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monástica ortodoxa
E. BEHR SIGEL,
(«La Igresia reza»- DDB. Pp. 9-48)
Tradução: Pe. André Sperandio
Fonte: Mercaba.org
Introdução
«A invocação do Nome de Jesus foi, no início, comum a todos, e segue sendo aceitável
a todos, acessível a todos» os que foram batizados em Cristo. Pode realmente então
reunir os cristãos, ainda dolorosamente divididos em outros planos institucionais ou
sacramentais. Levando ao aprofundamento do relacionamento do crente com a
pessoa divino-humana do Filho do Homem, a oração de Jesus, também nos introduz
nesta comunidade de pessoas in Christo per Spiritum Sanctum que os Padres
chamavam de »a comunhão dos santos».
A Oração de Jesus
«Sabei que a obra divina da santa oração espiritual foi a ocupação constante de
nossos antigos padres teóforos e que, como o sol, assim brilhou entre os monges em
inúmeros monastérios e eremitérios onde se vivia a vida comunitária, no Monte Sinai,
nos solitários do Egito e do deserto mítico, em Jerusalém e nos monastérios situados
ao redor desta cidade, em uma palavra, em todo o Oriente, em Constantinopla, no
Monte Athos, nas ilhas do arquipélago e, finalmente, nestes últimos tempos, pela
graça de Deus, na grande Rússia».
«Os Santos padres designam a esta santa oração de uma arte. A razão é que, penso
eu, assim como é impossível a alguém instruir-se em uma arte sem que receba lições
de um artista experiente, é igualmente impossível consagrar-se a esta 'obra espiritual'
sem a direção de um bom mestre».
A oração ativa
«Trabalhai até a exaustão. Esforçai-vos tanto quanto possível, mas a obra de vossa
salvação, esperai-a tão somente do Senhor... O Senhor deseja sempre tudo o que
aproveita para a nossa salvação e está pronto a nos conceder. Espera, tão somente,
que estejamos prontos e capacitados para receber os seus dons. Por isso, a pergunta:
-«como posso aprender a cuidar de minha alma? É substituída por esta outra: -
«Como posso estar sempre preparado para receber o poder da salvação que está
sempre pronto a descer do Senhor sobre nós»? E, eis aqui a resposta à esta pergunta:
abrir-se para a graça é «tornar-se vazio, desprovido de razão, sem força; é saber que
só o Senhor pode, quer e sabe como preencher este vazio» [8].
«Senhor Jesus Cristo, filho de Deus, tem piedade de mim, pecador» [11].
«Um dia bem cedinho, eu acordei, ou melhor, fui acordado pela oração. Comecei a
recitar as orações da manhã. Mas minha língua emperrava e eu só tinha vontade de
rezar a oração de Jesus. Comecei então a rezá-la. Senti-me logo muito feliz; meus
lábios se moviam espontaneamente e sem esforço. Passei o dia todo muito alegre. Eu
me sentia como que afastado de tudo e em um outro mundo...»
«Passei todo o verão a rezar sem parar a oração de Jesus e me senti totalmente
tranquilo. Durante o sono, até sonhava que estava recitando a oração de Jesus. E
durante o dia, quando me acontecia encontrar alguém, todos me pareciam tão
amáveis como se fossem da minha própria família. Os meus pensamentos se tinham
apaziguado e eu só vivía com a oração. Inclinava meu espírito a escutar e, às vezes,
meu coração sentia brotar de si como que um calor e uma grande alegria».
«É assim que vou agora, rezando sem parar a oração de Jesus que me é mais doce e
querida do que tudo no mundo. Às vezes, faço mais de setenta quilômetros por dia e
não sinto que estou caminhando; sinto somente que rezo. Quando me pega um frio
muito forte, eu rezo com mais atenção e logo me esquento. Se a fome aperta, eu
invoco mais vezes o nome de Jesus Cristo e me esqueço que estava com fome. Se me
sinto doente, com dor nas costas ou nas pernas, eu me concentro na oração e não
sinto mais dor. Se alguém me ofende, eu só penso na oração de Jesus tão benfazeja;
imediatamente desaparecem a raiva ou o sofrimento e me esqueço de tudo. Meu
espírito se tornou muito simples. Não me preocupo com nada, não me prendem as
coisas exteriores; eu gostaria de ficar sempre na solidão. Por hábito, só tenho agora
uma necessidade: recitar a oração sem parar. E quando faço isso, me sinto inundado
de alegria».
«Quando o Senhor acalenta o teu coração com o calor da sua graça e te restabelece
na unidade de teu espírito, literalmente, quando te reúne em um só espírito, então,
esta oração ininterrupta brota em ti. Permanece sempre contigo, e tu te deleitarás
com ela, e ela te alimentará» [37].
«É falso pensar que para realizar a oração espiritual é preciso estar sentado em um
lugar secreto e ali contemplar Deus. Não é necessário esconder-se em algum lugar
para orar mais do que no próprio coração, e fixando-se nele, ver o Senhor sentado à
nossa direita, como o fez David» [41].
«Olha o que te diria, a propósito do pobre Serafim [45], disse-me o starets: um dia,
lendo o Evangelho de São João estas palavras do Salvador: 'na casa do meu Pai há
muitas moradas', invadiu-me o desejo intenso de ver estas moradas. Passei cinco dias
e cinco noites em vigília e oração, pedindo ao Senhor a graça desta visão. E o senhor,
em sua infinita misericórdia, concedeu-me este consolo e me mostrou estas celestiais
moradas nas quais vi resplandecer, eu, pobre viajante terrestre, em um minuto de
êxtase (se foi no corpo ou fora do corpo, não sei), uma beleza celestial inefável... O
Padre Serafim ficou em silêncio. Em seguida, inclinou ligeiramente, baixou a cabeça
fechando os olhos, pondo sua mão direita sobre o coração. Seu rosto ia pouco a
pouco se transfigurando e irradiando uma luz maravilhosa; finalmente, pôs-se a
olhar, já que seu rosto e toda a sua expressão estavam tão cheios de alegria e êxtase
celestial que realmente se poderia chama-lo de anjo terrestre ou homem celestial.
Durante todo o tempo que durou seu misterioso silêncio, parecia contemplar algo
com ternura e escutar em êxtase...»
NOTAS
[1] O Starets Paisios, grande incentivador da «Oração de Jesus» nos meios monásticos eslavo e
romeno, a designa com estes termos: «Oração a Jesus, realizada pela inteligência no coração».
[2] Termo que designa a prática da «Oração de Jesus» em particular, sob a forma que assum iu nos
séculos XIV e XV entre os Hesicastas (solitários) do monte Athos.
[5] (A veneração pelo Nome de Jesus é também antiga na Igreja cristã. Tem suas raízes na piedade
popular da Antiga Aliança pelo nome de Yahvé. Encontrou sua expressão perfeita nas palavras de São
Paulo: «Por isso, também Deus o exaltou soberanamente, e lhe deu um nome que é sobre todo o nome;
Para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da
terra, e toda a língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai» (Fp 2,9-11).
[5] «Convém baixar do cérebro ao coração. De momento não há em ti nada mais que reflexões
cerebrais sobre Deus; Deus, porém, deixas do lado de fora». (Bispo TEÓFANO, Entretiens, p. 58).
[6] Traduzimos por «espontâneo» o termo russo «samodwiznaia» que quer dizer exatamente «o que se
move a si mesmo», mas que poderia ser mal traduzido neste contexto por «automático». Significa aqui
um surto sem esforço em oposição ao que é fruto de um penoso esforço da vontade.
[7] Entretiens, p. 395.
[7] No entanto, ocorre em todos os mestres russos da «oração espiritual», embora todos eles tenham
sido na sua maioria grandes ascetas, uma certa desconfiança do ascetismo puramente exterior. Assim,
Teófanes, o Recluso, vai escrever: «Prestai a menor atenção possível às manifestações exteriores do
ascetismo. São certamente necessários. Mas são apenas os andaimes, não o prédio. O edifício está
localizado no coração. Coloquem vossa atenção inteiramente no trabalho do coração».
[8] Entretiens, p. 389. Em outra parte, Teófano, o Recluso escreve: «.... Ancorar tua esperança, ainda
que apenas por um fio de cabelo, a algum trabalho pessoal, é desviar-te do caminho reto. Se te retiras à
solidão pensando que, graças às tuas meditações, às tuas rezas, às tuas vigílias noturnas, tudo vai
mudar, o Senhor, a propósito, não te concederá a graça prometida até que seja dissipada qualquer
esperança em teu próprio esforço, em tuas obras, embora seja verdade que sem elas não podes
receber nada» (Entretiens, p. 379).
[9] Damos a esta palavra um sentido geral, e não especificamente monástico.
[10] P. VELITCHKOVSKI em Entretiens p. 295. O starets Paisios admite, no entanto, que a falta de um
bom pai espiritual, pode servir de guia a Sagrada Escritura.
[11] Eis um conselho dado pelo starets ao autor de Récits d'un pélerin russe: «Deves aceitar este
mandato com confiança e recitar quantas vezes possas a Oração de Jesus. Tome este rosário com o
qual poderás fazer, a princípio, três mil orações diárias. De pé, sentado, deitado ou andando, repete
incessantemente: «Senhor Jesus Cristo, tem piedade de mim!», devagar e sem pressa. E recita três mil
orações por dia sem acrescentar ou retirar nenhuma. Assim chegarás à atividade perpétua do coração».
(Recits d'un pélerin russe, trad. J. GAUVAIN, p. 29-30). Há que se observar a importância dada à
obediência estrita ao starets. A recomendação de recitar a oração três mil vezes, não tem outro sentido.
[12] C. CETWERICON: Paisi Velitchkovski, T. 11, p. 89-90.
[13] Entretiens, p. 359.
[14] I. HAUSHERR, La Méthode d'oraison hésychaste, p. 102 e ss.
[15] O starets Paisios, em suas Chapitres sur la Priére se contenta com reproduzir sem comentário o
texto de «methodos» atribuída sem dúvida falsamente a Simeão, o Novo Teólogo. Teófano, por sua vez,
tem uma atitude mais crítica (Cf. Entretiens, p. 339, 340, 328, 327). Fala da técnica como de um refúgio
para aqueles que se «endureceram num formalismo exterior». Entretanto, admite que como
consequência da união da alma com o corpo, as atitudes corporais têm sua influência sobre a atenção
do espírito.
[16] Cf. Entretiens, p. 79
[17] Cf. Entretiens, p. 59
[18] Cf. V. LOSSKY, La Théologie Mystique de l'Eglise d'Orient, p. 197 (París, Aubier 1944).
[19] A palavra «sobriedade», é característica de uma mística que exclui todo colorido, toda exaltação
puramente psicológica, toda voluptuosidade e toda imagem humana.
[20] SERAFIM DE SAROV Entretien avec Motovilov, p. 214 (Collection «Spiritualité Orientale nº. 11). Cf
TEOFANO O RECLUSO: «En el corazón está la Vida y allí también es conveniente vivir». Entretiens, p.
58.
[21] Cf. V. LOSSKY, o. cit. p. 198
[22] Ibid. p. 197.
[23] S. Macário, Hom. Spirit. XV, 32 P.G., t. 34, col. 597 B.
[24] Teofano, o Recluso, Entretiens, p. 59 e ss.
[25] Teofano, o Recluso, Entretiens, p. 58.
[26] Serafim de Sarov, Instr. Sprit, p. 239.
[27] Serafim de Sarov, sa vie, p. 49.
[28] Seraphim de Sarov, sa vie, p. 48
[29] Ibid. p. 49
[30] Ibid. p. 48
[31] Teofano o Recluso, Entretiens, p. 70
[32] Entretiens, p. 419.
[33] Cf. Evangile selon Saint Jean, 5, 2-4.
[34] Serafim De Sarov.
[35] Teófano o Recluso. Citado en Entretiens., p. 97.
[36] Récits d'un pélerin russe, p. 31-32, 33, 34-35.
[37] Cf Teofano o Recluso, em Entretiens., p. 391.
[38] Ibid., p. 421.
[39] Ibid.. p. 299.
[40] Serafim de Sarov, p. 253-255.
[41] Entretiens, p. 349.
[42] Serafim De Sarov, Instructions spirituelles, p. 239.
[43] «Em meu coração, só no pensamento, orei: ‘Senhor, faz-me digno de ver claramente, com os olhos
de carne, a descida do Espírito Santo, como aos teus servos eleitos quando te dignaste aparecer a eles
no esplendor da tua glória!». Serafim de Sarov, p. 209.
[44] Serafim De Sarov, Entretien avec Motovilov, p. 190.
[45] O santo, como fazia habitualmente, fala de si mesmo em terceira pessoa.
[46] Cf. o relato da transfiguração em V. LOSSKY: Essai sur la Theologie mistique de l'Eglise d'Orient, p.
225 ss., París, Aubier 1945.
[47] Há que notar, no entanto, que nas experiências aqui descritas, o espírito do homem, mesmo
estando ciente de participar da Vida Divina, não perde, no entanto, a consciência pessoal que, não só
não é aniquilada, mas adquire, pelo contrário, uma lucidez sobrenatural.