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A EXECUÇÃO PENAL NO BRASIL E A CRISE NO SISTEMA

CARCERÁRIO

THE BRAZILIAN PENAL EXECUTION AND THE PRISON SYSTEM


CRISIS

Angélica Lima Silva


1
HEBERT LEITE

RESUMO: O encarceramento em massa gera um grande impacto na população carcerária


brasileira que cresce cada dia mais. O sistema punitivista acarreta um alto índice de presídios
lotados que, ao longo dos anos, deram origem a uma grande crise no Processo de Execução e
no Sistema Carcerário Brasileiro. Discutir tal situação é de extrema importância tendo em
vista que as condições às quais os presidiários são expostos durante o cumprimento da pena
influenciam nos seus respectivos comportamentos tanto dentro como fora da prisão. Diante
disso, faz-se necessário encontrar alternativas para diminuir os problemas existentes no
sistema prisional facilitando e assegurando uma aplicação justa do Processo de Execução
Penal Brasileiro.

PALAVRAS CHAVE: Direito Penal; Execução Penal; Pena; Sistema Carcerário.

ABSTRACT: The increase of criminality generates a huge impact on the brasilian prison
population which increases everyday. The penal system has a high index of crowded prisons
which, over the years, started a huge crisis both in the Implementation Process and the
Brazilian Prison System. To discuss this situation is extremely important taking into
consideration that the conditions the prisoners are exposed over the course of serving the
prison term have direct relation with their behavior both inside or outside the prison. In light
of this, it’s necessary to find solutions to decrease the existing problems in the Brazilian Penal
Execution Process and the impacts caused in the Prison System

KEYWORDS: Penal Law; Penal Execution; Prison Term; Prison System

1
Professor Orientador
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.........................................................................................................................2
1 EVOLUÇÃO PENA...............................................................................................................4
2 EXECUÇÃO PENAL NO BRASIL.....................................................................................5
2.1 PENAS PREVISTAS......................................................................................................5
2.2 EXECUÇÃO PENAL.....................................................................................................7
3 LEI DE EXECUÇÃO PENAL..............................................................................................8
4 SISTEMA CARCERÁRIO...................................................................................................9
5 A CRISE NA EXECUÇÃO PENAL E NO SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO
...................................................................................................................................................10
6 POLÍTICAS DE ENFRENTAMENTO A CRISE PRISIONAL.....................................12
6.1 APAC..............................................................................................................................12
6.2 FUNDOS E POLÍTICAS DE FOMENTO A PESQUISA E TRANSPARÊNCIA. 13
6.3 POLÍTICAS DE PREVENÇÃO AO CÁRCERE DENTRO E FORA DA ESCOLA
...............................................................................................................................................14
6.4 POLÍTICAS DESPENALIZADORAS E RESTAURATIVAS.................................16
6.5 PROPOSTA DE SOLUÇÃO INTEGRADA..............................................................17
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................17
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................19
INTRODUÇÃO

O homem é um ser social que só consegue se realizar no convívio com seus


semelhantes, ou seja, em sociedade. No entanto, essa convivência dá origem a conflitos os
quais demandam a criação de normas de condutas e a atuação de um agente externo para
solucioná-los.
Nesse sentido, tem-se que a criação do Direito Penal foi o primeiro ramo do Direito
concebido, antes mesmo da existência de uma organização estatal. A necessidade da criação
do Direito Penal se deu para "estabelecer quais seriam as condutas consideradas proibidas,
bem como suas respectivas sanções", principalmente no que diz respeito às transgressões dos
bens jurídicos mais importantes para os seres humanos e a sociedade (FADEL. 2012, p. 60).
As definições acerca dos delitos e das penas a eles cominadas variam de acordo com o
momento histórico e a sociedade na qual o homem está inserido, dessa forma, conforme a
sociedade evolui, também há a evolução nas ações consideradas crime e às penalidades
aplicadas aos autores das mesmas.
Após o surgimento do Estado Moderno e o advento dos direitos fundamentais, a pena
privativa de liberdade se consolidou como principal pena aplicada aos agentes infratores. Esse
método consiste no cerceamento da liberdade do criminoso através do seu aprisionamento em
estabelecimentos denominados presídios. Sobre tais estabelecimentos, Oliveira e Araújo
(2013, p. 177) explicam que:
A prisão é fruto de uma luta histórica pela humanização no cumprimento das
penas privativas de liberdade que culminou com o fim dos suplícios, dos
castigos cruéis e dos espetáculos públicos vigentes entre o século XVII e
início do século XVIII, os quais demonstravam todo o poder monárquico
soberano.

Completando tal pensamento, Barros e Jordão (2016, p.4) explicam que as prisões
possuem função social e política, sendo instituídas visando ressocialização dos indivíduos
infratores.
No entanto, com o passar dos anos, muitas foram as críticas para os estabelecimentos
prisionais. Nesse contexto, Carnelutti alertou que a sociedade e os operadores do Direito
sabem “muitas coisas em relação ao delito; mas muitas menos em relação à pena; e o pouco
que se sabe dela é mais do lado do corpo que do lado do espírito” (CARNELUTTI, 2015, p.
13)
Através da crítica de Carnelutti, faz-se perceptível que, a partir do aumento do índice
de criminalidade, as prisões perderam seu caráter conscientizador e ressocializador e devido a
2
superlotação assim como a falta de estrutura tornaram-se “espaços da desumanização dos
indivíduos forçados a conviver com as condições insalubres: espaço físico limitado, ausência
de higiene, inúmeras doenças, e a precariedade de acesso à Justiça” (BARROS, JORDÃO.
2016, p.7).
Nesse contexto, surge o que atualmente estudiosos denominam como crise do sistema
carcerário. Diante de tal crise, questiona-se: qual seria a solução para o sistema penitenciário
brasileiro? Há uma solução? Quais ações ou alternativas o Direito juntamente com outras
formas de conhecimento podem aplicar para que ao menos as prisões atendam a ideia de
ressocialização e de direitos abordadas na Lei de Execução Prisional (LEP), ou minimamente
que atendam os artigos escritos na Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH) e da
Constituição Federal de 1988.
O método de pesquisa utilizado visando encontrar respostas para o questionamento
levantado bem como para elaboração do presente artigo foi o método hipotético-dedutivo.
Com base nos ensinamentos de Diniz (2015, p. 108) o método em questão compreende na
percepção de problemas e formulação de soluções ou hipóteses para tais problemas.
Ademais, para aplicação deste método foi necessário realizar pesquisa bibliográfica, a
qual Lakatos e Marconi (2010, p. 183) definem da seguinte forma:

A pesquisa bibliográfica, ou de fontes secundárias, abrange toda bibliografia


já tornada pública em relação ao tema de estudo, desde publicações avulsas,
boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses, material
cartográfico etc., até meios de comunicação orais: rádio, gravações em fita
magnética e audiovisuais: filmes e televisão. Sua finalidade é colocar o
pesquisador em contato direto com tudo o que foi escrito, dito ou fIlmado
sobre determinado assunto, inclusive conferências seguidas de debates que
tenham sido transcritos por alguma fonna, quer publicadas, quer gravadas.

Dessa forma, percebe-se que para adquirir os conhecimentos utilizados, foram


consultados livros, dissertações, teses, publicações em periódicos bem como a legislação do
ordenamento jurídico brasileiro.

1 EVOLUÇÃO PENA

2
(INFOPEN, 2016, p.8) De acordo com o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias, embora o Brasil
não tenha a maior população carcerária do mundo, ele tem o pior é déficit, isto é, o maior número de presos
em relação a sua estrutura.
Visando facilitar o estudo sobre as penas, estudiosos e doutrinadores fracionam a
evolução das mesmas em quatro períodos distintos: o período da vingança privada, divina e
pública, o período humanitário e o período científico.
O período da vingança privada diz respeito aos primórdios da civilização, época onde
inexistia senso de justiça e as punições eram instintivas, sem proporcionalidade ou
pessoalidade. Durante esse período, se a infração fosse cometida dentro do próprio grupo, a
pena mais aplicada era o banimento. Por outro lado, caso algum membro de um grupo rival
viesse a cometer algum delito, as sanções muitas vezes eram direcionadas a pessoas ligadas ao
infrator e tinham como objetivo enfraquecer a sua tribo (FADEL, 2012, p. 62).
Durante o tempo em que os sacerdotes eram responsáveis pela administração da
justiça, imperou a aplicação das penas baseadas na vingança divina. A crença na existência de
deuses como guardiões da paz originava sacrifícios humanos quando crimes eram cometidos,
pois infrações eram consideradas afronta às divindades. Nesse sentido, Fadel (2012, p. 62)
explica que “mediante a prática de um único ato, três medidas eram adotadas: satisfazia-se o
Deus maculado, punia-se o ofensor e intimidava-se a população para que não mais praticasse
atos considerados criminosos”.
Com o passar dos anos a sociedade foi evoluindo e se desenvolvendo de modo que,
durante a prevalência da aplicação da vingança pública, as penas aplicadas aos infratores eram
uma resposta apresentada pelo Estado que tinha como objetivo proteger a coletividade. Foi
um período onde havia muita desigualdade entre os cidadãos em razão do abuso de poder por
parte dos senhores reinantes os quais detinham poderes absolutos e julgavam quais condutas
eram criminosas conforme sua conveniência. Ademais, a pena de morte era muito utilizada,
inclusive em solo brasileiro onde Joaquim José da Silva Xavier, popularmente conhecido
como Tiradentes, foi uma das milhares de vítimas (FADEL, 2012, p. 63).
Avançando mais na história, chega-se no período humanitário. Tal período, segundo
Fadel (2012, p. 64), resultou das profundas alterações ocorridas nas mais diversas áreas do
saber durante o século XVIII. O principal pensador da época foi Cesare Bonessana, também
conhecido como Beccaria, que questionou a utilização da pena de morte, a desproporção com
o delito cometido e a pena aplicada, a utilização de tortura como meio para obtenção de
provas, as condições das prisões, entre outras coisas. Beccaria obteve êxito em despertar a
atenção da população e, através dos seus questionamentos, houve um grande número de leis
que concediam tratamentos mais dignos e humanos aos criminosos sendo promulgadas por
todo o mundo.
Os questionamentos realizados pelos iluministas influenciaram não só estudiosos de
suas épocas, mas também embasaram pensadores de gerações futuras que se valeram de suas
ideias e métodos para analisar o Direito Penal. Tais concepções originaram período científico
(ou criminológico), que foi marcado pela atuação da Escola Penal Positivista, que, conforme
mencionado anteriormente, buscou por examinar o Direito Penal de forma mais abrangente,
observando não só a legislação, mas também o criminoso e suas motivações para cometer os
crimes.

2 EXECUÇÃO PENAL NO BRASIL

2.1 PENAS PREVISTAS

Segundo Machado (2014, p. 171), a pena

[...] é a consequência de uma infração penal aplicada pelo Estado no


exercício de seu ius puniendi, porém, esta pena deve ser imposta conforme
os princípios expressos no ordenamento jurídico, sobretudo, na Constituição
Federal, garantindo os direitos fundamentais de um Estado Democrático de
Direito.

Completando tal raciocínio, Takayanagi (2010, p. 1065) explica que em razão do


caráter de ultima ratio do Direito Penal, a pena pode ser aplicada com diversos objetivos,
quais sejam: retributivo, preventivo especial ou preventivo geral. Dessa forma, a finalidade da
pena varia pois depende da corrente utilizada no caso concreto, mas é uma forma do Estado
agir como “um ente garantidor da paz social e protetor de bens jurídicos considerados
relevantes à harmonia de um a coletividade”.
No ordenamento jurídico do Brasil as penas são aplicadas após o devido processo
legal composto pelo contraditório e ampla defesa. Dessa forma, quando o indivíduo é
considerado culpado, o juízo profere sentença penal condenatória para o que o criminoso
comece a cumprir a pena que lhe foi imposta por meio da execução penal. Com base no art.
32 do Código Penal Brasileiro, as penas aplicáveis no território nacional são: privativas de
liberdade, restritivas de direito e multa.
As penas privativas de liberdade são subdivididas em reclusão e detenção, sendo que
tais espécies se diferenciam no que tange ao tempo de condenação e, consequentemente, ao
regime de cumprimento. O indivíduo condenado à pena superior a 8 anos, obrigatoriamente,
deverá cumpri-la em reclusão e em regime fechado, isto é, em estabelecimento de segurança
máxima ou média os quais denominam-se de presídios (BRASIL, 1940).
Nos casos em que a condenação seja superior a 4 anos e não exceda a 8, o condenado
não reincidente tem o direito de iniciar o cumprimento da sua pena em regime semi-aberto na
detenção ou reclusão. Os casos de detenção em regime semi-aberto se dão em colônia
agrícola, industrial ou estabelecimento similar. Nesse modelo de cumprimento de pena, o
condenado fica sujeito a trabalho comum ou externo durante o período diurno e retoma para o
isolamento durante a noite (BRASIL, 1940).
Já os condenados a pena igual ou inferior a 4 anos, segundo o art. 33 do Código Penal,
desde que não seja reincidente, poderá, desde o início, cumprir sua pena na reclusão ou
detenção em regime aberto, ou seja, em casa de albergado ou estabelecimento adequado. Esse
regime é baseado na autodisciplina e responsabilidade do condenado pois consiste no trabalho
ou estudo sem vigilância durante o dia e recolhimento durante a noite e em dias de folga.
As penas restritivas de direito, por sua vez, estão previstas no art. 43 do Código Penal
e podem ser: prestação pecuniária, perda de bens e valores, limitação de fim de semana,
prestação de serviço à comunidade ou entidade pública e interdição temporária de direitos.
Tais modalidades podem ser aplicadas nos casos em que a condenação não seja superior a 4
anos, quando o crime tiver sido cometido de forma culposa e praticado sem violência ou
grave ameaça, o condenado não seja reincidente em crime doloso além do mesmo possuir
conduta pessoal e personalidade que indiquem a possibilidade da aplicação dessa medida mais
branda que as penas privativas de liberdade.
Por fim, segundo redação expressa do caput do art. 49 do Código Penal, “a pena de
multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada
em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-
multa”.
Ressalta-se que para definir a pena na sentença penal condenatória, o juiz deverá
seguir o sistema trifásico da fixação da pena. Tal sistema, segundo Takayanagi (2010, p.
1067), constitui em, na fixação da pena-base, “levar em consideração as circunstâncias
atenuantes e agravantes, por fim, adotar as causas de diminuição e aumento de pena,
conforme dita o artigo 68 do Código Penal.”

2.2 EXECUÇÃO PENAL


Santos (2013, p. 28) explica que o processo de execução penal é importante para que o
delito seja analisado bem como seja imposta e executada a pena. Já a execução da pena,
segundo a autora em questão, pode ser definida como:

[...] o conjunto de atos processuais desenvolvidos em observância a uma


ordem lógica com o objetivo de atingir a concretização punitiva, regulado
pelo direito de execução penal, componente de um capítulo do direito
público e que tem constituição jurídica complexa, eis que integrado
simultaneamente por normas de direito penal, de direito processual penal e
de direito administrativo (MARTINS, 2002, p.46 apud SANTOS, 2013, p.
28).

Dessa forma, percebe-se que a execução penal possui duas naturezas jurídicas, quais
sejam, a jurisdicional e a administrativa. A atuação administrativa se faz presente no
gerenciamento dos estabelecimentos penais enquanto as funções jurídicas correspondem às
questões processuais da execução da pena.
Teixeira (2008, p. 216) alerta que embora a natureza da execução penal seja híbrida,
há uma predominância de atividades de cunho administrativo, uma vez que a custódia dos
presos é delegada ao Poder Executivo. No entanto, a atuação Judiciária não se restringe
apenas às fases jurídicas do processo de execução (apuração de falta grave, concessão de
benefícios, progressões de regime, etc.) pois, por força de lei, os juízes das Varas de Execução
Penal possuem papel semelhante ao de corregedor dos sistemas prisionais, devendo fiscalizá-
los e, caso seja constatada alguma irregularidade no curso da execução, a mesma deverá ser
analisada jurisdicionalmente.

3 LEI DE EXECUÇÃO PENAL

A Lei n° 7.210, promulgada em 11 de julho de 1984, instituiu a Lei de Execução Penal


com o “objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar
condições para a harmônica integração social do condenado e do internado” (BRASIL, 1984).
Segundo Machado (2015, p. 169):

A Lei de Execução Penal tem natureza progressista, já que em seu escopo


existem propostas e institutos mais modernos em comparação a outros
países, inclusive de maior tradição jurídica. Assim, pode-se dizer que a Lei
de Execução Penal traz uma visão mais humanista com relação ao
cumprimento de pena.
Corroborando a ideia apresentada, Takayanagi (2010, p. 1066) explica que a LEP
consiste na “terceira forma processual penal precedida do processo de conhecimento e do
processo cautelar” com aplicação após sentença penal condenatória. Assim sendo, após a
cominação da pena, o juiz responsável pela execução da mesma deverá seguir os princípios
estabelecidos na referida Lei, com intenção de cumprir a decisão judicial e levando em
consideração o princípio da dignidade da pessoa humana no tratamento para com o preso.
A Lei de Execução Penal, portanto, tem como principal objetivo a garantia dos direitos
fundamentais dos condenados bem como a ressocialização dos mesmos, visando erradicar a
reincidência e diminuir os índices de violência no país. Levando isso em consideração, o
legislador cuidou de positivar uma série de garantias e deveres dos presidiários.
Acerca do caráter humanitário presente da LEP, Julião (2011, p. 145) explica que:

A Lei de Execução Penal foi elaborada fundamentada nas ideias da Nova Defesa
Social e tendo como base as medidas de assistência ao condenado. Além de tentar
propiciar condições para a harmônica integração social do preso ou do internado,
procura-se cuidar não só do sujeito passivo da execução como também da defesa
social.

Dessa forma, a legislação em questão possui embasamento nos direitos humanos bem
como diversos princípios e direitos constitucionalmente estabelecidos, quais sejam:
individualização da pena (art. 5º, inciso XLV e XLVI, CF/88), humanização da pena (art. 5º,
inciso XLVII e art. 84, XIX, CF/88), intranscendência da pena (art. 5º. XLV, CF/88),
legalidade (art. 5º XXXIX, CF/88), entre outros.
Ocorre que apesar do já citado caráter progressista e inovador, o legislador foi omisso
em alguns pontos da Lei de Execução Penal, pontos esses que são alvos de críticas por parte
de alguns doutrinadores. As omissões, segundo Takayanagi (2010, p. 1109) podem ser
observados no que tange ao direito de visita íntima aos presidiários, na progressão de regime
dos condenados estrangeiros, no laudo criminológico para progressão quando requerido pelo
Ministério Público, na remição da pena por estudo, no recurso contra decisões proferidas
pelos juízos de execução penal, entre outros.
Nesse contexto, Julião (2011, p. 146) afirma que a Lei de Execução Penal brasileira é:

Considerada como uma das leis mais modernas do mundo, muitos militantes no
exercício da aplicação do direito – cientes da realidade social brasileira, embora
reconheçam que os seus mandamentos sejam louváveis – afirmam que a LEP é
inexequível em muitos de seus dispositivos, principalmente porque, por falta de
estrutura adequada, pouca coisa será aplicada na prática quanto ao cumprimento das
penas privativas de liberdade e, principalmente, com relação às medidas alternativas
previstas.
Dessa forma, pode-se perceber que a LEP é um marco histórico na concessão de
direitos a população carcerária, além de ter tentado apresentar soluções para combater a crise
enfrentada ao longo dos anos dentro dos presídios e nos processos de execução penal.
Todavia, além das já citadas omissões, na prática a lei se demonstra ineficaz por parte dos
poderes executivos e portanto, não conseguiu sozinha diminuir o colapso do sistema
carcerário brasileiro.
Como apresenta Garutti (2012, p.26): “A lei de execuções penais por mais que seja
avançada, se não for incrementada para sua plena aplicação, acaba por se transformar em letra
morta”.

4 SISTEMA CARCERÁRIO

As primeiras prisões que adotaram o modelo de ressocialização, segundo Gelsom


Almeida (2009, apud Pinheiro e Gama, 2016, p.161), surgiram na Inglaterra durante século
XVI com as chamadas “Casas de Correção” que tinham como objetivo abrigar mendigos,
prostitutas e pessoas que sofriam com as consequências da desigualdade social existente na
Europa. Somente no século XVIII, após a Revolução Industrial e o advento da sociedade
capitalista, as prisões adquiriram a função de abrigar pessoas condenadas à pena privativa de
liberdade.
A influência do capitalismo no surgimento dos presídios se dá pelo fato de que,
após a Revolução Industrial bem como o confronto entre as classes burguesa e proletária,
houve um aumento no índice de desemprego, o que acarretou queda na remuneração salarial,
elevando a miséria e induzindo a prática de atos criminosos. Além disso, apesar de em alguns
períodos o trabalho ter sido utilizado como forma de castigo ou até mesmo do preso manter os
seus gastos na prisão, em dados momentos os detentos foram utilizados como mão de obra
barata, visando aumentar a produção nas fábricas e fomentar a economia (PINHEIRO,
GAMA, 2016, p. 165).
Segundo relatos de Pinheiro e Gama (2016, p. 166) percebe-se que a qualidade de
vida oferecida para os detentos oscilou durante a história. Nas primeiras décadas do século
XIX, por exemplo, as penas aplicadas para crimes de menor potencial ofensivo eram voltadas
para a prática de alguma atividade laboral, dessa forma, para alguns cidadãos europeus que
não conseguiam uma oferta de emprego, o cárcere era benéfico, pois iria lhe assegurar
condições mínimas de sobrevivência. Nesse panorama, visando reduzir a reincidência de
crimes para retornar às prisões, na primeira metade do século XIX, o valor ofertado para a
mão de obra carcerária foi reduzido para que os presos desfrutassem de um padrão de vida
inferior ao da população livre. Ao receberem valores bem abaixo do mínimo necessário para
sobrevivência, os presos passaram a adotar dietas baseadas em sopa de batatas e pão de má
qualidade, o que acarretou queda no índice de saúde e aumentou o número de mortos na
prisão, uma vez que além de não se alimentarem corretamente, os condenados também não
tinham condições de comprar remédios e se curarem das enfermidades contraídas.
Com base no exposto, pode-se notar quão antigos são os estabelecimentos
prisionais, bem como as mudanças pelas quais os mesmos foram submetidos. Os objetivos das
prisões variam de acordo com sua localização e o contexto histórico, mas desde o seu
surgimento até os dias atuais tem como principal público pessoas pobres e marginalizadas.

5 A CRISE NA EXECUÇÃO PENAL E NO SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO

Ao longo dos anos uma sucessão de erros colaborou para que o sistema carcerário
brasileiro chegasse ao estado crítico em que se encontra atualmente. Pode-se dizer que a base
para todos esses erros se faz presente no descaso tanto do Estado quanto da população civil
em relação aos presidiários, estes que, mesmo possuindo direitos e deveres legalmente
garantidos, são submetidos a condições de vida sub humanas.
Completando esse raciocínio, Machado, Souza e Souza (2013, p. 5) compreendem a
crise no sistema carcerário da seguinte forma:

São muitos os fatores que fizeram que o sistema carcerário brasileiro


chegasse à precariedade em que se encontra atualmente. Os pontos mais
graves são: o abandono, a falta de investimento e o descaso do poder
público. Dessa forma, aquele sistema que tinha o intuito de se tornar um
instrumento de substituição das penas desumanas, como as de morte e
tortura, não tem desempenhado o seu papel e, muito ao contrário, tem se
tornado um motivo para o aperfeiçoamento de criminosos, além de ter como
principal atributo a insalubridade, já que se trata de atmosferas sujas, sem
espaço suficiente para todos os detentos, sendo assim, impossível tratar da
ressocialização de qualquer um deles.

Tal descaso pode ser justificado com o desejo de punir e repreender severamente os
criminosos com o intuito de alcançar a justiça, no entanto, tal sentimento muitas vezes é
confundido com vingança. A punição aos que transgridem as leis e colocam em risco os bens
e a integridade física de outrem é importante, mas não é a solução para diminuir os índices de
criminalidade pois não tratam o problema em sua origem, qual seja, a desigualdade social e a
falta de oportunidade para todos.
Nesse panorama, Oliveira (2007, p. 2) descreve o cotidiano nas prisões e todas as
violações existentes nos estabelecimentos prisionais da seguinte forma:

A realidade da política carcerária brasileira é arcaica, os estabelecimentos


prisionais na sua maioria representam para os apenados um verdadeiro
inferno em vida, onde o recluso se amontoa a outros em celas totalmente
sujas, úmidas, anti-higiênicas e principalmente, superlotadas, de tal maneira
que, em não raros exemplos, o preso deve dormir sentado, enquanto os
outros revezam em pé. O cotidiano nas unidades penais é atravessado por
conflitos, saudades, revoltas, violências, depressões e brigas, sendo também
é um cotidiano regido por regulamentos, normas, relações de poder que
dificultam e proíbem as mais diversas atividades, um cotidiano no qual a
meta fundamental é evitar problemas e, sobretudo, dominar e controlar o
apenado.

Como o ordenamento jurídico brasileiro não prevê prisões perpetuas ou pena de morte,
o pensamento de que a população carcerária não merece a efetivação dos direitos que lhe são
garantidos gera um grande impacto na sociedade pois, em algum momento após o
cumprimento da pena o indivíduo que permaneceu preso por algum período irá retornar ao
convívio social.
Sabendo disso, o legislador brasileiro buscou meios para assegurar a dignidade
humana e os direitos fundamentais dos presidiários através da promulgação da LEP. Tal lei é
voltada para aplicação humanitária do cumprimento da pena e estabelece normas que
deveriam ser seguidas a fim de que o sistema carcerário impactasse de forma menos negativa
na vida do encarcerado. Como exemplo, pode-se citar a classificação dos presos por idade,
gênero e principalmente delitos, impedindo que os indivíduos de baixo grau de periculosidade
tenham contato com aqueles mais perigosos fazendo com que o período de encarceramento
seja uma espécie de "escola" do crime.
Além disso, a mencionada Lei prevê o incentivo e promoção de práticas tais como o
estudo e o trabalho, visando a ocupação do preso durante o cumprimento da pena e
oferecendo oportunidades para que o mesmo tenha condições de retomar ao convívio social
mais qualificado e assim evitar a reincidência.
Todavia, conforme já exposto, o descaso com a população carcerária proporciona,
entre outras coisas, a ineficácia de praticamente todos os dispositivos presentes na LEP. O
desejo de punir (ou vingar) originou o encarceramento em massa e a superlotação dos
presídios é um fator fundamental para todo o colapso do sistema carcerário. O aumento da
população carcerária impede a classificação dos presos da maneira correta, além de também
comprometer a qualidade de vida nos presídios, uma vez que as celas passam a abrigar um
número maior de indivíduos em relação aquele para qual ela foi planejada.
Os impactos do aumento de população carcerária também são percebidos no poder
judiciário, o qual não possui estruturas tanto pessoal quanto material para realizar todos os
julgamentos dentro dos limites estabelecidos como razoáveis para a duração do processo.
Dessa forma, os tribunais nada conseguem fazer para diminuir a superlotação nos presídios e
contribuem para que muitas pessoas permaneçam presas à espera de uma decisão judicial
condenatória ou não.

6 POLÍTICAS DE ENFRENTAMENTO A CRISE PRISIONAL

6.1 APAC

Outra forma de tentar proporcionar a execução da pena com as mínimas condições


vida dignidade aos presidiários é através das Associações de Proteção de Assistência ao
Condenado, comumente chamadas de APAC.
O modelo que tem origem no estado de Minas Gerais, foi idealizado pelo advogado
Mário Ottoboni e incentivado pela Igreja Católica, possui como principal objetivo fornecer
uma forma alternativa de cumprir a pena privativa de liberdade onde o condenado perca
apenas a liberdade, tendo sua dignidade mantida para que assim exista um efetivo empenho na
busca da ressocialização.
Acerca do funcionamento das APAC, Muhle (2013, p. 7) explica que:

Cada APAC constitui uma entidade civil de direito privado, sem fins
lucrativos que adota preferencialmente o trabalho voluntário, utilizando o
remunerado apenas nas atividades administrativas, quando necessário.
Possui estatuto próprio e tem suas ações coordenadas pelo Juiz da Execução
Criminal da Comarca, com a total colaboração do Ministério Público e do
Conselho da Comunidade.

Dessa forma, através da valorização humana, do mérito, do trabalho, da participação


social e da religião as APAC têm demonstrado ser efetivas, apresentando baixos índices de
reincidência, fuga e rebelião. Ressalta-se, inclusive, a ausência de policiamento ou segurança
nos estabelecimentos, uma vez que a segurança da casa prisional é realizada pelos próprios
presos.
Diversos são os benefícios apresentados pelo método em questão. Enquanto
reincidência dos condenados que cumprem suas penas no sistema público convencional
ultrapassa 80%, agentes públicos apontam que os detentos reincidentes do método APAC
compreendem cerca de 15%. Além disso, há considerável redução nos gastos uma vez que a
APAC a média de custo de ⅓ do sistema penitenciário comum pelo fato do Estado arcar
somente com a alimentação dos presos, ao passo que os demais custos são arcados pelas
entidades e seus respectivos parceiros.
No entanto, a influência cristã dentro das APAC é um ponto a ser criticado. Nesse
sentido, Muhle (2013, p. 11) explica:

A APAC é predominantemente católica, com algumas poucas unidades


protestantes, contando com o auxílio da Igreja Católica e de seus
representantes. Não há presença de outras religiões, e os recuperandos não
manifestam comportamentos contrários aos preceitos religiosos, por
exemplo, não existem homossexuais cumprindo pena neste contexto. A
escolha e prática da religião devem ser pessoal, todavia, para os
recuperandos da APAC, não existe escolha, para serem transferidos para
APAC tem que estarem dispostos à conversão e a praticar a religião, uma
vez que a religião constitui um dos dozes passos necessários para a
recuperação.

A APAC, portanto, apesar de fornecer bons resultados no âmbito da recuperação e


ressocialização dos detentos, só pode ser utilizada por cristãos, o que gera certa exclusão de
praticantes de outras fés além de contribuir para a intolerância religiosa no país.
Contudo, tratando-se da crise do sistema carcerário a APAC demonstra ser uma
possível solução, uma vez que reduz os gastos públicos bem como os índices de reincidência.
Dessa forma, a sociedade é beneficiada com uma queda na taxa de criminalidade e uma
possível melhora na prestação de serviços públicos, levando em consideração que os
governantes terão um montante financeiro mais elevado para investir em outras áreas
diferentes da carcerária.

6.2 FUNDOS E POLÍTICAS DE FOMENTO A PESQUISA E TRANSPARÊNCIA

A INFOPEN (Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias) é uma política


de visibilidade acerca da estrutura das prisões, sendo utilizada por diversas pesquisas e dando
um suporte para que movimentos sociais e agentes da lei possam saber se de fato a LEP esteja
sendo executada pelo Estado.
Criado em 2004, o INFOPEN compila informações estatísticas do sistema
penitenciário brasileiro, por meio de um formulário de coleta estruturado
preenchido pelos gestores de todos os estabelecimentos prisionais do país.
Ao longo de sua existência, o processo de coleta e análise dos dados do
INFOPEN foi continuamente aprimorado, em um processo de valorização da
cultura de análise de dados como uma ferramenta estratégica para a gestão
prisional (INFOPEN, 2016, p.5).

Antes de encontrar alguma solução geral para as prisões, é necessário entender a


peculiaridade de cada região, assim como sua estrutura política e financeira, e somente com o
relatório da INFOPEN, que se pode ter uma visão tanto panorâmica do Brasil quanto
específica de cada região. Pode-se ver a estrutura do espaço, acesso a saúde, número de
profissionais atuantes, assim podendo garantir o que falta mais ou menos em determinadas
prisões.
Além disso, na INFOPEN, consegue-se ver o perfil das pessoas que são presas no
Brasil, dando suporte para políticas de prevenção. Se 90% das pessoas que estão presas não
terminaram o ensino básico (INFOPEN, 2016, p.40), o documento denuncia uma relação
íntima entre escolarização e encarceramento.
Se mais de 60% das pessoas presas são negras (INFOPEN, 2016, p.32), o documento
denuncia uma relação entre o racismo estrutural e o encarceramento. Se em sua maioria são
homens e jovens, como as políticas e a cidadania está sendo pensada para esses jovens? Há
conselhos e participação dessa faixa etária nas atividades que envolvem a cidade? Quais
atividades e organismos de prevenção seriam uma possibilidade para diminuir esses números?
Se as políticas de Segurança Pública fossem criadas e efetivadas partindo dessas
pesquisas e mapeamentos, a diminuição da criminalidade aconteceria de forma mais rápida e
eficaz já que as medidas ocorreriam diretamente nos locais e grupos que são focos de uma
ação de prevenção e/ou ressocialização mais direcionada.
Por isso a necessidade de se investir e não deixar acabar a INFOPEN, é necessário que
esse mapeamento seja cada vez mais melhor detalhado e acessível à população para saber a
sua realidade carcerárias.

6.3 POLÍTICAS DE PREVENÇÃO AO CÁRCERE DENTRO E FORA DA ESCOLA

O programa curricular anteposto a Base Nacional Curricular Comum (BNCC) era


dividido em Diretrizes Curriculares Nacionais (2013), trazendo perspectivas e discussões
sobre cada modalidade de ensino, e trouxe uma específica da Educação no Cárcere. Valer esse
documento dentro das prisões é um desafio que deve ser considerado pelos promotores e
juízes durante o processo penal tanto como medida de ressocialização quanto uma postura
ética em defesa dos direitos postos na LDBEN – Lei de Diretrizes e Base na Educação (lei nº
9.394/ 1996).

Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na


vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino
e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas
manifestações culturais.

§ 1º Esta Lei disciplina a educação escolar, que se desenvolve,


predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias.

Porém a BNCC não traz consigo essa perspectiva e não contempla essa modalidade de
ensino colocando-se, portanto, uma contradição judicial. Uma medida necessário e importante
quando se fala de uma ressocialização humanizada e científica, envolve garantir direitos
básicos como o da Educação.
É válido ressaltar que as Diretrizes são resultado de uma longa luta judicial, política e
educacional, como no próprio documento é abordado:

Para alcançar essa mudança, tornam-se relevantes programas de formação


para educadores, gestores, técnicos e agentes penitenciários que auxiliem na
compreensão das especificidades e da importância das ações de educação
nos estabelecimentos penais. No que se refere aos agentes penitenciários,
trata-se de competência do Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária (CNPCP), do Ministério da Justiça, que já prevê esta ação na
mencionada Resolução nº 3, de 6 de março de 2009. Certamente, a
abordagem de temas como direitos humanos e de combate ao racismo,
sexismo, homofobia, lesbofobia, intolerância religiosa, entre outras
discriminações, contribuirá para se alcançar essa pretendida mudança
cultural. A inclusão dessa temática nos programas de ensino é da alçada dos
projetos político-pedagógicos uma vez que a lei já prevê essa possibilidade
para toda a Educação Básica. O destaque de temas como esse e outros
depende da sua relevância concreta como é a realidade da educação nas
prisões e deve ser considerado na construção destes projetos (BRASIL,
2013, p.312).

É necessário, nesse sentido, propor uma mudança na BNCC que faça valer esse direito
para esses educandos. Assim como seria importante pensar na base enquanto uma medida
preventiva por meio do currículo. Se o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) Lei Nº
8.069, de 13 de julho de 1990 tem como uma das leis mais avançadas do mundo exatamente
pela prevenção a violência da criança, adolescente e do jovem. Faz-se válido colocar na
escola conteúdos e diálogos acerca das prisões que são parte da cidade como um método
preventivo.
Programas de orientação e inserção no mercado de trabalho, assim como de
orientação e diálogos acerca das drogas, por exemplo, são fundamentais nesse programa
curricular preventivo, já que os crimes como furto/roubo simples e como tráfico de drogas são
os principais motivos de sobrecarregarem as prisões do país.
No município de Jacarezinho, há por exemplo, O Centro da Juventude José Richa uma
instituição criada pelo Conselho Estadual do Direito da Criança e do Adolescência. No
processo deliberativo de N°11/2010 – Cedca/PR encontra-se os objetivos pelos quais esse
órgão foi instalado:

O Programa Atitude (aprovado pela Deliberação nº 019/2007 – CEDCA –


PR) da Secretaria de Estado da Criança e Juventude do Paraná realizado em
parceria com as Prefeituras Municipais busca concretizar direitos e garantias
assegurados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e focaliza suas ações
em territórios com alta incidência de fatores de risco à violência relativa à
criança e ao adolescente, e que as ações previstas se baseiam em eixos como:
o fortalecimento das famílias, abordagens educativas e terapêuticas aos
usuários de drogas, redução da evasão escolar, criação de oportunidades de
esporte, cultura e lazer, cursos profissionalizantes e a criação de redes de
proteção para crianças e adolescentes (PARANÁ, 2021).

A política, portanto trabalha com diversas oficinas e atividades extracurriculares com


os jovens nos bairros periféricos e menos IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).
Com isso, nota-se a importância das políticas educacionais voltadas para prevenção ao
cárcere como elementos que compões ações sistematizadas de solução à crise do sistema
penitenciário brasileiro.

6.4 POLÍTICAS DESPENALIZADORAS E RESTAURATIVAS

Rossi e Maruno (2019) contribuem com a discussão e com a busca por propostas de
solução trazendo que, o encarceramento brasileiro em massa é também, dentre outros
fenômenos e fatores, consequência da criação de diversos tipos penais, isto é da tipificação de
todas as condutas tidas como imorais pela sociedade. Assim, os autores trazem como proposta
de solução a descriminalização de condutas que infrinjam apenas normas morais e religiosas,
sem eminência de auto risco ou risco social, que não causem danos que limitem a coexistência
social.
Nesta perspectiva, acredita-se que a busca por segurança, no sistema carcerário
brasileiro, ainda está centrada na reclusão como resposta à criminalidade, trazendo o
isolamento como elemento central para readequação dos elementos disfuncionais da
sociedade. A limitação dos diversos tipos penais na abrangência das condutas de
encarceramento centrada no isolamento e na reclusão contribuir com a superlotação
desnecessária das penitenciarias (ROSSI; MARUNO, 2019).
Nesta proposta “salienta-se que tais delitos não seriam impunes, apenas seriam
resolvidos na esfera extrapenal. No entanto, para a hipótese dos delitos que não podem ser
descriminalizados, como o roubo, deve-se aplicar uma pena alternativa, tal como serviço em
prol da comunidade [...]” (ROSSI; MARUNO, 2019, p. 82). ]
Assim, nota-se que a descriminalização e a diversificação não tornam supérfluos as
ações de punição e a reinserção, contudo reduz as políticas de isolamento e encarceramento
para um grupo específico conforme necessidade de garantia de segurança e dos direitos
humanos da sociedade. Sobre este aspecto, Rossi e Maruno (2019, p.82) trazem que [...] a
regulação da responsabilidade deve ser proporcional ao dano acarretado, no entanto [...]”.
Políticas despenalizadoras e restaurativas aparecem na literatura como um alternativa
pra compor um todo de ações e estratégias de solução ao problema em questão, sendo
propostas auxiliares no que tange a redução de superlotações carcerárias, permitindo
investimento, utilização de espaços e recursos de maneira mais efetiva e centrada na
restauração para além da punição.

6.5 PROPOSTA DE SOLUÇÃO INTEGRADA

A identificação da literatura, bem como das propostas levantadas nas pesquisas


científicas permitem compreender que solucionar a crise penitenciária brasileira não é
simples, no sentido de que pode ser reduzida à uma estratégia ou proposta de solução, sendo
necessário uma ação conjunto e integrada de políticas centradas na ressocialização, nos
direitos humanos e na legislação vigente. Assim, compreende-se que o aprimoramento e a
implementação das propostas aqui discutidas, em conjunto, e associadas às políticas de
valorização aos direitos humanos compõem um conjunto estratégico e sistêmico de solução
para o problema discutido.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O crescente índice de criminalidade no território brasileiro é reflexo da ineficácia do
funcionamento da máquina estatal. Essa afirmação pode ser exemplificada com uma rápida
análise da população carcerária brasileira que, em sua maioria, é formada por jovens homens
negros advindos de áreas periféricas. A falta de assistência bem como a falta de oportunidades
e estudos para essa parte da população gera um grande impacto na criminalidade, uma vez
que muitas pessoas só conseguem enxergar o crime como meio de sobrevivência.
Se em liberdade os jovens negros favelados já possuem seus direitos restringidos pela
ausência da atuação estatal, essa situação fica pior se tratando da vida dentro de presídios com
a provação da liberdade. O descaso e o preconceito não só do Governo, mas também da
população civil em relação a população carcerária impede a realização de investimentos na
área e dá origem a uma grande crise no sistema carcerário.
Apesar de existirem leis que assegurem os direitos dos presidiários, a realidade nos
estabelecimentos prisionais impede que tais garantias sejam colocadas e práticadas e, dessa
forma, há uma séria violação de direitos humanos e individuais dos encarcerados. O principal
fator que leva a violação de tantos direitos e, consequentemente, ao colapso do sistema
carcerário é a superlotação dos presídios, ocasionada pelo aumento da criminalidade que tem
origem na omissão estatal em relação aos mais necessitados.
A superlotação dos presídios acarreta uma série de violações aos direitos humanos,
fazendo com que os presos sejam obrigados a viverem sem condições mínimas de vida e
higiene. Além disso, a falta de espaço nos estabelecimentos prisionais favorece o contato de
criminosos de baixo índice de criminalidade com outros mais perigosos, fazendo com que as
cadeias sejam consideradas “escolas do crime”.
Percebe-se, dessa forma, que uma série de erros por parte do Poder Executivo
desencadeia no aumento da criminalidade e gera uma série de problemas sociais. Tais erros
também geram impacto no poder Judiciário, uma vez que o aumento da criminalidade
aumenta a demanda nos juízos criminais, estes que não possuem aparato material e pessoal
para julgar todos os casos dentro do limite legal e da razoável duração do processo. Assim
sendo, a crise no sistema carcerário impacta diretamente no processo de execução penal que
também sofre diante da impossibilidade de aplicação de todas as normas e princípios
estabelecidos em dispositivos legais.
Muito embora a Lei de Execução Penal tenha como objetivo a promoção do
cumprimento de pena de forma digna, visando alcançar a ressocialização do condenado, na
prática, em virtude dos diversos fatores já citados, os dispositivos da referida legislação não
são aplicados.
Nesse contexto, tem-se a necessidade de buscar meios alternativos para o
cumprimento da pena, uma vez que o sistema carcerário se encontra falido em meio à crise
enfrentada. Algumas medidas e políticas possíveis de enfrentamento a essas desigualdades
dentro das prisões são: APAC, INFOPEN e um acréscimo curricular sobre as prisões na Base
Nacional Curricular Comum. Em ambos os casos, os gastos aos cofres públicos são reduzidos
e são fornecidas as mínimas condições de vida digna aos presos, o que gera uma grande
diminuição na taxa de reincidência.
Solucionar a crise do sistema carcerário é uma tarefa de extrema importância para que
alguns problemas sociais sejam resolvidos e, consequentemente, haja uma diminuição da
criminalidade em solo brasileiro. Além disso, a diminuição do colapso do sistema carcerário
gera impactos no âmbito jurídico, tendo em vista que diminui a violação de direitos e propicia
a aplicação eficaz a Lei de Execução Penal.

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