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22/11/2023, 08:35 Envio | Revista dos Tribunais

Técnicas de deliberação colegiada e arbitragem: um diálogo necessário

TÉCNICAS DE DELIBERAÇÃO COLEGIADA E ARBITRAGEM: UM DIÁLOGO NECESSÁRIO


Panel decision-making methods and arbitration: a necessary interaction
Revista de Processo | vol. 332/2022 | p. 409 - 424 | Out / 2022
DTR\2022\14874

Marco Vanin Gasparetti


Doutorando em Direito Processual Civil na PUC-SP. Mestre em Direito Processual Civil pela PUC-SP. Advogado.
marco.gasparetti@fkgadv.com.br

Área do Direito: Processual; Arbitragem


Resumo: A doutrina processual, doméstica e internacional, há muito discute sobre as técnicas de deliberação
colegiada, em especial no contexto dos julgamentos ampliados (art. 942 do CPC) e nos julgamentos realizados pelos
Tribunais Superiores, sobretudo quanto à formação de precedentes com efeitos vinculantes. Nas arbitragens, muito
embora, em regra, elas sejam decididas por deliberação colegiada, muito pouco (ou nada) se fala sobre a forma pela
qual os árbitros devem deliberar e, mais importante, superar eventuais divergências. Nesse contexto, há diversos
estudos sobre os métodos de deliberação seriatim e per curiam e formas de resolução de divergências quantitativas e
qualitativas, de inegável aplicação, teórica e prática, às arbitragens. Da mesma forma, a aplicação, a arbitragens, da
técnica de julgamento estendido (na hipótese de divergências entre os árbitros), é tema que merece discussão. O
presente artigo procura expor essas técnicas de deliberação colegiada e provocar debate acerca de sua aplicação a
arbitragens, propondo reflexão acerca da normatização, na cláusula arbitral ou mesmo nos Termos de Arbitragem
sobre a forma pela qual os árbitros decidirão e superar eventuais divergências de opinião.

Palavras-chave: Arbitragem – Técnicas de deliberação colegiada – Seriatim e per curiam – Divergências


quantitativas e qualitativas – Julgamento estendido – Poder de decisão dos árbitros
Abstract: Procedural scholars, in Brazil and abroad, for many years have been debating on panel decision-making
methods, especially in the context of extended judgments (Article 942 od the CPC) and in the rulings entered by the
Superior Courts, particularly in which pertains to the formation of binding precedents. In arbitration, notwithstanding the
fact that, as a rule, they are decided by panels, there is just few (or none) discussion on how the arbitrators should
reach a decision and, more importantly, how to overcome dissenting opinions. In this context, there are several studies
on the seriatim and per curiam decision-making methods and on the technics for overcoming dissenting opinions on
quality and quantity of the pleadings, which could, without any doubt, be applied to arbitrations. In this same sense, the
subject of the extended judgments (when there are dissenting opinions between arbitrators) is one that demands
discussions. This article aims at exposing the panel decision-making methods and rising a debate on its applicability to
arbitrations, providing thoughts about the creation of rules, in the arbitral clause or in the terms of reference, on how
arbitrators should decide and overcome dissenting opinions.

Keywords: Arbitration – Panel decision-making methods – Seriatim and per curiam – Quantitative and qualitive
dissent – Extended judgment – Arbitrators decision powers
Para citar este artigo: Gasparetti, Marco Vanin. Técnicas de deliberação colegiada e arbitragem: um diálogo
necessário. Revista de Processo. vol. 332. ano 47. p. 409-424. São Paulo: Ed. RT, outubro 2022. Disponível em:
inserir link consultado. Acesso em: DD.MM.AAAA.
Sumário:

1. Introdução - 2. Técnicas de deliberação: os métodos seriatim e per curiam - 3. Sistemas de resolução de


divergências quantitativas e qualitativas - 4. Julgamento estendido em arbitragens: por que não? - 5. Conclusão - 6.
Bibliografia

1. Introdução
“Várias cabeças pensam melhor do que uma”, dizia minha professora do primário para convencer a classe dos
benefícios do trabalho em grupo. A frase, de procedência incerta e veracidade duvidosa, é aplicada a torto e a direito
pelo legislador processual ao dar à colegialidade uma enorme importância, subindo a régua (e ampliando o colegiado)
conforme a matéria a ser decidida aumenta de importância: nos julgamentos ordinários pelos Tribunais, o colegiado se
amplia de três para cinco desembargadores em caso de divergência; determinadas matérias são reservadas à
deliberação dos órgãos fracionários (Turmas, Câmaras, Seções) e outras ao plenário, sempre para assegurar que,
“quanto mais gente decidindo, melhor a decisão”.
Provocações à parte, é claro que o julgamento colegiado, em especial nos Tribunais Superiores, é capaz de (ao
menos em tese) melhor refletir a pluralidade de pensamentos e ideias, fomentar debates e ampliar pontos de vista.
Mas a fixação do legislador processual pela ampliação do colegiado como sinônimo de maior qualidade já vem, há

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muito, recebendo críticas da doutrina, em especial no contexto da transformação dos Embargos Infringentes na
técnica de julgamento estendido.
Teresa Arruda Alvim, ao tratar do tema, critica duramente essa “crença” de que “a ampliação da colegialidade levaria
necessariamente ao aprimoramento da decisão”, afirmando que “a colegialidade, sozinha, nada garante”, uma vez
que são “muito comuns casos de julgamentos colegiados em que todos, pura e simplesmente, acompanham o relator,
casos estes em que se revela de modo evidente alto grau de aversão ao dissenso”1.
Mas o que isso tem a ver com arbitragem? Tudo. Embora a Lei de Arbitragem e os regulamentos das câmaras
arbitrais nacionais e internacionais prevejam a figura do “árbitro único”, a esmagadora maioria dos processos arbitrais
é julgado por um colegiado. A razão é intuitiva: as partes se sentem muito mais confortáveis com o procedimento
podendo nomear um árbitro de sua escolha, para que os dois árbitros nomeados escolham o presidente. Ao optarem
pelo árbitro único, as partes se submetem à escolha pela câmara (fora a hipótese improvável de consenso com a
contraparte) e talvez, tal qual ocorre no judiciário, se iludam com a ideia de que “várias cabeças pensam melhor do
que uma”.
A problemática da colegialidade, muito estudada pela doutrina processual, reside na forma de se produzir uma
decisão e em como superar divergências. Muito se escreveu e ainda se escreve sobre a aplicação de técnicas de
deliberação colegiada e de superação de divergências (qualitativas e quantitativas) no âmbito de órgãos colegiados,
questão especialmente relevante quando se está diante de um colegiado formado não por três, mas por cinco, nove
ou onze julgadores2. Embora em arbitragem o colegiado de três árbitros seja a regra, e não a exceção, muito pouco,
ou nada, fala-se sobre como esses três árbitros devem deliberar e como devem superar eventuais divergências3.
Esse silêncio é especialmente eloquente quando se pensa que, em sede de arbitragem, as partes podem estipular na
cláusula arbitral (ou mesmo no Termo de Arbitragem) as técnicas de deliberação a serem aplicadas, como eventuais
divergências devem ser superadas, e de que forma essa eventual divergência deve ser traduzida na Sentença Arbitral.
A crescente insatisfação de partes e advogados com a qualidade de algumas decisões arbitrais que lhes são
apresentadas, em que, não raro, matérias complexas são decididas de forma simplista e com uma suspeita
“unanimidade”, somente pode ser a eles creditada. Ao confiar cegamente na capacidade dos árbitros de resolverem
eventuais divergências entre si, às portas fechadas e sem aplicar técnicas estruturadas, as partes e seus advogados
perdem a oportunidade de antecipar expectativas e melhor normatizar o procedimento, naquilo que talvez ele tenha de
mais complexo e desafiador: o momento da deliberação.
A proposta, aqui, não é criticar a colegialidade nem muito menos advogar a tese do árbitro único, até porque a
realidade mostra que a formação colegiada de Tribunais Arbitrais é a que melhor atende aos anseios de participação
da parte no processo de escolha de julgadores. O que se propõe é expor brevemente as técnicas de deliberação
colegiadas mais conhecidas e testadas (no Brasil e no exterior) e avaliar sua eventual aplicação às deliberações
arbitrais. Da mesma forma, será feita exposição sobre as técnicas de superação de divergências, para reflexão sobre
sua adequação aos procedimentos arbitrais. Ao final, lanço uma provocação, sobre a conveniência de transpor, para a
arbitragem, a figura do “julgamento estendido” para a hipótese de julgamento não unânime.
2. Técnicas de deliberação: os métodos seriatim e per curiam
Entre os modelos de julgamento mais conhecidos e estudados mundialmente, há dois que tradicionalmente vêm
merecendo a atenção da doutrina: os modelos seriatim e per curiam.
No método seriatim, os julgadores deliberam “em série”, emitindo cada qual o seu voto. A decisão (acórdão) é formada
por uma sequência de votos, que podem ou não representar a tese vencedora, sendo um modelo de julgamento
associado a sessões públicas, em que é essencial conhecer o posicionamento de cada um dos julgadores. Trata-se
de método adotado tradicionalmente na Inglaterra, em que as sessões deliberativas são caracterizadas pelo
“pronunciamento em série” (seriatim) das decisões individuais de cada Juiz, sem que necessariamente cada voto
dialogue com o outro. Esse é também o método adotado como regra no Brasil, tanto nos Tribunais Estaduais e
Federais quanto nos Tribunais Superiores.
Um aspecto positivo da sistemática é a publicidade, pois a opinião de cada um dos julgadores é externalizada de
forma expressa (e, no sistema brasileiro, a opção pelos julgados públicos decorre de norma constitucional – arts. 93,
IX, da Constituição Federal e art. 11 do CPC (LGL\2015\1656)). Por outro lado, a proliferação de deliberações
sequenciais, com potencial divergência de fundamentos (sem necessariamente significar diferenças no dispositivo da
decisão), pode dificultar o dimensionamento dos exatos termos da decisão judicial e a extração de sua ratio
decidendi4.
Já o método per curiam (“pelo Tribunal”) é aquele em que a decisão é materializada em texto único, representativo da
posição do órgão julgador. Em contraponto ao método seriatim, é o método adotado, como regra, em colegiados que
deliberam em sessões fechadas, como ocorre na França, Itália, Alemanha5 e Espanha. Segundo destaca a doutrina, o
que se perde em publicidade se pode ganhar em independência dos magistrados (que, longe da visão do público,
podem se sentir mais à vontade para debater e expor sua convicção pessoal) e autoridade do órgão judicial, que ao
externalizar uma decisão de texto único transmite a mensagem de unidade da Corte e segurança jurídica na
deliberação6-7.

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O sistema per curiam, assim, tende a produzir decisões mais coesas, nas quais as potenciais dificuldades de
entendimento impostas pelos votos em série são menos prováveis8. Entretanto, o teor das posições divergentes, por
vezes, pode não ser conhecido, uma vez que não são todos os sistemas que registram e impõem a declaração de
voto vencido9. Entre os sistemas que adotam o método per curiam se destaca o modelo adotado na Suprema Corte
dos Estados Unidos da América, que inicialmente era de um sistema de votos sequenciais, mas, a partir da atuação
de John Marshall como Chief Justice (em 1801), passou a adotar a prática de emitir uma única “opinião da Corte”,
resultado de ampla deliberação de seus membros (a portas fechadas), com ênfase na importância de o colegiado se
expressar com uma “única voz”10. Ainda assim, o sistema norte-americano não é considerado um per curiam “puro”, e
sim um sistema híbrido pela possibilidade de serem indicados votos dissidentes de algum de seus membros, mais
pela necessidade de detalhamento da decisão como uma parte importante do sistema de precedentes do que para
externalizar divergências internas dos julgadores11.
A prática arbitral, doméstica e internacional, sem dúvidas está muito mais próxima dos sistemas de deliberação
fechada, utilizando-se o método per curiam, com a possibilidade de emissão de votos dissidentes em separado,
normalmente de forma específica e restrita à matéria objeto da divergência. A Lei Brasileira de Arbitragem, ao tratar do
tema, limitou-se a dispor que “o árbitro que divergir da maioria poderá, querendo, declarar seu voto em separado” (art.
24, § 2º), sem detalhamento adicional.
O Guia para Elaboração de Sentenças Arbitrais da IBA (IBA Toolkit for Award Writing), ao tratar do tema dos “votos
dissidentes”, destaca que “dependendo das regras processuais aplicáveis, um voto dissidente pode ser anexado à
sentença arbitral ou entregue às partes em documento separado” mas que “em nenhuma dessas hipóteses, o voto
dissidente integrará a sentença arbitral”, estando “a critério da maioria do tribunal abordar ou não o voto dissidente ou
em separado no texto da sentença arbitral”12. Ao comentar essa passagem, os representantes do Comitê Brasileiro de
Arbitragem destacados para analisar o “Guia” (Professores João Bosco Lee e Cristiano Zanetti) ressaltam que “na
prática brasileira, o voto dissidente é parte integrante da sentença arbitral, sendo, por vezes, feito em nota de rodapé
ao trecho da sentença objeto de divergência”.
Mais do que discutir se o voto dissidente integra ou não a sentença arbitral (nos parecendo evidente que sim), é de se
notar, no “Guia” da IBA, a antipatia pela dissidência. Talvez pelo mesmo ideal de “unidade” e “autoridade” da sentença
arbitral e certamente pelo reflexo do método de deliberação per curiam, a “orientação” de que a divulgação da
dissidência fique a critério do árbitro ou do Tribunal Arbitral, figurando em meras notas de rodapé, é tema que, a nosso
ver, merece reflexão.
Retomando as ideias lançadas na introdução deste texto, se as partes optaram por submeter sua controvérsia a um
colegiado, foi porque, em alguma medida, acreditavam no maior potencial de três árbitros produzirem uma decisão de
maior qualidade do que um árbitro único. Ou, se não é isso, pelo menos porque puderam escolher um dos árbitros
que irá decidir a disputa, por seus atributos acadêmicos, experiência profissional ou até por estratégia, acreditando
que o árbitro pode ter um perfil de pensamento mais adequado ao seu caso.
Ao se deparar com a sentença arbitral, contudo, a parte, mais das vezes, não sabe qual foi o real envolvimento do
árbitro que indicou na deliberação: se ele chegou a externar seu ponto de vista, se realmente se debruçou sobre as
provas e argumentos jurídicos deduzidos ao longo do procedimento. É possível que a análise e redação do caso
tenham ficado a cargo do secretário do Tribunal (em geral, um assistente do Presidente do Tribunal Arbitral), sem que
os árbitros tenham de fato estudado o caso e se engajado em debates sobre cada um dos pontos controvertidos do
processo.
Nesse contexto, será que as partes, na convenção de arbitragem, poderiam dispor, por exemplo, sobre a forma de
deliberação dos árbitros, para determinar que eles deverão, necessariamente, lançar seus votos de forma
individualizada, em um sistema próximo ao seriatim anteriormente mencionado? E, mais do que isso: será que as
partes podem determinar que a deliberação se dê em sessão aberta, com a realização de debates e discussões na
presença das partes e seus advogados, até que se alcance a decisão final?
É perfeitamente válida a discussão se as partes deveriam regular tais questões na convenção de arbitragem, mas
parece não haver dúvida de que elas poderiam dispor a respeito desses temas. As balizas que se impõem à liberdade
das partes em criar e adaptar o procedimento13 não restringem a possibilidade de elas regularem como os árbitros
devem deliberar, inclusive para criar mecanismos que assegurem a real participação dos árbitros na formação da
decisão. Da mesma forma, a disposição de regras sobre a forma de deliberação em nada interferem na independência
do árbitro14, que poderá livremente decidir, mas desde que se submeta às normas de procedimento estipuladas pelas
partes15.
Como mencionado, os métodos tradicionais de deliberação (seriatim e per curiam) têm cada qual suas virtudes e
defeitos. O que impressiona é que em um sistema como o do Judiciário brasileiro, de ampla publicidade e deliberação
em série, sequer se cogite replicar ao procedimento arbitral senão todas, mas algumas das características desse
sistema. Não se vislumbra nenhum impeditivo, de ordem lógica ou jurídica, para que as partes, desejando mais
transparência na deliberação, criem regras visando proporcionar debates abertos entre os árbitros, ou mesmo para
que eles explicitem, de forma individualizada e por escrito, o seu voto, ainda que convergentes com os demais. É bem
possível que alguns árbitros se sintam demasiadamente controlados pelas partes ao se deparar com regras dessa
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natureza, mas, conhecendo-as de antemão, por estarem dispostas na cláusula arbitral ou no termo de arbitragem,
podem optar por aceitar ou não a indicação para atuar no procedimento.
Importante destacar que nesse tema, assim como quanto aos demais tratados neste artigo, não existe fórmula pronta
e única que possa ser indicada como a melhor técnica de deliberação para procedimentos arbitrais. Ainda que as
deliberações fechadas e traduzidas em decisão única sigam como a regra, nada impede que partes escolham adaptar
o procedimento e replicar outras técnicas de deliberação ao seu caso concreto, por reputá-las mais adequadas para
resolver aquela controvérsia de forma específica. Afinal, a criação e adaptação de regras ao caso concreto é um dos
maiores (senão o maior) benefício da arbitragem, e, se isso se aplica à forma de conduzir o procedimento, em suas
etapas postulatórias e instrutórias, por que não pensar em regras para a fase de deliberação?
3. Sistemas de resolução de divergências quantitativas e qualitativas
Outro tema que vem sendo objeto de estudo da doutrina processual civil (mas pouco discutido em arbitragem) é o da
dispersão de votos e seu potencial de gerar divergências quantitativas e qualitativas.

Transpondo alguns exemplos de situações dessa natureza16 para a arbitragem, imagine-se uma arbitragem em que se
discute o valor de uma indenização por violação contratual, e o primeiro coárbitro decide que a indenização deve ser
de R$ 1 milhão, o segundo coárbitro decide que a indenização deve ser de R$ 500 mil e o terceiro (presidente) decide
que a indenização adequada deve ter o valor de R$ 5 milhões. Como superar a divergência quantitativa?
A Lei de Arbitragem, nesse particular, dá uma solução curiosa ao tema: “Quando forem vários os árbitros, a decisão
será tomada por maioria. Se não houver acordo majoritário, prevalecerá o voto do presidente do tribunal arbitral” (art.
24, § 1º). Ou seja, prevalece o “voto de qualidade” do árbitro presidente, não importando quanto díspar sua decisão
seja daquela dos coárbitros.
Será que essa é a solução mais adequada? No exemplo dado, a divergência entre os coárbitros foi muito menor do
que entre eles e o árbitro presidente, não parecendo razoável que a decisão do presidente prevaleça apenas porque
ele é o presidente.
A divergência qualitativa é mais complexa. Imagine-se uma arbitragem versando sobre responsabilidade do acionista
controlador de uma sociedade anônima, com três causas de pedir distintas, todas fundadas no art. 117 da Lei das
Sociedades Anônimas, na qual o Tribunal Arbitral vota da seguinte forma: (i) o primeiro coárbitro reconhece a prática
de ato ilícito previsto no art, 117, § 1º, a (“orientar a companhia para fim estranho ao objeto social”); (ii) o segundo
coárbitro reconhece a conduta prevista na alínea b do mesmo dispositivo (“promover a liquidação de companhia
próspera, ou a transformação, incorporação, fusão ou cisão da companhia, com o fim de obter, para si ou para outrem,
vantagem indevida, em prejuízo dos demais acionistas”); e (iii) o árbitro presidente decide que o ilícito, na verdade, foi
aquele previsto na alínea f (“contratar com a companhia, diretamente ou através de outrem, ou de sociedade na qual
tenha interesse, em condições de favorecimento ou não equitativas”). Embora o administrador tenha sido considerado
responsável, por decisão unânime, em todos os casos apenas um voto concluiu pela prática de conduta ilícita, que foi
afastada pelos outros dois julgadores, podendo-se concluir que o pedido indenizatório é improcedente, por maioria de
votos.
Como fica a decisão nesse caso: prevalece novamente o voto do árbitro presidente, por aplicação do art. 24, § 1º, da
Lei de Arbitragem?
Para a hipótese de divergência quantitativa, são dois os sistemas de superação de divergências reconhecidos pela
doutrina e pelos Regimentos Internos dos Tribunais: (i) o sistema da média aritmética; e (ii) o sistema da continência.
No sistema da média aritmética, os valores fixados devem ser somados e divididos por três (no caso de um Tribunal
Arbitral com três árbitros), o que, no exemplo dado, resultaria em uma indenização de R$ 2.166.666,66 (R$ 6,5
milhões divido por três)17. Já no sistema de continência, verifica-se qual dos votos obtém a maioria primeiro, em
ordem decrescente. O voto que fixou a indenização em R$ 5 milhões (do árbitro presidente) é um voto isolado, ao
passo que o voto que fixou a indenização em R$ 1 milhão está contido no voto do presidente, ficando formada, assim,
maioria para decidir pela indenização de R$ 1 milhão18. Com as críticas que se pode fazer a um ou outro sistema (no
sistema da média aritmética, pode haver distorção por um voto muito “fora da curva”, e no sistema da continência
sempre se descarta o voto de menor valor), o fato é que são sistemas que fazem muito mais sentido do que o do “voto
de qualidade” do árbitro presidente.
Já para a divergência qualitativa, há três métodos de superação: (i) supervotação; (ii) opção coata; e (iii) exclusão. O
primeiro consiste em ampliar o colegiado, até que se consolide uma das teses jurídicas (não parece ser um sistema
imediatamente aplicável a arbitragens, salvo a hipótese de julgamento estendido de que se tratará na sequência). Já
no sistema de opção coata, renova-se a votação e, caso persista o impasse, o defensor da corrente minoritária deve
aderir a uma das posições majoritárias (também não resolve o problema em um Tribunal Arbitral com três árbitros). O
terceiro sistema (exclusão) consiste em
“pôr em votação, dentre todas as opiniões discordantes, duas somente, escolhendo para esse fim qualquer delas, e
resultado da votação a exclusão de uma, cotejando-se a vencedora, então, com a terceira, e assim sucessivamente,
até reduzir a duas opiniões discrepantes, e, assim restringindo o conflito, vencerá a que obtiver maioria”19.

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Novamente, a par das críticas a um ou outro sistema, as soluções parecem mais adequadas do que simplesmente
fazer prevalecer o “voto de qualidade” do árbitro presidente.
O fato é que, apesar da relevância do tema, que vem merecendo atenção da doutrina e até dos Regimentos Internos
dos Tribunais, pouco se fala a seu respeito no âmbito das arbitragens20. Como as partes têm plena liberdade para
regular o assunto na convenção de arbitragem, inclusive para afastar a regra do “voto de qualidade” do Presidente
prevista no art. 24, § 1º, da Lei de Arbitragem, é certo que, a depender da matéria em debate e do potencial risco de
dispersão de votos, pode ser interessante regular as formas de superação de divergências quantitativas e qualitativas.
Não há nada que impeça a disposição das partes a esse respeito e, na prática, o regramento de tal matéria contribui
para a qualidade da decisão arbitral, assegurando transparência e previsibilidade ao procedimento.
4. Julgamento estendido em arbitragens: por que não?
Já que estamos falando de técnicas de deliberação e dispersão de votos, é impossível não pensar na técnica de
julgamento estendido, uma das principais novidades do Código de Processo Civil de 2015, ao eliminar a figura dos
Embargos Infringentes e transformar a ampliação de magistrados que julgam o recurso em uma “técnica de
julgamento”, regrada pelo art. 942 do CPC (LGL\2015\1656)
“Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com
a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em
número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais
terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores”.
Estivéssemos tratando da antiga figura dos Embargos Infringentes, seria impensável cogitar da aplicação do
julgamento estendido à arbitragem. Afinal, “arbitragem” e “recurso” parecem ser expressões inconciliáveis. Além disso,
com sua roupagem antiga, os Embargos Infringentes visavam “desempatar” um julgamento em que, por maioria de
votos, era reformada a sentença recorrida, mas, com a regra do art. 942 do CPC (LGL\2015\1656), a ideia do
desempate foi também superada e a ampliação do julgamento passou a ser aplicada em qualquer hipótese de
dissidência21.
Mas, se o julgamento estendido é uma técnica de deliberação que tem por fundamento formar uma maioria
qualificada, que visa “aprofundar a discussão a respeito da controvérsia, de natureza fática ou jurídica, acerca da qual
houve dissidência”, com o objetivo de promover “maior grau de correção e justiça nas decisões judiciais, com
julgamentos completamente instruídos e mais proficientemente discutidos, de uma maneira mais econômica e célere”,
conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça sobre o art. 942 do CPC (LGL\2015\1656)22, a aparente
incompatibilidade entre a técnica de julgamento ampliado e a arbitragem parece ficar superada23.
Há, contudo, outros obstáculos a serem ultrapassados para se concluir pelo cabimento da aplicação de tal técnica aos
processos arbitrais. O primeiro é o fato de a Lei de Arbitragem já prever a solução do “voto de qualidade” do árbitro-
presidente, mas isso, como já visto, não impede as partes de convencionar outra forma de superação de divergências.
O segundo é a questão do custo, pois, ao chamar mais dois árbitros para integrar o Tribunal, as partes,
inequivocamente, incorrerão em honorários arbitrais adicionais, mas isso não é nada que não possa ser equacionado
pelas regras ordinárias de distribuição do ônus financeiro da arbitragem.
Também não parece ser um problema o fato de os árbitros adicionais entrarem no processo já na fase de deliberação,
sem que tenham acompanhado a instrução. A exemplo da solução adotada pelo art. 942 do CPC (LGL\2015\1656),
basta assegurar às partes a possibilidade de “sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores” (o que,
adaptado para a arbitragem, poderia se materializar em uma audiência de debates orais ou em memoriais escritos)
para que o contraditório seja preservado. Mais um ponto que não nos parece de difícil superação.
A questão que parece mais controversa diz respeito à escolha dos árbitros adicionais: seriam eles escolhidos pelas
partes (cada qual, obviamente, escolhendo um dos árbitros), pelos árbitros ou pela instituição perante a qual tramita o
procedimento, tal qual ocorre na hipótese de arbitragens-tripartites? Novamente, embora pareça uma questão a ser
deixada para a disposição das partes, a escolha dos árbitros depois que já está estabelecida a divergência pode
induzir direcionamentos, com cada parte buscando árbitros com pensamento alinhado com a tese por ela defendida.
Não que isso já não ocorra na escolha originária dos coárbitros, mas, com a dissidência materializada, o
direcionamento pode ficar mais preciso e, em alguma medida, até levar a questionamento quanto à imparcialidade dos
árbitros adicionais escolhidos (dentro da ideia de unconscious bias decorrente da defesa prévia, pelo árbitro indicado,
de alguma tese jurídica objeto da arbitragem).
Para contornar essa questão, é possível pensar na solução de o Tribunal Arbitral comunicar as partes da existência de
divergência sem indicar a que ela se refere, dando às partes a oportunidade de indicação dos árbitros adicionais. Essa
possibilidade parece mais adequada do que, por exemplo, deixar a escolha aos árbitros, pois, materializada a
dissidência, a escolha de árbitros por um Tribunal já dividido (ao menos no campo da solução jurídica da causa) pode
dar margem a questionamentos sobre os critérios de escolha (teriam os árbitros “vencedores” imposto a convocação
de árbitros adicionais alinhados com sua tese?) além, claro, de impasse na indicação dos árbitros. A outra opção, da
escolha institucional, parece mais neutra, embora, novamente, seja a que limita a participação das partes no processo
de seleção do Tribunal Arbitral.

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O fato é que, seja qual for a solução a ser aplicada, ela deve ser pensada pelas partes ao prever a hipótese de
julgamento estendido, a fim de não dar margem a discussões quando já instaurada a divergência, em que os
interesses antagônicos certamente não contribuirão para um desfecho consensual do impasse.
Por fim, um tema relevante a ser pensado quando da eventual previsão de aplicação da técnica de julgamento
estendido aos processos arbitrais diz respeito aos limites cognitivos dos árbitros adicionais convocados para
superação da divergência. O assunto, tratando do art. 942 do CPC (LGL\2015\1656), é bastante controvertido na
doutrina, havendo quem defenda que a cognição, nesses casos, é ilimitada, podendo os julgadores convocados julgar
todas as matérias objeto do recurso24, ao passo que outros sustentam que a cognição estaria adstrita ao capítulo
divergente da discussão25. O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar a matéria, decidiu que os julgadores
convocados não ficam adstritos ao capítulo que ensejou a ampliação do colegiado, devendo apreciar a totalidade do
recurso26.
A par da solução dada pelo Superior Tribunal de Justiça à questão, para o âmbito da arbitragem a restrição da
participação dos árbitros adicionais à análise da matéria objeto de divergência parece ser mais adequada. Conquanto
não se duvide que as partes podem estipular que a cognição, na hipótese de julgamento estendido, seja ilimitada, a
limitação da atuação dos árbitros adicionais à superação da dissidência está mais alinhada com os propósitos do
julgamento ampliado, sendo muito importante que, também quanto a esse ponto, as partes cuidem de estabelecer, de
forma expressa, na convenção de arbitragem, não deixando margem a discussões futuras que possam contaminar a
validade do processo arbitral.
5. Conclusão
A possibilidade de divergência é inerente aos julgamentos colegiados, sendo essencial debater formas de superar
essas divergências, bem como os métodos mais adequados para se julgar em grupo. Há mais de século se discute,
em especial no âmbito dos Tribunais Superiores, as diferentes técnicas de deliberação, todas com seus prós e
contras, bem como os métodos de superação de divergências, quantitativas e qualitativas, necessárias para que se
chegue ao julgamento final.
Na arbitragem, a dedicação das partes em discutir as regras de procedimento mais adequadas está, em regra,
totalmente focada nas fases postulatória e instrutória do processo. A ampla liberdade conferida às partes para regrar o
procedimento, um dos principais atrativos da arbitragem, não é refletida na fase de deliberação, na qual, em geral,
apenas se decide se os árbitros podem ou não julgar por equidade.
Ao deixar de prever regras sobre a forma de deliberação dos árbitros (se em sessões abertas ou fechadas, proferindo
votos sequenciais ou voto único, com a necessidade ou não de declaração de voto vencido) e como os árbitros devem
superar eventuais divergências, as partes perdem a oportunidade de conferir previsibilidade ao momento mais
relevante do processo, que é, inequivocamente, a sentença arbitral.
Apesar de sofisticar toda e qualquer cláusula arbitral para nela inserir uma enorme quantidade de previsões sobre a
forma de deliberação estar longe de constituir algo factível (quem já teve que negociar a cláusula arbitral depois de
uma difícil negociação dos demais termos do contrato sabe o quanto esse desgaste é evitado), é importante pensar,
para determinados litígios (e contratos), se um cuidado adicional para prever regras de deliberação pode se justificar.
Para casos complexos, pode ser de interesse de ambas as partes, mesmo sem previsão na cláusula arbitral, prever
no próprio termo de arbitragem determinadas regras de deliberação, bem como a aplicação do julgamento estendido,
a fim de proporcionar (ao menos em tese) julgamentos mais qualificados sobre temas delicados e que causam
divergência.
Por fim, convida-se também a reflexão pelas instituições arbitrais para que avaliem a conveniência de incluir, em seus
regulamentos, regras sobre a aplicação de técnicas de superação de divergências, a exemplo do que fazer os
Tribunais em seus Regimentos Internos.
6. Bibliografia
ABBOUD, Georges; VAUGHN, Gustavo Favero. A técnica do julgamento estendido e a jurisprudência do STJ. In:
ALVIM, Teresa Arruda; KUKINA, Sérgio Luiz; OLIVEIRA, Pedro Miranda de; FREIRE, Alexandre (Coord.). O CPC de
2015 visto pelo STJ. (e-book). São Paulo: Ed. RT, 2021.
ALI, Anwar Mohamad. Técnica de julgamento estendido e a visão do Superior Tribunal de Justiça. In: ALVIM, Teresa
Arruda; KUKINA, Sérgio Luiz; OLIVEIRA, Pedro Miranda de; FREIRE, Alexandre (Coord.). O CPC de 2015 visto pelo
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Superior Tribunal de Justiça – STJ. In: ALVIM, Teresa Arruda; KUKINA, Sérgio Luiz; OLIVEIRA, Pedro Miranda de;
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Consultor Jurídico. 31.01.2017. Disponível em: [www.conjur.com.br/2017-jan-31/paradoxo-corte-limites-devolucao-
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ERB, Marsha C. Dissent aversion at the Court of Justice of the European Union. 2014. Disponível em: [https://
scholarship.law.duke.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1010&context=mjs]. Acesso em: jun. 2022.
FERNANDES, Luís Eduardo Simardi Fernandes. Julgamento ampliado nos embargos de declaração. In: ALVIM,
Teresa Arruda; KUKINA, Sérgio Luiz; GINSBURG, Ruth Bader. The role of dissenting opinions. Minnesota Law Review,
v. 95, 2010.
JORGE, Flávio Cheim; DAHER, Mariana Aguiar. Cinco anos de vigência da técnica de ampliação do colegiado: uma
análise sobre sua aplicação e seus aspectos controversos. In: ALVIM, Teresa Arruda; KUKINA, Sérgio Luiz; OLIVEIRA,
Pedro Miranda de; FREIRE, Alexandre (Coord.). O CPC de 2015 visto pelo STJ. (e-book). São Paulo: Ed. RT, 2021.
KORNHAUSER, Lewis. Deciding together. Revista Estudos Institucionais, v. 1, 2015.
MAZZOLA, Marcelo; VALE, Luiz Manoel Borges do. Contagem de votos: divergências quantitativa/qualitativa e a
esquizofrenia no âmbito dos tribunais. Revista de Processo, São Paulo, v. 317, p. 199-221, jul. 2021.
MIRANDA, Victor Vasconcelos. Notas sobre o modelo de votação nos casos dirigidos à formação de precedentes
obrigatórios. In: ALVIM, Teresa Arruda; NERY JR., Nelson. Aspectos polêmicos dos recursos cíveis e assuntos afins.
São Paulo: Ed. RT, 2021. v. 15.
SCARPINELLA BUENO, Cassio. Curso sistematizado de direito processual civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2020. v. II.
VALE, André Rufino. Argumentação constitucional. Um estudo sobre a deliberação nos Tribunais Constitucionais. Tese
(doutorado) Universidade de Brasília. Brasília: Alicante, 2015.
WAGNER, Philipp; BICKMANN, Julian. The dissenting opinion in arbitration proceedings in Germany. 2020. Disponível
em: [https://wagner-arbitration.com/en/journal/the-dissenting-opinion-in-arbitration-proceedings-in-germany]. Acesso
em: jun. 2022.

1 Ampliar a colegialidade: a que custo?. Revista Res Severa Verum Gaudium, Porto Alegre, v. 3, n. 1, 2017. p. 17-27.

2 Sobre o tema, MIRANDA, Victor Vasconcelos. Notas sobre o modelo de votação nos casos dirigidos à formação de
precedentes obrigatórios. In: ALVIM, Teresa Arruda; NERY JR., Nelson. Aspectos polêmicos dos recursos cíveis e
assuntos afins. São Paulo: Ed. RT, 2021. v. 15.

3 Em diversos trabalhos, em especial da doutrina norte-americana, há estudos profundos sobre a complexidade de se


decidir dentro de um colegiado e das diferenças entre “decidir sozinho” e “decidir em conjunto”. Entre tais estudos,
destacamos o trabalho de Lewis A. Kornhauser (Deciding together. Revista Estudos Institucionais, v. 1, 2015), que
trata das várias formas de decisão colegiada e os protocolos a serem seguidos por aqueles que participam de uma
deliberação coletiva.

4 MAZZOLA, Marcelo; VALE, Luiz Manoel Borges do. Contagem de votos: divergências quantitativa/qualitativa e a
esquizofrenia no âmbito dos tribunais. Revista de Processo, São Paulo, v. 317, jul. 2021. p. 199-221.

5 Em interessante relato, reproduzido em grande parte dos estudos sobre os métodos de deliberação, Philip W.
Amram (The dissenting opinion come to the German Courts. The American Journal of Comparative Law, v. 6, n. 1,
1957. p. 108-111) comenta decisão do Tribunal Constitucional Alemão, que em 1957, pela primeira vez, abriu uma
exceção ao método per curiam puro para admitir a divulgação de votos divergentes. No artigo, Amram destaca o
debate sobre em que medida a divulgação de votos divergentes violaria a confidencialidade das deliberações: “The
statute of the State Supreme Court provides in Article 8(3) as follows: "The members of the court are obligated to
maintain secrecy over their deliberations and their voting." However, Rule 13 of the Court provides: "If an 'advisory
opinion' is given, any member may request that his dissenting opinion be filed with the advisory opinion."

6 VALE, André Rufino. Argumentação constitucional. Um estudo sobre a deliberação nos Tribunais Constitucionais.
Tese (doutorado) Universidade de Brasília. Brasília: Alicante, 2015. p. 99.

7 Na mesma linha, Marsha C. Erb (Dissent aversion at the Court of Justice of the European Union. 2014, p. 16): “What
per curiam sacrifices in insight into the decision-making process and transparency, it gains in bringing “institutional
strength to a controversial decision”.

8 Sobre esse ponto, merecem destaque as considerações de Marsha C. Erb (ob. cit., p. 15):
“In a seriatim court, each judge writes an individual opinion which collectively comprise the judgment. This practice
eliminates risk to collegiality caused by dissenting opinion since there are no proverbial feathers to ruffle. However,
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22/11/2023, 08:35 Envio | Revista dos Tribunais
seriatim writing can be confusing since it is not always easy to discern what principle the court is endorsing. In a per
curiam court, a unanimous, single unsigned majority decision is issued and published, the result of a vote among
participating judges comprises the opinion of the court as an institution. In a hybrid court, individual opinions of the
sitting judges’ are published as part of majority judgments as the overall decision of the Court”.

9 No Brasil, como destacam Marcelo Mazzola e Luis Manoel Borges do Vale (ob. cit., p. 202), o CPC dispõe, no art.
941, § 3º, que o voto vencido será necessariamente declarado e considerado parte integrante do acórdão pata todos
os fins legais, inclusive de prequestionamento.

10 Os detalhes da evolução histórica dos métodos de deliberação adotados pela SCOTUS (Supreme Court of the
United States of America) podem ser encontrados em artigo da Justice Ruth Bader Ginsburg (The role of dissenting
opinions. Minnesota Law Review, v. 95, 2010):
“Our system occupies a middle ground between the continental and the historic British patterns. In the earliest days of
our national existence, the U.S. Supreme Court, like its British counterpart, issued seriatim opinions. Each Justice
spoke for himself whenever more than a memorandum judgment issued. But John Marshall thought the “each-for-
himself” practice ill-advised. In its place, he established a new tradition of announcing judgments in a single opinion for
the Court, which (as I earlier mentioned) he generally wrote himself. Opinions that speak for the Court remain the
custom in the U.S. today. But unlike courts in civil-law systems, and in line with the British tradition, each member of the
Court has the prerogative to write separately”.

11 Como destaca Marsha C. Erb (Dissent aversion at the Court of Justice of the European Union. 2014):
“American separate writing is widely accepted as part of the common law decision making process. Publishing
alternate judicial opinion is not a general feature of continental civil law. Common law judgments are detailed and
expansive. Some of them approach literary eloquence and both majority opinions and dissents are still remembered if
not cited many decades later. Common law judgments make precedent-setting law which other lower judicial
institutions must understand, interpret and apply”.

12 Tradução elaborada por Laura França Pereira e Matheus Bastos Oliveira, divulgada pelo Comitê Brasileiro de
Arbitragem em 2021:
“A maioria das leis nacionais e regulamentos de arbitragem não proíbem os árbitros de apresentarem um voto
dissidente ou em separado. Árbitros dissidentes devem respeitar a confidencialidade das deliberações arbitrais, bem
como os seus deveres pessoais de independência e imparcialidade. Dependendo das regras processuais aplicáveis,
um voto dissidente pode ser anexado à sentença arbitral ou entregue às partes em documento separado. Em
nenhuma dessas hipóteses, o voto dissidente integrará a sentença arbitral. Fica a critério da maioria do tribunal
abordar ou não o voto dissidente ou em separado no texto da sentença arbitral. [...] Um árbitro pode discordar da
decisão da maioria sobre um ou mais pontos controvertidos, sem desejar escrever um voto dissidente ou em
separado. Nesses casos, e sujeito a quaisquer requisitos obrigatórios, o desacordo do árbitro sobre o ponto em
questão pode ser registrado no corpo da sentença e no dispositivo. Pode ser até que o árbitro não seja identificado,
mas que o texto registre simplesmente que a questão foi decidida por maioria.”

13 A “ordem pública” e os “bons costumes”, conforme art. 2º, § 1º, da Lei de Arbitragem: “Poderão as partes escolher,
livremente, as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem, desde que não haja violação aos bons costumes e
à ordem pública”.

14 Que, inclusive, é assegurada na Lei de Arbitragem, vide o art. 13, § 6º: “No desempenho de sua função, o árbitro
deverá proceder com imparcialidade, independência, competência, diligência e discrição”.

15 Em interessante artigo, Philipp Wagner e Julian Bickmann (The dissenting opinion in arbitration proceedings in
Germany. 2020) relatam caso decidido pela Corte Regional de Frankfurt, no qual foi reconhecida a incompatibilidade
da previsão de apresentação de votos dissidentes em processo arbitral com a “ordem pública” alemã, por violar o
dever de confidencialidade da deliberação como forma de proteger a independência e imparcialidade dos árbitros
(“The vital significance of confidentiality of deliberations for the protection of independence and impartiality of the
arbitrators also suggests that confidentiality of deliberation – even after the final deliberation and the award – should
not be put at the disposal of the parties and/or the arbitrators and should be regarded as part of the procedural public
policy”). Os autores criticam duramente a decisão, defendendo a inexistência de risco de violação aos deveres de
independência e imparcialidade, por confundir causa e efeito (“the assertion that dissenting opinions may endanger the
arbitrator’s ‘independence and impartiality’ (see quotation above) is unfounded. Some commentators suggest that
party-appointed arbitrators could take a stand for ‘their’ party by issuing a dissenting opinion. However, the problem
then would be the arbitrator’s partiality as such, rather than the possibility of issuing a dissenting opinion. The argument
thus confuses cause and effect”).

16 Os exemplos são de Marcelo Mazzola e Luis Manoel Borges do Vale (Contagem de votos: Divergências
quantitativa/qualitativa e a esquizofrenia no âmbito dos tribunais. Revista de Processo, São Paulo, n. 317, 2021. p.
https://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 8/10
22/11/2023, 08:35 Envio | Revista dos Tribunais
200).

17 A solução pelo sistema da média aritmética foi adotada pelo Regimento Interno do Tribunal de Justiça de São
Paulo (art. 139, § 1º): “Tratando-se de determinação do valor ou quantidade, o resultado do julgamento será expresso
pelo quociente da divisão dos diversos valores ou quantidades homogêneas, pelo número de juízes votantes”. É a
solução adotada pela maioria dos Tribunais Estaduais.

18 Essa é a solução preconizada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro em seu Regimento Interno:
“Art. 83. Se, em relação a uma única parte do pedido, não se puder formar a maioria, em virtude de divergência
quantitativa, o Presidente disporá os diversos votos, com as quantidades que cada qual indicar, em ordem
decrescente de grandeza, prevalecendo a quantidade que, com as que lhe forem superiores ou iguais, reunir votos em
número suficiente para constituir a maioria.” Seguem a mesma linha os Regimentos Internos dos Tribunais do Rio
Grande do Sul, do Ceará e de Pernambuco.

19 Araken de Assis (Manual dos recursos. 9. ed. São Paulo: Ed. RT, 2017. p. 482-483), citado por Marcelo Mazzola e
Luis Manoel Borges do Vale (Contagem de votos: divergências quantitativa/qualitativa e a esquizofrenia no âmbito dos
tribunais. Revista de Processo, São Paulo, n. 317, 2021, p. 205).

20 Carlos Alberto Carmona, ao comentar o art. 24 da Lei de Arbitragem, fala dos sistemas de superação de
divergências quantitativas (continência e média aritmética), manifestando preferência pelo critério da continência
(Arbitragem e processo, p. 286-287). Apesar de afirmar ser “curial optar por um deles”, o autor não indica se essa
opção fica a critério dos árbitros ou se as partes podem, na convenção de arbitragem, estabelecer o método a ser
aplicável.

21 Sobre a evolução histórica dos Embargos Infringentes e sua transformação na técnica de julgamento do art. 942 do
CPC: ABBOUD, Georges; VAUGHN, Gustavo Favero. A técnica do julgamento estendido e a jurisprudência do STJ. In:
ALVIM, Teresa Arruda; KUKINA, Sérgio Luiz; OLIVEIRA, Pedro Miranda de; FREIRE, Alexandre (Coord.). O CPC de
2015 visto pelo STJ. (e-book). São Paulo: Ed. RT, 2021.

22 Também destacados por Georges Abboud e Gustavo Favero Vaughn (ob. cit., p. 729): RESP 1.846.670-PR, rel.
min. Herman Benjamin, 2ª Turma, j. 17.12.2019 e RESP 1.733.820-SC, rel. min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, j.
02.02.2018.

23 Carlos Alberto Carmona, ao tratar do tema antes do CPC de 2015, chega a cogitar da possibilidade de aplicação
do julgamento estendido à arbitragem, indicando que, entre as técnicas de superação de divergências qualitativas
existentes, as partes poderiam, em lugar da aplicação do “voto de minerva” do art. 24 da Lei de Arbitragem, optar pelo
julgamento estendido: “Ficará, assim, ao alvedrio dos contendentes acolher o critério legal (que incidirá desde que
nada seja previsto na convenção de arbitragem) ou estabelecer método diverso para solucionar o impasse decorrente
da ausência de maioria. Dentro os critérios alternativos sugeridos pela doutrina, parece melhor aquele que
determinaria a convocação de outros árbitros para integrarem o painel” (ob. cit., p. 287).

24 Nesse sentido, Cassio Scarpinella Bueno (Curso sistematizado de direito processual civil. v. II. p. 423), Anwar
Mohamad Ali (Técnica de julgamento estendido e a visão do Superior Tribunal de Justiça, p. 671).

25 CRUZ E TUCCI, José Rogério. Limites da devolução da matéria objeto da divergência no julgamento estendido.
Consultor Jurídico. 31.01.2017. Disponível em: [www.conjur.com.br/2017-jan-31/paradoxo-corte-limites-devolucao-
materia-divergente-julgamento-estendido]. Acesso em: jun. 2022.

26 Recurso Especial 1.771.815-SP, rel. min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 13.11.2018:
“Recurso Especial. Processo civil. Ação de prestação de contas. Apelação. Código de Processo Civil de 2015.
Julgamento não unânime. Técnica de ampliação do colegiado. Art. 942 do CPC/2015. Natureza jurídica. Técnica de
julgamento. Cabimento. Modificação de voto. Possibilidade. Nulidade. Não ocorrência.
[...]
2. Cinge-se a controvérsia a aferir, preliminarmente, se houve negativa de prestação jurisdicional. No mérito, o
propósito é definir a correta interpretação e a abrangência da técnica de ampliação de colegiado na hipótese de
julgamento não unânime, nos termos do art. 942 do CPC/2015.
[...]
8. Os novos julgadores convocados não ficam restritos aos capítulos ou pontos sobre os quais houve inicialmente
divergência, cabendo-lhes a apreciação da integralidade do recurso.
9. O prosseguimento do julgamento com quórum ampliado em caso de divergência tem por objetivo a qualificação do
debate, assegurando-se oportunidade para a análise aprofundada das teses jurídicas contrapostas e das questões
fáticas controvertidas, com vistas a criar e manter uma jurisprudência uniforme, estável, íntegra e coerente.”

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22/11/2023, 08:35 Envio | Revista dos Tribunais

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