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ESTADO DO CEARÁ
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
GABINETE DESEMBARGADOR FRANCISCO DE ASSIS FILGUEIRA MENDES

Processo: 0622346-53.2020.8.06.0000 - Mandado de Segurança


Impetrante: Iolanda Maria Lima Gadelha
Impetrado: Secretário da Educação do Estado do Ceará

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por FRANCISCO DE ASSIS FILGUEIRA MENDES, liberado nos autos em 30/03/2020 às 20:43 .
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA

Trata-se de Mandado de Segurança impetrado por

Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjce.jus.br/esaj, informe o processo 0622346-53.2020.8.06.0000 e código 17C447D.
IOLANDA MARIA LIMA GADELHA contra ato imputado ao GOVERNADOR DO
ESTADO DO CEARÁ e SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO CEARÁ.
Na inicial, a impetrante afirma que é professora aposentada
da rede pública do Estado do Ceará, tento requerido sua aposentação em 29/08/2002,
com afastamento em 12/12/2002, e publicação do ato apenas 02 anos depois (ou seja,
em 17.01.2005), contudo, em razão do ato de aposentação afirma que a Administração
Pública procedeu com a revisão de seu ato ocasionando decesso remuneratório em
seus proventos.
Sustenta, em que pese o poder da autotutela da
Administração Pública em desfazer sues próprios atos, no caso em voga, não se
perfaz de razoabilidade um ato administrativo que anula ato de aposentadoria sem que
a mesma seja cientificada dos extratos efeitos do cancelamento de sua aposentadoria
limitando-se a Secretaria de Educação a cumprir determinação do Tribunal de Contas
do Estado, em desrespeito ao princípio do contraditório e da ampla defesa, vez que foi
o próprio Poder Público que a afastou das funções e concedeu sua aposentadoria.
Alega estarem presentes os requisitos para a concessão da
medida liminar, pois tem direito adquirido a manutenção do valor da remuneração
recebida no momento em que passou para a inatividade, haja vista não ter sido
respeitados os princípios da ampla defesa e contraditório.
Por fim, requer que as autoridades coatoras procedem com
a sustação de seu ato de aposentadoria, assegurando a impetrante manutenção
original de seus proventos, suspendendo a nova base de cálculos do benefício da
autora, datado de agosto de 2016, mantendo-se a base de cálculo de seu ato original
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de aposentação, pois, ilegal sua anulação sem o devido processo legal.
Documentação às fls. 31/205.

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É o relatório. Decido.
Cabe enfatizar, neste ponto, que o deferimento da medida
liminar, resultante do concreto exercício do poder cautelar geral outorgado aos juízes e
Tribunais, requer a observância do disposto no inciso III, do artigo 7º, da Lei n.
12.016/09 que prevê, como requisitos, (a) o fundamento relevante e (b) possibilidade

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de ineficácia da medida caso seja finalmente deferida, pelo Órgão Especial, o que
implica apreciar o fumus boni iuris e o periculum in mora.
Sem que concorram esses dois requisitos - que são
necessários, essenciais e cumulativos -, não se legitima a concessão da medida
liminar.
In casu, busca o impetrante em sede de liminar o
deferimento do pedido de tutela provisória de urgência, para determinar às autoridades
impetradas que se abstenham de realizar modificações na estrutura de cálculo dos
proventos do impetrante, abstendo-se de praticar qualquer redução nos proventos
independentemente da reformulação do ato de aposentação, determinando a
manutenção da mesma estrutura remuneratória implantada nos contracheques em
17.01.2005.
O fundamento relevante e a possibilidade concreta de que a
eficácia da medida reste comprometida se deferida tão somente ao fim da demanda,
portanto, são os requisitos que devem estar presentes para a concessão da liminar
inaudita altera pars, nos termos do que requer o impetrante.
A verossimilhança a ser exigida pelo julgador, por sua vez,
deve sempre considerar o valor do bem jurídico ameaçado de lesão; a dificuldade de
se provar o alegado; a credibilidade, de acordo com as regras de experiência da
alegação; e a própria urgência.
Após análise dos autos, em mirada perfunctória, resta
configurado o fundamento relevante, haja vista a modificação da estrutura de cálculo
de sua aposentadoria sem a observância do devido processo legal.
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Não se questiona o direito e o dever que a Administração
Pública tem de rever os seus próprios atos eivados de vícios que os tornem ilegais,

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visto que isso decorre do poder de autotutela, tendo a matéria já sido sumulado pelo
Supremo Tribunal Federal, in verbis:
SÚMULA Nº 346 – A Administração Pública pode declarar a nulidade dos
seus próprios atos.
SÚMULA nº 473 – A Administração pode anular seus próprios atos,
quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se
originam direitos, ou revogá-los, por motivo de conveniência ou

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oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos
os casos, a apreciação judicial.
O que se verifica, é que o poder de autotutela não pode ir
em confronto ao devido processo legal, devendo sempre ser assegurado o direito
ao contraditório e à ampla defesa àquele que venha a ter situação jurídica alterada em
função de revisão de ato administrativo.
No caso em comento, os direitos constitucionais
estabelecidos no inciso LV do art. 5º da Constituição Federal de 1988, incluem garantir
a autora o conhecimento prévio da revisão, assegurando-lhe oportunidade de se
manifestar, visto que o ato administrativo implicará em considerável abatimento de
seus proventos.
Assim, merece ser acolhido o pleito em análise, pois,
segundo a jurisprudência pacificada do Supremo Tribunal Federal, a supressão, pela
Administração, de parcela constante dos proventos de servidor deve ser precedida de
regular procedimento no qual assegurado o contraditório e a ampla defesa.
Precedente: recurso extraordinário nº 594296, relatado pelo ministro Dias Toffoli,
julgado no Pleno sob a sistemática da repercussão geral, acórdão publicado no Diário
da Justiça de 13 de fevereiro de 2012 (RE 1077219 AgR/SC – Agravo Regimental no
Recurso Extraordinário, Relator o Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma,
julgado em 05/12/2017, Dje 22/02/2018).
Neste sentido:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE
SEGURANÇA. DECADÊNCIA. PRELIMINAR REJEITADA. SERVIDORA
APOSENTADA. REDUÇÃO ABRUPTA DOS PROVENTOS. AUSÊNCIA
DE PRÉVIO PROCESSO ADMINISTRATIVO. AFRONTA AO
CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. CONSTATAÇÃO.
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PARÂMETROS ESPECIFICADOS NO TÍTULO JUDICIAL. DIREITO
LÍQUIDO E CERTO EVIDENCIADO. SEGURANÇA CONCEDIDA. 1.A
tese de configuração da decadência não merece prosperar, pois há nos
autos demonstração de que a diminuição salarial somente se concretizou

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em setembro/2017. Logo, o writ impetrado em 10/11/2017 não foi
alcançado pelo citado instituto. Ademais, a Ação Mandamental foi
ajuizada para combater a redução da aposentadoria, que vem se
perpetrando ao longo do tempo, circunstância esta que configura relação
de trato sucessivo e enseja a conclusão de que o prazo decadencial da
impetração se renova mês a mês. Preliminar rejeitada. 2.A noticiada e
abrupta redução dos proventos da aposentadoria, sem qualquer
processo administrativo prévio, configurou arbitrariedade que

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merece controle pelo Poder Judiciário, pois atingiu a esfera jurídica
da servidora sem que lhe fossem assegurados o contraditório e a
ampla defesa. 3. Não se discute a possibilidade de a Administração,
em atenção ao princípio da autotutela, rever seus próprios atos
supostamente eivados de ilegalidade, ou mesmo fazer quotmutirão
para detectar eventuais situações irregulares. Entretanto, o respeito
ao devido processo legal deve ser observado, já que o ato
combatido gerou efeito concreto e repercutiu no interesse da
servidora inativa que foi surpreendida com a alteração na forma de
cálculo dos seus proventos, os quais estavam sendo percebidos há
mais de 2 anos. 4.Registre-se, outrossim, que o título judicial transitado
em julgado é claro ao especificar que o piso salarial aplicável deve
corresponder a 8,75 salários mínimos, inclusive a própria Procuradoria
Geral do Estado reconheceu esse parâmetro ao implantar o benefício em
2011. 5.Liminar ratificada e segurança concedida. ACÓRDÃO
ACORDAM os Desembargadores integrantes do ÓRGÃO ESPECIAL
deste e. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ, por
unanimidade, em afastar a preliminar e conceder a segurança
requestada, nos termos do voto do relator, parte deste. Fortaleza, 28 de
novembro de 2019.
(Relator (a): ANTÔNIO ABELARDO BENEVIDES MORAES; Comarca:
Foro Unificado; Órgão julgador: N/A; Data do julgamento:
28/11/2019; Data de registro: 28/11/2019)
CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE
SEGURANÇA. REVISÃO DE APOSENTADORIA. ATO UNILATERAL
DA ADMINISTRAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE PRIVAÇÃO DOS BENS
DO DEVEDOR SEM O DEVIDO PROCESSO LEGAL. AMPLA DEFESA
E CONTRADITÓRIO. ART. 5º, LIV E LV, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL/88. VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. CARÁTER
ALIMENTAR. IRREPETIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1. A
Administração Pública pode, a qualquer tempo, rever os seus atos
para cancelar ou suspender benefício previdenciário que foi
concedido irregularmente, desde que o faça mediante procedimento
administrativo que assegure ao beneficiário o devido processo
legal. 2. Não pode a autarquia previdenciária, ainda que sob a alegação
de estar corrigindo erro administrativo ou fraude, cancelar aposentadoria
por tempo de contribuição do impetrante sem oportunizar o prévio
contraditório e a ampla defesa. 3. Não havendo prova de observância do
devido processo legal e da ampla defesa, merece ser prestigiada a
sentença que determinou o restabelecimento do benefício do autor até o
exaurimento do processo na esfera administrativa. 4. Na hipótese, a
Administração revisou o benefício da parte autora sem oportunizar à
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parte interessada o contraditório e a ampla defesa, garantias inerentes ao
devido processo legal. 5. Apelação do INSS e remessa oficial
desprovidas. (TRF-1 - AMS: 00367654320074013400, Relator:
DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, SEGUNDA

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TURMA, Data de Publicação: 08/11/2018).
Igualmente, há possibilidade concreta que a eficácia da
medida reste comprometida, se deferida só ao fim da demanda, porquanto o ato de
reforma implicará na redução dos vencimentos do impetrante, verba de natureza
alimentar.

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Outrossim, ainda, em mirada primeira, verifica-se a
impossibilidade neste azo da modificação/reformulação do ato de reserva remunerada,
através do exercício do poder da autotutela administrativa, pois como sabença, para a
administração pública, o quinquênio é lustro prescricional básico para revisão ex
officio de seus atos.
Quanto ao tema, o Supremo Tribunal Federal aduz que “a
inércia da Corte de Contas, por mais de cinco anos, a contar da aposentadoria,
consolidou afirmativamente a expectativa do ex-servidor quanto ao recebimento de
verba de caráter alimentar. Esse aspecto temporal diz intimamente com: a) o princípio
da segurança jurídica, projeção objetiva do princípio da dignidade da pessoa humana e
elemento conceitual do Estado de Direito; b) a lealdade, um dos conteúdos do princípio
constitucional da moralidade administrativa (caput do art. 37). São de se reconhecer,
portanto, certas situações jurídicas subjetivas ante o Poder Público, mormente quando
tais situações se formalizam por ato de qualquer das instâncias administrativas desse
Poder, como se dá com o ato formal de aposentadoria. (...) 5. O prazo de cinco anos
é de ser aplicado aos processos de contas que tenham por objeto o exame de
legalidade dos atos concessivos de aposentadorias, reformas e pensões.
Transcorrido in albis o interregno quinquenal, a contar da aposentadoria, é de se
convocar os particulares para participarem do processo de seu interesse, a fim de
desfrutar das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV).
(MS 25116, Relator Ministro Ayres Britto, Tribunal Pleno, julgamento em 8.9.2010, DJe
de 10.2.2011)” (grifos nossos).

Repita-se que no caso dos presentes autos a aposentadoria


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da recorrida se deu em JAN/2005, ao passo que a revisão e os respectivos descontos
passaram a incidir sobre seus proventos no AGOSTO/2016, incontestável o decurso

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temporal de cinco anos para a pretensa “revisão” do ato administrativo complexo de
aposentadoria.

Isto posto, CONCEDO A LIMINAR REQUESTADA, para


determinar a sustação imediata dos efeitos constantes do ofício de fls. 03 que tornou
sem efeito o ato de aposentadoria datado de 10/01/2005 e publicado no DOE em

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17.01.2005, até que se proceda o devido processo legal administrativo, com as
prerrogativas constitucionais, assegurando a Impetrante, até ulterior deliberação, a
manutenção da estrutura de cálculo utilizada quando do ato original de aposentação
datado de 10.01.2005, devendo, portanto a Administração Pública proceder com a
atualização dos proventos de aposentadoria da impetrante com fundamento naquela
estrutura de cálculo original.
Empós, determino, com a devida urgência, a notificação da
autoridade tida como coatora para prestação de informações no prazo decendial,
bem como a intimação do Estado (Pessoa Jurídica) através de sua Procuradoria, de
conformidade com o disposto no inciso, II, do art. 7º, da Lei 12.016/2009, tudo sem
prejuízo de posterior reexame das questões vertidas.
Ato contínuo, ouça-se a douta Procuradoria Geral de Justiça
e, por fim, voltem-me conclusos para julgamento.
Intimem-se.

Exp. Necessários URGENTES.


Fortaleza, 30 de março de 2020
DESEMBARGADOR FRANCISCO DE ASSIS FILGUEIRA MENDES
Relator

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