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Descentralização e endividamento municipal: formas, limites e


possibilidades [Decentralization and municipal indebtedness: modes,
constraints, and possibilities]

Article in Nova Economia · January 2002


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Amaury Patrick Gremaud Rudinei Toneto Jr


University of São Paulo University of São Paulo
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Descentralização e endividamento municipal:
formas, limites e possibilidades

Amaury Patrick Gremaud


Professor do Departamento de Economia da FEA-RP
Universidade de São Paulo
Rudinei Toneto Jr
Professor do Departamento de Economia da FEA-RP
Universidade de São Paulo

Palavras-chave Resumo Abstract


endividamento municipal, O principal objetivo do artigo é discutir alter- The objective of this article is to discuss
project finance, descentralização. nativas de financiamento para os investimen- alternatives to finance investments by
Classificação JEL H74
tos sob responsabilidade das prefeituras mu- municipalities. In general, current revenues are
nicipais. Em geral, as receitas correntes são insufficient to finance large investments, what
insuficientes para financiar grandes investi- brings about the necessity of municipal
mentos, o que traz à tona a questão do endi- indebtedness. These could assume different
vidamento municipal. A forma que este pode manners, according to the nature of the
assumir difere de acordo com a natureza do investment: if it is typically public or if it offers
investimento, se é tipicamente público ou se private return. For the first case, we discuss the
oferece condições de rentabilidade privada. possibilities of a municipal bond market and,
Key words Para o primeiro caso discute-se aqui a possi- for the second, we discuss project finance and the
municipal debt, project finance, bilidade de um mercado de títulos públicos participation of the private sector.
descentralization. municipais e para o segundo debate-se o pro-
ject finance e a necessidade de participação do
JEL Classification H74 setor privado.

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110 Descentralização e endividamento municipal

1_ Os municípios É bem verdade que, nos últimos


e a questão dos investimentos anos, esta tendência foi contrarrestada
No período recente, a economia brasileira por um aumento das receitas da União
enfrentou uma série de transformações por meio de contribuições sociais e ou-
relacionadas tanto à forma de inserção in- tros impostos em cascata (com a corres-
ternacional do país quanto ao papel do pondente perda de qualidade do sistema
Estado na economia e à inter-relação en- tributário brasileiro). Os estados apresen-
tre as diferentes esferas de governo. Gran- taram queda na participação sobre as re-
de parte das mudanças veio em decor- ceitas e os municípios conseguiram man-
rência de uma profunda crise econômica ter a sua participação. É interessante no-
que pode ser explicada pelo esgotamento tar que, em termos relativos, houve que-
da capacidade financeira do setor público, da das transferências em função, espe-
atingindo a capacidade de atuação do Es- cialmente, da diminuição do ritmo da ati-
tado em termos de desenvolvimento. vidade econômica, de modo que a pre-
A crise financeira do setor público servação da receita de governos sub-na-
afetou diretamente as políticas federais cionais fez-se com um esforço fiscal sig-
vinculadas à questão urbana. Isto ocor- nificativo. Esse esforço, porém, não foi
reu em função: igualmente distribuído entre os entes fe-
i. da deterioração do conjunto de derativos (Afonso, et al., 1998).
fundos de poupança compulsó- Neste ponto, deve-se notar que a
ria, como o FGTS, com as maio- forma assumida pela descentralização bra-
res facilidades de saque, o não- sileira dos anos 80 – o aumento das trans-
retorno dos projetos financiados ferências – criou uma série de dificulda-
e a precarização das relações de des para o equilíbrio federativo. O meca-
trabalho, que diminuíram o flu- nismo de transferência federal (fundos
xo de recursos para o fundo; de participação) foi criado com o objeti-
ii. do acirramento da crise ter ocorri- vo de compensar as unidades federadas
do em um momento de demo- que possuíam menor capacidade de arre-
cratização, com o atendimento cadação, ou seja, são direcionados princi-
às pressões sociais reprimidas e à palmente para os municípios com menor
ampliação da autonomia finan- população. Em tais municípios, as de-
ceira de estados e municípios. mandas em termos de desenvolvimento

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urbano são significativamente inferiores a ser resolvido na estrutura federativa


àquelas dos municípios com maior densi- brasileira, antes do desequilíbrio vertical,
dade demográfica. Assim, passou a exis- é o seu desequilíbrio horizontal1 (Resen-
tir “sobra” de recursos nos municípios de, 1998).
menores, que não precisavam se preocu- Desta forma, os municípios, espe-
par com a arrecadação própria e aumen- cialmente os de maior porte, estão assu-
taram as despesas de custeio. Por outro mindo um leque de funções – provisão
lado, houve uma escassez nos municípios de serviços públicos, infra-estrutura e de-
maiores. senvolvimento urbano, políticas de com-
Houve um processo ex-post de des- bate à pobreza e geração de emprego,
centralização dos gastos com os governos políticas de desenvolvimento etc. – sem
subnacionais assumindo novas responsa- que seus orçamentos suportem estas pres-
bilidades. A desarticulação na questão re- sões, uma vez que estão comprometidos
ferente ao desenvolvimento urbano e a pelo significativo aumento dos gastos de
crise de emprego na economia brasileira, custeio pós-Constituição.2 Algumas ex-
com a ausência de políticas de crescimen- periências municipais mostram que é pos-
to executadas pelo Governo Federal, co- sível, com base em algumas instituições
1 O desequilíbrio vertical locaram pressões adicionais nos governos que estão sendo criadas, potencializar a
ocorre entre as diferentes estaduais e municipais, que estimularam a eficiência da alocação dos recursos e dos
instâncias (Federal, Estadual, guerra fiscal. serviços municipais, de modo que estes
Municipal), quando algum A redistribuição de receita, como possam atuar de forma mais eficaz no de-
nível tenha falta de recursos
frente a suas despesas e em dissemos, não ocorreu no sentido de di- senvolvimento econômico e social. En-
outro o inverso. O recioná-la, necessariamente, para os mu- tre os programas e ações bem sucedidas
desequilíbrio horizontal se dá nicípios e regiões em que as demandas pode-se destacar algumas experiências com
entre as unidades que compõem
sociais por serviços e investimentos eram orçamento participativo, renda mínima,
uma instância. É a situação em
que, em alguns municípios (ou mais intensas. A metropolização da po- parcerias público-privado na provisão de
estados), haja falta de recursos breza intensifica ainda mais este ponto, já serviços públicos, fundos de desenvolvi-
frente às suas atribuições e em que amplia as demandas sociais assumi- mento municipal/regional, instituições de
outros ocorra o inverso.
das pelas metrópoles e diminui a capaci- microcrédito etc.
2 Em alguns casos também

existem fortes pressões


dade relativa de gerar renda própria por É possível pensar que a articula-
financeiras em função da meio de taxas e impostos. Tendo em vis- ção deste conjunto de iniciativas gere
elevação dos juros. ta o exposto, um dos pontos mais difíceis um novo tipo de gestão municipal mais

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eficiente, democrática e social; isto é, um A principal justificativa no que


sistema em que a sociedade participe na tange ao endividamento para fins de in-
decisão sobre a alocação dos recursos vestimento é a eficiência alocativa no lon-
públicos e que estes possibilitem a ala- go prazo. De modo geral, o acesso ao
vancagem de uma maior massa de recur- mercado financeiro aumenta a eficiência
sos que possa ser aplicada no desen- econômica ao melhorar a alocação de re-
volvimento econômico e social dos mu- cursos, tanto em termos intertemporais
nicípios. Isto, em conjunto com a escas- como setoriais. O endividamento é uma
sez de recursos e a busca de eficiência, forma adequada de financiar as despesas
remete à questão da participação do se- de capital, uma vez que os benefícios des-
tor privado e à ampliação das despesas te tipo de despesa estão distribuídos ao
de capital, o que traz à tona a questão do longo do tempo e a dívida permite distri-
endividamento municipal. buir também seu custo ao longo do tem-
po, gerando assim eficiência em termos
inter-geracionais, ou seja, possibilitando
2_ O endividamento sub-nacional: a compatibilização do período de con-
justificativas e problemas sumo do serviço com o de pagamento.
O crescimento das despesas de capital, As críticas ao endividamento mu-
especialmente nos municípios de maior nicipal são de duas ordens:
porte e as dificuldades para financiá-lo,
dado que não é o único gasto que cresceu i. restrição à condução eficiente da
no período recente, remete-nos à questão gestão macroeconômica da União;
do endividamento municipal. ii. utilização política com despesas
A possibilidade de endividamento eleitoreiras, deixando os encar-
pode ser justificada por uma série de ar- gos para os mandatários futuros.
gumentos: aumentar a flexibilidade orça- O primeiro aspecto envolve um
mentária, melhorar a gestão financeira, problema mais complexo que é a relação
possibilitar a antecipação de receitas e a entre descentralização e a função estabiliza-
continuidade das despesas, especialmen- dora do governo. Nos livros-texto con-
te quando houver forte sazonalidade nas vencionais (Musgrave e Musgrave, 1980 e
receitas – o acesso ao mercado financeiro Stiglitz, 2000), a função estabilizadora do
possibilitaria uma distribuição equânime governo é atribuída às instâncias centrais.
da mesma ao longo do ano. Existem, para tanto, uma série de argu-

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mentos (Oates, 1972):3 se a moeda é emiti- das esferas sub-nacionais estão inspira-
da centralmente e a política monetária é das nesse ponto de vista.
responsabilidade federal, a política fiscal, Contudo, merece destaque o fato
uma vez que está entrelaçada com a mone- de que, em alguns países, programas bem
tária, também deve ser centralizada. Outra conduzidos de descentralização têm au-
forma de colocar o argumento, é que o ris- xiliado na manutenção de políticas ma-
co de monetização dos déficits fiscais de croeconômicas estáveis, dados os ganhos
governos sub-nacionais pode colocar em de responsabilidade e de eficiência na
dificuldade a capacidade do Banco Central gestão dos recursos alcançados nestas
de realizar plenamente suas funções de ad- experiências. Não se pode dizer que paí-
ministrador da moeda nacional. ses como a Suíça e o Canadá tenham gra-
As dificuldades das políticas de es- ves problemas macroeconômicos em fun-
tabilização dos países da América Latina ção de sua elevada descentralização. Por
são sempre referidas para validar as teses outro lado, a unificação monetária euro-
acima mencionadas,4 especialmente le- péia recolocou a mesma discussão (Hem-
vando em consideração as liberdades en- ming e Spahn, 1997), porém em outro
tão existentes quanto ao endividamento contexto: até que ponto é possível ter
sub-nacional.5 Não é sem razão que as uma política monetária européia unifica-
propostas e medidas recentes de reforma da, dando forte autonomia aos países da
fiscal atuam em sentido inverso, isto é, coalizão? Em que medida deve-se impe-
mesmo sem modificar os recursos possu-
dir os diferentes governos europeus de
ídos pelos diferentes níveis governamen-
tomarem recursos empestados? A res-
tais, diminuem a capacidade dos mesmos
posta até aqui é que é possível este par,
em determinar impostos e em tomar em-
ou seja, pode-se unificar a política mone-
préstimos. A própria Lei de Responsabi-
tária e cambial dos países e manter um
lidade Fiscal no Brasil e as diferentes re-
alto nível de descentralização (autono-
gras quanto ao gasto e endividamento
mia), inclusive com endividamento dos
3 Mais recentemente ver Tanzi 5 Tanto por meio dos países membros.
(1996) e Prud´homme (1995) bancos públicos estaduais Assim, surgiu uma série de novos
4 Ver por exemplo quanto no próprio mercado elementos, recolocando em discussão al-
Prud´homme (1995), Banco privado.
guns aspectos teóricos que balizavam a
Mundial (1999) e Burki, Perry
& Dillinger (1999). postura de incompatibilidade entre a des-

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centralização e a estabilização. Neste sen- 3_ As formas de endividamento


tido, consagra-se a idéia de que houve na municipal: modelos e requisitos
literatura uma superestimativa da neces- Várias são as modalidades de endivida-
sidade de centralização das políticas ma- mento, dependendo de sua motivação.
croeconômicas. Esta decorre de diversos Quando o endividamento visa a dessazo-
aspectos (Spahn, 1998): nalização das receitas, as principais mo-
i. das hipóteses de choques regio- dalidades de empréstimo são: antecipa-
nalmente simétricos e de econo- ções de receitas, emissão de títulos de
mias fechadas; curto prazo e acordos de postergação de
ii. da assunção de mercados de capi- pagamentos. Quanto ao financiamento
tais segmentados e de comporta- dos investimentos, deve-se fazer a distin-
mento não-cooperativo das esfe- ção entre aqueles cujo retorno da opera-
ras sub-nacionais; ção pode gerar receita, para cobrir tanto
iii. do desprezo quanto aos efeitos os custos operacionais como o custo de
“supply side” da política fiscal; capital, por meio da cobrança de taxas ou
iv. do desprezo pela possibilidade de impostos específicos, de acordo com o
construção de instituições e re- princípio do benefício; e aqueles cujo ob-
gras que provoquem automatica- jetivo é prover um bem público, o qual
mente a estabilização. não gerará uma receita futura claramente
Existe assim uma revisão das pos- atribuível a tal investimento.
turas mais críticas, procurando mostrar Neste último caso o financiamen-
que não-necessariamente o controle ma- to faz-se de duas maneiras básicas: em-
croeconômico do país estaria sub judicie préstimos junto às instituições finan-
se fosse possível às instâncias sub-nacio- ceiras ou colocação de títulos no merca-
6 Entende-se por restrição
nais tomarem empréstimos, desde que do. As possibilidades são diversificadas:
orçamentária rígida o fato do
se construísse um aparato institucional endividamento com base em garantias
ente sub-nacional ter suas
compatível. Este aparato institucional reais ou não, com vinculação às receitas fontes de receitas e suas
pode assumir diferentes formas, contu- específicas etc. Já no caso de investimen- atribuições claramente
tos que geram receitas próprias, existem definidas e não ser possível
do a idéia de que é necessária uma “res- mudanças nestes pontos, nem
trição orçamentária rígida”6 para os en- outras formas de financiamento: securi- negociações freqüentes
tes sub-nacionais ganha destaque (Ter- tização de restituíveis e financiamento transferindo receitas e
Minassian, 1997). de projeto (project finance). Nestes últi- despesas entre os entes.

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mos, evita-se que riscos associados ao tâncias governamentais, de modo que os


projeto comprometam, no futuro, o or- governos locais operem sob uma restri-
çamento municipal, ou que desequilíbri- ção orçamentária rígida. Em relação às
os fiscais comprometam os pagamentos receitas, é importante que haja uma defi-
do projeto. No segundo caso, deve-se nição clara das regras de repartição das
ter em mente que, uma despesa de capi- receitas entre as esferas de governo, in-
tal hoje, financiada com endividamento, clusive com regras definidas e estáveis de
gerará no futuro tanto as despesas finan- transferência de recursos entre as esferas,
ceiras como, em alguns casos, o cresci- além de se racionalizar os sistemas tribu-
mento das despesas de custeio da pre- tários locais, estimulando a ampliação da
feitura, sendo o volume do endivida- arrecadação própria e a eficiência na arre-
mento limitado pelo crescimento da re- cadação.8
ceita líquida futura. Este ponto é fundamental para
Passaremos a discutir dois dos ca- que seja possível uma avaliação da sol-
sos acima levantados: a formação de um vência da municipalidade e dos riscos
mercado de títulos municipais e os project associados aos títulos, possibilitando a
finance. A discussão se fará particularmen- sua colocação em condições razoáveis e
7 Chamamos de título
te sobre os requisitos necessários para com a transparência requerida para que
genérico àqueles que não são
vinculados legalmente a um que estes possam vir a se tornar possibili- um mercado possa efetivamente ser cons-
tipo específico de gasto ou dades efetivas de obtenção de recursos tituído. Sem esta definição a possibilida-
que não tenham uma fonte por parte dos municípios brasileiros. de da emissão dos títulos se resumiria a
específica de renda do
poucas operações, não constituindo efe-
município atrelada a este
título, como garantia, 3.1_ O mercado de títulos municipais tivamente um mercado; além do mais,
por exemplo.
3.1.1_ Alguns requisitos para a existência
boa parte destas emissões ou serão rela-
8 Deve-se destacar que um
de um mercado tivas às operações determinadas da mu-
conjunto de avanços estão nicipalidade com recursos para seus pa-
A grande dificuldade para que se forme
sendo alcançados nas
administrações tributárias no mercado de capitais um mercado de gamentos também especificados, ou se
municipais, em especial títulos municipais genéricos7 é o fato das constituirão em uma espécie de merca-
devido à utilização dos competências e responsabilidades dos go- do sombrio, deixando muitas dúvidas
recursos do PMAT
vernos locais não estarem definidas com sobre a lisura dos processos.
(Programa de Modernização
da Administração Tributária) clareza. A questão central é o estabeleci- Ainda dentro do mesmo contexto
do BNDES. mento de relações entre as diferentes ins- – a possibilidade do estabelecimento das

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relações risco-retorno por parte do inves- instituições é a possibilidade de ampliar


tidor potencial – os governos locais de- ainda mais a incerteza no mercado se
vem ter processos eficientes e transpa- houver a emissão de sinais confusos. Isso
rentes para a elaboração orçamentária e é bastante comum no início do estabele-
sistemas confiáveis de acompanhamento cimento de tais mercados, especialmente
das contas públicas, inclusive com recur- quando não há qualquer tipo de mecanis-
so às auditorias externas. Para tal, deve-se mo (auto)regulador entre os agentes, que
criar padrões para disponibilizar infor- estabeleça um conjunto de diretrizes mí-
mações que possibilitem a avaliação de nimas. Estas deveriam promover a pa-
riscos pelos investidores. Neste sentido é dronização dos procedimentos e das in-
desejável, inclusive, o desenvolvimento formações das municipalidades.
de indicadores financeiros para as prefei- Estes pontos são importantes não
turas. Além disto, as prefeituras devem apenas no lançamento primário dos títu-
possuir sistemas adequados de gestão los, novamente impedindo que a operação
dos ativos e passivos e da liquidez, além se constitua numa transação a portas fechadas,
de outros instrumentos de planejamento mas também para a viabilização do merca-
financeiro e orçamentário (custeio e capi- do secundário destes títulos, diminuindo
tal). É importante que haja uma harmoni- os custos para a municipalidade com a
zação destes sistemas de informações e ampliação da liquidez dos títulos.10
que eles se adeqüem não apenas às verifi- Outro elemento importante neste
cações atualmente feitas pelo ministério quadro é a capacitação dos quadros mu-
público ou pelo poder legislativo e tribu- nicipais. Deve existir um corpo funcional
nais de conta, mas que passem a ser com- apto a realizar os serviços requeridos
preensíveis aos olhos dos investidores.9 para a captação dos recursos, os quais
9 No caso de emissões em
As agências de rating ganham im- não se resumem aos procedimentos con-
mercados internacionais
portância exatamente nos elementos an- tábeis, mas também a todo trabalho de alguma adequação frente às
teriormente levantados. Dadas as dificul- preparação, formatação e colocação dos práticas internacionais,
dades de processamento de informações títulos no mercado. Apesar de não se respeitando a legislação
nacional, também é requerida.
relativas à análise de risco e preço dos tí- prescindir das figuras das assessorias es-
10 Para aumentar a liquidez e
tulos, as agências diminuíram o custo de pecializadas nestas atividades, em alguns reduzir os custos desta
obtenção destas informações por parte casos estas se tornam fonte de suspeitas e operação é possível conceder
dos investidores. Um problema com tais dúvidas. Com o intuito de diminuir os isenção de impostos.

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custos na colocação dos títulos e forne- se regular estas emissões de títulos (ou
cer maior transparência, parece interes- mesmo todo o endividamento dos mu-
sante a criação de um organismo espe- nicípios). Desta forma temos diferentes
cífico que atue com títulos sub-nacionais, “modelos” reguladores que vão desde o
que promova uma padronização mínima, empecilho completo ao lançamento de tí-
estabeleça diretrizes para a preparação e a tulos por parte dos governos sub-nacio-
própria colocação dos títulos, faça a cus- nais, até a total liberdade, deixando ao
tódia e a liquidação, dando transparência mercado e sua auto-regulação o controle
ao mercado. O objetivo deste organismo sobre o endividamento municipal.
é múltiplo, mas parece fundamental a Dentro de um modelo em que exis-
idéia de existirem referenciais de preço te completa liberdade de lançamento de tí-
para o mercado, de modo a permitir a tulos, a regulação far-se-ia pelo próprio
avaliação das diferentes emissões. mercado,12 basicamente com os investido-
3.1.2_ Os modelos de controle de endividamento 11
res recusando-se a financiar o lançamento
Como frisamos anteriormente, a possi- de títulos muito arriscados, sendo que este
bilidade de descontrole das políticas de risco poderia vir do volume excessivo de
estabilização e os riscos de uso político colocações da municipalidade, inviabilizan-
do endividamento traz a necessidade de do a solvência da mesma no longo prazo.
Dois requisitos parecem importantes neste
caso, além das observações feitas no item
11 Ver Ter-Minassian (1999). 15 Um elemento importante
anterior:13 de um lado, o mercado de capi-
12 Pode-se citar como que faz parte da restrição
exemplos de países que em orçamentária rígida é o tais deve ser livre, relativamente aberto e
parte adotam este sistema: não-socorro do Governo estar bem desenvolvido a fim de que efeti-
Finlândia, Portugal, Canadá Federal, ou que este socorro vamente o seu poder de auto-disciplina se
para suas Provincias e, de esteja previsto e ocorra com efetive;14 de outro, regras claras de procedi-
certa maneira, o próprio Brasil regras preestabelecidas e
em alguns momentos disponíveis a todos os mento quanto ao default das municipalida-
13 Especialmente as relativas à municípios. des, tais como execução de garantias e leis
disponibilidade de informações 16 Temos aqui como exemplo de falência municipal.15
e às operações de bailing-out. os Estados Unidos e a Itália e Outro modelo possível é o estabe-
14 A obrigatoriedade de também a Lei de
lecimento por parte do Governo Federal
aquisição de títulos públicos Responsabilidade Fiscal e das
sobre os agentes não parece resoluções do Senado de regras sobre o endividamento munici-
ser aqui uma boa prática. brasileiro sobre o tema. pal.16 Neste caso também existem várias

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118 Descentralização e endividamento municipal

possibilidades, dependendo de qual seja dem ocorrer mudanças no quadro ma-


o objetivo do controle e quais os instru- croeconômico do país que tornam deter-
mentos disponíveis. Assim podem ser es- minadas regras muito duras (ou muito
tabelecidos limites sobre o montante do flexíveis), colocando em xeque os pró-
endividamento, seja em termos absolutos prios endividamentos, perdendo as suas
ou relativos (porcentagem sobre o PIB, vantagens, ou a própria estabilização se
sobre o volume de receitas etc.), podem as regras se tornarem inócuas.
ser também estabelecidos limites acerca Uma alternativa a este ponto é per-
do comprometimento que o endivida- mitir algum grau de reestruturação das
mento causa em termos de gastos futuros regras, toda vez que as condições (ou os
(limites de juros e amortizações a serem objetivos) tenham se alterado.17 Evita-se
pagos frente ao total de gastos) e, tam- a inflexibilidade, mas requer-se um alto
bém, pode-se limitar as modalidades de grau de cooperação entre as unidades e
endividamento (impedir endividamento um efetivo comprometimento com a dis-
com comprometimento cambial ou per- ciplina fiscal.18 O risco está em tornar tais
mitir apenas títulos com vistas a projetos revisões sistemáticas, politicamente de-
específicos). terminadas e no limite fazendo com que
Obviamente, a dificuldade deste as regras fossem definidas caso a caso,
modelo é a capacidade das instâncias fe- deixando efetivamente de existirem re- 17 Ao invés de regras

derais em efetivamente fazerem as regras gras. Porém em condições institucionais pré-estabelecidas temos um
endividamento coordenado
serem cumpridas. Os sistemas de conta- onde a cooperação é incentivada, os re- entre as esferas (Ter-Minassian,
bilidade e informação também devem ser sultados podem ser superiores ao de um 1999). Como exemplos
claros e transparentes e a possibilidade de modelo de regras definidas. internacionais temos: Austrália,
utilização de truques contábeis para fugir Um último modelo possível é o África do Sul, Bélgica,
Dinamarca, entre outros.
às regras deve ser mínima. O maior pro- controle direto,19 em que todo endivida- 18 Os governos subnacionais
blema deste modelo é a inflexibilidade. mento deve ser autorizado por parte do neste modelo devem estar
Esta pode ser vista de duas óticas: de um Governo Federal ou, no limite, nenhum ativamente envolvidos no
lado, as regras são impostas dando trata- endividamento é autorizado. processo de formulação dos
mento pouco diferenciado aos municípi- Podemos, para encerrar, levantar objetivos macroeconômicos
do país e dos parâmetros
os, que possuem realidades diferentes, um aspecto importante que poderia fazer fiscais subjacentes.
assim podemos voltar à situação de dese- parte dos modelos de controle sobre o 19 Ocorre na Áustria, Grécia,

quilíbrio horizontal; por outro lado, po- endividamento: é o seu controle social. Noruega e Espanha.

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Ou seja, para efetivamente existir o lan- imposição de regras orçamentárias e de


çamento de uma emissão esta decisão de- apresentação de contas e resultados que,
veria ser tomada apenas após a auto- além de homogeneizar as contas munici-
rização popular que poderia ser represen- pais, dão a elas maior transparência, ele-
tada não apenas pelo corpo legislativo, mento fundamental para a constituição
mas também por algum tipo de participa- de um mercado de títulos municipais que
ção popular direta, como um plebiscito funcione de modo limpo.
(ou referendum). Este tipo de ação não ape-
nas amplia o poder de decisão da popula- 3.2_ O “project finance”
ção e a transparência do procedimento, As instâncias municipais estão sendo ca-
diminuindo a utilização eleitoreira dos da vez mais pressionados para realizarem
empréstimos, como também aumenta a investimentos em infra-estrutura urbana.
responsabilização dos cidadãos frente às Destacamos a existência de dois tipos de
questões da municipalidade. investimento: aqueles que, apesar de pos-
Cumpre destacar ainda aqui que, suírem retorno social adequado, não apre-
para o caso brasileiro, a Lei de Responsa- sentam retorno privado adequado (o ca-
bilidade Fiscal (LRF) e as Resoluções de so típico de bens públicos) e aqueles que
n.os 40 e 43 do Senado brasileiro tocam possuem retorno no sentido privado. Os
diretamente nestes pontos. Por um lado, investimentos do segundo tipo podem
impõe-se a metodologia dos limites de ser atraentes para o setor privado e terem
endividamento (limites relativos à receita financiamento diferente do endividamen-
corrente líquida), deixando antever pro- to municipal discutido acima. Uma mo-
blemas relativos à magnitude e homoge- dalidade possível para ser utilizada nestes
neidade dos limites frente à heterogenei- casos é o chamado project finance.
dade dos municípios e de sua evolução. 3.2.1_ Definições, características e modalidades 20
Por outro lado, porém, especialmente com O project finance, cuja tradução correspon-
a LRF, pode-se pensar de maneira mais de ao financiamento de um projeto espe-
clara na efetiva montagem de um merca- cífico, não se limita a esta definição, mas
do de títulos, pois a referida lei avança em envolve uma ampla engenharia financeira
20 Sobre a montagem de um
project finance ver Ferreira
dois pontos fundamentais para tal: a im- de adequação do perfil de risco do proje-
(1996), Finnerty (1998) e posição de regras que se aproximam da to aos padrões suportáveis por patrocina-
Bonomi e Malvessi (2002). idéia de restrição orçamentária rígida e a dores financiadores e agentes envolvi-

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120 Descentralização e endividamento municipal

dos, de modo que se possa prescindir da Existem assim três tipos de projetos:
presença do Estado, enquanto patrocina- i. full-recourse – aquele que conta com o
dor. Quando se fala em project finance, aval do Tesouro, constituindo-se
compreende-se que o projeto é financia- em garantia soberana (fundada,
do com base em suas próprias perspecti- em última instância, em um fluxo
vas e riscos, tornando-o independente de receita de impostos), o que di-
da(s) empresa(s) originária(s) que o faz minui o risco do empréstimo, uma
(em), isto é, há uma cisão entre projeto e vez que independe da qualidade
empresa. Dessa forma, o financiamento do projeto e do seu retorno;
não depende do suporte de crédito dos ii. non-recourse – em que a única ga-
patrocinadores do projeto, mas da expec- rantia que os credores possuem
tativa de receita a ser gerada pelo projeto é o próprio fluxo de caixa do
ao longo do tempo. Assim, mesmo que o projeto. Neste caso, um amplo
município participe do projeto, o financi- estudo de viabilidade econômica
amento está ancorado no seu retorno e (perspectivas de receitas e cus-
não na base fiscal do município. tos, capacidade operacional e tec-
O próprio projeto torna-se uma nológica dos patrocinadores etc.)
pessoa jurídica, a chamada SPC (Special deve ser considerado na conces-
Purpose Company), com direitos (receitas) e são do crédito;
deveres, independente dos patrocinado- iii. limited-recourse – que se refere ma-
res, de modo que estes últimos compro- is propriamente ao project finance.
metem-se com os financiadores apenas É algo intermediário entre os do-
no montante do capital aportado no pro- is anteriores, não havendo garan-
jeto, constituindo-se, portanto, uma ope- tia plena do Tesouro, mas em
ração fora balanço. As grantias dadas ao que a estrutura contratual faz com
financiamento, isto é, o recourse do credor que as garantias não se limitem
em caso de fracasso do projeto, são de ao fluxo de caixa, havendo uma 21 No Brasil, o modelo
fundamentais importância para se definir repartição do risco entre os di- utilizado no pós-guerra
as suas condições. versos atores envolvidos.21 foi o full-recourse.

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Note-se que o modelo full-recourse balanço do patrocinador e cujo financia-


permite menores taxas de juros no em- mento inviabilize o acesso a novos crédi-
préstimo, uma vez que o risco é menor, tos, dependendo de sua magnitude.
mas o endividamento é limitado pela adi- Várias são, portanto, as formas pos-
tividade dos avais e o comprometimento síveis de contrato com o setor privado:
que este pode gerar das receitas tributári- i. leasing – o Estado constrói a obra,
as. No caso do non-recourse, esta é uma é o proprietário do projeto e faz
operação de alto risco e, como tal, dificil- o arrendamento a particulares
mente financiada pelo setor bancário, é por um período de tempo deter-
exigida uma taxa de juros tão elevada que minado;
inviabiliza o projeto. Restaria aí a alterna- ii. BOT (Build, Operate and Transfer) –
tiva dos instrumentos de risco cuja im- faz-se a concessão ao setor pri-
portância em termos de financiamento é vado que constrói, explora e pos-
bastante limitada. Os empréstimos limi- teriormente, findo o contrato,
ted-recourse, são aqueles aos quais a noção transfere o patrimônio ao setor
de project financing melhor se adequa. O público;
crédito bancário concedido é garantido iii. BOO (Build, Operate and Owner) –
pelo fluxo de caixa do projeto e pela base neste o setor privado constrói,
contratual que o sustenta, buscando-se a opera e posteriormente compra
distribuição dos riscos entre os diversos o patrimônio;
atores. A taxa de juros cobrada é mais alta iv. BOLT (Build, Operate, Leasing and
do que no caso do full-recourse pelas me- Transfer);
nores garantias, isto é, pelo maior risco, v. propriedade privada;
mas tem a vantagem de não restringir o vi. prestação de serviços pelo setor
financiamento à capacidade de endivida- privado a concessionárias públi-
mento do patrocinador. cas (terceirização) etc.
A grande vantagem para o patroci- O project finance refere-se à viabili-
nador desta modalidade de financiamen- zação de investimentos dentro dos mo-
to é que como o empréstimo ao projeto é delos BOT/BOO/BOLT. A sua emer-
não-recursivo, isso não afetará o seu ba- gência se dá pela possibilidade de delimi-
lanço e a sua capacidade de crédito, dife- tação dos projetos (unbundling) e, como
rentemente de um projeto que conste no dissemos, estrutura-se em torno de uma

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122 Descentralização e endividamento municipal

SPC, de modo a limitar o risco ao proje- guir que uma vez concluída a obra, a dívida
to, visando alocá-lo de forma apropriada seja renegociada para um prazo compatível
ao participante em melhores condições com o fluxo de caixa necessário para a sua
de reduzi-lo. Esta é a principal arte por amortização. Observa-se que na fase inicial
trás do project finance: a redução e a distri- (construção) o importante é a disponibili-
buição do risco de forma adequada é que dade de fundos, podendo inclusive ser
determina o sucesso na obtenção dos re- constituído de uma série de empréstimos
cursos necessários, o que se obtém pela de curto prazo renováveis (a dívida bancá-
constituição da base contratual. ria pode ser o mecanismo), mas uma vez
Os principais riscos existentes no concluída a obra existe a necessidade de
project finance decorrem, em grande parte consolidar esta dívida (fundar) em um pra-
da natureza dos investimentos de infra- zo longo para que as receitas geradas per-
estrutura: maior prazo de maturação do mitam o pagamento dos serviços e do prin-
investimento; não-recuperação dos re- cipal da dívida. Neste momento faz-se ne-
cursos investidos, caso o projeto não seja cessária a existência de mecanismos de fi-
concluído (sunk-costs elevados); mas, com nanciamento de longo prazo na economia.
perfil monopolista (utilidades públicas) e Um outro ponto é a necessidade de taxas
demanda estável (baixas substituição e de juros estáveis, uma vez que oscilações
sazonalidade, caráter essencial) com cres- das mesmas podem tornar deficitário um
cimento relativamente contínuo em fun- projeto que se mostrava rentável.
ção de pressões demográficas e do desen- Para que os riscos possam ser distri-
volvimento econômico. Assim, estes in- buídos adequadamente no project finance,
vestimentos tendem a ter um elevado risco eles devem ser delineados com muito mais
na fase de construção e um risco menor de clareza do que nos projetos públicos tradi-
mercado, mas sem que este desapareça. cionais. As principais contingências que de-
Percebe-se, portanto, que o grande vem ser consideradas são:
desafio de projetos de infra-estrutura é a i. riscos de construção – falhas no
fase de construção. É neste momento que cronograma de implementação
se devem garantir os recursos financeiros (demora na entrega que amplia o
de forma adequada para viabilizar a conclu- custo financeiro) ou custos que
são das obras. O segundo desafio é conse- excedam o previsto;

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ii. riscos operacionais ou de merca- lam-se o preço da obra, o prazo


do – problemas de desempenho da entrega e especificidades so-
da planta, receita abaixo da espe- bre a qualidade da mesma, res-
rada etc.; ponsabilizando-se a construtora
iii. riscos políticos e risco país – ex- por possíveis perdas decorrentes
propriação, sub-tarifação, estabi- de falhas que comprometam o
lidade das regras, proibição de fluxo de caixa do projeto;
remessa de lucros etc.; ii. contratos comerciais, tanto em re-
iv. riscos macroeconômicos – taxa de lação à obtenção de matérias-pri-
câmbio, taxa de juros etc. Estes mas importantes como para a ven-
últimos riscos podem ser resolvi- da dos serviços. Estes contratos
dos ou pela existência de merca- são de grande importância quan-
dos futuros, ou por sistemas de do existe o monopólio das maté-
garantias públicas contra as osci- rias-primas ou o monopsônio na
lações do valor da moeda nacio- aquisição de serviços. Em geral,
nal e da taxa de juros. estipulam-se os preços e as quan-
A alocação dos riscos entre os par- tidades a serem negociadas;
ticipantes costuma ser um processo difícil iii. contrato de operação e manuten-
e demorado, até que se obtenha os acor- ção: contrato firmado com uma
dos contratuais que atendam aos interes- operadora qualificada a operar o
ses das diversas partes. Já existem algumas projeto e fazer a sua manutenção.
salvaguardas e convenções para lidar com Neste estipulam-se metas de de-
tal complexidade, determinadas pelas pró- sempenho para os operadores, em
prias características do setor de infra-es- termos de grau de utilização da ca-
trutura. Os principais contratos de supor- pacidade instalada, produtividade,
te do project finance, fora o contrato de con- custos variáveis etc. Deve-se atri-
cessão, são (Ferreira, 1996): buir responsabilidades de desem-
i. contrato de construção – feito en- penho ao operador que sofre san-
tre a SPC e as empreiteiras, visa ções decorrentes de prejuízos de-
eliminar do patrocinador o risco vido ao mau desempenho;
da fase de construção referente à iv. contratos de acionistas e contra-
conclusão da obra. Neste estipu- tos financeiros – definem-se, en-

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124 Descentralização e endividamento municipal

tre outras coisas, as prioridades trução, os riscos políticos, riscos cam-


nas camadas de capital, em ter- biais, risco de não-abastecimento, cala-
mos de recebimento, o compro- midades naturais etc. Ou seja, para cada
metimento de capital dos acio- contrato acima mencionado, em geral, é
nistas, a forma de remuneração exigida a presença de um seguro para ga-
das dívidas subordinadas etc. Nes- rantir o ressarcimento dos prejuízos pelo
tes contratos garante-se a vincu- não-cumprimento de uma das cláusulas.
lação das receitas do projeto ao Além disso, uma série de garantias públi-
pagamento das obrigações. É im- cas é dada em relação, por exemplo, à re-
portante destacar este ponto: o messa dos serviços da dívida para o ex-
project finance ao quebrar a ligação terior (quando conta-se com financiador
projeto-empresa faz com que as estrangeiro), a convertibilidade da moe-
receitas do projeto não sejam do da (em alguns casos o país deve possuir
patrocinador, este passa a rece- um fundo de recursos administrados por
ber apenas os dividendos em ca- alguma instituição financeira internacio-
so de o projeto gerar lucro mas, nal para comprovar o comprometimento
por outro lado, limita a responsa- com a convertibilidade), garantias contra
bilidade dos patrocinadores com forças maiores (catástrofes naturais, guer-
o projeto ao montante do capital ras, revoluções, expropriações etc.) e, em
integralizado, de modo que não muitos casos, linhas de crédito stand-by,
se comprometam outras parcelas que garantam a continuidade do projeto
de seu patrimônio; em caso de aparecimento de algum im-
v. contrato com uma instituição fi- previsto.22
nanceira, chamada trustee, para a Dada a complexidade dos projetos
administração do fluxo de caixa envolvidos, dos mecanismos de repartição
do projeto. O objetivo é garantir de riscos e do volume de recursos envol-
o cumprimento dos contratos fi- vidos, não existe uma única forma de fi-
nanceiros, isto é, a prioridade dos nanciamento que atenda a todas as necessi- 22 É preciso tomar cuidado

recebimentos. dades do projeto. Em geral, tem-se que com a questão das garantias
públicas, pois pode-se criar
Paralelamente a esta série de con- utilizar aporte de capital dos patrocinado-
um passivo contingencial
tratos, desenvolve-se uma base de segu- res, dívida bancária, títulos securitizados, (endividamento potencial)
ros que busca cobrir os riscos na cons- debêntures conversíveis, linhas de crédito difícil de ser avaliado.

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standy by, seguros, produtos derivativos de no acesso. No Brasil, quando a in-


(opções, swaps) etc. As necessidades de cada fra-estrutura estava sob responsabilidade
fase do projeto são diferenciadas e cada do Governo Federal, recorria-se, em mui-
projeto possui suas próprias especificida- tos casos, ao chamado subsídio cruzado,
des, ou seja, não existe uma única estrutura em que determinada parcela dos consumi-
financeira para todos os projetos. As enge- dores financiava (subsidiava) o acesso dos
nharias financeiras devem ser montadas demais; ou, simplesmente, a empresa pro-
caso a caso. Com estas características, o vedora arcava com prejuízos que depois
aprofundamento do project finance só foi pos- acabavam sendo repassados para o Te-
sível em função das transformações ocorri- souro. Em um sistema em que se pretende
das no sistema financeiro internacional que assegurar a rentabilidade, para estimular o
permitiram o desenvolvimento de novos investimento, deve-se pensar em outros
produtos financeiros, novas técnicas para a mecanismos para garantir a eqüidade no
administração de risco e o surgimento de acesso. Qualquer subsídio que se pretenda
novos atores no sistema financeiro com ló- introduzir deve especificar qual a fonte de
gicas de atuação diferentes do sistema ban- receita para financiá-lo. Este não pode fi-
cário tradicional. car sob responsabilidade do projeto.
Em segundo lugar, este tipo de fi-
3.2.2_ Dificuldades e potencialidades nanciamento requer a existência de re-
Apesar deste modelo, ao possibilitar uma cursos financeiros de longo prazo. No
melhor distribuição do risco, ser uma for- Brasil, estes recursos sempre foram obti-
ma adequada de financiamento da partici- dos ou no exterior ou junto aos fundos
pação do setor privado em investimentos de poupança compulsória. Estes últimos
de infra-estrutura, tanto em parcerias com estão em crise, restando apenas os recur-
o setor público, como em regimes de con- sos do FAT (Fundo de Amparo do Tra-
cessões, alguns problemas permanecem. balhador) que alimentam o BNDES. Na
Em primeiro lugar, para que este exposição anterior não se considerou co-
modelo seja viável, o projeto deve ser ren- mo um problema a restrição de recursos,
tável, isto é, as tarifas devem refletir tanto considerando-se que havendo bons pro-
o custo operacional como o de capital. Se, jetos haveria financiamento. Isto pode
por um lado, é possível ganhar em eficiên- ser verdade quando se considera um aces-
cia; por outro, pode-se eliminar a eqüida- so sem restrições ao mercado financeiro

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126 Descentralização e endividamento municipal

internacional, dado as dimensões dos pa- um fluxo adequado de informações aos


íses. Mas, esta não é a situação, existindo investidores e facilitar a monitoração da
a necessidade de fontes internas de pou- utilização dos recursos. Este processo tem
pança para completar as fontes externas, sido acentuado pelos programas de pri-
uma vez que há restrições ao endivida- vatização que têm colaborado para o de-
mento externo, dadas pelo Balanço de senvolvimento do mercado de capitais e
Pagamentos e pelo fato de que os proje- pela globalização financeira que força uma
tos de infra-estrutura geram receita em adaptação das regras aos padrões vigen-
moeda nacional.23 Além disto, instabilida- tes nos países desenvolvidos. O BNDES
des em relação ao fluxo de capitais e crises pode desempenhar um importante pa-
cambiais podem prejudicar os investimen- pel na divulgação de informações pela
tos, gerando descontinuidades, além de expertise acumulada na avaliação de pro-
poder colocar os projetos em dificuldades jetos de infra-estrutura, além de poder
financeiras com a diminuição do retorno. oferecer um suporte (serviços de con-
Fontes internas estáveis são necessárias, o sultoria) para os municípios na montagem
que poderia ser obtido tanto com recursos dos projetos. Esta atuação do BNDES po-
previdenciários como com impostos vin- deria ser transitória pelos constrangimen-
culados e outros tipos de contribuições. tos políticos que geraria, mas poderia ser
Em terceiro lugar, deve-se notar um embrião para o desenvolvimento des- 23 As dificuldades
que, para o desenvolvimento destes no- tas atividades no país. relacionadas ao financiamento
vos mecanismos de financiamento, é ne- Outro ponto que deve ser destaca- em moeda estrangeira e
retorno em moeda nacional
cessário um grande aperfeiçoamento do do em relação ao quadro institucional re- podem ser vistas no caso
mercado de capitais nos países em desen- fere-se à regulação dos serviços de utili- recente do setor elétrico e das
volvimento. Nestes países, em geral, não dades públicas. Como foi destacado, es- telecomunicações no Brasil.
existem condições informacionais ade- tes tendem a constituir-se em monopóli- Grande parte do ônus acaba
sendo transferida ao
quadas nem um sistema judiciário adap- os naturais. Deve haver agências regula- consumidor com introdução
tado para resolver os problemas con- doras capacitadas para fiscalizar e garan- de correções tarifárias
tratuais que possam emergir (Pinheiro e tir o cumprimento dos contratos, pre- relacionadas com o câmbio.
Cabral, 1998). O desenvolvimento de servando os interesses da população. Desta forma aumenta a
vinculação entre choques
instituições privadas de classificação de Uma outra dificuldade no Brasil, externos e inflação e amplia-se
riscos e órgãos públicos reguladores é de para uma efetiva participação do setor a instabilidade
fundamental importância para garantir privado resolvendo o problema dos in- macroeconômica.

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vestimentos em infra-estrutura, refere-se para possibilitar, em casos necessários, a


às amplas diferenças regionais, que se re- concessão de subsídios ou para estender
lacionam à questão do acesso discutido a provisão para áreas em que o merca-
acima e a forma como se deu a descentra- do não teria interesse devido à baixa ren-
lização. Quanto às diferenças regionais, a da da população ou baixa densidade po-
preocupação refere-se ao possível desin- pulacional.
teresse do setor privado pelas regiões Propõe-se um modelo de provisão
mais pobres e menos densamente povoa- de infra-estrutura que se baseia, princi-
das. Quanto ao segundo aspecto, deve-se palmente, em recursos do setor privado
notar que grande parte dos problemas ur- mas que ainda preserve um espaço para o
banos concentra-se em metrópoles (re- setor público para garantir-se uma maior
giões metropolitanas) estendendo-se por coordenação dos investimentos e o aces-
mais de um município. Em vários casos so da população de baixa renda e das re-
de serviços públicos, o poder concedente giões mais pobres. Esta coordenação não
é o município e a inexistência de instân- pode ser confundida com centralismo,
cias que possam coordenar os investi- mas deve ser feita de forma democrática
mentos em termos regionais pode levar a e transparente com a participação por
soluções ineficientes. adesão de estados e municípios. O repas-
Os problemas de coordenação e se das verbas dos fundos infra-estruturais
de garantia de acesso das regiões mais po- (nacionais) poderia ser feito por meio de
bres poderiam ser resolvidos por meio de fundos regionais, estaduais e municipais,
fundos infra-estruturais criados com as que contariam também com aportes de
contribuições/recursos internos que ci- verbas dos respectivos governos. Os re-
tamos acima. Estes deveriam ter caracte- cursos poderiam ser utilizados para fi-
rísticas nacionais, mas não serem cen- nanciar uma participação minoritária dos
tralizados no Governo Federal como governos nos investimentos de infra-es-
ocorria no modelo anterior. Sua gestão trutura com o setor privado, colaborando
poderia ser feita por meio de um conse- para a obtenção de empréstimos ou, ain-
lho com representantes das três esferas da, para a concessão de garantias. Inde-
de governo e da sociedade civil. Seus re- pendente do arranjo, as questões da co-
cursos seriam utilizados para apoiar in- ordenação dos investimentos e do acesso
vestimentos com participação privada e são problemas que devem ser soluciona-

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dos em um modelo com maior participa- judiciário, à estabilidade das regras, à


ção do setor privado sob o risco de acen- transparência na gestão pública, ao de-
tuar-se a concentração de renda no país. senvolvimento do mercado de capitais, a
existência de recursos de longo prazo etc.
A questão básica que tentamos levantar é
4_ Comentários finais a impossibilidade de se tentar promover a
A preocupação básica do artigo era dis- descentralização das obrigações, ampli-
cutir alternativas de financiamento para ando as responsabilidades das instâncias
um conjunto de investimentos cuja res- locais na provisão de serviços, com as
ponsabilidade tem sido transferida para grandes restrições colocadas em termos
os municípios. Como qualquer agente, na de financiamento.
maior parte dos casos, as receitas corren- Na questão do endividamento mu-
tes (próprias) são insuficientes para fi- nicipal na forma de títulos deve-se salien-
nanciar grandes investimentos, com o tar as proibições impostas pelo Governo
que se deve recorrer a recursos de tercei- Federal através do BACEN, conforme
ros. Assim, a maior pressão por investi- medidas aprovadas pelo Senado Federal
mentos nas instâncias municipais traz à e pela Lei de Responsabilidade Fiscal
tona a questão do endividamento. A for- (LRF). Assim, qualquer endividamento
ma como este deve se dar difere, de acor- municipal (lançamento de títulos) está
do com a natureza do investimento, se é sujeito a autorizações destas instâncias,
tipicamente público ou se oferece condi- porém alguma liberalização deve ocorrer.
ções de rentabilidade privada. Para o pri- Em relação ao project finance, apesar de al-
meiro caso, discutimos a possibilidade de gumas experiências em andamento no
desenvolvimento de um mercado de títu- BNDES em conjunto com o IFC e ou-
los públicos municipais e para o segundo tras instituições internacionais, deve-se
caso destacamos o project finance e a neces- destacar o pequeno alcance deste instru-
sidade de participação do setor privado. mento até o momento no Brasil, tanto
Para o desenvolvimento destas al- pela não-participação do sistema financei-
ternativas de financiamento no Brasil, vá- ro privado nacional, desacostumado a fi-
rias modificações são necessárias, prin- nanciamentos de longo prazo, como ao
cipalmente no que diz respeito à provisão fato do BNDES ainda tratar esta modali-
de informações, à eficiência do sistema dade de forma semelhante às outras ope-

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rações, colocando a grande exigência de


garantias como um entrave ao seu desen-
volvimento.
Deve-se prosseguir na descentrali-
zação, pois isto facilita o controle popu-
lar e a eficiência, mas deve-se criar meca-
nismos que flexibilizem o financiamento
dos municípios, sem que isto se transfor-
me em irresponsabilidade fiscal.

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130 Descentralização e endividamento municipal

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