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7 de Setembro de 2020

Pedidos nos procedimentos de defesa – exceções permitidas

Introdução
O presente estudo tem como escopo principal demonstrar as nuanças das
permissões de pedidos em peças de defesa. Trata-se de exceções
permitidas, e não meras liberalidades do réu.

As concepções básicas da Teoria Geral do Processo norteiam o autor da


ação judicial como a principal personagem – aquele que postula, que pede
– de um sistema processual, sendo aquele que roga ao Estado-Juiz a
aplicação da atividade jurisdicional, isto é, dizer o direito. A figura do autor,
do demandante, do requerente, do impetrante etc., diante da estrutura
convencional e tradicional do Direito Processual Civil é conceituada como
sendo a parte que intenta, em face da parte adversa, um pedido completo
(mediato e imediato). É o autor o principal interessado na ação e no bom
prosseguimento da mesma.

O réu, por sua vez, é visto como a parte contrária que tem como objetivo
precípuo o combate a tudo que é direcionado a ele. Destarte, cabe a esta
personagem contestar, impugnar, afastar etc., todo o petitório efetuado
pelo autor. Para tanto, o réu poderá ter a mão, além de sua peça de defesa, a
apresentação de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito
autoral.

/
Nesta operação física onde os vetores se posicionam em um sistema
piramidal, há de um lado uma pretensão, de outro a resistência e em cima
com o poder de dizer o direito: o juiz.

O sistema processual brasileiro doa ao réu algumas possibilidades para sua


defesa. Portanto, este vetor de resistência poderá fazer uso da contestação,
da reconvenção, do pedido contraposto e do pedido dúplice nas chamadas
ações dúplice.

Há quem lecione que ao réu é impossível a formulação de pedido mediato,


ou seja, um pedido com teor de positividade para sua pretensão defendem,
portanto, que ao réu só é conferido o direito de pleitear de forma imediata,
isto é, através do pedido para haver uma sentença declaratória negativa da
pretensão autoral.

Rosa Maria Néri e Nelson Néri Júnior comentam que: “existe interesse
processual quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a
tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe
alguma utilidade do ponto de vista prático”.1

Por sua vez, Cândido Dinamarco, mestre e eterno aluno de Enrico Túlio
Liebman, assim se posiciona: “a efetividade do processo é uma das
preocupações da moderna doutrina e correspondente à ideia
instrumentalista de que o processo deve ser apto a produzir o melhor
resultado possível, seja para a plena satisfação do direito material, seja para
a satisfação integral das pretensões justas do demandante, seja para a
integral pacificação dos litigantes”.2

Com isso, o respeitado jurista soma-se àqueles, como nós, que entendem
ser o principal objetivo finalístico do processo, o bem e a paz social.
Portanto, se o réu tiver pedidos a serem efetuados em sua peça de defesa,
por que lhe negar o direito a esta posição, se o que se busca é a paz dos
litigantes, e não o engessamento dos procedimentos processuais?

Não olvidamos que o interesse para agir ou para pedir, segundo ensina o
ínclito professor Humberto Theodoro Júnior, “surge da necessidade de
obter através do processo a proteção ao interesse substancial. Entende-se,

/
dessa maneira, que há interesse processual 'se a parte sofre um prejuízo,
não propondo a demanda, e daí resulta que, para evitar esse prejuízo,
necessita exatamente da intervenção dos órgãos jurisdicionais”.3

Baseadas nessas premissas é que discorremos ao longo do texto sobre as


possibilidades, as lições, as correntes doutrinárias e as decisões proferidas
em nossos tribunais brasileiros a respeito da possibilidade de o réu pedir.

1. Contestação
É a peça formal mais usada como meio de defesa do réu contra a pretensão
do autor. Esse instrumento utiliza ao mesmo tempo um viés residual –
quando é relativo ao processo – e uma faceta de plenitude da defesa –
quando ataca substancialmente o mérito da demanda.

Sendo considerado um instrumento de plena defesa, a contestação deve


conter em seu bojo toda e qualquer matéria de defesa, ressalvando, apenas,
os incidentes. O que não é dito em peça contestatória, dependendo do que
seja alegado, não poderá mais ser usado no futuro, por conta do fenômeno
da preclusão.

Devem ser usados na defesa todos os meios possíveis que resguardem o


direito de resistir do réu. Destarte, se algumas manifestações forem
rejeitadas pelo magistrado, haverá outras que poderão manter a resistência
para o julgamento desfavorável.

A Contestação traz como requisito intrínseco a manifestação plena e


específica diante dos fatos narrados na inicial do autor, sob pena de que,
havendo inobservância, se presumam verdadeiros os fatos narrados e não
vergastados. Chamamos, doutrinariamente, de o “ônus da impugnação
específica”.

Na impugnação específica não poderá haver negações genéricas, abstratas e


elucubrações, em sendo assim, não restará outro entendimento senão o de
se considerar verdadeiros os fatos narrados pelo autor (Confissão Ficta).

/
Discorreremos sobre duas formas de defesa contidas na Contestação: a
defesa de mérito direta e a defesa de mérito indireta.

Na defesa de mérito direta o demandado (réu) possui a faculdade de negar


tudo sobre os fatos alegados na inicial e suas prováveis consequências no
mundo jurídico ou aceitar os fatos como postos sem, contudo, aceitar as
consequências jurídicas. (Ex: processo pedindo passagem forçada apenas
porque é um caminho mais confortável para o autor. Aceita-se o fato,
entretanto, resiste contra a formação da passagem forçada ou a servidão de
passagem).

Já na defesa de mérito indireta o réu admite os fatos e os fundamentos


jurídicos do pedido autoral, porém, no entanto, diverge dos mesmos
demonstrando motivos que o impedem, que os extinguiu ou os modificou.

O doutrinador Moacir Amaral defende uma segunda via de defesa indireta,


a qual o réu sustenta exceções substanciais, tais como: prescrição,
compensação etc. Faz-se mister asseverar que a grande maioria da doutrina
não reconhece essa segunda via.

A contestação para se preservar um estilo mais acurado e mais


organizadodeve ser escrita da seguinte forma: um capítulo para demonstrar
as indignações ao pleito autoral, impugnando uma a uma as pretensões da
inicial e outro geralmente conhecido como “do direito” onde devem
serapontados todos os fundamentos jurídicos que sustentam a resistência
do réu e os fornece razão em não ser condenado.

Existem também as chamadas defesas processuais. São as razões impostas


pelo réu antes do mérito, são chamadas pelo nosso códice processual civil
de “preliminares”.

As preliminares podem ser denominadas de defesas subsidiárias, digo


assim porque elas assumem verdadeiro escudo perante o magistrado. Caso
o juiz aceite-as ou entenda que a alegação das mesmas procede, ele
encerrará o processo sem analisar o mérito, pois a preliminar prejudica o
mérito, caso o juiz não as aceite, então passará ao exame do mérito.
(inteligência do artigo 328 do CPC).

/
Neste momento, enseja oportunidade para que façamos uma diferenciação
entre preliminar e prejudicial.

Preliminar: consubstanciada em matéria processual, isto é, uma vez


reconhecida inviabiliza o estudo do mérito da demanda. (Princípio da Res
in judicio deducta);

Prejudicial: questão inerente ao mérito da demanda, ou seja, uma vez


reconhecida seus efeitos atingirão o julgamento da ação.

As preliminares de contestação são elencadas de forma exemplificativa e de


modo não exaustivo ou também chamadas de numeros apertus. São
listadas nos artigos 301, 267 e 295 do CPC:

As hipóteses do art. 301:

Inexistência ou nulidade de citação: citação é o ato pelo qual o réu é


chamado a se defender. Se não for feita de forma legal e eficaz, poderá
ser alegada em preliminar de contestação como meio de defesa.

Incompetência absoluta: O magistrado que teve o processo distribuído


não pode julgar por incompetência devido à matéria, pessoa ou
função.

Inépcia da petição inicial: caso a petição inicial seja considerada


inepta, isto é, sem os requisitos necessários para sua constituição
plena, o processo se extingue.

Perempção: perda do direito de ação. O autor não possui o direito de


acionar o Estado, pois sua pretensão existe, mas o meio para
conquistá-la foi perdido.

Litispendência: quando já existe demanda proposta sobre o assunto-


fim do processo. Como não pode haver demanda de ações idênticas, o
réu argui preliminarmente a litispendência para afastar a defesa em
dois processos iguais.

Coisa julgada: decisão já transitada em julgado que não poderá mais


ser oposta por meio de novo processo, há não ser nos casos em que
couber ação rescisória e no prazo de dois (2) anos.
/
Conexão: há conexão quando houver identidade de objeto ou causa de
pedir entre duas ações. Destarte, recomenda-se que se apense uma
ação na outra para evitar decisões conflitantes.

Incapacidade de agir: a parte autoral não possui capacidade para ação,


ou seja, não tem condições para acionar a jurisdição. Também pode
ser oposta em relação a defeito de representação ou falta de
autorização.

Convenção de arbitragem: o acordo em sede de juízo arbitral impede


que o motivo venha novamente a ser discutido em processo de
conhecimento, devendo ser novamente decidido no âmbito da justiça
arbitral.

Carência de ação: idealizada por Enrico Túlio Liebman, italiano


radicado no Brasil, defende que para um processo ser constituído é
necessário que alguns pressupostos sejam preenchidos. São as
chamadas condições da ação.

Falta de caução ou qualquer outra prestação que a lei exija como


preliminar: Em alguns casos para se intentar uma ação é necessário
fazer um depósito de quantia. Ex: para intepor ação rescisória se faz
necessário depositar 5% do valor da causa original.

Teceremos, agora, comentários acerca dos requisitos intrínsecos e formais


da contestação.

A contestação deve ser escrita, constando a qualificação completa das


partes e endereçando para a Vara onde a ação foi distribuída. Deverá trazer
no rol de documentos: o mandato para o advogado atuar, juntamente com
seu endereço para receber as intimações. (inteligência dos arts. 36 a 39,
CPC)

São requisitos intrínsecos da Contestação:

Defesa específica e precisa, não devendo ser genérica acerca dos fatos
narrados pelo autor; exposição clara dos fatos e fundamentos jurídicos de
sua resistência; alegar, se for o caso, preliminares e prejudiciais de mérito;

/
apresentar documentações que atestem a fidedignidade de suas declarações
e, por fim, as provas que pretende produzir ao longo do processo como
meio de ampla defesa.

O prazo para apresentar contestação no rito comum ordinário é de 15


(quinze) dias a contar a partir da juntada do mandado de citação ou do
aviso de recebimento da citação.

Se no litígio houver mais de um réu, considerando, assim, um litisconsórcio


passivo, o prazo para a apresentação da contestação é o mesmo, salvo se os
réus tiverem patronos diferentes, caso em que o prazo conta-se em dobro a
partir da última juntada do mandado ou do aviso de recebimento.

Por fim, cabe-nos ressaltar que não é cabível aditamentos a pedidos


formulados em sede de contestação. Mais à frente quando formos
realmente falar das exceções permitidas de pedidos em defesa explicaremos
melhor.

Essas eram algumas considerações acerca da Contestação. Passaremos a


examinar a Reconvenção.

2. Reconvenção
A Reconvenção encontra-se preconizada na redação do art. 315 do Código
de Processo Civil estabelecendo que “o réu pode reconvir ao autor no
mesmo processo, toda vez que a reconvenção seja conexa com a ação
principal ou com o fundamento da defesa”. A nosso ver e de grande parte
da doutrina, a reconvenção é um verdadeiro contra-ataque.

O art. 299 disciplina que “a contestação e a reconvenção serão oferecidas


simultaneamente, em peças autônomas”. Isto quer dizer que a reconvenção
deve ser proposta no rito ordinário comum no prazo da contestação, ou
seja, 15 (quinze) dias e em peça a parte. Portanto, a reconvenção não é
contestação.

/
O percuciente professor Humberto Theodoro Jr. Explica: “a reconvenção
não é meio de defesa, mas verdadeiro contra-ataque do réu ao autor,
propondo dentro do mesmo processo uma ação diferente e em sentido
contrário àquela inicialmente deduzida em juízo”.4

Portanto, nestes termos, depreende-se que a reconvenção não elide a


revelia.

O mesmo autor supracitado prossegue ensinando: “enquanto o contestante


apenas procura evitar a sua condenação, numa atitude passiva de
resistência, o reconvinte busca, mais, obter uma condenação do autor-
reconvindo”.5

Entretanto, em alguns tribunais, envoltos por uma visão de vanguarda, há,


de forma embrionária, a aceitação de algumas reconvenções como meio de
defesa. Entretanto, faz-se mister dizer que isso ainda é algo isolado,
variando de posição jurisprudencial para entendimento dos doutrinadores
que transmitem e demonstram didaticamente a aplicação das leis e das
decisões.

Caso a reconvenção seja indeferida caberá agravo.

3. Pedido
O pedido é um artifício de suma importância para a processualística, uma
vez que o mesmo tem o condão de delimitar a ação jurisdicional,
demonstrando, peremptoriamente, o que se pretende e o que se quer
daquela ação manejada e do órgão impulsionado.

Trata-se, ao mesmo tempo, de provocação e de limitação. Pois se a primeira


motiva o órgão jurisdicional a revelar o direito, a segunda impõe critérios
para este julgamento. No caso de não observância desse limite poderão
ocorrer os fenômenos da citra petita, ultra petita e extra petita.

O Princípio da Congruência nos leciona que o pedido é o norte vislumbrado


pelo magistrado e a ele deve o mesmo ficar adstrito, sob pena de concessão
de tutela diversa da natureza, do objeto e da quantia, causando, assim, a
/
nulidade da sentença.

Nesta seara surge mais um entendimento. Falamos do objeto imediato e do


mediato. O objeto imediato é aquele detentor do pedido jurisdicional. Por
sua vez, o pedido mediato é o bem jurídico que está sendo pleiteado pelo
autor, ao qual a doutrina também o identifica de o “real objeto do autor”.

Distinguimos o pedido imediato do pedido mediato, a partir do momento


em que na inicial o autor busca a tutela jurisdicional (objeto imediato) para
assegurar-lhe a obtenção do bem jurídico ao qual pensa ter direito (objeto
mediato).

Existem várias outras classificações de pedidos.

Pedidos alternativos: são pedidos que, em função da natureza da obrigação,


facultam ao devedor a possibilidade de adimpli-los de diversas formas e
modos.

Pedidos subsidiários ou sucessivos: geralmente são confundidos com os


alternativos. Na prática ocorre assim: o autor faz um pedido específico, mas
caso o magistrado não o entenda dessa maneira, poderá conceder o
próximo que normalmente tem um caráter mais genérico. É muito comum
de se vislumbrar nas iniciais a seguinte redação: “caso Vossa Excelência
não entenda desta maneira, conceda o pedido agora manifestado [...]”.

Há a confusão porque se no pedido alternativo o autor concede ao réu a


faculdade de realizar a prestação de mais de uma forma ou modo, no
pedido subsidiário ou sucessivo, o autor permite ao juiz alternativa sobre o
pedido que ele irá deferir. No pedido alternativo o autor cria alternativas ao
réu, no pedido subsidiário o autor doa alternativas ao magistrado.

Exemplo: o autor impetra ação de anulação de contrato de locação alegando


ter havido vícios em sua assinatura. Pede então a anulação do contrato.
Porém, caso o juiz entenda ser o contrato válido, o autor na inicial já
formula um pedido sucessivo que diz: caso V. Exa. Não entenda ser o
contrato nulo, por favor observe a nulidade da cláusula x.

/
Pedidos genéricos: Vedado por nosso ordenamento jurídico processual,
uma vez que lemos no art. 282, IV, do CPC, que a petição deverá trazer em
seu bojo “o pedido, com as suas especificações”, isto é, o pedido tem que ser
certo e/ou determinado.

Pedido cominatório: geralmente são pedidos que trazem, juntamente com a


pretensão, o requerimento de sanções em caso de descumprimentos. São as
chamadas multas ou astreintes.

Aditamento do pedido: o artigo 294, do CPC, ensina que “antes da citação,


o autor poderá aditar o pedido, correndo à sua conta as custas acrescidas
em razão desta iniciativa”. Em outras palavras, é a possibilidade de mudar
o pedido da inicial.

4. Exceções (pedidos em procedimentos de defesa)

Chegamos, portanto, na razão maior deste artigo. Iremos demonstrar as


exceções de pedidos em procedimentos de defesa permitidas em nosso rito
processual brasileiro.

Primeira exceção que assistimos encontra respaldo no § 1º do artigo 278 do


Código de Processo Civil, in verbis:

“É lícito ao réu, NA CONTESTAÇÃO, formular pedido em seu favor,


desde que fundado nos mesmos fatos referidos na inicial”.

Conclui-se, assim, que há uma autorização expressa do CPC no sentido de


permitir ao réu em sede de contestação elaborar pedidos.

A jurisprudência adota de forma contumaz esse entendimento:

“HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA – exibição de documentos –


Reconhecimento de pedido em contestação – possibilidade –
apelação provida. (TJSP – ApCiv nº 822.457-0/3 – Rel. Des. Sá
Moreira de Oliveira).

/
Quando o legislador assim se referiu quis, com o intuito de prestigiar os
princípios da economia processual, da instrumentalidade e da efetividade
do processo, evitar a utilização da reconvenção ou a criação de outra ação
que versasse sobre os mesmos fatos.

Não é só em tal códice que encontramos essa mentalidade do legislador,


mas também quando o mesmo se refere a não exigência de formalidades
nos procedimentos admitidos em Juizados Especiais. Busca-se, a todo
modo, uma solução mais rápida ao litígio.

Por exemplo, em Juizado Especial quando o réu apresenta pedido


contraposto deixa de existir a necessidade cabal de se alargar ou complicar
a construção de provas.

Antes de prosseguirmos neste raciocínio, é imperioso dizer que os pedidos


efetuados na contestação, em pedidos contrapostos, em ações e pedidos
dúplices, devem observar as condições genéricas da ação (teoria de
Liebman) e os pressupostos processuais do pedido, sob pena de haver
inapetência do pedido.

Exemplo: o réu citado em ação de despejo, na contestação elabora os


pedidos, entretanto não faz menção a indenização por benfeitorias ou ao
seu possível direito de retenção. Apenas nos fatos aduz que fez benfeitorias,
não as especifica e, por fim, não pede indenização por elas. Este pedido
elaborado em contestação não pode ser aceito como um pedido –
respeitadas as condições de ação e os pressupostos processuais do pedido –
daí advém a preclusão e o indeferimento do pleito em peça de defesa.

Destarte, chama-se novamente a atenção para que estas exceções ensejam,


também, respeito aos pressupostos regulares de um processo e as condições
de ação.

Existe, nestas exceções permitidas, uma faceta legal. Em alguns casos em


razão de imperativo legal ou pela própria natureza da ação, a persona do
autor e do réu são vistas como interessadas na concessão do bem jurídico
disputado na demanda, fazendo, assim, que haja simultaneamente para
ambos a presença nos polos ativo e passivo da ação. Isto ocorre nas ações
dúplices e naquelas onde é possível a interposição de pedido contraposto.
/
As exceções existem porque a essência do interesse processual e do direito
de demandar e pedir é amparado pelo ordenamento jurídico e inerente
tanto ao autor quanto ao réu. O direito de defesa do demandado (réu) é
sempre simétrico ao direito do autor.

O direito de ação e o direito de defesa são norteados em um mesmo


interesse substancial, qual seja, a ampla liberdade de defesa e liberdade
para agir, diferindo-se, apenas, no prisma processual, onde o autor é ativo e
tem o poder de fixar o thema decidendum, enquanto, por sua vez, o réu é
passivo e pode, apenas, geralmente, resistir à pretensão contida na ação.
Assim há quem defenda que o papel do autor e do réu se restrinja ao
primeiro pedir e ao segundo impedir. Não comungamos com tal
pensamento.

4.1 Pedidos Contrapostos

Conhece-se por pedido contraposto aquele formulado pelo réu, não através
de peça autônoma, como acontece com a reconvenção, mas no bojo da
própria contestação, observado os mesmos fatos que fixaram a propositura
da demanda original.

Em termos legais, o parágrafo único do artigo 17 da Lei nº 9.099 (Lei dos


Juizados Especiais) prevê a possibilidade do pedido contraposto, in verbis:

Art. 17 – Comparecendo inicialmente ambas as partes, instaurar-se-á,


desde logo, a sessão de conciliação, dispensados os registro prévio de
pedido e a citação.

Parágrafo único: Havendo pedidos contrapostos, poderá ser dispensada a


contestação formal e ambos serão apreciados na mesma sentença”.

A inteligência deste artigo demonstra-nos que a existência de pedidos


contrapostos inibe e prescinde a existência de contestação. Lembramos
que, em sede de processo ordinário comum, a apresentação de reconvenção
e a não apresentação de contestação implica nos efeitos da revelia. Situação
que o parágrafo único do artigo 17 da Lei dos Juizados Especiais abona.

/
O profícuo doutrinador Nelson Néry Júnior comenta o supracitado art. 17:
“pedido contraposto é a pretensão deduzida pelo réu na contestação, desde
que fundado nos mesmo fatos articulados pelo autor na petição inicial”.6

Pensamos que o autor quando se refere que “o pedido contraposto é a


pretensão deduzida […] na contestação”, não quer fazer menção a peça
conhecida como contestação, mas sim, ao momento de defesa que,
geralmente, é chamado de contestação. Senão não havia necessidade de o
legislador asseverar: “Havendo pedidos contrapostos, poderá ser
dispensada a contestação”. Destarte, entendemos que o intervalo de defesa
é popularmente conhecido como o prazo para contestar e, por conta disso,
acha-se que toda peça de defesa é contestação. Situação semelhante ocorre
quando o réu se vir desfavorável em relação ao processo e profere: irei
apelar! Quando o certo seria: irei recorrer. Pois não existe apenas o recurso
de apelação e este, diga-se de passagem, só se presta a reformas de
sentença.

Theotônio Negrão leciona que a Lei dos Juizados Especiais não quis que
houvesse a figura da reconvenção, como acontece no CPC, e por isso
ordenou que o contra-ataque fosse “deduzidos na contestação, recebendo
nesta lei (Juizados Especiais) com o nome de 'pedido contraposto”.7

Cumpre-nos demonstrar as diversas correntes e posições acerca do referido


instituto.

No pedido contraposto existe a concepção de que a procedência de sua


interposição necessariamente finda em improcedência do pedido original
autoral, fato este que não ocorre em sede de pedido dúplice, a próxima
exceção a ser perlustrada.

Na lição profícua da Ministra Fátima Nancy Andrighi:

“O Pedido Contraposto é reconvenção deformalizada, porque é formulada


no texto da contestação sem formalismos, contudo com área de
abrangência menor do que a reconvenção porque o pedido a ser formulado
pelo réu deve, necessariamente, ser fundado nos mesmos fatos referidos na
inicial e, em se tratando de reconvenção, a conexidade exigida pode ser com
a ação principal ou com um dos fundamentos”.
/
Joel Figueira e Maurício Antônio Ribeiro defendem que “o pedido
contraposto foi criado com o escopo de não ampliar demasiadamente o
espectro do objeto da demanda e, desta forma, evitar o aumento da
complexidade da causa”.8

Deve-se ficar compreendido que ao interpor pedido contraposto o réu


estará exercendo legítimo direito de ação, por isso se subordina às
condições de Liebman. O pedido contraposto possui independência do
pedido autoral, uma vez que mesmo sendo considerada a carência de ação
do autor, o pedido contraposto não se extinguirá e será apreciado como se
fosse a demanda original. Verdadeiro será dizer que tal faceta não assiste ao
pedido dúplice, onde o réu não possui o direito de ação impregnado em sua
essência e, portanto, fica à mercê do conhecimento da ação protocolada
pelo autor. Neste caso, há verossimilhança com o recurso adesivo.

Mesmo que seja boa parte da doutrina que não vislumbre necessidade de
maior estudo sobre as diferenças do pedido dúplice e do pedido
contraposto, achamos indispensável para afastar as possíveis decisões
equivocadas de juízes que nas ações que permitem o pedido contraposto
concedem o bem jurídico tutelado ao réu que não formulou pedido
expresso, fato este que só é possível em via de ação dúplice.

O zênite da diferenciação entre um procedimento e o outro se alberga no


fato de que na contestação, na reconvenção e no pedido contraposto há a
necessidade imperiosa de se ler pedido expresso por parte do réu, sob pena
de não o existir, fato que nas ações dúplices é dispensável, quando a
sentença de improcedência do pedido autoral automaticamente concede ao
réu o bem jurídico tutelado, mesmo que não tenha havido pedido.

Por isso, debruçaremo-nos agora no estudo dos pedidos dúplices e ações


dúplices.

4.2 Pedidos e ações dúplices

O pedido dúplice recebeu esta nomenclatura baseada no instituto previsto


no § 1º do art. 278 do CPC, relativo às ações dúplices, bem como as que
tramitam sob o procedimento sumário. No pedido dúplice há a

/
possibilidade de o réu formular pedido em seu favor, no bojo da peça
contestatória, sempre com fundamento nos mesmos fatos relatados pelo
autor na exordial.

O pedido dúplice pode ser visto também na redação do art. 31 da Lei dos
Juizados Especiais (9.099/95). É bom que se ressalte que na supracitada lei
há os dois institutos: pedido dúplice e pedido contraposto. Estando o
primeiro na redação do art. 31 e o segundo no texto do art. 17. São
totalmente distintos.

No pedido dúplice, conforme já mencionado antes, pode haver procedência


tanto do pedido do réu como do pedido do autor.

No pedido dúplice não pode haver a dispensabilidade da contestação, já que


o referido pedido é efetuado no bojo desta peça, depois de citação válida,
sendo, portanto, ab initio, o réu da ação.

Exemplo de pedido dúplice: um condômino ingressa com ação em Juizado


Especial aduzindo que o condomínio está aplicando uma multa de 12%
como sanção a taxas vencidas e não pagas. Em seu pedido elabora o
seguinte pleito: entendendo ser abusiva a multa de 12% peço a V. Exa. Que
declare que a multa não poderá ser maior que 2%, visto que assim, haverá o
adimplemento de três taxas vencidas e três vincendas. O condomínio em
sua peça contestatória defende a legalidade da multa e aproveita para
postular que o autor seja condenado a pagar as taxas vencidas,
constituindo, assim, um título executivo judicial. O magistrado diante de tal
situação poderá julgar razoável o pedido do autor e diminuir a multa para
2% e concomitantemente condenar o autor a pagar as parcelas vencidas
dando procedência ao pedido do réu, no caso o condomínio.

As ações dúplices são originárias do Direito Romano. A História relata a


existência delas nas Institutas de Gaio9, no século II d. C.

Os romanos caracterizavam como ações dúplices as de caráter possessório,


mormente os interditos conhecidos como utrubi e uti possidetis.

/
Já em nosso direito tupiniquim podem ser citadas como ações dúplices as
ações possessórias, ações demarcatórias, ação de prestação de contas, ação
de divisão de terras particulares etc., todas onde a sentença concede o bem
jurídico a qualquer das partes, até mesmo ao réu, sem que esse tenha se
manifestado expressamente com pedido.

O ínclito professor Araken de Assis comenta com maestria:

“Do prisma material, é dúplice a ação, provocando o iudicium duplex, na


qual a contestação do réu já basta à obtenção do bem da vida. Em geral, o
autor pede e o réu somente impede; na actio duplex, o ato de impedir
(contestação) já expressa um pedido contrário. Tal característica deriva do
direito material posto em causa (rectius: Mérito, pretensão processual)”10

Entretanto, algo é importante que se destaque. Deve ser rejeitada a ideia de


que a mera autorização legal liberando pedidos na contestação seja o
suficiente para considerar uma ação como dúplice. A ação dúplice possui
idiossincrasias próprias e marcantes.

Destarte, na ação tipicamente dúplice, quando o magistrado concede o bem


jurídico ao réu, mesmo que não tenha havido pedido expresso do mesmo,
não estará afrontando o princípio da inércia da atividade jurisdicional, uma
vez que a tutela disputada é inerente às próprias condições de natureza
dúplice. Não há exorbitância da atividade judicante, pois a ação dúplice
permite ao réu o direito de sair vitorioso (com o bem jurídico) mesmo que
não tenha havido o desejo da conquista.

Exemplos de ações dúplices:

Ação de alimentos: Na ritualística da ação alimentar, o réu poderá além de


resistir à pretensão autoral, pleitear um bem jurídico a ser tutelado. Por
exemplo: o autor pede um valor x e o réu propõe um valor “-2x”. Desta
forma, o juiz poderá condenar o réu atendendo, assim, o pedido do autor,
porém poderá fixar o valor que o réu propôs. A jurisprudência entende
assim: ALIMENTOS – PROVISÓRIOS – AÇÃO DE OFERTA DO
DEVEDOR – FIXAÇÃO EM QUANTIA SUPERIOR À OFERECIDA – AÇÃO
DÚPLICE – DECISÃO ULTRA PETITA NÃO CARACTERIZADA / STJ
228/164)
/
Ação de prestação de contas: Poderá ser proposta por quem tem o direito
de exigi-las (ação de exigir as contas) ou por aquele que tem obrigação de
prestá-las (ação de dar contas). Theotônio Negrão comenta que “tanto
autor como réu terão legitimidade para esta cobrança, porque a ação de
prestação de contas tem natureza dúplice”.11

Ações possessórias: As mais clássicas nesta classificação. Costa Machado se


posiciona desta maneira:

[...] o dispositivo9222 doCPCC, reconhece expressamente a duplicidade


das ações possessórias, o que significa justamente o proposto pelo texto:
a possibilidade de o réu deduzir pretensão material contra o autor,
independente de pedido reconvencional, para tanto bastando que de sua
contestação conste, de forma expressa, o pedido de proteção
possessória.

As jurisprudências dos Tribunais superiores caminham nessa esteira:

“POSSESSÓRIA – REINTEGRAÇÃO DE POSSE – IMÓVEL DE


DOMÍNIO PÚBLICO – LEGITIMIDADE DO MUNICÍPIO –
INTELIGÊNCIA DO ART. 22 DA LEI 6.766 DE 1979 – INDENIZAÇÃO
POR ACESSÕES – DIREITO DE INDENIZAÇÃO – PEDIDO
FORMULADO NO BOJO DA CONTESTAÇÃO – ADMISSIBILIDADE –
PRECEDENTES DO STJ. Possível o deferimento do pedido de
indenização ou retenção por benfeitorias formulado em contestação.
(STJ - AGA 27.423 / Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito / julgado
em 4.2.2002).

Em outra decisão, o Desembargador relator doou a faculdade de o réu


escolher o modo de formular o pedido:

“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POSSESSÓRIA. NATUREZA


DÚPLICE. AJUIZAMENTO DE AÇÃO AUTÔNOMA. A parte tem o
direito de optar entre formular pedido possessório no bojo da
contestação da ação de interdito possessório, em virtude da força
dúplice das possessórias (art. 922 CPC), ou ajuizar ação autônoma.
(TJDF – APC – 2005.01.1.021219-7 / Rel. Des. Waldir Leôncio Júnior /
julgado em 28.11.2005)
/
No voto do eminente relator aprendemos:

“Primeiramente, é de se registrar que os feitos possessórios, pela


peculiaridade do próprio direito material, tem natureza eminentemente
dúplice, onde não há autores nem réus, pois ambas estão no mesmo
patamar processual, sendo idêntica a condição de litigantes, posto que
nenhum se encontra na situação determinada de réu ou autor, mas
cada um representa ambos os papéis. E isto ocorre pois o réu, ao
formular sua defesa e fornecer elementos de cognição ao juiz, estará
também obtendo tutela jurisdicional, entendida esta como provimento
favorável conferido àquele que tem razão a pretensão”. (grifo nosso).

Portanto as ações possessórias são verdadeiras ações dúplices, sendo,


portanto, exemplos reais do presente artigo, onde ora falamos de pedidos
nos procedimentos de defesa e as exceções permitidas.

Outros exemplos de ações dúplices: Ação de divisão de terras particulares;


ação de consignação em pagamento; ação renovatória de locação; ações no
rito processual sumário etc.

Conclusão
Pelo trabalho exposto, conclui-se que há, sim, possibilidade de se formular
pedidos em peças de defesa e que, também, pertence ao réu a garantia de
pedir, e não só impedir. As exceções foram demonstradas uma a uma dando
para se notar que o direito material é quem fornece elementos de convicção
para facultar ao réu o direito de demandar de volta, seja em contestação,
reconvenção, pedido contraposto, pedido dúplice ou nas ações dúplices.

Bibliografia
ASSIS, Araken de. Procedimento Sumário. São Paulo: Malheiros, 1996.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução Civil. São Paulo: RT, 1987.


/
FILGUEIRA JR., Joel Dias. RIBEIRO LOPES, Maurício Antônio.
Comentários à Lei dos

Juizados Especiais Cíveis e Criminais. 3ª ed. São Paulo: RT, 2000.

NEGRÃO, Theotônio.Código de Processo Civil e Legislação Processual em


vigor. 31ª ed., São

Paulo: Saraiva, 2000.

NÉRY, Rosa Maria, NÉRY JR., Nelson. Código de Processo Civil


comentado. 10 ed., São Paulo:

RT, 2008.

THEDORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. São


Paulo: Vol. I.

WASCONCELLOS JR., José Carlos Coelho. O Pedido Contraposto:


Definição Legal e

Especificidades.

1NÉRY, Rosa Maria, NÉRY JR., Nelson. Código de Processo Civil


comentado. 10 ed., São Paulo: RT, 2008, p. 504

2DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução Civil. São Paulo: RT, 1987, p.


165

3THEDORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. São


Paulo: Vol. I, p. 50

4THEODORO JR. Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol.


I, 22ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 376

5THEODORO JR. Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol.


I, 22ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 376
/
6NÉRY JR., Nelson. Apud WASCONCELLOS JR., José Carlos Coelho. O
Pedido Contraposto: Definição Legal e Especificidades. Disponível
em: <http://www.juspodivm.com.br/i/a/%7B8A573924-0A39-413B-
8D9D-B6EB71D48B64%7D_018.pdf>. Acesso em: 27 mai. 2012, p. 5

7NEGRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e Legislação Processual em


vigor. 31ª ed., São Paulo: Saraiva, 2000, p. 1418

8FILGUEIRA JR., Joel Dias. RIBEIRO LOPES, Maurício Antônio.


Comentários à Lei dos Juizados Especiais Civeis e Criminais. 3ª
ed. São Paulo: RT, 2000, 292

9Institutas de Gaio (Gai Institutionum Comnetarii Quattuor) livro


descoberto em 1816 pelo historiador Nieburh na Biblioteca da Catedral de
Verona.

10ASSIS, Araken de. Procedimento Sumário. São Paulo: Malheiros,


1996, p. 161

11NEGRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e Legislação Processual


em vigor. 31ª ed., São Paulo: Saraiva, 2000, p. 930

Disponível em: https://profrobertovictor.jusbrasil.com.br/artigos/121942961/pedidos-nos-


procedimentos-de-defesa-excecoes-permitidas

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