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Manole
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i! 52 REGIMES MONETÁRIOS
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no, a in tranqüilidade social causada pela recessão, o desalento no meio empre-
sarial, a hostilidade do mercado financeiro internacional e a elevação do risco-
país tornaram a conversibilidade insustentável.
O regime de currency board desempenhou, no início, papel essencial na vi-
tória contra a inflação. Mas seu pleno êxito, em termos de forjar um ambiente
favorável ao desenvolvimento econômico e social, dependia da execução de pro-
fundas reformas, destinadas principalmente a: (i) aumentar a competitividade O REGIME DE METAS MONETÁRIAS
do sistema produtivo, a ponto de favorecer mais fortemente o comércio externo;
(ii) disciplinar o ambiente fiscal, de forma a abrandar a questão do endividamento
1. Introdução'-- 2. Fundamentos teóricos do regime de me-
e elevar a capacidade de investimento do setor público; (iii) promover a reforma
tas monetárias: o monetarismo tipo I: 2.1 A taxa natural de
do Estado, dotando-o de maior habilidade para conceber e executar políticas pú-
desemprego; 2.2 A curva de Phillips e o papel das expectati-
blicas.
vas: 2.2.1 A curva de Phillips original; 2.2.2 A curva de
Como as reformas não aconteceram, a conversibilidade passou de fator de
Phillips versão de Samuelson-Solow; 2.2.3 A curva de Phillips
confiança para fator de dúvidas: até quando a Argentina agüentaria? Quais estra-
aceleracionista; 2.3 Expectativas adaptativas e ilusão mone-
gos seriam produzidos pela mudança de regime cambial? Por ter durado mais do tária; 2.4 A hipótese aceleracionista; 2.5 A regra monetária
que o razoável, o regime de currency board transformou-se em um "passivo'~ ao e os argumentos contra o discricionarismo: 2.5.1 Ilusão mo-
encolher o raio de manobra para uma política de retomada do crescimento. netária e redução do nível de utilidade dos agentes econô-
Chegou-se a um ponto em que as tensões econômicas, sociais e políticas micos; 2.5.2 Defasagens na condução da política monetária
superaram os benefícios do regime de currency board. Vale dizer, essas tensões e a exacerbação dos ciclos econômicos; 2.6 O papel limita-
provocavam danos maiores do que o trauma de sair da conversibilidade. Nesse do da política monetária; 2. 7 Estabilidade macroeconômica:
momento, houve a ruptura. visão de keynesianos e de monetaristas; 2.8 A teoria quanti-
tativa da moeda: 2.8.1 A concepção clássica; 2.8.2 A con-
cepção de Friedman- 3. A operacionalização do regime de
metas monetárias: 3.1 Elementos fundamentais; 3.2 Vanta- , I
! I
gens; 3.3 Desvantagens; 3.4 A definição do agregado mone- li
I I
'I
tário a ser utilizado como meta; 3.5 A crítica de Tobin; 3.6
Algumas experiências - 4. Resumo e conclusões - 5. Ter-
mos-chave- 6. Bibliografia comentada- 7. Questões para
discussão- 8. Exercícios- 9. Respostas- Apêndice 1- A
revolução keynesiana, a síntese neoclássica e a contra-revo-
lução monetarista - Apêndice 2 - A história da curva de
Phillips- Apêndice 3 - Verticalismo versus horizontalismo.
quando uma pessoa decide não trabalhar por considerar o salário real insufi- Box 1 -Taxa Natural de Desemprego: Distinção entre Forças Reais e Monetárias
ciente; e (ii) o desemprego friccional- que acontece quando um trabalhador na Determinação do Desemprego
está temporariamente desempregado, em transição de um emprego para outro.
Friedmaf1 usou. otermo natural. no sentido originalmente dado por Knut .WickseH
O desemprego friccionai ocorre quando o trabalhador está à procura de . (1898~ 1907), visando enfatizar a distinção entre as forças reais~ fatores estruturais
novo posto de trabalho, que se encontra temporariamente disponível em fun- e institucionais- e as forças monetárias na determinação do nível de desemprego.
ção: (i) da existência de informação imperfeita quanto à oferta e à procura por Isto é, a taxa natural é determinada por fatores reais e; não havendo intervenções
trabalho; e/ou (ii) do baixo grau de mobilidade geográfica dos trabalhadores. monetáriasro nível de desemprego se iguala à taxa natural;
Graças a Wicksell, nós estamos todos famíliarizados com o conceito de taxa na-
A taxa natural exclui, portanto, o desemprego involuntário- que ocorre
túré]l df! jurqs .e com a possibilidade de haver urna di~crepância entre a. taxa
quando os agentes estão dispostos a trabalhar pelo salário que vigora no mer- natural e a taxa de mercado. A análise anterior sobre as taxas de juros pode ser
cado de trabalho, mas não há postos de trabalho disponíveis. traduzida diretamente para aJinguagemwickselliarta. A autoridade monetária
O termo natural foi utilizado por Friedman no sentido wickselliano, com pode tornar a taxa de juros de mercado menor do que a taxa natural· apenas
o intuito de distinguir as causas de natureza estrutural e institucional das de- por meio de inflação. Ela pode tornar a taxa de mercado maior do que a taxa
mais - notadamente a política monetária - na determinação do nível de natural apenas por meio çle deflação. Essa análise tem sua contrapaí'f:idano
mercado "de trabalho. A qualquer momento, há algum nível d<l desemprego
desemprego. Isto é, a taxa natural é determinada por fatores reais e, na ausência
que possui a propriedade de· ser coincidente com um equilíbrio na estrutura
de intervenções monetárias, o nível de desemprego se iguala a ela (ver Box 1). dos salários reais que prevalecem na economia. Naquele nível dtl. desemprego,
A taxa natural de desemprego é, portanto, aquela que equilibra o merca- o salário real tende, em média, a evoluir a umataxa normal secular, isto é, a
do de trabalho, dadas as suas características estruturais e institucionais e as uma taxa que pode seHndeflnidamerite mantida,namedidâ em que a.fórma-
preferências dos agentes econômicos. Ela representa o nível de desemprego que ção de capital, o desenvolvimento tecnológico etc. permaneçam em sua ten-
dência de longo prazo. Um nível mais baixo de desemprego é uma indicação
é compatível com o comportamento racional-maximizador dos agentes eco-
de que há excesso de demanda pôrtrabalho,queproduzirá pres~ã? para cima
nômicos: nesse nível de desemprego, todos os agentes estão otimizando suas sobre os salárjosreais. Um nível mafs elevado de.desemprego é uma indicação
funções de utilidade. de que há excesso de oferta de trabalho, que produzirá pressão para baixo
Quando o nível de desemprego é igual à taxa natural, estão desemprega- sobre os salários reais. A taxa natural de desemprego, .em outras palavras, é o
dos apenas: (i) aqueles trabalhadores que consideram que os bens adquiridos nível que resultaria de um sistema walrasiano de equações de equilíbrio geral,
com o salário em vigor proporcionam um nível de utilidade menor do que as desde que contivesse as características reais e efetivas dos mercados de traba-
lho e de bens, incluindo as imperfeiÇões de mercado,as mudanças estocásticas
horas de lazer- caracterizando o desemprego voluntário; e (ii) os trabalhado-
nà oferta e na demanda, o custo de obtenção de informação sobre vagas e as
res que estão mudando de emprego - o que constitui o desemprego friccionai. disponibilidades de trabalho, o custo da mobilidade da mão'-dê-obra, e élssim
Ou seja, estão trabalhando todos aqueles que consideram que os bens-salários pór diante... Eu uso o termo natural pela mesma razão de Wícksell "-para sepa-
proporcionam nível de utilidade igual ou superior à satisfação derivada das forças monetárías. (Friedman,19~8; 7-9)
horas de lazer, à exceção daqueles que estão temporariarr{ente desempregados,
mudando de um posto de trabalho para outro.
A taxa natural goza das propriedades de unicidade e estabilidade. Isto é,
Na realidade, a hipótese de flexibilidade de preços (e salários) é que ga-
existe apenas um nível de desemprego de equilíbrio em que os agentes têm as
rante a propriedade de estabilidade do equilíbrio macroeconômico, associado
suas preferências plenamente satisfeitas (dadas as características estruturais e
a um volume de desemprego igual à taxa natural. Vale dizer, a convergência do
institucionais do mercado de trabalho); e a taxa de desemprego converge para
desemprego para a taxa natural é garantida pela flexibilidade do salário nomi-
este ponto na ausência de intervenções monetárias.
nal, da seguinte forma: (i) caso haja um excesso de oferta de trabalho, o salário
58 REGIMES MONETÁRIOS O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 59
(nominal) se reduz até o nível (de equilíbrio) em que a quantidade demandada 2. 2 .1 A Curva de Phillips Original
se iguala à ofertada; (ii) caso haja um excesso de demanda por trabalho, o salá-
rio (nominal) se eleva até o nível (de equilíbrio) em que a quantidade deman- A curva originalmente concebida por Phillips (1958) constitui-se na ex-
dada de trabalho se iguala à ofertada. pressão gráfica de uma relação estatística entre a taxa de variação percentual do
Finalmente, é importante notar que a taxa natural de desemprego não é w
salário nominal, (inflação salaría[), e a taxa de desemprego, U, verificada no
imutável. 1 Friedman considerou que os fatores que a determinam dependem Reino Unido no período de 1861 a 1913, descrita pela equação (1): 2
da ação humana e de decisões de política econômica, podendo, portanto, variar H
w=f(U) (1)
ao longo do tempo.
A taxa natural pode diminuir como resultado de medidas, como as que:
(i) incentivem as pessoas a trabalhar, por exemplo, por meio de reduções do 12
de desemprego somente pode ser reduzida pela adoção de medidas que alterem
as características estruturais e institucionais do mercado de trabalho, melho- Fonte: Phillips (1958).
rando o seu funcionamento.
Gráfico 1 - Curva de Phillips Original: Relação entre Inflação Salarial e Desemprego -
Reino Unido: 1861 a 1913
2.2 A Curva de Phillips e o Papel das Expectativas
O Gráfico 1 - que revela uma relação hiperbólica entre a inflação salarial e
Como mostrado adiante, o segundo passo na edificação do monetarismo a taxa de desemprego - ilustra a evidência favorável à hipótese testada por
tipo I foi a revisão, proposta por Friedman (1968) e Edmund Phelps (1967 e Phillips de que a taxa de inflação salarial é explicada por ambos, o nível e a taxa
1968), de uma pedra fundamental da teoria econômica moderna: a curva de de variação do desemprego.
Phillips, que prevê uma relação negativa ou um trade-off entre inflação e de- Em sua versão original, a curva de Phillips resultou de um mero exercício
semprego (uma história detalhada da curva de Phillips se encontra no Apêndi- econométrico, realizado com a finalidade expressa de se testar uma hipótese
ce 2). A seguir, são apresentadas três versões dessa curva: a original, a de
Samuelson-Solow e a aceleracionista.
2 O sinal em parênteses acima do argumento de uma função denota o sinal da derivada
' (-)
dessa mesma função em relação à respectiva variável. Assim, y =f( x) significa que
dy(x) <O; isto é, a derivada da função y(x) com relação à variável x é negativa: uma elevação
dx
I Ver Friedman (1968: 9). de x determina uma redução de y, e vice-versa.
60 REGIMES MONETÁRIOS O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 61
microeconômica, a de que o preço da mão-de-obra é regulado pela interação Nós traduzimos o diagrama de Phillips, mostrando o padrão de aumento do
entre a oferta e a procura de trabalho: salário nos Estados Unidos versus o nível de desemprego, o que permite ver quais
seriain os diferentes níveis de desemprego que seriam "necessários" para atingir
Quando a demanda por um bem ou serviço está elevada relativamente à sua cada patamar do nível de preços. (Samuelson & Solow, 1960: 191-2)
oferta, nós esperamos que os preços se elevem, sendo a taxa de crescimento tanto
maior quanto maior for o excesso de demanda. Inversamente, quando a demanda A partir dessa nova especificação, a curva de Phillips passou a ser descrita
está menor relativamente à oferta, nós esperamos que os preços caiam [... ] Parece pela equação (2):
plausível que este princípio deve operar como um dos fatores determinantes da H
F=f(U) (2)
taxa de variação do salário monetário, que é o preço da mão-de-obra. (Phillips,
1958:283) sendo P a taxa de inflação.
Repare que a curva de Phillips original (equação 1) se diferencia da curva
Em suma, a motivação de Phillips foi investigar se a determinação do salá- de Phillips versão de Samuelson-Solow (equação 2) tão-somente pela subs-
rio se dá do mesmo modo que o preço das demais mercadorias.A curva de Phillips tituição da taxa de variação do salário nominal (inflação salarial) pela taxa de
original representa, portanto, uma relação microeconômica entre o preço (salá- variação do nível geral de preços (inflação). Essa mera troca de variáveis não foi
. rio nominal) e a quantidade transacionada de um bem (a mão-de-obra). nada trivial: fez com ·que a curva de Phillips se tornasse representativa de uma
relação macroeconômica, como é visto adiante.
O Gráfico 2 ilustra a curva de Phillips versão de Samuelson-Solow. Ele mostra
2.2 .2 A Curva de Phillips Versão de Samuelson-Solow
que, entre os anos de 1935 e 1960, nos Estados Unidos, a estabilidade de preços
Samuelson e Solow (1960) não apenas batizaram a curva de Phillips, como poderia ser obtida à custa de uma taxa de desemprego de cerca de 5,5o/o.Alterna-
também a transformaram em uma relação macroeconômica. tivamente, para se manter a taxa de desemprego em 3%, seria necessário gerar
Supondo-se que os preços são fixados por uma regra de markup em rela- uma taxa de inflação em torno de 4,5 o/o a. a.
3
ção aos salários, esses autores substituíram a inflação salarial pela taxa de varia-
11
ção do nível geral de preços. O resultado obtido deu origem a uma nova versão
10
da curva de Phillips que fornecia uma espécie de menu das diferentes combina- 9
8
ções possíveis entre inflação e desemprego para a economia norte-americana:
6
3 Considerando-se que o preço (P) de um bem é determinado por uma regra de markup 2
em relação ao custo unitário do trabalho (C) - dado pela razão entre o salário-hora
ot---.---~---.---.---.~-.----.---.--.
( W) e o produto obtido por hora trabalhada ( Q), ou a produtividade do trabalho -, 2 4 6 7 8 9
-1
temos que: P =a C, a> 1. Supondo-se a produtividade do trabalho constante, observa- Taxa de Desemprego(%)
se que o preço é determinado por uma regra de markup sobre o salário; isto é, o preço
Fonte: Samuelson & Solow (1960).
é um múltiplo do salário: P =a W, a> 1. Dessa maneira, conclui-se que a inflação é
positivamente correlacionada com a taxa de variação do salário. Isso possibilita trans-
formar uma relação entre a taxa de variação salarial e o desemprego em uma relação Gráfico 2 - Curva de Phillips Versão de Samuelson-Solow: Relação entre
entre a taxa de inflação e o desemprego. A esse respeito, ver Humphrey (1986: 15). Taxa de Inflação Anual e Desemprego- Estados Unidos: 1935 a 1960
62 REGIMES MONETÁRIOS O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 63
Foi com essa nova especificação que a curva de Phillips se tornou relevan- Phillips parecia ser antes uma peculiaridade da história econômica britânica
te para a condução da política econômica. A partir do momento em que do que uma regra universal5 (ver Apêndice 2). Fazia-se necessária, portanto,
Samuelson e Solow substituíram a taxa de variação salarial pela inflação, a cur- uma revisão de um dos mais relevantes paradigmas da história do pensamento
va de Phillips transformou -se na pedra fundamental da teoria macroeconômica. econômico moderno.
De fato, ao longo da década de 1960, a curva de Phillips foi considerada,· Friedman e Phelps ressaltaram o fato de que a curva de Phillips original
pela ampla maioria dos economistas, representativa de um trade-offestável entre foi obtida plotando-se a inflação do salário nominal contra a taxa de desem-
inflação e desemprego. Dessa forma, ela foi largamente utilizada pelos policymakers prego. Segundo eles, essa especificação da equação de Phillips seria válida ape-
como uma espécie de cartilha, segundo a qual se poderia optar entre diferentes nas para uma economia caracterizada pela esta.J::lilidade de preços; ou melhor, a
combinações de inflação e desemprego, por meio da implementação de políticas formulação original de Phillips supunha que ~ão existiam expectativas infla-
·. ~ ... ·. . . . ··
... ·•
fiscal e monetária, em linha com a chamada síntese neoclássica (ver Apêndice 1). cion<Írias'{ ou que estas seriam estáveis). De acordo com Friedman,
É interessante notar que Samuelson e Solow não consideravam estável, no
longo prazo, o trade-off entre inflação e desemprego; chamando a atenção para Implicitamente, Phillips escreveu seu artigo para um mundo em que todos espe-
a possibilidade de a curva de Phillips se deslocar: 4 ram· que os preços nominais sejam estáveis e que esta expectativa permanece
estável e imutável, independentemente de qualquer coisa que vier a acontecer
Além da advertência usual de que estas são simplesmente nossas melhores suposi- com os preços e salários efetivamente verificados. Suponha, ao contrário, que
ções, nós devemos expressar outra advertência. Toda a nossa discussão tem sido todos antecipassem que os preços iriam subir a uma taxa superior a 75% ao ano
mencionada em termos de curto prazo, tratando do que poderia ocorrer dentro de -como, por exemplo, os brasileiros fizeram há alguns anos. Dessa forma, os salá-
poucos anos. Então, seria errado pensar que o nosso gráfico, que relaciona o com- rios deveriam subir àquela taxa simplesmente para manter o salário real cons-
portamento dos preços e do desemprego efetivamente acontecidos, deverá manter tante. (Friedman, 1968: 8)
seu mesmo formato no longo prazo. (Samuelson & Solow, 1960: 193)
O fato de os agentes anteciparem ou formarem expectativas acerca dava-
Quase uma década depois, no final dos anos de 1960, a curva de Phillips riação do nível geral de preços impunha a necessidade de se adicionar uma nova
passou por uma importante revisão, caracterizada pela inclusão de uma nova variável à equação de Phillips original. A expectativa de inflação passou, portan-
variável na equação que a representava: a inflação passou a ser explicada tanto to, a compor o que ficou conhecido na literatura econômica como curva de Phillips
pela t.âx:a de desemprego ~uanto pela expectativa dos agentes econômicos com versão de Friedman-Phelps ou curva de Phillips aceleracionista. 6 Assim, uma nova
<~. . - -.•••.._ . . /
relação à inflação: A seguir apresenta-se como se deu a elaboração dessa nova variável foi incluída na equação de Phillips, que passou a ser dada por:
versão da curva de Phillips.
2.2.3 A Curva de Phillips Aceleracionista 5 Com relação ao caso do Brasil, por exemplo, Lara-Resende e Lopes (1981) questionaram
a existência de um trade-off estável entre os preços industriais e o nível de desemprego.
A partir de fins da década de 1960, o consenso criado em torno da curva Segundo eles, não havia evidência favorável à existência de uma relação inversa entre o
de Phillips começou a ruir: a incrível regularidade estatística verificada por hiato do produto- utilizado como medida do desemprego supondo-se a lei de Okun, que
associa o hiato de produto ao desvio do nível de desehiprego em relação à taxa natural- e
os preços industriais na economia brasileira durante as décadas de 1960 e 1970.
6
Muitos autores utilizam o termo curva de Phillips expectacional, ao se referirem a essa
4 O próprio Phillips também chamou a atenção para essa possibilidade. versão da curva de Phillips.
REGIMES MONETÁRIOS
O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 65
64
A equação (6) representa um caso mais geral. Nele, os agentes corrigem suas
8
expectativas por uma fração do erro cometido no período passado, dado pela dife-
rença entre a inflação realizada e a expectativa de inflação em t-1: Em resumo, na ausência de ilusão monetária, o nível de desemprego se
iguala à taxa natural. Caso a inflação supere as expectativas, o nível de desem-
prego se reduz abaixo de sua taxa natural. Se a inflação ficar abaixo das expec-
tativas, o nível de desemprego se eleva acima da taxa natural. Dito de outra
" Realizando-se sucessivas substituições, obtém-se o seguinte resultado: forma, o desemprego corrente oscila em torno da taxa natural de desemprego;
00
e as flutuações econômicas resultam de erros expectacionais, decorrentes da
·e ·-1 ·
~ = (1-a) L,al PJ-1 (7) criação de inflação-surpresa por parte das autoridades monetárias.
)=1
2.3 Expectativas Adaptativas e Ilusão Monetária rapidamente do que o preço dos fatores de produção, as firmas percebem que
A hipótese de expectativas adaptativas é peça fundamental do modelo houve uma redução do salário real (~'-1 > w:- 1
) e, portanto, estarão dispostas a
~-1 ~
monetarista, na medida em que sua adoção possibilita o surgimento do fenô-
aumentar o salário nominal, de forma a manter o salário real constante
meno conhecido como ilusão monetária, que nada mais é do que um erro
(expectacional. A ocorrência da ilusão monetária faz com que o desemprego se
( ~t-1 = ~')para manter o nível de emprego. Isto é, os empregadores, ao constatar
situe em um nível diferente da taxa natural. É importante notar que esse fenô- l~-1 ~
meno impede os agentes econômicos de maximizarem suas funções-objetivo uma elevação no preço de seus bens, estarão dispostos a pagar um salário no-
(de utilidade, no caso dos consumidores e de lucro, no caso das firmas), como minal mais elevado. 10
mostrado na subseção 2.5.1. A informação acerca da variação do nível geral de preços só está disponí-
Para fins didáticos, a lógica do modelo de expectativas adaptativas e o vel para os trabalhadores de forma defasada. Dessa maneira, eles irão subavaliar
impacto da ilusão monetária sobre o nível de desemprego podem ser apresen- a inflação e, interpretarão, erroneamente, a elevação em seus salários nominais
tados da seguinte forma. como um ganho de salário real.
Suponha uma situação inicial de equilíbrio em que as expectativas de in- O fato de os trabalhadores não perceberem que a elevação no salário no-
flação dos agentes estão sendo plenamente realizadas, de modo que ambas, as minal simplesmente compensa o aumento da inflação determina uma expan-
taxas de inflação esperada e realizada, igualam-se e, portanto, o nível de desem- são da oferta de trabalho. Essa incapacidade de se distinguir entre variações no
prego coincide com a taxa natural. nível geral de preços e variações de preços relativos é que se chama ilusão mo-
Friedman considerou, ainda que implicitamente, que a oferta monetária é netária.
exógena e determinada pelo Banco Central, em linha com o chamado verti-
calismo (para maiores detalhes, ver Apêndice 3). Assim, considere-se que no 10
Da maneira aqui apresentada, os empregadores não sofrem de ilusão monetária. De
instante ta autoridade monetária promova uma elevação da taxa de expansão
fato, o cerne do modelo de Friedman está no fato de os trabalhadores sofrerem de ilusão
do estoque de moeda (M1 > M 1_ 1 ) de maneira que a inflação supere as expec- monetária, dando-se pouca importância ao comportamento das firmas. Entretanto, a
tativas - dado que estas se formaram com base na inflação verificada até o pe- teoria de Friedman pode ser apresentada de maneira sutilmente diferente. Caso as fir-
ríodo anterior (t- 1), que, por sua vez, depende da política monetária mas também sofressem de ilusão monetária, o mesmo resultado seria obtido. Nessa hi-
implementada até esse mesmo período. pótese, os empregadores- ao perceberem variações nos preços de seus produtos anteci-
padamente em relação às variações do nível geral de preços- irão interpretar um au-
Em linha com a teoria quantitativa da moeda, o nível geral de preços é
mento não-esperado no nível geral de preços como uma variação de preços relativos em
considerado função direta do estoque monetário (ver seção 2.8). Sendo assim,
seu favor, dispondo-se a ofertarem uma quantidade maior de produtos. Para tanto, ofe-
uma ampliação (redução) do estoque monetário determina uma elevação (di- recerão um salário nominal mais elevado, a fim de contratar um volume maior de mão-
minuição) do nível geral de preços. de-obra para poder aumentar a produção. Assim, a ocorrência de inflação-surpresa gera
Na medida em que o estoque monetário está crescendo a uma taxa maior o fenômeno da ilusão monetária porque ambos, firmas e trabalhadores, formam expec-
(+) tativas do tipo adaptativas: (i) os trabalhadores- ao esperarem uma taxa de variação do
do que no período anterior, a inflação se elevará cA= J(M t )), superando as nível geral de preços inferior à que se efetivará - interpretam uma elevação no salário
nominal como um ganho real; e (ii) os empregadores- ao esperarem uma taxa de varia-
expectativas cA > N = A-1). ção do nível geral de preços inferior à que se efetivará ~ consideram uma elevação no
A expansão do estoque monetário determinará uma elevação da deman- nível geral de preços como uma mudança de preços relativos em seu benefício. Com
essa formulação, o modelo de Friedman se aproxima ainda mais do modelo de Lucas,
da agregada (nominal). Supondo-se que o preço das mercadorias se ajusta mais
como mostrado no Box 2 do Capítulo 3.
68 REGIMES MONETÁRIOS O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 69
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Esse fenômeno faz com que os trabalhadores, ao olharem para o salário Box 2 - Taxa Natural de Desemprego, Expectativas Adaptativas e Neutralidade
real do período corrente, que é idêntico ao salário real do período anterior da Moeda no Longo Prazo
( ~~ = ~r-1J ,enxerguem um salário real maior ( ;~ > ;-~J, o que, por sua vez- A hipóte;e da existência da taxa natural de desemprego combinada com a hipótese
~ ~) lH H) de que os agentes formam expectativas adaptativas gera o principal resultaâo do
modelo monetarista: a neutralidadeda moeda no longo prazo. Ou seja, na ausên-
considerando-se que a oferta de trabalho é uma função crescente do salário cia de ilusão monetária, o nível de desemprego converge para a_taxa nat[Jral:
real-, os induz a ofertar uma quantidade maior de trabalho. Há sempre uma 'taxanatural d_e desemprego" determinada porfatoresreais.
1
O ponto central da teoria de Friedman é a hipótese de que os trabalhado- Essa taxa natural tenderá a ser alcançada quando, em média, as expectativas se
res não possuem informação acerca da inflação corrente, calculando o salário realizarem. A mesma situação real é compatível com qualquer.pívela~solut?
real com base na inflação esperada. de preços ou de mudanças destes, desde que se considere o efeito das mudan-
ças dos mesmos no custo_ real de manutenção dos salários. Nesse sentido, a
A partir do momento em que os trabalhadores formam expectativ(ls do
moeda é neutra. Por outro lado, mudanças não esperadas na demanda <:~gre
tipo adaptativas é que surge a possibilidade de uma il!fl:<t@:surpresa gerar a gada nominal e na inflação causarão erros sistemáticos de percepção, tanto '
ilusão monetária: os trabalhadores, ao esperarem uma taxa de variação no ní- por parte dos empregadores como dos empregados, que inicíalment~ desvia~
vel geral de preços inferior à que se efetivará, interpretam uma elevação no rã o o desemprego_ na direção oposta à sua taxa naturaL Nesse sentid() a moe- -
salário nominal como um ganho real e, portanto, aumentam a oferta de traba- da não é neu_ tra.Tod-avia, tais de-s_vios são transitó-rios/ embora possa leva-rum 'I
longo tempo até que eles sejam revertidos e, finalmente~ eliminados com o
lho, determinando-se, assim, uma redução do desemprego abaixo de sua taxa
natural.
ajuste das previsões. (Friedman, 1986: 444) _- --- _. _· • . ·- . - . ·.j
A hipótese da taxa natural de desemprego, quando incorporada à curva
de Phillips versão de Friedman-Phelps, gera aquilo que se pode chamar de quan-
2.4 A Hipótese Aceleracionista
titativismo de longo prazo, assim descrito: (i) no curto prazo, surpresas infla-
cionárias criam um erro expectacional, produzindo efeitos reais na economia Para Friedman, a política monetária pode afetar variáveis reais de forma
que duram apenas enquanto houver ilusão monetária; (ii) no longo prazo, a sustentada, conforme sugerido pela chamada hipótese acekracíonísta.
moeda é neutra. Como mostrado anteriormente, a eficácia da política monetária está con-
A possibilidade de ocorrer uma inflação-surpresa, gerando o fenômeno dicionada ao fato de esta não ser plenamente antecipada pelos agentes: seus
da ilusão monetária, implica que, no.curto prazo, o desemprego pode reduzir- ~feitos duram apenas enquanto houver o fenômeno da ilusão monetária. Dessa
se para níveis inferiores ao da taxa natural, caracterizando-se, assim, um trade- forma, o modelo monetarista prevê que, se a autoridade monetária visa manter
off entre inflação e desemprego - o que é representado graficamente por uma o desemprego sistematicamente abaixo da taxa natural, é necessário criar sur-
curva de Phillips de curto prazo negativamente inclinada. presas inflacionárias continuamente - expandindo a oferta monetária a taxas
Mas esse efeito é meramente transitório, pois, uma vez encerrada a ilusão crescentes-, gerando, assim, uma taxa de inflação também crescente.
monetária, no longo prazo, a economia retorna para a posição de equilíbrio A hipótese aceleracionista é, portanto, um resultado que deriva das duas
original- o que caracteriza uma curva de Phillips de longo prazo vertical, fixa- suposições centrais da escola monetarista: 11 (i) a existência da taxa natural de
da no nível de desemprego igual à taxa natural.
Em outras palavras, no longo prazo, ou quando as expectativas se reali-
zam plenamente, o nível de desemprego é determinado por fatores reais, e vari- 11 Note-se que, a rigor, trata-se de um resultado do modelo monetarista, e não de uma
ações no estoque monetário afetam apenas o nível geral de preços (ver Box 2). hipótese. O termo hipótese é certamente usado aqui com o intuito de chamar a atenção
para o fato de que se trata de uma possibilidade meramente teórica, ou de uma hipótese
70 REGIMES MONETÁRIOS
O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 71
Na seguinte passagem de seu artigo clássico de 1968,Friedman expôs com A hipótese aceleracionista, por si só, já se constitui em argumento contrá-
e riqueza de detalhes a hipótese aceleracionisfu: rio ao discricionarismo monetário, na medida em que ela sugere que qualquer
Vamos assumir que as autoridades monetárias tentam manter a taxa
tentativa sistemática de reduzir o nível de desemprego abaixo da taxa natural
desemprego corrente abaixo da taxa natural. (;..}Para isso, as autoridades
resulta, em última análise, em inflação crescente - o que é indesejável em vista
monetárias aumentam a taxa de expansão da quantidade de mo~da na econo-
mia. Essa será uma política expansionista. Ao tornar os encaixes nominais maio- de seus efeitos sobre a duração dos contratos e a capacidade de o sistema de
res do que as pessoas desejam, haverá tendêncià inicial para baixar as taxas de preços coordenar eficientemente a atividade econômica. 13 No ,entanto, este não
juros, e por essa e por outras razões haverá estímulo para aumentar o nível de é o único e, muito menos, o mais relevante argumento de Friedman contra o
gastos. A renda e os gastos começam a se elevar. No início/ muito ou a maior discricionarismo monetário.
parte do aumento da renda se transformará em aumento na produçã9 e no
Friedman destacou duas outras razões contrárias ao discricionaris~o (ou
emprego, ao invés de aumento nos preços. As pessoas esperam que os preços
continuem estáveis, e os salários são acertados durante algum tempo sob essa ativismo) monetário: (i) a redução no nível de utilidade dos agentes que so-
hipótese. Leva algum tempo para as pessoas se ajustarem ao novo .nível da frem de ilusão monetária; e (ii) o precário estágio do conhecimento quanto às
demanda agregada. Os produtores tenderão a reagir .à. expanl';ãq inicial da d~ verdadeiras causas geradoras dos ciclos econômicos e, notadamente, a existên-
maoda agregada, aumentando a produção; os trabalhadores, trabalhando o;a!s cia de defasagens na condução da política monetária.
horas, e osdesempregados aceitando posições oferecidas agora, ao salarro
nominal antigo. Isto é seguramente o que prevê a doutrina padrão. Mas ela
descreve apenas o.s efeitos iniciais. Tendo em vista .que os preços dos produtos 2.5 .1 Ilusão Monetária e Redução do Nível de Utilidade
respondem ao aument~ não previsto da demanda nominal mais rapidamente dos Agentes Econômicos
do que os preços dos fatores de produção/ os salários reais recebidos se redu-
zem ~embora aumente o salário real espet;adopelos empregados, desde que A ilusão monetária é condição necessária para que a política monetária\
eles implicitamente avaliem os salários oferecidos aos níveis anteriores de pre~
não seja neutra (como apresentado na seção 2.3). Ocorre que os agentes econô- \
ço. De fato, a queda expast do salário real pago pelos empregadores [isto é, o micos que sofrem de ilusão monetária não maximizam suas funções de utili- \
salário efetivo, fl ,simultânea ao aumento ex ante do salário reaJpara os dade, criando-se, assim, um peso morto ou uma perda de bem-estar sociaP 4 !
trabalhadores [isto é/osaládoesperado, ~~]r é o que possibilita é! eleva~o do Dito de outra maneira, a ilusão monetária impede os agentes de se comporta-
rem de forma ótima, desviando a economia de um estado de equilíbrio eficiente
nívelt:feemprego. O nível de desemprego corrente estáabalxo.dataxa natural.
no sentido de Pareto. 15
Há llm excesso de demanda por tra~áiho1 de forma. que o sa!ârio real fendea
se elevêlr a partirdo seu níveUniciaLEmbora o crescime~to da oferta de moeda
a.uma taxa mais elev~d~ continue,o aumentQ no salário real rev~rterá odedínío
no desempr~go, fazendo o desemprego retornarao"Seu níyel iníçial. A.fím de
manter 0 desemprego noseunfvel-meta de 30fo, a. autoridadétrmnet~ria terá
13 Ver Fríedman (1988: 440).
{JUe éll;lfTientar ajaxa de (:resclmentoda oferta de moeda ainda ma,js. tOI!JO no. ! 14 Em linha com a nota 10, quando as firmas sofrem de ilusão monetária, elas não maxi-
ca~p da taxq,dejlJI'OS, isto.aconfecérá ap~Q~S COm aacel$ração,da inflação. mizam suas funções de lucro.
(Fried.mari l968; 9~10l .•.
1 15 Intuitivamente, diz-se que um equilíbrio é eficiente no sentido de Pareto se não existir
nenhuma forma de melhorar a situação de algum agente econômico sem piorar a situação
de pelo menos um outro agente. Uma definição mais fdrmal pode ser obtida em Mass-
Collel, Whinston & Green (1995: 313).
74 REGIMES MONETÁRIOS O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 75
É possível formalizar isso da seguinte maneira (o leitor pouco lhar mais horas; e (ii) uma parcela dos trabalhadores voluntariamente desem-
familiarizado com métodos quantitativos pode pular este e os próxi- pregados, ao incorrer no mesmo erro, passará a considerar que os bens-salários
mos dois parágrafos, sem qualquer prejuízo para a compreensão do resto do proporcionam um nível de satisfação maior do que as horas de lazer e, portan-
capítulo). Suponha n trabalhadores que decidem a quantidade de seu tempo a to, irá trabalhar (ainda assim, continuarão voluntariamente desempregados
ser alocada em trabalho (L), em função do salário real ( W/P). Considere, ainda, aqueles trabalhadores que, mesmo iludidos, não consideram o salário nominal
que a quantidade ofertada de trabalho é função crescente do salário real e que a suficiente).
função de utilidade de cada um dos trabalhadores ( U) depende positivamente Em ambos os casos, os trabalhadores (empregados ou não) que anterior-
do salário real (ou dos bens-salários) e negativamente das horas de trabalho. mente estavam maximizando suas respectivas funções de utilidade deixarão de
Assim, o problema do trabalhador é dado por: fazê-lo, já que a decisão de aumentar a oferta de trabalho é fruto de uma mera
ilusão: os trabalhadores avaliam que houve uma elevação do salário real, en-
max ui LW) f}U.
, - ' __z <Üe
f}Ui
I >0 quanto esse, na verdade, permanece constante. Assim, esses trabalhadores terão
L ( P f}L f}(W; P)
o seu nível de satisfação reduzido, determinando, conseqüentemente, uma dimi-
Na ausência de ilusão monetária, cada um dos n trabalhadores oferta uma nuição do nível de bem-estar da sociedade.
determinada quantidade de trabalho (L;), que maximiza a sua função de utili- Em suma, Friedman postulou que o discricionarismo monetário, ao gerar
uma redução no nível de bem-estar social, é indesejável.
dade. Neste caso, a economia encontra-se em um ponto de equilíbrio eficiente
de Pareto:
2.5 .2 Defasagens na Condução da Política Monetária
Pr. -Pr . *-
- ·e ~Li -Arg max w)
Ui (L,p , vz-
-1 ,... ,n
\-f• e a Exacerbação dos Ciclos Econômicos
Box 5 - As Defasagens na Condução da Política Monetária Suponha que uma economia entre em uma fase recessiva no período t. A
defasagem interna implica que somente em t + 1 as medidas de estímulo eco-
~ação d~ existência de defasagens na condução da p61íficá monetária foi
nômico, ou de flexibilização da política monetária, serão tomadas. Já a defasa-
I uma das grandes contribuiçõesde Milton Friedman. Em suas palavras:
I Nossa economia é caracterizada não apenas por rigidez de preços; mastam- gem externa faz com que os efeitos das medidas adotadas só venham a ocorrer
1 bém por defasagens significativas e outros tipos de resposta (da política eco~ em t + 2. No entanto, é possível que em t + 2 a economia naturalmente já tenha
I nômica). As defasagens tornam impossívelqualquer afirmação x:lefinitiva sobre entrado em uma fase de recuperação (representada pela trajetória contínua),
I 0 real grau de estabilidade, que provavelmente irá resultar de urna política mo..c de tal forma que a expansão monetária acabe por gerar um superaquecimento,
I
I ;
netáría ou fiscaV como a descrita acima. Pode-se esperar menores flutuações
do que as existentes correntemente, embora noss~a ignorâ~ci~ so~re as defasa-
gens e sobre as causas fundamentais das flutuaçoes econom1cas Impeçam que
representado pela trajetória tracejada.
Friedman foi muito enfático com relação ao perigo representado pelo uso
I tenhamos confiança nos resultados das ações tornadas. Apolítica econômica discricionário da política monetária. A esse respeito, ele ressaltou:
1•. proposta poderá intensificar, ao invés de mitigar, as flutuações do dela eco~ô-j
1
1,
;~:o;:~n!~~::·~=~~::~e :e;:;:~~d;:::;:,:~~:::~R~::~ I A razão da existência de uma propensão a reagir de forma exacerbada parece
clara: o fracasso das autoridades monetárias em considerar a defasagem de suas
II ções aleatórias adicionais [...] Os fundamentos dessa hipótese podem ser mais li
bem vistos ao se subdividir em três partes a defasagem envolvida em qualquer·
ação do governo para compensar urna perturbação econômica: (1) a defasa-~
ações e os seus efeitos subseqüentes sobre a economia. Elas tendem a determinar
suas ações pelas condições atuais da economia- mas suas ações afetarão a econo-
1 gem entre a necessidade da ação e o reconhecimento da necessidade da ação; , mia apenas seis ou nove meses mais tarde. Dessa forma, elas se sentirão inclina-
I (2) a defasagem entre o reconhecimento da necessidade da ação e a tomada da j das a pisar no freio, ou no acelerador, dependendo da situação, o que é uma
I ação; e (3) a defasagem entreaação e seusefeitos. (Friedman; 1948: 254-5)
·~~~----
I decisão difícil. (Friedman, 1968: 16)
Para fins didáticos, os efeitos da existência de defasagem na condução da Pelos motivos expostos, Friedman defendeu a idéia de que a política mo-
política monetária sobre as flutuações econômicas podem ser apresentados com netária deveria ser conduzida segundo uma regra monetária que estipulasse
auxílio do Gráfico 4. uma taxa fixa de crescimento para algum agregado monetário:
Minha prescrição continua sendo que a autoridade monetária vá até o fim para
evitar tais movimentos na economia, ao adotar publicamente a política que vise
atingir uma taxa de crescimento constante para determinado agregado monetá-
rio. (Friedman, 1968: 16)
Box 6 - A Atuação Prospectiva das Autoridades Monetárias A Grande Depressão é o mais dramático exemplo, mas não o único. Todas as outras
depressões relevantes ocorridas nesse país têm sido produzidas ou por desordens
rCabe ressaltar que Friedman foi responsável por uma importante mudança napos-J
monétárias ou foram fortemente exacerbadas por desordens monetárias. Toda gran-
tura das autoridades monetárias,as quais, diante da constatação da existência de
de inflação tem sido produzida por expansão monetária. (Friedman, 1968: 12)
defasagens na condução da política monetária; passaram a atuar de maneira mini~
ma mente prospectiva, e não apenas emfunção do estadocorrerrte da ewnomia.
Isto é, caso a política monetária seja coqduzida discdcionariamente - mesmo que Friedman e Schwartz (1963b) apresentaram evidência empírica de que
não se assuma a existência de vma taxa natural de desemprego e a neutralidade da contrações no estoque monetário causaram as principais recessões norte-ame-
moeda -, a autoridade monetaria deve. considerar que. os efeitos de suas ações ricanas entre 1867 e 1960. 16 A partir dos resultados dessa extensa pesquisa, os
ocorrem de maneira defasada no tempo. C~nseqüentemente,os instrumentos de
dois autores sustentaram que a moeda tem papel ativo no mecanismo de trans-
política monetária também devem ser calibrados em função das expectativas com
missão da política monetária- entendido como a forma pela qual variações no
relação ao estado futuro . da economia -avaliado de acardo com indicadores ante-
cedentes das variáveis macroeconômicas (PIS; taxa de desemprego, inflação etc)-, ' estoque monetário afetam a renda nominal; 17 isto é, variações no estoque- mo-
não apenas de acordo com sel.J estado corrente. netário precedem e causam mudanças no nível da renda nominal.
Note.,-se, portanto, que a atuação ~rospeciivadas i'JUtoridades monetáríasíndepencle Apesar. de a política monetária ser um instrumento potente, os seus efei-
da aceitação da hipótese da taxa natural de desemprego~ resultando tão-so,mente tos não são perfeitamente previsíveis ou mensuráveis, fundamentalmente por
da existênda de· defasagens. (acerca das <:lefasagens na eéonômia ·brasiletra, ver
causa da existência de defasagens em sua execução, o que torna indesejável o
Capítulo 6).
seu uso discricionário.
Portanto, resta à política monetária somente a tarefa de não se constituir
em fonte adicional de distúrbios, proporcionando um ambiente de estabilida-
2.6 O Papel Limitado da Política Monetária de que favoreça o bom funcionamento do sistema econômico. Como concluiu
Friedman,
A política monetária desempenha um papel extremamente limitado no
modelo monetarista. No longo prazo, a moeda é neutra; isto é, a autoridade A primeira e a mais importante lição que a história ensina sobre o que a política
monetária não pode manter, sistematicamente, o nível de desemprego abaixo monetária pode fazer - e é uma lição da mais profunda importância - é que a
da taxa natural- a não ser que coloque a economia em uma trajetória de explo- política monetária pode evitar que a própria moeda seja a principal fonte de
são inflacionária, conforme sugerido pela hipótese aceleracionista. perturbação econômica[ ... ] Uma segunda coisa que a política monetária pode
Dado o paralelo traçado por Friedman entre a taxa natural de desempre- fazer é fornecer um ambiente estável para a economia- manter a máquina bem
go e o conceito wickselliano de taxa natural de juros, a política monetária tam- lubrificada, para manter a analogia de Mill. Realizar a primeira tarefa irá contri-
bém não é capaz de manter a taxa de juros permanentemente em um nível buir para que esse objetivo seja atingido, mas há muito mais a fazer do que isto.
diferente da taxa natural- a não ser que crie inflação ou deflação crescente, em Nosso sistema econômico funcionará melhor quando produtores e consumido-
linha com a hipótese aceleracionista. Isto é, no longo prazo, a taxa de juros se res, empregadores e empregados puderem continuar tendo total confiança de
iguala ao seu nível natural, sendo determinada por fatores reais, independente- que o nível médio de preços terá um comportamento conhecido no füturo -
mente das condições monetárias (exatamente igual ao que ocorre com o nível preferencialmente, de que ele seja altamente estável. (Friedman, 1968: 12-3)
de desemprego).
Mas isso não significa que a política monetária seja impotente; ao contrá-
rio, Friedman ressaltou sua importância na explicação da crise de 1929 e nas 16 Não se pretende discutir a validade das evidências apresentadas.
demais flutuações econômicas relevantes que se verificaram nos Estados Unidos:
17 No Capítulo 6, é exposto o funcionamento desse mecanismo para a economia brasileira.
80 REGIMES MONETÁRIOS O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 81
2. 7 Estabilidade Macroeconômica: Visão de Keynesianos Em suma, enquanto os keynesianos enfatizam que os níveis de emprego e
e de Monetaristas renda flutuam consideravelmente - e que, portanto, o gerenciamento da de-
manda agregada é necessário para estabilizá -los -, os monetaristas defendem
É importante notar que, subjacente à proposição de que a política monetá- que o equilíbrio macroeconômico é suficientemente estável a ponto de tornar
ria deva ser pautada por uma regra- e que, portanto, ela não deve ser conduzida dispensável o ativismo monetário e fiscal.
de maneira discricionária (ou ativa)-, encontra-se a hipótese de que a economia
é intrinsecamente estável.
Ou seja, a oposição monetarista ao ativismo monetário está intrinsecamente 2.8 A Teoria Quantitativa da Moeda
relacionada com a proposição de que a taxa natural de desemprego goza das pro-
O monetarismo tipo I também se caracteriza por um esforço de
priedades de unicidade e estabilidade e que, na ausência de intervenções mo-
restabelecimento, ou melhor, de restauração da teoria quantitativa da moeda,
netárias, o desemprego converge automaticamente para a taxa natural (conforme
um dos pilares da economia clássica e uma das mais antigas doutrinas eco.nô-
visto na seção 2.1).
micas, cujas origens remontam ao século XVI, sendo encontrada nas obras de
Ao se reduzir as causas das flutuações econômicas às oscilações na oferta
Jean Bodin - primeiro autor a considerar que a inflação verificada na Europa
monetária, a adoção de uma regra monetária torna-se uma proposição mera-
Ocidental, em meados dos anos 1500, tinha como causa a abundância de ouro
mente tautológica: dado que a "desordem monetárià' é considerada a principal '
decorrente do forte fluxo de metais preciosos importados das colônias espa-
causa das flutuações econômicas, basta adotar uma regra monetária para que a
nholas na América do Sul-, John Locke, Richard Cantillon e David Hume.
economia se mantenha estável. 18 Nesse sentido, pode-se dizer que Friedman
realiza um reducionismo ao considerar que os ciclos econômicos têm, como
causa principal, alterações na oferta monetária. 2.8.1 A Concepção Clássica
Em poucas palavras, os monetaristas acreditam que o setor privado é ineren-
temente estável e que, portanto, a política fiscal e, notadamente, a política monetá- Em poucas palavras, a teoria quantitativa da moeda (TQM) propõe que o
ria não devem ser conduzidas discricionariamente, de forma a não perturbar a nível geral de preços é determinado pelo estoque monetário. A TQM não se
estabilidade macroeconômica- considerada inerente ao sistema econômico. restringe, entretanto, a essa proposição.
Já os autores keynesianos postulam que o investimento privado é alta- De uma forma mais rigorosa, a teoria consiste em um conjunto de postulados
mente instável e oscila bruscamente em função de mudanças, notadamente, que se inter-relacionam: (i) o estoque monetário é proporcional ao nível de preços;
nas expectativas dos investidores (animal spirits, nas palavras de Keynes) com (ü) há uma causalidade que vai no sentido da moeda para os preços- isto é, varia-
relação ao desempenho futuro da economia, principalmente quanto ao com- ções no estoque monetário precedem e causam alterações nos preços; (iü) a moeda
portamento da demanda agregada. Desse modo, as políticas monetária e fiscal é neutra no longo prazo- ou seja, a política monetária não afeta variáveis reais de
devem ser utilizadas como instrumentos anticíclicos, com o intuito de ameni- forma permanente; (iv) a teoria monetária do nível geral de preços (ou a dicotomia
zar as intensas e recorrentes flutuações econômicas decorrentes da elevada entre preços relativos e absolutos)- segundo a qual, fatores não-monetários (es-
volatilidade do investimento privado. 19 trutura de mercado, choques reais como progresso tecnológico, ganhos de produti-
vidade etc.) podem determinar mudanças de preços relativos que se compensem
entre si, de modo que o nível geral de preços permaneçe inalterado (variando, por-
tanto, apenas em função do estoque monetário); e (v) o estoque monetário nomi-
18 Não confundir estabilidade econômica- que diz respeito aos níveis de emprego e renda
- com estabilidade de preços, que se refere a níveis reduzidos de inflação. nal é exógeno - a oferta monetária (nominal) é determinada por fatores
19 Ver, por exemplo, Minsky (1986). independentes daqueles que determinam a demanda por encaixes nominais.
82 REGIMES MONETÁRIOS O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 83
A TQM é comumente formalizada por meio das chamadas equações quan- Md= kPY (9)
titativas: (i) a equação de Fisher, originalmente formulada por Simon Newcomb
em 1885, veio a se tornar popular com a publicação de Irving Fisher (1922), Na medida em que (8) representa a oferta monetária e (9) a demanda por
The purchasing power of money; 20
e (ii) a equação de Cambridge, desenvolvida moeda, e dado que o estoque monetário é considerado exógeno, em equilíbrio
por Alfred Marshall e A. C. Pigou. obtém-se que: M = Md = M = ~ PY = kPY, donde se conclui que k = ~·A
8
minai. A inflação pode ser evitada se, e somente se, a quantidade de moeda por Da mesma maneira, a estabilidade da velocidade de circulação da moeda
unidade de produto puder ser impedida de aumentar de forma significativa. A foi tida como uma regularidade empírica: "Os teóricos da teoria quantitativa
deflação pode ser evitada se, e somente se, a quantidade de moeda por unidade de aceitam a hipótese empírica de que a demanda por moeda é altamente estável"
produto puder ser impedida de cair de forma significativa. (Friedman, 1989: 33) (Friedman, 1956: 16).
Realmente, durante as décadas de 1960 e 1970, a velocidade de circulação
A restauração da teoria quantitativa reforçou a tese a favor da adoção de urna da moeda mostrou-se altamente estável nos EUA, dando respaldo à hipótese
regra monetária. Em outras palavras, visto que no modelo monetarista a inflação é monetarista. Entretanto, a partir da década de 1980, ela apresentou um com-
um fenômeno monetário, a estabilidade de preços será alcançada se, e somente se, portamento errático, o que foi decisivo para a perda de prestígio da concepção
as variações do estoque de moeda evoluírem pari passu com a taxa de crescimento monetarista do processo inflacionário (ver Gráfico 5, na seção 3.6).
do produto real: "Inflação é sempre e em qualquer lugar um fenômeno monetário no Em suma, a essência da versão clássica da TQM- ou a concepção de que a
sentido de que ela é e somente pode ser gerada por um crescimento do estoque inflação é uni fenômeno monetário- foi incorporada pelo monetarismo tipo I.
monetário maior do que o do produto" (Friedman, 1989: 32; itálico no original). No entanto, Friedman se esforçou para apontar diferenças entre a sua concep-
Conseqüentemente, o controle inflacionário se reduz à adoção de urna política ção e a formulação original dessa teoria, ressaltando duas nuanças: (i) trata-se
monetária austera. Didaticamente, pode-se sintetizar a essência do monetarismo de uma teoria de demanda por moeda; (ii) a velocidade de circulação da moeda
tipo I por meio de um axioma e urna proposição, apresentados a seguir: é altamente estável (ver Box 9).
Para os estudos dos regimes monetários, a essência do que foi visto até
I aqui é o fato de que os fundamentos teóricos do regime de metas monetárias se
I Axioma do monetarismo tip<) I. A inflação é um fenômenpmonetárío. Ela ocorre
Ise, e somente se, o estoque mon~tário crescer a uma t.axa superior à taxa de cresci-:- encontram no monetarismo tipo I. A operacionalização e as principais caracte-
rísticas dessa estratégia de condução da política monetária são apresentadas a
mento do PIB real.
!, Proposição. A estabilidade de preços e obtida se, e somentese, a taxa de cresci-
l mento do estoque monetário for igual à taxa de crescimento do PIB reaL
seguir.
restat,eiE~cmnerltO da TQM por Friedman foi marcado por um Apesar de o regime de metas monetárias não se reduzir à mera adoção de
de distanciamento com relação à concepção clássica dessa teoria: ~ uma meta (ou uma regra) monetária, este é certamente o seu traço distintivo.
A teoria quantitativa é antes de tudo uma teoria de demanda,por moeda. Nao
Nesse sentido, o regime de metas monetárias está intrinsecamente relacionado
é uma teoria da produção, ou da renda monetária, ou do n1vel de preços {..,J
com o modelo monetarista.
Como na teoria usual da escolha do consumidor, a demanda por moe?a (ou
de qualquer outro ativo) qepende de três conjuntos de fatores: (a) a ~~~ueza A essência ou o fundamento teórico que dá suporte ao regime de metas
total a ser mantida nas várias formas -o análogo à restrição orça~entana; (b) monetárias é a concepção de Friedman de que a inflação é um fenômeno mo-
0
preço e 0 retorno dessa forma de riqueza e das formas alternativas; e netário e que, portanto, a estabilidade de preços é obtida se, e somente se, a
gosto e aspreferências dos detentores de riqueza; (Friedman, J:5~: 3) oferta monetária se expandir à mesma taxa que o produto real. Em outras pala-
Especial destaque foi dado à idéia de que a dema~~a ~or moeda nao e constante,
vras, a adoção do regime de metas monetárias supõe a aceitação da proposição
mas, sim, uma função estável de determinadasvan~vets: . . . _
um lado os adeptos da teoria quantitativa nao necessttam e geralmente nao monetarista de que o controle inflacionário pressupõe a austeridade monetá-
0
c:nsideram,que a quantidade real demandada de moeda por unida?e de produto, ria. Assim, a adoção de uma regra monetária pode ser concebida como uma
ou a velocidade de circulação da moeda, deve ser considerada num~ncamente con~ proposição derivada do axioma do rnonetarismo tipo I, ou seja, a concepção
tante ao longo do tempo; eles não consideram, por exemplo, que seJa uma ~ontradt de que a inflação é um fenômeno monetário.
ção para a estabilidade da demanda por moeda o fato de que a veloc~dade d.e Em suma, o regime de metas monetárias deriva diretamente do modelo
circulação aumenta dramaticamente durante as hiperinflações. Par<'!.que haJa estabt-
monetarista, independentemente de seu grau de rigidez. Mesmo que o nível de
lidader eles esperam que exista uma relaçãofuncional entre a quantidade dem~nda-
. "' ·. ue· ··a det.erm. h· am· aderência da política monetária às metas seja reduzido- ou que se aceitem, com
da de moeda e as . vanavets q
i.
. e que um f<.orte aum. ento n.a velo.· odade.
1 · · ;
de circulação da moeda durante as hiperinflações é inteiramente consistente ~m relativa complacência, eventuais desvios da oferta monetária com relação às me- ! i
uma relação funcional estável, como Cagan demonstrou claramente ~m' seu arttgo.
I
tas estabelecidas -, a austeridade monetária consiste no principal objetivo dos
Deoutro lado, os adeptos .da teoria quantitativa devem claramente hm1tar, e ~tar policymakers que adotam essa estratégia de condução da política monetária.
. - .. telm
preparados para especificar explicitam~nte q.uais variáveis. sao emptrtcamen . -
O regime de metas monetárias supõe três elementos básicos: (i) o anún-
portantes para incluídas na funçao. {Fnedman, J956. J6)
cio de uma meta para algum agregado monetário (notadamente, a base mone-
A OPERACIONALIZAÇÃO.DO REGIME DE METAS MONETÁRIAS tária ou os meios de pagamentos) que coordene as expectativas inflacionárias;
3. (ii) a disponibilidade de informação confiável sobre o comportamento dos agre-
0 monetarismo tipo I foi muito bem recebido tanto na academia quanto gados monetários a serem controlados; e (iii) o elevado grau de transparência
pelas autoridades monetárias. A prova disso é que, durante a segunda meta~e na condução da política monetária, o que possibilita o monitoramento e a ava-
da década de 1970, as principais economias do mundo adotaram alguma var~ liação do desempenho (accountability) da autoridade monetária por parte dos
ante do regime de metas monetárias: Estados Unidos, 6anadá, Inglaterra, Sm- agentes econômicos.
ça, Alemanha, Japão, México e Brasil, entre outros. , .
Apesar de nenhum desses países ter praticado a regra monetan~ de
3.2 Vantagens
Friedman de maneira estrita, seus Bancos Centrais certamente foram motlVa-
• 25
dos por essa abordagem monetansta. Segundo seus proponentes, o regime de metas monetárias possui as se-
guintes vantagens: (i) é facilmente compreendido pelo público, de forma a si-
25 Por exemplo, Mishkin ( 1999) ressalta diferenças entre a proposta friedmaniana e o regi- nalizar claramente os objetivos da política monetária, coordenando, assim, as
me de metas monetárias.
90 REGIMES MONETÁRIOS O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 91
expectativas inflacionárias; (ii) fornece informações sobre a condução da po- Nesse caso, pode-se garantir de antemão que o cumprimento da meta mone-
lítica monetária, conferindo maior transparência e possibilitando o monitora- tária irá assegurar a realização do objetivo final da política monetária: a estabilidade
mento e a avaliação (accountability) da condução da política monetária pelos de preços. Caso a velocidade se comporte de maneira errática ao longo do tempo, é
agentes econômicos - o que evita pressões externas para que o Banco Central impossível definir, a priori, qual volume de estoque monetário será compatível com
adote políticas inflacionárias; e (iii) o Banco Central possui elevado grau de taxas reduzidas de inflação. Como bem ressaltou McDounogh:
controle sobre os agregados monetários. Assim, os defensores desse regime se
aproximam do verticalismo (ver Apêndice 3). É importante enfatizar que as vantagens de uma meta para um agregado mone-
Ou seja, a adoção desse regime monetário proporciona uma âncora nomi- tário são totalmente dependentes da previsibilidade da relação entre a meta mo-
nal que coordena as expectativas inflacionárias dos agentes econômicos e baliza a netária e a meta para a inflação. Se flutuações na velocidade da moeda - talvez
formação de preços, contribuindo diretamente para o controle inflacionário. devido às inovações financeiras- tornam fraca essa relação, esse mecanismo não
levará à estabilidade de preços. (McDonough, 1997: 4)
3.3 I>esvantagens
Na seção 3.6, é mostrado como o baixo grau de previsibilidade do com-
Os críticos do regime de metas monetárias destacam duas desvantagens portamento da velocidade de circulação da moeda foi responsável pela derro-
associadas a essa estratégia de condução da política monetária: (i) a estabilida- cada desse regime no início da década de 1980. Na próxima seção, vê-se como a
de da velocidade de circulação da moeda é condição necessária para a sua eficá- definição do agregado a ser fixado como meta é uma decisão crucial na
cia no combate inflacionário; e (ii) o Banco Central possui reduzido grau de operacionalização desse regime, já que o Banco Central controla apenas a base
controle sobre os agregados monetários. Assim sendo, os críticos desse regime monetária, exercendo um controle imperfeito sobre os agregados monetários
se distanciam do chamado verticalismo (ver Apêndice 3). mais amplos (os meios de pagamentos, M 2 etc.).
A maior desvantagem desse regime reside no fato de seu sucesso depen-
der da estabilidade da velocidade de circulação da moeda. Se ela for instável, é
3.4 A I>efinição do Agregado Monetário a Ser Utilizado como Meta
possível que os objetivos finais da política monetária- notadamente o controle
inflacionário- não sejam alcançados, mesmo que a meta seja cumprida. Na realidade, aquilo que livremente se chama de estoque monetário pode
Caso a velocidade se altere ao longo do tempo, rompe-se a relação entre os assumir diferentes formas. Mais rigorosamente, os agregados monetários po-
agregados monetários e o nível geral de preços (e a renda nominal). Desse modo, dem ser definidos de cinco maneiras distintas. A base monetária (B ou M )
0
não é possível determinar ex ante qual o nível de oferta monetária compatível consiste na soma do papel moeda em poder do público (PMPP) com os encai-
com a estabilidade de preços. xes (reservas) totais dos bancos comerciais (ET):
Mais precisamente, não se requer que a velocidade,de circulação da moe-
da seja estável, mas, sim, previsível, de maneira que a relação entre o estoque B = PMPP + ET
monetário e o nível de preços também seja previsível. Isto é, se for possível
Aos haveres plenamente líquidos- isto é, que estão imediatamente disponí-
antecipar o comportamento futuro da velocidade de circulação da moeda du-
veis para liquidar dívidas- possuídos pelo público não-bancário, dá-se o nome
rante determinado período, a relação entre o estoque monetário e o nível geral
de meios de pagamento (MP ou M); esse agregado f obtido pela soma do papel
de preços será previsível. Dessa forma, torna -se possível definir previamente
moeda em poder do público com os depósitos à vista dos bancos comerciais (DV ):
qual volume de estoque monetário será compatível com a estabilidade de pre- ECo
ços no período em questão. M 1 = PMPP + DVBCo ';i
''
92 REGIMES MONETÁRIOS O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 93
Os meios de pagamento constituem, por definição, o agregado plenamente d = D~fo ; e (ii) a razão entre os encaixes (reservas) totais dos bancos comerciais
líquido - isto é, capaz de saldar dívidas e liquidar transações instantaneamente -
' ·
e os seus d. eposltos a' vista,
· d a d a por e = D Er
Vz • O m ultip 1icad o r monetário é
e, portanto, melhor representam o que livremente se chama de estoque de moe-
dado por: BCo
da. Mas existem conceitos mais amplos de moeda, que podem ser definidos em
ordem decrescente de liquidez. Os agregados monetários mais amplos são: 1
a=----
1-d(l-e)
M2 = M1 + Depósitos a Prazo + Títulos Públicos;
Sempre que o público (não-bancário) eleva a parcela de seus encaixes mo-
M3 = M 2 + Depósito de Poupança; e
netários mantida sob a forma de depósitos à vista, ceteris paribtf.S, há uma eleva-
M4 = M3 + Títulos Privados.
ção do coeficiente de comportamento do público ( d) e, portanto, o multiplicador
É importante notar que a definição dos agregados mais amplos do que M 1 aumenta. 26 Da mesma forma, se os bancos comerciais reduzem os seus encaixes
é arbitrária, variando de acordo com os objetivos e critérios de cada autor. Essa totais, ceteris paribus, há uma diminuição do coeficiente de comportamento
definição depende da avaliação de cada um quanto ao grau de liquidez dos dos bancos (e) e, dessa forma, o multiplicador também aumenta. Ou seja, para
componentes do respectivo agregado. um dado estoque de base monetária- determinado pelo Banco Central-, va-
Uma questão central na operacionalização do regime de metas monetárias riações no comportamento do público e dos bancos comerciais podem expan-
consiste na escolha do agregado que será utilizado como meta. Esta decisão se dá dir ou reduzir o volume de meios de pagamento.
em função de duas características: (i) a estabilidade da velocidade de circulação A autoridade monetária controla M 1 apenas parcialmente: ela determina
do agregado (mensurada por técnicas econométricas); e (ii) a capacidade de o o valor da base monetária, mas não controla (perfeitamente) o multiplicador mo-
Banco Central controlá-lo. netário. No entanto, o Banco Central pode influenciar o multiplicador mone-
O ideal é a adoção de um agregado que, ao mesmo tempo, seja diretamen- tário por meio de: (i) fixação do percentual dos depósitos à vista dos bancos
te controlado pela autoridade monetária e tenha uma velocidade de circulação comerciais que devem ser mantidos sob a forma de reservas bancárias (depósi-
altamente estável. No entanto, via de regra, há um trade-off entre o grau de tos ou encaixes compulsórios); e (ii) a determinação da taxa de redesconto-
controle por parte do Banco Central e a estabilidade da velocidade de circula- que é a taxa de juros que o Banco Central cobra nas operações de concessão de
ção do agregado: quanto maior (menor) o grau de controle do Banco Central liquidez para os bancos comerciais. Pela calibragem desses instrumentos, é pos-
sobre o agregado monetário, menor (maior) a estabilidade de sua velocidade. sível a autoridade monetária influenciar o comportamento de ambos, o públi-
É fácil entender a causa desse trade-off O Banco Central controla dire- co bancário e não-bancário, e, portanto, exercer algum impacto sobre o
tamente e de forma perfeita a base monetária (B), mas não os demais agrega- multiplicador.
dos. Os meios de pagamento são um múltiplo da base monetária, isto é: Em suma, o grau de controle do Banco Central sobre o estoque monetário
não é tão elevado quanto supõem os proponentes do regime de metas monetá-
M1 = aB, a :i? 1 rias. A autoridade monetária determina o estoque de base monetária, mas não
O multiplicador monetário, por sua vez, depende do comportamento do
público não-bancário e do público bancário. Ele pode ser expresso em função 26 O público não-bancário pode manter um determinado volume de meios de pagamento
de dois coeficientes que refletem, respectivamente, o comportamento do pú-
sob diferentes formas. Isto é, dado o estoque de MP, o ptíblico pode alterar a sua compo-
blico e o comportamento dos bancos comerciais: (i) a relação entre os depósi- sição, aumentando a parcela mantida sob a forma de moeda escritura[ (DVBco) e, conse-
tos à vista dos bancos comerciais e os meios de pagamentos, dada por qüentemente, reduzindo a parcela mantida sob a forma de moeda manual (PMPP), e
vice-versa.
94 REGIMES MONETÁRIOS
O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 95
[... ] uma regra cega e mecânica de resposta aos eventos correntes da economia e aumentava o grau de transparência e facilitava a condução da política monetá-
a seus resultados não funciona; apenas por essa razão não seria tolerada pelo ria (Mishkin, 1999).
Banco Central, governos e eleitores. Qualquer regra deve ser de reação às infor- Como destacaram Bernanke e Mishkin (1992) e Meeke Davis (1982), ne-
mações econômicas observadas. Contudo, é impossível antecipar todos os eventos nhum país perseguiu inflexivelmente suas metas monetárias, de forma que o
que podem exigir ajustamentos na política econômica e especificar antecipa- grau de rigidez de seus respectivos regimes sempre foi discutíveF 8
damente o tamanho correto e a direção das respostas para cada um desses eventos. Por outro lado, Lindseye Wallich (1989) ressaltaram que a busca por mai-
Respostas efetivas deveriam depender das melhores estimativas e julgamento dos or flexibilidade foi determinante no abandono desse regime. Assim, é
policymakers no momento de sua adoção- no sentido da discrição. Por essa ra- questionável até que ponto aqueles países praticaram uma regraflxa e, portan-
zão, eu enfatizo, como tenho dito aqui, a importância fundamental da escolha de to, em que medida a incapacidade de acomodar choques econômicos- princi-
metas e de procedimentos para a política monetária, preferencialmente ao esta- pal desvantagem associada à adoção de uma regra, conforme ressaltam os
belecimento de regras; cabe ao Banco Central encontrar, nas diversas circunstân- proponentes do discricionarismo monetário -contribuiu para a derrocada do
cias, os caminhos para perseguir os seus objetivos. (Tobin, 1998: 5) regime de metas monetárias.
A maioúa dos países que adotou o regime de metas monetárias o fez por
Apoiando Tobin, Benjamin Friedman (1988a) assinalou que a inferiori- um período de tempo relativamente curto, diferentemente da Alemanha e da
dade da regra fixa com relação à regra reativa é confirmada pela literatura eco- Suíça. De fato, esse regime monetário foi, em linhas gerais, razoavelmente bem-
nômica por ele pesquisada sobre metas e instrumentos monetários. Entretanto, sucedido no combate inflacionário até o início dos anos de 1980, notadamente
o autor chamou a atenção para o fato de que a proposição defendida por Tobin, nos Estados Unidos, Inglaterra e Canadá. A partir daí, seu desempenho mostrou-se
de que seria impossível definir uma regra de feedback, continuaria uma questão altamente insatisfatório.
aberta. Ou seja, esse autor ressaltou que permanecia em aberto a discussão acerca Mishkin ( 1999) apresentou duas possíveis interpretações para esse
das vantagens e desvantagens associadas ao discricionarismo monetário. insucesso: (i) o regime não foi conduzido com a devida seriedade e (ii) a velo-
cidade de circulação da moeda mostrou-se instável de forma a romper a rela-
ção entre as variáveis intermediárias (agregado definido como meta) e finais
3.6 Algumas Experiências
(inflação e renda nominal) da política monetária.
Dentre os países que adotaram o regime de metas monetárias, apenas a O caso norte-americano foi particularmente exemplar. A elevada instabi-
Alemanha e a Suíça foram bem-sucedidas no controle da inflação no médio e lidade da velocidade de circulação da moeda - em razão fundamentalmente
no longo prazos. Entretanto, nesses casos foi adotada, na verdade, uma estraté- das inovações financeiras-, verificada a partir de início da década de 1980, foi
27
gia híbrida que se aproximou do regime de metas de inflação (ver Capítulo 3). decisiva no abandono do regime de metas monetárias nos Estados Unidos, pelo
Ambos, os bancos centrais alemão, Bundesbank, e, suíço, Swiss National então presidente do FED, Paul Volcker. Naquele período, a estabilidade de pre-
Bank, freqüentemente não alcançavam as metas fixadas, mas consideravam o ços foi alcançada à custa da mais severa recessão norte-americana desde a crise
· seu estabelecimento como importante método de comunicação com o público dos anos de 1930. Problema igual verificou-se, à mesma época, na Inglaterra e
de uma estratégia focalizada no controle da inflação no longo prazo - o que no Canadá.
28 O próprio Tobin (1983: 509) reconheceu esse fato com relação ao caso dos Estados Unidos.
27 A esse respeito, ver Bernanke e Mishkin (1997), Laubach e Posen (1997a) e Andersen e Mishkin (1999) foi além ao ressaltar que uma das vantagens do regime de metas monetárias,
Berg (1995). com relação ao regime de metas cambiais, residia justamente em sua flexibilidade.
98 REGIMES MONETÁRIOS O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 99
Durante as décadas de 1960 e 1970, a velocidade de circulação da moeda, No início dos anos de 1980, estava se tornando muito claro que a relação entre os
nos Estados Unidos, cresceu a uma taxa notavelmente estável, situando-se, em agregados monetários, a inflação e a renda nominal tinha sido quebrada, e os três
média, próxima de 3,0% a.a. (ver Gráfico 5). Esta impressionante estabilidade, países [Estados Unidos, Inglaterra e Canadá] abandonaram formalmente as me-
que marcou o comportamento da velocidade de circulação da moeda no país, tas monetárias. Ou como a frase atribuída a John Crow, mas que efetivamente foi
durante os anos de 1970, garantiu o sucesso temporário desse regime. Durante dita por Gerald Bouey, ambos ex-presidentes do Banco do Canadá, "nós não aban-
o período, o regime de metas monetárias foi bem-sucedido no controle infla- donamos as metas monetárias, elas nos abandonaram". (Mishkin, 1999: 14)
cionário, na medida em que a velocidade de circulação da moeda se mostrou
altamente previsível. Ou seja, enquanto a velocidade de circulação cresceu a Em suma, a eficácia do regime de metas monetárias está condicionada à
uma taxa suficientemente estável, o cumprimento das metas monetárias asse- estabilidade - ou melhor, à previsibilidade - da velocidade de circulação da
gurou a consecução do objetivo final da política monetária. moeda. Esta, no entanto, não se mostrou estável o suficiente para que o regime
funcionasse de maneira satisfatória. A esse respeito, Cagan destacou que: .
> 3
"ü Ao constatar que a velocidade de circulação da moeda não é minimamen-
te estável, Phillip Cagan, um dos principais autores monetaristas, contribuiu
para abalar o prestígio da concepção de Milton Friedman de que a inflação é
um fenômeno meramente monetário. Assim, ele refutou a proposição de que a
1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1994
inflação deve ser controlada por meio de uma regra estipuladora de uma taxa
Fonte: Mayer, Duesenberry & Aliber (1996). fixa de crescimento para o estoque de moeda.
De fato, o regime de metas monetárias foi tornando-se cada vez menos po-
Gráfico 5- Velocidade de Circulação da Moeda- Estados Unidos: 1960 a 1995 pular e, em fins da década de 1980, já havia sido abandonado por praticamente
todos os países que o adotaram, mantendo-se apenas na Alemanha e na Suíça.
Tobin (1983 e 1998) também considerou a instabilidade da velocidade de
circulação da moeda como o principal motivo para a derrocada desse regime,
A partir da década de 1980, a velocidade passou a flutuar consideravel- que, no início dos anos de 1980, segundo ele, já estava condenado ao fracasso,
mente nos Estados Unidos (e também em outros países), de maneira a se rom- fazendo-se necessário, portanto, encontrar uma nova estratégia de condução
per a relação entre o estoque monetário e o nível geral de preços, tornando esse da política monetária na busca da estabilidade de pueços:
regime ineficaz no combate à inflação. Nesse sentido, as autoridades monetá-
rias não abandonaram o regime de metas monetárias, mas, sim, foram por ele Nos anos de 1970, o monetarismo conquistou corações e mentes de muitos eco-
abandonadas. Como bem afirmou Mishkin, nomistas e a maioria dos Bancos Centrais. Agora parece estar perdendo adesões e
100 REGIMES MONETÁRIOS O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 101
influências- particularmente porque foi responsabilizado pela severa depressão, da criação de inflação-surpresa por parte das autoridades monetá-
e particularmente porque as mudanças institucionais e regulatórias têm alterado rias. Em síntese:
a importância e a velocidade de circulação dos agregados monetários. Menos
metas, para um alívio quase universal [... ] É pouco provável, embora possível,
que as metas para os diferentes estoques de moeda ganhem novamente seu status
anterior. Se não for assim, que nova doutrina de controle monetário, que estratégia
para conduzir a política monetária vai substituir esse modelo? Numerosos arqui-
tetos monetários estão prontos para preencher o vácuo. (Tobin, 1983: 506)
5. A TQM consiste nos seguintes postulados: (i) o estoque monetário é
proporcional ao nível de preços; (ii) há uma causalidade que vai no sen-
4. RESUMO E CONCLUSÕES
tido da moeda para os preços; (iii) a moeda é neutra no longo prazo;_ (iv)
1. O monetarismo tipo I (ou modelo monetarista) foi o movimento teóri- a teoria monetária do nível geral de preços (ou a dicotomia entre preços
co liderado por Milton Friedman, cuja hipótese central é a da existência relativos e absolutos); e (v) o estoque monetário nominal é exógeno.
de uma taxa natural de desemprego. Esta tem as seguintes característi- 6. A TQM é comumente formalizada por meio das chamadas equações
cas: (i) comporta apenas o desemprego friccionai- que ocorre quando =
quantitativas: (i) a equação de Fisher, MsV PY; e (ii) a equação de
um trabalhador está à procura de um novo emprego - e o desemprego Cambridge, Md kPY.=
voluntário- que acontece quando uma pessoa decide não trabalhar por 7. A tese a favor da adoção de uma regra monetária é reforçada pelo
considerar o salário real insuficiente-, excluindo-se, assim, o desempre- restabelecimento da teoria quantitativa da moeda, que prevê que va-
go involuntário, que ocorre quando os agentes estão dispostos a traba- riações no estoque monetário são o fator predominante na determi-
lhar pelo salário que vigora no mercado de trabalho, mas não há postos nação do comportamento dos preços (e da renda nominal).
de trabalho disponíveis; (ii) é determinada por fatores reais; (iii) goza 8. A adoção de uma regra monetária é a principal prescrição de política
das propriedades de unicidade e estabilidade. Na ausência de interven- econômica do modelo monetarista. Friedman destaca duas razões con-
ções monetárias, o desemprego converge para a taxa natural. trárias ao ativismo monetário: (i) a redução no nível de satisfação
2. A segunda hipótese central do modelo monetarista é a de que os agen- dos agentes que sofrem de ilusão monetária; e (ii) a existência de de-
tes formam expectativas adaptativas: peI = P1-1 . fasagens na condução da política monetária. A figura a seguir ilustra
3. A combinação das hipóteses de taxa natural de desemprego e de expectati- a derivação da regra monetária.
vas adaptativas resulta na neutralidade da moeda- ou na incapacidade de
a política monetária afetar variáveis reais- no longo prazo.
4. A curva de Phillips aceleracionista é dada por: f>r =a (U N - Ut) + P{, Regra Monetária
a > O. Ela implica que, na ausência de ilusão monetária, o nível de
desemprego se iguala à taxa natural. Caso a inflação supere (fique Defasagens Neutralidade da Moeda
abaixo de) as expectativas, o nível de desemprego se reduz (se eleva)
abaixo (acima) de sua taxa natural. Dito de outra forma, o desempre-
Taxa Natural de Desemprego Expectativas Adaptativas
go corrente oscila em torno da taxa natural de desemprego; e as
flutuações econômicas resultam de erros expectacionais, decorrentes
Figura 1 - Regra Monetária e Monetarismo Tipo I
REGIMES MONETÁRIOS O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 103
a) ( ) A chamada curva de Phillips postula uma relação positiva a) ( ) Vigorando o salário real de equilíbrio, a economia estará em
entre inflação e desemprego. pleno emprego, mas, ainda assim, haverá desemprego voluntário
b) ( ) Nos modelos em que a oferta considera expectativas racio- e desemprego friccionai.
nais, apenas a parte não-esperada da moeda afetará a atividade b) ( ) Se todo o estoque de moeda é útil apenas como meio de troca,
econômica. ou seja, se não há entesouramento, então os indivíduos não pou-
c) ( ) Segundo a teoria quantitativa da moeda, sendo a velocidade parão nessa economia.
de circulação constante, haverá deflação quando a economia cres- c) ( ) Se o governo decide estabelecer um salário real superior ao
cer mais rapidamente do que a oferta de moeda. salário de equilíbrio, o desemprego aumentará p~r dois motivos:
d) ( ) Em um modelo de expectativas racionais, a curva de Phillips (i) trabalhadores serão demitidos e (ii) parte dos trabalhadores
de longo prazo é horizontal. desempregados passarão a procurar emprego.
e) ( ) Uma elevação das expectativas de inflação desloca a curva de d) ( ) Se na economia os indivíduos não poupam, vigorará a lei de
Phillips para cima e para a direita. Say, que diz que toda oferta encontra uma demanda correspondente.
8. (Anpec, 2005) Avalie a proposição: 11. (Adaptação do Provão, 1999) A principal causa da inflação e das
( ) Usando a teoria quantitativa da moeda e assumindo: primei- flutuações econômicas, segundo os monetaristas, é a( o):
ro, que a velocidade de circulação é constante e, segundo, que o a) ( ) instabilidade da demanda agregada.
PIB cresce à taxa anual de 4%, uma expansão de 3% da oferta de b) ( ) flutuação da taxa de investimento.
moeda levará a uma inflação de 1%. c) ( ) flutuação na taxa de câmbio.
9. (Anpec, 2005) Avalie as seguintes proposições sobre economia mo- d) ( ) flutuação na taxa de juros.
netária: e) ( ) crescimento monetário instável.
a) ( ) Um aumento da taxa de redesconto, tudo o mais constante, 12. (Adaptação do Provão, 1999) De acordo com Friedman, quando as
leva a uma contração de Ml. expectativas inflacionárias aumentam, a curva de Phillips:
b) ( ) Caso a base monetária não se altere, uma elevação do a) ( ) é vertical.
multiplicador bancário leva à redução de Ml. b) ( ) é horizontal.
c) ( ) Dado que a autoridade monetária pode controlar o compul- c) ( ) não varia.
sório dos bancos, ela também pode determinar o tamanho do d) ( ) desloca-se para a direita.
multiplicador bancário. e) ( ) desloca -se para a esquerda.
d) ( ) Se o Banco Central quiser aumentar a quantidade de moeda 13. (Adaptação do Provão, 2001) De acordo com a TQM e o modelo clás-
na economia, ele pode realizar operações de mercado aberto que sico, é ERRADO afirmar que:
envolvam venda de títulos públicos, ou reduzir as alíquotas do com- a) ( ) a plena flexibilidade de preços e salários nominais garante que
pulsório. o mercado de trabalho atinja o nível de pleno emprego.
e) ( ) A base monetária é, por definição, igual à reserva bancária b) ( ) a velocidade de circulação da moeda é constante no curto prazo.
mais os depósitos à vista nos bancos. c) ( ) o equilíbrio entre poupança e investimento é garantido por
'
10. (Anpec, 2005) Com base no modelo clássico (também chamado flutuações na taxa de juros.
neoclássico ), julgue as afirmativas: d) ( ) um aumento da oferta de moeda reflete-se em uma elevação
do nível geral de preços.
O REGIME DE METAS MONETÁRIAS 111
110 REGIMES MONETÁRIOS
exacerbá-las. Por exemplo, suponha que uma economia entre em re- 9. RESPOSTAS
cessão no período t. A defasagem interna implica que somente em
t + 1 as devidas medidas serão tomadas. Já a defasagem externa faz 1. Não existe gabarito disponível.
com que os efeitos das medidas adotadas só ocorram em t + 2. No 2. Não existe gabarito disponível.
entanto, é possível que em t + 2 a economia já esteja em fase de recu- 3. a) F b)V c) V
peração, de forma que as medidas de· expansão monetária acabem 4. a) F b)F c) V
por gerar um superaquecimento. 5. a) V b) F c) F d)V
22. ( ) A tese monetarista foi muito bem recebida tanto na academia 6. v
quanto pelos policymakers: a partir da segunda metade da década de 7. a) F b) F c) V d) F e) V
1970, uma série de países adotou alguma variante do regime de metas 8. F
monetárias, como, por exemplo, Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, 9. a) V b)F c) F d) F e) F
Suíça, Alemanha, Japão, México e Brasil. 10. a) V b) F c) V d) F
23. ( ) A eficácia do regime de metas monetárias depende da estabilida- 11. e
de da velocidade de circulação da moeda. Se ela for instável, é possível 12. d
que os objetivos finais da política monetária- notadamente a taxa de 13. e
inflação - não sejam alcançados, mesmo que a meta seja cumprida. 14. b
24. ( ) Friedman restabelece dois elementos fundamentais do modelo clás- 15. v
sico: (i) a taxa natural de desemprego- que comporta o desemprego 16. F
voluntário e friccionai e representa um paralelo com o conceito 17. v
wickselliano de taxa natural de juros; e (ii) a teoria quantitativa da moe- 18. v
da (TQM): MV = PY. Na medida em que a velocidade de circulação da 19. F
moeda (V) é considerada constante e a renda real está fixa no nível de 20. v
pleno emprego, Friedman afirma que a inflação é um fenômeno mo- 21. v
netário. 22. v
25. ( ) A estabilidade da velocidade de circulação da moeda é condição 23. v
necessária para que o regime de metas monetárias seja eficaz no con- 24. F
trole inflacionário. O fato de a velocidade de circulação da moeda ter- 25. F
se elevado drasticamente determinou o fracasso desse regime em 1994. 26. F
Isso pode ser explicado pelo fato de a interrupção do processo infla-
cionário verificada no período ter gerado uma remonetização de gran-
de magnitude.
26. ( ) Friedman se aproxima de Keynes ao propor o uso discricionário
da política monetária.
APÊNDICE 1 -A REVOLUÇÃO KEYNESIANA 115
APÊNDICE 1 mas, sim, nos próximos dez anos - com relação à forma como o mundo encara
os problemas econômicos. (CW, v. 13, p. 492)
A REVOLUÇÃO KEYNESIANA, A SÍNTESE Em linhas gerais, a revolução keynesiana consistiu na negação dos três princi-
NEOCLÁSSICA E A CONTRA-REVOLUÇÃO pais elementos constitutivos, ou melhor, axiomas do modelo clássico, quais sejam:
1) a existência de uma função de oferta de trabalho positivamente inclina-
MONETARISTA da, representando a proposição de que o salário real é igual à desutilidade
marginal do trabalho, e que esta é crescente em relação ao nível de em-
"[... ] Keynes criou um sistema teórico logicamente diferente,
prego- ou o segundo postulado da escola clássica, conf~rme denomina-
um sistema que reflete de modo correto as características do
ção de Keynes. Assim, foi contestada a essência de A teoria do desemprego,
mundo econômico real, aquelas de Wall Street e da sala
publicada em 1933, por Arthur Cecil Pigou, professor da Universidade
da diretoria das empresas, mais do que aquelas do mundo
de Cambridge e um dos principais representantes da escola clássica.
de Robinson Crusoé ou da feira medieval."
Segundo essa teoria, o nível de emprego é determinado pela interação
Paul Davidson entre a curva de oferta de trabalho e a curva de demanda- derivada do
chamado primeiro postulado da escola clássica, de acordo com o qual o
salário real é igual ao produto marginal do trabalho. Em vista da flexibi-
1. A REVOLUÇÃO KEYNESIANA
lidade dos salários e do perfeito funcionamento do mercado de traba-
A publicação, no ano de 1936, da Teoria geral do emprego do juro e da lho, o ponto de equilibrio corresponde a uma situação em que, no nível
moeda, principal obra de J. M. Keynes, configurou uma revolução contra a esco- dado de salário real, as pessqas que estão desempregadas o estão porque
1
la clássica, que até então representava o mainstream do pensamento ma- querem. Vale afirmar, elas têm uma desutilidade marginal maior que o
2
croeconômico. A esse respeito, em carta escrita a George Bernard Shaw em salário real de equilíbrio, não estando, portanto, dispostas a trabalhar.
1935, Keynes confessou: Dito de outra forma, há apenas o chamado desemprego voluntário;
2) a lei de Say, ou o princípio de que toda oferta cria sua própria procura.
Eu acredito sinceramente estar escrevendo um livro sobre teoria macroeconômica Essa lei postula que toda produção realizada em um determinado pe-
que será muito revolucionário - não suponho que isso ocorrerá imediatamente, ríodo será necessariamente demandada nesse mesmo período. Assim,
a renda monetária gerada no processo produtivo (dada pela soma das
remunerações dos fatores produtivos, salário+ lucros) será integral-
1 Keynes usa essa definição - atribuindo o seu primeiro emprego a Marx-- para designar mente gasta no consumo de bens e serviços, de tal forma que não há
um conjunto de autores cujas obras formam um corpo teórico homogêneo. Dentre eles, a possibilidade de ocorrer um excesso de produção (ou de renda cria-
destacam-se David Ricardo, James Mill e seus predecessores, além de John Stwart Mill,
da) em relação à demanda (ou despesas realizadas) em um determi-
Alfred Marshall e o Professor Pigou.
2 O papel da obra de Keynes na evolução do pensamento econômico se encaixa no con-
nado período.
ceito de revolução científica de Thomas Kuhn: " [ ... ] consideramos revoluções científicas A transformação da lei de Say em um axioma fundamental da teoria clás-
aqueles episódios de desenvolvimento não-cumulativo, nos quais um paradigma mais sica foi realizada, notadamente, por David Ricardo. É importante ressaltar que
antigo é total ou parcialmente substituído por um novo, incompatível com o anterior" a lei de Say está intrinsecamente relacionada com a proposição de que a moeda
(Kuhn, 1994: 179).A esse respeito, ver Barrere (1961: Caps. 1 e 2), Klein (1952) e Davidson desempenha, tão-somente, a função de meio de troca. Ou seja, a proposição de
(2003a).
116 REGIMES MONETÁRIOS APÊNDICE 1 -A REVOLUÇÃO KEYNESIANA 117
Say- segundo a qual a produção de um bem (em si mesma) gera uma demanda Box 1 A Crítica de Miglioli à Lei de Say
de valor idêntico ao do bem produzido - deriva de sua concepção de que a e
Jorge Miglioli bem ressaltou que.a proposição de que a móeda é perécívél funda:.:
mental p~ra a lefde Say:
moeda é algo perecível- e que, portanto, não desempenha a função de reserva
. .. ..· • .. .· .·. · .. /·
de valor. Em seu Tratado de economia política, publicado em 1803, Say assim Na formulê!ção da "lei de Say~ entretanto - seja para q prOprip Sa.y; s~jap~~a
enunciou a sua lei dos mercados: Ricardo -', o dinheiro é visto não apenas como constituindq somente tltn .meio
de troca, mas também como sendogasto imeqiatamente.lsto s~ .explíc;i(parêl
Say,pelo fato de o dinheiro ser perecível (desvalorizar-se) e,porta11toí op~oputor
É bom observar que um produto acabado oferece, a partir desse instante, um
não desejar conservá-lo em suas mãos. {Miglíoli, 1982:.22) ·
mercado para outros produtos equivalente a todo o montante de seu valor. Com de
Na medida em que a moeda não desempenha a função de reserva valor, consti-
efeito, quando o último produtor acabou um produto, seu maior desejo é vendê- tuindo-se tão.,somente em meio de troca, inexiste a possibilidade de haver ente-
lo para que o valor desse produto não fique ocioso em suas mãos. Por outro lado, soutamento:
ele tem igual pressa em desfazer-se do dinheiro que sua venda lhe propicia, para [...] se conclui que inexiste eritesouramento de dinheiro. Nenhtlm indivídyp, iJO
que o valor do dinheiro tampouco fique ocioso. Ora, não é possível desfazer-se auferir. uma renda, deixa de usá-la ínteiramente. Uma partedelaé empre~ada
parao consumo pessoal, a parte restante é poupada (não consumida), 111as
de seu dínheiro, senão procurando comprar um produto qualquer. Vê-se, portanto,
essa poupança não significa entesouramento, isto é, não significa que o indiVÍ-'
que só o fato da criação de um produto abre, a partir desse mesmo instante, um
duo a mantenha sem utilização. Ou ele a emprega diretamente para acumulâr
mercado para outros produtos. (Say, 1983: 139) capital ou empresta-a para outrem (em ambos os casos,auferindo 41llrendí,.,
mento); e se uma pessoa a toma emprestado é porque pretende dela fazer Uso.
3) a neutralidade da moeda ou a dicotomia entre os setores real e monetá- Portanto, o poder de compra gerado por uma determinada produção é sempre
rio da economia- ou a proporcionalidade entre o estoque monetário e o preservado·~ daí termos dito anteriormente que a "lei deSaY'pode tambéfl1.~er
denominada de "lei de preservação do poder de compra";[...] o poder de compra
nível geral de preços -prevista pela teoria quantitativa da moeda.
só podesér criado pela pro~uçãM~, assim, seu valor nãopodeserslip~ribr ao
Ao negar os três axiomas fundamentais da escola clássica, Keynes revolucio- valor da produção; agora, depois de criado, o poder de compra tambérn não
nou a história do pensamento econômico propondo, respectivamente: pode ser diminuído. Ele poderiaseueduzido se alguérn deixasse de gastar o
1) que a determinação do nível de emprego se dá de acordo com o prin- dinheiro auferido no processo de produção. Mas isso - segundo .os adeptos
cípio da demanda efetiva, não pela interação entre a oferta e a de- da "Lei de Say" - não acontece. Um indivíduo gasta seu dinheiro na compra de
manda por trabalho; um ou de outrq bem e, se não gastar, outro o faz por ele, recebendp o dinheiro
por empréstimo. (Miglioli, 1982: 26)
2) a possibilidade de ocorrer equilíbrio macroeconômico com desem-
Em suma, Say não foi capaz de perceber uma distinção fundamental existente entre
prego involuntário. Ou, visto por outro ângulo, a insuficiência de de- o ato de criação de poder de compra potencial - gerado pelo processo de produ-
manda efetiva pode determinar a ocorrência de crises de ção de mercadorias"- e a sua efetivação. Isto é, em determinado período de tempo,
superprodução, como a Grande Depressão dos anos de 1930; e o processo produtivo gera, necessariamente, um volume de renda pofencigl q.ue,
3) a moeda não é neutra, ou seja, a política monetária é capaz de exercer não nec:essariamente, irá se transformar integralmente em demanda para.ps f:>ens
produzidos, conforme postula a lei de Say. Dito de outra forma, nem ~odarençla
impacto sobre as variáveis reais da economia (como os níveis de em-
criada em um déterminado período obrigatoriamente se transforma em consumo
prego e renda). A esse respeito, Keynes afirmou que:
nesse mesmo perídtl6. A respeito, Miglioli foi altamente didático:
Não resta dúvida deque um produtor, ao críar uma determinada gui'Jntidade
I [... ] não existe uma única posição de equilíbrio de longo período igualmente válida
1
! sem se considerar a política da autoridade monetária. Ao contrário, existem várias
de bens ouserviços, está automaticamente crianCio para si mesmo um poten-
cial poder de compra de mesmo valor. Ou seja; a venda de seus prqdutos lhe
fornecce um m'onj:ante de dinheiro igual ao valor daquela venda. Mas.isso n~~
Il
l
posições correspondentes a diferentes políticas [monetárias]. (CW, v. 29, p. 55)
118 REGIMES MONETÁRIOS
APÊNDICE 1 -A REVOLUÇÃO KEYNESIANA 119
é ~uficiente para cfemon~trar que e~se poder de compra seráefetiVàmente usa- ciência de demanda. Assim, se tudo que é produzido é vendido, a produção
do. Se não for, Isso significa que urnsegundo prgdutor e~tará deix~ndo de pode expandir-se continuamente, até que todos os fatores de produção sejam
vender rJ1ercadorias para o primeiro; e, portànto, ap.rodu~ãodeste não terá
empregados. A economia tende, naturalmente, ao pleno emprego dos fatores de
criado efetivamentesua respectiva dem;3nda. :;\~sim, para que a. demanda efeti~
produção, que constitui o único limite à expansão da oferta. 3
o.
va seja igual à· produção1. é. preciso que podefde .com~r<'l. gerndo por esta
última seja realmente utilizado, o queporsuavezreqoer gutras c()ndições: A dura realidade dos anos de 1930 chocou-se frontalmente com os confor-
uma demanda pgtencial (ou necessidade~) il.imítada e a inexistência de tantes resultados previstos pela teoria clássica. Havia um claro e profundo
entesouramento. (Mígliolí, 1982: 22) descompasso entre o mundo real e a teoria, o que colocou a ciência econômica
em um dos momentos mais críticos de sua história. Nas palavras de Keynes:
Em resumo, a essência do modelo clássico pode ser expressa em duas pro- Os teóricos da escola clássica são comparáveis aos geômetras euclidianos em um
posições que se inter-relacionam: (i) a inexistência de desemprego involuntá- mundo não-euclidiano [ ... ] Sendo esta a realidade, não há, de fato, nenhuma
rio; e (ii) a impossibilidade de ocorrer uma crise geral de superprodução. A outra solução a não ser rejeitar o axioma das paralelas e elaborar uma geometria
crença dos autores clássicos na impossibilidade de uma crise de superprodução não-euclidiana. A ciência econômica reclama hoje uma medida desse gênero.
pode ser verificada na seguinte passagem de Princípios de economia politica e Precisamos nos desembaraçar do segundo postulado da doutrina clássica e ela-
tributação, principal obra de David Ricardo, publicada em 1817: borar um sistema econômico em que o desemprego involuntário seja possível no
seu sentido mais estrito. (Keynes, 1983: 24)
Ninguém produz a não ser .para consumir ou vender, e jamais se efetua uma
venda a não ser com a intenção de comprar qualquer outra mercadoria que pos- Como era possível, em um mundo teoricamente regido pela lei de Say e
sa ser imediatamente utilizada ou possa contribuir para a produção futura. Pro- conduzido pela mão invisível para o pleno emprego dos fatores de produção,
duzindo, portanto, um indivíduo torna-se consumidor de seus próprios produtos verificar tão intensa retração do PIB, como registrado por praticamente todas
ou comprador e consumidor dos produtos de outros[ ... ] Os produtos são sem- as economias do mundo durante a mais grave e profunda de todas as crises
pre comprados com outros produtos ou com serviços. O dinheiro é apenas o econômicas da história do capitalismo, conhecida como a Grande Depressão?
meio pelo qual se efetua a troca. Determinada mercadoria pode ser produzida Como poderia, em um mundo em que deveriahaver apenas desemprego vo-
em excesso e pode haver uma superabundância dela no mercado que não chegue luntário, a taxa de desemprego alcançar 25% da força de trabalho, como verifi-
a remunerar o capital nela aplicado. Mas isso não pode acontecer com todas as cado nos Estados Unidos, em 1933? A esse respeito, Keynes afirmou:
mercadorias. (Ricardo, 1983: 198)
[... ] o argumento de que o desemprego que caracteriza um período de recessão se
Os clássicos negavam a possibilidade de haver desequilíbrios duradouros, deva à recusa da mão-de-obra em aceitar uma diminuição dos salários nominais não
na medida em que os mecanismos de mercado - ou a famosa mão invisível de está claramente respaldado pelos fatos. Não é muito plausível afirmar que o
Adam Smith- supostamente operam de maneira rápida e eficiente para garan- desemprego nos Estados Unidos eni 1932 tenha resultado de uma resistência do
tir pleno emprego dos fatores de produção, de forma que a intervenção gover- trabalhador em aceitar uma diminuição nos salários nominais, ou de uma insistência
namental não é necessária nem desejável. Ou seja, tudo que é produzido é
vendido, a um preço livremente estabelecido pela interação entre a oferta e a
3
procura. O chamado preço de mercado é de equilíbrio, no sentido de que igua- Trevithick (1992) faz uma distinção entre duas versões da lei de Say. A versão fraca dessa
la a quantidade ofertada à quantidade procurada: inexistem excesso ou insufi- lei não implica que o pleno emprego dos fatores de produção será alcançado. Já a versão
forte é aquela aqui utilizada.
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obstinada em conseguir um salário real superior ao que permitia produtividade do desemprego e da recessão, a elaboração de uma teoria capaz de dar conta dos
sistema econômico [ ... ] Esses fatos emanados da experiência constituem, prima facie, fatos e, notadamente, de propor medidas de política econômica que evitassem
0 motivo para pôr em dúvida a adequação da análise clássica. (Keynes, 1983: 20) a derrocada do capitalismo tornava-se um imperativo.
Foi então que Keynes revolucionou a história do pensamento econômico,
A Tabela 1 mostra a gravidade da crise em função da sua intensidade e da notadamente, ao formular um modelo em que o equilíbrio macroeconômico
sua ampla difusão por praticamente todas as principais economias do mundo. era compatível com o desemprego involuntário e que, portanto, previa a possi-
Por exemplo, a produção industrial dos Estados Unidos caiu 45%, e o seu PIB bilidade de ocorrer uma crise geral de superprodução. Assim, Keynes promo-
apresentou uma retração de nada menos que 28%, entre os anos de 1929 e 1932. veu a reconciliação entre a realidade e a teoria econômica.
IMalthus deuoprimeiropas;o necessárioparase consíderarqueamoeda não:é 1 pelos clássicos - entre a vasta maioria dos economistas e policymakers, de-
um meio de troca (como irnplícit~ na. lei deSay), desempenh~ndo, tam-
Imeramente
1bém, a função de reserva de valor, Na méd1da em que a moeda ·funCiona corno
nominado síntese neoclássica por Paul Samuelson: 4
I reserva de valor, existe a possibilidade dehave: entesouran:ento.. Neste caso, :nem Nos anos recentes, 90% dos economistas norte-americanos deixaram de ser "eco-
tudo oque é poupado se transforma, necessariamente, ernmvestlmento, surgmdo
I a possibilidade de ocorrer insuficiência de demanda efetiva. Ou seja, have.ndo nomistas keynesianos" ou "economistas antikeynesianos': Em vez disso, eles pas-
saram a trabalhar na formulação de uma síntese daquilo que tivesse valor tanto
entesoura.ment. o, .pare.e. la. do pod.er de. compr·a· poten.dal. (ge.rad·o. no p.ro.cesso de
Iprodução) não se transformará em demanda. Dito de outra forma, nem toda renda
criada em um determinado período se transforma em consumo nesse.mesmo pe-
na ciência econômica mais antiga quanto na teoria moderna de determinação da
I
1 ríodo, criando-se uma insuficiência de demanda efetíva e, portanto, a possibilidade
renda. O resultado dessa síntese poderia ser chamado de teoria econômica neo-
clássica, e ele é aceito, em suas linhas gerais, por todos os economistas, exceto os
I de ocorrer uma crise de superprodução. Nas suas palavras: 5% de autores da extrema esquerda. (Samuelson, 1955: 11)
1 A poupança nacional, LJ considerad(l como forma de expandir a pro.d~ção,
1 está confinada a limites muito. mais estreitos do que a poupança mdMdual.
i Enquanto alguns incl.ívíduos .continuam a gastar, outros podem contínuar a Os principais autores da síntese - também conhecidos como velhos-
keynesianos- foram: Jonh Hicks 5 (laureado com o Prêmio Nobel em 1972),
I
1
poupar muito; mas a poupança nacional, com relação à massa de produtores
e consumidores, será, necessariamente, limitada pelo montante que. pode ser James Tobin (laureado com o Prêmio Nobel em 1981), Paul Samuelson (laure-
I empregado de forma vantajosa na produção de bens; e para criar a demanda ado com o Prêmio Nobel em 1970), e Lawrence Klein (laureado com 0 Prêmio
por esses bens, deve haver um. nível de consumo efetivo que seja adequado Nobel em 1980).
entre ambos, os própl'íos produtores eosconsumidores. (Malthus, ApudSpiegelr
1991: 296J Este movimento teórico foi marcado por um esforço de conciliação, ou
melhor, de mediação entre os dois pólos das duas principais escolas de pensa-
mento macroeconômico: (i) a clássica; e (ii) a keynesiana. Nesse sentido, a ex-
Em suma, o grande sucesso da obra de Keynes reside no fato de que a
pressão síntese neoclássica pós-keynesiana, utilizada por Tobin (1980), é mais
teoria econômica vigente não era capaz de explicar- e, portanto, muito menos apropriada.
capaz de reverter- a triste realidade que se impunha de maneira avassaladora
A crença na eficiência dos mecanismos de mercado no restabelecimento
por todo o mundo capitalista:
do pleno emprego foi substituída- fundamentalmente pela postulação da exis-
tência de rigidez no salário nominal- pelo reconhecimento da necessidade do
A época em que o livro [A Teoria geraL..] foi lançado foi certamente uma das
gerenciamento da demanda agregada, notadamente por meio da gestão discri-
razões do seu sucesso. A Grande Depressão não foi apenas uma catástrofe econô-
cionária da política fiscal- daí a origem do termo fiscalismo keynesiano associado
mica, mas também um fracasso intelectual [... ] Poucos economistas tinham uma à síntese.
explicação coerente para a Depressão, tanto sobre a sua profundidade quanto
sobre a sua duração[ ... ] A Teoria geral ofereceu uma interpretação para os even-
tos, um modelo lógico e uma razão clara para a intervenção do governo na eco-
nomia. (Blanchard, 1997: 610) 4
Para maiores detalhes, ver Togati (1998).
5
Hicks (1937) é autor da obra que deu origem a esse movimento, intitulada "Mr. Keynes
2. A SÍNTESE NEOCLÁSSICA and the 'Classics': a suggested interpretation': Nela, realiza-s'e uma interpretação da Teoria
geral, que, junto à contribuição de Alvin Hansen (1949), deu origem ao modelo que se
No início dos anos de 1950, formou-se uma espécie de consenso- contrá- popularizou como IS-LM, e faz parte de qualquer manual de macroeconomia contem-
rio à convicção sobre a estabilidade do equilíbrio macroeconômico, postulada porânea.
124 REGIMES MONETÁRIOS APÊNDICE 1 -A REVOLUÇÃO KEYNESIANA 125
A confiança na capacidade da realização de uma espécie de sintonia fina Assim, Friedman instaurou uma contra-revolução na história do pen-
no gerenciamento da demanda agregada por meio da calibragem dos instru- samento macroeconômico que, em linhas gerais, resgatou os pilares da escola
mentos de política fiscal (ou em seu potencial anticíclico) marcou aquilo que clássica: (i) a idéia de pleno emprego é substituída pelo conceito de taxa natural
ficou conhecido como a era de ouro da Macroeconomia, quando os mais oti- de desemprego; e (ii) ainda que se admita que a moeda possa exercer impactos
mistas vislumbraram o fim das flutuações econômicas: "Uma época em que a sobre variáveis reais no curto prazo, é mantida a proposição de que ela é neutra
economia poderá ser controlada por uma sintonia fina e todas as recessões eli- no longo prazo.
minadas não se encontra em um futuro muito distante" (Blanchard, 1997: 613). Nesse sentido, resgatou-se a essência da escola clássica, até então forte-
Então, pode-se dizer que a síntese neoclássica caminhava pari passu com a mente contestada pela revolução keynesiana: ''As raízes do monetarismo se en-
convicção acerca da existência de um trade-off estável entre inflação e desem- contram na teoria quantitativa da moeda, que formou a base da teoria monetária
prego, proposto pela curva de Phillips (original e, notadamente, a versão de clássica desde pelo menos o século XVIII" (Cagan, 1989: 196).
Samuelson-Solow). Isto é, uma fase de desaquecimento econômico- ou uma
situação de elevado desemprego - poderia ser revertida por meio de medidas
de estímulo à demanda agregada - ou por uma elevação da inflação. Assim, a
curva de Phillips foi rapidamente incorporada pelos adeptos da síntese neo-
clássica, como uma extensão do modelo keynesiano:
3. A CONTRA~REVOLUÇÃO MONETARISTA
APÊNDICE 2
15 13
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V1 o 3 99 •• 89 .,2
A HISTÓRIA DA CURVA DE PHILLIPS o c
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2 4 5 6 7 8 9 10
Desemprego (%)
Três anos antes da publicação do artigo de Phillips, Brown, em sua obra 6,-~---------------------.
The great inflation 1939-1951, apresentou três diagramas em que a taxa de in-
flação salarial anual é plotada contra a taxa de desemprego, utilizando, respec- Inflação Máxima Tolerável
tivamente, dados referentes ao Reino Unido, relativos ao período de 1881 a
1914 e aos anos de 1920 a 1951, e. dados referentes aos Estados Unidos, durante
o período de 1921 a 1948.
Deflação Máxima Tolerável
O Gráfico 1 a seguir, obtido a partir de dados verificados no Reino Unido -4
entre os anos de 1881 e 1914, indica a existência de uma relação negativa entre
Desemprego(%)
a variação percentual do salário (com relação ao ano anterior) e o nível de Fonte: Sultan (1957).
desemprego (percentual).
Gráfico 2 - Curva Hipotética de Sultan
128 REGIMES MONETÁRIOS APÊNDICE 2- A HISTÓRIA DA CURVA DE PHILLIPS 129
~
"'><
Como registrado anteriormente, os fundamentos teóricos, econométricos e 1,5
1
empíricos da curva de Phillips já haviam sido integralmente estabelecidos em
0,5
meados da década de 1950, muitos anos antes da própria contribuição de Phillips.
3,5 4,0 4,5 5,0 5,5 6,0 6,5 7,0
No entanto, faltava que alguém apresentasse uma relação do tipo de Phillips, hm-
Taxa de Desemprego(%)
damentada em técnicas estatísticas e desenhasse a familiar curva convexa negati-
vamente inclinada que representa o trade-off que leva o seu nome. O crédito por
Fonte: Dornbusch & Fischer (1996).
ser o primeiro a realizar estas tarefas não é do próprio Phillips, mas, sim, de dois
economistas, A. J. Brown e Paul Sultan. (Humphrey, 1985: 96)
Gráfico 3 - Relação entre Inflação e Desemprego- Estados Unidos: Década de 1960
(evidência a favor da existência de um trade-off entre inflação e desemprego)
Em resumo, a curva de Phillips consistiu, portanto, em um simples exercí-
cio econométrico, que se tornou notório por ter sido pioneiro em apresentar,
de maneira mais formalizada, uma especificação estatística de uma relação já
amplamente estabelecida. Para isso, foi utilizado o método de mínimos qua- Não se pode dizer o mesmo, entretanto, com relação à economia norte-
drados para estimar os coeficientes de um modelo do tipo log-logrepresentado americana durante a década de 1970, que não mais apresentava evidência favo-
pela forma funcionallog(y + a) =1ogb + clogx, obtendo-se o seguinte resulta- rável à existência de um trade-off estável entre inflação e desemprego. A esse
do: log(y + 0,900) = 0,984- 1,394logx, sendo y a taxa de variação dos salários e respeito, Friedman observou que:
x, o desemprego percentual. 1
Estimativas empíricas da curva de Phillips foram insatisfatórias. E, o que é mais
importante, a taxa de inflação, que parecia ser consistente com um determinado
4. A EVIDÊNCIA EMPÍRICA NORTE~AMERICANA: AUGE E
nível de desemprego, não permanecia fixa: nas circunstâncias do período pós-
DECLÍNIO DA CURVA DE PHILLIPS
Segunda Guerra Mundial, quando os governos de todos os países procuravam
promover o "pleno emprego", a taxa de inflação tendia a aumentar com o decor-
A mesma regularidade apontada por Phillips entre os anos de 1861 e 1913
rer do tempo em todos os países e a variar significativamente entre estes. Obser-
também se verificou, em linhas gerais, no período entre os anos de 1948 e 1957
vando-se de outra maneira, as taxas de inflação, que haviam sido anteriormente
no Reino Unido. Da mesma forma, a economia norte-americana, durante a
associadas a baixos níveis de desemprego, ocorreram com altos níveis de desem-
década de 1960, apresentou evidência empírica favorável à existência de um
prego. O fenômeno da alta inflação e alto desemprego simultâneo chamou cada
trade-offestável entre inflação e desemprego (conforme o Gráfico 3).
vez mais a atenção do público e dos economistas, recebendo o desagradável rótu-
lo de stagf/.ação. (Friedman, 1985: 426)
1 Para maiores detalhes sobre a história da curva de Phillips, ver Humphrey (1982, 1985 e O Gráfico 4 ilustra a elevada instabilidade da curva de Phillips verificada
1986). nos Estados Unidos, entre as décadas de 1970 e 1990.
130 REGIMES MONETÁRIOS APÊNDICE 2- A HI.STÓRIA DA CURVA DE PHILLIPS 131
14 1980 13,0
12
~ 10,0
o
~ 10
'"'""
o
'"'"" "'
<=
_f: 7,0
"'
<=
_f: "'
-o
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-o 1982
"'
X
~
4,0
"'X
~ 4
1,0
2 0,0 2,0 4,0 6,0 8,0 10,0 12,0
o Taxa de Desemprego(%)
4 10
Tal fato foi apontado por Friedman como evidência favorável à proposi-
ção de que a curva de Phillips de curto prazo se desloca em função de variações
na expectativa de inflação. Isto é, na medida em que a taxa de inflação aumen-
tou nos anos de 1960- e alinhada com a hipótese de que os agentes formam
expectativas adaptativas-, a expectativa de inflação elevou-se deslocando, as-
sim, a curva de Phillips de curto prazo para cima, conforme previsto pela curva
de Phillips versão de Friedman-Phelps.
O Gráfico 5 ilustra a interpretação monetarista de que existe uma família
de curvas de Phillips de curto prazo para cada nível de expectativa de inflação e
que elevações dessa variável deslocam a curva para cima (conforme a equação
(4) do Capítulo 2).
A crença na existência de um trade-offestável entre inflação e desemprego
foi fortemente abalada pelo até então desconhecido- e teoricamente negado -
fenômeno da estagflação: situação caracterizada pela combinação de estagna-
ção econômica com inflação. Ou seja, não era mais possível reduzir o desem-
prego simplesmente por meio de uma elevação da taxa de inflação. A partir daí,
não havia mais um menu oferecendo combinações alternativas de inflação e
taxa de desemprego: os policymakers deixaram de ter à sua disposição uma
cartilha que pudessem seguir para dosar os níveis de inflação e desemprego.
APÊNDICE 3- VERTICALISMO VERSUS HORIZONTALISMO 133
APÊNDICE 3 Por outro lado, Mo ore batizou de horizontalismo a visão de Nicho las Kaldor
(1982)- por ele compartilhada- de que o estoque monetário é essencialmente
endógeno, sendo determinado pela demanda por liquidez (reservas bancárias)
VERTICALISMO VERSUS HORIZONTALISMO dos bancos comerciais. Vale dizer, a oferta monetária é perfeitamente elástica e a
função de oferta monetária é representada graficamente por uma reta horizontal,
''A moeda é um véu, mas quando ele se agita a economia palpita." fixada no nível de taxa de juros definido pela autoridade monetária.
Nesse caso, em vez de o Banco Central fixar o estoque monetário- e dei-
J. G. Gurley (a propósito da teoria monetária de Friedman)
xar que a demanda por moeda determine a taxa de juros, como no caso ante-
rior-, ele estabelece um valor paraa taxa de juros (() e atende plenamente à
É importante notar que, subjacente à adoção do regime de metas mone-
demanda por moeda, expandindo ou contraindo a oferta monetária, perden-
tárias, está a proposição de que a oferta monetária é exógena e determinada
do, dessa forma, o controle sobre o estoque de moeda. Por exemplo, uma.ex-
pelo Banco Central. Isso significa que (no curto prazo) a função de oferta mone-
pansão da demanda por moeda (representada por um deslocamento dessa curva
tária ( SM) é perfeitamente inelástica à taxa de juros, representada graficamente
de JY10 para if) força o Banco Central a expandir a oferta monetária de M 0
no plano estoque monetário (M) versus taxa de juros (i) por uma reta vertical,
para M 1, mantendo-se a taxa de juros constante (ver Gráfico 2).
fixada no volume de moeda determinado pela autoridade monetária (M*). Esse
fato está na origem do termo verticalismo, cunhado por Basil Moore (1988)
para se referir a essa concepção da oferta monetária.
Nesse caso, o Banco Central determina um valor para o estoque de moeda
e deixa que a taxa de juros seja determinada pela demanda por liquidez (reser-
vas bancárias) dos bancos comerciais. Por exemplo, uma expansão da demanda
i*
por moeda (representada por um deslocamento dessa curva de JY10 para IJM)
determina uma elevação da taxa juros de i0 para i1, mantendo-se o estoque
monetário constante (ver Gráfico 1).
SM
M, M, M
DE INFLAÇÃO E A INDEPENDÊNCIA
DO BANCO CENTRAL 1. INTRODUÇÃO