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AO DESEMBARGADOR RELATOR SEBASTIÃO LUIZ FLEURY, DA 7ª

CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS.

Processo nº: 5603235-09.2023.8.09.0000


Impetrante: Estado de Goiás
Impetrado: Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Goiás

O CONSELHEIRO DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE


GOIÁS, EDSON JOSÉ FERRARI, com o respeito e acatamento devidos, vem,
tempestivamente, ante Vossa Excelência, apresentar

INFORMAÇÕES

nos autos do Mandado de Segurança, com pedido liminar, impetrado pelo


ESTADO DE GOIÁS, em face de suposto ato coator consubstanciado no Despacho n°
526/2023, exarado no exercício do controle externo, pelo Conselheiro Edson José Ferrari,
nos autos do Processo n° 202300047002207, do Tribunal de Contas do Estado de Goiás.

1. SÍNTESE DA INICIAL

1. Em apertada síntese, alega o impetrante que, “objetivando selecionar entidade


caracterizada como Organização da Sociedade Civil – OSC para a celebração de termo
de colaboração, cujo objeto reside no gerenciamento, na operacionalização e execução
das ações e serviços de saúde no Hospital de Urgências de Goiás Dr. Valdemiro Cruz
(HUGO), lavrou o Edital de Chamamento Público nº 01/2023-SES/GO (anexo à
inicial).”

Que foi deflagrado pelo Conselheiro Edson José Ferrari o processo administrativo
nº 202300047002207, tendo por finalidade viabilizar o controle externo do referido
processo de chamamento público, o qual foi inaugurado pelo Ofício n. 24/2023 – GCEF,
por meio do qual requisitou cópia do Edital de Chamamento Público em questão.
Aduziu que, após o trâmite regular do processo de controle externo, foi exarado o
Despacho n. 526/2023 -GCEF, que, acolhendo sugestão do Serviço de Fiscalização da
Saúde, unidade técnica do Tribunal de Contas do Estado de Goiás, decidiu pela suspensão
cautelar do procedimento instaurado pelo Edital de Chamamento Público nº 01/2023-
SES/GO (e de outros procedimentos correlatos), bem como determinou a retificação dos
editais de chamamentos públicos, adequando-os à Lei estadual nº 21.740, de 20 de
dezembro de 2022, para que instrumentalizem a celebração de contrato de gestão, e não
de termo de colaboração/fomento.

Destacou, ainda, que a citada decisão “repisa os apontamentos traçados pelo


Serviço de Fiscalização da Saúde nas Instruções Técnicas Conclusivas nºs 16/2023 e
21/2023, acerca de supostas ilegalidades nos chamamentos públicos em comento.”.

O impetrante requereu a concessão de medida liminar, a fim de suspender os


efeitos do ato dito coator (Despacho nº 526/2023) até a incursão no mérito do mandamus,
a qual, justamente, foi indeferida pela douta Juíza Substituta em 2º Grau, Dra. Sirlei
Martins da Costa, por entender que não estariam configurados os requisitos necessários
ao deferimento da pretensão e por entender que a situação requer estudo mais
aprofundado, na busca da certeza do direito apontado, o que inviabilizaria, por prudência,
a concessão do pedido liminar.

Irresignado com o indeferimento do pedido liminar, e de forma inovadora, o


Estado de Goiás apresentou Pedido de Suspensão de Liminar, com fundamento no art. 4º,
§7º, da Lei nº 8.437/92, autuado sob o número 5606588-57.2023.8.09.0000, em face da
decisão que denegou a liminar, tendo sido deferida pelo Presidente do TJ/GO, conforme
decisão proferida no evento 9 dos autos mencionados, para determinar a liberação do
normal prosseguimento do procedimento do Chamamento Público nº 01/2023-SES/GO,
da Secretaria de Estado da Saúde de Goiás.

Ao final da petição inicial de Mandado de Segurança, requereu a concessão de


segurança para declarar a nulidade do Despacho nº 526/2023, proferido nos autos do
processo TCE/GO nº 202300047002207/309-09.

Insta ressaltar, ad argumentantum tatum, que o arrazoado utilizado pelo Estado


de Goiás, na oportunidade do Pedido de Suspensão de Liminar (risco de grave lesão à
ordem e à saúde públicas), não se sustenta. Ora, existe a possibilidade de prorrogação
normal do contrato de gestão, acaso ainda não tenha se atingido o interregno máximo de
12 (doze) anos, conforme prevê o §2º do art. 6-F, da Lei estadual n.º 15.503/2005. E,
também, há a possibilidade de se realizar a prorrogação excepcional do contrato de gestão,
por até 12 meses, prazo suficiente para a escolha de nova entidade para gerir a unidade
de saúde, com base na lei adequada (Lei n.º 21.740, de 29/12/2022 - Lei das OSS). Assim,

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não há que se falar em prejuízos para a população goiana acaso não deflagrados os
procedimentos de chamamentos públicos, com fundamento em lei inaplicável.

Deve ser considerado, portanto, que a própria legislação, ao prever situações


excepcionais que podem impactar na execução dos contratos entabulados pela
Administração Pública, prevê a possibilidade de prorroga-los até o advento do prazo
máximo ou, até mesmo, diante de uma excepcionalidade, elastecê-lo por mais 12 (meses)
tempo este suficiente para a instauração e contratação de uma nova entidade gestora de
hospitais públicos, na forma do contrato de gestão, conforme determina a lei.

Com esse arremate e, destacando o acerto da decisão desse d. juízo que indeferiu
o pleito liminar, deve ser extinto o processo sem resolução de mérito ou, eventualmente,
denegada a segurança pleiteada, cujos fundamentos para tais serão demonstrados abaixo,
para o fim de, assim, prevalecer a decisão adotada por este Conselheiro, suspendendo a
realização dos chamamentos públicos para a gestão dos hospitais estaduais, instaurados
com fundamento na Lei nº 13.019/2014.

2. DA PRELIMINAR

2.1. DA INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA

O mandado de segurança é o instrumento jurídico cuja finalidade é proteger direito


líquido e certo que tenha sido violado por ato ilegal ou abusivo de autoridade pública ou
de agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público, tratando-se de
ação constitucional, também conhecido como remédio constitucional, nos termos do art.
5°, inciso LXIX, da Constituição Federal de 1988.

Compulsando os autos, verifica-se que o Impetrante intenta a declaração de


nulidade da decisão exarada por meio do Despacho n. 526/2023 -GCEF do TCE-GO, sob
o argumento de proteção de direito líquido e certo violado em razão da suspensão
supostamente ilegal do procedimento deflagrado pelo Edital de Chamamento Público nº
01/2023-SES/GO (e de outros similares), em decorrência de interpretação jurídica
supostamente equivocada da autoridade coatora. Transcreve-se trecho da exordial nesse
sentido:

Em primeiro lugar, a ação constitucional ora impetrada é cabível,


porquanto se está a proteger direito líquido e certo – há prova pré-
constituída: a controvérsia reside apenas na equivocada
interpretação jurídica perfilhada pela autoridade coatora –, não
amparado por habeas corpus ou habeas data, violado em razão da

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suspensão flagrantemente ilegal do procedimento deflagrado pelo
Edital de Chamamento Público nº 01/2023-SES/GO (e de outros
similares). (grifo nosso).

Depreende-se da exordial que o Impetrante não comprova a existência de direito


líquido e certo. Pelo contrário, há evidente ausência de tal direito. Explica-se.

O ato acoimado de coator foi exarado por membro do Tribunal de Contas do


Estado de Goiás – no legítimo exercício do controle externo, de previsão constitucional
–, o qual foi subsidiado por orientações contidas nas Instruções Técnicas n. 16/2023 e n.
21/2023 (cópias anexas), emanadas de unidade técnica especializada deste Tribunal, qual
seja, o Serviço de Fiscalização da Saúde.

Referida Unidade Técnica especializada, por sua vez, se debruçou sobre o caso e
realizou um estudo aprofundado e minucioso da matéria, devido a sua extrema
importância para a sociedade e, ao elaborar a Instrução Técnica Conclusiva n.º 16/2023
– SERVFISC-SAÚDE, chegou à única conclusão possível, no sentido de que os ajustes
firmados com a iniciativa privada para gerenciamento, operacionalização e/ou execução
de ações e serviços de assistência à saúde em unidades públicas, tal qual o que pretende
firmar a SES/GO para gerenciamento do HUGO, configuram a participação
complementar no Sistema Único de Saúde, o que afasta a aplicabilidade da Lei nº
13.019/2014, nos termos do seu art. 3º, IV.

E esse entendimento técnico, Doutos Julgadores, se baseou na interpretação da


legislação regente, na doutrina e na melhor jurisprudência (na verdade, há mais decisões
das Cortes de Contas e do Poder Judiciário contra a utilização da Lei n.º 13.019/2014 para
os ajustes decorrentes dos chamamentos públicos para selecionar entidades para o
gerenciamento, a operacionalização e a execução de ações e serviços de saúde em
unidades hospitalares públicas).

Sobre a temática enfrentada, em reforço ao entendimento firmado pelo Serviço de


Fiscalização da Saúde do Tribunal de Contas do Estado de Goiás, acolhido por este
Conselheiro Relator, existem entendimentos de outros tribunais de contas, do Tribunal de
Contas da União, bem como do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

Deve ser frisado, portanto, que os ajustes firmados com a iniciativa privada para
a gestão, operacionalização e execução dos serviços de assistência à saúde em
unidades públicas configuram a participação complementar (e não preventiva) no
Sistema Único de Saúde, o que afasta a aplicabilidade da Lei 13.019/2014, nos termos
do seu art. 3, inciso IV.

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Conforme aduzido pelo próprio Impetrante, “...a controvérsia reside apenas na
equivocada interpretação jurídica perfilhada pela autoridade coatora.” Ou seja, não há
direito líquido e certo se há divergência acerca da Lei aplicável ao caso em discussão, ou
melhor, existem decisões de outros Tribunais de Contas do país a corroborar a decisão
acoimada de ato coator.

Portanto, o Impetrante faz uso do writ para discutir, de forma inadequada, qual
Lei deve ser aplicada aos chamamentos públicos que foram objeto de controle externo
pelo Tribunal de Contas do Estado de Goiás.

É visível que o Impetrante não logrou êxito em comprovar de plano o seu direito
líquido e certo, não havendo prova pré-constituída, como exige o mandamus. Haveria sim
direito líquido e certo se houvesse Lei assegurando de forma inequívoca a pretensão do
Impetrante, qual seja, de fazer uso da Lei 13.019/2014 como fundamento de chamamentos
públicos para gerenciamento, operacionalização e execução das ações e serviços de saúde.

Tanto é assim que o Estado de Goiás abre tópico específico (III – Breve
Contextualização. Cenário Fático Subjacente À Legítima Escolha Pública De Adoção
Do Regime Da Lei Nº 13.019, De 31 De Julho De 2014) na exordial, na tentativa de
justificar a inovação quanto à adoção do regime da Lei n. 13.019/2014 – que traz o
instrumento do Termo de Colaboração –, nos chamamentos públicos mais recentes
envolvendo o gerenciamento, operacionalização e execução das ações e serviços de
saúde.

Ora, se o próprio Impetrante aduz expressamente que fazia uso do instrumento de


contrato de gestão – previsto na Lei n. 15.503, de 28 de dezembro de 2005 e,
posteriormente, na Lei n. 21.740, de 29 de dezembro de 2022 –, nas contratações cujo
objeto era a gestão privada de hospitais públicos, e que, recentemente, tem se aventurado
em fazer uso da lei que versa sobre o Termo de Colaboração, não há que se falar em prova
pré-constituída e tampouco em violação a direito líquido e certo por parte do Tribunal de
Contas do Estado de Goiás.

Nesse sentido, há vasta jurisprudência desse egrégio Tribunal de Justiça:

EMENTA: REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL.


MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. ICMS.
TRANSFERÊNCIA DE MERCADORIAS ENTRE
ESTABELECIMENTOS DE MESMA TITULARIDADE.
AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA QUANTO À
TITULARIDADE DO ESTABELECIMENTO E NECESSIDADE DE

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TRANSFERÊNCIA DAS MERCADORIAS PERTENCENTES AO
IMPETRANTE. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. EXTINÇÃO
DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. 1. Consoante
o entendimento jurisprudencial perfilhado pelo Supremo Tribunal
Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça, no âmbito do ARE nº
1255885, ADC 49 e REsp nº 1125133, processado sob o rito dos
recursos repetitivos, não constitui fato gerador do ICMS o simples
deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos de mesma
titularidade. 2. Não restando demonstradas, por meio de prova pré-
constituída, a titularidade do estabelecimento e a necessidade de
transferência das mercadorias que pertencem ao impetrante para outro
estabelecimento, sem ser por ato de mercância, a extinção do processo,
sem resolução do mérito, em virtude da inadequação da via eleita é
medida que impõe, haja vista que o mandado de segurança não
comporta dilação probatória. 3. REMESSA NECESSÁRIA E
APELO CONHECIDOS E PROVIDOS. SENTENÇA REFORMADA.
(TJGO, 5134462-52.2022.8.09.0051, 7ª Câmara Cível, Relator Des.
Sebastião Luiz Fleury). (grifo nosso).

Portanto, o mandado de segurança não é a via processual adequada para a tutela


do direito do Impetrante, que deve ser materializado em uma ação de conhecimento, em
observância ao devido processo legal. Logo, ante a inadequação da via eleita, impõe-se a
consequente extinção do processo, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485,
VI, do Código de Processo Civil.

3. DA DECISÃO ADOTADA NO PROCESSO DE CONTROLE, A


CARGO DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE GOIÁS

O Tribunal de Contas do Estado de Goiás, órgão de extração constitucional,


tem suas competências definidas no art. 71, da Magna Carta de 1988, que, em suma,
envolvem o controle externo da gestão administrativa e dos gastos públicos.

Tais atribuições estão, também, definidas no art. 26, da Constituição Estadual,


repetindo a norma federal.

A matéria objeto da demanda está afeta às atribuições do Tribunal de Contas do


Estado de Goiás, conforme previsão contida no art. 26, da CE:

"Art. 26 -Ao Tribunal de Contas do Estado compete:

V - fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pelo


Estado, mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos

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congêneres, à União, a outros Estados, ao Distrito Federal ou a
Municípios;"

Já o art. 1º, inc. VII, da Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de Goiás
(Lei n.16.168/2007), prevê, mais especificamente, a competência do Tribunal para
fiscalizar demais tipos de ajustes, verbis:

"Art. 1º Ao Tribunal de Contas do Estado de Goiás, órgão de controle


externo. nos termos das Constituições Federal e Estadual e na forma
estabelecida nesta Lei, compete:
(...)
VII - fiscalizar os procedimentos licitatórios, contratos, incluindo
os de gestão, parceria público-privada, termos de parceria ou
instrumentos congêneres, convênios, ajustes ou termos, envolvendo
concessões, cessões, doações, autorizações e permissões de qualquer
natureza, a titulo oneroso; ou gratuito, de responsabilidade do Estado,
por qualquer de seus órgãos ou entidades da administração direta ou
indireta;"

A fiscalização e a consequente decisão monocrática deste Conselheiro,


enquanto membro do Tribunal de Contas do Estado de Goiás, encontra guarida legal,
portanto, legítima. Isso porque a matéria objurgada encontra-se afeta às atribuições
da Corte de Contas, cujo mérito não pode ser adentrado por órgão do Poder Judiciário.
Apenas vícios de ordem formal, segundo a jurisprudência, podem ser levados à
discussão judicial, sob pena de invasão de competência.

Não há que se falar em substituição do administrador público a decisão


decorrente de procedimento de fiscalização legitimamente instaurado. O Tribunal de
Contas não tem a intenção de substituir o gestor, mas de orientá-lo a executar suas
ações conforme determina a legislação. Ora, se a irregularidade é latente, deve o
Tribunal de Contas atuar para afastá-la, e não ser conivente, sob pena do prejuízo ser
maior que o benefício.

Portanto, se o Tribunal de Contas se depara com indícios de ilegalidade na


ação administrativa, tem o dever de atuar preventivamente para estanca-la. E, nos
termos da função atribuída ao Tribunal de Contas, tem ele o dever de orientar a
atuação do administrador (funções pedagógica e orientativa). Neste caso, o Tribunal
de Contas não está se imiscuindo no mérito administrativo, mas zelando pela
observância do princípio da legalidade que poderá ser vulnerado.

A atuação do Tribunal de Contas respeitou o devido processo legal (atuação


de ofício, análise técnica, contraditório, decisão cautelar, intimação), não havendo se

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falar em vícios de ordem procedimental, passíveis de controle judicial. O mérito do
processo é que foi levado à discussão no Poder Judiciário, matéria esta afeta ao
controle a cargo do Tribunal de Contas, conforme delimitou a Constituição Federal
de 1988.

É certo que, como bem ressaltado, a atuação do Tribunal de Contas, como


defensor da estabilidade das regras e dos contratos e da eficiência, não pode omitir-
se, pois tem a obrigação, o poder-dever de realizar o complexo de atribuições
previstas no artigo 71 da CR/88. E assim agiu o Tribunal de Contas do Estado, sob a
Relatoria deste Conselheiro, ao expedir a cautelar para suspender os chamamentos
públicos eivados de vícios de legalidade.

Insta ressaltar que a cautelar poderia ter sido concedida inaudita altera parte, com
fundamento no §1º, do art. 324, do Regimento Interno do TCE/GO1 mas, por prudência,
decidiu este Conselheiro Relator ouvir antes a parte ora Impetrante, reforçando, assim, o
devido processo legal. Ocorre que a tese argumentativa trazida pelo Impetrante não
convenceu nem a Unidade Técnica especializada do Tribunal de Contas, nem este
Conselheiro Relator, que decidiu por exarar a decisão cautelar aqui fustigada.

Continuando, trata-se a matéria submetida ao controle externo de atividade


da competência constitucional dos tribunais de contas, cujo mérito é insindicável,
portanto, ao Poder Judiciário.

Cumpre registrar, por oportuno, que o Tribunal de Contas atuou no seu


REGULAR EXERCÍCIO DO CONTROLE EXTERNO. A medida de cunho
acautelatório adotada pelo Tribunal de Contas do Estado de Goiás, seja de ordem
monocrática ou colegiada, foi no estrito cumprimento de sua missão constitucional de
exercer o controle externo, fiscalizando os atos e as contratações públicas sob o prisma
da legalidade, economicidade e eficiência.

Ressalte-se que esta Corte de Contas possui em seus quadros profissionais


de alta capacidade técnica, extremamente especializados e preparados para o

1
Art. 324. O Tribunal de Contas do Estado, sempre que houver risco de dano irreparável ou de difícil
reparação para o interesse público, de fundado receio de grave lesão ao erário ou a direito alheio ou risco
de ineficácia da decisão de mérito, poderá, de ofício ou mediante provocação, motivadamente, determinar
medidas cautelares, nos termos estabelecidos neste Regimento, determinando, entre outras providências, a
suspensão do ato ou do procedimento questionado, até que o Tribunal decida sobre o mérito da questão
suscitada.
§1° A medida cautelar de que trata o caput deste artigo poderá ser adotada sem a oitiva do fiscalizado ou
dos interessados, admitida inclusive a determinação de afastamento temporário do responsável, se houver
indícios suficientes de que possa retardar ou embaraçar a realização de auditoria, inspeção ou outro
procedimento de fiscalização do Tribunal, provocar novos danos ao Erário ou inviabilizar o ressarcimento.

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exercício de seu mister, de modo que todas as decisões tomadas pela Corte de Cotas,
seja em caráter cautelar ou definitivo, são respaldadas por instruções e pareceres de
suas unidades técnicas, que levam em consideração as especificidades técnicas
de cada caso.

A atividade de controle externo é atribuída constitucionalmente ao Tribunal


de Contas. A jurisprudência é uníssona no sentido de não ser cabível a intervenção do
Poder Judiciário em assuntos afetos ao Tribunal de Contas, em questões que dizem
respeito ao mérito administrativo de atuação da Corte de Contas. Nesse sentido,
decidiu o Supremo Tribunal Federal:

"AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO.


INTERPOSIÇÃO EM 23.04.2020. ADMINISTRATIVO. EX-
PREFEITO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DESCUMPRIMENTO.
PENALIDADE PECUNIÁRIA IMPOSTA. NEGATIVA DE
REGISTRO DE APOSENTADORIAS DE SERVIDORES
PÚBLICOS. CONTROLE EXTERNO PELO TRIBUNAL DE
CONTAS. DISCUSSÃO SOBRE A LEGALIDADE DO ATO.
MÉRITO ADMINISTRATIVO. REVISÃO PELO PODER
JUDICIÁRIO. ART 5°, XXXV, DA CF. IMPOSSIBILIDADE.
AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER.
REEXAME DE FATOS E PROVAS E DE LEGISLAÇÃO
INFRACONSTITUCJONAL. OFENSA REFLEXA. SÚMULA 279
DO STF. [...] 2. A atuação do Poder Judiciário no controle do ato
administrativo só é permitida quanto tal ato for ilegal ou abusivo,
sendo-lhe defeso qualquer incursão no mérito administrativo.
Precedentes. 3. Não cabe, no âmbito do recurso extraordinário,
corrigir eventual injustiça da decisão dos Tribunais de Contas. [...]
(STF -AgR RE: 1222222 RS-RJO GRANDE DO SUL 0065356-
68.20/9.8.21.7000, Relator: Min. EDSON FACHIN, Data de
Julgamento: 29/06/2020, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-
172 08-07-2020)."

Para Maria Sylvia Zanella di Pietro2:

"[...] não se pode colocar a decisão proferida pelo Tribunal de Contas


no mesmo nível que uma decisão proferida por órgão integrado à
Administração Pública. Não teria sentido que os atos controlados
tivessem a mesma força dos atos de controle. Pode-se afirmar que a

2
PlETRO. Maria Sylvia Zanella Di. Coisa julgada - aplicabilidade a decisões do Tribunal de Contas da
União. Revista do TCU. Nº• 70, 1996.

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decisão do Tribunal de Contas, se não se iguala à decisão jurisdicional,
porque está também sujeita a controle pelo Poder Judiciário, também
não se identifica com a função puramente administrativa. Ela se coloca
a meio caminho entre uma e outra. Ela tem fundamento constitucional
e se sobrepõe à decisão das autoridades administrativas qualquer que
seja o nível em que se insiram na hierarquia da Administração Pública,
mesmo no nível máximo da Chefia do Poder Executivo. "

O TRF-5 (Apelação n.º 0800612-18.2015.4.05.8401, Rel. Des. Cid Marconi)


também já se posicionou sobre essa questão, e entendeu pela impossibilidade de o
Judiciário adentrar nas matérias afetas ao controle externo, veja-se:
"Por tal razão, é forçoso concluir pela impossibilidade de o Poder
Judiciário rever o mérito da decisão do Tribunal de Contas da União
proferida no exercício da competência prevista no art. 71, inciso II, da
Constituição Federal, sob pena de se esvaziá-la, frustrando o comando
contido no dispositivo constitucional citado.

Vale ressaltar que a regra do art. 5 inciso XXXV, da CF/1988, segundo


o qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça a direito". é dirigida, claramente, ao legislador
infraconstitucional, o que não impede, portanto, que a própria
Constituição, na distribuição das competências, atribua a função
jurisdicional a órgão não integrante do Poder Judiciário, por meio de
regra da mesma hierarquia da transcrita.
receio de grave Lesão ao erário ou a direito alheio ou risco de
ineficácia da decisão de mérito, poderá, de oficio ou mediante
provocação, motivadamente, determinar medidas cautelares, nos
termos estabelecidos neste Regimento, determinando, entre outras
providências, a suspensão do ato ou do procedimento questionado,
até que o Tribunal decida sobre o mérito da questão suscitada.”

Conforme ressaltado acima, o §1° do art. 324, do Regimento Interno do


TCE/GO traz, ainda, a previsão de concessão da medida sem a necessidade de prévia
oitiva do fiscalizado ou dos interessados, senão vejamos:

"§ 1º A medida cautelar de que trata o caput deste artigo poderá ser
adotada sem a oitiva do fiscalizado ou dos interessados, admitida
inclusive a determinação de afastamento temporário do responsável,
se houver indícios suficientes de que possa retardar ou embaraçar
a realização de auditoria, inspeção ou outro procedimento de
fiscalização do Tribunal, provocar novos danos ao Erário ou
inviabilizar o ressarcimento.

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O poder geral de cautela dos Tribunais de Contas, a despeito de estar previsto
tanto em suas respectivas Leis Orgânicas quanto em seus Regimentos Internos, é
também reconhecido pelo STF, conforme manifestou o Ministro Celso de Mello, ao
relatar o MS 24.51O-7/2003, que reconheceu esse poder ao Tribunal de Contas da
União, aplicado aos demais Tribunais de Contas do Brasil, por comando do art. 75
da Constituição Federal.

No âmbito do TCE-GO, o poder geral de cautela está previsto no inciso VIII


do art. 26 da Constituição do Estado de Goiás, na Lei nº l6.168/2007(LOTCE/GO) e
no Regimento Interno, nos dispositivos supracitados.

Em suas ações e procedimentos de fiscalização os Tribunais de Contas devem


atuar elaborando o seu juízo de valor levando em conta o aspecto da legalidade (por
exemplo: observância da Constituição, da Lei de Responsabilidade Fiscal, da Lei de
Licitações e Contratos, da lei que rege os contratos de gestão, da lei que rege os termos
de colaboração, das leis que regem outros ajustes, das Leis Orçamentárias, dos editais
de concurso, dos editais de licitações e dos editais de chamamentos, das contratações
diretas, etc) da legitimidade (observância do interesse público) e da economicidade
(relação custo-beneficio e preços razoáveis).

Constatada a ilegalidade na prática do ato ou procedimento, o Tribunal de


Contas deverá adotar as medidas previstas na Constituição. No caso em análise, é o
que dispõe o inciso VIII do art. 26 e seus§§1º e 2°, da Constituição do Estado de Goiás.

Neste caso, o Tribunal de Contas deverá "assinar prazo para que o órgão ou
entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada
ilegalidade "; primeira parte, nos expressos termos do inciso VIII do art. 26 da
Constituição Estadual. Se não atendido, poderá sustar a execução do ato impugnado,
comunicando a decisão à Assembleia Legislativa; segunda parte do mesmo inciso e
artigo.

No caso específico, a cautelar foi adotada por este Conselheiro, em decisão


monocrática (que posteriormente seria submetida ao referendo do Tribunal Pleno),
para o fim de impedir temporariamente (até a análise do mérito) a realização de
chamamentos públicos instaurados pela Secretaria de Estado da Saúde, destinados a
seleção de Organização da Sociedade Civil (OSC) para o gerenciamento, a
operacionalização e a execução de ações e serviços de saúde em unidades
hospitalares públicas, com base na Lei n.º 13.019/2014. Isso diante de possível

Tribunal de Contas do Estado de Goiás


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ilegalidade na utilização da referida lei, haja vista sua inaplicabilidade para o caso.

A atuação deste Conselheiro, haja vista a ilegalidade prestes a se consumar,


buscou atender, precipuamente, ao interesse público, considerando que a fragilidade
dos requisitos previstos na lei nº 13.019/2014 para a seleção de OSC para gerir
unidades de saúde públicas, considerando que o prejuízo para os serviços de saúde
podem ser bem maiores que os benefícios que a Administração Pública pretende
auferir com a entrega dos referidos serviços a tal entidade privada.

Portanto, tem-se que a cautelar foi adotada em conformidade com as previsões


legais, não havendo se falar em ilegalidade.

4 - DO CASO FUSTIGADO - DA UTILIZAÇÃO DE LEI INADEQUADA


PARA A REALIZAÇÃO DE CHAMAMENTOS PÚBLICOS

O processo de controle externo, a cargo do Tribunal de Contas do Estado de


Goiás (autos administrativos n.º 202300047002207), foi instaurado com fundamento
no art. 26, inc. V, da Constituição do Estado de Goiás que dispõe que:

"Art. 26 - Ao Tribunal de Contas do Estado compete:


(...)
V - fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pelo
Estado, mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos
congêneres, à União, a outros Estados, ao Distrito Federal ou a
Municípios:"

No caso, a partir de informações midiáticas de que o Governo do Estado de


Goiás, por meio da Secretaria de Estado da Saúde, teria publicado o Edital de
Chamamento Público nº 01/2023, para selecionar Organização da Sociedade Civil
(OSC), com contrato a ser firmado no valor mensal estimado de R$ 21.322.433,06,
sendo de R$ 255.869.196,72 para um contrato de 12 (doze) meses, e estimado global
de R$ 767.607.590,16, para um período de 36 (trinta e seis) meses de vigência da
parceria, este Conselheiro entendeu por bem fiscalizar o procedimento, haja vista os
indícios de ilegalidade que circundavam o ato.

A justificativa para a solicitação do Edital de Chamamento Público foi no


sentido de que, conforme dispõe o §2° do art. 263 do Regimento Interno do Tribunal
de Contas do Estado de Goiás, para os fins das ações de controle externo de sua
competência, com o objetivo de priorizar e individualizar os objetos a serem

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fiscalizados, o contrato a ser firmado em decorrência do Edital de Chamamento
Público nº 01/2023 enquadrar-se-ia nos critérios de oportunidade (pertinência de se
realizar a ação de controle), materialidade (volume de recursos que o objeto de
controle envolve) e relevância (o objeto de controle envolve questões de interesse da
sociedade, que estão em debate público e são valorizadas).

Chegando as informações e documentos no Tribunal de Contas, foram


encaminhados à Unidade Técnica especializada em assuntos da saúde (Serviço de
Fiscalização da Saúde), para analisar e propor as medidas adequadas.

Referida Unidade Técnica especializada, por sua vez, como já dito acima, realizou
um estudo aprofundado e minucioso da matéria, devido a sua extrema importância para a
coletividade, e, ao elaborar a Instrução Técnica Conclusiva n.º 16/2023 – SERVFISC-
SAÚDE (cópia em anexo), chegou à única conclusão possível, no sentido de que os
ajustes firmados com a iniciativa privada para gerenciamento, operacionalização e/ou
execução de ações e serviços de assistência à saúde em unidades públicas, tal qual o que
pretende firmar a SES/GO para gerenciamento do HUGO, configuram a participação
complementar no Sistema Único de Saúde, o que afasta a aplicabilidade da Lei nº
13.019/2014, nos termos do seu art. 3º, IV.

Também, no mesmo relatório técnico, a Unidade competente sugeriu que fosse


adotada medida cautelar inaudita altera parte, visando suspender a realização do
Chamamento Público nº 01/2023-SES/GO, bem como de outros que se enquadrassem na
mesma situação (Chamamentos Públicos nº 02/2023-SES/GO e 03/2023-SES/GO), com
determinação para se observar os ditames da Lei estadual n.º 21.740/2022 (lei das
Organizações Sociais da Saúde – OSS), com vistas à celebração de contrato de gestão
com organização social devidamente qualificada.

E esse entendimento técnico, Excelência (e não político), conforme já repisado


nesta oportunidade, se baseou na legislação vigente, na doutrina e na jurisprudência (TC’s
e judicial) contra a utilização da Lei n.º 13.019/2014 para os ajustes decorrentes dos
chamamentos públicos para selecionar entidades para o gerenciamento, a
operacionalização e a execução de ações e serviços de saúde em unidades hospitalares
públicas).

Com a devida prudência, zelo e sensibilidade que este Conselheiro Relator sempre
teve com a gestão pública, decidi por bem, não atendendo a proposta da Unidade Técnica
para conceder a cautelar sem a oitiva da parte contrária, dar a oportunidade de comunicar
o fato ao órgão jurisdicionado, com o fim de ouvi-lo a respeito.

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Contudo, a documentação trazida aos autos após o contraditório, inclusive, após
algumas reuniões realizadas no Gabinete do Conselheiro Relator, com o Sr. Secretário de
Saúde e o Procurador Setorial e, posteriormente, com o Procurador-Geral do Estado, não
foi suficiente para alterar o entendimento técnico, razão pela qual a Unidade competente
manteve seu posicionamento, no que tange à expedição da cautelar necessária para
suspender os Chamamentos Públicos realizados com base na Lei n.º 13.019/2014.

Com base nesse entendimento de ordem técnica, firmado pelo setor competente
(Serviço de Fiscalização da Saúde), decidi, prudentemente, portanto, após a oitiva das
autoridades envolvidas, adotar a cautelar para o fim de suspender os atos considerados
ilegais e ilegítimos, até a análise do mérito.

Considero importante colacionar o entendimento a que chegou este Conselheiro,


Relator da matéria no âmbito do Tribunal de Contas do Estado, ao exarar a cautelar objeto
da presente demanda (Despacho n.º 526/2023 – GCEF), sob as seguintes premissas de
ordem técnica:

“(...)
Conclui-se, portanto, dentro do SUS, ainda que o conjunto de
ações e serviços de saúde seja prestado por órgãos e instituições
públicas, toda a atuação da iniciativa privada em atividade
assistencial, qual seja, a promoção, proteção e recuperação da
saúde, é complementar.

Contudo, os instrumentos jurídicos estabelecidos pela Lei nº


13.019/2014, por vontade expressa da Lei, não alcançam as
contratualizações para fomentar as ações de entidades
filantrópicas e entidades privadas sem fins lucrativos que atuam
em complementariedade ao SUS. É o que se depreende do artigo
a seguir transcrito:

Art. 3º Não se aplicam as exigências desta Lei:


[...]

IV - aos convênios e contratos celebrados com entidades


filantrópicas e sem fins lucrativos nos termos do §1º do art. 199
da Constituição Federal.

Dessa forma, conclui-se que os ajustes firmados com a iniciativa


privada para gerenciamento, operacionalização e/ou execução

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de ações e serviços de assistência à saúde em unidades públicas,
tal qual o que pretende firmar a SES/GO para gerenciamento do
HUGO, configuram a participação complementar no Sistema
Único de Saúde, o que afasta a aplicabilidade da Lei nº
13.019/2014, nos termos do seu art. 3º, IV.”(grifos nossos)”

Com esse fundamentos, além de outras considerações relevantes consignadas na


Instrução Técnica Conclusiva nº 16/2023 - SERVFISC-SAÚDE, de 26 de junho de 2023
(cópia anexa), após concluir a análise do edital de Chamamento Público nº 01/2023-
SES/GO e da legislação aplicável à matéria, o Serviço de Fiscalização da Saúde firmou
entendimento de que o ajuste que a Secretaria de Estado da Saúde – (SES/GO) pretende
firmar para gerenciamento, operacionalização e execução das ações e serviços de saúde
em regime de 24 horas/dia, do Hospital de Urgências de Goiás Dr. Valdemiro Cruz
(HUGO), tem caráter de participação complementar ao Sistema Único de Saúde (SUS),
o que afasta a aplicabilidade da Lei nº 13.019/2014, nos termos do inciso IV do art. 3º.

Assim, o mesmo entendimento se aplicaria aos Chamamentos Públicos nº


02/2023-SES/GO, para a gestão do Hospital Estadual da Mulher Dr. Jurandir do
Nascimento – HEMU e nº 03/2023-SES/GO, para a gestão do Hospital Estadual de
Aparecida de Goiânia Caio Louzada – HEAPA, publicados em 16/06/2023, nos mesmos
termos do Chamamento Público nº 01/2023-SES/GO, ora analisado, cuja Lei utilizada
como fundamento para a seleção de entidade de direito privado sem fins lucrativos, para
gestão, operacionalização e execução de serviços assistenciais de saúde em hospitais
públicos estaduais, é também a Lei nº 13.019/2014.

Concluiu a Unidade Técnica especializada, que os termos de colaboração


pretendidos pela Secretaria de Estado da Saúde de Goiás com os instrumentos
convocatórios analisados, amparados nos preceitos da Lei nº 13.019, de 2014, não podem
ser utilizados para formalizar os ajustes de parceria e fomento intencionados, os quais
devem ser regidos pela Lei Estadual nº 21.740, de 29 de dezembro de 2022, sendo o
Contrato de Gestão o instrumento adequado para tal finalidade.

Assim destaquei em minha decisão, conforme o posicionamento da área técnica:

“24. Nota-se, portanto, que o fator determinante para a


aplicação da Lei nº 13.019/014 na área da saúde não é o local
onde os serviços serão prestados, se em unidades hospitalares
próprias do Estado ou se nas instalações particulares, nem a

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forma do ajuste nem, tampouco, a forma do cálculo da
remuneração.

25. O que determina a incidência da referida Lei é tão somente a


natureza da atividade a ser desempenhada. Se assistencial ela
não se aplica, uma vez que é dessa atividade que se trata o art.
199, § 1º da Constituição Federal e, pela norma, afastada em seu
art. 3º, inciso IV. Se a atividade é preventiva ela poderá ser objeto
de termos de colaboração, termo de fomento e acordos de
cooperação, na forma da Lei nº 13.019/2014.”

Sobre a temática enfrentada, em reforço ao entendimento firmado pelo Serviço de


Fiscalização da Saúde do Tribunal de Contas do Estado de Goiás, segue entendimentos
de outros tribunais de contas, bem como do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

Segundo o Tribunal de Contas da União, nos termos do enunciado, extraído do


Acórdão n.º 1.786/2022:

“Acórdão nº 1.786/2022-Plenário (Representação, Relator


Ministro Substituto Weder de Oliveira)
Convênio. Organização social. Assistência à saúde. SUS.
Legislação. Contrato de gestão.
A Lei 9.637/1998, e não a Lei 13.019/2014, é a norma de regência
a ser aplicada aos ajustes cujo objeto envolva parceria e fomento
à atuação do setor privado sem fins lucrativos para a prestação
de serviços de caráter complementar no SUS, sendo o contrato
de gestão a única forma de se firmar a parceria entre as
organizações sociais e o setor público.”

Em 2020, o Tribunal de Contas dos Municípios do Estado da Bahia (TCMBA)


também se manifestou sobre o assunto, em resposta à consulta formulada (cópia anexa):

“A execução de projetos e/ou planos de trabalho, em razão de


celebração de Termos de Colaboração, para a oferta de serviços
em saúde, em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde,
nos diversos equipamentos que compõe a rede municipal, como
Policlínicas, Unidades de Pronto Atendimento, Unidades Básicas
de Saúde, Centros de Acompanhamento Psicossocial, dentre

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outros, é de fato possível e juridicamente permitida?
(Grifamos).”

Na oportunidade, o referido órgão de controle externo assim se posicionou:

“Diante deste arcabouço legislativo, reafirma-se mais uma vez,


que a Lei nº 13.019/2014 não se aplica aos ajustes firmados com
OSC que prestam serviços de internações e ambulatoriais, em
complementaridade ao SUS. Veja-se que a aplicabilidade do
citado diploma legal depende essencialmente da natureza e do
objeto do ajuste, além do tipo de atuação que a OSC
desempenhará na parceria.

Com isto, se a OSC presta serviços assistenciais na área de


saúde, como internações e atendimentos ambulatoriais, cabem os
convênios e contratos, conforme já disposto acima, afastando-se
o regime da Lei nº 13.019/2014, já que, nestas circunstâncias,
ela atue em complementação aos SUS.

Por outro lado, nas hipóteses em que a OSC não se configure


como prestadora de serviço, atuando em ações classificadas
como promoção à saúde, aquelas voltadas para redução de risco
à saúde, tais como: prevenção ao câncer, ao vírus da
imunodeficiência humana (HIV), às hepatites virais, à
tuberculose, à hanseníase, à malária e à dengue; redução da
morbimortalidade em decorrência do uso abusivo de álcool e
outras drogas; e, prevenção da violência, a parceria firmada com
o poder Público será regida pelas normas delineadas na Lei n°
13.019/2014 (sem grifos no original).”

E foi nesse mesmo sentido que, em agosto de 2022, o plenário do TCU se


manifestou:

“38. [...] cumpre observar que a contratação de entidade civil


sem fins lucrativos para gestão compartilhada de saúde não
pode ocorrer por celebração de termo de colaboração, como traz
o Termo de Referência. [...].

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A Lei 13.019/2014 não pode ser aplicada aos ajustes cujo objeto
envolva parceria e fomento à atuação do setor privado sem fins
lucrativos para a prestação de serviços de caráter complementar
no SUS, cuja norma de regência é a Lei 9.637/1998, sendo o
contrato de gestão a única forma de se firmar a parceria entre
organizações sociais e o setor público.”

Recentemente, o Tribunal de Contas da União se deparou com uma representação


do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba (TCEPB), tratando de supostas
irregularidades incidentes no chamamento público realizado pelo município de
Cabedelo/PB, para firmar parceria, por meio de Termo de Cooperação, com Organização
da Sociedade Civil (OSC), para a execução das atividades de saúde do Sistema Único de
Saúde (SUS), com fundamento na Lei n.º 13.019/2014.

Na ocasião, foi adotada medida cautelar pela Corte, para suspender a execução do
chamamento, que não teve continuidade após a concessão da medida.

Instada, a Unidade de Auditoria Especializada em Saúde (AudSaúde), daquela


Corte de Contas Federal, concluiu pela procedência da representação, no mérito, quanto
a irregularidade apontada no Chamamento Público 003/2019, visto que a delegação
proposta nos termos do referido certame não teria amparo no ordenamento jurídico pátrio
(artigo 3º, inciso IV, da Lei 13.019/2014, artigo 199, § 1º, da CF/88 e artigos 24 e 25 da
Lei 8.080/1990). Segue excerto do Acórdão n.º 1005/2023 – TCU, que julgou procedente
a representação:

“1.1. Órgão/Entidade: Prefeitura Municipal de Cabedelo - PB.


1.2. Relator: Ministro Aroldo Cedraz.
1.3. Representante do Ministério Público: não atuou.
1.4. Unidade Técnica: Unidade de Auditoria Especializada em
Saúde (AudSaúde).
1.5. Representação legal: Andre Martins Pereira Neto
(16180/OAB-PB), Mayara Araujo dos Santos (16377/OAB-PB) e
outros, representando Prefeitura Municipal de Cabedelo - PB.

1.6. Determinações/Recomendações/Orientações:

1.6.1. informar à Secretaria Municipal de Saúde de


Cabedelo/PB, com fundamento no art. 9º, inciso I, da Resolução-
TCU 315, de 2020, que o Chamamento Público 003/2019, com
previsão de delegação de serviços de saúde de natureza

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complementar do SUS municipal mediante utilização de
instrumentos de parceria previstos na Lei 13.019/2014, não tem
amparo no ordenamento jurídico pátrio (artigo 3º, inciso IV, da
Lei 13.019/2014, artigo 199, § 1º, da CF/88 e artigos 24 e 25 da
Lei 8.080/1990), sendo o contrato de gestão o instrumento
jurídico adequado para promover parcerias entre o poder
público e a entidade privada sem fins lucrativos, em regime de
mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse
público e recíproco na área de saúde, desde que sejam
observados os requisitos da Lei 9.637/1998 e o disposto na
jurisprudência do TCU, a exemplo do Acórdão 2057/2016 – TCU
– Plenário, da relatoria do Ministro Bruno Dantas;

1.6.2. dar ciência desta deliberação à Secretaria Municipal de


Saúde de Cabedelo/PB e ao Tribunal de Contas do Estado da
Paraíba;

1.6.3. arquivar os presentes autos, nos termos do art. 237,


parágrafo único, c/c o art. 250, inciso I, do Regimento
Interno/TCU.”

Deve ser frisado, portanto, que os ajustes firmados com a iniciativa privada para
a gestão, operacionalização e execução dos serviços de assistência à saúde em
unidades públicas configuram a participação complementar (e não preventiva) no
Sistema Único de Saúde, o que afasta a aplicabilidade da Lei 13.019/2014, nos termos
do seu art. 3, inciso IV.

Ante o exposto, conclui-se que a atuação deste Conselheiro, em decisão


monocrática que, não fosse a liminar judicial, posteriormente seria submetida a
referendo no Plenário da Corte, se deu sob os auspícios da lei e da balizada
jurisprudência, e lastreada na instrução técnica lavrada por corpo técnico competente,
realizando, assim, o devido controle de legalidade dos atos da administração pública.
Não havendo, portanto, que se falar em manifesta ilegalidade.

5. DA DECISÃO ADOTADA PELO CONSELHO ESTADUAL DE


SAÚDE DO ESTADO DE GOIÁS - CES/GO.

Interessa registrar a informação de que o Conselho Estadual de Saúde do


Estado de Goiás - CES/GO, órgão colegiado, deliberativo e de controle social, que

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tem como objetivo a fiscalização, o acompanhamento e o monitoramento das
políticas públicas de saúde no âmbito estadual, cujas obrigações encontram-se
previstas na Lei federal n.º 8.080/904, ainda na data de 01/08/2023, decidiu, em
Plenária, por meio da Resolução n.º 07, de 01 de agosto de 2023, recomendar, ao
Secretário de Estado da Saúde a suspensão dos chamamentos públicos n.º 01/2023,
02/2023 e 03/2023; assim como a SUSPENSÃO de celebração de Termo de
Colaboração, em caráter emergencial, com qualquer organização da sociedade civil -
OSC, nos termos da Lei Federal n.º 13.019/2014.

Conforme consta da Resolução n. 07, de 01 de agosto de 2023 (cópia anexa),


em reunião ordinária realizada em julho de 2023, foram identificadas várias
irregularidades (preocupantes) na implementação da Lei n.º 13.019/2014, para a
gestão da saúde pública do Estado de Goiás, arroladas na referida resolução, tais quais os
problemas identificados pela Unidade Técnica desta Corte, que motivou a decisão
cautelar deste Conselheiro, para suspender os editais de chamamentos públicos.
Inclusive, uma das preocupações apontadas pelo órgão, é no sentido de que o novo
modelo de gestão por "OS" impede a fiscalização pelo Tribunal de Contas do Estado
de Goiás dos repasses financeiros à "OSC" em razão de Termo de Colaboração.

Diante todo o exposto, não há que se falar em ato coator por parte do Conselheiro
Edson José Ferrari.

Sendo essas as informações que tinha a prestar, coloco-me à disposição para


eventuais esclarecimentos adicionais que Vossa Excelência e os demais integrantes da 7ª
Câmara Cível entenderem necessários, pugnando desde já pela extinção do processo,
tendo em vista a inadequação da via eleita, e, eventualmente, pela denegação da
segurança, dada a inexistência de ato ilegal e abusivo por parte deste Conselheiro.

Goiânia, 27 de outubro de 2023.

EDSON JOSÉ FERRARI


Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Goiás

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