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Universidade Federal do Rio de Janeiro - Escola de Belas Artes

Curso Graduação em Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis


Disciplina Técnicas de Pintura I – Prof.ª Monica Dias

INTRODUÇÃO

A preservação de um patrimônio é a garantia da memória de uma nação, e preocupar-se


com a conservação de um bem cultural, artístico ou até mesmo de valor afetivo é o
primeiro passo para contribuir com esse propósito.

PRESERVAÇÃO

Série de ações cujo objetivo é garantir a integridade e a perenidade de algo.


defesa, salvaguarda / íntegro = completo / perenidade = durabilidade

O emprego de técnicas, materiais e conhecimentos apropriados à natureza de cada obra,


assim como a utilização de pesquisas e análises diferenciais de todo o processo de
restauração, confere a possibilidade de firmar o compromisso com a integridade física e
moral de um patrimônio.
Com o passar dos anos, além do processo natural de envelhecimento, a obra sofre
alterações ocasionadas pela forma inadequada de acondicionamento, por condições
climáticas e suas oscilações, pelos agentes biológicos e outros agentes externos de
deterioração.
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O primeiro passo para sua conservação dependerá da forma como o artista utilizou os
materiais que a compõe.
Muitas obras de arte começam a deteriorar-se devido a alguma reação interna causada
pela incompatibilidade de materiais que fazem parte da sua própria constituição.

A Conservação ainda é a melhor forma de prolongar a existência de uma obra de arte,


porém quando acontece um atentado à integridade estética da obra, ela poderá sofrer
um processo de intervenção chamado restauração.

A Restauração constitui-se de uma intervenção consciente que obedece a princípios


básicos como a reversibilidade, a estabilidade e a autenticidade. Ou seja, caberá ao
profissional utilizar materiais reversíveis e estáveis, de forma que não seja alterada a
originalidade da obra, e não lhe seja atribuída nenhuma falsificação. O principal objetivo
será devolver a integridade física e estética da obra, em toda sua complexidade,
possibilitando sua leitura através do restabelecimento de sua unidade visual e da
restituição de seus valores plásticos perdidos.

CONSERVAR é prolongar e manter o maior tempo possível os materiais que constituem a


obra. Estabelecer condições e tomar medidas menos danosas para que a obra fique o
mais estável possível.

“Conservação = Estabilidade”.

A conservação pode ser dividida em:

Conservação Preventiva - ações indiretas com o objetivo de retardar a deterioração e


prevenir futuros danos, criando perfeitas condições à conservação. Isto diz respeito à:
manipulação, transporte, acondicionamento e exposição das obras.

Conservação Curativa - ação direta efetuada sobre o objeto em tratamento a fim de


retardar sua deterioração. Tais como: identificar e eliminar xilófagos presentes no chassi,
remover a poeira com pincel, entre outros.

São operações características de conservação:

 Análise e prevenção dos fatores de deterioração;

 Controle das condições ambientais;

 Intervenções sobre o ambiente;

 Intervenções diretas de conservação;


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RESTAURAR é restituir a legibilidade estética da obra, preservando sua unidade física e


histórica. São operações características de Restauração:

 Restauro Conservativo: referente à parte estrutural da obra;


 Restauro Estético: referente à sua imagem.

Qualquer intervenção de restauro deve ser precedida por uma análise completa da obra:
materiais que a constituem, seu atual estado de conservação e identificação das
deteriorações que apresenta.

É indispensável para os profissionais que trabalham com conservação e restauração de


objetos de arte:

 Reconhecer os materiais que compõem as obras;


 As peculiaridades de envelhecimento dos mesmos;
 A vulnerabilidade destes em relação aos agentes de degradação;

Além, de obedecer aos Princípios


Fundamentais da Restauração:

Reversibilidade – todos os materiais e


processos utilizados devem ser reversíveis,
ou seja, será possível removê-los e
substituí-los por outros futuramente,
quando tivermos uma tecnologia mais
avançada.

Estabilidade – todos os materiais utilizados


devem ter sua estabilidade comprovada, e
necessariamente devem ser compatíveis
com a natureza dos materiais constituintes
da obra.

Autenticidade – a originalidade da obra deve ser preservada, não sendo permitido


qualquer tipo de intervenção que a descaracterize e a falsifique.

Mínima Intervenção – no passado, quando a restauração era vista e realizada de forma


empírica, muitas obras sofreram tratamentos desnecessários e, muita das vezes,
desastrosos. Atualmente toda intervenção deve ter caráter científico, só é permitido
intervir realmente no que for necessário.
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ESTRUTURA DA PINTURA

A pintura tradicional possui uma estrutura complexa formada por várias camadas. Cada
camada é constituída de materiais específicos, que irão degradar de forma diferente.
Portanto, devem ser consideradas individualmente.

1 . SUPORTE

2 . ENCOLAGEM

3 . CAMADA DE PREPARAÇÃO

4 . IMPRIMAÇÃO

5 . CAMADA PICTÓRICA

6 . CAMADA DE PROTEÇÃO

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SUPORTE

É o elemento de sustentação da pintura, a superfície que vai receber todas as camadas.


Pode ser: parede, madeira, tela, papel, etc. A sua utilização vai depender das
necessidades da técnica, do material e geralmente estará relacionada com o período ao
qual está inserida.

Dos materiais mais comuns empregados para a fabricação de suportes, destacam-se


principalmente a MADEIRA e a TELA.

A utilização da madeira como suporte vem desde os períodos mais remotos da história
da arte. Na Europa medieval e renascentista foi adotada como painel e até hoje, continua
a ser o suporte ideal para trabalhos que necessitem de superfície rígida.
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TELA

O emprego efetivo da tela como suporte para pinturas aconteceu a partir do


Renascimento, com o desenvolvimento e a popularização da pintura a óleo,
possibilitando a criação de obras móveis de grandes dimensões e o intercâmbio de obras
de arte entre povos.

Uma das características para que um têxtil seja utilizado como tela para pinturas é ter
uma trama fechada e ser feita com materiais de fibra relativamente resistente. Todos os
tecidos são formados pelo entretecimento de uma série longitudinal de fios, com outros
fios perpendiculares, chamados de urdidura e trama.

URDIDURA ( B )
É o conjunto de fios que se colocam fixos no tear, paralelos entre si, para entre eles se
passar a trama, entretecendo o tecido. Estão dispostos na direção longitudinal da tela e
constituem o comprimento do tecido.

TRAMA ( A )
Formada pelos fios que se entrecruzam com a urdidura no sentido da largura da tela. A
largura do tecido é definida pela medida da trama de uma ourela a outra.
Ourela ( C ) é o grupo de fios da trama dos extremos da tela, corresponde à largura do
tear.

A - TRAMA

B - URDIDURA

C - OURELA

C B A
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Os materiais mais utilizados nas telas são os que procedem do reino vegetal,
tais como: o algodão, o linho e o cânhamo. O LINHO cru destaca-se como a
melhor fibra para o preparo de suportes flexíveis para pinturas.
O linho é uma planta da família das lináceas. As fibras têxteis são obtidas
pela maceração do talo e são constituídas na quase totalidade por celulose.
Suas fibras são mais resistentes e duráveis, além de serem pouco elásticas e
flexíveis e apresentarem nódulos.
A história do linho começa na Antiguidade egípcia, de onde a planta é
originária, e onde muitos exemplares do tecido envolvendo múmias já foram
encontrados. O tecido de linho foi sempre o material mais procurado para a
feitura de telas, é a fibra mais resistente à ruptura, é menor a sua
capacidade de absorção de umidade, são menores os extremos atingidos à
dilatação e contração, sobretudo depois de molhado pela primeira vez e a
consequente acomodação dos fios.
O linho puro de trama apertada, onde as fibras da trama e da urdidura
tenham o mesmo peso e resistência é o melhor material para a pintura. As
telas de linho se distinguem das de algodão por sua cor natural e pelo
caráter irregular de sua trama, que é o resultado do formato arredondado
das fibras de linho. Esta característica persiste através das camadas de tinta,
resultando numa textura desejável para muitos pintores, apesar do
inconveniente de seu custo elevado.
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CHASSIS

Estrutura de madeira (geralmente) sobre a qual a tela é presa, esticada e


tensionada.

Sua função é estirar e sustentar o suporte. Deve ser fabricado de forma


adequada, isso será essencial para a conservação da pintura. A madeira deve
ser de boa qualidade estar seca (quando o chassi é feito com madeira úmida, é
um risco para a pintura, pois ao secar provoca tensões que irão deformar o
suporte), ser leve e imunizada (se a madeira estiver infestada, será um risco e o
ponto de partida para a degradação da pintura).
A parte da frente, que entra em contato com a pintura, deve ser chanfrada, para
evitar que o tecido não cole sobre a madeira (ao ser-lhe aplicado o fundo) e não
formem marcas irreversíveis no suporte. As bordas externas devem ser
arredondadas, uma tela preparada e esticada sobre cantos e bordas não
arredondados terá maior tendência para apresentar fissuras de tração. Além
disso, as quinas muito vivas fragilizam o tecido podendo ocasionar rupturas.
Deve possuir encaixes livres nas suas quatro peças. Tais encaixes permitem os
movimentos próprios da madeira diminuindo a tensão sobre a tela. Os encaixes
mais comumente usados são os conhecidos como macho / fêmea. Cada encaixe
deve possuir pequenos pedaços de madeira, colocados em seus ângulos, pelo
verso, são as chavetas ou cunhas: uma no sentido horizontal e outra no sentido
vertical, sua função é distender a armação e também o tecido, regulando a
abertura do ângulo, mantendo-o dentro dos 90°, auxiliando na manutenção da
tensão. Antes de adaptar o chassi ao suporte, certifique-se de que esteja bem
ajustado medindo a exatidão dos cantos com um esquadro.
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ESQUEMA DA CONSTRUÇÃO DE UMA TELA

A fixação da tela ao chassi, embora seja uma operação simples, deve a rigor,
obedecer algumas recomendações, sobretudo para evitarem-se distorções.
Os fios da trama e da urdidura devem correr paralelos às réguas do chassi e
perpendiculares entre si. Sua fixação com tachas inoxidáveis também deve
obedecer à regra segundo a qual parte-se do centro das réguas do chassi
para suas extremidades, colocando-se os pregos em distâncias regulares (4
cm), e em forças opostas, simultaneamente, em seus quatro lados. Após
uma primeira camada de pregos, coloca-se uma segunda nos espaços
intercalados da primeira, formando um zigue zague.

chanfros

Fonte da Ilustração: Livro Iniciação à Pintura, de Edson Motta e Maria Luiza Guimarães Salgado
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ENCOLAGEM

A cola é considerada uma necessidade absoluta, para que a tinta a óleo


nunca fique em contato direto com a fibra. Caso isto aconteça, a tela ficará
oxidada, frágil, quebradiça e esfarelada ocasionando seu apodrecimento.
A cola não é um revestimento, é um líquido empregado para preencher os
poros, isolar camadas ou tornar as superfícies adequadas para receber a
camada de preparação. A aplicação de uma densa camada implicará num
excesso de carga que ocasionará rachaduras e descamações da camada
pictórica. Em geral a mais utilizada é a cola de coelho, 10% ou 5% em água
deionizada ou filtrada, (cerca de 30 a 50 gramas para um litro de água). Deve
permanecer de molho por no mínimo 12 horas, para que inche. Somente
depois deste período deve ser aquecida em banho-maria para que dissolva
completamente. Também nesse momento é indicado adicionar um fungicida
(timol 10% em álcool etílico ou 5 gotinhas de essência de cravo). Quando
fria tem a consistência de uma gelatina e deve ser conservada em geladeira.
A gelatina pode ser também utilizada, porém devem ser aquelas fabricadas
para uso técnico e para laboratórios, em qualidades muito puras, quase
transparentes como água e, na maior parte, importadas da França e Bélgica.
A gelatina comestível tem uma cor amarela e é comparativamente fraca em
resistência.
Os ingredientes na gelatina não estão presentes nas mesmas proporções em
que estão na cola, sendo considerada uma segunda opção.
Quimicamente, as proteínas complexas das quais são compostas as colas
podem ser agrupadas em duas classes: condrina (responsável por suas
propriedades adesivas) e glutina (responsável por sua característica
gelatinosa). A cola contem mais condrina e menos glutina que a gelatina.
Tecnologicamente, a diferença entre cola e gelatina é considerável. Quando
usado na encolagem, a gelatina pode ser encarada como um material da
mesma origem, com características similares as da cola. Porém suas
propriedades aglutinantes, adesivas e de acabamento são sempre inferiores
às colas de peles.
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CAMADA DE PREPARAÇÃO

A camada de preparação ou fundo confere uma camada estrutural


intermediária entre o suporte e as camadas de pintura. Em outras palavras, é a
ponte de ligação entre o suporte e a pintura. Constitui-se de uma carga e um
aglutinante e possui duas funções:

 Mecânica: confere estabilidade e consistência, aplana irregularidades e


facilita a correta aderência da pintura.
 Ótica: produz efeitos de translucidez quando colorida e como superfície
refletora, quando branca.

Para uma tela ser de qualidade, a camada de preparação deve ter o grau correto
de absorção e flexibilidade, assim como deve estar bem ligada ao tecido da tela,
sendo forçada para dentro da trama, utilizando-se uma quantidade mínima de
materiais.

IMPRIMAÇÃO

A imprimação pode ser considerada a finalização da camada de preparação e o


início da camada pictórica. É onde é feito o esboço da pintura, onde são
marcadas as áreas de luz, os tons intermediários e as sombras. Onde o artista
faz seu estudo de cores, de composição. O material utilizado é variado: aguadas
de tinta magra, carvão, etc.

CAMADA PICTÓRICA

É a pintura propriamente dita, a identidade visual da obra. Pode ser formada


por várias camadas, finas ou com empastes, conforme a intenção do artista. É
onde encontramos a fatura (caligrafia pictórica) do artista e todas as
informações acerca da imagem e mensagem que ele gostaria de nos transmitir.

CAMADA DE PROTEÇÃO

Considerado um escudo protetor, o verniz, é uma camada intermediária entre a


camada pictórica e o meio externo. Ele protege a pintura das agressões
externas, tais como a oxidação. O verniz oxidado e com contaminantes
superficiais pode ser removido e a pintura continuará intacta. Para o artista tem
função estética, pois é uma ferramenta para aspectos plásticos de brilho ou
opacidade.

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