Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
hoje a colega e amiga sabrina corrêa me chamou pra uma conversa que me jogou
nuns pensamentos que fizeram com que retomasse algumas coisas que tem poucos
dias se desenharam em minhas letras... interessada em fazer um curso de
doutorado, fui juntar minhas ideias para a candidatura e eis que das muitas coisas
que me faltavam para as formalidades acadêmicas uma era a boia que se deve
tratar regularmente ao césar lattes... faltou boia... faltou tempo pra fazer a boia e
tratar... faltou disponibilidade para fazer e tratar a boia ao lattes... mas não faltou
tempo e nem disponibilidade para fazer boia com as gentes que não comem da
mesma coisa que o lattes... sempre fico a pensar sobre as importâncias e
(des)importâncias daquilo que tecemos nos teares dos dias e nas tramas das
vidas... aquilo que possibilita outras escrevinhaduras nas vidas e nas existências
das pessoas com quem transversamos nossas existências... isso... essas coisas não
aparecem e não dão boia ao lattes... essas coisas pulsam nas vidas e as fazem
potentes... não são boia pra coisa pouca!
Tínhamos também, possivelmente, uma concepção comum de filosofia. (...) Nossa tarefa era
analisar estados mistos, agenciamentos, aquilo que Foucault chamava de dispositivos. Era
preciso não remontar aos pontos, mas seguir e desemaranhar as linhas: uma cartografia, que
implicava numa microanálise (o que Foucault chamava de microfísica do poder e Guattari,
micropolítica do desejo). É nos agenciamentos que encontraríamos focos de unificação, nós de
totalização, processos de subjetivação, sempre relativos, a serem sempre desfeitos a fim de
seguirmos ainda mais longe uma linha agitada. Não buscaríamos origens mesmo perdidas ou
rasuradas, mas pegaríamos as coisas onde elas crescem, pelo meio: rachar as coisas, rachar
as palavras. Não buscaríamos o eterno, ainda que fosse a eternidade do tempo, mas a
formação do novo, a emergência ou o que Foucault chama de ‘a atualidade’
Gilles Deleuze[2]
BOCÓ
Quando o moço estava a catar caracóis e pedrinhas na beira do rio até duas horas da tarde, ali
também Nhá Velina Cuê estava. A velha paraguaia de ver aquele moço a catar caracóis na
beira do rio até duas horas da tarde, balançou a cabeça de um lado para o outro ao gesto de
quem estivesse com pena do moço, e disse a palavra bocó. O moço ouviu a palavra bocó e foi
para casa correndo a ver nos seus trinta e dois dicionários que coisa era ser bocó. Achou cerca
de nove expressões que sugeriam símiles a tonto. E se riu de gostar. E separou para ele os
nove símiles. Tais: Bocó é sempre alguém acrescentado de criança. Bocó é uma exceção de
árvore. Bocó é um que gosta de conversar bobagens profundas com as águas. Bocó é aquele
que fala sempre com sotaque das suas origens. É sempre alguém obscuro de mosca. É
alguém que constrói sua casa com pouco cisco. É um que descobriu que as tardes fazem parte
de haver beleza nos pássaros. Bocó é aquele que olhando para o chão enxerga um verme
sendo-o. Bocó é uma espécie de sânie com alvoradas. Foi o que o moço colheu em seus trinta
e dois dicionários. E ele se estimou.
Manoel de Barros[3]