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DUBITO ERGO SUM

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O CONCEITO DE LITERATURA *

Gustavo Bernardo

Apresentamos a literatura pelo que ela não é — e


isto, esperamos demonstrar adiante, tem tudo a ver
com o que ela é. Grosso modo, "literatura" se realiza
com palavras. Entretanto, começaremos realizando o
seu conceito através de uma imagem sem palavras:
o desenho acima. Nele, o conhecido pintor espanhol,
Pablo Picasso, representou um centauro. Na
verdade, o fez com uma única linha, sem tirar o lápis
do papel nem uma única vez. Picasso realizou muitos
destes trabalhos "de uma única linha", como uma
espécie de acrobacia artística. Escolhendo um ponto inicial — a ponta do rabo do
animal-homem, ou a ponta da letra "R" que o homem-animal desenha, por sua vez,
no ar —, percorria, na frente de testemunhas e espectadores devidamente
embasbacados, todo o corpo da figura, sugerindo os músculos, a força, o
movimento, e, ao mesmo tempo, a fantasia, a impossibilidade, a vontade.

O espetáculo desta performance aconteceu apenas porque o artista resistiu ao


espetáculo, o que é uma evidente contradição. Esta contradição, no entanto,
configura o próprio motor da arte. Pablo Picasso precisava ter o máximo controle
sobre o seu movimento, resistindo a torná-lo espetacular. Somente assim o seu
desenho (e não ele como artista) se tornaria um espetáculo por si mesmo.
Podemos chamar esta resistência de "economia de meios". Selecionando criteriosa
e rigorosamente os seus meios de trabalho e de ação, aplicando a medida mais fina
ao que faz, o artista consegue produzir, no espectador, a indescritível sensação de
que algo, ou alguém, superou todas as medidas. A obra assim construída empresta
aos demais a sensação de transcendência dos limites do homem e das coisas,
sugerindo um caminho para além da essência que conhecemos.

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A economia de meios é condição de toda técnica. O jogador de futebol (Pelé, por
exemplo) se torna um artista, um virtuose, somente quando escolhe tais
movimentos e não escolhe outros, buscando sempre o efeito final — no seu caso, o
gol, a vitória. Há muitos jogadores bem dotados para o esporte que nunca se
tornam artistas do ofício, porque driblam bem, mas para o lado, ou porque correm
muito, mas não fazem a bola correr na direção certa. O diretor de cinema
(Hitchcock, por exemplo) se torna um artista, um virtuose, somente quando sabe
montar o seu filme cortando muitas cenas e encadeando as demais, buscando
sempre o efeito final — no seu caso, o espetáculo do suspense, do medo e do
humor associados. Há muitos cineastas, com dinheiro e idéias, que, todavia, nunca
se tornam artistas do ofício, porque não sabem o ponto de corte e não conseguem
eliminar a cena que não devia entrar.

Picasso, Pelé e Hitchcock constroem, sobre meios e motivos à disposição de todos


os atletas e artistas, obras (imagens, jogadas, cenas) completamente únicas,
porque descobriram o que nenhum manual, nenhum livro (como este), nenhum
técnico, ensina: onde cortar. O que escolher. É o que faz o pintor, que escolheu,
para além da técnica em si, como motivo, um ser que, sabemos, não existe,
formado por dois seres que, acreditamos, existem: o cavalo e o homem. Sobre o
corpo de um cavalo, emerge o torso de um homem. Este ser, o centauro,
representa muito bem outra contradição: o artista, ao inventar, deve respeitar o
limite da existência, recorrendo a formas e entes que de fato existem, para
recombinar tais formas e entes de tal modo que crie o inexistente. No entanto,
dizer que um centauro "não existe" é uma contradição nos próprios termos: afirmar
que algo não existe já confere, a este algo, existência (no mínimo, existência
verbal). E este mínimo não é pouco, se lembrarmos quantas coisas que nos são
caras (liberdade, vontade, desejo, medo) parecem ter existência exclusivamente
verbal (o que não é pouca coisa). E, assim, seguimos a pista do próprio centauro,
que traça no ar uma letra: a letra "R". A imagem chama o verbo; a pintura chama
a literatura.

Então, como definir o conceito de literatura? Primeiramente, observando que, nesta


pergunta, nós temos, embutidas, duas questões: o que é "literatura", e o que é
"conceito" — vale dizer, o que é "o que é"? Perguntar sobre o conceito de literatura
implica também perguntar por que nos interessamos pela literatura, por que a
literatura tem alguma importância como disciplina, e por que ela existe, enfim,
como questão e como um campo de questões. Isto tudo deve ser explicitado.
Definir o nosso objeto de estudo, a literatura, no caso, é fundamental para todo o
resto — para estudar, por exemplo, a literatura brasileira, a literatura alemã, a

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literatura comparada, a teoria da literatura. Mas é, ao mesmo tempo, talvez, a mais
difícil de todas as tarefas, justamente porque precisamos precisar o nosso lugar em
relação ao tema. Para demonstrá-lo, podemos recorrer à primeira das quatro
perguntas fundamentais do ser — quem sou eu, de onde eu vim, para onde vou,
mas que raios estou fazendo aqui —, perguntando, ao querido leitor: quem é você?

Você (permita-nos, por um instante, tratá-lo assim, informalmente) poderá


responder de pronto: "sou um leitor, ou sou uma leitora". Entretanto, esta resposta
ainda não o, ou a, define: esperamos sinceramente contar com muitos outros
leitores e muitas outras leitoras de nosso pequeno livro. Então, você prossegue:
"eu sou homem, ou, eu sou mulher; tenho vinte anos de idade, ou, fiz quarenta (e
poucos) anos no mês passado; chamo-me Paulo, ou Lúcia, ou Adauri Jobim Quelha
de Castro Rocha; eu sou estudante de Letras, ou, sou professor, ou, ainda, sou
astrofísico mas, nas horas vagas, como hobby, estudo literatura". Em qualquer das
respostas, você pouco se define, porque pouco se individualiza. Ao invés de nos
responder "quem é", diz o sexo, a idade, o nome e o sobrenome (que lhe deram), a
ocupação profissional (do momento). De fato, são circunstâncias que,
propriamente, circunscrevem a pergunta, mas não dão conta do "centro", do cerne,
da questão. Até porque, se você realmente conseguisse responder quem você é,
seria imediatamente cercado pelos filósofos, biólogos e outros logos de todo o
mundo, ansiosos em extrair o seu segredo.

Acontece que, apesar da impossibilidade de se responder à pergunta, a pergunta


não é, de modo algum, absurda. A questão "quem é você" o acompanha desde
sempre, e você a tem respondido, ainda que provisoriamente, de mil maneiras em
mil momentos: desde "eu sou o pai daquela menina", até "eu sou aquele que fez
esta obra". A obra pode ser o desenho de um centauro, o som de um "sim" na
frente de um altar, a educação de uma filha, a carreira profissional, ou um gesto. A
obra pode ser um único gesto, capaz de definir, sim, quem você é — ainda que
provisoriamente. O caráter provisório da resposta corresponde ao caráter
igualmente provisório de todo e qualquer conceito, o que não impede cientistas e
filósofos de continuarem perseguindo os seus conceitos. É necessário, não apenas
conceituar, mas estar sempre conceituando, ou seja, se encontrar sempre se
perguntando sobre o fundamento. Ora, como essa pergunta não encontra uma
resposta definitiva, portanto não encontra uma resposta "certa", sua formulação
constrói não uma certeza, mas uma hipótese. E a hipótese, em todas as ciências,
implica um raciocínio condicional do tipo: "se o mundo fosse assim, então as
conseqüências seriam estas e aquelas". No momento em que se formula este se 
então, temos uma ficção; uma ficção necessária para se lidar com os fenômenos.

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O conceito, qualquer conceito, é uma ficção. Não
existe enquanto coisa, mas existe enquanto
condição sine qua non para se lidar com as coisas.
Logo, é uma ficção necessária, o que nos remete à
própria literatura, que produz ficções
absolutamente necessárias para nós, em
particular, e para a sociedade, como um todo. A
literatura, como conjunto assumido de ficções,
pode ser reconhecida como ficção ela mesma.
Nessa hora, o nosso argumento começa a se
tornar circular — o conceito da literatura começa a
reconhecer a literatura em si como conceito ela
mesma —, o que não ocorre nem por acaso nem
por conta de algum defeito. Esta circularidade,
este eterno retorno do argumento, faz com que o pensamento progrida não para
"frente", mas sim em espiral, na direção de um centro ao qual se chega cada vez
mais perto, ainda que nunca se possa chegar "lá". A forma da espiral está contida
no mito do Uroboro, a cobra que tenta desesperadamente devorar o próprio rabo,
indicando os dois extremos do esforço intelectual humano: a necessidade e a
impossibilidade. O uroboro foi representado, pelo gravador holandês M. C. Escher,
como uma espécie de dragão que, ao tentar se devorar (ou, talvez, ao tentar se
entender), acaba formando com o corpo um "8" deitado, ou seja, forma o símbolo
do infinito.

Assim, enfrentando o dragão de Escher, podemos começar a nos apresentar a


literatura pelo que ela é (ou parece ser), recorrendo às duas primeiras estrofes de
um dos poemas mais famosos de toda a literatura mundial:

O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que ele escreve


Na dor lida sentem bem
Não as duas que ele teve
Mas só a que eles não têm.

O poema, de Fernando Pessoa, se chama "Autopsicografia". Não define a literatura,


exatamente, mas o literato — ou, mais propriamente, o poeta (portanto, a si
mesmo). Naquele caminho do dragão, o faz de maneira circular, sem, entretanto,
retornar ao mesmo ponto. Afirma, primeiro, que o poeta é um fingidor, portanto,

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parente muito próximo do mentiroso. Afirma, a seguir, que o seu fingimento é
completo, vale dizer, radical, chegando a fingir que é dor uma dor verdadeira. A
dor, verdadeira, pode até ser a motivação inicial do poeta: uma dor-de-cotovelo,
por exemplo. Ao representá-la, porém, pela radicalidade da poesia, ela se
transforma em outra coisa: a dor (sensação e emoção indizíveis) vira "palavra" e,
portanto, se torna dizível. A emoção primeira se transforma em uma emoção nova,
superando aquela emoção que dera partida aos versos.

Nesta primeira estrofe do poema de Pessoa (que, como sabemos, transformou-se


ele mesmo em várias "pessoas"…), temos sintetizado um dos mais difíceis e
controvertidos conceitos da teoria da literatura: o conceito de mímese. Assim como
o mimetismo do camaleão o faz confundir-se com a casca da árvore em que se
encontra, sem, no entanto, ser a árvore, de maneira equivalente a dor
representada alude à dor original, sem, no entanto, ser esta dor. Todavia, a
segunda dor, digamos, artificial, propriamente, ficcional, ajuda o poeta a lidar com
as suas dores primeiras. É como se desta forma o poeta pudesse controlar o
incontrolável e interferir no acaso, tomando, pela imaginação, o seu destino na
mão.

Por isto, a segunda estrofe prossegue no caminho em espiral, trazendo junto,


agora, os leitores — que, ao lerem o que o poeta escreve, sentem, na dor lida, não
exatamente a dor que eles originalmente teriam, mas ainda uma outra, diferente,
de certo modo, talvez, até mesmo mais intensa. Corresponde, para lembrarmos
experiência comum, àquela sensação que temos quando assistimos a um filme
lacrimejante e, então, choramos copiosamente. Ao sairmos do cinema, entretanto,
não nos encontramos tristes, ao contrário: sentimo-nos algo aliviados. A segunda
estrofe sintetiza, portanto, outro conceito capital da teoria da literatura: o conceito
de catarse. A catarse, que Aristóteles compreendia como uma espécie de
"purgação" (porque realiza um efeito purgante sobre as emoções reprimidas dos
espectadores), permite nos identificarmos com o sofrimento dos personagens, ou
dos poetas, sentindo temor e piedade. Ao sairmos do teatro (ou do cinema, ou das
páginas do livro), retomamos a nossa própria identidade — mas enriquecida pela
experiência ficcional, que nos ajuda a conviver com as nossas dores e com os
nossos dramas.

Esta difícil convivência, porém (de nós conosco mesmos), não se dá num plano
exclusivamente racional. Não basta, de modo algum, a compreensão da causa dos
nossos dramas para nos sentirmos tranqüilos. Como também se sabe, em termos
de alma e de existência, saber não implica, necessariamente, poder. Às vezes,

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sucede mesmo o contrário: saber a razão do sofrimento somente intensifica o
sofrimento. Há, portanto, um outro saber, que a literatura e a poesia admitem,
mobilizando razão e emoção nas voltas daquela espiral. É um saber dinâmico, cujas
respostas são móveis, metamorfas, de certo modo, brincalhonas, irônicas (ou, para
usar termo mais acadêmico, lúdicas), como conclui a terceira e última estrofe do
poema de Fernando Pessoa:

E assim, nas calhas de roda,


Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama o coração.

Assim, nas calhas de roda (como em um moinho que transforma o trigo em pão), o
coração, miticamente o centro da alma, gira, entretendo e enganando a razão, para
moer a dor transformando-a em verso — para fazer com que a dor faça sentido.

Quando percebemos a enorme facilidade com que as crianças são iludidas


(comendo espinafre com prazer, só porque é comida do Popeye ou do monstro),
não dizemos: "me engana que eu gosto"? Mas, quando lemos um romance policial
típico, não percebemos que o narrador está nos enganando, plantando pistas falsas
no enredo, retardando a solução do mistério, e não gostamos exatamente disto? A
criança também poderia brincar conosco, dizendo: me engana que eu gosto, hein?
Na verdade, crianças, leitores, jogadores, amantes, políticos, eleitores, enfim, todo
mundo necessita de ilusão. Esta ilusão ora tem a forma da mentira que não pode se
assumir como mentira, como, por exemplo, no discurso de um político em ano
eleitoral, ora tem a forma da mentira que avisa que é mentira. A este segundo tipo
de "mentira", mentira honesta, na verdade, chamamos, com mais propriedade, de
ficção.

Mundus vult decipi, decipiatur ergo — o mundo quer ser enganado, logo, que o
seja. O adágio latino mostra a necessidade humana do logro, talvez porque a
verdade, última e primeira, nos seja inacessível. Como não podemos responder
quem somos, ficcionalizamos, inventamos um personagem, até o ponto em que a
invenção se torna verdadeira. Lemos um romance de Machado de Assis, sabendo
que "qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas é mera coincidência", mas
não podemos deixar de nos reconhecer na miséria e na grandeza daqueles
personagens. É como se, por determinados instantes, Machado de Assis, que
sequer nos conheceu nem ao nosso século, nos conhecesse melhor do que nós
mesmos.

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O mundo é uma grande brincadeira, podemos afirmar com toda a seriedade. Num
pequeno texto chamado "Der Dichter und das Phantasieren" (a melhor tradução
seria "O poeta e o devanear"), Sigmund Freud comparava o escritor de ficção à
criança que brinca. Ao observar crianças brincando, percebera a brincadeira como
uma coisa muito séria. Não se pode impunentemente interromper uma brincadeira,
ou mudar as suas regras; há risco sério de choro, ranger de dentes, arrancar de
cabelos, traumas gravíssimos. Porque a antítese da brincadeira não é a seriedade,
mas sim a realidade. Como a realidade é sempre muito "grande" e assustadora, a
criança a reconstrói, sob seu controle tanto racional quanto emocional, no jogo.

Ora, mas na chamada vida adulta e "real", o mesmo parece acontecer. Se o leitor
trapacear num reles jogo de pôquer no sábado à noite, seus parceiros se sentirão
profundamente ofendidos, ainda que não joguem a vera, isto é, a dinheiro. Se o
time de futebol para o qual torce desde pequeno cair para a segunda divisão
(desgraça!), periga de sentir a sua própria identidade afetada, precisando se
esforçar muito para não reagir às brincadeiras agressivas (que são "só brincadeira"
e, ainda assim, agressivas) dos amigos que torcem para os demais times. Tudo isso
porque jogo é coisa séria. Tão séria, que as nossas atividades profissionais e
políticas se desenvolvem, sem que o notemos claramente, como jogos — em suma,
como instâncias ficcionais. Para fazer parte de uma corporação profissional ou
política é preciso não só adquirir os conhecimentos e a competência necessários,
mas também aprender a dominar o jargão, os gestos, as regras escritas e não
escritas — em resumo, é preciso aprender a jogar o jogo.

Isto não significa, obrigatoriamente, ser cínico ou hipócrita. Mais cínico, talvez, seja
aquele que acusa os outros de serem meros jogadores, isto é, atores de uma peça
de ficção, como se a sua própria acusação não fosse uma determinada jogada, ou
seja, não fizesse parte… de um jogo. Como professor, sei, por exemplo, que o ideal
de uma avaliação justa e objetiva é não mais do que isto: um ideal. Um horizonte
necessário, mas inalcançável. Sei que a nota, de 0 a 10, corresponde a uma
medida arbitrária, corresponde a uma regra do jogo. É necessária, não para ser
justo (isso, nunca se pode ser), mas para promover, ainda que artificialmente, a
necessidade e a vontade de saber. Entretanto, esta concepção pedagógica, que
pretendo honesta, não é de fácil aceitação pelos alunos, porque é difícil um adulto
se aceitar sentado sobre o tabuleiro de um jogo. Em outras palavras, temos
vergonha das nossas fantasias, assim como temos vergonha de jogar (até quando,
marmanjos, jogamos bola, logo perdemos o humor e transformamos a brincadeira
em guerra, quebrando a perna do adversário).

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Freud reconhecia que as crianças, ao brincarem, sabem que brincam. Mas observa
que, ao crescerem, começam a ficar com vergonha de brincarem em público,
passando a fazê-lo intimamente — fantasiando, devaneando. Só que ficam com
vergonha de externar as suas fantasias, os seus devaneios, reprimindo-se e
recalcando-se. O escritor criativo, no entanto, consegue "se pôr para fora",
diferenciando-se do homem comum ao encontrar uma maneira de dar forma
pública às suas fantasias e devaneios; ele "finge tão completamente que chega a
fingir que é dor a dor que deveras sente", o que ajuda os leitores a encontrarem,
na dor lida, não aquela que já tinham antes de lerem, mas outra — aquela que
ainda não tinham e que, por um efeito de perspectiva, empresta sentido à dor
primeira, à dor que não fazia sentido.

Por isto, Wolfgang Iser reconhece a necessidade da literatura neste efeito de


perspectiva, vale dizer, na sua propriedade de obrigar o leitor, ao identificar-se com
um personagem, ou com o narrador, a olhar-se, e ao mundo, por um ângulo novo,
por um ângulo inusitado — por uma nova perspectiva. As conseqüências estéticas,
psicológicas e éticas desta perspectivização podem ser radicais, obrigando-nos não
só a compreendermos a diferença representada pelo outro, sem exclui-lo nem
discriminá-lo, como também a compreendermos que a realidade, em última
instância, nos é inacessível — só temos acesso, no máximo, à sua sombra. A
realidade nos é inacessível porque ela engloba tudo o que existe e todas as
perspectivas possíveis. Ora, não podemos ver "tudo", mas apenas nesgas de
coisas, assim como não podemos ver tudo "todo o tempo", mas apenas em
determinado momento. A verdade e a realidade, portanto, só podem ser não-toda
(na formulação precisa de Alain Badiou). A ficção, a literatura, fazem mais do que
ampliar as nossas perspectivas, ao mapearem a realidade, anunciando territórios
inexplorados e desconhecidos; a ficção e a literatura nos permitem viver o que de
outro modo talvez não fosse possível, ou seja, nos permitem ser outros (os
personagens) e adquirir, ainda que momentanemente, a perspectiva destes outros
— para, adiante, termos uma chance de cumprir o primado categórico de todas as
éticas, de tão difícil realização: ser o que se é.

Como afirma Octavio Paz (citado por Perrone-Moisés), o poeta encontra sempre, na
linguagem, a alteridade (a otredad): "Escrevemos para ser o que somos e aquilo
que não somos. Num ou noutro caso, buscamos a nós mesmos. E se temos a sorte
de encontrar-nos — sinal de criação — descobrimos que somos um desconhecido."
Arthur Rimbaud, poeta francês, disse-o com maior economia de meios (de
palavras): "je est un autre". Mais do que afirmar que eu posso ser um outro, ou
seja, posso usar diferentes personas (em sentido estrito, máscaras), Rimbaud

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afirma que "eu é um outro", isto é: minha identidade se define de fora, pela
linguagem e, principalmente, pela linguagem dos outros. Reconhecê-lo pode ser
desesperador, mas quebra toda a arrogância na sua raiz.

Entretanto, devemos historicizar, ou seja, situar sob uma perspectiva histórica, este
nosso esforço de conceituar a literatura como perspectivização da verdade. Se
concordamos que possa ser assim hoje, configurando ainda, a despeito da
emergência dos media, a necessidade da literatura, podemos concordar que
sempre tenha sido assim? Por que a literatura tem importância institucional? Por
que é ensinada nas escolas e nas universidades? Por que tantos alunos, e até
mesmo muitos professores (mormente das chamadas disciplinas exatas),
consideram o estudo da literatura o supra sumo da cultura inútil e, a despeito, ela
continua a ser ensinada e cobrada, com significativo espaço na grade curricular e
nos exames vestibulares? Um pouco de história do seu conceito pode nos ajudar a
responder a estas perguntas.

Timothy Reiss, num trabalho chamado "The invention of Literature", estabelece


precisamente o ano de 1635 como o da invenção da literatura, tal como desde
então a conhecemos. Naquele ano, em janeiro, o cardeal Richelieu, pouco depois de
jogar a França na Guerra dos Trinta Anos (que, obviamente, ainda não era
conhecida assim), ajuda a fundar a Academia Francesa, com o objetivo de tornar o
francês "the most perfect of the modern languages": não apenas elegante mas
ainda capaz de lidar com todas as artes e todas as ciências. Os membros da
Academia receberam as tarefas de compilarem um dicionário e elaborarem uma
gramática normativa. O dicionário deveria prover o significado único de cada
palavra, enquanto que a gramática deveria prover as ferramentas analíticas
necessárias a toda expressão da atividade humana. Em 1637, o Cardeal acrescenta
uma terceira tarefa: formular as normas das bonnes lettres, ou seja, das letras
escritas para dar conta do "bom sentido", portanto, do sentido da verdade, tal
como recentemente o filósofo René Descartes proclamara. Estas normas se
inspiravam, é certo, naquelas que Aristóteles teria formulado na sua Arte poética
muitos séculos antes, mas se vinculavam, de maneira explícita, à defesa política de
uma língua, portanto, em conseqüência, à defesa política de uma nação. No final
daquele mesmo século, John Dennis (talvez o primeiro crítico literário profissional)
afirmava que "without literature a nation’s political greatness would disappear" —
sem literatura a grandeza política de uma nação poderia desaparecer. Relacionava
assim, de maneira explícita, a Literatura ao Poder. À época, a Política, a Filosofia e
a Ciência procuravam demonstrar ponto de vista semelhante: o de que a linguagem
correta e o método correto eram uma e a mesma coisa, ambos essenciais para o

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conhecimento e para a ação humana. Justifica-se, pela via da nacionalidade,
portanto, a necessidade da literatura e, conseqüentemente, a necessidade do
ensino de literatura. A consolidação dos Estados Nacionais, nos séculos XVIII e XIX,
com sua expansão imperialista e posteriores lutas de independência, apenas reforça
este projeto, atualizando-o através dos diferentes romantismos, na arte
propriamente dita, e através do ensino da literatura, implantado oficialmente nas
universidades e nas escolas.

O leitor mais perspicaz, entretanto, já terá percebido uma contradição entre o


projeto político-educacional da literatura e o Centauro com que começamos a falar
do seu conceito. Richelieu desejava a língua como expressão unívoca da verdade,
em termos gerais, para, nos termos particulares, afirmar o domínio das verdades
ocidentais e francesas, enquanto que o animal-homem de Picasso e o poeta de
Pessoa fingem, de maneira não-unívoca mas, ao contrário, totalmente ambígua, a
dor que deveras sentem.

Esta contradição está presente nas salas de aula e nos manuais didáticos. A
disciplina Literatura Brasileira tem um razoável espaço na grade curricular e nos
exames vestibulares, mas alunos e professores das demais matérias não
conseguem compreender completamente a sua utilidade, se comparada com
Matemática, Biologia, até mesmo História. Não à toa os manuais didáticos
soberanamente se recusam a tratar dos conceitos-chave da disciplina, ou o fazem
num capítulo introdutório e perfeitamente descartável, repisando a noção de
literatura como belles lettres e sua vinculação estreita com a nacionalidade. Não à
toa os manuais didáticos permanecem presos, no final do século XX, à concepção
romântica da história como combate de antagonismos. O século XIX, romântico-
positivista, leu os séculos anteriores, anacronicamente, à luz da sua própria falsa
dicotomia entre a razão (realista) e a emoção (romântica). Essa concepção é
aparentemente uma bobagem, pela perspectiva de qualquer teoria do
conhecimento desenvolvida no nosso tempo. No entanto, se tal concepção se
manteve por tantas décadas — na verdade, se mantém até hoje, na maioria
absoluta dos manuais —, não basta dizer que é uma bobagem. Porque serve aos
propósitos dos Richelieu e demais estadistas ou pedagogos de plantão, qual seja, a
defesa, simultaneamente espetacular e subliminar, da Língua e do Estado nacionais
— vale dizer, da Política e da Guerra. As aulas e os estudos de literatura ou se
tornam acontecimentos para exercícios de patriotismo e pieguice, e neste sentido
são soberanamente chatas, mas necessárias (inclusive, creio, é necessário que
sejam chatas), ou se tornam realmente inúteis, se comparadas com a noção de
utilidade presente nas demais disciplinas do currículo.

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Aquelas obras, entretanto, que não se encaixam nos malfadados “estilos de época”
(as de Miguel de Cervantes, William Shakespeare, Machado de Assis e Guimarães
Rosa, por exemplo), sugerem mistério mais profundo que o da pátria geográfica.
Patriotismo, a propósito, para Vilém Flusser (filósofo tcheco que viveu no Brasil por
trinta anos), é sintoma de enfermidade estética, na medida em que transforma o
hábito — “a camada de algodão que encobre os fenômenos e ameniza as rebarbas”
— em algo misterioso, isto é, em algo a ser glorificado e fetichizado. O patriota
sempre corre o risco de cometer crime ético-político ao santificar o costume. O
costume mistificado encobre a feiúra, a miséria, a doença da nação. Sempre que
voltava a São Paulo de uma viagem, Flusser se chocava com as crianças famintas
nas favelas e nas esquinas, mas depois se horrorizava porque, justamente, como
qualquer brasileiro, percebia-se se acostumando com o que via: “o costume
patriotizado é crime ético-político, ou seja, um pecado que o patriotismo glorifica.
Confundir morada com pátria, costume com mistério, eis o que me parece ser o
núcleo do patriotismo”, afirmava, em artigo publicado n'O Estado de São Paulo de
14 de dezembro de 1991.

A capacidade da literatura de multiplicar ambigüidades contribui para deslocar o


costume do seu lugar confortável, tornando-o desconfortável. Escreve-se, na
verdade, não contra alguém ou algo, mas contra as idéias prontas. Isto pode
parecer não exatamente inútil, mas subversivo, ou revolucionário, quando aí sim
teríamos uma utilidade para a literatura, ainda que "à esquerda". Trata-se, no
entanto, do mesmo clichê espelhado. A literatura também não é revolucionária, a
despeito da literatura que se queria engajada. À pergunta "para que serve a
literatura", a resposta mais honesta seria: de fato, para nada. Poesia e literatura
não são úteis, no sentido pragmático e capitalista (ou comunista) do termo. Num
mundo em que “tempo é dinheiro”, a poesia configura real perda de tempo —
portanto, de dinheiro (como bem sabe a maioria daqueles que se dedicam ao seu
mister). É verdade que, para os funcionários alienados de todos os aparelhos
institucionais, para os professores amarrados em múltiplas escolhas que não
admitem qualquer escolha (sempre só uma resposta será a certa, como se os
fenômenos admitissem uma e somente uma "alternativa" correta), para os
workaholics desesperados por ascenderem até o teto das suas carreiras, para os
políticos e governantes envolvidos com altas economias e altas mutretas, a
literatura pode ser não apenas inútil como perigosa — como o demonstra muito
bem a censura de todos os Estados, que encontrou sua forma mais espetacular nas
enormes fogueiras nazistas de livros, durante a Segunda Grande Guerra. Mas ainda
assim ela é outra coisa, para além desse desmonte do costume e da idéia pronta

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(porque, se não for esta "outra coisa", a própria literatura se transtorna em
costume, isto é: no estilo de uma época).

Um excelente ícone deste mundo encontramos nas corridas de Fórmula 1, em que


se gastam fortunas imensas para construir carros cada vez mais rápidos que
correm todos em círculo exatamente no mesmo lugar, numa monotonia
insuportável quebrada tão-somente por um "acidente", de preferência com uma
boa morte (através da qual os espectadores possamos purgar, simultaneamente, o
nosso sadismo cruel e a nossa piedade piegas). Mas, mesmo nesse mundo, mesmo
entre funcionários alienados, professores estressados, alunos entediados, cientistas
militarizados e políticos mutretados, encontra-se, de repente, aquele que "perde"
tempo em interromper a corrida circular e volta-se para olhar a si mesmo e à sua
tarefa sob outra perspectiva. Estes podem fazer a diferença; podem ser inventores,
descobridores, filósofos, em suma, poetas. Podem ser, também e apenas, irônicos e
auto-irônicos, capazes de se libertar, ainda que por momentos e graças à própria
linguagem, das amarras da linguagem e dos aparelhos cotidianos. Não à toa,
novamente, os grandes cientistas e matemáticos, como Heisenberg, Einstein e
Russell, por exemplo, foram simultaneamente grandes leitores, apreciando
particularmente a literatura stricto sensu. Que "utilidade", então, vislumbravam no
fazer literário? A de perspectivizarem o seu próprio conhecimento, aprendendo,
sem parar de aprender, a olharem o mundo, os fenômenos e a si mesmos sob
perspectivas inusitadas, superando por instantes os limites da percepção e da
história humanas.

Isto não significa, de modo algum, que a literatura seja o apanágio dos bem-
pensantes, ficando todo o resto para os não-pensantes. Posso encontrar, se o
quiser, outros tantos exemplos de grandes cientistas e pensadores que não
gostavam de literatura. Como bem disse Jean-Paul Sartre, filósofo e dramaturgo
francês, o mundo pode viver muito bem sem literatura (na verdade, pode viver
melhor ainda sem o ser humano). Entretanto, como o autor destas linhas vive da e
para a literatura, forçamente tende a seu elogio (o que pelo menos é melhor do que
passar a vida lamentando as opção que fez). Descontada esta parcialidade,
podemos retornar ao nosso argumento, historicizando mais um pouco o conceito de
literatura.

Roberto Acízelo, no verbete inédito "Literatura" (preparado para um futuro


Dicionário de Termos Críticos e Literários), reconhece duas hipóteses básicas para a
constituição do conceito: a hipótese nominalista e a hipótese realista. A hipótese
nominalista entende que, se o termo "literatura" é de fresca data (um marco

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plausível, como vimos, seria 1637), os fatos literários também o seriam. Logo, falar
em "literatura grega antiga", por exemplo, encerraria, mais do que um
anacronismo, verdadeiro nonsense. A hipótese realista entende, por sua vez, que
os fatos literários existem independentemente do vocábulo literatura, o que
permitiria falar em "literatura grega antiga", mesmo sabendo-se que tal modo de
dizer constitui solução léxica recente, não sendo contemporânea do fenômeno que
designa. Para Acízelo, porém, ambas as hipóteses são inconsistentes. A hipótese
realista não considera as mudanças históricas. As chamadas "artes verbais", em
meados do século XVIII, sofrem profunda reconcepção, que se consuma no início
do século XX. Muda, por exemplo, e de maneira radical, a noção de "autor": à
compreensão medieval do autor como authoritas, vale dizer, autoridade, segue-se
o ideal moderno, romântico, do autor como individualidade criativa. Muda, também,
a relação entre arte e técnica, pela perspectiva do trabalho: até o século XVIII,
produtos discursivos heterogêneos — prosa, verso, ciência, ficção, filosofia, carta —
submetiam-se à mesma arte (no sentido clássico: técnica, habilidade, perícia,
ofício), quando se observa o crescimento da distância conceitual entre razão e
imaginação — filosofia e ciência passam a se ocupar com a razão, enquanto a
imaginação torna-se apanágio de uma arte, cujos diversos gêneros logo seriam
recobertos pela palavra literatura, então submetida a uma espécie de reciclagem de
seu significado. A hipótese nominalista, por seu lado, sofre do pecado oposto,
encarando a reciclagem de um significado como a invenção de significado
inteiramente novo. Na verdade, o termo literatura não seria uma solução léxica tão
recente assim. Em latim, a palavra littera traduz o termo grego gramma,
significando letra do alfabeto, ou carácter da escrita. O coletivo litterae, equivalente
ao grego grammata, indica, primeiro, uma carta (epistula), e depois, por extensão,
qualquer tipo de obra escrita, ou então instrução, cultura. Cícero, no século II antes
de Cristo, já empregava litterae, bem como o neologismo litteratura, no sentido de
cultura obtida mediante o domínio da arte de ler e de escrever. Aulo Gélio, no
século II depois de Cristo, identifica o latim humanitas com o grego paidéia,
servindo-se do vocábulo litterae para designar o estudo das artes e letras dos
gregos, concebidas como representantes da idéia geral de homem (donde
humanitas, literalmente, "humanidade"). No latim medieval, os vocábulos da
família morfológica litterae tornam-se pouco utilizados, recobrando alento no
Renascimento, derivando-se em lettres humains e bonnes lettres (século XVI),
good letters e belles lettres, littérature e literature (século XVII). A partir do século
XVIII, a palavra "literatura" passa a significar, nos diversos idiomas ocidentais,
certo corpo heterogêneo de escritos, repositório de saberes tidos por relevantes
para todos os homens. Com a autonomização e especialização das diversas

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ciências, este sentido se restringe às produções ficcionais e de poesia, embora
ainda se use, concomitantemente, para designar outros conjuntos de escritos (por
exemplo, "literatura jurídica"). A vinculação estreita que se faz entre aquelas
produções ficcionais e as línguas nacionais (promovida desde Richelieu, como
vimos) abre espaço para expressões como "literatura brasileira", "literatura
portuguesa", "literatura francesa", e assim por diante. Verifica-se, portanto,
considerando o trajeto histórico da palavra, que ela está longe de ser uma novidade
setecentista ou oitocentista.

Entretanto, exatamente o seu caráter plurissignificativo, já referido, associado às


mudanças históricas observadas, deve nos advertir para a fluidez do conceito.
Capturar o seu sentido, bem como o sentido das suas manifestações (dos contos,
dos poemas, das obras), não se mostra tarefa simples que se possa executar com
dois passos, apenas observando e relatando o observado. Em relação às
manifestações literárias propriamente ditas, quais sejam, os textos, não existe um
instrumento adequado, do tipo microscópio semântico, capaz de nos ajudar a ler
nas suas entrelinhas, isto é, capaz de nos ajudar a explicitar o que se encontra
implícito, ou dizer o "não-dito". A máxima do cientista do século XIX, na verdade a
mesma de São Tomé — “só acredito no que se possa ver” —, não funciona em
relação à literatura. O texto literário, ao menos como o conhecemos hoje, menos
descreve determinado fenômeno que o autor teria observado, porque antes sugere
alguma coisa que não está ali nem é dita. Logo, o fundamento da literatura é,
paradoxalmente, invisível, advindo de um efeito de sugestão. Tal efeito parte da
economia de meios a que nos referíamos, na abertura do trabalho, com relação a
Picasso, Pelé e Hitchcock.

Reduzir um centauro a linhas — na verdade, a uma única linha — é um trabalho


colossal, implicando toda a energia e concentração de uma vida. Deve parecer ao
espectador, todavia, simples, sugerindo, com leveza máxima, os músculos, a força,
a vontade, o desejo, a fantasia e a impossibilidade. O escritor faz aproximadamente
o mesmo, reduzindo um fenômeno a uma espécie de forma alusória e ilusória,
apresentando isto no lugar daquilo, de tal modo que o leitor "veja" isto e aquilo, e
ainda o que o escritor não viu nem pôde imaginar. Esta redução condensada do
fenômeno toma os prosaicos nomes de "metáfora" (isto no lugar daquilo,
exatamente) e "metonímia" (a parte pelo todo, ou o todo pela parte, mais
precisamente).

A metáfora também é chamada, pela teoria psicanalítica, de "condensação",


enquanto a metonímia se reconhece como um "deslocamento". Ambos os conceitos

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e processos, fundamentais para se compreender o conceito propriamente dito de
literatura, também o são para se compreender os movimentos oníricos, vale dizer,
os sonhos de toda a gente. Na verdade, não são apenas os poetas e os professores
de literatura que ficam fazendo metáforas ou falando delas; o leitor, no momento
em que fecha os olhos e adormece, tem sonhos nos quais produz sucessivas
metáforas e metonímias — nos quais faz, podemos reconhecer, poesia. Se sonha
com uma intensa cor vermelha se sobrepondo às trilhas do seu caminho, pode, sem
que conscientemente o saiba, estar promovendo o deslocamento metonímico da cor
da camisa de determinada pessoa que encontrou durante o dia; se sonha com um
ninho de passarinho, vazio, pode, sem que conscientemente o saiba, estar
figurando a condensação metafórica de um certo colo, profundamente desejado.

O ninho, no caso, como qualquer imagem metafórica, não é somente um resumo


da idéia de "colo" (ou outra parecida, que não nos cabe interpretar assim, com
tanta segurança, os sonhos do leitor, ou leitora), mas uma espécie mesma de
redução do fenômeno à sua potência. Condensar, neste caso, não implica apenas
tornar breve, mas igualmente saturar de sentido. O centauro de Picasso não
somente resume as idéias mitológicas dos homens-animais, como minotauros e
sereias, mas gera um enigma que só pode ser momentaneamente resolvido em
confronto com as dúvidas mais íntimas do espectador, isto é, em contato com o
caráter radicalmente enigmático da existência de nós todos (afinal de contas, quem
somos, de onde viemos, para onde vamos, o que estamos fazendo aqui?).

Para que o leitor possa lidar com o enigma que a literatura e, quiçá, a vida,
representam, há a necessidade, como Samuel Coleridge formulou, da “suspensão
voluntária da descrença” — the willing suspension of disbelief —, movimento que
todo leitor de poesia precisa fazer para se permitir “embarcar” no poema que lê, de
modo a poder de fato “curti-lo” (nos sentidos arcaico e popular do termo). A
suspensão da descrença vale tanto para um poema quanto para um filme estilo
007, em que o espectador se exige embarcar na narrativa como se fosse verdade.
Esta atitude do "como se" (derivada do se  então que gera os conceitos e o
pensamento) é fundamental, porque, sem ela, o espectador se sente enganado ao
assistir a tanta "mentira". Na verdade, um bom espectador e um bom leitor
desejam ser enganados — mundus vult decipi, decipiatur ergo —, para que, por sua
vez, se sintam existencialmente capazes de enganar, vale dizer, de iludir,
transformando-a, a própria realidade. Naturalmente, a suspensão da descrença é
uma espécie de exercício que se faz por certos momentos; se suspendêssemos a
descrença para sempre, entraríamos na tela do filme (como o faz a personagem de
The purple rose of Cairo, filme de Woody Allen) para não sair nunca mais.

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E como deve ler o leitor especializado, isto é, o teórico, o crítico, ou o professor?
Creio que nós precisamos efetuar uma espécie de “suspensão da suspensão da
descrença”, ou seja, uma suspensão de segundo nível que implica uma segunda
leitura. Afinal de contas, sustentamos em nossas aulas, tudo o que merece ser lido
merece ser relido. Um dos perigos que corremos é fazer a primeira leitura como se
já fosse a segunda, analisando apressados o texto em suas partes constitutivas. Se
isto acontece, perdemos o prazer que nos levara, certo dia, a estudar literatura. A
tarefa crítica, propriamente, deve se exercer no momento da segunda leitura que,
aí sim, se desdobra em duas perspectivas: pela primeira perspectiva, deve-se reler
o texto para melhor entendê-lo e para melhor relacioná-lo com os outros textos
que conhecemos; pela segunda perspectiva, deve-se procurar ler exatamente a
nossa primeira leitura, isto é, como lemos da primeira vez, como o texto nos
afetou, nos mobilizou, por que veredas nos interessou. Este é o segredo (bem,
agora não é mais segredo) que junta as pontas da razão com as pontas da emoção,
tornando honesto e significativo o nosso trabalho. Dessa maneira, podemos
entender o processo que não só faculta como provoca aquela “suspensão da
descrença” (processo que, de resto, nas melhores histórias, persiste misterioso).

Mas esta segunda leitura (que não apenas relê um texto, como também "lê" a
primeira leitura) não basta, se quisermos compreender um pouco mais o conceito
de literatura. Parte da filosofia propõe algo bastante parecido com a suspensão da
descrença, formulada por Coleridge, e com a "suspensão da suspensão da
descrença", que formulamos nós. Poderíamos chamar este algo, por comparação,
de suspensão da crença — suspensão da crença nos mapas, vale dizer, na teoria,
na filosofia, na ciência. O exercício de “suspensão da crença” é o principal
responsável pelo misto de fascinação e vertigem que continua provocando a leitura
dos livros e do mundo, mesmo no leitor que vai se especializando. Tal qual
acontece com a suspensão da descrença, trata-se de um exercício que se faz por
um momento; depois, precisamos refazer, embora sob perspectiva renovada, a
nossa crença nos mapas do mundo: na teoria, na filosofia, na ciência.

A suspensão da crença é a epokhé. Para os gregos, a epokhé era o estado de


repouso mental, no qual não afirmamos nem negamos nada, o que tanto nos
conduz à imperturbabilidade, quanto nos deixa abertos a todas as perspectivas dos
fenômenos. O filósofo Edmund Husserl, bem mais tarde, revive o conceito,
tornando-o o eixo da sua "redução fenomenológica", pela qual "suspendemos o
juízo acerca do conteúdo doutrinal de toda filosofia determinada e realizamos todas
as nossas comprovações dentro do quadro desta suspensão". A epokhé, portanto,

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corresponde à suspensão momentânea do juízo, para se tentar "ver" o fenômeno
sob nova perspectiva.

Quando exercitamos a segunda leitura sobre os textos e sobre as coisas, somos


inevitavelmente teóricos. Na verdade, a teoria não é necessariamente "chata", nem
elimina o chamado "prazer do texto" (que é, aliás, uma expressão teórica). A teoria
se torna árida, seca, burocrática, somente quando pára de pensar sobre si mesma,
acreditando-se acima da crítica e da reflexão e se sobrepondo totalitariamente ao
método e à prática. Quando se coloca a teoria na frente do método, ela fica se
parecendo com uma chave de fenda que não encontra, na dimensão do real, a
fenda que lhe cabe, e então “arranha” o real até forjar a fenda e torcer o fenômeno
para onde a teoria dizia a priori que ele ia. Quando, pelo contrário, se coloca o
método na frente da teoria, no entanto, os procedimentos se tornam mais difíceis e
mais delicados, porque o fenômeno ele mesmo passa a revelar a teoria que o
informa, construindo, a partir daí, uma nova teoria que contemple as relações do
sujeito com o acontecimento. Quando se coloca o método na frente da teoria, se
faz indispensável suspender, de quando em quando, a crença na própria teoria,
justo para vivificá-la.

Encontramos eco importante desta epistemologia no trabalho do psicanalista Fábio


Herrmann. A psicanálise, aliás, é mestra na segunda leitura, ensinando seus
praticantes e pacientes a desconfiar do que se diz, de si mesmos e das suas
próprias teorias sobre o ser humano e sobre a realidade — porque procura, no não-
dito, nas entrelinhas, a chave escondida. Neste sentido, a interpretação
psicanalítica pode nos ajudar bastante na interpretação literária (assim como a
literatura ajudou a psicanálise — é só lembrar como a peça de Sófocles, Édipo-Rei,
emprestou a Freud os personagens e as tramas para o fundamental conceito de
"complexo de édipo").

Herrmann propõe um processo terapêutico em que o método, e não as teorias,


determina a escolha e a seqüência das etapas, justamente para se poder criar com
cada paciente a teoria original que melhor lhe cabe. Considera fundamental não
confundir o paciente vivo com a psicanálise e seu jargão, para não enxergar apenas
as lentes no lugar do objeto visado. É preciso, Herrmann o diz explicitamente,
ensaiar, desde a primeira entrevista, um corte fenomenológico na ação
psicanalítica. Não se deve sonhar em conhecer o paciente “como ele é”, sob pena
de hybris (isto é, de arrogância desmedida). Freud propunha a escuta analítica
regida por uma espécie de “atenção livremente flutuante”, que outra coisa não é do
que a condição sine qua non para se ler a própria primeira leitura. Poderíamos

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chamá-la, também, de “desatenção heurística”. Equivale a assistir a um “filme de
autor”, daqueles instigantes mas indefinidos, recusando-se a atribuir-lhe um
sentido pelo maior tempo suportável — até que, de repente, surja, como um
insight, como um estalo, aquela sensação de compreensão totalizante. Todavia, é
importante, nesta hora, fazer nada. Nada. Apenas tomar em consideração e não se
apressar em explicar, não se apressar em traduzir em palavras. As palavras
apressadas não só não conseguem traduzir aquela sensação íntima, como ainda a
encolhem e a amesquinham irremediavelmente.

Sentimos isso quando saímos do cinema, depois de um filme particularmente


mobilizante. Mal nos levantamos da cadeira, a sensação é de compreensão global,
como se a emoção tivesse tomado a forma da narrativa e nos devolvesse inteiros,
razão e afeto reconciliados. No entanto, a pessoa que está conosco não se contém
e pergunta, ansiosa: "e aí, o que achou?" Neste instante, a tal sensação de
compreensão se esvai por um ralo, e não conseguimos expressar nada mais do que
clichês vazios, do que exclamações sem frases e sem idéias. Precisávamos de mais
tempo, tempo interno, para elaborar a experiência em silêncio. Esta elaboração
silenciosa da experiência é necessária tanto na literatura quanto na psicanálise.
Herrmann chama a isso de “nado de peito”: uma longa imersão no material do
paciente — para deixar que surja —, seguida de um movimento de ascensão,
quando se respira e se contempla o conjunto — para poder tomar em consideração.
Segue-se, sempre, não uma interpretação pontual, mas sim uma nova braçada,
para imergir no fenômeno e deixar, novamente, que surja.

Deste modo a interpretação, antes de se afigurar completamente ciência, é uma


arte: a arte de agarrar a poça d’água (como na fábula de Menelau e o veraz Proteu
que, tal qual a verdade, metamorfoseava-se continuamente em fera, em árvore e
em água), mais um dedilhar da alma alheia do que uma formulação
pseudocientífica sobre o discurso do outro. Na minha disciplina específica, em outro
momento (no livro Quem pode julgar a primeira pedra?), eu dizia preferir, aos
sintagmas “teoria literária” (que presume uma teoria com a vã pretensão de se
substituir a seu próprio objeto) e “teoria da literatura” (que presume um
distanciamento dito objetivo) a expressão “teoria na literatura”. A vantagem dessa
expressão reside em, primeiro, não recair nos equívocos suscitados pelos outros
dois sintagmas, e, segundo, escapar dos preconceitos de imanência a que a própria
gramática nos força, substantivando e concretizando processos e contextos. A
atenção flutuante, a leitura da leitura, a desatenção heurística, a redução
fenomenológica, a teoria na literatura, são maneiras, ou métodos, propriamente, de
assumir as curvas do caminho, reconhecendo que não há linha reta, nem nas coisas

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nem na linguagem. Deduz-se, daí, a necessidade da suspensão da crença, a
necessidade da epokhé, porque, “a bem da verdade, não existe a razão, ela só
existe em pedaços” (conforme a formulação feliz de Deleuze).

Só assim podemos nos espantar, não com uma pintura, mas


com o próprio gesto de pintar, tal como nos foi
reapresentado por René Magritte no seu quadro de 1928,
Tentando o impossível, que retoma, de maneira
especialmente perturbadora, a lenda do escultor Pigmalião.
Agora é o pintor que "esculpe", não com o cinzel mas com o
pincel, a sua bela mulher. Este quadro mostra que não
existe algo assim como um pintor, que de fora possa
escolher pintar uma modelo, nem algo assim como uma
modelo, que existe prestes a ser retratada: existe, sim, o
gesto concreto de pintar, e nele se "realizam" (na acepção britânica do verbo)
pintor e modelo (ainda que sempre falte o braço de Vênus).

Admite-se que semelhante descrição do gesto de pintar, bem como tudo o que até
aqui se falou do espanto, da redução fenomenológica e da epokhé, soa a mística,
se por "mística" se entende a "desaparição", a indistinção do sujeito e do objeto na
realidade concreta. De fato, estamos nos aproximando (alguns diriam:
perigosamente…) da concepção do budismo-zen, da união mística e íntima do
arqueiro com o alvo, do chá com a cerimônia de tomar o chá. Com efeito, o zen
deseja acentuar, como o método da fenomenologia, a vivência concreta dos
fenômenos. O mestre zen não vive a meditar, as pernas cruzadas em posição de
lótus (esse é um clichê ocidental); ele deve ser profundamente iconoclasta,
chutando, literalmente, todas as imagens, principalmente as imagens da sua
própria cultura (as de Buda, por exemplo), para banir toda distinção entre o
sagrado e o profano, de maneira a sacralizar o cotidiano. De outra parte, a
literatura parece fazer o mesmo: sacraliza o cotidiano, ao erigir um altar fugaz,
sem pompa e sem pose, ao enigma.

Os koans, charadas paradoxais do zen, revelam que o mundo, tal como o


concebemos, é mera dependência da linguagem. Duvida-se metodicamente, ou
melhor, religiosamente: a imagem de um indivíduo ocupado em serrar o galho
sobre o qual está sentado seria a expressão mais precisa desta dúvida primordial.
Suspender a crença e o juízo equivale, sem dúvida, a tentar serrar, metódica e
seriamente, o galho sobre o qual se está sentado. É por isso que dizem que a
fenomenologia, o pensamento de Husserl e de Flusser em especial, radicaliza o

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pensamento cartesiano, assumindo a dúvida não apenas metódica, como
propriamente urobórica, por seu método. Bem a propósito, Vilém Flusser entendia a
obra literária de duas maneiras: ou como uma resposta ao contexto histórico em
que surgiu (como uma resposta a um texto que a tenha antecedido), ou como uma
pergunta a dado leitor em dado momento. Se tentarmos compreender a obra como
resposta, dizia ele, precisaremos analisá-la e analisar as suas relações ou com o
contexto de que emergiu, ou com o texto que a antecedeu. O campo dessa
tentativa é a crítica. Se tentarmos enfrentar a obra como uma pergunta (vale dizer,
como uma provocação), nos obrigamos a conversar com ela. O campo da segunda
tentativa é o da especulação.

Os dois campos não podem ser rigorosamente delineados. A investigação crítica


suscita especulações, enquanto que a especulação termina por demandar a
investigação crítica. Não obstante, aos dois campos correspondem duas atitudes
diferentes. Ao campo da crítica corresponde a atitude da curiosidade, enquanto ao
campo da especulação corresponde a atitude da simpatia, no sentido grego da
palavra, ou seja, no sentido de co-vibração. Neste segundo caso, cabe entender a
obra que se lê como pretexto, propriamente pré-texto daquele texto que o leitor se
disporá a assinar, como resposta sua à pergunta, à provocação que a obra lhe fez.
Sem descartar ou desvalorizar a crítica, Flusser opta pela especulação, quer dizer,
opta por tomar o seu lugar na conversação geral, da qual a obra literária é parte
nobre.

Nesse campo, o da especulação, encontramos Luiz Costa Lima, lembrando, em


artigo publicado no Jornal do Brasil de 12 de setembro de 1998, que a tradição
insiste em tomar a ficção romanesca ou como uma fantasia compensatória do
mundo efetivo, ou como um espelhamento de certo tempo histórico, ou, ainda,
como uma reflexão imaginativa que desvela a "estrutura" da sociedade. No
primeiro caso, a obra literária serve de divertimento, para o leitor comum, e, para o
leitor especializado, se presta ao estudo particularizado e fragmentado de seus
recursos expressivos (a ironia, a alegoria, a metáfora, e assim por diante). No
segundo caso, a obra literária é um espelho que revela à sociedade como ela seria.
O terceiro caso é uma variante sofisticada do segundo: a literatura não seria bem
um reflexo da sociedade, mas uma espécie de processo imaginativo que captaria o
cerne, a "alma" da sociedade. Ora, os três casos fazem a maior força para
emprestar, à literatura, aquela utilidade que dizíamos não existir, até porque essa
noção de utilidade é unívoca e linear, estabelecendo relações estreitas de causa e
efeito, ou de intencionalidade e resultado, que contradizem o espírito espiralado da
arte (quiçá de todo o pensamento humano, como admitem muitos filósofos e

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cientistas). Por isso, Luiz pode afirmar que aceitar a leitura de uma obra enquanto
ficcional implica pôr em questão, simultaneamente, tanto a possibilidade de
significação da ficção quanto a possibilidade do nosso sentido da realidade: "se é
ficção, como pode ser séria? Se é séria, como o leitor não sentirá perturbadas as
respostas sérias que dá ao dia-a-dia?" Gera-se desse modo uma tensão de
atitudes, em que cada uma é minada pelas outras. É o assumir da tensão que faz a
fecundidade da postura especulativa. Por isso, nem a leitura técnica nem a leitura
histórico-sociológica do texto literário seriam suficientes. Não haveria, portanto,
pergunta Costa Lima, algum homólogo à fala que mostrasse o mundo como um
útero múltiplo, onde a miséria e o absurdo pudessem conviver com formas
inesperadas de alegria?

Esta pergunta é muito boa. Podemos terminar com ela.

* O texto "O conceito de literatura" foi publicado


no livro Introdução aos termos literários (1999),
organizado por José Luís Jobim e editado pela
EdUERJ.

referências bibliográficas

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Borheim da versão inglesa. São Paulo: Abril Cultural, 1979.
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Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1978.
Galassi, Susan Grace [introduction]. Picasso’s one-liners. New York: Artisan,
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Reiss, Timothy. The meaning of literature. New York: Cornell University Press,
1992.

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