Você está na página 1de 5

Universidade Federal do Rio de Janeiro

Instituto de História
Disciplina: Brasil II
Docente: José Augusto Pádua
Discente: Ana Luísa Candal Laurindo
DRE:121040210

O projeto de Brasil de José Bonifácio

Antes de iniciar a análise crítica do documento, é necessário apresentar o seu autor e


compreender o contexto no qual a fonte foi apresentada pelo mesmo. José Bonifácio de
Andrada e Silva, nasceu em 1763 em Santos no estado de São Paulo, demonstrando desde
muito novo seu brilhantismo, na cidade de São Paulo participava das aulas de Filosofia e
Retórica e demonstrava sua facilidade em aprender novos idiomas, sendo capaz de falar seis
idiomas ainda jovem. Em 1783 foi para Portugal estudar da Universidade de Coimbra onde
estudou Direito, Filosofia Natural e Ciências Jurídicas, fez sua monografia sobre a pesca da
baleia no Brasil, o que já demonstrava o seu interesse e preocupação com questões
ambientais, algo que será presente na fonte trabalhada posteriormente aqui. Após isso, pelo
seu destaque como universitário fez uma longa viagem científica pela Europa.
Passando uma grande parte de sua vida na Europa, José Bonifácio só retorna ao Brasil
com 56 anos em 1819, após ter sido professor em Coimbra, além disso, foi intendente-geral
das Minas e Metais do Reino, superintendente do Reflorestamento dos Areais, diretor das
obras do Rio Mondêgo, oficial do Batalhão Acadêmico na guerra contra os franceses, ficou
desempenhando o seu cargo como secretário perpétuo da Academia de Ciências até voltar a
sua terra natal. Para encerrar sua carreira como pesquisador, Bonifácio realiza a sua Viagem
Mineralógica na Província de São Paulo. A partir disso, passa a construir sua carreira política
no Brasil, sendo uma figura de suma importância no processo de independência do Brasil.
Bonifácio, devido a sua vivência acadêmica em Coimbra, era influenciado pelas ideias
iluministas, algo que será presente nas suas ideias de projeto para o Brasil após a
independência, que se baseiam na formação civilizada do estado brasileiro.
Com o objetivo de trazer novas propostas para a sociedade brasileira, em específico a
com ênfase na situação escravista no Brasil, no ano de 1823, Bonifácio apresenta à
Assembleia Constituinte suas ideias. O autor deixa claro ao longo do documento a sua
aversão da continuidade da escravidão e do tráfico negreiro no Brasil, apresentando diversos
argumentos para suas ideias além de trinta e dois artigos que apresentavam propostas
concretas para a nação brasileira.Na fonte Bonifácio traz exemplos externos de países que
não utilizavam a escravidão, como a Conchichina que não existia escravidão e conseguia
atingir números significativos em sua produção, sem afetar a natureza, São Paulo também é
citado como um outro exemplo, que antes da criação dos enegenhos de açúcar a mão de obra
escrava era muito pouca e mesmo assim a região alcançava um número de produção
desejável, contudo, Bonifácio deixa de lado o fato de São Paulo utilizar a mão de obra
indígena para a sua produção “...São Paulo, que teve o crescimento na lavoura comercial,
cuja mão de obra indígena foi fundamental para o seu desenvolvimento.” (BARBOZA, 2015,
p.32).
Bonifácio ao longo da fonte ressalta o seu argumento a respeito da defesa da
humanidade negra, pois os escravos desgraçados por sua condição, não usufruem de sua
dignidade humana devido a cobiça dos senhores, que ao invés de trazer o povo africanos para
viver como colonos no Brasil, os trazem para viver em desgraça.
Essas críticas feitas por Bonifácio também são carregadas de religiosidade, visto que
de acordo com o mesmo, as leis civis não condizem com as leis divinas, “É de espantar pois
que um tráfico tão contrário às leis da moral humana, e às santas máximas do Evangelho, e
até contra as leis de uma sã política dure há tantos séculos entre os homens, que se dizem
civilizados e cristãos! Mentem, nunca foram.” (BONIFÁCIO, 1823, p.95), a igualdade entre
os homens deveria prevalecer, já que perante a Deus todos os homens são iguais, sendo
assim desumano a continuidade deste tratamento com os escravos. A felicidade doméstica,
segundo ele, também é afetada pela escravatura, uma vez que a escravidão seria um exemplo
de corrupção e tirania que acaba gerando vicíos e trazendo indolência para a sociedade
brasileira.
Outro ponto ressaltado por Bonifácio é a respeito da qualidade da produção brasileira,
pois os métodos de agricultura não possuíam tecnologia, já que era destruído diversos
terrenos que acabavam por gerar a diminuição da qualidade de produção, a preocupação de
Bonifácio com a natureza tem raízes em seus estudos durante o tempo que passou em
Coimbra onde estudou Ciências Naturais, sua preocupação com a natureza é acompanhada
com sua pretensão de projeto político para o Brasil,
“Esta política passava, essencialmente, pela superação do modelo agrícola aqui
implantado pelo sistema colonial, calcado no latifúndio, na monocultura e na destruição
florestal. Tal modelo deveria ser transformado por meio de uma reforma agrária e da
difusão de métodos agronômicos modernos e ambientalmente equilibrados.” (PÁDUA,
2000, p.132)

Sendo assim, a utilização da mão de obra escrava nas plantações não seria cabível,
visto que esse método não possuía a tecnologia necessária para realizar uma produção de
qualidade que não destruísse a natureza, o novo modelo de produção agrícola seria um dos
caminhos fundamentais para que o Brasil caminhasse para o progresso. Isso se daria em
conjunto da inserção dos indígenas na sociedade brasileira:

“A incorporação dos índios na sociedade brasileira, além do benefício imediato de


reduzir a necessidade dos escravos africanos, inseria-se em uma proposta mais geral de
reforma ambiental e política. A abundância da natureza no Brasil podia ser um
elemento de inibição do esforço civilizatório, como demonstrava o exemplo dos
próprios índios e o parasitismo das atividades econômicas dos colonizadores. Em
sentido inverso, se esta abundância fosse aproveitada de forma laboriosa e inteligente,
ela se transformaria na alavanca de um formidável progresso. Para isso era fundamental
superar as formas econômicas que faziam mal uso destes recursos, seja pela
subutilização ou pela devastação. Nesta direção, o modo de vida tradicional dos índios
devia ser superado, assim como a grande monocultura escravista.” (PÁDUA, 2000, p.
133).

Com isso, a emancipação se fazia necessária para conseguir alcançar os objetivos de


civilizar os escravos e indígenas:

“Acabe-se pois de uma vez o infame tráfico da escravatura Africana; mas com isto não
está tudo feito: é também preciso cuidar seriamente em melhorar a sorte dos escravos
existentes, e tais cuidados são já um passo dado para a sua futura emancipação.”
(SILVA, 1823, p. 97).

Portanto, Bonifácio com o seu pensamento iluminista, acreditava na igualdade entre os


homens, o que fazia a diferenciação entre eles seriam dadas as circunstâncias sociais do qual
cada um estava inserido. Para ele, era de suma importância que a sociedade brasileira
deixasse de ser heterogênea e passasse a ser homogênea, “É da maior necessidade ir
acabando tanta heterogeneidade física e civil; cuidemos pois de combinar desde já, em
combinar sabiamente tantos elementos discordes e diversos e contrários” (SILVA, 1823, p.
91), isso se dá em virtude do medo de surgir alguma crise política, visto que uma sociedade
que abriga tantas diferenças sociais é mais vulnerável ao surgimento de discordâncias, no que
se refere a situação dos escravizados, o medo de ocorrer algo parecido ao que ocorreu no
Haiti era existente.
Embora Bonifácio expressasse de maneira clara o seu desejo de abolir o tráfico
negreiro e a inserção dos escravizados e indígenas na sociedade, o mesmo não queria de
imediato a abolição da escravidão, sendo antes necessário um processo civilizatório em sua
religião, cultuta etc. Portanto, é possível compreender aqui a existência de um desprezo por
parte do mesmo em relação à cultura indígena e dos escravizados, contudo, Bonifácio
reconhecia a violência realizada contra esses grupos.
Dessa maneira, a emancipação consiste no processo civilizatório desses grupos, para
que esses indivíduos passassem a integrar a sociedade, e assim, a sociedade brasileira se
tornaria mais homogênea. Em suma, esses argumentos levantados por José Bonifácio reúnem
todos os seus desejos para o futuro do Brasil, não só apresentando ideias de melhoria
econômica, mas também apresentando sua preocupação com a natureza e com a ordem
social. Dessa forma, é possível concluir que o seu maior interesse não era em melhorar a vida
dos escravizados em virtude de sua preocupação com os mesmos, o seu maior interesse era
em construir um projeto para o futuro da nação brasileira.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SILVA, José Bonifácio de Andrada. Representação à Assembléia Geral Constituinte
Legislativa do Império do Brasil sobre a Escravatura. Tipografia de Firmin Didot. Paris,
1825.

PÁDUA, José Augusto. A profecia dos desertos da Líbia: conservação da natureza e


construção nacional no pensamento de José Bonifácio. [S. l.: s. n.], 2000.

DOLHNIKOFF, Miriam. O PROJETO NACIONAL DE JOSÉ BONIFÁCIO. [S. l.: s. n.],


1996.

BARBOZA, Maria José. "CIVILIZAÇÃO" DE ÍNDIOS EM PERNAMBUCO NO SÉCULO


XIX: a mão de obra indígena. [S. l.: s. n.], 2015.
FALCÃO, Edgard de Cerqueira. JOSÉ BONIFÁCIO, O PATRIARCA. SUA VIDA E SUA
OBRA. [S. l.: s. n.], 1963.

Você também pode gostar