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2. Surgimento e desenvolvimento da cristologia do Novo Testamento.

Cf. H. Kessler/ T. Schneider, Cristologia, Manual de Dogmática I, Vozes,


Petrópolis, 2001, p. 265-294.

Surgimento da Cristologia no NT

Foram principalmente dois fatores que contribuíram para a diversidade das concepções
cristológicas:

1° Por um lado, o caráter distinto das situações e funções na vida das comunidades
cristãs, envolvendo questões pertinentes à pregação e a liturgia, verificando-se, em cada
caso, formas e ênfases distintas na expressão cristológica.

2° Por outro lado, o caráter distinto de nexos da tradição já existente dos quais proviam
indivíduos ou grupos cristãos; judeus e também gentios de fala e proveniência diversas

A concepção judaica apocaliptica acerca do Filho do Homem escatológico foi retomada


pelos judeus cristãos após a ressurreição de Cristo e ampliada em termos especialmente
cristãos, a fim de tornar compreensível para ouvintes judaicos de fala aramaica que o
Jesus histórico e crucificado é a figura escatológica exaltada.

Não foi a expressão “Filho do Homem”, “mas sim o titulo “Messias” que se tornou a
afirmação básica da cristologia neotestamentária

O titulo neotestamentário “Filho de Deus”, provem da messianologia judaica, e rompe a


concepção judaica na medida em que uma pessoa executada é entronizada como Messias
por sua ressurreição dos mortos.

Apesar do título “Senhor”, usado para o Jesus exaltado não significar uma transferência
direta de uma designação de Deus para Jesus, a teologia do AT, distinguia o rei
entronizado com predicados divinos. Portanto, quando os primeiros judeus cristãos da
Palestina invocam o Jesus exaltado como Senhor, eles o confessam como Messias e
representante de Deus, subordinando a ele toda a sua existência.

Todos os títulos cristológicos são tentativas de expressar o pleno significado de Jesus


recorrendo a modelos de compreensão já existentes cujo conteúdo e reinterpretado.

Tentou-se remontar o que havia ocorrido na morte de Jesus, alcançando-se paulatinamente


o sentido indicado pelo próprio Jesus em seus gestos durante a ultima ceia e através de
palavras que os acompanhavam:

a) A antiga tradição kerigmática contrapõe a ação humana referente a Jesus à ação


ressuscitadora de Deus para mostrar o crucificado como pessoa confirmada por
Deus e motivar a conversão para obter o perdão dos pecados.
A fonte “Q” e também uma tradição pré-marquiana, compreendem a missão e o
destino de Jesus como o deuteronômista no destino violento dos profetas.
Para uma tradição pré-marquiana, a entrega de Jesus a morte de certo é obra
humana, mas Deus faz dela um acontecimento em que se efetua sua vontade
salvífica.
b) Existe possibilidade de que já a comunidade primitiva de língua aramaica reunida
em torno de Pedro e dos doze tenham entendido a morte de Jesus como
acontecimento expiatório e de perdão para Israel. Contudo, essa concepção foi
ampliada e universializada por judeus-cristãos de fala grega congregados em torno
de Estevão e dos sete que se dedicaram mais acentuadamente a missão do gentios.
Essa morte salvífica do Cristo e sua ressurreição foram interligadas em formulas
confessionais já antes de Paulo, que foram designadas pelo apóstolo como os
tradicionais elementos principais do evangelho.

c) A característica mais saliente da cristologia paulina é sua total concentração na


morte e ressurreição de Jesus como verdadeiro acontecimento salvífico. Paulo não
somente fala da morte de Cristo, mas acentua que anunciar o Messias significa
proclamar Jesus Cristo como crucificado.
Só a ressurreição evidenciou que o caminho da cruz era o caminho trilhado por
Deus até o ser humano miserável. A comunidade agora, se subordina ao exaltado
como Kyrios.
Desenvolvimento da Cristologia no NT

Quando os evangelhos sinóticos narram a vida de Jesus na terra, proclamam também quem
é ele agora, como Cristo e Kyrios ressurreto, que foi anunciado e se faz presente à nós,
olhando-nos e falando-nos.

a) A cristologia evangélica de Marcos é narrativa, razão pela qual não pode ser extraída
dele e transladada para uma forma conceitual-sistemática mais abstrata. Antes, esta é a
história de Jesus Cristo que diz quem ele é. Ela esboça uma cristologia do preceder, onde
Jesus vai curando, servindo, sofrendo, entregando sua vida por todos, ressuscitando e
abrindo caminho para a vida verdadeira

b) Diferente da tradição pré-paulina de Paulo e Marcos, Lucas mostra como o caminho de


Jesus traz salvação, através de sua solicitude para com as pessoas perdidas, passando
pelo caminho do sofrimento até a consumação da sua exaltação a direita de Deus, pela
qual ele se tornou permanente o autor da vida a da salvação, para conceder perdão dos
pecados e dádiva do Espírito, para abrir o acesso ao reino de Deus, possibilitando a
salvação definitiva. Jesus agora é o Kyrios exaltado.

c) Para Mateus, o Messias Jesus é ao mesmo tempo o intérprete pleno e completo da


vontade de Deus. Mais ainda, porque em toda vida, ensino e atuação de Jesus a vontade
de Deus é feita, ocorrendo assim o cumprimento escatológico da lei. Por isso, Jesus não é
somente mestre da nova justiça mas também a encarnação dela. Em sua cristologia
sapiencial, Mateus afirma de maneira autônoma que em Jesus de Nazaré, o próprio Deus
se encontra com seres humanos. (Emanuel: Deus conosco)

A especulação sapiencial judeu-Helenista exerceu grande influência sobre o surgimento da


cristologia de preexistência, abrindo uma nova dimensão na aproximação ao mistério e
significado de Jesus, que haveria de torna-se determinante sobre tudo em termos de teologia
da criação, em termos cósmicos ou também metafísicos. Na reflexão sobre essa nova
dimensão deve considerar o seguinte:

a) Há controvérsia se o envio do Filho, como ocorre no contexto de Paulo e João, já


pressupõe a preexistência ou é comparado ao envio dos profetas. Entretanto,
apesar de que não se deve sobrecarregar teologicamente a fórmula cristã primitiva do
envio, ainda sim, a referida fórmula é teológicamente significativa pois:

1° Mediante referencia a preexistência do Filho de Deus enviado ao mundo, o Cristo


Jesus é diferenciado de outros enviados por Deus, pois nele Deus agiu para a salvação
dos seres humanos com intensidade inédita e com um caráter definitivo que não pode mais ser
sobrepujado.

2° O discurso acerca da preexistência do envio do Filho significa que a história do


portador escatológico da salvação baseia-se inteiramente na iniciativa de Deus, e o
libertador vindo inteiramente de Deus precisa entrar inteiramente nas condições terrenas de
existência e desgraça das quais quer libertar
b) A ocorrência de Idéia explicita de preexistência em hinos cristológicos
neotestamentários

1° Na epístola aos Filipenses Paulo cita um hino cristologico mais antigo, já existente
antes dele e proveniente de judeu-cristãos helenistas. Neste hino, Jesus é sobretudo um
ser humano Humilhado e exaltado que veio de Deus, qualificado como acontecimento de
revelação e salvação.

2° O autor da epístola aos efésios retoma em Colossenses um hino cristológico, que


entende Cristo tanto em sua preexistência quanto em sua pós-existencia como uma grandeza
igual a Deus ou repleta de Deus, cabeça do corpo do mundo, que origina no mesmo, a
consciência quanto à restauração da harmonia rompida do cosmo.

3° O evangelho de João se inicia com o hino ao Logos. Este hino fala do logos que era no
princípio e por meio do qual tudo foi criado, e recorre a grande abertura bíblica “no princípio” de
Gênesis 1.1 e a “palavra” criadora veterotestamentaria que Deus fala e que pertencente
exclusivamente a ele, sendo por isso divino.

O Evangelho de João junta duas coisas: a história narrada de Jesus e a teologia da


preexistência. A encarnação como tal não é objeto de reflexão neste evangelho, pois o que
predomina é a idéia de envio. A paixão e a morte de Jesus são vistas no contexto da
cristologia de envio. O Filho enviado ao mundo pelo Pai tem a missão de comunicar vida divina
ao mundo, e concluída a sua missão, ele abandona o mundo e retorna ao Pai, para atrair
todos a si.

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