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10/09/2023, 14:50 Jesus Cristo: Deus e homem - Teologia Brasileira

Jesus Cristo: Deus e homem


7 de agosto de 2018

A relevância da cristologia cl ssica para a América latina

Na apresentação de seu recente trabalho Jesus through the Centuries (“Jesus através do Séculos”), o erudito
Jaroslav Pelikan escreveu: “Jesus de Nazaré tem sido a figura dominante na história da cultura ocidental por
quase vinte séculos… E ao seu nascimento que a maior parte da humanidade vincula o calendário. Em seu nome
milhões blasfemam. E em seu nome milhões oram.”1 Com cerca de 1,8 bilhão de adeptos (sejam nominais ou
praticantes), o cristianismo é a religião mais universal da história humana. Tradicionalmente, o núcleo da fé
cristã localiza-se na confissão de que o homem Jesus Cristo é o Filho unigênito de Deus. Tal afirmação
caracterizou o catolicismo romano exportado por Colombo para o Novo Mundo há 500 anos. E hoje uma
renovada convicção dessa verdade marca o despertamento evangélico em grande parte da América Latina.

Nos últimos anos, contudo, tanto na Ibero-América como em outros lugares, o conceito clássico a respeito de
Jesus foi ofuscado por releituras experimentais, filosóficas, ideológicas e nacionalistas tanto de sua pessoa
quanto de sua missão.2 É verdade que novas perspectivas a respeito de Jesus Cristo podem enriquecer nossa
compreensão da plenitude da revelação de Deus em Cristo. Nosso entendimento do Salvador tem de ser
contextualizado à nossa cultura e personalizado em nossa própria vida. No entanto, a declaração de José
Ramón Guerrero de que “todo homem e toda geração deve experimentar, descobrir e compor seu próprio
evangelho sobre Jesus”3 é tão falsa quanto verdadeira. As bases fundamentais da teologia cristã – e mais
especificamente da Cristologia – não são relativas. A confissão evangélica sola Scriptura exige que nossa
estrutura cristológica e nossas mais profundas convicções a respeito de Cristo sejam fundamentadas na
revelação proposicional da Bíblia. São as Escrituras que estabelecem a verdade e o erro no que concerne a
Jesus Cristo. São elas que separam o provável do improvável em nossa teologia, e o espiritualmente autêntico
da autodecepção em nossa experiência.

Em sua filosofia editorial, Vox Scripturae abre a participação para uma pluralidade de perspectivas doutrinárias.
Todavia, essas perspectivas devem honrar os limites da estrutura clássica que foi desenvolvida nos números
anteriores.4 (1) a autoridade e inerrância da Escritura; (2) a primazia hermenêutica do método histórico-
gramatical; e (3) o aspecto normativo da Bíblia em relação a toda verdade e prática cristã. Juntamente a essas
três afirmações concernentes às Escrituras, a revista adota uma quarta posição doutrinária: Jesus Cristo é o
Deus-homem, manifestando duas naturezas distintas em uma única pessoa. Assim, ele é singular; o eixo entre
Deus e o homem, sendo ao mesmo tempo nosso perfeito exemplo humano e nosso Senhor divino.5

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A presente discussão concentra-se nas duas naturezas de Jesus Cristo, o que já é o tópico de centenas de
obras teológicas.6 Em primeiro lugar, nosso propósito é pesquisar a evidência bíblica e o processo histórico que
culminou na Definição de Calcedônia (451 A.D.), o padrão da Cristologia clássica. Em segundo lugar,
compararemos o modelo de Calcedônia com algumas Cristologias latino-americanas selecionadas, tanto
tradicionais quanto liberacionistas. Nas observações finais, queremos indicar a relevância vital da Cristologia
clássica para a cristandade na América Latina.

QUEM É JESUS CRISTO? CRISTOLOGIA CLÁSSICA


A encarnação do Verbo, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, tem sido um dos mistérios mais complexos
da revelação bíblica, mas, simultaneamente, tem sido a glória e a fascinação do cristianismo. Quem é esse bebê
nascido em Belém, mas também preexistente (Mq 5.2; Mt 2.2-7)? Quem é esse menino humano que será
chamado “Deus forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz” (Is 9.6)? Ao sondar as declarações da Bíblia, a igreja
primitiva e os teólogos dos primeiros quatro séculos foram confrontados com uma dimensão desconhecida à
mente humana: Como é que Jesus Cristo pode ser ao mesmo tempo homem e Deus?7

A DIVINDADE DE CRISTO

Evidência Bíblica
De um lado, os primeiros cristãos viram as múltiplas evidências da divindade de Jesus. Conforme o evangelista
João, num contexto estritamente monoteísta, Jesus se proclamou igual ao Pai: “Eu e o Pai somos um” (Jo
10.30) e “antes que Abraão existisse, Eu Sou” (Jo 8.58; cf. Êx 3.14, LXX). Por outro lado, o próprio Jesus se
declarou distinto do Pai (Mt 28.19), como pessoa separada. Os testemunhos dos escritores neotestamentários
destacam a mesma posição: “O Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus” (Jo 1.1); “o Deus unigênito” (1.14);
“nele habita corporalmente toda plenitude da divindade” (Cl 2.9); ele é “a expressão exata” do Ser divino (Hb 1.3),
cujo trono “é para todo o sempre” (1.8). Contudo, as evidências indiretas deste “Deus incógnito” (frase de Seren
Kierkegaard) são até mais fortes, porque a Jesus foram atribuídos preexistência eterna (Mq 5.2; Jo 17.5; Cl 1.16-
17), onipresença (Mt 18.20; 28.20), onipotência (Mt 28.18; Hb 1.3) e imutabilidade (Hb 13.8). O Novo Testamento
revela que o Deus Filho criou todas as coisas e sustenta o universo (Jo 1.3; Cl 1.16-17; Hb 1.2); que Jesus foi
concebido pelo Espírito Santo e nasceu de uma virgem (Mt 1.18-25; Lc 1.35); que ele perdoa os pecados (Lc
7.48); que tem em si o poder da ressurreição (Jo 20.28); e que, às vezes, até demonstrou autoridade sobre o
Espírito Santo – em certo sentido, ele era o Senhor do Espírito, junto ao Pai (Jo 15.26; 16.7-11).8

Desenvolvimento Histórico
Embora a igreja primitiva abrigasse diversas interpretações da pessoa de Jesus, vários líderes da corrente
principal definiram uma posição bíblica equilibrada. Irineu, Bispo de Lyon, declarou, em cerca de 180 A.D., que o
Filho “sempre coexistiu com o Pai desde o princípio” e que “Deus [Pai] sempre tem com Ele seu Verbo e a sua
Sabedoria, o Filho e o Espírito”.9 Em Adversus Praxean (c. 210), Tertuliano escreveu: “o Pai é Deus, o Filho é Deus
e o Espírito Santo é Deus, e cada um é Deus”.10 E de novo:

CREMOS EM UM SÓ DEUS, MAS… ESTE UM SÓ DEUS TAMBÉM TEM UM


FILHO, SEU LOGOS, QUE PROVÉM [PROCESSERIT] DE SI MESMO… ELE
FOI ENVIADO DO PAI DENTRO DA VIRGEM E NASCIDO DELA, HOMEM E
DEUS, FILHO DO HOMEM E FILHO DE DEUS, E CHAMADO JESUS
CRISTO… TODOS [PAI E FILHO] SÃO DE UM, ISTO É, PELA UNIDADE DA
SUA SUBSTÂNCIA QUE, AO MESMO TEMPO EM QUE O MISTÉRIO DA
ECONOMIA DIVINA DEVE SER PROTEGIDO, DA UNIDADE FAZ UMA
TRINDADE, COLOCANDO OS TRÊS EM ORDEM, NÃO DE QUALIDADE MAS,
SIM, DE SEQUÊNCIA, CONTUDO DE UMA QUALIDADE E DE UM PODER,
POIS TODAS AS FASES, OS ASPECTOS E AS MANIFESTAÇÕES SÃO DO
ÚNICO DEUS, NO NOME DO PAI E DO FILHO E DO ESPÍRITO SANTO. 11

Mais tarde, houve conflito sobre a hermenêutica e o método teológico para determinar a divindade de Cristo. Em
Alexandria, influenciados pela filosofia neo-platônica, Clemente e Orígenes popularizaram a hermenêutica

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espiritual ou alegórica que concebe o significado objetivo do texto bíblico apenas como sombra da verdadeira
realidade transcendente. Assim, a revelação escriturística jamais seria verdade objetiva. A verdade sempre fica
além das palavras do texto sagrado, ou seja, em última análise, é intuitiva e subjetiva.12 Logo depois, rejeitando
explicitamente a hermenêutica espiritual, Alexandre, bispo de Alexandria, e seu sucessor Atanásio voltaram a
insistir num objetivismo textual que se aproximava da hermenêutica histórico-gramatical de hoje. Foi justamente
essa reafirmação da revelação proposicional que estabeleceu o fundamento dos credos e das doutrinas
principais da fé cristã histórica.13 Atanásio reconheceu que, sem objetivismo textual, seria simplesmente
impossível chegar a uma doutrina absoluta e universal. Foi a partir dessa hermenêutica objetivista que o
primeiro concílio ecumênico da Igreja em 325 elaborou o Credo de Niceia, a confissão de que Jesus Cristo é
plenamente Deus, o Deus Filho da Santa Trindade.

CREMOS EM UM DEUS, PAI TODO-PODEROSO, CRIADOR DE TODAS AS


COISAS VISÍVEIS E INVISÍVEIS. E EM UM SENHOR, JESUS CRISTO, O
FILHO DE DEUS; GERADO COMO O UNIGÊNITO DO PAI, ISTO É, DA
SUBSTÂNCIA DO PAI, DEUS DE DEUS, LUZ DE LUZ; DEUS VERDADEIRO DE
DEUS VERDADEIRO; GERADO, NÃO FEITO; CONSUBSTANCIAL COM O PAI;
MEDIANTE O QUAL TODAS AS COISAS FORAM FEITAS, TANTO AS QUE
ESTÃO NOS CÉUS COMO AS QUE ESTÃO NA TERRA; O QUAL PARA NÓS
HUMANOS E PARA NOSSA SALVAÇÃO DESCEU E SE FEZ CARNE, SE FEZ
HOMEM, E SOFREU, E RESSUSCITOU AO TERCEIRO DIA, E VIRÁ PARA
JULGAR OS VIVOS E OS MORTOS. E NO ESPÍRITO SANTO. AOS QUE
DIZEM, POIS, QUE HOUVE [SIC.] QUANDO O FILHO DE DEUS NÃO
EXISTIA, OU QUE FOI FORMADO DE OUTRA SUBSTÂNCIA OU ESSÊNCIA,
OU QUE É UMA CRIATURA, OU QUE É MUTÁVEL OU VARIÁVEL, A ESTES A
IGREJA CATÓLICA [UNIVERSAL] ANATEMATIZA. 14

No pensamento dos pais de Niceia e de todo o século IV, assim como hoje, a questão fundamental é se a
verdade (i.e., a revelação divina nas palavras da Bíblia) é, em última análise, “de cima para baixo”, objetiva e
suficientemente reconhecível, ou se ela se reduz meramente à subjetividade da percepção humana, seja dos
autores originais ou dos intérpretes das Escrituras.15 Com a afirmação da doutrina da Santa Trindade,
reafirmada e aprofundada nos concílios e credos posteriores (apesar das oscilações políticas provocadas pelo
arianismo), a questão da divindade de Jesus Cristo foi resolvida: o Filho é Deus da mesma essência do Pai, mas
simultaneamente distinto do Pai como Pessoa, sendo eternamente gerado pelo Pai.16

SUA HUMANIDADE E A SÍNTESE DO HUMANO-DIVINO

Evidência Bíblica
Grande parte dos pais da igreja primitiva reconheceu que a divindade do Salvador de Belém não impedia a
realidade da sua humanidade: seu nascimento através da jovem Maria, em condições humildes (Mt 1.18s.; etc.);
a aprendizagem durante seu período de sua imaturidade física, enquanto criança (Lc 2.40); o dilema real diante
das tentações humanas (Lc 4.1-11; Hb 4.15); a necessidade, às vezes bem visível, de comida e descanso (Jo
4.6-8; 19.28); a intensidade de suas emoções humanas (Mc 6.34; Lc 22.15, 44; Jo 11.35); as contendas em
situações difíceis e opressivas (Mt 12.1-14, 22s.; 23.1-39; Lc 20.19-47; Jo 11.47-57); e o seu sofrimento horrível
na crucificação. Lembramos da sua infância dificultada pelo exílio e pela necessidade de se esconder (Mt 2.12-
23); a juventude provavelmente (a partir de algum ponto) sem pai, sendo assim o responsável pela família com
pelo menos quatro irmãos e duas irmãs (Mc 6.3; Mt 13.55-56); o jejum e a provação no deserto (Mt 4.1-11; Lc
4.1-13); e a rejeição e abandono que sofreu da parte de quase todos os seus discípulos na hora da traição e
crucificação (Mt 26.56, 69-75; Mc 14.50-51; 15.40). Hebreus 2.10 diz que Jesus foi aperfeiçoado “por meio de
sofrimentos”, para se qualificar humanamente para ser o sacrifício e o sumo sacerdote final. Evidentemente, a
sua luta para se submeter à vontade de Deus não era mais fácil do que para os outros. O Novo Testamento
indica que suas tentações ultrapassaram a agonia emocional que nós temos, pois quem, em toda história

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humana, tem suado “como gotas de sangue” (Lc 22.44) por obedecer a Deus? Jesus tomou a nossa
humanidade, engolindo (na analogia de Emil Brunner) todo o cálice amargo da vida, inclusive as borras.

Mais ainda, nem a sua divindade nem a sua perfeição humana impediram a atuação do Espírito Santo sobre sua
vida e ministério. Geralmente, vemos Jesus como alguém inteiramente submisso ao Espírito, o Messias que
seria ungido e receberia poderes por meio do ruach de Deus (Is 11.2; Mt 3.13; 4.11; 12.18s.; At 10.38). Mas,
paradoxalmente, às vezes Jesus Cristo é visto como “o Senhor do Espírito”, com autoridade para enviar e batizar
as pessoas com o outro Paracletos (Mt 3.11, 16; Jo 4.10-14; 14.16, 26; 15.26; 16.7-15; etc.) Se, às vezes, sua
própria divindade é evidenciada em sua relação com o Espírito, Jesus nos mostra muito mais que, mesmo na
sua humanidade perfeita, dependia do Espírito Santo.

Síntese da Evidência Bíblica


O gráfico a seguir mostra os textos principais que apoiam esses três aspectos da vida terrestre de Jesus: (1)
sua natureza divina; (2) sua natureza humana; e (3) seu relacionamento com o Espírito Santo – tanto sua
submissão ao Espírito, quanto sua autoridade sobre o Espírito. Embora alguns autores bíblicos enfatizem mais
um aspecto do que outro, vemos um padrão equilibrado e claro.

Ainda que uma fórmula cristológica não se apresente de forma clara na Bíblia, um modelo global surge das
passagens que apresentam o Redentor. Alguns autores bíblicos dão ênfase à unção do Espírito (os salmistas,
Isaías, Mateus), outros à profundidade da luta humana de Jesus (Hebreus, Lucas) e outros à sua divindade
absoluta (João, Paulo). Mas o testemunho total manifesta simetria. Como disse Benjamin Breckinridge Warfield:

ESSAS MANIFESTAÇÕES DE UMA CONSCIÊNCIA TANTO HUMANA


COMO DIVINA SIMPLESMENTE FICAM LADO A LADO NAS
DECLARAÇÕES DA AUTOEXPRESSÃO DO NOSSO SENHOR. NENHUMA É
SUPRIMIDA OU MESMO LIMITADA PELA OUTRA. SE OBSERVÁSSEMOS
SÓ UM GRUPO DE DECLARAÇÕES, PODERÍAMOS SUPOR QUE ELE SE
PROCLAMAVA INTEIRAMENTE DIVINO; SE SÓ O OUTRO GRUPO,
PODERÍAMOS IGUALMENTE IMAGINAR QUE ELE SE APRESENTAVA
COMO ALGUÉM INTEIRAMENTE HUMANO. COM AMBOS OS LADOS
JUNTOS DIANTE DE NÓS, PERCEBEMOS QUE FALA ALTERNADAMENTE
DE UMA CONSCIÊNCIA DIVINA E DE UMA CONSCIÊNCIA HUMANA;
MANIFESTA-SE COMO TUDO QUE DEUS É, E TUDO QUE O HOMEM É;
MAS COM UMA UNIDADE DE CONSCIÊNCIA MUITO NOTÁVEL. ELE, O
ÚNICO JESUS CRISTO, ERA NA SUA PRÓPRIA COMPREENSÃO O
VERDADEIRO DEUS E O HOMEM COMPLETO NUMA VIDA UNIDA E
PESSOAL. 17

A partir da evidência bíblica, concluímos o seguinte: (a) sobre a divindade de Jesus Cristo: não podemos insistir
que a natureza divina foi sempre suprimida em seu ministério público. Sua autoridade inata e filiação eterna é,
frequentemente, o ponto principal dos evangelistas. As palavras de Jesus sobre a presença do Espírito e sobre a
sua submissão ao Pai não negam a atividade de sua natureza divina. Jesus agiu como Deus. (b) Mas, como
visto acima, a divindade de Cristo não negava a completa e profunda realidade de sua humanidade, excluindo o
pecado. Ele foi à nossa frente como nosso irmão na carne, como primogênito dentre os mortos, como sumo
sacerdote dos santos. Muito mais do que Paulo, João ou Maria, o próprio Jesus Cristo é o nosso supremo
exemplo humano. (c) Portanto, nem a divindade do Senhor nem a sua perfeição humana dispensavam a
presença do Espírito Santo em sua vida diária.

Conclusão Histórica
Desde o começo, a maioria dos pais da igreja reconhecia as duas naturezas de Cristo, ainda que não houvesse
uma definição clara. São típicas as palavras de Melito de Sardis, bispo do segundo século, em Na Páscoa:
“Aquele que nasceu como Filho, foi conduzido ao matadouro como um cordeiro, sacrificado como uma ovelha,

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sepultado como homem, ressuscitou dentre os mortos como Deus, uma vez que ele é por natureza Deus e
homem”.18 O próprio Credo de Niceia declara que o Deus Filho “se fez carne, se fez homem”. Tais citações dos
primeiros séculos, no entanto, não implicam em que o entendimento das duas naturezas de Cristo não fosse às
vezes ameaçado ou que a unidade da pessoa de Cristo tenha sido sempre compreendida.

AT Mateus Marcos Lucas João Atos & Hebreus


Messias Epístolas
O Filho de Sl 2.7 1.18, 20-23 1.8 1.35 1.1-3 At 20.28 1.1-12
Deus: 45.6-7 3.11, 16 2.8 3.15-17 1.14, 18 Rm 5.9 5.5
Natureza 110.1 7.29 3.22 5.17 1.33s Ef 1.3-14 13.8
Divina Is 9.6 8.2, 17, 29 5.30 6.19 8.58 Fl 2.5-11
44.6 9.1, 27 8.46 10.30 Cl 1.15-18
48.16 11.27 22.70 14.6, 16 2.9
Mq 5.2 16.16 17.5 Ap 22.13
Zc 12.10 18.20 20.28 etc.
28.17-20
Varão 2Sm 7.2 1.18-25 10.17s 1.36 1.14 At 2.22s 2.16-18
Perfeito: Is 9.6-7 19.17 13.32 2.40, 52 5.19, 30 10.42 3.1-6
Natureza 11.1-3 24.36 14.38 18.18s 6.38 Rm 1.1-4 4.15s.
Humana 53.1s 26.36-38 22.41-44 8.28s 8.3; 9.5 5.1-10
61.1s 27.46, 50 23.46 14.10 Gl 3.16; 4.4 6.20
etc. Fl 2.5-7 7.26, 28
1Jo 1.1-4 etc.
O Ungido Sl 45.7 1.18s †1.8 1.35 1.32 †At 1.5 1.9
pelo Espírito Is 11.2 †3.11-16 1.10, 12 †3.16 †1.33 †2.33 9.14
[†autoridade 42.1-4 4.1 3.22s, 30 4.1, 14 3.34 4.27s
sobre o 61.1-3 12.18-21 4.18-21 6.27 10.38
Espírito] 12.28-32 10.21 †7.38-39
11.20 †14.16s., 26
†15.26
†16.7-15
†20.22

Depois que a absoluta deidade de Cristo foi afirmada em Niceia, surgiram diversas tentativas sub-bíblicas de
resolver como Jesus, sendo Deus, podia ser também homem. Apolinário postulava que apenas a alma superior
de Jesus (mente e sentimentos nobres) era divina e, na verdade, apenas suas emoções inferiores e apetites
eram humanos. Em contraste, conforme as acusações históricas, Nestório insistiu na plenitude das naturezas
divina e humana a ponto de se dizer que ele criara duas pessoas em um só corpo, uma espécie de Dr. Jekyll e
Mr. Hyde (médico e monstro numa pessoa) oscilando entre deidade e humanidade. Em compensação, Eutiques
fundiu as duas naturezas de Cristo a ponto de misturar suas diferenças, fazendo o divino tornar-se humano e o
humano divino. Pelo menos, as diferenças concernentes à natureza humana de Cristo serviam para focalizar as
questões e estimular a igreja a encontrar soluções mais profundas a partir da Bíblia.19

Partindo do mesmo método teológico e hermenêutico objetivista de Niceia,20 o Concílio de Calcedônia,


finalmente definiu o relacionamento das duas naturezas, ou seja, a estrutura da Cristologia. Sem destruir o
mistério da Pessoa, o Definitio Fidei concluiu que Jesus Cristo é simultânea e completamente Deus e homem
unidos numa só pessoa:

FIÉIS AOS SANTOS PADRES, TODOS NÓS, PERFEITAMENTE UNÂNIMES,


ENSINAMOS QUE SE DEVE CONFESSAR UM SÓ E MESMO FILHO, NOSSO
SENHOR JESUS CRISTO, PERFEITO QUANTO À DIVINDADE, E PERFEITO
QUANTO À HUMANIDADE, VERDADEIRAMENTE DEUS E
VERDADEIRAMENTE HOMEM, CONSTANDO DE ALMA RACIONAL E DE
CORPO; CONSUBSTANCIAL, SEGUNDO A DIVINDADE, E
CONSUBSTANCIAL A NÓS, SEGUNDO A HUMANIDADE; EM TODAS AS
COISAS SEMELHANTE A NÓS, EXCETUANDO O PECADO, GERADO
SEGUNDO A DIVINDADE ANTES DOS SÉCULOS PELO PAI E, SEGUNDO A
HUMANIDADE, POR NÓS E PARA NOSSA SALVAÇÃO, GERADO DA
VIRGEM MARIA, MÃE DE DEUS;

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UM SÓ E MESMO CRISTO, FILHO, SENHOR, UNIGÊNITO, QUE SE DEVE


CONFESSAR, EM DUAS NATUREZAS, INCONFUNDÍVEIS E IMUTÁVEIS,
INSEPARÁVEIS E INDIVISÍVEIS; A DISTINÇÃO DE NATUREZAS DE MODO
ALGUM É ANULADA PELA UNIÃO, MAS, PELO CONTRÁRIO, AS
PROPRIEDADES DE CADA NATUREZA PERMANECEM INTACTAS,
CONCORRENDO PARA FORMAR UMA SÓ PESSOA E SUBSISTÊNCIA; NÃO
DIVIDIDO OU SEPARADO EM DUAS PESSOAS. MAS UM SÓ E MESMO
FILHO UNIGÊNITO, DEUS VERBO, JESUS CRISTO SENHOR; CONFORME
OS PROFETAS OUTRORA A SEU RESPEITO TESTEMUNHARAM, E O
MESMO JESUS CRISTO NOS ENSINOU E O CREDO DOS PADRES NOS
TRANSMITIU. 21

O Salvador, então, é visto como consubstancial com Deus na sua natureza divina e consubstancial conosco na
sua natureza humana.22 No entendimento dos antigos pais, é justamente essa união hipostática das duas
naturezas de Cristo que possibilita a salvação do ser humano. Ecoando Atanásio, Gregório de Nazianzo
enfatizou que “o que não é assumido não é curado”. Como evangélicos, diríamos hoje que os reformadores
esclareceram ainda melhor o relacionamento entre as duas naturezas e a nossa salvação: porque Jesus Cristo é
Deus e homem, por intermédio da cruz, ele é capaz e digno de ser o substituto completo do homem e o
pagamento infinito de Deus.

Enfim, quaisquer que sejam as tradições teológicas, historicamente, a Cristologia de Calcedônia tem sido o
divisor de águas entre o verdadeiro e o falso cristianismo. Conforme elaborada e discutida em profundidade por
Anselmo de Cantuária, Martinho Lutero, João Calvino, Karl Barth, Piet Schoonenberg, teólogos da libertação e
centenas de outros, a Definição de Calcedônia – embora vista como obsoleta por muitos – continua sendo o
modelo clássico para Cristologia, porque procura ser fiel às Escrituras.

A CRISTOLOGIA NA AMÉRICA LATINA


O prolongado esforço da igreja primitiva para estabelecer a estrutura da Cristologia bíblica nem sempre foi
apreciado pelos adeptos do nome de Jesus. Seitas como as Testemunhas de Jeová, os Mórmons e os
Pentecostais Unidos (“só Jesus”) são consideradas estranhas à fé cristã por causa de sua visão heterodoxa de
Deus e Cristo. O liberalismo teológico moderno, a partir de Friedrich Schleiermacher – prosseguindo com
Albrecht Ritschl, David Strauss, Adolf von Harnack, Rudolph Bultmann, Paul Tillich, Hans Kung, Norman Pittinger,
John Hick e muitos outros – é rejeitado pelo cristianismo clássico pela mesma razão: deixaram de afirmar as
duas naturezas de Jesus Cristo ou, quando o fazem, as definições das naturezas desviam-se marcantemente da
compreensão calcedônica.

Na América Latina, existem dezenas de abordagens parciais de Cristologia, seja a partir do aspecto humano de
Cristo, da contextualização da sua ética sócio-política ou das discussões cristológicas europeias. Entre as
Cristologias mais completas, parece que Segundo Galileia, José Comblin e Jon Sobrino posicionam-se, como
seria de se esperar, dentro do entendimento clássico de Calcedônia.23 Não obstante, dois outros teólogos de
destaque, Leonardo Boff e Juan Luis Segundo, embora professem a Definição de Calcedônia, propõem
alterações significativas no entendimento de Jesus Cristo – aspecto este que logo será demonstrado. Antes,
porém, de observar algumas Cristologias não-clássicas da América Latina, é importante compreender alguns
desvios práticos de uma Cristologia historicamente genuína.

ABERRAÇÕES PRÁTICAS
Na América Latina, seja entre os católicos ou os evangélicos, a Cristologia calcedônica não tem sido
propriamente negada, mas desequilibrada pela ênfase exagerada em uma natureza, em prejuízo da outra.

O Jesus Divino: Menos que Humano


Catolicismo Romano. Apesar dos antigos concílios que afirmaram sua plena humanidade, na prática histórica
da Igreja, Jesus Cristo logo foi elevado a um nível supra-humano, distante da nossa realidade. Ele foi

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devidamente adorado como Deus, mas não foi seguido como homem e como modelo de obediência humana.
David Steinmetz capta a evolução do pensamento católico popular:

JESUS CRISTO ERA O DEUS-HOMEM. ELE FOI PERFEITAMENTE


OBEDIENTE À VONTADE DE DEUS. MAS, NESSA OBEDIÊNCIA, ELE TEVE
VANTAGEM SOBRE HOMENS E MULHERES NORMAIS. ELE PODIA
OBEDECER NO PODER DA SUA NATUREZA DIVINA. NÃO TEMOS ESSA
VANTAGEM. QUANDO SOMOS TENTADOS, NÃO POSSUÍMOS UMA
NATUREZA DIVINA PARA NOS CAPACITAR PARA A OBEDIÊNCIA. COMO É
QUE JESUS, ENTÃO, PODE REALMENTE ENTENDER AS TENTAÇÕES QUE
SOBREVÊM AOS HOMENS E MULHERES NORMAIS? COMO É QUE ELE
PODE SE COMPADECER DELES? MARIA, POR OUTRO LADO, ERA
TOTALMENTE HUMANA. ORIGINALMENTE, CHAMAR MARIA DE PESSOA
“PURA” SIMPLESMENTE INDICAVA QUE ELA ESTAVA LIVRE DA MANCHA
DO PECADO. MAS ISSO ACUMULOU UM NOVO SIGNIFICADO. CHAMAR
MARIA DE SER HUMANO PURO QUERIA DIZER QUE ELA ERA UM SER
HUMANO REAL. ELA OBEDECEU E AGRADOU A DEUS SEM POSSUIR UMA
NATUREZA DIVINA. ELA É COMO VOCÊ E EU. ENTÃO ELA PODE
COMPADECER-SE DE NÓS NO MEIO DOS NOSSOS PECADOS E
TENTAÇÕES. UMA PESSOA PODE ORAR À MARIA DE TODA COMPAIXÃO.
ELA ORARÁ AO SEU FILHO. E O SEU FILHO REALMENTE NÃO PODE
REJEITAR OS PEDIDOS DA SUA MÃE. 24

Em grande parte da cristandade – apesar das declarações doutrinárias – Jesus tornou-se tão singularmente
divino que não era mais verdadeiramente humano. Especialmente na América Latina católica, como escreveu J.
A. MacKay em 1932, Jesus Cristo passou “a ser visto como um ser puramente sobrenatural, cuja humanidade,
sendo apenas aparente, tem pouca contribuição ética para nossa vivência”.25 Quanto mais Jesus era adorado
como Deus, tanto mais se esvaziava o significado dessa própria divindade. No início dos anos 70, uma pesquisa
feita no Brasil por Hubert Lepargneur demonstrou que o catolicismo popular não possui quase nenhuma
compreensão bíblica de Jesus. Visto como uma figura nebulosa posicionada entre Deus e os santos, Jesus é
alguém menos poderoso (e menos importante) do que o Deus Pai, “a Mãe de Deus” e o próprio Satanás! – e, de
novo, menos relevante do que o panteão de santos, onipresente na religião popular.26 Para milhões de latino-
americanos, então, o significado bíblico da natureza divina de Cristo é tão distante e insignificante quanto a ideia
de sua natureza humana. Que ele é, em teoria, Deus Filho, sim. Jesus Cristo, porém, perde a relevância na prática
popular da Igreja – especialmente como homem, mas até mesmo como Deus.

Evangelicalismo. Embora na Reforma, Cristo tenha sido restaurado à posição de sumo sacerdote dos crentes,
para a maioria dos protestantes ele continua sendo algo menos do que nosso exemplo humano. Dos
reformadores, foi Lutero quem mais sublinhou a humanidade completa do Salvador: “Só se pode pensar
corretamente sobre a unidade Deus-homem em Jesus Cristo quando se começa com sua humanidade”27 e,
outra vez, “Quanto mais profundamente pudermos trazê-lo à carne – jamais seremos capazes de fazê-lo o
suficiente – melhor!”28 Até agora, poucos evangélicos, seja da América Latina, seja de qualquer herança cultural,
seguiram a ênfase de Lutero. Diante do ônus bíblico de pregar e de defender a divindade de Cristo em um
mundo cada vez mais cético, talvez não seja surpreendente que haja uma preocupação quase exclusiva com a
divindade do Salvador. Como consequência, porém, o Salvador é adorado, mas não é imitado. Nesse desejo de
defender a deidade de Jesus, às vezes existem razões mais sutis para que prefiramos a divindade exaltada de
Hebreus 1 à intensa humanidade de Cristo de Hebreus 2. Em vez de exaltar a Virgem Maria e os antigos santos,
os evangélicos tendem a venerar pregadores, super-pastores e televangelistas. Proclamamos que a vida cristã –
“cheia do Espírito” – traz-nos as bênçãos de felicidade emocional, estabilidade financeira, bem-estar familiar e
sucesso profissional – a despeito do exemplo do próprio Jesus que adoramos. Pois, enquanto os benefícios
humanos do evangelho são muitos, o Redentor repetidamente nos indica que devemos deixá-los, para seguir a
via dolorosa da cruz – e isto, não de forma passiva, mas deliberada, dando-nos uns aos outros em amor e em

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obediência ao Senhor. A vantagem de manter Jesus divino é que, assim, ao contrário dos apóstolos do Novo
Testamento, podemos seguir outros exemplos mais confortáveis.

O Jesus Humano: Menos que Divino


Catolicismo Romano Tradicional. Enquanto uma imagem ibérica de Jesus é a da divindade exaltada além dos
céus, um outro quadro ainda mais embutido na complicada consciência religiosa latino-americana é o do Jesus
humano impotente. Entre o bebê Jesus sossegado nos braços de sua mãe Maria e o Jesus agonizante do
crucifixo, quase nada da vida do Salvador é reconhecido como essencial e relevante para o viver diário.29 Hugo
Assman comenta: “Os Cristos dolorosos da América Latina, dos quais a imagem central é o crucifixo, são os
Cristos da impotência – uma impotência interiorizada pelos oprimidos. [É] Derrota, sacrifício, dor, cruz”.30 Anton
Wessels comenta: “Testemunhos atuais extraídos do catolicismo popular brasileiro mostram que a fé em Jesus
não é experimentada como um desafio; não é uma fé transformadora de corações e mentes, produzindo
esperança e regozijo, antes é uma espécie de repetição mística da própria tristeza e da existência
transtornada”.31 Sem ressurreição, o Cristo popular da América Latina sacraliza o sofrimento e deixa o povo sem
recursos para uma vitória espiritual e material. Identificar-se com a humanidade de Jesus significa, na realidade,
submeter-se passivamente à desumanidade e injustiça do mundo à sua volta.

Cristolagia liberacionista. Depreciando o Jesus anêmico e irrelevante da religião popular, e destacando as


implicações da encarnação do CELAM II (Medellín, 1968), E. F. Pironio e outros insistiram na necessidade de um
“Cristo vivo”, uma visão renovada da praticabilidade social da humanidade de Jesus.32 Logo, na década de 70, o
novo Jesus libertador foi apresentado como um ideólogo sócio-político – e um pouco mais. O teólogo cubano
Adolfo Ham Reyes expressa a perspectiva militante da humanidade de Cristo:

JESUS CRISTO É O TRABALHADOR, O POBRE, O IRMÃO MAIS VELHO,


QUE FOI INJUSTIÇADO PELO STATUS QUO QUE SE LHE OPÔS ATRAVÉS
DE UMA CONSPIRAÇÃO QUE UNIFICOU A RELIGIÃO COM OS
REPRESENTANTES DOS INVASORES IMPERIALISTAS DE ROMA… ASSIM
COMO JESUS CRISTO SE TORNOU INTEIRAMENTE ENCARNADO NO
MUNDO DO SEU TEMPO, … ASSIM TAMBÉM NÓS TEMOS QUE NOS
ENCARNAR NA NOSSA SOCIEDADE. JESUS CRISTO É NOSSO
COMPANHEIRO NA LUTA, ELE É O “CRISTO GUERRILHEIRO” PELO POVO
NA BATALHA REVOLUCIONÁRIA. E, PARA NÓS, ELE É O “CRISTO
REVOLUCIONÁRIO”, MEMBRO ANÔNIMO DO PARTIDO COMUNISTA… 33

Ainda outra perspectiva da humanidade de Jesus é a visão pacifista do argentino Adolfo Pérez Esquivel,
ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 1980. Durante o seu encarceramento político, Pérez Esquivel sonhou que
viu Cristo vestido com um poncho, morrendo na cruz: “Daquele momento em diante, ele [Cristo] nunca me
abandonou e, depois de eu ter sido liberto da Prisão de La Plata, me dispus a pintar esse Cristo com o poncho.
Ele é o Cristo dos pobres”.34 De uma maneira ou outra, o Jesus humano – alguém que fez a “opção galileia” 35 de
obscuridade e aflição – veio personificar a esperança e a salvação do povo latino-americano em sua pobreza,
alienação e opressão sócio-política. Contudo, se a natureza divina raramente foi negada, do mesmo modo, ela
raramente foi afirmada – muito menos conforme o Definitio Fidei de Calcedônia. De modo geral, na década de
70, a Cristologia clássica foi interpretada como imperialista e opressiva, certamente nada relevante à péssima
condição do “povão” da América hispânica.

Junto com as Cristologias mais globais de Leonardo Boff, Jon Sobrino e Juan Luis Segundo, havia tratados
menos conhecidos ou parciais de diversos setores: Maximino Arias-Reyero, José Cárdenas Paliares, Hugo
Echegaray, Antonio Francisco Falconi, Benedito Ferraro, José Ramón Guerrero, M. P. Lacerda, Carlos Mesters,
José Porfírio Miranda, Carlos Palacio, José Augusto Fontes Rico, R. Richard Shaull, João Evangelista Martins
Terra e outros.36 Vale a pena notar que a maioria dos estudos cristológicos na América Latina foram escritos por
eruditos católicos doutorados na Europa. De certo, boa parte dessas Cristologias foram elaboradas tendo como
base (e em relação com) as teologias primeiro-mundistas de Bultmann, Schnackenburg, Hahn, Cullmann,
Jeremias, Rahner, Pannenberg, Moltmann, Kasper, E. Schweitzer e uma pletora de outras. No entanto, também

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houve várias novas contribuições positivas, das quais talvez a mais iluminadora seja a de Jon Sobrino, ao
afirmar que a verdadeira Cristologia se faz, não através de estudos abstratos, mas por meio da obediência em
seguir a Jesus.37 Depois da proliferação da Cristologia criativa na década de 70, os anos 80 mostram uma
disposição de equilibrar histórica e biblicamente o que já foi dito. Também observamos que, desde o início da
teologia da libertação, os protestantes da América Latina – com sua atenção mais no campo da hermenêutica –
não produziram nenhuma obra de grande porte sobre Jesus Cristo, seja clássica ou liberacionista.38

ABERRAÇÕES TEOLÓGICAS
Até agora, três liberacionistas destacaram-se mundialmente por seus tratados cristológicos. Embora tivesse
oferecido uma valorosa contribuição existencialista ao método cristológico, diante das críticas cristológicas do
Papa João Paulo II na inauguração de CELAM III (Puebla, 1979)39 o jesuíta basco Jon Sobrino reconheceu
certos exageros em sua teologia e voltou a rearticular a plena divindade de Cristo.40 Nosso resumido estudo,
então, focaliza dois Cristologistas oriundos do hemisfério sul: o brasileiro Leonardo Boff e o uruguaio Juan Luis
Segundo.41 Ambos procuram novas compreensões de Cristo, embora os resultados sejam extremamente
diferentes. Os dois também reivindicam vínculo com a Definição de Calcedônia, embora nenhuma das duas
teologias caiba no círculo da Cristologia clássica.

Leonardo Boff: União Hipostática Universal


O homem Jesus encarnou o Logos. Ao longo das duas décadas da teologia da libertação, parece que Boff tem
mantido seu lugar (eclipsado só um pouco por Sobrino) como o principal pensador e inovador cristológico da
América Latina. Em essência, Boff adotou e estendeu o conceito da “Cristologia (ou antropologia)
transcendente” de Karl Rahner (e em parte de Pierre Teilhard de Chardin)42 de que em Jesus descobrimos a
abertura de Deus para o homem e a verdadeira estrutura “crística” do homem e do universo.43 Por meio de
Jesus, entendemos “também nosso próprio mistério”:44 que existe um profundo interrelacionamento ontológico
(ou estrutural) entre o Criador e a criação. A essência da ideia é que o Nazareno foi nosso exemplo humano ao
se abrir para Deus e deixar Deus se encarnar nele.

QUANTO MAIS JESUS ESTAVA EM DEUS, MAIS DEUS ESTAVA NELE.


QUANTO MAIS O HOMEM-JESUS ESTAVA EM DEUS, MAIS SE
DIVINIZAVA. QUANTO MAIS DEUS ESTAVA EM JESUS, MAIS SE
HUMANIZAVA. ORA, JESUS-HOMEM ESTAVA DE TAL FORMA EM DEUS,
QUE SE IDENTIFICOU COM ELE. DEUS ESTAVA DE TAL FORMA EM
JESUS-HOMEM, QUE SE IDENTIFICOU COM ELE: DEUS SE FEZ HOMEM
PARA QUE O HOMEM SE TORNASSE DEUS. 45

União hipostática universal. Dessa forma, em vez de negar a divindade e a humanidade de Jesus Cristo, Boff
universaliza a união hipostática com Deus. Assim como Jesus, nós também podemos encarnar Deus. O
exemplo mais claro disso, afirma Boff, é Maria. Assim como Jesus encarnou o Verbo de Deus em união
hipostática, Maria também encarnou hipostaticamente o Espírito Santo.46 Logo, temos as “duas mãos”,
masculina e feminina, de Deus encarnadas na raça humana através dos dois arquétipos: Jesus e Maria. Diz Boff
numa passagem famosa:

O DIVINIZADOR DO MASCULINO (E FEMININO) FOI O VERBO; O


DIVINIZADOR DO FEMININO (E DO MASCULINO) É O ESPÍRITO SANTO. O
PARALELISMO CRISTO-ADÃO, MARIA-EVA ENCONTRA AQUI O SEU
PERFEITO EQUILÍBRIO. MARIA NÃO SE ENCONTRA ABAIXO DE JESUS,
MAS AO LADO DELE: JUNTOS TRADUZEM DE FORMA ABSOLUTA O QUE
SIGNIFICA A HUMANIDADE SER IMAGEM DE DEUS. 47

No livro A Trindade, a sociedade e a libertação (1986), Boff desenvolve essa ideia de que o Verbo e o Espírito
Santo “entram hipostaticamente em relação conosco”,48 assim atualizando, através de Jesus e Maria, o processo
da divinização da raça humana: “Jesus e Maria representariam toda a humanidade já assumida, dentro do

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tempo, beata antecipação do evento escatológico da plena divinização dos varões e das mulheres no Reino de
Deus”.49 Embora as duas Pessoas divinas se encarnem em qualquer pessoa aberta para Deus (não importa a
crença ou religião), Boff sugere que o Logos manifesta-se mais nos elementos masculinos e o Espírito mais nos
femininos. Cada pessoa pode tornar-se Jesus e Maria, talvez não na intensidade da experiência divinizadora,
mas certamente seguindo o mesmo padrão, que indica ainda mais um passo.

“Panteísmo cristão”. Essa estrutura crística de duas naturezas se estende a toda criação, vista agora nos
elementos dos sacramentos (e.g., a missa) mas para se realizar no sentido absoluto em toda existência no
escaton. Para Boff, esse é o grande projeto cósmico de Deus, sinalizado na encarnação: “A Trindade na criação
visa inserir a criação na Trindade” e “O universo em Deus trino será o corpo da Trindade, no qual resplandece, na
forma limitada da criação, a plenitude da comunhão dos divinos Três”.50 Haverá no porvir o “Ponto Ômega” de
Teilhard de Chardin, uma completa integração do Deus trinitário infinito com o cosmos que ele criou. Enfim, a
Trindade entrará em imanência total e eterna com o universo – um tipo de panenteísmo hegeliano escatológico.

Boff e a Definição de Calcedônia. A genialidade de Boff na síntese de várias ideias modernas é evidente.
Entretanto, para os evangélicos que insistem na Sola Scriptura, as ideias soam estranhas. Em outros lugares,
Boff, convicto da evolução progressista da revelação, já exprimiu desprezo para com uma hermenêutica
histórico-gramatical da Bíblia.51 Ademais, mostra-se hostil a qualquer doutrina substitutiva do valor da morte de
Cristo na cruz.52 Questionamos, aqui, se sua Cristologia pode ser classificada como bíblica e clássica, conforme
o Definitio Fidei de Calcedônia.

Semelhantemente a Rahner, Boff apresenta várias Cristologias. Ele não quer negar explicitamente a Cristologia
clássica de Calcedônia, mas igualmente não tem muito interesse em seguir aquela linha. Então, no lado católico
tradicional, Boff diz que Jesus Cristo é o único Deus Filho preexistente que deve ser adorado. Por outro lado, ele
afirma que Jesus era um homem igual a todos nós, que se abriu para Deus de tal maneira que Deus
gradualmente se encarnou nele, sendo o primeiro numa longa fila de encarnações. Nessa Cristologia, vemos
que Jesus é o protótipo da união hipostática, único (talvez) em qualidade, mas nada diferente de nós em seu
próprio ser. Ou seja, Jesus é o Primogênito, mas dificilmente o Unigênito; é nosso exemplo de união hipostática,
mas não o nosso Senhor Deus em si. O fato de Boff dizer que o Jesus humano revelou tão bem a estrutura
crística que ele deve ser Deus preexistente não resolve a tensão. Enfim, Boff apresenta pelo menos duas
Cristologias contraditórias:54 uma pertence à teologia clássica cristã; e a outra, que é totalmente dominante em
sua teologia, universaliza a união hipostática para toda a criação – e, assim, está longe da alta Cristologia das
Sagradas Escrituras.

Juan Luis Segundo: Duas Naturezas em Uma Só


Embora catorze anos mais velho do que Boff, o jesuíta uruguaio Segundo55 entrou no campo da Cristologia
apenas em 1982 com O homem de hoje diante de Jesus de Nazaré.56 Em contraste com Boff, que escreveu vários
livros cristológicos ao longo de um período de quinze anos, Segundo quase nem tocou no tema da Cristologia
até essa enorme obra de 1.393 páginas (na edição em espanhol) – que, mais tarde, ele mesmo admitiu ter sido
tão “confusa que gostaria de reescrever numa forma mais organizada e clara”.57 O homem de hoje é um tipo de
apologética filosófica visando o ateísta hodierno. Neste livro, Segundo revoluciona por meio da hermenêutica a
maneira de ver o significado do Nazareno. Para J. L. Segundo, Jesus é o revelador dos verdadeiros valores
humanos.

Ideologia como base da interpretação cristológica. Em Fé e ideologia (Tomo I), Segundo desenvolve o tema do
livro anterior, Libertação da teologia (edição espanhola, 1974), em que a ideologia é a “chave hermenêutica” para
a fé cristã. A fé em si é um fenômeno universal, já que todo homem pressupõe uma “estrutura de valores” que
determina a ética de sua vida. Essa fé não visa um conteúdo religioso (ou bíblico), mas apenas escolhe modelos
de ética ou de valores. A melhor “estrutura de valores”, conforme Segundo, é a que descobrimos no Jesus
histórico que, devido à sua ideologia política do reino de Deus (justiça e amor), morreu como mártir. Assim, a
declaração cristã de que “Jesus é Deus” significa que adotamos como nossos seus valores humanitários,
considerando-os superiores. Quem assume os valores de Jesus deveria desenvolvê-los dentro da sua própria
ideologia de vida. Assim, o ateu que assume os valores humanistas de Jesus já é cristão na essência de sua
fé.58

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As “chaves hermenêuticas” históricas. Esse vínculo entre fé e ideologia serve como o fundamento de um novo
entendimento da fé cristã, uma metacristologia (ou, em suas palavras, uma “anticristologia”)59 que abandona os
debates doutrinários. No Tomo 2, Segundo distingue quatro chaves hermenêuticas exemplares de Cristologia:
Nos sinóticos (II/1a), Jesus foi interpretado como um político, fiel às suas convicções éticas até o fim, na cruz.
Na Epístola aos Romanos 1-8 (II/1b), afirma Segundo, o Apóstolo Paulo interpretou Jesus criativamente, pela
chave humanista (existencialista) – uma Cristologia tão diferente dos sinóticos que só pode ser justificada por
meio de grande liberdade metodológica. Na história pós-bíblica, Inácio de Loyola (II:2a) interpretou Jesus como
o supremo exemplo das disciplinas espirituais. Para uma Cristologia atualizada (II/2b), Segundo propõe que o
homem moderno compreenda Jesus Cristo como a força cósmica de ética e de esperança dentro das
categorias do humanismo e da evolução (via Teilhard de Chardin). Insistindo que cada autor das Cristologias
históricas reinterpretou livremente o significado de Jesus dentro de sua ideologia, Segundo sugere que nós,
também, devemos exercitar essa mesma liberdade.

J. L. Segundo e o “Definitio Fidei” de Calcedônia. Enquanto em Teología abierta para el laico adulto (ed. espanhola
1970) Segundo elaborou o significado social do trinitarianismo,60 em O homem de hoje a questão de Deus
simplesmente não tem resposta: Deus é o Mistério Absoluto, de quem (ou do que) é impossível falar. Nesse
contexto, é difícil imaginar como Segundo pode afirmar a Definição de Calcedônia, mas ele dedica quase 50
páginas à sua explicação.61 Embora discorde da linguagem do Concílio, Segundo afirma que sua própria
interpretação das “duas naturezas” é de fato verdadeira: Jesus é homem e Deus, mas já que a natureza de Deus
é um mistério absoluto, a natureza divina de Jesus só pode ser conhecida através da sua natureza humana (ou
seja, por características humanas). Em “Disquisición sobre el misterio absoluto”, Segundo volta a se defender:

EM EFEITO, CALCEDÔNIA, POR NEGAR QUALQUER MISTURA OU


CONFUSÃO, ENCERRA UM PONTO IMPORTANTE NO CONCEITO DO
DIVINO: A EXPERIÊNCIA… SE AS NATUREZAS NUNCA SE MISTURAM,
ENTÃO O QUE A EXPERIÊNCIA PERCEBEU EM JESUS FOI SOMENTE O
HUMANO. ESTA CONCLUSÃO, APARENTEMENTE TÃO SIMPLES, NÃO FOI
SACADA. A IDEIA QUE SE TEM DE JESUS AINDA HOJE, NÃO É A QUE
SURGE DE CALCEDÔNIA, SENÃO A QUE CALCEDÔNIA CONDENA: A DE
UM SEMIDEUS. PENSAMOS (ERRADAMENTE) QUE EM JESUS, O
CONHECIMENTO HUMANO SE MISTURA COM O CONHECIMENTO
DIVINO… 62

Assim, Segundo diz que afirma o Definitio Fidei mas, de facto, o nega, esvaziando o conteúdo da natureza divina
até não passar da humana. Ao contrário de toda teologia clássica, ele ignora a revelação bíblica que define
muito bem as características divinas (santidade, justiça, misericórdia, onipotência, etc.) Para Segundo, elas não
passam de interpretações fenomenológicas e ideológicas dos autores. Logo, qualquer palavra sobre uma
natureza divina torna-se absurda – incluindo sua própria defesa, ao afirmar que suas ideias concordam com o
intento de Calcedônia. Por fim, a singularidade e o valor intrínseco de Jesus Cristo são postos em dúvida, tanto
no nível clássico de Redentor e Expiador dos pecados do homem, como no fato de ser Filho unigênito de Deus.
Apesar das suas intenções positivas de atrair a comunidade ateísta, o relativismo filosófico-ético de Segundo
como fundamento da fé cristã deixa-nos com uma salvação por nossos esforços éticos, uma filiação sem
conhecimento do Deus Pai e uma fé sem qualquer conteúdo dogmático.

Resumindo, então, vimos que Leonardo Boff universaliza as duas naturezas de Cristo para todos os que se
abrem ao infinito – tendo, em Maria, o coexemplo feminino. O propósito e o fim de toda criação é que Deus se
encarne hipostaticamente nela. Por outro lado, a metacristologia filosófica de Segundo volta-se, não para a
pessoa de Jesus Cristo, mas para sua ética. Na elaboração das “chaves hermenêuticas”, existe pouca proteção
contra interpretações de Jesus que são meramente arbitrárias. E a colocação de que a divindade do Salvador
não vai além da sua humanidade leva o leitor, na prática, a um agnosticismo real. Embora existam observações
penetrantes e edificantes nos escritos dos dois teólogos (especialmente de Boff), diante do Definitio Fidei e o
cristianismo clássico, as duas Cristologias se mostram heterodoxas e deficientes – longe da resposta
neotestamentária da fé viva e transformadora.

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CONCLUSÃO: RUMO À CRISTOLOGIA LATINO-AMERICANA


Se uma Cristologia latino-americana não é uma Cristologia universal e eterna, não tem base suficiente para
transformar uma vida, muito menos uma sociedade. E se a Cristologia universal não se baseia na Palavra
escriturística, então não passa de algo subjetivo e passageiro. Temos visto que o Definitio Fidei do Concílio de
Calcedônia apresenta, se não inteiramente, pelo menos corretamente, o testemunho bíblico sobre Jesus Cristo,
o Deus-homem, confessado por todo o cristianismo clássico (incluindo centenas de milhões de seguidores de
hoje): “Um só e mesmo Cristo, Filho, Senhor, Unigênito, que se deve confessar, em duas naturezas,
inconfundíveis e imutáveis, conseparáveis e indivisíveis…” A teologia clássica concluiu que, sem a encarnação, o
homem Jesus de Nazaré não teria existido. Foi a natureza divina (o Logos) que assumiu uma natureza (e não
uma pessoa) humana.63 Assim, Jesus Cristo é Deus feito carne no nosso meio. Mas sendo completamente
homem, Jesus é também o nosso irmão, exemplo, primogênito, substituto e rei.

No dia a dia, como devemos agir diante do mistério da encarnação? Primeiro, como os magos, devemos dobrar
nossos joelhos e adorá-lo. Jesus Cristo é o ícone vivo de Deus (Cl 1.15). Ele é eternamente divino, manifestando
a graça e a verdade da Santa Trindade a nós (Jo 1.14). O Brasil e a América Latina que, no anseio de utopias
milenistas, transformam os candidatos políticos em messias, precisam do verdadeiro Deus-homem, o único
fidedigno. Somente através dEle entramos no verdadeiro Reino de Deus.

Segundo, Jesus não somente revela quem é Deus, mas também revela o que é o homem. Na sua natureza
humana, Jesus nos mostra como viver. Devemos nos dar em amor aos outros (Lc 10.25-37). Devemos lutar para
sermos obedientes a Deus até à morte (Fl 2.8). E, muito mais do que Jesus, precisamos da presença do Espírito
Santo nas nossas vidas (Jo 3.5; 7.37-39) para fazer a vontade de Deus. Ainda que estejamos cheios do Espírito,
a vida nem sempre será de alegria, paz e boa saúde. Os resultados da queda atingem a todos, e a batalha
interior para nos submetermos ao Espírito continuará de algum modo, até estarmos com ele. Uma Cristologia
contextualizada nos convoca a uma vida realista, que nos engaje em um mundo necessitado, sem deixar de
reconhecer que talvez não sejamos nós que transformaremos esta terra, nem nossa cultura, mas que devemos
tentar, sendo obedientes e diligentes no poder do Espírito Santo.

Terceiro, porque Jesus Cristo é Deus e homem, a sua encarnação e, especialmente, a sua morte na cruz têm
valor infinito para todos os que nele creem. Por meio da fé nele, podemos ter perdão para os nossos pecados e
plena comunhão com o Deus Altíssimo. O poder motivador de uma transformação social não vem
principalmente de fora, mas sim de dentro de cada ser humano, quando é remido por Jesus Cristo e habitado
pelo Espírito Santo de Deus. Afinal, sem essa Cristologia – a fé do cristianismo clássico – simplesmente não há
esperança.

_________________________
1
Jaroslav Pelikan, Jesus through the Centuries: His Place in the History of Culture (New Haven, CT: Univ. de Vale,
1985) 1.
2 Veja Associação dos Seminários Teológico Evangélicos, ed., Quem é Jesus Cristo no Brasil? (São Paulo:
ASTE/Imprensa Metodista, 1974); Claus Bussmann, Befreiung durch Jesus? Die Christologie der
lateinamerikanischen Befreiungstheologie (München: Kösel-Verlag, 1980); Equipo Seladoc, ed., Cristologia en
América Latina (Salamanca: Sígueme, 1984), vol. 6 em Panorama de la teologia latinoamericana; José Míguez
Bonino, ed., Jesús: Ni vencido ni monarca celestial: Imagens de Jesucristo en América Latina (Buenos Aires:
Tierra Nueva, 1977); Emilio A. Núñez C., El Cristo de Hispanoamérica (Puebla: Las Américas, 1979); Maria Isaura
Pereira de Queiroz, Images Messianiques du Brésil (Cuernavaca: CIDOC, 1972); R. Richard Shaull, Jesús en
América Latina (Santander: Sal Terrae, 1982); M. M. Thomas, Risking Christ for Christ’s Sake: Towards an
Ecumenical Theology of Pluralism (Genebra: Concílio Mundial das Igrejas, 1987); Anton Wessels, Images of
Jesus: How Jesus is Perceived and Portrayed in Non-European Cultures, trad. do holandês por John Vriend (Grand
Rapids, MI: Eerdmans, 1990).
3 José Ramón Guerrero, El otro Jesús (Salamanca: Sígueme, 1976) 15.
4 Veja Richard J. Sturz, “A palavra que prende e liberta”, VS 1:1 (março de 1991) 3-10; Russell P. Shedd,
“Hermenêutica bíblica”, VS 1:2 (setembro de 1991) 3-11; e Estevan F. Kirschner, “O papel normativo das
Escrituras”, VS 2:1 (março de 1992) 2-13.
5 Conforme a declaração de fé da Vox Scripturae, “Jesus Cristo, Deus-Homem, é a revelação final das Escrituras, e
toda interpretação das mesmas gira em torno de sua vida, ensino, morte, ressurreição e volta”. Doutrinas ilativas

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incluem a natureza trinitária de Deus e a expiação substitutiva.


6
Além dos outros citados na monografia, sugerem-se os seguintes livros sobre Cristologia: Joseph de Baciocchi,
Jesus Cristo nos debates dos homens, trad. por Euclides Carneiro da Silva (São Paulo: Paulinas, 1977); D. M.
Baillie, Deus estava em Cristo, trad. por Jaci Correia Maraschin (2ª ed., Rio de Janeiro: JUERP/ASTE, 1983); G. C.
Berkouwer, A pessoa de Cristo, trad. por A. Zimmerman e P. G. Hollanders (São Paulo: ASTE, 1964); Otto
Borchert, O Jesus Histórico, trad. por Adiei Almeida de Oliveira (São Paulo: Vida Nova, 1985); Christian Duquoc,
Cristologia: Ensaio dogmático, 2 vols., trad. por Atico Fassini (São Paulo: Loyola, 1980); Joseph A. Fitzmyer, A
Christological Catechism: New Testament Answers (New York: Paulist, 1982); Domenico Grasso, O problema de
Cristo, trad. s.n. (São Paulo: Loyola, 1967); Martin Hengel, Der Sohn Gottes, Die Enstehung der Christologie und
die judisch-hellenistische Religionsgeschichte (Tubingen: J. C. B. Mohr, 1975); Walter Kasper, Jesus der Christus
(Mainz: Matthias-Grunewald-Verlag, 1974); I. Howard Marshall, The Origins of New Testament Christology
(Downers Grove, IL: InterVarsity, 1976); Jürgen Moltmann, Der gekreuzigte Gott (2a ed., München: Christian
Kaiser, 1973); C. F. D. Moule, The Origin of Christology (Cambridge: Univ. de Cambridge, 1977); Josh McDowell e
Bart Larson, Jesus: Uma defesa bíblica da sua divindade, trad. por Neyd V. Siqueira (São Paulo: Candeia, 1990);
Wolfhart Pannenberg, Grundzuge der Christologie (Gutersloh: Gutersloher Verlagshaus Gerd Mohn, 1964);
Bernard L. Ramm, An Evangelical Christology: Ecumenic and Historic (Nashville: Thomas Nelson, 1985); Mário
Serenthà, Jesus Cristo ontem, hoje e sempre. Ensaio de cristologia, trad. por Isabel Fontes Leal Ferreira (São
Paulo: Salesiana Dom Bosco, 1986); João Evangelista Martins Terra, O Jesus histórico e o Cristo querigmático
(São Paulo: Loyola, 1977); e David F. Wells, The Person of Christ: A Biblical and Historical Analysis of the
Incarnation (Westchester, IL: Crossway, 1984).
7
Algumas partes deste ensaio bíblico já foram apresentadas em J. Seoll Horrell, “O significado do Natal”,
Reconciliação, 11 (dezembro de 1985) 2.
8
Antes de fechar o breve resumo da evidência bíblica da divindade de Cristo, observamos que os oponentes
frequentemente citam dois títulos como “provas” de que o Filho é apenas uma criação ou semideus do Deus
Altíssimo: (1) 7 vezes no NT Jesus é chamado o “primogênito” (gr. protótokos), i.e.: de Maria (Mt 1.25; Lc 2.7),
“entre muitos irmãos” (Rm 8.29), “de toda a criação” (Cl 1.15), “de entre os mortos” (Cl 1.18), “dos mortos” (Ap
1.5) e sem qualificação (Hb 1.6). A ideia tinha dois significados comuns, seja no hebraico ou no grego, sendo (a)
o primeiro nascido no sentido físico-cronológico, ou (b) uma posição jurídica como o herdeiro principal (cf. Dt
21.16-17; Sl 89.27). À luz das evidências da divindade de Cristo, o segundo significado era entendido pela igreja
primitiva: Jesus Cristo é o herdeiro principal da igreja e de toda criação. O problema é que hoje a palavra
“primogênito” geralmente não carrega o segundo significado, deixando confusas as pessoas. (2) Em Ap 3.14,
Jesus Cristo se chama “o princípio [gr. arshë] da criação de Deus”. A palavra arshë, no gr. clássico,
frequentemente é traduzida como “a primeira causa, origem, fonte; autoridade; soberano”. Assim, Jesus é o
princípio no sentido de originador e fonte da criação (veja Jo 1.3 e Cl 1.16-17).
9Irineu, Adversus Haereses, II, 30 e IV, 20.1, em Michael O’Carroll, Trinitas: A Theological Encyclopedia of the Holy
Trinity (Wilmington, DE: Michael Glaziar, 1987) 137.
10
Tertuliano, Adversus Praxean, 13, em ibid., 208-209.
11 Ibid., 2 (itálico do articulista), em ibid., 208.
12 Veja Berthold Altaner e Alfred Stuiber, Patrologia: Vida, obras e doutrina dos padres da Igreja, trad. por Monjas
Beneditinas (2a ed., São Paulo: Paulinas, 1988) 211-212.
13 Veja T. F. Torrance, Theology in Reconciliation (London: Geoffrey Chapman, 1975), “Athanasius: A Study in the
Foundations of Classical Theology”, 215-266; Ralph E. Person, The Mode of Theological Decision Making al the
Early Ecumenical Councils: An Inquiry into the Function of Scripture and Tradition al the Councils of Nicaea and
Ephesus (Basiléia: Friedrich Reinhardt, 1978) esp. 175-183; e Craig A. Blaising “Chalcedon and Christology: A
1530th Anniversary”, Bibliotheca Sacra 138:552 (out.-dez. 1981) 326-337.
14 “O Credo de Nicéia”, em Justo L. Gonzalez, História Ilustrada do Cristianismo, 10 vols., trad. por Key Yuasa, Hans
Udo Fuchs, et. al. (São Paulo: Vida Nova, 1980- ) 2:97.
15
A hermenêutica objetiva é rejeitada por muitos teólogos modernos, inclusive da América Latina: veja, Rubem
Alves, Dogmatismo e tolerância (São Paulo: Paulinas, 1982) e Protestantismo e repressão (São Paulo: Ática,
1979); J. Severino Croatto, Êxodo: Uma hermenêutica da liberdade, trad. por J. Américo de Assis Coutinho (São
Paulo: 1981) 5-18; Ivone Gebara e Maria Clara L. Bingemer, Maria, Mãe de Deus e Mãe dos pobres (2ª ed.,
Petrópolis: Vozes, 1988) 27-43, Vol. 13 em Coleção teologia e libertação.
16 Apesar de uma certa ambiguidade sobre o significado da palavra “gerado”, os pais da igreja concordavam em
que não podia significar “criado”. Eles concluíram que, vista sempre no presente, a frase “eu hoje te gerei” (Sl 2.7;

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At 13.33; Hb 1.5; 5.5) indicava um relacionamento único, eterno e misterioso entre a Primeira e a Segunda
Pessoa da Trindade.
17 Benjamim Breckinridge Warfield, The Person and Work of Christ, ed. Samuel G. Craig (Philadelphia: Presbyterian
& Reformed, 1950) 67-68.
18 Melito de Sardis, vs. 8, em Gerald F. Hawthorne, “A New English Translation of Melito’s Paschal Homily”, em
Current Issues in Biblical and Patristic Interpretation, ed. G. F. Hawthorne (Grand Rapids: Eerdmans, 1975) 151.
19 Veja Richard A. Norris, Jr., ed., The Christological Controversy (Philadelphia: Fortress, 1980) 103-154, em
Sources of Early Christian Thought; Harold O. J. Brown, Heresies: The Image of Christ in the Mirror of Heresy and
Orthodoxy from the Apostles to the Present (New York: Doubleday, 1984) 158-180; e “Eutyches” em Encyclopedia
of Early Christianity, Everett Ferguson, ed. (New York: Garland, 1990) 329.
20
Veja Person, Mode of Theological Decision Making, 175-183; e Blaising, “Chalcedon and Christology”, 326-337. A
Definição de Calcedônia geralmente é vista como uma continuação da metodologia teológica e das conclusões
de Nicéia.
21
Definitio Fidei, Concílio de Calcedônia, Actio V., Mansi, VIII, 116s em Henry Bettenson, ed., Documents of the
Early Church (Oxford: Univ. de Oxford, 1967) 86, adaptado pelo autor. A afirmação de que Maria é “a Mãe de
Deus” (Theótokos, do gr. theo, “Deus” e tiktein, “dar à luz”) é ainda afirmada por todas as tradições cristãs,
incluindo a evangélica, já que não podemos dividir a pessoa de Cristo: Maria é a mãe do ser humano Jesus
Cristo, que é também Deus. Assim como o sangue de Deus foi derramado na cruz (At 20.28), também o embrião
no ventre de Maria era o Deus Filho assumindo a carne (Fp 2.7; Jo 1.14).
22
Uma crítica comum ao Definitio Fidei diz respeito à definição e ao interrelacionamento entre as palavras
natureza e pessoa, chamadas por Harnack e outros de “helenização” do evangelho. Embora existam dificuldades
no conjunto misterioso das naturezas e pessoa de Cristo, virtualmente todos os teólogos clássicos defendem
essas categorias, considerando-as úteis e essenciais – natureza sendo as características inatas da divindade e
da humanidade, pessoa sendo o centro da consciência (ego). Para uma discussão mais ampla, veja Jean Galot,
The Person of Christ: Covenant between God and Man, trad. do francês por M. Angeline Bouchard (Roma: Univ.
Gregoriana, 1981 e Chicago: Fransiscan Herald, 1983).
23 Segundo Galilea, Seguir a Cristo. Desafio para o homem de hoje, trad. por José Fernandes (3ª ed., São Paulo:
Paulinas, 1984); S. Galilea e Raúl Vidales, Cristologia y pastoral popular (Bogotá: Paulinas, 1974); José Comblin,
Breve curso de teologia, 4 vols. (São Paulo: Paulinas, 1983), Tomo I: Jesus Cristo e sua missão; Comblin, Jesus
de Nazaré: Mediações sobre a vida e a ação humana de Jesus (4a ed. Petrópolis: Vozes, 1974); Comblin, O
enviado do Pai (Petrópolis: Vozes, 1974); Comblin, Francisco Bravo e B. Catão, Christología y pastoral en América
Latina (Santiago/Barcelona: Herder, 1965); Jon Sobrino, Cristologia a partir da América Latina. Esboço a partir do
seguimento do Jesus histórico, trad. por Orlando Bernardi (Petrópolis: Vozes, 1983); Sobrino, Jesus na América
Latina: Seu significado para a fé e a Cristologia, trad. por Luis João Gaio (São Paulo: Loyola e Petrópolis: Vozes,
1985).
24 David C. Steinmetz, “Mary Reconsidered”, Christianity Today (5 de dezembro de 1975) 6; cf. Heiko Augustinus
Oberman, The Harvest of Medieval Theology (Cambridge, MA: Univ. de Harvard, 1963) 281-322.
25 John A. MacKay, The Other Spanish Christ: A Study in the Spiritual History of Spain and South America (New
York: Macmillan, 1932) 98.
26 Hubert Lepargneur, “Imagens de Cristo no Catolicismo Popular Brasileiro”, Quem é Jesus Cristo no Brasil? 57, cf.
55-94.
27 Martinho Lutero, Works (ed. Weimar) 1:362, citado por Friedrich Gogarten, Christ the Crisis, trad. do alemão por
R. A. Wilson (Londres: SCM Press, 1970) 3.
28
Ibid., 1:147, citado por Gogarten, 3.
29
As imagens de Jesus na tradição ibero-americana são amplamente elaboradas em outras obras: Mackay, The
Other Spanish Christ, 3-58; Pereira de Queiroz, Images messianiques du Brésil; Núñez, El Cristo de
Hispanoamérica, 14s.; João Dias de Araújo, “Images of Jesus in the Culture of the Brazilian People,” em Míguez
Bonino, ed., Faces of Jesus, 30-38; Saúl Trinidad, “Christology, Conquista, Colonização” em ibid., 49-65; e George
Casalis, “Jesus – Neither Abject Lord nor Heavenly Monarch”, em ibid., 72-76.
30 Hugo Assmann, “La actuación histórica dei poder de Cristo” (palestra na Consulta de Cristologia, Lima, 1/1974),
citado por Saúl Trinidad, op. cit., 58.
31
Wessels, Images of Jesus, 71.
32 E. F. Pironio, “Cristo vivo”, Vispera 9 (1969) 29-31; Hugo Assmann, A Theology of a Nomad Church, trad. por Paul
Burns (Maryknoll: Orbis, 1976) 103-104 [Teología desde la praxis de la liberación (Salamanca: Sígueme, 1973)].

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33 Adolfo Ham Reyes, et. al., Cristo vivo en Cuba: Reflexiones teológicas cubanas (San José, CR: DEI, 1978) 32.
34 Adolfo Pérez Esquivel, Christ in a Poncho, ed. Charles Antoine, trad. do francês por Robert R. Barr (Maryknoll:
Orbis, 1983) 36-37 e capa.
35
Veja Norberto Saracco, “The Liberating Options of Jesus”, em Sharing Jesus in the Two Thirds World, eds. Vinay
Samuel e Chris Sugden (Grand Rapids: Eerdmans, 1983) 33-41.
36 Veja as notas de rodapé 3, 7, 24 e Maximino Arias-Reyero, Jesús, el Cristo: Curso fundamental de Cristologia
(Santiago: Paulinas, 1980); José Cárdenas Pallares, El poder de Jesús el carpinteiro (México, DF: CUPSA, 1983);
Hugo Echegaray, A prática de Jesus, trad. por E. F. Alves (Petrópolis: Vozes, 1982); Antonio Francisco Falconi,
Jesus de Nazaré, seu rosto e sua mensagem (São Paulo: Paulinas, 1983); Benedito Ferraro, A significação política
e teológica da morte de Jesus à luz do Novo Testamento (Petrópolis: Vozes, 1977); Guerrero, El otro Jesús; M. P.
Lacerda, Jesus de Nazaré: Vencedor ou perdedor (São Paulo: Loyola, 1982); Carlos Mesters, A pessoa de Jesus
Cristo, 3 vols. (Petrópolis: Vozes, 1973); José Porfírio Miranda, O ser e o Messias, trad. por H. A. Toschi (São
Paulo: Paulinas, 1982); Carlos Palacio, Jesus Cristo: História e interpretação (São Paulo: Loyola, 1979); José
Augusto Fontes Rico, Cristo branco (São Paulo: Paulinas, 1975); J. E. Martins Terra, O Jesus histórico e o Cristo
querigmático; etc.
37
Jon Sobrino, Cristologia a partir da América Latina; também, “La fe en el Hijo de Dios desde um pueblo
crucificado”, Concilium 18:n.173 (1982) 331-340; “The Following of Jesus and Faith in Christ”, em The Myth/Truth
of God Incarnate, ed. Durstan R. McDonald (Wilton, CT: Morehouse-Barlow, 1979) 105-122; e “Qué Cristo se
descubre en América Latina: Hacia una nueva espiritualidad”, Diakonia [Managua) 29 (1984) 47-63. A ideia de
desenvolver a Cristologia via a prática já existia em Boff, Jesus Cristo libertador: Ensaio de Cristologia crítica para
o nosso tempo (Petrópolis: Vozes, 1972) 46-47; Miranda, O ser e o Messias; e Raúl Vidales, “¿Como hablar de
Cristo hoy?” Spes, 4 de janeiro, 1974, 7s.
38 No lado ecumênico, são a antologia de Míguez Bonino, ed., Jesús: Ni Vencido ni monarca celestial e a obra de
Shaull, Jesús na América Latina. No lado evangélico conservador, as obras foram boas mas menores, incluindo
Andrés Kirk, Jesucristo revolucionário (Buenos Aires: La Aurora, 1974); Núñez, El Cristo de Hispanoamérica;
Núñez, Liberation Theology, trad. por Paul E. Sywulka (Chicago: Moody, 1985) 175-239; C. René Padilla, Samuel
Escobar e Edwin Yamauchi, Quién es Cristo hoy? (Buenos Aires: Certeza, 1969); Reynaldo Purim, Jesus Cristo no
panorama da história (2ª ed., Rio de Janeiro: JUERP, 1979); Almir dos Santos Gonçalves, A teologia de Jesus
Cristo (Rio de Janeiro: JUERP, 1973); e Virgilio Zea, Jesús, el Hijo de Dios (Bogotá: USTA, 1981).
39
Boaventura Kloppenberg, “La situación de la Cristología en América Latina”, Medellin 6:23 (setembro de 1980)
381, notou corretamente que, no CELAM III, o Papa advertiu contra duas aberrações: (1) tratar Jesus de uma
forma que simplesmente não se fala da sua divindade e, assim, o remove do centro do evangelium e da sua
exaltação como o verdadeiro Filho de Deus; e (2) apresentar Jesus “como político, revolucionário, como o
subversivo de Nazaré” e, assim, contra a doutrina e magisterium da Igreja. Cf. Comissão Teológica Internacional,
“Quaetiones selectae de Christologia”, Gregorianum 61:4 (1980) 609-632.
40
Depois da publicação espanhola de Cristologia a partir da América Latina (1976), Sobrino admitiu em 1981 que
errou ao dar ênfase quase exclusiva à obra intra-histórica e à natureza humana de Cristo, com prejuízo da obra
salvífica meta-histórica e da natureza divina. Veja Jesus na América Latina, trad. por Luis João Gaio (São Paulo:
Loyola e Petrópolis: Vozes, 1985) 15-86; e Juan Alfaro, “Foreword” na edição inglesa de Sobrino, Jesus in Latin
America, trad. por Robert Barr (Maryknoll: Orbis, 1987) ix.
41 Veja J. Scott Horrell, “Analysis of the Deity of Christ in Boff and Segundo”, Dissertação não publicada de Th.D.
(Dallas: Dallas Theological Seminary e Ann Harbor, MI: UMI, 1989).
42
Veja Karl Rahner, Foundations of Christian Faith, trad. do alemão por William V. Dych (nova ed., New York:
Crossroad, 1984) 178-321, esp. 206-227; Rahner e Wilhelm Thusing, A New Christology, trad. do alemão por
David Smith e Verdant Green (New York: Crossroad/Seabury, 1980); e Teilhard de Chardin, “The Christic”, em The
Heart of Matter, trad. do francês por René Hague (New York: Harcourt, Brace Jovanovich, 1978) 80-102.
43
A primeira obra publicada de Boff foi O evangelho do Cristo cósmico. A realidade de um mito, O mito de uma
realidade (Petrópolis: Vozes, 1970), uma exposição e defesa parcial da Cristologia de Teilhard de Chardin. Em
Jesus Cristo libertador (1972), Boff juntou uma Cristologia crítica (de baixo) na linha do pós-Bultmanismo
europeu (dos anos 60) e uma Cristologia cósmica (de cima) especulativa na linha de Rahner e Teilhard de
Chardin. O trampolim entre um extremo e o outro era a ressurreição, se foi corporal no sentido clássico ou não
(o corpo dele é o universo) ficou em contradição, dependendo da obra.
44 Jesus Cristo libertador, 196.
45 Ibid., 213.

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46 L. Boff, O rosto materno de Deus (Petropólis: Vozes, 1979) 106.
47 Ibid., 107-108.
48 L. Boff, A Trindade, a sociedade e a libertação (2a ed., Petrópolis: Vozes, 1986) 40-41, 218-258.
49
Ibid., 257. Em outra passagem famosa, Boff diz: “Maria seria… não apenas o templo de Deus, mas o próprio
Deus do templo, isto é, o Deus que mora em Maria e que se faz nela o templo vivo e verdadeiro. Qual é a
distinção futura da humanidade em sua concretização feminina?… ser divinizada como o foi Maria…”, 258.
50 Ibid., 257-258; também Jesus Cristo libertador, 207-209, 283.
51
Veja Jesus Cristo libertador, 45-56.
52 Veja L. Boff, Paixão de Cristo – paixão do mundo (2ª ed., Petrópolis: Vozes, 1978) 60- 85.
53 Aqui o assunto se complica no nível de “linguagem religiosa” – se é, ou não, mero balbúcio poético que não
tem realidade ontológica. Boff é muito sutil e sofisticado nesse ponto: a linguagem bíblico-teológica é a
elaboração da igreja sobre suas experiências com Deus em Jesus; ou seja, a Bíblia não revela as palavras
(proposicionais) de Deus, mas apenas a reflexão da igreja sobre Deus (A Trindade, 11-19). Assim, é impossível
ter certeza se a Bíblia corresponde ou não à realidade transcendente; e assim é igualmente impossível ter
certeza revelatória se Jesus é o Deus Filho preexistente ou se essa concepção é apenas um salto de fé, a partir
da experiência da igreja.
54 Veja John M. McDermott, “The Christologies of Karl Rahner”, Gregorianum, Pt. 1, 67:1 (1986) 87-123 e Pt. 2,
67:2 (1986) 297-327, esp. 316-324, que mostra a mesma contradição em Rahner. Boff, com sua teologia
mariana e seu “panteísmo cristão”, é menos cuidadoso do que Rahner.
55 Juan Luis Segundo (1925- ) escreveu cerca de 23 títulos, Boff (1938- ) mais de 40 livros. Segundo é
especialmente conhecido pelas obras Teologia abierta para el laico adulto, 5 vols. (Buenos Aires: Carlos Lohlé,
1967-1972) e Libertação da teologia, trad. por Benno Brod (São Paulo: Loyola, 1978).
56 J. L. Segundo, O homem de hoje diante de Jesus de Nazaré, 2 tomos, 3 vols., trad. por Benno Brod (São Paulo:
Paulinas, 1985).
57
J. L. Segundo, “Disquísición sobre el misterio absoluto”, Revista Latinoamericana de Teologia 2: nº 6 (1985) 209.
Veja outras críticas em Hugo Assmann, “Os ardis do amor em busca de sua eficácia. As reflexões de Juan Luis
Segundo sobre O homem de hoje diante de Jesus de Nazaré”, Perspectiva Teológica 15:36 (1983) 224-225;
Jacques Dupuis, Resenha de The Historical Jesus of the Synoptics de J. L. Segundo, Gregorianum 67 (1986)
551-553; Javier Jimónez Limón, “Sobre la ‘Cristología’ de Juan Luis Segundo”, Christus 577 (1084) 57-61; N. D.
O’Donoghue, Resenha de Faith and Ideologies por J. L. Segundo, Scottish Journal of Theology 39:3 (setembro de
1986) 399-400; Eduardo J. Ortiz, “Cristología latinoamericana: Nuevo aporte de J. L. Segundo”, Serviço de
Informação 46:455 (1983) 212-215; Juan R. Stumme, “Juan Luis Segundo sobre el ser humano y Jesús.
Comentario”, Cuadernos de Teologia 7:3 (1986) 197-209; J. S. Horrell, “Segundo, Juan Luis”, em Enciclopédia
Histórico-Teológico da Igreja Cristã, ed. Walter A. Elwell, trad. por Gordon Chown (São Paulo: Vida Nova, 1988-
1990) 3:372-374.
58
É interessante que, com uma teologia kantiana baseada na ética, Segundo (ao que parece, sem saber) está
voltando para o velho liberalismo (Ritschl até Harnack e Herrmann) do século XIX – uma teologia rejeitada como
subjetivista e oca por quase todos do século XX.
59O homem de hoje, II:1a, 17-32. Ao dizer “anti-cristologia”, Segundo coloca-se contra as fórmulas dogmáticas,
na “tentativa de abrir caminho entre as cristologias a Jesus de Nazaré até nossa atualidade e até os problemas
de nossa fé antropológica”, através de “três leituras: a investigação histórica (crítica), generalização
antropológica e problematização atual”.(31)
60 Teología abierta para el laico adulto, vol. 3, versão inglesa, Our Idea of God, trad. por John Drury (Maryknoll:
Orbis, 1974), 5-6, 153.
61 O homem de hoje, II:2a, 17-65.
62
“Disquisición sobre el misterio absoluto”, 217.
63
Depois de Calcedônia, desenvolveu-se o conceito da “anhipostasia” (anhupóstatos), afirmando que a natureza
humana de Jesus não existiria separada da natureza divina do Logos; de um outro ângulo, a “enhipostasia”
(enhupóstatos) significa que a natureza humana de Jesus foi sustentada pela pessoa do Filho e nela subsistia. A
discussão técnica se encontra em vários livros desde Calcedônia, em Leôncio de Bizâncio, Libri III adversus
Nestorianos et Eutychianos e João Damasceno, De fidei orthodoxia, III, 9, 14, 18 até Barth, Schillebeeckx e outros
teólogos modernos. Veja Altaner e Stuiber, Patrologia, 505-506, 520-526; Brown, Heresies, 186-192.

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