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NOTÍCIAS

ma
ga-
12 fevereiro 2023 / Número 1603
Esta revista faz parte integrante
do Jornal de Notícias n.º 256/135
e do Diário de Notícias n.º 56180 e não
pode ser vendida separadamente

zi
Médicos
ne
estrangeiros
dão saúde
ao Interior

ma- INSOLVÊNCIA PESSOAL:


PERDER TUDO PARA

gazine
VOLTAR A VIVER

NO POLE DANCE,
O VARÃO É CADA VEZ
MAIS MASCULINO
alma-
naque
O MEU OBJETO
POR Sara Dias Oliveira

SÍLVIA
RIZZO
Atriz
55 anos

“Vivi sempre rodeada de guitarras. Te-


nho quatro, neste momento. É um ins-
trumento que faz parte da minha vida.
Vou tocando, dedilhando, criando e in-
ventando, quando quero, quando me
apetece, quando tenho tempo, quan-
do tenho disponibilidade. Dá-me pra-
zer ouvir o que sai dali. Vou compon-
do e vou viajando entre as cordas.
Lá em casa, tocávamos todos, o meu
pai tocava, nenhum especialista na
arte, tudo de ouvido. Tínhamos esse
gosto. Mas nunca aprendi a tocar gui-
tarra. Digo sempre que fica para depois.
Pode ser que, entretanto, frequente al-
gumas aulas, bases já eu tenho. Por ve-
zes, faço umas pesquisas no YouTube,
improviso um bocadinho e depois é in-
tuitivo. A música também é isso, é in-
tuição.
Tocar guitarra é uma coisa prazero-
sa e que me relaxa. Talvez, um dia,
quem sabe, possa sair alguma coisa des-
te prazer. Quem sabe...” ● m

MÁRIO BAU

Neste momento, Sílvia Rizzo


veste a pele de São Silva
na telenovela “Festa é festa”,
da TVI. É Irene no filme “Biscoito
da fortuna”, de Raphael Vieira,
que vai estrear.

Notícias Magazine 12.02.2023 3


4
BARRAS NA BARRA
HISTÓRIA
DA SEMANA

ELES SÃO CADA VEZ MAIS

lista Sara Oliveira assistiu a


Há cada vez mais homens a
praticar pole dance. A jorna-

aulas e a treinos e falou com


quem se rendeu à modalida-

estudantes de Medicina. Não


Medicina

de. Engenheiros, bancários ou

há status que os separe. P. 38


sem fronteiras

da estima. P. 48
COMPORTAMENTO
Juan Urbano (Elvas) e o argentino Pablo

para trabalhar e viver. E sentem-se úteis,

trevistou especialistas
para desmontar o mito
cos estrangeiros contratados pelo Serviço
Nacional de Saúde. Escolheram o Interior

nalista Sofia Teixeira en-


e Viorica Gradinaru (Bragança), o espanhol

conta a jornalista Sara Sofia Gonçalves. P. 20

Gostar de nós é essencial,

mos de ser perfeitos ou não


Nestor (Mirandela) são cinco dos 1270 médi-

a fasquia muito elevada. Te-


Os moldavos Iurie Pantazi (Guarda) e Andrei

há nada para valorizar. A jor-


mas hoje a sociedade coloca
ACEITAR E SÓ DEPOIS MUDAR
BEM-ESTAR
ESTAR DE OLHO
NAS CATARATAS
Quando a

das é uma bola de

de juro anunciam
pessoal é a
insolvência

lista Catarina Silva


cessivos para tapar
única saída

e especialistas. P. 30
buracos. A inflação
e a subida das taxas

simples. Basta vigiar. P. 52


O labirinto das dívi-

ouviu protagonistas

lista Ana Tulha, é tudo muito


neve que derruba fa-
mílias, desesperadas

Prognóstico? Cataratas. Ou-


a aumentar. A jorna-

los que se formam à volta da


pagar as prestações e

correm a créditos su-


penhorados e que re-

luz, a graduação insuficiente.


por não conseguirem

Uma névoa, a visão turva, ha-

Hoje, como nos conta a jorna-


as despesas correntes,
que ficam com os bens

que os casos vão voltar

trora era cegueira irremediável.


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12.02.2023 Notícias Magazine


sumário#1603

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6
naque
alma- FLASH

CAN EROK/AFP RAMI AL SAYED/AFP RAMI AL SAYED/AFP

12.02.2023 Notícias Magazine


ABDULAZIZ KETAZ/AFP
Não há escala
onde caiba
esta dor
Milhares de edifícios escan-
galhados, um infindável re-
gisto de mortes – à hora que
estas linhas são escritas, a
contagem continua em cres-
cendo acelerado, com a Orga-
nização Mundial de Saúde a
avançar com a estimativa to-
tal de 20 mil –, um cenário de
destruição que é um nó in-
cessante na garganta, o de-
sespero de quem ainda revi-
ra os escombros em nome de
uma nesga de esperança.
Dois sismos devastadores ar-
rasaram, na madrugada da
última segunda-feira, a Tur-
quia e a Síria. Na escala de Ri-
chter, os abalos registaram
magnitudes de 7,8 e 7,5. Mas
não há escala que meça a
grandiosidade desta dor.
OMAR HAJ KADOUR/AFP

ERDEM SAHIN/EPA
ADEM ALTAN/AFP

Notícias Magazine 12.02.2023 7


alma-
naque

MARIA JOÃO GALA/GLOBAL IMAGENS


RAIO-X
POR Ana Tulha

Guião de
exames nacionais
revisto
Provas obrigatórias para a conclusão do percurso
escolar passam a três. Português continua a ser
condição “sine qua non”. Peso dos exames na média
final do Secundário desce, mas sobe
no acesso ao Ensino Superior.

O QUE MUDA NA CONCLUSÃO UMA EXCEÇÃO CHAMADA PANDEMIA “Eu acho


DO SECUNDÁRIO Excecionalmente, nos últimos três anos
O número de exames obrigatórios para letivos, os exames nacionais apenas fo- que é bom haver
a conclusão do Secundário passa de
quatro para três, com o peso destes a
ram obrigatórios para os alunos que pre-
tendiam seguir para o Ensino Superior.
avaliação final
cair dos 30% para os 25%. O Português Este ano, a política de exceção ainda e não faria sentido
é obrigatório, os outros dois são à esco-
lha do aluno. Foi ainda revisto o peso
prevalecerá. deixar de haver”
das diferentes disciplinas, passando a MARCELO REBELO DE SOUSA
haver proporcionalidade entre o número O BRAÇO DE FERRO Presidente da República, ainda antes
de anos durante as quais são lecionadas O Ministério da Educação, liderado por da conferência de Imprensa conjunta
e a sua expressão na média final. O novo João Costa, pretendia acabar com a de João Costa e Elvira Fortunato, em
modelo entra em vigor no próximo ano obrigatoriedade da realização dos exa- que foi apresentado o novo modelo
letivo, mas as diferenças na ponderação mes nacionais. Já o Ministério Ciên-
stério da Ciên
das disciplinas bienais e trienais apenas cia, Tecnologia e Ensino Superior, tute-
se aplicarão aos alunos que comecem lado por Elvira Fortunato,, recusava esta

45%
o Secundário nessa altura. ideia, batendo-se por umm peso crescen-
te destas provas no acessoso às universi-
dades. A reconfiguração agora proposta
é uma espécie de meio-termo
ermo entre as
partes.

O peso total mínimo dos exames nacio-


nais (no mínimo dois) na nota de acesso
à universidade, segundo o novo modelo.
Até aqui, era de 35%.

8 12.02.2023 Notícias Magazine


alma-
naque
AS HISTÓRIAS OS ROSTOS
DA SEMANA
DOS DIAS
POR Sara Sofia Gonçalves

Rui Moreira
Presidente da
Câmara do Porto
Numa troca de acu-
sações acerca da
ocupação por toxi-
codependentes
de um edifício mili-
tar, reafirmou que

Chelsea,
o combate às dro-
gas não é compe-

a Barbie que
tência da Polícia
Municipal.

tem escoliose
Em mais uma ação para a representação da di-
versidade humana, a fabricante de brinquedos
Mattel apresentou recentemente uma boneca
diferente do estereótipo magro e alto. Chelsea
é uma Barbie com escoliose, que apresenta a Beyoncé
coluna curvada e um colete de tratamento Cantora
amovível. O novo produto foi desenvolvido É a artista, tanto
pela empresa norte-americana em colaboração no masculino como
com um neurocirurgião especializado em pro- no feminino, mais
blemas de saúde semelhantes nas crianças. O premiada de sem-
objetivo é que a representação seja o mais fiel pre na história dos
possível a um caso real, para que a informação Grammy, com 32
transmitida aos mais novos seja correta. O mais vitórias. Alcançou o
recente exemplar de inclusão junta-se a uma recorde na 65.ª edi-
FOTOS: FACEBBOK

coleção que já apresenta bonecas em cadeiras ção do prémio.


de rodas, amputadas ou com problemas de
pele, entre outras características distintivas.

UMA CAIXA DE AREIA PARA GATOS


EM HOMENAGEM AOS “EX” Migu Castelo-
Miguel
Chegados a fevereiro, os apaixonados não falam lam de mais -B
-Branco
nada a não ser do Dia de São Valentim. Para os corações par- Inv
Investigador
tidos, a data pode significar fazer o luto de uma
ma relação pas- Com trabalho
sada e anualmente repetem-se as histórias de jardins zooló- nos últ
últimos 15 anos
gicos que oferecem batismo de baratas ou alimento
imento de ani- na área do autismo,
mais em nome de um(a) ex-companheiro(a). ). Mas em Ohio, o médico
méd e neuro-
nos Estados Unidos, um abrigo para animais decidiu inovar: cientista é o grande
cientis
este ano, as caixas de areia para gatos serão nomeadas em vencedor do Prémio
venced
homenagem aos “ex”. A inscrição para o batismo ismo da de Medicina
Bial d
“casa de banho” dos felinos custa perto de cinco
inco eu- Clínica, no valor
Clínic
ros, que revertem a favor do cuidado animal.. de cem mil euros.

10 12.02.2023 Notícias Magazine


A CULTURA

AFP
Jorge Manuel Lopes
POR
Música

COMO DOMINAR ESTE

3549
ESTADO DE ANSIEDADE
Em 2020 e 21, o ambiente físico e mental semeado pela
pandemia propiciou a transição de alguns artistas, em
especial da música eletrónica dançável, para a criação de
peças ambientais conducentes à meditação, uma fuga
sensorial que melhor ajudasse a lidar com o alarme sani-
tário e o confinamento global. Abundaram as mixtapes
com músicas em estado de levitação, uma preciosa
pessoas disfarçadas da personagem indústria artesanal em que se destacou o veterano
Smurf juntaram-se em produtor britânico Richard Norris com as peças sema-
Landerneau, França, em 2020, nais de 20 minutos “Music for healing”, entretanto
vertida para vários discos.
mas o recorde não foi validado por Um outro veterano da música
questões burocráticas. A 25 de de dança, nascido no norte de
Inglaterra, George Evelyn
março voltarão a tentar, querendo experimentou em primeira
chegar aos 4999 Smurfs reunidos. mão a razia que os anos de
chumbo da covid-19 aplicou ao

“DESTA VEZ, NINGUÉM NOS PÁRA”


ecossistema das discotecas e
clubes. Evelyn reside em Ibiza,
tem um caminho de louvor
cravado desde os anos 1990 sob a designação Nightmares
Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, on Wax, e no início de 2023 chegou a sua vez de revelar
sobre a continuação das greves dos professores uma obra contemplativa. Lançada em formato digital
através da sua editora de sempre, a Warp, “Re -imaginee-
NUNO BRITES/GLOBAL IMAGENS

ring meditation mix” é uma composição em oito capítu-


los (também disponível numa “Continuous mix” de 56
minutos, o formato ideal) que habita um lugar onde a
música ambiental, o jazz e a composição contemporânea
se confundem.
Aqui, uma frase de cinco notas, saltando em bicos de pés
ao longo das pedras de um lago, é observada e repetida sob
vários pontos de vista. O mais ténue dos silvos orques-
trais entra e sai de cena, um piano elétrico (muito
Air) acaricia-nos a espaços, há pontuais observa-
ções extrovertidas. Nos momentos em que a frase
central faz uma pausa, sobra uma malha de sinais
enviados para o espaço. No seu minimalismo
eloquente, evoca uma versão mais subtil de
“Promises”, o celebrado álbum de 2021 de
Floating Points com Pharoah Sanders e The
London Symphony Orchestra.
Lúdico, de um hipnotismo solar no qual
o ouvinte mergulha sem dar por isso,
“Re -imagineering meditation mix”
transporta uma estranha forma de
otimismo. A partir da sua doçura já se
vislumbra o verão. Adeus ansiedade,
adeus stress. ●m

Notícias Magazine 12.02.2023 11


alma-
naque
MÁQUINA DO TEMPO
POR Filomena Abreu

DIREITOS RESERVADOS
Pu Yi. O último
imperador da
China, fotografado
entre 1930 e 1940
por um autor
desconhecido,
quando era um
“fantoche” dos
japoneses

Qin Shi Huang, o primeiro imperador da China, governou entre 221 a.C. e 210 a.C.,
sendo responsável por unificar o país, que se tornou o território que hoje conhecemos.
Deixou como legado a Grande Muralha da China e o admirável Exército de Terracota.
Toda a dinastia Qing foi tão impressionante que perdurou por cerca de dois mil anos,
tendo acabado a 12 de fevereiro de 1912, há precisamente 111 anos, quando o último
imperador renunciou.
Depois de décadas de crescimento e prosperidade (económica, social e militar), a China
passou pelo chamado “século da humilhação”. A chegada dos ocidentais ao país abalou
totalmente as estruturas da sociedade chinesa. Foi neste contexto que Pu Yi, o último
imperador, com apenas seis anos, foi forçado a abdicar do trono, cargo que assumiu
aos três.
O desfecho era esperado. O país estava mergulhado na Revolução Xinhai, um conflito
estabelecido contra a dinastia Qing e o seu reinado. O resultado foi a abdicação de Pu Yi
e a implantação da República Chinesa.
Pu Yi ainda permaneceu na Cidade Proibida até completar 18 anos, quando foi expulso
por outro golpe no país. Haveria de voltar por volta de 1930, como um imperador
fantoche, usado pelos japoneses para “comandar” um novo país dentro da China. Após
a derrota japonesa na Segunda Guerra Mundial, em 1945, o último imperador chinês
foi preso pelos soviéticos e depois pela China comunista. Só em 1959, já com 53 anos, se
conseguiu livrar das prisões. Morreu em 1967, aos 61 anos, com cancro nos rins. Antes
deixou uma biografia, “De Imperador a cidadão”. É por ela que se sabe que acabou os
dias como jardineiro, numa simplicidade que o deixava verdadeiramente feliz.

12 12.02.2023 Notícias Magazine


Cidadania Impura
Por Valter Hugo Mãe

Álvaro Vasconcelos
Com séculos de presença no O incómodo causado pelo testemunho de Álvaro Vasconcelos no livro “Memó-
país, onde estão os negros rias em tempo de amnésia” só se justifica porque a atrocidade cometida pela
nos municípios, no Governo, ocupação colonial ainda é crime impune e sem assunção. A indignação de Álva-
nos bancos, nas direcções ro Vasconcelos perante o esquecimento nada inocente resvala no esforço hipó-
das grandes instituições, crita dos poderes brancos que visa manter o assunto em silêncio o tempo sufi-
onde estão os negros ciente para que não se pague pelo que foi feito. Até porque adiando a questão
por umas gerações haverá sempre a desculpa de dizer que quem exerceu o pri-
portugueses proprietários? vilégio branco de explorar os negros já morreu. A questão é que quem usufrui
da exploração ainda viverá. Porque os séculos de abuso e extermínio dos negros
favorecem até hoje, e continuarão a favorecer, tudo quanto respeita à vida do
cidadão europeu.
O livro de Vasconcelos explica com clareza como é impossível a conquista da
ideia democrática perante a manutenção do colonialismo. Democracia é obri-
gatória inclusão, pelo que o ódio à subalternização de pessoas por qualquer mo-
tivo se torna elementar nas consciências dos jovens que fazem o Maio de 68 e
se preparam para o 25 de Abril. A Democracia, contudo, perante o trauma dos
povos negros, parece pedir esquecimento. Uma espécie de jogo zerado quando,
na verdade, o que os povos brancos extorquiram dos negros não foi minima-
mente devolvido, não houve qualquer processo de compensação por uma es-
cravidão que perdurou travestida até 1974.
Como se pode, então, pedir esquecimento quando não se exerceu terapia al-
guma sobre o trauma? Perante a vontade europeia de esquecer, que direito exis-
te em pedir esquecimento aos povos africanos que ainda se vêem excluídos de
toda a parte?
Com séculos de presença no país, onde estão os negros nos municípios, no Go-
verno, nos bancos, nas direcções das grandes instituições, onde estão os negros
portugueses proprietários? Famílias que representem a nobreza negra, a me-
mória negra, a cultura que tanto se diz que os portugueses admiram mas que
não parece digna o bastante para ascender acima da condição servil?
A Europa é racista. Absorve outras culturas com muita parcimónia e sempre
pelo mesmo motivo: toleramos os diferentes na medida em que venham tra-
balhar naquilo que não queremos mais fazer. Isso é tão válido para os portugue-
ses que foram construir e limpar casas para os franceses, como para os brasilei-
ros que chegam cuidando da nossa restauração.
Se a Democracia implica a inclusão, esta só existe se a paridade for praticada.
Incluir não é prosseguir com a mesma lógica de exploração mudando o nome
às coisas e adoptando retóricas hipócritas. Democracia é fazer representar em
todos os poderes as pessoas que efectivamente fazem parte, e os negros não es-
tão no poder em Portugal. Não estão inscritos em coisa nenhuma, senão em
muito pontuais oportunidades que mais significam uma quase folclórica ale-
gria do que um Direito verdadeiramente adquirido. São precisos mais mil livros
como o de Álvaro Vasconcelos, e menos um milhão de chefias por toda a parte
a impedir que se assuma a atrocidade da nossa História ainda actual. Porque não
é sobre o passado. É sobre nós, agora, num sistema sempre racista e abusador.

O AUTOR ESCREVE DE ACORDO COM A ANTERIOR ORTOGRAFIA

Notícias Magazine 12.02.2023 13


alma-
naque
PERFIL
POR Alexandra Tavares-Teles

CARLOS
ANTÓNIO
VASCONCELOS
MOTA DOS
SANTOS

Cargo
Chairman e CEO
da Mota-Engil

Nascimento
13/05/1978
(44 anos)

Nacionalidade
Portuguesa
(Porto)

14 12.02.2023 Notícias Magazine


O bom sobrinho
Carlos Mota Santos em casa fica
Formal e institucional, não se intimida ou atrapalha. E nunca
olhou para os cargos que teve como um favor. Pragmático,
reflexivo, focado, o novo líder da Mota-Engil define-se em
três palavras: “Ambição, felicidade e gratidão”.

“Foi um bom menino, é um bom rapaz.” O pa- lhor preparada do que a segunda. O meu sonho
triarca António Mota não esconde o apreço pelo de ter pessoas de família com muita qualidade e
sobrinho e afilhado. Carlos, único filho de Maria bem preparadas para prosseguir o trabalho reali-
Manuela, a mais velha das três irmãs, acaba de zou-se”, orgulha-se o patriarca.
ser o escolhido para lhe suceder no topo da maior A teimosia do novo líder da Mota Engil tem-lhe
construtura portuguesa, caminho familiar ini- rendido mais bens do que males. “Detesto per-
ciado há 76 anos por Manuel António Mota, e a der. Fico a remoer por dentro e a cismar, não obs-
passagem de testemunho enche-o de orgulho. tante tenha aprendido com alguns insucessos.”
“Filho único, mas sem mimo. Nem em casa nem Concursos que se perdem, investimentos falha-
no trabalho”, continua António, não poupando dos, desilusões com parceiros de negócios. “Trai-
reconhecimento ao recém-nomeado CEO e ções, mesmo. Nesses casos, não sendo de explo-
chairman da Mota-Engil. “É muito preparado. dir, corto de vez. Quando acaba, acaba.” Tem na
Começou do início. Andou pela Polónia, foi res- família o centro. A mulher, médica, e os três fi-
ponsável pela América Latina e, ultimamente, lhos – Rodrigo e Luís, futuros engenheiros. E Bea-
andou comigo, a segurar-me na mala. A vida dele triz, “a menina que faz o que quer de mim, por-
foi acompanhar o tio nos bastidores, onde teve que aprendeu com a mãe”.
sempre uma boa relação com todos.” As amizades, fazem parte do essencial. “Sou um
Padrinho de batismo e de casamento de Carlos colecionador de amigos, adoro convívios e jan-
Mota dos Santos, recorda “um miúdo muito alegre tares.” Necessidade premente que explica com
e divertido, muito ligado aos primos, dado a gran- a experiência de filho único, apesar de tantos pri-
des brincadeiras de férias”. Mas também diz: “O mos. “Sempre gostei muito de me divertir, e di-
Carlos transitou com grande rapidez da juventu- verti-me muito na juventude, mas também me
de para a ponderação”. Amadurecimento que se sentia sozinho. E eu detesto a solidão.” Quem o
notava já em 2012, quando teve pela primeira vez vê na empresa, apesar de afável, não adivinha “o
assento na Comissão Executiva, então liderada por lado bem-disposto e divertido”. António Lobo
Jorge Coelho (falecido em 2021), também figura Xavier conhece-lhe o “entusiasmo pela vida, o
central no percurso do gestor – “Só quando o perdi sentido de humor e a boa conversa”. Sobre para-
percebi o quanto era importante para mim”. gens longínquas, sobre arte, sobre o Porto – “A
António Lobo Xavier é também testemunha cidade que adoro”. Sobre música, fã dos Metalli-
dos primeiros passos que o conduziriam ao topo, ca, sente-se ainda hoje “semi-roqueiro”. E sobre
por entre primos direitos, sem disputas fratrici- Engenharia, paixão antiga. “Houve tempo em
das. “Recordo o profissionalismo, o foco, a refle- que quis ser advogado, não sei porque é que tal
xão, o equilíbrio, a sensatez no trabalho.” E, acres- me passou pela cabeça.”
centa, “a coragem de discordar”. Não é fácil dis- Para Francisco Seixas da Costa, ligado à empre-
cordar de António Mota, líder de convicção, de sa há dez anos, “há muito que a terceira geração
instinto, de faro. De emoções e de muito suces- da família Mota está a ser preparada para dar con-
so. Em reuniões do Conselho de Administração, tinuidade à empresa”. Carlos Mota Santos “tem
marcadas pela boa disposição e pelo sentido de todos os requisitos pessoais para assegurar uma
humor, traço do patriarca, o então jovem de 34 excelente liderança”, acrescenta.
anos, o primeiro dos dez netos do fundador a sen- Herdou do avô “o humanismo e o amor à famí-
ILUSTRAÇÃO: JOÃO VASCO CORREIA

tar-se na Comissão Executiva, mostrava-se “fo- lia”. Tem por objetivo “fazer o que fez a segunda
cado, calado, reservado, apresentando as áreas geração e entregar à seguinte uma Mota-Engil
dele, por vezes dossiês difíceis, de forma convin- melhor” do que a que recebeu, promete o novo
cente e bem preparada”, acrescenta o advogado. CEO. Aos 44 anos, define-se em três palavras:
Formal e institucional, Mota dos Santos não se “Ambição, felicidade e gratidão”. O tio e padri-
intimida ou atrapalha. E nunca olhou para os car- nho, treinador do Benfica em jogos de computa-
gos que teve como um favor. “Tenho uma espe- dor nas horas vagas, encontra-lhe um único de-
rança muito grande na terceira geração, que é me- feito: “É do F. C. Porto”. ●
m

Notícias Magazine 12.02.2023 15


alma- Susana Romana
naque Partida, Largada, Fugida

1 8
Faltam dois dias para o Dia O líder nor
norte-coreano, Kim
orados. Se nesse dia
dos Namorados. Jong-un, ordenou que as
se sentirr pouco amoroso, suas forças
forç armadas se
é porquee muito provavel- preparassem
preparasse para a guerra.
mente o São Valentim foi Como sempre,
sem há de ser só
do pelo S.TO.P. para
recrutado fogo de vista
vis deste regime
fazer
azer greve. ditatorial.
ditatorial A única guerra
que eles efetivaram
e em
anos foi aos cortes de cabelo.
2
O líder do S.TO.P, André
7
Pestana, tem tido muito
destaque na imprensa. Não A Netflix
Netfli anda a testar
se deixem enganar pelo novos métodos
mét para impe-
apelido: é improvável que dir a partilha
partil de passwords
André seja familiar de João do mesmo utilizador. Boa
Pestana, já que não anda sorte com isso no mercado
aqui a dormir no que às suas português.
português Nós arranjamos
ambições políticas diz esquemas
esquem para sacar
respeito. conteúdos
conteúd à borla desde
que
q era preciso
copiar
co as pinturas
rupestres
r para o
calh de um primo.
calhau
3
Aindaa na educação, os
6
ue queiram termi-
alunos que
cundário terão de
nar o Secundário Foi também
també revelado que
rês exames: dois à
fazer três alguns dos
do ex-atores irão
escolhaa e o de Português. regressar com
co as suas perso-
to. Eu costumo ler
É injusto. nagens à trama.
t Tendo em
ntários nas redes
comentários conta que
qu na primeira
sociais,, sei que 90% das temporada o Pipo já parecia
pessoass não passam num pai deles todos,
to não espero
me de Português.
exame menos do que
q desta vez ter
neti
os seus netinhos na Associa-
ção de Estudantes do Colé-
4 5
gio da Barra.
Cr
Cristiano Ronaldo fez 38 A TVI anunciou o regresso
anos
an e celebrou com um dos “Morangos com
vinho Barca-Velha, no
v açúcar”, juntamente com a
valor de 865 euros. plataforma de streaming da
Curiosa escolha, porque
C Amazon, a Prime Video.
a ver o que aconteceu Não há ainda data de estreia,
quando quis sair de pelo que não se sabe se o
Manchester parece-me professor Sapinho vai estar
que “barca velha” é de greve por não ser aumen-
o que muitos clubes tado desde a última vez que
o consideram. a série esteve no ar.

16 12.02.2023 Notícias Magazine


PLANETA PORTUGAL
POR Sara Dias Oliveira

Era boa aluna a todas as disciplinas, a Literatura do nos Estados Unidos, a recusa e a sensação de
surgiu por exclusão de partes, inicialmente como ter perdido a oportunidade para ver como era a
expressão, depois como estudo aprofundado que LOLA XAVIER vida lá fora. A vontade ficou e veio ao de cima. “Já
lhe tem enchido os dias, os anos, a vida. “Havia ali tinha feito 40 anos, sentia que estava a ganhar raí-
uma perceção aliada a um gosto”, confessa. Um Localização zes em Coimbra como uma árvore que já tem a
gosto que deu de si. O percurso reflete essa entre- Macau sua própria terra, uma imagem que me começou
ga. Curso de Línguas e Literaturas Modernas, pós- a desagradar”, recorda. Até à vaga num concurso
-graduação em Literaturas e Culturas Africanas e 22º 10’ N internacional para o Centro Pedagógico e Cien-
da Diáspora, mestrado em Literatura, doutora- 113º 33’ E tífico da Língua Portuguesa do então Instituto Po-
mento e pós-doutoramento na mesma área. Lo- (GMT+8) litécnico de Macau, há oito anos. Entrou, ficou.
la Xavier, de Coimbra, é professora de Literatura Os dias são desafiantes. “Acordamos com uma
na Universidade Politécnica de Macau. Cargo ideia, ao meio-dia temos outra, ao fim do dia já é
No tempo de estudante, na Faculdade de Le- Professora outra.” Reflexões constantes e um currículo com
tras da Universidade de Coimbra, fundou um jor- de Literatura cerca de uma centena de publicações, entre arti-
nal com uma amiga, escrevia poesia e contos, re- gos em revistas e livros. Anda sempre a pé na ci-
censões críticas, entrevistas, roteiros por Coim- Idade dade do Oriente, gosta de ali viver. E à pergunta
bra. A escrita andava ali. Depois, abriu a porta do 49 anos se pensa voltar, a mesma resposta. “Não sei res-
ensino, professora de Língua Portuguesa em li- ponder a essa questão.” ● m
ceus da cidade dos estudantes e na Escola Supe-
rior de Educação de Coimbra, onde deu aulas em
licenciaturas e mestrados, foi diretora do curso
de Educação Básica.

A paixão
Num outro país, num outro continente, a mes-
ma paixão. “As literaturas em Língua Portugue-
sa, que tenho tido o privilégio de lecionar a estu-

pela Literatura
dantes chineses de licenciatura e doutoramen-
to, permitem-me usar o Português como meio
que dá acesso a outros mundos tão diferentes dos
asiáticos, abrindo os horizontes para a reflexão,
questionamento e formação humanista, hoje
fora de moda, mas tão necessária”, refere. A lín-
e pela Língua
gua como meio de recriar e aceder a outros mun- Lola Xavier é professora universitária em Macau,
dos, linguísticos e culturais. “Há uma língua com
a suas variedades que nos permite comunicar em
dinamiza atividades que colocam alunos em contacto
Macau, em Moçambique, no Brasil, etc., e em com a riqueza e diversidade do Português. Uma
cada ponto do Globo que é atualizada veicula uma forma de dialogar com outras culturas.
história e uma cultura diferente. É nessa diver-
sidade que está a sua riqueza”, sublinha.
Neste momento, coordena o doutoramento
em Português na universidade de Macau. Coor-
denar tem sido um karma que não a larga. “A van-
tagem é que me tem permitido organizar e dina-
mizar atividades que coloquem os estudantes
em contacto com riqueza da língua e das cultu-
ras em português, o que transporta a língua para
além da sala de aula, tão mais importante se es-
tivermos a trabalhar em contextos que não são
de imersão linguístico-cultural”, conta.
Pelo caminho, encontros felizes, vários mes-
tres, o professor e escritor Pires Laranjeira, o pro-
fessor e especialista em teatro Oliveira Barata, o
poeta João Camilo, o convite para fazer o mestra-

A entrevista foi realizada através de


videochamada por Zoom

Notícias Magazine 12.02.2023 17


alma-
naque
A SEMANA
QUE VEM
POR Catarina Silva

SEGUNDA-FEIRA A leitura do acórdão do processo “Operação


Cavaleiro”– no qual é visado o ex-diretor do

ACÓRDÃO
Museu da Presidência, Diogo Gaspar, e
outros três arguidos por um total de 42

DO PROCESSO
crimes – está agendada para este dia, depois
de vários adiamentos. À noite, às 22 horas,

“OPERAÇÃO Fábio Porchat, humorista brasileiro do cole-


tivo Porta dos Fundos, leva o seu novo espe-
CAVALEIRO” táculo a solo de stand-up ao Coliseu do Porto,
inserido na primeira
Na quarta-feira, Por-
digressão internacio-
chat atua no Coliseu
de Lisboa. Neste caso, nal, que vai passar
já só há bilhetes para a por vários países


sessão das 19 horas europeus.

QUARTA-FEIRA
TERÇA-FEIRA
IRS: DATA-LIMITE PARA
Em dia dos Namora-
dos, o festival literá-

É DIA DE S. VALENTIM rio Correntes d’Escri-


tas, na Póvoa de COMUNICAR O AGREGADO
E COMEÇA O CORRENTES Varzim, regressa ao
encontro entre auto-
Esta é a data-limite
D’ESCRITAS res e leitores. Até dia
18, estão confirmados para comunicar o agregado
98 escritores, de 15
nacionalidades. De familiar no Portal das
Paulina Chiziane a
Ondjaki. No mesmo
Finanças por quem teve
dia, começa o julga- alterações. É ainda o último
mento de dois ex-diri-
gentes do Lar do
dia para as empresas se ins-
Comércio, Matosi- creverem no projeto piloto
nhos, por 67 crimes
de maus-tratos. da semana de quatro dias.
No futebol, às 20 horas,
o Benfica defronta o Club
Brugge, na Bélgica, para
a Champions.

18 12.02.2023 Notícias Magazine


QUINTA-FEIRA
ABUSOS NA IGREJA:
É CONHECIDO O RELATÓRIO5ª
O relatório da Comissão Independente para o
Estudo de Abusos Sexuais de Crianças na
Igreja Católica Portuguesa vai ser apresen-
tado às 10 horas, em Lisboa. Em outubro, já
tinham sido recolhidos 424 testemunhos.
No mesmo dia, estreia nos cinemas “Ice
merchants”, de João Gonzalez, o primeiro
filme português nomeado para os Oscars. Na

É a primeira vez que o ci-


nema português chega
tão longe, com a nomea-
Liga Europa, o
Sporting recebe o
Midtjylland, da
Dinamarca. O jogo
D
ção do jovem cineasta
de 26 anos arranca às 20 horas.

DOMINGO
SEXTA-FEIRA
CHEGA AO FIM “A BELA
O JULGAMENTO E O MONSTRO”
EM BRAGA E BAFTA
DA MORTE DE FILM AWARDS
LUÍS GIOVANI
O musical “A Bela

S
A leitura do acórdão
do processo da morte
do jovem cabo- e o Monstro”,
-verdiano Luís
Giovani, em Bragança,
de Fernando
que já esteve agen- Gomes, sobe ao
dada duas vezes, foi
remarcada para este
palco do Altice
dia, três anos depois Forum Braga, às
dos factos. Sete jovens
estão acusados de 15.30 horas.
homicídio qualifi-
cado. Ainda nesta SÁBADO Também neste
dia, todos os
LUÍSA SOBRAL LEVA
data, começam as
comemorações dos
olhares se viram
100 anos do Carnaval
de Torres Vedras, que “DANSANDO” AO PORTO para Londres,


se vão estender até
fevereiro de 2024. A digressão que celebra o lançamento de onde os Bafta
“DanSando”, novo álbum de Luísa Sobral – preen-
chido por 11 temas originais –, vai passar pela Casa da
Film Awards
Música, no Porto, neste dia. Uma semana depois, a 2023, que
cantautora atua no Teatro Tivoli BBVA, Lisboa. Na
mesma data, estreia a terceira temporada da série celebram o
“Trafficked”, no canal National Geographic, da
autoria da jornalista portuguesa Mariana Van Zeller,
melhor do cinema
repórter premiada, que vive nos Estados Unidos. E britânico e
que procurou “infiltrar-se” em vários submundos,
desde a venda de armas à indústria das barrigas de internacional, vão
aluguer na Ucrânia, com a guerra pelo meio. ser anunciados.
Notícias Magazine 12.02.2023 19
“A minha
nacionalidade
é o amor à
medicina”
Não nasceram em Portugal, mas foi cá que decidiram assentar
a carreira profissional. São médicos e escolheram o interior do
país para viver e trabalhar. Vindos da Moldávia, da Roménia, da
Argentina ou até da vizinha Espanha, encontraram a qualidade
de vida que procuravam. Diferentes passados, um sentimento
em comum: as terras que adotaram precisam deles.

J
TEXTO Sara Sofia Gonçalves

á lá vão mais de dez anos desde que Iurie, hoje com 45 anos, continua sem ter rece-
cá chegou. Numa carrinha cheia de bido o salário desses 60 duros dias de trabalho.
outros homens carregados de so- Mas nem o começo atribulado lhe tira o sorriso
nhos, atravessou a Europa. Da Ro- do rosto ao falar da sua casa do coração, Portugal.
ménia para Portugal, vinha na É pelos corredores do Hospital Sousa Martins,
companhia de uma mala e com a na Guarda, que hoje nos guia. Lá fora, a tempera-
promessa de trabalho junto do pri- tura está perto de negativa, mas a energia conta-
mo, que já por cá estava há dois giante do médico moldavo (que também tem na-
anos. Entre as poucas roupas que cionalidade romena e portuguesa) na medicina
trouxe, não faltava a esperança de interna faz aquecer o espaço. Ora vamos a esta
um futuro. Vinha na companhia de um diploma sala. Ora vamos àquela. “Este é o interno novo.”
em Medicina, uma bata branca e um estetoscó- “Este médico veio de Macau.” “Aqui estão duas
pio. Mas não foi logo em 2002 que Iurie Pantazi médicas excecionais, uma brasileira com raízes
os colocou a uso. italianas e outra ucraniana.” Iurie sabe tudo de
Com vontade de procurar um futuro melhor, cor. As caras. Os nomes. As histórias. E as esqui-
chegou a Sesimbra para trabalhar nas obras com nas da casa.
o primo. Foram dois meses entre escadotes e mas- Mas a facilidade com que hoje nos fala do traba-
sa. E longe da primeira mulher e da filha Maria. lho e da família que constituiu na Guarda não

20 12.02.2023 Notícias Magazine


ILUSTRAÇÃO FREEPIK

Notícias Magazine 12.02.2023 21


enubla o que para trás ficou. Voltemos às obras.
Sentado no seu consultório, no qual entra o sol
de inverno que aquece o espaço, Iurie volta a
2002. Em Portugal há dois meses, sem dinheiro
e apenas com o apoio do primo, também molda-
vo, “arriscar” era a palavra de ordem. A viver por-
ta a porta com a corporação de bombeiros de Se-
simbra, a resposta estava mesmo ali. E a ideia par-
tiu do primo: “És médico, porque é que não pe-
des trabalho aqui?”.
E, pela ironia da realidade, descreve Iurie, no
dia 1 de abril de 2002 – “era dia das mentiras, mas
o que conto é bem verdade” – chegou a tão aguar-
dada chamada. “Podem vir trabalhar à experiên-
cia para os bombeiros.” E lá foram os dois. Primei-
ro, como motoristas. Depois, Iurie começou por
ser maqueiro e, mais tarde, chegou até a tratar de
alguns cuidados de saúde primários.

PEDIR A EQUIVALÊNCIA
Hoje recorda esse emprego não só pelo carinho
com que foi recebido pelos colegas de corpora-
ção, mas também pelo que ele significou no seu
futuro. “Estava a fazer um serviço sozinho, a
transportar uma senhora de casa para uma con-
sulta, lembro-me perfeitamente da cara, do
nome, da situação, até que ela me diz que viu na
televisão que tinham aberto as equivalências de
médicos estrangeiros para trabalhar em Portu-
gal.” Mal pôde esperar pelo final desse turno para
se informar.
Foi em 2004 que fez da Guarda casa, quando
conseguiu aprovação para escolher uma vaga
para o ano comum (ano de estágio do curso de
Medicina em Portugal, antes de iniciar a espe-
cialidade médica). Qualquer que seja a naciona-
lidade, para um médico estrangeiro trabalhar
em Portugal é necessário que este requisite a
equivalência do seu “diploma”. Segundo expli- mesmo escalão que um aluno do quinto ano de Antes de conseguir
ca a Ordem dos Médicos, são necessários três pas- Medicina em Portugal. Fez o ano comum, fez o a equivalência em
sos para a obtenção da licença: primeiro, o reco- exame de admissão à especialidade e escolheu Medicina, Iurie Pantazi
nhecimento junto de uma faculdade de ensino uma vaga. trabalhou na
de Medicina; depois, é preciso falar português, Depois de ter feito o primeiro ano na Guarda, construção civil
sendo necessário fazer uma prova de comunica- não havia outro local que fizesse sentido para em Portugal
ção; por fim, avança-se com a candidatura jun- avançar com a especialidade e para assentar a car-
to da Ordem. reira profissional que não fosse naquela capital
Como Iurie não tinha iniciado a especialização de distrito. “Não conhecia nada de Portugal sem
no país em que se formou em Medicina, a Romé- ser Sesimbra, cheguei à Guarda sem conhecer
nia, quando chegou a Portugal iniciou o proces- ninguém, mas não podia ter escolhido melhor.”
so de equivalência nessa fase. Ou seja, ficou no É enquanto caminha pelos jardins do hospital

22 12.02.2023 Notícias Magazine


cerca de dez anos que conseguiu a nacionalida-

PEDRO CORREIA/GLOBAL IMAGENS


de portuguesa. Hoje diz-se guardense. Mas ser
moldavo nunca o fez sentir-se desconfortável,
nem como morador nem como profissional em
Portugal. “Aqui nunca olharam para mim pelo
país onde eu nasci. A minha nacionalidade é o
amor à medicina. É isso que importa.”
Tal como tantos outros moldavos como Iurie,
estudar na Roménia era uma opção para molda-
vos alargarem horizontes. História semelhan-
te, mas uns anos mais tarde, chega-nos mais a
norte de Portugal. Já familiarizada e reconheci-
da pelas ruas de Bragança está uma família de
(quase) mão cheia: Viorica e Andrei Gradinaru
e as duas filhas.

MISSÃO: UMA VIDA MELHOR


É entre gargalhadas, colos e saltos da mais nova,
que insiste em querer ficar junto dos pais e ouvir
o que têm a dizer, que o casal Gradinaru recua até
à viagem que os trouxe até ao interior de Portu-
gal. Os dois partiram da Moldávia à procura de
um futuro melhor na Roménia, onde, no segun-
do ano do curso de Medicina, se conheceram.
Ele queria cirurgia e ela pediatria. Hoje, Andrei
trabalha na medicina interna do Hospital de Bra-
gança. Viorica ainda corre atrás da especialidade
de sonho (mas já lá vamos). Medicina interna,
uma especialidade generalista que procura cui-
dar de diversas valências da saúde, é a área de tra-
balho de grande parte dos médicos no Interior,
especialmente os de nacionalidade não portu-
guesa. Viorica avança duas explicações para a si-
tuação comum. Em primeiro lugar, a dificulda-
de de fazer um exame extenso (e intenso) como
é o de admissão à especialidade. “Se já é um mo-
mento complicado da formação para quem nas-
ceu em Portugal, imagine-se para quem não tem
que nos conta o amor que tem por esta cidade – a língua portuguesa como primeiro idioma.” Em
“percorria diariamente este monte durante o ano consequência, as notas acabam por ser mais bai-
comum, era o meu caminho para o trabalho”, xas e têm menos opções de escolha. Depois, con-
atenta a certa altura junto de um pequeno lago tinua a moldava, a realidade do Interior leva a que
artificial. Conheceu a companheira atual, a guar- assim seja. “A medicina interna é a especialida-
dense Paula, no primeiro ano que por cá esteve. de prevalente nos hospitais do Interior, onde fal-
Cinco anos mais tarde nascia o filho Pedro. “Ele tam tantas especialidades.”
ainda é novo para decidir, mas estou a tentar mos- Mas Andrei não vê a medicina interna como
trar-lhe que a medicina é um bom caminho pro- uma especialidade “menor”. Pelo contrário, acre-
fissional.” Também no Interior de Portugal? dita que é aí que um médico mais aprende, já que
“Sim”, garante. Porque, justifica, “a medicina tem de saber fazer de tudo, desde procedimen-
não tem nacionalidade, morada ou rosto”. Foi há tos de gastrenterologia até cardiologia.

Notícias Magazine 12.02.2023 23


24 12.02.2023 Notícias Magazine
NUNO PINTO FERNANDES/GLOBAL IMAGENS
O casal Gradinaru, O destino do casal depois do curso não era cer-
Andrei e Viorica, to, mas havia a certeza de que a emigração seria
escolheu Bragança a opção acertada. Alemanha e Canadá foram os
para assentar a vida primeiros países na lista de possibilidades, só que
profissional e pessoal. o facto de os pais de Viorica morarem no Porto
As filhas já nasceram atraiu-os até ao país mais ocidental da Europa.
em Portugal Primeiro veio ele. Conseguiu vaga para fazer o
ano comum em Braga, mas colegas de profissão
falaram-lhe de uma terra pacata com muito tra-
balho. “É falso que o Interior não tem trabalho.
Há trabalho. Há é também pouca vontade das pes-
soas de saírem dos grandes centros.” Andrei é,
aliás, muito crítico da forma como o Interior de
Portugal tem sido abandonado, tanto por quem
não quer se fixar nessas regiões como pelo poder
governativo. Sobre a falta de médicos nestas lo-
calidades com cada vez menos habitantes, e cada
vez mais envelhecidos, o moldavo sugere que
haja um sistema de “passagem obrigatória” para
os médicos, por um determinado tempo, pelo In-
terior. “Muitos iriam aperceber-se de que viver
longe dos grandes centros não é uma questão pro-
blemática, na verdade só nos traz benefícios.” À
saúde mental, à carteira e à cultura, enumera.
O que mais o cativou em Bragança, destaca, fo-
ram as pessoas. Em específico a vontade de ajudar,
a simpatia para quem chega de fora e o sorriso fá-
cil. Mesmo quando a língua ainda não era domi-
nada. “Nunca senti que me olhassem de lado, nem
como médico nem como morador, por ainda não
ter um português perfeito ou por ter sotaque.” An-
drei diz que “a pessoa mais crítica de todas” é mes-
mo a filha. “Tenho de vos dar umas aulas de por-
tuguês”, atira a mais velha de quando em vez.
Iurie e Andrei não se conhecem, mas partilham
opiniões sobre como olham para o estado da saú-
de no Interior de Portugal. “Quem quer conhe-
cer o Interior basta vir a um dia de urgência aqui”,
diz Iurie. Di-lo enquanto se atravessam corredo-
res apinhados de macas. “Por aqui temos de
aprender a fazer um pouco de tudo. Não há diver-
sas especialidades e a medicina interna serve de
canivete suíço para o que aparece.” Nas macas es-
tão, maioritariamente, pessoas idosas. E é essa a
radiografia que Iurie faz da região onde vive.

ESTRANGEIROS NO INTERIOR
Os dois moldavos não são casos únicos, longe dis-
so. Até ao final do ano passado, estavam inscri-
tos na Ordem dos Médicos mais de quatro mil

Notícias Magazine 12.02.2023 25


profissionais que nasceram fora de Portugal. Des-
ses, 512 estão a exercer em distritos do Interior
do país (Vila Real, Bragança, Guarda, Castelo
Branco, Portalegre e Évora). Não é preciso uma
bola de cristal ou olhar para uma grande tabela
estatística para adivinhar a nacionalidade predo-
minante entre estes: espanhola. A proximidade
geográfica faz com que muitos médicos espa-
nhóis supram as necessidades da saúde no Inte-
rior de Portugal.
Juan Urbano dá cara a esses números. Juan e qua-
se todos os seus colegas do Hospital Santa Luzia
de Elvas, no distrito de Portalegre. Aos 54 anos,
é morador em Badajoz, professor na Universida-
de da Estremadura e médico em Elvas. São me-
nos de 20 quilómetros entre os três pontos que
norteiam a vida do espanhol.
É depois de um turno de 24 horas que fala à “No-
tícias Magazine”. Pouco tempo teve para descan-
sar. “Dormi uns 15 minutos, mas vamos.” A voz
não fraqueja e a cara não dá sinais de cansaço.
Nem de cansaço nem da ginástica que faz diaria-
mente para acompanhar uma agenda mais do
que preenchida. Natural de Córdoba, Badajoz
apareceu na sua vida por vontade, além de ser
médico, de ser docente numa universidade. A
proximidade a Portugal trouxe-lhe, no início do
século, uma oportunidade: fazer uns turnos ex-
tra em Elvas. A menos de 20 minutos de carro,
pensou: “Porque não?”. Os turnos tornaram-se
em contrato (que, conta, não vislumbrava em Es-
panha, porque, à época, eram poucas as contra-
tações para o quadro do serviço nacional no seu
país) e por aqui ficou a trabalhar.
Hoje, a ponte José Saramago, sobre o rio Caia,
que divide os dois países, é passagem diária obri-
gatória. E é também aqui que repousa para con-
tar a sua história entre as duas nações. Está bom
tempo e o sol reflete na bata branca, que se vai cidadão transfronteiriço que eu.” Juan Urbano
movimentando para acompanhar os movimen- A tendência de médicos estrangeiros regista- vive em Badajoz,
tos de braços que gesticulam enquanto conta, re- dos em Portugal e no próprio Serviço Nacional Espanha, e trabalha
cheado de orgulho, a sua história. Pai de trigé- de Saúde não é nova. Até ao final de 2022 havia no Hospital de Elvas
meos nascidos quando começou a trabalhar em 1270 médicos estrangeiros contratados pelo ser-
Portugal, a estabilidade de um contrato do lado viço público. Três anos antes, em 2019, o valor
de cá da fronteira pareceu-lhe a opção mais está- rondava os 1195. Questionada sobre o número de
vel. Na altura, recorda, ele e outra colega eram os estrangeiros novos a inscrever-se nos últimos
únicos espanhóis em todo o serviço médico con- anos, a Ordem dos Médicos fala de uma ligeira
tratado no hospital de Elvas. Passados 20 anos, a quebra de equivalências entre 2020 e 2021, en-
realidade é diferente. “Chefio uma equipa de dez tretanto ultrapassada. No ano passado, 194 mé-
pessoas. Oito delas estão na mesma situação de dicos estrangeiros fizeram a inscrição junto da

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REINALDO RODRIGUES/GLOBAL IMAGENS
mesma manhã ao domicílio e que estava com a
televisão ligada num jogo de futebol da “La Liga”.
Sem razão, apenas por mera companhia.
Desde o ano passado, Juan é, além de professor
e médico, também coordenador do projeto de ser-
viços ao domicílio da área de Elvas. “Tenho mui-
to amor ao que faço, porque sei que as pessoas que
visito quase diariamente sentem uma diferen-
ça muito grande com a minha visita, com a mi-
nha palavra.” A atenção e o carinho também cu-
ram, considera.
Para além dos 387 profissionais espanhóis a
exercer no Interior do país, há ainda 39 brasilei-
ros, 18 ucranianos e 11 cubanos. “No entanto,
existem alguns casos de médicos que se registam
na Ordem com outra nacionalidade que não a ori-
ginal”, especifica fonte da Ordem dos Médicos.
A situação mais frequente acontece com médi-
cos oriundos do Brasil, “os que obtêm ou já ti-
nham dupla nacionalidade portuguesa/brasilei-
ra, mas também os que têm dupla nacionalida-
de italiana/brasileira, alemã/brasileira ou fran-
cesa/brasileira”. E outras tantas nacionalidades
em números residuais.

O SENTIMENTO NUM POEMA


Pablo Nestor entra para esses números “que res-
tam”. É argentino, esteve em Portugal em 2009,
voltou à terra natal para cuidar da mãe doente e,
agora, regressou para a “segunda casa”, Miran-
dela, cidade transmontana. Questionado sobre
“o que é viver no Interior”, a resposta sai-lhe fa-
cilmente. “Ó Mirandela querida/ Tu que do nor-
te, és a diva/ De ti nunca vou esquecer/ Miran-
dela és demais/ Palavras não tenho mais/ Para te
enaltecer.” E continua. São oito quadras decla-
madas pelo médico. Nos olhos, há um brilho. No
rosto, um leve sorriso. O poema não é seu, mas
Ordem. Nos últimos cinco anos foram 819. Estes podia ser. As palavras são da poetisa local Maria
dados referem-se às aprovações, já que as repro- de Fátima Gomes, do livro “Sentimentos reais”.
vações de pedidos ascendem a 50%. Pablo, que se apressou a revirar a sua biblioteca
Juan assegura que os estrangeiros que estão a quando desafiado a falar sobre Mirandela, confi-
trabalhar em Portugal como médicos “dão tudo dencia que também escreve – pensamentos, cró-
de si por estas terras”. Di-lo com confiança na voz, nicas, poesia –, mas que “ainda não se atreveu a
num sotaque espanhol que, garante, nunca in- colocar no papel o que sente pelo sítio que o aco-
comodou nenhum paciente. “É engraçado por- lhe”. Diz que ainda não está com o português afi-
que muitos fazem o esforço de falar ‘portunhol’ nado ao nível que Mirandela merece. Aos 43 anos,
por simpatia.” Há até quem veja regularmente os sonhos residem agora na escrita. E espera um
canais de televisão do país vizinho, revela Juan, dia lançar um livro.
recordando a paciente que acompanhou nessa Foi já no terceiro ano de especialidade, de saú-

Notícias Magazine 12.02.2023 27


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12.02.2023 Notícias Magazine
RUI MANUEL FERREIRA/GLOBAL IMAGENS
de mental e psiquiatria, que surgiu a oportuni- especialidade, não exerce em Portugal aquela
dade de fazer um estágio em Barcelona. De Espa- com que sempre sonhou e para a qual estudou na
nha para Portugal o “salto” era rápido. “E mais Argentina: saúde mental. Não conseguiu ver essa
aventureiro.” Conta que o que o trouxe a Miran- parte específica do seu currículo reconhecida por
dela foi a vontade de aceitar um desafio. Um país cá. “Tenciono a médio prazo apostar nesse reco-
que não conhecia, uma terra de que nunca tinha nhecimento para conseguir ajudar o Interior do
ouvido falar, uma língua que não conhecia. “Na país numa área ainda mais debilitado do que a
altura foi reconfortante ter a oportunidade de saúde em geral: a psiquiatria.” “Ajudar” é a pala-
passar para este lado do Atlântico e cumprir um vra repetida vezes sem conta. Ajudar a terra. Aju-
sonho da minha mãe.” Sempre foi influenciado dar as pessoas. Ajudar o país que o acolhe pela se-
pela mãe, professora de História, a gostar da cul- gunda vez.
tura histórica europeia. “Estava em Portugal há Voltemos ao casal bragantino. Viorica Gradina-
uns meses e trouxe-a cá. Foi uma vitória.” ru chegou a Portugal quando Andrei já por cá se
Foi o amor incondicional à mãe que o levou a tinha instalado. Aterrou em Bragança grávida da
deixar Mirandela e Portugal para voltar à Patagó- primeira filha. Ainda sem falar português, deci-
nia. No regresso, em agosto do ano passado, por diu, no primeiro ano, ficar em casa a cuidar da fi-
convite de um amigo para voltar, trouxe consi- lha. E começar a ambientar-se à nova realidade.
go algo que não tinha quando cá esteve: uma fa- Aprendido o português, feito o ano comum, e rea-
mília. A mulher, Celeste, e a filha, Céu, fazem lizado o exame de admissão, a primeira notícia
com que Pablo sinta que “Mirandela faz, agora, não foi positiva: não conseguiu nota para entrar
ainda mais sentido”. na vaga de pediatria em Vila Real (o hospital mais
Quase dez anos depois de ter partido, afirma perto de Bragança com essa especialidade). Mas
ter encontrado uma terra diferente. “Mirande- partiu para a segunda ronda. Fez recentemente
la tem crescido e percebe-se que está rejuvenes- o exame – “acho que desta vez até correu melhor”
cida.” Tem mais estudantes, observa. “É uma ci- – e está a aguardar a nota para saber se é desta que
dade agradável e calma”, descreve. E são esses consegue exercer na área de sonho.
adjetivos que o cativaram, especialmente por o Apesar de ainda não exercer medicina, Viorica
fazerem lembrar-se de casa. “Nasci numa cida- Gradinaru trabalha no Hospital de Bragança, ten-
de argentina do Interior e morar agora numa ci- do a função de coordenar o grupo de controlo de
dade do Interior, em Portugal, traz essas lem- infeções hospitalares. Corrobora a ideia do ma-
branças da calma, de brincar na rua, de conver- rido de que, pela terra que agora chamam deles,
sar com as pessoas, de ter um vínculo significa- não há falta de trabalho para os profissionais da
tivo com a terra.” Tudo o que um dia sonhou dar saúde. Nem falta de trabalho, nem de condições.
a um filho. Elogia a facilidade que tem nas viagens casa-tra-
Sobre ser médico no Interior, diz que “é uma balho-escola, as paisagens verdes que pode apre-
questão de humanidade”. “Muitos dos idosos ciar a dois passos de casa e poder educar as filhas
que cuido querem uma palavra amiga, uma mão num ambiente saudável.
que aperta e alguém que lhes diga que está tudo O privado nunca foi opção, para nenhum dos
bem.” Ainda que considere que há falta de recur- dois elementos do casal. Não se revêm no siste-
sos na saúde nas terras do Interior, deixa de lado ma. “Queremos cuidar das pessoas e por isso é
colocar a “culpa” nos profissionais. “É preciso que acreditamos no Serviço Nacional de Saúde”,
mostrar aos médicos que viver no Interior é frisa Andrei. E o casal gostava de ver esse sentido
Depois de ter bom.” E por isso aceitou partilhar a sua história, de missão replicado pelos jovens futuros médi-
passado por Portugal porque acredita que o amor que sente pela terra cos. “Muitos preferem não escolher nenhuma
em 2010 e de ter poderá convencer alguém a arriscar. vaga do que ficarem colocados numa vaga no In-
regressado à A dificuldade burocrática que assume existir terior.” O que, sublinham, não faz sentido. É por
Argentina por uns nunca lhe toldou o tom positivo com que fala do aqui, entre a pacatez do Interior e a movimenta-
anos, Pablo Nestor país onde agora trabalha. Ainda está em Miran- ção de uma capital de distrito, que “mais preci-
voltou recentemente a dela com visto de residência e a tratar da “pape- sam deles”. “É no Interior do país onde mais se
Mirandela lada” para conseguir a nacionalidade. Quanto à vive a missão da medicina.” Cuidar. ● m

Notícias Magazine 12.02.2023 29


30 12.02.2023 Notícias Magazine
CASA, CARRO,
RENDIMENTOS.
PERDER TUDO
PARA RENASCER
O desespero para pagar as prestações e
as despesas correntes. Os bens
penhorados. Os créditos para tapar
buracos. São bolas de neve de dívidas,
onde se cai quase sem se dar por isso. E
a vida a ficar de pantanas. No meio da
aflição, a insolvência pessoal é a única
saída para muita gente. A última crise
fez disparar o número destes processos.
E a pandemia, a inflação e a subida das
taxas de juro são ingredientes que
antecipam que os casos vão aumentar.

TEXTO
Catarina Silva

Notícias Magazine 12.02.2023 31


F
ernando já não tem vergonha. Diz o nome todo, as-
sim sem medos: Fernando Pedro Moreira. A humi- “DE REPENTE,
ESTÁVAMOS NUM
lhação, a mágoa de perder tudo por que tinha luta-
do uma vida inteira ainda é uma mochila pesada,

BURACO. DOS TRÊS


mas vestiu a capa de quem sabe restar-lhe a digni-
dade. Dois filhos catraios, dez e sete anos, que bem
tentou despistar. “Dizia-lhes que íamos viver para
uma casa mais perto dos avós. Que ia trocar de car-
ro. Tive que os tirar do futebol, da natação. É de uma ORDENADOS,
FICÁMOS COM UM.
impotência total para um pai.” A pandemia foi um
vendaval sem aviso. Fernando tinha dois empregos, perdeu

E AS CONTAS A VIR.
um em 2020. A mulher, que trabalha a recibos verdes como
ama, viu-se sem trabalho e sem rendimento durante meses.
Os confinamentos foram uma sentença. “De repente, está-
vamos num buraco. De três ordenados ficámos com um. E as
contas a vir. Não me sobravam nem 20 euros para comprar lei- NÃO ME SOBRAVAM
NEM 20 EUROS
te para os meus filhos. Tive que pedir dinheiro ao meu pai para
comprar comida.” O crédito habitação, o crédito automóvel,

PARA COMPRAR
a água, a luz, o gás, uma soma a parecer infinita. Tentou rene-
gociar, tentou um empréstimo para tapar buracos.
Um dia bateram-lhe à porta para lhe levar o carro. O caminho
ficou esguio. Agosto de 2020, a bola de neve a agigantar-se –
“cheguei a pensar cometer erros, roubar para comer, o deses- LEITE PARA OS
MEUS FILHOS”
pero é tanto que nem se imagina” – e uma pesquisa na Inter-
net por um advogado. “Encontrei o doutor Pedro Meira, que
não foi um advogado, foi um amigo. Que nos conseguiu dar es-
perança.” Fernando e a mulher avançaram para um processo
de insolvência pessoal. E veio a dor de ver o tanto que construí- Fernando Pedro Moreira
ram a voar, como um penso rápido arrancado à pressa. “Perdi
tudo o que tinha. Tudo. A casa, o recheio. Virem tirar-me tudo,
ali perante a minha mulher e os meus filhos, é humilhante.”
Os sogros cederam-lhes um andar-moradia para morarem. Um
amigo emprestou-lhes um carro que não usava.
Estão a reerguer-se. O tribunal definiu que, além da casa,
tudo o que recebam de salário acima de três ordenados míni-
mos têm que entregar – o casal não chega a isso nos rendimen-
tos. Até 2024, o ano em que a família vai conseguir a exonera-
ção do passivo restante, que é como quem diz que ficam total-
mente libertos das dívidas. É um começar de novo previsto
na lei. Um renascer das cinzas. Mesmo que o estigma os pos-
sa perseguir. “Sentimos muito. Mais de familiares até. O jul-
gamento típico de que foi má gestão nossa. Eram críticas em
vez de uma palavra amiga. É tudo muito doloroso, estávamos
muito bem e de repente perdemos rendimentos e ficámos
completamente frágeis. Se eu e a minha esposa não nos tivés-
semos unido tanto, o nosso casamento não teria durado.”

INSOLVÊNCIA PESSOAL E O “FRESH START”


Pedro Meira, advogado, admite que o filme da última crise
(em 2013 bateu-se o recorde das insolvências de pessoas sin-
gulares, com 10 717 processos) pode estar prestes a repetir-se.
Depois de uma pandemia, chegou a inflação, as taxas de juro
a disparar. “Já se começa a sentir. Agora há uma legislação nova,

32 12.02.2023 Notícias Magazine


os chamados cuidados paliativos, que obriga os bancos à rene- te, quando os bens não são suficientes para saldar as dívidas.
gociação dos créditos, o que atrasa os incumprimentos. Mas “É um benefício que a lei concede ao devedor para conseguir
isto é uma bola de neve. É um conjunto de ingredientes que um ‘fresh start’, um conceito importado dos Estados Unidos,
vai ter consequências a médio prazo.” Lá iremos. que permite aos singulares ficarem presos ao processo duran-
Afinal, o que é isto da insolvência pessoal? “É não só ter um te três anos (até abril de 2022 eram cinco, a lei foi alterada para
passivo superior ao ativo, mas também uma impossibilidade cumprir uma diretiva da União Europeia) e depois desses três
efetiva de cumprir com as obrigações”, explica Zita Medeiros, anos fica-se liberto das dívidas.” É uma ficha limpa a partir daí,
advogada. Isto é, acontece quando não há recursos suficien- um começar do zero.
tes para cumprir o pagamento dos créditos, bem como para Durante esses três anos, o devedor pode ter que entregar par-
fazer face às despesas mensais correntes. Por exemplo, quan- te dos rendimentos. Normalmente, o tribunal define um va-
do já não se consegue cumprir com o crédito habitação pode- lor mínimo de subsistência, de acordo com a realidade de cada
mos estar perante uma situação de insolvência. Se ainda se um – se houver filhos, será maior –, mas que normalmente
consegue cumprir, mas já há dificuldade em pagar, podemos corresponde ao salário mínimo. Partindo desse pressuposto,
estar a falar de uma insolvência iminente. Aliás, um dos maio- tudo o que o devedor receba acima do salário mínimo, tem de
res indícios de insolvência é precisamente a falta de cumpri- ser entregue. “Na maioria dos casos, não é entregue nenhum
mento de uma ou mais obrigações – seja crédito habitação, au- valor ou é muito residual”, aponta João Mota da Costa, advo-
tomóvel ou outras. gado. O perdão, avisa, só não engloba as dívidas ao Estado, no-
Trata-se, na prática, de um processo judicial, que dá entrada meadamente à Segurança Social, Autoridade Tributária, coi-
no tribunal, por iniciativa da própria pessoa ou de algum cre- mas. Essas são para a vida.
dor. Simplifiquemos. Há a hipótese de insolvência com a apre- Certo é que antes da última crise, “ninguém conhecia mui-
sentação de um plano de pagamentos judicial, que permite to bem o conceito de insolvências de pessoas singulares”. É
preservar o património. Ou a insolvência que implica perder Zita Medeiros quem o diz. “As pessoas hoje estão muito mais
todo o património (casa, recheio, carro, mota, bicicleta...) para alerta para as consequências de não pagarem os créditos. E
que seja vendido e o valor entregue aos credores. Neste últi- para esta hipótese quando entram em dificuldades. Já me che-
mo caso, junta-se o pedido de exoneração do passivo restan- gam clientes a sugerirem eles próprios a insolvência.” Que é

Notícias Magazine 12.02.2023 33


uma solução. “Imagine-se pessoas que perdem a casa e ainda das dívidas. Quando percebi, nem acreditei.” Está prestes a
andam dez, vinte anos a pagar dívidas. A insolvência é um me- conseguir a exoneração do passivo restante. O alívio. Conse-
canismo de recuperação, são três anos, é curto.” guiu, entretanto, um apoio à renda da Câmara de Vila Nova
Gaia, que “tem sido uma ajuda grande”. “Tenho conseguido
A TEIA DOS CARTÕES DE CRÉDITO gerir. Há coisas que não compro no supermercado, sobretudo
Fernanda Pereira é mãe solteira, trabalha numa fábrica. Fala com o aumento dos preços. Privo-me muito, a mim e à minha
acelerada, sem pudores. Viu-se enredada numa teia de dívi- filha. É complicado, mas nunca mais na vida me meto em car-
das de cartões de crédito. “Vivo sozinha com a minha filha, de tões de crédito.”
nove anos. Não tenho casa própria, não tenho carro. Mas pago Na verdade, cair num poço sem fundo é mais fácil do que se
420 euros de renda, ganho o ordenado mínimo e os cartões de possa imaginar. Acontece a pessoas que tinham vidas com-
crédito pareciam uma solução fácil. Usava para pagar a água, pletamente organizadas. Em regra, é o desemprego que pre-
a luz.” A teia começou a ganhar forma em 2019. Abordagens cipita as dificuldades. “E isso pode acontecer a qualquer um
em centros comerciais, por telefone, cartões de crédito à mão de nós, mesmo a quem tem rendimentos altos. As pessoas vi-
de semear. “Fiquei iludida a achar que era uma solução. Até vem as vidas delas de acordo com as possibilidades que têm.
que percebi que já não tinha controlo.” Os extratos chegavam Mas, de repente, mudando algo, caem numa situação difícil”,
e Fernanda não conseguia pagar. Os juros astronómicos a acu- reconhece Zita Medeiros. A maioria dos casos atualmente, as-
mularem. O medo que lhe penhorassem o ordenado, o abis- segura, são as “chamadas insolvências legítimas”, ou seja, não
mo a aproximar-se, o sufoco a apertar. Procurou um advoga- culposas, “e precisamente por isso é que estas pessoas mere-
do. “A minha ideia era juntar os créditos todos num só.” cem o perdão”.
Mas a insolvência foi, afinal, a saída. “Ao início não sabia bem Vamos a números. Até 2008, o número de insolvências pes-
do que se tratava. E, claro, há a vergonha. Sobretudo quando soais rondava as centenas. Foi a partir daí que começaram a
tive de comunicar aos patrões. Mas o advogado tranquilizou- disparar de forma mais visível e cresceram até ao ano do pico,
-me. Como não tenho bens, não tive que entregar nada. E como em 2013, com mais de dez mil processos. Desde então, tem
recebo o salário mínimo, também não tenho que entregar par- vindo a cair, aos poucos. Em 2021, o último ano completo dis-
te dos meus rendimentos. Ao fim de três anos tenho o perdão ponibilizado pelo Ministério da Justiça, foram 6143 as insol-
vências de pessoas singulares. E no ano passado, só até setem-
bro, já havia 5161 processos.
A avalanche, a catástrofe, a cascata de processos da última
crise ainda não chegou. Longe disso. Mas já há pessoas a pro-
curarem advogados para se aconselharem. “Estão a tentar
adaptar-se a esta nova realidade. Sabemos que para a maior
parte das pessoas de classe baixa e média é impossível supor-
tar aumentos de 300 euros na prestação da casa, mas hoje há
mais informação e depois da última crise negoceiam com os
bancos, têm mais cuidado com créditos. Sendo certo que o ce-
nário pode vir a mudar de figura no final do primeiro semes-
tre deste ano”, calcula Zita Medeiros. João Mota da Costa con-
corda. Prevê que a escalada inflacionista vá levar muitas fa-
mílias a uma situação limite ainda este ano. “E por isso é que
importa dar a conhecer que há mecanismos preventivos, de
renegociação, para evitar processos executivos e de insolvên-
cia, com a sempre dramática liquidação de património.”
Na maioria dos casos, assinala, as pessoas procuram ajuda
numa fase já muito avançada da deterioração da situação eco-
nómica e financeira. E deviam fazê-lo “logo que se verifiquem
as primeiras dificuldades”. Também advogada, Rita Rola já
tem sido mais procurada para processos de insolvência pes-
soal. “Ainda é muito cedo para tirar conclusões, mas acredito
que os números vão disparar. Porque as pessoas estão com ren-
dimentos parcos para o custo de vida.”

INVESTIR EM CRIPTOATIVOS, CAIR NO ENDIVIDAMENTO


Recuemos a finais de 2021, inícios de 2022. Foi aí que Alfredo

34 12.02.2023 Notícias Magazine


“VIVO SOZINHA (nome fictício) começou a sentir as dificuldades financeiras.
Divorciado, com um filho adolescente em casa, tinha inves-

COM A MINHA
tido grande parte do património financeiro em ações de crip-
toativos, nomeadamente na moeda digital Bitcoin e em NFTs.

FILHA. PAGO 420


“De forma a realizar os investimentos, fui-me endividando.”
Mas primeiro veio a pandemia, depois a guerra na Ucrânia, e
o valor das ações caiu a pique, os ativos digitais idem. Vendeu

EUROS DE RENDA, alguns, perdeu cerca de um quinto do valor total que investi-
ra. Para se manter à tona, contraiu créditos pessoais na espe-

GANHO O
rança de que “num curto espaço de tempo ganharia muito di-
nheiro de forma fácil”. Na crença de que tudo era passageiro.

ORDENADO MÍNIMO
Abriu um buraco financeiro, uma queda vertiginosa.
“Tive, na verdade, muito azar, porque parte dos meus inves-
timentos estavam numa corretora que faliu, a chamada FTX.”

E OS CARTÕES DE Ainda tentou renegociar os créditos, os bancos fecharam-lhe


a porta. Entrou numa fase de depressão. Sentiu a dor de os pais

CRÉDITO PARECIAM
quererem vender a casa onde vivem para lhe pagar as dívidas
– não contou a outros familiares, vizinhos nem amigos. Pe-

UMA SOLUÇÃO
diu ajuda. “Procurei o advogado Dantas Rodrigues. Já estava
a ser confrontado com os vários processos executivos para co-
brança coerciva das dívidas. Na altura não tinha sequer noção

FÁCIL. USAVA PARA de que a insolvência seria a melhor solução.” Não conhecia a
figura jurídica, mas percebeu que “o prazo para conseguir o

PAGAR A ÁGUA,
chamado ‘fresh start’ era agora de três anos, o que veio facili-
tar muito”. Vive numa casa arrendada, o carro que usa é de ser-

A LUZ”
Fernanda Pereira

Notícias Magazine 12.02.2023 35


viço, da empresa. “Entrego uma parcela do meu rendimento ço pode ter alguns espinhos. “Já vimos bancos a recusarem
mensal ao administrador de insolvência.” abrir uma conta a quem foi considerado insolvente. Operado-
res de telecomunicações a não aceitarem celebrar contratos.
FAMÍLIAS EM AFLIÇÃO Empresas de recrutamento a não contratarem pessoas que fo-
De acordo com a Deco, nos últimos anos as insolvências pes- ram declaradas insolventes.” O objetivo da Deco é evitar que
soais ultrapassam largamente as insolvências de empresas, o as pessoas cheguem a este ponto, “ajudar a reorganizar, a oti-
que é revelador da maior informação e do estigma social a cair. mizar orçamentos familiares”. A olhar para as despesas, a re-
Até 2010, o fenómeno era inverso. Mas esse desfecho não é duzir gastos, a fazer planos de pagamento para cartões de cré-
imediato. “As famílias estão a sentir agora as dificuldades, a dito, por exemplo. “Nos últimos tempos, temos tido alguma
deixar de pagar alguns encargos, como cartões de crédito, cré- pressão de contactos por causa do aumento da prestação do
ditos pessoais, só em última instância é que entram em in- crédito habitação. E estamos a dar toda a informação. Um au-
cumprimento com o crédito habitação. E nessa fase é que pe- mento de 200 euros, muitas vezes, é dramático e saber as al-
dem ajuda”, salienta Natália Nunes, coordenadora do gabine- ternativas que existem é bom.”
te de proteção financeira.
A Deco faz aconselhamento gratuito (sobretudo por telefo- A QUEDA À BOLEIA DE EMPRESAS
ne, por ainda haver muita vergonha), ajuda a apontar cami- Ainda que a realidade atual esteja a massacrar muito as famí-
nhos, sempre de forma extrajudicial. “A decisão é sempre da lias, as insolvências pessoais também chegam, muitas vezes,
família. Mas é muito importante que esteja bem informada à boleia de empresas. José, só José, 53 anos, foi carpinteiro a
do que significa um processo de insolvência, que é doloroso, vida toda. Trabalhava para o irmão. Construiu a casa onde vi-
e em que não se pode entrar de ânimo leve.” Natália alerta que via com a mulher e os dois filhos à conta do trabalho. Uma vida
“muitas pessoas entram no processo com o atrativo de decor- estável, duas carrinhas, uma mota. O irmão sugeriu-lhe que
ridos três anos se livrarem das dívidas, mas sem perceberem comprasse a sua empresa de carpintaria, um presente enve-
que até lá vão perder casa, carros, bens, que parte do seu ren- nenado. Confiou. E o resto é um novelo sem fim. A empresa
dimento tem que ser entregue, há muito desconhecimento”. chegou-lhe às mãos carregada de dívidas. Daí para as penho-
E, apesar de o espírito da lei ser um “fresh start”, o recome- ras dos bens pessoais foi um instante. Mal teve tempo de pis-

36 12.02.2023 Notícias Magazine


“LEVARAM-ME car os olhos. Casa, carros, recheio. “Levaram-me tudo, só me
deixaram a família.”

TUDO. SÓ ME
Mudou-se para uma casa arrendada – 360 euros já com des-
pesas. Tudo o que a mulher recebia acima do salário mínimo

DEIXARAM A
era penhorado. José ainda tentou segurar as pontas com bisca-
tes de carpintaria e a pandemia aterrou que nem bomba. “O
preço do material subiu. Tinha móveis encomendados, que fiz,

FAMÍLIA” mas depois os clientes já não queriam. Foi tudo prejuízo.” Es-
tava a nadar em dívidas, a inflação a juntar-se à festa, acabou
finalmente a pedir ajuda. Depois de um calvário de anos. A in-
solvência foi decretada em dezembro. Agora, espera encontrar
José um emprego. “A minha mulher está a receber o salário míni-
mo, temos que fazer muita ginástica. Vão ser três anos duros,
ao princípio parece uma eternidade. Mas vamos a ver se ainda
vou a tempo de reconstruir alguma coisa da nossa vida.”

“DURANTE TRÊS Maria, só Maria, também viveu o semelhante. O cão, Fred,


de volta dela. Um vira-lata adotado de um abrigo de animais,

ANOS TENHO QUE


não é cão-guia mas é amor. Maria é invisual, cegou aos 21 anos.
Conheceu o falecido marido, que também cegou tarde, num

VIVER ASSIM [SEM


centro de reabilitação para invisuais. Casou, foi morar com
ele para Coimbra, trabalhar como telefonista nas empresas
do marido e do pai dele. O marido acabaria por falecer em 2007,

PARTE DOS vítima de cancro, e as dívidas de uma das empresas dele – que
entretanto já tinham sido vendidas – viriam, anos mais tar-

RENDIMENTOS],
de, cair-lhe no colo qual furacão. “Nos pedidos de emprésti-
mo à banca para as empresas, eu também tinha que assinar

ATÉ ACABAR O
por estar casada em comunhão de adquiridos, mesmo não sa-
bendo o que estava a assinar.” As assinaturas, por ser cega e
não terem sido feitas perante um notário, não eram válidas.

PROCESSO. MAIS O tribunal deu-lhe razão aí, só que já tinham passado os pra-
zos para contestar.

TRÊS ANOS COM A


Passou anos a pagar uma dívida que não era dela. Parte do sa-
lário penhorado. Primeiro, perdeu o apartamento que havia

VIDA AMPUTADA”
comprado depois de o marido falecer (antes vivia em casa do
sogro). Depois o emprego. Mudou-se para o Porto, para uma
casa que a mãe tinha para arrendamento. “Achava que era
temporário, até que me caíram mais dívidas. Dívidas que não
Maria fiz. Uma catrefada que até me benzi. No fundo só confiei no
meu marido e no meu sogro. Isto causa muito revolta.”
Num labirinto de angústia, não houve caminhos alternati-
vos. Pediu insolvência, em outubro do ano passado. Tem 57
anos, nunca mais conseguiu voltar a trabalhar – ao facto de ser
invisual somou-se a idade. Vive com uma pensão de invali-
dez, entrega subsídios de férias e de Natal e tudo o que recebe
acima de um salário mínimo e um terço (valor estipulado pelo
tribunal). “A minha mãe ajudou-me muito. O dinheiro que
recebo é exatamente para cobrir tudo o que apresentei como
despesas ao tribunal, se houver um imprevisto tenho que pe-
dir ajuda. E agora com a inflação é horrível. Durante três anos
tenho que viver assim, até acabar o processo. Mais três anos
com a vida amputada.” Mas ainda guarda resquícios de espe-
rança. “Espero conseguir viver os últimos anos da minha vida
com alguma dignidade.” ● m

Notícias Magazine 12.02.2023 37


HOMENS NO VARÃO
SEM PRECONCEITOS
No pole dance, as mulheres ainda são a maioria.
Mas eles estão cada vez mais seduzidos.
Engenheiros, bancários ou estudantes de
Medicina, na barra não há status que os separe.

TEXTO Sara Oliveira

38 12.02.2023 Notícias Magazine


RITA CHANTRE/GLOBAL IMAGENS

Notícias Magazine 12.02.2023 39


“S
em género e sem limite
de idade.” É assim que a
presidente da Associação
Portuguesa de Varão Des-
portivo (APVD) e instru-
tora profissional de dan-
ça e aéreos, Inês Ribeiro,
promove o pole dance,
uma modalidade com
cada vez mais praticantes
nas vertentes desportiva (sport) e artística. Ain-
da muito associada às mulheres e ao erotismo,
esta é uma arte transversal que vem conquis-
tando também os homens, que, sem medo de
preconceitos, dominam a barra vertical com
base na força ou com foco na flexibilidade, sem
nunca perderem o equilíbrio. É uma forma de
fazer exercício físico, com destreza, até porque
o varão não pára de girar.
Muitos começam por curiosidade ou influen-
ciados pelas companheiras ou amigos, mas aca-
bam rendidos ao ponto de, com a experiência,
se tornarem professores e até campeões. Isto
quando o senso comum ainda teima em rotular
a prática como dança do varão, à conta da ferra-

40 12.02.2023 Notícias Magazine


RITA CHANTRE/GLOBAL IMAGENS

DIREITOS RESERVADOS
menta que a alicerça. ro de pessoas”. “Foi um avanço positivo na mo-
Através de giros, inversões ou movimentos dalidade porque ajudou a desmistificar alguns
conjugados e combinações (e são mais de 300), estereótipos”, recorda.
a dança funde-se com a ginástica, a expressão Atualmente, João Afonso reconhece que “os
corporal e os corpos desinibem-se com fluidez, homens continuam muito renitentes em ex-
quase sempre para contar uma história. Nela perimentar”, admitindo que “o preconceito não
podem entrar “atores”, ou melhor, atletas e per- é em termos da atividade, mas o que a ativida-
formers de ambos os sexos, dos mais novos aos de representa”. Como ainda não consegue vi-
mais velhos, sem julgamentos ou tabus. ver exclusivamente do pole dance, mantém-se
O pole dance teve origem em Inglaterra nos como professor de fitness em ginásios de Alma-
anos 1980. No nosso país, a cortina abriu-se em da e Lisboa, onde, quando faz os exercícios ou
2005, no Círculo de Dança de Lisboa, e Inês re- leva o varão, nota que os homens “têm bastan-
gista “cada vez mais participantes e pessoas a te adesão”, tal como acontece em eventos de
querer experimentar”. “O preconceito está a demonstração. Ou seja, “não é que não exista
dissolver-se dia após dia”, assegura. Quem ar- vontade em querer fazer, é também porque não
O bancário Henrique risca, sente o físico mudar e está comprovado há informação sobre a modalidade, além de não
DIREITOS RESERVADOS

Dantas (em cima à que a saúde fica a ganhar a todos os níveis. existirem estúdios em sítios onde a modalida-
esquerda), brasileiro de possa ser mais visível”, realça. Percebe-se que
de São Paulo radicado Presença no “Got Talent Portugal” o conhecimento de causa é a melhor forma de
em Lisboa, frequenta Pioneiro no universo masculino, depois de so- derrotar ideias preconcebidas.
as aulas de pole dance mar vários desportos (natação, andebol, volei- João, de 31 anos, defende que “os homens, em
no LX Factory. Paulo bol e hóquei em patins), João Afonso estreou- Portugal, só gostam de exercícios ou atividades
Nogueira (à direita), -se no pole dance em 2014. Foi Francisca Leitão, em grupo como o futebol, ou o padel agora, e o
engenheiro eletrotéc- “uma pole dancer de Sintra” que o apresentou pole é muito individual, por isso não fazem”.
nico e ex-praticante de ao varão e nunca mais parou. “Nunca senti qual- “Uma aula de pole dance é considerada uma ati-
râguebi, foi influenciado quer preconceito. A única preocupação que ti- vidade individual, uma vez que cada um evolui
pela mulher. Licenciado nha era mostrar, com um varão que tivesse por à medida das suas capacidades e isso não causa
em Educação Física, perto, que não tem nada a ver com striptease”, perturbações entre as pessoas que estão a pra-
João Afonso (à revela. Desde 2014, evoluiu e ficou habilitado ticar”, explica. “Faz bem ao corpo e à mente.”
esquerda em baixo) a dar aulas, foi campeão nacional e participou
estreou-se na modali- no Campeonato do Mundo de Pole e Aéreos. Engenheiro e professor de pole dance
dade há quase uma Licenciado em Educação Física, adquiridos co- Com a mulher “sempre associada às danças”,
década. E até já brilhou nhecimentos em Roma – onde estudou e deu Paulo Nogueira, de 41 anos, deixou-se enredar
na televisão aulas em três escolas –, em 2016, João partici- por este mundo quando “ela perguntou se não
pou no “Got Talent Portugal”, na RTP1, onde queria experimentar”. Amante de desporto –
conquistou o botão dourado por parte do jura- “joguei râguebi federado e sempre fiz surf e des-
do Pedro Tochas, seguindo para as galas em di- portos náuticos, além de fazer musculação, ago-
reto. Na mesma edição do talent show estive- ra estou também no crossfit” –, aceitou o desa-
ram mais dois pole dancers masculinos e a opor- fio e acabou “surpreendido pela positiva”. “Não
tunidade permitiu “chegar a um maior núme- estava à espera que fosse fisicamente tão pesa-

Notícias Magazine 12.02.2023 41


do e intenso. Comecei a praticar e não parei até
hoje”, conta, recuando “sete ou oito anos”. “O
pole foi uma outra forma de ver a dança e asso-
ciar a minha capacidade física à sua prática”, des-
creve. Mesmo sem concretizar uma espargata
ou puxar uma perna para as costas, diz ter “uma
flexibilidade significativa”.
Engenheiro eletrotécnico de profissão, nos
primeiros tempos não contou a ninguém o que
andava a fazer. “Só que, depois, comecei a en-
trar em espetáculos e falei com alguns colegas
de trabalho para perceber se queriam ir ver, até
porque um ou outro, mais reservado, já sabia
que eu fazia. Seguiram-se convites para dançar
na televisão e as pessoas ficaram a conhecer-me
um bocadinho mais. No entanto, no início, não
falei a muitas pessoas, por receio das más inter-
pretações.” Perante a apreensão dos pais, jun-
tou fotos e vídeos e um convite para assistirem
à festa de final de ano da escola, dissipando
quaisquer dúvidas.
Paulo Nogueira sentiu o peso dos juízos de va-
lor quando quis fazer uma festa de pole num
teatro e ouviu os responsáveis da sala dizerem
que “não faziam esse tipo de espetáculo”. “Exis-
te um distanciamento de determinadas enti-
dades que deviam ter outra mentalidade”, la-
menta. Apesar disso, sente que “as pessoas já es-
tão muito mais abertas ao pole dance, sobretu-
do a partir do momento em que apareceu no
‘Got Talent’ e pessoas conhecidas começam a
praticar. Ajuda a desmistificar”. A par de dias en-
tre projetos e estudos na área da eletrotecnia,
Paulo também dá aulas no varão, sem nunca
descurar o lado de praticante. Descreve-se como
“um amador de nível avançado”.

“Falo abertamente do que faço”


É na Academia de Pole Dance, em Lisboa, que se
pode encontrar Paulo Nogueira. Ali sempre hou-
ve vários homens a dar aulas. Inclusive as que
versam despedidas de solteira. Este foi o primei-
ro estúdio inteiramente dedicado à prática e en-
sino da modalidade a surgir em Portugal, em
2007, pelas mãos de Andreia Pinheiro, que con-
tinua a receber mais mulheres do que homens.
“Eles ainda não aderem tanto e são casos pon-
tuais os que vêm experimentar. Mas este pode
ser um desporto muito masculino e acrobático,
em que é necessário muita força”, assinala a res-
ponsável.
Entre os alunos, cruzámo-nos com Henrique
Dantas, brasileiro de São Paulo radicado em Lis-
boa “há três anos” e onde anteriormente havia
estado em Erasmus. A responsável por se ter ini-
ciado no pole dance foi a mulher, Thaís, que “sem-
pre fez danças orientais”. “Ela tinha um varão
em casa, no Brasil, e sempre teve vontade de ter
aulas. Quando viemos para Portugal, prometi
que iria fazer uma modalidade de dança com ela.
Nunca imaginei que fosse o pole dance, mas ela

42 12.02.2023 Notícias Magazine


No Studio Alma, em Vila “muitos já ficaram fãs”. Ao lado, Gonçalo Castro,

IGOR MARTINS/GLOBAL IMAGENS


Nova de Gaia, Inês que está a terminar o mestrado em Medicina, no
Ribeiro, presidente da Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, no
Associação Portuguesa Porto, não passa sem as aulas com Inês Ribeiro,
de Varão Desportivo, no espaço em Vila Nova de Gaia. Iniciou-se em
auxilia Gonçalo Castro, 2018, “numa altura de muito stress, em que já não
que está a terminar o fazia exercício regular”. “Queria voltar a dançar,
mestrado em Medicina, porque tinha dançado quando era mais jovem.
enquanto André Alves, Experimentei o pole e nunca mais larguei”, rebo-
finalista de Enferma- bina. A família não estranhou, pois “já estava ha-
gem, assiste ao exercí- bituada”. “Para eles, é mais um desporto não con-
cio. O pole dance conti- vencional e está tudo bem”, acrescenta.
nua a quebrar barreiras Ao contrário de André, Gonçalo só anda por “ro-
tina fitness, como exercício físico”. “Por não ser
extremamente flexível, acabo sempre por privi-
legiar mais a força”, assume, afirmando o estilo.
Quando for médico, o mais provável é manter-
-se fiel ao pole, pois “é como ir ao ginásio, basta
tirar uma hora”.

Distinto do striptease e a
viu a escola no LX Factory e inscrevemo-nos jun- caminho dos Jogos Olímpicos
tos. Já lá estamos há um ano, com o professor Hu- Ao contrário do que sucede em alguns casos, Gon-
go Matos”, partilha o bancário, de 30 anos. çalo Castro nunca sentiu que o associassem ao
Henrique garante que se sai melhor em exercí- striptease. E com justiça. Como pormenoriza Inês
cios de força, acusando “alguma dificuldade Ribeiro, o pole dance exibe-se nas “vertentes des-
quando se trata de flexibilidade, que tem melho- portiva e artística, e depois há a exótica, que é di-
rado”. Sem falsos pudores, fala “abertamente” ferente e é onde se usam tacões e outras indu-
do que faz e isso “gera mais curiosidade do que mentárias”. “O striptease é distinto disto tudo,
preconceito”. Antes, já fez remo, bicicleta, cor- mas infelizmente é aquilo que uma grande par-
rida de rua, sem nunca deixar o ginásio. Cons- te da população pensa que o pole dance é – uma
ciente das limitações, ainda não se sente prepa- forma de ganhar dinheiro através da arte de des-
rado para exibições, se bem que seja um desejo a pir e que não pretendemos representar”, salva-
concretizar. Para isso, adquiriu um pacote de au- guarda a também presidente da APVD, que re-
las extra, com vista a apurar destrezas mais rapi- presenta nacional e internacionalmente o pole
damente. sport e os desportos aéreos. Tudo em estreita li-
gação com a International Pole Sports Federa-
Entre os hospitais e a barra tion, cujo objetivo é a inclusão da modalidade nos
Os palcos são o cenário favorito de André Alves Jogos Olímpicos.
que chegou ao pole dance, há dois anos, à boleia A 4 de fevereiro, o Auditório do Olival, em Vila
do sonho de ser artista de circo. “Foi muito en- Nova de Gaia, recebeu a mostra anual de pole e
graçado, porque o meu pai andava à procura de aéreos da associação (que batalha por ver o pole
escolas de circo no Porto. Não encontrava nada dance ser reconhecido oficialmente como mo-
perto e acabou por me dizer que tinha visto um dalidade desportiva), dando a conhecer ao públi-
estúdio de pole dance e umas coisas áreas, para co o que se faz em Portugal, com atletas de am-
eu experimentar. Fiquei apaixonado e nunca bos os sexos em ação. Um aperitivo para o cam-
mais larguei”, lembra o jovem finalista de En- peonato nacional, marcado para 29 e 30 de abril.
fermagem, antes de mais uma aula no Studio Campeã nacional “em sport em 2021 e artística
Alma. Isto enquanto se contorce no aquecimen- em 2022”, Joana Magalhães entrará novamente
to, como se fosse elástico, não fosse a flexibili- em competição em breve. Consciente que “o po-
dade a sua mais-valia. Para ele, “é um prazer” di- le dance ainda está muito associado à mulher e a
vidir-se entre mundos tão diferentes, entre a Es- outras áreas”, observa que “o homem, quando
cola Superior de Saúde Santa Maria e o pole dan- gosta deste tipo de exercido, recorre mais aos ca-
ce, sem desistir de um dia chegar à arena circen- listénicos (em que se usa o peso do próprio cor-
se. Quem sabe ao Cirque du Soleil. “O maior so- po)”. Isso traduz-se em imagens singulares, mas
nho”, suspira. igualmente envolventes. Por vezes, Joana treina
Em conversa com os amigos, André percebe que à mesma hora que Gonçalo e André, que provam
“ficam todos entusiasmados” ao ouvi-lo falar so- que o desempenho é sempre individual, por maior
bre a modalidade, “pois nunca tinham visto uma que seja o grupo na sala. Enquanto se executam
versão desportiva do pole dance e tinham uma diferentes exercícios, os corpos movem-se com
ideia errada”. Acaba por os convencer a tentar e liberdade. E sem sombra de estigma social. ● m

Notícias Magazine 12.02.2023 43


VIOLÊNCIA
VS EXPLORAÇÃ0
A violência Sabes qual é a diferença
entre violência sexual e ex-

sexual tem
ploração sexual? A explo-
ração é o tipo de abuso que
acontece quando a criança

muitas formas ou adolescente sofre abuso


sexual em troca de alguma
coisa. Seja comida, roupa,
um lugar para dormir
Toques íntimos indesejados, envio de “nudes”, até
conversas e perguntas desconfortáveis sobre o sexo (mais habitual em crianças
muito pobres ou que pro-
e a intimidade. Percebe os sinais de alerta e o que curam fugir da casa dos
podes fazer se um dia te deparares com uma pais) ou dinheiro. Neste
situação destas. caso, falamos de prostitui-
POR Ana Tulha ção infantil e implica que al-
guém lucre financeiramen-
te com a exploração sexual
do menor.

O QUE ESTÁ
EM CAUSA
É possível que quando
ando ouves falar
de violência sexuall contra crianças
e jovens penses numum adulto
adultto a obri-
ob
gar um menor a ter sexo com ele (ou
ela). E não estás errado. Mas é im-
portante que saibas que a violência
sexual não acontece apenas quan-
do há penetração. Pelo contrário,
tem muitas formas. Pode ser um to-
que íntimo indesejado (como um
beijo na boca ou uma mão nos ór-
gãos genitais). Ou um comentário
de cariz sexual. Ou um envio de
uma foto suspeita – as chamadas
“nudes”. Os agressores podem ain-
da forçar as vítimas a tocar-lhes nos
órgãos sexuais. Ou fazê-las assis-
tir ou participar em filmes ou foto-
grafias de caráter pornográfico. Ou
até insistir em conversas ou ques-
tões intrusivas sobre o sexo e a in-
timidade. E estes são apenas al-
guns exemplos.

44 12.02.2023 Notícias Magazine


!
O QUE SE PASSA NA IGREJA?
Provavelmente, já te apercebeste de que nos últimos tempos a Igreja tem
surgido associada a esta temática da violência sexual. Sabes porquê? Por-
que, depois de em vários países terem rebentado escândalos relacionados
com o abuso sexual de menores por parte de membros da Igreja (em Fran-
ça, por exemplo, estima-se que, entre 1950 e 2020, tenha havido mais de 200
mil vítimas), decidiu-se também tentar perceber a extensão do problema em

PERIGO Portugal. Para isso, foi criada uma comissão independente que, há mais ou
menos um ano, está a recolher denúncias e a procurar fazer um raio-X des-

À SOLTA
te flagelo. O relatório final será apresentado esta segunda-feira, dia 13. No
último balanço público, que foi feito em outubro, a comissão tinha já rece-
bido mais de 400 denúncias.

NA INTERNET
Possivelmente, és um fã assumido
da Internet e de todas as ferramen- ALERTAS E
O QUE FAZER
tas que ela te permite usar. Mas con-
vém estares consciente de que,
quando usada de forma errada, a
web pode pôr-te em perigo. Na ver- Há outros dados importantes que
dade, o mundo cibernético veio au- convém reteres. Um deles é que,
mentar o leque de possibilidades de muitas vezes, as pessoas que so-
exercer violência sexual sobre os frem os abusos, sobretudo quando
mais novos. Porquê? Porque há são menores, não percebem logo o
muitos pedófilos e violadores que ti- que está a acontecer. Nem perce-
ram partido da ingenuidade das bem que são vítimas. Outro é que di-
crianças e jovens que a usam e se ficilmente será possível reconhecer
aproveitam deles. Refugiados atrás um pedófilo ou agressor à primeira
de um ecrã que lhes permite vista. Na maioria dos casos, trata-se
ocultar a verdadeira identi- até de alguém próximo da vítima.
dade, fazem-se passar Seja na escola, no futebol, até den-
por outras pessoas, qua- tro da própria família. Também é co-
se sempre jovens (por mum que os abusadores tentem
vezes enviam até supos- convencer as vítimas a não falar so-
tas fotos deles, que na bre o assunto com terceiros (só o
verdade não são reais), pedido de segredo é um claro indí-
com o intuito de conven- cio de que algo está errado...). Ou-
cer as vítimas a enviar “nu- tro sinal de alarme é o facto de as ati-
des” ou até a alinhar em tudes e gestos da pessoa em cau-
encontros cara a cara. sa te provocarem desconforto, nojo,
Quando finalmente vergonha, angústia, medo. Perante
se percebe com isto, o que podes fazer? Falar com
quem se esteve um adulto da tua maior confiança e
a falar, pode explicares exatamente o que
ser dema- aconteceu e como isso te fez sen-
siado tarde. tir. Se, por acaso, isso for desva-
lorizado, insiste. Ou tenta um outro
adulto de confiança (nunca o au-
tor dos abusos, por muito próximo
que ele seja de ti). E mais importan-
te, nunca te esqueças disto: a cul-
pa NÃO é tua. E o teu corpo tem de
ser respeitado SEMPRE.

Notícias Magazine 12.02.2023 45


QUANDO EU ERA PEQUENIN@
TELMA MADEIRA A MISS
QUE QUERIA SER CRIMINOLOGISTA
Em janeiro, Telma Madeira classificou-

ANDRÉ ROLO/GLOBAL IMAGENS


-se no top 16 do concurso Miss Univer-
so, a melhor posição alguma vez alcan-
çada por uma representante portugue-
sa. “Um sonho tornado realidade” anos
depois de ter sofrido bullying na adoles-
cência. Aos 23 anos, a modelo da Póvoa
de Varzim superou os traumas passados
e com o título de Miss Universo Portu-
gal voou até aos Estados Unidos, onde se
distinguiu entre as semifinalistas em
competição. O percurso nos concursos
de beleza começou em 2017, com vários
títulos no currículo, antes do passapor- cinou o lado da criminologia. Queria ser
te para o cobiçado certame. médica-legista. Todos os meus colegas
“Tímida” na infância, Telma tem atual- ficavam a olhar para mim quando o di-
mente a comunicação como área em que zia”, recorda.
quer evoluir, se possível “em televisão”. Filha única, Telma Madeira sempre foi
Em criança, “nem pensava sequer em “muito próxima da família”. “Adorava
ser Miss”. Nessa altura, “sempre me fas- as férias de verão, quando eu e os meus
pais nos divertíamos muito”, sublinha.
Mónica e Carlos Madeira viajaram até
Nova Orleães, EUA, para assistirem ao
Miss Universo e apoiarem a sua meni-
na. “Foi fantástico”, sublinha Telma.
Etapa a etapa, a jovem ficou “incrédu-
la” quando ouviu o seu nome e o de Por-
tugal no lote de 16 semifinalistas. “Co-
mecei logo a chorar porque foi um mar-
co na minha vida”, confessa. A entrevis-
ta oficial foi a prova que mais gostou, por
se poder dar a conhecer melhor e mos-
trar que não é “só mais uma cara boni-
ta”. “Nós temos muito mais para além
disso. Eu própria desenvolvi um proje-
to social, ‘Sê a voz da realidade’, em que
tive oportunidade de viajar por todo o
país e falar sobre a saúde mental”, afir-
ma, determinada em continuar a fazer
a diferença.● m
SARA OLIVEIRA

46 12.02.2023 Notícias Magazine


MLADEN ANTONOV/AFP

tag.jn.pt
AUSTRÁLIA
REI DE INGLATERRA NÃO
VAI APARECER NAS NOVAS NOTAS
As novas notas de dólar australiano,
que deverão ser lançadas dentro de
alguns anos, vão deixar de ter o retrato
do monarca britânico. Até aqui, a fale-
cida rainha Isabel II aparecia nas no-
tas de cinco dólares. O rosto do rei BRINCAR NA RUA É
vai ser substituído por figuras aborí- IMPORTANTE (E NÃO É DIFÍCIL
genes, primeira comunidade a viver PERCEBER PORQUÊ)
na Austrália. Nas moedas, no entan-
to, continuará a figurar o monarca Mexer o corpo torna-te mais ágil e autóno-
de Inglaterra. mo. Puxar pela cabeça em jogos e aventuras
ao ar livre ajuda-te a exercitar o raciocínio.
Os especialistas recomendam. Por muitos
motivos. Mas o panorama não é animador.
Sabe tudo no site do TAG.

RÚSSIA DIREITOS RESERVADOS

GUERRA LEVA MÃES


RUSSAS A DAR À LUZ
NA ARGENTINA
Já era uma opção para algumas fa-
mílias, mas com a guerra na Ucrâ-
nia e o isolamento da Rússia do
resto do Mundo, cada vez
mais mães optam por ter
os filhos na Argentina. As
À volta do Mundo

famílias preferem realizar


esta viagem na altura do
parto para que o recém- HÁ UM CRIME NO MUSEU –
-nascido obtenha a ci- E TU PODES RESOLVÊ-LO!
dadania argentina, o que
facilitará, de futuro, deslo- Os crimes estão de volta ao Pavilhão do Co-
cações internacionais. As condi- nhecimento com uma nova e misteriosa
ções médicas são também um fa- aventura que só a ciência pode ajudar a reve-
tor a considerar, já que na Rússia lar – com a tua especial ajuda, claro. Tudo se
a medicina não oferece tanta passa em Lisboa, neste museu construído
qualidade e segurança. por altura da Expo 98. Lê mais em tag.jn.pt.

Notícias Magazine 12.02.2023 47


ACEITAÇÃO
POR Sofia Teixeira

O problema amigos disponíveis, bons profissionais, compa-


nheiros pacientes, pessoas com sentimentos no-
bres. Condições, convenhamos, pouco compatí-

da autoestima veis com a realidade do que somos tantas vezes: fi-


lhos que dão preocupações, amigos demasiado
ocupados, profissionais que cometem erros, com-
panheiros irritáveis, pessoas que sentem raiva do
Tanto foco no valor pessoal e tantas ‘dicas’ para próximo. E o que é que acontece nessas alturas em
melhorar o amor-próprio podem estar apenas a que não cumprimos com as expectativas? Temos
menos confiança no nosso próprio valor.
servir para nos tornar mais infelizes. Mais
“É por isso que o conceito de autoestima pode
importante do que nos sentirmos sempre bonitos, ser prejudicial: porque implica corresponder a
capazes, inteligentes e talentosos parece ser aceitar uma condição ou exigência ”, refere a psicóloga
aquilo que é uma inevitabilidade: que, de facto, nem clínica e psicoterapeuta Cláudia Madeira Perei-
sempre nos sentiremos assim. ra. “Ficamos dependentes dos julgamentos e ava-

N
liações acerca dos nossos ‘sucessos’ ou ‘insuces-
sos’ por comparação – seja com outras pessoas,
seja connosco próprios no passado”, detalha.
as últimas décadas, a autoestima Paradoxalmente, quando nos dizem insisten-
tornou-se num dos conceitos mais temente que ‘devíamos’ ter autoestima, está em
populares da psicologia. Milhares jogo a mesma dinâmica: sentimos que acreditar
de artigos, livros e oradores moti- no nosso valor é, em si, uma condição para ter-
vacionais informam-nos que de- mos valor. Parece uma subtileza de linguagem,
vemos gostar de nós próprios e que, mas é um problema profundo: a valorização so-
se não gostarmos, podemos apren- cial da autoestima tornou o amor-próprio em
der a fazê-lo. Acontece que estes mais um bem que devemos possuir a todo o cus-
conselhos, presumivelmente sen- to. Que nos sentimos obrigados a ter. Então, so-
satos, podem estar a criar mais pro- mos infelizes se não o temos.
blemas do que aqueles que resolvem.
É preciso dizer que o conceito se tornou tão fa- Nós e os outros
lado por boas razões: a investigação mostra que Nas últimas décadas têm surgido vozes que apon-
as pessoas com uma boa autoestima são mais fe- tam para a promoção excessiva da autoestima,
lizes, mais bem-sucedidas, têm melhores rela- não apenas como uma fonte de disfuncionalida-
ções interpessoais e menos probabilidade de fi- de individual, mas também social, nomeada-
carem deprimidas. Mas, se gostar de nós próprios mente, como uma das origens do narcisismo e da
é saudável, o dever de o fazer e o caminho para lá desvalorização dos outros.
chegar podem não ser. Porque a mesma sociedade que valoriza a au-
A definição de autoestima parece bastante ino- toestima, também valoriza a competitividade e
fensiva à superfície: ter confiança no próprio va- o sucesso. “Somos seres sociais, produtos de so-
lor. Mas como é que definimos habitualmente o ciedades que estão muito assentes em mecanis-
nosso valor? “Desde cedo vamos formando uma mos de comparabilidade social, em que o estatu-
avaliação de nós próprios a partir daquilo que vão to e o valor individual se medem por aquilo que
sendo as mensagens dos outros sobre nós e a for- se tem e pelas experiências às quais consegui-
ma como nos fazem sentir”, explica a psicóloga mos, ou não, aceder – especialmente quando nos
clínica Carla Cunha, professora da Universidade comparamos com os outros”, sustenta Carla Cu-
da Maia, onde coordena o mestrado em Psicolo- nha. E comparamo-nos com os outros não é no-
gia Clínica e da Saúde. Ou seja, valorizamo-nos vidade, mas a forma como o fazemos é, vivendo
“na medida em que ‘encaixamos’ ou não na pres- nós na era de redes sociais. “Escolhe-se seletiva-
ILUSTRAÇÕES: ADOBE STOCK

crição social” e “nas expectativas dos outros, que mente o que se mostra das nossas vidas e somos
depois se tornam nossas”. expostos a momentos particulares, também eles
Estabelecemos então, desde novos e quase sem- selecionados e editados, por isso estamos prova-
pre sem dar conta, uma série de condições para nos velmente mais expostos do que nunca aos efei-
sentirmos dignos de valor: ser filhos obedientes, tos da comparabilidade social.”

48 12.02.2023 Notícias Magazine


Notícias Magazine 12.02.2023 49
ACEITAÇÃO

50 12.02.2023 Notícias Magazine


Na comparação com os outros, para sentirmos
que temos valor, frequentemente, precisamos
de nos sentir melhores ou especiais. Mas, como
defende nos seus livros e apresentações Kristin
Neff, investigadora e autora na área da autocom-
paixão, da Universidade do Texas, nos Estados
Unidos, ser mediano é hoje considerado um in-
sulto: ninguém quer ser um profissional media-
no ou uma mãe mediana. Mas estarmos todos ção connosco próprios e direcionam-nos para
acima da média é, por definição, uma impossi- aquilo que precisamos de mudar internamente.”
bilidade.
Isso leva-nos a arranjar atalhos pouco saudáveis Aceitar para mudar
para resolver essa dificuldade. Em vez de supor- Ao consultório de Cláudia Madeira Pereira che-
tarmos a dor de estar aquém das expectativas, cria- gam com frequência pessoas que procuram aju-
mos mecanismos de distorção da realidade: um é da por não se sentirem bem com características
valorizarmo-nos em excesso, caindo no narcisis- físicas, de personalidade, com pensamentos, sen-
mo, o outro é depreciando os outros. “A extrema timentos ou situações que veem como fracassos.
importância que se tem dado ao aumento da au- “Embora as pessoas procurem ajuda para mudar
toestima tem contribuído para um fenómeno psi- todas essas condições com a finalidade de se sen-
cológico que se manifesta na necessidade, geral- tirem melhor consigo próprias e aumentar a sua
mente inconsciente, que as pessoas têm em jul- autoestima, na verdade, precisam primeiro de
gar negativamente ou diminuir outras para se sen- aprender a acolher-se e aceitar-se, tal como são”,
tirem superiores ou melhores consigo próprias”, garante.
constata Cláudia Madeira Pereira. Isto é um pro- Na verdade, a maioria das teorias psicológicas
blema individual, mas têm mostrado que é a aceitação – e não a autoes-
também social, por- tima – uma das condições essenciais da mudan-
“NÃO PRECISAMOS DE NOS que na origem deste ça. Carl Jung, o fundador da psicologia analítica,
SENTIR SUPERIORES OU mecanismo estão fe- dizia que “aquilo a que se resiste, persiste”. Carl
MELHORES DO QUE AS OU- nómenos como o pre- Rogers, um dos pais da terapia humanista, asse-
TRAS PESSOAS, OU DO QUE conceito, o bullying e gurava que “o curioso paradoxo é que, quando
NÓS PRÓPRIOS NO PASSA- a intolerância. nos aceitamos como somos, podemos finalmen-
DO, PARA NOS SENTIRMOS “Ainda faz sentido te mudar”. E no centro da Terapia Focada nas
BEM CONNOSCO” refletir sobre os aspe- Emoções está a frase “não se pode sair de um lu-
tos da autoestima, gar sem antes lá ter chegado”.
Cláudia Madeira Pereira dada a forma como E aceitar significa conseguir pôr de lado a ideia
Psicóloga clínica e psicoterapeuta este conceito pene- de julgar o valor. “A autoestima é o nível de ava-
trou os nossos discur- liação positiva que atribuímos a nós próprios, (...)
sos quotidianos, tor- a autocompaixão não é um processo avaliativo,
“ESCOLHE-SE SELETIVA- nando-se uma refe- mas sim de uma atitude e de uma forma de nos
MENTE O QUE SE MOSTRA rência também para as relacionarmos connosco próprios, baseada na
DAS NOSSAS VIDAS E pessoas que atende- empatia, aceitação e bondade, sem julgamentos,
SOMOS EXPOSTOS A mos em consulta”, de- avaliações ou comparações”, esclarece Cláudia
MOMENTOS PARTICULA- fende Carla Cunha,
“quanto mais não seja,
Madeira Pereira. “Desta forma, não precisamos
de nos sentir superiores ou melhores do que as
RES, TAMBÉM ELES SELE- será útil para refletir outras pessoas, ou do que nós próprios no passa-
CIONADOS E EDITADOS, com as pessoas acerca do, para nos sentirmos bem connosco.”
POR ISSO ESTAMOS PRO- da forma como se au- É isso que nos permite mudar: só com a tranqui-
VAVELMENTE MAIS toavaliam e como fo- lidade de aceitar o que somos – agora – podemos
EXPOSTOS DO QUE NUNCA ram formando o cálcu- avançar para o que queremos ser. “A autocrítica
AOS EFEITOS DA COMPA- lo do valor próprio”.
No entanto, a profes-
e o julgamento negativo deixam a nossa mente
deprimida, insegura, ansiosa, irritável e revolta-
RABILIDADE SOCIAL” sora da Universidade da, o que destrói a motivação e a resiliência ne-
da Maia e formadora cessárias a qualquer mudança positiva e susten-
Carla Cunha da Sociedade Portu- tável a longo prazo”, resume a psicóloga.
Psicóloga clínica guesa de Terapia Foca- Então, voltando ao princípio: milhares de arti-
da nas Emoções, expli- gos, livros e oradores motivacionais informam-
ca que, de acordo com -nos que devemos gostar de nós próprios e que,
vários modelos de psicoterapia e intervenção psi- se não gostarmos, podemos aprender a fazê-lo.
cológica mais recentes, que subscreve, prefere O que não dizem é que isso implica, em primei-
outros construtores como a autoaceitação ou a ro lugar, estar em paz com todos os momentos
autocompaixão. “Porque enfatizam mais a rela- em que não gostamos. ● m

Notícias Magazine 12.02.2023 51


bem-
estar
FACOEMULSIFICAÇÃO
POR Ana Tulha

Quando a
Começa quase sempre com uma espécie de né-
voa, a visão que se vai turvando, a acuidade visual
que se vai perdendo com o passar da idade, os ha-

“objetiva” perde
los que se formam à volta da luz, o número do au-
tocarro que já não se consegue ver, as legendas na
televisão que já se tem dificuldade em acompa-

a transparência
nhar, as alterações frequentes na graduação dos
óculos, por vezes uma dificuldade excessiva em
conduzir à noite, uma intolerável sensação de en-
cadeamento, aqui e ali a sensação de visão dupla.
Não o queremos de todo assustar, caro leitor, mas
se já não caminha para novo, se esta descrição lhe
Antes diabolizadas por serem conotadas com uma
é familiar e se já há algum tempo não vai ao oftal- cegueira praticamente certa, as cataratas têm hoje um
mologista, está na altura de marcar consulta. Até prognóstico bem distinto. A cirurgia (quando necessária)
porque as cataratas atingem uma parte muito é feita em regime de ambulatório e o doente deixa o
considerável da população idosa (ver caixa). hospital passado pouco tempo, pelo seu próprio pé.
A boa notícia é que muito tem mudado a este
nível. Se no século passado eram imediatamen-
te conotadas com uma cegueira praticamente
certa, hoje o cenário é bem distinto. “Agora a
maior parte das pessoas já é operada antes de dei-
xar de ver totalmente. E em condições normais
é totalmente reversível”, assinala Pedro Mene-
res, diretor do serviço de oftalmologia do Cen-
tro Hospitalar Universitário de Santo António,
no Porto.
Mas vamos ao início. As cataratas são a “perda
progressiva da transparência do cristalino [uma
das duas lentes que temos no olho; a outra é a cór-
nea]”. “Quanto maior for esta opacidade, maio-
res vão ser as perturbações da visão”, acrescenta
o especialista. Pita Negrão, coordenador de oftal-
mologia do Hospital CUF Descobertas, em Lis-
boa, recorre a uma metáfora para explicar o que
acontece aos nossos olhos quando as cataratas se
desenvolvem. “Olhando para o olho como se fos-
se uma máquina fotográfica, o que sucede é que
a objetiva da máquina perde a transparência. E o
que é que temos de fazer? Temos de mudar a ob-
jetiva para que volte a ser transparente.”
E a explicação não podia ser mais simples. Tudo
se resume ao facto de envelhecermos. E ao enve-
lhecermos há um processo de oxidação que se
traduz em dores de cabeça várias. Claro que de-
pois há outros fatores que podem precipitar ou
acelerar o problema. “Algumas medicações, por
exemplo. Sabemos que tratamentos prolonga-
dos à base de cortisona podem ter esse efeito. A
própria diabetes pode acelerar o processo, por-
que se traduz num aumento da idade vascular.”
Note-se que há outro tipo de cataratas – congé-
nitas (que estão presentes no nascimento ou logo
após o mesmo) ou traumáticas (provocadas por
traumatismo), por exemplo –, mas não represen-
tam de todo a parte mais substancial dos casos.

52 12.02.2023 Notícias Magazine


.ADOBESTOCK
À boleia de um dentista
DIREITOS RESERVADOS

E como se tratam? “O tratamento, quando ne-


cessário, é cirúrgico”, esclarece o médico da CUF.
Impõe-se, no entanto, uma ressalva: nem todos
os doentes que têm cataratas precisam de ser
operados no imediato. Nalguns casos, a evolu-
ção é tão lenta que nem sequer chegam a ter de “OLHANDO
ser submetidos a cirurgia. Mas de volta à cirur- PARA O OLHO
gia. Facoemulsificação é o palavrão que dá nome. COMO UMA
Pita Negrão volta a socorrer-se de uma metáfo- MÁQUINA
ra. “O cristalino é como se fosse um tremoço,
uma lente transparente que tem uma cápsula à FOTOGRÁ-
volta. O que fazemos é abrir uma espécie de tam- FICA, O QUE
pinha nessa cápsula e, depois, com os ultrassons, SUCEDE É
destrói-se e aspira-se o que lá está dentro. A se- QUE A ‘OBJE-
guir, colocamos nesse mesmo espaço uma len- TIVA’ PERDE
te que se desdobra. E cuja graduação é calculada A TRANSPA-
a priori.” Curiosamente, a inspiração para esta
técnica até surgiu quando um afamado oftalmo-
RÊNCIA”
logista, Charles Kelmann, estava no dentista. Pita Negrão
Reza a história que tinha ido fazer uma limpeza Oftalmologista
.ADOBESTOCK

Notícias Magazine 12.02.2023 53


bem-
estar
FACOEMULSIFICAÇÃO

FACTOS & NÚMEROS

.ADOBESTOCK
50%
A percentagem de pessoas com
mais de 70 anos que têm cataratas
relevantes ou que já foram submeti-
das a cirurgia.

2
de tártaro quando perguntou ao colega que o tra-
tava que tipo de aparelho estava a usar e ele lhe
respondeu que se tratava de uma broca movida
a energia de ultrassons. E assim nasceu a ideia
de fazer apenas uma pequena incisão no olho,
destruindo a catarata através de ultrassons. En-
tretanto, a técnica, exigente mas certeira, mas-
sificou-se e foi aprimorada. A partir da entrada
Hoje, a facoemulsificação é um procedimento
relativamente rápido, feito em regime de ambu- na terceira idade,
latório e com o doente acordado, uma vez que
apenas é aplicada anestesia tópica. “Passado umas
é aconselhada
horas, está a sair pelo seu próprio pé. Nos primei-
ros dias tem de colocar umas gostas e não pode
vigilância regular,
apanhar nem pó nem vento, mas a reabilitação com idas ao
é rápida”, assegura Pedro Meneres, que também
desconstrói a ideia de um possível desconforto oftalmologista de
motivado pela inserção de uma lente artificial.
“Ao contrário das lentes de contacto, que são usa-
dois em dois anos.
das à superfície e podem potenciar o desconfor-
to, esta lente [em acrílico] é uma lente intraocu-

A INFLUÊNCIA DA SEGUNDA GUERRA


lar, colocada numa zona onde não temos essa sen-
“A MAIOR sibilidade.” E prevenir, é possível? Nem por isso.
PARTE DAS Claro que uma alimentação equilibrada, um cor- As lentes intraoculares surgiram durante
po livre de tabaco e de quantidades excessivas de a Segunda Guerra Mundial, quando
PESSOAS JÁ É álcool será, em teoria, mais saudável e, portan- o oftalmologista inglês Harold Ridley
OPERADA to, menos propenso a processos de envelheci- reparou que, na sequência de uma
ANTES DE mento e oxidação mais acelerados, mas apenas explosão na cabine de plástico do avião,
DEIXAR DE isso. No entanto, há algo relevante que pode e vários fragmentos entraram nos olhos
VER TOTAL- deve ser feito, alerta o especialista: “Nesta idade dos pilotos que seguiam a bordo,
MENTE. EM em que este tipo de problemas começa a apare- sem que estes apresentassem qualquer
cer é muito importante fazer uma vigilância re- tipo de rejeição ao plástico.
CONDIÇÕES gular. Porque tanto podemos estar a falar de ca-
NORMAIS É taratas como de glaucoma ou de uma degeneres-
TOTALMENTE cência macular [doença degenerativa da área cen-
REVERSÍVEL” tral da retina] ligada à idade. E nestes casos a de-
Pedro Meneres teção precoce do problema pode ser fundamen-
Oftalmologista tal para que o tratamento seja mais eficaz.” ● m

54 12.02.2023 Notícias Magazine


A vida como ela é
Por Margarida Rebelo Pinto

Do fundo do coração
Não conheço nenhum O coração, como aliás todos os órgãos, está sujeito a avarias e a alterações mor-
fológicas. Diz a ciência que as emoções fortes podem provocar miocardiopatia
pensamento capaz de apa- de Takotsubo, conhecida como miocardiopatia do stresse, ou síndrome do co-
gar um sentimento. E todas ração partido. Perante um choque emocional profundo e intenso, o ventrícu-
as pessoas que vi negarem a lo esquerdo dilata e o coração fica, por assim dizer em linguagem corrente, afli-
to. É o chamado aperto no coração.
voz do coração, nenhuma se O poder eletromagnético do coração é largamente superior ao do cérebro. Ele
reconciliou com estados de pode sentir e emitir uma frequência que alcança cinco metros. Talvez por isso
paz e de alegria. conseguimos sentir a presença de alguém antes de chegar. O sentimento apa-
rece antes, só depois é processado pelo cérebro, onde são criadas as imagens que
ilustram o que sentimos. No século XVII, um tipo muito aborrecido chamado
Descartes criou o dogma “Penso logo existo”. Estudei-o no Secundário a con-
tragosto, nunca me identifiquei com a sua lengalenga e além disso irritavam-
-me os caracóis pomposos, a franja parola e o ar presunçoso. O Iluminismo apa-
gou as razões do coração, retirou as emoções da condição humana e quis con-
vencer-nos de que os sentimentos eram como lixo tóxico. O resultado não se
fez esperar: um século depois, o movimento do Romantismo espalhou-se pela
Europa, exacerbando emoções e sentimentos, interpelando a Humanidade a
entregar-se sem reservas aos seus sonhos, desejos, emoções e vícios.
Já por diversas vezes escrevi sobre as consequências tão nefastas do Roman-
tismo, sobretudo em relação às mulheres. Felizmente não minou todos os paí-
ses de igual forma. A escritora inglesa Jane Austen, que no fundo era uma sen-
timentalona reprimida pela coleira de choques vitoriana, apresenta-nos mu-
lheres orgulhosamente fortes. Neste contexto puritano, entenda-se fortes
como dignas, corajosas, virtuosas, sérias, e, como tal, prontas para exigir ao gé-
nero masculino atitudes à altura das circunstâncias e ao nível de classe e de de-
cência destas bravas donzelas. Austen teve o mérito de criar modelos de virtu-
de através das suas personagens que sofrem de amor, mas não cedem ao sofri-
mento, que choram quando ninguém está a ver e que nunca baixam os stan-
dards a que se propõem por fraqueza ou egoísmo. Austen recupera assim as mu-
lheres estoicas que ajudaram a governar o Mundo na idade das trevas e que fo-
ram sendo enfraquecidas pelos costumes desde o Renascimento. Românticas
sim, mas quanto baste, para não cair nem no ridículo nem em desgraça, porque
sofrer por amor na literatura inglesa é sempre uma questão menor, como ter
uma unha encravada ou um ataque de caspa.
Todos já passámos por esse tormento que nos atira das nuvens suaves do en-
levo para uma caverna interna na qual lambemos as feridas ou mudamos de
pele, tantas vezes iludidos com as projeções na parede de uma suposta realida-
de exterior que imaginamos melhor do que a verdadeira existência. Enquanto
o coração se expande e atrapalha, seja por delírio passional ou por desgosto amo-
roso, é importante não tirar os pés do chão, pois é sabido que a sombra persegue
a luz e a queda é inerente ao voo. Ouvir o coração é muito mais produtivo do que
ignorá-lo. Contudo, em caso de dúvida, é melhor ser a sensata Elinor Dashwood,
ou a impulsiva Lady Chatterley? Não conheço nenhum pensamento capaz de
apagar um sentimento. E todas as pessoas que vi negarem a voz do coração, ne-
nhuma se reconciliou com estados de paz e de alegria. No fundo, o coração é que
manda, do seu fundo mais puro e belo, que se chama vontade.

Notícias Magazine 12.02.2023 55


esti-
los
RECEITAS DA ÉPOCA
POR Ana Bravo
Nutricionista, autora e blogger (Nutrição com Coração)

TODOS OS MESES, FRUTOS SILVESTRES COM


AS MINHAS RECEITAS
TÊM UM ALIMENTO
EM DESTAQUE. CREME DE AIPO ADOCICADO
EM FEVEREIRO
É O AIPO Aipo doce? Sim. É muito bom! Fica com textura de doce de
gila. Pode utilizar simples, em tostas ou misturar com iogurte.

HISTÓRIA INGREDIENTES PREPARAÇÃO


Pertence à família da salsa e da ce- Duas pessoas 4 colheres de sopa ❶ Comecei por colocar ao lume o
noura. Existem três espécies mais de aipo ralado aipo ralado com o sumo de limão e
conhecidas: o aipo de rama, o 2 colheres de sopa stevia a gosto (usei uma colher de
aipo-rábano e o aipo-silvestre. Co-
meçou a ser cultivado há cerca de
de sumo de limão chá). ❷ Deixei cozinhar até evaporar
3 mil anos no sul da Europa e no 30 minutos q.b. stevia todo o líquido e esperei que arrefe-
norte de África. Existem registos 180 g frutos silvestres cesse. ❸ Misturei quase todo o aipo
históricos de uso do aipo pelos an- (ou fruta a gosto) com o mascarpone. ❹ Numa taça dis-
tigos egípcios, gregos e romanos, 4 colheres de sopa tribuí em camadas a mistura de quei-
que reconheciam as suas virtudes
terapêuticas e também o usavam
Fácil (rasas) de mascarpone jo e aipo e os frutos silvestres (ou ou-
como planta sagrada. O cheiro (ou ricota) tra fruta a gosto). Por cima, coloquei
deve-se às lactonas, compostos o restante aipo. ❺ Pode guardar no
característicos do óleo essencial frio durante algumas horas.
das suas folhas e sementes.

56 12.02.2023 Notícias Magazine


IDEIAS

FOTOGRAFIAS: RITA CHANTRE/GLOBAL IMAGENS


lhos manuais alinham-se e conjugam-
POR Sara Dias Oliveira -se. Elisa Pereira publicou um livro in-
fantil “O sonho de Tomás”, participou
em mais de três dezenas de coletâneas
de poesia, foi responsável por um gru-
po de escrita criativa numa associação.
As rimas saem-lhe do coração. Com as
mãos, produz cestas de palha, caixas de
madeira e tabuleiros de diversos mate-
riais, onde coloca os artigos para sur-
preender quem recebe. Pode ser tudo,
porque ali cabe tudo, livros, canecas,
chocolates, porta-chaves, fotografias,
vinhos, queijos. Tudo o que é preciso
para celebrar uma ocasião especial, um
aniversário, uma data de namoro, o dia
de casamento, um batizado, seja o que
for. O objetivo maior é agradar a quem
recebe. Sempre. “É tudo estudado por
mim”, garante. O recipiente adequa-
do, a posição certa, a composição mais
bonita, as quadras pensadas e sentidas.
PRESENTES COM “O amor está implícito em tudo”. A di-
ferenciação é ponto de honra. “Uma
POEMAS QUE RIMAM caixa pode transportar muito amor.”
Elisa Pereira dedica-se a perceber o que
Elisa Pereira constrói prendas em cestas e caixas e pode surpreender, o que pode destacar-
compõe quadras exclusivas e personalizadas para -se, o que provoca impacto, o que cau-
qualquer celebração. Cada detalhe tem um sentido sa recordações inesquecíveis. “Apelar
no seu projeto “Poesia, Amor, no Presente”. à criatividade, para que seja diferente”.
Neste momento, anda a fazer rosas de
cetim para colocar em prendas como flo-
Gostava de escrever poemas na escola Faz prendas à medida, pensadas ao ín- res que nunca desaparecem, que ficam
primária, demorava-se nas composi- fimo pormenor, que exigem pesquisa, para sempre, além do Dia dos Namora-
ções à procura das palavras certas, sem- investigação, conhecimento de gostos dos ou de qualquer outro momento es-
pre a rimar. O jeito de mãos para dar e paixões. Todas acompanhadas com pecial, um nascimento, umas bodas de
vida a novos objetos também se eviden- um poema exclusivo e personalizado casamento, o que se quiser. “Rosas eter-
ciou cedo. Elisa Pereira resolveu então dedicado a quem recebe o presente, de- nas com brilho dourado ou de cetim. Um
juntar dois amores e criar um novo pro- pois de escutar quem oferece. Uma his- trabalho artesanal”, descreve.
jeto com cunho pessoal. Chama-se tória, uma pessoa, um poema. “Pessoas “Poesia, Amor, no Presente” está nas
“Poesia, Amor, no Presente”. “Nasce da especiais merecem prendas originais”, redes sociais com presentes a partir de 19
fusão de duas paixões que tenho: a poe- defende. É este o ponto de partida. euros. Este ano, haverá novidades. Para
sia e o artesanato”, explica. O amor às palavras e o jeito por traba- criar boas memórias. Hoje e sempre. ● m

Notícias Magazine 12.02.2023 57


esti-
los
BOAS INFLUÊNCIAS
POR Catarina Silva

João Bettencourt
OS FAVORITOS
DE UM ATOR NA
RAMPA DO SUCESSO
Snacks, perfume ou roupa. Eis os essenciais de
João Bettencourt, que tem vindo a dar cartas na
ficção e que partilha o dia a dia nas redes sociais. HUXIA
Barra
Chocowheyfer
Foi uma
descoberta recente
e tem sido o meu
snack preferido.
Faço muito
desporto e estas
DCK WINTER JACKETS barras são
Grand Canyon saudáveis e
Jacket proteicas. Levo
A DCK lançou a sempre uma barrita
primeira coleção para ter aquela
de casacos, com energia extra.
materiais 100%
reciclados e
rapidamente se
tornou no meu “go
to” (para o que der
e vier).
O meu preferido
é o verde e
consigo usá-lo
tanto no dia a dia
como em eventos.

HUGO BOSS
Hugo Boss
Bottled
Já se tornou o meu
cheiro
característico. Faz
parte da minha
rotina e já é
automático, antes
de sair de casa
coloco o meu
perfume, se não o
APPLE dia não corre da
AirPods mesma maneira.
São o meu salva-vidas. Uso todos os dias,
ajudam-me a descontrair antes de uma peça,
a concentrar-me antes das gravações e a
treinar. Oiço tanto músicas como podcasts.

58 12.02.2023 Notícias Magazine


PERFIL
DOS PALCOS
DA FICÇÃO
PARA O INSTAGRAM
Embora só tenha começado
a carreira de ator em 2019,
já acumula sucessos na ficção
nacional. Na TVI, SIC e RTP.
Atualmente, João Bettencourt,
21 anos, participa na peça
“O diário de Anne Frank” como
protagonista. E, mais recente-
mente, começou a entrar pela
caixa mágica na nova novela
da SIC “Flor sem tempo”.
As redes sociais, inevitável,
também se atravessaram neste
caminho. Para lá da representa-
ção, pratica futebol e equitação,
e partilha isso no seu Instagram,
onde já conquistou milhares
de seguidores.

LEVI’S
Calças Chino XX EZ Tapper II
São as calças mais confortáveis @JOAOBETTENCOURTBRITO
3S E2G U,I 8D O RmE S
(e giras) que já tive, e por isso
as que mais uso.

Notícias Magazine 12.02.2023 59


esti-
los
SABORES
POR Sara Dias Oliveira

REINALDO RODRIGUES/GLOBAL IMAGENS

A chef Marlene Vieira, do Marlene, do Zunzum Gastrobar,

OSTRAS, em Lisboa, compara as ostras a uma fragrância. A imagem faz


sentido. “As ostras são quase como um perfume, muito pró-

O MAR NUMA prias, muito identificativas.” Cada ostra é uma ostra, cada os-
tra espelha a sua origem, cada ostra mostra como foi tratada
na sua cultura seja no Algarve, no Sado, na região de Aveiro,

CONCHA onde quer que seja. Cada ostra é uma ostra. Como um perfu-
me e uma pele.
Na cozinha, exigem a máxima atenção, no trato, na conser-
É um alimento peculiar, de sabor caracterís- vação, na confeção. Cuidadas como merecem, comidas o mais
tico, textura pouco comum. Cruas ou cozinha- frescas possível (e lavar muito bem se forem sugadas da con-
das, ao gosto de cada um, o importante é não cha). Óscar Geadas trata-as bem, gosta de as gratinar com um
ofuscar o brilho delas e manter aquele suco. pouco de pancetta de porco bísaro ou de servi-las fora da cas-
ca. Gratinadas, braseadas, fritas ou grelhadas, abertas à Bu-
lhão Pato, há receitas para vários gostos. Para várias ostras.
O seu corpo é mole e corpulento ao mesmo tempo, está guar- Marlene Vieira abre parênteses. “Nada é definitivo, há sem-
dado numa concha calcificada, revela a sua exuberância quan- pre novas formas de saborear um alimento.” O que também
do se abre. É um molusco com as suas idiossincrasias, perso- se aplica às ostras, cruas ou cozinhadas, com ou sem condi-
nalidade forte, que requer um palato à medida. Um alimen- mentos, com ou sem limão, com ou sem pickle de cebola. “A
to rico em zinco e outros nutrientes, com um certo toque forma mais genuína é abri-las e comê-las sem acrescentar
afrodisíaco. Ao natural ou cozinhadas. As ostras são como o nada.” Ao natural, portanto. Quanto aos temperos, avisa, “há
mar na ponta da língua. limões que aumentam a salinidade da ostra”.
O chef Óscar Geadas, do G Pousada Restaurante, em Bra- Marlene Vieira prefere vê-las como um aperitivo, como o
gança, destaca a delicadeza, a textura gelatinosa e carnuda, centro das atenções de uma entrada. “Não se pode ofuscar o
o sabor peculiar. Ou se ama ou se odeia, não há meio-termo, brilho de uma ostra”, diz. Óscar Geadas vê-as numa entrada,
nem sequer um assim-assim. “Têm um sabor muito caracte- num prato principal, como guarnição, como acompanha-
rístico a mar, a salinidade, os sucos são fantásticos”, diz. Evi- mento. Em qualquer dos casos, a mesma avaliação. “Fazem
dencia-lhe o ar exótico, uma certa sensualidade. “As ostras de qualquer prato uma excelente refeição.” Palavra de estre-
como um fruto do pecado.” la Michelin. ●m

60 12.02.2023 Notícias Magazine


TENDÊNCIAS
POR Sara Sofia Gonçalves MISTÉRIUS
Fato Wednesday Addams
52,95 euros

Z E TA N M E D I E V A L
Armadura Game of Thrones
845,98 euros
FUNTOCOME
Disfarce Stranger Things
FUNIDELIA 27,50 euros
Máscara filme IT
19,99 euros

Não se pense que festejar o Carnaval


é só para os mais novos. Entre festas
em casa, saídas à noite ou festejos pe-
las ruas, os graúdos também têm di-
reito à diversão neste dia de folia
e fantasia. Este ano, o Dia de Car-
naval celebra-se a 21 de feve-
reiro. Por isso, ainda há tem-
po para correr até à loja
mais próxima e encontrar
o melhor disfarce. Quem
FESTA EM CASA sabe, ainda ganha um con-
Máscara Casa de Papel curso de máscaras.
1,20 euros Dos mais clássicos aos
contemporâneos, as perso-
nagens das séries e dos filmes
de ficção são as primeiras esco-
lhas para muitos. O aumento de
consumo destes conteúdos tem
trazido de arrasto uma maior pro-
cura por fatos ou máscaras das per-
sonagens favoritas do momento.
DISFRAZZES
Fato Squid Game Há máscaras que não são de ago-
22,50 euros ra, e que não serão novidade nos
disfarces de Carnaval, mas que,
VAGAOO ainda assim, não vão falhar na mis-
Disfarce Harley Quinn são de fazer soltar gargalhadas. Fa-
54,99 euros lamos da “Casa de Papel”, de “Ga-
TOYS “R” US me of Thrones”, ou de um clássico
Fato Smurf de animação como “Shrek”. Mas há
29,99 euros
também looks relacionados com
as tendências que irão deixar to-
dos de queixo de caído, como as
SER personagens da série da Netflix
“Wednesday” ou, ainda a mais
QUEM SE VÊ recente Ellie de “The Last of Us”.
Quer sejam fatos completos,
NA TELEVISÃO pequenos apontamentos para
complementar a indumentária
que já se tem no armário, ou uma
Com o crescimento das plataformas simples máscara facial, não faltam
de streaming e do consumo de séries opções. Outra vertente para esta
e filmes, é cada vez mais comum noite de diversão é o aluguer, no
optar por disfarces de personagens qual cada vez mais lojas de disfar-
cinematográficas. ces apostam. ● m

Notícias Magazine 12.02.2023 61


esti-
los
CONSUMO ❶
POR Sara Oliveira

❶ Coffret Carolina Herrera


Very Good Girl, 95,09€
(Wells) ❷ Perfume Caroli-
na Herrera 212 VIP Men
Black, 103,65€ (Perfumes ❼
MIMOS
& Companhia) ❸ Amor
num poema personalizado, DE ÚLTIMA
por Ricardo Guerra, a partir
de 7€ ❹ The Florist by
Moet & Chandon®, 205€
HORA
❺ Chocolates Guylian,
6,85€ ❻ Escapadinha ro- Em cima da data, há vários presentes
mântica nos hotéis do Gru- e surpresas à mão para surpreender a
po SANA (preço sob con- cara-metade no Dia dos Namorados. Muitas
sulta) ❼ Miss Pavlova Hot são sugestões personalizadas e à medida
Box, 25€ de qualquer paixão – ou amizade.

Um perfume, flores, joias, bombons e peluches são os presen-
tes mais comuns no dia de São Valentim, que se celebra na pró-
xima terça-feira. Há conjuntos e caixas preparados a combi-
nar com a data dedicada aos namorados, mesmo para quem
deixa tudo para a última hora. Para já, faltam dois dias e há
imensas sugestões para agarrar e mimar.
Os hotéis também se associam à data com as mais variadas
iniciativas, acicatando a vontade de pegar na mão do outro e
partir, nem que seja apenas por uma noite. O grupo SANA, por
exemplo, abre as portas a “uma escapadinha romântica de so-
nho” numa das suas unidades (Myriad, Epic SANA Algarve,
Epic SANA Lisboa, Epic SANA Marquês, Epic SANA Luanda,
SANA Berlin, SANA Sesimbra e SANA Silver Coast). O progra-
ma inclui tratamentos ou rituais de beleza, além de massa-
gens a dois, pois o romance é mais forte quando se partilha.
❺ No norte, o Hilton Porto Gaia oferece um jantar animado,
no Restaurante Composto, para solteiros e para casais que gos-
tam de celebrar a data em ambiente de festa. Por 55 euros por
pessoa, não faltarão ingredientes para colecionar memórias.
O sentimento está no ar mas, para muitos, faltam as pala-
vras para o verbalizar. A pensar em quem quer mimar a cara-
-metade ou os melhores amigos, Ricardo Guerra (@ricardomn-
guerra), um estudante universitário apaixonado por letras,
escreve poemas através de histórias ou experiências indivi-
duais, sob um fundo temático, a partir de sete euros, e com a
garantia de que chega a tempo ao destinatário.
Sem olhar a calorias, na Ribeira do Porto ou no NorteSho-
pping (Matosinhos), a Miss Pavlona soma chama a qualquer
paixão com a “Hot Stuff Collection” (a partir de 9,90 euros
euros) com macarons, merengues ou cookies, acompanha-
dos por um postal com mensagens sexys, inspiradas em qua-
tro grandes êxitos musicais que estão na memória de todos os
apaixonados: “Let’s get physical” (Olivia Newton-John), “Spi-
ce up your life” (Spice Girls), “You’re my sexbomb” (Tom Jo-
nes) e “Sexual healing” (Marvin Gaye). O amor está no ar e o
difícil será escolher entre esta e outras ideias que saltam à vis-
ta e tocam o coração. ●m

62 12.02.2023 Notícias Magazine


CONSULTÓRIO
JURÍDICO
❷ Dantas
POR
Rodrigues *

Pagamento dos óculos


pelo empregador

O Tribunal Europeu de Justiça da UE (TJUE)


determinou que os empregadores têm de pagar
óculos graduados ou lentes de contacto a quem
trabalhe em frente de monitores. Quando
e em que moldes isso pode acontecer?
Renato Santos, pergunta recebida por email

De acordo com a referida Diretiva, os empregadores


estão obrigados a fornecer aos trabalhadores dispositi-
vos de correção especiais, concebidos para o seu tipo de
trabalho, se os resultados de exame médico de olhos e
visão ou oftalmológico demonstrarem a sua necessi-

A NM TEM UM ESPAÇO PARA QUESTÕES DOS LEITORES NAS ÁREAS DE DIREITO, JARDINAGEM, SAÚDE, FINANÇAS PESSOAIS E SUSTENTABILIDADE.
dade e os dispositivos de correção normais não puderem
ser utilizados.
Segundo o TJUE, quando a Diretiva se refere a “dispo-
sitivos de correção especiais”, estão compreendidos
“óculos graduados especificamente destinados a corrigir
e a prevenir perturbações visuais relacionadas com um
trabalho que envolve equipamento dotado de visor”.
No ordenamento jurídico português a mencionada

AS PERGUNTAS PARA O CONSULTÓRIO DEVEM SER ENVIADAS PARA O EMAIL MAGAZINE@NOTICIASMAGAZINE.PT.


Diretiva encontra-se transposta para o Decreto-Lei n.
349/93, no seu art. 7. , dispondo no mesmo sentido e
prevendo ainda a aplicação de coima ao empregador
pelo incumprimento.
De acordo com as normas vigentes, o empregador
terá de suportar o custo de óculos ou lentes de contacto
a quem trabalhe em posto de trabalho dotado de visor,
sempre que o resultado dos exames médicos o exigir e
os dispositivos de correção normal não puderem ser
utilizados.
❹ Assim, embora este normativo estivesse em vigor há
mais de 20 anos, ninguém o tinha interpretado como o
vem a fazer agora o Tribunal de Justiça Europeu. Sendo
assim chegou a hora de reclamar o pagamento de óculos
ou lentes às entidades patronais, bastando comprovar
por relatório médico que necessita desses dispositivos
para exercer o seu trabalho. Atenção não engloba os
óculos ou lentes necessários para correção da visão, por
doença degenerativa relacionada a causas congénitas ou
enfermidades como diabetes e traumas no olho, etc.

* Advogado e professor de Direito

Notícias Magazine 12.02.2023 63


esti-
los
MOTORES
POR Reis Pinto

Com um motor 2.0 de cilin-


drada e uns justos 150 cava- SKODA KODIAQ
los de potência, o Kodiaq é
um valor seguro para quem UM SUV PARA
procura um familiar
TODA A FAMÍLIA
Tem nome de animal selvagem, mas é bem
comportado em estrada, económico e com espaço
para toda a parafernália das férias. E, coisa rara
nos tempos que correm, gasta gasóleo.

Grande, sem se tornar incómodo de conduzir em cidade, com uma qualidade


percebida de bom nível, seja pelos materiais usados ou pela montagem rigo-
rosa, o Skoda Kodiaq (nome que remete para o enorme urso-pardo) sofreu
um ligeiro upgrade estético, que lhe acentuou o ar robusto. Num interior
sem grandes fantasias, mas igualmente com poucos desvarios digitais – que
nem sempre nos facilitam a vida –, o espaço torna mais fácil a vida a bordo.
Mesmo se dois dos lugares (e são sete) sejam mais apropriados a crianças. A
única motorização disponível a Diesel (2.0 TDI, de 150 cavalos e 360 Nm de
binário), com caixa DSG de 7 velocidades, move sem dificuldade o Kodiaq,
mesmo com quatro adultos a bordo. E com consumos ajustados, pois conse-
guimos 7 l/100 km em cidade, e em torno dos seis em estrada e autoestrada.
Com um pisar sólido, o SUV está talhado para as grandes distâncias, pagando
Classe 1 nas portagens, desde que tenha Via Verde. É comercializado em qua-
tro versões – Kodiaq, Sportline, Laurin & Klement e RS –, que custam entre
44 640 e 64 405 euros. ●m

❶ Dimensões Tem 4,69 ❷ Equipamento Correta- ❸ Números O Kodiaq atin-


metros de comprimento, mente equipado desde a ge os 203 km/h de velocida-
1,88 de largura e 1,67 de versão base, o Kodiaq tem de máxima e tem um consu-
altura. O Kodiaq apresenta jantes de 19 polegadas na mo declarado de 5,6 l/100
uma distância entre eixos versão Sportline que testá- km. O peso é de 1813 quilos
de 2,78 metros. mos e bancos elétricos. em ordem de marcha.

64 12.02.2023 Notícias Magazine


HORÓSCOPO
Isabel Guimarães
POR
Astróloga — ISAR/CAP
ANIVERSÁRIO
13 a 19 fevereiro

Carneiro Balança
21.03 a 20.04 23.09 a 23.10
Permita-se abrir novos horizontes para Altura para surpreender quem gosta, com
expandir um projeto ou até seguir a sua atitudes altruístas e românticas. No en-
vocação, sem receio. Para aproveitar esta tanto, e parecendo paradoxal, pode estar
oportunidade, precisa de ser persistente permeável a ilusões e fantasias. Logo,
e acreditar no seu potencial. Arrisque. procure estar atento e seja prudente.

Touro Escorpião
21.04 a 21.05 24.10 a 22.11 Mena Suvari
Pode ter a necessidade de encontrar uma Tente promover o diálogo e discutir os li- Atriz, 43 anos
atividade paralela ao seu trabalho, que lhe mites, procurando ser claro(a), antes que
permita expandir ideias e imaginação. surjam conflitos. Caso não tenha um com- Mena Alexandra Suvari
Procure encontrar espaço na sua vida para promisso sério, podem surgir oportunida- é uma atriz, estilista e
quebrar rotinas. Boa altura para inovar. des, se sair da zona de conforto. modelo, nascida a 13
de fevereiro de 1979,
nos EUA. De signo solar
Gémeos Sagitário Aquário, com ascen-
22.05 a 20.06 23.11 a 21.12 dente em Peixes, uma
A comunicação torna-se mais entusiasta e Promova atividades com o(a) parceiro(a) maior liberdade de pen-
aberta a novas experiências. A capacidade e usufrua do prazer nos seus relaciona- samento leva-a a lidar
de trazer os factos à consciência, e de for- mentos. Porém, pode ter manifestações com os problemas de
ma impessoal, permite sinergias nos rela- românticas e não ser bem entendido. Pro- forma rápida e eficiente.
cionamentos e objetividade. Aproveite. cure o diálogo para firmar a sua intenção. Liberdade e originalida-
de são forças que ca-
racterizam a sua perso-
Caranguejo Capricórnio nalidade. De tempos a
21.06 a 22.07 22.12 a 20.01 tempos, necessita de
Evite excessos e crie momentos de hu- Os amigos nesta altura desempenham se recolher para refletir
mor e criatividade, com integração dos um papel muito importante, aproveite de forma profunda.
outros no seu trabalho. As parcerias são para escutar opiniões. Altura em que sen-
importantes para sentir o apoio e a parti- tirá maior clareza no papel do outro na sua
lha necessária à realização de objetivos. vida. Evite a teimosia e entenda o outro.

P L A N E TA S
Leão Aquário
23.07 a 23.08 21.01 a 18.02 A semana começa com a
Aproveite para negociar, principalmente O sentir é crucial para que possa mostrar lua em Escorpião, na fase
aquilo que o beneficie e o liberte de res- a sua vulnerabilidade em quem mais con- minguante em quadratura
ponsabilidades. Aprenda a delegar. Novos fia. As relações melhoram com o quebrar ao Sol/Saturno. O desafio
interesses podem surgir. Seja como for, de rotinas e partilha com amigos e famí- entre o que pretendemos e
priorize o prazer de que possa usufruir. lia. Fase de muito trabalho e decisões. o que podemos fazer gera
dificuldade de foco. O in-
gresso do Sol no fim da se-
Virgem Peixes mana em Peixes pode trazer
24.08 a 22.09 19.02 a 20.03 maior compaixão para com
Procure ter cautela na altura de comunicar O companheirismo e apoio são funda- o coletivo. A capacidade de
com colegas ou chefias. Mas mantenha a mentais para lidar com os desafios. Sur- inovar e renovar intensifica-
consistência nos seus esforços, o que pode preenda o(a) parceiro(a), quebrando roti- -se, mas é preciso ter caute-
trazer mudanças importantes no trabalho. nas e vivenciando o seu lado romântico. la com os excessos e rees-
Procure por novos conhecimentos. A família precisa de atenção. truturar os nossos objetivos.

Notícias Magazine 12.02.2023 65


Pai aos 50
Por Joel Neto

Ao contrário
de Clemenceau
Mas tudo bem: ensinem- Como assim, eu não devia ensinar o meu filho a cantar “isso do Hasta Siempre”,
-lhe vocês essa coisa da escrito “em honra de um assassino”? Três quartos dos nossos heróis mataram.
Os próprios super-heróis mataram – até Batman, ao qual sempre atribuímos a
competitividade, da (como regra de não matar, matou. Não estou certo de que Che Guevara tenha chega-
é que se diz?) optimização – do a esperar tanto de si mesmo. Mas importa-me o que pode simbolizar tam-
da acumulação. Ele aca- bém para o Artur: o sonho de uma sociedade fraterna – tão impossível de alcan-
çar como urgente de pedir, tal qual os melhores ideais.
bará por precisar. Já eu, Pelo contrário: “Hasta Siempre” é mesmo uma das primeiras da playlist que
para já, vou cantar-lhe “isso criámos e pomos diariamente no shuffle. Isto é, ao lado de “Os Índios da Meia-
do Hasta Siempre”. -Praia”, “Qual É a Tua Ó Meu”, “Grândola Vila Morena” ou “A Cantiga É Uma
Arma”. Para “A Cantiga É Uma Arma”, até inventámos uma coreografia, eu e a
Marta. Pomo-nos os dois de pé diante do fraldário e fingimos caminhar em fren-
te, com passos decididos e rosto determinado, os braços rodando à volta do cor-
po: Tudo depende da raiva/ E da alegria/ A cantiga é uma arma/ De pontaria.
Sim, sei-o bem: eu também repeti essa máxima que Clemenceau palmou a
Guizot, e segundo a qual (parafraseio) “se aos 20 não és de esquerda, não tens
coração; e, se aos 30 não és de direita, não tens cabeça”. Mas a minha vida não
acabou aos 30, e, se em breve o tempo começou a ensinar-me a compaixão, re-
gressar aos Açores abriu-me os olhos para a pobreza. A sentença, como a repito
agora, conclui-se com: “E, se aos 40 não és de esquerda de novo, então não tens
esperança”.
Para ensinar o cinismo ao Artur, não faltarão candidatos. Desde logo, os pro-
fesso
fessores de Economia do liceu, com os seus programas liberais; a maior parte
dos aautoproclamados conselheiros de vocação, e mais as suas obsessões com as
saída
saídas profissionais e o conhecimento útil; toda a fauna das faculdades, incluin-
do alguns
alg veteranos, a generalidade dos putativos bons alunos e até muitos pro-
fessores, com os seus “contactos” e as suas “estratégias de RP” para facilitar isto
fesso
e aqu
aquilo; e, claro, os prosélitos do empreendedorismo, a comunicação social em
geral e os jornais do PSI-20 em particular.
Não: ele tem muito tempo para chegar à conclusão de que – sei lá – os escutei-
Não
ros sã
são uns grandes pirosos e entrar para uma jota, sim, é que é fixe. Haverá sem-
pre imensa
im gente para lhe ministrar o pragmatismo. Parece, aliás, que são ensi-
namentos mais do que desejados pelo aprendiz. Ainda há dias li sobre um estu-
name
do segundo
se o qual os jovens mais activos politicamente são – lá está – os de di-
reita. Na altura até me pareceu um oxímoro, “jovem de direita”. Mas, se é pos-
sível, então devia pelo menos ser proibido – como é proibido o excesso de açú-
car num
nu refrigerante ou a venda de tabaco a menores de 16.
Mas tudo bem: ensinem-lhe vocês essa coisa da competitividade, da (como é
que sse diz?) optimização – da acumulação. Ele acabará por precisar. Já eu, para
já, vo
vou cantar-lhe “isso do Hasta Siempre”. Não é sobre a economia: é sobre a jus-
tiça, que
q está a montante. A estratificação social continua a maneira mais pre-
cisa de
d entender o Mundo, e primeiro ainda vem a idade de acreditar na revolu-
ção. DDigo-o eu, social-democrata pardacento – mas que ainda as tenho em mim,
a raiv
raiva e a alegria.

O AUTOR
AUTO ESCREVE DE ACORDO COM A ANTERIOR ORTOGRAFIA.

66 12.02.2023 Notícias Magazine


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