansiedade é questão de falta de fé e caracteriza-
se como uma atitude não apenas inútil, como também, em certo sentido, insensata.
A despeito de suas palavras, nós ainda ficamos preocupados. Às vezes, parece que
simplesmente não podemos evitar. A preocupação, entretanto, é um dos nossos
maiores incentivos à oração, pois a oração é o maior antídoto contra a ansiedade.
Quando me preocupo, sou imediatamente levado a ficar de joelhos, embora isto me
lembre das palavras de Vesta: “Não deveríamos ficar de joelhos antes de nos
preocupar, em vez de deixarmos a preocupação ser o gatilho para orarmos com
mais fervor?”

Lição da vida selvagem


Jesus faz algumas perguntas retóricas: “Não é a vida mais do que o alimento,
e o corpo, mais do que as vestes?” (v. 25). É claro que a vida é mais do que o
alimento, e o corpo é muito mais do que as vestes. Preocupar-se com os resultados
de um exame médico não é o mesmo que se preocupar com o valor da próxima
compra de roupas. Todos nós temos consciência de que nosso corpo humano é
mais importante do que as coisas que utilizamos para vesti-lo.
Em seguida, Jesus nos diz para observarmos a natureza: “Observai as aves do
céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai
celeste as sustenta (v. 26). Há várias coisas na analogia de Jesus que não
devemos deixar passar. Nunca vimos uma ave arar o campo, plantar sementes nos
sulcos, adubar a terra e arrancar as ervas daninhas durante o processo de
crescimento para que, quando o alimento brotar, ela possa levá-lo a um celeiro que
construiu especialmente para épocas de vacas magras. O que vemos é o homem
lavrando e semeando a terra, e, depois, as aves descendo para comer as sementes
que ele lhes forneceu. As aves não são como as pessoas; elas não têm de atentar
para as épocas de cultivo. Como regra, Deus simplesmente cuida de suas
necessidades sem que plantem, colham ou armazenem. Jesus diz: “vosso Pai
celeste as sustenta”.
Acerca deste texto, alguns críticos dizem que Jesus aparentemente não estava
bem informado sobre as catástrofes naturais que assolam a terra e matam milhares
de aves. Pássaros morrem quando há escassez ou vazamento de óleo no mar. Por
estas razões, tais críticos negam a veracidade das palavras de Jesus sobre as aves.
No entanto, ele estava usando um fenômeno comum, corriqueiro, para ilustrar um
argumento. Ele não estava apresentando a doutrina do cuidado providencial à vida
selvagem. Lutero diz que Jesus estava nos apontando a natureza para que as aves
nos ensinassem uma lição. John Stott, que era um ávido observador de pássaros
na Inglaterra, disse que esta não é uma doutrina de ornitologia de Jesus, mas uma
doutrina de orni-teologia. Temos uma lição a aprender com as operações normais
da natureza. Jesus estava simplesmente dizendo que, quando vemos as aves
extraindo minhocas da terra e sementes do nosso jardim, sabemos que elas não
estão morrendo de fome.
A outra questão que desejo observar é o fato de Jesus dizer que o nosso Pai
celestial é quem alimenta as aves. Nós costumávamos ter aqui em casa um
comedouro para pássaros perto da garagem, e, todos os dias, eu colocava bastante
alpiste nele e procurava manter os esquilos longe. Podíamos olhar pela janela e
assistir às diversas espécies de aves sendo atraídas ao comedouro. Eu as
alimentava, mas elas não eram minhas, e eu tampouco era pai delas. Meu Pai
celestial as estava alimentando por intermédio das minhas mãos naquele caso. Eu
pude participar da providência divina cuidando daquelas criaturas, mas devemos
entender que é o nosso Pai quem cuida dos animais, das aves e dos peixes.
Depois, Jesus faz outra pergunta claramente retórica: “Porventura, não valeis
vós muito mais do que as aves?” (v. 26). Perguntar algo tão óbvio a um palestino
do primeiro século não causaria discussão alguma. “Claro”, diria ele. “Sim, nós,
como seres humanos, somos mais valiosos do que as aves do céu.” Até mesmo os
pagãos daquele contexto compreendiam que a vida humana é mais valiosa do que
ovos de tartaruga. Hoje, entretanto, vivemos em uma cultura tão invertida, que ovos
de tartaruga são considerados mais valiosos do que embriões humanos. É por isso
que, talvez, alguns leitores deste texto hoje não saibam do que Jesus estava
falando. Deus não diz que devemos valorizar a vida humana e desprezar os
animais. Pelo contrário, ele nos diz para valorizar as criaturas que colocou aqui;
contudo, temos de valorizar a vida humana ainda mais. Há um cálculo de valor
atribuído à natureza por Deus.

Providência de Deus
Jesus destaca mais uma vez a inutilidade e a tolice da ansiedade: “Qual de vós,
por ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado ao curso da sua vida?”
(v. 27). A principal inferência deste texto provavelmente não está relacionada à
altura, mas à duração da vida. Nós nos preocupamos mais com a morte do que com
qualquer outra realidade que enfrentamos. Todas as nossas reações de medo estão
intrinsecamente ligadas ao medo da morte. Jesus está dizendo que a nossa vida
está nas mãos do Pai, e, por isso, a ansiedade não tem poder para estendê-la.
Nossos dias foram designados por Deus. Ele designou o dia de nosso nascimento,
e, da mesma maneira, o dia de nossa partida deste mundo. O problema é que ele
não nos forneceu essa informação; não sabemos o dia da nossa morte e, por isso,
ficamos preocupados, muito embora tal preocupação não mude absolutamente
nada.
“E por que andais ansiosos quanto ao vestuário? Considerai como
crescem os lírios do campo: eles não trabalham, nem fiam. Eu, contudo, vos
afirmo que nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer
deles” (v. 28–29). Por mais magnífico que fosse o vestuário do rei, ele não era, nem
de perto, tão lindo quanto as cores em tons sutis das flores silvestres que brotam
pelo caminho. Jesus não achava que a flores do campo evoluíam; ele acreditava
que as roupas dignas de realeza usadas por elas eram resultado direto da
providência divina mencionada. É o nosso Pai quem adorna as flores com a beleza
que exibem.
Jesus, então, chega à sua conclusão: “Ora, se Deus veste assim a erva do
campo, que hoje existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós
outros, homens de pequena fé?” (v. 30). Ele destaca o “quanto mais” de Deus e
conclui: “Portanto, não vos inquieteis” (v. 31). Em outras palavras, se Jesus diz
que não há necessidade de ficarmos preocupados, então não precisamos nos
preocupar. Este é o ponto final da questão.
“Porque os gentios é que procuram todas estas coisas; pois vosso Pai
celeste sabe que necessitais de todas elas” (v. 32). Nosso Pai sabe daquilo que
precisamos antes mesmo de pedirmos. Isso não significa, evidentemente, que não
devemos pedir. Na verdade, ele não apenas nos encoraja a pedir; ele ordena que o
façamos. Nós não o informamos de nossas necessidades, pois ele já as conhece.
Somos chamados a ir até sua presença para que descansemos o coração, sabendo
que falamos com o Pai sobre nossas preocupações. Trocando em miúdos, Deus
diz: “Eu sei do que você precisa, mas venha aqui e me diga o que é.” É para o nosso
benefício, não o dele.

Antídoto contra a preocupação


“Buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas
coisas vos serão acrescentadas” (v. 33). No versículo que provavelmente
representa o auge do discurso, Jesus oferece a alternativa à preocupação com a
vida. Este versículo talvez seja o mais importante de todo o sermão do monte. Jesus
não nos diz para esquecermos nossas preocupações, mas, em vez disso, para
focarmos nossas preocupações e nossos pensamentos no reino de seu Pai. Todas
as coisas que nos forem acrescentadas serão consequência de canalizarmos
nossos desejos em seu reino.
Certa vez, ofendi um membro da família com uma decisão que ele considerava
irresponsável do ponto de vista financeiro: decidi vender todos os meus bens e
dedicar-me aos estudos. Este homem questionou-me como eu pretendia sustentar
minha família, e eu citei o seguinte versículo: “Fui moço e já, agora, sou velho,
porém jamais vi o justo desamparado, nem a sua descendência a mendigar o pão”
(Sl 37.25). Isso é um truísmo, mas não um absoluto universal. Os justos passam
fome de vez em quando. O princípio que Davi estabeleceu no salmo é o mesmo
que Jesus afirmou aqui. Se você buscar o reino de Deus em primeiro lugar, as
demais coisas de que precisar serão acrescentadas. Você não terá de se preocupar
com elas.
A força dessa ordem encontra-se na palavra primeiro. Ela vem do vocábulo
grego prōtos, que, aqui, não indica o primeiro elemento de uma série cronológica.
Em outras palavras, Jesus não está dizendo que devemos buscar o reino em
primeiro lugar, as roupas em segundo, a casa em terceiro e assim por diante. Em
vez disso, ele está falando de prioridades. Jesus está dizendo que o mais importante
que podemos fazer é buscar o reino do Pai e sua justiça. Direcione seu coração a
isso, e tudo o mais cuidará de si. A prioridade número um do cristão é buscar o reino
de Deus.
Fico irritado quando incrédulos são descritos como indivíduos que “buscam a
Deus”. Nenhum incrédulo busca a Deus. Há milhões de incrédulos buscando
benefícios que só Deus pode dar, mas eles insistem em fugir dele o tempo todo. Os
cultos de adoração deveriam ser voltados para crentes, não para incrédulos, pois a
busca pelo reino de Deus não começa até que o encontremos por intermédio da
conversão. Em nossa condição natural, como diz o apóstolo, não há quem busque
a Deus (Rm 3.11). É por isso que Jonathan Edwards disse que buscar o reino de
Deus é a principal ocupação do cristão. Nós não paramos de buscar o reino no dia
em que nos convertemos; é neste dia que começamos a buscá-lo. A partir do dia
da conversão, toda a nossa vida deve ser definida como uma busca pelo reino de
Deus e sua justiça. Essa é a prioridade.
Por fim, Jesus diz: “Portanto, não vos inquieteis com o dia de amanhã, pois
o amanhã trará os seus cuidados; basta ao dia o seu próprio mal” (v. 34). Eu
me preocupo com o dia de amanhã e me arrependo disto. Já com o ontem, eu nunca
me preocupo, pois ele já se foi. Posso me preocupar com as consequências que
haverão amanhã daquilo que aconteceu ontem, mas eu não me preocupo com o
ontem. Jesus diz que temos o suficiente em nosso prato hoje para não nos
preocupar com o amanhã. Ele não está dizendo que não devemos estudar para
uma prova marcada, preparar um sermão ou fazer um orçamento para a compra
dos mantimentos. Não devemos ser negligentes no que tange à provisão das coisas
normais da vida. Temos de nos preparar para isso, mas sem um coração ansioso.3

COMENTÁRIO DO HERNANDES DIAS LOPES

O que ocupa o primeiro lugar em sua vida: o reino dos céus ou as coisas
materiais? (6.25–34)
Você é uma pessoa ansiosa? Você é daquele tipo de gente que vive roendo as
unhas, antecipando os problemas? Os problemas ainda estão longe e você pensa
que eles estão batendo à sua porta? Você sofre pensando no que vai comer, com o
que vai se vestir? Onde vai morar, onde vai trabalhar, onde seu filho vai estudar?

3
R. C. Sproul, Estudos Bíblicos Expositivos em Mateus, trans. Giuliana Niedhardt Santos, 1a edição.
(São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2017), 154–159.
A ansiedade é o mal deste século. Atinge homens e mulheres, jovens e velhos,
doutores e analfabetos, religiosos e ateus. As pessoas andam com os nervos à flor
da pele. São como um vulcão prestes e entrar em erupção. São como um barril de
pólvora pronto a explodir.

O que não é ansiedade


Antes de entendermos o que é ansiedade, vejamos o que a ansiedade não é.
Em primeiro lugar, ansiedade não é desprezar as necessidades do corpo. Jesus
nos ensinou a orar: O pão nosso de cada dia dá-nos hoje (6.11). Mas o mundo está
adotando um conceito reducionista, nivelando o homem com os animais. Parece
que o bem-estar físico é o único objetivo da vida.
Em segundo lugar, ansiedade não é proibir a previdência quanto ao futuro. A
Bíblia aprova o trabalho previdente da formiga. Também os passarinhos fazem
provisão para o futuro, construindo ninhos e alimentando os filhotes. Muitos migram
para climas mais quentes antes do inverno. O que Jesus proíbe não é a previdência,
mas a preocupação ansiosa. O apóstolo Paulo aconselha: Não andeis ansiosos de
coisa alguma… (Fp 4.6). O apóstolo Pedro exorta: [Lançai] sobre ele toda a vossa
ansiedade, porque ele tem cuidado de vós (1Pe 5.7).
Em terceiro lugar, ansiedade não é estar isento de ganhar a própria vida. Não
podemos esperar o sustento de Deus assentados, de braços cruzados. Temos de
trabalhar. Cristo usou o exemplo das aves e das plantas: ambas trabalham. Os
pássaros buscam o alimento que Deus proveu na natureza. As plantas extraem do
solo e do sol o seu sustento.
Em quarto lugar, ansiedade não é estar isento de dificuldades. Estar livre de
ansiedade e livre de dificuldade não é a mesma coisa. Embora Deus vista a erva do
campo, não impede que ela seja cortada e queimada. Embora Deus nos alimente,
ele não nos isenta de aflições e apertos, inclusive financeiros.

O que é ansiedade
Jesus fala sobre cinco evidências da ansiedade, como vemos a seguir.
Em primeiro lugar, a ansiedade é destrutiva (6.25). A palavra ansiedade (6.25)
significa “rasgar”, enquanto a palavra inquietação (6.31) significa “constante
suspense”. Essas duas palavras eram usadas para descrever um navio surrado
pelos ventos fortes e pelas ondas encapeladas de um mar tempestuoso. A palavra
“ansiedade” vem de um antigo termo anglo-saxônico que significa “estrangular”. Ela
puxa em direção oposta. Gera uma esquizofrenia existencial. Warren Wiersbe,
citando Corrie ten Boom, diz que a ansiedade não esvazia o amanhã do seu
sofrimento; ela esvazia o hoje do seu poder. Ansiedade é ser crucificado entre dois
ladrões: o ladrão do remorso em relação ao passado e o ladrão da preocupação em
relação ao futuro.
Em segundo lugar, a ansiedade é enganadora (6.25,26). A ansiedade tem o
poder de criar um problema que não existe. Muitas vezes sofremos não por um
problema real, mas por um problema fictício, gerado pela nossa própria mente
perturbada. Os discípulos olharam para Jesus andando sobre as águas vindo para
socorrê-los e, cheios de medo, pensaram que era um fantasma. É sabido que as
pessoas se preocupam mais com males imaginários do que com males reais.
Estatisticamente falando, 70% dos problemas que nos deixam ansiosos nunca vão
acontecer. Sofremos desnecessariamente.
A ansiedade tem o poder de aumentar os problemas e diminuir nossa
capacidade de resolvê-los. Uma pessoa ansiosa olha para uma casa de cupim e
pensa que está diante de uma montanha intransponível. As pessoas ansiosas são
como os espias de Israel, só enxergam gigantes de dificuldades à sua frente e veem
a si mesmos como gafanhotos. Davi agiu de forma diferente dos soldados de Saul.
Enquanto todos viam a ameaça do gigante Golias, Davi olhou para a vitória sobre o
gigante. Geazi olhou os inimigos de Israel e ficou com medo, ao passo que Eliseu
olhou com outros olhos e viu os valentes de Deus cercando sua cidade.
A ansiedade tem o poder de desviar os nossos olhos de Deus e fixá-los nas
circunstâncias. A ansiedade é um ato de incredulidade, de falta de confiança em
Deus. Onde começa a ansiedade, aí termina a fé.
A ansiedade tem o poder de desviar os nossos olhos da eternidade e fixá-los
apenas nas coisas temporais. Uma pessoa ansiosa restringe a vida ao corpo e às
necessidades físicas. Jesus disse que aqueles que fazem provisão apenas para o
corpo, e não para a alma, são loucos. John Rockefeller disse que o homem mais
pobre é aquele que só tem dinheiro.
Em terceiro lugar, a ansiedade é inútil (6.27). Côvado aqui não se refere a
estatura (45 centímetros), mas prolongar a vida, dilatar a existência. A preocupação,
segundo Jesus, em vez de alongar a vida, pode muito bem encurtá-la. A ansiedade
nos mata pouco a pouco. Rouba nossas forças, mata nossos sonhos, mina nossa
saúde, enfraquece nossa fé, tira nossa confiança em Deus e nos empurra para uma
vida menos do que cristã. Os hospitais estão cheios de pessoas vítimas da
ansiedade. A ansiedade mata! Como já afirmamos, o sentido da palavra “ansiedade”
é estrangular, é puxar em direções opostas. Quando estamos ansiosos, teimamos
em tomar as rédeas da nossa vida e tirá-las das mãos de Deus.
A ansiedade nos leva a perder a alegria do hoje por causa do medo do amanhã.
As pessoas se preocupam com exames, emprego, casas, saúde, namoro,
empreendimentos, dinheiro, casamento, investimentos. A ansiedade é incompatível
com o bom senso. É uma perda de tempo. Precisamos viver um dia de cada vez.
Devemos planejar o futuro, mas não viver ansiosos por causa dele.
Preocupar-nos com o amanhã não nos ajuda nem amanhã nem hoje. Se alguma
coisa nos rouba as forças hoje, isso significa que vamos estar mais fracos amanhã.
Significa que vamos sofrer desnecessariamente se o problema não chegar a
acontecer e que vamos sofrer duplamente se ele vier a acontecer.
Em quarto lugar, a ansiedade é cega (6.25b,26). A ansiedade é uma falsa visão
da vida, de si mesmo e de Deus. A ansiedade nos leva a crer que a vida é feita só
daquilo que comemos, bebemos e vestimos. Ficamos tão preocupados com os
meios que nos esquecemos do fim da vida, que é glorificar a Deus. A ansiedade não
nos deixa ver a obra da providência de Deus na criação. Deus alimenta as aves do
céu. As aves do céu não semeiam, não colhem, não têm despensa (provisão para
uma semana) nem celeiro (provisão para um ano).
Vejamos a seguir alguns dos argumentos de Jesus contra a ansiedade.
Primeiro, do maior para o menor. Se Deus nos deu um corpo com vida e, se o
nosso corpo é mais do que o alimento e as vestes, ele nos dará alimentos e vestes
(6.25). Deus é o responsável pela nossa vida e pelo nosso corpo. Se Deus cuida do
maior (nosso corpo), não podemos confiar nele para cuidar do menor (nosso
alimento e nossas vestes?).
Segundo, do menor para o maior. As aves e as flores são apresentados como
exemplo (6.26,28). Martinho Lutero disse que Jesus está fazendo das aves nossos
professores e mestres. O mais frágil pardal se transforma em teólogo e pregador
para o mais sábio dos homens, dizendo: “Eu prefiro estar na cozinha do Senhor. Ele
fez todas as coisas. Ele sabe das minhas necessidades e me sustenta”. Os lírios se
vestem com maior glória que Salomão. Valemos mais que as aves e os lírios. Se
Deus alimenta as aves e veste os lírios do campo, não cuidará de seus filhos? O
problema não é o pequeno poder de Deus; o problema é a nossa pequena fé (6.30).
Em quinto lugar, a ansiedade é incrédula (6.31,32). A ansiedade nos torna menos
do que cristãos. Ela é incompatível com a fé cristã e nos assemelha aos pagãos. A
ansiedade não é cristã. É gerada no ventre da incredulidade; é pecado. Quando
ficamos ansiosos com respeito ao que comer, ao que vestir e coisas semelhantes,
passamos a viver num nível inferior ao dos animais e das plantas. Toda a natureza
depende de Deus, e ele jamais falha. Somente os homens, quando julgam depender
do dinheiro, se preocupam, e o dinheiro sempre falha.
Como podemos encorajar as pessoas a colocarem a sua confiança em Deus
com respeito ao céu, se não confiamos em Deus nem em relação às coisas da
terra? Um crente ansioso é uma contradição. A ansiedade é o oposto da fé. É uma
incoerência pregar a fé e viver a ansiedade. Peter Marshall diz que as úlceras não
deveriam se tornar o emblema da nossa fé. Mas, geralmente, elas se tornam!
A ansiedade nos leva a perder o testemunho cristão. Jesus está dizendo que a
ansiedade é característica dos gentios e dos pagãos, daqueles que não conhecem
Deus. Mas um filho de Deus tem convicção do amor e do cuidado de Deus (Rm
8.31,32).

Como vencer a ansiedade


Jesus não apenas faz o diagnóstico, mas também dá o remédio para a cura da
ansiedade, como vemos a seguir.
Em primeiro lugar, vencemos a ansiedade quando entendemos que Deus é
nosso Pai e conhece todas as nossas necessidades (6.32). Vencemos a ansiedade
quando confiamos em Deus (6.30). A fé é o antídoto para a ansiedade. Deus nos
conhece e nos ama. É o nosso Pai. Ele sabe do que temos necessidade. Se
pedirmos um pão, ele não nos dará uma pedra; se pedirmos um peixe, ele não nos
dará uma cobra. Nele vivemos e existimos. Ele é o Deus que nos criou e nos
mantém a vida. Ele nos protege, nos livra, nos guarda e nos sustenta.
O apóstolo Paulo nos ensinou a vencer a ansiedade orando a Deus (Fp 4.6,7).
A ansiedade é um pensamento errado e um sentimento errado. Quando olhamos
para a vida na perspectiva de Deus, a nossa mente é guardada pela paz de Deus.
Quando alimentamos nossos sentimentos com a verdade de que Deus conhece e
supre as nossas necessidades, então a paz de Deus guarda o nosso coração. A paz
é uma sentinela que guarda a cidadela da nossa mente e do nosso coração.
Em segundo lugar, vencemos a ansiedade quando sabemos que, ao cuidarmos
das coisas de Deus, ele cuida das nossas necessidades (6.33). Aqui temos uma
ordem e uma promessa. A ordem é buscar o governo de Deus, a justiça de Deus, a
vontade de Deus e o reinado de Deus em nosso coração em primeiro lugar. Deus,
e não nós, deve ocupar o topo da nossa agenda. Os interesses de Deus, e não os
nossos, devem ocupar nossa mente e nosso coração. Somos desafiados a buscar
o governo e o domínio de Cristo em todas as áreas da nossa vida: casamento, lar,
família, vida profissional, lazer. A promessa é que, quando cuidamos das coisas de
Deus, ele cuida das nossas necessidades.… todas essas coisas vos serão
acrescentadas (6.33). Deus faz hora extra em favor dos seus filhos. Ele trabalha em
favor daqueles que nele esperam.
Em terceiro lugar, vencemos a ansiedade quando descansamos no cuidado
diário de Deus (6.34). Não administramos o futuro. Antecipar o futuro e começar a
sofrer por ele não é prudente. Devemos cuidar do hoje e deixar o amanhã nas mãos
daquele que cuida de nós.4

COMENTÁRIO DO WILLIAN MACDONALD

Não fique ansioso (6:25–34)


6:25 Nessa passagem Jesus golpeia a tendência de centralizarmos a vida ao redor
da comida e do vestuário, perdendo assim o seu verdadeiro significado. O problema
não é tanto o que comemos e vestimos hoje, mas o que comeremos e vestiremos
daqui a dez, vinte ou trinta anos. Tal preocupação sobre o futuro é pecado, pois
nega o amor, a sabedoria e o poder de Deus. A preocupação nega o amor de Deus
implicando que ele não se preocupa conosco. Nega sua sabedoria implicando que
ele não sabe o que está fazendo. E nega seu poder implicando que ele não é capaz
de suprir nossas necessidades.
Esse tipo de preocupação faz com que dediquemos todas as nossas melhores
energias a fim de termos a certeza de que teremos o suficiente para nos mantermos
vivos. Então, antes de percebermos, nossa vida passou e perdemos o propósito
central para o qual fomos criados. Deus nos criou à sua imagem com um objetivo
muito mais elevado que o mero consumismo. Estamos aqui para amá-lo, adorá-lo
e servi-lo, e representar seus interesses na terra. Nosso corpo foi planejado para
ser nosso servo e não nosso mestre.
6:26 As aves do céu ilustram o cuidado de Deus em prol das suas criaturas.
Elas nos ensinam quanto é desnecessário nos preocuparmos. Elas não semeiam,
não colhem, nem ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai celeste as sustenta.
Portanto, se na hierarquia da criação divina valemos muito mais do que as aves,
então é certo que deveríamos esperar que Deus tome conta das nossas
necessidades.
Mas não deveríamos deduzir disso que não precisamos trabalhar para nossa
provisão. Paulo nos lembra disso: “se alguém não quer trabalhar, também não
4
Hernandes Dias Lopes, Mateus: Jesus, o Rei dos Reis, 1a edição., Comentários Expositivos Hagnos
(São Paulo: Hagnos, 2019), 227–233.
coma” (2Ts 3:10). Tampouco deveríamos concluir que seria errado um fazendeiro
semear e colher a safra. Essas atividades fazem parte da sua provisão. O que Jesus
está proibindo aqui é a multiplicação de celeiros na tentativa de providenciar
segurança futura independente de Deus (prática que ele condena na parábola do
fazendeiro rico em Lucas 12:16–21). A obra Daily Notes of the Scripture Union
[Notas diárias da união bíblica] resume da seguinte forma o versículo 26: “O
argumento é que se Deus sustenta criaturas de menor valor sem que haja
participação consciente delas quanto mais sustentará, com a participação ativa
deles, aqueles para quem a criação ocorreu”.
6:27 Ficarmos ansiosos quanto ao futuro não é apenas uma desonra para Deus,
mas é também inútil. O Senhor demonstra isso com uma pergunta: Qual de vós,
por ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado ao curso da sua vida?
Uma pessoa de estatura pequena não pode se preocupar a ponto de crescer 45
centímetros. Ainda, relativamente falando, seria muito mais fácil executar esse feito
que se preocupar com a existência de todas as providências das suas necessidades
futuras.
6:28–30 Em seguida, o Senhor lida com a irracionalidade de nos preocuparmos
se teremos ou não vestuário suficiente para o futuro. Os lírios do campo
(provavelmente anêmonas selvagens) não trabalham nem fiam, contudo sua
beleza ultrapassa a dos vestuários reais de Salomão. Se Deus pode providenciar
tal vestuário elegante para as ervas do campo, que têm breve existência e então
são usadas como combustível no forno, certamente ele cuidará do seu povo que o
adora e o serve.
6:31–32 A conclusão é que não deveríamos gastar nossa vida numa ansiosa
perseguição de comida, bebida e vestuário para o futuro. Os gentios descrentes
vivem desesperadamente em busca de uma acumulação de bens materiais, como
se a comida e o vestuário fossem tudo na vida. Mas não deveria ser assim com os
cristãos que têm um Pai celestial que sabe das necessidades básicas de todos.
Se os cristãos tivessem de fixar diante deles a meta de providenciar
antecipadamente todas as suas necessidades futuras, então seu tempo e suas
energias teriam de ser dedicadas à acumulação de reservas financeiras. Eles nunca
poderiam estar certos de que têm guardado o suficiente, pois sempre existe o perigo
de um colapso de mercado, uma inflação, uma catástrofe, uma enfermidade
prolongada, um acidente provocando paralisia. Isso indica que Deus seria roubado
do serviço do seu povo. O verdadeiro propósito pelo qual eles foram criados e
convertidos seria perdido. Os homens e as mulheres que levam a imagem divina
estariam vivendo para um futuro incerto nesta terra quando deveriam estar vivendo
com os valores da eternidade em mente.
6:33 O Senhor, portanto, faz um pacto com seus seguidores. Em resumo, ele
diz: “Se você colocar os interesses de Deus em primeiro lugar na sua vida, eu
garantirei suas necessidades futuras. Se você buscar, pois, em primeiro lugar, o
seu reino e a sua justiça, então eu cuidarei para que nunca lhe falte as
necessidades da vida”.
6:34 Esse é o programa de “providência social de Deus”. A responsabilidade do
crente é viver para o Senhor, confiando em Deus para o futuro com uma confiança
inabalável de que ele tudo providenciará. Nosso trabalho é simplesmente suprir
nossas necessidades atuais; qualquer coisa acima disso deve ser investida no
trabalho do Senhor. Somos chamados para viver um dia de cada vez: o amanhã
trará os seus cuidados.5

COMENTARIO DO FRITZ

b. A preocupação
25–34 Por isso, vos digo: Não andeis ansiosos pela vossa vida, quanto ao que
haveis de comer ou beber; nem pelo vosso corpo, quanto ao que haveis
de vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e o corpo, mais do que
as vestes? Observai as aves do céu: Não semeiam, não colhem, nem
ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai celeste as sustenta.
Porventura, não valeis vós muito mais do que as aves? Qual de vós, por
ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado ao curso da sua vida?
E por que andais ansiosos quanto ao vestuário? Considerai como
crescem os lírios do campo: Eles não trabalham, nem fiam. Eu, contudo,
vos afirmo que nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como
qualquer deles. Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que hoje
existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós outros, homens
de pequena fé? Portanto, não vos inquieteis, dizendo: Que comeremos?
Que beberemos? Ou: Com que nos vestiremos? Porque os gentios é
que procuram todas estas coisas; pois vosso Pai celeste sabe que
necessitais de todas elas. Buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino
(dos céus) e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão
acrescentadas.
Portanto, não vos inquieteis com o dia de amanhã, pois o amanhã
trará os seus cuidados. Basta ao dia o seu próprio mal.
Essa é a palavra para os pobres. O que o Senhor quer dizer com
“preocupar-se”? Será que não se preocupem significa “não trabalhem”,
“fiquem de braços cruzados”? Não, porque sempre de novo a Bíblia fala do
trabalho e da bênção do trabalho: “Quem não quiser trabalhar também não
coma” (2 Ts 3:10), e: “Preguiçoso, aprenda uma lição com as formigas” (Pv
6:6). Fundamentalmente, pois, preocupar-se e trabalhar são coisas
diferentes.
Com a palavra “preocupar-se” o Senhor refere-se, não ao “prover”, mas
ao angustiar-se medroso, cismado e atormentado. A essas preocupações
falsas, angustiantes, insistentes, arrasadoras de coração e nervos, o Senhor
contrapõe três argumentos:
• Ele aponta para a revelação de Deus em nossa própria vida;
A indicação para nós mesmos: Não é a vida mais do que o alimento, e
o corpo, mais do que as vestes? Ambos, a vida e o corpo, nós os
recebemos sem contribuirmos para isso. Deus os deu a nós. Deus os

5
William MacDonald, Comentário Bíblico Popular: Novo Testamento, 2a edição. (São Paulo: Mundo
Cristão, 2011), 30–31.
conserva em sua mão. Aquele que dá o maior, o corpo e a vida, não seria
capaz de cuidar também do menor?
Perante Deus nenhuma angústia é tão grande que ele não a pudesse
resolver, e nenhuma necessidade tão pequena que ele não a pudesse ver.
Diante de Deus (falando em figuras), a maior montanha da terra e a maior
profundeza da terra são iguais a um pequeno cupinzeiro. Deus situa-se
acima de todas as medidas de espaço e de tempo deste mundo. Diante dele
não existem coisas grandes e coisas pequenas. Nenhum pardal cai do
telhado sem a sua vontade. Ele cuida com máxima atenção de cada instante
de nossa vida. O Pai dos céus, que governa o mundo das estrelas e os
sistemas solares do universo, tem sob seu controle também o mínimo
acontecimento que se aproxima de mim na próxima hora. Nada (esse “nada”
tem sentido total) pode acontecer comigo, a não ser o que ele previu e o que
será benéfico para mim (cf. Is 40:26–31). É blasfêmia contra Deus se nos
preocupamos e nos angustiamos temerosamente. É paganismo (cf. v. 32). É
“inútil”, porque com todas as preocupações não se muda nem melhora nada
(v. 27). Pelo contrário: através da tristeza somente aumentamos nossa cruz
e sofrimento.
• Ele aponta para a revelação de Deus na criação;
A indicação para a criação é a seguinte: Observai as aves do céu: Não
semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai
celeste as sustenta. […] Considerai como crescem os lírios do campo:
Eles não trabalham, nem fiam (não realizam “nem trabalho masculino nem
feminino”). Eu, contudo, vos afirmo que nem Salomão, em toda a sua
glória, se vestiu como qualquer deles.
Está aí a palavra: “Não se afadigam, i. é, não trabalham, não semeiam…”
Não deveríamos deduzir daí: Não trabalhamos, não semeamos, cruzamos
os braços e deixamos que o Pai do céu nos alimente? Assim como os
pássaros não semeiam, assim também nós não temos necessidade de
semear e colher?
Que tolice! Olhemos bem claramente para a figura dos pássaros. O
passarinho não consegue semear, mas não obstante precisa fazer uso dos
dons que Deus depositou nele para providenciar seu alimento. Não pode ficar
sentado preguiçosamente no ninho, até que Deus lhe jogue a comida no bico.
O sustento não chega voando. É ele que precisa voar até o alimento e
procurar dedicadamente aquilo de que necessita.
E os lírios, eles não podem voar como os pássaros nem trabalhar para
procurar comida, mas apesar disso precisam sugar as gotas de chuva e
orvalho que caem sobre suas pétalas e abrir-se aos raios do sol. Se não o
fizessem, morreriam.
Pássaros e lírios, portanto, não precisam se inquietar para além do que
estabelece sua natureza de pássaros e lírios. Mesmo que não semeiem, não
colham nem se afadiguem, Deus lhes dá o de que precisam. Deve, agora, o
filho de Deus ansiar-se em vista de sua natureza de filho de Deus? Não, mas
deve trabalhar, isso sim. Verdadeiros filhos e filhas de Deus são por isso
sempre as pessoas mais dispostas e diligentes no trabalho.
Contudo, se, apesar de todo o esforço, falta o mais necessário? O que
fazem os pássaros na tempestade? Abrigam-se o melhor que podem e
aguardam. É o que faz também o filho de Deus! Quando a tempestade ruge,
ele se abriga na proteção de Jesus – e espera. Bonhoeffer disse: “Creio que,
em cada necessidade, Deus nos quer dar tanta força de resistir como
precisamos. Mas ele não a dá antecipadamente, para que não nos fiemos
em nós próprios, mas unicamente nele. Nessa fé deveria estar superando
todo o medo do futuro.”
• Ele aponta para a revelação de Deus no seu reino.
Chegamos à terceira revelação. O Senhor diz: Ora, se Deus veste assim
a erva do campo (da qual fazem parte os lírios), que hoje existe e amanhã
é lançada no forno, quanto mais o fará a vós? Com essas palavras o
Senhor pára bem diante de nós, olha fundo nos olhos de cada um e, por meio
dessa terceira indicação, nos eleva a uma altura que deixa bem atrás tudo o
que é terreno e todas as preocupações: Vocês foram comprados por preço
alto e são destinados ao céu, não ao forno. Vocês são destinados à
eternidade. Não destinados ao suicídio, como diziam os estóicos quando as
cargas da vida haviam se tornado muito pesadas.
Existe apenas uma única preocupação justificada, que é a preocupação
pelo céu. Dela o Senhor fala no final.
Ela é: Buscai, em primeiro lugar, o reino (dos céus) e a sua justiça, e
todas estas coisas vos serão acrescentadas. “Reinado dos céus” é o
domínio de Deus, é a presença de Deus. Esse reino já quer agora,
invisivelmente, obter espaço. Tudo o que existe é apenas um pequeno início,
um indício sugestivo para o grande e visível estado de consumação, quando
Deus será tudo em todos, quando o reino perfeito de Deus abrangerá a terra
numa grandeza visível. Para esse reino futuro deve estar direcionada toda a
busca.
Buscar significa deixar-se preencher já agora com toda a riqueza desse
maravilhoso reino futuro de Deus.6

6
Fritz Rienecker, Comentário Esperança, Evangelho de Mateus (Curitiba: Editora Evangélica
Esperança, 1998), 112–114.

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