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O Brasil de JK - O custo do desenvolvimentismo

A política econômica do governo Kubitschek procurou estabelecer condições para a implementação dos compromissos
desenvolvimentistas do governo, sintetizados no Plano de Metas. A prioridade dada ao fomento do desenvolvimento
econômico contava com uma larga base de apoio que incluía interesses empresariais, trabalhistas e militares, irmanados
pela ideologia nacional-desenvolvimentista. De outro lado, porém, enfrentava a oposição de alguns setores internos e de
organismos internacionais favoráveis a uma rígida política de estabilização. As tensões entre essas duas tendências
marcaram as gestões dos três ministros da Fazenda do período: o político José Maria Alkmin, o técnico Lucas Lopes e o
banqueiro Sebastião Pais de Almeida.
Premido pelo progressivo déficit orçamentário e da balança comercial e pela crescente
desvalorização internacional do preço do café, o governo JK teve inicialmente que definir
os instrumentos de política econômica dos quais viria a lançar mão. O ministro José Maria
Alkmin rejeitou a adoção da política cambial formulada por José Maria Whitaker quando
ministro da Fazenda do governo Café Filho, a qual previa a desvalorização do cruzeiro e o
fim do regime de taxas múltiplas de câmbio. Tal sistema tradicionalmente permitia ao
governo federal subsidiar a importação de produtos considerados estratégicos, como
petróleo e trigo. Além de refutar os princípios da reforma cambial proposta por Whitaker,
Alkmin ainda tratou de estender os subsídios às indústrias automobilística e naval,
tornando a política cambial um importante instrumento de fomento ao projeto de desenvolvimento industrial do Plano de
Metas. O compromisso com a execução do plano também pode ser observado na forma pela qual Alkmin procurou definir
uma política monetária destinada a conter o processo inflacionário. O ministro buscou limitar o processo de expansão da
moeda através da restrição do crédito ao setor privado, mas, de maneira conflitante, empenhou-se em adotar medidas que
viabilizassem maior disponibilidade de recursos para os investimentos do setor público e para o subsídio de atividades
industriais consideradas de interesse estratégico. Assim, uma vez mais, tornavam-se explícitas as prioridades do governo
Kubitschek.
As críticas à política econômica adotada por Alkmin se estenderam aos cafeicultores – que, em maio de 1957, chegaram a
organizar uma marcha contra o "confisco cambial" – aos trabalhadores assalariados – só em 1958 foram deflagradas 29
grandes greves –, passando pelos defensores de uma maior austeridade na execução do orçamento como forma de
exercer efetivo controle inflacionário – entre os quais se destacava Eugênio Gudin. O aumento dos gastos públicos com a
execução dos programas previstos no Plano de Metas e com a construção Brasília, a concessão de aumentos salariais e o
alargamento das linhas de crédito do Banco do Brasil, associados a uma forte depressão no mercado internacional dos
produtos da pauta de exportações brasileiras, resultariam em um quadro de forte pressão inflacionária (só no primeiro
semestre de 1958 o custo de vida na cidade do Rio de Janeiro aumentou cerca de 10%) e de expansão do endividamento
do setor público. Esse panorama passou a representar um real risco para a condução das ambiciosas metas de
desenvolvimento do governo.
Em março de 1958, o Fundo Monetário Internacional (FMI) enviou uma missão ao Brasil com o propósito de avaliar a
capacidade do país de honrar um empréstimo externo de US$ 300 milhões, solicitado para cobrir os investimentos previstos
no plano de desenvolvimento. O relatório elaborado pelo FMI sugeria uma série de alterações nos rumos da política
econômica brasileira, entre elas a contenção dos salários, o respeito a tetos inflacionários, a revisão da política cambial e a
suspensão de subsídios. Procurando adequar-se às exigências do principal avalista dos empréstimos internacionais,
Juscelino deu sinais de que promoveria uma radical alteração nos rumos da política econômica ao substituir Alkmin por
Lucas Lopes.
Ao assumir o Ministério da Fazenda, em junho de 1958, Lucas Lopes apresentou as bases de um Programa de
Estabilização Monetária (PEM) que defendia um rígido controle do orçamento e o combate à expansão da base monetária
através de medidas radicais como o aumento de impostos, o controle das linhas de crédito do Banco do Brasil e a
eliminação dos subsídios cambiais. Com seu rigor monetarista, o PEM impunha limites à implementação das metas de
desenvolvimento, além de provocar sérios abalos nos eixos de sustentação política e social do governo. Revelando a falta
de consenso político para a implementação das medidas contencionistas, JK autorizaria um aumento de 30% para o salário
mínimo em janeiro de 1959 e, pouco depois, concederia novos subsídios aos cafeicultores e à importação de maquinaria
para a indústria de base. Afrontando abertamente a diretriz do ministro da Fazenda, o presidente do Banco do
Brasil, Sebastião Pais de Almeida, se recusaria a cumprir a orientação de austeridade creditícia e abriria novas linhas de
empréstimos para o setor industrial. Ficava claro que, entre a necessidade do ajuste macroeconômico e a aposta no
desenvolvimento, o governo Kubitschek assumia a opção de implementar a matriz desenvolvimentista, ainda que os
indicadores econômicos apontassem para um progressivo desequilíbrio dos pilares da economia. Vencia a concepção de
matriz estruturalista, segundo a qual os sinais de desequilíbrio identificados na economia eram inerentes ao processo de
desenvolvimento e seriam corrigidos progressivamente, à medida que a economia brasileira se modernizasse, dinamizasse
e diversificasse.
Juscelino fez do embate entre a matriz desenvolvimentista e a matriz monetarista, que privilegiava a estabilização, um
poderoso instrumento de ação política, capaz de mobilizar diferentes setores da sociedade a partir da evocação de um
ideário nacionalista. Foi assim que transformou em gesto de soberania nacional o rompimento com o FMI, em junho de
1959, e a exoneração de Lucas Lopes do Ministério da Fazenda e de Roberto Campos da presidência do BNDE. Sua
imagem pública, ao final de seu governo, estava associada à do grande empreendedor da modernização da economia
brasileira, processo esse, no entanto, que viria a cobrar seus ônus nos anos seguintes. JK legou ao seu sucessor uma
economia que crescia à média de 8,2% ao ano, mas que passara a conviver com taxas de inflação anuais da ordem de
23% e com um progressivo descontrole das contas externas.
Fonte: SARMENTO, Carlos Eduardo. Disponível em:
http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/artigos/Economia/Desenvolvimentismo. Acesso em 17/09/2017.
Questões

1. A política econômica do governo Kubitschek foi marcada pelo Plano de Metas e pela tensão
entre dois interesses claros. O que foi o Plano de Metas, quais foram os interesses
conflitantes para seu desenvolvimento e que grupos político-econômicos os representavam?

2. Faça um quadro comparativo com as principais características da política econômica do


ministro José Maria Alkmin e o Programa de Estabilização Monetária (PEM) desenvolvido
pelo ministro Lucas Lopes a partir de 1958.

3. As críticas à política econômica adotada por Alkmin se estenderam aos cafeicultores e aos
trabalhadores assalariados. Em que consistiam tais críticas?

4. Como parte das alterações na política econômica sugerida pelo FMI, em 1958, JK substituiu o
ministro Alkmin por Lucas Lopes. Quais alterações o FMI propunha?

5. O texto afirma que, entre a matriz desenvolvimentista (estruturalista) e a matriz monetarista,


Juscelino optou pela primeira. Com base no texto, caracterize cada uma das matrizes.

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