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Maesley de Sousa Fernandes 21082515

Economia Brasileira Contemporânea II Noturno

A Crise do “Milagre” – Paul Singer

I - Resumo

Partindo de uma conjuntura global, a declaração de “milagre econômico”


evidenciada no pós-guerra deu-se pelo contínuo e virtuoso crescimento econômico
da Alemanha Ocidental, partindo de uma linha neoliberal sobreposta ao dirigismo
estatal, onde apresentou renda nacional de 6,8% entre 1950-1960, e ao clássico
crescimento japonês baseados em uma política de desenvolvimento focada em
fomentar as exportações e com abundância de mão de obra barata, de forma a
apresentar um PIB de 7,2% entre 1950-1960 e 8,6% entre 1960-1967. Ambas
apresentaram grande caráter político e tornaram-se exemplo a serem seguidos. Já o
“milagre brasileiro” é evidenciado pela junção dos dois modelos anteriores ligado a
um mercado de trabalho tomado como perfeitamente disciplinado e com forte
controle na distribuição de renda.

O surgimento do neocapitalismo, caracterizado por um novo ciclo conjuntural


oriundo do controle realizado pelo Estado na oferta dos meios de pagamento
(controle do crédito), retratando que há relação de manipulação política na
economia, especialmente na inflação, denotou grande influência e devera
importância para o entendimento do excepcional crescimento das economias
capitalistas, e como conseguem contornar as crises econômicas por um período de
tempo mais longo. Desta forma, a correlação entre o crescimento econômico e
inflação evidentemente apresenta um grande impacto sobre o acelerado
crescimento dos países capitalistas, no entanto o alto nível de poupança também
apresenta sua devida contribuição nesse processo.

Com o início de um espírito nacional desenvolvimentista, iniciado basicamente pelo


governo de Getúlio Vargas, o processo de transformação constante da economia
nacional em prol de seu crescimento industrial e econômico tem estado cada vez
mais ligado às ações tomadas pelos governos instaurados, estes que enfrentam
grandes desafios, especialmente o inflacionário, ao longo da história econômica do
Brasil. Após 1930 as políticas elaboradas pelo Estado viraram-se para o mercado
nacional com o objetivo de produzir nas indústrias locais e romper com a
dependência internacional do país, além de buscar o aumento do excedente de
capital que contribuíssem com o desenvolvimento.

Com o ideal de substituir importações, através do aumento de preços sobre produtos


importados, os preços relativos dos produtos nacionais eram institucionalmente
manipulados favorecendo os setores que mais intensificavam o desenvolvimento do
país. No entanto, isso gerou um surto inicial da inflação visto que dada à pequena
variedade de produtos e o encarecimento das mercadorias estrangeiras, os
consumidores eram forçados a consumir a preços elevados.

Na década de 1940 – até 1948, a intensidade do aumento da inflação não esteve só


associada ao crescimento industrial acelerado, mas dado à Segunda Guerra Mundial
a falta de bens de consumo foi um fator de extrema importância para explicar o
aumento de preços tal como também o déficit orçamentário do governo devido às
despesas causadas pela guerra. Além disso, a utilização de política monetária
expansionista, com vasta emissão de moeda resultante dos investimentos de
infraestrutura realizados pelo Governo, e o espiral preços-salários, resultado da
autonomia e força dos sindicatos e dos pleitos salariais cada vez maiores, visto o
aumento do custo de vida, também contribuíram para o disparo da inflação.

A partir de 1948, o governo Dutra assume uma política anti-inflacionária, através de


corte na espiral preços-salários e semicongelamento nos salários dos trabalhadores
ao não reajustar o salário mínimo, que não resultou em recessão econômica nem
reincidiu o crescimento e desenvolvimento nacional, além de reduzir o ritmo
inflacionário. No entanto, a posse de Getúlio Vargas em 1951 agiu de forma
antagônica à política implementada pelo seu antecessor, com a volta do aumento de
salários, especialmente o salário mínimo, e com foco em redistribuição de renda
retoma ao crescimento industrial sem controle da inflação. Ao assumir a presidência,
Café Filho também implementou uma política recessiva baseada em restrição ao
crédito, porém sem sucesso e as condições creditícias voltaram ao estado normal,
além disso enfrentou grande problema com o balanço de pagamentos, devido à
queda do estoque de divisas.

No governo Juscelino Kubitschek, o maior ritmo do crescimento industrial deu-se


pela abertura ao capital estrangeiro e por uma acelerada substituição de
importações para consumo de bens duráveis e intermediários, porém com uma
inflação ainda mais agravante e deterioração na redistribuição de renda.

Com o domínio do poder político pelas forças armadas a partir de 1964, as


organizações sindicais perdem força e a política anti-inflacionária implantada por
Bulhões e Campos, no governo Castelo Branco, resultaram em efeitos depressivos
na economia partindo de redução ponderável do salário mínimo, afetando a classe
mais pobre, aumento de tributos para redução do déficit do governo, estrito controle
do crédito e criação de poupança forçada (tal como o FGTS1, resultado da abolição
do emprego vitalício). É notável que não houve eliminação da inflação, mas um
maior controle sobre ela e ficando claro que o liberalismo econômico no mercado de
trabalho apresentava maior eficácia à medida que o liberalismo político era restrito.

O crescimento econômico do Brasil retorna no governo seguinte com o presidente


Costa e Silva onde é implementado uma política expansionista de crédito, partindo
do pressuposto que o ritmo inflacionário já havia reduzido o suficiente a ponto de

1
Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.
não optar por novas recessões, e que ao encontrar uma economia com capacidade
produtiva ociosa, altas taxas de desemprego e uma forte propensão a consumir,
principalmente das classes de maior renda, mesmo com controle da espiral preços-
salários, o que resultou no controle inflacionário, e os subsídios às exportações,
propiciou sua ascensão e o florescer do milagre a partir de 1968.

O subsídio às exportações, aumentando a pauta de produtos comercializados no


exterior e a participação brasileira no comércio internacional, e o aumento de
investimento através de capital estrangeiro resultou em rápido aumento da receita
brasileira e maior capacidade de importação, posteriormente levando à elevação da
dívida externa. A mudança nas relações trabalhistas impostas pelo novo regime
como a mudança de estabilidade empregatícia para o FGTS e as contenções dos
conflitos industriais promovidas por reivindicações sindicais e dos trabalhadores
promoveu elevação de produtividade visto que a carga horária semanal do trabalho
tornou-se cada vez maior, apresentando sua forte participação no acentuado
crescimento da economia brasileira.

A instauração de uma nova política econômica a partir de 1964, que favoreceu as


instituições de grande porte visto que havia certa insustentabilidade das empresas
menores em arcar com os tributos e dificuldades para manter-se no mercado devido
aos oligopólios incentivados pelo próprio Estado, atenuou fortes medidas do governo
para uma aplicação mais eficaz de seus preceitos econômicos de forma que este
contribuísse na aceleração do desenvolvimento do país, utilizando como fonte
primordial a acumulação de capital e o controle do mercado pelas grandes
empresas, especialmente multinacionais.

No entanto, essa nova estratégia de desenvolvimento nacional com abertura da


economia para fora, em que o processo de industrialização deixa de priorizar o
mercado interno e passa a priorizar o mercado externo, especialmente pela atuação
das multinacionais, acarretou no aumento de dependência do exterior e na vasta
participação econômica de instituições internacionais na demanda local, tornando o
país sensível às ações tomadas na economia global propiciada pelo liberalismo
mundial e atestando seu subdesenvolvimento.

Notoriamente, o período de crescimento econômico brasileiro entre 1968 e 1973


determinado como “milagre” foi substancialmente uma recuperação da recessão
econômica ocorrida entre 1962 e 1967, oriunda de uma configuração conjuntural
estritamente política resultante de medidas que visavam redução da capacidade
ociosa ocasionada pela depressão no período anterior, contenção do acelerado e
crescente ritmo inflacionário contido no histórico da economia brasileira e busca do
desenvolvimento industrial nacional pautado em acumulação e concentração de
renda.
II – Comentário

A situação recessiva da economia brasileira no período pré ditadura militar, causada


pelo surto inflacionário dado o esgotamento da dinâmica do desenvolvimento
industrial por substituição de importações, pode ser tratado como um período de
transição a um novo modelo desenvolvimentista visto que a conjuntura estrutural do
modelo pré regime militar aborda questões controversas ao novo modelo, mas que
contribuíram para a expansão da atividade econômica do país.

Essa transição dos modelos econômicos tratados, posteriormente, como recessivo e


milagroso, respectivamente, está pautada sobre a mudança de regimes e condições
sociais que invertem os papéis entre crescimento econômico global e expansão das
atividades das indústrias nacionais. Se anteriormente havia um governo que
buscava a independência do mercado externo e tinha pouco carisma com os
investidores internacionais, o novo governo estreita ainda mais as relações
internacionais e, consequentemente, atrai novos investimentos e empréstimos com o
intuito de desenvolver o mercado interno, assumindo, assim, seu atestado de
dependência, tanto tecnológica quanto financeira, e retomando ao seu estado
primitivo (colonial).

Como o Estado, controlado pelo regime militar, não tem severo


compromisso/obrigação com a burguesia e nem com os trabalhadores, dada pela
perda da força sindical, tal como ocorreu nos períodos anteriores, a implantação de
políticas expansionistas, no caso do crédito, e contracionistas, no caso dos salários
e preços, que reestruturaram as instituições e indivíduos, não sofreu grandes
empecilhos, sendo aplicadas com mais praticidade.

Com a forte aceleração inflacionária a partir de 1961, a restrição do mercado de


consumo popular à classe dos assalariados se intensificava, direcionando o
processo de dinamização do consumo de bens duráveis à classe média urbana.
Para Maria da Conceição Tavares (1983)2, o processo de concentração de renda
está vinculado diretamente à sua desconcentração e reconcentração sendo o
precursor de mudanças nas relações produtivas, consequentemente reorganizando
o funcionamento do mercado, mas sem qualquer garantia de que haverá aumento
da concentração global.

À medida que o capitalismo brasileiro crescia a altas taxas através da acumulação


de capital e concentração da renda a participação na economia foi afunilando e
deteriorando as relações empregatícias, tornando o crescimento socialmente
excludente. Com a contração cada vez maior dos níveis salariais, reduzindo o poder
de compra dos trabalhadores assalariados visto que o custo de vida apresentava
considerável elevação, principalmente na região urbana, e um crescimento baseado
na exploração desses trabalhadores com cargas horárias semanais mais extensas,

2
Tavares, M. da Conceição. Da Substituição de Importações ao Capitalismo Financeiro, Rio de Janeiro, Ed.
Zahar, 1983.
as condições sociais ficaram extremamente decadentes, provocando aumento de
acidentes nos postos de trabalho.

Já no âmbito das instituições privadas, a capacidade que as empresas menores


tinham de concorrer com as multinacionais foram totalmente aniquiladas pelos
incentivos monopolísticos do Estado, que visava o alcance e prestígio internacional
das economias desenvolvidas, retratando uma escassez de oportunidades
extremamente alta às indústrias nacionais, as quais sofreram fusões e aquisições ou
fecharam as portas por impossibilidade de manter-se no mercado.

É notável que aderir ao processo de modernização para pequenas e médias


empresas também resultaria à mesma mudança estrutural forçada por destruição da
capacidade produtiva, da renda e do emprego, a ponto de ser necessário averiguar
se tal ato proporcionaria rentabilidade e possibilidade de ser realizado. Mediante a
uma reorganização geral da indústria, possivelmente poderia haver, com intervenção
pública que implementasse políticas eficientes de emprego, crédito e tecnologia, um
aumento da concentração absoluta.

Do ponto de vista geral, a mudança do grave processo inflacionário e endividamento


externo atrelados aos problemas do balanço de pagamentos para uma inflação
controlada e uma dívida externa associada ao livre movimento de capitais
proporcionou modernização do processo produtivo, heterogeneidade na pauta de
exportação, diversificação dos instrumentos financeiros, expansão dos meios de
pagamento, desenvolvimento mais acentuado do mercado de capitais, entre outros,
no entanto baseadas em políticas que mudaram as estruturas institucionais da
economia visto que as empresas, nem mesmo o Governo, não tinham capacidade
de promover autofinanciamentos que propiciassem transferências de recursos que
cobrissem os investimentos necessários.
III) Bibliografia

 Singer, Paul. A Crise do “Milagre”. Interpretação crítica da economia


brasileira. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1982.

 Tavares, Maria da Conceição. Da Substituição de Importações ao Capitalismo


Financeiro, Rio de Janeiro: Editora Jorge Zahar, 1983.

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