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Conjuração Baiana

Salvador, 1798

No início do ano, na cidade de Salvador, a forca, onde eram lidos os decretos


da coroa e seu símbolo máximo de poder, amanheceu queimada. O ato era
símbolo da revolta que estava por vir.

Nos meses que se seguiram, uma imensidão de panfletos inundaram a cidade


de Salvador. Seu significado político era notável, pois fizeram transitar opiniões,
notícias e ideias que até então só podiam ser transmitidas por canais
clandestinos.
Panfletagem

O conjunto de panfletos que sobreviveram aponta uma novidade: por seu


intermédio, colonos articulavam as ideias de República e Democracia,
organizando, pela primeira vez, o repertório político de baixo para cima.

Os panfletos baianos foram escritos por diferentes tipos de pessoas das mais
numerosas classes sociais: negros que exerciam ofício mecânico e que traziam
na cor um empecílio a mais para dificultar sua possibilidade de ascenção social.
Artesãos, soldados, todos que quisessem poderiam produzir um panfleto.
Possuíam um caráter extremamente democrático.
Panfletagem

O alvo era o “povo” da Bahia, designado, prioritariamente, como a população


pobre. Apresentar o povo como agente da mudança em plena América
Portuguesa era de uma ousadia tremenda. Indicava, antes de mais nada, a forte
influência que os conjuras baianos receberam das “francesias” – nome como
eram chamados pelas autoridades imperiais os princípios de liberdade originados
na Revolução Francesa.
Estética revolucionária

Adornos e vestuários eram sinais capazes de fixar uma identidade. A presença do


búzio, ligado à religião de matriz africana, como candomblé, sugeria ser étnica, religiosa
e política. Os conjuras baianos não queriam permanecer anônimos na cena pública: ao
contrário, estavam admitindo abertamente que eram distinguíveis e identificáveis pelo
uso de ornamentos que transmitiam e reafirmavam seu compromisso político.
Como explicou às autoridades José de Freitas Sacoto, homem negro e livre, todos os
que fossem vistos pelas ruas “com brinquinho na orelha, barba crescida, até o meio do
queixo, com um búzio de Angola nas cadeias do relógio, este era Francês e do Partido
da rebelião”.
Salvador, 1798

O entusiasmo pelas “francesias” articulou de diversas maneiras uma


multiplicidade de vozes e interesses. Incluiu escravos, libertos e homens livres
pobres, na sua maioria crioulos e mestiços. Embora nenhum dos panfletos
sobreviventes faça referência ao fim da escravidão, há indícios de que um,
destruído, de acordo com o depoimento do capitão de granadeiros do 2º
regimento de Linha, Antônio José de Matos e Lucena, trazia a promessa de
“liberdade aos escravos”.
Salvador, 1798

A Conjuração não chegou às vias militares e boa parte de seus líderes foi
presa em uma reunião cujo objetivo era precisamente fazer uma avaliação da
correlação de forças. João de Deus, Lucas Dantas, Manuel Faustino e Luiz
Gonzaga das Virgens, negros e pertencentes as classes sociais subalternas,
pagaram o preço da sua ousadia. Foram enforcados e esquartejados. As mãos de
Luiz Gonzaga, acusado de escrever os panfletos, permaneceram pregadas na
forca para servir de exemplo.

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