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Da germinação à dupla fecundação: o enigma da

reprodução em Arabidopsis thaliana

Inês Moura1, Sílvia Coimbra1*

1
Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, Rua do Campo Alegre, s/nº, 4169-007, Porto.
*
Correspondence: scoimbra@fc.up.pt. Tel.: +351220402020

Este artigo foi escrito segundo as diretrizes do MDPI.

Resumo
A nível evolutivo, as angiospérmicas correspondem ao grupo de plantas mais bem
sucedido, devido ao complexo sistema de reprodução, conhecido como dupla fecundação.
Este processo, responsável pela produção de sementes, tem início na germinação do grão
de pólen que ocorre no estigma. Após a formação do tubo polínico, este desenvolve-se e
cresce ao longo dos tecidos femininos até chegar ao seu destino final, o gametófito
feminino, no qual entra através do micrópilo. Desta forma, o tubo polínico liberta as duas
células gaméticas, uma delas funde-se com a célula central e a restante com o ovo, dando
origem ao endosperma e ao embrião, respetivamente. O objetivo deste trabalho teve como
princípio, o estudo do processo de dupla fecundação em Arabidopsis thaliana. Este estudo
foi feito através da coloração dos tubos polínicos com azul de anilina em plantas “wild-
type”, que nos permitiu observar o crescimento e desenvolvimento dos tubos polínicos.
Foi feita também a observação de linhas marcadoras para células gametófitas masculinas
e femininas através de microscopia de fluorescência.

Palavras-chave: dupla fecundação; tubo polínico, grão de pólen, células sinergídeas; azul de
anilina; LAT52; MYB98

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Introdução
Ao contrário dos animais, que produzem gâmetas unicelulares, as plantas apresentam
gerações que alternam entre o esporófito diploide e o gametófito haploide, sendo que
ambos desempenham funções bastante distintas. A produção de esporos haploides é
assegurada pelo esporófito que, através da meiose, origina dois tipos de esporos, os
micrósporos e os megásporos. É no interior dos gametófito, que estes esporos passam por
processos de diferenciação de modo a dar origem aos gâmetas masculinos e femininos.
Nas angiospérmicas, durante a fecundação, o gametófito masculino desenvolve-se dentro
do pistilo e cresce em direção ao micrópilo de modo a libertar as duas células gaméticas
imóveis no gametófito feminino, e ocorrer a dupla fecundação, completando desta forma
o ciclo de vida. Este processo único de dupla fecundação, esta intimamente associado
com o sucesso ecológico e evolutivo das plantas com flor, e com a produção de cultivos
agrícolas que são indispensáveis ao Homem (Hamamura et al., 2012; Higashiyama, 2002;
Higashiyama et al., 2017; Li et al., 2002).

Desenvolvimento do gametófito masculino e feminino

Nas angiospérmicas, tanto o gametófito masculino como o feminino são reduzidos a


estruturas simples constituídos por várias células. Este desenvolvimento dos gametófitos,
é estritamente controlado de modo a permitir a formação adequada do número de células,
polaridade celular e localização nuclear (Borg et al., 2009). Nas plantas com flor, o
desenvolvimento do gametófito haploide masculino (grão de pólen) ocorre dentro de uma
estrutura especializada denominada antera. Para haver um bom desenvolvimento do
pólen, é necessário o correto desenvolvimento das camadas da parede de antera, e um
aumento a nível de crescimento dos quatro lóbulos fundidos aos dois sacos polínicos,
processo este dependente do fornecimento de nutrientes assegurado pelo tapete. O tapete
é uma estrutura bastante importante responsável por este bom desenvolvimento, além
disso sabe-se que a maior parte dos mutantes para esterilidade masculina esta relacionada
com genes específicos do tapete, o que evidencia a relevância do seu papel (Coimbra et
al., 2012). Este desenvolvimento do grão de pólen ocorre em dois processos distintos: a
microsporogénese e microgametogénese. Na microsporogénese, uma célula mãe de pólen
diploide, sofre meiose de forma a produzir uma tétrada de micrósporos haploides. Cada
tétrada, constituída por quatro micrósporos, encontra-se envolvida por uma parede de

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calose. No final da meiose, as paredes externas das tétradas são digeridas de forma a
ocorrer a libertação dos micrósporos individuais, através de uma mistura de enzimas
(endoglucanases e exoglucanases) secretadas pelo tapete (calase). Nas fases posteriores
do desenvolvimento do pólen, dá-se a desintegração do pólen (Huang et al., 2021; Ma,
2005; McCormick, 2004). O processo de microgametogénese começa com a libertação
dos micrósporos das tétradas e leva á formação dos grão de pólen maturos. Após a
libertação, forma-se o vacúolo central, e o núcleo do micrósporo migra para uma posição
periférica (Figura 1A). O micrósporo é submetido a uma divisão celular assimétrica que
dá origem a duas células: a célula vegetativa e a célula generativa. A divisão assimétrica
é essencial para o correto desenvolvimento do gametófito masculino, uma vez que as duas
células resultantes são completamente diferentes em tamanho, função e atividade
genética, características importantes pois conferem estruturas e destinos celulares
distintos (Twell et al., 1998). A célula vegetativa herda a maior parte do citoplasma da
célula do micrósporo, portanto, bastante grande, e envolve completamente as células
generativas. A célula generativa mais tarde sofre uma segunda mitose e origina as duas
células gaméticas (Figura 1A) (Twell, 2011).

Tal como no desenvolvimento do gametófito masculino, o desenvolvimento do


gametófito feminino também decorre no interior de uma estrutura especializada,
denominada óvulo e é constituída por dois processos: megasporogénese e
megagametogénese. O desenvolvimento do óvulo começa com a formação de um
primórdio que à medida que se alonga, dá origem a uma estrutura denominada nucelo.
Durante a megasporogénese a célula arquesporial sofre diferenciação e forma uma célula
mãe diploide (megásporo) que, após meiose, origina quatro megásporos haploides.
Aquando da megagametogénese, dependendo da espécie da planta, um, dois, ou quatro
megásporos, podem participar na formação do gametófito feminino maturo. Em
Arabidopsis, o megásporo mais próximo do tecido materno, torna-se o megásporo
funcional e os restantes sofrem morte celular programada (Figura 1B) (Ma, 2005; Yang
et al., 2010). O megásporo funcional desenvolve-se muito rapidamente ocupando o
espaço deixado pelos restantes megásporos degenerados, posteriormente ocorrem três
rondas de mitose nas quais não se dá a citocinese, dando origem a um saco embrionário
sincício composto por oito núcleos. Segue-se o processo de celularização, responsável
pela produção de sete células, três células antípodas na zona proximal e duas células
sinergídeas e um ovo na zona distal. Os restantes dois núcleos encontram-se no centro do

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citoplasma formando uma grande célula central (Figura 1B) (Liu et al., 2009; Steffen et
al., 2007).

Figura 1- Desenvolvimento do gametófito masculino e feminino nas angiospérmicas. A) Gametófito


masculino. Meiose produz quatro micrósporos; Vacuolização acompanhada de migração nuclear.
O micrósporo divide-se assimetricamente de modo a formar uma grande célula vegetativa e uma
pequena célula generativa. A célula generativa produz duas células gaméticas que mais tarde
movem-se ao encontro do óvulo através do grão de pólen. (B) Gametófito feminino. A célula mãe do
megásporo sofre meiose e produz quatro megásporos haploides; um deles torna-se o megásporo
maturo. Durante o desenvolvimento sofre três rondas de mitose e dá origem a dois grupos de quatro
núcleos nas duas extremidades do gametófito feminino. A celularização gera sete células: um ovo e
duas células sinergídeas na extremidade distal e três antípodas na extremidade proximal. Na célula
central, os dois núcleos migram em direção ao centro e fundem-se. Adaptado de Li at al., (2002)

Crescimento do tubo polínico e percurso até ao óvulo

Antes da formação do tubo polínico, o grão de pólen depara-se com a dificuldade de


adesão física deste, às células papilares do estigma. Se a adesão for bem sucedida, o grão
de pólen necessita de passar por um processo de reconhecimento e consequente
hidratação de modo a realizar-se a germinação. Esta hidratação é providenciada pelo
estigma e pelos revestimentos lipídicos dos grãos de pólen (Lush et al., 1998; Wolters-
Arts et al., 1998). Desta forma, o grão de pólen, responsável pelo transporte de gâmetas
masculinos, origina uma estrutura tubular, denominada de tubo polínico através da
emergência da célula vegetativa. Á medida que o tubo polínico cresce a partir da zona
apical, as células gaméticas e o citoplasma vão sendo transportadas para essa região
através da produção periódica de “plugs” de calose. (Franklin-Tong, 1999) Durante o

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crescimento do tubo polínico, este percorre o tecido de transmissão, extremamente rico
em substâncias (glicoproteínas, polissacáridos e glicolípidos) que se pensa que
promovem e facilitam o crescimento dos tubos polínicos (Figura 2) (Pereira et al., 2021).
Em Arabidopsis, este crescimento através do tecido de transmissão até ao óvulo, pensa-
se ser controlado pelas células sinergídeas. Quando chega ao ovário, o tubo polínico
normalmente cresce até ao funículo, entra no micrópilo do óvulo e eventualmente chega
ao saco embrionário. É sabido que, na ausência das duas células sinergídeas, a atração do
tubo polínico é cessada, e quando apenas uma célula sinergídea está presente, esta
continua a ter capacidades de atração do tubo polínico até ao saco embrionário. Desta
forma, através da produção autónoma de sinais de atração, uma célula sinergídea permite
que o tubo polínico chegue corretamente à entrada do saco embrionário durante a fase
final do seu crescimento (Higashiyama et al., 2001; Higashiyama, 2002). Em 2007, Chen
et al. mostrou que além das células sinergídeas, também outras células do gametófito
feminino poderiam ter um papel importante na orientação do tubo polínico,
nomeadamente a célula central e o ovo, concluindo que para se assegurar o sucesso da
fecundação, são necessários múltiplos sinais do gametófito feminino totalmente maturo.
Em espécies dicotiledóneas, as células sinergídeas secretam moléculas de atração
conhecidas como LUREs, descobriu-se que em Torenia, uma proteína arabinogalactana
(AMOR) derivada de AGPs ovulares, torna os tubos polínicos totalmente competentes
para os péptidos LURE (Coimbra & Gustavo, 2012; Mizukami et al., 2016; Okuda et al.,
2009). Aquando da chegada do tubo polínico ao micrópilo, este interrompe o seu
crescimento, entra pelo aparelho filiforme das células sinergídeas e liberta o seu conteúdo.
Durante este processo, ocorrem inúmeros eventos de comunicação célula-célula, sendo
que a libertação dos gâmetas e a degeneração da sinergídea recetiva, ocorrem quase
simultaneamente. Após a fecundação de ambos os gâmetas femininos, a célula sinergídea
restante funde-se com o endosperma (Dresselhaus et al., 2013; Faure et al., 2002).

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Figura 2- Orientação do tubo polínico no gametófito feminino.
Emergência do tubo polínico a partir do grão de pólen (PG),
crescimento através do tecido de transmissão (TT) e emergência na
superfície do septo (ST) que separa os dois lóculos do ovário. Cada tubo
polínico dirige-se ao óvulo (OV) através da superfície do funículo (FL)
e do micrópilo (MP) do ovulo. Adaptado de Higashiyama et at., (2017)

Dupla fecundação e formação da semente

As angiospérmicas desenvolveram um processo reprodutivo único denominado dupla


fecundação, que consiste na fecundação de dois gâmetas femininos dimórficos por dois
gâmetas masculinos transportados pelo tubo polínico. Este mecanismo permite a rápida
formação de semente mesmo sob condições de seca (Hamamura et al., 2011). Após a
rápida libertação e entrega do conteúdo do tubo polínico no gametófito feminino, as
células gaméticas permanecem imóveis durante um período relativamente grande de 7min
(Figura 3). Após este período de imobilidade, as células gaméticas reiniciam o seu
movimento, de uma forma súbita, e dirigem-se aos núcleos das células gaméticas
femininas. Desta forma, um dos espermatozoides fecunda o óvulo de modo a produzir o
zigoto, e o outro espermatozoide fecunda a célula central, dando origem ao endosperma
(triploide) (Figura 3). Independentemente da ploidia do endosperma, este é um órgão
único preponderante, uma vez que é o pilar nutricional para o correto desenvolvimento
do embrião (Berger, 2011; Faure et al., 2002; Li et al., 2002). Após o sucesso da dupla
fecundação, é importante evitar a atração de tudo polínicos adicionais de modo a prevenir
eventos de polispermia (Figura 4) . Deste modo, pensa-se que existe a secreção de
moléculas repulsoras quando o primeiro tubo polínico entra no micrópilo, no entanto este

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mecanismo molecular permanece desconhecido (Cheung et al., 2001; Dresselhaus et al.,
2013; Hamamura et al., 2012).

Figura 4- Prevenção da polispermia. A correta


fecundação tanto do ovo como da célula central,
induzem a morte da segunda célula sinergídea
(indicada pelas setas), removendo os sinais de
orientação do tubo polínico para a zona do
micrópilo. O sinais de repulsão sobrepõem-se aos
sinais de atração do tubo polínico que ainda
Figura 3- Representação esquemática do comportamento
permanecem, evitando desta forma, a atração de
das células gaméticas durante o processo de dupla
tubos polínicos secundários e a consequente
fecundação em Arabidopsis. O comportamento das células
libertação de células gaméticas. Abreviações:
gaméticas é dividido em três fases. Na primeira fase ocorre
APs, células antipodais; CC, célula central; dSY,
a libertação dos gâmetas. As células gaméticas são
célula sinergídea degenerada; EC, ovo; II,
entregues rapidamente a partir do tubo polínico para o
tegumento interno; SY, célula sinergídea; Z,
gametófito feminino. A segunda fase refere-se à fase de
zigoto. Adaptado de Dresselhaus and Franklin-
imobilidade. Depois da entrega, as células gaméticas
Tong (2013)
permanecem na região entre a célula central e o ovo
durante 7.4 min. Na terceira e última fase, refere-se à
dupla fecundação propriamente dita. Depois do período de
imobilidade ter passado, as células gaméticas fecundam o
ovo e a célula central. Adaptado de Hamamura et., (2013)

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Material e métodos

Material vegetal e condições de crescimento

Sementes de Arabidopsis thaliana Col-0 e os marcadores para as células sinergídeas


(pMYB98::GFP), pólen (pLAT52::GFP e pLAT52::RFP) e pólen e células espermáticas
(pLAT52::GFP-H3.3:mRFP) foram fornecidos pelo laboratório. As plantas foram
diretamente semeadas no solo e foram mantidas em condições de dias longos (16 h de
luz) a 22 ºC com 50-60 % de humidade relativa e intensidade de luz a 180 μmole m2 s.

Preparação de ensaios in vivo para microscopia

Após 24h da emasculação de flores de Arabidopsis “wild-type” (WT) e pMYB98::GFP,


estas foram polinizadas de acordo com os seguintes cruzamentos:

− WT x LAT52::GFP
− WT x LAT52::RFP
− WT x pLAT52::GFP-H3.3:mRFP
− pMYB98::GFP x LAT52::GFP
− pMYB98::GFP x LAT52::RFP
− pMYB98::GFP x pLAT52::GFP-H3.3:mRFP

Cerca de 8-12h depois da polinização os pistilos foram recolhidos e procedeu-se à


eliminação da zona superior e inferior do pistilo. De seguida foi feita uma incisão de
modo a separar o septo e desta forma o conjunto tecido de transmissão-óvulos foram
transferidos para uma lamela para se proceder à visualização.

Coloração dos tubos polínicos com azul de anilina

De modo a realizar a técnica de coloração com azul de anilina, flores polinizadas foram
recolhidas e emasculadas. Desta forma os pistilos foram colocados numa solução fixadora
de etanol/ácido acético glacial (9:1) e deixados ON. Após este período, foram lavados
três vezes com água e colocados numa solução de 1 M NaOH (7,5-8N), durante um dia e
de seguida foram lavados três vezes com água e deixados numa solução de coloração de
azul de anilina (0,1% azul anilina (Acid Blue, Sigma) em 100 ml de K3PO4 0,1 M (0,100
g de azul anilina em 100 ml de H2O com 2,12 K3PO4) durante 12h. Posteriormente fez-
se a análise através de um microscópio Nikon Eclipse CiL.

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Resultados e Discussão

A técnica de coloração dos tubos polínicos com azul de anilina, é bastante utilizada na
análise de mutantes uma vez que, a partir desta, é possível verificar quaisquer tipo de
defeitos desde a germinação do grão de pólen, passando pelo seu crescimento nos tecidos
femininos e terminando o seu percurso no gametófito feminino. Desta forma, de modo a
visualizarmos as várias fase de crescimento e desenvolvimento do tudo polínico, plantas
“wild type” de Arabidopsis thaliana, foram coradas com azul de anilina.

O correto crescimento dos tubo polínicos desde o estigma, é comprovado na figura 5 A,B.
É através do tecido de transmissão que apenas um tubo polínico consegue alcançar o saco
embrionário de modo a permitir o processo da dupla fecundação (figura 5 C,D).

A gpgp B

tp
tp

ov
ov

CC DD

tp

tt tp
ov tp
mi

fufu

ov

Figura 5- Coloração com azul de anilina de flores “wild type” polinizadas. A e B) desenvolvimento dos tubos
polínicos desde o pistilo ao óvulo. C e D) entrada dos tubos polínicos no saco embrionário. Abreviações: gp-
grão de pólen; tp- tubo polínico; ov- óvulo; tt- tecido de transmissão; mi- micrópilo; fu- funículo.

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De forma a observar o processo de dupla fecundação, incluindo o desenvolvimento dos
tubos polínicos e respetivo percurso através dos tecidos femininos, foram utilizadas linhas
marcadoras de Arabidopsis que permite a marcação de células e respetiva visualização
com fluorescência. Sendo assim, inicialmente, pistilos emasculadas de plantas “wild-
type” foram polinizados com três diferentes tipos de pólen com os seguintes construtos:
pLAT52::GFP, pLAT52::RFP e pLAT52::GFP-H3.3:mRFP.

O marcador fluorescente pLAT52::GFP/RFP é específico do pólen. Inicialmente


encontrado no pólen de tomate, o promotor LAT52 regula a expressão nos micrósporos
antes da primeira divisão do pólen (Bate & Twell, 1998; Eady et al., 1994; Muschietti et
al., 1994) . Após a divisão assimétrica dos micrósporos, o marcador é então expresso na
célula vegetativa que mais tarde se desenvolve no tupo polínico. Desta forma, através das
proteínas fluorescentes, é possível fazer o rastreamento do percurso do tubo polínico
desde o estigma, até ao seu destino final, o gametófito feminino.

A adição do marcador H3.3 (HISTONE3) ao construto pLAT52::GFP permite fornecer


mais informações no que respeita os gâmetas masculinos. Após a primeira divisão
assimétrica do pólen, a expressão de H3.3:mRFP fica confinada na célula generativa,
depois da segunda mitose, este marcador acumula-se no núcleo de cada espermatozoide
(Ingouff et al., 2007; Ingouff et al., 2010; Otero et al., 2016). Deste modo, aquando da
germinação do grão de pólen e consequente desenvolvimento do tubo polínico, o
construto pLAT52::GFP-H3.3:mRFP permite a observação do tubo polínico e dos
gâmetas masculinos, através da fluorescência verde e vermelha, respetivamente.

Como é possível observar, o cruzamento entre pistilos “wild-type” e pólen com o


construto pLAT52::GFP-H3.3mRFP, foi efetuado com sucesso, sendo visível os grãos de
pólen (verde)(figura 6 A,D) e as células espermáticas no seu interior (vermelho)(figura 6
C,F). Ainda que se tenha feito o cruzamento de pistilos “wild-type” com pólen
pLAT52::RFP e pLAT5::GFP, nenhum destes teve sucesso no que respeita à marcação
dos tubos polínicos.

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A Wild type X pLAT52::GFP-H3.3:mRFP B Wild type X pLAT52::GFP-H3.3:mRFP
C Wild type X pLAT52::GFP-H3.3:mRFP

cg cg
gp gp

D Wild type X pLAT52::GFP-H3.3:mRFP Wild type X pLAT52::GFP-H3.3:mRFP


E Wild type X pLAT52::GFP-H3.3:mRFP F

cg cg
gp gp

Figura 6- Cruzamento entre pistilos “wild-type” e grãos de pólen com o construto pLAT52::GFP-H3.3mRFP. (A) e (D) Grãos de pólen com a
expressão do pLAT52-GFP na célula vegetativa. Marcador H3.3-mRFP localizado nos núcleos das células gaméticas nos grãos de pólen (B e E).
(C) e (F) Grãos de pólen (fluorescência verde) com as duas células gaméticas (fluorescência vermelha). Os canais para a fluorescência verde,
vermelha e “merged” correspondem às coluna s (A,D), (B,E), e (C,F), respetivamente. Abreviações: gp- grão de pólen, cg- células gaméticas

Após a realização destes cruzamentos de pistilos “wild-type” com as linhas marcadoras


masculinas, procedeu-se ao cruzamento dos mesmos marcadores com a linha marcadora
feminina pMYB98::GF. No contexto em estudo, no gametófito feminino, o MYB98
funciona como um regulador transcricional nas células sinergídeas e ativa a expressão de
genes necessários para o direcionamento do tubo polínico e formação do aparelho
filiforme (Eckardt, 2007; Kasahara et al., 2005; Punwani et al., 2007).
Na figura 7 é retratado o cruzamento pMYB98::GFP com pLAT52::GFP, o sinal da GFP
é evidente através da fluorescência nas sinergídeas. No entanto este sinal não é visível
nos tubos polínicos, indicando que possivelmente nem a polinização nem a fecundação
ocorreram com sucesso.

pMYB98::GFP XX
pMYB98::GFP pLAT52::GFP
pLAT52::GFP pMYB98::GFP X pLAT52::GFP
A B

cs ov

fu

ov

cs

Figura 7- Cruzamento entre pistilos com o marcador sinérgico pMYB98::GFP com grãos de pólen com o marcador
do tubo polínico pLAT52::GFP. É possível observar o sinal GFP nas células sinergídeas (A,B). Abreviações: cs- célula
sinergídea, ov- óvulo, fu- funículo

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No cruzamento com pLAT52::RFP é bem visível o sinal da GFP presente nas células
sinergídeas (figura 8 A,C), no entanto não nos é permitido a observação do tubo polínico
marcado a vermelho através do marcador pLAT52::RFP.

pMYB98::GFP X pLAT52::RFP pMYB98::GFP X pLAT52::RFP


A B pMYB98::GFP X pLAT52::RFP C
B
ov ov

cs cs

Figura 8- Cruzamento entre pistilos com o marcador sinérgico pMYB98::GFP com grãos de pólen com o marcador do tubo polínico
pLAT52::RFP. É possível observar o sinal GFP nas células sinergídeas (A,C), no entanto não se observa o sinal RFP no tubo polínico. Os canais
para a fluorescência verde, vermelha e “merged” correspondem à coluna (A), (B), e (C), respetivamente. Abreviações: cs- célula sinergídea, ov-
óvulo

Como esperado, no cruzamento com o pólen pLAT52::GFP- H3.3:mRFP, é possível


analisar o transporte de células gaméticas pelo tubo polínico em direção às células
sinergídeas. Através da figura 9 C, observa-se a presença dos gâmetas masculinos
(fluorescência vermelha) no interior dos grãos de pólen (fluorescência verde). Na figura
9 I, o tubo polínico apresenta-se no interior do óvulo (fluorescência verde), sendo visível,
além das células sinergídeas, estruturas como o funículo (por onde o tubo polínico entra)
e o tecido de transmissão.

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Conclusão

Nos últimos anos, a investigação na área da reprodução das plantas tem permitido a
descoberta de inúmeros compostos envolvidos no processo reprodutivo. Nas plantas com
flores, este processo único denomina-se dupla fecundação, na qual dois gâmetas
femininos dimórficos são fecundados por dois gâmetas masculinos imóveis,
transportados pelo tubo polínico.
Através de métodos, como a coloração com azul de anilina, podemos acompanhar o
processo de desenvolvimento do tubo polínico, desde a germinação do grão de pólen até
à fase final na qual o tubo polínico entra no saco embrionário. Além disso, também o uso
de linhas marcadoras (proteínas fluorescentes), tanto para as células gametófitas
masculinas como femininas, permite a obtenção de imagens que, por microscopia de
fluorescência, facilitam a deteção de outros tipos de células envolvidas no processo de
dupla fecundação. Não obstante, são necessárias novas ferramentas de forma a avaliar
como é que os espermatozoides são libertados e fundidos, como ocorre a prevenção da
polispermia, como é que a migração dos núcleos gaméticos ocorrem antes da cariogamia,
e todos os detalhes dos eventos que levam à reativação da vida zigótica. Agora, mais do
que nunca, é necessário a compreensão destes processos que culminam na produção de
sementes uma vez que a população mundial continua em constante crescimento e a
demanda de alimentos é exponencial.

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