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Helene Shinohara
RESUMO
Several new theoretical aspects and techniques have been added to cognitive therapy
since its beginning as a therapeutic approach. The need to expand the limits came
from the clinical work, especially with challenging clients. The work with dreams in
psychotherapy is one of these issues. Research suggests that some dreams may have
relation to the dreamer’s personality, contain the same themes and expectations of the
awaken life, and express similar worries. Therefore some dreams could be considered
important therapeutic material, where cognitive and emotional patterns are expressed
and when schemas are fully activated. As the access to the dream memories and its
discussion occur in the awaken state, the mode to remember details and the
organization of the material will be influenced by the same characteristic distortions
one uses to interpret reality. The objective of this article is to present some
considerations about the cognitive model of dreams, including the description of an
intervention that used a dream as a sign of change in the client’s core belief.
Introdução
Vários assuntos são pouco explorados na literatura sobre terapia cognitiva, por
diferentes razões. Apesar de fronteiras terem sido ampliadas e problemas antes
considerados de difícil prognóstico já poderem ser analisados e tratados, outros temas
relativos a aspectos clínicos relevantes acabaram por ficar fora do âmbito dos estudos
da mais promissora abordagem psicoterapêutica. Até bem pouco tempo atrás, os
principais livros sobre terapia cognitiva para profissionais, recomendados pelo site do
Beck Institute, enfatizavam teoria e técnica, e quase nada tinha sido publicado sobre
relação terapêutica, resistência, transferência e contra-transferência, inconsciente e
sonhos. É importante que artigos existentes sobre estes assuntos sejam
compartilhados e novos sejam escritos, por mais que pareça difícil ou pretensioso.
Perguntas sobre estes assuntos são freqüentemente feitas por alunos nas salas de
aula. Em conversas entre colegas (terapeutas experientes), discutem-se dificuldades e
peculiaridades dos casos que não respondem aos procedimentos básicos da terapia
cognitiva. Os clientes também nos colocam em situações para as quais nem sempre
estamos preparados tecnicamente. Portanto, são estes os desafios que nos forçam,
cada vez mais, a buscar novos horizontes.
Os sonhos
Sonhar é uma experiência humana que, desde sempre, intriga, confunde e encanta
tanto o homem comum quanto o cientista. A sabedoria popular encontra relações
causais entre um determinado tipo de sonho e certo acontecimento; ou credita-lhe
poderes de revelação sobre o futuro ou sobre enigmas; ou ainda de cura. Há
explicações que enfatizam a necessidade de reencontros com entes queridos que se
foram, ou até que os exploram como oportunidade para experiências extracorporais
importantes, para insights e para soluções de problemas do dia-a-dia. Há, portanto,
uma série de crenças a respeito dos sonhos, seus poderes e significados.
Para a psicologia, qual seu valor? Terá o sonho relação com a personalidade daquele
que o sonha? Terá alguma colaboração a dar? Estas perguntas têm sido respondidas
de forma diferente em cada uma das abordagens. Freud (1976), destaca a
interpretação do sonho como técnica importante para acesso e entendimento do
Inconsciente. Para Jung (1996), os sonhos têm função compensatória, ao apresentar
ao ego pontos de vista que são complementares às atitudes dominantes quando
acordados, além de revelar o inconsciente coletivo. A Gestalt entende os sonhos como
produto pessoal do sonhador, e todos os elementos introduzidos nele como projeções
dos aspectos da sua personalidade (Perls, 1977). Para os behavioristas radicais, os
sonhos são comportamentos discriminativos que trazem informação relevante sobre a
história passada e as contingências de reforçamento atuais (Skinner, 1976). Concorda-
se, então, que é uma atividade do ser humano que pode ser valorizada em
psicoterapia.
É no estágio do sono chamado de REM, que está associado a movimentos rápidos dos
olhos, que ocorrem os sonhos. Neste momento, observa-se uma alta atividade
cerebral; níveis de acetilcolina altos e de serotonina e noradrenalina baixos; sonhos
vívidos, bizarros e com imagens complexas. As imagens são claras e nítidas, apesar de
ausência de crítica, quando se aceita, por exemplo, como natural, estar sonhando com
uma pessoa que se transforma em outra no meio da conversa; quando se está em um
local e, de repente, em outro; ou quando coisas impossíveis ocorrem naturalmente
naquele contexto.
De qualquer forma, os sonhos fazem parte da experiência humana e têm sido foco
central nas psicoterapias psicodinâmicas. Por isso, discute-se a utilidade de uma teoria
dos sonhos que não esteja estabelecida em princípios psicanalíticos. Terapeutas
cognitivo-comportamentais podem construir uma compreensão dos sonhos baseada
em teorias contemporâneas e encontrar utilidade na análise de alguns sonhos, de
alguns clientes, em algum momento do trabalho clínico.
Em revisão de pesquisas realizada por Beck (1971), conclui-se que os temas dos
sonhos estão correlacionados com categorias diagnósticas. Por exemplo, depressivos
relatam sonhos de derrota e coerção; paranóides, de perseguição ou abuso; ansiosos,
de perigo; e maníacos, com temas expansivos e de grandeza. É sugerido que o
trabalho com sonhos pode também servir ao propósito de confirmação ou refutação de
hipóteses diagnósticas.
A narrativa imposta pelo sonhador ao seu sonho quando o conta pode servir como uma
tentativa de interpretar e estabelecer alguma ordem à experiência sensorial caótica
vivenciada durante o sono. Este “barulho” refletido da atividade cerebral durante o
sono, quando lembrado em partes ao acordar, será arranjado numa seqüência
coerente para ser relatado.
O trabalho terapêutico
Muitas vezes, os sonhos são trazidos espontaneamente pelo cliente e podem ser parte
da agenda daquela sessão como qualquer outro assunto. Terapeutas cognitivo-
comportamentais têm dificuldade e se sentem pouco à vontade nestes momentos, já
que não estão familiarizados com esta perspectiva por não encontrarem referências
claras na bibliografia regular. A história do sonho nada mais é do que uma
oportunidade extra para identificação, questionamento e reformulação de crenças.
O trabalho terapêutico com os sonhos do cliente pode ser escolhido como estratégia
em momentos em que a terapia parece estar estagnada, por exemplo, ou quando
emoções fortes são vivenciadas neles. Para tanto, deve fazer parte da agenda da
sessão como qualquer outro assunto, como sugerido por Freeman e White (2004).
Registros de sonhos, fragmentos ou imagens devem ser pedidos de forma análoga aos
registros de pensamentos disfuncionais. Quando ocorreu o sonho, qual era a cena, o
que pensou, o que sentiu e o que fez. Os personagens envolvidos também serão
explorados, pois podem trazer diferentes perspectivas sobre o tema.
3. Qual o título desta história? Qual a relação deste título com a história?
Caso clínico
Suas crenças mais negativas sobre si mesmo e sobre o mundo são novamente
ativadas. As crenças nucleares identificadas são: “eu sou inseguro e incapaz de lidar
com a vida” e “o mundo só reconhece os vencedores”. Os principais temas das suas
preocupações se concentravam nos estudos, no estágio, nos relacionamentos, nas
doenças e no futuro. Apresentava medo acentuado de fracassar e decepcionar
principalmente o pai, um modelo de sucesso a ser seguido. As preocupações tinham
como principal objetivo evitar que isto acontecesse.
Após alguns meses de terapia, nenhum novo ataque de ansiedade tinha sido relatado,
e o cliente demonstrava habilidade em identificar disparadores das preocupações e
trabalhar com seus pensamentos disfuncionais. Conseguiu começar um estágio em sua
área, estabelecer algumas novas amizades e sair pelo menos em alguns dos fins de
semana.
T: “O que está passando na sua cabeça, quando você está naquele canto da prisão?”
C: “Está passando que estou sozinho, impotente, sem ninguém para me ajudar, que
eu vou ficar ali para sempre e, principalmente, que ninguém vai entender plenamente
o que estou sentindo. É um sentimento terrível e é só meu, eu estou existencialmente
sozinho na minha vida, eu não sei como lidar comigo mesmo e com a situação, preciso
que alguém me ajude e não tenho a quem recorrer, estou despreparado para enfrentar
o mundo.”
C: “É, e quando penso assim, sei que sinto muito medo, como no sonho.”
Após alguma discussão sobre isto, continuamos a explorar a segunda parte do sonho:
C: “Acho que algo do tipo: Não se preocupe, tudo tem jeito, você pode contar comigo.”
T: “Porque será que ele aparece neste sonho e não nos anteriores?”
C: “Me parece que tem alguma mudança no sonho e que essa mudança tem a ver com
o que a gente vem discutindo nas sessões.”
T: “Como assim?”
T: “Por que será que apareceu no sonho um jovem advogado e não outra pessoa
qualquer, seus pais, por exemplo?”
Foi interessante discutir, a partir deste ponto, as mudanças em suas crenças, ao longo
da terapia. Ele concluiu a sessão refletindo sobre como estava aos poucos se sentindo
menos menino, menos despreparado. Para o terapeuta e para o cliente, este sonho foi
importante no sentido de permitir perceber que antigas crenças estavam sendo
reformuladas e novas crenças estavam, sim, sendo formadas.
Portanto, para alguns clientes, o trabalho com sonhos pode ajudar a identificar
crenças, pode explicitar melhor o funcionamento cognitivo, ou pode evidenciar
mudanças. Assim sendo, o terapeuta cognitivo deve enriquecer seu arsenal de
possibilidades terapêuticas, ao incluir os sonhos como mais um meio para o
entendimento da perspectiva particular de seu cliente sobre si, sobre o mundo e sobre
seu futuro. Beck (2007) afirma que alterar o “tratamento-padrão” é necessário para
abranger a multiplicidade de dificuldades apresentadas pelos clientes.
Referências Bibliográficas
Beck, J. (2007). Terapia cognitiva para desafios clínicos. Porto Alegre: Artmed.
Freeman, A. & White, B. (2004). Dreams and the dream image: using dreams in
cognitve therapy. Em: R. I. Rosner; W. J. Lyddon & A. Freeman (Orgs.). Cognitive
therapy and dreams (pp.69-87). New York: Springer.
Jung, C. G. (1996). O homem e seus símbolos. 14ª. Ed. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira.
Rosner, R. I.; Lyddon, W. J. & Freeman, A. (Orgs.) (2004). Cognitive therapy and
dreams. New York: Springer.