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Disciplina: Teologia sistemática II

Aula 7: Quem é Jesus Cristo?


Apresentação

Nesta aula, com base no acompanhamento das principais correntes filosóficas e cristológicas e suas contribuições e
influências, vamos aprofundar e identificar dificuldades em nossos estudos.

Traçaremos ainda um panorama geral do conhecimento das naturezas divina e humana de Jesus, do modo como os
hagiógrafos do Novo Testamento as apresentam, de alguns títulos cristológicos e, por fim, da relação entre o Filho fazer-se
como homem para fazer-nos como Deus.

Objetivos

Refletir sobre as naturezas humana e divina de Jesus;

Identificar o testemunho escriturístico do Filho que se faz homem;

Analisar virtudes e limites da Cristologia.


Cristologia e influências
O centro de estudos da Cristologia é o próprio Ser de Deus que,
ao mesmo tempo em que é divino, assume a humanidade no
Filho, tornando essa Encarnação como decisiva. Assim, o Filho
tem duas naturezas que se complementam, correlacionam-se
e realizam o que propõem: a vida divina totalmente na vida
humana, da Encarnação à Cruz. Sem dúvida, estamos diante
de um mistério de Deus.

Encontramos, em Jesus Cristo, a realização de todas as


promessas do Antigo Testamento, em uma expressão que é,
ao mesmo tempo, ruptura e continuação, pois se renova e se
mantém atual em uma nova dinâmica para a humanidade.
Toda essa nova realidade convida cada um de nós a assumir
uma posição crítica do mundo a partir de uma referência no
seguimento de Cristo.

 O Cristo Amarelo, de Paulo Gauguin. (Fonte: art-Gauguin.com <//art-


gauguin.com/gauguin_1880_third.html> ).

Cristologia é, portanto, o tratado que tem Jesus Cristo como objeto de estudo tanto em sua
perspectiva de ser Filho como na de seu Ser: Deus que se faz homem e o homem que é
divino, em uma dinâmica única, que nos revela quem é Deus e, nessa revelação, quem é o
ser humano.

Vejamos alguns pontos importantes para ajudar a situar nossos estudos:

1
Correntes filosóficas
Racionalismo Positivismo e neopositivismo
Segundo essa corrente, somente a experiência humana Preocupação em estudar os fatos, considerando
pode elaborar conhecimentos sobre Jesus, distinguindo opiniões como interpretações subjetivas.
o que não se enquadra nessa experiência como ficção
ou mito. A questão aqui está na compreensão de que o fato é
uma manifestação do ser, significado por ele, sendo a
A crítica atual a essa corrente é que ela não considera a própria seleção desse fato como um processo de
consciência apostólica após Pentecostes, experiência interpretação (quem o seleciona o faz pela importância
essa que imprimiu sentido ao que foi vivido que lhe dá, sendo, portanto, uma interpretação
anteriormente – a experiência deixa de ser limitada subjetiva).
enquanto tal e é compreendida a partir do sentido que
lhe é dado.

2
Perspectivas cristológicas

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Teologia da Cruz e Teologia da Glória em oposição 

A defesa na manifestação de Deus no que lhe é aparentemente contrário (a cruz) situa a teologia como sendo imanente e de
foro íntimo pelo recolhimento de Deus. A posição atual expressa a cruz e a glória como unidade, sendo uma manifestação
da outra.

Método histórico 

Fruto do racionalismo alemão no século XX, foi aceito de modo geral quando considerado em unidade com a fé. Aqui houve
um processo de questionamento sobre o que foi transmitido pelas primeiras comunidades, definindo o conhecimento como
sendo o do Jesus da Fé e o que realmente Jesus teria dito e feito, o Jesus da História.

Questões da Cristologia

Os estudiosos atuais:

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ACEITAM NÃO ACEITAM
que, antes de ser escrito, o Evangelho foi pregado a autonomia das primeiras comunidades por terem sido
oralmente por décadas e sua escrita teve como objetivo fundadas e acompanhadas tanto por apóstolos como
ordenar essa experiência com Jesus no significado por pessoas de sua confiança, mantendo a unidade do
próprio após Pentecostes. Anúncio e sua fidelidade.

 Mosaico: A última ceia - Santuário de Caravaggio, ITÁLIA. (Fonte: Macthia / Shutterstock).

Os apóstolos não seriam somente pessoas que tiveram uma experiência de ver e ouvir, limitada à sua pessoa, mas também
estavam cientes:

Da responsabilidade do anúncio e de ter o Espírito Santo como memória.

Sobre a subjetividade da fé cristã, os dados históricos e objetivos que


corroboram seu conteúdo.

Da descrição mitológica de um Jesus taumaturgo e milagreiro, em uma origem


meio humana e meio divina, fruto da fragmentação e parcialidade das fontes,
que é contestada pela articulação entre a fé cristã e a história.

Atenção
Nos estudos cristológicos, frente às diferentes influências filosóficas e metodológicas que recebemos, é preciso considerar o
ambiente hostil que não refutaria um testemunho contraditório, o estilo literário, a simplicidade e o tom despretensioso dos textos,
a verdade expressa sem adereços, a mentalidade superior à da época e as dimensões intelectual, moral e psicológica
apresentadas nas fontes.

A denominada separação histórica entre Jesus (Fé) e Cristo (História) rompe com a confissão de fé e com a própria autenticidade
da verdade histórica, pois distingue o que é factual, acontecido e interpretado quando essas três questões são expressões do
mesmo Jesus de Nazaré.

Saiba mais

Para ajudar no aprofundamento cristológico, podemos refletir sobre alguns trechos da Bíblia Sagrada: 1Cor 15, 2; 2Ts 2, 14s; Fl 4,
9; Cl 2, 6-9; Gl 1, 8-12; 2, 2s.

Temos a cristologia atual em diálogo crítico com a filosofia contemporânea, refletindo sobre a fé eclesial que perpassa o tempo. A
referência à vida histórica de Jesus nos é apresentada no Novo Testamento e da Igreja primitiva aos dias de hoje. É preciso
discernir a eclesialidade da fé na Igreja que antecede, alimenta e forma o cristão na vida comunitária, anunciando o conhecimento
próprio dos seguidores do Cristo.

A opção da Cristologia pelo Logos é expressão histórica de desenvolvimento e amadurecimento. Nele, temos tanto a
manifestação de Deus pela Palavra como sua permanência oculta. Em alcance universal (e não como divindade local), Deus se
manifesta como Ser supremo, presente no povo e conduzindo-o à sua realidade futura.

Comentário
No conceito cristão de Logos, encontramos a reflexão filosófica grega sobre o Ser, fundamento de todos os seres, tendo a origem
do pensamento e da liberdade em Jesus Cristo. O ser criado é racional, inteligente, livre e traz sentido em si. É aqui que temos
tanto a refutação do materialismo como do idealismo: a realidade não é uma consciência que tudo abrange, e sim uma Razão
Infinita, Absoluta, uma Pessoa – o Logos.

É por Ele que temos a configuração do cristianismo em síntese


entre fé, sentido e vida, alcançando força universal. Na
interpelação que faz à humanidade no “Escuta, ó Israel” (Dt 6,
4), tem a iniciativa de interpelar primeiro, ouvindo, invocado,
respondendo. Nessa centralidade, Jesus Cristo se legitima
como Filho de Deus na história.

O encontro entre o Deus da fé judaica e o deus ser dos


filósofos no Logos expressa sua comunicação com o ser
humano, revelando-se. Logos que se faz sax (carne) na
dinâmica entre fé e história. Não de modo restrito em um
historicismo, mas em base crítica e propriamente teológica,
salvaguardando a exegese bíblica e sua atualização, bem
como a fé cristã e sua eclesialidade expressa nos Concílios de
Niceia (325) e Calcedônia (451).

 O Juízo Final, de Michelangelo. (Fonte: Creative Lab / Shutterstock).

Atenção

É preciso ter o cuidado de não compreender a cristologia nem o cristianismo como uma questão de método, um sistema
metodológico. O centro é uma Pessoa, que podemos identificar como sendo o Crucificado, tendo a cruz como lugar de sua obra,
no ato de entrega com amor, como ser que procede do Pai doando-se plenamente por todos. Trata-se do Homem que se entrega
pela humanidade – a radicalidade humana, a filiação que inclui a divindade, um Deus que traz a presença humana em seu ser.

Dificuldades atuais da Cristologia

Dificuldades Internas
Distinção das naturezas de Jesus Cristo, ora valorizando sua condição humana, ora supervalorizando sua divindade. A
relação entre razão e Palavra, criação e Criador, não é evidente para muitos, não considerando a racionalidade própria do
nosso ser promovida pelo próprio Deus.
Assim, ficamos perplexos sobre o sentido, o fundamento das coisas, não centralizando o Logos como origem do mundo e
que ele é Pessoa, é Amor. Ao contrário, a não consideração da fé no estudo cristológico, supervalorizando a racionalidade,
priva a pessoa humana do sentido divino e da dimensão espiritual próprias do ser humano. Nessa polarização conflituosa,
a ética perde relevância na sociedade.
Dificuldades Externas
Diante da mudança cultural da qual participamos, de um mundo sendo construído em uma proposta de pós-verdade, a
inserção da fé em relação à Igreja torna-se um desafio na contemporaneidade.

 Pintura a óleo: Jesus com anjos. (Fonte: Gouache7 / Shutterstock).

A natureza humana e divina de Jesus

1
Jesus, Filho de Deus

Um conceito importante para entendermos as naturezas de Jesus é o termo:

“Filho de Deus”1
 
Tem sua origem na teologia da realeza do Antigo Também é próprio da teologia política de Roma3 .
Testamento própria do Oriente2 , no qual o rei é
declarado filho gerado por Deus. A questão está na Entre Israel e Roma, temos caminhos diferentes e

escolha divina, que cria um ser novo – o rei -, e não na independentes, em conotações históricas e teológicas,

geração. que vão se refletir na aspiração de poder universal dos


imperadores romanos – fundo da profissão de fé em
Assim, Israel é chamado de primogênito e filho amado Jesus.
de Deus (Ex 4, 22). Podemos identificar uma profissão
de esperança Naquele que viria um dia e que
corresponderia a todas as aspirações.

Os mitos pagãos que podemos encontrar justificavam comportamentos humanos e poderes políticos. Respondendo ao processo
histórico de enfrentamento da realidade e à instrumentalização da religião pelo poder político, eles encontraram um cristianismo
em expansão. A compreensão de Jesus como Filho de Deus traz esse entendimento e supera esses mitos no anúncio mais
íntimo do coração do próprio Jesus (Jr 4, 7).

2
Jesus, O Filho
A expressão O Filho apresenta um conceito diferente. Ela é
usada em círculos mais íntimos, com categoria linguística
própria, sendo codificada em parábolas. Remetida à tradição
dos profetas e mestres de sabedoria de Israel, não é ouvida na
pregação pública. Provavelmente remonta à vida de oração de
Jesus, em unidade com sua invocação pessoal de Deus:
“Abba” (Mc 14, 36; Mt 26, 39; Rm 8, 15; Gl 4, 6).

Portanto, não tem como objetivo ser exclusiva, e sim integrar


os seus na própria relação com o Pai, superando limite e
distância. O Filho apresenta-nos a autocompreensão que
Jesus tem de Si mesmo, bem como sua origem divina, missão
e sentido que daria à sua morte. Abrange toda sua realidade e
doutrina.

 The Savior Not Made by Hands, ícone de Novgorod. (Fonte: Wikipedia


<https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Christos_Acheiropoietos.jpg> ).

3
A Teologia da Cruz
Tem suas raízes nos escritos de Paulo, bem como no próprio
desenvolvimento da fé cristã das primeiras comunidades. É
enfatizada pela Reforma.

A força da relação entre Israel e o Império Romano dá à


reflexão sobre a cruz no início do cristianismo a afirmação e o
testemunho da Igreja primitiva.

Ela centraliza a ação de Deus na vitória


da morte e na ressurreição,
consagrando a esperança da
humanidade em Jesus4 .

 Cristo carregando a cruz, 1580, El Greco. (Fonte: The Metropolitan Museum of Art
<https://www.metmuseum.org/art/collection/search/459087> ).

4
A Teologia da Encarnação

É o segundo momento da comunidade cristã em sua reflexão sobre Jesus Cristo. É quando começa a buscar entender quem Ele
é, dirigindo-se à questão do Ser. De seu testemunho de entrega na cruz, de sua Palavra, vamos para o princípio, do Ser em êxodo
de Si, além de qualquer possibilidade que pudesse ser pensada, vindo ao encontro da humanidade na Encarnação.

Atenção
Estudar a cristologia considerando a Teologia da Encarnação é ter o Tratado da Graça sob uma atenção especial. Sendo a graça a
comunicação gratuita que Deus faz de Si ao elevar o ser humano, ela é apresentada de modo específico na união hipostática
(quando Deus se doa à humanidade, fazendo-se humano) como graça habitual (ou graça santificante, aperfeiçoando a
humanidade no tempo).

A doutrina do nascimento virginal5 de Jesus profetizada na


tradução grega de Isaías (Is 7, 14) precisa ser muito bem
considerada para não reduzir o mistério ao seu aspecto
biológico.

A questão não se inicia na pessoa de Maria – sem querer


desconsiderar sua importância e o seu “sim” -, e sim ter na
concepção de Jesus seu caráter ontológico.

O Ser divino, Filho do Pai (Hb 4, 15), é concebido pelo Espírito


Santo (Lc 1, 35) no seio da virgem Maria (Lc 1, 42). O
movimento descende de Deus e se realiza pela acolhida, pela
abertura de Maria ao dom apresentado (Lc 1, 38). Dessa
forma, a natureza expressa o que é realizado por meio
sobrenatural.

 (Fonte: ONEVECTOR / Shutterstock).

Na humanidade de Jesus Cristo, Deus que não só se compadece das fraquezas humanas
(Hb 4, 15-16) como as vive em Si, podendo então libertar o ser humano de seu coração
escravo e suscetível a deixar-se dominar (At 26, 18; Cl 2, 15; Hb 2, 14; 7, 25). Ao trazer a
humanidade para Si, o Filho sustenta o sim permanente ao Pai, sendo o sumo sacerdote que
se oferece para que, através Dele, todos possam de aproximar de Deus (Hb 2, 9-18; 5, 1-9; 7,
24-28; 10, 4-12).

Nesse encontro entre Deus e a humanidade na pessoa de Jesus Cristo, encontramos (Gruden, p. 445-447):

Sua obediência ao Pai (Rm 5, 18-19)

Seu sacrifício por nós (Hb 2, 16-17)


Sua mediação entre Deus e a humanidade (1Tm 2, 5)

O reinado sobre a criação (Mt 28, 18; Lc 19, 17; Hb 2, 8-9; Ef 1, 22; 1Cor 6, 3; Ap
3, 21)

A centralidade de vida (1Jo 2, 6; 3, 2-3; 2Cor 3, 18; 1Pd 2, 21; 3, 17-18; Hb 12, 2;
Fl 3, 10)

A referência do Corpo (1Cor 15, 42-44; Cl 1, 18)

Seu sofrimento oferecido como sumo sacerdote (Hb 2, 18; 4, 15-16)

 (Fonte: meunierd / Shutterstock).

O testemunho da Escritura sobre o Filho que se faz Homem

Vejamos o que nos é revelado sobre Jesus pela Sagrada Escritura:

Ele é de Nazaré (Jo 1, 46) e do Pai (1, 1) de modo próprio.

Temos narrações de sua infância em Mateus e Lucas, com citações do Antigo Testamento que confirmam o mistério:

Lc 1, 28ss e Sf 3, 14ss, Jz 5, 24 e Jt 13, 18s.


A intenção dos hagiógrafos é clara ao afirmar o início do novo Israel, como em:

Lc 1, 32-33, Gn 1, 2 e Sl 104 (103), 30.

Comentário

Podemos encontrar narrativas mitológicas de diferentes povos antigos que descrevem o nascimento milagroso de uma criança
salvadora. Considerando nosso conhecimento teológico, podemos dizer que a humanidade anseia tanto pela acolhida de uma
maternidade bondosa e madura quanto o que a alegria e a esperança que a criança representa. No fundo, grande parte dos
nossos problemas nos remete à necessidade de acolhimento e afeto que costumamos encontrar no colo de uma mãe amorosa.

A Encarnação do Verbo supera esses anseios. Aqui não é um deus que procria, em uma compreensão biológica, sexualizada,
como nas demais culturas de então e mesmo à moda de muitas compreensões atuais.

No Novo Testamento, temos a nova criação em uma Criança que é totalmente Deus e
totalmente homem. É nesse ponto que podemos situar a pureza da virgem e sua
completa abertura à realização divina.

Atenção

Estamos diante da eternidade de Deus que se insere no tempo e na pessoa humana, assumindo a humanidade, sem deixar de ser
Deus. É algo que faz parte do próprio Ser, do prolongamento do diálogo do “Sou Eu”, com toda a radicalidade que o Filho envolve.
Não é um simples nascimento, e sim o auge da misericórdia divina em que Deus se dá no ser humano como outro ser humano,
precisando ser acolhido como dom e graça.

Na Encarnação, Deus não se restringe ao mundo dos espíritos. Ele age no nosso mundo e, em Maria, age sob o mesmo Espírito
criador que pairava sobre as águas no princípio, fazendo-se carne.

Em uma atualidade que se preocupa com o fazer e o ter, em um vazio existencial que envolve a mulher de modo especial, quando
ainda temos permanências de culturas que afetam sua dignidade, a Encarnação nos apresenta a humanidade que aguarda e
recebe Deus como Dom que se faz imagem em Jesus Cristo, tornando-se acessível a todos nós.

Nos evangelhos sinóticos, a percepção da natureza humana de Jesus é testemunhada por aqueles que O acompanharam. João,
no entanto, já inicia com:

“Deus se fez carne” (1, 1).



Não há contradição entre um homem que é Deus ou um Deus
que se faz homem: são perspectivas que ajudam a
compreender melhor quem é Jesus Cristo.

Vejamos a seguir um resumo dos quatro evangelhos e de outros livros do Novo Testamento:

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Marcos 

Simples e objetivo, o evangelista destaca a humanidade de Jesus em sua tristeza (3, 5; 8, 12), na ternura com as crianças (9,
36; 10, 16), em sua raiva com os vendilhões do templo (11, 15s), no sofrimento físico e espiritual (14, 32-42), entre diversas
outras situações. Ele é o Filho do homem. Expressão semita encontrada em Ez 5, 1; 6, 2; 7, 2; 12, 2; 13, 2, além do uso com
sentido messiânico em Dn 7, 13s. Nela, Marcos destaca o perdão dos pecados como Deus que perdoa (2, 10), o ser Senhor
do sábado (2, 28) e Aquele que vai consumar a história (13, 26; 14, 62).

Comentário

Verdadeiro homem, Filho do Homem, que veio para julgar o mundo (Is 52, 13 – 53, 12), anunciando e
aguardando que o homem livremente responda. Em Marcos, temos o chamado segredo messiânico, pois ele
não diz que Jesus é o Messias, mas o que quer silêncio na cura (1, 44; 3, 11-12; 5, 43; 7, 36; 8, 26-29), pois revela-
se discretamente, no ordinário e de modo paulatino, aos discípulos (4, 11; 9, 9). Escrito para os pagãos, Jesus é
o Filho de Deus (15, 39).

Mateus 

Escrito para os judeus, Mateus destaca Jesus em sua majestade, o que veio para cumprir as promessas, Filho de Deus vivo.
Senhor e Mestre (26, 25.49), é o que, na tradição judaica, encontra-se entre a divindade do messias e a humanidade do
Mestre. É o filho de Davi, filho de Abraão (15, 22; 20, 30-31; 21, 9), ao qual devemos nos prostrar.

Lucas 

A cristologia de Lucas é mais desenvolvida e sistematizada. Com vocabulário próprio e estilo mais apurado, apresenta Jesus
como o Salvador, o Senhor, o Cristo, Filho de Deus. Aborda temas centrais da Boa Nova, tendo a salvação que chega ao
mundo para todos, de alcance universal e misericordioso.

João 

Para João, o evangelho é o anúncio que Jesus é Deus, o Logos, que, pela Encarnação, revela o Pai e o Espírito. Salvador, Ele é
o que vence o mau.
Escritos Paulinos 

Paulo apresenta Jesus como o Senhor, desenvolvendo os temas da sua Preexistência, Encarnação e glória. Ele é o Cristo
Cabeça, o Salvador, que veio para justificar a pessoa humana pela fé, pela graça, e não pela lei. Sua compreensão é próxima
à de João, revelando o plano divino de modo inimaginável. Assumindo nossa condição humana, rebaixa-se como um de nós
e, indo ao Pai, leva a humanidade em si, deixando sua condição divina conosco. É o Novo Adão.

Hebreus 

Aqui temos a exortação aos sacerdotes de que Jesus Cristo é o Sumo Sacerdote perfeito (9, 1-28), Aquele que oferece um
sacrifício único e é reconciliador da humanidade com Deus pela sua obediência, extinguindo a antiga Lei.

Apocalipse 

Aqui temos a apresentação de Jesus como o Senhor da História, o Todo Poderoso, o Rei dos Reis, que está voltando (Ap 1,
13; 19, 8-9).

Se Jesus tivesse sido apenas uma figura humana, teria sido uma lembrança da história. Ao ser Deus e assumir realmente a
humanidade, Ele participa, como homem, tanto da eternidade como revela-se capaz de abarcar todos os tempos, sendo presente
em nosso meio hoje.

Inserindo-se na história pela Encarnação, vence o abismo entre o eterno e o temporal, entre o visível e o invisível.

ELE É DEUS:
tira o véu que nos separa e dá-se a conhecer,
entregando-se à contemplação, ao toque das mãos,
tornando-se alcançável.
A humanidade de Jesus O deixa tão perto de nós que podemos tanto acolhê-lo no colo quanto flagelá-lo como Deus que se revela
e se oculta totalmente. O escândalo da cruz que parece contradizer todas as promessas anteriores e até sua divindade é o
mesmo que revela a profundidade com a qual se entrega a nós, em nós, por nós, que exige que enfrentemos em seu rosto
desconfigurado a própria desconfiguração causada pelo fechamento a Deus.

A cristologia, portanto, não nos apresenta um cristianismo facilmente alcançável, que não incomoda e que pode ser reduzido a
um conjunto de regras morais ou encontrado em qualquer tempo e em qualquer cultura, esvaziado de sua realidade salvífica. A
cristologia nos questiona diariamente sobre quem é Jesus Cristo e sobre nosso próprio ser revelado nele.

 (Fonte: Sogno Lucido / Shutterstock).

Atividade
O método histórico é muito difundido nos estudos exegéticos e um dos principais instrumentos de pesquisa. O caminho de
distinguir o Jesus da fé e o Jesus da história situa um Jesus distinto do que nos é apresentado pela Igreja Primitiva.

Marque a opção que contenha as frases que são coerentes com o Logos e aceitas como ponto de partida para os estudos
cristológicos:

1. primeiro o evangelho foi pregado, depois que ele foi escrito.


2. o evangelho foi escrito, enquanto as experiências com Jesus aconteciam.
3. a escrita do evangelho é um processo de significação do que foi vivido.
4. o evangelho é ordenado considerando a comunidade a qual é dirigido.
5. as comunidades eram autônomas para escrever sua experiência evangélica.
6. o evangelho são biografias de Jesus para entender melhor sua vida.
7. diversas fontes confirmam a historicidade dos fatos evangélicos.
8. a memória é o mais importante na redação dos evangelhos.

a) 1, 3, 4 e 7
b) 1, 2, 6 e 8
c) 2, 3, 4 e 8
d) 3, 4 e 6
e) 5, 7 e 8

2. O perfil cultural em que vivemos é de crescente materialidade, dificultando a profissão pública da fé. Reflita sobre a questão e
identifique três atuações que você pode assumir para associar seus estudos cristológicos com a vivência da fé no mundo.

3. Relacione figuras de Jesus nos escritos neotestamentários:

-- Salvador
1. Marcos
-- Preexistência
2. Mateus

3. Lucas -- Senhor da História

4. João -- Filho do homem

5. Paulo -- Sumo Sacerdote

6. Hebreus
-- Filho de Davi
7. Apocalipse
-- Logos

Notas

Filho de Deus 1

Não há essa expressão no Novo Testamento com o objetivo de designar homens divinos, como em outras culturas antigas da
época cristã. Culturas com as quais ainda temos diferenças linguísticas e de conteúdo.

Oriente 2

É interpretada por Israel como expressão de escolha (Sl 2, 7) e inserida no cerimonial de entronização.

Roma 3

Cidade pode ser identificada como o lugar em que surge a designação no Novo Testamento.

Jesus 4
Aqui temos Jesus como o Rei que serve até o fim. A Ressurreição é a superação da morte, o sustento de acreditar quando tudo
parece dizer o contrário. A cruz interpela o seu caráter secular e presente, não sendo compatível com a fuga de Deus, em
processo de descontinuidade entre Adão e Jesus (Segundo Adão), rumo a uma nova criação.

Virginal 5

O termo almah, do hebraico, que designa moça solteira, é usado em Gn 24, 43 para virgindade (na cultura hebraica, não há outra
Referências
consideração para a jovem que não casou) e é traduzido para pathenos na Septuaginta: virgem.

CHESTERTON, G. K. O homem eterno. São Paulo: Ecclesiae, 2014.

GRUDEM, W. Teologia sistemática. 2. ed. São Paulo: Vida Nova, 2017.

HACKMANN, G. L. B. Jesus Cristo, nosso redentor: iniciação à cristologia como soteriologia. Porto Alegre: EdiPUCRS, 1999.

LADARIA, L. F. Introdução à antropologia teológica. 7. ed. São Paulo: Loyola, 2014.

MARTINS. J. G. (Org.). Teologia sistemática. Curitiba: Intersaberes, 2015.

RATZINGER, J. Introdução ao Cristianismo. 8. ed. São Paulo: Loyola, 2015.

RUBIO, A. G. O encontro com Jesus Cristo vivo: um ensaio de cristologia para nossos dias. 11. ed. São Paulo: Paulinas, 2007.

TILLICH, P. Teologia sistemática. São Leopoldo: Sinodal, 2005.

VON BALTHASAR, H. Teologia da história: um ensaio. Lisboa: Universidade Católica, 2010.

Próxima aula

Controvérsias cristológicas;

Comunhão trinitária;

Profissão de fé nos credos.

Explore mais

O homem eterno <https://portalconservador.com/livros/G-K-Chesterton-O-Homem-Eterno.pdf> . Chesterton faz uma leitura


própria de Jesus Cristo, com observações amplas e pessoais que giram em torno de Sua pessoa segundo uma perspectiva
instigante. Sua mente brilhante indica que vale a pena pelo menos folhear sua obra;

Teologia da história – um ensaio


<//www.uceditora.ucp.pt/resources/Documentos/UCEditora/Indices/Teologia%20Historia%20II.pdf> . Vejamos nestas
páginas da obra de Hans Urs von Balthasar a centralidade de Cristo como aquilo que dá sentido ao tempo histórico e ordena
esse tempo a Ele.

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