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CODIGO CIVIL

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JOSE DIAS FERREIRA

SEGUNDA EDIÇAO

Volume III

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COIMBRA
IMPRENSA DA UNIVERSIDADE
1898
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CAPITULO III

DO MANDATO OU PROCURADORIA

SECÇAO 1

Disposições geraes

Art. 1318.° Dá-se o contracto de mandato ou procura-


doria, quando alguma pessoa se encarrega de prestar, ou
fazer alguma cousa, por mandado e em nome de outrem.
O mandato pôde ser verbal ou escripto.
(Vid. artigos 1330.0, 1332.0 e 1333.)
A origem e a necessidade do mandato deriva da impossibilidade
de acudir pessoalmente pelos negocios, quer pela complexidade d'el-
les, quer pela incompetencia ou incompatibilidade para os tractar.
Era o mandato magistralmente tractado nas leis romanas. 'T'udo
quanto depois preceituaram os codigos foi copia mais ou menos feliz
d'aquella immortal legislação.
Destaca-se especialmente o mandato, em que n'este contracto
basta a vontade de um só dos pactuantes para o romper, quando os
outros só pelo mutuo consenso podem ser desfeitos. Fundado na con-
fiança reciproca, caduca pela base o mandato desde que o mandante
não tenha confiança plena no mandatario, ou desde que o manda-
tario nio exerça de vontade a procuração.
Diz-se constituinte ou mandante o que delega poderes para ser
representado, e mandatarioou-procuradoro que aeceita esses poderes
para os exercer.
Como na maior parte dos codigos, está definido no artigo o con-
tracto pelo lado do mandatario. Mas tambem pôde ser definido pelo
lado do mandante; e então é a incumbencia a outrem de tractar um
G ARTIGOS 1319.0, 1320., 1321.0 E 1322.*

ou mais negocios em nome e debaixo da responsabilidade do consti-


tuinte.
Mas, qualquer que seja o lado por onde se encare, o mandato
representa sempre a transmissão de poderes para se praticar algum
facto ou contrahir alguma obrigaço em nome de outrem; e valem
os actos praticados por terceiros em virtude do mandato como se
os tivesse praticado o proprio mandante - Qui mandat ipse fecisse
videtur-.
O contracto, que é puramente consensual, ou seja conferido a pre-
sentes ou a ausentes, nio tem validade senão depois da aeceitação
artigo 1330.°
Basta porém a acceitação tacita, segundo se exprimia o projecto
primittivo no artigo 13850, correspondente ao artigo 1330. do
codigo, como se mandatario, sem a declaração explicita de que
acceita, começa a tractar do negocio do seu constituinte, o que é

1 frequente nas procuraç5es forenses, que raras vezes têem outro indi-
cativo de acceitação além do facto do mandatario advogar ou pro-
curar na causa.
Tambem póde ser tacito o mandato, o que o artigo 1726.0 reconhece
faltando do mandato expresso, como nas compras feitas pelo creado
de conta do amo.
Pôde acceitar-se doação por intermedio do procurador, porque a
lei o não prohibe, como podem ser exercidas por intermedio de outrem
as funcçes de tutor, com quanto o encargo seja pessoal.
S6 não podem ser praticados por outrem os actos meramentepes-
neaes, artigo 1332.-, e aquelles para que a procuração seja vedada por
lei, artigo 1333.°, como o testamento que nio pôde ser feito por meio
de procurador, porque a lei absolutamente o prohibe.
Não pôde por outro lado o mandante por si praticar actos que pôde
praticar por outro, como assignar articulados, minutas e petiç5es
I de recurso e allegações escriptas nas causas judiciaes, que carecem
de ser aseignados com o nome por inteiro de advogado ou procura-
dor, conforme o artigo 93.- do codigo de processo civil.
Mas este caso obedece menos ás regras do mandato, do que ás
regras do processo.
f É commercial o mandato quando tem por fim a pratica de actos
de commercio.

Art. 1319.° Diz-se procuração o documento, em que o


mandante ou constituinte exprime o seu mandato. A pro-
curação pôde ser publica ou particular.
Art. 1320.° E procuração publica a que pôde ser feita
por tabellião, ou pelo escrivão respectivo, sendo exarada
em alguns autos.
Art. 1321.° Procuração particular é a que foi escripta e
assignada pelo mandante, ou que foi escripta por outrem,
e assignada pelo mandante e mais duas testenunlhas.
Art. 1322.° São havidas por publicas a procuração escripta
e assignada pelo mandante, sendo a letra e a assignatura
reconhecidas por tabellião; e a escripta por pessoa diversa
do mandante, mas assignada por este e por duas teste-
munhas, se taes assignaturas forem feitas perante
tabellião,

i
ARTIGO 1822. 7

que assim o certifique, e as reconheça no proprio docu-


mento.
(Vid. artigo 1326.-)
Reputa-se para todos os efleitos verbal o mandato escripto, que
não tenha os requisitos determinados nos artigos 1820.^ a 1322.;
isto é, que não for conferido por meio de procuração, artigo 1326.°,
publica, particular ou havida por publica.
As formalidades da procuração em caso nenhum dependem, como
por direito velho, da qualidade da pessoa do mandante.
Os requisitos são os mesmos, qualquer que seja a categoria dos
outorgantes.
Permittia o direito anterior, Ord., liv. 3., tit. 29., e tit. 59.,§15.",
a certas e determinadas pessoas, como eram os nobres, fazer pro-
curação por sua mão, privilegio que por leis posteriores e pelo uso
do fôro se foi ampliando aos negociantes matriculados, aos bachareis
formados, advogados, otilciaes militares de patente e mulheres d'es-
tes, e aos clerigos com beneficio e sem beneficio, e até considerava
feita pelo proprio punho do constituinte a procuração escripta pelo
secretario das pessoas, a quem a lei concedia secretario, como eram
os arcebispos e bispos, os infantes, os duques, os mestres, os mar-
quezes e os condes; e o projecto primitivo, uma vez que fosse as-
signada pelo mandante a procuração, conservava ainda no artigo
1381.° esta jurisprudencia.
Mas acabou com este privilegio a commissão revisora logo nos
trabalhos da primeira revisão. Hoje nem o rei pôde fazer procu-
ração fóra das regras prescriptas nos artigos 1320. a 1322. N'esta
materia nio ha hoje excepção para pessoa alguma.
É da essencia da procuração publica ser lavrada por oficial publico
por qualquer das duas fôrmas indicadas no artigo 1320.·, isto é, ou
por tabellião em papel avulso com a intervenção do mandante e de
mais duas testemunhas artigo 2495.', ou pelo escrivão do processo
nos autos independentemente de testemunhas estando presente o
juiz.
A commissão de legislação da camara dos deputados, apesar de
ter acrescentado uma virgula á palavra «tabellião., sem eliminar
ao mesmo tempo a virgula, que se segue á palavra .respectivo», nao
alterou a doutrina do projecto primitivo no artigo (1379.) correspon-
dente ao artigo 1320.', ainda conservada nos projectos de 1863 e de
1864, que era assim: «A procuração publica pôde ser feita por ta-
bellião, ou nos autos pelo escrivão competente».
A Ord., liv. 3.', tit. 29.' pr., reconhecendo a validade da procura-
ção, chamada apud acta segundo a phrase dos jurisconsultos roma-
nos, sem testemunhas na presença do juiz, implicitamente exigia a
presença de testemunhas para o caso de não estar presente o juiz.
Os escrivães dos juizes municipacs e dos juizes de paz, ainda que
não sejam tabelliães, tambem podem lavrar no seu cartorio ou na
presença do respectivo juiz as procurações apud acta.
Mas os escrivães das camaras municipacs que continuam a ser
tabelliies nos contractos em que ellas outorgam, codigo administra-
tivo artigo 109.', como os escrivães dos juizes de paz que ainda são
competentes para lavrar instrumentos de approvaçâo dos testa-
mentos cerrados, Nov. Ref. Jud. artigo 142.°, não têem attribuições
para lavrar instrumentos de procuração.
O codigo em todo o caso não definiu a competencia dos officiaes
8 ARTIGO 1322.0

publicos para lavrar procurações, limitou-se a determinar as condi-


ções da procuração publica, particular, e havida por publica.
Duas são tambem as firmas de procurações havidas por publicas,
que na sua origem não são publicas, por não serem escriptas por
tabellio, mas a que a lei ldi a mesma força que 's procurações
publicas, quando revestidas posteriormente das formalidades pre-
scriptas no artigo 1322.-
Para ser havida como publica a procuração escripta e assignada
pelo constituinte, ha de o tabellião declarar positiva e terminante-
mente que reconhece não só a assignatura, mas a letra do man-
dante.
Não bastam os reconhecimentos, aliás frequentes, em que o ta-
bellião declara apenas reconhecer o signal supra, corso não basta
reconhecer simplesmente a assignatura. É essencial reconhecer ex-
f pressa e explicitamente a letra e a assignaturai, tanto no substabe-
k lecimento como nas procurações porque a razão é a mesma, apesar
i
de já se ter julgado dispensavel
2 nos substabelecimentos o reconhe-
cimento por aquelIa fôrma.
Se não é escripta pelo constituinte, ha de ser assignada pelo man-
dante e por duas testemunhas perante tabellião que assim o certi-
fique e reconheça essas assignaturas no proprio documento.
Não póde ser havida por publica a procuração de mais de uma
pessoa, escripta por unia e assignada por todas, se não ten os re-
quisitos estabelecidos na segunda parte do artigo 1322.1 E apenas
admittida na pratica como publica a procuraçóo de marido e mu-
lher, escripta por um e assignada por ambos, independentemente de
testemunhas, visto serem reputados uma só pessoa, es for reconhecida
por tabellião a letra do que escreveu, e a assignatura dos dois 3,
pratica rigorosamente legal, sobre tudo quando o conjuge que a es-
crever for o directamente imteressado no acto ou na causa.
Não admíitte o codigo a procuração no velho direito conhecida
pela clausula in re~ propriam, que impropriamente se chamava
procuração, pois não havia mandante e mandatario, e sim cedente
e cessionario, visto importar verdadeira cessão de direitos, porque o
mandato nóo terminava pela morte de nenhum dos pactuantes, e
porque o titulo ou acto juridico era subordinado ás regrasda cessão
dos direitos, e julgado incompativel com a natureza da procuração.
Exige-se n'alguns casos procuração com formalidades
como no consentimento para casamento artigo 104;8., para especiaes,
a ex-
tracção do testamento do archivo do districto artigo 1931., etc.
O mandato judicial só póde ser conferido por procuração publica,
ou havida como tal, que contenha expressamente
poderes forenses,
ainda que não mencione especiatmente o pleito a que respeita salvo

3 Accordãos da Relação de Lisboa de 4 de


fevereiro de 1871, e
de 9 de julho dê 1894, Direito, 3. anno, n.o 20, pag. 319, e
Gazeta
da Relação de Lisboa, 7. anno, n.- 3, pag. 19.
1 0 Accordào da Relação de Lisboa
de 10 he maio de 1873, Revista
de Legislação e de Juriprsdencia,de Coimbra,
pag. 154. 8,; anuo, n. 374,
Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de maio
1874, Gazeta da Associação dos Advogados de
pag. UsSI. de Lisboa, 1 anno,
ARTIGO 1322.° s
disposição especial em contrario como na hypothese do artigo 141.0
do codigo de processo que, para confissão, desistencia ou trans-
acção, se exigem na procuração côo só poderes especiaes, mas refe-
rencia expressa à causa.
Na pratica forons as procurações impressas com poderes geraes
são sutlicientvs para intentar acçIes civeis, tanto cuservatorías,
como persecatorias, bem como execuções de qualquer especie sem
necessidade de menção especial do negocio.
No crime não póde ser prestada por procurador a querela sem a
declaraçâo do facto na procuração com todas as suas particulares
circumstaícias, sem a designação da pessoa querelanda, e sem poder
especial para o juramento, Nov. Ref. Jud. artigo 887?
Além das condições prescriptas na lei civil devem as procurações
ter o sêllo marcado ua legislação respectiva, cuja falta não é mo-
tivo de nullidade, mas obriga a revalidação com pagamento de
multa.
A procuração para geral adminitraçdo viril está sujeita ao sello
da verta 189 da tabella n. 1 anexa á lei de 21 de julho de 1893;
e à procração especial, ou para certos o determinados negocios,
cabe o sello da verba ri.- 187 da mesma tabella, e se entre os po-
deres conferidos houver os de contracto é então applicavel a verba
n: 188.
As procurações forenses pagam o sello designado na verba n. 186
da referida tabella.
Mas á procuração para arrematar, que é verdadeiro contracto, e
que não se confunde com a procuração para licitar, que respeita
simplesmente a ui acto de processo forense, compete o sello da
verba n. 188 fixado para contractos.
As procurações eommerciaes estão sujeitas ao sello fixado nas
verbas ni 190 a 192 da referida tabella.
Nas prscrações, coío n'outros quaesqtcr papeis vindos do ultra-
mar, ha de ser reconhecido e lcgalisado o signal do tabelílo pela
assignatura do respectivo juiz de direito da localidade, e a assigna-
tura do juiz de direito reconhecida e legalisada na secretaria d'es-
tado dos negocios da marinha e do ultramar, como na secretaria da
marinha ha de ser legalisada a procuração ou qualquer outro docu-
mento que do reino for para o ultramar, artigo 13 da lei de 24 de
maio de 1837, ainda hoje em vigor.i
Deve porém reputar-se dispensada esta formalidade nos papeis
relativos a termos e formalidades do processo, como contrafés de
citação, etc., visto serem regulados pelo rodigo de processo, o qual
no suscitou, nem referencia fez sequer ás leis de 24 de maio de
1837 e de 15 de novembro de 1844, e apenas incumbiu no artigo 13.
ao secretario geral do governo da India o reconhecimento da 2assi-
gnatura da auetoridade consular portugueza na India ingleza.
As procurações de paiz extrangeiro, para fazerem fé em juizo, ou
fira d'elle, devem ser legalisadas pelo competente consul geral,
consul ou vice-consul do Portugal, e a asignatura deste reco-

1 Accordão da Relação de Loanda de 28 de maio de 1800, Bile-


tim dos Tritinaes, 6i anti, n!. 246, pag. 443.
SAcecordào do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de maio
de 1889,
Boletim doas tribnaes, 4. anno, u? 162, pag. 501.
10 ARTIGOS 1323., 1324." e 1325.-

nhecida no ministerio dos negocios extrangeiros, codigo de pro-


cesso artigo 213.0, para o que os empregados consulares, antes de
entrarem no exercieio de faneçes, enviam a sua assignatura ao mi-
nisterio dos negocios extrangeiros, como a enviam ao ministerio do
reino onde funeciona a juneta de saude publica.
Tambem o artigo 33.° da lei de 11; de junho de 1855, que mandou
declarar nas procurações se o outorgante era menor ou emancipado,
casado ou viuvo t, ainda nuo foi revogado, nem pelo codigo civil,
nem pelo codigo de processo, que no se occuparam dos termos for-
mularios das procurações, nem das consequencias resultantes da falta
de cumprimento d'essas formalidades.
Na procuraçio, como acto entre vivos, sujeito á disposiçio dos
artigos 1966.0 e 2492.", não podem intervir como testemunhas, nem
os filhos nem os amanuenses do tabellião.

Art. 1323.1 A procuração pôde ser geral ou especial.


Art. 1321.0 A procuração geral é a que representa o
mandato para todos-e quaesquer actos, sem os especificar.
A procuração especial é a que representa o mandato para
certos e determinados negocios.
Art. 1325.1 A procuração geral só póde auctorisar actos
de mera administração.

E especial a procuração para arrendar ou para alienar o predio A.


É geral a procuração para todos os negocios da constituinte, ou,
como dizia o projecto primitivo no artigo 1384., correspondente ao
artigo 1324.° do codigo, é geral a procuraçjo que comprehende a
gerencia de todos os negocios do mandante.
Mas a procuração para todos os negocios só dá poderes para admi-
nistrar, como para alugar casas, arrendar terrenos, semear terras,
recolher e vender fructos, fazer córteo de madeira, etc., e não para
transigir, hypothecar, alienar, ou praticar qualquer outro acto de
transmissão ou encargo de bens, que requerem pela sua importancia
consentimento especial; ou, como dizia o projecto primitivo em ar-
tigo collocado entre os artigos correspondentes aos artigos 1330.° e
1331.0 do codigo, e depois eliminado pela commissoo revisora: «Os
actos que importarem transferencia de dominio, não poderão ser pra-
ticados sem poderes especiaes..
Para alienar ou para hypothecar, o que facilmente póde despojar
o mandante de tudo quanto possue, deve a procuração ser escripta
em termos formaes e explicitos, porque encerra poderes exorbi-
tantes que nem a lei nem a boa razio permitte regular por pre-
sumpçoes.
Mas ainda na procuraçlo especial basta determinar o negocio, sem
especificar as condições. Não é indispensavel especificar a proprie-
dade alienandaouhypothecanda na procuração para vender ou hypo-
thecar, como não é necessario fixar o preço na procuração para eum-
prestimo.

1 Accordão da Relação do Porto de 6 de agosto de 1869, Direito,


3.° anuo, n. 27, pag. 431.
eýq
ARTIG OS 13'., 1327., 132,. e 1329» 11

Em parte nenhuma a lei exige similhante especificação, apesar


de já se ter julgado r que a procuraçâo para administrar, arrendar,
partilhar, hypothecar o vender sem especificar os bens, só contem
poderes germes de administraçãa, e é insufticiente para a alienação.
A procuração pôde ser especial e de geral administração ao mes-
mo tempo.
Os poderes geraes co-existem perfeitamente com os poderes espe-
ciaes, póde o procurador exercer uns ou outros ou uns e outros,
segundo as circumstaneias.2
0 mandato commercial, embora contenha poderes geraes, só póde
auctorisar actos não mreantis por declaração expressa, codigo de
cosmerio artigo 231.-
A procurção para receber a primeira citação deve conter poderes
especiaes, mas sem necessidade de referencia expressa á causa,
codigo de processo artigos 141.' e 186'
Apesar dos artigos 335" e 336^ do codigo de commrrcio decla-
rarrmosolidariamente garantes para com o portador os que assignam
uma letra, determinarem que a ssigaytora apposta n'uma letra su-
jeita o signa/ario á obrigaçôo que ella implica, e não permittirem
assignatara por procurador nas letras, como ó artigo 2599 § uico
permuite assignar por procurador os recibos do producto de fazendas
vendidas por caixeiros em armazeus por grosso, quando tacs co-
branças se effectues, fóra do armazem, ou procedam de vendas feitas
a pra, bem podem ser assignadas as letras por procurador, desde
que a lei não exclue a assignatura por procuração, e desde que por
procuração se podem praticar todos os actos, que não forem mera-
mente pessoaes; e essa é, e foi sempre, a pratica.

Ai t. 1326.1 O mandato verbal prova-se por qualquer meio


de prova; o escripto, nos casos em que a lei o exige, só
0
pelos meios estabelecidos nos artigos 1321.O, 132L. e 1322.°
(Vid. nota ao artigo 1319.)

Art. 1327.° E necessaria procuração publica, ou havida


por publica, para os actos que tèem de realisar-se por modo
authentico, ou para cuja prova é exigido documento authen-
tico.
Art. 1328.° É suliciente a procuração particular para os
actos, cuja prova só depende de documento particular.
Art. 1329.° Nos actos, no comprehendidos nos dois
artigos antecedentes, é admissivel a prova de simples
mandato verbal.
(Vid. artigo 1355»)
Nos actos, que não carecem do ser realisados por escripto basta o

1 Accord<lo da Relação de Lisboa, de 20 de novembro de 1895,


Gazeta da relaçào de Lisboa, 9. anno, u" E8, pag. 457.
8 Accordão da Relaçào do l'orto de 26 de janeiro de 1877, Direito
,
9.' anno, a.' 7, pag. 109. ,
F

12 ARTIGOS 1330.0, 1331.-, 1332.° e 1333.

mandato verbal. Nos actos, que s por escripto podem ser realisa-
r dos, ou dependem de documento particular, e é suliciente procuração
particular, carecem de ser provados por documento authentico, e é
indispensavel procuração publica, ou havida por publica.
Todas as disposiçes relativas á falta de procuração e A procuração
illegal foram pela commisso revisora eliminadas por serem da ex-
clusiva competencia das leis de processo, e inteiramente extranhas
á lei civil.

Art. 1330.° 0 mandato pôde ser conferido a ausentes,


mas o contracto só se valida pela acceitação do mandatario.
(Vid. nota ao artigo 1318.)

Art. 1331.1 O mandato presume-se gratuito, não tendo


sido estipulada remuneração, excepto se o objecto do
mandato for d'aquelles, que o matdatario tracta por officio
ou profissão lucrativa.
rE" No direito romano era da essencia do mandato a gratuidade. Nos
codigos modernos não é assim. A nossa legislação civil, seguindo
ainda as pisadas do direito romano, presume gratuito o mandato, mas
resalva os negocios que o mandatario tracta por otleio ou profissão
lucrativa, artigo 1331": e assim considera oneroso o mandato do
advogado ou do solicitador judicial que se encarrega da demanda,
attendendo ú profsso e oficio do mandatario.
O mandato commercial não se presume gratuito. Em commereio
todo o mandatario tem direito pelo seu trabalho a remuneração, 0ue
lia de ser regulada por aecordo das partes, e, na falta de accordo,
pelos usos da praça onde for executado o mandato, codigo de com-
mercio artigo 232.
Não se desnatura pois o mandato por ser retribuido.

SECÇAO II

Do objecto do mandato, e das pessoas que podem conferir


e acceitar procuração

Art. 1333.0 Pôde qualquer mandar fazer por outrem todos


os actos juridicos, que por si pôde praticar, e que não
forem meramente pessoaes.
Art. 1333.° 0 matdatario pôde acceitar procuracão para
todo e qualquer acto, que lhe não seja vedado por dispo-
sição da lei.
(Vid. nota ao artigo 1318.9
ARTIGO 1834.0 13

Art. 1334.0 As mulheres casadas, e os menores não


emancipados podem ser mandatarios, salvo o disposto no
artigo 1354.°; mas o mandante só terá acção contra o
menor ou contra a mulher casada, em conformidade das
regras geraes que regulam a responsabilidade dos actos
destas pessoas, excepto se o mandato, sendo escripto,
tiver sido auctorisado pelo marido, pae ou tutor do man-
datario.

(Vid. artigos 1887.0 e 1888.°)


Não quiz o legislador negar, nem à mulher casada, nem ao menor
não emancipado, o erercicio do mandato particular extrajudicial,
porque a primeira regra na escolha do mandatario deve ser a propria
confiança do rommittente, e se elle deposita no menor ou na mulher
casada a confiança precisa para lhes entregar a administração do
negocio, a si impute as consequeneas.
Podem pois, o menor e a mulher casada, com auctorisaçào das
pessoas a quem estão sujeitos, ser encarregados da compra de predios,
da eobr:nça de rendas, feros, etc.
. No projecto primitivo o artigo 1391.0, correspondente ao artigo
1334.1 do codigo, era redigido nos seguintes termos: «As mulheres e
os menores podem ser mandatarios, salvo o disposto no artigo 1411.0
(1354.0 do codigo); mas não terá o mandante acção contra o menor,
ou contra a mulher casada, senão em conformidade das regras ge-
raes, que regulam a responsabilidade dos seus actos,.
A commissâo revisora, teudo discutido o artigo nas sessões de 13,
de 17 e de 22 de fevereiro de 1862, votou a final, 1.0 que a mulher
casada e o menor podiam ser maudatarios, 2.° que a mulher casada,
com auctorisaçào do marido para aeceitar o mandato, contrahia
todas as obrigações de masdatario, 3.° que a mulher casada tam-
bem podia acceitar o mandato sem auctorisação do marido, mas que
n'este caso não coatrahia obrigações para com o mandante nem para
com terceiros, nem a ellas sujeitava o marido; e acerescentou outro
artigo redigido nos seguintes termos: <Porém as mulheres casadas
não poderão, sem auctorisação de seus maridos, nem os menores
sem consentimento de seus paes ou tutores, acceitar mandato es-
cripto, ou seja por procuração publica ou particular, sendo uullos
todos os actos que em virtude de taes procurações praticarem sem o
alíndido eonsentisicnto.», -
liEm harmonia com aquellas conclusões foi redigido o presente ar-
tigo, segundo o qual, 1.0 podem ser mandatarios os menores não
emancipados sem auctorisação de seus legitimos representantes, e
as mulheres casadas sem auctorisação dos maridos, mas não cabe
n'estas cireumstancias a acção ordinaria de mandato, porque a res-
ponsabilidade de taes mandatarios é regulada nos termos geraes
de direito; 2.0 tendo sido escripto o mandato, respondem, a mulher
casada auctorisada pelo marido, e o menor auctorisado pelo pae ou
tutor, como se fossem mandatarios capazes de por si se regerem e
administrarem seus bens.
A responsabilidade do menor não emancipado na falta de aucto-
risação do pae ou do tutor, e a da mulher casada na falta de auctori-
sação do marido, póde dizer-se nulla tanto em relação ao constituinte,
como etc relação a terceiro, porque o menor não rmancipado só póde
14 ARTIGO 1334.-

ter responsabilidades nas hypotheses previstas no artigo 299., e a


mulher casada, sem auctorisação do marido só responde no casamento
com separação de bens, e só pelos bens mobiliarios separados da
commsnhdo e pela terça parte dos rendimentos nos termos do
artigo 1125.
Não devia a commissão revisora deixar simplesmente ao par, e
sobre tudo ao tutor, a faculdade de auctorisar o menor para a pro-
curadoria, quando para actos aliás de menor importancis exige a
intervenção do conselho de familia artigos 224.' e 243., e quando
os menores ficam sem outra garantia que não seja a responsabilidade
dos tutores, para se indemnisarem dos prejuizos que por dolo au culpa
d'estes porventura sofirerem, artigo 248."
Ainda assim a auctorisação do par ou do tutor, apesar da redacção
do artigo, não responsabilisa o menor por actos, que elle não possa
validamente praticar sem auctorisoçá. judicial.
Podem em todo o caso obrigar-se, como mamlatarios, pessoas aliás
incapazes de se obrigarem em seu proprio nome, ficando a capaci-
dade necessaria para responderem pelas consequencias do mandato
dependente apenas da auctorisação do marido, do pae, ou do tutor.
Não podem porém ser incumbidos de promover os termos de uma
demanda em juizo, porque Iho vedam as leis do processo, salvo o
disposto no artigo 1354, e. 2.°
Tambem não podem ser testamenteiras sem auctorisaçào do marido
as mulheres casadas. salvo estando judicialmente separadas de pes-
soas e bens, artigo 1887.% porque o rompimento dos laços conjugaes
lhes permitte exercer livremente o mandato.
A testamentaria com a obrigação de administrar e de dar contas
poderia trazer á mulher casada graves responsabilidades que lhe
compromettessem a fortuna, e os herdeiros do testador não teriam
garantia segura contra a má administração d'ella, porque não pode-
riam demandal-a senão pelos bens pessoaes.
Mas por outro lado, para não perder qualquer legado deixado em
remuneração da testamentaria, permitte-se-lhe implorar o suppri-
mento judicial quando o marido lhe negar auctorisação, no casa-
mento com separação de bens, que a colloca n'uma especie de in-
dependencia do poder marital, e dá aos herdeiros garantias de
indemnisação.
Os menores não emancipados, ainda auctorisados pelos paes ou
pelos tutores, não podem ser testamenteiros artigo 1S88., já pelas
dificuldades da administração da testmentaria, já e sobre tudo
por terem de ser eommcttidos ao tutor os actos de execução da tes-
tamentaria, em contrario á natureza d'este mandato, que é encargo
pessoal e de confiança.
Não se permitte ao menor nem á mulher casada acreitar testamen-
taria, como se lhes permitte aceritar mandato nos termos do presente
artigo, porque no mandato não póde cora razão queixar-se o consti-
tuinte do mandatario que escolheu voluntariamente, quando na tes-
tamentaria é o testador quem escolhe o mandatario, e são os herdeiros
quem corre o risco da gerencia.
ARTIGOS 1335., 1836 °, 1837.0 E 1338.' 15

SECÇAO III

Das obrigações do mandatario em relação


ao constituinte

Art. 1335.° 0 mandatario é obrigado a cumprir o seu


mandato, nos termos e pelo tempo por que lhe foi con-
ferido.
Art. 1336.1 0 mandatario deve dedicar à gerencia de
que é encarregado a diligencia e cuidado, de que é capaz,
para o bom desempenho do mandato; se assim o não fizer,
responderá pelas perdas e damnos a que der causa.
Regula o codigo em separado os direitos e as obrigações do man-
datario e do mandante, tanto entre si, como em respeito a terceiros.
O mandatario representa a pessoa do mandante dentro dos limites
da procnraçào, de modo que não pôde tomar de aforamento se o
mandato é para compra e vice-versa, nem mais exercer os poderes
da procuração terminado o negocio ou expirado o praso do mandato.
Deve dedicar à gerencia do negocio todo o cuidado e zelo de que
for capaz, ainda que esse esforço seja superior is forças do mandante,
e assim responde, não só pelo dolo, mas por qualquer falta de dili-
gencia, que podia empregar e não empregou.
Podia o mandatario ter recusado o mandato, que é encargo de
confiança. Mas, desde que o acceitou, abusaria da confiança n'elle
depositada não recorrendo a todos os meios para o bom desempenho
da sua missão.
Em coinoercio responde por perdas e damnos o mandatario que
nuo cumprir o mandato em conformidade com as instrueções recebi-
das, e, na falta ou insuificiencia d'ellas, em conformidade com os usos
do commercio, codigo commercial artigo 238.0

Art. 1337. 0 mandatario não pôde compensar os pre-


juizos, a que deu causa, com os proveitos que, por outro
lado, enha diligenciado para o seu constituinte.
(Yid. nota ao artigo 1258.0)

Art. 13 3 8.° 0 mandatario, que exceder os seus poderes,


será responsavel pelas perdas e damnos que causar, tanto
para com o constituinte, como para com qualquer terceiro
com quem haja contractado.
E consequencia dos direitos e obrigações creados pelo mandato a
16 ARTIGOS 1339.0 E 1340."

responsabilidade do mandatario não só pelo excesso de poderes, senão


tambem pelos prejuizos causados por culpa sua ao constituinte e a
terceiros mesmo no exercicio dos poderes conferidos na procuração.

Art. 13 39 .° 0 mandatario é obrigado a dar contas exactas


da sua gerencia.
O mandatario, como administrador de negocios alheios, é obrigado
a dar coutas mesmo autes de finda a gerencia1, porque a lei não
prescreve spocha para a prestação de contas, nem reserva essa pres-
tação só para o termo do mandato, pois que pôde ter o mandante
necessidade de averiguar o estado da administração, e querer mesmo
liquidar para dar destino aos seus interesses, e de outro mudo po-
4.
deria o uandatario prejudiear o mandante, não concluindo o negocio,
e finalmente porque desde que ha gerencia, ha direito de pedir
contas.
As contas devem ser exactas, isto é, conformes aos factos, aliás
não mereceriam o nome de contas, e docmentadas, para se saber
como e quando se cumpriram as ordens do mandante. 2
A liquidação do mandato por meio da acção de contas pôde ser
intentada tanto por quem tem direito de as exigir, como por quem
voluntariamente as queira prestar, em todos os casos de prestação
de contas, codigo de processo civil artigos 611.- e 613., e não sim-
plesmente nos casos de mandato ou de gestão de negocios.
As acções de prestação de contas, qualquer que seja o valor da
causa, ou o mandato seja civil, ou commercial codigo de processo
commercial artigo 131., seguem os tramites prescriptos nos arti-
gos 611.- a 1614." do codigo de processo civil.

Art. 13's0. 0 Se o mandatario distrahir, em proveito seu,


o dinheiro do seu constituinte, será responsavel pelos juros,
desde que se achar constituido em múra, se esse dinheiro
os não vencer por outro titulo.
O mandatario, que distrãe dinheiro do constituinte em seu proveito,
é responsavel pelos juros, não desde o facto da distracção dos fundos,
como na sociedade, mas desde a mra, isto é, desde a obrigação da
entrega, ou por ioterpellação do mandante. ou por ser chegado o dia.
Os juros n'este caso representam as perdas e damnos artigo 720.°
Em commercio u o mandatario obrigado a pagarjuros dos dinheiros
do mandante a contar do dia em que, conforme a ordem, os devia
ter entregue ou expedido; e, se distrahir do destino ordenado as
quantias remettidas, empregando-as em negocio proprio. responde,
a datar do dia em que as receber, pelos respectivos juros e pelos
prejuizos resultantes do não cumprimento da ordem, sem prejuizo da

1 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de abril de


de 1892, Boletim dos Tribonaes, 7.- anno, n." 295, pag. 514.
2 Accordão da Relação de Lisboa de 20 de março de 1897, Gazeta
da Relaçdo de Lisboa, 11.° anuo, u.° 10, pag. 73.
ARTIGO 1341 17

competente acção criminal, se a ella houver logar, codigo commereial


artigo 241.1
Não podem peém ser julgados os juros, com quanto corram desde
a mora, se não foram pedidos na acção. r
Por faltar á fidelidade devida no exercicio das suas fuseçiles pôde
até ser punido o mandatario com as penas prescriptas no artigo 453.»
do codigo penal, que considera ro de furto o mandatario
2
que distráe
em proveito proprio o dinheiro do mandante.
As palavras finaes do artigo «se esse dinheiro os não vencer por
outro ti/elo» referem-se de certo ao caso de já receber juros o man-
dante pela quantia distrahida, porque entio continúa a recebel-os
pelo titulo por que já os recebia, ou sejam mnaores ou menores do
que 5 por cento, porque não ha de receber juros em duplicado pelo
mesmo capital.

Art. 131.° Sendo varias pessoas encarregadas conjuncta-


mente do mesmo mandato, responderá cada lima d'ellas
pelos seus aclos, se outra cousa no for estipulada.
unico. No caso do ioexecução do mandato, será a res-
ponsabilidade repartida, por egtal, entre os mandatarios.

(Vid. artigos 1348.» e 1356.0)


A nomcação de diversos mandataris, ainda no mesmo acto e no
mesmo instrumento, não importa a indivisibilidade da gerencia, nem
a solidariedade na obrigação, salvo estipulaçao. Não vai a respon-
sabilidade de cada um além dos factos pessoaes, porque nem a so-
lidariedade se presume, nem o mandatario, que exerce em regra uma
missão do brurficencia e de amizade, quereria responder pelos actos
do commíandatario, em que não interviesse.
Polo contrario sendo muitos os constituintes e um só o mandatario
para negocio coííumns, como se os co-herdeiros incumbem terceiro
da ndministração da herança, são solidariauente responsaveis os
mandantes para com o mandatario, salvo o regresso de uns contra
os outros pela parte respíetiva artigo 1348., jí porque, recebendo
esi coíníuní o beneficio e o serviço, em eommam devem indeninisar
o mandatario, ji porque esta solidariedade será mais uma garantia
da indenmisação dos prejuizos que o mandatario soifrer na gerencia
de negocio, em que ordinariamente entra gratuitamente, e finalmente
porque, qualquer que seja o numero dos mandantes, é só um o man.
dato.
o mandatario, que recebeu os seus poderes de cada um, como de
todos junetos, não tem qe dividir os seus creditos contra os mandan-
tes, póde tornal-os efleetisos nos bens de qualquer d'elles.
Não pôde porém o constituinte, que paga pelos outros, exigir soli-
dariamente de cada una dos consocios a quota parte, salvo obtendo

t Accordão da Relação de Lisboa de 18 de abril de 1894, Gazeta


da Relação de Lisboa, 7.» anno, n. 86, pag. 686.
2 Accordào da Relação de Lisboa de 17 de junho de 1891, Gazeta
da Relação de Lisboa, 5.» asno, ni, 46, pag. 362.
ToMo I5 2
18 ARTIGO 1342.'

do mandatario cessão de direitos, visto não dar a lei o caracter de


solidariedade ao seu direito contra os outros constituintes.
No procuradoria judicial, concedida a muitos, é que não se per-
iitte a clausula de nada poder um fazer sem os outros artigo 1356.',
porque semelhante estipulação poderia prejudicar, e irremediavel-
mente, as demandas.
Em commercio, encarregadas varias pessoas do mesmo mandato,
deve, salvo declaração, trabalhar cada uma na falta de outra pela
ordem da nomeação, e, havendo declaração para procederem conjun-
etamente e não sendo acceite por todas o mandato, ficam obrigadas
a cumpril-o as que o acceitarem, constituindo maioria, codigo com-
mercial artigo 244.°

Art. 4342.° 0 mandatario não pôde encarregar a outrem


o cumprimento do mandato, se para isso não lhe tiverem
sido dados poderes; e, se lhe forem dados sem designação
de pessoa, responderá pelo substituido, sendo este notoria-
mente inhabil ou insolvente.
Na delegação do mandato podem ser consideradas quatro hypo-
theses: 1 prohibiçào de substabelecimento ou de delegação n'ou-
trem á escolha do mandatario; 2.' completo silencio a esse res-
peito; 3.- auctorisação para substabelecer; 4.1 designação da pessoa
para substituir o mandatario.
Da primeira e da quarta bypotheses não se occupa o codigo, porque
tars casos não offerecem difìiculdades. Regula apenas as hypotheses
2.' e 4.' «o mandato sem auctorisação para substabelecer., e so
mandato com poderes para delegar, mas sem designação da pessoa
em quem hão de ser delegados».
Não permitte o codigo substabelecer o mandato, quando para isso
não ha poderes na procuração. O projecto primitivo no artigo cor-
respondente (1400.) impunha ao mandatario, que substabelecesse
sem poderes, a mesma responsabilidade, que se substabelecesse em
pessoa notoriamente inhabil ou insolvente na falta de designação de
pessoa.
O artigo era redigido nos seguintes tersos: -o mandatario póde
encarregar a outrem o cumprimento do mandato, se outra cousa não
for estipulada; mas se estes poderes lhe não tiverem sido expressa-
11
mente outorgados, ou o forem sem designação de pessoa, responderá
pelo substituido, sendo este notoriamente incapaz ou insolvente..
A cosmmissão revisora porém supprimiu a parte relativa ao sub-
stabelecimento sem poderes, de certo por considerar o caso excesso
de mandato, comprehendido no artigo 1351.?, e não ficar por isso
exempto de responsabilidade pelo substituido o mandatario, pois, se-
gundo a nota ao artigo 1369.^ do projecto de 1863, resolveu que o
mandatario responderia sempre pelo substituido quando lhe não
tivrsoem sido expressamente outorgados poderes para substabelecer.
E pois responsavel pelo substituido o mandatario, ou substabeleça
sem poderes, ou substabeleça com poderes, sem designação de pessoa,
em pessoa notoriamente iseapaz ou insolvente.
Mas é diversa essa responsabilidade, segundo substabelece a
procuração sem poderes, ou a substabelece com poderes, sem desi-
gnação de pessoa, em pessoa notoriamente inhabil ou incapaz.
O mandatario, que substabelece sem poderes, responde directa-

J
ARTIGO 1313.9 19

mente pela gerencia do substabelecido, ainda que este seja pessoa


muito capaz, ou antes é nullo tudo o que o substabelecido fizer, como
excesso de mandato, visto só ao zelo e amizade do mandatario ter
o constituinte entregue os poderes de administração; e se substabe-
lece, tendo poderes sem designação de pessoa, em pessoa notoriamente
inhabil ou incapaz, não é nulo o substabelecimento, porque estava
auctorisado sem designação de pessoa, mas responde o mandatario
pela gerencia do substabelecido, pela grande falta que commetteu,
entregando a gerencia a quem não era capaz de a desempenhar.
O substabelecido pelo mandatario, que estava inhibido de entregar
a terceiro a gerencia do negocio, não contráe com o mandante relaçoes
juridicas, derivadas do mandato, e tudo o que fizer é sob a respon-
sabilidade do mandatario.
Exempto de responsabilidade pela gerencia do substituido só é o
mandatario com poderes de substabelecer, quando substabelece na
pessoa designada, se houver designação de pessoa, ou em pessoa
babil e capaz, não havendo designação de pessoa.
Com fundamento no artigo 1336. responsabilisam alguns o man-
datario pelo substabelecimento, mesmo quando feito à pessoa desi-
gnada pelo mandante, se a reconhecia como inhabil e incapaz, por
não ser obrigatorio o substabelecimento, e sim subordinado i con-
dição de ser bem desempenhado o mandato.
Esta opinião, porém, é insustentavel em vista da letra do codigo.

Art. 1343.° 0 matdatario substituido tem para com o


manlante os mesmos direitos e obrigações qíte tinha o
matdatario originario.

Fixa o artigo as relaçes juridicas entre o constituinte e o man-


datario substituido, as quacs variam conforme a procuração contém
ou nao poderes de substabelecer.
No primeiro caso toma o procurador substabelecido inteiramente
o logar de mandatario com os mesmos direitos e obrigações, e no-
meadamente com a obrigação de dar contas, salvo provando que não
praticou actos de gerencia', e póde demandar e ser demandado pelo
constituite, que não tem soais arçào contra o mandatario directo
senão quando este se substituir por pessoa notoriamente inhabil ou
insolvente, que não venha designada¯no instrumento da procura-
doria.
No segundo caso tem o constituinte acção contra o mandatario
originario, e póde exigir do substabelecido indennisaçâo dos pre-
juizos que este lhe causasse, são pelo exercicio do mandato, ou pelo
excesso de mandato, mas por qualquer outro titulo, e não tem o
substabelecido arçào contra o constituinte.

1 Accordão da Relação de Lisboa de 8 de janeiro de 1873, Direito,


65. anno, n. 12, pag. 191.

.a
20 ARTIGOS 1344.- z 1345.0

SECÇÃO IV

Das obrigações do constituinte em relação ao mandatario

Art. 1344.0 0 constituinte tem obrigação de indemnisar


o mandatario de todas as despezas, que este fizer, e de
todos os prejuizos, que lhe provierem do cumprimento do
mandato, comtanto que o dicio mandatario não excedesse
os seus poderes, e procedesse de boa fé.
O mandato, como contracto bilateral, prescreve obrigaçies tanto
ao constituinte, como ao mandatario.
As do mandante são indemnisar o mandatario, não só das despe-
zas, consequencia directa e immediata do mandato, mas tambem das
perdas indirectas originadas na execução da procuração, perdas que
o constituinte teria provavelmente soffrido se houvesse dirigido elle
proprio o negocio, comtanto que não representem excesso do mandato,
e não haja má fé da parte do mandatario, porque com o dolo ninguem
deve aproveitar.

Art. 1345.0 0 constituinte não pode escusar-se de cum-


prir todas as obrigações, que o mandatario houver contra-
bido em seu nome, dentro dos limites do mandato.
(Vid. artigo 1350.-)
A especialidade d'este contracto consiste em se ligar o mandante
a terceiros por via do mandatario, e ficar o mandatario completa-
mente extranho ás relaçBes juridicas nascidas dos actos que praticar
dentro dos limites do mandato, nos quaes interveio unicamente como
representante do constituinte, e não em nome proprio.
Todas as questóes nascidas da compra de umas casas feitas a
Sancho por Pedro em virtude de procuração de Paulo, são discutidas
entre Paulo e Sancho, porque Pedro não figurou no acto juridico
senio em nome de Paulo. Pedro nenhumas obrigações contrahiu em
seu nome, e por isso nenhuma responsabilidade póde ter no acto.
No contracto conforme o mandato desapparece a pessoa do man-
datario para só o mandante ficar sujeito á obrigação de cumprir o
feito em seu nome pelo mandatario, e só elle gosar o direito de
tornar eslectivo o contracto entre o terceiro e o mandatario.
Se o mandatario dentro dos limites do mandato contractou mal,
ibi iniputet o mandante, porque foi liberrimo na escolha de pro-
curador.
Se o excesso de poderes do mandato redunda em beneficio do
constituinte nada tem com isso o mandatario.
O mandatario não fica obrigado para com terceiros, a quem tenha
dado conhecimento dos seus poderes, excepto quando se responsa-
bilisa pessoalmente pelo constituinte artigo 1352.'
J:;^%

ARTIGOS 1346.-, 1347, 1348. s 1349.' 21

Art. 1346.0 Não é licito ao constituinte eximir-se de


cumprir o que lhe é ordenado nos artigos antecedentes,
com o fundamento de não ter percebido os proveitos, que
do mandato esperava.
Art. 1347.° 0 constituinte é obrigado a pagar ao man-
datario os salarios estipulados, ou que lhe sejam devidos,
conforme o que fica disposto no artigo 1331.1, ainda que
o mandato não tenha sido vantajoso ao dicto constituinte,
excepto quando isso acontecer por culpa ou negligencia do
mandatario.
(Vid. nota ao artigo 1261.-)

Art. 1348.0 Se muitas pessoas houverem constituido ua


só mandatario para algum negocio commum, será cada um
dos constituintes solidariamente responsavel por todas as
obrigações que resultarem da execução do mandato, salvo
o regresso do constituinte, que haja pago, contra os outros
pela parte respectiva a cada uni d'elles.
(Vid. nota ao artigo 1341.-)

Art. 1349.° 0 mandatario tem direito de retenção sobre


o objecto do mandato, até que esteja embolsado do que,
em razão d'este, se lhe deva.
Como o credor pigooraticio artigo 870.' pôde reter todo o penhor,
pôde o mandatario reter todo o objecto do mandato até estar intei-
ramente pago do seu credito, ainda que esse objecto seja divisivel,
e exceda muito o valor da divida.
O mandatario commercial gosa de privilegios mobiliarios espe-
ciaes:
1.° Pelos adiantamentos e despezas feitas, pelos juros das quantias
desembolsadas, e pela sua remuneração, - nas mercadorias a elte
remettidas de praça diversa para serem vendidas por conta do man-
dante, e que estiverem á sua disposição em seus armazens ou em
deposito publico, e n'aquellas que provar com a guia de transporte
haverem-lhe sido expedidas, e a que taes creditas respeitarem -;
2.' Pelo preço das mercadorias compradas por conta do mandante,
-nas mesmas mercadorias, emquanto se conservarem á sua disposi-
ção nos seus armazens ou em deposito publico-;
3. Pelos creditos constantes dos numeros antecedentes,-no preço
das mercadorias pertencentes ao mandante, quando estas hajam sido
vendidas - .
Os creditos referidos em o n.' 1.0 preferem a todos os creditos sobre
o mandante, salvo aos provenientes de despezas de transporte ou
seguro, quer hajam sido constituidos antes quer depois das merca-
dorias haverem chegado á posse do mandatario, codigo de commercio
artigo 247.
22 ARTIGOS 1350., 1351., 1352.1 s 1853.-

SECÇAO V

Dos direitos e das obrigações do constituinte


e do mandatario em relação a terceiro

Art. 1350.0 0 constituinte é responsavel para com qual-


quer pessoa, nos termos do artigo 134.5.°, pelo que o
mandatario tiver feito, como tal, em relação a essa pessoa;
mas o mandatario não tem acção para exigir delia, em
nome do constituinte, o cumprimento das obrigações con-
trahidas pela mesma pessoa. Este direito compete ao con-
stituinte.
(Vid. nota ao artigo 1345.°)

Art. 1351.1 Os actos que o mandatario pratica em nome


do seu constituinte, mas fúra dos limites expressos do
mandato, são nullos em relação ao mesmo constituinte, se
este não os ratificou tacita ou expressamente.
Art. 1352.° 0 terceiro, que assim houver contractado
com o mandatario, não terá acção contra elle, se o dicto
mandatario lhe houver feito conhecer, quaes eram os seus
poderes, e se não se tiver respotsabilisado pessoalmente
pelo constituinte.
Art. 1353.° São havidos por não auctorisados, embora
sejam da mesma nattreza dos auctorisados, os actos que
forem evidentemente contrarios ao fim do mandato.
(Vid. artigo 1726.0)
Fica sanada a nullidade dos actos praticados fóra dos limites ex-
pressos da procuraçio com a ratificação do mandato, que produz todos
os effeitos de procuração, como a ratificaçdo da gestào, artigos 1726.^
e 1730.°, que tambem pôde ser expressa ou tacita, como expresso ou
tacito póde ser o mandato.
Só obriga para com terceiros o mandatario o excesso de mandato,
não ratificado, e não pela acçào de mandato, mas pela acção de dolo,
salvo tendo o mandatario declarado a extensão dos seus poderes, e
não se havendo responsabilisado pessoalmente, porque neste caso
a si imputem terceros o contracto fóra dos limites do mandato.
Quem vendeu ao mandatario uma casa por preço superior ao fixado
no mandato, ou lhe vendeu uma herdade quando a procuração era
para a compra de um navio, nenhuns direitos adquiriu contra o
constituinte se este não ratificou expressa ou tacitamente os actos
do mandatario.

IVs

,J11
ARTIGO 1354. 23

SECÇAO VI

Do mandato judicial

Art. 1354.0 Não podem ser procuradores em juizo:


1.0 Os menores ião emancipados;
2.0 As mulheres, excepto em causa propria, ou de seus
ascendentes e descendentes ou de seu marido, achando-se
estes impedidos;
3.1 Os juizes em exercicio, dentro dos limites da sua
jurisdicção;
4.5 Os escrivães e olliciaes de justiça nos respectivos
julgados, excepto em cansa propria;
5.5 Os magistrados do ministerio publico, em toda e
qualquer causa em que possam intervir de officio, dentro
dos limites de seus respectivos districtos;
0.° Os que tiverem sido inhibidos, por sentença, de pro-
curar em juizo ou de exercer officio publico;
7.5 Os ascendentes, descendentes ou irmãos do julgador;
8.° Os descendentes contra os ascendentes, e vice-versa,
excepto em causa propria.
Pela sua elevada importancia são tractadas em separado as espe-
cialidades do mandato judicial.
O presente artigo, não obstante de advogados se não fallar até o
artigo 1357, comprebende nas funcçêes de procurador as de advo-
gado tambem, porque a secção inscreve-se «do mandato judicial.,
que tanto pôde ser exercido pelos advogados, como pelos solicita-
dores, e porque a sentença do artigo, se é necessaria para os so-
licitadores, é absolutamente indispensavel para os advogados; nem
a variedade da referencia ora a procuradores, ora a procuradores
ou advogados, ora a procurad~res e advogados, impede a applicação
a uns e aos outros de todas as provisões contidas n'esta secção, pois
tambem no artigo 1356., evidentemente applicavel a advogados
como a procuradores, unicamente se usa a expressão 'procoradores».
Provavelmente empregam os artigos 1354.o, 1356.o e 1357.o uni-
camente a expressio «procrradores, por se referirem principal-
mente á ýfuncçdo' de procurar em juizo, e os artigos seguintes as
expressões <proeuradores e advogados», por se referirem principal-
mente ás pessoas que exercem essa funcção; diversidade de lingua-
gem já do projecto primitivo, e conservada em todos os projectos da
commissdo revisora.
Differençam-se, porém, as funeçées dos advogados das funeções
dos procuradores: 1." em instruir em regra só de direito e não soli-
citar o advogado, e em solicitar em regra só o procurador; 2.' em
24 ARTIGO 1354.0

carecerem os advogados de habilitações litterarias superiores, por-


que hão de ser bachareis formados com a sua carta registada, ou
advogados provisionaes conforme a lei de 19 de dezembro de 1843
e o decreto de 17 de fevereiro de 1858, quando aos procuradores
bastam as habilitações ordenadas no decreto de 12 de novembro
de 1869.
O processo da provisão para advogar, regulado no continente e
ilhas pelo decreto de 17 de fevereiro de 1858, e no ultramar pelo
decreto de 12 de janeiro de 1880, é meramente gracioso: nao
admitte contestação dos interessados, nem no juizo da justificação,
nem perante a auctoridade a quem compete expedir a provisão.
A provisão para advogar compete, no continente do reino, á pre-
sidencia do Supremo Tribunal de Justiça, na Madeira e Porto San-
eto á presidencia da Relação de Lisboa, e nas ilhas dos ASóres á
presidencia da Relação competente; e no ultramar aos presidentes
das Relações, com recurso para o presidente do Supremo Tribunal
de Justiça quando negarem a provisão, decreto de 12 de janeiro
de 1880.
O presente artigo, como o decreto de 12 de novembro de 1869,
teve principalmente em virtude excluir de solicitar emjuizo os que
não offerecem garantias de saber e de probidade, ou que pela sua
posição e influencia podem prejudicar a administrtção da justiça.
Habeis, pois, para procurar em juizo são os que não estiverem
comprebendidos nalguma das oito causas de inhabilidade marcadas
no artigo, salvo o disposto em o n" 2.0, e que reunirem as habilita-
ções prescriptas nos decretos de 17 de fevereiro de 1858 e de 12 de
novembro de 1869.
As disposições do artigo eram, coto era já pela Ord., liv. 1, tit.
48., § 24.°, e liv. 3.^, tit. 28.', § 3 ., unicamente applicaveis aos so-
licitadores em juizo contencioso.
Porém depois da promulgaçio do codigo de processo, que usa
da palavra procurador. nos artigos relativos á conciliaçio, como nos
artigos relativos ao juizo contencioso, tambem só o procurador judi-
cial pôde promover os termos no juizo avindor.
O cojigo, porém, regula o mandato judicial apenas como direito
civil. A legislação administrativa é que compete determinar as
condiçOes da profissão de advogado e de solicitador.
Por lei, cotao pela jurisprudencia dos tribunaes, o mandato judi-
cial não é simples contracto ou industria puramente particular, ee
sim considerado tambem como ftncç o psbica, o ' 6." do presente
artigo, e até como encargo obrigatorio. artigo 1357.'
Eflectivamente o interesse da sociedade, e o dos constituintes,
reclama habilitaçòes e provas officines de capacidade e de morali-
dade nos que tiverem de procurar em juizo.
Differençam-se os advogados provisorios dos bachareis formados,
em que estes podem advogar em todas as comarcas do reino onde
apresentarem as suas cartas, e os provisionarios, quer no continente,
quer no ultramar decreto de 12 de janeiro de 1880 artigo 8.', só
podem advogar na comarca para que obtiverem a provisão. As ha-
bilitações dos solicitadores estão reguladas no decreto de 12 de
novembro de 1869, que a ninguem permite procurar em juizo sem
se habilitar com a respectiva carta ou despacho.
O decreto de 12 de novembro de 1869 tasíbem aurtorisa a nomea-
ção de solicitadores por simples despraro do juiz da comarca, nos
termos dos artigos 12.° e 13.°, tilo havendo solicitadores
encartados
em numero sufiiciente.
ARTIGO 1354 25

Para as causas da fazenda nacional ba solicitadores, nomeados


pelos inspectores de fazenda do distrieto, que exercem as suas fun-
eçBcs subordinados aos delegados do procurador regio.
lá lêem sido inasllados processos pela intervenção de solicitador
não encartado, ou aso anctorisado, conforme o decreto de 12 de
novembro de 1869 artigos 12. e 15»1
Péde tambem o juiz nomear procurador ad Isne para assignar
popvis, que dependam da assignatura de advogado ou de solicita-
dor, quando nio houver advogados nem solicitadores no auditorio,
oi estiverem todos impedidos, o que é frequente nas comarcas do ul-
tramar, onde é desconhecida a entidade -solicitador encartado -- .

Lor e2.

Procuradores judiciaes não podem ser os menores não emancipa-


dos, ainda com auctorisaçào do pae ou do tutor, rem as mulheres
casadas ainda com auctorisaçdo do marido, e nem mesmo as mulheres
solteiras ou viuvas, porque a procuradoria judicial, apesar de pro-
fissào particular, como tem certo caracter de oflicio publico, que a
sujeita à liscalisaçlo do governo, e a certas penas disciplinares, não
é compativel com o estado de menor não emancipado, nem com o de
mulher, ou seja casada ou eclibataria.
NIo permitte o codigo a procuradoria ás mulheres, porqne o man-
dato judicial envolve os mais altos segredos e os mais caros inte-
resses das partes, e o legislador julgou que não casava com o tem-
peramento e com o decoro das mulheres a guarda dos segredos, e
a investigaçio de certos factos.
Podem apenas, por excepção, procurar em causa propria, o nas
causas dos ascendentes e descendentes e do marido, estando estes
impedidos, porque no primeiro caso não são procuradores, e sim
partes directamente interessadas, e no segundo Lambem podem re-
putar-se antes partes do que procuradores, porque as relaçòes de
sangue e de amor as tornam verdadeiramente interessadas.
Mas para exercer o mandato judicial em beneficio dos ascenden-
tes, dos descendentes ou do marido, impedidos, não carece a mulher
de diploma passado em conformidade do artigo 1. do decreto de
12 de novembro de 1869, ou de despacho do juiz, nos termos do
artigo 12° do mesmo decreto. Basta-lhe documento comprovativo
da sua qualidade de ascendeote, de descendente, ou de mulher do
constituinte, e do impedimento d'este.
As palavras do a. 2. whcíondo-se estes impedidos»', que não vi-
nham no projecto primitivo, e que apparcceram pela primeira vez
no projecto da commissão revisora de 1865, escusadas eram para a
mulher casada, que já por outras disposições substitoia o marido nos
seus impedimentos, pois no impedimento, filho de interdicção ou de
ausencia julgada por sentença, é a mulher tutora ou curadora quem
administra n esta qualidade, e nos casos de impedimento ou de ausen-
cia do marido, no julgados por sentença, e é ella quem administra
por direitoproprio, artigos 1117 ., 11690 e 1190.0

1 Accoedão da Relaçlo de Lisboa de 14 de maio de 1892, Gazeta


da Relação e/e Lisboa, 5 atno, n 8, pag. 61.
2 Accordão da Relação de Loanda de 30 de janeiro de 1892, Re-
eista dos Tribunaes, 13 anuo, a.0 302, pag. 217.
26 ARTIGO 1354.'

3., etc.

É homenagem ao principio - ninguem póde ser juiz e parte na


mesma causa-.
Não pôde julgar com imparcialidade e justiça quem tiver advogado
por uma das partes.
Sempre foi probibido ao juiz advogar nas causas que houvesse
de julgar.
Já a lei vi, cod. De postulando, dizia Quisquis vul esse causidi-
cus, non idem eodem negotio sit advogatus e jcdex; e a Ord., liv. 1.-,
tit. 6.-, § 22.', até prohibia aos juizes declarar quando mandassem
emendar alguns artigos as cousas em que se haviam de emendar,
porque não deviam ensinar ás partes, nem a seus procuradores, como
haviam de formar seus artigos.
O que era duvidoso ao tempo da promulgação do codigo, era se
os juizes podiam ou não procurar nas causas que corriam fóra dos
limites da sua jurisdicção.
A Ord. liv. 3.-, tit. 28.-, § 2.-, mandando que -nenhum homem po-
deroso por razão do oficio, assim como cada um dos julgadores das
relações, ou vedor da fazenda, ou qualquer outro oficial de justiça,
egual d'estes ou maior, não advogue nem procure., parecia prohibir
a advocacia, quer dentro, quer fóra dos limites da respectiva juris-
dicção, não aos juizes subalternos, mas aos juizes de categoria
superior, que podiam exercer influencia sobre os subalternos.
Da lei de 19 de dezembro de 1843, que revogou no § 3.' do ar-
tigo 18.0 as Ordenaçdes, liv. 1.', tit. 47.', § 22, e liv. 3.- tit. 28.0, e
pjermittiu o exercicio de advocacia a todos os que tivessem a habi-
litação necessaria, excepto aos juizes em exercicio de funcçôes, tanto
podia deduzir-se que os juizes eram simplesmente inhibidos de ad-
vogar dentro dos limites da sua jurisdicção, como que eram tambem
impedidos de advogar nas causas que corressem fóra da sua juris-
dicção apesar de ahi não exercerem funcções.
O codigo civil permittiu aos juizes procurar nas causas pendentes
em juizo differente.
Hoje porém são inhibidos de advogar todos os juizes de primeira
instancia, de primeira, segunda, e terceira classe, qualquer que seja
a comarca ou tribunal administrativo onde exerçam funeç6es, os
juizes das Relações e os do Supremo Tribunal de Justiça, lei de 7 de
agosto de 1890 artigo 1. declaração 7.1, e unicamente excluidos da
prohibição os juizes municipaes, cujas fuseçães tambem havia decla-
rado incompativeis com a advocacia o decreto n.- 3 de 29 de março
do mesmo anno artigo 15.0
Nao é, porém. impedido de aeceitar no processo procuração de
qualquer das partes o advogado que presidiu à audiencia de instal-
lação da acção.'
As funcçóes de juiz são incompativeis com a advocacia, com a
profissão de commerciante, e com todo o cargo publico electivo, á
excepção do de par do reino, ou de deputado da nação, e conta-se-lhe
para o effeito da promoção o serviço legislativo, o de governador
civil, o de magistrado superior do ministerio publico, e o de juiz syn-

r Accordão da Relação de Lisboa de 22 de junho de 1892, Gazeta


da ijelação de Lisboa, 6.- anno, a.' 20, pag. 158.
ARTIGO 1354." 27

dicante, decreto n.o 3 de 29 de março de 1890 artigo 12.^ § 1.- e


artigo 150

4.", etc.
Com quanto não seja applicavel aos escrivães a regra do numero
antecedente, é certo que a imparcialidade d'estes funecionarios deve
ser superior a toda a suspeita pela grande influencia que lhes dá
nos pleitos a sua importante intervenção no processo.
Nas palavras «escrirses e ofliciaes de justiça. estão hoje compre-
hendidos os escrivàes de juiz de paz, cujas funeções não são limita-
das a lavrar autos conciliatorios, e instrumentos de approvação de
testamentos cerrados, e pelo contrario se estendem ao processo con-
tencioso, que pelo decreto de 29 de julho de 1886 ficou sendo da
competencia dos juizes de paz.
Embora essas causas corram perante o respectivo juiz de direito,
não podem procurar no seu respectivo julgado os escrivães dos juizes
de paz, ou por estarem directamente cmaprebendidos no presente
numero do artigo, ou pela possibilidade de intervirem em actos ou
diligencias do processo, que hajam de ser praticados dentro do seu
julgado.
Por isso são egualmente inhibidos de procurar em juizo os ajudan-
tes dos escrivães por serem tambem considerados ofliciaes de justiça,
visto exercerem funeções judiciaes, artigo 100.0 da novissima reforma
0
judicial, artigo 31." da lei de 16 de junho de 1855, e decreto n. 5
de 29 de março de 1890, bem como os contadores, Ord., liv. 1.,
tit. 790, § 45., e decretos de 20 de setembro de 1849, artigos 1.0 e
3., e de 17 de novembro de 1868, e finalmente os tabellUes de notas
que por diferentes providencias legaes são considerados oficiaes de
justiça.
Os outros oihciaes de justiça, se não exercem tanta influencia nos
pleitos como os escrivães, podem todavia encontrar muitas vezes o
cumprimento dos seus deveres em opposição com o interesse dos seus
constituintes.
No entre tanto já se tem julgado que os contadores das varas ci-
veis não são impedidos de advogar nos juizos criminaes, onde não
exercem funeções proprias do seu emprego 1; e na pratica são os
contadores admittidos a procurar, quer no crime, quer no civel.
Tambem se tem julgado que o escrivão da Relação só no tri-
bunal onde exerce funeções é inhibido de advogar 2, e que os guardas-
móres da Relação não são considerados escrivães e officiaes de jus-
tiça para o effeito de serem excluidos das fimeções de solicitar e
advogar.3
Da sentença e saneção d'este n^ 4." estão evidentemente exclui-
dos os escrivães da administração do concelho, da regedoria de

t Accordão da Relação de Lisboa de 1 de agosto de 1895, Gazeta


da Relação de Lisboa, 9. anno, n. 27, pag. 212.
2 Accordão da Relação de Loanda de 12 de julho de 1890, appenso
2." ao Boletim Oficial d'ingola, n. 9, de 28 de fevereiro de 1891,
pay. 41.
Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de março de
1887, Direito, 25.0 anuo, n." 7, pag. 104.

.
28 ARTIGO 1354.°

parochia, da camara municipal, e quaesquer outros que não sejam


escrivàes em tribunaes de justiça.

5.°, etc.

Osmagistrados do ministerio publico, que apenas requerem e não


julgam, nem organisam processos, podem advogar em todas as causas
em que não seja interessada a fazenda, ou em que não tenham de
intervir de odicio.
Nos magistrados do ministerio publico estio caroprebendidos os
sub-delegados do procurador regio.
No ultramar não podem os agentes do ministerio publico, sem exce-
ptuar o que funeciona juncto da procuratura dos negocias synicos era
Macau, nem os curadores dos indisiduos sujeitos a tutela publica,
exercer advocacia perante tribunal algum durante o exercicio do seu
cargo, decreto de 4 de agosto de 1881 artigo 6.°
No continente e ilhas podem os delegados do procurador regio
exercer advocacia, menos em Lisboa e Porto, lei de 30 de junho de
1864, onde aliás a podem exercer os curadores geraes dos orphãos.
Os conservadores do registo predial não podiam pelo decreto de
29 de julho de 1886 advogar nas comarcas, nào capitaes de distri-
eto, porque eram substitutos do juiz de direito, e aquelle decreto no
2.0 do artigo 31.0 applicava-lhes o disposto no artigo 87. da Nov.
Ref. Jud., que não admittia os advogados do auditorio para substi-
tutos do juiz de direito.
Mas depois, para não ferir interesses creados, veio a portaria de
14 de agosto d'aquelle anuo excluir da substituição do juiz de direito
os conservadores que estivessem advogando, e o decreto de 25 de
novembro do mesmo anno prohibiu a advocacia só aos posteriormente
nomeados
0
ou transferidos a requerimento seu. Mas a final o decreto
n. 3 de 29 de março de 1890 voltou ao antigo systema da substi-
tuição dos juizes de direitos por individuos annualmente nomeados,
e não excluiu, como a Reforma excluia, das funeções de substitutos
os advogados do juizo.
Portanto os conservadores, com quanto sujeitos ao ministerio da
justiça, ao procurador geral da coras, e aos procuradores regios, não
são inhibidos de exercer as funeçôeo de mandatarios judiciaes até
onde for compativel com os deveres de oficiaes do registo predial.
Os administradores de concelho, que aliás no estão compreben-
didos no preceito do artigo, devem abster-se de advogar em causas
criminaes e fiscaes, em que as obrigações dos seus cargos estão fre-
quentemente em collisào com as de advogado em taes processos.

6.0, etc.

Já a legislação antiga, Ord., liv. 1., tit. 48.°, excluia de procurar


em juizo os infames, ou estivessem declarados assim por sentença,
ou por exercício de profissões então julgadas infames.
Em presença do preceito do n.^ 6. não poderá, por ef9eito da pena,
o bacharel formado em direito, condemnado a degredo. procurar ci
juizo no legar do degredo, ainda que apresente as suas cartas, visto

t Portaria de 12 de outubro de 1874, Direito, 7.- anno, n.° 19,


pag. 218.
ARTIGOS 1355.', 1356.' u 1357.• 29

o artigo 76.' n." 3." do codigo penal, som quanto julguemos muito
desarrazoada semelhante disposição.
Não inhibe porém o advogado de exercer as suas funeçóes a in-
diciação com transito em julgado, como inhibe o solicitador em vir-
tude do decreto de 12 do novembro de 1869, que não é applicavel
aos advogados.1

7.', etc.

Não podem tambem procurar nas causas os descendentes ou as-


cendentes dos juizes, em razão da influencia, mais ou menos directa,
que poderiam exercer sobre elles, e do respeito ao decoro publico.

8.0, etc.

Este preceito é dictado pela repugnancia natural de procurarem


os filhos contra os pacs, ou estes contra aquelles.

Art. 1355.0 0 mandato judicial só pôde ser conferido


por procuração publica, ou havida por tal.
(Vid. nota ao artigo 1327.")

Art. 1356." Não será admitlida em juizo procuração a


dois ou mais procuradores, com a clausula de que um nada
possa fazer sem os outros; mas podem conferir-se os mes-
mos poderes a dilferentes pessoas simultaneamente.
(Vid. nota ao artigo 1341.^)

Art. 1357." Se os procuradores do juizo, por attenção á


pare contraria, recusarem a procuração conferida, deverá
o juiz, a requerimento do constituinte, nomear algum d'elles
que a aeceile, sob pena de suspensão por seis mezes, nao
provando escusa legitima.
Em virtude do principio eterno, que vinguem deve ser condeonado
sem ser ouvido, porque a defesa é de direito natural, dá a lei com-
petencia ao juiz para nomear advogado ou procurador, quando nin-
guea acceitar voluntariamente o patrocinio da causa e só por in-
termedio de advogado ou procurador o interessado poder fallar, e
muitos são estes casos.
Não são recebidos em juizo, sem estarem assignados, com o nome
por inteiro, por advogado ou por procurador se não houver advogado
no auditorio, e tambem pela parte quando não ajunetar ou não tiver

' Accordão da Relação do Porto de 22 de março de 1892, Revistk


dos Triunaes, 10.o anuo, n.^ 210, pag. 377.
r 30 ARTIGO 1357

nos autos procuração, os requerimentos para começo de acção, as


contestações e quaesquer outros articulados, as minutas e petiçoes
de recurso, e as allegaçôes escriptas, codigo de processo civil ar-
tigo 93.^
A Ord., liv. 3., tit. 20., já reconhecia ao juiz auctoridade para
constranger o advogado a acceitar procuração, ainda que estivesse
contractado com a parte contraria, para uma das partes não perder
por desegualdade de procurador; e a Nov. Ref. Jud., artigo 747.-,
impunha ao guarda-mór a obrigação de não acceitar as petições de
aggravo, que não fossem assignadas com o nome inteiro de advo-
gado com procuração nos autos; e até se julgou [ que não devia o,
tribunal conhecer deste recurso, quando assignado por individuo
a quem a lei prohibisse o exercicio de funeções de procurador.
Pelo codigo penal de 1852 artigo 188.0 cabia ao advogado, que
não acceitasse o patrocinio da causa depois de nomeado pelo juiz a
requerimento da parte, a pena de desobediencia, applicavel em
todos os casos em que não estivesse especialmente declarada na
lei ou nos regulamentos administrativos auctorisados por lei a pena
ou a responsabilidade civil pela desobediencia.
Mas só is nomeaçes obrigadas a requerimento da parte era appli-
cada esta pena, porque as nomeaçes officiosas eram reguladas pela
lei de 18 de julho de 1855, que no artigo 21.p decretava a muleta
C de 54000 a 504000 réis, revogando o § 4.° do artigo 1107.- da no-
vissima reforma judicial que impunha a pena de suspensão ao advo-
gado que não acceitasse a defesa do réo para que tivesse sido offi-
ciosamente nomeado, ou faltasse aos termos d'ella, sem justo impe-
dimento.
O codigo civil puniu o advogado que não acceitasse a nomeação
feita a requerimento da parte, com a pena de suspensão por seis
mezes.
Finalmente o codigo de processo civil, artigo 15.", sujeitou, não à
s
pena de suspensão por seis mezes, como o presente codigo, mas á
pena de suspencão aé seis mezes, a arbitrio do juiz, o advogado ou
procurador, nomeado a requerimento de parte, que recusar acceitar,
não allegando no praso de quarenta e oito horas a contar da inti-
mação escusa, ou sendo julgada improcedente a escusa.
Pelo presente artigo do codigo civil não podia o juiz nomear
advogado sem o litigante ter primeiro solicitado o patrocinio de
todos os advogados do auditorio, e todos lh'o haverem recusado.
Mias pelo codigo de processo, para evitar despezas, perda de tempo
e de trabalho, basta allegar a parte que não encontra quem volunta-
riamente lhe acceite o patrocinio da causa para o juiz lhe nomear
otliciosamuente advogado.
Tambem pelo codigo civil o juiz só podia nomear advogado ou
procurador a requerimento da parte quando nenhum dos procurado-
res do juizo quizesse acceitar o mandato por attcsçdo á parte con-
traria, quando pelo artigo 15.^ do codigo do processo é permittida
a nomeação otlhciosa de advogado ou procurador desde que a parte
não encontra quem lhe acceite o patrocinio da sua causa, qualquer
que seja o motivo de recusa.

t Accordão da Relação de Loanda de 15 de de 1890, ap-


penso 2.1 ao Boletim Official d'Angola, n. 9, deoutubro
28 de fevereiro de
1891, pag. 29.

1.
ARTIGO 1858." 31

Aquelle artigo é tambem applicavel à bypothese da recusa do


patroeinio da causa unicamente por desaccêrdo no preço dos honora-
rios ou dos salarios, porque é em todo o caso unia recusa, e porque
a remuneraçào dos sírviços do procurador judicial bem póde ser
depois liquidada segundo a regra prescripta no artigo 135b.-
0 advogado otliciosamente nomeado nos termos do artigo 15.0 do
codigo de processo não carece de procuração da parte, que é substi-
tuida pelo despacho do juiz.'

Art. 1358.0 Será nullo todo o contracto, que as partes


fizerem com os seus advogados ou procuradores, conceden-
do-lhes alguma parte do pedido na acção.
§ unico. Os procuradores ou os advogados, que infrin-
girem o que se dispõe n'este artigo, serão inhibidos, por
espaço de um anuo, de procurar ou advogar em juizo.
É permittida sociedade para demandas, entrando uns com o direito,
e outros com o capital, e quinhoando depois no vencido, como é valido
o contracto de fornecimento de fundos a troco do pagamcuto de
certa quantia no caso de se vencer o pleito, e bem assim o ajuste de
preço pelo patrocinio da causa.
Os contractos de sociedade com adiantamento das despezas da
demanda, e divisão a final dos lucros, são muito frequentes, e com-
pletamente validos. Só aos advogados e aos procuradores judiciaes
é prohibido contracto em que se lhes conceda parte do pedido na
acço.
Não prohibe o codigo os ajustes de preço fixo entre procuradores
judiciaes e as partes, segundo se vencer ou não a demanda.
O que o codigo probibe aos advogados e procuradores judiciaes,
como já a lei auterior probibia, são os pacto, quota litis, isto é, ajus-
tarcomes tpartes quota ou percentagem nos lucros das demandas,
para evitar os contractos leoninos que elles poderiam impér, pre-
valecendo-se da sua posição, ou da pobreza dos litigantes.
Os pactos quota tis, já prohibidos pelas leis romanas, pelo menos
desde o tempo do Ulpiano, eram punidos pela nossa Ord., liv. 1.,
tit. 48.o, 11., e pelo alvará de 1 de agosto de 1774, que, ampliando
a Ordenação, impunha ao advogado a peua de suspensão perpetua
de procurar ou advogar, e a de degredo.
Deixaram, porém, de ser considerados crimes os referidos pactos
depois da publicação do codigo penal; e mesmo civilmente só nio
são permittidos aos advogados e aos procuradores.
O sr. dr. Joaquisi José Paes da Silva queria a prohibiçâo ab-
soluta dos pactos quota litis, quaesquer que fossem os contrahentes,
e assim o restabelecimento pleno do alvará do 1 de agosto de 1774,
que os prohibiu com pena de nullidade a todas e quaesquer pessoas
sem differença de classes.
Dizia este distineto jurisconsulto nas suas observaçes ao projecto
primitivo do Sr. Seabra: «Ao artigo 1417. (artigo 1358.° do codigo)

SAcecordão da REclaçâo de Lisboa de 4 de julho de 1891, Gazela


da Relaçdo de Lisboa, 5." anno, n. 46, pag. 368.
0~~

32 ARTIGO 1359.1

que impàe pena de nullidade aos pactos quota litis feitos entre as
partes, advogados e procuradores, parece-me se devia isso ampliar
aos mesmos pactos feitos com quaesquer outras pessoas, porque os
prejuizos são os mesmos, e até são mais frequentes entre pessoas que
não são advogados e procuradores, e os advogados e procuradores
têem o meio de fazer intervir n'elles terceiras pessoas. Já tivemos
entre nós o alvará do 1.0 de agosto de 1774, que os prohibiu com
pena de nullidade a todas e quasquer pessoas sem differença de
classes, e ha conveniencia vm o restabelecer».
Respondia o sr. Seabra. «Prohibem-se estes pactos aos advogados
e aos procuradores, porque, sendo o seu oflicio tractar de demandas,
mais facilmente podem abusar. As pessoas que não estão n'este caso
não podem fazer taes contractos cem que sejam logo publicos, e
incorrem no odioso que os acompanha, o que é, até certo ponto, um
freio. E por outro lado, quando este mal aconteça, é por certo menor
que o que resultaria de inhabilitar as partes pobres de poderem fazer
valer os seus direitos.
A pena comminada no § unico do artigo, como é consequencia da
nullidade de contracto, e nio respeita a nenhum dos factos especi-
ficados no artigo 289.· do codigo penal, só pelos tribunaes civis póde
ser decretada em acção ordinaria a requerimento da parte offendida;
com quanto alguns sustentem que o facto representa unia trans-
gressdo de preceitos relativos a funeções publicas, que devem ser
perseguidas criminalmente a requerimento do ministerio publico.

Art. 1359." Os procuradores e os advogados haver5o os


salarios do estylo no respectio auditorio, além das despezas
que fizerem com a causa.
Não ha, nem seria possivel, tabella de preços para o serviço dos
advogados e dos procuradores.
Mas tapbem não são exequiveis as contas do advogado ou pra-
curador. E necessario promover em acçdo ordinaria, levantada cue
seja impugaação, o julgamento dos serviços prestados, podendo ficar
reservado para a execução o valor d'esses serviços.
Quer na acção, quer na execuçd-, o valor do serviço ha de ser
fixado segundo os preços medios do auditorio, e não segundo os
preços exagerados para mais ou para menos.
O costísue do auditorio é a unica regra de liquidação consignada
no codigo para o caso de questão entre as partes e os advogados ou
procuradores sobre o preço dos honorarios ou dos salarios.
Nas consultas, porém, que não são trabalhos judiciaes em causas
pendentes, já os honorarios dos advogadas hão de ser regulados, uão
so pelo costume da terra, mas tamnbem pela importaucia do serviço,
pela reputação de quem o houver prestado, e palas posses de quem
o houver recebido, artigo 1409."
Emprega o codigo, como já fizera o projecto primitivo, a palavra
.salarios para designar, nio só a retribuiçdo do procurador, mas
tambem a do advogado, quando no artigo 540.°, como o projecto
primitivo no artigo 620.0 (correspondente), designa a remuneraçdo
dos advogados, pela palavra .honorarios. que é a classica em ma-
teria juridica.
A obrigaçáo de responder pelas depezas com registos, e com ad-
vogados ou procuradores no caso de demanda judicial, não inhibe o
litigante de discutir essas contas, quando lhe parecere m excessivas,

4
ARTIGOS 1360. E 13610 88

Art. 1000.0 0 procurador ou o advogado, que houver


acceitado o mandato de uma das partes, não pôde procurar
ou advogar pela outra na mesma causa, ainda que deixe
a anterior procuração.
unico. 0 procurador ou advogado, que assim o não
cumprir, será suspenso de procurar ou de advogar por es-
paço de uni anuo.
Art. 4361.0 0 procurador ou o advogado, que revelar
á parte contraria os segredos do seu constituinte, ou lhe
subministrar documentos, ou quaesquer esclarecimentos,
será inhibido para sempre de procurar ou de advogar em
juizo.

(Vid. artigo 2511. n. 5.')


Posto que aos olhos da moral e da consciencia publica seja egual-
mente criminoso o procedimento do advogado que revela os segredos
do consulnte, ou tivesse ou não procuração judicial, é certo que o
codigo, talvez para evitar que uma das partes, consultando sobre o
seu negocio todos os advogados do auditorio, impossibilitasse por
isso a ootra de encontrar advogado que lhe defendesse a sua justiça
no juizo, se refere em todos os artigos d'esit secção unicamente
aos advogados o aos procuradores com procuraçao para causa, e no
ao procurador apenas encarregado de certo negocio e sem procura-
ção para intentar ou seguir qualquer acção, nem ao advogado que é
simplesmente consultado sobre qualquer assmpto do seu officio.
No interesse dos segredos das partes, cuja publicidade poderia
pôr cm perigo a sua propriedade e até a sua honra e liberdade, são
os advogados e os procuradores judiciaes inhabeis para testemunhar
nos negocios relativos á sua profissão artigo 2511.0, n.° 5.', bem
coao para procurar pela outra parte, ainda que substabeleçam a
procuração, se o substabelecimento for com reserva de poderes.
O preceito do artigo que tem por fim, não só vigiar pelos interes-
ses das partes, mas tambem assegurar a boa reputação dos advoga-
dos e dos solicitadores, abrange tanto o caso do advogado deixar a
procuraçno, como o caso de lhe ser retirad:a a procuração pela parte,
porque não se presta a restricçcs 3, e comprehende todas as causas
sem exceptuar o inventario judicial, que c processo contencioso
pelas qucstces que u'elle so resolvidas artigo 2087, e codigo de
processo civil artigos 704., 724.' e outros, pois que até envolve o
processo gracioso, porque a lei não faz distineção.
A peca de suspensão por espaço de um ano ao que for procurar
na mesma causa a favor de uma das partes depois de haver acei-

i Arcordo da Relação de Lisboa de 3 de julho de 1877, Revista


de LegiluçYo e de Jurisprudencia,de Coimbra, 10.' ano, o.° 491,
pag. 3id8.
i Accordão da Relação de Lisboa de 4 de novembro de 1893, Ga-
zela ota Reau;oo de Lisboa, 7.' ano, u.n 52, pag. 412.
3 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de fevereiro
de 1896, Gazeta da Relação de Lisboa, 9.' anno, n.' 84, pag. 669.
Too 111 3
i

34 ARTIGO 13620

tado o mandato da outra, e a pena de inhibição para sempre de pro-


curar em juizo ao que revelar directa ou indirectamente á parte
contraria os segredos do seu constituinte, ou lhe subministrar docu-
mentos ou esclarecimentos, ficam substituiído em materia civel como
em materia crime, n'este ponto preciso, as penas de suspensão tem-
poraria e de muleta correspondente de tres mezes a dois annos, que
o codigo penal no artigo 289.- impunha ao advogado ou procurador
n'aquelles casos.
Continúa porém de pé em materia civel, como em materia crime,
a penalidade estatuida no codigo penal contra o advogado, para os
casos não prevenidos no codigo civil, que vem a ser: 1.0 descobrir
segredos do cliente, de que haja tido conhecimníato no exercício
do seu ministerio. a outra pessoa que não seja a parte contraria;
2.0 depois de receber de alguma das partes dinheiro, ou outra qual-
quer cousa para lhe procurar na demanda, procurar ou aconselhar
em publico ou secreto na mesma causa pela outra parte; 3.- receber
alguma cousa da parte contra quem procurar.
O facto previsto no artigo 1361.0, porque aos olhos da moral não
tem defesa nem desculpa, é mais severamente punido que o do em-
pregado publico, que revela segredos de que tenha conhecimento em
razão do exercício do seu emprego, ou indevidamente entrega a al-
guem papeis ou copias de papeis da sua repartição que não devam
ter publicidade, e que é punido apenas com suspensão, nos termos
do artigo 290.0 do codigo penal.
Procede a penalidade contra os advogados ou procuradores pelos
factos especificados u'estes dois artigos, ainda quando d'ahi não
adviesse damno á parte.

Art. t362.0 0 procurador ou o advogado, que tiver justo


impedinuto para continuar na procuradoria, não poderá
abardonal-a sem substabelecer a procuração, tendo poderes
para isso, ou avisar em tempo o seu constituinte para que
nomeie outro; aliás responderá por perdas e datunos.
(Vid. artigo 1368.0)
Péde recusar-se absoluta e incondicionalmente qualquer procu-
ração, porque ninguem é obrigado a desempenhar uma missão de
confiança, quando a confiança nãi se impôe, e deve ser reciproca.
Ainda depois de acccite póde o mandatario renunciar ao mandato,
ou por lhe causar prejuizo, pois nemini officium sunm debel esse da-
amnosum, ou por não querer continuar os otlicios da sua profissio.
Mas a renuncia só a péde fazer com as cautelas devidas para resal-
var os interesses do constituinte artigo 1368.°
Nen a moral, nem o bom senso, permittcm ao mandatario judicial
renunciar o mandato, ainda a pretexto de grandes prejuizos, porque
péde comprometter a posição do constituinte, como prejudicando o
offerecimento de articulados ou a interposiçào de recursos; e tanto
mais que este cargo de confiança imple deveres sagrados, cujo res-
peito está primeiro do que a consideração dos interesses individuaes,
por mais elevados que sejam.
O constituinte não deve ser victima da sua confiança, nem joguete
do capricho ou da fraude do mandatario.
E portanto obrigado o mandatario a continuar, em quanto não

1
ARTIGO 1863.- 35

avisar o constituinte para este providencear, quaesquer que sejam os


prejuizos que lhe resultem da costinaçâo do mandato, os quaes não
podem releval-o da responsabilidade do abandono.
Já a Ord., liv. 1.', tit. 48.°, § 13.', impunha responsabilidade por
perdas e damnos ao advogado ou solicitador que desamparava a
causa por negligencia, culpa ou ignorancia.
O codigo de processo no artigo 648.', regulando a disposição do
presente artigo, impoz ao smandatario a obrgação de notificar judi-
cialmente a renuncia ao mandante, e não deu effeitos á renuncia
em quanto se não ajunetasse ao processo a certidão de notificação,
o que garante ao mandante tempo razoavel para constituir novo
procurador, porque ha para a juneçào da nova procuração tanto
tempo como para a jneção da notificação.
Mas não pôde a renuncia do mandatario entorpecer a marcha do
processo em prejuizo da outra parte.
Assim a renuncia da procuração findo o praso legal da vista dos
autos ao advogado para minutar impede o constituinte de requerer
a continuação dos autos a outro advogado para o mesmo fim, porque
isso embaraçaria o andamento da causa em prejuizo da outra parte.
Neste, como em casos analogos, fica apenas ao prejudicado o di-
reito de intentar a acção de perdas e damnos contra o advogado
que o não avisou em tempo conveniente.

SECÇAO Vil

Do termo do mandato

Art. 1363.0 0 mandato expira:


1.4 Pela revogação;
2.n Pela renuncia do mandatario;
3.° Pela morte, ou pela interdicção do constituinte ou
do mandatario;
4.e Pela insolvencia, ou pela mudança de estado do
constituinte ou do mandatario, se por esta mudança se
tornar inhabil aquelle para conferir, ou este para acceitar
o mandato;
5.° Pela expiração do praso do mandato, ou pela con-
clusão do negocio.

1.° e 2.', etc.

(Vid. artigos 13G4.' e 1365.')


Por excepção à regra de que os contractos só podem revogar-se
pelo mutuo dissenso termina o mandato, que se funda na confiança,
pela vontade de qualquer das partes, ou - pela renuncia do man-
datario, ou-- pela revogação do mandante.
11,
36 ARTIGO 1363.

O mandato, que tem por objecto o interesse e o beneficio do


man-
dante, e que nasce da confiança, deve cessar sempre que o mandante
o o mandatario assim o queira.
A faculdade de revogar o mandato exerce-se como e quando aprou-
ver ao mandante artigo 1364.'
Póde o mandante a todo o tempo revogar o mandato, ou o negocio
esteja começado, ou esteja ainda re integra, sem que lhe possa ser
questionada a procedencia dos motivos da revogação; mas se m-
tempestivamente, sem causa legitima, cassa a procuração para tra-
ctar, por exemplo, negocias em paiz extrangeiro, depois que o man-
datario alli foi estabelecer-se, e fez despezas que só poderia cobrir
concluido o negocio de que estava encarregado, ba de responder
pelos prejuizos que d'ahi resultarem ao mandatario artigos 1345.-
e 1350.
Póde marcar-se ao mandato certa duração, ou até á conclusão de
certo negocio, e pôde mesmo convencionar-se mandato perpetuo. Mas
nada d'isso impede o mandante de revogar a toda a hora o man-
dato
Não ha clausulas nem condições que possam obstar á revogação
do mandato.'
Póde o constituinte revogar a procuração com a mesma liberdade
com que o mandatario póde renunciar ao mandato, não obstante as
palavras -sem prejuizo de qualquer condiço ou convençdo em cetro-
rio, as quaes significam, eão a ljberdade de estipular a irrevoga-
bilidade do mandato, porque a revogabilidade é da essencia do man-
dato, mas sim a faculdade de regular as consequencias de revoga-
ço do mandato, quando se ajusta a irrevogabiildade: isto é, não
fica o constituinte inhibido de revogar a procuração por ter estipu-
lado a irrevogabilidade do mandato, e ha de apenas responder por
perdas e damnos, fazendo a revogação contra qualquer clausula ou
condição do contracto.
A 2pena convencional é tambem admissivel no contracto do man-
dato em conformidade com o artigo 672., que permitte ajunetar aos
contractos qualquer clausula ou condição.
e..
Foi necessario dizer que vale a revogação e que vale a condiçãoa
aliás poderia contestar-se a validade de qualquer pena contra a re-
vogação do mandato, quando se estipulasse a clausula absoluta da
irrevogabilidade.
Não pôde o mandatario questionar a revogação, mas pôde exigir
a indemnisação dos dasnnos causados pela revogação extemporanea.
O constituinte que se sujeita á pena de um conto de réis para o
caso de revogar o mandato, não fica privado do direito de o revogar,
fica apenas obrigado a pagar o conto de réis, se revogar a procu-
ração.
Em todo o caso a validade da pena equivale á inutilisação da
t liberdade de renuncia e de revogação, que a lei concede ao man-
datario e ao mandante, pois que pouco importa o direito de livre-
mente revogar ou de renunciar ao mandato, desde que são permit-
tidas clausulas, que indirectamente tolhem essa liberdade.
5

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de dezembro de


1890, Boletim dos Tribunoes, 6.- anno, ,.- 232, pag. 217.
r Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de julho de 1884,
Boletim doe Tribniaes, 1. anno, n. 21, pag. 328.
S
ARTIGO 1363.' 37

Em commercio a revogação e a renuncia do mandato, não justifi-


cadas, importam, na falta de pena convencional, indemnisação de
perdas e damnos, e, terminado o mandato por morte ou por inter-
dicção de um dos contrahentes, fica ao mandatario e a seus herdeiros
ou reprentantes direito a uma compensação proporcional ao que te-
riam de receber no caso de execução completa, rodigo commercial
artigos 245.o e 246.
Na vigencia do presente codigo, que a simples nomeaçio do novo
procurador ou advogado para o mesmo pleito ou objecto importava
revogação do mandato desde que pelo constituinte fosse notificiada
ao anterior mandatario, sustentava-se que o mandato posterior espe-
cial só revogava o anterior quanto ao negocio a que respeitava, que
o geral posterior não revogava o especial anterior, porque as duas
vontades deviam conciliar-se sempre que fosse possivel, e que o
mandato posterior, quando nullo, nao revogava o anterior, porque
a manifestação da falta de confiança devia ser revestida das forma-
lidades legaes para produwir effeitos joridicos.
Hoje, porém, deixaram de ter importancia as questões sobre o al-
cance da revogação do mandato, por ser especial ou geral quer a
primeira, quer a nova procuração, ou por ser nullo o novo mandato,
pois que fica inteiramente sem valor o mandato, quaesquer que se-
jam as condiçães, logo que seja notificada a revogação da procura-
ção, notificação que não admitte opposição alguma, codigo de pro-
cesso artigo 647.0
No mandato constituido por escripto pôde o mandante, quando o
revogar, exigir o instrumento da procuração artigo 1364.° § unico,
para evitar o abuso de poderes já revogados.
Não caducam as procurações passados dez annos, como já se sus-
tentou com argumento de analogia derivado do disposto no ar-
tigo 64.'; porque nm a especialidade prevista e regulada n'aquelle
artigo póde prejudicar a regra geral estatuida no artigo 1363.°,
nem o mandato se extingue pelo decurso de dez annos mesmo na hy-
pothese do artigo 64.°, que apenas auctorisa o deferimento da cura-
doria definitiva passado aquelle praso a contar, não desde a data da
procuração, mas desde o desapparecimento, ou desde a data das
ultimas noticias, e desde o requerimento para a curadoria até á
execução da sentença que a defere, e até i entrega dos bens aos
herdeiros presumidos, póde ir muito tempo.
No caso de muitos mandantes, fallecendo algum ou revogando só
algun d'elles o mandato, fica só com relação a esse sem elteito o
mandato, que subsiste com relação aos outros; e o mesmo é quando
o mandatario não acceita o mandato da algum dos constituintes.
3.1 e 4.', ete,
Tambem acaba o mandato pela morte do mandante ou do manda-
tario, porque a amizade e a confiança não se transmittem, como os
direitos.
Acaba o mandato pela morte do mandante porque falta a perso-
nalidade representada, e pela morte do mandatario porque com elle
desappareceu a pessoa cuja pericia e probidade inspirava confiança
ao mandante.
Juneta á causa certidão de obito do constituinte não péde o man-
datario continuar a exercer as funcções de advogado ou de procu-
rador, sem nova procuração dos herdeiros, ou dos que como taes se
apresentarem,
I:

88 ARTIGOS 1364. z 1365.-

Fica egualmente sem effeito pela interdicção o mandato, ou o in-


terdicto seja o mandante, porque não pôde o procurador continuar a
estipular em nome d'aquelle a quem a lei nào permite estipular para
si, ou seja o mandatario, porque o administrador do interdicto pôde
não merecer ao constituinte a confiança que este lhe inspirava.
Tambem expira o mandato com a insolvencia, tanto do mandatario,
que não pôde inspirar confiança desde que pela desordem dos seus
negocios deitou a perder a sua fortuna, como do mandante que não
tem negocios a administrar desde que foi declarado insolvente, por-
que todos os seus bens ficam pertencendo aos credores, e ainda
porque nem o mandante pôde ficar exposto a perder o objecto do
mandato, nem o mandatario a importancia dos seus gastos e ante-
cipações.
O auto de arresto já tem sido considerado prova sufliciente de
insolvencia do mandatario.1
A palavra .insolvencia- aqui abrange tambem a fallencia com-
mercial, vistos os expressos termos do artigo 1622.1 do projecto do
codigo civil hespanhol, fonte do nosso, que usava das palavras -que-
bra ou insolvencia. como eynonymas, e tambem do artigo 2003.° do
codigo civil francez, egua mente fonte do nosso, que usa do termo
.déconfture..
Termina tambem o mandato pela mudança de estado do constituinte
ou do mandatario, hypothese não prevista nos artigos acima citados
do codigo civil francez e do projecto do codigo civil hespanhol,
como pelo casamento da mulher solteira, que d'abi em diante não
pôde continuar a ser constituinte, porque não é em nome d'ella, mas
do marido, que se hão de praticar todos os actos administrativos e
judiciaes, nem a ser mandatario, porque depois de casada nAo póde
contrahir obrigações sem auctorisaçào do marido senão nos termos
indicados no artigo 1334.-

5., etc.

Pela simples e natural razão de que, cessando a causa, cessa o


effeito.

Art. 1364.° 0 constituinte pôde revogar, quando e como


lhe aprouver, o mandato conferido sem prejuizo de qualquer
condição ou convenção em contrario.
§ unico. Se a procuração for por escripto, poderá o
constituinte exigir, que o mandatario Ilh'a restitua, se a
tiver em seu poder.
Art. 1365.1 A nomeação de um novo procurador, para
o mesmo e unico objecto, equivale á revogação da primeira
procuração, sendo noticiada pelo constituinte ao anterior
mandatario.
(Vid. nota ao artigo 1363.° n. 1.-)

t Accordôo da Relação de Lisboa de 7 de março de 1888, Gazeta


da Relação de Lisbca, 3. anno, n. 25, pag. 196.

-1i
ARTIGOS 1866.0, 1367.-, 1368.° n 1369.0 39

Art. 4366.0 Posto que o mandato expire pela morte do


constituinte, deve, em tal caso, o mandatario continuar na
gerencia, em quanto os herdeiros não proverem sobre o
negocio, se do contrario lhes podér resultar algum prejuizo.
Art. 1367.0 Se, em consequencia da morte do manda-
tario, expirar o mandato, deverão os seus herdeiros avisar
o constituinte, e fazer entre tanto o que for possivel para
evitar qualquer prejuizo deste.
Para evitar prejuizos aos interessados quando finda o mandato
pela morte do mandante deve continuar o mandatario na gerencia
dos negocios até os herdeiros providenciarem, para não faltar ii
amizade e á confiança, que n'elle depositou o constituinte, e quando
finda pela iorte do mandatario devem os herdeiros avisar o consti-
tuinte e fazer no entre tanto o que lhes for possivel, porque a obri-
gação de velar pela conservação da cousa, objecto da procuração,
natural encargo da herança, que se deriva da obrigaçuo originaria
contrabida pelo mandatario defuncto.
Com a morte do constituinte, desde que esteja legalmente certifi-
cado nos autos o obito, não soffrem prejuizo os hterdiros; porque,
joncta ao processo certidào ou documento official do obito do con-
stituinte, até estarem habilitados os representantes do fallecido ou
verificada a incerteza d'elles ficam suspensos os termos da causa,
e tombem os prasos para a interposição ou expedição dos recursos
que começam novamente a correr depois de intimado o despaebo
ou a sentença aos habilitados ou ao ministerio publico como re-
presentante de incertos, citado rodigo de processo artigo 342.'
elas com a morte do mandatario pdde haver grandes prejuizos,
apesar do aviso, quando forem necessarias providenciao urgentes,
porque os herdeiros do mandatario, que não t1em procuraçlo, nem
poderiam legalmente desempenhar o mandato, pouco poderão fazer.
Em todo o caso os herdeiros do mandatario que não avisarem o
mandante na hypothese do artigo devem responder por perdas e
damnos em conformidade das regras geraes de direito.

Art. 4368.° Em caso de renuncia do mandatario, será


este obrigado a continuar com a gerencia, se do contrario
podér seguir-se algum prejuizo ao constituinte, em quanto
este não for avisado, e não tiver o tempo necessario para
prover aos seus interesses.
(Vid. nota ao artigo 1362.°)

Art. 1369.° Os actos prticados pelo mandatario depois


da expiração do mandato não obrigam o constituinte, nem
para com o mandatario, nem para com terceiro, excepto:
1.' Nos casos dos artigos 1366.°, 1367.0 e 1368.1;
2.° Se o mandatario ignora a expiração do mandato;
3. Se o mandatario, auclorisado a tractar com certa e
40 ARTIGO 1369.

determinada pessoa, houver com ella contractado, ignorando


esta a expiração do mandato, posto que o dicto mandatario
não a ignorasse.
§ unico. N'este ultimo caso, porém, o mandatario é res-
ponsavel para com o constituinte por todas as perdas e
damnos, a que der causa.

Não responde o constituinte pelos actos praticados pelo mandatario


depois de findo o mandato, como não responde pelo excesso de au-
etorisação; porque expirado o mandato cessa a razão, porque o
mandatario tractava em nome do constituinte.

1., etc.

(Vid. nota ao artigo 1366.)

2., etc.

Pela regra Ex boao et acquo, que em contractos de tal especto


deve prevalecer sobre os apices do direito, introduziu-se esta provi-
dencia em favor da boa fé do mandatario que ignorava a causa da
expiração do mandato, e portanto a revogaçfo dos seus poderes.

a.1, etc.

Fica egualmente obrigado o constituinte para com terceiros que na


boa fé contractaram com o mandatario, pela mesma razão por que é
obrigado quando este, ignorando o facto da expiração do
mandato,
continuou a exercel-o depois de findo. Mas cessa a obrigação para
com os terceiros, sejam ou não designados, se estes já sabiam da ter-
minação do mandato, ainda que o mandatario a ignorasse.
Ha de ser feita a notificação da revogação do mandato, que não
tem distribuição, nem admitte opposição, e é entregue a quem a tiver
requerido, conforme prescreve o codigo de processo
no artigo 46.°,
para evitar os contractos feitos com o mandatario, depois de expi-
rado o mandato, variando apenas as formalidades a seguir, segundo
o mandato é ou não para tractar com certa e determinada
pois no primeiro caso é preciso intimar não só o mandatario mas
pessoa,
tambem a pessoa com quem elle devia contractar,
e no segundo,
em vez da intimação a terceiro, ha de ser annunciada a revogaçào
do mandato na folha otlicial.

É
1r
ARTIGOS 1370.' E 1371.- 41

CAPITULO IV

DO CONTRACTO DE PRESTACÃO DE SERVICOS

SECÇAO 1

Do serviço domestico

Art. 4370.0 Diz-se serviço domestico o que é prestado


temporariamente a qualquer individuo por outro, que com
elle convive, mediante certa retribuição.
Art. 1371.0 0 contracto de prestação de serviço domes-
tico, estipulado por toda a vida dos contraientes, ou de
algum d'elles, é nullo, e póde a todo o tempo ser rescin-
dido por qualquer d'elles.

São restrietas unica e exclusivamente ao serviço domestico estas


disposições. Nada obsta a contractar com o medico ou com o advo-
gado, por exemplo, a prestação perpetua dos seus serviços.
O serviço domestico abrange simplesmente o serviço dos creados,
com exclusão dos empregados no commercio, e dos jornaleiros; e é
da natureza do serviço domestico ser: 1. temporario, 2.° retribuido
e não gratuito, 3.' conviver o que o presta com o que o recebe.
No serviço domestico é fundamental o principio da temporarie-
dade.
Nem o amo pôde obrigar-se a servir-se perpetuamente com o ser-
viçal, nem o serviçal obrigar-se a servir perpetuamente o amo.
Póde contractar-se por praso largo o serviço, com tanto que a
convenção não derogue o principio probibitivo da perpetuidade;
porque se o contracto for por praso tão longo, que illuda o principio
probibitivo do serviço perpetuo, tanto o amo, como o serviçal, além
das acções ordinarias a que podem recorrer, sem por isso ficarem
obrigados a perdas e damnos, têem nas disposições dos artigos 1377.'
a 1384.' meio facil de quebrar essa relação perpetua.
O contracto de serviço domestico por toda a vida representaria a
alienação da liberdade, e unia especie de escravidão disfarçada sob
o nome de prestação de serviços,
42 ARTIGOS 1372.-, 1373.-, 1374.^o 1375.

As Partidas de Castella, que aliás reconheciam a escravidão,


condemuavam a perpetuidade dos pactos de serviço domestico com
o fundamento de semelhante etipulaç5o ser a corsa mais vil e des-
presirel, como a liberdade era o bem mais caro e apreciado.
A difticuldade de obrigar a estes serviços quemt não tem vontade
de os prestar, e de os fazer acceitar a quem os não quer, determinou
os codigos dos povos cultos a declarar rescindiveis taes contractos
á vontade de qualquer dos pactuantes, e a marcar as consequencias
da resilição do contracto sem justa causa, segundo é o amo que
despede ou o serviçal que se despede.
No projecto primitivo não havia artigo correspondente ao artigo
1371.0 do codigo, de certo por estar já comprehendido o respectivo
preceito nas palavras aprestado temporariamente. que se liam no ar-
tigo 1429.-, correspondente ao artigo 1370.°, e n'este conservadas.
Mas a commissìo revisora resolveu, nota ao artigo 1399.^ do pro-
jecto de 1863, correspondente ao artigo 1372.° do codigo, que fosse
redigido o artigo de modo que expressamente se dissesse que tambem
era nullo o contracto de prestação de serviços por toda a vida, e que
a todo o tempo podia ser rescindido tanto pelo amo como pelo ereado.

Art. 13 7 2.° 0 contracto de prestação de serviço será


regulado a aprazimento das partes, salvas as seguintes
disposições.
Art. 1373.° Na falta de convenção expressa sobre o
tempo do serviço, entender-se-lta que o contracto é feito
por anuo, no serviço rustico, e por mez em qualquer outro
serviço, salvo se honver costume da terra em contrario.
Art. 1374.° Na falta de convenção expressa ácerca da
retribuição, que o serviçal deva receber, observar-se-ha o
costume da terra, segundo o sexo, a edade e o mister do
serviçal.
Art. 1375.° Não sendo o serviçal ajustado para certo e
determinado serviço, entender-se-ha, que é obrigado a todo
e qualquer serviço compativel com as suas forças e con-
dição.

(Vid. artigo 1390. a.0 2.-)


São regras para a decisão das questões, que o trabalho domestico
péde levantar, quer em relação ao tempo, quer em respeito á retri-
buiçào, quer em relação á natureza do serviço.
Neste, como nos demais contractos, prevalece sobre tudo o ajuste
dos pactuantes. Sé na falta de convenção regem as proviões do codigo,
e o costume das terras nos termos do mesmo codigo.
O tempo do serviço é regulado pelo costume da terra; e, na falta
de costume, dura o contraeto um ano no serviço rustico, e um mez
em qualquer outro serviço.
Tambem na re/ribuima se ha de observar o costume da terra,
tendo em attenção a edade, o sexo e o mister do serviçal, e, na falta
de costume, visto o silencio da lei, deve recorrer-se á liquidação por
arbitramento, artigo 16.'

J
ARTIGOS 1376. E 1377.. 43
Tambem pelo costume da terra é regulado o serviço dos menores,
maiores de 1t e de 12 anos, segando forem vares ou femeas, quando
servirem sem ajuste previo, artigo 1390." n.° 2.°
No arbitramento do preço influe o sexo, a edade e a qualidade do
serviço. Não se paga do mesmo modo ao homem e á mulher, ao maior
e ao menor, ao serviçal grosseiro, e ao serviçal fino.

Art. 1376.° 0 serviçal contractado por certo tempo não


pôde ausentar-se nem despedir-se, sem justa causa, antes
que preencha o tempo ajustado.

(Vid. artigos 1378.", 1379.', 1380.", 1382.", 1392.", 1394." e 1429.")


Sem justa caisa não póde despedir-se, nem ser despedido, o ser-
viçal, quer domestico, quer assalariado, antes de findo o tempo ajus-
tado, artigos 1378", 137.°, 1380." e 1394.
0 serviçal domestico, despedindo-se com justa causa, tem direito
ás soldadas ovencidas artigo 1378.", pagas ou não pagas;e despedin-
do-se sem justa causa fica com as soldadas vencidas que estiverem
pagas artigo 1879.•, as quaes não é obrigado a restituir, e perde
apenas o direito no vencido e não pago, e não respondo por perdas
e damnos para com o amo, como dispunha o projecto primitivo no
artigo 1437." para o caso de se despedir sem justo motivo por modo
e em occasião que originasse prejuizo irreparavel.
É favor devido á posição pouco invejavel d'esta classe de ser-
viçaes.
O serviçal assalariado por dia, ou pelos dias necessarios para certo
serviço, que se despede sem justa causa, perde o salario vencido; e
se for despedido sem justa causa ha de o servido pagar-lhe o salario
por inteiro, como se elle fizera o serviço, artigo 1394. § unico.
Não tracta o codigo com tanto favor o aprendiz, que abandona
o mestre sem justa causa, porque dá a este o direito de o demandar,
ou oseu abonador, ou representante, por perdas e damnos, artigo 1429."
A razão da differença é que o serviçal domestico ou assalariado,
que se despede extemporaneamente, não pôde causar coma despedida
tão graves prejuizos ao amo ou ao servido, que deva responder por
mais do que a perda das soldadas ou do salario, pois ereados e
operarios, em regra facilmente se substituem, quando o aprendiz
pôde abandonar o serviço em occasiào, em que o mestre, contando
com elle, se tenha encarregado de obras, que por falta do aprendiz
não possa concluir no tempo ajustado, e tenha por isso de indemnisar
largamente os prejudicados.
No silencio do codigo deverá o amo que despede o serviçal do-
mestico com justa causa pagar-lhe as soldadas vencidas, como o
servido que despede o serviçal assalariado com justa causa, antes
de findar o dia, lhe paga as horas de serviço prestado, artigo 1392."
Por analogia com o disposto no artigo 1382." em relaçôo ao ser-
viçal domestico ha de o amo que, antes de findar o dia, despedir
sem justa causa o serviçal assalariado, pagar -lhe o dia por inteiro,
artigo 1394." § unico.

Art. 1377.1 Diz-se justa causa a que provém:


1.° De necessidade de cumprir as obrigações legaes, in-
compativeis com a continuação do serviço;
44 ARTIGOS 1378.- a 1879.-

2.2 De perigo manifesto de algum damno, ou mal con-


sideravel;
3.O De não cumprimento da parte do amo das obriga-
ções a que este esteja adstricto para com o serviçal;
4.5 De molestia, que impossibilite o serviçal de cumprir
com o seu serviço;
5.° De mudança de residencia do amo para logar que
não convenha ao serviçal.

1.°, etc.

(Vid. artigo 1430." e.° 2.°)


chamamento a encargos publicos, e ao desempenho de obrigações
legaes como a do serviço militar, justifca a despedida do serviçal, e
o termo do contracto de aprendizagem, artigo 1430.° n.- 2.', visto ser
caso de força maior, pela qual não é responsavel, nem o serviçal,
nem o aprendiz, ,casus nemo praesate.
á
2.", etc.
i.:
Se está involvido n'algum crime e quer escapar á prisão, ou re-
ceia ser victima de epidemia mortifera que assole a povoação, etc.

3.-, etc.

Póde o serviçal despedir-se, não lhe pagando as soldadas ou fal-


ti tando a qualquer outra obrigação o amo, porque n'este contracto,
como em todos os contractos ouerosos, é condição natural a reciproci-
dade dos serviços.
r.
4.°, etc.

Pela regra Ad imposibilia nemo teneur.

5.', etc.

Porque ficam assim alteradas as condições do ajuste, que se pre-


sume subordina-lo tambem á residencia do amo. Não pôde o amo
ter a pretensão de ser acompanhado, para Traz os Montes ou para
o Algarve, do serviçal que se prestou a servil-o em Lisboa.

.è Art. 1378.° 0 serviçal, que se despedir com justa causa,


tem direito a ser pago de todas as soldadas vencidas.
Art. 1379.° 0 serviçal, que abandonar arbitrariamente
seu amo, antes que finde o tempo do ajuste, perderá o
direito ás soldadas relativas a esse tempo, vencidas e não
pagas,
ARTIGOS 1380.•, 1381.!, 1882.* E 1888.' 45

Art. 1380.0 Não poderá o amo despedir sem justa causa


o serviçal, contractado por tempo certo, antes que o dicto
tempo expire.

(Vid, nota ao artigo 1876.')

Art. 1381.0 Será justa causa de despedimento:


10 A inhabilidade do serviçal para o serviço ajustado;
2.0 Os seus vicios, molestias ou mão procedimento;
3.° A quebra ou falta de recursos do amo.

1. e 2., etc.

(Vid. artigo 1425.° n. 2.' e 8.')


Faltando ao serviçal as condiçes para servir, ou por desconhecer
o serviço, ou por não poder exercel-o em razão de impedimento phy-
oiro, oo por não inspirar confiança ao amo, ou por se tornar indigno
de viver na sua companhia em razão de vicios e mão comporta-
mento, não pôde ser obrigado o amo a soffrer-lhe, por todo o tempo
do ajuste, o mio serviço, ou a falta de serviço, porque cessa a reei-
procidade, condição impreterivel nos contractos onerosos.
Tambem pelo itáo procedimento do aprendiz e pelo mio tracta-
mento do mestre o contracto de aprendizagem está sujeito a rescisão,
artigo 1425.' n.~ 2.' e 3.-

3.-, etc.

Pôde o amo despedir o serviçal desde que não tem recursoa para
lhepagar, pela bem conhecida regra «Necessitas caret legc».

Art. 1382.1 0 amo que despedir o serviçal, som justa


causa, antes que finde o tempo do ajuste, será obrigado a
pagar-lhe a sua soldada por inteiro.

(Vid. nota ao artigo 1876.°)

Art. 1383.0 0 serviçal é obrigado:


1. A obedecer a seu amo em tudo o que não for illicito,
ou contrario ás condições do seu contracto;
2.O A desempenhar o serviço que lhe incumbe com a
diligencia compativel com as suas forças;
3.o A vigiar pelas cousas de seu amo, e a evitar, po-
dendo, qualquer damno a que se achem expostas;
r

41 ARTIGO 1384.°

4.° A responder pelas perdas e damnos que, por culpa


d'elle, o amo padecer.

1.0, etc.

(Vid. nota ao artigo 142.°)

2.° e 3.°, etc.

Os serviços aqui designados constituem o fundo da obrigação do


'-a serviçal, que deve não só desempenhar a missào especial para que
foi ajustado, mas vigiar pelas cousas do dono, e evitar-lhe qualquer
damno.

4.°, etc.

1 A não execução das obrigações resolve-se sempre em perdas e


dsmuuos, que no caso o amo póde descontar na soldada ao serviçal,
artigo 1388.'

Art. 4384.1 0 amo é obrigado:


1.° A corrigir o serviçal, sendo menor, como se fôra seu
tutor;
2.° A indemnisar o serviçal das perdas e damnos, que
padecer por causa ou culpa d'elle;
3.° A soccorrer ou mandar tractar o serviçal á custa da
sua soldada, se o não quizer fazer por caridade, sobrevindo-
lhe molestia, e não podendo o serviçal olhar por si, ou não
tendo familia no logar onde serve, ou qualquer outro recurso.

1.', etc.

(Vid. nota ao artigo 143.')

2., etc.

Éconsequencia do principio geral que responsabilisa cada um


pelo damno a que dó causa.

3.°, etc.

Édictada por um principio de equidade a disposiçio, ue obriga


o auo, que por sua couta o udo quizer fazer, a tractar custa da
soldada o serviçal que adoece sem poder olhar por si, e que uão tem
familia, nem o recurso de entrar em estabelecimento publico para
doentes por não o haver no logar.

a
1,11

ARTIGOS 1885.^ E 1886." 47

Ar. 1385.° 0 contracto de serviço domestico resolve-se


por inerte do amo ou do serviçal. No primeiro caso, terá
o serviçal direito de ser pago das soldadas vencidas e de
quinze dias mais; tio segundo, só poderão os herdeiros do
serviçal exigir as soldadas vencidas.

(Vid. artigo 1430.' o." 1.0)


Tambem pela morte do mestre ou do aprendiz termina o contracto
de aprendizagem artigo 1430.° o." 1.0 Slas -ó no serviço domestico
o serviçal tem direito . morte do amo, noo só s soldadas vencidas,
senão ainda a quinze dias mais, como compensação do desemprego
até obter outra collocaçào, por ser muito digna de favor a sua si-
tuação.

Art. 1386.. Não se entende, que o legado, deixado em


testamento pelo amo ao serviçal, é por conta das soldadas,
senão quando isso for expresso no testamento.

(Vi. artigo 1820.°)


N'este artigo, aqui completamente deslocado, porque o assento
proprio da materia é o capitulo dos legados, consigna o codigojario-
prudescia exactamente contraria á da velha Ord., que no liv. 4..,
tit. 31. § 11.o dispunha o seguinte:
«Item, se algum defuncto em seu testamento deixou a criado, ou
criada, que o servisse, algum legado, não declarando n'elle, que lh'o
deixava liberalmente, além da sua satisfação, mandamos que o dicto
legado se desconte da soldada e salario, que o tal criado havia de
haver, como se o testador assim o declarára, porque n'este caso
queremos, que se presuma que quiz antes lisrar-se da divida, a que
era obrigado, do que fazer doaço que não devia».
De contorsoidade com o preceito do presente artigo se resolve no
artigo 1820." un0a questo muito controvertida no velho direito, de-
terminando-se que o legado feito ao credor sem referencia á divida
não é compensação da divida 1, solução a mais acommodada á
naturoza das disposições de ultima vontade, que em caso de duvida
devem ser interpretadas no sentido de maior beneficio, ojaoorabilia
ampianda.»
Fica assim o credor, na falta de declaração, com direito ao legado
e com direito á divida.
O legado deixado a serviçal em testamento aberto depois da pro-
mulgação do codigo, com quanto feito antes, é sem prejuizo das sol-
dadas devidas, porque os testamentos, salvo no que respeita ás
formalidades externas, estão subordinados á lei vigente ao tempo
da morte do testador, artigos 1763." e 17G2.0
Tambem é admittida, artigo 1818.0, a formula do legado sem a

1 Accordào do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de julho de


1896, Gazea da Relação de Lisboa, 10.o anno, n.o 28, pag. 220.
48 ARTIGOS 1887.' u 1388.'

apparencia de liberalidade e a titulo de divida, em que todavia


transparece evidentemente a intenção do testador de deixar ao sup-
posto credor a cousa, confessada como divida.

Art. 1387.0 Na acção por soldadas devidas e não pagas,


na falta de outras provas, será a questão resolvida por
juramento do amo.
§ unico. Esta acção prescreve pelo tempo e fôrma de-
clarada nos artigos 538.0 e 539.'

Na falta de outras provas a acção de soldadas dos creados, tanto


dos que servem por mez como dos que servem por atno, fica depen-
dente do juram'nto do amo, por não ser costume exigir recibo no
pagamento destas dividas, e presumir-se a verdade da parte do
amo, cuja respeitabilidade em regra é maior.
A razão do preceito do artigo está declarada na Ord., liv. 4.',
til. 32., 1., que dizia assim: -Mas porque muitas vezes se viu por
experiencia, que muitos, que viveram com senhores ou amos, depois de
receberem suas soldadas ou salarios, passados alguns aneos, pedem
satisfação de seus serviços, que já receberam, esperando que os que
sabiam serem rites satisfeitos, ou morreram ou se ausentaram, ou
lhes não lembra a verdade do que se passou; o qual atrevimento
U5 tornam maior, quando os senhores já são defuntos, que não podem
dar rasão do que pagarnam nem perante quee; e porque no dito caso
o engano está mais facil, porque poucas vezes os senhores pedem
aos creados, que com elles vivem, conhecimentos e quitaçóes do que
lhes dão. Por evitarmos as ditas fraudes ; ordenamos que todo o Ia-
caio ou creado, que estiver com amo aos mezes, com lhe dar de co-
mer e beber, e no cabo do mez certa cousa, que os taes creados não
possam pedir soldada de algum mez, que hajam servido, passados
tres mezes, depois que saírem de casa de seus amos. E se a ração de
comer lhes derem a dinheiro seco, não poderão pedir senão até dez
dias depois de saidos dos dictos seus amos; porque se presume que
estilo pagos e satisfeitos, pois não pediram o salario no dito tempo..
E pena que tambem no serviço salariado, onde egualmente não é
pratica exigir recibos, se não decida a questão, na falta de. outras
provas, pelo juramento do amo, como é pelo codigo civil francez, e
como era pelo projecto do codigo civil hespamhol, fontes do nosso
n esta materia.
Reiuerido o juramento na hypotlhese do artigo, ter-se-ha por con-
fessada a falta de pagamento se o amo recusar jurar, ou se deixar
de comparecer e nos cisco dias seguintes não comprovar justo im-
pedimento, codigo de processo civil artigo 225.'
(Vid. nota ao artigo 538.^)

Art. 1388.0 0 amo pide descontar na soldada do serviçal


a ímportancia de perdas e danmos, que este lhe haja
causado, salvo o direito do serviçal a oppõr- se ao desconto
no caso de injustiça.
j unico. Se o amo não fizer o desconto no momento do

4
'R"

ARTIGOS 1389.0 s 1390.- 49

pagamento, não (orá acção contra o serviçal, senão durante


um mez depois da sua despedida ou do termo do contracto.

Não teria o amo meio de se pagar a não ser por desconto na


soldada. De nada lhe serviria intentar acção de perdas e damuos
contra o serviçal, já porque no valeria a pena pôr uma demanda
por quantias em regra pequenas, já porque não sria facil encon-
trar bens onde padesse executar-se qualquer sentença contra o ser-
viçal.

Art. 1389. 0 contracto de serviço dos menores só pôde


ser celebrado com as pessoas, a cujo cargo elles estiverem.
0
(Vid. nota ao artigo 224.c n. 7.1)

Art. 1390.1 Mas se, por acaso, o menor não tiver quem
o represente, observar-se-la o seguinte:
1.° Se o menor não exceder dez asnos de edade, sendo
do sexo masculino, e doze, sendo do feminino, só será
obrigado o amo aos alimentos.
2.0 Se exceder esta edade, vencerá tudo o que for de
costume na terra, relativamente aos serviçaes da mesma
condição e edade.

1., etc.

Presume-se não merecer mais do que a comida o menor até aos 10


e 12 armos, segundo é varão ou femea.
A alimentação e vestido do tutelado, ainda que não tivesse sido
assoldadado, nem pelo conselho de farmilia lhe tivesse sido designado
serviço, deve ser compensada com os serviços por elle prestados.,

2., etc.

(Vid. nota ao artigo 1374.c)

1 Accordão da Relaçao de Lisboa de 12 de janeiro de 1895, Ga-


teta da el.'aço de Lisboa, ü.° amno, n." 62, pag. 490.

Tomo III 4
s

50 ARTIGOS 1391.0, 1392.0, 1393.0 E 1394."

SECÇAO II

Do serviço salariado

Art. 1391.Õ Serviço salariado é o que presta qualquer


individuo a outro, dia por dia, ot hora por hora, mediante
certa retribuição relativa a cada dia ou a cada bora, que
se chama salario.

Para resolver as questões entre os operarios e os patrões aucto-


risou a lei de 14 de agosto de 1889 a cresção de tribunaes de ar-
bitros avindores nas localidades onde houvesse centros industriaes
importantes, e regulou o decreto de 19 de março de 1891 o respe-
ctivo processo.

Art. 139±.1 0 serviçal assalariado é obrigado a prestar


o trabalho, a que se propoz, conforme as ordens e direcção
da pessoa servida. Se assim o não fizer, poderá ser despe-
dido antes que finde o dia, pagando-se-lhe as horas de
serviço prestado.

(Vid. nota ao artigo 1376.°)

Art. 1393° 0 servido é obrigado a satisfazer a retri-


buição promettida, ou ro fim da semana, ou no fim de cada
dia, conforme a necessidade do assalariado.
§ unico. O preço da retribuição presume-se sempre esti-
pulado em dinheiro, salvo havendo convenção expressa em
contrario.

As penosas circunstancias do serviçal não lhe permittem esperar


longo tempo pela retribuiço, da qual carece quasi dia a dia para
oecorrer a necessidades urgentes.
Pôde ser estipulada em generos ou n'outro qualquer valor a retri-
buição do serviço. Mas na lalta de ajuste la de ser paga em dinheiro,
que é o modo ordinario de pagar.

Art. 1394.° 0 serviçal, assalariado por dia, ou pelos dias


necessarios para perfazer certo serviço, não pode abando-

1 li
Fý' .

ARTIGOS 1395.", 1396.^, 1397.° E 1358. 51

nar o trabalho, nem o servido despedil-o, antes que finde


o dicto dia ou dias, não havendo justa causa.
§ unico. Se o serviçal, ou o servido, fizerem o contrario,
aquelle perderá o salario vencido, e este será obrigado a
pagai-o por inteiro, como se fOra feito.

(Vid. nota ao artigo 1376.')

Art. 1395.1 Se o trabalho ajustado por certos dias, ou


em quanto durar a obra, for interrompido por caso fortuito
ou força maior, nem por isso ficará o servido desobrigado
de pagar o trabalho feito.

Se o mu tempo, por exemplo, obstar à continuaçào do trabalho,


ou i conetosdo da obra, não perdir por isso o serviçal o direito á
paga do serviço feito, visto roo ter sido interrompido o trabalho
por culpa d'eite «casos w~o praestat».

SECÇAO II

Das empreitadas

Art. 1396.1 Dá-se o contracto de empreitada, quando


algum ou alguns individtos se encarregam de fazer certa
obra para outrem, com materiaes subministrados, quer
pelo dono da obra, quer pelo empreiteiro, mediante certa
relribuiçdo proporcionada á quantidade do trabalho exe-
cutado.
Art. 1397.° Se o empreiteiro, on empreiteiros se obrigarem
a subministrar o laror e os materiaes, todo o risco da obra
correrá por conta dos empreiteiros, até ao acto da entrega,
salvo se houver mura da parte do dono da obra em re-
cebel-a, ou convenção expressa em contrario.
Art. 1398.' Se a empreitada for unicamente de lavor,
todo o risco será por conta do dono, excepto se houver
mora, culpa ou impericia dos empreiteiros, ou se, conhe-
cendo a má qualidade dos materiaes, não tiverem prevenido

e- -
r
52 ARTIGO 1398.-

o dono da obra do risco, a que, empregando-os, ficaria


exposta.

(Vid. artigo 1408.)


Dar de empreitada é encarregar outrem de fazer uma obra for-
necendo o trabalho e os materiaes, ou unicamente o trabalho, com
a differença apenas de ser todo o risco por conta do encarregado
quando fornece trabalho e mtaeriaes porque se assemelha neste
caso o contracto S venda, com a obrigação de entregar pelo preço
convindo o todo que resultar do material e do trabalho reunidos, e
de correr o risco por conta do proprietario, cujos são os materiaes
pela regra ores suo domino perit., quando entra só com a industria
o empreiteiro.
Deixa porém de correr o risco por conta do empreiteiro na pri-
meira hypothese, se o dono da obra se demorou em recebel-a, e por
conta do dono da obra na segunda, se da parte do empreiteiro houve
demora na entrega, ou culpa e impericia no trabalho, de que resul-
taram erros, que prejudicaram a conservação da obra.
Mesmo na hypothese de ser unicamente de lavor a empreitada
soffre o risco o empreiteiro, que, conhecendo a má qualidade dos ma-
teriaes, não preveniu o dono, e responde em todo o caso, ainda que
não seja rejeitada a obra, inutilisando ou deteriorando os materiaes,
ou não fazendo a obra conforme o risco e medidas, artigo 1408?
A culpa do dono na destruição da obra por ter fornecido mate-
riaes de míi qualidade, que o empreiteiro nio conheceu, ou por outro
qualquer motivo, dá ao empreiteiro o direito de exigir a remunera-
ção do seu trabalho.
Destruida a obra antes de entregue sem culpa quer do dono, quer
do empreiteiro, é razoavel supportar cada iu dos contrahentes o
prejuizo respectivo, o dono da obra a perda doa materiaes e o em-
preiteiro a perda do trabalho, como dispàe no artigo 1790.° o codigo
civil francez , dispunha no artigo 1531.0 o projecto de codigo civil
bespanhol, f<rtes do nosso.
Como em caso de duvida se presume ordinaria, e não excepcional,
a jurisdicção, as empreitadas em geral, como as empreitadas e sub-
empreitadas de estradas, e os emprestimos para execução d'essas
empreitadas são actos civis, e da competencia exclusiva dos tribu-
naes ordinarios. 1
Apeuas se consideram commerciacs, codigo de commercio artigo
230, as emprezas, singulares ou colleetivas, que se propozerem
edificar ou construir casas para outrem cum materiaes subministrados
pelo emprezario.
As empreitadas de caminhos de ferro, que pelo velho codigo com-
mercial artigos 206.0, 513.0, 10290 e outros eram da competencia dos
tribunaes de commercio, são pelo presente codigo civil, como pelo

t Accordãos, da Relação de Lisboa de 12 de dezembro de 1894 e


de 8 de julho de 1896, e do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de
janeiro de 1884, de 12 de julho de 1892 e de 28 de fevereiro
de 1896,
Gazeta da Relaçao de Lisboa, 8.' anue, n. 50, pag. 393, 9.°
anuo,
n.O 72, pag. n73, e 10 ° anno, no 9, pag. 6i, Direito,
27.o anuno, n.o 17,
pag. 260, e Boletim dos Tribunes, 7. anuno, n.o 302, pag. 632.

1 À
ARTIGO 1399.0 53
novo codigo de commerio, da competencia dos tribunaes civis 1; e
materia civil é a abertura de credito para despezas de empreitada
com a coastroeção de caminhos de ferro.2
'Tambem é civil, e não cooecial, a acção para pedir aos em-
preiteiros o preço de materiaes para obras que no sejam constru-
cção de navios l; e competentes são os tribonaes ordinarios para
obrigar as corporações administrativas a pagar o preço das obras
que tiverem dado de empreitada. 1
Não depende de escriptara publica o contracto de empreitada,
nem está sujeito a formalidades especiaes para prova.

Art. 1399.1 Nos contractos de empreitada de edificios ou


de outras construcções consideraveis, o empreiteiro de mate-
riaes e de execução será responsavel, pelo espaço de cinco
annos, pela segurança e solidez do edificio ou construcção,
tanto em razão da qualidade dos materiaes, como da firmeza
do solo, excepto se houver prevenido com tempo o dono da
obra de não achar o dicio solo suílicientemente firme.

O empreiteiro de lavor e de materiaes, que pela sua profissão é


obrigado, não só a saber construir edificio solido e bom, mas tam-
bem a conbecer se o solo péde ou não sustental-o, responde na
construeçéa de edificios ou de outras obras consideraveis pela soli-
dez, conhecesse ou não conhecesse a iá qualidade dos materises,
salva estipulação em contrario, como é sempre responsavel pelos
prejuizos da pouca firmeza do terreno, pela presumpção de que devia
conhecer a natureza do solo em que fazia a obra.
A responsabilidade comminada ao empreiteiro subsiste aisda mes-
mo que a obra tenha sido approvada por declaração de peritoa,
Nem o codigo teria marcado praso de duração da responsabilidade
do empreiteiro, se lhe permittisse entregar a obra sem responsali-
lidade futura mediante vistoria por perias.
Alterou a commissão revisora o projecto primitivo na porte em
que relevava de responsabilidade o empreiteiro approvada a obra
por declaração de peritos, por ser impossivel conhecer a mã quali-
dade de certos materiaes, e todos os vicios occultos da construcção,
logo que ella se das mãos dos operarios.
No caso de dolo responde sempre o empreiteiro pelos vicios que
posteriormente apparecerem, mesmo nas obras de pequena conside-
raçao.

1 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de julho de


1893, Revista dos Tr/bouaes, 13.- anno, n. 305, pag. 260.
2 Accordão da Relação de Lisboa de 27 de janeiro de 1897, Ga-
zeta da Relação de Lisboa, 10.° anno, ns 64, pag. 507.
s Conferencia da Associação dos Advogados de Lisboa de 26 de
novembro de 1873, Gazeta da mesma Associação, 1. anno, pagg. 86,
113 e 129.
1 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de novembro
de 1890, Boletim dos Tribuaaes, 6.° anno, o." 23, pag. 180.

L -
54 ARTIGOS 1400.0 E 1101."

O periodo de cinco anmos conta-se desde a entrega; e para a pro-


cedencia da acção é essencial, não só que os prejuzos appareçao
dentro de cinco annos, mas tambim, no que vae de acordo Itogron,
nota ao artigo 1792:' do codiga civil francez, que seja proposta a
acção dentro dos cinco annos de duração da responsabilidade.
Responde eguahneute o empreiteiro pelos factos das pessoas que
empregar na obra.

Art. 1400.° Não se tendo assignado praso para a con-


clusão da obra, é o empreiteiro obrigado a concluil-a no
tempo que razoavelmente for necessario para esse fim.

Sem offensa aos principios de eterna justiça não podia ficar ao


arbitrio do empreiteiro adiar indefinidamente a obra.
Na falta de convenção marca-se por meio de arbitramento praso
razoavel para a conclusão, sob pena de perdas e damnos ou de res-
cisão do contraeto.
A commissào revisora logo nos trabalhos da primeira revisão eli-
minou, de certo por escusado, o seguinte artigo do projecto primitivo
immediato ao artigo correspondente ao presente artigo: ýO emprei-
teiro que não der a obra feita no devido tempo, será responsavel por
perdas e damnos,.

Art. 1401.1 0 empreiteiro, que se encarregar de executar


planta, desenho, ou descripção de qualquer obra, por preço
determinado, não terá direito de exigir mais cousa alguma,
ainda que o preço dos níaleriaes ou dos jornaes augmente,
e ainda que se tenha feito alguma alteração na obra, em
relação á planta, ao desenho ou á descripção, se essa alte-
ração e o custo d'ella não foram convencionados por escriplo
com o dono da obra.

Este artigo, que no projecto primitivo continha sd a primeira parte


até ás palavras ou dosjornaesaugmente., é destinado a prevenir gran-
des abusos por parte dos empreiteiros, qu, a pretexto de alteraçbes
no plano da obra, pediam angmento de preço, invocando a maxima
que ninguem deve enriquecer ú custa alheia, e allegando tajbom
que os donos da obra expressa ou tacitamente haviam aptrovado
aquellas mudanças.
Para evitar aos donos da obra maiores desembolsos do que os cal-
culados no ajuste da construeção, e para acabar com todos os pre-
textos de augosento de preço contra vontade do dono, nega o e"digo
absolutamente o aogmento de prego a pretexto de alteraçúes no
plano ajustado, se as mudanças não foram auetorisadas por escripto
pelo dono da obra, mesmo em casas extraordinarios em que o ao-
gmento seria razoavel, como se ao abrir os alicerces se encontra-
ram obras ou editicios subterraneos que foi indispensavel destruir, e
mudar depois os materiace.
ARTIGO 1402.0 55

Rogron ainda era de opinião qjs o empreiteiro podia n'este caso


recorrer a juizo para lhe ser augmentado o preço, se o dono da obra
não quizesse amigavelmente asgísentao. Mas o artigo 1793- do
codigo civil francez, em que o distincto conmentador se funda, não
se presta, como se oão presta o nosso codigo, a semelhante inter-
pretação, inteiramente contraria ao pensamento do legislador.
Nem a falta de materises nem a elevação dos jornaes póde servir
de fundamento ao empreiteiro para augmento de preço, como não
poderia servir de fundamento ao dono da obra a circumstancia con-
traria para pedir a diminuição de custo, porque n'este contracto,
como em todos, ha uoa parte aleatoria, cujas consequencias as partes
hão de supportar, e os empreiteiros podem acautelar-se de quaes-
quer prejuizos por clausulas expressas na convenção.
Não tem por isso o empreiteiro direito a abandonar a obra, sem a
ultimar, por falta de pagamento dos augmentos feitos fóra das con-
diçles prescriptas no artigo 1401.1; e, se o fizer, póde o dono da
obra mandar concluil-a á custa d'elle nos termos do artigo 712.-1
Não carecem porém de ser auctorisadas por escripto as novas
obras quando não constituirem parte da empreitada, nem alterarem
as construcções objecto da empreitada. E

Art. t402. 0 dono da obra póde desistir da empreitada


começada, comtanto que indemnise o empreiteiro de todos
os seus gastos e trabalho, e do proveito que elle emprei-
teiro poderia tirar da obra.

Este preceito, aliás excepçlo ao principio geral de que os contractos


só se resolvem pelo mutuo consentimento das partes, foi dictado no
interesse de uma das partes, salvando o prejuizo da outra.
Seria iniquo obrigar o proprietario, sobre tudo quando a sua for-
tana se acha repentinamente compromettida por sucessos imprevis-
tos, a arruinar-se completamente com trabalhos não remuneradores,
fazendo-o seguir n'uma obra, ao principio reputada necessaria ou
util, e que deixou de o ser por circmostancias supervenientes; e o
empreiteiro nada perde, porque recebe tudo o que poderia lucrar
com a conclusão do trabalho.
Para execução d'este preceito, que era já do artigo 521.- do velho
codigo commercial, basta notificar o empreiteiro em conformidade
do artigo t45.° do codigo de processo: não lia necessidade da acção
de rescisão, porque o direito de desistir da empreitada não tem outra
limitaçâo suão a obrisa;são de isinssisar o empreiteiro de perdas

Accordão da Relação do Porto de 10 de maio de 1872, Direito,


'
4. ano,
r.^ 26, pag. 414.
:Aceordào do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de dezembro
de 1896, Gazeta da Relaç o de Lisboa, 10. rano, n.o 77, pag. 614.

L
56 ARTIGOS 1403.", 1404.0 E 1405.0

e damnos, direito que não precisa de ser declarado por sentença,


visto estar fixado na lei. t

Art. 4403.° Se o empreiteiro fallecer, poderá o contracto


ser rescindido; mas deverá o dono da obra inudemnisar os
herdeiros do dicto empreiteiro do trabalho e das despezas
feitas.
§ unico. Vigorará a mesma disposição, quando o emprei-
teiro não podér ultimar a obra, por impedimento indepen-
dente de sua vontade.
Art. 140.° 0 contracto de empreitada não se rescinde
por fallecimento do dono da obra. Os herdeiros deste são
obrigados a cumpril-o.

Não fica dissolvido o coutracto de empreitada, nem pela morte


do dono da obra, iem pela morte do empreiteiro.
Por falleimento do dono da obra nem rescindido pôde ser. por-
que o empreiteiro não se obrigou de certo e attençào As qualidades
pessoaes do dono, e ser-lhe-ha indiferente trabalhar para este ou
para seus herdeiros; e por morte do empreiteiro, para ser rescindido,
é preciso requerimento do interessado, porque podia ter sido feito
o contracto em attençào ao zelo, intelligencia e outras qualidades
pessoaes do empreiteiro que não existam nos herdeiros.
No caso de rescisão por fallecimento do empreiteiro, que podere,
ser requerida pelos herdeiros d'este como pelo dono da obra, ha de
o dono, que não deve locupletar-se á custa alheia, pagar aos her-
deiros do empreiteiro todo o trabalho e despezas feitas, fossem ou
não uteis, porque o codigo não distingue, como distingue o codigo
civil franecez, que soi obriga o dono a pagar as obras e despezas
quando d'abi lhe proviesse ou podesse provir utilidade.
E, porém, mais razoavel a nossa legislação, porque os herdeiros
do empreiteiro não devem ser prejudicados com a inutilidade da
obra desde que é feita ei conformidade com o plano ajustado.
E egualemente obrigado o dono da obra a pagar as despezas feitas,
u quando o empreiteiro a abandonar por motivo independente da sua
vontade artigo 1403.§ unico, como por se impossibilitar para con-
tinuar o serviço, pela regra -ad imposxiblia neo (ceer.,e porque
o caso de impossibilidade pôde equiparar-se, nos seus effeitos, ao caso
de morte.

Art. I405.° Os que trabalharem por conta do empreiteiro,


ou lhe subministrarem materiaes para a obra, não terão

t Accordão da Relação do Porto de 19 de agosto de 1890, Rerista


dos Tribunaes, 9.° aneo, n.o 213, pag. 327.

II
ARTIGOS 140G., 1407.- E 1408. 57

acção contra o dono delia, senão até á quantia de que este


for devedor ao empreiteiro. Se o dono da obra antecipar,
a favor do empreiteiro, as epoctas do pagamento estipula-
das no contracto, tanto os vendedores de materiaes, como
os operarios, terão acção contra o dono da obra pelo que
se lhes dever, até ; quanlia cujo pagamento este ante-
cipou.
Foi accresesnhdo pela cotomissão revisora, logo nos trabalhos da
primeira revisào, cno garantia dos direitos dos fornecedores de
matcriaes ou de mão de obra, o segundo periodo do artigo, que não
viiha no projecto primitivo.
O contracto de sociedade entre o empreiteiro e terceiro, sem inter-
venção do dono da obra, não póde ser invocado contra este, que fica
sempre directamente obrigado para com o mesmo empreiteiro, nem
o que ,,ontractou com o empreiteiro pôde oppôr-se a que o dono da
obra pague áíquelle o preço da empreitada.
No entretanto, posto que nem os fornecedores de materiaes, nem
os operarius tivscsem contractado cousa alguma com o dono da obra,
e sim com o empreiteiro, e devessem por isso dedozir as suas recla-
maçies contra este e não contra aquele, permittiu.se por favor e
eqidade aos que cooperaram na obra, ou com materiaes ou com
industria, demandar o dono da obra até o montante do que devesse
ao empreiteiro ao tempo da instauração da acção, considerando se
tão feitos, relativmnte aos operarios e aos fornecedores de toate-
riaes, os pagomentos antecipados, porque esta antecipação quebra
uma das garantias do pagamento de que elles gosavam, e pôde ter
sido feita dolosamente para os prejudicar, e porque n'este caso
pede-se verdadeiramente o que pertence ao empreiteiro e não o que
é do dono da obra.

A rt. finS.0 O preço da empreitada será pago na entrega


da obra, salvo o costume da terra ou qualquer conNençao
em contrario.

Como o preço é devido pela obra justo é que entregue a obra se


pague o preço.

Art. 1407.0 0 empreiteiro de qualquer obra mobiliaria tem


o direito de a reter, em quanto não for pago do preço.
(Vid, nota ao artigo 4983.)

Art. 1408.1 0 empreiteiro de lavor que, por sua impericia,


inutilisar ou deteriorar os materiaes subministrados , ou não
fizer a obra conformo o isco e medidas, que lhe forem da-

t
58 ARTIGO 1409y
dos, responderá por todos os prçjnizos que cansar, ainda
que a obra lhe não seja rejeitada.

(Vid. nota ao artigo 1398.-) 5

SECÇAO IV

Dos serviços prestados no exercicio das artes


e profissões liberaes

Art. 1409.1 Os vencimentos dos que exercem artes e pro-


fissões liberaes, serão ajustados entre os que prestarem
essa especie de serviços, e os que os receberem.
§ unico. Em falta de ajuste, os tribunaes arbitrarão os
vencimentos, conforme o costume da terra. A verba dos
vencimentos regulada por este costume poderá, comíndo,
ser modificada, tendo attenção á importancia especial do
serviço, á reputação de quem o houver prestado, e ás
posses de quem o houver recebido.

Assim, na falta de ajuste entre o orador e o que lhe encommendou


o sermão, deverá arbitrar-se a retribuiçio segundo o costume da
terra.
Mas esse costume tia de ser subordinado à natureza especial do
serviço, à fama do orador, e aos recursas de quem o encommendou,
pela mesma razão porque a consulta de medico ou de advogado de
fama tem muito maior valor debaixo de todos os pontos de vista do
que egual trabalho de bacharel sem nome ou com nome obscuro.
Mas os honorarios dos advogados pelos serviços judiciaes, ia falta
de ajuste, hão de ser regulados pelo est/o do auditorio sem atteuçào
aos creditos e reputação do advogado, artigo 1359.°
0 presente artigo não vinha no proJerto primitivo. Foi introdu-
zido pela commissào revisora sob proposta do sr. Marrera.
Segundo a nota ao artigo 1439. do projecto de 1863, correspon-
dente ao artigo 1408. do codigo, ~0 sr. Marreea propoz que se se-
erescetasse uma nova secção intitulada «Dos serriços prestados no
exercicio das antes liberaes, contendo o segíinte:
« Artigo . . . Os honorarios dos que exercem profissões liberaes aeda
ajustados eore os que prestam essa especie de serriços, e os que os
recebem.

a
p.,

ARTIGOS 1410.0, 1411.0 E 1412.0 5ã


unico. Em falta de ajuste os trilauaes arbitrarãoos honorarios
§
pela tara da terra. Esta tara cmtudo poderá ser modificada, tendo
attenção a importaacia especial do serviço prestado, à reputação do
que a prestou, e ú fortuna do que o recebeo.
«A commisso, poreém, tendo adiado o exame d'esta proposta, nào
chegou a tomar dsliberaço alguma acerca d'ela.
Mias foi a final considerada e convertida em preceito legal nos
termos em que se eceontra n'este artigo.

SECÇAO V

Da recovagem, barcagem e alquilaria

Art. 1410.° Diz-se recovagem, barcagem e alquilaria o


contracto, por que qualquer ou quaesquer pessoas se obri-
gam a transportar, por agua ou por terra, quaesquer pes-
soas, ou animaes, alfaias ou mercadorias de outrem.
Art. 1411.° Este contracto será regulado pelas leis com-
merciaes, e pelos regulamentos administrativos, se os con-
ductores tiverem constituido alguma empreza ou companhia
regular e permanente. Em qualquer outro caso, observar-
se-hjio as regras geraes dos contractos civis, com as modi-
ticações expressas na presente secçãlo.
Art. 1412.° Os recoveiros e barqueiros serlio havidos,
para todos os effeitos, por depositarios dos objectos con-
duzidos, desde o momento em que estes lhes forem entre-
gues.

O codigo defne a recoagem, a barcagem e a alquilaria, pres-


creve as disposiçoes cocmmuns á recovagem e barceagem, e as
privativas da alquilaria, sujuita o contracto n junsdieçâo mercantil,
ou aos tribunaes civis, conform os recoveiros, barqueiros e alqui-
]adores tiverem ou no companhia ou empreza regular para o desem-
penlco do seu mister.
't'ambem o codigo commercal, artigo 230.° c.- 7, declara commer-
ecaes as emprezas, singulares ou collctivas, para transprtc regular
e permanente, por agua ou por terra, dv quaesquer pessoas, animaes,
alfaias ou mercadorias de outrem.
Os recoveiros e os barqueiros, quer sob a jcrisdicçào civil, quer
sob a jurisdicço commercial, estio sujeitos ds mais rigorosas res,
ponsabilidades no interesse do transito e do commereio, como cog

_.
Mu

60 ARTIGO 14l8.n

sequencia necessaria da natureza dos serviços por elles prestados,


sendo para todos os effeitos considerados depositario, com os direitos
e obrigaçles descriptas nos artigos 1435.^ e seguintes, salvo o dis-
posto nos artigos 403.- a 406.- do codigo commercial.
Começa no momento da entrega a responsabilidade dos recoveiros
e dos barqueiros, como os principios juridicos indicam, e a com-
missão revisora resolveu em a nota ao artigo 1442.- do projecto
de 1x63.
No projecto primitivo, em vez do artigo 1412., vinha o seguinte:
«Os recoveiros e barqueiros sào responsaveis pela damnificação ou
estravio que soffrerem os objectos conduzidos, excepto se provarem
que o prejuizo ou estravio teve logar por caso fortuito, força maior
ou vicio dos mesmos objectos».
Mas a commissdo revisora deliberou consignar em artigos as se-
guintes idêas, que estão effectivamente reconhecidas no codigo:
1.- principiar no momento da entrega a responsabilidade dos re-
coveiros e dos barqueiros; 2.' serem para todos os effeitos deposi-
tarias dos objectos transportados.
As emendas introduzidas pela cammissão revisora accrescentaranm
apenas a circunstancia, aliás importante, de ficarem sujeitos os re-
coveiros e os barqueiros ás condições que regem os depositarios.
Na palavra -recoreiros devem reputar-se comprehendidon os 1con-
ductores de carruagens, para o effeito de responderem como depo-
sitarios pelos objectos do passageiro, visto referir-se o termo «alqai-
lador» unicamente ao alugador de animaee para andar a cavallo, e
não ao transportador de pessoas em trens onde podem ir bagagens,
pelas quaes o conductor, como recoveiro, deve responder nos mesmos
termos que o depositario.
Fixa o codigo n'esta materia apenas os preceitos fundamentnes,
reguladores da responsabilidade dos transportadores pela guarda e
conservaçào dos objectos que lhes são confiados, e da indemnisaçào
pelos prejuizos e deteriorações, que não provm de caso fortuito ou
força maior.
Os damnos provenientes de máu estado ou de vicios das cousas
reealem sobre o dono, e nio sobre o transportador.
Não contem o novo codigo commercial disposição alguma sobre
recoagem, como o codigo commercial de 1833w, que tractava desta
materia n'uma seeçào sob a epigraphe-dos commnissarios de trans-
portes, e dos recoveiros -.
i Fica portanto regendo o codigo civil a recovagem e barcagem
mercantil, doutrina, aliás de vastissima applicsção em commercio,
e de pequena importancia em matoria civel.

Art. 1413.1 0 recoveiro ou barqueiro terá direito a ha-


ver, no momento da entrega dos objectos, ou em que con-
cluir o serviço, o preço convencionado ou do costume, e
quaesquer despezas a que a conducção dos objectos tiver
dado causa, se por convenção ou costume não são incluidas
no frete.

(Vid. artigo 1415.)


Paga-se o recoveiro ou barqueiro do preço ajustado ou do costume,
R de todas as despezas de transporte, unas vezes no momento

11 jýÁ
ARTIGOS 1414., 1415.^, 1416.', 1417.- a 1418.* 61

da entrega dos objectos, e outras vezes depois de concluido o


trabalho.
Ao recoveiro e ao barqueiro concede a lei a faculdade de haver o
pagamento da sua retribuiçào logo na orcasiào da entrega dos obje-
ctos antes de concluido o serviço, favor que não concede ao alquilador,
salvo se o estipular, porque os recoveiros e os barqueiros, se gosam
de mais vantagens do que os alquiladores, tambem estão sujeitos a
maiores responsabilidades.
Pela sua parte são obrigados a prestar o serviço no tempo couven-
cionado, sob pena de responsabilidade por perdas e danos, salvo
caso fortuito, porque cotão entra a regra ces nono proadí.

Art. 1414.' 0 recoveiro e o barqueiro gosaul do direito


de retenção dos objectos conduzidos.

(Vid. nota ao artigo 498.0)

Art. I'o15.° 0 recoveiro ou barqueiro é obrigado a fazer


o serviço, no tempo convencionado, e responderá, se assim
o não lixer, por peras e darmos, excepto se for impedido
por caso fortuito ou força maior.

(Vid. nota ao artigo 1413.')

Art. 1416.° 0 alquilador deNe declarar as manhas, ou


os defeitos das cavalgaduras, e responderá pelos dannos
e prejuizos que resultarem da falta d'esta declaração.
Art. 141 7.° Se as cavalgaduras morrerem ou se arrui-
narem durante o serviço, será a perda por conta do alqui-
lador, se não provar que houve culpa da parte do alugador.
Art. 1418.° Se o alquilador alugar para certos serviços
cavalgaduras, que não os possam prestar por defeito pre-
existente, conhecido do mesmo alquilador, mas não do alu-
gador, responderá pelas perdas e damnos, a que tiver dado
causa pela sua má fé.

Referem-se estes tres artigos unicamente ao alquilador, como os


quatro anteriores se referiam exclusivamente ao recoveiro e ao bar-
queiro.
Responde por quaesquer prejuizos o alquilador que não declarar
ao alugador os defeitos dos animaes, porque responde cada um pelo
seu dolo, salvo se eram tambem conhecidas do alugador as manhas
ou defeitos, porque então sibi impítet quaesquer perdas e damnos

k
92 ARTIGOS 1419.0 E 1420.0

que resultem de defeitos, de que elle sabia, e de que tomou portanto


sobre si a responsabilidade.
A morte ou a deterioração das cavalgaduras é por conta do alqui-
lador em virtude da regra geral res suo doaino peril, salvo culpa
da part do alugador, pela qual este responde.

SFECCASi VI

Do contracto de albergaria ou pousada

Art. íIíú.° c:nrac'


í-uí dr albergaria, quando ai-
gnem presta a outrem albergue e alimeto, ou só albergue,
mediante a retribuição ajustada ou do costume.
§ uico. Este contracto deduz-se de factos, sem neces-
sidade de eslipulação expressa, quando o que presta alber-
gue é albergueiro por oflicio.

E na legislação admiuistrativa que estão verdadeiramente deter-


minadas as obrigações do albergueiro. A lei civil encara este objecto
unicamente na essencia da convenção, para determinar as condições
da formaçio do contracto, e isdireitos e as obrigações civis que
d'elle derivam. Nas albergarias de profissão, pelo simples facto da
entrada na hospedaria, se obriga o hospede, independentemente de
accordo expresso com o dono, a oatifazer pelo albergue os preços
do costume.
Sé é precisa a prova 11 n i :justada quando o alhergueiro
;ri[
não é de officio. 1

Art. 14 0 .° ti albergueiro é resaonsaýel, como se fôra


depositario, pela bagagem, ou por quaesquer alfaias, que
o hospede laja recolhido ta pousada.
unico. Se. porém, frem cousas e e pequeno valor e
faceis de sumir, deverá o hospede rectmmeudal-as á guarda

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de abril de


1869,
Gazeta da Relaçdo de Lisboa, 9. anno, u.° S2, pag. 652.

i
AlTiGOr 1131.- L 142 1,1
do albergueiro, aliás não responderá este pelo extravio ou
deterioração d'ellas, não se provando culpa da sua parte.

Impõe o legislador ao albergueiro a obrigação de vigiar e guar-


dar as cousas do hospede, como se foram suas proprias, e responsa-
bilisa-o como depositario por qualquer extravio ou deterioração da
bagagem e das alfaias, independentemente de recommendação espe-
cial.
Pelo codigo é precisa a rceommnsdaçõo expressa do hospede para
a responsabilidade do albergueiro quando a bagagem ou alfaias
representem pequeno valor, e sejam faceis de sumir; e em muitos
casos exigem os albergueiros a entrega a sua guarda especial dos
objectos de grande valor.
Salvo o caso de dolo ou culpa não é responsavel o albergueiro
pelo extravio de dinheiro, ou de papeis de credito que podem conter
grande valor em pequeno volume, se o hospede lhe não fez declara-
ção, para elle tomar todas as cautelas neessarias i segurança e
guarda daquelles valores, como responde pelas bagagens e alfaias,
que perfeitamente se vies, e podem aeutelar-se, independetenemte
de quaesquer prevenções ou reconííendações.
Se o albergueiro não responde sem reconímendação especial pelas
cousas faceis de sumir, quando são de pequeno valor, por maioria de
razýo afo responderá quando forem de grande valor.
F;ra d'este caso não se livra de responsabilidade o albergueiro
com a simples falta de dolo ou de culpa, sem a prova de força maior,
ou de culpa do hospede, como não é julgado procedente o direito do
hospede, sem a prova da subtração dos objectos dentro da hospedaria.
A responsabilidade do albergueiro, a primeira vista rigorosa, é
de ordem publica, necessaria para segurança dos viajantes e alber-
gados, e base solida da prosperidade dos proprios albergueiros, pois
a confiança que elles inspiram, pelas obrigações a que as leis os
sujeitam, facilita e multiplica as viagens, e attrúe aos estabeleci-
mentos de albergaria.

Art. 1421.õ 0 albergueiro responde, egualmtente, pelos


damnos que os proprios creados, serviçaes, ou qualquer
estranho por cle albergado, causarem, salvo o regresso
contra estes.
Art. <'i22.° 0 albergueiro não é, todavia, responsavel
pelos damnos provenientes de culpa do hospede, de força
maior, ou de caso fortuilo, para os quaes de nenhum modo
haja concorrido.

(Vid. artigos 2''?3. e 2331)


Nã responde o albergueiro pelos damnos causados por força maior,
como ímeendio, isundação, etc., porque ess síemo prsestat, nem pelos
provenientes de culpa do hospede, que, por exemplo, deixou aberta
a porta do quarto, etc., porque sibi imputet os prejuizos resultantes
do seu descuido.
Mas responde pelos damnos causados pelos serviçaes, domsticos

'i
-11~ 11
1''
-
r
64 A1TIiO 142$.9

ou assalariados, ou por quaesquer pessoas empregadas no seu serviço


artigo 2380.', visto ter sido cile quem as escolheu, e quem portanto
devia ter guardado toda a cautela na escolha, «é/bitalor suam suo-
rumqe culpaa praestare debet..
A commissâo revisora com razão alterou a redacção do projecto
Ii- primitivo, que no artigo 1491., correspondente ao artigo 1421." do
codigo, só pelos domesticos responsabilisava o albergueiro, e declarou
8 respousavel o albergueiro pelos seus commissionados, ou estes vivam
ou não de portas a dentro, isto é, responsavel por quaesquer pessoas
encarregadas de certos serciços ou comissdes, como expressamente
determina o artigo 2380.°, e já determinava o projecto primitivo no
artigo 2655. correspondente, porque a razão é a mesma em todos
estes casos.
Responde tambem o albergueiro pelo damno causado por estranhos,
que estejam ou venham á estalagem, quando os receber sem euprir
os regulamentos policiaes, cmo dispõe mui terminantemente o artigo
2381."
O albergueiro pois só responde pelos damnos causados por ex-
tranhos, quando deixa de dar parte á auctoridade policial, nos termos
das disposições vigentes, do estrâsho que albergára, porque parti-
ripado na repartiçào competente o nome do extranho lia os elementos
precisos para o reconhecer, e para fazer correr sobre elle directa-
mente a responsabilidade.
Em todo o caso desde que o hospede prove que o damno teve efie-
etivamente logar na estalagem pertence ao albergueiro provar, para
a' se defender, que o damno proveio de culpa do hospede, de força
maior, ou de estranho, a respeito de cuja pousada elle cumprira os
regulamentos policiaes.
O artigo 1421., responsabilisando o albergueiro pelos damnos
causados por extranhos, reproduz exactamente a disposição do artigo
1690." do projecto do codigo civil hespanhol, e o artigo 2381.-, res-
ponsabilisando o albergueiro pelos damnos causados por estranho
unicamente quando albergado sem cumprimento dos regulamentos
policiaes, teve por fonte o artigo 116. dn nosso codigo penal de 1852,
do qual apenas difere em responsabilisar o albergueiro pelo damno
causado por estrího, qualquer que fosse a duração da pousada, ou
excedesse ou nôo as vinte e quatro horas, quade o codigo penal só
responsabilisava o albergueiro durando o albergue mais de vinte e
quatro horas.
Hoje, porém, está em pleno vigor o preceito do artigo 2381.' do
presente codigo, porque o citado artigo 116. desappareceu do novo
codigo penal de 16 de setembro de 1886, que não cogitou de respon-
sabilidade eivil, e se reportou u'esta materia ao codigo civil.

Art. 1i23.' llavendo contenda entre o albergueiro e o


hospede, sobre a quantia da retribuição de'ida por este
ájuelle, o hospede satisfará, deposiltado perante a compe-
tente auetoridade judicial do logar, onde é situada a pou-
sada, loda a quatia pedida.
t ttico. A cunlenda será resolvida, atiendendo-se aos
preços ordinarios da terra, qantlo aos objectos ministrados,
e aos serviços feitos ao hospede, e a divida liquidada será
paga pela somma depositada. O excedente, havendo-o, terá

k
Fr..,,. .

ARTIGO 1423,- 65

a applicação que o depositante houver indicado, ou, na falta


de indicação, continuará em deposito, até que o depositante
venha ou mande recebel.o.

0 artigo não tinha correspondente no projecto primitivo. Foi


introduzido pela comissão revisora, e logo nos trabalhos da pri-
meira revisão. Pela fórma, como foi primitivamente redigido e con-
servado nos projectos de 1863 e de 1864 o artigo, devia ser feito o
deposito perante o juiz eleit da parochia do albergador, o qual,
tomando conhecimento summarissimo dos motivos da questão, fixava
sem recurso a saom devida. A commsissão revisora, porém, nos tra-
balhos da ultima revisão tirou da competeneia exclusiva do juiz
eleito o conhecimento d'estas questóes, que ás vezes podiam repre-
sentar grandes valores, e mandou-as julgar em conformidade da lei
geral, que regula as jarisdicçcs e as alçadas, e nos termos do pro-
cesso comoum.
No caso de divergencia entre o albergueiro e o hospede sobre o
preço da pousada, o codigo, em attençào á necessidade de sahida do
hospede antes de resolvido o litigio, declara que este satisfaz de-
positando a quantia pedida, para o albergueiro se pagar depois pelo
deposito da somma quejudiciaaente lhe for arbitrada, ficando para
o hospede o excesso, se o houver.
Concilia assimo codigo o direito do hospede, que liberta de pagar
quantias exorbitantes a arbitrio do albergueiro, com o direito do
albergueiro, que é dispensado de ir demandar o hospede a localidade
estranha para haver a importancia da pousada.
A questão do arbitramento do preço do albergue ha de ser dispu-
tada perante a auctoridade judicial do logar que competente for
segunlo o valor da causa; e no processo hão de ser apreciados os
objectos ministrados, os serviços feitos, e os preços ordinarios da
terra.
O grande favor que o artigo concede ao albergueiro é o da com-
petmcia do foro, se o hospede consegue ausentar-se sem ter pago ou
depositado.
No deposito, que á feito a requerimento do hospede e com inti-
maç3o dos interessados, não se admitte questáo de especie alguma,
e as custas serão attendidas a final na acçâo, i qual deve appensar-se
o incidente, codigo de processo artigo 389.o
Pôde ser proposta a acçào. tanto pelo albergueiro, como pelo hos-
pede, por aquelle que nisso tiver interesse, e seguem-se para a liqui-
dação da conta os termos ordinarios.
Não tem o albergueiro, como o recoveiro e o barqueiro, o direito
de retençáo na bagagem e nas alfaias do hospede até se pagar. Mas
gosa de privilegio mobiliario especial no valor das alfaias que o
devedor tiver na pousada, artigo 882.- o.' 2°, como o credito por
despeoas de recovagem, barcagem ou alquilaria no valor dos obje-
ctos transportados, citado artigo, n 1$; e póde assim recorrer ao
arresto nas alfaias, e mesmo na bagagem salvo a indispeisavel para
empa e vcotuario d lospede e sua familia, sobre a qual no póde
recasir penhora, artigo 815. n. 11.t do codigo de processo.

'ono I1 b

L_
66 ARTIGOS 1424., 1425. s 1426.0

SECÇAO VII

Da aprendizagem

Art. 1424.0 Chama-se contracto de prestação de serviço


de ensino, ou contracto de aprendizagem, aquelle que se
celebra entre maiores, ou entre maiores e menores devi-
damente auctorisados, pelo qual uma das partes se obriga
a ensinar á outra uma industria ou um oflicio.

V (Vid. nota ao artigo 224.- n." 7.1)

Art. 1425.° Este contracto só pde ser rescindido nos


casos seguintes:
.° Por inexecução das obrigaçoes contrahidas por uma
ou por outra parte;
2.0 Por máu tractamento da parte do mestre;
3.° Por máu procedimento da parte do aprendiz.
unico. Nos diversos casos d'este artigo, haverá acção
de indemnisação de perdas e damnos, contra o que der
causa á rescisão do contracto.

1.- e § unico.

c+ (Vid. nota ao artigo'676.-)


A

2.0 e3

(Vid. nota ao artigo 676.°)

Art. I426.° Pôde ser rescindido todo e qualquer contra-


cto d'esta especie, em que o aprendiz se tenha obrigado
a trabalhar por tanto tempo, que o seu trabalho viria a valer
mais do dobro da retribuição que razoavelmente deveria
dar ao mestre, pagando o ensino a dinheiro.

Foi uma correcção contra os abusos commettidos constantemente,

4
ARTIGOS 1427.", 1428.^, 1429.0 E 1480.- 97
nos contractos de aprendizagem, pelos mestres que obrigavam os
aprendizes a dar-lhes tempo de trabalho, equivalente a mais do
dobro do preço do ensino, se este fosse pago a dinheiro, abusos fre-
quentes pela facilidade com que o :prendiz ou quem oactorisava
se sujeitava a preço exagcrato, por ser representado emi trabalho e
no em reis.

Art. 127.1 Nenhum aprendiz, antes dos quatorze an1os,


pde ser obrigado a trabalhar mais de nove horas em cada
vinte e qutiro; nem, antes dos dezoito, mais de doze.

Foi destinada esta providencia a evitar outro abuso, tamsbem com-


mettido pelos mestres, de obrigarem os aprendizes a trabalhar mais
horas por dia, do que a sua Idade permittia, prejudieando-lhes assim
o desenvolvimento da orgaisaçào, e o bem estar physico.
Nào vinha o artigo o projeeto primitivo. Foi introduzido pela
commissao revisora logo nos trabalhos da primeira revisào, e assim
apiparecet pela priímeira vez no projecto de 1863, onde porém se fal-
lava de nove horas 1p0 dia, que depois se emendou no sentido de
nove e doze horas em cada vinte o quatro horas, nota ao artigo
1459.^ do projecto do 165, e acta da sessão de 15 de niarço de 1862.
Com o fundamento de não dever ser tractado no capitulo da
sprenolizageo tal objecto, com quanto merecedor de attençào, des-
attondu a cooimissão revisora uma proposta do sr. Marreca para
a fixação de regras relativas ao tempo de trabalho dos operarios
fabris.

0
Art. 1128.° mestre não poderá reter o aprendiz, além
do tempo convencionado ou do costume. Se o fizer sem
novo ajuste, será obrigado a pagar-lhe o serviço que
prestar.

Os contractos devem ser ponctiahnete cumpridos. Se o mestre


receber do aprendiz mais serviços, ou serviços por mais tempo que
o ajustado, maior remuneraç-o lH loa d pagar.

Art. 1'x29.° Se o aprendiz abandonar o mestre, sem justa


causa, antes de acabado o temip do ajnste, poderá o mestre
denlandal o, ou a pessoa que o haja abonado, ou que tenha
contractado por elle, pela indemuisaçao do prejuizo, que
lhe resultar da inexecução do contracto.
(Vid. nota ao artigo 1376.)

Arl. 43O.° Este contracto termina:


V° Por morte do mestre ou do aprendiz;
2.1 Por chamamento do mestre ou do aprendiz ao desem-
Pb

i
68 ARTIGO 1331.

penho de serviço publico, imposto por lei, o qual seja in-


compativel com a continuação da aprendizagem.

N.o 1.*

(Vid. notas aos artigos 1377- e 1385.)

SECÇAO VIII

Do contracto de deposito

sUE-sECCÃO 1

Do contracto de deposito em geral

Art. 1431.° Diz-se contracto de deposito aquelle, por que


alguem se obriga a guardar e a restituir, quando lhe seja
exigido, qualquer objecto movel, que de outrem receba.

Regula o codigo mio só o deposito propriamente dieto, no nosso


antigo direito denominado voluntario ou filho de contracto, que é
deposito extra-otlicial feito por vontade do depositante, mas tambem
o deposito forçado, § 1. do artigo 1434.°
Em sessão da commisso revisora de 15 de março de 1862 lembrou
o sr. Ferreira Lima a conveniencia de tractar n'alguma parte do
deposito, chamado universal, ou antes miserael, decendo attribuir-se
a erro .a palavra «universal», que se lé nas actas impressas, a
pag. 2-;1.
Mas o sr. Seabra declarou que podia tractar-se d'esse objecto na
materia de damnos, com a qual tinha connexão.
O deposito judicial, filho de despacho do juiz, como o deposito
determinado no unico do artigo 488. e no codigo de processo ar-
tigo 495, o dos bens arrestados, o dos bens perolorados, e o dos
bens arrolados, que tambem pde chamar-se deposito em virtude da
lei, é por sua natureza da competencia do codigo de processo; como
o deposito i ordem de qualquer outra auctoridade publica é regu-
ladp pela legislaçio administrativa.
E caracteristica essencial do deposito a entrega da cousa ao de-
positario pela tradiçio real ou ficta, para ser guardada e restituida
em especie, quando exigida.

lia_ .
ARTIGO 1412.0 69

D. Affonso de Castella, o Sabio, dizia deposito quando um homem


dava a outro as suas cousas a guardar fiando-se nce; e os romanos
formavam tão alta idén deste contracto, que o chamavam sacer con-
tractus, porque mais que nenhum outro assentava na honradez e na
probidade pessoal.
O deposito, que muitas vezes se toma pelo contracto, no poucas
se toma pelo objecto depositado.
Em rigor só os moveis são objecto de deposito, porque o fim do
deposito é a guarda da cousa para ser entregue ao depositante,
quando d'ella precise; e o edificio ou o predio rustico não carece
de ser entregue á guarda de nieguem para ser depois encontrado.
A qualidade de depositario é pessoal. Aos herdeiros ão passa
senão a responsabilidade pelos valores que o depositario houvesse
recebido.
Para ser mercantil o deposito Ido de ser destinados a qualquer
acto de comsercio os generos ou mercadorias, codigo commercial
artigo 403.
Os depositos em bancos ou sociedades regem-se pelos respectivos
estatutos em tudo quanto não estiver prevenido no capitulo do de-
posito e mais disposiçôes legaes applicaveis, citado codigo de com-
mercio artigo 407.1
Na falleucia de estabelecimento commercial o deposito á ordem
da auctoridade publica fica sujeito Ús leis reguladoras da quebra',
em vez de ser entregue por inteiro com os interesses acerescidos
como já se tem julgado.
Deelarada a fallencia do depositario, o deposito á ordem da aucto-
ridade publica obedece ás regras de quebra, codigo commercial ar-
tigos 695. e 717
Nem o depositario pode já entregar o deposito depois da sentença
de quebra; nem a massa o entrega senão de conformidade com o seu
estatuto, que é a lei commercial.

Art. 432.0 Este contracto é de sua natureza gratuito,


o que não impede, todavia, que o depositante possa con-
vencionar a prestação de qualquer gratificação.

A gratuidade é elemento natural, mas não essencial do contracto.


Ainda que por natureza gratuito, pois a creação das obrigações do
deposito é dietada pela amizade e confiança reciproca do depositante
e do depositario, a remuneraçio pelo trabalho, cuidados e responsa-
bilidade do deposito não desnaturalisa o contracto.
Ainda que no deposito judicial não ha espontaneidade nem favor,
só no deposito por arresto e por penhora e em nenhum outro, nem
asesmo no dos bens arrolados, é arbitrada remuneração, codigo de
processo civil artigos 367.0 e 830.0

1 Accordão da Relação do Porto de 3 de novembro de 1896, Re-


vista dos Tribuaaes, 15.0 anuo. nY 347, pag. 167.
Aecordão da Relação do Porto de 23 de setembro de 1896, Re-
vieta dos Tribuaaes, 15o anuo, n." 346, pag. 150,

à"
i ý?1. 1ç

70 ARTIGOS 1463., E 1431.l

Em commercio, salva convenção em contrario, tem o depositario


direito a gratificacão pelo deposito nos termos do artigo 401- do
respectivo codigo.

Art. 1433.0 Podem depositar e ser depoirios lodos is


que podem contracar, mantidas as crýuitliesgs:
1.a A incapacidade t in dos eipulaltes não exine,
o que acceitlou o deposito, das obrigaéi)es a que os depu-
sitarios estão sujeitos;
2.a 0 incapaz que acceitar o deposito pôde, sendo deman-
dado por perdas e dantos, defender-se cum a nuiidade
do contracto, mas não valer-se da propria incapacidade
para subtrahir-se á restiuição da cousa depositada, achan-
do-se ainda em seu poder, ou a repôr aquilo, cor que,
pela alienação d'ella, se locupletou;
3.a se o incapaz não for desutitido de sufficiente intelli-
gencia, poderá ser condemnado em perdas e daunos, tia-
vendo procedido com dolo e má fé.

(Vid. notas aos artigos 98.° e 99.")

Art. 1434 ° O deposito de valor, excedente a cincoenia


mil réis, sô pôde ser provad por escripto, assignado pelo
proprio deposilario ou reconhecido como authentico, e, se
exceder a cem nuil réis, só por escriptura publica.
S1.° Exceptua-se o deposito feito forçadauíente por oc-
casião de alguma calamidade, o qual poderá ser provado
por qualquer meio de prova, seja qual for o seu alor.
2.° A exoneração do deposito pôde provar-se pelos
mesmos meios, por que a prova do deposito é admillida.

A exoneração do deposito páde prorar-se pes ie-los-, meios por


que se prova a sua constituiçao, isto é, por testeuhas, ou por
qualquer outro meio te prova, se não excede 50soo réis; por escri-
pio particular, se excede 503000 réis, mas não 10030W réis; e por
escriptura publica, se excede 100,3000 réis.
A entrega de dinheiro para certa e determinada applicação não
importa deposito, e pôde ser provada par meio dc testeunhlas,
ainda que o valor exceda 503oo0 réis.
No deposito forçado em consequncia de accidente de força aior,
como inceudio, inuudação, etc., na antiga lingíagrm clamado de-

6 r Accordão da Relação de Lisboa de 22 de abril de 1874, Dircito,


.^anuo, n.- 29, pag. 461.

L
ARTIGOS 1135.t E 113G. 71

posito oiisci-rlc, por ter legar em virtude de acontecimento des-


graçado, é admissivel qualquer meio de prova; porque em momentos
de crise confii-se ao primeiro que apparcrc os olectos a salvar,
e torna-se iipossivel obter prova por escripto do deposito, de mais
recebido por favor especial ou por sentimentos de timanidado.
na de o depositante provar a existencia do deposito, e o facto do
accidente pela regra «Ous probandi iuctmbiu auctori,.
O deposito com receio de ladres ião dispensa, colo o deposito
em occasiao de inundação, naufragio, incendio, ou qualquer outra
calamidade r(ec/iiri, a escriptura publica, se a quantia é superior a
100000 réis 1; porque o receio de mal possirel oão equivale a ca-
lamidade real, nem obsta à entrega por escripto.

SUB-SECCAO 11

Dos direitos e obrigações do depositario e do depositante

Art. 1435.1 0 depositario é obrigado:


4.° A prestar, na guarda e conservação da cousa depo-
sitada, o cuidado e diligencia de que é capaz, para o bom
desempenho do deposito;
2.° A restituir o deposito, quando lhe for exigido pelo
depositante, com todos os sens fructos e acerescidos.
Art. 1436.° 0 depositario só responde pelo prejuizo acon-
tecido ao deposito por caso forlito ou força maior:
1.1 Se a isso se tiver obrigado expressamente;
2.' Se estava em mora quando se deu o prejuizo.

O depositario lia de entregar exactamente a cousa recebida, a


cousa identica, in indiciduo, que devia ter guardado com escrupulosa
fidelidade, porque no podia tocar-lhe, nem trocal-a por outra, e
cotrv al-a no estado em que estiver no momento da restituirâo, com
os fertos percebidos, se ella os produziu, porque so acressrio do
capital.
O deposito de sommas amoedadas, por exemplo, em peças de 84000
réis, ha de ser entregue nas mesmas especies, ou ellas tenham au-
gmentado ou diminuido de valor.
Não previne o codigo a hypothiose do depositario distrabir di-
nheiro em proveito seu como previne no caso de mandato artigo

Accordào do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de junho de


1882,Boletim dos Tr-itunaes, 1." ansno, n." 4, pag. 57.

L
72 ARTIGO 1436.0

1340.0, porque em caso neubuma reconhece ao depositario o direito de


servir-se do deposito, que é obrigado a guardar fielmente sem lhe
tocar, nem com elle procurar interesses.
Mas não o allivia de responsabilidade por perdas e damnos no
caso de usar da cousa depositada, os quaes poderão a final ser re-
presentados pelos juros segundo o prre ituado no artigo 720°
porque é o dono quem responde 'pelos perigos da cousa, pela re-
gra «res suo domino perit, não responde o depositario pelas deterio-
rações que não provierem de culpa sua, salvo se a isso se obrigou,
ou se a deterioração teve 1ogar depois de passado a dia da resti-
tuição, pela presumpçào de que, se o tivesse restituido, não teria
aontecido a mesma causa ao deposito.
O deposito na mão de particulares de quaesquer quantias em
dinheiro com garantia hypothecaria para a restituição foi pelo de-
creto de 27 de julho de i893 declarado contracto de íutao, para os
effeitos tiscoes da decima de juros.
No deposito de papeis de credito é o depositario obrigado à co-
brança de juros, e a todas as mais diligencias necessarias para a
conservação de seu valor e etícitos legaes, so pena de responsabi-
lidade pessoal, codigo de coíoaercio artigo 405
Não impõe o codigo ao depositario senão responsabilidades civis.
Nullas são p r isso as clausulas dos contractos (fite transformam os
devedores em depositarios do dinheiro, e os consideram infieis de-
positarios e sujeitos a prisão não pagando no tempo competente,
pois nos contractos apenas são aduiioiviis as coioiç0es physicas e
legalmente possiveis artigos 643n, 669., 672.0 e 6830; e a pena de
prisão no pude estipular-se, porque não élegalmente possivel como
pena convencional.
Nem os proprios juizes podem commioar a pena de prisào, quer
em materia crime, quer em oíateria civel, senio nos casos expressa-
mente taxados nas leis.
Nos primeiros tempos de Roma, e segundo as disposições das leis
das doze tábuas, eram os devedores, que não satisfaziam as suas
dividas, entregues aos credores, que d'elles podiam fazer o que qui-
zessem, até vendel-os e a familia.
Posteriormente eram entregues só os bens aos credores, e ficavam
os devedores sujeitos a prisão apenas quando os bens não chegas-
sem.
A final permittiu-se aos devedores o beneficio da cessão de bens,
de que se tracta no Digesto, titulo de cessione bonorom, e no codigo,
titulo qui bonis cedere poss., que consistia na entrega fiel e exacta
dos bens e fortuna do devedor para pagamento dos credores, e que
era equiparada à apresentação voluntaria da fallencia em com-
mereio.
Tambem pela t rdenaçio philippina, liv. 4., tit. 76.0, já transoripta
da Ordenação manuelina, tit. 520, como esta o havia sido da affon-
sina, tit. 670, o devedor condemnado definitivamente por dividas civeis
podia ser preso depois de esgotados os bens, ou, ainda tendo bens,
se na obrigação se tinha expressamente sujeitado á clausula de pri-
são, que so podia evitar, aproveitando-se, conmo por direito romano,
do beneficio da cessão de bens nos teri nos da mesma Ordenação.
Era porém denegado este beneficio a alguns devedores, como:
1o aos de m fé, e taes se reputavam os que não mostrassem que
ao tempo da celebraçãio da divida tinham bens soticientes para
pagar, ou que nesse acto tinham patenteado aos credores o estado
da sua fortuna, citada Ord., tit. 74. pr.; 21 aos devedores á fazenda
! °"'

ARTIGOS 1437.0 e 1438. 73

nacional, citado tit. 76.$ i 4.; 3$ aos negociantes, tit. 74.§ 7.; 4." aos
devedores de dividas criminnes, tit. 76. j 5.-; 5.° aos bulres e illi-
çadores, e outros, citado tit. 74" § 7.
Mas a ressào não alliviava os devedores de pagar por outros quaes-
quer b as, que depois adquirissem, como ainda hoje não ficam
alliviídos os fallidos; e apenas. quanto aos adquiridos, os devedores
gasavam do beneficio da competencia, isto (, de lhes ficarem salvos
os alirentos, citado tit. 74.° pr.
Esta .ursprudencia porém foi profundamente alterada pelas refor-
mas do aurquez de Pombal.
Fm vr:ude da lei de 20 de junho de 1774 a 19." se, depois da
arremataçâo, não ficasse ainda inteiramente satisfeita a divida, e o
devedor aão tivesse mais bens, nem o exequente os mostrasse ou
o exeeutado com dolo os oceultasse, mandava o juiz nos autos qoe
se orosruisse aiss naaerceaçd, palavras que o assento de 18 de
agosto do mesmo arro interpretou no sentido de deverem ser im-
mediatamente soltos es devedores, que entoo estavam encarcerados,
ou que depois o fossem por dividas viveis ou crimes, interpretação
que demostrava ter cessado a prisõo por dividas.
Finalmente a carta constitucional, que prohibi no artigo 145.-
9." a prisão sem culpa forda, salvo nos casos em que a lei o
etermiasse, acabou com a prisão por dividas. aliás conservada em
muitos c'digos, e especialmente reconecida em França na lei de
17 de abril de 1832, que só foi alterada em 1867.
Entre nós foi ha muito extineta a prisão por dividas, hoje applica-
vel apenas,nlo em homenagern aos direitos privados, e sim em garan-
tia do interesse publico, ao que tem a sea cargo dinheiro ou valores
do estado, codigo de processo artigo 373.0, ao arrematante judicial
que no entra em deposito com o preço em devido tempo, citado co-
digo de processo artigos 721.§ 8" e 859.°, ao depositario judicial,
que no entrega os valores em deposito no pcaso legal, citado codigo
de processo artigo 825., etc.
O decreto de 15 de setembro de 1892 até acabou com a prislo por
custas.
Alas esta providencia, eminentemente liberal, foi revogada pela
lei de 4 de maio de 1896.

Art. 1437. 0 depositario não pôde servir-se da cousa


depositada sem permissão expressa do depositante; aliás
responderá por perdas e damnos.

Sob pena de perdas e damnos não póde sersir-se da cousa depo-


sitada sem permissão expressa do depositante o depositario, em cujo
poder está como se fôra em casa do depositante, reputando-se que
o depositario emprestou apenas o logar para ella, e que, por isso,
usando da cousa sem licença viola a fé devida ao contracto, artigo
1437°
Mas não perde o contracto a sua natureza de deposito, como al-
guas legislaçes prescrever, para ficar sujeito ás regras de outra
convemrç,o, pelo facto de se permittir ao depositario usar da cousa,
artigo 1437
Em commercio, dada permissão para o depositario usar do depo-
sito, já para si ou para seus negocis, já para operações recommen-

L
74 ARTIGOS 1439., 1440. . 1441.0

dadas pelo depositante, cessam os direitos e as obrigações proprias


de depositante e de depositario, para serem observadas as regras
do cmprestimo mercantil, da conniissão, ou de qunlqner outro con-
tracto que, em substitui ão tio deposito, se Houver celebrado, citado
codigo artigo 405."

Art. 1138.1 Se as cousas depositadas forem entregnes


cerradas e seliadas, deverá o depositario restitui[-as no
mesmo estado.
Art. 139. Se o depositario devassar o deposito feito
na firma sobredicla, ficará obrigado a repôr o conteúdo,
pelo juramento do depositante; salvo se o devassamento
nuo piocedesse de culpa sua.
Art. 1i440. 0 devassamento presume-se feito por culpa
do depositario, em quanto este não provar o. contrario.
$ unico. Feita esta prova, é o depositante obrigado a
provar o valor do deposito.

Para respeitar a intenção do depositante, que entregou cerradas


as cousas depositadas, deve abster-se o depositario de devassar o
deposito; aliás fica obrigado, em pena da violação da fé do contracto,
a repôr o deposito segundo o juramento do depositante, que não
póde ser contrariado, provado que o deposito foi entregue sellado e
depois devassado.
Nem o deposito, que foi entregue fechado, poderia facilmente ser
provado, a não ser pelo juramento do depositante.
Xio sendo do depositario a culpa do devassamento, será o deposi-
taste, longe de ser crido pelo seu juramento, obrigado a provar pelos
5. meios ordinarios o valor do deposito.
Presume-se feito por culpa do depositario o devassamento até
prova em contrario, não só pelo principio geral de que a cousa
perdida em poder do devedor se presume perdida por islpa d'elle,
mas porque de outro modo fieariam a maior parte das vezes impunes
ou irresponsaveis os depositarios infieis.

Art. 1'4I .° A restituição deve ser feita ao depositante ou


a tuem o represente.

(Vid. artigos 1445.- e 1446.)


Deve ser entregue o deposito ao verdadeiro dono, ou ao seu re-
presentante, que póde ser o procurador bastate, ou o tutor, curador
ou administrador.
Se o depositante mudou de estado, como a iailher solteira isitei-
ramente livre no smínento do deposito que pelo casamento poste-
rior ficou sob a administração do marido, ou se o depositaute no
goso pleno dos seus direitos foi depois declarado interdicto, ha de
ser entregue o deposito, são no depositante, mas a quem tiver a
ad iuistr,:aio dos bens e direitos do depositante artigo 11I.G, que
nao pôde directamente recebel-o, por se haver tornado ineapaz de
administrar seus bens.
ARTIGO 1442.Õ 75

Reglam os artigos 1445.0 e 1 1136. as condiçes da r.estitoição do


deposito feito pele represenstsite de isca paz, e pelo que, sendo capaz
ao ,trspo do dcss sito, perdeu depois o lircita de se administrar.
E psrtm neesr ,mio attender tambe aos casos de incapacidade
do depositle ou do dposiri ao tempo do deposito, ácerca dos
qenes. omisso
L o coligo, ou por serem rarissinos, ou por estarem
com prehendidos nas diposi-còesgerae, relativas aos direito' e ds
obr)iaJes dos inceaazes.
O ds 1 aito feito directamente pelo incapaz sem intcrvenç o ds seu
rsprescstaste ido liv -a de cietnua das obrigaçoes respectivas o
depositarie, e imps-lhe responsa bilidase, se o restituir depois ao
dep sitant, e nao ao sei representant.
0 deposito em p oder de incapaz i nullo, sem prejuizo todavia do
direito d1 depositante a haver do depositario o que elle em si tiver
e o sor de que se-tiver aproveittlo.
feaim bem escusados os artigos 1415.0 e 1446.>, que nada adiantam
ao artigo 1-141.0, cujo preceito mesmo era dispensavel porque está
contido nos principiss geras de direito.
No caso de morte do depositante sustentam alguns que não póde
ser entregue a cousa depositada senão io herdeiro, ainda que no
contraeto se tenha feito ti indicação da passoa a quem devia ser
entregue, com o fundamento de não ter deixado o depositante de ser
o proprietario da coesa depositla, de que a entrega a pessoas, que
mio fosseís herdeiros do depositante, poderia encobrir liberalidades
prohibidas pela lei, e ainda prque o mandato expira pela morte do
mandante; e litar fosse e-te o pensamen o deo sr. Ferreira Lima,
quando est sessão de 14 de novembro de 1864 propoz a alteração do
artigo 1413.0 do projecto, correspondente ao artigo 1441.0 do codigo,
paroa caso de ser sido feito o deposito para ser entregue a ter-
ceiro, e o deptsitante morrer antes da entrega, proposta que não
foi approvada.
Porém a designação da pessoa a quem deve ser feita a restituição
ha do ser respitida mesmo no caso de morte do depositante, por-
que nem o deposito está subordinado is regras do mandato, nem
ptde ser entregue aos Ierdeiros do dep o sitante, que não téem outros
direitos ssão os que este lhis transmitaiu, um deposito que isem á
propria pessoa do depositante podia ser entregue, em virtude da
estipuasço do contracto.
(luamo sob a apparencia de dep o sito houver doação ou qualquer
outro acto simulado, o resíedio para a reseisão pela fraudela t está
nas Icis. Não é pela acçilo do deposito que os herdeiros hão de liaver
os obiect"s depositados.

Art. jtj U . Se o edepositario ier no cohitci men0lo, de


qne a cOusa depositada fti ftrt;ula, deserá participal-o io
dono, sabed quem é, oet, niá u sabendo. a0 iniisterio
publico. 1, se, dentro de quinze dias, coniados desde a data
d'esla participaçhi, a cusa dpssitala n'io for eííílaargasla
judiciaulmente, o1 reclamada por seu duno, poderá ser en-
tregue ao deposilane, sem que o deposilario por isso fique
sujeilo a responsabilidade alguma.

Tio forte é a obrigação de entregar a cousa ao depositante peli

Ws
16 ARTIGOS 1443." E 1444.°

simples facto do deposito, que por direito romano até no ladrão se


entregava a cousa furtada, por ell depositada, salvo se o verda-
deiro dono a reclamasse ao mesmo tempo, e não era o depositario
obrigado a prevenir o dono ainda que soubesse do furto, e coehe-
cesse o ladrão. Em varias legislaçes o depositario, com quanto
saiba do furto, no é obrigado a diligencia de especie alguma para
descobrir o proprietario, e póde entregar o deposito ao depositante
sem responsabilidade.
Pelo nosso codigo, porém, o depositario, desde que sabe que a
cousa é furtada, ainda que ignore quem é o dono, já não póde entre-
gal-a ao depositaste'sem satisfazer as diligencias legacs, prescriptas
n'este artigo, isto é, sem prevenir o dono, se sabe quem é, ou o mi-
nisterio publico, não conhecendo o dono, e só passados quinze dias
sem reclamação do dono, ou sem embargo judicial, é que pôde entre-
gal-a ao depositante, porque deve cutio reputar falsas as suas sus-
peitas, visto nem o proprietario avisado pedir á justiça o que era seu,
nem o ministerio publico proceder, como lhe cumpria, e no ser o
depositario pessoa competente para proceder judiciahoente por facto
em que nào é interessado.
A participação ao ministerio publico é, nuo si para os effeitos
penaes, mas tambem para procedimento civil, pois que o deposito
póde pertencer a algum incapaz, ou ausente, ou a pessoa a estes
equiparada.
Não póde o depositario exigir para a entrega a prova de que a
cousa pertence ao depositante. Faz-lhe a entrega, por isso que é
elle o depositante. Se o depositario queria exigir a prova da proprie-
dade, devia fazeI-o antes de receber o objecto, para não correr o
risco de ser depositario de cousa furtada, e incommodado como en-
cobridor de furto.
Na aoceitaçdo dos depositos voluntarios devem os depositarios pôr
o maior escrupulo, para não se verem depois implicados em respon-
sabilidades penaes como encobridores, nos termos do codigo penal.
A doutrina proposta por Ferreira Lima em sessão de 15 de março
de 1862 para a desoneraçào de todas as obrigaçôcs de depositario,
desde que este descobrisse e provasse que o objecto depositado lhe
pertencia, com quanto não fosse convertida em preceito legal, é ap-
plicavel a todo e qualquer depositario, cujas obrigaçesccessam logo
que prove que a cousa é sua.

Art. 14x3.° Se forem varios os deposilantes, mas não


solidarios, e se a cousa depositada adnittir divisão, não
poderá o depositario entregar a cada um d'elles senão a
sua respectiva parte.

Desde que os depositantes não são solidarios, e a cousa depositada


admitte commoda divisão, reputam-se depositantes cada um pela sua
quota parte, e aó esta poderá ser entregue a qualquer delles. Por
isso, reclamando os herdeiros do depositante o deposito de dinheiro
feito pelo auctor da herança, deve o depositario entregar a cada um
apenas a respectiva quota.

5
Art. t'ei,4. Se os depositantes forem solidarios, ou a

L.
PrF, '

ARTIGOS 1445o, 1446., 1447., 1448.° E 1449.0 77

cousa for indivisivel, observar-se-ha o que fica disposto nos


artigos 750.° e 751.°
(Vid. nota ao artigo 751.)

Art. 1445.° Se o deposito, feito em nome de algum in-


capaz, por seu legitimo representante, ainda subsistir,
quando a incapacidade cessar, será restituida a cousa de-
positada á pessoa, em cujo nome o deposito tiver sido feito.
Art. 1416.° Se o depositante se tornar incapaz, ou se,
sendo mulher, casar, a cousa depositada será entregue, no
primeiro caso, a quem legitimamente representar o inca-
paz, e no segundo, ao marido ou á mulher com auctorisa-
ção deste.

(Vid. nota ao artigo-1441.)

Art. 1447.° A cousa depositada deve ser entregue no


logar, onde o deposito foi feito, não havendo convenção em
contrario.

(Vid, nota ao artigo 739.)

Art. 14.8.° 0 depositario deve restituir a cousa deposi-


tada, a todo o tempo em que a restituição lhe seja reque-
rida pelo depositante, ou por seu legitimo representante,
ainda que o deposito fosse estipulado por tempo determi-
nado, salvo se for judicialmente embargada a cousa deto-
sitada, ou o depositario intimado para não a entregar.
Art. It9.° 0 depositario póde restituir a cousa deposi-
tada ainda antes de findar o praso convencionado, sobre-
vindo justa causa; e se o depositante a não acceitar, po-
derá o deposilario requerer. que se ponha em deposilo ju-
dicial

No cmprestimo, em regra, nem o commodante artigo 1511., nem


o mutuante artigo 1524., podem reclamar a cousa emprestada, nem
oequer intervir na posse do outro pactuante, em quanto nào findar
o praso convencionodo, porque seria faltar 1 boa fé exigir a cousa
antes do tempo, depois de terem cunsentido em que d'ella se ser-
visse o commodatario ou o mutuario durante certo periodo.
Mas no deposito, em que o depositario se limita a guardar a cousa,
Bem poder fazer uso d'ella, nào tia direito de a reter depois de re-
clamada, apesar da fixaçào de proso para a entrega, visto não tirar

OL-
- '-' -. -.

78 ARTIGOS 1150.0 a 1451.0

o depositario interesse da detençto da cousa, e poder o depositante


renunciar ao favor que recebe com o deposito.
Só póde negar-se a restituir a cousa reclamada pelo depositante
o depositario, qurdo ella foi embargada em seu poder, ou elle foi
judicialmente intimado para não a restituir ao depos9tante, porque em
qualquer destes casos lia de entregai-a só á pessoa que o juiz de-
terminar.
Pedro, depositario rie cousas pertencentes a Paulo, que é devedor
a Martinho, pódr ser intimado a requerimento de 'Martinho, para
nro pagar a Paulo, e sim á ordem do juizo; e se, apesar da intimação,
Pedro entregar o deposito a Paulo, fica responsavel pelo seu valor
para com Martinho, quando este exeeutar o seu credito contra
Paulo, sulvo o direito de Pedro a reraver de Paulo o que por este
foi abrigado a pagar.
O depositario não incorre em responsabilidade criminal sem a
recsa effectiva á entrega da cousa depositada.1
Não pde, porém, o depositario compllir o depositante a receber
a cousa antes de findo o prato, sisto ter-se obrigado a guardal-a
drraste certo periodo, salvo se lhe sobreveio justa causa para
noo continuar, como se é decorrido muito tempo depois do deposito,
se deseja ausentar-se, ou se receia graves'perigos para a cousa,
etc.
Negando-se o depositante a receber o deposito póde o depositrio
livrar-se, requerendo a conoignaç3o judicial do objecto depositado,
nos termos do artigo 759." e seguintes, e codigo de processo ar-
tig r28.; e o juiz decidirá se é ru não extemporanea a restituição
do deposito, e se os motivos allegados pelo depositario são causa
jrisa.

Art. 4.0.1 0 depositante lem obrigação de indemnisar


de todas as despezas que haja feilr na con-
o depusilarii
srvlrIi da cousa deposita;da, un.por causa delia.
unico. O depositario pôde reler a cousa depositada, em
quato não é pago.

Gosa o depositario, alim do direito de indemisaçfo pelas des-


pecas feitas, do privilegio da reteuç-,o, que é irmportarte garantia
de pagamento, porque, tendo prestado os seus otlicios de amizade,
nlo ha de ainda em cima ser prejudicado com o serviço gratuito
que fez.

A t. 14:31.1 0 depositario, que for perturbaido ou eAbt-


lhado da cousa iepositada, dará disso avie, sem delença,
ao depositante, toando a defeza dos direitos deste, até
que elle proveja no caso conto cumprir e se não der o dicto

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de novembro


de 1892, Recata dos Tribnaes,12." anro, a.^ 280, pag. 25U.
-r '75

ARTIGO 1451.0 79

aviso, ou não tomar a dieta defeza, ficará responsavel por


perdas e damnos.
(Vid. nota ao artigo 10416, e artigos 1515, 1608^ n. 4.-, 2219y
e 2240.)
Foi introduzido de novo pela commiss o revisora o artigo, que não
vinha no projecto primitivo.
A obrigação de darem parte sem demora, o depositario, o commo-
datario artigo 1515., e o arrendatario artigo 1608.° n. 4., áquelle
em come de gxe.. poisem, de qualquer tnrbaço ou esbulol, e de
conjnetam ete int-ntare a acç:o de matitinçào ou de restituiçào,
artigo 504., at- rlle prover, foi dirtada no interesse <ti prnprietario,
que poderia soffrer com a demora, visto contar-se o atno para a
restitniço, na posse tomada publicamente, nào desde a no/icia , mas
desde o facto do shulho, unico dos artigos 4b2." e 501
E na qoalidade de sn<odatorio (gal que se apresenta o depositario,
commodatario, os arrendatario , cm juizo, a tomar a defesa dos direitoa
do proprietario. Até to artigo correspond -a te, 1450., do terceiro pro-
jecto da eommiosso revisora onde polo primeira vez se introd zit em
sessão 15 de alarço de 1,62 sob proposta do sr. Seabra esta dispo-
siçao, e no artigo 1453 da edição de 1864, se achavam collocadas
antes da palavra até. as palavras «eoo ' ro<cnrador La<tante,, que
foram supprimidas, talcz por desneeessarias, no projecto apresen-
tado is crites.
As palavras «e se no dir o dito aiuo, ou «<ro tomar a dita defesa,
fcarí responsarelpor perdas e damos», que no vinham na primeira
redacção, como se mostra do artigo 1453., correspondente ao artigo
1451." do codigo, e ete só no ultimo projecto foram consignadas,
significam a iamposiçao simultanea das duas obrigaçoes.
O artigo 1451.° impòe ao depositario, perturbado ou esbulhado da
cousa depositado, a obrigaço cumulativa de avisar, sem demora,
o depositante, de tomar a defesa deste até elle prover, como o
n.' 4." do artigo 1608d. imipSe ao arrendatario a otrigação similtanea
e cumulativa de dar parte ao senhorio das usurpações, tentadas ou
feitas por terceiro, e de defender os direitos do mesmo senhorio.
Não se exoneram de responsabilidade por perdas e damnos por
satisfazerem a uma das duas obrigaçúes.
Para exigirem indemnisaçSo hlo de avisar o senhorio das usur-
paçòes tentadas e tomar a defesa, porque. se no avisaram o proprie-
taio, e ao mesmo temípo nào toiííram a defesa deste contra as
pretenses de terceiro, não só nada podeun reclamar, mas ficam ainda
em ema responsaveis para com o senhorio por todos os prejui os.
A lei, que na primeira parte do presente artigo e do i." 4. do
artigo iG0/.° e no artigo 1515.° imp e duas obrigaçcos simultaneas,
e <<o alternadas ao d-posi/ario. io rommiodatario e no nrrendataio,
nao viria na segíuda parte desoneral-os de respmaíbilidade, quando
elles tivessem cumprido só uma.
M1:s o cumprimento das obrigaçôes im,í sas ao depositario com-
modatario ou arrendatario, não os inhibe de defenderem em seu
nome os direitos otfendidos, apesar de terem avisado o senhori, e
de ter o senhorio comparecido em juizo.1

1 Accordão da flelaçso do Porto de 4 de agosto de 1891, Rerista


dos Tribunaes, 10.° anuo, n." 222, pag. 86.
r 80 ARTIGO 1451.-

O aviso ao depositante, ao senhorio e ao proprictario, está regu-


lado no codigo de processo artigo 645.", e não admitte opposiçao
alguma; e já se julgou que o cumprimento da obrigação imposta ao
arrendatario em o n. 4.° do artigo 1608.° se resume n'uma simples
notificação conforme aquelle artigo 645. do codigo de processo, e
que ao arrendatario não cabe o direito de chamar o senhorio à au-
toria, e nem mesmo o de o nomear á acção. t
Nio é isso porém o que está no artigo 321. do codigo de processo.
hoje, em vista do artigo 321. do codigo de processo, o deposita-
rio, o commodataris ou o arrendatario, quando demandado por quem
pretenda ter direito sobre a cousa, além de avisar o senhorio. e de
lhe começar a defesa dos seus direitos, como lhe prescreve o presente
codigo, póde tambem nocar á aeçto aquelle, em cujo nome possue.
O auctor deve mesmo dirigir a sua acção tambem contra o se-
nhorio, porque depois só poderá executar a sentença contra o arren-
datario se este não nomear o senhorio para ser ouvido na acção.
Tambem o usufructuario é obrigado, sob pena de responsabilidade
por perdas e damnos, a avisar o proprietario de qualquer lesão que
este soffra nos seus direitos artigo 2240.°, a qual o proprietario poderia
ignorar por muito tempo, visto ser o usufructuario o possuidor efle-
etieo da cousa, e poder ser fusesta ao proprietario ausente a negli-
gencia do usufructuario, pois que a perturbação ou usurpaço dos
direitos poderia conduzir á prescripçào.
Mas nio é obrigado a tomar a defesa dos direitos do proprietario,
porque, como é possuidor por direito proprio, e em nome proprio,
póde usar n'essa qualidade dos meios que competem ao proprietario
para ser mantido no seu usufructo artigo 2219.; e, se o usufructua-
rio quizer deixar correr á revelia os seus proprios direitos, ninguem
póde responsabilisal-o por deixar de velar pela conservaçáo dos
direitos alheios.
As despesas com os processos relativos ao goso do usufructuario,
se alguem lhe causar damno, ou negar o usufructo, isto é, as custas
do litigio pelo usufructuario sustentado para ser mantido no seu
usufructo são por conta d'elle se o usufructo foi constitoido por titulo
gratuito, e por couta do alheador, obrigado à evicçào artigo 2219.,
r se foi constituido por titulo oneroso.
Se, porém, interessa ao proprietario e ao usufructuario ao mesmo
tempo o processo, e se ambos intervém na demanda, as custas reca-
hirào sobre ambos pro rata.

1L

P
t Aceordão da Relação de Lisboa de 16 de fevereiro de 1889,
F Dircito, 23.: anuo, n. 7, pag. 111.

?W'_J
ARTI( 1 14!,2, 81

CAPITULO V

DAS DOACOES

SECÇAO 1

Das doações em geral

Art. l42.0 Doação é um contracto, por que qualquer


pessoa transfere a outrem gratuitamente uma parte, ou a
totalidade de seus bens presentes.
A doaçào, derivada de donativo, era no direito francez definida
como contracto; palavra que Napolelo depois substituiu por acto,
por ào julgar cousentanea á natureza da doaçâo a idêa de utili-
dade de serviços reciprocos, significada pelo contracto.
e
Pelo nosso codigo é a doaçào um coosracto, e uào um simples acto
juridico, por só estar perfeita e irrevogavel depois da acceitação,
artigo 1456.°, e da aceeitaçâo authenticada, artigo 1466.-
E o contrario do testamento, que é revogavel a todo o tempo, por
ser a express5o simples da vontade do testador.
Porque todos os actos de transmissão a titulo gratuito se resumem
nas doações ou nos testamentos, artigo 1457.', é na maior parte
dos codigos tractada a seguir a materia dos testamentos e a das
doaçõce.
0 osso codigo, porém, tendo acabado com as chamadas doações
iortis causa, que mais se approsimavam dos testamentos do que das
doações entre vivos, e que eram fonte perene de questões pela
ignorania dos tabelliUes e por falta de lei que lhes regulasse as
solmnid:des, tracta das doações na materia dos contractos, e dos
testamentos na materia das suecessoes.
São capitars as differenças entre um e outro acto juridico, nao
só quanto is formalidades da constituição, seno tambem quanto aos
efeitns lenes, e à capacidade juridica do auctor.
As condições impossiveis annullani as doações, artigo 683., e re-
putam-se não escriptas nos testamentos, artigo 1743..; podem doar
todos os que podem contractar, artigo 1476.', e uào podem doar todos
os que podem testar, artigo 176j4 n.° 3.'; de receber por doaçao
ninguem é absolutasrnte inhibido. nota ao artigo 1480.', e de receber
por testamocnto a titulo dc herdeiro são absoltamente inhibidas as
pessoas mencionadas nos artigos 1779. e 1781 .
MIas onde é fundamental a diferença entre as doações e os tes-
tamentos é em serem irrcogarceisas doações, artigo 1456.', e essen-
cialmente reroauceis a todo o tempo os testamentos.
Tono III 6

il1 ÈL
~1
82 ARTIGO 1453.-

Nos testamentos nem possivel é renunciar em caso algum ro direito


de revogar, artigo 1754.'. Nas doações só no póde renunciar-se o
direito de revogar por ingratiddo artigo 1490.o, porque tal pacto
seria contrario aos bons costumes, como exclusivo do direito de cas-
tigar um crime ou uma immoralidade, ou por supervesiencia de
filhos artigo 1486.' porque são nullas as clausulas estabelecidas em
prejuizo de terceiros.
A doação não péde abranger mais do que os bens presentes, ar-
tigo 1453.0, salvas as excepções expressas em lei. O testamento pôde
abranger todos os bens, tanto presentes corno futuros, artigo 1739.',
isto é, tanto os que o testador possue ao tempo do testamento, como
os que lhe advierem depois, e que r morte estiverem no seu patri-
nionlo.

Art. t443.° A doação não póde abranger bens futuros.


unico. Por bens futuros entendem-se aquelles que
não se ariam em poder do doador, ou a que este não tem
direito ao tempo da doação.

Em Roma, antes de Justiniano, não era permittida a doação de


bens futuros, por se- reputar necessaria para a transferencia do
domiuio a tradição material dos bens doados, e nio poder o doador
entregar o que não tinha na sua mão.
Cessou depois o motivo da prohibiçào quando se julgou bastante a
simples manifestação da vontade para aperfeiçoar a doação.
A nossa velha Ordenação, liv. 4.', tit. 70.-, j 3.', não probibia a
doação de bens futuros, mas declarava nullo o contracto em que o
doador nada reservava para si; e os interpretes foram sempre de
parecer que a doação universal era nulla por privar da facçào tes-
tmentaria, visto inguem querer ser herdeiro sem a esperança de
receber bens.
Segundo os melhores auctores a doaçio de bens suluros, isto é,
de bens sobre que o doador no momento de doar não tena direito
effeetivo, nem acção pura ou condicional, artigos 1454.' e 1478.', é
incompativel com a natureza do coutracto, porque o doador deve
despojar-se irreeoõarcs/estedos bens, para não ficar com o direito
de aniquilar ou pelo menos de restringir a doação, dissipando a sua
r
fortuna. porque as d, ações de bens futuros poderiam originar gran-
des abuses, habilitando os doadores a explorar a troco de liberali-
dades pouco penosas os donatarios sob a esperança do beneficio
que haviam de receber, e finalmente porque as doações de bens fu-
turos representam até certo ponto pactos secessorios, já reprovados
por direito romano.
Todavia, a razão principal por que se limitou a doação aos bens
presentes foi para evitar o impulso desordenado da liberalidade, e
para assegurar o porvir do que não sabe guardar o que é seu, porque
o amor do proximo não deve ser superior ao amor de ai mesmo, e
porque as mais formosas virtrdes, quando exageradas, podem dege-
rerar ero vio.
Alguns codigos modrn.s, como o codigo hespanhol, probibem a
doação, não sé de bens futuros, mas ainda de ftrd s os bens presentes
sem a reserva do necesoario quer em usuructo, quer em propriedade,
á vida do doador conforme a sua posição e circumstancias, e negam

:a
ARTIGO 1454.- 83

ao homem o direito de privar-se dos meios de subsisteneia por um


acto, que mais pjle ser qualifieado de prodigalidade ou de loueura
do que de liberalidade, por u:1 se prsumir em sio juizo e livre de
suggestòi estt:ilis,quem
'í' se reduz vohMtariamiiíte idigeeia.
As prodigalidadls espontanns salo iuasi sempre obra da nii te o
da fraude, senao da debilidade do dsador, explorada pelo donatario
cm proveito proprio sem coiseiencia e sem pudor.
No pode explicar se esta especie de suicidin senão pela força
irresistivel da sedueçño empregada com habilidade e constancia, ou
por aecesso passageiro de loucura.
Ora a lei deve proteger o direito n vida, que exige os meios in-
di s peasaveis para satisfação das necessidades physicas e espiri-
tuas
N'esta ordem de idèas procuraram os legisladores conciliar, quanto
possivel, a liberdade individual do doador coma as suas necessidades
physicas e espiritmaes.
A nullidade da doação de bens futuros, porém, não importa a mil-
]idade da doação dos bens presentes, porque o util não se vicia pelo
inutil, sempre que d'este pode separar- se.

0
Art. Iii. A doação póde ser pura, condicional, one-
rosa o remnaínera leria.
I.° Pura é a doarão meramente beíefica, e indepen-
dente de qualquer condição.
2.1 Doação condicional é a que depende de certo
evento ou circumstancia.
3. Doação oneruosa é a que traz comsigo certos eu-
cargi s.
rtmuneratoria é a que é feita em attenção
li.° Doação
a serviços recebidos pelo doador, que não tenham a natu-
reza de divida exigivel.

Salvo as doaçòes onerosas, uiicas que se destacam porque são as


unicasregidas 'a parte respectiva pelos principios dos contratos one-
rosos, artigo 1455.°, todas as outras especies, sem exceptuar as re-
inaneriorias, estão subordinadas aos principios consignados n'este
capitulo.
Não perde o caracter de liberalidade a doação remuneratoriaque
Be refere a dividas no exigieis, como a dividas pelo bom tracta-
mento durante a molestia, pelo conforto na adversidade, etc., por-
que semelhantes actos de gratidão não produzem efeitos alguns
juridicos.
Ei these todis as doaçòes são remneratocias, porque em geral
signifieiio o recohciiento de serviços. las cm direito si; téem
este nome as que o doudo'. declaca poit ivamente feitas em remu-
neração de serviços, que não importem divida exigivel.
tesde que os serviços premiados tivessem
a natureza de divida
exigivel converter se ia a doação em pagmento.
A doação ou legado feito pelo ao ao errado ou pelo devedor ao
credor está sujeita a contribuição de registo a titulo gratuito, e só
11

áli,
sei

84 ARTIGOS 1455., 1456.° e 1457.-

deixa de ser remuneratoria para ser onerosa, quando tiver realmente


por fim compensar o creado pelas soldadas em divida, o credor pela
importancia do seu credito, etc.
As doaçJes remuueratorias, que não forem condicionaes nem one-
rosas, aproveitam, como as puras, ás pessoas incapazes de contrartar,
independentemente de acceitaçào, artigo 1478.°

Art. 1455.° A doação onerosa só pôde ser considerada


como doação, na parte em que exceder o valor dos encar-
gos impostos.

Subordinando muito positivamente a doaçào onerosa is regras da


doação só na parie excedente aos encargos, e regulando pelos prin-
cipios dos contractos onerosos a parte absorvida pels encargos, fez
o codigo innovaçào radical no direito anterior, que, salvos -os casos
de simulação e de fraude, sujeitava sempre as doaçJes, por mais
onerosas, ás regras especises dos contractos gratuitos.
Vi As doações com encargos annexos, como a doação no valor de
6:000OO réis com a obrigação de pagar certas dividas, ou de dar
pensão ao doador ou a outrem, representam um mixto de acto gra-
tuito e de acto oneroso.
Os contractos de compra e de troca, ambos onerosos, sio ambos
sujeitos ás mesmas regras artigo 1594., salvo no que respeita á in-
dole especial de cada um.
Porém nos contractos mixtos de gratuito e de oneroso, para su-
bordinar a parte gratuita á doutrina das doações, e a parte onerosa
á doutrina dos contractos bilateraes, paga-se contribuição de registo
a titulo oneroso pelo valor correspondente aos encargos sobre bens
Ea. immobiliarios, e a titulo gratuito pelo resto dos bens se d'ella não
for dispensada a transmissâo.
Nas doaçJes onerosas, quer com entradas, quer em bens immo-
biliarios com encargos, ou estes sejam em favor do doador, ou em
favor de terceiro, é calculada a contribuiçào por titulo oneroso sobre
a importancia da divida paga com os bens transmittidos, e por titulo
gratuito sobre o excesso de valor dos dictos bens com relação á im-
portancia da divida, regulamento de 1 de julho de 1895, artigos 5.-
e 11.0
Só as doações onerosas feitas a favor de descendentes são exem-
ptas do imposto, citado regulamento, artigo 7.° n. 15.°

Art. 1456.° As doações, que tiverem de produzir os seus


etfeitos entre vivos, são irrevogaveis desde que forem ac-
cetas, excepto nos casos declarados tia lei.
(Vid. nota ao artigo 1169.' n.' 1.0)

Art. 1457.° As doações, que tiverem de produzir os seus


elleitos por morte do doador, lécto a naltureza de disposição
de ultima vontade, e licaít sujeitas ás regras estabelecidas
no titulo dos testamentos.

.11
'"O?-' 's

ARTIGOS 1458.', 1459.' E 1460.* 85

tnico. A disposição d'este artigo não abrange as doa-


ções para casamento, ainda que hajam de produzir o seu
effeito depois da morte do doador.

(Vid. nota ao artigo 1179.)

Art. 1458.0 A doação póde ser feita verbalmente ou por


escripto.
§ 1. A doação verbal só pôde ser feita com tradição
da cousa doada, sendo esta mobiliaria.
S2.1 A doação de cousas mobiliarias, não sendo acom-
panhada de tradição, só pôde ser dita por escripto.

Esta fórma de doações, chamodas oomouaes, por eerem feitas de


poão a ;não, não poderia ser eliminada sem prejudicar um dos mais
sagrados direitos do homem, privando-o de realizar sem formalida-
des escriptas a mais insignificante doação em recompensa imme-
diata de serviços recebidos.

Art. 1459.° A doação de bens immobiliarios, se o valor


d'elles não exceder a cincoenta mil réis, poderá ser feita
por escripto particular comt a assignalura do doador, ou
de outrem a seu rogo, não sabendo elle escrever, e de
mais duas testemunhas, que escrevam o seu nome por in-
teiro; se exceder aquella quantia, só poderá ser feita por
escriptura publica.
4 unico. Estas doações só produzirão efeito em relação
a terceiros, desde que forem registradas, como se deter-
mina no titulo respectivo.

(Vid. notas aos artigos 686.- e 949.')


Tão substancial é na doação de bens immobiliarios de valor exce-
dente a 503000 réis a escriptura publica, que já foi annullada, aliás
sem justo fundamento, uma doação de bens immobiliarios n'aquelle
valor, feita em auto de conciliação e em fárma de transaeçào, com
o fundamento de não supprir o auto de conciliaçào a escriptura
publica.1

Art. 1460.° E nulla a doação, que abrange a totalidade

1 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de maio de


1884, Direito, 23.' ano, n." 16, pag. 242.

ãLý.
?a.'!, 5

86 ARTIGOS 14G1., 1462.° s 1463.0

dos bens do doador sem reserva do usufructo, ou que deixa


o doador sem meios de subsisteicia.
(Vid. nota ao artigo 1171.1)

Art. 1461.0 Se o doador fizer doação de todos os seus


bens moveis e irimoveis, entender-se-lia que a doação
abrange os direitos e acçiies.
(Vid. nota ao artigo 377.0)

Art. 1462.° Se o doador, em contracto de casameito,


fizer doação de seus bens por morte, sem reserva alguma,
ou reservando alguns bens sem desigtação d'elles ou de
porção certa, entender-se ha (ie reserva a terça dos doados.
Art. 1163.O Se o doador, em cliitracto de casamento,
dispozer da sua terça legal, entender-se-ha que reserva a
terça da terça.

nota ao artigo 1174')


(Vid.
Em a nota ao artigo 1174.1, pag. 410 do 2.0 volume, declarimos
applicaveis os artigos 141;2.' e 1463.' a quaesquer doaçJes em casa-
mento, quer entre esposados, quer feitas por terceiros aos esposados.
Mas reconhecemos agora que os dois artigos retpeitam unicamente
ás doações feitas por terceiro, e que os artigos 1175.1 a 1177., re-
lativos às doações feitas por terceiros aos esposados, hão de ser com-
binados com os artigos 1462.0 e 1163.'
Appliear os artigos 1462 e 14t33.1 ás doações entre esposados
importaria o traustorao completo do legislado nos artigos 1166.1 a
1173.-, onde esto consignadas as disposições reguladoras das doa-
ções entre esposados.
As doações entre esposados estão pois fóra do alcance do artigo
1462.°, collocado sob a rpigraphe- das doaçces em geral-, e ho
de ser regidas pelos artigos 1171.° a 1173.'
As regras das doações em geral apenas são applieadas ás doa-
ções entre esposados no que não for rontrario ao disposto n'aquella
secção, artigo 1174.'
Assim os esposados, que se doam todos os bens havidos e por ha-
ver. renunciam por esse facto á disposiçdo da terça. 1
E ainda a doutrina que resulta da comparação do ceodigo com o
projecto primitivo, onde os artigos 1522.' a 1526.', correspondentes
aos artigos 1460.' a 1464.', crntinham precisamente as mesmas dis-
posições com a differença de não virem no artigo 1524.' do projecto
as palavras - em contracto de casamento -, que foram introduzidas

1 Aecordão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de junho de


1893, Gazeta da Relaçdo de Lisboa, 11.0 anno, n.' 28, pag. 221.

L, a
ARTIGOS 1464.^, 1465.', 1466.0 E 1467.0 87

pela eonmmissão revisora no artigo 1462.^ do codigo; pois no pro-


jecto o artigo correspondente ao artigo 1464. abrangia todas as
doações, fossem ou não para casamento; e não é de presumir que a
coimissI5o revisora, com o aecrescentamento d'aquellas palavras,
quizesse prejudicar as disposições fundamentaes sobre doações entre
esposados.

Art. 14t. Se o doador se finar set] dispúr da reserva


legal, pertencerá esta ao donatario.
unico. Se, poréni, a reserva tiver sido feita por esti-
pulação expressa tio acto da doação, e o doador se finar
sem dispòr d'ella, pertencerá a dieta reserva aos seus her-
deirs legititíos dentro do quarto gráu, e só na falta d'estes
accrescerá ao donatario.

Ila de applicar-se o artigo, desde que está formulado em termos


genericos, a todas as doações e não simplesmente á doação em ca-
samento.
A reserva na falta de estipulação expressa passa ao donatario por
se presumir essa a vontade do doador; e no caso de ter sido expres-
samente estipulada, como esta previdencia revela o desejo de não
transmittir a reserva ao donatario, passa para os herdeiros legiti-
mos, mas só para os que estiverem dentro do quarto grAu por di-
reito civil, porque apesar da estipulação expressa prestme-se que o
doador não preferiria os parentes remotos, que estão além do quarto
grAu, ao donatario que elle beneficiou.
Foi a eommisao revisora quem, logo nos trabalhos da primeira re-
visão, introduziu esta distincção, que o projecto primitivo não
reconhecia expressamente, porque o artigo correspondente (1526.)
era redigido nos seguintes tertis: -Mas se o doador se finar sem
dispór da reserva, perteneerá esta aos seus herdriros legitimos.
dentro do quarto grãu, e sómente accrescerá ao d< natario na falta
d'estes..
A reserva em testamento vae sempre aos herdeiros porque só lhes
não pertencem os direitos expressamente exceptuados artigos 703.,
163i.^ e 2014.0

Art. 1465.° A doação caduca não sendo acceita em vida


do doador, salva a disposição do artigo 1478.1

(Vid. nota ao artigo 1169.)

Art. 1466.1 Se a doação não for acceita no proprio acto,


e a acceitação não for inserida tio contexto do documento,
do qual consta a doação, será depois averbada n'elle.
(Vid. nota ao artigo 1176.')

Art. 1467.° Sendo a doação feita a varias pessoas con-


9ri1-?

88 ARTIGO 1467.0

junctamente, não se dará entre ellas o di reito de accrescer,


salvo se o doador expressatilete houver declarado o con-
trario.
(Vid. artigos 1852.- a 1854 ° e 1972.1)
Reconhece o codigo o direito de accrescer, isto é, marca o destino
a dar à herança ou ao legado que caducar por ter fallecido o her-
deiro ou o legatario, ou por ser insuecessivel ú abertura da herança,
ou recusar a sua quota antes de a ter aceeitado, mandando entre-
gar aos outros contemplados o quinhão dos que não quizeram ou não
poderam acceital-o.
Depois da acceitação qualquer renúncia A porção havida pelo tes-
tamento reverte já em proveito dos herdeiros ou dos credores do
que aeceitou, e não em proveito dos outros instituidos.
Por falta de lei expressa offerecia graves duvidas antes da pro-
mulgação do codigo a applicaçào do direito de accrescer.
Em direito romano acerescia qualquer porçào caduca da herança
aos co-herdeiros instituidos, e nunca aos herdeiros legitimes, em
homenagem ao principio «emo pro parte testatus, pro parte inteeta-
tus, decedere protest..
Nos legados era tambem admittido o direito de acecrescer com
fundamento na vontade presumida do testador, se os legatarios ti-
nham sido nomeados conjunctamente re et verbis, isto é, rocati ad
eandem rem, e não simplesmente re ou rei-tis, e reputava-se conjuncta
a nomeação quando os instituidos eram chamados à successào sem
partes designadas, ou com a declaração de partirem por egual.
Entre nós era geralmente recebido o direito romano até que Mello
Freire nas suas obras immortaes o combateu, repatando supersti-
cioso e repellido pelas disposições das leis de 18 de agosto e de 9
de setembro de 1769 o fundamento do direito de accrescer entre
herdeiros, e por maioria de razão entre legatarias, visto ser a posi-
ção do legatario menos favorecida que a do herdeiro.
Lobio, Correia Telles e Liz Teixeira, negavam o direito de aceres-
rer entre herdeiros, e admittiam-no entre legatarios conjunetos, por
se presumir ordinariamente vontade mais faooravel do testador para
com o co-legatario, do que para com o herdeiro; e Coelho da Rocha
reconhecia o direito de accrescer tanto nas heranças como nos lega-
dos, no caso de não ter havido designação de partes para cada um dos
herdeiros, e de terem sido nomeados csnjictaamente os legatarios.
Porém a opinião mais geral no fóro, antes da promulgaçào do
codigo, era pelo direito de acerescer, tanto nas heranças, como nos
legados, quando os herdeiros ou os legatarios tivessem sido nomeados
conjuncti re et cerbis, isto é, nomeados ao mesmo tempo e para a
mesma cousa t.
E certo que com os progressos da civilisaçãzo perdeu o direito de
accrescer o seu primitivo caracter que era derivado da impossibi-
lidade das duas suecessôes, que hoje representa apenas a masnifes-
taçào*expressa ou presumida da vontade do auctor da herança, e

t Aceordàos, da Relação do Porto de 4 de maio de 1869 e de 28


de junho de 1870, e do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de agosto
de 1870, Revista de Legislação e (ie Jurisprdencia, de Coimbra,
3.' anuo, n.' 146, pag. 675, e Direito, 2.' anuo, n.° 31, pag. 494.

à
ARTIGO 1467.0 89

que os codigos modernos o applicaras em regra tanto aos herdeiros


como aos legatarios, comtarto que uns e outros tivessem sido no-
meados conjrnetamente.
Consideremos o direito de aecreseer em relação aos donotrios,
em relação aos legatarios, em relar:io aos herdeiros, e sos reloçdo
aos testametceiros, cada um dos quacs póde deixar de adir o direito
por não querer, ou por fallecer, ou por se tornar incapaz antes da
morte do testador.
Quanto aos donatarios:
Ndo reconhece o codigo, como não reconrecia a lei velha, o direito
de accrescer entre os donatarios, ainda na doaçào feita a varias pes-
soas eonjcrnetamente na mesma cousa.
Nas doaçres rouca foi admittido o direito de recrescer, porque
nuo era indispensavel como nas dispoei es d ultima vontade pre-
veuir a quem havia de accresccr a parte vaga, se aos Lerdeiros
legitims do testador, se aos outros contemplados tio testamento,
no caso de fallecer ou de tornar-se incapaz algum dos instituidos
antes da abertura da herança.
Nas doacòes escusada era tal previdencio, porque com a acceitaçdo
fica o direito irrevogavelmete transferido ao donatario, e consti-
tuindo parte do seu patrimronio, que passa pela sua morte aos respe-
ctivos herdeiros.
Quanto aos legatarios:
Nos legados não admitte o rodigo o direito de acescer artigo.
1851 1>à o quinhão do que se tornar incapaz, ou do que o repu-
diar ou lno podór adir, aos herdeiros iustituidos ou aos legitimos,
segundo a lerança tiver de seguir para uns ou para os outros, por-
que o testador, contemplando com determinada cousa o legatario,
ião significou vontade de lhe augmentar o beneficio.
Assim legado o asufructo de todos os bens a Pedro e a Paul e
fallrcendo Pedro, ou sendo insuccessivel á abertura da herança, o, ou
não acercitando o beneficio, passa logo á morte do testador para o
herdeiro a parte do usufructo que pertenceria a Pedro, como pas-
saria por morte de Pedro se houvesse aceitado o legado, com a diffe-
rença de ir para o lerdeiro neste caso, no pelo direito dv acrescer,
mas pelo direito hereditario, em virtude do qual o instituido na
propriedade, separada do usufructo, reune o usufructo logo r morte
do usufructuario.
O se Seabra, escrevendo ia Geseta elos Tr-ibnrnaes n9 2188 sobre
o direito de acrescer, consignado no eru projecto, e que passou sem
modi taieseg para o codigo, dizia reerca dos legatario :
hRejeitrros o direito de accrescer entre os legatarios,s em beneficio
dos herdeiros instituidos ou legitimos.
«Seja qual for o legado, cjuoeti reris et re, re ou rer-itr sómente,
é sempre certo que o testador só quer beneficiar os co-legatarios na
parte proporcional da cousa legada. Se o co-legatario não póde ou
não quer recolher esta parte, uro ]Ia razdo alguma que justifique a
preferncia dada ao co-legatario contra o herdeiro. Esta parte deve-
lhe pois ser adjudicada>
As disposiçdes dos artigos 1853 e 185-4 , negando aos legatarios
o direito de acerescer, so tambem applicaveis á hurpothese da dis-
tribuiçào da herança toda em legados sem instituiçdo
de
porque tambem n'este caso a presumpçào é que o testador herdeiro, quiz dar
a cada um dos legatarios só a cousa certa, ou o valor
determinado,
com que os contemplou em testamento, e nada mais.
Nem no caso de ser indivisivel ou de dão admrittir commoda di-
x
23
90 ARTIGO 1467.1

viso a cousa legada pertence ao legatario o direito de accrescer.


Se é legada a Pedro e Paulo una fabrica, e Pedro fallece antes da
abertura da herança, tem Paulo apenas a escolher, ou ficar com a
fabrica em propriedade perfeita dando aos herdeiros o valor do qui-
nho de Pedro, ou entregar-lhes a fabrica e exigir d'elles o valor
do seu quinho.
Sb no caso de pesar sobre o legado a obrigaçlo de alguma pei-o
ou de outro qualquer encargo, e de este caducar, é que fica o lega-
tario senhor da cousa sem obrigação de pagar aos herdeiros o valor
do encargo, que mào supportou, e que teria de supportar se eào ea-
ducasse.
Apesar de já se ter sustentado que o artigo 1853.- nas palavras
'se os legaarios não qcizerem ou não poderem receber o respectio le-
gado, se refere só i hypothese de caducarem odos os legados, e não
simplesmente á hypothese de caducar algum on alguns dos legados,
porque alis seria escusado repetir no artigo seguinte ,entre legat-
iios no harerá direito de accrescerr, é certo que o artigo 1853.
se refere a ambas as hypotheseo, tanto á de caducarem alguns, corno
1.
á de caducarem todos os legados, e que a repetição do mesmo pre-
ceito eme artigos separados no é para estranhar no codigo.
Quanto aos herdeiros:
t direito de accrescer só póde verificar-se nas sucessles testa-
mentarias, porque nas successles legitimas suecede o herdeiro por
direito proprio ou por direito de representaçào, e nunca por direito
de accrescer.
Na sessão de 13 de dezembro de 1862, onde se votou a doutrina
do artigo 185Gm:, em substituiçlo do preceituado no artigo 1990.: do
projecto primitivo, deliberou a comnmisso revisora deixar esta doa-
trina no tngar em que no projecto estava collocada, eom ofudameto
de ser smmemte applica el m sucesso tesomenaria.
Na successo legitima, artigo 1972', repudiando a herança o
sendo inseccessiveis om.parentes mais proximos, passa a síccessao
aos pareutes do gráu subsequente, e repudiando tão sómente algum
dos co-herdeiros, recresce esta parte à dos outr .s co-herdeiros.
11 Mas n'estes casos verifica-se a successão por direito proprio, e
nào pelo direito de accrescer.
t direito reconhecido no artigo 1972.' nio reune as eomdiçles do
direito de accrescer, regulado nos artigos 1852" e seguintes.
Na legislaçlo romana, emi que o direito de accrescer entre os her-
deiros se fudava na necessidade politica de nâo morrer parte tes-
tado e parte intestado, nem licito era ao testador prohibir o direito
de acemescer. Mas pilo nosso codigo artigo 1852' é permittido dei-
xar a algum legatario ou aos herdeiros legitimos, ou a certo e de-
terminado herdeiro instituido, ou a qualquer outra pessoa, a parte
que porveutura caducar da herança ou do legado
Pelo nosso direito, pois, mào podendo ou no querendo algum her-
s deiro adir a herança, ou algum legatario adir o legado, passa, em
r razo da presmmima vontade do testador, o quimiiuo d'este herdeiro
i ou deste legatario para os herdeiros instituidos, em proporção das
suas quotas hereditarias, e no para os herdeiros legitimos, artigos
1852' e 1853.'
O direito dos herdeiros instituidos a haver as partes vagas, tanto
dos co-herdeiros, artigo 1852.', como dos legatarios, artigo 1853, justi-
IN. ficava-o o sr. Seabra no citado m.n2188 da Gazeta dos Trib-naes nos
a seguintes termos:
.O principio romano da indivisibilidade das heranças, de que nin-
r
ARTIGO 1168.0 91

guem póde morrer parte testado e parte intestado, é hoje inadmis-


sivl; de accordo; mas o priaipio da vontade presumida não é des-
truido pelas razes adluzidas.
«o testador que, tendo herdeiros legitimos, os pretere completa-
mente em seu testamento, desherda-os tacitamente e revela de sobejo
a sua predileeço pelos instituidos.
«Isto é innegavel, e é por conseguinte forçoso conferir a estes o
acrescido.
. Mas o testador devia saber que a lei chamava os lerdeiros legi-
timos ia falta de disposição.
«,Saim duiida o testador devia conhecer a lei; mas esta lei só chama
os legitimos na falta dos institidos, e aqui ha instituidos, e o testa-
mento deve entender-se, uma vez que a lei o admitte, segundo a in-
tenço manifesta do testador, sempre que occora alguma duvida, o
a mesma lei assim o determina.
«Mas a ca-ua dos legitims é mais favoravel que a dos instituidos?
Sem duvida pelas razes de parenteseo. Mas esta razão desapparece
aos olhos da lei, quando começa a livre disposição do testador, a
que a lei sómente se substitue dentro de certos limites, e d'alli para
decate a lei só attende i vontade expressa ou presumida do testador.
«3emais o concurso unanime de quasi todas as tegislaçles antigas
e modeenas ajuncto um certo peso sobre esta opinião que não deve
desprezar-se sem razòes eoncludentes».
Etfeativamette os artigos 152,0 a 1854, 19683. e 1972 0 não per-
mittes duvidar de que o testador só chama successão os herdeiros
legitimos na falta (te Herdeiros testamentrios.
Já na imprensa juridica se discutis se aos herdeiros institíidos
accresce sempre a parte do que não receber por incapaz, ou essa
incapacidade seja anterior ou posterior i feitura do testament , por-
que o artigo 1852 nas palavras - ot se torar incapaz de a rece-
ber-, parece referir se unicamente i incapacidade posterior á fei-
tura do testamento.
Todavia, apesar da incorrecta redacção do artigo 185.° não póde
duvidar-se de que a parte do incapaz deve sempre pertencer aos
herdeiros instituidos, iu a incapacidade existisse já ao tempo do
test inuto, ou proviesse de causa posterior, pois não se descobre
razão para dar aos herdeiros instituidos o quinhão do incapaz, quando
a incapacidade for posterior ao testamento. e destinal a para os her-
deiris legitimos, quando a incapacidade já existisse, visto ter sido
em todo o caso pensamento do testador dar preferancia aos herdei-
ros instituidos sobre os herdeiros legitimos.
O proprio artigo 1853-, dando aos herdeiros instituidos o direito
de receber o que os legatarios não podérem receber, claramente lhes
garínte o direito de accrescer, quer seja anterior, quer posterior á
feitura do testamento a incapacidade do legatario, e o direito de
acareacer nio péde ter significação ditlerente, segundo o incapaz é
herdeiro ou legatario.
Quant aos testaiPeitros:
lia tambei logar ai direito de accrescer entre os testamenteiros
artigo 1907.-; pois, se o testador reserva certa remuneração para o
encargo da testamentaria, justo é que d'ella se aproveitem os que
se sujeitaram ao encargo.

Art. 1468.° 0 doador não responderá pela evicção da

áLIII-
Y

92 ARTIGOS 1469.', 1470.', 1471.' E 14720

corsa doada, se a isso se não obrigar expressamente, sal-


vas as disposições dos artigos 1 42.° e 113.°
§ unico. O donatario ficará, porém, subrogado em todos
os direitos que possam competir ao doador, verificando-se
a evicção.
(Vid. nota ao artigo 1046.')

Art. 1469. Se a doação for feita com encargo de paga-


mento das dividas do doador, entender-se-ha essa clansula,
não havendo outra declaração, como obrigando ao paga-
mento ilas que, ao tempo da doação, existirem com lata
auteulica ou athenlticada.
Art. 1470.0 Na falta de estipulação a respeito das divi-
das do doador, observar-se-ha o seguinte:
S 1.° Se a doação for de certos e determinados bens, o
donatario não responderá pelas dividas do doador, excepto
no caso de hypotheca ou de fraude, em prejuízo dos cre-
dores.
ý 2.° Se a doação for da totalidade dos bens, responderá
o donatario por lolas as dividas do doador, anteriormente
contrabidas, salvo havendo declaração em contrario.

A lei, partindo do principio de que primeiro está pagar do que


doar, prefere o direito dos eredoces, relativo a evitar damno, ao di-
s.. reito dos donatarios tendente a procurar interesses artigo 13.
(7 Respondem os bens doados só pelas dividas anteriores á doação,
porque os credores posteriores não podiam contar com bens que ao
tempo da divida no cotavam já no patrimonio do doador, e ainda
assim só quando os bens do doador não são suflicientes para o paga-
mento d'essas dividas, salva a hypotese de hypotteca registada ou
de fraude.
A responsabilidade abrange todos os bens doados e até o valor
dos bens de tqne o donatario já se tente desfeito, mas nao vae nunca
além do valor dos bens doados, visto não se tractar de dividas pro-
prias do donatario.
(Vid. nota ao artigo 1033.')

E
V
Art. 1471.0 As doações de moveis ou dinheiro, feitas
pelo marido, sem cotsetilimento da mulher, serão levadas
etn conta ta meação d'elle, excepto sendo remuneratorias
ou de pouca importancia.

(Vid. nota ao artigo 1118.)

Art. 4472.' A doação legitimamente feita, seja de que


ru

ARTIGO 1472.- 93

valia for,
prodizií tílodos os seus efflTcos juiriliíos, inde-
prndenltemete de itSiululO ou ie qlqiuer mtra firnia-
lidade poslorior à mestima díaíirço, salvo o íjte fica disposto
no § utilco do artigo 1459.1

Eslã feita com o preciso desenvolvimento no preambulo da lei de


25 de janeiro de 1775 a historia da insinuação, que tinha por fim
evitar a captação das doaçes pelo dolo e pela fraude, e que ainda
hoje ter de ser apreciada em qu e stões pendentes, ou que de futuro
se suscitem, ácerca de doações feitas na vigencia da lei anterior.
Teve aquella istituição por origem uoa providencia do imperador
Constantino, o qual, para oceorrer ds fraudes e ão sggestõcs causa-
das por dolosas malbinações para extorquir beneticios, exigiu geral-
~nte em todas as doações de qualquer qualidade, quantia e natu-
reza, a intervençào salutar da atctoridade publica para evitar as
extorsões e as violencias dos grandes e dos senhores feudaes nas suas
terras.
Depois o imperador Theodosio, moderando o rigor d'aquella coa-
stituiçào, obrigou a isinuação unicamente as doações que excedes-
sem o quantia de duzentos aureos sem excepção alguma; e ultima-
mente Justiniano só mandou insinuar as doações excedentes a 500
soldos, e introduziu carias excepções.
Os povos, que fundaram sobre a legislação romana a sua juris-
prudencia, adoptaram, uns a constituição de Constantino, outros a de
Tiseodosio, e outros a de Justiniano; e entre nós foi adoptada na
Ordemaçõo Manuelina a constituiçéo de Theodsio, unicamentc com
a excepção das doações regias aproveitada da constituição de Justi-
niano.
O systema da iusinuação das doações era já assim reconhecido no
direito romaío, mas por modo muito differente do nosso, não só quanto
ds formalidades a observar, mas tambem quanto as auctoridades
que istervinham no processo.
A nossa legislaçào, seguindo no caminho de todas as que reconhe-
ceram a formalidade da iusinuação, como meio de evitar a capta-
ção das doações pelo dolo e pela fraude itrcou um istervallo entre
síoaçâo e a insinuaçõo para dar tempo aos doadores de corrigirem
por meio da retiexâo as precipitações em que porventura tivessem
raido no acto da doação.
Pela Ord., liv. 4 o,tit. 62.' pr., todas as doações, assim de moveis
coso de raiz, eoo de is e outros conjiíotaueste, que passassem
de 120,00 réis sendo feitas por homem e de 60,000 réis sendo fei-
tas por mulher, quer solteira, quer viuva, quantias depois elevadas
ao triplo pelo alvari de 16 de setembro de 1814, calculado o valor
ao tempo da doação, eram nllas no excesso d'aquella taxa, não ha-
vendo insinuaço.
Ainda as doações inferiores à taxa da lei, quando feitas ao mesmo
tempo pelo mesmo doador e ao meso dnatario, se todas reunidas
excediam a taxa legal, ert m cousideiradas unia só doação por no se-
rem feitas em diverso tempo, e, portanto, sujeitas á iusinuaçào.
Da formalidade da insinuação nem uoa só dotçíco excedente
áquella taxa era pela Ordenaçào dispensada. MIas foi-se isntríduzindo
no foro tal abuso de excepções que a lei de 25 de janeiro de 1775,
fulinando acremente no preambulo essas limitações mormente com
relaçâo a doações pias, e a opiniào dos doutores para debellar a

L,
94 ARTIGO 1472.

qual não bastâra a lei lo 18 de ag'st de 1769, ordenou que todas


e quaesquer doaçJes de,, alquer qi-sidule e altcreza fossem nullas
e de nenhm efeito no excesso da taxa, não sendo insinuadas dentro
do terio legal, e aboliu assim as exeepçées accuíidais pelos
casuistus e ieCiptores foreoes.
Exceptuou apenas dl insinuação as doaçJes regias, exeepçio reco
shecida na Ordeuação Manuelina, e ,a-i/osuawd omittida na Orde.
nação Philippina, e as doaçoes reunseratorias a pessoas estranhas
á familia dos doadores provada previameate a verdade e a equiva-
lencia dos serviços.
Posteriormente o assento de 21 de julho de 1797 exceptuou tam-
bem da insinuaçào as doações à conta das legitimas, por não se re-
putarem rigorosa liberalidade, e as doaçJes de prazos de vidas com
reserva de usufruct,, por se julgar neste caso proveniente o direito,
não do nomeante, mas do senhorio, como se declara na provisão de
17 de agosto de 1801, collecçâo do dr. Digado, que até certo ponto
revoga a provisão de 10 &l novembro d," 1775.
Com quanto alguns sustentassem que a doação de prazos com re-
serva de usufructo só era exempta de insinuação quando feita por
paes a filhos, e À conta das legitimas, outros pelo contrario jul-
gassem desnecessaria a issinuaçào lias doaçJes em geral de prazos
com reserva de usufructo, e o assento de 21 de julho de 1797, inter-
pretativo da lei de 25 de janeiro de 1795, só dispensasse de insinua-
çào as doaçJes de prazos de livre nomcação com reserva de usufru-
eto, quando feitas pelos paes, o certo é que a jurisprudecia dis-
pensou sempre de insinuação as doaçãea dos prazos de vidas com
reserva de usufructo, quaesquer que fossem os pessoas beneficiadas.
As doaçdes <orOis causa eram exempras de insinuação em virtude
da resolução de 10 de outubro de 1805, que no vem na collecção
ç das nossas leis, mas que é apontada no repertorio de Fernandes Tho-
maz, vero isiuaçdo, e no tomo isId sice clsronologico de João
Pedro Ribeiro.
Negaram alguns o caracter dl regra geral à resoluçâo de 10 de
outubro por se referir a certa e determinada doação, e por não se
ter publicado ecarta que lhe deese força legislativa e declarasse nos
termos da Ord., liv 2.^, tit. 40 que valeria mais de um ano, por-
que as resoluçGes sobre consultas dos tribunaes não estavam no caso
dos assentos da )'asa da Supplicaçâo que tisslsam força legislativa con-
* forme a Ord., liv., L', titulo 5.", 5 .", e a lei de 18 de agosto 1769
2., 5 e 14."
Na pratica, porém, nunca entrou em duvida que as doaçôes sí,,rtis
cínsa dispensavam is issisnUaçâo para verificar a espontaneidade do
doador, porque, tendo a natureza de disposiçêes testametarias, a
todo o tempo o doador podia revogal-as como entendesse, e acabar
assim com a disposição porventura feita em razão de cossuio, engano
ou coacção.
Finaleste, foram pela lei de lii de julho de 1853, artigo 9. ý.",
tambi cxi'xmpto de insinuaçào as doaçJes que o rei fize¯- se de seus
bens particulares; e já a lei de 19 de julho de 1853 tinha dispen-
sado da formalidade da insinuação as doaçsui que tizesse ao esta-
belecimento a imperatriz do Brasil, viuva, duqueza de Bragança,

1 AcCirdão do Supremo Tribunal de lístiça de 13 de julho de


1886, Bole/io dos Tiribouaes, 1.° unso, si. 27. pag. 591.

À
r. -.

ARTIGO 1472. 95

quando a auctorisou a estabeleer no Funchal o hospici da prinae:a


D. Aaria Aamelia.
Da iasinuaçào quizeram alguns tambm exceptuar as doações ma-
leimaiaiS entre esposos a ptrtexto de loo serem rigorosas libera-
lidades, visto ser onerosa a eausa do matrimonio; e nunca chegoa a
haver jsrisprudacaia assente sobre caso. -
o
No processo de insiuaçào a aucti idade publica confirmava a
doação, precedendo averiguaçõcs sobre a espontaneidade do doa-
dor, com o fim de lhe dar tempo a reflectir, e assim obstar á preci-
pitaçâs, e aos abusos e conluios, com que poderia ter sido illudida
a sua boa fé.
A ord., liv. 4o, tit. 62, 1%' dizia: ,E a insinuação s. fará. man-
dahdo tirar inquirição, em que primeiro será perguntado o que fez
a doação, se a fez por laduzimento, arte, engano, medo, prisão, ou
outro algum ciluio.
1'r direito romano corria a insinuação das doaçnes perante as
justiças terri toriaes; e petas nossas leis era da aampeteacia do De-
sembargo do taço, como dependencia itinrediata da auctoridade real.
Ulltimamente com a ratinrção do Desembargo do laço, em con-
sequencia das reformas administrativas e polticas promtgadas com
o systema liberal, passou para os administradores de concelho; e pe-
rante esta auctoridade corria o processo nos termos do artigo 254.'
n 1.° do codigo aministrativo de 1842.
Começava a insiuuaçào por um requerimento ao administrador
de concelho para inquirir o doador, sobre a espontaneidade com que
fizera a doação, bem como alguns vizinhos que tivessem razão de
saber se a doaçào fâra devida a mera liberdade, ou a coaeçao,
sedurçâo ou fraude : e confirmando o doiador a doaçào, e não dando
as testesmahas depoimentos que fizessem suspeitar de maotivos ille-
gitimos, proferia o administrador de concelho sentença, julgando
isituada a doaçao.
Não significava a inthrvençào da auctoridade publica vèrdadeira-
oente confirmação de doação, porque requerida em tempo a insinua-
ção, satisfeitas as formalidades da lei, veriticada a espontaneidade
da doação, e não havendo sentríça de interdicção nem iudirios de
demrniia, não podia negar-se a itsinuaçào.
Mas para se passar o alvará de insinuaço era indispensavel e
substancial a declaração do doador de que confirmava a doação, no
bastando ter-se verificado a espontaneidade no acto de doar.
O mesmo era já no tempo de regimen absoluto, em que o respectivo
serviço estava coíunettido ao Desembargo do Paçe, porque aOrd., liv.
4.', tit. 62, 2.-, com quanto faltasse de doação «por sós confirmada
e approradaa dizia logo em seguida «A qual inquirição vista por
nós ou pelos ditos desembargadores, se por cila se mostrar que foi
feita bem e como devia, e que aquelle que a fez é contente. que seja
por nós confirmada, ser-lhe 'a dada nossa carta de confirmação, e
de outra maneira ausoa.
Do despacho do .administrador de concelho, que recusasse a insi-
nuação, cabia recurso coítentioso para o cnselho de districto, e
d'sali para o conselho de estado.
Para o começo e conclusão do processo marcava a lei de 25 de
janeiro de 1775 a.' 2. prasos fatres, salvo provindo a demora de
culpa da auctoridade publica e no de omissão dos interessados, e
que oram diftirretes, segundo as doaçóes se faziam no continente
do reino, lias ilhas adjacentes, na America, na Africa ou na Asia.
Passados os prasos legaes só podia fazerse a insinuação em be-

t.
q
"
96 ARTIGO 1472.

nefici de menor que invocase, nos termos da Ord., liv. 4., tit. 7.?,
j 2.', o renefirir, d restitriço, segundo delarO a pOrtaria de 9
de fevereiro do 181J.
Fui muito qucstiojado se a isinuaçào era propriamente acto
de administraçâo ou se tinha a natureza de decimo controvertida,
e se o poder judicial tinha jurisdicçào para conhecer da validade
da insinuaçào, allegada a coacçào, o erro, eu a fraude.
Era, porém, jurisprudencia forense que o alvará de irsinuaçào não
tolhia os direitos de terceiro contra a doação, nem impedia os jui-
zes de conhecer da validade ou nullidade do contraeto, e que devia
ser respeitado o alvará de insinuaçào, logo quie se apresentasse re.
vestido de todas as solermidades externas, visto ser acto do poder
executivo que não podia ser coutrovertidío no firo judicial, mas que,
impugnada a doaç o ou a insinuação com fundamento de vicio no
corsertirentr, corpetia o conhecimento da questão aOs tribunaes
judiciaes, e não ao poder administrativo, porque se tractava já da
apreciação de direitos individuaes comprehendidos na esphera do
direito civil.
Proscreveu o codigo esta formalidade que importava a interven-
ção da auctoridade publica em negocio rmrerani-te privado. pela
mesma razão por que acabou co a formalidade da confirmaçào re-
gia nas perfilhaçóes.
Nos governos de opinião ião deve a auctoridade publica intervir
nos negocios de interesse reramente privado, nemr póe a lei presu-
RI mir precipitações e irrflectidôrs do doador, desde que exige provas
solenrres da constitiçuo da doação; e, para o caso de corrção, de erro,
ou de frurle, lia os meios ordinarios de direito.
O sr. dr. Pas ainda insilti na necessidade de insinuar as doa-
ç5es. Mas respondeulhe o sr. Scabra que iáo acceitar a a insinuaçào
pela, rarzcs que tinha dado ria sua obra, intitruada Prilosophia de
C direio de propriedu, pagina 298 e sguinrtes
n
Nos dorainios ultrunarmos já com o decreto de 17 de outubro de
185 artigo 348 tinha acabad,, a formalidade da insinuaço.
Estindo a correr o praso para a insinuaçiio rio tempo da promul-
gaçio do codigo, nãO era já precisa a formalidade da iusinuaçào,
iem mesmo podia já ser insinuada a doaçào, visto ter a lei nova
acabado com a jurisdicçio da auctoridade encarregada do processo.
a.
"ui corrente, rm seguida áprourrigaçâo
i do coligo civil, que as
Y doçtrrs srjeitas a isinuaçào e nr iirnuadas eram mumlas ipso jure,
e que nullrs deviais os juizes declaral-as no excesso logo que do
proprio titulo c rostasse o valor excedente á taxa legal, calculado
pela cuecha do contraeto, porque a fdrmr dos actos juridicos é re-
gulada pelas leis vigentes a tempo da sua celebraçào, e porque
nas lIia de processo, iuricas que começam a reger desde a sua pro-
mulgui-o, .10i estáo cmprrhendids as fórrmlas dos actos juridicos ;
e tanto q ue nã fez jurioprudnvia a decisão do Suprero Tribunal
de Juitiça r que neg:ra o direito de arnrllar depois do codigo civil
por falta di iusinuaç o aa doações rnrtiriores.
Depois começou de julgar-se rure a, doaçcs sjeitas a insiuroção,
e nio insimiadas, deviam prodruir todos Os efieitos juridicos em
quanto nmão fosser rescindidas pelos ueios competentes, e que po-

r Acordão rle 21 de fevereiro de 173Diario do Govern, 1.° 94


do mesmo ruao.

.r4®
A\RTle tJt 11777 e 1171. 97

diam ser itacada- tanto por aceso, Como por excepção nos termos do
artigo 693.a do presente codigo, e do artigo 3.o o 5.° do codigo de
processo civil que dá o direito de deduzir por excepção a nullidade
do contracto ou do titulo em que se fundar a acçào.
Hoje poriem com o fundamento de qoe o artigo se refere is doa-
ções anteriores à promulgação do codigo civil, de que na falta de
relaimçao pendente ao tempo da mesma promlgaçac n0o ha offensa
de direitos adquiridos, e de que o preceito do artigo 1472. foi coo-
signado no codigo precisamente para salvar as doações anteriores,
porque para as posteriores bastava o artigo 1459.. ten-se encami-
nhado a jurisprudencia no sentido de não poderem ser anautladas
depois da promulgação do codigo, om por acção nem par excepção,
com fundamento na falta de insinuação as doações anteriores', com
quanto em bom direito nsâ possa a lei posterior, sem retroagir ex-
pressamente, dar validade ao que anteriormente estava nullo.

Art. 1473.? O doador pôde estipular a reversão da cousa


doada, col tauto que seja a seu favor e não de outras
pessoas, salvo nos casos em que a substituição testamen-
tana é pernittida.
Art. 1474.° A reversão estipulada pelo doador a favor
de terceiro, com quebra da disposição do artigo antecedente,
é ulla, mas não produz a nullidade da doação.

A reversão está sujeita ás mesmas regras que a substituição. O


doador pôde fazer substituiçes vulgares, pupillares, quasi pupillares
e Sideiconmoissarias, nos mesmos termos em que as póde fazer o tes-
tador artigo 1858. e seguintes.
Já assim era por direito romano. Voet, nos seus commetarios as
Pandectas, fasdaudo-se n'algumas leis do Digesto e do codigo, dizia:
Xáe tantus utísa otste, sed et acte ieter ricos, ideicoeseissa ií-
duei posse, nulla dubitatio est; dum donaltioni rern adjicile slipu-
latio de rebes donatis alterae personae restiluendis... Et toe ipsuna
eo'ribs quogtae hodiernis probatee esse, qeod nempe acto inter ecivOas,
fideicomamissa incrti passe, praecipee pactis dotalibus est.e
Nos patrimoios ecelesiasticos, feitos por pessoas no ascenden-
tes, era vulgar a clausula de pasoarem por morte do elerigo os bens
doados para o doador.
A reversão a favor do doador no caso de sobreviver ao donatario
é digna do favor das leis, visto não se desapossar o doador do que
é seu senâo por consideração com o individuo, 3 ierte do qual se
lia de realisar o direito de reversão.

t Accordãos, do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de dezembro


de 18s9, de 7 de abril e de 4 de agosto de 1891, de 16 de fevereiro
de 1892 e de 28 de junho de 1898, e da Relação de Lisboa de 22 de
abril de 189G, Boletim dos Tribnaes, 5. ano, n" 190, pag. 245,
7y aauo, n-, 268, 273 e 285, pagg. 86. 109 e 357, e Gazeta da Rela-
çAo de Lisboa, 11. anuo, n. 18, pag. 137, e 12. ano, .- 10, pag. 78.
Toxo 111 7

LI.
1
98 ARTIGO 1475.0

Reconhece o codigo, além da reversão convencional, um caso de


reversão legal no artigo 1177.", onde declara caducas as doações
feitas por terceir os sos esposados an or ira o por morte o caso
de sobrevivencia do doador ao dotatari e aos filhos e descendentes
d este.
Mas a favor de terceiros não pede o doador estabelecer a rever-
são senão nos casos em que a substituição fideicommissaria é per-
mittida; e n'este caso não pôde o doador, como não pôde o testador,
fazer mais de tí,ía nomeaçào.
Hoje não pôde o doador, como não pôde o testador, determinar a
transmissão sucessiva de todos ou de parte dos seus bens a favor
de duas pessoas. O doador ou o testador que dá ou deixa os seus
bens a Paulo nada pôde determinar ácerca do destino d'esses bens
pela sorte de Paulo, porque fóra das excep raes marcadas no artigo
1867.o expira completamente o direito de diepôr com a designaçao
da primeira pessoa a quem os bens devem pertencer.
Mas pôde o do:dor, como o testador, substituir diferentes donata-
rios para a hypothese de algumí não querer ou não poder arceitar,
artigo 1858.°, e substituir pupiltrmente o descendente para o caso
d'este fallecer no estado de incapacidade, srtigos 1859. a 1863.°,
como póde nomiear e substituir muitos usufructuarios, com tanto
que sejam todos vivos ao tempo da constituição do usufructo, artigo
2250.
Na antiga jurisprudencia tinha o direito de substituir chegado
ao maior excesso e abuso. O codigo acabou com semelhante estado
1.. de cousas, quer nas doações, quer nos testamentos.
A substituição em doação exige a acceitação apenas pelo gravado,
sem necessidade de intervenção do fleicommissario, porque a esti-
pulação em proveito de terceiro, que não concorreu ao acto, reputa-se
apenas condição da doação feita ao grarado.

Art. f4 . Os bens doados, passando, pela clausula de


o
reversão, para o poder da pessoa ou pessoas a favor de
lO
'3
quem tal clausula foi estipulada, passam livres de quaes-
F quer encargos, que lhes tenham sido impostos no tempo
em que estavam em poder do donatario.
A rlausula da reversão nas doações dá ao donatario, como a sub-
stituição nas instituições dá ao instituido, os direitos de simples
usufructuario artigo 1873.-, visto serem, tanto os donatarios, como
os instituidas, encarregados de ,oservar os bens, e de os trasmittir
por sorte, com prohibição de os alienar, ou de os onerar com bypo-
tlrecas, ou com qutesquer outros encargos.
Os fiduciarios, como são pelo codigo considerados usufructuarios,
não gosam da particula alguma do direito de dispJr, e por isso ces-
sam os encargos por elles impostos com a cessação do usufructo pela

1:
regra -resaiio jure concetentis reslriturjpis concessm.»
Na reversão legal na lypothese do artigo 1177:, como na revo-
gação por superveniencia de filhos por ingratidão, e por inotliciosi-
dade, revertem os bens uo estado em que se acharem ao tempo da
reversão, subsistem os encargos sobre os bens doados, e fica apenas
salvo ao doador o direito de expurgação com regresso contra o do-
natario, artigos 1484§ 1 , 149.- e 150o.
ARTIGOS 1476., 1477. 1478.' e 1479.- 9.9

Na revrsâo covencional, porém, voltam os bcns inteiramente


livres de encargos para o doador ou seus herdeiros.
A raoo da diternça nos ditos entri a reverno legal e a re-
versão reivincion raal ara.
Na reverso legal, como foa diiados os bens seso condição de
raupocie algorna, respeitan-se as hype ecas e quaesquer encargos,
costiinidos snre, os bins doados 5 registados aíterionrmite á re-
claumçso jrIlii l contra as d içrcs.
Na reversão convencional, como a estipuação da codição resolu-
toria é patente, nenho encargo pôde ficar subsistente, porque é
eoosequceia de condição resolstoria a revers:éo, como nos con-
tractos com a condição de se haverem por desfeitos desde certo
farto ru acontecim't eo, verifida a odiçroí cada ui dos econ-
trahentrs restituido Os direitos que tinha niooiento do contracto,
se out:a cousa não tiver sido estipulada artigo 660.-, porque tercei-
ros frem desote dos olhos os encargos e as condições da transmissão
dos bons.
A palavra encargos» na sua generalidade compretende, aléoo dos
onus reres, as hypotheceas que tambem são consideradas encargos.

SECÇAO 11

Das pessoas que poden fazer ou receber doações

Art. 1476.° Podem fazer doações todos os que podem


contractar e dispôr de seus bens.
Art. 1477.° Podem acceitar doações todos os que não
são especialmente itibidos d'isso por disposição da lei.

(Vid. nota ao artigo 643.-)

ArI. 1478.o As pessoas, que não podem contractar, não


podem acceitar, sem auctorisação das pessoas a quem per-
tence concedel-a, doações condicionaes ou onerosas. Porém
as doações puras e simples, feitas a t aes pessoas, produzem
effeito, independentemente de acceitação, em tudo o que
aproveitar aos douatarios.

(Vid. nota ao artigo 1169.0)

Arl. 1479.° Os nascituros podem adquirir por doação,

ki,
1.
100 ARTIGO 1480.0

com tanto que estejam concebidos ao tempo da mesma


doação, e nasçam com vida.
1
(Vid. nota ao artigo .') 4?

Art. SO." São nullas as doações feitas por homem ca-


sado a sua concubina. Esta ntllidade, porém, só pôde ser
declarada a requerimento da mulher do doador ou dos
herdeiros legitimarios d·ella, não podendo todavia a respe-
ctiva acção ser intentada senão dentro de dois annos de-
pois de dissolvido o mattrituoio.

Nào vinha no projecto primitivo o artigo 1480.^, introduziu-o a


commisso revisora no exame do artigo 1541.0 correspondente ao
artigo 1481.° do codigo; e coasta da nota ao artigo 1510 0 da edi-
çào de 1863, que se resolveu aceresceutar á respectiva secçào os ar-
tigos necessarios para consignar o direito de annullar as doações
feitas, pelo homem casado i sua amasia, e pelo clerigo à sua barregà,
e para declarar que no primeiro raso o direito de promover a annul-
laçào só á mulher ou a seus herdeiros necessarios pertenceria.
1 Porém, à deliberação sobre a nullidade da doaçào feita pelo ele-
rigo á sua amasia não se deu seguimento, porque houve empate
sobre a legitimidade do pessoa para intentar a acção, e nunca mais
se poz a votaçâo semelhonte assumpto.
Por mais longa que seja a posse dos bens em poder da concubina,
no prescreve o direito de anullar as doações, nem durante o ma-
t trimonio, nem antes de dois anos depois da dissoluçào do matri-
manio, ou sejam proprios ou communs os bens. Mas tambem por
mais curto que seja o periodo da posse, prescreve o direito de re-
querer a annallaçào, decorridos dois annos depois da dissoluçào do
casamento.
Nem depois de effectuada a separação judicial de pessoas e bens
a mulher casada é inhibida de requerer a annullaçào da doação á
E concubina, posto que effectuada a separaçào nem a mulher nem oe
seus herdeiros legitimarios tenham em geral interesse na fortuna
do doador, por ser talvez o caso menos de sucessào, do que de
desafrota da injuria feita ao dever conjugal.
Por que a prohibição do artigo, longe de contribuir para corrigir os
costues, poderia facitoirte ser illudida, e originar questões e plei-
tos vergonhosos, restringiu a commissâo revisora o praso para a
anmnlíaçâo a dois anos depois da dissoluçào do matrimonio, e uni-
camente ú mulher do doador e aos herdeiros legitimarios d'ella deu
competncia para reclamar.
Para caracterisar o coonohioato não é essencial a eohabitaço,
como nio basta a copula accidental. Depende da continuaçâo e per-
manencia de relações illicitas.
A ocçao para annullar as disposições de ultima vontade, feitas pelo
conjuge adultero em favor do seu cumplire, é mais ampla, porque
pôde ser intentada por oalquer herdeiro do testador, legitimo ou
iustituido, legitimario ou não legitimario, tendo sido o adultotio ju.
dicialmente provado antes da morte do testador.
A concubina de homem casado nada pôde receber d'este por doa-

Ai
cc
"4'

ARTIGO 1481.0 101

çKo; mas pôde receber por testamento, não tendo sido judicialmente
provado o adulterio antes da morte do testador, artigo 1771.'
A disposição testamentaria a favor do amante é probibida tanto
ao marido, como á mlher, se foi jurgado em vida rio testador o adul-
terio artigo 17711, porque para dispor por testamento tão auctorisada
está a mulher, como o marido.
Reputa-se menos immoral a disposição por morte do que a doação
entre vivos, e mesmo menos prejudicial para os interesses do casal,
visto ser a toda a hora rerogarel o testamento, e ter assim o testador
tempo para corrigir o seu erro ou a sua allucinao
Tambem a Ordenação do Reino, liv. 4.0, til. 66.- , se referia só ás
doações e não aos testamentos, o que não obstava a que os nossos
praxistas ampliassem a disposição egualmcnte aos actos de ultima
vontade, contra as boas regras de interpretação que não permittem
crear nullidades, ainda ob orrpem causam, onde a lei as não estabe-
leceu.
Tão repugnante é aos bons costumes e :i consciencia publica o
beneficio ao consorte adultero que, uma vez provado em juizo o es-
candalo da infidelidade á fé jurada, primeiro dever entre os casados,
não permitte a lei perdão, ainda que o conjuge inncente tenha
perdoado, porque se attribue d'este caso o perdão, menos a senti-
mentos nobres, do que a relaxação de costumes ou a sggestées
ea%,illosas, que a lei não deve proteger nem garantir.
E porém valida a doação feita pelo marido adultero á concubina
com o consentimento da mulher, não só porque se presume que a
mulher perdoou a affronta recebida com as rélaçóes illicitas de seu
marido, e renunciou ao seu direito, mas tmbem porque ás doações
não applica o codigo o disposto no artigo 1771.- para os testamentos.
De incapacidade absoluta para receber por doação ninguem é fe-
rido, nem mesmo os condeínoados á pena mais elevada da escala
penal, porque a condemnação só Ises aifecta os direitos politicos e
não os ireitos civis, artigos 74.o a 81. do codigo penal.
A incapacidade relatira abrange apenas: 1o a concubina com
relação ao homem casado; 2- o tutor e o descendente do tutor com
relação á pessoa tutelada com quem casou artigo 103"; 3 o tutor
e o pro-tutor, que não podem receber doações do ex-pupillo maior
ou emancipado, senão nos precisos termos rios artigos 244a, n' 1.-,
262.' e 1767.'
Não é especialmente inhibida a mulher casada de fazer doaçòes
ao amante, como é especialmente inhibidíí o homem casado de fazer
doações á concubina, porque essa doação estava já ferida de nulli-
dade absoluta pela incapacidade da mulher para doar sem auctorisa-
ção do marido.
A nullidade especial prevista no artigo é sem prejuizo da nulli-
dade geral por inobservancia das formalidades ordinarias, como falta
de eseripto particular ou de escripto psblico, nos casos e nos termos
dos artigos 1458.' e 1459., e sem prejuizo das nullidades de direito,
pomo abranger a doação bens immobiliarios communs artigo 1191.
Expressamente dispõe assim o artigo 1482.'

Art. 1481.1 As doações feitas a pessoas inhabeis, quer


sejam feitas simuladamente, quer o sejam com apparencia
de outro contracto, ou por interposta pessoa, no produ-
zem efTeito algum.
rp'

102 ARTIGO 1481.-

unico. São havidas como interpostas pessoas os des-


cendentes, ascendentes ou consortes dos inhabeis.
(Vid, artigos 1567.°, 1599^ unico e 1783.°)
Tende o artigo a evitar que a lei prohibitiva da doação a pessoas
inhabeis seja sophismada, quer por meio de simulaçâo, como dando
a cousa ás escondidas para ser entregue ao verdadeiramente benefi-
ciado, quer com apparencia de outro eontraeto, como dando á doação
o caracter de venda sem receber preço, ou confessando divida que
se não devia, ou renunciando a divida que se devia, etc., quer por
meio de inerpostaspessoas, tão ligadas com o incapaz, que haja toda
a presumpção de que possam vir ãs mãos do incapaz os bens doa-
dos, ou de que o incapaz se lisonjeia tanto com a doação feita a
esas pessoas como se fóra feita a si proprio.
É cgualmente applicavel às disposiç,es trstamestarias, artigos
1783.- e 1818., o preceituado sobre as d'ý,a' simuladamente feitas
a pessoas inhabeis.
O caracteristico de pessoas interpostas varia um pouco, conforme
são a titulo gratuito ou a titulo oneroso as acquisiçurs.
São sempre interpostas pessoas os consortes ds inhaseis, tanto
1 nas doações e nas disposiçes testamentarias, como nas veadas, nas
trocas e nos arrendamentos.
t Nas disposiçBes a titulo gratuito são os desccadeutes e os ascen-
dentes do inhabil em todos os casos interpostas pessoas; mas nos
contractos onerosos não são rites considerados interpostas peesoas
sesão quando herdeiros presumidos, isto é, herdeiros immediatos e
directos do inhibido.
Herdeiro presumido na linguagem do codigo não é qualquer her-
deiro successivel, mas sim e sómente o herdeiro immediato e directo
ao tempo do acto juridico.
Nos actos gratuitos são interpostas pessoas o consorte, os descen-
P- dentes e os ascendentes. Nos actos onerosos são interpostas pessoas
o consorte, a pessoa de quem o ishibido é herdeiro presumido, e
k o terceiro quando combinado com o inhibido para lhe transmittir
a cousa; ou, como dizia o projecto primitivo no § nico do artigo
1631.», correspondente ao ý unico do artigo 15137. do codigo : - En-
tender-se-ha como interposta pessoa o consorte, ou qualquer outra
pessoa de quem o iíhibido seja herdeiro presumido, ou de quem haja
a cossa dolosamente-
Nos actos onerosos artigo 1567.» é interposta pessoa o consorte do
ishibido, e o individuo de quem o inhibido é herdeiro presumid,
nos actos gratuitos é interposta pessoa o consorte, mas não o isdi-
viduo de quem o inhabil é herdeiro.
Nas interpostas pessoas a que se refere o artigo 1481.» não estão,
pois, comprchendidos o sogro ou o genro, a sogra ou a nora, porque
as palavras «ascesdentes, e «descendentes' abrangem usicamuente os
parentes e não os aflins, como na expressão 'eosorteso se incluem
apenas os conjuges dos inhabeis, ou ihibidos, e não os conjuges das
j..
interpostas pessoas.
Alguns consideram em todos os casos interposta pessoa aquelle
de quem o consorte do ihibido é herdeiro, mesmo sem distinguirem
se os interesses são commns por haverem casado por carta de me-
tasl, ou distinetos por se ter efc,sílo o casamento com regimen de
absoluta separação.
Não póde porém considerar-se feita por interposta pessoa a doa-

A
MW,
ARTIGOS 1482.° E 1483.0 103

çeo ao sogro da concubina, ainda casado segucdo o costume do reino,


apesar de marido e mulher formarem unia só pessoa, como não póde
ser considerado interposta pessoa o esposo, a quem o futuro sogro
vende bens nas vesperns do casamento com a filha, nem os filhos
adulterinos, que, exccpto o <ire it aos alinestos, so eco tudo o mais
havidos por eçtrunlI, ao- pees e à facuillii d'rtes; porque as restri-
eçtes neo podem amcpliar-se alm dos termos precisos da lei.
A presumpçìi legal abrange uicamente as pessoas designadas
na lei, o que todavia no prejudica a prova da simulaçâo a respeito
de outras pessoas.
Na doaç6o e na disposição testamenturia, como nos actos onerosos,
póde ser annullado o acto juridico, provado o accordo entre o ihi-
bidp e o terceiro, como claramente determina o artigo 1481.:
As doaçcs a interpostas pessoas sào applic:vcis as regras geraes
da pcc-ocriuuçaí, e nao a preseripçto esp e cial, cstatuida no trtiuo
14.ti11
O p rojecto pr i mitivo no artigo 1431.°, correspondente ne artigo
1567.: do codigo, apenas delarava de nenhum eleito, os contractos
de compra e venda celebrados em contruvenço ao disposto nos ar-
ligos 1626., 1G27.' e 128.', correspodecntes io artigos 161:, 1562.,
1553.: e 1564.' do codigo, porque noutro logar fuhniiava a pena de
nullidade contra as eendas celebradas cm quebra do disposto nos
artigos 1565." e 1566.

SECÇAO III

Da revogação e da reducção das doações

Art. 1482.1 As doações consímmadas só podem ser re-


vogadas, aléíí dos casos em que o pôde ser qualquer con-
tracto:
1.° Por superveniencia de filhos legitiítos, sendo o doa-
dor casado ao tempo da doação;
2.° Por ingratidão do douatario;
3.° Por inofiuiosidado.
Art. 1483.° A doação não será revogada por superve-
niencia de filhos:
1.0 Se o doador já tiver algum filho ou descendente lo-
gilimlo, vivo ao tempo da doação ;
2.° Sendo a doação feita para casamento.
(Vid. artigo 1501.)
Reproduz o artigo a providencia da Ord., liv. 4.', tit. 63.',
§ 5.,
do donatario que promette ao doador, por 1he fazer a doaçd, daí-lhe
ou cmpri-lhe guma coua, e o aão fer;, cii emprinu coo pcrooet-
te, disposiço commum atodos os contractos; e meuciona os casos
particulares em que as doações podem ser revogadas.
11

104 ARTIGO 1483.-

Independentemente de preceito especial pôde o doador, se o dona-


tario faltar as condições impostas na doação, usar do direito re-
conhecido no artigo 676., que abrange tanto os contractos gratuitos,
como os coetractos onerosos, e desfazer a convenção, como pela sua
parte a póde desfazer o donatario verificando-se as mesmas con-
dições.
O artigo, porém, refere-se aos casos especiaes em que a doação
pôde ser revogada ou reduzida por superveniencia de filhos, por in-
gratidão do donatario, e por inotliciosidade
Segudo consta da acta da sessão da commissão revisora de 14
de novembro de 1864 queria Marreca a suppressão de todos os nu-
meros do artigo 1486. do projecto de 18134, correspondente ao ar-
tigo 1482" do codigo, e limitada a revogaçào da doação unicamente
aos casos, em que o sao outros quaesq u er contractos, queria Jos- Ju-
lio a suppressào do n.1-, e pelo contrario propunha Martens Ferrão
a substituição das palavras «seodo o doador casado. pelas seguintes
ou legitiomdos por 'suteriente matrimonio".
A commissâo revisora, porém, manteve a doutrina do projecto, e
acrrescenton ainda n'aquella mesma sessão, sob proposta do sr. Fer-
reir Lima, as palavras ýao tempo da doaçio,.
A doutrina mais liberal era incontestavelmente a de Marreca, rise
garantia ao proprictario a mxima liberdade de dispôr entre vivos,
e assegurava escrupulosamente as resoluções da vontade uma vez
mauifestada; pois a revogação das doações por superveniencia de
filhos pôde destruir esperanças que a doação creúra, e despojar, dos
bens doados, filhos nascidos de casamento determinado talvez pela
doação, para favorecer filhos supervenientes As vezes contra a espe-
etativa de doadores e de donatarios.
Não admittem a revogação das doações por snperveniencia de fi-
lhos os codigos da Hollanda, do Uruguay, do Chile e da Republica
Argentina, nem o codigo de Guatemala quando a doação não excede
a sexta parte do patrimonio do doador.
r: No artigo 347 n" 3? o decreto de 17 de outubro de 1865, rela-
tivo ao ultramar, que hoje deve ter-se como revogado em virtude
do decreto de 18 de novembro de 1869, que mandou pôr o codigo
civil em execução em todas as possessões ultramarinas desde 1 de
janeiro de 1870, abolia, como contrario ao credito predial, a revoga-
ção de doação por ingratidão ou por superveniencia de filhos, salvo
tendo sido estipulada e registada a condição resolutoria.
O codigo, porém, seguii o systema do direito velho. Permittiu a
revogação das doações pela superveniencia de filhos, subordinada ais
seguintes condições cumulativamente, 1- serem legitimos os filhos
supervenientes, 2. ser o doador casado ao tempo da doação.
A superveniencia de filhos, ainda que já concebidos ao tempo da
doação, revoga as doações, como revoga a instituição de herdeiro
artigo 1814.", porque o filho concebido só paras) effeito dos seus inte-
resses se reputa nascido.
A revogação de acto consummado, independentemente de accordo
de ambas as partes, pelo simples facto de superveniencia de filhos
quando o doador era casado ao tempo da doação, foi determinada,
menos pelo direito da fanilia Irgitimaria ao patrimonio do ascen-
dente, do que pela presumpção de que o amor paternal não consen-
tiria ao doador dispór do patrimonio se previsse que virias ter filhos,
e tambem a convenieneia de facilitar as doações, que o doador ca ado
não faria se no interesse dos filhos supervenientes as não podesse
inutilisar.

L.
Al ruIG o 111 3 10.

A legitimação por subsequente matrimonio de filho illegitimo nas-


cido o por nascer, apesar di equiparados aos legitimos os filhos
legitimados at para o efieito de romper o instituição de herdeiro,
como era já por direito anterior onde aliãs não havia expressa dis-
posição egnal é do artigo 1814., póde determinar a reducção por
inotlicisidade, mas nunca a revogação, porque só a filhos legitimos
se refere o codigo, e porque só com estes não é possivel fraude da
parte do doador.
A legitimação por subsequente matrimonio só produz effeitos desde
a data do casamento artigo 119. 3; e doações consumadas só as
rompe a superveniencia de filhos legitimos, sendo o doador casado
ao tempo da doaçéo.
Por maioria de razão não pôde revogar as doações a perfilhação,
quer voluntaria, quer judicial.
Pelo codigo hespanhol tanto revoga a doação a supervenicncia de
filho legitimo, como a legitinoaçdo ou perfilh.çào de illegitimo, como
o apprecimíento de filho vivo que se reputava morto, caso este só
prcvrnido expressamente n'aquelle codigo e no codigo de Guate-
miala.
Pelo codigo portuguez o apparecimseto de filho vivo ao tempo da
doarão, cuia roisteneis o doador ignorava, não rompe a doação, como
rompe a instituição de herdeiro artigo 1814., porque s revoga a
doação a superveniencia de filhos sendo o doador casado ao tempo
da mesma doação, e não tendo filho ou descendente legitimo vivo.
Por oiperveniencia de filhos não póde ser anotílada a doação, se
o doador era solteiro, ou mesmo casado mas em descendente legi-
timo vivo, porque sendo fundamento da annullação a presumpção de
que o doador são teria doado se os affertos paternos o prendessem jà
na epocha da doação, cessa essa presumpçào pela certeza de que o
amor paternal o não demoveu de praticar o acto de beneficencia a
favor de parente ou de estranho, visto que doou quando já tinha
descendente leitimo.
Tatbem não são atulladas pela superveniencia de filhos as doa-
ções para casamento entre os esposados artigo 1169.° n. 2, nem as
doações entre conjoges artigo 1182., porque com taes doações não
soffrem os filhos, que são egualmente herdeiros do doador e do do-
natario, com quanto possaíi ser reduzidas por inodiiciosidade as pri-
meiras no interesse do herdeiro legitimario conforme o artigo 1167.,
como por inodiciosidade podem ser reduzidas as segundas artigo
1182., pois que poderiam ser repartidos os bens por outra camada
de filhos, no raso de passar a segundas nupeias o eonjuge sobre-
vivo.
Mas as doações que não são revogadas pela superveniencia de fi-
lhos estão ao menos sujeitas á reducção por inofficiosidade?
A doação pelo facto de não poder ser revogada por superveniencia
de filhos, poderá ao menos ser reduzida por inoffciosidade, isto é,
por offensa das legitimas?
Não se confunde a redução por inoßciosidade com a revogação
por saerreieciieio de filhos.
A ioficíiosidade suppõr a existencia de herdeiros legitimarios ao
tempo da morte do doador; e a soperreincia defilhos suppée a falta
de filhos legitimos ao tempo da doação.
A existencia de herdeiros legitimarios ao tempo da doação não
determia a revogação tor superveniencia de filhos, ao passo que
a reduseçs por inofliciosidade tem logar quando ha prejuizo dos
herdeiros legitimarios.

&M1,~ -
i
c
106 ARTIGO 1483.- e

Para a revogação por superveniencia de filhos é essencial ser


casado o doador, e não ter descendente legitimo ao tempo da doação,
ao passo que a redueçào por inolieiosidade no depende de nenhuma
destas eircumstancias.
Só fi/hos /eitimois determinam a revogação por superveniencia, ao
passo que todos os descendentes do doador, quer legitioos, quer
legitimados, quer perfilhados, podem reclamar por iífliciosidade;
com quanto já se julgassel que a perfilhoiao posterior nem reseinde
a doação artigo 1482.°, nem a reduz artigo 1492.', por sahir sómente
da terça disponicel do pae a porção hereditaria dos perfilhados, e por
não ser applicavel As doações o disposto no artigo 1814. para os
testamentos.
Finalmente a annullaçào pela superveniencia de filhos prejudica
totalmente as doações, não deixando sequer subsistir a terça do doa-
dor, qe aliAs subsiste nas disposições testamentarias artigo 17G0 ^
No systema do codigo estão em geral sujeitas à redueçso todas as
doações, qualquer que seja o donatario, desde que prejudiquem a
quota devida aos herdeiros legitimarios.
Seja qoea for o donatario pôde ser revogada ou reduzida por ir-
oficiosa a doaçto, diz o artigo 1492.', se envolver prejuizo na legi-
tima, ou os heideiros legitimarios sejam descendentes ou ascenden-
tes, ou existissem ou no ao tempo da doação.
Os herdeiros legitimarios, ou o doador fosse solteiro ou casado, ou
tivesse ou não tivesse herdeiros legitimarios ao tempo da doação,
quer proereados antes quer depois, téem egual direito a requerer
a reducçào da doação quando ella envolva prejuizo das legitimas,
vistos os artigos 1117.", 1492.'. 1784.° e 1789.
Nem o artigo 1784.°, que define a legitima, nem o artigo 1492.',
que trata da revogação ou reducçâo das doações em geral, nem
o artigo 1789.° que respeita á revogação e redueçào por inotliciosi-
dade, tanto das doações inter viros, como das doações testamentarias,
distinguem entre herdeiros legitimarios existentes ao tempo da
doação e herdeiros legitimarios supervenientes, e bem pelo con-
trario a todos reconhecem indistinetamente a faculdade de requerer
r na abertura da herança a reduceço por inofficiosidade.
Só nas doaifes entre esposados é que não ha reducção em bene-
ficio das legitimas, seuo existindo os herdeiros legitimarios ao
tempo do casamento e ao tempo da dissolução do matrimonio, e no
caso sómente de não terem sobrevivido filhos; porque, tendo sobre-
vivido filhos, ainda que vivam ao tempo da dissolução do matrimo-
nio asendeítes que existissem ao tempo do casamento, não pôde
ser reduzida a doação, nem em beneficio dos asemientes porue os
ir" filhos lhes tomaram o lugar, nem em beneficio dos filhos, aos quaes
não aproveita o direito de terceiro, isto é. o direito dos ascendentes
que existiam ao tempo da celebraçto e da dissolução do matrimonio.
No projecto primitivo o respeito pela invi lal ilidade das legitimas
não arlnittia excepção; e o codigo aproveitou com pequenas altera-
ç,es os artigos do projecto primitivo n'esta secç-o.
Correspondem aos artigos 1182" e 1483.' do codigo os artigos

1 Accordão da
Relação do Porto de 21 de julho de 1882, Reitta
de Legislação e de Juriprudecia,de Coimbra, 16.' anuo, n.° 787,
pag. 263.
¢r
e 5

ARTIGO 1483" 107

1542." e 1543.0 do projecto primitivo, com leves modificaçes; e


em seguida até o artigo 1500.- do codigo, a que corresponde o ar-
tigo 1562.' do projecto primitivo, encontram-se tambem as mesmas
dioposiçnes, correspondendo aos artigos 1502.0 a 1505.0 di codigo os
artigos 1564.- a 1568.0 do projecto primitivo.
Nào continha, porém, o projecto do sr. Seabra artigo algum cor-
res p ondente ao artigo 1501. do codigo.
Em vez do artigo 1501.n encontrava-se no projecto o artigo 1563.0,
que dizia assim: -Operada a revogaçlo, ou rrdncço por inolticio-
sidade, ficará o iniiovel, de pleno direito, em todo ou em parte,
exonerado dos encargos, ou hypothecas, com que o donatario o tenha
gravado".
A commissão revisora, em sessão de 25 di março de 1862, «re-
solveu substituir a doutrina do artigo, por outra egual à que se en-
contrava no artigo 1549.0 (correspondente ao artigo 1189.- do cedigo)
com referencia ao artigo 1544.° , correspondente ao artigo 1481." do
codigo.
Referi:, sr o artigo 1510. do projecto, como e artigo 1489." do
codigo, ao artigo 1541., correspondinte ao artigo 1484." do codigo,
e ao artigo 153.', correspondente ao artigo 1483.-; e deliberou a
commíissto revisora que o artigo 1549.' só fosse applieavel ao ar-
tigo 1514., e não ao artigo 1543.'
Mas nas ediçoes posteriores não appareceu consignada essa deli-
bernão.
Logo no projecto de 1863, que devia exprimir fielmente a reso-
luçoo tonada pela commissào revisora, o artigo 1531.-, correspon-
dente ao artigo 1501.' do codigo, fazia referencia, não só ao artigo
1513., correspondente ao artigo 1544.' do projecto primitivo, e ao
artigo 1481.- do codigo, mas tambem ao artigo 1512.' n. 2.', cor-
respondente ao artigo 1543.' n9 2.' do projecto primitivo, e ao artigo
1483.' n.- 2.' do codigo.
De certo por descuido e esquecimento 8
não foi emendada a re-
dacção do artigo 1531." do projecto de 1 63 no artigo 1506.' da edição
de 1864, nom no artigo 1501.' do projecto de 1865, apresentado ls
côrtes, nem no correspondente do codigo.
Consta ainda da acta da mesma sessão de 25 de março de 1862
que omseguida s deliberação de substituir a doutrina do artigo 1563.'
pela do artigo 1549." com referencia ao artigo 1544.', e em harmonia
co osal ro/açto,se resolvera a eliminaçlo do artigo 1565.', que estava
collocado entre os artigos correspondentes aos artigos 1502.' e 1503."
do codigo, e que dizia assim: 'ias se o donatario se achar insol-
vente, poderão os interessados reivindicar os bens doados, não que-
rendo o terceiro possuidor pagar o seu valor ao tempo da acquisi-

O pensamento da commissão revisora foi inquestionavelmente


applicar à revogação íu reducçlo por inoiiosidade unicamente o
disposto no artigo 1484, e não o preceito do n.' 2.' do artigo 1483.'
Nio é esta, porém, a doutrina que se encontra no artigo 1501.';
e o que nós havemos de respeitar é o que ficou no codigo, e não o
pensamento da commiss o revisora por mais claro que fosse, desde
que no foi consignado em preceito legal.
hlavemos de portanto aceitar a doutrina do artigo 1501 - que nos
seus precisos termos representa mais uma excepção em favor das
doaçoes para casamento.
L artigo 1501.' na sua litteral interpretação significa que as
doaçies para casameuto não so reduzidas por inofieiosidade, como
'~~1
4,
4r
108 ARTIGO 1484. A"
não são revogadas pela supervenicncia de filhos, isto é, que a
doação para casamento resiste . inofliciosidade como á superve-
niencia de filhos, o que vae de harmonia com a nota ao artigo 1462.°
Em favor das doações para casamento parte o artigo 1501. do
principio que as legitimas não abrangem o que já não era do anetor
da herança, se ao tempo da doação o doador não tinha filhos ou des-
cendentes legitimos, e que tendo os bens sabido do seu dominio
antes de ter filhos, que só podeo estes haver legitima nos bens no
dominio do doador, e não nos bens anteriormente doados.
Não permitte o artigo 1501.' a quem doou os seus bens para ca-
samento quando não tinha herdeiros legitimarios, animando talvez
com a sua liberalidade a constituição de uma familia, reclamar, por
lhe sobrevirem depois herdeiros legitirarios, bens e direitos de que
estava já privado ao tempo da superveniencia d'esses herdeiros,
e despojar do seu patrimonio a familia beneficiada, quando a causa
do matrimonio se reputa onerosa.
Portanto as doações pata casamento nio se revogam nem se re-
duzem por iroticiosidade pelo facto de sobrevirem filhos, visto o
artigo 1501.^, sobre o qual não podem prevalecer as lisposições ge-
raes sobre doações em casamento, porque o artigo 1501.0, com quanto
colloeido no capitulo das doações em geral, refere-se unica e ex-
elosivamentes á espece da doação em casamento.
Porém, as doações em casamento, que aliás não podem ser re-
vogadas pela superveniencia de filhos, podem ser reduzidas pela
existencia prévia de algum filho ou descendente legitimo, ou de ou-
tro herdeiro legitimario vivo ao tempo da doação, o que vae de har-
monia com o preceituado no artigo 1167.o
Conseguinterente a irrevogabilidade da doação em casamento
pela superveniencia de filhos, epecie nira do artigo 1501.0, não
exclue a redueçao pela existencia prévia de herdeiros legitimarios.
f A disposiçlo dos artigos 1483.0 n." 2.- e 1501.0 tem um pouco de
analogia nos seus effeitos com o preceito da Ord., liv. 4 ", tit. 97.0,
4.-, que permittia ao donatario, nas doações para casamento, optar
entre o valor dos bens do doador ao tempo da doação e ao tempo da
morte.
r'
Art. 1+83.° Rescindida a doação por superveniencia de
filhos, serão restituidos ao doador os bens doados, o, se
o donatario os houver alienado, o valor d'elles.
§ 1.1 Se os bens se achareni hypothecados, subsistirá a
hypotheca; mas poderá ser expurgada pelo doador, com
regresso contra o donatario, pelo que o dicio doador des-
dender por essa catsa.
2.1 Quando os bens não podérem ser restituidos em
especie, o valor exigivel será o que os dielos bens tinham
ao tempo da doação.

(Vid. artigos 148q, ]502" e 1504..)


A revogação das daçAes, quer por superveniencia de filhos, quer
por imgratidao do donatario, quer por inofliciosidade,rão anmulla as
alienaçJes dos bens doados nem os encargos impostos pelo donata-
rio no intervallo da doação á demanda, salvo elausula resolutoria.
e,

ARTIGO 144.1 109 .


Etm qualquer das tres hYpotheses ao doador só revertem os bens
doados ainda em poder do donatario, artigos 150i. e 1502.-, sub-
sistem a alienaç cs e os encarga coa stituidos sobre os bens im-
nebiliarios antes do registo da acçda de revogação, e apenas no
caso do artigo 1504.° póde ser demandado, insolvente o donatario,
o imiediato adquirente pelo valor dos bens moveis ao tempo da
sequisição, se esla foi gratuita, e não decorreu o tempo marcado
nos artigos 5329 a 534.' para a prescripçdo.
No direito franez só por superveniencia de filhos são revogadas as
doações, e ficam seom efseito as alienaçues e os encargos, voltando
oa beis ao doador no estado anterior á doaçdo, e não no caso de in-
gratidão, que o doador no julgsra possivel, aliis não teria doado,
e em que a revogação só é permittida por um principio de morali-
dade para punir a ingratidào do donatario para com o seu bem-
feitor.
O nosso codigo, porém, em todos os casos de revogação de doações
obstou a que fossem feridos com factos inesperados e imprevistos
os direitos de terceiro, que em boa fé tivesse contrartado com o do-
natario sobre os bens doados, e negou os effeitos da clausula resolu-
toria, menos por favor ao donatario, que por attençáo a terceiros, que
em, boa fé contractarato.
E a posse legal do donatario e a justa defesa dos direitos de ter-
ceiro que es boa fé contractos que abonam o respeito pelas aliena-
ções e hypotecas dos bens doados.
A applicação da clatsula resolutoria a revogação por superve-
niencia de filhos, e por inofliciosidade. diflicultaria as convenções
sobre os bens doados com prejuizo dos dosatarios e da sociedade.
'Pendo, porém, ficado no contracto de doação determinada e expli-
rita a clausula de reverso doos bens para o doador, e assim preve-
nidos terceiros das condições da doaçào, verificada a superveniencia
de filhos ou a ingratidão, são rescindiveis as alienaçées, as hvpo-
thecas e quaesquer outros encargos, coto a serviddo e o arrenda-
mento, apesar de só t alieoaa;do e à staotheca se referir o artigo,
porque a razao é a mesma.
O codigo, pois, por ser muito combatida a rescisão das doações
fira das causas geraes, communs a todos os contractos, aceitou, a
exemplo de algamas legislaç~es mais adeantadas, a resciso das
doações, impondo ao donatario apenas a obrigaçào de restituir os
bens que em si tiver e a responsabilidade pelo valor dos que não
podér restituir, ou o mativo da revogação seja a superveniencia de
filhos, artigos 1484^ 2.°, ou a ingratidào artigo 1489., ou a in-
olticiosidade artigo 1501.t, e resalvando sespre os direitos de ter-
ceiro, salvo no caso especial, previsto no artigo 15049, de serem
moveis os bens doados, e de terem sido alienados a titulo gratuito.
O valor é calculado pela epocba da doaçdo, e tio pela epocia da
demanda, porque os bens podem ter augmentado ou diminuido de
preço desde a doaçào até á demanda, e o doador no deve receber
mais nem menos do que deu.
Paga o donatario as despezas com a expurgaçào das hypothecas
sobre os bens doados pelas mesmas razões por que paga o vaor dos
beus alienados.
O artigo 1544.^ do projecto primitivo, correspondente ao artigo
1481^ do codigo, que, no caso de revogação por superveniencia de
filhos, mandava restituir ao doador os bens doados ou o seu ralor,
altnas quando alienados metes do uascientsl dos filhos, foi com razão
alterado pela commissào revisora, porque semelhante restricção fa-

'et

e'm
110 ARTIGOS 1485. 1486. e. 1487.

eultava ao donatario a alienação dos bens, sem respoisabilidade,


desde o nascimento dos filhos até á instalraçâo da seção de revo-
gação.

Art. 1485.1 Perlencem ao donalario os frulos onu ren-


dimentos dos [eus doados, até o dia em que for proposta
a acção de revogação por superveniolcia d filios do doa-
dor.
(Vid. artigos 1505.? e 2106?)
Não aceitou a commissso revisora a doutrina do projlcto pri-
mitivo que no artigo 1545.", correspondente ao presente artigo,
obrigar: o donatario a restituir os froctos desde o nascimento do
filho, porque a revogação da doaçao por supervenieleia de filhos
pela nossa lei não se verifica 2ps oure, como n'algumas legislaçôes,
pelo simples facto do nascimento do filho.
Carece de ser decretada pela justiça sobre aeção para esse fim
intestada pelo doador ou pelos seus desesidentes legitimns, artigo
1487.; e nem deveria ser obrigado o donatario a restituir os rendi-
mentos anteriores á proposição da acção, porque se presumem colhi-
dos em boa fé.
Mesmo nas collaçües pertencem ao donatario os fruetos vencidos
11< até á abertura da suceessão, não só porque obrigal-o a conferir o
consumido nas despezas quotidianas seria arruinal-o, mas ainda pela
regra de que os frnetos civis se adquirem dia a dia, e os naturas
desde o momento em que sào colhidos.
Responde pelos rendimentos desde a iorte do doador o donatario
co herdeiro, artigos 1505. e 21060, não em virtude dos principies
que regem a revogação das doações, e sim em virtude das regras
relativas A collaçào.
A morte do filho antes de proposta em juizo a acção revogatoria
da doação perime o direito de rescisão por supervrniencia, visto não
se ter tornado epectieí em juizo o direito ei vida do filho.
E o que dispc em caso inalogo o artigo 1815.0, e é a consequencia
da maxima juridiea- suilato cusa cessal ehíects--, com q uanto al-
guns sustenteom que o direito de revogação, erado com o nascimento
do filho, já não péde ser prejudicado com a morte d'este.

Ari. 1486.1 0 doador não pôde renunciar o direito de


revogação por supervenieucia de filhios.
Não péde o doador renunciar o direitode revogaçà por superve-
niencia de filhos, porque este preceito foi introduzido, nào no inte-
resse do pae, mas no
interesse dos filhos; e
a ninguem pode permit-
tir-se lesar direitos de terceiro.
:e
Art. 1487.° A acção de revogação, por superveniencia
de filhos, só se trasittile a estes e a seus descendentes
-4 legilinios.
(Vid. artigo 1491.)
e' A acção de revogação por síperveniencia de filhos, estabelecida só

-
f.
ARTIGO 1488.- 111
por iacar aos é transmissivel, nem aos as-
descendentes legttioíos, não
cýndutes, nem a outros quaesquer herdeiros, legitimos oi testamen-
tarins.
Mesmo aos descendentes perfilhados e legitimados é negada, aliás
ficil seria ao doador achar pretexto para revogar as da çdrs.
Só depois de installida a cansa é que passa o direito de revo-
gação a quaesqucr outros herdeiros, os quaes proseguem na causa
pendente, como direito sucessorio, porque a proposição da acção
cria um direito transiissivel como qualquer outro, e a acção jant ia *
bonis esse aoepit dimatoris.
Tambem não passa aos herdeiros do doador, nem pôde ser inten-
tada eotra os herdeiros do donatario ingrato, a acço de revogação
por ingratidào artigo 1491., por ae fundar n'uma injuria de natureza
eslusivamontc pessoal. 4
Não devia ser intentada contra os herdeiros do donatario, que
não são responsaveis pelos factos criminosos ou immoracs que alie
praticou, nem podia competir aos herdeiros do iijuriaíte, que não
tèvm direito a maior rigor de que o doador, para lhes sor permittido
perseguir uío injuria que aqutle esqueceu, e que se extinguiu eo
razão do seu caracter penal com a morte do *tfendido.
Se porém estava em juizo a acção ao tempo da morte do doador,
passa a lide pendente, como qualquer outro direito da herança, aos
herdeiros e contra os herdeiros.
Em todo o caso o principio absoluto de que a morte extingue todas
as otbensas couduz ao absurdo de absolver da entrega dos bens doa-
dos o donatario que proitieou o crime de assassinato, por exemplo,
na pessoa do doador, e que ficou sujeito apenas i acção criminal,
unica que os herdeiros podem intentar, quando ctí vida pódc o doa-
dor intentar a acção de revogação da doação contra o donatario que
commettu o mais insignificante crime de injuria verbal.
O herdeiro que attentar contra a vida do auctor da terança póde
ser excluido do direito á horança testamentaria, ou o intestado,
artigos 1749. e 1752.1 Mias o donatario, responsavel por eguaes cri-
mes, tao póde ser privado da doação, se não foi proposta a acção
pelo doador.
Algumas legislaçàes concedem a acção de revogação por ingra-
tidão aos herdeiros do doador, quando este tiver morrido sem poder
intetal-a, e tia quem julgue applicavel entre uós ao donatario, que
attcnta contra a vida do doador, o disposto nos artigos 17490 e
1782. para o herdeiro que attcnta contra a vida do autor da he-
rança.
Porém as leis não permittem argooentos de analogia em materia
penani.
Com razão se não aos herdeiros do doador acçâo fun-
transtmitte
dada na injuria pessoal por serem pessoaes as penas como os deli-
etos, e por se presumir ter perdoado a injuria o injuriado, e não se
admitiir recursO coutra o perdão.
ias devia permittir-se aos herdeiros propdr a causa em juizo,
quando cessa esta presumpção por haver fallecido o doador sem ter
podido intentar a acção; e tanto mais que o ascendente, descen-
dente, conjuga, irtão, ou herdeiro pôde intentar acçàrs penaes por
injuria quando o crime é comnettido depois da morte do offendido,
codigo penal, artigo 417. 4s

Art. 1588.° A doação pôde ser revogada por ingratidão:

k~
112 ARTIGO 1488.

4. Se o donatario cominetter algum irimt contra a pes-


soa, bens, ou bonra do doador;
2l. Se o donalario actuar ;rdiíiahlreue o doador por
crime em que o ministerio publico lenha acção, salvo se
[onver sido conrmettido contra o proprio donatario, sua
'S mulher ou filhos, que estejam debaixo do palrio poder;
3.° Se, caindo o doador em pobreza, o donatario recusar
soccorrel-o de modo proporcionado à iimportancia que, de-
duzidos os encargos, teve a doação.

(Vid. artigos 1875.°, 18763, 1878. e 1879.°)


Para castigar o comportamento do donatario e do herdeiro legiti-
mario, quando tão indigno, que repugue á consciencia humana e á
ir moral publica mantel-o no gozo do beneicio, permittiu o legislador
a rescisão da doação, e a privação da legitima; e, para obstar quanto
possivel aos abusos inherentes ao exercicio desta faculdade, especi-
ficou os casos em que poderia ser revogada a doaçdo por ingratidão,
e privado da legitima o herdeiro necessario.
ÇL A eiunciaçâs dos casos em que a diaçdo póde ser revogada por
ingratidào, e em que o herdeiro legitimario póde ser excluido da
legitima, é taxativa e no excmplificativa.
Nenhumas outras causas além das fauadas no codigo determinam,
quer a revogação das doaçôcs por ingratidão, quer a privaçío das
legitimas, ainda que revelem maior ingratidão do donatario, ou
maior indignidade do herdeiro legitisario.
Tanto à revogaçâo das doaçoes por ingratidào, como á desherda-
çào, é applicavel o principio fJivorabiia aipliaida, odiosa reétrir-
geroa'.
Ninguem pôde ser privado de direitos, adquiridos por cemtracto ou
por lei, seao nos casos expressos.
A ingratido é em quasi todos os codigos considerada justa causa
de revogaçào das doaçêes, quer em vida, quer por morte, como em
is quasi toda a parte tem sido reconhecida a desherdaçào, estabelecida
lei
por Justiniauo Nov. 115 nos ultimos tempos de aoina, porque nos
primeiros tempos e durante sculos, cm quanto o pater jmàilias foi
considerado soberano absoluto, no era necessario armar o pie com
esta arma terrivel.
Consideram alguns escriptores a deslerdação acto de vingança,
contrario a todas as conveiiecias humanas, e tant mais repreheu-
sivel, quanto que é decretado com os olhos fitos na eternidade, no
momrento solmne, m que o testador devia despir-se de todo o
rrsertimento humano e cobrir com o manto do perdào e do esque-
Y' cimento todas as offeisas que em vida recebera.
Julgam que o coração de par, fundo inexgotavel de indulgencia
para com os filhos, só permittirá a desberdaçâo quando o entendi-
meto está sfiuscado, ou gravemente perturbado por suggestôes
r; estranhas, que seria mais christão prohibir o pae de levar a viu-
i gança além da vida, privando da herança o filho, e marcando-lhe
a fronte com esta especie de maldição, que, destinada a assegurar a
aurtoridade domestica, no coítribue para fortalecer os vincules de
famsilia, e que peior ainda é a deshrdaçào decretada pelo desceu-
deute, porque converte o filho em juiz do pae.

C: 4 ,al
rse ir'

ARTIGO lóisi 118

Codigos de naçées tão adiantadas, como a França. a Italia e o


Chile, não acceitam a desherdaç,o entre as suas isitiuiíes.
l ossa codigo, poríim, prefri a inatrina tradicioil. que veio do
direito romano, e que estâ santeci nada na maior parte dos codigos
taoto antigos, como modernos.
Para evitar a diliculdade de classiticar factos constitutivos de
ingratidào e de iídiguidade, declarou o codigo causas de revogação
das doaçes e de deserdaçìão erimes como taes classificados na lei
penal, qiasdo nem sempre os factos, elevados i categoria de crime
pela Iegnsln;ào penal, delmumiam ingratidào da parte do donatario,
e indignidade para haver a herança deferida pr lei.
Pela redacção do endigo delictos insignificintes, como as olensas
corpaares involuítariaiente feitas por imipericia, negligencia, falta
de destreza, ou falta de observ:inia de algum regulamen to, conforme
o artigo 368 do codigo penal, aurtorisaii a revogo;o das doaçnes
por ingratidão. bem como a desherdaçào artigos 187t39. 1878. e,
18799, quando taes crimes não denunciam ingratidão, nríí indigni-
dade.
Em direito todas as regras gerars são perigosas, como dizia o
jurisconsulto romiano, oínis defiuitio in jure peric/os.
Dclicto artigo 1876.' e crime artigo 1488.' n" 1. e 2.9 significa
a mesma idéa - o facto volunta rio declarado puníivel pela lei pe-
nal-, codigo criminal artigo 1., com exclusão das coatrarençes
definidas no artigo 39 do mesmo codigo.
Sáó quasi as mesmas as causas de revogação das doaçães e de
privaçào da legitima, de certo por ser o autor da herança tão obri-
gado pela disposiio da lei a trinsmittir a legitima respectiva aos
herdeiros legitimarios, como o doador pelo sei contracto de doação
a respeitar ao donatario a propriedade dos bens doados.
As disposiçOes do codigo, que deveria ser muito mais rigoroso com
o donatario do que com o herdeiro legitimario, por ser muito mais
criminosa aos olhos da razão e da moral a ingratidão do donatario,
que sód ni íenficenea do doador deve a doação. do que a indignidade
do herdeiro legitimario, que deriva o seu direito da lei, carecem de
base racional n'esta parte, porque ora incriminam mais o facto
do donatario, ora tractans com mais severidade o herdeiro legiti-
matio.
E motivo de revogação das doaçnes por ingratidào o crime practi-
cado pelo donatario contra o doador, ou seja contra a pessoa, como
ferindo-o, maltractaldo-o corporalmente, ou contra a ionra, como
injuriando-o, caluuiiaudo-o, ou contra os bens, como roubando-o,
burlando o, etc.
Só é motivo de desherdaçào o crime commettido contra a pessoa
do auctor da herança, e no o commettido esntra a sua honra ou
contra os seus bens, e nâo todo e qualquer crime contra a pessoa,
masso o crime a que corresponda pena superior a seis mees de
prisao.
Assim o criííe de offeusas corporaes voluntarias, previsto e punido
no artigo 3iil.- si.- 19 do codigo penal, de que não resultou doença
nem impossibilidade de trabalhar além de dez dias, que é motivo de
revogaçdo da doação por ingratidào, noa é motivo de desherdação.
Ja no projecto primitivo as injurias verbaes ou esceriptas, a que
não cabia pena superior a seis míezes de prisão, eram motivo de re-
vogação das doaçães por iugratidâo, mas nào eram causa de desber-
daçào; e o codigo, não permittindo a desterdação por facto practi-
cado contra os bens do auctor da herança, vae de harmonia com o
ToMo I1 8

i.:;
rsrr<rr '<ri
* .05-e,

114 ARTIGO 1488.^

disposto nos artigos 431. ti9 2.' e 438.' do codigo penal sobre acçâo
criminal pelas subtracçôes commettidas entre ascendentes e descen-
dentes.
O codigo civil franeez, que para a desherdação exige a cosdema-
cào do herdeiro legitimario por crime contra a pessoa do auctor da
herança, não exige a mesma rircumstancia para a revogação da doa-
ção por ingratidão; e a razão da differrnça é, segundo Rogron, ser
mais criminoso o attentado contra aquelle de cuja liberalidade pro-
vêm todos os direitos, do que o attentado contra aquelle cujos direi-
tos são transmittidos em virtude da lei
O nosso codigo, porém, quer para r revogação da doação, quer
para a desherdação, em caso nenhum exige a condemnação do de-
linquente, contenta-se com a prova do facto.
io póde o pae desherdar o filho que practicou delicto contra a
mãe, nem o filho desherdar o pae que cmmetteu crime contra a
madrasta.
filas póde ser desherdado pelo filho o pae que attentou contra a
vida da mãe, ou a mãe que attentou contra a vida do pae, se depois
se não reconciliaram, artigos 18789 e 1879., porque se tornou in-
digno da successão do descendente que não pôde ver a sangue frio
tamanho attentado commettido por um contra o outro dos auctores
de seus dias.
Não póde, todavia, o pae desherdar o filho que attentou contra a
vida do conserte, visto não serem as mesmas as relações e o vinculo
natural e legal entre o pae e a nora ou entre o pae e o genro que
entre o filho e a mãe.
E motivo de revogação das doações por ingratidão a accusação
judicial do doador por crime em que tenha acçào o ministerio pu-
blico, haja ou não condemnação, porque a absolvição do crime, ce
livra o donatario da imputação de calunmiador, nem por isso o livra
da imputação de ingrato.
O donatario que, em logar de se compadecer do seu bemfeitor, o
vae perseguir usando de acção, que bem prdia ser posta em anda-
mento pelo ministerio publico, comrmette uma ingratidão a que o
legislador não devia ser indifferente.
O n 29 do artigo 1488.- não se refere unicamente aos delicetos, em
que podem accusar as pessoas dr povo, como aos crimes de suborno,
peita, peculato e erneussão, artigo 771." da novissima reforma ju-
dicial, alias bem eseusadas seriam as palavras -em que o ministerio
publico tenha acção., porque não ha delicto sujeito r acção popular
sm que o ministerio publico não tenha que intervir.
O psísamento do n9 2.° do artigo é castigar o donatario por se
ter mettidr a aceusar crimes, que bem podia ter deixado â acção do
ministerio publico, comeo são os crimes previstos ios artigos 865.,
866.° e 867.-, cm que são admittidos particulares, além do ministerio
publico, a querelar.
loda a accusação por crime em que póde aceusar o ministerio pu-
blico é motive de revogação da doação por ingratidão.
Só não é causa de revogação da doação por ingratidão a accusa-
Pý ção do doador por crime commettido contra o donatario, sua mulher
on filhos iortituido debaixo d, patrio puder, porque prefere a tudo
o direito de via ar um errr cmeRtido <ontra n ou contra as pes-
soas cja drfs ns está cor.ettidr.
A gratidão do donatario não p(<te ir até o ponto de tolerar os cri-
mes do doador contra si, contra sua mulher ou contra seus filhos
debaixo do patrio poder; nem o doador pôde fazer maior offensa ao

M
I", -

ARTIGO 14S8 116

donatario do pie iijiriar-tLi a mulher e os tilhos, isto é, os entes


que naturaliente lhe são mais caros.
N'esta parte foi o codigo muito menos rigoroso com o donatario do
que com o herdeiro legitimaris, porque o herdeiro legitimario póde
ser desherdado, ainda que não tenha aceusado, pelo simples facto de
ter desancieo judicialmente o crime, isto é, de o ter participado em
juizo nos termos do artigo 91F da novissima reforma judicial; e o
donatario pôde denunciar os crimes que quizer contra o doador, o
administrativa ou judicialsente, que, se não accusar, isto é, se não
se sujeitar ás despezas e riscos do processo, não lhe corre perigo a
doaçdo, posto que a denúncia em muitos casos denote ainda mais
perversidade do que a accusaçào.
Por outro lado pôde o herdeiro legitimario accusar e denunciar
impunemente o auctor da herança por crimes commettidos contra os
seus descendentes, ainda que não sejam filhos debaixo do patrio po-
der, e contra os ascendeutes ou irmãos, o que ao donatario não é
permittido.
Tambem nio cei sob a saneçào irritante dos artigos 1488», 1876.,
l78^ e 1879» a denúncia ou aceusação dos crimes, que é consequen-
cia de dever imposto pela posição oficial, ou por qualquer preceito
legal.
O terceiro caso de revogação da doação por ingratido, e de pri-
vaçàs da legitima, é a recusa de alimentos ao doador ou ao auctor
da herança, ainda que o alimentante seja depois condemado a
prestal-os, porque se reputa ui attentado contra a vida negar ali-
mentos. - Necarc xdeter qni alimieaa denegat.
Castiga a lei a ingratido do donatario que consente privaçôes a
quem se despojou dos seus haveres para o beneficiar, impondo-lhe a
perda do beneficio que recebeu, penalidade a que não escapa, ainda
que por lei o doador possa pedir alimentos a outreni. poque a obri-
gação do donatario que provém do benericio prefere â dos parentes
que provém da lei.
Foi a doaçio que concorreu para o doador ficar sem meios de
subsisteucia. L, portanto, sobre o donatario que deve pesar ú encargo
de alimentos, que deverão ser rateados havendo mais que uni bene-
ficiado.
Deve o donatario alimentos prroperciesado ao valor da doação,
depois de deduzidos os encargos, pelo simp/es fato de cair em po-
breza o doador, ainda que este se tenha reduzido
u pobreza por acto
reprehiisivel, e esteia a tempo de emendar-se, quando o herdeiro
legitimario só fica sujeito á pena de desherdaçào se os recusar sem
justa causa, sítigo 180.
Não póde estar sujeita ao artigo 180." a obrigação do dona-
tario, porque deriva - de beneficio ja recebido do alimentando -.
E o codigo mais rigoroso n'esta parte com o berdeiro legitimario, a
quem obriga a alimentas proporcionados aos recursos do alimentante
e ás necessidades do alimentando, do que com o donatario a quem
só obriga a alimentos pelos rendimentos dos ben doados em pro-
porção com a importancia da doação, deduzidos os encargos.
lais das causas de desherdaçào reconhecia ainda o projecto
primitivo no artigo 2013., correspondente aí artigo 1876 . do eo-
digi--o casamento dos filhos menores contra a vontade dos paes-
e a prsstituiçlo das filhas-. Mas, a segunda foi logo eliminada nos
trabalhos da primeira revisão, e a primeira, com quanto appare-
cesse ainda no projecto de 1863, já não figurou no projecto de 1864.
Fóra mesmo dos casos de desherdaçào fica privado do direito á
1
116 ARTIGOS 1489.0 e 1490.-

herança: ã.0 o que por dolo, fraude ou violencia impediu de fazer


testamento, artigo 1749.0; 2.o o que deixou por dolo de apreeentar
testamento cerrado que tinha em seu poder dentro de tres dias,
desde que soube do faltecinento do testador, ou no caso previsto
no artigo ":.^independentemente de lhe ser exigido, artigo 1937.-;
3. o que subtrabiu dolosamente testamento do espolio do testador,
ou do poder de pessoa onde estivesse depositado, artigo 1938.1; 4. o
que viciou ou dilacerou o testamento de modo a não poder ler-se
a primitiva disposição artigo 1940
N'estes quatro casos além da privação da suecesso, que não é
subordinada ás mesmas regras. nem depende das mesmas formali-
dades, que a desherdaçio, lia logar a perdas e damnos, salvo na
primeira hypothese que o eodigo não reconhece a obrigação de in-
demnisar o que seria herdeiro se o testador não fosse impedido de
fazer as suas ultimas disposiçes, talvez porque não chegou a ser
manifestado o beneficio com as formalidades exigidas pelo codigo
para a validade dos testamentos, e cabem tambem as penas crimi-
naes prescriptas nos artigos 329.0, 424.0 e 453.° do codigo penal.
Não lia pena no codigo penal para o caso de ser alguem impedido
de fazer testamento por doío ou fraude, apesar da referencia feita á
lei penal no artigo 1719.- do presente eodigo, ficando apenas sujeito
á responsabilidade civil o auctor do dolo ou fraude.

Arl. 148.° E applicavel á revogação da doação por in-


gratidão o que fica disposto nos artigos 1483.° n° 2.0,
1481.° e 1185.°

(Vid. nota ao artigo 1484.0)

Art. 1490.1 A acção de revogação por ingratidão não


pode ser renunciada antecipadamente, e prescreve por um
ano, contado desde o Iacto que lhe deu cansa, ou desde
que houve noticia d'elle.
Permittir a renúncia à acção de ingratidão féra prender os bra-
ços ao doador, deixal-o indefeso contra os maleficios do donatario,
e assegurar a este de anteoão a impunidade.
Mas só é prohibida a renúncia antecipada, e não a renúncia pos-
terior aos factos.
K0 de o doador offendido deixar de usar da acção de desaggravo,
visto ser pessoalissima a oSfensa, artigo 1491.0
Por não poder renunciar antecipadamente á acção de revogação
não fica o doador impedido de votar ao esquecimento o facto coo-
summado.
Para a revogação das doaçócs por superveuiencia de filhos ou por
inoftciosidade não marca a lei praso especial.
A prescripção n'estes casos é a de direito commum.
Só é fixado praso corto para a prescripçâo ia revogação por in-
gratidào, por este pedido revestir caracter penal, e se presumir que
o doador, deixando correr uns anuo sem demonstrar intenção de re-
haver os bens, ou esqueceu a ofiénoa ou quiz perdoal-a.
ARTIGOS 1491., 1492.- 1493.- 117

Art. 1491.° Esta acção não póde ser intentada, nem


contra os herdeiros do donatario ingrato, nem pelos her-
deiros do doalor; inas será transmissivel, se, por ventura,
se achar pendente ao tempo da morte do doador.

(Vid. nota ao artigo 1487.0)

Art. 1h92.° A doação, seja quem for o donatario, pôde


ser revogada or reduzida por inoflciosa, se envolver pre-
juizo da legilima dos herdeiros legitimarios do doador.
.0 Mas, se o prejrizo da Iegitima não abranger o va-
lor total ria doação, será esta reduzida em tanto quanto
for necessario, para que a dita legiLima seja preenchida.
.° 0 calculo da terça para conhecer se ha ou nião
inotliciosidade, será feito pelo modo estabelecido rio titulo
das successões.

Nenhuma outra restricção se impõe em geral à liberdade dos


doantes senão b respeito pelas legitimas.
As palavras ,seja quem for o donatario», que não vinham no pro-
jecto primitivo, nem eram realmente necessarias, foram consignadas
para abiranger todas as doaçies, tanto as feitas a parentes como as
feitas a estranhos, o que se mostra da nota ao artigo 1521.» do pro-
jecto de 183, onde se it :.Resolveu-se que a este artigo se aceres-
centasse outro §, declarando que esta revogaçào ou reducção com-
prehendia tambem as doaçòes feitas a estrarhos-
Não se acresecentou o §, como se tinha resolvido. Mas acerescen-
taram-se, de certo para significar o mesmo pensamento, as palavras
«seja rjuenr or o doaitrioa , que já se lem com insignificante ditfe-
rença de redaeçào no artigo 1490'.» do projecto de 1864.
Nas doaçdes, como nas disposiçcaes testamentarias, só póde ser
apreciada a reducçôo na abertura da successão, porque a iuofliciosi-
dade, salvo o disposto no artigo 1149.- s 4., é regulada pelo valor
dos bens do canal, não no momento da doação, mas sim ao tempo
da morte, que é a epocha da abertura dos direitos dos herdeiros, e
do apuro das legitimas.
Não lia doação inodiciosa sem herdeiro forçado, porque o fim da
reducção é manter intacta a reserva destinada para os herdeiros te-
gitimarios; e a existencia de herdeiro forçado só à morte do auctor
da herança póde ser reconheida.
Nem os herdeiros no legitimarios, nem os donatarios, nem os te-
gatarios, podem queixar-se de doaçòes anteriores, nem os credores
da herança exercer outros direitos com relação ás doaçòes além dos
que lhes conferem os artigos 1030' a 1035., 1419. e 1470.»
A expressão »inofficiosa., já adoptada no direito antrior, é deri-
vada do direito romano, que declarava in ocitn ou contra os de-
veres da piedade as disposiçôes oflensivas das legitimas.

Art. 1493. A reducção das doações inolGiciosas começará


hrra -an. ,qgc

118 ARTIGOS 1494 , 1495.° E 1496.0

pelas doações testamentarias ou legados e só se estenderá


ás doarões entre vivos, se não chegarem os bens legados.
Art. 1494. Se bastar redacção parcial dos legados, será
esta rateada entre os legatarios, salvo se o testador houver
ordenado que para este elfeito seja preferido uni d'elles,
ou que algum lique exemplo de tal encargo.
Art. 1h95.° Se for necessal io recorrer is doacões entre
vivos, começar-se-ta pela ultima, em todo ouem parte; e,
se não bastar, passar-se-la áimimediata, e assim por diante,
em quanto doações houver.
Art. 1!96.° Ilavendo liversas doações, feitas no mesmo
acto ou la mesma data, far-se-ha a reducção entre clas ra-
teadamente.

(Vid. artigo 2111.')


Em quanto podér ser satisfeita á custa das liberalidades testa-
mentarias a legitima, não se entra pelas doações, porque os dona-
tarios tioaham pela acceitaçào da doação adquirido direitos de que o
testador no podia já prival-os pela distribuiçào posterior dos bens
em legados.
Fica, portanto, sem effeito qualquer disposição testamentaria desde
que seja absorvida a terça pelas doações, artigo 2111.'§ 2.^, porque
o auctor da terança não podia já dispér testamentariamente do que
em vida doára irrevogavetmente.
Sendo preciso sacrificar as doações ás legitimas, começa-se pela
ordem gradual iaversa, isto é, pela mais recente das doaçBes, porque
a suppressâo ou redueção deve principiar onde principiou a inoffi-
ciosidade, ou a otFensa das legitimas, e porque sem.esta disposição
ficaria inteiramente ao arbitrio do doador prejudicar o doíatario
anterior, illudindo com doações posteriores o direito adquirido ts
doações anteriores.
Nas doações feitas ou registadas no mesmo acto, ou na mesma data,
em que não páde observar-se aquella regra, faz-se rateio; e assim,
faltando 6004000 réis para preeneber as legitimas e havendo duas
doações na mesma data, uma de 1:0000 0 réis e outra de 500000
réis, desfalcam-se 4006000 réis na primeira e 2004000 réis na se-
gunda.
Tambem não chegando a terça para cobrir todas as doações no
caso de diversos donatarios a inteirar, pagam-se de preferencia as
mais antigas, e rateadaínente as que tiverem sido feitas no mesmo
acto ou na mesma data, citado artigo 2111.' § 1.; e no rateio de
doações na mesma data não ha que attender a preferencias expres-
sas ou tacitas da parte do doador, porque o donatario adquire desde
a acceitação direito irrevogavel sobre os bens doados, que só póde
ser iotluenciado pela data do registo com relação a terceiros.
A reduoeço das doações para pagamento das dividas do doador
é regulada, não pelos presentes artigos, mas sim pelos artigos 1469.'
e 1470.'
A rati proporcional se procede entre os diversos legatarios
quando a herança não chegar para cobrir todos os legados salvo
kJ
determinação expressa do testador artigo 1795.', como proporcio-
nalmente são reduzidos os legados para pagamento das dividas da
ARTIGOS 1497.0 a 1498.0 119

herança distribuida em legados, artigo 1794.0, porque os legados


toem todos a mesma data, que é a data da morte do testador.
O rateio, quer ns doaçòes, quer nos legados, faz-se entre as li-
beralidades iistnetamente, ou abrajam objecto determinado, ou
quantidade certa.

Art. 1497.° Consistindo a doação em objectos mobiliarios,


attender.se-ha, na reducção, ao valor, que elles tinham ao
tempo da doaão.
á utieo. Não será imtpuada ao donatario a perda ou de-
terioração dos objectos mobiliarios, se tiverem desappare-
cido, ou esiverem deteriorados por causa fortuila ou força
maior.
Art. 1t98.1 Consistindo a doação em objectos immobi-
liarios, será a reducção feita em especie.
n 1. A estas doações é applicavel o que fica disposto
no unico do artigo antecedente.
Y.9 0 valor dos tens immohiliarios doados será calcu-
lado com relação à epocha, em que se houver de fazer a
reducção, não se itcluindo no calculo, nem o argrmento de
valor provenienle de beafeitorias feitas pelo donalario, nem,
por outra parte, a diminuição desse valor procedida de
deteriorações imputaveis ao mesmo donatario.
(Vid. §á 2.0 e 3.° do artigo 1790.0 e ; unico do urtigo 2107)
Para obstar a que rr doador privasse de todos os bens isísobilia-
rios os seus herdeiros legitimarios, doando iuais de que o valor da
terça, é a reduoçao eta eopecie, que o mesmo é dizer ei substancia,
como resulta dos artigos comparados 1498° e 1499.0, que são re-
produeçìc dos artigos 1500. e 1561.0 do projecto primitivo, c0om a
differençta de não haver io artigo 1560° do projecto primitivo os j
que loje apparecem no artigo 1498. do codigo.
Não é imputada ao donatario a perda ri deterioraçào de objectos
mobiliarios, que tis crea tsapparecido ou estiverem deteriorados
por causa fortuita ou força riaicr, tunico do artigo 1497.0; nem
a diminuição do valor dos bens immobiliarios, que rno provier de
deterioraçies a elle impu ecis, § 2. do artigo 1498, nem os pre-
juizos para que slo concorreu directamente quando constituem perda
total, 30 do artigo 1790., nem a ret eioraçào ou perda, que resul-
tar de easa foroita, de torea mioir, o< eto oaturl ro da iosa dada
ou dotada, 4 unico do artigo 2107.°, ou seam mobiliarius ou iuir-
biliarios os bens doados.
Nã1o se computa para a avaliarão o augmento de valor proveniente
de bemfritorias, e pelo contrarir calcita-se o valor dos bens doado
na epoca da doação, sem distinguir entre mobiliarios e inuobilia.
rios, artigo 1790 2.^ e artigo 211t 7 i unico.
Mas o ý 2. do artigo 149b.- riada excluir do calculo só o argmento
de bemfeitorias provenientes do donatario, tractando-se de bens ias-
mio]üliari,'s.
Quasi todos os artigos, reguladores do assumpto, ticm, pois, reda-
rção differente.
120 ARTIGO 1498.-

Nas reducções descontam-se as bemfeitorias pelo donatario feitas


e as deteriorações por elle causadas, para não lucrarem com aquel-
las nem serem prejudicados por estas os herdeiros.
Desde que é em valor e não om substancia a conferencia, deveria
o perecimento da cousa, qualquer que fosse a casa, reeair sobre
o donatario, pela regra - Res suo dounii peril- -porque o donatario
não é devedor de objecto deteroidoío, e sim de certo valor, e tanto
que péde alienar, salvo convenção em contrario, os bens doados, fi-
rando as alienações ao abrigo da rescisão, ainda que elle não tenha
os valores correspondentes para trazer â collaçào.
Mas por equidade não se imputa aos donatarios o calor das dete-
risoc-'es, em que elles não tiveram eulpa, cotao se lhes não imputa
a deterioração resultante do uso natural da cousa doada nas colla-
ções, § unico do artigo 2107"
(3 ciherdeiro, a quem foi doada no valor de 7:0003000 réis cousa
que pereceu por accidente independente da sua vontade, levanta do
patrimonio do actor da herança, na hypotbese de serem dois os
herdeiros, e 8:0003000 réis o valor da suecessão, 4:0003000 réis,
quando levantaria apenas 500000 réis, se porventura tivesse de
responder pelo valor da cousa doada, que pereceu por causa estranha
á sua vontade.
O codigo civil franez manda abstrabir de todos os melhoramen-
tos e deteriorações supervenientes â doação, e attender ao estado
dos bens na occasido da doação, e ao valor na oceasiào da morte do
testador, com o fundamento de que n este valor seriam estimados,
se o doador, em vez de se ter despojado d'elles, os tivesse no seu
patrimonio ao tempo da morte, e manda calcular o preço do objecto
ao tempo da morte pelo que valeriaseestivsso exactamente no mesmo
estado em que estava ao tempo da doçào.
O que parece é que para o effeito das reduoçoes são avaliados os
bens doados, sem attenção âs modificaçoes. augmentos ou deteriora-
ções supervenientes, que podem ser devidos ao donatario, e que
em todo o caso não existiam quando os bens sahiram do poder do
doador; e que para o effeito das collaçoes, artigos 1790 2." e 3.,
e 2107. e inico, revertem em favor do donatario os augmentos
posteriores i doação, e tio o prejudicam as deteriorações que nâo
lhe foreíí imputavcis, comprehdndo-sr nas dettrioruçécso apenas
os prejuizos causados dirrctmeite nos objectos.
Em todo o caso tem-se julgado que an augmento de vaor, que
nãO provier de bemfeitorias feitas pelo doado, como são as resultan-
tes da redueçáo dos direitos dominicaes ordenda pelo decreto de
13 de agosto de 1832 e pela lei de 22 de junho de 1546, não é applica-
vel a disposição do artigo 2107" unico, que se refere unicamente
a augmento de valor devido a benfeitorias pelo donatario feitas
nos termos do artigo 1198." 2.", e não a factos extraordinarios e
imprtvistos.
Os prejuizos resultantes das oscilía<;ýes de valores, como da cotação
cambial, ou de quaesqucr disposiçies legaes, não são attendidos,
7
porque as cotiç es não podem ser consideradas casos fortuitos ou
de força maior, visto serem taes variações inherentes ao coemíercio

1 Accordio da Relação do Porto de 30 de maio de 1879, Rerista


de Legislaçdo e de Jrisprudencei, de Coimbra, 17" anuno, n" 833,
pag. 13.

M
M
."
ARTIGO 1498.^ 121

dos titulos de credito i; e por isso os papeis de credito doados, ou


subam ou desçam de valor, hão de ser conferidos pelo valor real ao
tempo da doação. 2
la, porém, num di iderença de redacçào entre o ý 2. do artigo 17900
e e 4 2' do artigo 149.', que só pôde explicar-se porque o artigo
1790.° maida attender para o calculo da terça ao valor dos bens ao
tempo da doaçio, por ser esse o valor de que o doador se privou, e
por correr em regra por conta do doiatario o augmento ou diminui-
çào posterior do valor da cousa, e o artigo 1498.' manda partilhar
os heis immobiliarios ao tempo da redeção, tendo em attençáo o
seu valor, porque a partilha é feita em especie.
Quer dizer - dteriina-se priieiro até onde a doação offendeu
as legitimas, isto é, a parte inofliciosa da tloaçào, avaliando-se os
beins doados pelo que valiam ao tmcpo da doação, porque desde en-
tío se privou o doador de certo valor, e porque desde esse tempo
corre por couta do donatario oiigiieití'ou diminiçào do mesmo
valer; e, encontrado por este processo o iiantím da inotticiosidade,
procedí se a nora avaliaçáo dios immobiliarios ao tempo da reiieçàío
para tirar em eopre- com perfeita egnaldade quanto baste para per-
fazer aquelle íantumi, aliás graves injustiças poderiam surgir em
prejuizo, já dos herdeiros, já do douatario, se o valor dos bens doa-
dos tivesse sotrido iltoeaçâo no periodo decorrido entre a acceitaçlo
da toaçào e a redueço por mo te do doador.
SEo doador coii a tfrtina de 12:000O00) réis doasse um predio,
que valesse ao tempo da doaçio 6:000,5000 réis ou mais 2:0W3000
réis do qiic elle podia doar, e ao tempo da moete do doador ):0(0)d000
reis, e fosse tomado em conta não o vaIo do predio ao tempo da doa-
ção, ms o oalor do predio ao tempo da uiirte, entregaria o drnita-
rio não 2:0ti03t00 réis, mas 3:000 ã000 réis, isto é, daria a mais
1:0003000 réis do qr recebeu, saido elle não tem a restituir se-
não 29 do valor da propriedade, que representa a somma de 2:0004000
réis a mais que recebeu.
As avessas, vulendo 9:0003000 réis o predio doado, e tendo o
doador uma tbrtua do 18:00030011 réis, sendo assim iioficiosa em
3:10,(M000 réis a doação, se ao tempo da redueçlo valesse só 6:01105000
réis,e, o donatario entregasse em espeeie apenas a terça parte do
predio, vinham s he rdeiros iegitimarios a recber só 2:0011000 réis
em vez dr 3:00[000 réis, e o donatario a pagar só com 2:0005000
réis o valor de 3:0030011 réis, que tinha recebido em doaçâo.
Apura-se o valor dbs hens doados para o effeito da collaçào, veri-
tieido se cm cada mu dios cinco annos anteriores à doaçás a pro-
ducção, fixando-se o preço dos generos pelas tarifas camararias, e
míititlicando-se por 20 o termo médio desses preços 3
Para execuçáo do disposto io § 3." do artigo 1790.', e eo uico

1 Accordso da Rlaçio do Porto de 23 de agosto de 1892, Direcilo,


25.' asso, n.' 11, pag. 175.
2 Aceerdào da Relaço do Porto de 23 de agosto do 1892, Direito,
28.' asno, n." 19, pag. 303.
3 Aceordáos, da Relço do Porto de 9 de dezembro de 1881, e
Supremo Tribunal de . ustiça de 3 de junho~de 1890, Revista de Le-
gislação e se Juripru'descia,de Coimbra, 22.o anuo, n.' 1078 ., pag. 41,
e Boletim dos Trimsres, 5.' anno, e.' 208, pag. 531.
122 ARTIGOS 1499. E 1500.

do artigo 2107.°, impõe o codigo de processo no artigo 696.' § 1.0


aos conferentes a obrigação de declarar, na drscripçào dos bens a
conferir, as alteraç,es que os bens tiverem soffrido depois que os
receberam, quando dessas aíteraçes podér resultar augmento ou
dimoinuiçõo de valor.
Nenhuma lei probibe aos interessados requerer nova avaliação, no
inventario, dos bens doados que téem de vir à collaçào, para recti-
ficar o valor estimado por occasião da doaçào entre o doador e o
donatario n; e até são admittidas nos inventarios segundas avalia-
çêes nos termos do decreto de 15 de setembro de 1892 artigo 9.0
A disposiçào do artigo 722° 3.' do codigo de processo civil que,
no interesse dos co-herdeiros, dispensa as novas avaliaçes nos casos
no mesmo previstos, ioo abrange os donatarios, que não são 'bri-
gados a conferir o objecto pelo valor do antecedente inventario. Y
A nova avaliação dos bens doados para os effeitos da collaçào ha
de tambem fazer-se sobre a base do valor que teriam ao tempo da
doaçâo, vistas as palavras--tinham ao tempo do dote ou da doação-
empregadas no artigo 2107.'
Não peritte a lei conferir os bens pelo valor médio entre o tempo
da doaçéo e o tempo da collaçào.

Art H99. Se algum immovel não podér ser dividido


sem detrimento, observar-se-a o seguinte:
1.1 Se a importancia da redtcção exceder melade do
valor, haverá o donatario o resto em dinheiro.
2.° Se a redueção tro exceder a dieta metade, reporá
o donatario a imporiancia da reducção.
Ai. 1500.1 Se, porém, o donatario for tambem co-her-
deiro, so poderá reter r inmiovel doado, se o valor d'esse
immovel rão exceder o da legitima do co-herdeiro accumu-
lado com o da doação reduzida.
No caso contrario, o donatario entrará com o immovel doa-
do para o casal, e será pago da legitima e da doação re-
duzida, em conformidade das regras geraes rue regulam
as partilhas.

(Pid artigo 2107.)


E regulada a fórma da collaçào pela lei vigente à data do fal-
lecimento do doador em tudo o que nào otfender os direitos ad-
quiridos pelo donatario ou por terceiro.
Já se tem sustentado que, tanto por direito antigo como por direito
moderno, é o donatario sempre obrigado a trazer à collação os pro-
prios bens doados, para o effeito de repér os que excederem o valor

SAcecordão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de junho de 1886,


Boletim dos Tribaes, 1° anuo, n, 12, pag. 502.
2 Acecorddo do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de julho de 1897,
Gazeta da Brelaçdo de Lisboa, 11.° anuo, n. 68, pag. 5dO.
ARTIGO 1500.0 123

da sua legitima e da terça do doador, com o fundamento, de ser essa


a melhor iíterpretação da Ord., lir. 4.0, tit. 97., ý 3.P e 13.o a 15^,
de deverem ser inteirados os co-berdeiros em bens da mesma natureza
e especie sendo possivel conforme os artigos 2109.» e 2142», de
sa poder reter o immovel o donatario co-herdeiro quando o predio
nào exceder o valor da sua legitima accumlado com o da doação
reduzida porque do contrario loi de entrar com elle para o casal e ser
pago da sua legitima e da doação reduzida eta conformidade das
regras geraes que regulam as partilhas artigo 15(10., de ser res-
ponsavei o donatario pelo valor dos bens ao tempo da dóaçio ar-
tigo 2502.", de ser em especie a reducçào na doaçào de objectos
inmobiliarios o que importa a obrigaçào de largar dos proprios
bens doados a parte inotliciosa, e finalmente de ser este o corollario
do artigo 2011»
Porém o artigo 2107. confere ao co-herdeiro descendente todos os
bens doados, sem distineção entre mobiliarios e immobiliarios, uni-
camente no valor e não em substancia; nem o donatario deveria
ser obrigado em caso algum a trazer á collação senão o respectivo
valor, visto sahires do casal os bens pela doaçào, que importa trans-
ferencia de dominio.
Porém o artigo 1500.0 manda conferir em sotacia o immovel
doado quando exceder o valor da legitima do co-herdeiro aceu-
mulado ao da doarão reduzida.
l'om o 2.' do artigo 1498» que se refere a todo e qualquer do-
natario, ainda não descendente soccessivel, facilmente se concilia o
artigo 2107? que se refere t hypothese excepcional de ser o donatario,
descendente sucecssivel legitimo, legitimado, ou perfilhado, unioa
classe de co-erdeiros que determina a collação, artigo 2102.
Mas com o artigo 1.s00. que se refere exactamente à hy'pothcse
de ser coherdeiro, e co-herdeiro descendente, o donatario, pois que
com os outros erdeiros tno ha collaçio citado artigo 2102., ditficil,
senlo inspossivel, é a conciliação.
Tem-se dieto que 'o artigo 1500" se refere, no As collações entre
herdeiros legitimarios descendentes como o artigo 2107, mas sim á
reducção de doaçies por intlheiosidade, fóra do caso de collaçêes
como se os berdeiros prejudicados na sua legitima são ascendentes
do doador, que no caso de inofliciosidade, e no silencio do artigo
2111.", assento da materia, deve observar-se a disposição generica
dos artigos 1498. e 1500., que regulam a reducção das doações em
geral, que o artigo 1500." é só applicavel à redacçào das doaçies
na inofliciosidade em geral, e no i especie da collaçào ou confe-
rencia, e que na secção - da revogaçào e redueção das doaç6es -
nto ha palavra relativa a conferencias ou coltaç,es, porque a ma-
teria da collação está regulada pelo preceito claro do artigo 2107.",
collocado na sub-secção relativa ãs doaçes, 1que se refere só ao
caso de não haver inodiciosidade.2 '
N'este sentido já se julgou 3 que nos inventarios hão de ser regu-

Accordão do Supreío Tribunal de Justiça de 7 de julho de 1876,


Direito, 9.o anco, u 8, pag 11h.
2 Accodão da lelação do Porto de 23 de dezembro de 1890, Re-
eista dos Trintes, 1i.' ano, n." 249, pag. 134.
3 Accordãos, do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de junho de
1883, e da Relação do Porto de 6 de dezembro de 1895, Direito,

iLI-
'ir

124 ARTIGO 1500.'

ladas as collaçdes pelos artigos 2107.0


7
e 2111.', porque o processo do
artigo 1498.° só se observa nas doaç es fóra dos inventarios, e que a
conferencia ha de em todos os os casos, sem exceptuar a hypothese
do artigo 1500.', ser feita em valor, e não em substancia, porque o
artigo 2107.0 manda sempre conferir em valor, porque o artigo 2111.'
maida repr o excesso sem declarar se a reposição ha de ser em
valor ou em substancia, e porque o artigo 1500.° deve ceder és dia-
posiçées dos artigos 2107.- e 2111.°, por não se encontrarem nas ou-
tras disposiçües do codigo civil, nem no codigo de processo, regras
para a rédueção em substancia.
Porém a distineção entre donatarios que são herdeiros legitima-
rios para conferirem em valor, e donatarios que não são herdeiros
legitimaosis para conferirem em especie, substancia ou natureza, não
é meio de conciliar os artigos, porque o artigo 1500.n refere-se, como
o artigo 211>7.", só aos herdeiros legitimarios.
Pondo de parte as subtilezas metaphysicas não vemos outro meio
de conciliar o artigo 1500.' com o artigo 2107.. seuào limitando um
ou o outro, ou limitando o primeiro ao caso de não ser herdeiro le-
gitimario o donatario, ou limitando o segundo ao caso de não exce-
der a doaçâo a legitima do donatario e a terça do doador.
Nós consideramos o artigo 1500.' como excepção ao artigo 2107.,
e assim concluimos que o co-herdeiro confere os bens doados pelos
valores artigo 2107., salvo tendo sido objecto da doação algum im-
movel que exceda o valor da legitima do donatario e da terça do
doador, porque nesse caso ha de conferil-o em substancia.
0 codigo não permittiu apenas doar bens de raiz além das forças
da terça do doador e da legitima do donatario, talvez para evitar
que o doador privasse os herdeiros legitimarios dos bens immobilia-
rios doando-os a ui só para este compor os herdeiros a dinheiro
contra o disposto no artigo 2009.'
Portanto se o donatario não é co-herdeiro, restitue o immovel e

recebe a sua porção em dinheiro, ou paga a importancia da reducçào,
e fica com o immovel, segundo esta excede ou não metade do valor
do immovel; e assim na hypothese de valer o immovel 1:0Oóýo00
réis, e ser a importancia da reducção 4O4000 réis, fica o donatario
com o immovel e repãe 4is>000 réis, e, sendo a importancia da re-
ducção 6004000 réis, recebe 400:000 réis o donatario e restitue o
immovel.
Se, porém, o dotatario é co-herdeiro, retem o immovel cabendo-
lhe na legitima e na terça do doador, pois entra pela terça do doa-
dor até onde for preciso para cobrir a doação, artigo 2111.'; e, se o
immovel excede o valor da legitima do donatario e o da terça do
à
doador, vem collaçâo em substancia, e será feita a partilha con-
forme as regras geraes.
1)esde que o immovel exceda, pouco que seja, o valor da legitima
do donatario, e da terça integral oi rateada do doador, não póde o
donatario, sioda pagando o excesso, ficar com o immovel em nome
da doaçào. Pelo contrario ha de vir para a massa dos bens o predio,
e será pago da sua legitima e da doação respectiva o donatario, que
aliás poder ficar com o immovel por meio de licitaçào.
Assim fica o donatario com o immovel ou sem o immovel, segundo

19.° anmo, n.o 1, pag. 5, e Revista dos Trióbsaes, 14.° asso, n.· 327,
pag. 231.

4i
ARTIGOS 1301.° 1502. , E 1,03. 125

o desfalque na doação excede ou nào amutade do valor do predio,


tosando-se a palavra «reducção., empregada no artigo 1499., como
synoymla das expresses «doação redoidao, empregadas tio artigo
1500.-
A jarispradrcia corrente t é pela licitação sobre todos os bens
doados na hyvpothese especial do artigo 1500.-, porque a redncção é
eam sustaniia, porque no sào exceptuados da licitação, nem pelo
artigo 2128. do presente codigo, nem pelo artigo 720.° do codigo
de processo civil, e porque d'outro modo ficaria seai applicaçào o
artigo 1300.-
Influe assim poderosamente nos termos da redueçào a circumstan-
eia de ser ou não co-herdeiro o douatario.
Se foi de sorel a doação, ainda que o preço d'este v. além da quota
legitiwaria do herdeiro e da faculdade disponivel do doador, a col-
laçao é em valor.
A cllação pois é em valor, abatendo-se como verdadeiros encar-
gos as reservas ainda teirporarias impostas na doação 2, salvo quando
a doação abranger immovel que exceda a legitima do co-herdeiro e
a terça do doador, que é cm substancia.

Ar. 1101.0 E applicavel à revogação, ou redacção por


inoiliciosidade, o iue fica
disposto nos artigos 1483.° n.° 2.°
e 184.°

(Vid. nota ao artigo 1483.)

Art. 1 50 a1 Se os immoveis se não acharem, ao tempo


da revogação ou reducção, em poder do donatario, será
este responsavel pelo valor d elles ao tempo da doação.

(Vid, nota ao artigo 1484.)

Art. 1503.1 Esta acção prescreve, não sendo intentada


deno de deis atnos, contados desde o dia em que o her-
deiro legititmario taja acceilado a herança.
(Vid. nota ao artigo 547.)

t Aceordãos, da Relação do Porto de 26 de agosto de 1890 e de


14 de julho de 18J:3, e do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de
agosto de 1892, de 6 de mrço de 1894 e de 7 de fevereiro de 1896,
Reeisti do Tribsaei , 9. anuo, na 201, pag. 134, e 12.' anuo, n^ 267,
pag. 39, e Gaeta da Rl/arço de Lisboa, 6.' amo, a.' 74, pag. 586,
7. ansno, ai. 81, pag. 644, e 9. anno, n.' 88, pag 700.
2 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de janeiro de
1890, Loletiu, dos Tritunacs, 5.: an5o, n. 191, pag. 265.
rt 126 ARTIGOS 1504.', 1505.^, 150G.0, 1507.^ E 15nR.ý
0
Ar. 1501. Se a doação consistir em moveis, e o dona-.
tario se achar insolvente, só poderão os interessados de-
mandar o immediato adquirente, pelo valor d'esses moveis
ao tempo da acquisição, tendo sido transferidos gratuita-
mente, e não obstando a prescripção.
Art. 1505.° 0 donatario, sobre quem recãe revogação
ou reducção de doação por irotfciosidade, só responde pelos
fructos e rendimentos desde que é demandado; salvo sendo
co-herdeiro, porque n'esse caso, responde por elles desde
a morte do doador.

(Vid. nota ao artigo 1485.")

CAPITULO VI

Do ENPrESTIIO

SECiXAO I

Disposições. geraes

Art. 1V50(0. O ouilaclo de emírestimo consiste ra ce-


deícia gratuita de qíalquer cmusa, para que a pessoa a
que é cedida se sirva d'ella, com a obrigação de a resti-
tuir em especie ou vii cousa equivalente.
Art. 1507.° 1) eupreslimo diz-se cnrmmodato, quando
versa sobre cousa que deva ser restituida na mesma espe-
ele: e mutuo, quando versa sobre cousa que deva ser resti-
tuiia por outra do mesmo genero, que lidade e quantidade.
ArL 1508.° 0 emprestimo é essencridmeíte gratuito.
Logo que o comnmodato ou o mutuo é retribuido, toma
aquelle a natureza de aluguer, e este a de usara.

(Vid. artigos 1510.', 1523. 1524.0 e 1(Ul ^)


ft muoi, que moo requer Já o desenvolvimento de que carecia
antigmuu,.te finando ti iua era prohibida c até punida, é tractado
no codigo com a mesma simplicidade que o contraceto
de colodato,
em que as obrigações do cmmodatario se resumem nua restituiçào
do objecto no praso devido em bom estado ao commodante.

1
(O lãCýt.
ART'IG

No contraecto de emprestimo a obrigação principal é a do tomador.


As obrigaçòes do cedente so consideradas accessorias e incidentes.
Emprestimo não é taonhemo a entrega de dinheiro a outrem para
certas compras com a clausula de quinhão nos lucros sem quinhão
nas perda.
Apesar de serem essencialmente consensuaes hoje os contractos
em geral, sio tia eureetimo sem a cedencia efieeli0, isto é, sem
a tradição, como era em direito romano.
A obiqyíçdo de emprestar íído está subordinada ás regras do em-
prestimo. ti contraeto de emprestimo tio se fórma sendo pela tra-
dição. Antes da entrega da cousa ono pode nascer a obrigaçdo de
restituir, que é elemento esseucial do emprestimo.
Feita a promessa (lo entrega da cousa pôde ser responsavel o
dono pelas consequenrias da promessa. Mas não lia acção de mutuo
senão depois da trsdiçào.
lIara evitar, de certo, as diiiculdades de distinguir entre cousas
fungiveis e não fIugiveis, determinação aliás precisa no mutuo e
no comíodato, abandonou o codigo as velhas divisJes e definiçes
escolasticas, e considerou mutuo ou commodato o coíraeto, couforme
deva ser restitida outra cousa do mesmo genero, qualidade ou quan-
tidade, ou a mesma cousa etmprestado.
Semelhante regra, porém, inteiramente aoceitavel para estremar o
mutuo do commodato se do coutrato constassem sempre claramente
as condições do emprestimo, não resolve as ditriouldades nas con-
venções verbaes, fórm or dinaria d'estes contraetos.
Portanto, na falta de declaraçües, que é preciso decidir pela sa-
Isra da cosa, asi estams de novo caídos na q uestão da deter-
minaçdo e distieço entre cousas fungiveis e sio fungiveis, e até
o codigo se serve destas expresses nalguns artigos, como nos
artigos 1633.' 1636.0 e t137. terminologia dos romanos, que havia
passado para o nosso direito velho, e que estava já abandonada por
vieiosa n'algumas leis modernas, que preferiram a recommendada
pelas indicaçLes da seielcia: assim o codigo rivil franecez, o da
Baviera e o da Austria, em vez de ordenares no commodato a res=
tituiçào em <espeie, madam restituir a elesia cousa emprestada.
Diz sc fiuígirí 1 a cousa, designada pelo genero e sio pela propria
individualidade, de que o devedor se liberta entregando outra da
mesma qualidade, peso ou medida, e <ião euaígirel o contrario. Va-
riam as condiçées do emprestimo segundo são fuyireis, ou não
Jugiveis as ceosas.
No mutuo, que tem por objecto cousas que se consomem pelo pri-
meir uso a que s o destinadas, isto é, que tão se usam sem se con-
smoieií, passa o dominio para o mutuario, porque de nenhum pro-
veito lihe serviria o contraeto, se não tivesse o direito de dispôr da
propriedade, artigo 1523.'
Por isso dizia a velha Ord., liv., 4.. tit., 53. § 1.' que o commo-
dato se differençava do mutuo em que no conmodato não passava
o senhorio ileso a posse da cousa no que a recebeu, e sémente lhe
concedia o uso d'ella. para tornar a mesma cousa.
Assim 1ío commodato, que pflíe ser celebrado pelo simples usu-
fructuario, porque sio se cede senão o aso, contilúa o dominio em
poder do cennuodasíte, e correm per conta delie os prejíizos não
imputaveis ao cemmd atario.
Na legislaçáo romana servia a palavra gíros para designar o que
nas sciencias se chama species, verbi gratia, o livro, o cavallo, e
usava-se da palavra species lara sigiificar o individuo, verbi gratia,

JL.
r,.
rr-
11

12lS ARTIGO 160S

o cavallo n 5, etc.; a na mesma accepçìa dos romanos se encontra


a palavra genero. na Ord., liv. 4, tit. 1. pr., e tit. 53.^ I e mo
velho codigo coínercial, artigo 272."
A palavra .eaj"ie. encontra se nos artigos 1805 , 210t e 2142.a
como sy uoiy\ic de -y-ero- isto é. como siguiliuijul cousa ind, ter-
saitada ou como couaprehendendo nmitas cousas; no artigo 1530.
já tem outra accepçào muito differunte; e no artigo 1507- significa
certo grupo de individuos da mesma classe, mas não um individuo
especifico, e tanto que o artigo 1510.° manda expressamente resti-
tuir ao rommodatario a coisa emprestada.
• No commodato, em que ha obrigação de restituir a cousa na
mesma espccie, a mesma e identica cousa que se recebeu, e não outra,
ainda que da mesma especie, não póde tomar-se a palavra «espeie.,
senão por um individuo especifico.
No mutuo restitue-se, não a prpria cosa, mas o equivalente em
peso, qualidade e quantidade.
Por concenção podem se: objecto de com.adato cousas fungivcis,
que em regra são objectos de autuo, como o emprestimo de moedas
para marcar ao jogo com a obrigação de serem restituidas as pro-
prias; e póde ser objecto de mutuo o que por sua natureza é
objecto de commodato, como o emprestimo de exemplar novo de
qualquer obra para ser restitaido outro egualmente novo, ainda que
o primeiro não tenha sido consumido pelo uo.
Já dizia a velha Ord., no liv. 4, tit- 50. 1.° : Poréa se algu-
mas cousas d'estas se déssem para se não gastarem, antes se torna-
rem as mesmas, seria coimmodato; assi como, se luma pessoa em-
prestasse a outra alguma moeda de ouro ou prata para algnm
apparato de festas ou represcntaçôes, e para lhe tornarem as mesmas
moedas, acabadas as festas: pelo que, se o tal dinheiro se perdesse
por algum caso fortuito, em poder do commodatario, não será obri-
gado a pagaI-o, como fira, se se lhe dera o tal dinheiro para gastar
e cousumír».
Tambem podem ser considerados cousas fongiveis, pelo uso a que
são destinados, os animaes emprestados com a condiçào de serem
res.ituidos outros da mesma qualidade.
E da essencia do commodato e do mutuo a gratuidade.
Mas não perdem a sua natureza por vencerem interesses; e desde
que haja retribuiçào segue o mutuo as regras da usura e o comiso-
dato as do aluguer.
Na propria usara a retribuição é a compensação das privaçes que
soffre o que empresta, e dos beneficios que proporciona ao tomador.
O dinheiro tem valor como qualquer outra mercadoria, é o inter-
mediario em quai todas as convençes, e o padrão legal dos valores.
Em commnercio é sempre retribuido o emprestimo, e na falta de
ajuste a retribuição " a taxa Iýgal do juro calculado sobre o valor
da cousa cedida, codigo de uammercio artigo 39;.
0 emprestimo para ser couuercial ha de ser destinado a qualquer
acto mercantil, citado codigo artigo 394.°; e o emprestimo mercantil
entre comnmecciantes admitte toda a q ualidade de prova, qualquer
que seja o scu valor, citado artigo 396.«
Os titulos da constituição de uutuo com p e iuor são obrigados ao
sello da confissio da divida e da constituiçào do penhor.1

1 Oficio da Itirecçãà (eral dos Proprios Nacionaes do 12 de maio


de 1897, Direita, 3.° alno, n 6, pag. 9J4.

L. 1j[
ARTIGOS 1509.^, 1510.0, 1511., 1512 E 1513.• 129

Contra o emprestimo confessado em escriptura publica no é hoje


admittida a rectamaçuo, de que resava a Ord. liv. 4.^, tit. 51.? pr., nas
seguintes palavras: «Qualquer pessoa, que confessar que recebeu
algum emprestimo, poderá dizer e allegar até sessenta dias que o
não recebeu. E pondo esta excepção antes de sessenta dias, no seja
constrangido pagar o confessado por elle. E posto que ao tempo do
contracto diga, que renuncia esta Lei, tal renunciaçào seja senhu-
ma. E defendemos aos Tabeliles e Scrivàes, que tes obrigações
houverem de fazer, que no screvam tacs renunciaçòes, e fazendo
o contrario, percam os officios..
Aqulla causa de resrisão reconhecida na velha Ordenação dei-
xava dependente apenas de uma das partes a revogação do contracto,
com o que o codigo acabou, como incompativel com os principies
germes, que regem e determinam os contractos.

Art. 1509.0 Os direitos e as obrigações, resultantes do


emprestimo, são transmissiveis, tanto aos herdeiros e re-
presentantes do que empresta, como aos do que recebe o
emprestimo.
(Vid. nota ao artigo 703.)

SECÇÃO Ii

Do commodato

Art. 1510.1 0 commodatario é obrigado a restituir a


cousa emprestada, findo o praso convencionado.
(Vid. nota ao artigo 1506.)

Art. 1.311.° Se não houver declaração sobre o praso do


emprestimo, entender-se-la que fôra pelo tempo itdispen-
savel para o uso concedido.
Art. 1512." Se o uso da cousa emprestada não estiver
determinado, poderá o commodante exigil-a quando Ihe
aprouver.
unico. Qualquer duvida, qte se levante a este respeito,
será resolvida 0pela declaração do commodante.
Ar. 1513.° commodante poderá exigir a cousa, antes
que linde o praso coovenciontado, sobrevindo-lhe necessi-
dade urgente, ou finando-se aquelle a quem o emprestimo
foi feito.
(Vid. artigos 1525., 1526.- e 1528.-)
Toao III L

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w ýI

180 ARTIGO 1514.0

Differentes são as regras para a restituição do objecto emprestado,


segundo é mutuo ou commodato o emprestimo, salva sempre a con-
venção que antes de tudo ha de ser respeitada, como lei entre as
partes n'um e n'outro contracto, artigo 1525.°
Não pôde ser exigida antes do praso a restituição da cousa em-
prestada por determinado tempo, porque seria faltar á boa fé dos
contractos.
Apenas se permitte ao commodante exigir a cousa, sobrevindo-lhe
necessidade urgente, ou finando-se o commodatario; porque se pre-
sume que o commodante no quizera em egnaldade de necessidades
preferir outrem a si mesmo, e não tivera em vista, n'esse contracto
essencialmente gratuito e benefico, ompliar aos herdeiros do com-
modatario o beneficio pessoal, que a este dispensava.
Carece porém de justificar judicialmente a necessidade urgente da
exigencia antecipada, se o commodatario recusa a entrega.
Na falta de ajuste só póde ser exigida a restituição da cousa com-
modada passado o tempo indispensavel para o uso concedido; e as-
sim não póde ser exigida a restituição da prensa emprestada para
fazer o vinho da colheita, senão depois de concluido este serviço.
As duvidas sobre a determinação do uso da cousa resolvem-se
pela declaração do commodante, que é quem faz o beneficio, e por-
que nos contractos gratuitos decide-se, em caso de duvida, pela
menor transmissào de direitos e de interesses, nos termos do artigo
685.0
O commodato, como cancessão graciosa de que ao commodante
nenhum proveito resulta, deve sempre interpretar-se restrietamente,
pela regra «iniasm est domsosns cique esse oiium susni..
O emprestimo de productos ruraes, feito a dono de productos o-
melhantes quer por cultura directa, quer pela renda de terras pre-
prias, não póde ser exigido antes da primeira colheita de productos
eguaes, artigo 1526.°, por se presumir que o mutuario os eão tem
antes da colheita para as restituir, salvo comprando-os, e que, se
quizesse compral-os. não teria celebrado o mutuo.
O tempo de duração do mutuo, quando não for de productos ru-
raes ou de dinheiro, é determinado pela declaraçào do mutuante,
artigo 1528.0
Para obstar aos abusos da parte do commodante e do mutuante
preferem alguns ao disposto nos artigos 1512.- e 1528.0 o preceito
da velha Ordenação. liv. 4.°, tit., 50.,¯§ 1., que deixava a decisão
do caso ao prudente arbitrio do julgador, segundo a qualidade das
pessoas, tempo e logar.

Art. 1514.1 O commodatario tem obrigação de velar pela


conservação da cousa emprestada, como se fôra siua propria.

(Vid. artigos 1516.0 e 1517.)


O commodatario, que tão beneficiado é com o emprestimo, deve
velar, como diligente pae de familias, pela conservação da cousa,
como se fôra sua propria, e até com prejuizo da sua propria artigo
1516" § unico, em homenagem ao sacrificio do homem generoso, que
lhe fez o favor do emprestimo.
Já a Ord. liv. 4.°, tit. 58.°, § 2 °, responsabilisava o commodatario
até pela culpa leve e levissima, assim no principal como no se-
cessorso.
ARTIGOS 1515.", 1516., 1517,, 1518. E 1519.0 131

Por casos fortuitos responde o coumodante, cois dono da cousa,


pela regra *res suo domino perita, salvo empregando o commodatario
e cousa em uso differente ou por modo differente do ajustado, como
destinando para trem o cavallo emprestado para cavallaria, ou
emprehendendo jorrada para que lhe não, foi emprestado o ani-
mal.
Se a cousa perecer ou se deteriorar por caso fortuito ou força
maior, mostrando-se que não lhe teria acontecido o mesmo em casa
do comímodante, aiuda que a perda deveria recair toda sobre este pela
já citada regra "res suoa domino perit», dividem-se as perdas entre
ambos artigo 1517., por equidade para com o commodante, que se
privou do uso da cousa sem retribuição alguma, e attendendo a que
«neíni ofjicium sum. debes esse damnosume».
Nem as legislaç8es modernas ofterecem, nem a referida Ordena-
ção reconhecia, exemplos d'esta eleia responsabilidade, que aliás não
deixa de ter apoio na boa razão.

Art. 1515.° 0 commodatario fica lambem sujeito, pelo


que respeita á cousa emprestada, ás mesmas obrigações
que o artigo 1451.° impõe ao depositario, em relação á
cotsa depositada.
(Vid. nota ao artigo 1451.)

Arl. 1516.1 Se a cotsa perecer, ou se deteriorar no uso


que lhe é proprio, ot por acontecimento fortuito ou força
maior, não sendo a dieta cousa empregada em uso difle-
rente d'aquelle para que foi emprestada, será toda a perda
por conta do dono, salvo havendo estipulação do contrario.
unico. Porém, se, ainda no caso de força maior ou de
acontecimento fortuito, o commodatario, podendo salvar
a cousa emprestada, não a salvou ou preferiu salvar as suas,
deixando perder a emprestada, toda a perda será por conta
d'elle.
Art. 1517.° Se o caso fortuito ou força maior for tal que
seja obvio, que tal caso ou força não se teria dado, se a cousa
estivesse em poder do seu dono, responderá o commoda-
tario por metade das perdas e damnos.
(Vid. nota ao artigo 1514.)

Art. 1518.1 0 commodatario responde por perdas e


damnos, desde o momento em que se acha coustituido em
mira.
(Vid. nota ao artigo 711)

Art. 1519." 0 comísodatario é obrigado ás despezas,


que a conservação da cousa naturalmente exige.
l"

132 ARTIGOS 1520.0, 1521. E 1,522.

Art. 1520.° Sendo dois ou mais os commodatarios, es-


tarão solidariamente adslrictos ús mesmas obrigações.
Art. 1521.° 0 commodante é obrigado:
1.e A indemnisar o commodatario das despezas extra-
ordinarias e inevitaveis, que elle fizer com a cousa em-
prestada, sem que por isso o dicto commodatario goze do
direito de retenção;
2.1 A reparar os prejuizos que o commodatario padecer
em razão dos defeitos occulos da cousa emprestada, se o
commodante o não preveniu, tendo conhecimento d'esses
defeitos.
fVid. artigo 1532.0)
São a cargo do commodatario as despezas ordinarias com a con-
servação da cousa, como consequencia do uso e do proveito que
d'ella tira, e de conta do commodante as despezas extraordinarias,
por inevitaveis e imprevistas.
Não gosa, porém, o commodatario do direito de retençio, que pela
Ord., liv. 4.1, tit. 53., § 1.-, tinha o que recebesse a cousa empres-
tada, e n'ella fizesse algumas beofeitorias necessarias ou provei-
tosas, e que pelo codigo tem o mandatario e o depositario, artigos
1349.0 e 1450.°, porque, ao contrario d'estes, é o commodatario quem
tira interesse e o commodante quem soffre com o commodato.
Tanto o commodante, como o mutuante artigo 15320, responde
pelos vicies oceultos que conhecia, e de que não preveniu o com-
modatario ou o mutuario, como se o commodante emprestou um
cavallo doente de mormo, que foi pegar a molestia aos do com-
mandatario, ou se o mutuante emprestou ao mutuario azeite mau
que foi estragar o azeite bom, com que este o misturou, etc., porque
não ha realmente epitheto bastante ignominioso para qualificar o
procedimento do homem que, sob a apparencia de obsequiar ter-
ceiro, lhe empresta dolosamente cousa que péde prejudicar-lhe a
vida, a saude, ou a fortuna.
Se o commodante ou o mutuante não conhecia os vicies da cousa
não é responsavel, porque nos contractos de beneficencia não res-
ponde o pactuante senão pelo dolo.
No caso de serem dois ou mais os commodatarios estabelece a lei
a solidariedade em proveito do commodante, que faz o favor, contra
os commodatarios, que são os favorecidos, pela mesma razão por que
no artigo 1348.° a estabelece em proveito do mandatario contra os
mandantes. Péde por isso o commodante, que empresta a duas pes-
soas a carroagem, pedir a restituição a qualquer d'ellas, e tornar
qualquer d'ellas responsavel pela restituição, ainda que se não te-
nham servido em commum da cousa, porque a sua intenção fóra
emprestal-a por inteiro a cada uma d'ellas.

Art. 1522.1 As acções por perdas e damnos, ou por


despezas feitas com a cousa emprestada, prescrevem dentro
d'um mez, contado desde a entrega da mesma cousa.

(Vid. nota ao artigo 547.°)

1,1

7
ARTIGOS 1523.-, 1524.", 1525.-, 1526.° a 1527.0 133

SECCAO III

Do mutuo

Art. 1523.° 0 mutuario adquire a cousa emprestada, e


por sua conta correrá todo o risco, desde o momento em
que lhe for 1entregue.
Art. 1524. 0 mutuario é obrigado a restituir a cousa
por outra equivalente em numero, quantidade e qualidade,
dentro do praso convencionado.

(Vid. nota ao artigo 1507.)

Art. 1525.1 Se não houver declaração ácerca do praso


da restituição, observar-se-ha o seguinte.
Art. 1526.0 Se o emprestimo for de cereaes ou de quaes-
quer outros productos ruraes feito a lavrador, presumir-
se-ha feito até á seguinte colheita dos fructos ou productos
semelhantes.
§ unico. A mesma disposição é applicavel aos mutuarios
que, apesar de não serem lavradores, recolhem fructos se-
melhantes pela renda de terras proprias.

(Vid. nota ao artigo 1511.0)

Art. 1527.° Se o emprestimo for de dinheiro, nunca se


presumirá que fôra feito por menos de trinta dias.

(Vid. artigo 1641.-)


Para evitar surprezas ao mutuario, que o poderiam collocar em
graves apuros, não pôde ser exigido antes de decorridos trinta dias
o dinheiro de emprestimo sem tempo marcado.
O alvará de 17 de janeiro de 1757, para obstar aos emprestimos
de dinheiro a um e a mais por cento ao miez debaixo do pretexto de
lucros cessantes e damnos emergentes, não permittia exigir a resti-
tuição do dinheiro antes de anuo, e o projecto primitivo do sr. Seabra
marcava tres mezes, prasos que representavam sem duvida maior
favor.
Mas o codigo não quiz favorecer tão avantajadamente o devedor
i custa do credor.
Havia até quem quizesse a continuação da jurisprudencia que ge-

3,..
e,:
q,.

134 ARTIGO 1527.-

ralmente applieava o aitará ao emprestimo gratuito, posto que' de


dinheiro a juro só elle faltasse.
Respondia porém o Sr. Seabra: «Não podemos concordar. As partes
podem estipular praso, se o nio espularem, a regra é que o mutuante
ficaria com direito de reclamar o dinheiro emprestado quando qui-
zesse; porém marca-se o praso de trea mezes (que era o praso mar-
rado no artigo 1589. do projecto primitivo, correspondente ao artigo
1527.' do codigo) nestes emprestimos, para evitar surprezas e em-
baraços ao mutuario com exigencias com que não contasse. Um anno
seria sem duvida maior favor, mas não temos direito a favorecer tio
exorbitantemente uns á custa dos outros. Não pequeno beneficio é já
o que resulta do emprestimo gratuito.
,A generalisação que se tem feito do citado alvará é injustificavel..
Além disso, não se tendo estipulado prsso, nas obrigações a di-
nheiro, a acção de restituição lia de ser precedida do aviso previo,
que só é dispensado nas obrigações com praso certo.1
Não havendo praso certo nem a falta de pagamento dos juros dis-
pensa o aviso previo quer na acção, quer na execução, e o devedor
ausente ha de ser prevenido em conformidade com o disposto no ar-
tigo 194.° do codigo de processo civil.
Deixar á vontade do credor o temp. do cumprimento da obrigação
equivale a não marcar praso para a restituição.
A falta de estipulação sobre o tempo do pagamento não impede
o devedor de pagar, ou de depositar quando quizer. O que impede é o
credor de exigir o pagamento da divida sem prevenir judicialmente
com trinta dias de antecipação o devedor para arranjar o dinheiro;
notificação que não tem distribuição, que não admitte opposição, e
que, depois de feita, é entregue a quem a tiver requerido, codigo de
processo civil, artigo 645.°
Por isso nas obrigações sem determinação de tempo para o re-
embolso, é nulla a clausula de dispensar o devedor de pagar o capital
em quanto pagar os juros, ou qualquer outra que tenda a inhibir o
credor de pedir o reembolso do seu capital.
A principio era pela jurisprudecia considerada nullidade suppri-
vel a falta dc aviso previo dos trinta dias, devia ser feita a recla-
mação dentro de cinco dias a contar da citação para a causa, e, jul-
gada procedente a nullidade, annullava-se todo o processado, em
vez de se suspender o andamento da causa, porque o aviso era re-
putado acto preliminar e não incidente posterior. 3
hoje, porém, outra é a jurisprudencia.
Hoje a prevenção de trinta dias é indispensavel para se legitimar
a parte era juizo, porque não se julga vencida e exigivel a divida
senào decorridos trinta dias depois da notificação.
Hoje a falta de prevenção não é nullidade de processo que possa

Accordão da Relação do Porto de 20 de novembro de 1885, Re-


vista osTribunaes, 4.° anno, n.-
86, pag. 216.
E Otticioda Direcção Geral dos Proprios Nacionaes de 30
de no-
vembro de 1863, Direito 2.' anno, n.° 24.
3 Accordàits, da Relação do Porto de 9 de março de 1890, e do
Supremo Tribunal de Justiça de 2 de novembro de 1887, Reista
das Tribsuaes, 9.' anno, n.' 197, pag. 77, e Boletim dos Tribuanaee,
2.' anno, n.' 50, pag. 105.

k AL
A TtttS 1528.' e 1529 135

ser sanada, é rullidade de direito, visto dizer a lei positivamente


que o credor não pilde usar do direito sem ter feito o aviso; e só
póde ser sacada por consentimento da parte.
E applicavel o artigo 1641.' tanto ds acções, como ás execuções,
como a qualquer genero de processo, porque o codigo não distin-
gue t, com quanto em relação ás expropriações hypothecarias se
coítem julgados por um e por outro lado.2
E tambem applicavel ao fiador, seja ou não principal pagador.
Mas só comprehende os contractos de emprestimo com interesse,
e não os emprestimos gratuitos, nem os credites provenientes de
outra erigem, que não seja a usara tal qual é definida no artigo 1636.°,
os quaes podem ser exigidos sem o favor do aviso antecipado de
trinta dias.
Nos tribunaes contisúa a julgar-se que a fazenda na enigencia
dos juros dos capitacs mutuados lia de observar o processo da lei
de 4 de junho de 1859 e das instrucções de 27 de setembro do mesmo
ano, com o fundameto de não terem sido revogadas pelo decreto
de 30 de dezembro de 1892, que n'esta parte se limitou a reconhe-
cer a disposição do artigo 6.° do decreto de 22 de julho de 1870. 3
Tambem pela jurisprudencia uniforme do fôro a falta de mani-
festo em tempo habil para o effeito da contribuição de juros não
anulla, e apenas suspende, o andamento do processo até se prati-
car esta formalidade; e é mesmo dispensado o manifesto, se o cre-
dor é por lei exempto de decima de juros. 4

Ai. 1528.° Sendo o emprestimo de qualquer outra cousa,


o tempo da duração será determinado pela declaração do
ulitnante.
(Vid. nota ao artigo 1511.')

Art. 1529.1 A restituição do emprestimo far-se-ha no


logar convencionado. Na falta da convenção, sendo o mu-
tuo de generos, far-se-ha no logar onde estes tiverem sido
recebidos, e, sendo de dinheiro, no domicilio do mutuante.

(Vid. nota ao artigo 739.^)

3 Accordéos, da Relaçào do Porto de 6 de agosto de 1895, e da


Relaçào de Lisboa de 11 de novembro de 1896, Revista dos Tribunaes,
14.' anno, n.' 317, pag. 73, e Gazeta da Relação de Lisboa, 10.' aoo,
n.: 70, pag. 553.
a Accordâos, da Relação do Porto de 27 de agosto de 1872, e do
Supremo Tribunal de Justiça de 12 de novembro de 1886, Revista
de Leyislaçâo e de Jurisprudencia, de Coimbra, 6.° anno, n.' 272,
pag. 189, e Boletini dos Tribunaes, 2.' anno, n.' 50, pag. 104.
3 Accordâos, da Relação de Lisboa de 28 de novembro de 1894, e
do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de maio de 1895, Gazeta da
lelaçào de Lisboa, 8.' anno, n.- 94, pag. 745, e 9.° ano, n.' 1, pag. 6.
4 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de junho de
1889, Direito, anno 29.', e.' 12, pag. 180,
136 ARTIGO 1530.-
Art. 1530.0 Se não for possivel ao mutuario restituir
em especie, satisfará, pagando o valor do mutuo ao tempo
do vencimento, e no lugar onde o emprestimo tiver sido
feito.

(Vid. artigos 1617.' e 1637.1)


Deveria regular-se o valor ou preço da cousa, que não pôde ser
restituida na mesma quantidade e qualidade, pelo que ella valesse
ao tempo do vencimento no logar da restituiçào. Nem o credor po-
deria aspirar a mais, nem o devedor offerecer menos, visto ser a
cousa, tanto em relação ao mutuante, como em relação ao mutua-
rio, representada pelo seu preço no tempo e no lagar da restituiçào.
Paulo, que não pôde restituir a Pedro vinte almudes de vinho que
este lhe tinha emprestado no Porto para os receber em Lisboa pelo
Natal, desonerar-se-ia da obrigação restituindo 20ô000 réis com os
juros da mora artigo 1533., se a 1 000 réis corresse então o almude
de vinho em Lisboa.
Esta é a doutrina da lei franceza e da lei hespanhola, e de quasi
todos os codigos.
No entretanto o nosso codigo manda calcular o valor do objecto
ao tempo do vencimento, não com respeito ao logar da restituição,
e sim com respeito ao lagar onde o emprestimo tenha sidofeito, dou-
trina já do projecto primitivo, e depois conservada pela commissão
revisora em todas as edições.
i
O artigo correspondente (1592.') do projecto primitivo era redi-
i gido nos seguintes termos: .Se não for possivel ao mutuario resti-
tuir em natura, satisfará, pagando o seu valor ao tempo, e no logar
em que o emprestimo for feito».
No projecto de 1863 artigo 1560.°, e no de 1864 artigo 1535.', vem
a mesma redacção, supprimindo-se apenas duas virgulas, e conser-
vando-se a que estava posta em seguida á palavra natura; e no pro-
E jecto definitivo da commissão revisora, apresentado como proposta
de lei pelo governo ás côrtes, vinha já com a redacção que tem no
codigo, faltando-lhe apenas a virgula que se encontra em seguida à
palavra vencimento.
Em vista, pois, tanto da letra como da historia da redacção do
artigo, ha de o mutuario, que não pôde restituir em especie, pagar
na epocha do vencimento o.valor do mutuo no logar da celebração
do emprestimo.
A commissào de legislação da camara dos deputados, substituindo
pelas palavras -em especie» as palavras «em natureza do projecto
apresentado pelo governo ás côrtes, que eram já do projecto primi-
tivo, e conservando a linguagem do artigo 1507', que declara obje-
cto do commodato as cousas que devem ser restituidas na mesma
especie, estabeleceria eonfusão entre o objecto do mutuo e o do com-
modato, se não subordinassemos a significação das palavras á natu-
reza dos principios que regem o assumpto, e se não considerassemos
que no commodato se restitue a propria cousa emprestada e não ou-
tra, ainda que da mesma especie, e que no mutuo se restitue em
quantidade e qualidade outro tanto como se recebeu. Empresto o ca-
vallo A, não posso ser obrigado a receber do commodatario outro,
ainda que da mesma raça e qualidade. Empresto vinte almudes de
vinho de Bordeaux, fico pago com outros vinte almudes da mesma
qualidade,

j
ARTIGOS 1531.", 1532.", 1535. a 1534." 137

Art. 1531.0 A restituição dos emprestimos, feitos em


moeda metallica, será regulada pelo modo estabelecido nos
artigos 724.° e seguintes.

Os pagamentos estipulados em ouro, antes ou depois de declarada


a inconvertibilidade da nota, em ouro hão de ser feitos conforme o
artigo 723.0 e o § unico do artigo 727.. porque nem esta moeda sa
hiu da circulaçào, nem ha impossibilidade de a obter no mereado.
Os decretos de 7 e de 10 de maio e de 9 de julho de 1891, dando
curso forçado às notas. que o mesmo é dispensnl-as da conversio,
nso invalidou as clausular relativas á fórma de pagamento, ajusta-
das em contractos anteriores, como não teve effeito retroactivo o
aviso de 23 de março de 1801, interpretando o alvará de 25 de fe-
vereiro do mesmo anuo, nem os decretos de 14 de novembro de 1846,
de 10 de março de 1847 e a lei de 13 de julho de 1848, com respeito
ás notas do antigo banco de Lisboa.
N'este sentido é a jurisprudencia.
(Vid. nota ao artigo 723.0)

Art. 1532.s 0 mutuante é responsavel pelos prejuizos5


que o mutuario tiver, tios termos do artigo 1521.°, u. 2.°
(Vid. nota ao artigo 1521.")

Art. 1533.1 0 mutuario é obrigado a pagar juros, desde


que se acha constituido em mora.

(Vid. nota aos artigos 711." e 720.")

Art. 1534. 0 mutuo de quantia excedente a duzentos


mil réis só póde ser provado por escrípto, assignado pelo
proprio mutuario ou reconhecido como authentico; e se
exceder a quatrocentos mil réis, só póde ser provado por
escriptura publica.
unico. A prova da quitação é applicavel o que acima
fica disposto para a prova do mutuo.
(Vid. artigo 2438.°)
Na falta de disposição especial rege o preceito geral do artigo

t Accordâos, do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de julho de


1894 e de 9 de novembro de 1897, e da Relação de Lisboa de 8 de
amaio de 1897, e de 2 de março e de 20 de julho de 1898, Direito,
27." anno, n." 8, pag. 36, e Ga seta da Relação de Lisboa, 11.° anno,
n.0 56, pag. 442, e n." 87, pag. 689, e 12.° anuo, n. 11, pag. 81.

BN&
138 ARTIGO 1584.'

2506.-, que admitte em regra a prova testemunhal para prova dos


contractos. 1
Muitas são, porém, as excepções.
O mutuo excedente a 4004)0 réis não pôde ser judicialmente
exigide sem escriptura publica, ainda que se reduza áquclla quantia
o pedido, porque a alteração na quantia pedida u o salva de nulli-
dade o contracto, como era já de direito velho, Ord. liv. 3., tit. 59,
24^
O proprio conselho de familia na apreciação das dividas dos me-
nores esta sujeito a esta mesma regra, visto competir-lhe, pelo ar-
tigo 224.° do presente codigo, verificar a legalidade das dividas pas
sivas, e pelo artigo 743.s do codigo de processo civil conhecer das
dividas c.igiveis nos termos da lei civil.
Tão rigorosa interpretação tem sido dada ao artigo 1534.°, que
já foi julgado insafliciente por falta de escriptura publica o re-
conhecimento de divida superior a 4004000 réis nos orçamentos das
corporações superiormente approvados, com o fundamento de não
supprirem tmes documentos a falta de escriptura publica por não re-
unirem os requisitos marcados no artigo 2423.", com quanto repre-
sentassem a confissão extrajudicial da divida, e podessem conside-
rarse authenticos.3
A disposição do artigo está sujeita a obrigação de celebrar escri-
ptura, aliás equivaleria a promessa de escriptura á propria escri-
ptura. 4
Refere-se o artigo apenas aos emprestimos em dinheiro, vistas as
palavras - quantia excedente a... réis -, com quanto os empresti-
mos noutros valores, como em joias, por exemplo, devessem tambem
1 merecer prova especial; e só comprehende os contractos de usura e
de mutuo s, e qualquer outro contracto especificado na lei, com ex-
clusão das materias commerciaes, porque se não exigem formalida-
Y
des especiaes para prova dos pagamentos mercantis.
Mas não rege as quitações de tornas em partilhas, nem os titulos
1- de confissão de divida em ajuste de contas, nem a entrega de di-
nheiro para emprestar, que representa mandato e não emprestimo 6,

É Accordãos do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de abril de 1886,


de 28 de julho de 1891, Boletim doa Tribnaes, 1.- anuo, n.° 26, pag.
409, e 6.- anno, n.: 258, pag. 626.
r Accordàos do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de fevereiro
de 1877, e de 24 de maio de 1887, Diario do Gose-o, n. 165 do
mesmo anao, e Boletim dos Tribunaes, 2.? anuo, n.^ 75, pag. 511.
3 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de fevereiro
de 1872, Boletim dos Tribtnaes, 7° anuo, n.- 288, p . 407.
4 Accordàos do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de novembro
de 1891 e de 2 de agosto de 1892, Boletim dos Trilntaes, 7.s anno,
n. 273, pag. 166, n.Y 306, pag. 694.
5 Accordãos da Relação do Porto de 27 de abril e de 14 de maio
de 188t, Revista de Legislação e de Jurisprndencia, de Coimbra,
19.° anno, n- 939, pag. 42, e 940 pag. 57, e accordão do Supremo
Tribunal de Justiça de 28 de novembro de 1893, Gazeta da Relação
de Lisboa, 7. anuo, n.° 50, pag. 398.
6 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de dezembro
de 1886, Boletim dos Tribunaes, 3: anuo, n." 94, pag. 121.

re
AITIGO 15 34.o 139

nem os pagaimentos por conta de terceiro t, que, se na essencia aio


emprestimo, na fórma não se confundem com o emprestimo, nem o
abono de dinheiro para a construeçào de obras com a promessa de
sociedade que ào é mutuo. 2
Fazem-se por escripto tparticular nos termos do artigo 62.1 do re-
gulanmento de 17 de agos o de 1881 os emprestimos na caixa geral
de depositos, qualquer que seja a quantia; como escripto particular
basta nos contractos de mutuo feitos pelas sociedades anonymas'
ainda caucionados com penhor, qualquer que seja o seu valor, mesmo
que não seja commerciante o outro contractante, codigo de processo
commercial artigo 141.°
Tambem pôde fazer-se a prova do mutuo superior a 4004000 réis,
independentemente de escriptura publica propriamente dieta, pela
declaração do devedor em testamento publico + ou mesmo particu-
lar, porque o testamento é documento authentico, é auto puia, ar-
tigo 2415., em que nada falta das formalidades da escriptura pu-
blica, porque o reconhecimento da divida no testamente importa a
confisso, que é a primeira das provas, artigo 2407.- no. 1.-, porque
a prova especial prescripta no artigo alo exclue a coufssdo pelos
devedores, aliás alo valeria o auto de conciliação que terminasse
pela confissão do devedor, e porque já assim se tem julgado. c
A confissão dolosa e simulada, quer em prejuizo das legitimas,
quer em beneticio de pessoas que por lei não podiam ser contem-
pladas pelo testador, só pela acçào competente pôde ser atacada.
86 para o efeito da contribuição de registo é que não so des-
contadas no inventario as verbas de passivo a que o ministerio
publico negar a sua approvação, qualquer que seja a somma e o ti-
tulo, regulamento de 1 de julho de 1895 artigo 96.°
Por esripto particular se prova o pagamento de divida de mutuo
excedente a 4004000 réis s, quando o pagamento e o escripto sejam
anteriores ao codigo civil, novissima reforma judicial, artigo 462.0;
assim como está sujeito, nio à lei portugueza, mas á lei do respe-
etivo paiz, o titulo de divida contrabida no extrangeiro.h
De ter a commissão revisora introduzido de novo o artigo 1534.0
sem o larmoisar com o artigo 2438.° resulta que, se em regra só
pôde ser provada por escriptura, publica ou particular, segundo ex-
cede a quantia de 400d000 réis ou a de 200 000 réis a quitaçào do
mutuo, por excepção basta a nota posta pelo credor no proprio titulo,

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de dezembro


de 1889, Iloletio doas Tribuoaes, 5.° anuo, n.- 188, pag. 211.
2 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de junob de
1896, Revista dos Tribunaes, 15.° auno, a.° 358, pag. 339.
3 Accordão da Relação do Porto de 30 de novembro de 1877,
Revista de Legislação e de Jurisprudencia, de Coimbra, 14.1 anco,
ny 687, pag. 169.
4 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de dezembro de
1887, Revista dos Tribunoacs, 9.- ano, n.- 210, pag. 281.
s Accordào da Relação do Porto de 26 de janeiro de 1872, Revista
de Legislação e de Jurisprudencia, de Coimbra, 5.' anno, n.- 222,
pag. 220.
O Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de dezembro
de 1897, Gazeta da Relação de Lisboa, 12.° anuo, n.^ 12, pag. 91.
140 ARTIGO 1584.

ainda sem data e sem assignatura, para exonerar da responsabili-


dade qualquer que seja a quantia, artigo 2438.0
O disposto no artigo 2438.° não é applicavel unicamente ao mutuo
inferior a 2004000 réis, como alguns pretendem, para o conciliar com
o artigo 1534.'
Pelo contrario o artigo 2438.' é excepção ao preceito consignado
no artigo 1534' A quitação no mutuo ha de ser sempre dada nos
termos do artigo 1534.°, salvo o disposto para a bypothese especial
do artigo 2438.'
O artigo 2438.' veio legalisar o costume, que com o andar dos
tempos se foi introduzindo, de exonerar o devedor pela entrega da
escriptura de divida com a nota de quitação no fim ou nas costas,
dispensando-se a escriptura publica para o distracte dos contrastos
por escriptura publica celebrados contra a doutrina da Ord. liv. 3.°,
e contra o principio de que as cousas, juridicamente fallando, pelos
modos por que se fazem por esses mesmos se desfazem.
Não tem a nota, a que se refere o artigo 2438.1, outra analogia
com os escriptos particulares, senão carecer tatobem de ser reco-
nhecida, ou havida judicialmente como reconhecida, para produzir
o effeito de desonerar da obrigação.
A commissão revisora com razão supprimiu o artigo 2813.' do
projecto primitivo, que applicava a disposição do artigo 2812.°, cor-
respondente ao artigo 2438.° do codigo, mesmo á hypothese de ndo
ser escripta pelo credor a nota, se a escriptura ou obrigação tivesse
estado sempre em seu poder, porque legalizado semelhante modo de
exoneração poderia o devedor fazer escrever a nota por terceira
pessoa, sem o credor dar pelo engano, especialmente na ocrasiáo
P de enfermidade, que terminasse pela morte.
Conforme o artigo 2438.° é indifferente estar em poder do devedor
ou do credor ou de terceiro o titulo com a nota de quitação, com-
tanto que a nota seja do punho do credor.
O simples escripto do credor, ainda sem data nem assignatura,
appareça onde apparecer, faz presumir o pagamento, porque o credor
não lançaria no titulo anota da exoneração do devedor sem o previo
F pagamento; e, se a lançou sem isso, sibi imputet.
A nota de descarga póde ser posta á margem ou nas costas ou
logo em aegida ao conteúdo da obrigação, como declarava o projecto
do sr. Seabra, e todos os projectos da commissào revisora, incluindo
o de 1865, apresentado como proposta de lei pelo governo ãs côrtes,
que n'esta parte não soffreu alteraçào nas camaras legislativas.
Tendo sido, porém, supprimida, ou nas commissoes das camaras le-
gislativas, ou na imprensa, a virgula que estava em continuação á
palavra .seguimento,, podia nascer a duvida - se posta noutra
i parte, que não á margem ou nas costas do documento, a nota signi-
ficaria a descarga do devedor, se não se conservasse a palavra -se-
guimento. que não teria justificaçto possivel, e seria até offensa à
C grammatica, se não aproveitasse ao devedor tambem a nota de des-
carga escripta logo em seguida ao conteúdo da obrigação, como lhe
aproveita a escripta á margem ou nas costas.


ARTIGOS 1535. s 1536.- 141

SECÇAO IV

Do emprestimo feito aos filhos-familias

Art. 1535.° 0 emprestimo feito a menor, sem a devida


auctorisação, não pôde ser exigido, nem do mutuario, nem
do fiador, se o houver.
§ unico. Porém, se o menor tiver pago a cousa pedida
ou parte d'ella, não lerá direito de pedir a sua restituição.
(Vid. nota ao artigo 99.^)

Art. 1536.0 A disposição do artigo 1535.0 não produ-


zirá elfeito:
1.0 Se o emprestimo for ratificado por aquelles cuja
auctorisaçãa era, alias, tecessaria, ou pelo mutuario, depois
da soa emancipação ou maioridade;
2.O Se o menor tiver bens com livre administração, que
possam responder pelo emprestimno, alé onde os dictos
bens chegarem;
:3. Se o dicto menor. achando-se ausente das pessoas
a quem pertencia auteorisal-o, se viu obrigado a coutrahir
o emprestimo para seus alimentos.

Respondem por qualquer emprestimo os bens de que o menor tiver


livre administraç o nos termos dos n.o 1.- e 2.° do artigo 147., até
onde chegarem em relaç5o a esses bens, porque é considerado maior.
Tambem náo pade subodtair-se o menor ao pagamento de empres-
timo para alimentos, contrabido na ausecia das pessoas a qaem
competia auctorisal-o. excepço determinada pela santidade do fim
a que o dinheiro é destinado.
Poderá então o credor exigir dos paes, como representantes do
menor, o que a este tiverem emprestado para alimentos, mas nâo o
qne lhe tiverem emprestado para estudos como permittia a lei velha.
E eloquente comnentario aos differertes nmeros do artigo, com
quanto os seus preceitos sejam em parte differentes, o disposto na
Ord., liv. 4., tit. 50.' 5 3. e 4.°, que dizia assim:
.§ 3 Porém, se o tal filho familias estiver em algnma logea de
mercadorias, ou tiver algum traeto de consentimento e mandado de
seu pae, ou sem elle, ser obrigado a pagar o que se lhe emprestar.
Porque, se por mandado de seu pae est no tal tracto, fica o pae
obrigado pelo emprestimo, que ao dito filho se fizer; e se o dito filho

MI
1
142 ARTIGOS 1537.-, 1538.0 E 1539.-

negociava sem mandado de seu pae, ficará elle obrigado até onde
chegar o seu peculio, e mais lno.
§ 4.° E quando o filho familias está em parte alongada e remota
por causa do sudo, será o pae obrigado a pagar o que se emprestar
ao dito filho para os gastos do estudo, não sendo porém mais que o
que o pae lhe costumava dar. E o mesmo será no que se emprestar
ao filho familias soldado, que stiver na guerra em parte remota, ou
que andar na corte em nosso serviço.,

CAPITULO VII

DOS CONTItACTOS ALEATOIIOS

Art. 1537.° E contracto aleatorio aquelle, pelo qual uma


pessoa se obriga para com outra, ou ambas se obrigam
nr
reciprocamente, a prestar ou fazer certa cousa, dado certo
facto ou acontecimento futuro incerto.
Art. 1538.Õ Se a prestalão é em todo o caso obrigatoria
e certa para uma das partes, e a outra só é obrigada a
prestar ou a fazer alguma cousa em retribuição, dado uni
determinado evento incerto, o contracto aleatorio diz-se de
risco ou de seguro.
Art. 1539.° Se a obrigação de fazer ou prestar alguma
coesa é commím, e deve necessariamente recahir em uma
das partes, conforme a alternativa do evento, este contracto
aleatorio chama se jogo ou aposta.

Vem a denominação <te contractos aleatorios da palavra latina


aa1otu que significa todo o jogo de sorte ou de fortuna, risco e
incerteza. N'estes contractos o que imprime caracter é a dependen-
cia de acontecimento incerto, completamente ignorado dos contra-
etantes.
A incerteza é elemento essencial dos contractos aleatorios.
O que fórra a essencia destes contractos é depender de aconteci-
mento incerto a perda ou o lucro das partes, como se o dono do navio
vindo de Moçambique segura o valor das fazendas em 100:OOOOOO
réis para o caso de perda ou de avaria, mediante a retribuição de
10 por cento paga definitivamente.
Não é da essencia do contracto, como resulta do artigo 1537.-, o
acontecimento y½tlro, porque basta a incerteza do acontecimento,
ainda que tenha já passado, como a perda de um navio, se o acon-
tecimento e as respectivas consequencias são ignorados dos contra-
hentes.

1
ARTIGO 1539. 143

Por isso os codigos de França, de Guatemala, do Mexico e outros,


definem contracto aleatorio a convenção reciproca, cujos effeitos,
quanto aos lucros e perdas para todos os contractantes ou para al-
gum d'elles, dependem de acontecimento incerto.
Preferem alguns para evitar fraudes a definição que exclue acon-
tecimentos passados, embora ignorados.
0 nosso codigo conmmercial, poré, seguiu a doutrina d'aquelles
codigos. porque segundo o artigo 436 é nullo o seguro se ao tempo
do contraeto a segurador tinha conhecimento de haver cessado o
risco, ou se o segurado, ou a pessoa que fez o seguro, sabia da exis-
tencia do sinistro, e fica o segurador sem direito ao premio no pri-
meiro caso, e com direito a elle no segundo mas sem obrigação de
indemnisar o segurado.
Pelo artigo 436. do codigo commercial, pois, ou fosse feito o se-
guro quando as fazendas estavam perdidas, ou quando estavam sal-
vas, se o segurado e o segurador estavam ambos na boa fé e ignora-
vam os factos, é valido o contracto, em que a sorte e a incerteza são
a parte essencial, porque ha egualdade para ambos os pactuantes,
visto que a cousa, assim como podia ter perecido, podia tambem
estar já fóra de perigo.
Téem os contractos aleatorios a natureza de contractos de risco
ou de seguro e de jogo ou de aposta, segundo é obrigatoria e certa
a prestação só para una ou incerta para ambas as partes; distin-
cção que é fundamental, porque os contractos de seguro ou de risco
não permittidos, ao passo que os de jogo ou de aposta são nallos ou
prohibidos.
Nos contractos de seguro verdadeiramente só uma das partes se
expüe a risco, mediante quantia que recebe como premio; mas não
deixam de ficar abnías obrigadas, com a diffcrcn;a de ser certa e de-
finida a obrigação do segurado, 10 por cento do valor das fazendas,
por exemplo, ou o navio chegue ou não a porto de salvamento, e
indefinida e incerta a obrigação do segurador, pois ou recebe a
prestação de 10 por cento sem outro incommodo que o risco a que
se sujeitou, chegando o navio a porto de salvamento, ou tem que
pagar o valor dos 100:0003(0) réis, ou menos, conforme se perdeu
toda ou só parte da carga segura.
N'estes casos contrahiram ambas as partes obrigação, com a unica
differença de ficar a obrigação de unia desde logo definida e certa,
ede ser a 'brigação da outra inteiramente dependente de aconteci-
mento fortuito.
O segurador não indemnisa o segurado senão dos damnns causados
por acontecimento incerto, e ao segurado não imputaveis. Se o se-
garado carregou as fazendas em movio innavegavel, por exemplo,
e por esse motivo ellas se perdcram, nenhuma indemnisaçào póde
reclamar do segurador, artiga 437. n, 3. do codigo de commercio.
Nos contractos de jogo ou aposta fica dependente de evento in-
certo a obrigação de ambos os pactuantes, como se Pedro aposta com
Paulo ganhar 100:(00(â00 réis se as inscripçães estiverem a 60 por
cento em 30 de junho de 1899, e perdel-os se as inscripções n'essa
epocha forem cotadas por preço inferior.
Não ha aqui obrigação certa e definida para nenhuma das partes.
Depende de evento certo a obrigação tanto de uma como de outra.
Não é aleatorio o contracto de alistamento para o serviço militar,
porque não vão além dos de risco su de seguro, de aposta ou de jogo
os contractos aleatorios, artigo 153-7 e seguintes; e não são obriga-
dos a restituir parte alguma do preço do alistamento os herdeiros
144 ARTIGO 154O.

do substituto contractado para o serviço militar por elle ter falle-


cido antes de concluido o tempo do serviço, porque se deixou de
seguir no cumprimento do contracto, não foi por acto voluntario,
mas por força maior artigo 677.-.1
Por serem de natureza bilateral os contractos aleatorios, eliminou
a commissão revisora, logo nos trabalhos da primeira revisão, o se-
guinte artigo que no projecto primitivo estava em seguida ao ar-
tigo 1599.°, correspondente ao artigo 1537. do codigo, e que era
redigido nos seguintes termos: ýO contracto aleatorio reveste a na-
tureza de doação condicional, se o estipulante que deve receber a
prestação não fica sujeito a retribuição alguma, quer se verifique
ou não o acontecimento..
Não prescreve o codigo regras especiaes para contractos de
risco, com quanto os reconheça e lhes garanta validade juridica.
Subordina-os is regras geraes estabelecidas para os outros contra-
ctos, salvo respeitando a objectos de commercio, porque então são
regulados pela legislação commercial.

Art. 1O. 0 contracto de risco ou de seguro, que nao


disser respeito a objectos commerciaes, será regulado pelas
regras geraes doscontractosestabelecidosno presente codigo.

Este artigo introduziu profunda alteração no direito anterior.


Pelo velho codigo commercial, artigo 204° n.- 10., eram conside-
rados actos commerciaes todos os contractos de seguro, qualquer que
fosse a especie, ou terrestres, ou maritimos, ou de vidas, ou contra
incendios, riscos de mar, etc.; e ainda hoje alguns codigos reservam
V para a legislação commercial o seguro, que aliás tem actualmente
tão larga applicação na vida social, que indispensavel é consignar-
lhe preceitos reguladores na lei civil.
Os segros mstso, por exemplo, hoje muito frequentes entre os
proprietarios para se indemnisarem reciprocamente dos prejuizos
causados em seus bens, nio são realmente actos de commercio.
O codigo civil, porém, subordinou às disposiçies das leis civis o
contracto de risco ou seguro que não diga respeito a objectos com-
á
merciaes, deixando assim as questões de seguros esphera da juris-
prudeocia civil ou da jurisprudencia commercial, segundo forem de
natureza civil, ou de natureza commercial.
Pela legislaçño vigente todos os seguros, com excepçào dos mu.
tmos, são sempre commerciaes para o segurador. qualquer que seja
o objecto, e para os outros contractantes só quando recahirem sobre
generos ou míeradorias destinados a qualquer acto de commercio,
ou sobre estabelecimento mercantil; e mesmo os seguros mutuos
quanto a actos de commocio extranhos ú mutualidade sito regula-
dos pelas disposiçes da lei commercial, como pela lei commercial
sito exclusivamente regulados os seguros maritimos, novo codigo de
commmercio artigo 425.'
Em todo o caso é o coligo civil legislaçào subsidiaria do direito

t Accordão da Relação de Lisboa de 5 de fevereiro de 1873, Di-


reito, 5. anuo, nY 13, pag. 208.

L, ti
ARTIGOS 1541., 1542. E 1513.- 145

commercial, assim como o codigo de processo civil é subsidiario do


codigo do processo commercial.

Art. 1541. 0 contracto do jogo não é permittido como


meio de adquirir.
Ar. 1542.° As dividas de jogo não podem ser pedidas
judicialmente, embora se disfarcem com as apparencias de
outro qualquer contracto ou novação. Mas, se o jogador
tiver pago o que perdera, não poderá tornar a pedir o que
assim pagou, excepto:
1.° No caso de dolo ou fraude da outra parte, ou quando
se dér alguma outra circumstancia das que, conforme as
regras geraes, obstam a que os contractos produzam effeito.
S2.° Se a somma ou cousa tiver sido paga em resultado
de perda em jogo de azar.
1. Diz-se jogo de azar aquele em que a perda ou o
ganho depende unicamente da sorte e não das combinações
do calculo ou da pericia do jogador.
2.0 A restituição de dinheiro, emprestado para jogo de
azar no acto do mesmo jogo, não pôde egualmente ser exi-
gida.
Art. 1543.° As disposições dos artigos antecedentes são
aplticaveis ásapostas.

Tractou o nosso codigo com bastante simplicidade e clareza a


questão do jogo, no que foi fielmente seguido pelo codigo do Chile.
Reconhece, como meio de adquirir, os contractos de seguro, ou
versem sobre objectos commerciaes, ou sobre objectos civis.
Mas não reconhece o jogo nem a aposta como meio de adquirir, e
nega por isso acção judicial para reclamar as sommas ganhas ao
jogo, qualquer que seja a importancia dessas sommas, ainda qse
disfarçadas sob a appareneia de outros contractos, porque considera
torpe a origem das dividas provenientes de jogo ou de aposta, e a
torpeza nào ,xplde sor causa de pedir.
Respeita apenas os factos consummados, isto é, os pagamentos vo-
luntariamote feitos pelo jogador, salvo o caso de dolo ou fraude e
de nsllidade geral, ou de jogo de azar.
To rigoroso é o codigo com o jogo de aoar. que dá ao jogador o
direito de rehaver as sommas que perdeu, e nega acção para repetir
o que para jogo de azar se emprestou no acto do jogo, porque reputa
cumplice o mutuante pelo concurso que prestou ao jogador.
Tatbem póde o jogador pedir o que pagou quando se der algusa
outra cireumstacia das que, conforme aos regras geraes, obstam a que
os cotractoo produzao effito, como a menoridade, a interdicçâo por
demencia, etc.
Egualmtcate o jogador, que perdeu em virtude de fraude, seja ou
noto de azar o jogo, como por estarem assignaladas as caras, etc.,
póde repetir o que pagou, por ser maior a torpeza do jogador que
empregou a fraude.
Too III. 10
146 ARTIGO 1543."

Para prohibir o jogo como meio de adquirir não distinguiu o co-


digo entre jogos licitas e jogos de azar, mesmo porque em rigor não
ha jogo sem azar.
A lei tolera o jgo, que não for de azar, como mero divertimento,
seguido se exprimia o projecto primitivo no artigo 1604.", corres-
pondente ao artigo 1541.° do codigo. Mas o jogo por modo de vida
pune-o como vadiag-m, codigo penal artigo 264., além da interdieçã
por prodigalidade a qu est arriscado o jogador se com isso des-
baratar seus bens conforme o artigo 340." e seguintes do presente
codigo.
O jogo em nenhum caso poderia ser considerado contracto civil;
porque, se é mera distracção, não é negocio, e, se representa officio
ou modo de vida, é verdadeiro dvlieto de que a lei civil não tem que
oceupar-se.
Não falava o projecto primitivo de apostas. Esta materia foi in-
troduzida pela commissâo revisora; e teve o artigo 1543." por fonte
o artigo 1702." do projecto de codigo civil hespanhol, a todos os
respeitos mais claro e menos sujeito a duvidas, porque dizia: «O dis-
posto nos dois artigos anteriores a respeito do jogo é applicavel às
apostas. Reputam-se prohibidas as apostas que téem connexào ou
analogia com os jogos prohibidosi.
Não havia diticuldades no systema d'aquelle projecto, que não re-
conhecia distincçào entre jogo de azar ou de não azar para o effeito
de se poder pedir ou não o que se tivesse pago ao jogo.
Applicadas ás apostas as disposiçées relativas ao jogo, ao qual
são equiparadas na definição, artigo 1539.°, tambem não podem re-
petir-se as dividas dellas provenientes, e apenas pdde pedir-se o
que se pagou no caso de dolo ou de fraude, como se o outro estipu-
laute apostou, sabendo j9 do evento, ou se empregou meios dolosos
para preparar a sua realisação, ou no caso de menoridade ou de in-
ter;licçào.
E aposta o ajuste entre duas pessoas de receber uma da outra ou
de pagar uma á outra certa quantia conforme acertar ou errar em
determinado calculo; e aão póde repetir.se neste caso a aposta
paga, salvo verifieaudo-se alguma das circumstacias descriptas em
os p." 1.° e 2.° do artigo 542.1
E jogo de azar a aposta, salvo não dependendo a perda ou o
ganho unicamente da sorte, mas tambem das combinações do cal-
culo ou pericia do jogador, nos termos do artigo 1542.° § 1., porque,
assentando em objecto razoavel e plausivel, como actos de força e
de destreza, é sujeita ás regras por que se rege o jogo, que não é de
azar.
Tambem representam verdadeiro jogo de azar, inteiramente de-
pendente da sorte, as loterias, que no codigo penal artigo 270.0 1.0
são delinidas toda a operação offerecida ao publico para crear a
esperança de am ganho que haja de obter-se por meio da sorte.
t decreto de 3 de junho de 1841, confirmado pelo decreto com
força de lei de 5 de novembro de 1851, suscitou a observancia da
lei de 25 de janeiro de 1677, que prolibiu em geral todos os jogos
de azar semr excepção alguma.

a Aceordão da Relaçào do Porto de 7 de fevereiro de 1882, Revista


de Legislaçdo de Jurisprdecia, de Coimbra, 22." anno, n." 1083,
pag. 119.

L
ARTIGO 1543.' 147

Aquelles decretos, declarando defesas no reino todas as loterias


naciones e extrangeiras, salvo as aoctorisadas por disposição espe-
cial, deixaram apenas em vigor a rsica que estava auctorisada pela
portaria de 27 de maio de 1831 e pelo decreto de 5 de outubro de
1838, no edificio da santa casa da toisericordia de Lisboa com ap-
plicação aos expostos da mesma santa casa, aos enfermos do hospital
de S. José, aos aluamos da casa pia, e aos pobres invalides do asylo
de mendicidade da capital.
O referido decreto de 5 de outubro de 1841 no artigo 2.' § uniro
considerou auctores ou cumplices de crime, pelo qual deviam ser
processados e punidos na csfarmidade das leis, todos os individuos
que de qualquer modo iaterviesse na comapra e venda, ou na cir-
eulaçãu dos bilhetes das loterias proibidas.
O projecto primitivo, de harmonia com o artigo 272." do codigo
penal então vigente, dispunha no artigo 1607.": «O jogo de loteria
poderã comtudo ser permittido pelo governo, mas sómente para fins
de beacilcencia, ou protecção das bellas artes, ou das letras,.
A commisso revisora, porém, eliminou aquelle artigo, sem das
actas constar se foi eliminado por superfduo, ou por deslocado ou
por inconveniente, como eliminou, de certo por desnecessario, o ar-
tigo 1t08" do projecto primitivo, final d'este capitulo, que era re-
digido assim: .As disposições deste capitulo serão entendidas sem
prejuizo do disposto no codigo penal, livro 2.", § 3., capitulo 7"»
Por decreto de 26 de setembro de 1891 chegou a estar auctorisada
a camaa municipal de Lisboa a crear estabelecimentos de jogos de
aar com permissao do governo. Mas nunca se deu execução a este
preceito, nem a opinião publica consentiria que elle fosse executado
no continente; e péde dizer-se hoje revogada semelhante disposição,
porque o codigo administrativo vigente não incluiu semelhante re-
ceita ns rendicentos da cascara municipal de Lisboa.
Não ficam prejudicadas pelas disposições d'este capitulo as penas
criminacs prescriptas no codigo penal artigos 264." a 269.°, como
expressamente dispusa o projecto primitivo no artigo 1608", final
deste capitulo, que a commissào revisora eliminou de certo por des-
necessario.
Nos artigos 270. a 272." prohibiu o codigo penal todas as loterias
não auctorisadas por lei, salvo as de moveis ou de dinheiro, desti-
nadas exclusivamente a actos de beneficencia ou á protecção das
artes, e a venda de bilhetes e cautelas de loterias extraugeiras,
constantes da carta de lei de 28 de julho de 1885.
Apesar das disposições de todas estas leis continuaram na pra-
tica sem reclaaçâo loterias estabelecidas antes da promulgação
do codigo; e possesscs temos, como Macau, onde são ainda hoje
permittidos os jogos publicos, sem embargo de alli ter sido posto
em vigor o codigo civil desde 1 de julho de 1870, decreto de 18 de
novemro de 1869.
As questôcs sobre o jogo da loteria e pagamento dos premios da
santa casa da misericordia de Lisboa ainda hoje estão sujeitas ás
preseripçôes do decreto de 27 de novembro de 1783, porque o co-
digo civil tia materia dos contractos aleatorios não legislou expres-
samente sobre lItvrias, e porque o decreto de 28 de abril de 1892,
usaudo da auctorisaçào coucedida pelo 36." a. 139 da lei de 30 de
junho de 1891, acabou com todas as loterias no continente do reino,
ilhas adjtcecntes e provincias ultramarinas, mantendo apenas a lote-
ria da saucta casa da misericordia de Lisboa, que declarou loteria
nacional porlugucza.

148 ARTIGOS 1544. e 1545.

CAPITULO VIII

DO CONTRACTO DE COMPRA E VENDA

SECÇAO I

Da compra e venda em geral

Art. 1544.° 0 contracto de compra e venda é aquelle,


em que um dos contrahentes se obriga a entregar certa
cousa, e o outro se obriga a pagar por ella certo preço em
dinheiro.
Art. 1545.° Se o preço da cousa consistir, parte em di-
nheiro, e parte em outra cousa, o contracto será de venda,
quando a parte em dinheiro for a maior das duas: e será
de troca ou escambo, quando essa parte em dinheiro for
a de menor valor.
1 unico. Quando os valores das duas partes forem eguaes,
presumir-se-a que o contracto é de venda.
(Vid. artigos 1592.° e 1594.0)
É da essencia da compra o pagamento a dinheiro da cousa ven-
dida 'cine pretio nulla rudi/io este dizia a lei romana; e é da es-
sencia da troca, ou cscambo como dizia a velha Ordenaçào, dar uma
cousa, que não seja dinheiro, por outra.
Mas, fixado e determinado uma vez o preço em dinheiro, não
deixa de ser compra e venda o contracto, p r se pagar o preço n'ou-
rv tra cousa em virtude de convençào posterior, porque é á constitui-
çào dos contractos, e não aos ajustes ulteriores, que se attende para
os qualificar.
Não prejudica a natureza de venda, ao menos para o effeito do
imposto de transmissào, o pagamento do preço em bens moveis ou
semoventes, ou em direitos e acções, ou em titulos de bancos, ou de
sociedades, ainda que pelos interessados o contracto seja denominado
de troca ou escambo, lei de 28 de junho de 1854 artigo a.oY
0 codigo civil hespanhol, mandando pagar a cousa em dinheiro

i boletim dos Tribunaes, 2.o anno, n.o 47, pagg. 49 e 60.


ARTIGO 1545. 149

ou em signal que o represente, comprehende no genero moeda os


valores fiduciarios.
Mesmo na trcoca a apreciação dos valores c a final feita em dinhei-
ro, pois troca-se o predio rustico que vale 1:000000 réis pelo edi-
ficio que vale 1:0o1000 réis; nem a esseseia da permutação está no
padrão para a apreciação dos valores, e sim la cousa dada em re-
ciprocidade.
A troca de moeda por moeda, como de ouro por prata, segue
as regras do contraeto de troca, porque se pemtam espcies por
especies, e não se dá outra cousa por dinheiro artigo 1592.0
( poaínoonto em dinheiro e n'outra cousa, como em predio rustico
e em dinheiro de volta, fica sojeito sempre ás regras da venda, salvo
quando for menos valiosa a porção dada em dinheiro.
Por em toda se parecerem os dois contractos de compra e de troca,
menos no preço que na venda é dinheiro e na troca não, appli-
cami-se troca, salvas disposições especiaes, as regras da compra e
venda artigo 1594., quanto á entrega da cousa, quanto á evicção,
quanto á lesão e vicios reílhibitoios, etc., por ser da esseuaia de
ambos os rostractos a transmissão a titulo oneroso e a equivalencia
dos valores
Não é elemeto costitutivo tio contracto a tradição. Pelo con-
trario est perfeita a coompra logo que se convem oa cousa e no
preço, sn emobargo de não estar entregue a cousa, nem pago o preço,
artigo 1549.0, como toosbem se opera a troca pelo simples consenti-
mento artigo 159.
Como o codigo civil frances, que define no artigo 1382. venda -o
contracto, pelo qual os contrahentes oc obriga»oo, e no artigo 1702.0
troca o contracto, pelo qual as partes se dão reciprocamente uma
comoa por outra., o nosso codigo define compra o contracto em que
um dos contrahentes se obriga, e troca, não oo contracto por que se
dá, mas -o conteacto em que os contrahentes se obrigao a dar»,
parecendo assim ora dispensar, ora exigir a entrega da cousa para
validade do coutraeto.
Sem embargo, porém, de qualquer redacção menos aceurada, na
lei nova tem a troca, como a compra e venda, o caracter puramente
consensual, independente da tradição, vista a disposição terminante
do artigo 715., e do artigo 1549.0 applieavel á permutação por força
do disposto no artigo 1594.°
E todavia certo que, para os effeitos fiseaes e do registo, antes de
reduzido a escripto e antes de paga a contribuição de registo não
ha contracto valido, nem de compra, nem de troca, sobre bens im-
mobiliarios.
Nas transmisses por titulo oneroso ha de ser paga a contribuição
de registo antes de celebrado o acto que as opéra, salvo nas trans-
missões, por escciptos particulares, em basta publica ou por adjudi-
raçào judicial, autos de conciliação ou subrogaçào de bens dotaes,
licitaçoes e tornas, que pode ser paga dentro de trinta dias conta-
dos da relebraçìo dos contiactos, da assignatora do termo de arre-
matação, da sentença da adjudicaço, do auto de conciliação, da
sentença sobra a subrogação ou sobre as parilhao, e ainda depois
do praso designado, no caso de justo impedimento devidamente com-
provado, mediante o juro da lunra.
Cootam-se os trinta dias, nas licitações e nas tornas, da data da
sentença sobre as partilhas, por ser a data da transmissão para os
herdeiras, salva isalteraç9es resultantes da decisão dos recursos
em conformidade do artigo 729.» do codigo do processo civil, não
.rrr 1.11

150 ARTIGO 1545.'

pde ser executada nem produzir effeitos juridicos a sentença sem


ser validada a transmissão no proso de sessenta dias pelo pagamento
da contribuição devida aggravada com mais 50 por cento, e juros de
mora; e passados noventa dias sem pagamento cumpre ao ministerio
publico intentar logo a arção de nullidade da partilha cumulada
corp o pedido da contribuição em dobro.
E o que dispõe o regulamento de 1 de julho de 1895 artigo 69."
e §§.
Nem mesmo no praso concedido para o pagamento da respectiva
contribuição podem ser produzidos em juizo os titulas comprovativos
d'esses contractos, sem estar assegurado o pagamento do respectivo
imposto, citado regulamento de 1 de julho de 1895 artigo 85.
Foi muito questionado, e de differente modo julgado, se pelo regu-
lamento de 31 de março de 1887 a contribuição de registo na com-
pra e venda de direitos illiquidos ou de quinhão de qualquer herança
indivisa havia de ser paga antes do contracto ou depois de feita a
liquidação dos cens ou direitos. u
Por terem os decretos de 31 de março de 1887 e de 1 de julho de
1895 eliminado o n." 13" do artigo 2 " do decreto de 30 de junho de
1870, que á contribuição de registo só sujeitava os contractos de
compra e venda de direitos incertos depois de verificada a posse dos
bens, por terem mantido no artigo 10.^i 8." o primeiro e no artigo
11^ 8." o segundo, o preceito seguinte - quando a transmissão
se effectuar por meio de renúncia au eedeccia a contribuição será
calculada sobre o preço que for pago ao renunciante ou cedente, ou
sobre o valor do objecto que qualquer d'elles receber da cedeocia
ou renúncia-, e por terem exigido aslctamente nos artigos 18."
e 69 F 1." a pagamento da c.ntribcição de registo nas transmissões
por titulo oneroso antes de celebrado . acto que os opéra, liquidan-
do-se o imposto pelos valores constantes dos titulos ou declarados
pelos contraetantes, algumas vezes fii julgado nullo o contracto de
cessão ou venda de direito a herança indivisa sem o previo paga-
mento da contibuição de registo.
Os artigos 18." e 9." 1." dos regulamentos, quer de 31 de marro
de 1887, quer de 1 de julho de 18t5, não reconheciam liquidação de
contribuição de registo por titulo oneroso de bens qne não estives-
sem ou não podessem estar na mo/ri: predial, nem pagamento de
imposto por titulo oneroso em transmissões que não fossem de pra-
priedade; e o 8" do artigo 10." do regulamento de 31 de março
de 1887 e do artigo 11. do regulamento de 1 de julho de 1895 aão
declarava quando, e sim cois havia de ser liquidada a contribuição,
e era copia textual do artigo 7. 10. do regulamento de 30 de ju-
nho de 1870, onde coexistia com o a." 13." do artigo 2 ", o que no
seria possivel, se significasse o contrario do que este numero pres-
crevia.
Porém, desde que a contribuição de registo não recahia sobre bens

SAcecordãos, da Relação do Porto de 21 de novembro de 1893, e


do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de junho de 1889, de 29 de
julho de 1892, de 13 de janeiro de 1893, e de 24 de janeiro de 1896,
Recista dos Tricanacs, 12 anno, n.271, pag. 100, e n "277, pag. 202,
e 14." auio, n' 336, pag. 373, e Gaota da Relao de Lisboa, 7.° auno,
n. 44, pag. 356.

.rr
,.

ARTIGO 1515.- 151

moveis, e a Ier:nça abrangia tanto moveis Camo immoveis, era in-


dispensavel a liquidação dos beus e valores, porque a cessão d> di-
reita 1 parte illiquida de uma herança aio se confunde, nem as leis
fi8eaes, quer antigas, quer modernas, jmais a confundiram, com a
tranmuissdo efleitiia de propriedade imumeiliaria.
Depois que Mousinho da Silveira escreveu no memoravel decreto
8
de 19 de abril de 1 32-desde o 1 dejaneiro de 1s39 se não pagar'
mais si:a alguma por nenhuní e s,ýre nenhum contracto, sene de
/itul<>
vendas e trocas de brs de raiz-no podia ser ampliada a incidre-
eia do imposto de transmissão por titulo oneroso a bens mobiliarios
Bem lei expressa que assim o determinasse.
Era a jurisprudeicia o seguida já ntes do decreto de 30 de junho
de 1870, apesar de ut haver na lei disposição Iegual a que este
decreto consignou, e que o decreto posterior de 31 de março de 18b7
eliminou, de certo per ser dispensavel, porque no artigo 18. man-
dava calcular o imposto sobre a confrntaço dos valores declara-
dos com os do rendi mento coliertavel das matrizes, o queaio podia
fazer-se antes da liquidaçào.
Ilíje, porém, esta resolvida a questão pelo decreto de 24 de outu-
bro de 18lt que declarou nullos os contractos de cessão de direito
a herança illiquida sem o previo pagamento da contribuição de re-
gisto, e prorogou até 8 de abril de 1l97 a faculdade de validar, me-
diante o pagamento das taxas respectivas. os contractos celebrados
sem o pagamento previo da contribnição de registo quando devida
fosse.
Tambem as disposiçues dos artigos S5a e 88.' do regulamento de
30 de junho de 1870 íue si obrigavam a pagamento da contribuição
de registo pelos contractos de venda condicioal, verificada a eudi-
çào, e que permittiam, verificado o pagameto da contribuiçlo de
registo por titulo oneroso, celebrar a todo o tempo o respectivo con-
tracto sem augmento ou diminuição dos impostos ja satisfeitos, ainda
que subequentes leis os tivessem alterado, se no encontram repro-
duzidas nos regulamentos posteriores.
D'antes nas cmpras e trocas, feitas em paiz extrangriro, de bens
de raiz sitos co reino não era ncessario pagar a contribuição de re-
gisto previamente á celebração dos contractos, antes da entrega dos
becs trarsuittidos. porque os formularios e mais annexos ao regi-
mento consular de 2m; de novembro de 1851, approvado pela carta
de lei de 1 de unho de 1853 mandavam fazer em taes contractos
expressa declaração de ficarem sem vigor até no reino se pagarem
os direitos.1
Mas hoje os contractos de compra e venda de bens immobiliarios
em territnria extrangeiei, ou perante o oiicial da localidade, ou pe-
rante os nossos agentes consulares, não sio validos sem o pagamento
previo da contribuiço de registo. z
Apeuas os contractos de compra e venda de bens immobiliarios,
celebrados no Brazil entre portuguezes perante o agente consular
portuguez podem ser feitos antes, com quaíto não façam fé perante

t Accordào da Relação de Lisboa de 22 de fevereiro de 1873, Di-


reito, 5: anno, n. 14, pag. 222.
2 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de junho de
1889, Direito, 29." anno, n. 2, pag. 19,
Y'

152 ARTIGO 1545.-

qualquer tribunal ou auctoridade do reino, sem estar paga a contri


buiçào de registo conforme as leis portuguezas, artigo 10. da con-
vençlo consular de 25 de fevereiro de 1876, approvada pelas cartas
de lei de 19 de abril, e ratificada por carta de 28 de abril do mesmo
anuo.
A contribuição de registo paga depois de operada a transmissào de
qualquer propriedade nos termos e com as formalidades da lei civil,
ainda que o acto ou contracto se desfaça, só é restituida quando a
mesma transmissào for julgada nulla por sentença, e no quando for
desfeita por accordo das partes ou o contracto de venda tenha sido
feito por escriptura publica ou por titul particular, citado regula-
mento de 1 de julho de 1895 artigo 117."
Apesar de no deixar duvida a ge eralidade do artigo 504." n." 3."
do codigo eommercial de 1833, de que não eram mercantis as vendas
de fructos proprios feitas pelo lavrador, nem com relaçào ao vendedor,
nem com relaçào ao comprador, fíi na vigencia d'aquelle codigo
muito questionado se a compra dos fructos para revender era acto
de commercio, pelo menos quanto ao comprador; e por vezes se jul-
gou que o lavrador que vendia os fructos da sua colheita a nego-
ciante do gencro para revenda nuo podia demandar o comprador
pelo cumprimento do contracto sendo no juizo do commercio, e que o
lavrador, quando réo, noo podia ser desaforado do juiz civil.'
Hoje é fóra de duvida que a venda dos fructos propries do lavra-
dir para revenda, com quanto acto de commercio só com relaçào ao
comprador artigos 463." e 464. do codigo de commercio, sujeita
ambos os pactuantes b jurisdicç ão mercantil, artigo 99. do mesmo
codigo, e artigo 3.' 1. do codigo de processo commecrcial.2
Ao juizo do commercio, e pela mesma razo. pertencem as com-
pras de moveis destinadas aouo ou caonsumo do comprador ou de
sua familia, e as reveadas d'esses objectos, cnmo as compras de
madeira para edificaçâo de predios, desde que sejam adquiridas
de commerciante que as tenba comprado para revender, posto no
sejam consideradas actos commercias, codigo de commercio artigo
464" ." 1
É a jurisprudencia hoje corrente. s
Não é, porém, operação mercantil 1 a venda d objectos para o
scenario em qualquer especta ala, visto nSo serem destinads a re-
r venda, comio o nào é a compra de papel para a impresso de um

r Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de agosto de


1885, Boletim dos Tribonaes, 1. anuo, a" 31, pag. 495.
2 Accordãos, da Relaçào de Lisboa de 30 de abril de 1890, e do
Supremo Tribunal de Justiça de 28 de abril de 1891, de 1 de março
de 1895 e de 1I de junho de 1897, Boletim do Tribunaes, 6." anuo,
n 25, pag. 649, e Gazeta da Re1?çcí de Lisboa, 9." anno, n. 1,
pag. 3, e 11 anuo, a." 4, pag. 27.
3 Accorddos da Relaçào de Lisboa de 2 de março de 1894, e de 6
do, fevereiro e 23 de março de 18,5, Gazeta da Relação de Lisboa,
7." anuo, o. 72, pag. 574, 8." anuo, n. 62, pag. 489, e 9. anno, n. 29,
pag. 27,
4 Accordão da Relaçào de Lisboa de 14 de março de 1877, /e-
visto de Legislação e de Jurisío"udencia,de Coimbra, 12." anno, a. 609,
pag. 526.

À
ARTIGOS 1546. E 1547 153

jornal, porque não importa a compra de mercadoria para ser re-


vendida depois de trab:lhada, pois o papel é destinado não para
revenda depois de trabalhado, mas sim para instrumento de mani-
festação do pensamento.

Ari. 1516.1 Os estipulantes podem convencionar que o


preço da cousa seja o que ella tiver em certo dia ou em
tal mercado ou Iogar.
Ari. 1i117.a Podem tambem os estiplmantes convencionar,
que a especificação da cons vendida tique dependente de
escolha; bem como, que esta seja feita por qualquer d'elles
ou por terceiro.
ý unico. Quando a escolha houver de ser feita por ter-
ceiro, e este não quizer ou não poiter fazel-a, ficará o con-
tracto sem eieito. se outra coida não for accordada.

Cm quanto não possa ficar dependente do arbitrio de senu


dos contratíntes, nem do anliirio de terceiro como alias permitte
o redigo rivil franeez no artig' 1592. a designaeào do preço, visto
dever ser certc, porque indefinido e indeteriado o pareo, que é da
eseucb do coitreto, falta tm elemento essencial to pacto, pode to-
davia coivceio tir-se que o peço da cousa ser o que ella tiver
ems certodia ou em tal íercad ou lugar, ou bolsa, coto succede
com os pipiis negciaecis e com as conses fiuigiveis, porque em
títquer dos casos ha meio de fixar o preço tjustide.
asiim é valida e muito ir quente 'els nossas trancçaets a vrenda
do visito, trigo, milho, e azeite pelo preço do primeiro mereado.
'ambem e preço certo obri;.'ar-e o comprador a susteter o ven-
dedor durante toda a sua vida, porqu e , se aio está espceiticaminte
fixai, píde todavia ser diteirminado pela justiça.
Não é, pois, idispensav el ficar desde logo certo e deteroinado o
preço, comtínio que se fixei bases para o determinar cum a refe-
rencia ~i íiqued, ex euo posil cerif'ciri.
A epecfieiçào dn cousa, porém, pôde deixar se ao arbitrio de ter-
ceiro, ou de qualquer dos contrahentes. Na compra de 20 metros de
terreno na quinta de Pedro pode ficar ao arbitrio do comprador, ao
de Pedro, ou ao de terceiro, a designção da parte da quieta onde
hão de ser iscolhidos os 20 metros de terreno, porque 'este caso a
falta de espícificaçe nao importa a falta de cousa certa por estar
comprehendida em coisa certa.
Nao queredo ou não podendo o terceiro fazer a escolhas, fica sem
elfeito o ajuste, salvo eonvençio em contrario, por nào se presumir
que as partes, tendo designado certo e dterminado individuo para
fazer a espeeiicaç:o, vi o commettel-a a outro.
Mas se por dolo de síia das partes o terceiro deixar de fazer a
escolha, poderá ento a utra obrigal a a louvar-se em pessoa did'e-
rente para a esprcificaç>i; e se a escolba ficou dependente de um
dos estipulates não pode este recuesar-se ádesinaçao.
Tamem o arbitrio proferido, ou por qual uer dos estipulantes,
ou por terceiro, sio t óde ser rejeitado, a não serq de commum acordo,
como diepunha o projecto priittivo no artigo 1611 , corresponde te
ao artigo 154i do codigo, que a commisto revisora ainda con-er-
154 ARTIGO 1548

vou nas ediçnes de 1863 e de 1814, e que depois eliminou, de certo


por desnecessario.
O contracto de compra e venla mercantil de cousa movei póde
tambem ser feito para pessoas que depois hajam de ser nomeadas, e
póde convencionar-se que o preço da cousa venha a tornar-se certo
por qualquer meio, que desde logo fique estabelecido, ou que fique
dependente do arbitrio de terceiro, indicado no contracto, sendo
sem effeito o contracto quando o terceiro não quizer ou não podér
fixar o preço, se outra cousa no for aecordada, codigo commercial
artigos 465. e 466.
A commissão revisora eliminou logo nos trabalhos da primeira
revisão, de certo por contrario à liberdade das convençes, o Á 3.
do artigo 16112 do projecto primitivo correspondente ao artigo 1547.
do codigo, redigido nos seguintes tercos: «O preço de fructos e ee-
rcaes vendidos a credito, a pessoas nào commerciantes, e para seu
consumo, não pôde exceder o mais alto preço que esses generos
tiverem na terra desde o acto da entrega até ao fim da seguinte
colheitas.

Art. t3'iS.1 A simples promessa reciproca de compra e


venda, sendo acompanhada de detertlitação de preço e de
especificação de cousa, constitue uta mera convenção de
prestação de facto, que será regulada nos termos geraes
dos contractos; com a dilferença, porém, de que. se houver
signal passado, a perda d elle ou a sua reslituição em utolbro
valerá como compensação de perdas e damnos.

Pelas Ordenaçies do reino, liv. 4., titt. 2.o e 7., reputava-se per-
feito o contracto de compra e venda logo que houvesse accordo na
cousa e no preço las, dependente como era da tradiçio a trans-
ferencia do dominio, ficava pertencendo ao primeiro que d'ella to-
masse entrega a cousa vendida a dois.
No systema do esdigo a promessa reciproca de venda com ac-
cordo na cousa e no preço, longe de constituir só mera convençlo
de prestação de facto, devia reputar-se verdadeira venda por reunir
os tres requisitos constitutivos do contracto, consentimento das par-
tes ou promessa reciprocm cousa certa ou cousa especifcada, e preço
certo os preço rdeermialo.
Pelo projecto de cod igo civil hespanhol artigo 1373.°, como pelo
codigo civil francez artigo 1599.°, e pelo projecto do sr. Seabra ar-
tigo lJ3i" correspondente ao presente artigo, só era simples con-
vençào de prestação de facto, e não passav a contracto de compra
e vena, a promessa de compra e venda sem determinação de preço
ou especiieaçào de ensa, doutrina ainda mantida pela commissào
revisora na edição de 1863 artigo 1577., e na edição de 1864 artigo
1583."
Tias a final ficou no codigo o principio exactamente opposto, isto
é, o preceito de que a simples promessa de venda acompanhada de
determiaçào de preço e de especiticação de cousa não importa só
por si renda irlida, com quanto seja contracto ralido, não para a
entrega do predio, moas como mera convenção de prestação de facto
para acçio de perdas e damnos.
ARTIGO 1548. 15

Das ultimas alteraçbes feitas pela commisso revisora resulta:


1 Que a simples promessa de compra e venda sem determinação
de preço e especificaçào de cosca nem fórma convenção de venda,
nem produz sequer direito ou scçâs para perdas e damnos, visto
faltar o accordo de vontades, que nào existe em quanto não se de-
termia a cusa e o preço;
2 Que a promessa de venda com determinação de preço e es-
pecificaçào de cousa já fórma contraeto, mas no contracto de
venda;
3.° Que nos bens immorioo só depois de reduzido a escripto o
contrarto artigo 1590.', e depois de effectuado o paramento da con-
tribuição de registo, é qe fica garantido o direito do comprador á
colha, e o direito do vendedor ao preço, sem possibilidade de urre-
petdimento.
J. pela lrdenaço, nos casos regulados no liv. 4.". tit. 19.°, e tit 96.'
18.'. antes de assigiada a tscriptura no estava perfeito e con-
,
smaido o cottraeto.
E preciso tambem o registo na ronservatoria quando a transmissão
é de immobiliario, para ficar seguro o direito do comprador contra
terceiros.
Talvez que a mente do egislador, reconhecendo à promessa re-
ciproca de renda com determinado de preço e especificarço de
cousa a natreza de mera eon-eçào de prestaçiã de facto, fosse
resolver o duvida uascids das ptlacrs da lei de 9 de julho de 1849,
que no podiam fazer prra em mir osecou por e.'rriptrapolica os
contractos de empra e venda, e de troca de bens re raiz de valor
excedente a i50/300 réis, se era tullo o cNtratu em quanto. io
fosse reduzido u escriptra publicr. por ser a escriptura da ess-cia
do rontra ito, oi se podia ser ompellida judicialente a fazer es-
eriptura publica a parte que se reetsava a assignar o contracto
depois ilo ajuste, servindo como titulo de egual força a sentença
que a isso a csrdemnaese, por nào ser a escriptura da essencia do
contrarto, mas s necssaria para prova.
Tá depois da prt tlgaígco do codigo se escreveu na imprensa ju-
ridite qut podia o comprador uar da acçào alternativa para coto-
pellir o vedteidr que Se arrependia a fazer a escriptura de
venda,
oa iudmnisar de perdas e dtmnío.
Ei face d endigo, porem, é celars que a simples promessa de
venda acompanhada de determinação de preço e de especificaçáo de
cousa e mera convenção de prestaçào de furto, que habilita apenas
para pedir perdas e darmos. e nto para obri Oar a parte ü assigna-
ttra d trcntrart e que
l, não ha contracto de venda e troca de tens
immoriliarios sem estar reduzid a esr ,/^, pblic ou particiar
segando t valor excede ou não 503000 réis artigo 1590.t, além da
contribuição de registo imposta pelas leis fiscaes.
Desde que o codigo terminntemente declara que a simples pro-
messa reciproen de cmpra e venda, ainda com determinação de
preço e especificaço da cousa, é mera convenção de prestaçào de
facto, que apenas dá direito a indemnisaçào de perdas e damnos
falta legitima elísi para pedir a celebração da escriptura.
Nem o vendedor poderia obrigar o comprador na mera conven-
çio de prestaçào de facto a fazer escriptura, desde que o obrigado à
prestaçào do facto til, pido ser rompelliduo jdicialmnte a prestal o,
mas sinple,-eate ti indemuisaço de perdas e ttanmos, artigo 711.'
NFlla é por isso a esiitpui:ão de pena para o que se recusar a
fazer a escriptura de venda promettida, como nulla é a pena con-
1516 ARTIGO 1548.'

vencional na promessa de venda de bens immobiliarios feita pelo


marido sem consentimento da mulher.
Para o efleito da cotribiiçào de registo, porém, são desde logo
consideradas vendas effeetivas as promessas de venda, verificada a
tradição da cousa, ou gosatdo o osufructo del!a o comprador, re-
gulamentd de 1 de ulho de 1815 artigo 14.'; e não dá direito á
restituição da contribuição a rescisão da promessa de venda n'estas
codiçòés, regílausent de 1 de julho de 1895 artigo 14»
Na falta de ajuste sobre o praso para converter em venda a pro-
messa de venda é preciso interpellar primeiro o comprador nos ter-
sms do artigo 711., notificaçâo, que pide ser substituida pelo cha-
mamento do réo ao juizo conciliasírio, apesar de julgados em con-
trario, e que poderá mesmo er dispensada comprovado o facto da
venda da cousa a outrem.
Marca o artigo a pena em que incorre o pactuante que pela sua
parte faltar ao promettido, e permitte ao que pela sua parte quer
cumprir, não a alternativa de exigir perdas e damnos ou a pena
convencional nos termos do artigo 676.', mas apenas o direito de
exigir a pena.
A pena convencional é o signal, que se reputa a verdadeira com-
peosaçdo de perdas e damnos, e que a Ord. liv. 4.', tit. 2., § 1." já
definia a cousa ou dinheiro que uia das partes dava a sutra como
garantia do contracto, perdendo-o o que o deu, e restituindo-o em
dobro o que o recebeu, conforme fosse aquelle ou este a abandonar
o contracto
Com quanto pareça destinado o signal, menos a garantir do que
a desfazer o contracro, visto poder a parte arrepender-se pagando
certo valor, é certo que as disposiçôes do codigo foram dirtadas no
intuito de premunir o comprador contra as cavillaçes do vende-
dor, e de segurar o vendedor contra a mi fé do comprador.
Nàn permittem alguns codigos a rescisào do contracto ainda com
a perda do signal.
Mas o nosso, inspirando-se na velha tradição do direito romano e
portugíez, deixa inteiramente livre a rescisào da venda, tanto ao
vendedor restituindo o signal em dobro, como ao comprador per-
dendo o signal dado.
Pelo velho codigo commercial artigo 463 tinha força de venda a
promessa de venda com consentimento reciproco de ambas as par-
tes sobre a cousa e preço, e não podia resilir- se do contracto a
titulo de se haver dado signal, porque em commercio sempre este
se entendia em principio de paga, salva couvençào expressa em con-
trario.
Mas no silencio do novo codigo conmmercial fica regendo o codigo
civil tanibem em materias mercantis.
Não depende a pena da verificação prévia da importaneia das
perdas e damnos. t valor do signal é, a titulo de compensação, a
pena do nào cumprimento da promessa o da aeceitação.
Ainda que tivessem sido muito maiores ou muito menores as per-
das e damnos do que a importancia lo aihsal, e mesmo qte nenhuma
das pírtes tivesse sítfrií. perdas e damnos com a ins realisaçio da
venda, a lei, no intuito de evitar liquidaçées ditheris e dispendiosas,
e na presumpçds de que as partes teriam considerado o calor do
signal suticieunte indemnisação dos prejuizos resultantes da não
relisaçio do con raeto, declara exonerados os paetuantes, pago
que seja o valor do signal, isto é, perdendo o signal quem o deu, e
restituindo-o ei, dobro quem o recebeu.

L.
-. q. .-

ARTIGO 1549.0 157


Por isso deve o comprador ter especial cuidado na fixação do va-
lor do signal, porque ticarã lesado sem possibilidade de reparação,
recusando-se o vendedor a fazer a escriptaua, se o valor do signal
não cobrir todas as despezas e todos os prejuizos, visto que não pôde
exigir maior indemnisação de perdas e damnos.
Si na promessa de venda onde ha possibilidade de arrependi-
mento, e não na venda consummada, é admissivel signal.
Hoje, salvo declaração em contrario, na promessa de venda todo
o diuteiro dado é signal, e na venda todas as quantias dadas ou
promettidas importam principio de paga.
O dinheiro adiantado pelo comprador ao vendedor é considerado
signal ou prfucipio de paga, conforme se tractar de simples promessa
de venda, ou de venda acabada, posto que já se julgasse que tam-
bem na promessa reciproca de compra e venda o dinheiro entregue
pelo comprador ao vendedor deve sempre considerar-se principio
de paga, salvo tendo-se estipulado expressamente a condição de
signal, porque a clausula do signal é apenas aecessoria, e não ele-
mento de compra e venda. 1
Corton assim o artigo a velha questão - se o dinheiro dado ao
tempo do ajuste dívia, em caso de duvida, reputar-se mero signal,
ou signal e principio de paga-, porque no primeiro caro podiam
as partes arrepender-se, perdendo o valor do signal, e no segundo
nao.
Se, porém, não houver signal passado, nem por isso o que se arre-
pendeu deixa de ficar obrigado a iademnisar o lesado nos termos
dos artigos 676.° e 702.° a 709., restituindo a cousa ou o valor re-
cebido, e pagando os demais prejuizos resultantes do não cumpri-
mento da convenção.
O sigoal representa apenas a liquidação prévia da importancia das
perdas e damnos.
A prova da promessa de venda, como do recebimento de qual-
quer quantia em signal ou em principio de paga, não carece de es-
criptura publica, e até por testemunhas póde ser feita artigo 686.°,
visto não estarem marcadas formalidades especiaes para este con-
tracto; as quantias devidas em restituição de signal não estão su-
jeitas a decima de juros. 2

Art. 1549.° A cousa comprada pertence ao comprador,


desde o momento em que o contracto é celebrado, bem
como, desde esse momento, fica o vendedor com direito a
haver do comprador o preço estipulado; mas, em relação
a terceiro, a venda, sendo de bens immobi harns, so pro-
duzirá efdeito, desde que for registada tos termos declara-
dos no titulo respectivo.
(Vid. nota ao artigo 715.-)

t Accordão da Relação de Lisboa de 30 de abril de 1885, Gazeta


da Relação de Lisboa, 1. an0o, a.° 9, pag. 63.
2 Decreto, sobre consulta do Supremo Tribunal Administrativo, de
28 de janeiro de 1892.
158 ARTIGOS 1550.^ a 1551.'

Art 1550.° 0 risco}la cousa vendida será regulado pelo


que fica disposto nos artigos 71.0 e seguintes.
(Vid. nota ao artigo 714.°)

Art. 1551.° As vendas a contento, ou de cousas que se


costumam provar, pesar, medir, ou experimentar antes de
serem recebidas, consideram-se sempre como feitas debaixo
de condição suspensiva.
(Vid. artigos 1576.° e 1577.-)
A venda a contento, isto é, dependente da subsequente approva-
ção do comprador, e bem assim a tenda de cousas que pela sua
natureza costumam ser provadas, pesadas, medidas, ou experimenta-
das. fica em suspenso at a acceitação definitiva, correndo por conta
do vendedor o risco, nas primeiras em quanto o comprador não se
dá por satisfeito, e nas segundas em quanto não são ettbetivamente
provadas, pesadas, medidas, ou experimentadas.
Comprado a contento por um mez o relogio todo o risco durante o
mez que uào seja imputavel ao comprador é i conta do vendedor,
porque não póde dizer-se prestado o consentimento pelo comprador
sem haver decorrido o mez de ensaio ou experiencia, como por conta
do vendedor é o risco das cousas que, antes de se receberem, cos-
tumam provar-se, medir-se, pesar-se, ou experimentar-se, ou essas
cousas sejam compradas em globo, isto é, por partida inteira, ou
sejam compradas por conta, peso ou medida, vistos os termos gene-
ricos e absolutos do artigo.
Pelo novo codigo commercial artigo 472.', como era já pelo velho
codigo de commercio artigo 458.°, as cousas, não vendidas a esmo ou
por partida inteira, mas por conta, peso ou medida, são a risco do
vendedor, até serem contadas, pesadas ou medidas, salvo se a coa-
tagem. pesagem ou medição se não fez por culpa do comprador, e as
vendidas a esmo ou por partida inteira ficam por conta e risco do
comprador, ainda que não tivessem sido contadas, pesadas, ou me-
didas para determinar a quantia do preço.
Segundo o novo codigo commrcial é a esmo ou por partida in-
teira a venda quando as cousas forem vendidas por um só preço de-
terminado, sem attenção á conta, peso ou medida dos objectos, ou
quando se attender a qualquer d'estes elementos unicamente para
determinar a quantia do preço; e na venda por conta, peso ou me-
dida a entrega da fazenda, sem se contar, pesar ou medir, suppre
a conta, peso ou medida.
Vendida a partida de algodão vinda no navio B, e entregue o
conhecimento da alfandega, fica por conta do comprador a perda
acontecida depois da venda, antes mesmo de pesada a fazenda para
computar a totalidade do preço.
Mas em direito civil, vista a regra absoluta do artigo, a venda de
cousas que se costumam provar, pesar, medir, ou experiment ir,
ainda que sejam designadas em globo, e se fixe o preço na totali-
dade, como, por exemplo, a comprade todo o trigo que Pedro tem
no celleiroi pord1:OOOéOOU réis, considera-se sempre feita debaixo
de condição suspensiva, e não é, portanto, perfeita antes da conta,
peso, ou medida.

.
ARTIGOS 1552.^ . 1553.° 15s

Fica, porém, mesmo em direito civil, desde logo perfeita e pura a


venda de partida ou da totalidade de certas cousas por preço de-
terminado, e sem sujeiç:ìo a conta, peso, ou medida, em presença
das inteaçfes das partes claramente manifestadas.
A disposiçio do artigo não prejudica a estipulaçào em contrario.
Podem comprar-se em razdo de certo numero, peso, ou medida,
não só cousas fauígiveis, mas até coausas immoveis, como indica a
generalidade do artigo 1576., e a sua fonte, artigos 1617.° a 1620.°
do codigo civil francez, e se deduz tambem do artigo 716.:, como a
compra por 10041000 réis de uma propriedade com 1:00 metros a
100 réis o metro.
Mas não basta declamar no contracto a medição e a compra da
totalidade do predio. E preciso ainda comprar por medida, verti
gralia a 100 réis o metro.
Se na entrega da quantidade marcada ao adquirente se descobre
falta ou excesso ronsideravel, a arbitrio do juiz, tem o comprador a
faculdade, ou de resilir do contracto, ou de exigir a reducção do
preço ou de supportar o aogmento, conforme houver falta ou ex.
cesso, artigo 1576.; e não pode queixar-se da alternativa concedida
ao comprador o vendedor que deu causa ao engano por não conhe-
cer exactamente a medição do seu terreno.
Se o terreno, por exemplo, em vez de medir 1:000, medir só 800
metros, pagará o comprador só 8é000 réis eru vez de 1003000 réis,
reduzindo se o preço em proporção da falta, para não ficar o metro
mais caro do que o ajuste; e se o terreno, longe de medir 1:000 me-
tros, medir 1:200, pagara o comprador 1203000 réis, para não se
locupletar com a jactura alheia.
Se porventura o comprador preferir abandonar a convenção, é o
vendedor obrigado a restituir-lhe, alén do preço que recebeu, as
despezas do contrarto, artigo 1577., visto ter dado causa á rescisão,
por não conhecer, como devia, a medida exacta da cousa vendida.

ArI. 1552° As despezas da escriplura e do registo, ha-


vendo-as, ticam a cargo do comprador, tia falta de decla-
ração em contrario.
(Vid. nota ao artigo 746.")

SIECÇAO 11

Dos objectos da compra e venda

Art. 1553." Podem ser objecto de compra e venda todas


as cousas que estão em con atercio, e não são exceptuadas
por lei ou pelos regulamentos administrativos.
(Vid. nota ao artigo 370.")
160 ARTIGO 1554.

Art. 1554.° Só podem ser vendidos nos casos e pela


fórma estabelecida na lei:
1.0 Os bens dos menores e dos interdiclos, e quaesquer
outros, que estejam em administração;
2.0 Os bens dotaes;
3. Os bens nacionaes, municipaes ou parochiaes, ou de
qualquer estabelecimento publico;
4.° Os bens penhorados.
1.0

(Vid. nota ao artigo 267.)

2.9

(Vid. nota ao artigo 1149.0)

3.

(Vid. nota ao artigo 35.')


A venda como o arrendamento dos bens comprehendidos no pre-
sente numero estl sujeita .i, legislação administrativa artigo 104.-
Os bens nacionaes, como os bens municipaes, e os de quaesquer
outras corporações publicas, quando immobiliarios, só em hasta pu-
blica podem ser alienados, salvas hypotheses especiaes, como a do
artigo 46. j 1t. do decreto n.°2 de 31 de dezembro de 1861, em que
os proprietarios obrigados, em resultado do alinhamento para a
reconstracçào dos predios, a avançar sobre a via publica 1, se hão de
conformar com as leis de expropriação, porque a praça seria ia-
compativel com o aproveitamento do terreno em tars condições.

(Vid. nota ao artigo 9490 n. 6.')


Não pôde qualquer vender senão o que estiver effectivamente no
seu patrimonio e ia sua posse, oo a qu teunha direito, como, por
exemplo, o ou quinhão em herança indivisa; e os bens, pelo facto
da penhora, deixam de estar ã ordem do executado, porque ficam
ordem da justiça.
Por direito velho, j 3. n» 2." do artigo 590.°' da Nov. Ref. Jud.,
como por direito novo, codigo de processo civil artigo 815.', não po-
dem ser penhorados, nem vendidos em execução, nem ser objecto de
hypotheca legal ou convencional, os jazigos de familia 2; o que to-

1 Accordãos, da Relação de Lisboa de 3 de outubro de 1888, e do


Smprcmo Tribunal de Justiça de 2 de maio de 1390, Direito, 22." anno,
n.' 16, pag. 255.
2 Accordão da Relação do Porto de 18 de fevereiro de 1873,
Direito,5.° anno, n.° 14, pag. 223.


as -

Ár'IGO ã555. 161

davia mio obsta a que sejam objecto de contracto ou de deixa, pois


que fazem parte do patrimenio individual. 1

Art. 1555.1 Ninguem pôde vender senão o que for pro-


priedade sua, ou a que tenha direito; e, se vender cousa
que pertença a outrem, será o contracto nullo, e o ven-
de'lor responderá por perdas e damnos, tendo procedido
coni dolo ou tua fé.
nico. O contracto será, comttdo, revalidado e ficará
o vendedor quite da respousabilidade penal em que tiver
incorrido, se antes que se d a evicção ou a acceusação, o
dicto vendedor adquirir por qualquer titulo legitimo a pro-
priedade da cousa vendida.

Por direito romno, que tambem ãopermittia, como não permitte


neiinoaii legislação, a venda da cousa aliíeia, ndo podia o compra-
dor rescindir o contraeto com o ftndamento de não ser o vendedor
o verdadeiro proprictario, senão no caso de dolo da parte do alica-
dor.
Ptrém, segundo os boia principios jíridicos, e conforme o preceito
do artigo 4hi83 do velho codigo comitercial, o contracto de venda
de cousa alheia, além de siulo, legitimaria a acção de perdas e
damnos contra o vendedor de má fé, mas só quando o comprador
igeoras'e que a cousa era de outrem, porque não deveria pemittir-se
a aciàs de perdas e dianos cont a o vendedor de iá fé, se em
m fé estava tambem o comprador.
Pea codigo civil póde o comprador, logo que saiba que o vende-
dor não é o verdadeiro prop rietario, tenha ou não havido dolo, seja
ou to incoimodado por terceiro, requerer inunediatítente a res-
cisão do contrato. Mas em caso nenhum pde ser allegada e op-
posta pelo v-tdedor a nulidade da veNida de cousa alheia, como
acertadtamnte determina o codigo civil italiano no artigo 1459.-
Não , pois, radical a absolutamente nulla a venda de cousa alheia,
porque ní o , de ordem publica a falta, e tanto que desapparece o
vicio de srigem, fica sanada íadllidade, e é revalidado o contraeto,
desde que o vendedor obtenha do verdadeiro dono a cousa aleia
por cropra, ou por dcação, ou por qualquer outro meio legitimo, por-
que seriao os unicos in teressados e os unios competentes para in-
tentar qualquer aeçSo o verdadeiro prtprictario para entrar si
posse da propriedade a o comprador para evitar, não só a evicçs,
mas qualquer procdento petal por cuiplicidade criminosa com o
vendedor.
Fira obrigado e voenddor, se proceder comi dolo, uão sé á evicção,
mas tambem a perdas e damuos, e á responsabilidade penal, que é
priso por itais de seis mezes, liu póde ser aggravada com multa

t ilficio do Alinisterio do Reino de 17 de julho da 1896, Direito,


29?1 anuo, n 12, pag. 1838.
Tomo 111 11

X,
1G6 ARTIGOS 1556.', 1557. n 1558.

e suspensão dos direitos politicos por dois annos artigo 450.' n: 1.


do codigo penal
Ndí fica, porém, desonerado da responsabilidade criminal o ven
dedor, eií vcificando-se a acquisiçào a/es da eeicçdo ou da -ies-
sardo, plrases que devem entender-se no sentido mais favoravel ao
vendedor pela regra odiosa restrinenda..
Aoim di se a coieço, não desde a proposição da respectiva aeçào
em juizo, mas depois de transitar em julgado a sentença, que julgou
procedente a aeçào, e dl-se a aceusaçdo, formulada que seja a queixa
n proceso intermediario, artigo 3. do decreto m.i» 'de 29 de março
de 1890, que é o competente, em vista da pena prescripta no ar-
tigo 450." do coligo penal, para perseguir quem, jiayiído-se senhor
de cousa alheiií, a alienou como propria.
Fica portaut livre de respoísabilidade penal o vendedor, ad-
irindo o predio antes de transitar im julgado a sentença que
jnlý procdate
it a açao de rvicçvi) ou antes de formlada a
qucix: no juiza crine.
Foi assim profundamente modifiesdo o artigo 450.° do codigo pe-
nal, que não absolvi:, o burlão, que tivesse vendido cousa alheia
fioiiodose senhor della, pelo facto de a adquirir posteiormentc
de julgada a evicçdto ou antes de tcomçada a accusaçào; e
í.w-
deveria despparceer de tudo a penalidade pela venda de cousa
alheia, quando fosse immaobiliaria, desde que se tornasse obrigato-
rin o registo do dominio, porque entào a propriedade perteneeria
a quem o registo indicasse conto dono, e o adquirente teria no re-
gisto provisorio do contracto o meio de evitar qualquer logro do trans-
iittente.
Não pide reclamar o preço o comprador se sabia que a cousa era
alheia, porque tomou sobre si o risco, argumento do disposto no ar-
1 tigo 1051.· n." 1.-
A hypothese do legado de cousa alheia é regulada nos artigos
1801.° a 1804.°

Art. 15Id.° Nio póde ser objicto de compra e venda o


direito a herança de pessoa viva, ainda havendo consenti-
mento d'ella, nem o podem ser os alimentlos devidos por
direilo de fam lia.

(Vid. nota ao artigo 189.')

Art. 1557.1 A venda de cousa ou direito litigiosos não


é defesa; m<s, se o vendedor não dec!arar, como a coesa
vendida é litigiosa, responderá por perdas e damnos, se a
dieta cousa for evicta, ou se no litigio se provar, que nãao
linha esse direito.
F
(Vid. nota to artigo 785

Art. 1558.< E nulla a venda de cousa que já nio existe,


ou não póde existir, e o vendedor responderá por perdas
e damos, se tiver procedido coto dolo on mi fé.


ale L

ARTIGOS 1559.-, 1560.-, 1511- s 1562.- 163

mico. Se, porém, a cousa vendida tiver perecido só


em parte, ficará ao aibitio do comprador desfazer o con-
Iralo, ol acceitar a parte restaule, reduzindo-se propor-
cio;i;lrente o preço.
E mlli pos )'n'ai/ i/idade phy.ica, porque falta tm dos tres re-
qrí is,,s es.-o-iu( < La convenção-- cosa cera - a venda de cousa
que t: itio esiAlia ao tempo do contracto, como de edificio já in-
cendialo e perdido na totaid:ide, porquC, o assento e os alicerces
nr sarisfiazm ao lim io comprador.
Irá de a vended uirl pr', piorquIe verdadiirameute u5o
venlau ,e reponrer aiIr disso por prds e dtmní s no caso de
dolo, isto d, no ci d. sailr qu a cousa j n o existin; e roltn
aíim as
ti cusas i c,1hr anterior, para o vendedor siao locuple -
tar co a iaitra ll:ir .
Tendo, prrCm:. pcrcido prnas prrte da cousa, fica ao compra-
dor o direito d acceilnr a parte restante com rdueçao d ..preço,
ou de rescindir o contracto, porrue o objecto xistente ao tempo
da tenda no é precisamente o que elle quiz comprar, e ao com-
pror opde nuo convir senão a totrlidnde, o nio parte da cousa
oinprada.

S:Ctt:\o IIi

Das pessoas que podem comprar, e das que podem vender

Art. 15'i9. Podem vender todas as pessoas, que não


são lealmente inhihidas de disptr de seus bens, ou seja
em razýrr d cu esýado ou da natureza da cousa.
Art 1oiG0. Podtim comprar todas as pessoas que podem
conractar, salsas as seguitles exrepçes
(Vid, nota ao artigo G13.O)

Ari. 11G1.° Não podem comprar bens immobiliarios as


assor :itoes On cortrações perpetuas, senão nos casos e
pela friua em que por lei lhes é periittido.
(Vid. nota ao artigo 35)

Art. i5ii.° Não podem ser compradores, nem directa-


meule, nem por inierposia pessoa:
1.o Os mandatarios ou procuradores, e os esiabeleci-

ýk_ .
i] 1 ARTIGO 1562.

mentos, quanto aos bens, de cuja venda ou administraçâo


se acham encarregados;
2.° Os ltures e os protutores, quanto aos bens dos seus
tutelados ou prolulelados, durante a tutela ou protutela;
3.° Os testamenteiros, quanto aos bens da herança, em
quanto durar a testaimentaria;
4.0 Os funecionarios publicos, quanto aos bens em cuja
venda intervém, conto taes, quer esses bens sejam nacio-
naes, municipaes ou paroebiaes, quer de menores, de in-
terdictos ou de quaesquer outras pessoas.

(Vid. artigos 1599. e 1G69s ur '2.-)


Não podem adquirir bens, quer por venda, quer por emprazamento,
quer por locação, aert os mianrdatarios ou procuradores nem os esta-
bclerimetos os bens da sua administração, nem os testamen/eiros
os bens la herança em quanto durar a testamentaria, nem os tuto-
res e os protulores os bens dos tutelados em quanto durar a tutela
ou a protutela, nem os /ítncioarios ptblicos quando intervenham
como tars nesses contractoa, artigos 1599 e 169 as 2
A razão é porque todas estas entidades são obrigadas pela natu-
reza de suas fínireçes a empregar os meios legitimos para elevar ao
mais alto preço aquelles bens, e na lucta dos interesses com o de-
ver poderiam prevalecer-se da sua posição para afastar concor-
rentes.
Sías podem tomar, quer de arrendamento, quer de compra, quer
de emprazamtinto, os bens de estabelecimentos publicos, como muni-
cipalidades, parochias, misericordias, etc., os respectivos administra-
dores nas ailinaçbes feitas pelo governo, das quaes não são encar-
regados, e nas quaes não intervêm.
Não fdlava de estabelerimenLos, e sim de administradores, o proje-
cto primitivo, onde o artigo 1626., correspondente ao presente ar-
tigo, era redigido nos seguintes termos: aNão podem comprar os
bens, de cuja venda ou admiistraçâo se acham encarregados: 1.° os
mandatarios ou procuradores; 2." os testamenteiros e adminislra-
dores: 3.° os empregados publis a.
Mltas [ago ta primeira revisão a doutrina do artigo foi approvada.
salva nova redaccão, como se declara em a nota ao artigo corres-
pendente (1591.") da ediçàt de 1863; e na ediçào de 1064 appa-
receu já a redacçã, hoje no coeligo, com a differença de estar em
o n 1.' a palavra «ídsiíistradores, em vez da palavra «estabele-
cimen/rss,
No ultimo projecto, porém, foi mais unra vez substituida aquelia
redtícçáo pela que ficou definitivamente no codigo, de certo para
comprehender a hYpothese de ser encarregada a pessoas síoraes
e não a individuos a venda de bens alheios, e por ser desnecessaria
a referencia expressa a sdíinistradors que já deviam julgar-se in-
cluidos na palavras «,adatarioas o procuradores».
As successivas mtdificaçáes por que passou o artigo na commissão
revisora, e as paiavras - -ou admiinist-açào - do rrs 1.-, não deixam
duvida de que a lei quiz abranger na prohibiçao todos os adminis-
tradores de bens alheios. rio admittirdo a arrematar quem tivesse
de promover a trrrmatiço.
Assim porque, represeutando a massa, iriam vender a si proprios,

ei
ARTIGOS 1563. a 1564. 165

artigo 701. do novo codigo de commercio, oão podem os adminis-


tradores da massa fallida arrematar os direitos e bens da massa,
apesar d não se rcoítrar io novo edigo de commercio a prohi-
biç5o expressa consignda o artigo 1210. do velho codigo com-
meCial.
Não são, porém, inhibidos de arrematar bens de orphãos os mem-
bros do conselho dc fooilia, porque o podem ser equiparadas as
suas foneçües ás do tutor, do eurador,do juiz e do escrivs 'is venda
dos heas dos menores, porque nenhumas attribuiçôes elles exercem
na praça, e prqie ão estio comprilodidos em ncnim dos nu-
mers do artigo e as excep-,es que restringem os direitos dos ri-
dadãos não podem ser ampliadas visto o preceito di aili 11»
Não pôde o testamenteiro comprar bens da Iniaria,
testam nm
mesmo aos herdeiros maiores no pleno ausdos seus direi tos, os qiaes
podem questionar depois a venda feita durante a testamentaria
Apesar do regra que iingum pode impus inir o proprio facto, porque
,
o n3. do artigo na masima genGralidade prohibe ao tesLuu fleiro
a compra de beos da herança im quato durar a testamentaria.
Na phras «junecionaris jndicssii, empregada em o . 4. do ar-
tigo, rompreheidím-se, não si os nomeados pelo poder executivo,
seno tambem os filhos da eleição popular, isto r. todos os pine oxer-
cem ou participm no exereicio tefuníç. 1
ipblicas ciis de qiualquer
natureza, coro para certos e leitos os define o artigo 327. do odigo
penal.

Art. 1563. Nio podem comprar cousa litigiosa os que


ião podem ser cessionaros, conforme o que fica dis-
posto no § uico do artigo 785.", excepio no caso de venda
de acções hereditarias, sendo os compradores co-herdeiros,
oi de os compradores possuirem bens Iypothecadtos para
segurança do direilo litigioso.

(Vid. nota ao artigo 795.)

0
Art. i56$. io oem comprar nem vender reciproca-
mente os casados, excepto achando-se judiciaiente sepa-
rados de pessoas e lets.
§ unico Não será, comtudo, havida como Neuda probi
bida entre casados a cessão ou doação em paga11nlo, feita
pelo conjuge devedor ao seu consorte, por causa de alguma
divida legítima.

(Vid nota ao artigo 1178^)


Salvo o caso de separação, em que a mulher est livre da influen
ria e da pressão do msrido, é prohibida aos conjuges por um alto
sentimento de morslid:ale e de c:roni:í domestica a compra e
venda reciproca. A victima seria quasi sempre a mulher.
E sujeita a contribuição de registo a dação de bens immobiliarios
166 ARTIGO 1565 .
1
em pagamensof de dote , porque a contriibsiçio de registo é sujeita
a alieirsçlo dc beis de um dos conjuges para pagamento de divi-
das do outro.

Art. 1565.o Não podem veler a liuos, ou nlotos, os


paes ou avós, se os outros filhos ou nelos não consentirem
na venda.
nivo. Se alguo dlelles rcusar o seu consentiumenlo,
poderá este ser supprllo por um1 conselho de familia, que
para esse fim será convocado.
Prohibia a Ord., liv. 4., tit. 12n, a venda a qualquer dos descen.
dentes sem consentimento dos outros para eritar muitos e/lios
e demisdas, que se easm e podem cusar das esdas que a/lomas
pessoas fa:em a seus ,ilhas, oa ncls, or en'ros
l dscedeurles»o,, etc. \las
a troca sem consentimento dos outros descendentes, que houves-
sem <te ser herdeiros, só a proibia quando ella fosse desigual.
O codigo, porém, prohibe a troca rtigo 1594.', como a venda, ou
seja egual ou desegnal. e restrige a prohlíição sé a filhos e a ne/os,
porque no p r aso ordinio da viaao tiomilm s em caso rarissimo
poderão descendentes em grúu inferior chegar à edade de contra.
etar com os ascende tes.
Ser. pois, a transmissào a favor de descendente sei consentimento
dos outros descendentes, nenhuma e de nenhum rifeito, como dizia
a velha Ordenação, e ser' a cousa assim vendida ou trocada por
inerte do vendedor partida entre os descendentes, que seus herdei-
ros forem, como se estivera em poder do vendedor, e fôra sua ao
tempo da morte, sem por isso pngarcím preço algum ao que a coi-
prou, por s e presamir fraudulento o contracto, julgando se a íulli-
dade no juizo do inventario seiu necessidade de arção ordiíaria, desde
que os interessados sejam partes no processo.
No caso da compra e venda está a dação em pagamento, feita
pelos ascendentes aos descendentes, opesao de já se ter julgado que
o artigo só prohibe a venda e a troca, e não a cessão ou daçáo
em pagamento, porque a daçao cm pagamento é verdadeira venda,
visto reunir os tres requisitos - consctimen t, cousa certa, e preço
certo -, por q ue c'mo verdadeira venda a considera o § unico do ar-
tigo aiítecedeiíe, e porque já a lei romana dizia - is quí remi in
soltun, acepit, unl'.-i siilis et-.
No p receito do aitigo mo s:ìo, porém, eomprcndidas as doaçács
onerosas, porqíe náo perdem o cavacter de gratuidade por trazeremi
annexos alguns nenargos, salvo todavia o caso de fraude, como nào
é comprolíendido o direito de renir, concedido aos descendentes do
exerutado, porque nas vendas em praça no lia o perigo de abuso
que nas vendas particulares, e porque esse direito est expressa e
especialmente reconhecido no artigo 888.^ do codigo de processo
civil, cormo uno é inhibido o filho de usar do direito de preferencia
na venda dos bens do pae, apesar de representar compra o exer-
cicio do direito de opçào.
Da prohibição do artigo estã taíobem evidentemente excluido o

t Accord6o do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de fevereiro


de 1891, Boletim dos Trihunaes, 6.° anno, ii.- 239, pag. 329.

11

r'
ARTIGO 1565. 167

arrendamento a us dos filhos sem intervenção dos outros, e bem


assim o emprestimo feito pelo filho ou neto ao pae ou avê, com quanto
alguns dousres, e ioiadamrte Lolilo. julgassim rotmprvIsrndido
12.,
na Ord., lie. 4., tit tmibim o caso dos emprestimos feitos pelos
deareííílrstes aos ns'endrites, para se evitarem os conluios e as
fraudes, que a citada Ordri:ao qu iz asitelar.
O codigo, psm, iso impedei os ascendentes d ionstiseir Lypo-
theeas a favor dos d's lentes, nem de lhes conssar dividas de
certo por não ver tantos perigos na Lypothee e no emprestimo,
como a venda que é ordinariamete feita para dar a algum Cilho
certos e detersiudas presíios; nem obsta á Lvypotheca o artigo 894.,
que se limita a exigir a mesma capacidade juridica para a hypo-
theca que para a alienação.
Nem a Ordeaçno nem o codigo civil cogitars d'esrs casos.
A lei prevcnin os casos de abuso mais gerses, os qíaes se verificls
na compra e venda. Para remediar os males dos emprestimos ou de
qiaesqu r outros actos siulados trem os lesados o direito reconhe-
eido no artigo 1031. e seguintes; e freqíente é impugnarem os her-
deiros leitii aris as dividas confessadas pelo ascendente em tes-
tamnrto, mesmo qusndo a favor de extranho.
Apesar dr sio ser permittida a venda de bens imssobiliarios de
menores sccso ci hasta publica, artigo 268., e de serem as regras
da senda as regias lsu troca, podem s r trocados os bens issobilia-
rios de menores, indeperdetemnte de praça, intervindo a alminis-
traça, oridenologia, sinda que a troca seja com ascendeitrs.
A prohibiç'o consignada no artigo não abrange os desendentes
por atinidade, como noras e gisros, porque a lei. que faz ecxcepçlo
's regras geracs, u10 pode ser applicala :, nenhuns casos que não
estejam epjecifirí'os na mesma lei artigo 11", salvo vivendo ainda
o desendente legitimo com quem o alisís é casado, porque se con-
sidera interposta pessoa o consorte do ishibido.
O consentimento dos outros descendentes, no caso de opposição s
venla, treoa ou hypothea, é supprido, iso pelo juiz, mas por um
conselho de familia, para este flui especial convocado, ainda que os
herdeiros oppoentes sejam todos maiores, como ha de reunir-se, oiuda
na falta de opposiçlo, se houver interessados menores, ou assentes.
No caso de não poderm prestar o consentimento os interessados,
quer por aisusei:, quer por outro impediento, procede-se, como se
elles ino ioiressei prestal-o, porque a razão é a mesma.
Na acSo de supprimento do cessentimento, artigo 485. do codigo
de processo civil, findos os artirulados é convocado o conselho de fa-
milia, composto d juiz que preside, r de seis vogues nomeados, tres
por pa re do auetor no requerimsento inicial da acção, r tres por parte
do réo na contestação, d'eitrce os seus mais proximos parentes, com
exclusão dos que tiverem interesse immediato nu contracto, e a deli-
beração do conselho é tomada em conferenci, reduzida s auto, e
homologada por sentença do juiz, e d'ella cabe o recurso de appel-
lação.

u Accordãos, do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de novembro


de 189 e de 7 de janeiro dr 1898, e da tirlação de Lisboa de 5 de
maio de 1897, Bolelim dos Trib«naes, 6:" ano, is» 227, pag. 130, e
Gazea l, Relssçdo de Lisboa, 11 armo, n." 53, pag. 417, e n 66,
pag. 522.
168 ARTIGO 1566.0

Para impugnar a venda feita aos outros descendentes no care-


cem os prejudicados de esperar pela morte do pae. apesar de só i
morte se tornar efectivo o direito es legitimas, porque está reconhe-
rida no artigo a legitimidade do descendente para a causa, logo que
o acto seja praticado.

Art. 1566.° Não podem os com-proprielarios de cotsa


indivisivel vender a extranhos a sua respectiva parte, se o
consorte a quizer tanlo por tanto. l com-proprietario, *a
quem não se lér conhecimeno da venda, pôde, depositando
o preço, haver para si a parte vendida a exlranho, com-
tanto que o requeira n praso de seis mitezes.
Sunico. Se forem muilos os com-proprietarios, preferirá
o que tiver iniior parte. Se as partes forem egnaes, have-
rão todo s sconsorles, ou os que a quizerem, a parte ven-
dida, feito tr:-eviamente o deposito do preço.

(Vid. artigos 1598.-, 1678.-, 1680., 1708.°, 2015.^ e 2195.).


Mo reconhecia a legislaçeo anterior o direito de preferir senâo
nos aforamentos, e unicamente aos senhorios; e nem o projecto pri-
mitivo dava ao cemphyteta o direito de opçiio, e nem palavra con-
tinha a respeito de sbcemphyteuse.
Deve-se e comíissio revisora o 1.' do artigo 1678.°, e as de-
mais disposiç es relativas a preferencias.
A concess io do direito de preferir unicamente ao senhorio era
ainda vestigio das antigas idias feudaes, e do velho direito de vas-
sallagem, que consideravam o aforamento um beneficio feito ao fo-
reiro, e não um contraeto com direitos egíaes.
Mas, como nem a sciencia nem o direito admittiam a distineço,
para este fim reconhecida na velha Ordenação entre senhorio e
ermphytenta, nem o direito de preferencia hoje tem por fundamento
genero algum de reconhecimento ou de sassallagem, e sim a ne-
cessidade de proieover a liberdade da terra, e de garantir o direito
de propriedade perfeita com a reuni o dos direitos desmembrados,
logo nos primeiros trabalhos a commissão revisora ampliou e com
justiça a faculdade de optar coemo hoje se encontra no codigo.
As leis de 4 de abril de 1861 e de 22 de junholde 1866, depois con-
firmadas pela lei de 28 di agosto de 1s69, já haviam permittido aos
emphyteetas, aos subempteeutas, aos rensuarios e aos quinhoei-
ros de bens vendidos perante o teesouro publico, mais que o direito
de preferencia, porque lhes haviam garantido com dispensa de praça
o direito de remir, e assim o direito de ficar com os respectivos do-
minios por preço inferior ao que outrem porventura offerecerse por
cites. t
Reconhecendo ao consor e, ao senhorio directo, ao emphytenta,
Ip ao subemphyteuta, ao censuista, ao censuario e ao quinhoeiro, o
direito de se preferirem reciprocamente na venda de cousa iedivisi-
vel, quiz a lei dispdr as cousas para approximar quanto possivel a
propriedade commum e a propriedade imperfeita da propriedade
singular e da propriedade perfeita, que é o estado normal e regu-
lar do dominio.
Em sesaâo de 14 de março de 1864 substituiu a commissão revisora

... -wi
ARTIGO 1566.9 169

a palvra ýop ç io., applicada à venda dos predios emprazados no


velho direito. onde era rigorosa visto poder-se optar ou escolher na
eiii iados predios aforados entre a acquiiào o laudemio, pela
palavra "ntrterine Oivisto que hoje nem nos emprazamentos trtigo
1657.°, salvo nos de preterito artigo i89.t, é licita a escolha entre
dus mousas, e openis auctorizada a declaração de querer ou não
adquirir tanto por tanto
A br pre dio diversas glebas não póde o com-proprietario
oegendo
de casa consní nem o quinteiro, como sno póde o directo se-
nhorio, nem o caotista, nem o tmphyttt, artigos 1680., 1703.
e 1i08, preferir ima e rejeitar í,tiinos.
Pisde o quihoeiro, porque é epies-o o artigo 2195%, alhear o
quinhão só ei pari", como póde o proprietario de cousa indivisivel,
aios censos, e do dominio empvteutico e directo alhear só coi porte
o seu direito, pois só a reda dos pras em gh ãas é que é pro-
íibid sem csntitímento d senhorio. oecepçn q u e não pide am-
pliaro uos outros direitos, com quanto iimi biliarios, por nào se
dar a tsma razão, e por uno se ampliarem as exepises fera dos
casos esp itecastt na lei.
Mas essa mííeís parlt em vonda o preferente ha de aceitar toda,
sem lhe ser permitido subdividil-a píra ficar só com nora fracção.
Tímbet nas tiansmiss7as de propriedades havidas de esiporaçJcs
de mi motai ha lgar ao direito de prefcrmncia, apesar de ninguem
Zp Z ler transferir mais direitos d, que tem, porque o direito de pire-
torir provém, menos do contrato. do que da lei, que só o proiibiu
ás pessoas mornes para evitar a atortisnção das propriedades, visto
tei-o estabelecido to interesse da liberdade da terra.
Não devia ser imípedido de exercer o direito de preferencia o
acital possuidor de propriedade que foi tie mosteiro, por uno gosar
disse direito o mosteiro, visto que, cessando a razão da lei, devia
cessar tombem a sua disposiçào.
iara exercer o direito de preferencia não é indispensavel o re-
gisto do dominio emphyteutico, suliemphyteutico, quihoeiro ou ren-
sities, adquirido antes de 1 de abril de 1867, visto que depois de
varias prorogaçõos por periodos determinados foi a final prorogado
por tempo indeterminado pelo decreto com força de lei de 17 de
março de 1887 o praso para o registo d'aquelles direitos, bem como
para o registo da servidão.
aias se a acquisiçâo foi posterior ti installaçào do novo registo da
esniervatiria, tio pde o adquirente demandar pelas penses sem
ter feito o registo da trtanmissão
Por direito antigo não podia o foreiro vender livremeit- o prazo
quando estava ex prosatente estipulada a clausula de no ser tres-
passado o féro a pessoa que an iose do agrado d senotí i-.
ilas hoje sio tem a abenaçio do prazo outras restricç-es alem
dos avisos preeriptos no ariigos 1678. e 1679, e regulados no co-
digo de processo civil, quer para os emprazamettos de futuro, q u er
para os emprazamentos de preterito, artigo 16949, salva qualquer
estipulnçà especial perítittida em direito.
Nas vendas de bens em virtude das leis da desamortisação tem

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de maio de 1883,


Revista de Legislação e de Jrisprudeocia, 21o ano, u.n 1166, pag.
300,
170 ARTIGO 15G6.

sido negado o direito de prefernoia com o fotdamento de estarem


sujeitos os bens :is leis tepeciaes de 4 d abril de 1861, de 22 de ju-
nho de 1S3li, e te 28 do agosto de I018. e ls instrleçr es de 25 de no -
veibro desto mesmo am.o, que n.o u .n0a1 smlhante direito.
Pírm, as citadas instritnos, pira eev"uço da lIi de 28 de agisto
de 18111, nos artigos 31." 41.'o 52.2 mandam proceder lia renda
i3
dos respectivos bens e direitos is diligencias ncesarias para o
anuuio da vendo, pela aetsa turma e com as mtestas formali-
dades estabelecidas para a venia dos bens perítents á fazenda
nacional; e o decreto com força de lei de 22 de abril de 1869 reco-
nhee o direito de preferencia na venda dos bens nacionas.
Contra esta pruiposiçào argumenta se que moa cousa sào asforota-
lidades da venda, e outra o direito de preferencia, e que no ha pa-
ridade com as outras vendas, porque as erporaçórs publicas são
bri gatdis a alienar.
Prrmt, as corparaçirs e estabelecimentos publicos, como a fa-
zenda, sao considerados particilares quanto i propriedade indivi-
dual e as leis da desamortisaçlo t o alteraram ao relaçes joridiats
estabelecidas na lei civil entre com-propritarios, nem podiam privar
ningum de direitos adquiridos, sem disso fazerem expressa men-

Aos foroiros dos bens naoioaes' já a lei de 22 de junho de 1848


havia reconhecido o direito te remissão antes de lhes ser concedido
pelo decreto de 22 de abril te 18;: o direito de preferencia.
Nem o facto de estar stjíita tis leis da dsamortisaçâs a venda dos
bitrs das corporaç'ts era raeo para negar o direito de preferencia.
E, porém, competente o poder judicial para conhecer do direito de
preferencia nas veidas m virt u das leis d desamortisoç ào. qua ido
na praça teoa sido recusado a exercicio desse direito pela auteo-
ridade administrativa que presida :i arremtataçàs, visto neíníl a
lei upeoial ter restringido às justiças ardinarias a competencia.para
conecer das causas fundadas em titulaos e propriedade e de posse,
* e antes lites ser reeonhecida no veguitmínto do ministcrio da fa-
zenda de 21 de abril de 18701 e na legisla(:7 aíí inistativa. 1
Tambem nas vendas feitas pela rmatras municipaes toem que
ser ouvidos os preforcntes para us:rem, querendo, do direito de
opço. 2
No começo da exectçìto tio codigo foi muito questionado se a venda
dos diritos à hírança indivisa estava ou não sujeita A provisào
do artigo 15GG. visto referir-si' si ls cousas itdtíisireis o artigo,
e poder dbisar de ser indivisiv'l a herança, mesmo em quanto iui
divisa, e porque, si o herdeiro tnei podia di-pr d' erta o dtrmi-
nada ctusa antes da p:til;a , podia n cmtato dispar do direito t
sua parto, direito att enjeito a pettilra, tanto pula legislaço nova,
conto pela legislação velha.

1 Acordàos, da RelaçIo do Li>boa de 1904 e do Supremo Tribautal


de Justiça d 27 de novembro de 1887, Direi/, 17.' anu., te.t 16,
pag. 251, e Boletim dos i rio s, 1.' asno, íí.- 10, pag. 154.
i ,ocret, sobre cosulta do Supremo Tribunal Administrstivo, de
18 de abril d 13. Diario do Gortro, a' 202, de 7 de setembro
do ittsmo ano, e Ret'sta ele Legisação e te Jrisprdetíoia, de
Coimtbra, 21.' anuo, 1í.' 1154, pag. 105.

II--
r
ARTIGO 1566Y 171

O pensamento do artigo 2ý15t, drelarando indivisivel o direiti de


variesposolaschioamlasssinioltanuamoteú usiiao bcrarn miquii to
a partilha si nio fizer, foi apenas prhibira aliciaçde i da-drmiit
bjiectc da híeriiça auts da p:rtilla, e 'Co regular o direito de
t
príferecia; iim as ruazes da profrencia, que se cifram i final na
cinveiiícia de converter em prýpriedade perfeita ti proprieifide
impcrftia, o 0m propriedade singular a pi-opriedade connini, Iro-
cedrii nos caraso i eiid, de quinhào hereditario, nem as rierieçes
ao dirrit' d d; icoio excepçes à liberdade de alienar, devem
ser idmittidas seo íuando espresas na lei.
A counisso revisora cidltimente quizra negar o direito de
prrferieiia nestas vendas, cimwíidio o artigo 2:23. do projecti
primitivo, eoloevdo eítre is corre-spodentrsios artigos 212. e
2153. do eidigo, fue reconheia a preferencia nas venilis dos qui-
nhes hlreditiírios, e era redigido assim: 'Se concorrer a partilha *
algm cssinariO. podera ser removido, nuo sendo cgualmnirte her-
deiro, ou soja por todos os co herdeiros, ou seja por ilgim d elles
simiite, eibols'nlio- do preço e despezas di csrno..
O preceito d'este artigo era importado do codigo civil franez. que
reeiiheil ra a prefreicia nos io-herdeiros para, segundo a e1 ,li-
caço dos rspOetivns tIractadistas, repllir os erpetladores, fiue,
moids pelo ambiçno, iaí p
ríjíudiíar as rionençies amigavci -O
tre os iítiressdos e introdzir a deordem no seio ulas familias.
Todavia desde logo se foi accritiisdo o jurisprtidencia de que
as quotas sueirssorias no podiam ser vndidas a estranhos seu
aviso aos interresalos. meiro, e e oherdeiros, visto reconhecer o
presente artigo o direito de preferencia aio cnm proprietaris de
rousa indirisirel, deelurir o artigo 2015.^, no indiviso, wM s ini-
rieirel, o direito das pessnns cIm naas ,imJtula exte a mesma
heriça, tanto a respeito da posse como domniuio em qu a nto a
partilha se ilibo fizer, e dar o artigo 216ýi.i ao com-proprietirio de
rous commum os direitas de que gosaíl os herdeiros t'a partillla da
herança.
Enlào depis da promulgaçào do codigo de processo civil as de-
risses judicies sdo todas pelo direito de prefrreucia na venda dos
quihoes heriditarios, e até já se tinm negado validade a ceosso que
uno foi iidimada ao prcfrrente 1;com gn:umo ainda alguns susten-
tem qe o odigo de procsso uio fins, í apoas reguloi o direito
de priferiecia nos casos em qe peio prens te codigo este direito
é udmiltidn, oa olienarìo dos gnpwbhýes her"di!:urius.
i coigo d, procso civil. porem, apipfido íí síl

o que o ~cdigo civil disipmin para a herança no artigo 201.),

1 Aecordfnos, do Supreiio Tribunal de Justiça de 29 d maio


de 1888, de 9 de ibril de 1889 e de 3 de março de 1893, e da Rela-
çdo de Lisbon de 13 de maio di 188:,, de 12 de julho de 1i9, d 27
do abril de 189:2, e de 3 de ííarço de 1893, /iciithi dos Tris,í
3.^ anno, n." 120, pag. 536. e Gi aio, n., 227, pag. 134. lirilo,
28:. anoíío ii -1, pag. 52, e Ga:.eo ed Rlaçod, a :íí, í. 83, pag.
t03, e I." aíío, ui^ 5, pag. 36, e u 86. pag. 683.
2 Accordào da Relaçno do Porto de 2G de maio de 1898, [erista
1
dos Tri í,i o, 17P anío, ní 385, pag. 11.

1
172 ARTIGO 156 ;

nAs exigindo artigo 848: n^ 7.n que seja indiesivel a cousa para o
exercidro do direito de preferencia em praça, abertamente reconhece
o direito de preferencia na venda dos quinhlei hereditarios.
Tamtbtm na revenda os q u ithties da cousa eotmnumn to de ser
offerecidos tanto por tanto aos respectivos com-proprietarios, 1
Mas só a ierdeiros se referem os irtigos 2015» e 2016." do codigo
civil e o artigo 642. do codigo de processo civil.
O legatario nào é obrigado a offerecer tanto por tanto o egado,
como o herdeiro a ofirerecr tanto por tacto o qainhào, porqte a
coammuho da herança indivisa abrange apenas os herdeiros, e não
os legatarios.
O legatario contempldo com quantia certa ou com objecto de-
terminado, isto é, com 1005000 réis, ou com um relogio, bem póíe
dispor dos l 0t3000 réis ou do rclogio sem attençdo alguma com os
interessados na herança, quer herdeiros, squer ligatarios, porque a
cousa legada tio é itlirisirel. netm sequer indicisa.
Mesmo que o legado consistisse em certa parte de objecto deter-
minado como mi tametade do predio A, não era o legatrio obri-
gado a offireeer tacto por talito a sia parte. senão por se tractir
de coisa commun ou de parte d'ela, em que o artigo 2186. shi o di.
reito de preferencia ao com proprietario de coa indirisa, ou em
que o artigo 818 n. 7. reconhece a opiào ao consorte.
O objeito legado está no caso de qulqír objecto encontrado
na heratça, que é arrolado sepa radamient pr dver patear precipuo
a ríalquer herdeiro, codigo civil artigo 2078., que o proprietario
pide alienar à vontade porque n'elle no têem coíímonho os co-
hcrdeiros.
E, porém, restrieto 4 venda e à dação em pagamento o direito de
preferencia.
Na alií-naçAo da servidão, ou de qualquer outro encargo predial,
já ndo é admittido.
A prefiremiia d consorte tanto por tonto estáo sujeitos os com-
proprietarios de cousa indivisivel taibem no caso de doçío em pa-
gamento, corno no caso de venda, apesar de só na renda de cousa
indivisivel fallar o presente artigo, e de una e muitas vezes usarem
das palavras « rendere, e «dar en pii étse/os os artigos 1t78 , 1703
e 2193, porque a dação em pagamento é verdadeira venda, com
todos os requisitos essencias deste contracto - consentimento -
preo ecrto - e cousa certa -.
Sei o quinhi o hereditario envolver 'ens emphytclticos prefere o
co herdeiro a senhorio dircrto, porque o senhorio deve preferir o
coa- proprietario.
Atíresentando-se, porém, a preferir mais de uma pessoa com egual
dirnito, prefere a que melhor preço offerecer, conforme os artigos 848.
3. e 870.° 1n do codigo de processo civil.
Pesando dois fóros, ou dois quinhes, ou ui fóro e quinhes ou

rAccordào da Relação
de Lisboa de 7 de dezembro de 1895, Ga-
zeta da 1 Ziçis de Litioa, 9: aai, n.o 47, pag. 369.
2 Accordiis,da Relação do Porto de 20 de novembro de 1894, e
do Suprem- 'riibunal de Justiça de 9 de novembro de 1897, Reíista
dos Tribunaes, 14.' anuo, ua. 318, pag. 83, e Gazeta da Relaço de
Lisboa, 11. anuo, n. 56, pag. 445.

rt
s9
ARTIGO 156 1.J
censi sobro omesmo prrdií, sem designação da parcella do terreno
sobre que recae cada elcargo, prefere o senhorio do direito mais
avaltado, e todos conforme os seus quiihies no caso de direitos
eglaes, por arguento do artigo 642.° unico do codigo de processo
civil. com quanto muitos opinem pela preferencia de todos os com-
proprietarios na proporção de seus quinhoes.
Tambei o codigo de processo civil, ordenando, artigo 848., a
citação para a praça dos que podem usar do direito de preferencia,
e garantindo este direito nas veldas judiciaes a todos os que o téem
nas vendas voluntarias, dirimi a questão levantada i piromulgaçào
do codigo civil se nas vendas jidiciaes era ou não admittido o di-
reito de preferencia.
(I.íd ião ha direito de preferencia t nas vendas em expropriação
por utilidade publica ainda amigavelmente feitas entre o proprieta-
rii e o representante do estado ou de corporaçào que faça parte do
estado, ou de pessoa a íumíí a lei conceda por motivos geraes de
interesse publico o direito de expropriar, porq u e lio piíde ser invo-
cadi o direito de preferencia em nome do interesse particular 1m1a
venda feita no in/erss puico.
Não li.a, 1r i,, o sííílorin directo privad do direito ao respectivo
laud mi., li de 23 de jul o di 151I :írtigo 27." 17.°
Na veuda dos bens de herança indivisa é iotiicado o cabeça de
casal, e, se este u1o preferir, póde qualquer dos hlrdcirs usar, den-
tro do mesmo praso, do direito de preferencia, sem dtepedencia de
outra oítilicaçào; e pretcideio preferir mais de rm herdeiro per-
teíeerao os beis ao que tiver maior quinhdo na herança, ou ao que
por meio de licitação otYrecer maior preço se os quiiihbes forem
eguaes, codigo de processo civil artigo 642."
Pode tambem o conjugc meeiro exercer o direito de preferencia
nos bens da herança indivisa, porque, longe de ser exratnho, é or-
dinariamente o maior interessado na socoesoo, apesar de já se ter
julgado o contrario.2
Na venda de parte de cousa indicisirel prefere o de maior qui-
nho o forsem muitos os com-proprietarios, e cada 1101 conforme o
seu quiihio'no caso de partes eguaes.
Na venda do qíinlo é do posseiro a preferencia, dos outros
quinhoeiros na falta Welle, e escolte o alheador o que lhe apro -
vcc ireínd mais de um usar do direito de opçào; e na veuda da
poss ou do quinhão do posseiro é dos quihoeiros i preferencia, e
escolhe o posseiro o que lihe aprouver, se mais d um quiier exercer
o direito de preferencia, artigo 21i5."
O coai-proprietario a quim não se dér coihecieti dla venda póde
haver pla si a prte vomiida, depositando o preço. no praso de seis
se certado, lio da geriicado, mas da noticiada voida.
No artigo 131s,1 .rrespondnte ao artigo 1566."' dizia o projecto
priitivo imas sómct dentro em seis meoes da rerificacãi da
ieniito, redacçào ainda onservada 11o projecto de 1b63 artigo 1555."

1 Accrrdso da Relação de Lisboa de 28 de janeiro de 18d, Ga-


ze/a da RIíçdo de LisbA, 12." aío, n. 61, pag. 41.
O Accordâo da Relaçdo de Lisboa de 1ll de julho de 1882, Reeista
dos Tribuoes, 10.1 ano, n. 218, pag. 21.

k
- -r wrrw

174 ARTIGO 1566.*

Declarou-se todavia desde logo que o artigo ficasse para ser redi-
fido de noro, e na ultina redaeçao introduziuse o unico, que não
vinha mo projecto primitivo, nem na referida edição de 1863, e que
apparecu pela primeira vez no projecto de 1864, e foram elimina-
das as palavras »da rerificaão da renda».
Coroe, portanto, a prescripção desde a noticia como na acção pos-
sessoria, artitgos 42 e 51i4.^ § mico.
Não -aole oa , codigo re-ras uniformes para o exercieio do di-
reito d. prefirrca na vela de firos, censos, qlin hes, e partes
de cousa cotum indivíivel. falta que o codigo de processo civil
suppriu, impondo no artigo 6i ." 2.^ ao interessado eta todos os
casos de preferencia a obrigação l doeclarar por termo que protenrtr
preferir no praso de trinta dias a contar d'aqulle em que tiver sido
notificado.
Antes da promlgatçãa do cotigo de processo civil era baotante
paa noticiar n venda ao preferent um simples ariso extrajtlicial,
artigo 1678.% em que se declarasse o preço definitivo ofterecido, ou
o preço por que se pretendia alienar,
preço que o proprietario não
podia alterar sem di novo dar coi ecimen lo da modificação ao prefe-

Lp >is do coligo de proce.so civil carece de ser judicial o aviso,


e etã regia los nos artigos 641." a 641.' do mesmo cedigo os ter-
mos das nýtiticaçes para preferencia nos contractos de alienação,
artigos 1506., 1678» , 173." e :215.», as quaes não admittem opposi
çà' algma.
Para a arrematção dove sr citado o preferente pessoalmente e
não na pessoa dn procurador, salvo tendo este poderes especiaes para
receber tal cittção, aliás ptde o preferente requerer a anntillaçâo
da arrematação ou da adjudicaçâ' do predio ou d direito predial
para o eleit de o haver pelo preço da aqttisiçâo, argmento do
artigo lia e ta de ser citado e prevenido do dia da príça para
ahi meso rxercer, quretdo, o seu direito de preferencia, quando
antigamente na venla judicial sl depois da arrematação do prazo
1. era citado o preferente para declarar se queria ou iào preferir.
Tambem nas vetdi em in, ntarios de menores, visto applicar-
lhes o codigo de processo civil no artigo 757.1' o disposto no artigo
721., e, portaíto, o precvito , arti go 8,.», deve sercitado o preferente
para assistir à praça, e não para dentro de trinta dias declarar se
pret-tdr prcferir, como di»põi o artigo 1i73." do coligo civil, apesar
de j se ter julgado 1 que os artigos 1t8id e 1683.» do codigo civil
não são applicúeis s vendas em inventario, e so, ao caso do ser
precedida de penhora a arremataçâo.
Sendo ensados, s interessados hasta avisar o marido, porque o uso
do direito de preferencia no é acto de alienação, e sim acto de ad-
ministração que o marido pidc praticar sem intervrnçío da muíler.
ts preferentes menores e semelhantes serão representados n exer-
cicio ('este direito por quei estiver encarregado de Iles reger a
pessoa e bens.
O aviso estando dividido o direito entre usufríctuario e proprie-
tario lia de ser feito ao proprietario que é o dono, e mo ao usa-

1 ,Accordã do Sup r emo Tribunal de Justiça de 24 de janeiro


de 1979, R"eis/a de Legislaçdo e de Jírisprtdeíia, de Coimbra,
18.° ano, n,» 913, pag. 46:2

À
.1,1

ARTIGO 1567.- 175

fructuario, apesar de já se ter decidido o contrario, porque o usu-


frich) reprsenta siplesmente nmi atna retl.
0 codigo de procesao civil conuigta no artigo 341." rs terno-s para
dar conhecimeto do facto pr meia d notiiicaçdo, que neta opposi-
çro tmmitti, e no artigo 638." conteta tita ftrra citminatoria
para nbrigr o citado a usar ou nti do seu direito.
E dipeiisado o proeess de aiitdiecia priscripto no artigo 341 *
do udigo d puýessit lavdo prova ligal de iu ,eerrnte de
sistiu do seu tireitr de preferir, como lIh permitit, o artigo 816.'
Não resulvi o codio d praces o civil claramete se o reqte-
rente pide retirar a proposta d venda depois de notificcdí o pre-
fcreate.
im nosso entnder, porem,iira sem effeit, a ntificatço do prefe-
rente, se o rei terente a iro acrsalr na primeira adieleia, ou de-
sistir antes de ceia a proposta pelo priferinite ", como cessa o
direito do p r efertiie, apesar da falta dc aviso da venda, ar optes
de tertla a acçã os dis pitiuatas desfazem o contrato. por-
tie a preferecia repreaeiia. no iu direito adquirido, ms uma
factldade de tiçìi que ficou sem valor depois do desfazimento da
venda.3
l direito de rescindir n venda pra falta de rudi cia do pref irt
st poreste pôde ser invocado, e nunca pelo vencdur nem pelo com-
prtdrr.
Na discusso do artigo 178i.' do projecto priitivo, correspon-
dente no artige l681.- do codigo, propoz o sr. Ferreira Lima em
sesso riri cínrnirsão revisora de 12 de maio de 186':L." que se
esttblecesra alguma pruvitrencia tendente a evitar que o senhorio
or o feiero fossem fradad- -i seu direito de preferen c ia; ?. quet
se declarasse xpriss que, depois de prevenido o sanirio ou
camt-
o emphyteuta para fazer us ddireito
to de preferencia, tão poderia
ser retirada a proposta de ipç:ti no praso marcado tuo tcsmo artigo.
Mas a commisir o nio attrnd u estas iuiticaçý,cs, talvez por julgar
bastantes as regras gernes sobre rt rullidade dos roitractos para
acautelar os interesses dos preferentes, os quaes, todavia, s pelos
meios ordinarios podero fazer valer o seu direito.

Ar. I37. Os coulractis de compra e venda, quer feitos


direttuiaee, quer por iiterposea pessoa, com quebra das
lisposiçúes cnlidas nos artigos aniecedentes, sero de te-
nhum effeiti.
uniro. Eulede-se ne a compra é feita por itlerposia
lesoa:
.O Qiíando é feili pelo consiite do ilibio, 01 por
p[ut a de fnem este seja herdeiro pesumido;

t Aceorddo do Supremo Tribunal de Justiça do 9 de maio de 1890,


Bolelim elos Tril>aoes, 5. nuto, nr 206, Dag. 01.
2 Aecord4o da Iielação de Lisboa de 15 de janeiro de 1890, Direito,
23° anuo. n' Si pag. 319.
3 Acordão do Suprtmo Tribunal de Justiça de 7 de dezembro do
1897, Gacela da lltlnçro de Lisoa, 11' ano, n.' 95, pag. 736.

e-z
4
rc. é .,

176 ARTIGOS 1568. e 1569.

?.° Quando é feita por terceiro, de accordo com o inhi-


bido; com o fim de transmitlir a este a cousa comprada.
(Vid. nota ao artigo 1481.)

SECCAO IV

Das obrigações dos vendedores

Art. 1568.° 0 vendedor é obrigado:


I.° A entregar ao comprador a cousa vendida;
2. A respnder pelas qualidades da cousa;
3.: A prestar a evicção.

SUl'-SECCAO 1

Da entrega da cousa vendida

Art. IuG9.° A eutrlga das cousas moveis elTeitua-se pela


translerecia d'ellas para poder lo comprador, ou [<ii
facto de serem postas à sua disposição.

Eia duas se resumem as obrigaçbcs do vendedor - entregar o ob-


jecto da vcíida artigos 1569.- a 150., e - --garantir a causa vendida -
artigos 1581. e 15F2.
A entrega dos moveis eitectua-se, ou por acto material a que se
ceima tr adi,;io real, pýasandlo as cosas da ,o do vededor para a
do comprador, ti por aito sytbo/isc coao dando ao comprador as
chaves para receber os objectos, ou pela -eutrcga do ilo, ou por
Mer- casentiate/o das partes como comprando algum dos pa1tian-
tes o que já tinha por aluguer.
Conservou-se no artigo a redacção do projecto primitivo, sibsti-
tuido-se apenas no projecto de 1835 a palavra «tradio ii pela pa-
lavra .traasi recia~y talvez emi virtude da ro*-ução da commisso
revisora na sessão de 17 de novembro de 1834 para ser alterada a
redacção de fórasa que no se coufundisse a entrega, facto material,
com n eitreea, facto iuridico.
Foi a final eliminado, não só por ter sido excluida do direito civil
a materia das arreimataçòes, mas por não serem applicaveis $ venda
em hasta publica toes preceitos senão cm harmonia com a lei de

Si
ARTIGOS 1570.°, 1571.* z 1572.' 177

processo, o seguinte artigo ultimo da secção anterior do projecto


primitivo, ainda conservado nos projectos da commissão revisora de
1863 e de 1864 «As disposições especiaes relativas ãs compras e
vendas feitas em hasta publica serào declaradas no titulo das arre-
mataçieso.
Art. 1570.' Os gastos da entrega da cousa vendida serão
por conta do vendedor, não havendo estipulação em con-
trario
(Vid. nota ao artigo 746.-)

Art. 1571.° A entrega dos bens immoveis e dos direi-


tos reputa-se feita, logo que o vendedor entrega ao com-
prador o respectivo titulo, abandonando-lhe o gozo da cousa
.ou do direito, não havendo estipulação em contrario.
(Vid. nota ao artigo 745.-)

Art. 1572.' Se o vendedor deixar de fazer a entrega,


por causa que lhe seja imputavel, ao tempo e no logar con-
vencionado, poderá o comprador requerer a entrega da
cousa, com perdas e damnos, ou a rescisão do contracto.
A entrega da cousa fóra do praso marcado, iu em logar differente
do ajustado, dá sempre ao comprador a opção entre resilir do con-
tracto, ou exigir o cumprimento do contracto com a indemnisaçào de
perdas e damnos, porque póde convir-lhe recebeI-a só em dado
praso, erbi gratia, na vespera de uma feira, onde possa revendel-a
por bom preço, ou em certo logar, por exemplo, nas vizinhanças da
feira, para evitar as despezas de tracsporte e conducção.
Não fica porém desfeito ipso jure o contracto pela não entrega da
cousa ao tempo e no logar conveneionado, sem se verificar por sen-
tença, eis acção para esse fio intentada, que a mora na entrega é
imoitael ao vendedor, e não proveniente de força maior.
O artigo só garante o direito de indemnisaçào quando o comprador
requer a entrega da cousa, e não quando pede a rescisão do contracto,
porque o pedido de rescisão exclue a idêa de lucros provenientes do
contracto.
Se, porém, o vendedor não é obrigado n'este caso a indemnisaçào
de perdas e damnos, como consequencia do contracto, nem por isso
fica alliviado de responsabilidade pelos prejuizos causados ao com-
prador a proposito do contracto.
Já se julgou que o comprador tem tambem o direito de rescindir
a venda, se por quaesquer difficuldades possessorias lhe não podér
ser entregue a cousa, com quanto o artigo 1555.° não declare nulla
a venda por faltar ao vendedor a posse, e sim por não ter o vende-
dor o dosiuio, porque a graode obrigação do vendedor é entregar
a cousa vendida, e a entrega não pôde effectuar-se embaraçada a
posse artigo 153.- § 2.''

SAcecordão do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de outubro de


1891,Boletim dos Tribunges, 7.' anuo, n.° 269, pag. 99.
Toxo M 12

àm
178 ARTIGOS 1573.- E 1574.°

Semelhante decisão, porém, não encontra apoio no artigo 1583.


§ 2, e é inteiramente condemnada pelo disposto no artigo 1584.°

Art. 1573.° Se a venda for feila com espera do preço,


poderá o vendedor exigil-o com os interesses da mora, se
não for pago no praso convencionado; mas não poderá pe-
dir a rescisão do contracto.
Art. 1574.0 O vendedor não é obrigado a entregar a
cousa vendida, sem que o preço lhe seja pago, salvo se
houver rotvenção em contrario.

1Vid. artigos 1583. j 2." e 1585.°1


Em regra é pago logo o preço, salvo se a venda sois fosse feita a
pagar no acto da enrega, como se exprimia o projecto primitivo no
artigo 1639., correspondente ao artigo 1574° do codigo.
Cumpre o vendedor, entregando ou depositando a cousa, e satisfaz
o comprador pagando ou depositando o preço.
Em todo o caco pôde o vendedor deixar de entregar a cousa em
quanto o comprador lhe não pagar o preço, como pôde o comprador
deixar de pagar o preço em quanto o vendedor lhe não entregar a
cousa, porque nenhum dos pactuantes pôde obrigar o outro a cum-
prir sem pela sua parte ter cumprido, devendo cumprir primeiro o
que primeiro quizer instar pelo cumprimento do contracto, para não
ser elidido o pedido com a excepção de inexecução por parte do re-
querente, artigo 676.0; e entrando em duvida qual se fará primeiro,
se a entrega da cousa, se o pagamento do preço, como as obrigações
da entrega da cousa e do pagamento do preço são correlativas, serão
postas a cosa e o preço em deposito em poder delereciroartigo 1583.0,
que pôde ser, conforme a natureza dos objectos, a caixa geral dos
depositos.
Depois de entregue a cousa é que nio pôde já o vendedor rescindir
o contracto por falta de pagamento de preço, artigo 1585., e apenas
póde exigir tambem os competentes juros a contar do tempo, em que
devia ser embolsado, e o não foi, como não pôde já o comprador des-
fazer o contracto, ainda que se preste a entregar ao vendedor o
objecto vendido, e a perder qualquer quantia dada á conta do preço.
io se deve decima de juros pela espera do preço da venda, em
quanto não vence interesses, artigo 2.0 da lei de 18 de agosto de
1887 e artigo 1.0 do regulamento de á de setembro do mesmo anno.
Alsm da entrega do preço pesam sobre o comprador obrigações
accessorias, como as despezas com a conservação da cousa pelo véu-
dedor não moroso, os juros do preço nas vendas a proso, os encargos
do contracto, artigo 1552., etc.
Em commercio considera-se exonerado da obrigação da entrega
da cesa o vendedor que se obrigou a entregai-a antes de pago o
preço, se o comprador fallir antes da entrega, salvo mediante caução,
codigo commercial artigo 468.0; e não estando convencionado o
proso para a entrega das cousas vendidas, deve o vendedor pol-as
á disposição do comprador dentro das vinte e quatro horas seguin-
tes ao contracto, se ellas houverem sido compradas á vista, e pôde
o comprador promover que seja judicialmente fixado o praso, se não
tiver sido feita á vista a venda, e não tiver sido convencionado o
tempo para a entrega, codigo commercial artigo 473,'

;u
ARTIGOS 1575.° , 1576.- 179

Art. 1575.0 0 vendedor deve entregar a cousa vendida


no estado em que estava ao tempo do contracto, e bem
assim todos os seus fructos, rendimentos, accessões e titulos,
se outra cousa não foi estipulada.
Não póde o vendedor por seu livre alvedrio mudar o estado da
causa depois de vendida, porque a cousa foi vendida tal qual era ao
tempo do contracto; e por isso pertencem ao comprador os augmen-
tos e as diminuições posteriores.
Porque do comprador é a cousa desde o momento do contracto, do
comprador são tambem os froctos naturaes e industriaes pendentes
sem obrigação de indemnisaçno pelas despezas de cultura ou de
colheita, porque foram já incluidos no preço do predio ; e porque não
é applicavel ao caso o artigo 495., que manda dividir o producto li-
quido proporcionalmente ao tempo da posse com relação ao da co-
Ilhcita; pois nas vendas particulares todos os fructos pendentes, quer
naturaes quer civis, pertencem ao comprador salvo estipulação em
contrario.
Nas vendas em praça, porém, dividem-se os fructos civis entre o
comprador e o ante-possuidor pro rata teapori.s conforme o artigo
3017." do projecto do sr. Seabra; os ajá recebidos quando compre-
hendidos na arrematação só pelos meios ordinarios o arrematante os
poderá haver, t
As mesmas regras estão sujeitos os rondimcntos dos bens vendidos
por virtude das leis de dcsamortisaço. 2
Por isso, e tambtm porque os encargos dos beus arrematados ou
adjaicados passam para o preço em deposito, salvas sempre as co-
dieJe, da arrematação 3, não responde o arrematate pelas contri-
Imçúes anteriores á arrematação, se nào estavam garantidas com
hypotheca registada, e ha de a fazenda deduzir o seu direito sobre
o preço em deposito ou seguir contra o ante-possuidor.
Realisada a compra de propriedade immobiliaria e feito o registo,
póde o comprador requerer a posse judicial, e, não havendo embar-
gos á posse ou sendo estes desattendidos, fica reconhecida ao adqui-
rente com o dominio a posse, e pOde elne usar da acção criminal
coForme o artigo 445.' do codigo penal, se o detentor volta a oceu-
par a propriedade contra a vontade do dono.
A palavra «italos, designa os documentos comprovativos do direito
do vendedor.

Art. 1576.1 Se a cousa for vendida em razão de certo

i Acecordão da relação de Lisboa de 15 de outubro de 1898, Ga-


zeta da relação de Lisboa, 12.' anuo, nr. lß3, pag, 259.
2 Portaria de 19 de agosto de 1862.
3 Accordbs, da Relação do Porto de 30 de novembro de 1869, de
14 de agosto de 1877 e de 17 de junho 1893, da Relação de Lisboa
de 5 de maio de 1897, e do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de
julho de 1876 e de 6 de junho de 1891, Revista de Legislação e de
Jurisprudeacia,de Coimbra, 3.' anuo, n.o 124, pag. 322 e 13.° anno,
na. 648 e 653, pagg. 383 e 457, Gazeta da Relação de Lisboa, 11.0 anuo,
n.^ 3, pag. 20, Boletim dos Tribunes, 6.' anuo, n.- 254, pag. 567, g
Lciuía dos Tribunaea, 11.0 ano, n,^ 248, pag. 116.
180 ARTIGOS 1577.0, 1578.-, 1579.-, 1580.0 E 1581.°

numero, peso ou medida, poderá ser o contracto rescindido


pelo comprador, havendo na entrega falta consideravel ou
excesso, que não possa separar-se sem prejuizo da cousa;
mas, se o comprador quizer manter o contracto, poderá
exigir a reducção do preço em proporção da falta, assim
como o deve augmentar, em proporção do excesso.
Art. 1577.1 Sendo o contracto rescindido, em conformi-
dade das disposições do artigo precedente, será o vendedor
obrigado a restituir o preço, se o tiver recebido, e a satis-
fazer todas as despezas, que o comprador tiver feito com o
contracto.

(Vid. nota ao artigo 1551.0)

Art. 1578.° Se a mesma cousa for vendida pelo mesmo


vendedor a diversas pessoas, observar-se-ha o seguinte:
se a cousa vendida for mobiliaria, prevalecerá a venda
mais antiga em data; se não for possivel verificar a prio-
ridade da data, prevalecerá a venda feita ao que se achar
de posse da cousa.
Art. 1579.° Em qualquer dos casos mencionados no ar-
tigo precedeute, responderá o vendedor pelo preço, que
tenha recebido indevidamente, e por perdas e damnos, além
da responsabilidade penal em que tiver incorrido.
Art. 1580.0 Se a cousa vendida for immobiliaria, preva-
lecerá a venda primeiramente registada; e, se nenhuma
se achar registada, observar-se-ha o que fica disposto no
artigo 1578.°

(Vid. nota ao artigo 715.-)

SUB-sECCÁO 11

Da garantia e da evicção

Art. 1581.1 O vendedor é obrigado a assegurar a pro-


priedade e posse pacifica do comprador, e a prestar a
evicção nos termos declarados nos artigos 1046.1 e seguintes.
(Vid. nota ao artigo 1046.0)

;ri
ARTIGO 1582.0 181

Art. 1582.1 0 contracto de compra e venda nao poderá


ser rescindido com o pretexto de lesão ou de vicios da
cousa, denominados redlhibitorins, salvo se essa lesão ou
esses vicios envolverem erro que annulle o consentimento,
nos termos declarados nos artigos 656.1 a 668.' e 687.0 a
701.°, ou havendo estipulação expressa em contrario.

(Vid. artigo 1606., n. 5.)


Introduziu o codigo importantes modificações na legislação ante-
rior nobre as causas de nullidade e de rescisão dos contractos, e al-
terou fundamentalmente o disposto sobre lesão e sobre redhibição.
Por direito anterior, Ord., liv. 4, tit. 18.0, podia rescindir-se o
contracto oneroso só por ter sido lesado algum dos pactuantes no
justo preço, devidamente calculado pelo que a cousa valia por com-
mum e geral estimação ao tempuo do contracto, considerando-se lesão
enorme quando o engano ora em mais de metade, e lesão enormis-
sima o engane em mais de dois terços do valor da cousa, segundo a
melhor e mais geral opinião; especies que se distinguiam pela du-
ração das respeetivas acções, e restituição dos fruetos.
Hoje a lesão, tanto na compra e venda, como no arrendamento
artigo 1606." n.° 5.°, siem annulla o contracto, nem dá direito á acção
de rescisão, senão quasdo envolve erro de consentimento.
Contra a extincção da acção de lesão levantaram-se desde logo
as mais vivas reclamações, habituados como estavam os nossos ju-
risconsultos à velha rotina das Ordenações. Chegaram alguns a ma-
nifestar tal enthusiasmo pela acção de lesão, que a queriam não só
mantida, mas até ampliada ãs arrematações, onde aliás a interven-
çâo da justiça exclue toda a presumpção de fraude e de serpreza,
onde a publicidade e livre coneorr ncia fazem presumir a elevação
do preço ao mais alto grIl, e onde o arrematante ou ajudicatario
não pôde queixar-se de haver sido enganado pelo proprietario exe-
cutado, visto contractar por intermedio da justiça.
Tão grande foi a resistencia levantada contra esta innovação no
nosso direito, que o sr. Seabra, para a hypothese de naufragar a sua
opinião, propunha o encurtamento do praso da prescripção, reduziu-
do-o a um anno, em vez de quinze, que a Ordenação determinava
para a lesão enorme, e de trinta que os praxistas mareavam para a
lesão enormissima, e dava, como razão, «dco sal o menos,.
Não quiz porém o legislador, a titulo de reprimir cobiças e de
prevenir prejuizos, subverter os principios fundamentaes das con-
venções humanas, abalar a segurança dos contractos, e tornar in-
certa e vacillante a propriedade nem a acção de lesão.
Reconheceu que o remedio da lesão, em vez de ser obstaculo, era
antes incentivo a estes iales, porque com mais facilidade fariam
seus ajustes os necessitados que tivessem em seu favor a liber-
dade legal de faltar 1 fé dos contractos, do que os que soubessem
que o estipulado havia de ser necessariamente cumprido.
Pôde lastimar-se a situaoeâ do proprietario que larga por preço
inferior a propriedade forçado pelas circusmtancias. Mas se a cousa
foi comprada por baixo prero, foi porque não valia mais na occasião
da venda. e a justiça não permitte que seja rasgado o contracto,
salso vicio no consentimento.
E por isso que o codigo não auctorisa a rescisão por lesão, e só a
rescisão por erro, e s quando o erro recahe sobre o objecto ou sobre
182 ARTIGO 1582.'

as qualidades da cousa, ou sobre a pessoa, e se verificarem conjun-


etaoente as condiçâes prescriptas nos artigos 660.' a 662.' do pre-
sente codigo.
Não é pois hoje, em lypotlese alguma, causa de rescisão a igno-
rancia do valor, e sim a ignorancia do oijeclo, das qualidades do ob-
jecto, ou da pessoa, a que respeita o contracto, e só quando a outra
parte acceitou a razão por que o enganado contractára.
Acabaram pois as açoes derivadas da Ord., liv. 4-, tit. 13.
Pedia a justiça que se acabasse com a rescisão por lesão, como
opposta à boa fé dos contractos, e à lei economica dos preços que
são regulados, não pelo valor intrinseco dos objectos que depende
do capital e do trabalho empregado ou da somma do seu rendimen-
to, mas pela cotação do mercado que depende da lei da offerta e do
pedido.
Os proprios contractos anteriores á promulgaçào do codigo não
poderiam ser hoje rescindidos por lesão, porque o legislador não fez
d'esse direito expressa resalva, como se fez na Hollanda, onde se
declarou positivamente que a acção de rescisão por lesâo no con-
traeto de compra e venda, etfertuado antes da execuçào do codigo
civil, seria julgada na conformidade das leis em vigor ao tempo da
venda.
Contra a falta de resalva dos contractos anteriores tem-se dicto
que a lei burla os pactuantes, que não estipularam a arção de lerão
na epocha em que não era precisa semelhante estipulação inhibin-
do-os agora de a intentar.
Estes inconvenientes, porém, são a consequencia natural da tran-
sição do velho para o novo direito, que nunca se opera sem prejuizo
mais ou menos profundo para jnteresses crrados; e em todo o caso
ííedeou um praso longo entre a publicaçâo e a promulgação do co-
digo civil para os interussados se acantelarem das alteraçces por que
passava a legislação velha.
Tambem a Ord., liv. 4. tit. 17.', dava a acçRo de redhibição ao
comprador contra o vendedor, ou para desfazer o contracto, ou para
pedir a respectiva indenmisaçâo, quando os vicios ou defeitos oc-
cultos da cousa a tornavam impropria para o uso, a que era destinada,
ou lhe diminuiam dc tal sorte o valor, que o adquirente, se os sou-
besse, a não teria querido, ou a não teria querido por tal preço.
A mesma Ordenação, regulando o coíitraeto da compra de ani-
maes, muito frequen te nas transacçées ordinaria s, permittia engeitaro
animal por míanqucira, doença, vicies, ou falta de animo, como se se
espantaa, impinra ou rebellra, sem se lhe fazer mal algum, com-
tanto que o comprador provasse que ao tempo da entrega já o animal
tinha o defeito, í- fizesse a sua reclamação dentro de or maez.
Nalgumas povoaçoes tinha-s(, introduzido o costume das compras
aca/e/a, e n'este caso podia o comprador dentro de tres dias resi.
lir livremente do contracto, sem prijuizo da aeção de lesão, para a
qual ficava sempre aberto o direito.
Hoje os vicios redhibitorios, que tornam resoluvel o contracto
de compra e venda ou troca dos animaes domesticos, salvo conven-
ção em contrario, são as molestias ou defeitos, especificados no ar-
tigo 49. do regulamento de 16 de dezembro de 1886
Permitte este regulamento artigos 50. a 58.' a acção de reducçâo
de preço, quando o vendedor não preferir antes rehaver o animal
ou animaes vendidos restituindo o custo da venda e indemnisando
o comprador das perdas e damnos soifridos.
Para isso é necessario propor a respectiva acção perante os tribu-

a
ARTIGO 152. 183

naces competentes, segundo as regras estabelecidas na legislaçéo


vigente, que nio é admissivel quando o valor do animal ou animaes
alienados for inferior a 9s00 réis.
A rescisào da venda ou da troca, o a reducçào do preço, por
vicio redhibitorio do animal ou animaes comprados ou trocados, ha
de ser requerida dentro de dez dias completos, comprehendido o
da rnt ega do animal, e o do exame ou vistoria de peritos para
averiguaçéo do fito.
No caso de fusmo periodica dos olhos é de trinta dias completos o
praso para o exame, que dive ser requerido nos termos do codigo
de processo civil artigo 147.1 e paragrapho, no juizo do domicilio do
comprador ou d'aquelle dos permutadores que o requerer.
0 juiz ní,meará, em líarmonia com o § unico io artigo 336. do
mesmo edigo de processo civil, para o exame um ou dois peritos,
e em caso de empate ua terceiro, para verificar o estado do ani-
mal ou animaes, recolher todos os esclareciientos uteis, e ashirmar
sob juramento a sua opinio.
Veriicada pelo exame no animal ou animaes vendidos ou trocados
alguns das molrstias ou defeitos, considerados vicios redhibitorios,
mandar o juiz intimar as partes para, em conferencia, se resolver
se o vindedar concorda em rescindir a venda e restituir o preço, e
na falta de acrdt,,, ou á revelia do vendedor. seráa o animal vendido
judicialente por conta e risco de quem for de direito, e o preço
da venda depositado.
Não será obrigado o vendedor á garantia, morrendo o animal ou
animaes vemlidos, scuo quando o comprador tiver requerido o
exame dentro dos pirios marcados, e se provar que a morte proce-
de de qualquer d:is ii lrstias ou lesSes especificadas, como em caso
respomle pelo moorr e laparão do cavallo, jumento e mula,
iiinm
e pela gafeira ma ispecie ovina, se provar que o animal ou animaes,
depois de entregues ao comprador, foram postos em contacto com
animaes aflectados i'aquell mmolestia.
cessa a responsabilidade do nlheador na venda, como a do senho-
rio no arrendamento, se os eicios são conhecidos do comprador, pela
presumpçà de que este tomára sobre si o risco.
0 aleiador e o seorio só cío caso de erro respondem pelos vi-
clos aect,íos, além da indnuiisaçào de perdas e damnos no caso
de mã fé.
Não é natural que o legislador quizesse respousabilisar o alhea-
dor pelos vicios da cousa na compra e venda, unicamente quando
clles envol vessem erro de consentimento, e quizesse responsabilisar
por elles o senhoio no ar rendameíto, ou os vicios envolvessem ou
io erro de consentimento.
No aredmtneto só responde o senhorio pelos vicios anteriores
ao ariendamento, artigo 106.° n 5, como na cmpra e venda,
e ma troca nao responde o alhíador pela evicçào procedente de causa
potlerior : transferencia da propriedade senào nos termos do artigo
1051. n. 3i
184 ARTIGOS 1583. z 1584,"

SECÇAO V

Das obrigações do comprador

Art. 1583.° 0 comprador é obrigado a cumprir tudo


aquillo que estipulou, e especialmente a pagar o preço da
cousa no tempo, no logar, e pela fórma convencionados.
1." Não se tendo assignado tempo e logar, entender-
se-ha que são os da entrega da cousa vendida.
2.O Se entrar em duvida qual se fará primeiro, se a
entrega da cousa vendida, se o pagamento do preço, tanto
aquella como este serão postos em deposito na mão de ter-
ceiro.

§f1.

r (Vid. nota ao artigo 739.-)


Tambem em commercio a competencia do juizo é a do logar do
paganmento.1

52.'
(Vid. nota ao artigo 1574.")

Art. 1584.° Se o comprador, com espera de preço, for


perturbado no seu direito e posse, ou se tiver justo receio
de o ser, de modo que tenha, ou venha a ter, direito de
demandar o vendedor pela evicção, póde depositar judi
cialmente o preço, em quanto o vendedor não fizer cessar
a turbação, ou lhe não dér canção, salvo se outra cousa tiver
sido estipulada.

Requerida a consignação e feito o deposito, será o vendedor ci-


tado para impugnar, querendo, nos termos do artigo 629.' e seguintes
do codigo de processo civil.

1 Accord3o do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de outubro de


1895,Gazeta da Reação de Lisboa, 9.^ anno, n." 33, pag. 261.

3
ARTIGOS 1585.-, 1586.-, 1587.- a 1588.' 185

Na falta de impugnação, ou julgada improcedente a impugnaçào,


será declarado subsistente o deposito, e não poderá levantai-o o
vendedor sem fazer cessar a turbaçào, ou sem prestar caução no
mesmo processo, observando-se o disposto no artigo 508.o e seguintes
do referido codigo; e, prestada cauçào ou mostrando o vendedor que
cessou a turbaçào, ser-lhe-ba entregue o preço depositado.
E o que determina o artigo 637.- do codigo de processo civil,
regulamentando o presente artigo.

Art. 1585. Depois da entrega da consa vendida, quer


esta seja mobiliaria, quer immobiliaria, não pôde o vende-
dor fazer rescindir o contracto, por falta de pagamento do
preço. o
(Vid. nota ao artigo 1573.')

SECÇAO VI

Da venda a retro

Art. 1586.° Diz-se a retro a venda que é feita cott a


clausula ou condição, de que o vendedor poderá desfazer
o contracto, e recobrar a cousa vendida, restituindo o preço
recebido.
Art. 1587.° Fica protibido para o futuro o contracto de
venda a retro.
Art. 1588.° Nos contractos de tenda a retro, feitos at-
tetor-meníe á promulgação d'este codigo, e que não tive-
rena praso estipulado para o retracto, será este praso de
quatro antos, contados desde a dicta promulgação.

(Vid. artigos 1701.-, 1707.^ e 2196.)


0 projecto primitivo conservava ainda a venda a remir, com quanto
limitada aos bens immobiliarios onde era mais frequente, em que o
vendedor se reservava o direito de rebaver a propriedade restituindo
ao comprador o preço dentro de certo periodo, direito que formava
parte do patrimonio do vendedor, e que podia ser cedido, penho-
rado e executado.
A venda a remir conserva ainda o moderno codigo italiano com
o fundamento de não justificarem os seus inconvenientes a restri-
eçào da liberdade das partes.
Acabou, porém, com esta iastituiço juridica o nosso codigo, no
11-

186 ARTIGO 1588.-

só para evitar a incerteza do proprietario definitivo da propriedade,


incerteza que prejudicava a cultura e o commercio, mas sobre tudo
porque cla representava em regra contractos usurarios.
A verdade era que o vendedor deixava ir a cousa por baixo preço,
na esperança de a rehaver o que raras vezes acontecia por não bas-
tar, além do mais, para remir, pagar unicamente o preço recebido,
como póde inferir-se da letra do artigo 1586., pois que tinha o ven-
dedor de restituir, não só o preço, senis ainda as despezas do con-
tracto, sem exceptuar a contribuição de registo quando devida, e
até as bemfeitorias necessarias e uteis, pelo comprador feitas de boa
fé.
No intuito de impossibilitar ou de dilticultar a remissão, podia até
convencionar-se, para o effeito da remissão, preço maior que o rece-
bido effectivamente no momento da venda.
dobre o comprador pesavam apenas as despezas ordinarias como
consequencia da percepço e goso dos fructos da propriedade.
líoje é nulla a venda a remir. A illegalidade da condição produz
a nullidade do contracto, artigo 683
Nem para os contractos celebrados anteriormente á promulgaçào
da lei nova quiz o codigo prolongar a incerteza além de quatro ansos
contados desde a mesma promulgaão, nem mesmo prorogar os prasos
para a remissão da venda a retro, dentro dos quatro amsos, a que
se refere o artigo 1588.°, porque semelhante prorogaçào importaria
nova venda.
São
nullas as vendas a remir, ainda feitas por portuguez no o-
trangeiro, ou os bens sejam moveis porque seguem o estatuto pos-
soal, ou sejam immoveis porque os portuguezes em paiz extrangoiro
estão sujeitos à lei portugueza quanto a propriedade immobiliaria
sita no reino em tudo o que n'elle houver de produzir os seus effei-
tos, artigo 24.-
O que nenhuma lei fulmina de nullidade é aclausula, bem frequente
nos contractos hvpotheearios, da preferencia do credor na compra
dos bens hypothecados.
No intuito tambem de libertar a terra de ons e encargos que pre-
judicam a cultura e o movimento predial, ou antes das complicaçes
e difiiculdades que cria a desmembração dos direitos, que consti-
tuem o domisio pleno, prohibe o codigo de futuro o sub-empraza-
mento artigo 1701", a constituição de censo reservativo artigo
1707., e a constituição de quinhes artigo 2191., declara emphy-
teutico o contraeto com o name de censo reservativo, e regula pelas
disposiçdes relativas á propriedade commum a constituiçào do qui-
nhão.
Continúa, porém, o contracto de censo consignativo sujeito á cou-
tribuição de registo calculada sobre o preço da consignaçio, regu-
lamento de 1 de julho de 1895 artigo 1 n." l e artigo 11 5.0

ti,

11
pi

ARTIGOS 1589.°, 1590. E 1591.0 187

SECÇAO VII

Da fórma do contracto de compra e venda

Art. 1589.' 0 contracto de compra e venda de bens mo-


biliariís não depende de formalidade algumua especial.
Art. 1590.°
O contrarto de compra e venda de bens ini-
mobiliarios será sempre reduzido a escripto.
1.0 Se o valor dos dictos bens nau exceder a cincoenta
mil réis, poderá a venda ser feita por escripto particular
com a assignatura do vendedor, ou de outrem a seu rogo,
não sabendo elle escrever, e de mais duas testemunhas
que escrevam tis seus nomes por inteiro.
l ° Se o dirto valor exceder a cincoenta mil réis, a
venda só poderá ser leita por escriptura publica
Na venda ou troca de bens mobiliarios, ajustada a cousa e o preço,
fica perfeito o contracto, porque nào depende de formalidade al-
guma especial
Na venda on troca de bens immobiliarios antes de reduzido a es-
cripto no está auteantieado ou antes no tua verdadeiramoente con-
trato, porque tais contractos em caso nenhum podem receber vida
da prova testemunal.
A natureza do titulo, isto é, a necessidade de escripto particular
ou d esscripttra publica depende apenas do preço que o vendedor
receba, e n da importancia da contribuiçdo de registo, ou do lau-
demio que o coípradsc haja de pagar.
Desde que o preço entregue ao vendedor no eseeda 501000 réis,
pode ser ettectuada por escripto particular a venda ou a troca dos
beus immnobiliarios.
lDa regra geral doaetigo exceptua-se a transacção extrajudicial, que
pode au bem ser feita por augto de cosciiaçdoartigo 171'2., e a alie-
uaço do direito insnobiliacio dos proprietarios ao uso da aguas que
atraveosam ou banham os seus predios, que psde ser feita cm qual-
quer osl, publico artigo 439 ", etc.
A conveçào consular com o trazil de 28 de abril de 1878 cessou
com o decreto de 3 de julho de 1884. tendo sido substituida pelos arti-
gos 2.o a 8.° e 11. do regiulamcnto de 8 de outubro de 1851, publicado
pelo governo brazileiro.

Art. 1591.0 A venda de bens immobiliarios não produ-


zirà elfeilo em relação a terceiro, não sendo registada nos
termos prescriplos na lei.
(Vid. nota ao artigo 949.- n. 2.°)
9'
188 ARTIGOS 1592.0, 1593.0 E 1594.0

CAPITULO IX

DO ESCAMBO OU TROCA

Art. 1592.1 Escambo ou troca é o contracto, por que se


dá uma cousa por outra, ou uma especie de moeda por
outra especie d'ella.
unico. Dando-se dinheiro por outra cousa, será de
venda ou escambo, segundo o disposto nos artigos 1544. 0
e 1545.°
(Vid. nota ao artigo 1544.)

Art. 1593.1 0 permutador, a quem for evicta a cousa


que recebeu em troca, pôde reivindicar a que prestou.
achando-se ainda em poder do com-permutador, ou exigir o
valor d'ella.
I unico. Se a cousa dada em troca tiver sido onerada
pelo com-permutador com encargos registados, continuarão
estes a subsistir; mas o permutador que a reivindicar terá
tambem direito a ser indemnisado pelo dicto com-permuta-
dor da diminuição do valor, que a cousa teve por efleito
dos mesmos encargos.
Como é da indole dos contractos onerosos a reciprocidade de in-
teresses, tem o permutador, que foi privado do que recebeu, direito a
rehaver a propria cousa que deu, se eila ainda está na mào do com-
permutador ou de seus herdeiros.
Se, porém, a cousa passou a terceiro, que a adquiriu na fé de que
o transmittente era o verdadeiro dono, o interessado s púde exigir
o valor d'ella do outro com-permutador, ou a indemnisaçlo do valor
dos encargos, se com encargos ella tiver sido onerada.

Art. 1594.0 São applicaveis a este contracto as regras


do contracto de compra e venda, excepto na parte relativa
ao preço.
(Vid. nota ao artigos 1544.-)
r,.- f

ARTIGOS 1595.° E 1596.0 189

CAPITULO X

DO CONTRACTO DE LOCACAO

SECÇAO I

Disposições geraes

Art. 4595. Dá-se contracto de locação, quando alguem


traspassa a outrem, por certo tempo, e mediante certa re-
tribuição, o uso e fruição de certa cousa.
Art. 1596.° A locação diz-se arrendamento, quando versa
sobre cousa immovel; aluguer, quando versa sobre cousa
inovei.
(Vid. artigos 1600., 1603.0, 1634.°, 1654.° e 1658.°)
Póde ser o arrendamento pelo tempo que aos pactuantes aprouver,
artigo 1600.-, por mil, ou dois mil annos, ou por prasos ainda mais
longos, comtanto que seja por tempo certo.
A elausula da perpetuidade, que o direito anterior aliás admit-
tia, alvarás de 3 de novembro de 1757, de 21 de maio de 1764, de
20 de junho de 1774, e de 27 de novembro de 1804, resolução de 6
de novembro de 1770, lei de 4 de julho de 1776, etc., foi absoluta-
mente excluida, por incompativel com a indole do arrendamento que
não transfere dominio.
No arrendamento deve ser certo o tempo, como é certo o preço.
A emphyteuse pelo contrario é por natureza perpetua.
A clausula da perpetuidade é tão essencial ao contracto empby-
tentico, como a de limilaçdo de tempo ao pacto do arrendamento,
de modo que os contractos, ainda com o nome e com a fórma de
emphyteuse, desde que sejam por tempo limitado, serão tidos como
arrendamentos, e, como taco, regulados pela mesma legislação, ar-
tigo 1654.°
Nem o legislador, que probibiu os censos de futuro, poderia re-
conhecer arrendamentos perpetuos.
O novo codigo civil italiano prohibe arrendamentos por mais de
trinta annos, salvo sobre casas que póde ser vitalicio, e sobre
terras incultas, que pôde elevar-se a cem annos.
Nio é, porém, prohibido o arrendamento por tempo indeterminado,
artigos 123.-, 1628.- e 1629.0, que não importe perpetuidade, como
o arrendamento por toda a vida do arrendatario, porque, se não é
perta a duração da vida do arrendatario, é certo que elle ha de
190 ARTIGO 1596.

morrer, nem o arrendamento até o arrendatario se pagar, pelas


rendas, de quaesquer adiantamentos feitos ao senhorio, durante o
praso do contracto, que nada tem de incompativel com a condição
de tempo certo.
Para obstar á fraude com que se disfarçavam transmissòes de
propriedade sob fõríoa de arrendamentos a longuissimo praso, sobre
tudo para fugir ao imposto de registo nas transmissões do dominio,
sujeitou a lei de 10 de maio de 10 a contribuiçào de registro por
titulo oneroso os arrendamentos a longo praso, isto é, por vinte an-
nos ou mais, disposição conservada na legislação vigente, regula-
mento de 1 de julho de 12595 e lei de 31 de março de iah%.
A mesma lei de 31 de março de 12596 artigos 3.o e é.° sujeitou a
contribuição de registo, além dos arrendamentos por vinte annos ou
mais, as prorogaçoes de arrendamento em virtude de novo contra-
cto, quando a somana dos anos dos diversos periodos fosse egual ou
superior a vinte, e as sublocações de arrendamento por vinte annos
ou mais, que em face da lei de 16 de maio de 1580 nao eram sujeitos
a registo quer tivessem sido feitos antes quer depois os arrenda-
mentos, por serem de interpretaçào restrieta as leis tributarias, e
não se referir a lei às solo-açóes.
A cotriuiçào lia de ser calculada sobre o valor de vinte vezes a
renda asnual, coaatoo que nau uesça aoaixo do rendínento col-
leciave deserpto na níatriz prrrial, salvo as partes o direito de
recaar contra este renuuiento, citado regutamentu de 1 de julbo
de loo artigo 11", 12.
Noo lde a locaças compreheider, como a venda, cousas fuugi-
veis, artigo 16á.a", as quaes nar padeu ser cedidas sesà eni prepsí.
dade, visto contsuirum-se na primeiro uso a que so destinadas;
corto da secção do arreudamento foi excauida a prestaças de ser-
viços debaixo das suas variadas formas, que por direito anterior
era comprehendida na locaçâo, subdividindo-se por isso em locação
de cocuas e lecsçdo de obras, e que hoje e regida pelas disposições
consignadas nos artigos 13s.u e seguiutes.
Ao arrendamento so o «itmoaea está sujeito, como só o morei
está sujeito ao aluguer.
O arredateato versa sobre cousa immovel, es aluguer sobre cousa
morel, com quanto as disposiçees relativas ao arrendamento dos
bens immoveis sejam eguaímente applicaveis ao aluguer em tudo
o que não repugnar á indale dos bens mobiarios, artigo 1634.-
us iwmabsiaros, isto é, os direitos inherentes aos immoveis, como
a transierencia do direito de perceber, por tempo e preço certos,
quaesquer prestações ou rendas, estào sujeitos às regras da cessão,
artigo 1635., e regula-se o direito de arrecadar essas pensões, nao
pelas provisões relativas ao arrendamento, mas sias pelas providencias
relativas à cessão de bens ou direitos, posto que na pratica sejam
csmpreheudidos no arrendamento até os toros e quaesquer prestaçoes.
Ie o artigo 164.1 a respeito do aluguer emprega a expressao
moiliar-s, logo o artigo imitediato 163% sujeita ás regras da ec-
sdu a transfrenrcia do direito de perceber por tempo e preço certos
quaesquer prestaçees ou rendas.
Niáo é da essencia do arrendamento, como é da compra e venda,
o preço cm ditíóeiro, pois que a renda péde ser paga em qualquer
cousa, e até em fructos. O que é da essencia do arrendamento é que
a pensão seja certa e determinada, artigo 1603.o, e não quota; aliás
degeneraria cm parceria agricola nos termos do artigo 1299.°i ol
um rontracto de sociedade,

e
co

ARTIGOS 1597.0 a 1598.- 191

Tambem o fóro, como o arrendamento, pôde ser estipulado em


qualquer genero, uma vez que conste de quantidade certa, e não de
quotas incertas, artigo 1656.0, salvo quando for de predio urbano
ou de chão para edificar, que será sempre a dinheiro, artigo 1658.0,
como pela ord., liv. 4, tit. 40.", era a dinheiro ou aves, talvez por
si" produzirem as casas os generos, que podem ser pensão nos pre-
dios rusticos.
A fundameutal differença entre a venda e o arrendamento está
em que na compra e venda cede-se a coisa, e na locação cede-se o
tiso, que nio deve confoodir-se com o usufructo que é mais pleno.
Não é cossiderado propriedade imperfeita o arrendamento, apesar
de consistir na ruição de certa cousa, que pôde durar milhares de
asnos, e de sa especifiração dos direitos comprehendidos la proprie-
dade enumerar o artigo 2169. em primeiro Iogar o direito defrui-
ção, porque nào encerra particula alguma de dominio, como proprie-
dade imperfeita não é a hypotheca que todavia póde chegar a absorver
o valor da propriedade.
Propriedade imperfeita é o ~sufruecto, que aliás acaba pela morte
do usufructuario, artigo 2241.", e o censo consignativo, que aliás pôde
ser remido pelo censuario, artigo 1648.", porque representam direito
de dispôr com quanto sujeito a mais ou menos restricçes.
Da competencia das justiças civis é o arrendamento dos mouta-
dos para extracção de cortiças, ainda que o arrendatario seja com-
merciante, porque o codigo coímercial não cogitou de arrendame-
tos. t
No arreudamento chama-se senhorio a pessoa que concede o uso
da cous, e arrendatarioa que o aeceita.
Para os arreodamentos de preterito, na falta de providencia espe-
cia), ha d regulir a lei vigente ao tempo em que foram feitos.
E do ticatario a obrigação de pagar o séllo, a que estão sujeitos
os arrendamentos e consignaçes de rendimentos de bens immoveis,
por qualquer modo nu titulo que sejam feitas; e do locatario o po-
derá haver o locador, quando por qualquer circumstancia tiver de
o pagar.

Art. 1597.° Podem locar todos os que podem contractar


e dispôr do uso ou fruição da cousa locada.
(Vid. nuta ao artigo 643.:)

Art. 1598.° Não pôde, todavia, locar o com-proprietario


de cousa indivisa, sem consentimento de outros com-pro-
prietaris ou de quem os represente, excepto o que, ácerca
do quinhão, vae estabelecido no artigo 2191.1
(Vid. nota ao artigo 1566.")

1 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de março de


1899, Resista dos Tribnucaes, 17.° anuo, n." 405, pag. 327.
192 ARTIGOS 1599.-, 1600.° z 1601.-

Art. 1599.° Podem acceitar a locação todos os que po-


dem contractar, salvas as seguintes excepções:
1.0 É defeso aos magistrados, juizes, e quaesquer outros
empregados publicos, tomar de aluguer ou de arrendamento,
quer por si, quer por interposta pessoa, quaesquer bens
postos em locação pelo tribunal, juizo ou repartição, onde
exercem magistratura, jurisdicção ou emprego;
2.° E defeso aos membros de qualquer estabelecimento
publico tomar de aluguer ou de arrendamento, por si ou
por interposta pessoa, quaesquer bens pertencentes ao dicto
estabelecimento.
f unico. São interpostas pessoas as que declara taes o
artigo 1567.1, § unico.
(Vid; nota ao artigo 1562.')

Art. 1600.° A locação pôde fazer-se pelo tempo que


aprouver aos estipulantes, salvas as disposições dos dois
artigos seguintes.
(Vid. nota ao artigo 1595.-)

Art. 1601.0 Os administradores de bens dotaes e os usu-


fructuarios vitalicios ou fideicommissarios podem arrendar,
pelo tempo que quizerem; mas, se o arrendamento ainda
durar quando findar a administração do dote, o usufructo
ou o fideicommisso, findará com elles.
unico. O usufructuario por tempo limitado não pôde
fazer arrendamento por tempo que exceda o do seu usu-
fructo; porém, se o fizer, não ficará de todo nullo o arren-
damento, mas só pelo que toca ao tempo que exceder á
duração do usufructo.
(Vid. artigos 2207.- e 2224.^)
Póde o usufructuario, o que ao usuario não é já permittido ar-
tigo 2258.^, dar de locação, vender, e fazer quaesquer outros con-
tractos, sobre o seu direito de usufructo, artigo 2207.0, quer por
periodo determinado, quer por toda a vida, com a unica obrigação
de responder pelos damnos causados pela pessoa que o substituir,
artigo 2224.
Mas todos esses contractos terminam logo que termine o usufructo
pela regra-Resoluto jure concedeolis resolvitlrjus concessum -.
Pôde por isso o proprietario oppôr embargos de terceiro á penhora
dos rendimentos vencidos depois da morte do usufructuario, visto
ter cessado com a morte o usufructo.
Caduca . morte do marido, como no caso de separacão judicial,
o arrendamento de bens dotaes ou de bens em usufructo, segundo a
determinaç6o positiva do presente artigo, como cessam quaesquer

> i
ARTIGO 1602." a 1603.- 193

encargos sobre dote, originados em contracto(; e subsistem apenas


nos termos da semtença os provenientes de execuçào judicial, por-
que, verificada a separaçào judicial ou a dissoluçào do matrimonio,
tram desde logo direito 1 entrega dos bens a mulher ou seus herdei-
ros, artigo 1156? e seguintes, que podem requerer immediatamente a
posse judicial, sem prejuizo do direito de embargar reconhecido no
artigo 14.' do decreto de 15 de setembro de 1892.
Tambem caduca no regimeu dotal o arrendamento dos bens pro-
prios da mulher, que têem do lhe ser restituidos junetanente
com os dotas, visto serem applieaveis t restituiçdo dos bens pro-
prios da mulher as regras ácerca da restituiçào dos bens dotacs 2,
artigos 115.° e 1105., salvo se a mulher outorgou no contracto.
Mas nào caduca pela morte do marido o arrendamento dos bens
do casal, apesar de já se ter julgado que á dissoluçào do matrimonio
ou separação judicial de pessoas caduca o arrendamento sem inter-
vençto da molher, desde que constitua onus real, pois que então está
fóra dos actos de administraço que o marido só por si póde praticar,
e porque de outro mtodo facil seria ao marido desfazer-se de todos os
bens ituuohiliarios sem necessidade de intervenção da mulher. 3
Pocrm, a junrispruddneia que priva o marido de contractar só
por si arredmtnmtos que constituam outis real é forçada e offensiva
dos direitos maitaes.
<) que reconhecemos 1 mulher ou a seus herdeiros e a quaesquer
outros interessados é o direito de intentar as acçIes competentes
para provar que o contracto só de arrendamento tem o nome, e que
no fundo é alienaço.
Mas a unnullaçio do arrendamento por falta de legitimidade do
marido para sé por si o contractar, não tem fundamento na lei.
O arrendamento de tens de menores póde continuar ainda depois
da morte do tutor ou do pupillo, até Ires annos, quando feito só pelo
tutor, e por tempo indefinido, mas não além da maioridade, quando
feito pelo te ou mic ou auetorisado pelo conselho de familia artigos
224.t n.- 14.-, 243.° n.-" 6. e 266.

Art. 1602. Nos arrendamentos dos bens de menores e


interdictos observar-se-ha o que fica disposto nos artigos
243.°, n.° 6.0, 263.1, 264.°, 265.1 e 266.u
(Vid. nota a artigo 224.° no 14.-)

Art. 1603 ° 0 preço da locação ou renda pôde consistir


em certa somtía de dinheiro, ou em qualquer outra cousa
que o valha, com tanto que seja certa e determinada.
(Vid. nota ao artigo 1595.")

t Acordào da Relaçâo de Lisboa de 8 de março de 1890, Direito,


24.0 ann, n" 18, pag. 285.
= Accordào da Relaçlo de Lisboa de 25 de agosto de 1894, Gazeta
da Relaçéo de Lisboa, 8." anso, n." 31, pag. 241.
3 Accordào da Relaçào de Lisboa de 6 de novembro de 1897, Ga-
sela da Relaçdo de Lisboa, 11. anno, n.o 54, pag. 425.
Toso III 13
0~

194 ARTIGOS 1604.0 E 1605.0

Art. 160.0 A ftrma do arrendamento dos bens do estado,


e de quaesquer estabelecimenlos publicos, é regulada pela
legislação administrativa.
O arrendamento dos bens dos estabelecimentos publicos, como
o arrendamento dosbens do estado, não é regulado pela legislação
contida no codigo. E regulado por eos especaes.
O arrendamento de bens immobiliarios do estado carece de pré-
via auctorisação legislativa, qualquer que seja o valor da renda,
salvo se o praso do arrendamento nao excede a tres annos, artigo
38.° da lei de 25 de junho de 1881, e artigo 71." do regulamento ge-
ral de contabilidade publica de 31 de agosto do mesmo anno.1

Art. 160'1. Se no contracto não houver clausula alguma


prohilsiliva de sublocação, o locatario poderá sublocar livre-
ment-, ficando, porém, sempre responsavel para com o
senhorio pelo pagamento du preço locativo e mais obriga-
ções derivadas da locação.
Permitte o codigo a sublocação no todo ou em parte, e a sub-
locação de sublocação, salvo estipulação em contrario, porque não
é justo negar ao locatario. como negava o projecto primitivo, o di-
reito de dispôr livremente do uso da cousa, desde que elle fica respou-
savel para com o senhorio pelo pagamento do preço locativo, e pelas
mais obrigações derivadas da locação.
Não cria, porém, relaçõesjuridicas a sublocação entre o sublocatario
e o locador, se este no interveio no contracto, porque o sublocata-
rio fica obrigado para com o locatario, e o locatario para com o
locador.
Acção directa contra o sublocatario só a tem o senhorio, pelos pre-
juizos que sobrevierem à cousa por culpa d'este, pela regra babita-
tor suam suorumque culpam praestaredebet, isto é, pelas consequencias
do proprio ;bcto em prejuizo da propriedade alheia, e não pelas elau-
sulas do contracto, que nenhum fez com o senhorio.
Mas com quanto as relaçêes do senhorio sejam só com o locatario,
deverá o senhorio, quando quizer intentar a acção de despejo, fazer
citar por cautela o sublocatario junetameute com o locatario,
para não encontrar depois ditliculdades na execução da sentença
contra o que não foi ouvido nem convencido, mesmo porque o sub-
locatario póde ser prejudicado por mancommunação entre o se nhorio
e o locatario.
Em todo o caso o recibo da renda passado pelo senorio ao sub-
locatario importa a ratificação da sublocação, quando a auctorisação
do senhorio é precisa; e não póde o locatario fazer despejar o sub-
locatario por falta de pagamento de renda quando este a entregou
ao senhorio.
Com quanto directamente responsavel pelas rendas para com o
senhorio, não tem o locatario o direito de oppêr embargos á execução

1 Accordão da Relação de Lisboa de 8 de outubro de 1892, Direito,


29.°anno, n.° 5, pag. 77.
rev

ARTIGO 1606.- 195

nas rendas, como já lhe foi reconhecido 1, com o fundamento de que


se não colhe directamente os fructos, tem todavia direito ao preço
da sublocaçdo, porque pela sublocação perdeu o locatario a posse,
e ficou apenas com o privilegio sobre os fructos.
o que a lei lhe reconhece é o privilegio para pagamento da renda
artigos 880.- u.o 2." e nada mais.
Tambem com fundam ento no artigo 815.' n.o 10.° do codigo de
processo civil já se julgou que, sem conseutimento do senhorio
não podia ser penhorado em arrendamento com prohibiçlo de sub- ,
loear ,e com obrigaçaes dependentes dos conhecimentos especiaes
do arrendatario; jur isprudencia aeceitavel desde que a execução do
arrendamento depende das aptides especiaes do arrendatario.

SECÇAO II
Do arrendamento

SU-SECCAO 1

Dos direitos e obrigações dos senhorios e dos arrendatarios

Art. 160G.° 0 senhorio é obrigado:


1.° A entregar ao arrendatario o predio arrendado, com
as suas pertenças, e em estado de prestar o uso para que
foi destinado;
2. A conservar a cousa arrendada no mesmo estado
durante o arrendamento;
3.0 A não estorvar, nem embaraçar por qualquer fórma
o uso da cousa arrendada, a não ser por causa de reparos
urgentes e indispensaveis; t'este caso, porém, poderá o
arrendata;io exigir indemnisação do prejuizo, que padecer
por no poder servir-se da cousa, como era direito seu;
4.° A assegurar o uso da cousa arrendada contra os
embaraços e turbações provenientes de direito, que algum
terceiro tenha com relação a ella, mas não contra os

1 Accord:io do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de maio de


1894, Gazeoa da Relação de Lisboa, 8.o anno, n.- 82, pag. 657.
P Arcordão da Relação de Lisboa
de 10 de abril de 1897, Gazeta
da Relaçdo de Lisboa, 10.' anuo, n.o 97 pag. 771.
,,"

196 ARTIGO 1606.'

embaraços e turbações nascidos de mero facto de ter-


ceiro;
5.1 A responder pelos prejuizos, que padecer o arren-
datario em consequencia dos defeitos ou vicios occultos da
cousa, anteriores ao arrendamento.
1.-, etc.

E da essencia do contracto a entrega, sem a qual é impossivel


o goso e fruiçào da cousa, e a entrega em bom estado e com todos
os aecessorios, aliás será illusoria porque não permittiria ao
locatario tirar o proveito com que contava, como se tivesse tomado
de renda uma casa para habitação, e depois a não encontrasse nas
condições necessarias para ser habitada.
Feita a locação da mesma cousa a mais de uma pessoa, apesar de
em regra se aperfeiçoarem os contractos pelo mero consentimento,
em vez de prevalecer invariavelmente a posse, deve observar-se o
disposto nos artigos 1578.' a 1580.'

2.1 e 3.', etc.

(Vid, artigo 1611.0)


Para conservar a cousa no mesmo esaado durante o arrendamento,
a fim de servir ao que é destinada, deve o senhorio fazer os re-
paros necessario, salvo os que por costume, em razão da sua pe-
quena importancia, são a cargo do locatario, ou que o locatario pelo
contracto sobre si houver tomado.
Mas não pôde o senhorio perturbar o arrendatario no uso da cousa
arreadada senão para reparos indispensaveis e urgentes, como para
levantar paredes, concertar telhados, etc., e ha de em todo o caso
indemnisal-o dos prejuizos que com isso lhe causar, por menor
que seja o valor do damno, e por mais curta que seja a duraçào
dos trabalhos.
Tem o arrendatario pela sua parte o direito de rescindir o con-
tracto com perdas e damnos, ou de mandar fazer as obras por conta
do senhorio, se, requerendo os reparos necessarios, artigo 1611.', em
conformidade dos artigos 638.' e 639.° do codigo de processo civil,
elle os nio fizer.
Por outro lado tem o arrendatario o mesmo direito a habitar a
casa durante o arrendamento que o senhorio fóra do arrendamento.
O proprio dono que se introduzir na propriedade arrendada con-
tra a vontade do arrendatario durante o periodo do arrendaísento
fica sujeito á pena imposta no artigo 380.° do codigo penal ao que
se introduzir, fira dos casos em que a lei o permitte, ou persistir em
ficar na casa de habitação de alguma pessoa contra vontade d'esta.
Com quanto alguns, em attençio á epigraphe da secção-em que está
collocado o referido artigo 380.', reputem elemento constitutivo do
crimp ser alheia a casa, é certo que nem aquelle artigo se refere ao di-
reito de propriedade da casa, e sim ao direito de a habitar, nem a
epigraphe da secção pôde prevalecer sobre um preceito, que respeita,
náo á ioterducção em casa alheia, mas á introducçào na casa de habi-
laçâo de alguma pessoa.
Não fica, porém, sujeito a acção criminal o locador que é verda-
deiro dono, se alhear, arrendar, gravar, ou empenhar a cousa arren-

C
y

ARTIGO 1607.' 197

dada, porque é elemento constitutivo de incriminação neste caso


fingir-se senhor da cousa, artigo 450.' n. 1.° do codigo penal.

4., etc.

Para tornar effectiva a primeira obrigação do senhorio que é as-


segurar ao arrendatorio o goso da cousa arrendada, dá o codigo de
processo civil artigo 3219 ao arrendatario, que for judicialmente
perturbado, o direito de nomear à acção o senhorio na audiencia
em que se accusar a citação, observando-se os termos prescriptos
nos differontes ý§ d'aquelle artigo.
tas é já ao arrendatario que cumpre desaggravar-se, e no ao
senhorio qu cumpre desaggraval-o, quando não for questionado o
dmuuioo ou a posse do locador, e o embaraço nascer apenas de mero
fac'o de terceiro, como de roubo de fructos, de invasão arbitraria
dos campos, etc.

5., etc.

(Vid. nota ao artigo 1582.')

Art. 1607.1 0 senhorio, poderá, comludo, despedir o


arrendatario, antes de o arrendamento acabar, nos casos
seguintes:
1.° Se o arrendatario nio pagar a renda nos prasos con-
vencionados;
2.° Se o arrendatario usar do predio para fina diverso
d'aqíelle que lhe é proprio, ou para que foi arrendado.
(Vid. artigos 1608.' a.~ 1.' e 3.' e 1627.)
Pela Ord,, liv. 4., tit. 24", muitos eram os casos em que podia
ser despedido o arrendatario antes de findo o arrendamento. Mas
pelo codigo s, as faltas meocionadas no presente artigo e no ar-
tigo 1627.' fundamentam o despejo. Quaesquer outras só darão
logar á acção de iodemisaçào ou de rescisào do contracto , salvo
estipulaçio em contrario.
Tanto é primeira e principal obrigação do arrendatario pagar a
renda n, tempo e fórma convencionados, ou, na falta de ajuste, se
gundo o costume da terra, artigo 1608. o.' 1.-, que por falta de pa-
gamento da renda nos prasos ajustados, pôde o senhorio requerer o
despejo ainda antes de acabar o tempo do contracto.
O pagamento quando feito contra a fórma ajustada, como em fru-
etos quando devia ser em dinheiro, ou sem incluir as contribuiç)es,
quando estas faziam parte da renda, ou fóra do tempo e logar de-
vido, nio importa cumprimento da obrigação.
Cabe tambem a acção de despejo no caso de abuso. isto é, no caso
de uso do predio para fim diverso d'aquelle para que elle é proprio,
ou para que foi arrendado, como no destino para oficina de casa
arrendada para habitaço, etc., porque melhor é prevenir o au-
gmento do damno, ou a total destruição da cousa, do que trabalhar
depois para a reparsçào.
Não deve porém reputar-se comprehendido em o n.' 2.' o damno
por ooissdo, v. gr., a deterioração da casa por o arrendatario a ter
constantemente fechada, como pretende Goyena, commentario ao ar-
é o

198 ARTIGO 1608.-

tigo 1479. do projecto de codigo civil hespanhol, fonte d'este numero,


porque a lei não permitte semelhante ampliação.
Ha ainda outro motivo de despejo se o predio é rustico, que é o
caso de deterioração, artigo 1627.0, que não póde ampliar-se aos
predios urbanos, porque a lei o não determina.
Estão prescriptos no artigo 5HO. do codigo de processo civil os
termos a seguir para o despejo nos casos do artigo, sempre que se
tracte do despejo em si, e não do despejo como consequencia da res-
cisão do contracto, caso em que só é competente a acção ordinaria 1,
como por nullidade de arrendamento, ou por cancellamento de re-
gisto, etc.. não renuncia ao despejo o senhorio pelo facto de deman-
dar as rendas, como não renuncia ds rendas pelo facto de pedir o des-
pejo, por não poder cumular-se o pedido judicial das rendas com a
acção do despejo, em razão de ser differente a fórma de processo,
cojo quanto seja de boa cautela resalvar na primeira acção instau-
rada o direito de propôr a outra.
A liquidação das deterioraç5es. quando com esse fundamento ti-
ver sido ordesado o despejo, póde effectuar-se na execução se não
tiver sido feita na acção, codigo de processo civil, artigo 506.9

Art. t608.° 0 arrendatario é obrigado:


1.° A satisfazer a renda no tempo e fórma convenciona-
dos, ou na falta de ajuste, conforme o costume da terra;
2.° A responder pelos prejuizos, que sobrevierem á
cousa arrendada, por sua culpa e negligencia, ou de seus
familiares e sublocatarios;
3.5 A servir-se da cousa tão sómente para o uso conven-
cionado, ou conforme com a natureza da cousa;
4.ê A dar parte ao senhorio das usurpações, tentadas
ou feitas por terceiro, e a defender os direitos do mesmo
senhorio, nos termos ordenados na segunda parte do ar-
tigo 1431.°;
5.s A restituir a cousa, no fim do arrendamento, sem
deteriorações, salvo as que forem inherentes ao seu uso
ordinario.
1.
(Vid. nota ao artigo 1607.')

2.'

(Vid. nota ao artigo 1605.)

3..
(Vid. nota ao artigo 1607.')

t Accordão da Relação do Porto de 23 de agosto de 1898,


Reisa doo Tribunaes, 17.' anno, n.' 396, pag. 187.

4'
ARTIGOS 1609.° E 1610.' 199

4.1

(Vid. nota ao artigo 1451:)

5.-, etc.

(Vid. nota ao artigo 1610.:)

Art. 1609.o 0 arrendatario não é obrigado a pagar os


encargos do predio, excepto nos casos em que a lei expres-
samente o determine; e ainda em tal caso, serão pagos
esses encargos por conta da renda, salvo se outra cousa
tiver sido estipulada.
Não é obrigado o arrendatario a supportar os encargos do predio,
salva em contrario, porque o dono do predio pelo facto
convenção
do arrendamento não deixa de ser o senhor da renda, e ao que per-
cebe a renda é que incumbe pagar os impostos que recnem sobre
esse rendimento.
Ao arreandatario são tambem lançadas contribuiçes, mas nunca
como senhor da renda, e sim na qualidade de rendeiro, isto é, na
qualidade de iadis/rid da cultura do predio.
A clausula da contribuição a cargo do senorio não altera a in-
cidencia do imposto, e apenas auctorisa o arrendatario a descontar
na renda ao senhorio a collecta qua pagou á fazenda.
No entre tauto por dividas do senhorio não podem ser penhorados
os rendimentos do prdio arrendado que são cobrados pelo arrenda-
tario, e sim apenas a importancia das rendas a que este é obrigado. r

Art. 1610.1 Se o senhorio não fizer entrega da cousa ao


arrendatario, no praso convencionado, ou do costume, po-
derá este demandai-o por perdas e damnos, rescindindo o
contracto, ou obrigando o dicto senhorio a mantel-o.
(Vid. artigo 1608.° n.1 5.' e artigo 1616.1)
Não lhe sendo entregue o predio no praso ajustado tem o arren-
datario a alternativa, ou para obrigar o senhorio a manter o contra-
cto, ou para o demandar por perdas e damnos com a rescisão do con-
trato.
Mas com a acção de maanatnção dr contracto não pôde o arren-
datario cumular o pedido de perdas e damnos, que fica substituido
pela goso da convenção.
E para o arrendatario obrigação tão impreterivel a restituição
findo o arrendamento, como é para o senhorio a obrigação da entrega
no começo do contraeto.
Por isso a retenção indevida obriga a perdas e damnos.

r Accordão da Relação de Lisboa de 26 de julho de 1893, Direito,


30. anuo, n.^ 19, pag. 303.

-.
'1~

200 ARTIGOS 1611., 1612.0 a 1613.-

Art. 1611.' Se o senhorio, sendo requerido pelo arren-


datario, não fizer no predio arrendado os reparos necessa-
rios ao uso para que é destinado, poderá o arrendatario
rescindir o contracto, e exigir perdas e damnos, ou mandar
fazer os dictos reparos por conta do senhorio, precedendo,
em tal caso, citação d'este com praso certo.
(Vid. nota ao artigo 1606.-)

Art. 1612.1 Se o arrendatario for estorvado, ou privado


do uso do predio por caso fortuito ou por força maior,
relativa ao mesmo predio e não á propria pessoa do arren-
datario, poderá exigir que lhe seja abatido na renda o valor
proporcional á privação que padecer, se outra cousa não
tiver sido estipulada.
Art. 1613.' Se a privação do uso provier da evicção do
predio, observar-se-a o que fica disposto no artigo prece-
dente, excepto se o locador tiver procedido de má fé; por-
que, n'esse caso, responderá lambem por perdas e damnos.
(Vid. artigo 1630.^)
Desde que o arrendatario tem direito a gosar a cousa arrendada
durante o arrendamento no mesmo estado em que a arrendou, tudo
o que importar privação do uso do predio importa direito a diminui-
ço na renda.
O arrendatario, que não consentiu em pagar a renda senão a troco
do uso da cousa, se por qualquer caso fortuito, como inundação ou
incendio, para que não contribuiu nem directa nem indirectamente,
foi privado de parte do predio, ou se em parto do predio foi preju-
dicada a possibilidade de cultura, pôde pedir reducção na renda,
mas não em alternativa a rescisão do contracto como alguns co-
digos permittem.
Privado, porém, o arrendatario do uso total do predio, verigratia,
por a corrente Ih'o ter levado ou inutilisado todo, fica sem effeito o
contracto de arrendamento por não haver logar a pedir abatimento
na renda onde nenhuma renda péde pagar-se, como fica extineto o
contracto de fóro com a destruição ou inutilisação total do predio em-
plivteutico artigo 1687
Desde que a renda é abatida em valor proporcional á privação
do uso do predio, claro é que, prejudicado o uso de todo o predio,
acabado ficou o contracto, porque nenhuma renda ha a pagar, e
sem renda não ha arrendamento.
Para a dispensa do pagamento de rendaS attendido apenas o caso
fortuito relativo ao predio, e nào o caso fortuito relativo á pessoa
do arrendatario reconhecido no antigo fôro, onde se permittia ao
conductor resilir do contracto quando tivesse justo receio de rão
poder usar da cousa com segurança.
O sr. dr. Paes ainda sustentava, apoiando-se em Corréa Telles,
Digesto portugoe, tomo III, artigo 788. como mais conforme á
razo, que ao conductor devia ser permittido resilir do contracto no
caso,de justo receio de não poder usar da cousa com segurança e li-


ýr

ARTIGO 1613 201

herdade, v. gr., por alguma guerra superveniente, por peste ou ruina


do predio, e por outros casos semelhantes, avisando o locador, en-
tregando-lhe a cousa e pagando-lhe a renda vencida; e contava que
em Coimbra, nos amos em que tinha sido fechada a Universidade,
não erm os estudantes nea os lentes, que se retiravam para fóra
da cidade, obrigados a pagar as rendas das suas casas por inteiro,
mas sim e unicamente pelo tempo que as habitavam.
Pelo codigo, porém, pide exigir diminuiçdo de renda o arrenda-
tario, se parte do ano deixou de habitar o predio por ter soffrido
um ineendio, mas ti se brgou o predio com o receio, por exemplo,
de alli o untarem, como não tem direito a pedir abatimento na renda
se por força maior foi privado, não do aso da cousa, mas doo fractos,
artigo Ni0., ao contrario da Ord., liv. 4-, tit. 27.-, que permittia
a redcçô' por motivo de esterilidade nas rendas, salvo nas do
estado, com a compensaç;m em annos de maior abundancia.
O projecto primitivo itíatina ainda os preceitos do direito velho,
pois n artigo 1711- correspondente ao artigo 1630? do codigo, dizia
assim:
«Ei caso de esterilidade extraordinaria, ou de perda consideravel
dos fructos pendentes, por algum caso fortuito para que o arrendatario
não haja eoítribuido, poderá este eximir-se de pagar a renda. entre-
gando os fructos restantes ao senhorio tiradas as sementes.
'-1 unico. N'este caso, porím, só gosará o arrendatario d'este bene-
ficio, prevenindo o seníorio, antes que levante da terra ou colha das
arvores alguns dos fructos restantes".
O mesmo dispunha com relação aos firos no artigo 1794.", que se
seguia ao artigo correspondente ao artigo 1688.° do codigo, e que era
redigido nos seguintes termos:
.No caso de esterilidade extraordinaria, ou de devastação fortuita
dos fructos, de sorte que não reste o suticiente para pagamento da
pensão, salvas as sementes e despezas da cultura, não será o fo-
reiro obrigado a pagar o que faltar, com totto que proceda nos ter-
mos declarados no artigo 1710, á unico (1i30.') do codigo».
A cimmisso revisora. porétm, com razão suppriííiu estes doisarti-
gos logo tios trabalhos da primeira revisio.
Só a privação do ?o do predi, por ser obrigação do senhorio as-
segurar a posse da cousa arrendada, e não os prejuizos, ou a dimi-
nuiçào nos fructos por mais extraordinaria qne seja a esterilidade,
dá direito a diminuiçio na renda.
Por isso o phyloxera nào justifica o pedido de abatimento na
renda1.
A esterilidade, quando não é absoluta, além de ser consideravel-
mente attenuada pela alta correspondente do preço dos fructos, é
eventualidade que no deve escapar á previsão dos pactuantes no
ajuste do preço ou da renda; e a reducçào forçada nas rendas dei-
xaria em incerteza a execução dos costractos, e seria origem de fre-
quentes demandas.
A privação do uso do predio pela evicção obedece as mesmas re-
gras que a privaçãs do uso do predio por causa fortuita ou força
maior, isto é, ha de tambem diminuir-se a renda na proporção da
parte evicta, e fica além d'isso o aerendatario com direito a in-

t Accordão da Relaçao de Lisboa de 10 de março de 1897, Ga-


zeta da Relação de Lisboa, 11- anuo, u.- 10, pag. 76.

fiL:za
w.rw

202 ARTIGOS 1614. . 1615.-


demnisação de perdas e damnos se o locador sabia que não era sua
a propriedade que dava de renda.
A reconstrueção do predio depois de devorado por um incendio não
faz reviver o arrendamento, porque o predio arrendado era o incen-
diado e ilo o reconstruido.

Art. 1614.0 0 arrendatario não póile recusar a entrega


do predio, findo o arrendamento. Só no caso de bemfeito-
rias, expressamente consentidas por escripto ou auctorisa-
das pelas disposições do artigo 1611.1. terá o direito de
retenção, até haver a importancia, immedialamente prova-
da, das dietas bemfeitorias.
Art. 1615.° No arrendamento de predio rustico por
menos de vinte annos, o arrendatario tem direito, depois
do despejo, de haver do senhorio o valor das bemfeitorias
agricolas, tanto necessarias como tleis, ainda que não fos-
sem expressamente consentidas, salvo havendo estipulação
em contrario.
unico. Neste caso, porém, o valor das bemfeitorias e
os juros d'elle serão pagos pelo augmento de rendimento
aunual, que d'ellas resultou, no predio em que foram feitas.

Em dois casos tem o arrendatario direito a bemfeitorias: 1." quando


tiverem sido auctorisadas pelo senlorio ou pela justiça, tanto em pre-
dio rustico como em predio urbano; 2." quando for rustico o predio
arrendado, e não tiver durado por vinte annos o arrendamento.
Porém, do direito de retençdo só gosan as bemfeitorias expressa-
incute consentidas por eseriptto ou auctorisadas nos termos do ar-
tigo 1611 . e que selam immediatamnente provadas.
No intuito de favorecer o direito de propriedade não é permittido
ao arrendatario recusar-se a trgar o predio fndo o arrendamento
a pretexto de bemfeitorias, se nóo apresentar escripto do senhorio
que expressamente as tenha auctorisado, ou sentença reconhecendo
ao arrendatario o direito de fazer os reparos necessarios para mora-
dia, por não os ter feito o senhorio.
Não se abre exepçio a esta regra geral, ainda que o arrendatario
tivesse estado por factos supervenientes menos tempo do que o
devido tio goso do contracto; porque isso poderia dar-lhe direito a
intentar a acção de indemnisaç,io, mas nunca a manter-se no arren-
damento com o direito de ritençào depois de findo o praso ajustado.
Fóra ('estes dtis casos não téesr os arrendatarios de predios 'r-
hanos direito a bemfeitorias, pela presumpção de que as obras feitas
n'estes predios foram para goso e commodidade dos arrendatarios,
e não reverteram em beneficio do proprietario.
O arrendatario de pr -dio rustico ainda pode pedir bemfeitorias
fsra dos cois Oe artigo 1614.-, mas só dlepis do despeja. Ha de lar-
gar prin iro o preýi,--, p
tdil-as dir-is.
>résm ao arrsssittrio de prdios urbanos seiou o coAi,. qual-
quer rps fosse s praso do arresdainii to, não só o direit de reten-
:ão por bemi itois, mas ainda o direito a bemfitorias que nao
tivessem sido cousentidas por escripto ou auctorisadas nos termos

a
ARTIGO 1615.° 203

do artigo 1011:, para cortar os abusos dos inquilinos, que creavam


dililculdades aos senhorios, já com o amplissimo direito de retençào
por bemfeitorias, já com o processo de liquidação.
ilesmo ,, arrendamento de predio rustico, se foi por vinte annos
ou mais, nem com retenção nem sem retenção o arreodatario tem
direito a bemfcitorias, por se presumir que no largo tempo da sua
posse teve oceasião de se indemnisar do custo d'ellas, compensando
as despezas com o augmento de rendimento annual, ainda que o
prolongamento do contraeto além de vinte arnos tenha sido em vir.
tude de ctnut eçies tacitas, porque nem o artigo distingue nem
a ba razã aduitite a distineção.
E a interprtação mais aronunodatia ao preceito do artigo 1615."
No silencio do contraito incumbe ao proprietario, e tn to acren-
datario, a prova de se ter prílsigado o arrendamento por vinte annos
ou usais, por si preímir a falta de declaraç,w, artigo 1G28.0, que
o praso foi segido o costume da terra.
Prefeitm atti-s juriscouwtos ás mdificaç'es introduzidas pelo
codigo o velho direito da Ord_, liv. -1, tis. 54., j 1., que decretava
a retnço paira tolas as especirs de benfeitorias necessarias ou
uteis nos seguintestermos: «E se o que recebeu a cousa eipres-
tada, lugaíla ou arrendada, fez t'elia algumas despezas necessarias
ou proveitosa poderá reter em si a dita cousa, até que lhe seja paga
a despeza que n'clla fez,.
Reputam injusto negar direito ás benfeitorias ao possuidor de
vinte anos e rais, com o fundamento de que a negação d'esse di-
reito, longe de melhorar as terras, tia de condenmal-as ao aban-
doto, especialmente nos ultimos annos do contracto, e não vaei ia-
conveniente no direito de retençâo at com respeito ás besfeitorias
uteis, desde que ao senhorio, depositando as benfeitorias pedidas ou
o seu valor pelo juiirei o do possuidor, quando illiquidas, seja
logo dada a posse, contiirnndo-se depois na liquidação.
Effetivaíenete os iicíovonittes do direito de retenção pôde o
senhorio evitar, pagando u depositando a quantia pedida sem pre-
juizo da contestação, salvo quando se tiver convencionado que as
benfeitorias serão pagas por teio de prorogação do arrendamento,
codigo d pírosso civil artigo 501-
O projecto primitivo ainda reconhecia o direito de reteução por
bemfritrias, independentemente de sentença ou de auctorisaçào do
srnhrio, quado ellas recahiiam sobre predios rusticos.
No projecto primitivo os artigos 1695 " e 1â3-, correspondentes
ao artigo 1614." do codigo, erasi redigidos assini
«Artigo 1Gs5. Se o predio fôr de morada, smestc poderá ter logar
a reteção pelo importe das bemfeito ias expressamente consentidas,
ou fei tas seundo o dis p osto no artigo 1G91.0 (artigo 1611t. do codigo).
«Artigo 1í, ^ Se o predio for de cultura, terá legar a retenção
mO smeote pelas beifeitírias consentidas, mas por todas as bem-
feitorias, necessarias e srgentes, que o arreídatario fizer, meso
sem consentimento do seshorio
A costíiss o revisora, porém, resolveu, .segundo se lê em a nota
ao artigo 165.' do projecto de 1863, correspondente ao artigo 1G9.o
do projecto primitivo, manter o direito de retinção só em bemfei-
torias expressamente consentidas por cscripto, ou auctorisadas nos
termos do citado artigo 1t;95." do projecto t1611. do codigo), e pro-
vadas in continti, e applicar este preceito tanto aos predios urbanos
como aos predios rusticos.
Para cortar os obstaculos que na vigenlia da lei anterior emba-

4
~~v-

204 ARTIGO 1615."

raçavam o senhorio de entrar immediatamente na posse dos predios


arrendados, o legislador, na collisào entre os interesses dos possuido-
res temporarios que se metteram a fazer obras sem consentimento
do senhorio ou sem auctorisaçào judicial, e os interesses dos verda-
deiros e legitimos proprietarios, decidiu por estes.
Não é o senhorio obrigado a pagar ao arrendatario bemfeitorias
que excedam o valor do beneficio ao tempo da entrega, pois que
para o possuidor de boa fé é calculado pelo custo o valor das bem-
feitorias, se o custo não exceder o preço do beneficio ao tempo da
entrega, artigo 499s § 4 °, e a posição do arrendatario não é tão fa-
vorecida como a do possuidor de boa fé.
Assim, se o custo das bemfeitorias foi 1:000000 réis, e o valor do
beneficio 2:00000 réis, paga o senhorio apenas 1:Ot000it réis; e
se o custo foi 1:000000 réis, e o valor do beneficio 500&000 réis,
não é obrigado o senhorio a pagar mais de 500() réis.
Deve por isso no pedido das bemfeitorias articular-se sempre nAo só
o custo, mas o valor do beneficio, sob pena de improcedencia ou de
ineptidão do pedido.
As bemfeitorias, quer com direito de retençào, quer sem direito
de retenço, podem ser pedidas por embargos no despejo, ou a arçào
de despejo represente apenas o aviso ao arrendatario de que o senho-
rio não quer a continuação do arrendamento no fim do praso, ar-
tigo 498.- do codigo de processo civil, ou represente a pretençAo de
expulsar o arrendatario antes de findo o arrendamento, citado codigo
de processo civil artigo 500s; e faz-se a liquidação nos proprios em-
bargos, ou depois como incidente da execução em conformidade do
disposto nos artigos 282.- e 909" e seguintes do mesmo codigo.
As bemfeitorias consentidas ou auctorisadas gosam do direito de
retençâo, e são pagas immedistamente que estejam liquidadas.
As outras bemfeitorias sem retenção só podem ser pagas pelo nu-
gmento do rendimento, e pelo augmento de rendimento calculado ao
tempo da entrega do predio.
Não deve ser animal a liquidação do augmento do rendimento,
como alguns pretendem com o fundamento de deverem ser pagas
pelo angsiento de rendimen o annual as bemfeitorias e os juros.
O augmento de rendimento deve computar-se desde logo de modo
permaieste, e não sujeito a liquidaçio periodica, nAo só por ser
mais simples aquelle processo, mas por ser de boa razão fazer a
liquidaçào na occasiào da entrega do predio.
Assim, liquidadas as bemfeitorias no valor de 1:00044000 réis, a
que corresponde o juro de 50(000 réis, artigo 1640 § unico, e liqui-
dado o augmeeto de rendimento annual proveniente das bemfei-
torias em ü0t000 réis, são os 60KO0 réis destinados para pagamento
dos juros e amortisaçâo da divida até completa extineção.
E usia divida, com renda applicada para juros e amortisaçào.
Se o augmento do rendimento annual não chegar para amortisação
do capital e para pagamento dos juros, nunca será integralmente
satisfeita a divida do arrendatario; e este a si impute o ter-se met-
tido em despezas, cujo producto não compensava os capitacs empre-
gados.
Não deve ser obrigado o senhorio a pagar mais do que o valor do
beneticio ejfetico, nem a desfazer-se do que tem para pagar de
prompto ao arreílatario. Receba o arrendatario o valor do que au-
gmetou, e receba por parcellas, que por parcellas recebe o senhorio
tambem o rendimento anoual.
Mas tambem nAo póde o senhorio descontar no valor das bemfeito-

é
Ái
ARTIGOS 1616.- E 1617. 205

rias e de seus juros o augmeuto de rendimento, que o arrendatario


auferiu durante o arrendamento em consequencia d'essas bemfeito-
rias, porque esse augmento é o tnico premio que o arrendatario
tirou do seu trabalho, premio fundado no interesse do proprio senho-
rio, porque estimula os arrendatarios a esmerarem-se na cultura e
no melhoramento das propriedades.
O rendeiro, rondemuado a despejo, qualquer que seja o motivo,
é logo obrigado a largar o predio sem direito a indemnisaçào alguma,
ainda que só tenha pago rondas, e não tenha recebido fructos 1, por-
que ao arrendatario que possue em nome alheio2 não póde appli-
car-se a regra geral estabelecida nos artigos 495.° e seguintes para
os possuidores de boa fé, ou que possuem animo donioi, em nome
proprio.
Rege r coligo todas as questýes movidas depois da sua promul-
gaçào, ainda por benfeitorias anteriormente feitas, com quanto al-
gnns julguem applicavel a este caso a Ord., liv. 4., tit. 51., que
não exigia a prova in cotinenti das bemfeitorias nem o consenti-
mento expresso do senhorio.
Derivam-se de toda esta doutrina as seguintes conclusles:
1." Direito a bemnfeitorias com retençâs quando consentidas, ou
auctorisadas nos terros do artigo 1611.-;
2. Direito a bemfeitorias não consentidas nm auctorisadas, mas
sem reteneçào, se o objecto bemfeitorisado for predio rustico e o ar-
rendamento tiver sido por menos de vinte annos;
3." Pagameto das primeiras na totalidade desde logo, sendo im-
mediatameite liquidadas e provadas;
4 Pagameto das segundas, nio de prompto, mas annuanente
pelo augmeto de rendimento annual;
5) N:s bemfeitorias de qualquer natureza paga-se o custo se nio
for superior ao valor do beneficio, aliás paga-se apenas o valor do
beneficio.
Aos contractos sobre cortiça são applicaveis as regras do ar-
rendamento, ou as da compra e venda, conforme a sua essencia e
natureza.
Se a cortiça é vendida já fóra da arvore ou para ser tirada logo,
não póde negar-se ao contracto o caracter de venda, como não pôde
negar-se o caracter d arrendamento n alienação da cortiça que as
arvores produzireru dentro de certo periodo, por se considerar a cor-
tiça fructo da arvore.

Art. 1616.1 0 arrendatario, que indevidamente retiver


o predio arrendado, ficará sujeito a perdas e damnos.
(Vid. nota ao artigo 1610.°)

Art. 1617.° Consistindo a renda em fructos e não tendo

Aecordãos da Relação de Lisboa de 24 de janeiro e de 21 de


novembro de 1894, Gazeta da Relação de Lisboa, 7. ano, n° 56,
pag. 513, e 8.0 anno, n.° 42, pag. 329.
Y Accordào do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de novembro de
1895, Gazela da Relaçdo de Lisboa, 9.° asso, n.- 39, pag. 309.
206 ARTIGOS 1618.' E 1619."

sido paga no devido praso, será satisfeita em dinheiro


pelo preço corrente no tempo do vencimento, com juros
desde a mora.
(Vid. nota ao artigo 1530.")

Art. 1618.0 Se, depois de findar o arrendamento, o ar-


rendatario continuar sem upposição na fruição do predio,
presumir-.e-ha renovado o contracto nos predios rusticos,
por um ano, e nos predios urbanos, por um atino ou por
seis mezes, ou por menos tempo, conforme o costume da
terra.
(Vid. nota ao artigo 1621.0)

Art. 1619.° 0 contracto de arrendamento, cuja data for


declarada em titnlo autlhentico ou authenticado, rão se res-
cinde por morte do senhorio nem do arrendatario, nem por
transmissão da propriedade, quer por titulo universal,
quer por tituo singular, salvo o que vae disposto nos ar-
tigos subsrquentes.

Ao contrario do que sucede com a parceria agricola, que, como


sociedade, termina com a mort deiquaquer
te dos pactuantes ar-
tigo 130().0 em coaíormidade do que dispe o artigo 1276." u.- 4.°
com rlação á sociedade em geral, os arrendamentos com data em
titulo autentico ou authentirado obrigam sempre as proprias par-
tua e seus herdeiros; porque se entende que as partes, estipulando
por esta fórma, quiceram estipular para si e para seus herdeiros.
Já pela velha Ord., liv. 4.", tit. 15.0 § 3., passava sempre aos
herdeiros o contrarto de arrendamento, por ser diverso do contracto
da parceria, e dever ser jLgado d, outra maneira, sobre tudo quando
era feito por tempo de dez anos ou mais.
Terceiro. porem. é que não está obrigado a manter o arrendatario,
ainda que esteja athenticuda a data do cemeço e do termo do ar-
ri lamento, se não está regi"tado o contracto, artigos 1621.' e
1622., na parte relativa a bens immobitiarios; pois contra terceiro
apenas subsistem iídep-identimete de rígisto os arrendamentos
que de registo est o dispesados1
Até o arrendamento dos bens immobiliarius, apesar de sujeito
ás regras da cessão artigo 1635.', para ser invocado contra terceiros,
ha de ser registado, salvo se o opus real não estiver sujeito a registo,
artigos 949. n.' 6.0 e 1622.'. com quanto respeitaveis opinióes julguem

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de fevereiro de


1898, Gatea da Relação de Lisboa, 12.' anuo, n.p 61, pag. 490.

oea.
rr

ARTIGOS 1620.° E 1621.0 207

applieaveis aos arrendamentos dos iunobiliarios só os artigos 785.'


a 795.%e em caso nenhum os artigos 1621.° e 1622.0
Na falta de data aithentica ou authenticada podem livremente
os herdeiros do senhorio despedir o arrendatario e os herdeiros do
arrendatario abandonar o arretdiueto.
São tambm appliraveis as disposiçes dos artigos 1618.0 a 1624.°
aos arrendameutos feitos eta praça por se ter despedido o rendeiro
de bens peuhorados uns termos do artigo 58.' do decreto de 31 de
dezembro de 1lti.
Plde, puis. revestir o contrarto de arrendamento tres férmas, jri-
dicas, todas differetes, e co, efeitos diversos: arrendamento sem
titulo aitheitieo ou anthenticado; arrendanento om data em titulo
sathentico ou authetirado; e arrendamento registado, como onus
real, ou dispensado de registo, artigos 949.° j 2.° n. 6.0 e 1621.0

Art. I620.° Se a transmissão resultar de expropriação


por ulilldade publica, sera rescitdido o contracto com
prévia indetntisação do arrendatario.
No caso de expropriação por utilidade publica, por mais authen-
ticada que esteja a data do contracto, e por mais perfeito que esteja
o registo, é o roitraeto de arrrudamento rescindido porque é neces-
saria a propriedate para serviço do estado, e substituido pela
indeimi-,i:o previa o direito do arrendatario a gosar o arrenda-
mento.
No projecto de codigo de processo civil era nos casos de expro-
priaçlo por utilidade publica equiparado ao usufructo o valor do ar-
rendamento, isto é, tinha o arrerdatario o direito de usufruir o
producto da propriedade expropriada por tanto tempo quanto de-
vesse durar o arrendamento.
Mas não tendo a camara dos dignos pares aceitado o capitulo do
projecto sobre expropriação por utilidade publica, sob pretexto de
que esta materia devia ser regulada por legislação especial con-
forme o disposto no artigo 2360- § unico do presente codigo, e no
fazer parte de um corpo de direito, lia de ser hoje determinada a in-
deimisação em conformidade do artigo 253.° do codigo de processo
civil.
Ao processo de indenisação no caso de expropriação por utili-
dade publica são tabem chamados os arrendatarios nos termos da
lei de 23 de julho de 1850.
Meismo quo a expropriasço por utilidade publica só abranja parle
do terreno, não tei o arei, datario a alternativa para exigir o abati-
mtt proporcional nas rendas, ou a rescisão do coltrarto com is-
demnisação de perdas e damnos; pois que a lei declara rescindido o
contrarto desde que o motivo da trsasmissão seja a expropriação
por utilidade publica, e não di ao arredatario senão o direito de is-
demnisação.

Art. 162°1. Se a transmissão proceder de execução,


observar-se.ia o seguinte:
1.° Os arrendamentos sujeitos a registo subsistirão,
se estiveem registados anteriormente ao registo do acto
ou facto de que a execução resultou.
208 ARTIGO 1622.'

2.° Os arrendamentos não sujeitos a registo subsis-


tirão, apesar da execução, por 1odo o tempo por que tive-
rem sido feitos, salvo se outra cousa se houver estipulado.
Art. 1622.° Estão sujeitos a registo os arrendamentos
excedentes a un anuo, se houver antecipação de renda, e
os excedentes a quatro anuos, não havendo.

(Vid. nota ao artigo 949. § 2.' n. 6')


No projecto primitivo o artigo 1703.', correspondente ao artigo
162a.t do codigo, era redigido assim:
oSe a transmisão tiver logar por execução observar-se-ha o se-
guinte:
«) 1p Se o predio arrendado for urbano e faltar para acabamento
do arrendamo-nto um anno, ficará reduzido esse tempo a um semestre,
a contar da arremataçào ou da adjudicação; em qualquer outro caso
observar-se-ha o contraeto.
«§ 2 Mas se o predio for de cultura, nunca poderá ser despedido
o arrendatario, sem que finde o at1no de cultura pendente ao tempo
da arr:matação ou da adjudicação.
«§ 3. A mesma disposiçào terã logar nos casos de sucessão de
bens vinculados ou não vinculados, usufructo ou fideicommiaso vita-
ie licio ou de reiviudicaçâo, não havendo neste caso má fé da parte do
arrendatario'.
A commisso revisora, porém, logo nos trabalhos da primeira re-
visão, segundo consta da acta das respectivas sessoes de 29 de março
de 1862 e da nota ao artigo (1o66.) correspondente do projecto de
1863, alterou fundamentalmente aquella doutrina, tomando as se-
guintes resoluçes, que foram a base do § 2? n. 6.o do artigo 949.,
do n.' 7 do artigo 978', e dos artigos 1621? e 1622.:
1.' Que para produzir effeitos para com terceiros, deviam ser regis-
tados os arrendamentos excedentes a quatro aunos não havendo
antecipação de renda, e os excedentes a um anno, havendo anteci-
pação de renda;
2.' Que os arrendameutos não sujeitos a registo subsistiriam até ao
fim, apesar da execuçâo;
31 Que dos sujeitos a registo subsistiriam apesar da execução
sómente aquelles que estivessem registados em data anterior ao re-
gisto do facto ou contracto de que a execução resultou;
4.' Que por esta doutrina ficava substituida a do artigo para todos
os arrendamentos, tanto de predios rusticos como de predios urbanos
nos casos de execmo;
5.' Que a doutrina destes § subsistia sémentr para os casos de
reiviudicaçào de que se falla no §3.
6.' Que todos os outros casos de que tracta este § estavam prejudica-
dos pelo resolvido em harmonia com os artigos 1680.' e 1681? (ar-
tigo 1645. do projecto de 1863, e artigo 1601? do codigo).
0 codigo de processo civil, porém, alterou profundamente o dis-
posto no § 1. do artigo 1621-, e no artigo 1023. do presente
codigo, como em a nota a este artigo se explicou.
O codigo civil satsava os onus reaes com registo anterior ao re-
gisto do acto donde proviutoa a execução.
Mtas o codigo de processo civil no artigo 856.' e n'outros eviden-
temente alterou o artigo 10213. e o § 1? do artigo 1621? do pre-
sente codigo, e prejudiceu todos os onus reaes com penhora, h5 po-

i
ffl"T"

ARTIGOS 1628y x 1624.- 2WO


theca, ou arresto anteriormente registado, mesmo que fosse posterior
o registo do acto donde resultou a exeaço.
Ainda assim, jú depois que escrevemos a nota ao artigo 1023-
se tem julgado pela doutrina, aliás anterior, do codigo civil, contra
a doutrina, aliás posterior, do codigo de processo civil. t

sr-SEccÃo I

Disposições especiaes dos arrendamentos de predios urbanos

Art. 463.5 Qtando o tempo do arrendamento dos pre-


dios urbanos não tiver sido determinado no contracto,
eulender-se-ha qíie o dilto arrendamento foi feito por
senlesIre, ou por anto, ou por menos tempo, conforme o
costume da terra.
uínico. Se houver costume de arrendar tauto por anno
como por semestre, entender-se-ha que o arrendamento
foi feito por semestre.
(Vid. artigo 1628.-)
Nos arrendamentos, que é onde o costume da terra mais frequen-
temente suppre a falta de clausulas no contracto, adopta-se na
falta de designaçào do praso o periodo do arrendamento em uso na
localidade como o mais accommodado á natureza dos predios, quer
rusticos quer urbanos.
Assim o arrendamento de propriedades, divididas em duas ou mais
folhas; reputa se feito por tantos arm0s, quantos sejam necessarios
para cultivar todas as terras e tirar do predio todos os fructos.
E se, por costume do terra, houver prasos differentes, rege o praso
menor, porque a recúncia de direitos nunca se presume, comtanto
que nos predios rusticos abranja sempre o tempo necessario para
uma sementeira e para uma colheita conforme a natureza, circrm-
itancias e uso da cultura, artigo 1628$

Art. 624.° Presíme-se renovado o contracto, se o ar-


rendatario se não liver despedido, ou o senhorio o não
despedir ao tempo e pela fórma costumados na terra.

t Accordâos, da Relaçào de Lisboa de 11 de novembro de 1897 e


do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de fevereiro de 1898, Gazeta da
Relaçao de Lisboa, 11. atmo, s. 40, pag. 318, e processo de revista
n. 27:922.
Too I 14
2110 ARTIGOS 162. u 1626.-

Art. 162:f.° Nas terras onde se usarem escriptos haver-


se-la por despedido o arrendatario que os pozer, e será
obrigado a mostrar o interior da casa, a quem pretender
vel-a.
Art. 1626.° Nas terras onde se não usam escriptos, deve
o arrendatario prevenir o senhorio, ou este o arrendatario,
da cessação do arrendamento, qíarenta dias antes de findar.

(Vid. artigos 16I.° e 162.')


A velha Ordenação exigia a prevenção para evitar a renovação
tacita nos arrendamentos de predios urbanos, quer por tempo deter-
minado quer por tempo indetcrminado, mas não sujeitava à mesma
regra os arrendamentos de predios rusticos.
Em face do presente codigo era muito questionado se para evitar
a prorogação ou reconducçào do arrendamento por tempo determi-
nado se tornava necessaria a prevenção antes de findar o respectivo
praso.
Nos arrendamentos por tempo indeterminado, quer de predios ur-
banos quer de predios rusticos, todos concordavam na necessidade
da prevençào; e expressamente a exigia o artigo 16295. para o termo
dos arrendamentos de predios rusticos por tempo indeterminado.
Não havia duvida de que acabava findo o praso convencionado
o arrendamento por tempo determinado, porque assim o preceituavam
expressamente os artigos 108 n.° 53., 1610. e 1614.0
Mas a questão era se para tornar electira a cessação do arren-
damento, mesmo nos arrendamentos por tempo determinado, era ou
não precisa a prevenção.
O artigo 116., que evidentemente se refere a arrendamentos com
praso fixo, presumia renovado o contracto, continuando o arrendata-
rio sem opposiçâo na fruição do predio, depois de findar o arrenda-
mto.
Mas não exigia a prereuçào. $ó presumia renovado o contracto,
quando o senhorio não só não avisava o arrendatario antes de findar
o arrendamnento, mas tambem não reclamava contra a continuação
do arrendatario no uso do predio, depois de findo o praso do contracto.
Esta regra, porém, parecia ter excepção nos predios urbanos, ar-
tigos tI24.- e 1626.-, onde a despedida parecia essencial para evitar
a prorogação do arrendamento.
Corto,, porém, todas as duvidas o codigo de processo civil, exigindo
no artigo 458. aviso para despejo mesmo nos arrendamentos com
dia certo, e modificando assim os artigos do codigo civil, que por-
ventura tivessem dispensado a notilicação para a entrega do predio,
quando se tinha ajustado o termo do arrendamento.
Tambem o codigo de processo civil se não contenta como se con-
tentava o codigo civil com a intimação extrajudicial para obstar á
prorogação tacita do arrendamento.
Pela lei de processo tem o sehorio de avisar judicialmente o
arrendatario quando o quizer despedir, como judicialmente tem o
rendeiro de avisar o senhorio quaudo quizer despedir-se.
O aviso, quer do arrendatario quer do senhorio, deve ser com a
antecipação de quarenta ou de sessenta dias, segundo forem urba-
nos ou rusticos os predios arrendados, salvo nos arrendamentos de
predios urbanos, onde se usarem escriptos, que basta ao arrendata-

cait
AMlT'IGO 1626.- 211

rio, para despedir-se, por escriptos em tempo competente codigo de


processo civil artigo 5al7.
A citação para despejo, ha de ser feita nos arrendamentos de pre-
dios urbanos, até o dia em que se devem pôr escriptos nas terras
onde elles se usarem, ou quarenta dias antes de findar o arrenda-
mento onde no houver aquelle uso, e nos arrendamentos de predios
rusticos com a antecipaçào usada na terra, ou, na falta d'aquelte uso,
com a de sessenta dias antes de findar o ano agricola, codigo de pro-
co.so civil artigo 498.
E assim mais besevola a lei de processo com o arrendatario do
que com o senhorio, pois que o senhorio, para despedir o arren-
datario, tem de recorrer ao processo especial do artigo 498? do
codigo de processo civil, em qeanto que o arrendatario péde despe-
dir-se pelo meio simples de escriptos rm tempo comsptente, se o ar-
rendamento é de predios urbanos sitos em terras onde se usem
escriptos.
Estas notificações, que em caso nenhum podem ser contestadas,
feitas fira de tempo não produzem effeito algum; mas não impedem
o senhorio de pelos meios competentes usar dos seus direitos contra
o arrendatario, como não impedem o arrendatario de usar dos seus
direitos contra o senhorio, apesar de só ao senhorio e não ao arren-
datario se referir o l do artigo 507. do codigo de processo civil.
Não deixa todavia de produzir effeitos juridicos o aviso feito com
ictervallo superior aos quarenta oa aos sessenta dias, marcados nos
artigos 498, e 507. do codigo de processo civil, e nos artigos 1626y
e 162.0 do presente codigo, porque a antecipação, longe de contra-
riar as prescripções da lei, é ainda de maior vantagem para o in-
teressado, salvo o aviso por meio de escriptos que ha de ser feito
no dia costumado, ou hão de ser conservados os escriptos até o dia
que todos escolhem para procurar casa, para nào diflicultar o ar-
rendamento.
Como, porém, os direitos e as obrigaç5es dos senhorios slo regidos
prinseiramuente pelo titulo do arrendamento, eão obsta ao despejo
a falta de prevenção judicial, quando no respectivo titulo o arren-
datario se cmprounettcu a dar por fiado o contracto em determinado
dia, iadepeudentmoente de qualquer citação ou aviso, porque não
repugna aos principios de direito tal estipulação, destinada a impedir
a reconducçào tacita do arrendamento.
A mesma jurisprudencia deve observar-se quando se estipulou
que o contracto seria regulado pelos artigos 1606., 1608., 1609.- e
seguintes do presente codigo, sem referencia ao do artigo 1607.-,
porque semelhante estipulaçào deixa presumir que o senhorio renun-
ciou ao direito de requerer o despejo por falta de pagamento de
rendas. n
Na falta de escriptos ou de aviso judicial presume-se renovado o
contracto com as mesmas condiçòes do anterior arrendamento, me-
nos o praso vistos os artigos 1618.0 e 1623' j unico2, pois que a re-

Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de maio de 1899,


Revista dos Tribunaes, 17.0 armo, n.- 408, pag. 372.
s Aceordão da Relaçào de Lisboa de 16 de janeiro de 1892, Gs-
seta da Relação de Lisboa, 6.0 anno, n. 16, pag. 121.
21'2 ARTIGO 1626.-

novação se entende pelo minimo quando não ha determinação de


tempo, isto é, por semestre, por anto ou por menos, conforme o coe.
tuse da terra, apesar do artigo 1624.- presumir renovado o contracto
sem restricçoes nem diminuições.
Se o senhorio deixou de prevenir o arrendatario, ou o arrenda-
tario de prevenir o senhorio, da cessação de arrendamento estipu-
lado, v. gr., por vinte aunos, presume-se renovado o contracto, mas
não por outro tanto tempo, apesar da letra expressa e positiva do
artigo 1624.
Nem o nosso direito anterior nem a legislação romana admittiam
a reconducçào quanto ao tempo; nem póde hoje presumir-se tal re-
novação porque as fontes do nosso codigo, o artigo 1759.- do codigo
civil franrez, e o artigo 1521" do projecto de codigo civil hespa.
nhol, estatuem expressamente que a reconducção é feita sob as mes-
mas condições, salvo quanto ao tempo, que ha de ser o do costume da
terra.
O arrendamento com a clausula de renovação em quanto o arren-
datario pagar pontualmente a renda, só dura o tempo da recon-
ducção tacita no minimo do praso, se o arrendatario findo o tempo
fixado não reclamar a reconducção, como claramente resulta do ar-
tigo 1618'
A renovação do arrendamento, apesar da desharmonia dos jul-
gados a este respeito', abrange a fiança, quando prestada pelo
pactuante, aias não quando prestada por terceiro, se este não houver
consentido expressamente na renovação; pois o fiador pésa apenas
com a responsabilidade que tomou, e não com lquella a que foi cha-
mado por novo contracto em que não interveio. E a disposição do ar-
r tigo 852'
Não prevenia o codigo a hypothese de arrendamentos por menos
de quarenta dias, aliás tão usuaes sobre tudo em Lisboa, e por isso
já uma vez se julgou applieavel a regra geral do aviso prévio com an-
tecipação de quarenta dias, mesmo aos contractos de semanas ou
de dias 2, por menór que fosse o periodo do arrendamento.
Essa lacuna foi, porém, preenchida pela lei de 21 de maio de 1896
no que toca aos arrendamentos de predios urbanos por mez ou por
periodo inferior a seis mezes, e por periodo de seis a doze meses de
renda não superior a 508000 reis, mantendo-se todavia n'este caso
as disporiçôes dos artigos 1625.' e 1626? do presente codigo.
N'estes arrendamentos o senhorio que não quizer a.renovação do
contracto avisará por si ou por seu procurador, na presença de tes-
temoshas, o arrendatario para pôr escriptos seis dias antes de findar
o praso do arrendamento; e o arrendatario, a quem uo tiver sido
feito o aviso, e quizer a renovação do arrendamento, será obrigado
a pagar dentro de seis dias a renda correspondente ao contracto
renovado, salvo estipulação em contrario.

t Accordâos da Relação de Lisboa de 8 de janeiro e de 14 e 28


de maio de 1873, de 16 de maio de 1874, e 26 de novembro de 1890,
Direito, 5.' asno, n. 3, Revista de Legislaçao e de Jrisprudencia,de
Coimbra, o'" 340 e 376, Ga:eta da Asso-iaçdo dos Advogados, de
Lisboa, 1. anno, pag. 611, e Gazeta da Relação de Lisboa, 5.' anuo
n.- 9, pag. 68.
SAcecordão da Relação de Loanda de 11 de fevereiro de 1893,
Boletim Official d'Angola, de 15 de julho de 1893, no 28, pag. 28.
pi~pTI !~
q

ARTIGOS 1627.", 162S.^, ifl9.* E 1630.' 218

Jodo o aso o arrendatario a quem não convenha a renova-


+ontracto será obrigado com ou sem aviso a pôr escriptos no
de seis dias.
feoea do arrendamento a drias, que não é raro em Lisboa, uâo
providenciou, como não providenciava o codigo civil nem o codigo
de processo civil, a lei de 21 de inalo de 1896; e por isso em tal caso
deverá seguir-se por analogia o processo prescripto na mesma lei.

sUB-SEcÇÃo uI

Disposições especiaes dos arrendamentos de predios rusticos

Art. 1627." 0 arrendatario de predios rusticos é obrigado


a cultival-os de modo que não sejam deteriorados, aliás
pôde ser despedido, e responde por perdas e damnos.
(Vid. nota ao artigo 1607.)
1
Art. Não tendo sido declarado o praso do arren-
1628.o
damento, entender-se-ha que este se fizera pelo tempo
costumado na terra, e, em caso de duvida ácerca de qual
é o costume, por não ser uniforme, nunca se presumirá
sjue fosse feito por menos tempo que o necessario para
uma sementeira e colheita, conforme a cultura a que tenha
sido applicado.
(Vid. nota ao artigo 1623.)

Art. 1829.° 0arrendatario por tempo indeterminado,


que não quizer continuar com o arrendamento do predio,
deverá prevenir o senhorio com a antecipação usada na
terra, e, na falta de praxe a tal respeito, sessenta dias
antes que, conforme o costume da terra, e o genero de
cultura, finde o anno agricola. O mesmo aviso deverá fazer
) senhorio ao arrendatario, se lhe não convier a continuação
¬ do contracto.
(Vid. nota ao artigo 1G24.)

Art. 1630.0 0 arrendatario não pôde exigir diminuição


214 ARTIGO 1631.-

de renda com o fundamento de esterilidade extraordinaria,


ou de perda cousideravel dos fructos pendentes, por qual-
quer causa fortuita, salvo se outra cousa tiver sido estipulada.

(Vid. nota ao artigo 1612.^)

Art. 4631.° Ficam sujeitos ás disposições do presente


codigo todos os contractos de arrendamento de predios rus-
ticos, ainda mesmo nos districtos ou provincias do reino,
onde, antes da promulgação do mesmo codigo, taes con-
tractos eram regulados por leis especiaes.

Acabou o artigo 1114.° com as differenças para o elfeito do des-


pejo entre predios urbanos e predios rusticos, reconhecidas na Ord.,
liv. 4.°, titt. 23.° e 54., no alvará de 27 de novembro de 1804, e no
assento de 23 de julho de 1811 ; e revogou o artigo 1631.0 as dispo-
siçcs especiaes da lei de 20 de junho de 1774. e do alvará de 27
de novembro de 1804 relativas aos arrendamentos das herdades
no Alemtejo e na Beira.
E a estas herdades que principalmente se refere o artigo. e tanto
que o projecto primitivo no artigo 17129 correspondente dizia .As
disposições da presente secção são applicaveis ás colonias do Alem-
tejo e Beira. redacçào ainda conservada nos prectos da commis-
sa revisora de 1863 e de 1864
Por aquella legislaçào especial no podiam ser despedidos os colo-
nos findo o arrendamento, salvo em casos especiaes, e dadas certas
circunstancias.
O projecto primitivo ainda quiz transigir com a velha instituiýào,
deixando ás colonias existentes a natureza de arrendamentos por
tempo indeterminado em quanto direitamente nio terminassem, ap-
plicando as regras dos arrendamentos só ás colonias que de futuro se
estabelecessem, e reconhecendô só tres casos em que podiam ser
despedidos os colonos existentes que se achassem estabelecidos com
sua familia nalguma herdade.
A commissào revisora. porém, com razSo applicou desde logo ás
velhas colonias as disposições do codigo sobre arrendamentos, per-
mittindo despedir todos os colonos das herdades do Alemtejo e da
Beira Baixa, por mais longo que fosse o tempo do seu contracto, sem
outra formalidade além do aviso de sessenta dias antes de fiado o
mano agricola nos termos do artigo 1629.0
No entre tanto apesar de revogada pela lei de 1 de julho de 1867
toda a legislação anterior, tanto geral como especial, que recahisse
nas materias comprehendidas no codigo civil, ainda na ilha da Madeira
se mantem uma instituiçào de eclonia, que alli existe desde tempo
immemorial, em que os colonos exploram os predios, pagando em
regra a dimidia dos fructos aos senhorios, bypothecando e alienando
as bemfeitorias como bens proprios e distinctos, e recusando-se a
largar a posse dos predios em quanto no estão pagos d'essas ben-
feitorias.
N'aquella ilha pertence por uso aos colonos a propriedade de todas
as bemfeitorias hato rusticos como nbanas, consistindo estas aacasa
que cada colono edifica para sua morada, e da qual nada paga ao

a
ARTIGO 1631.- 215

dono do terreno, e aquellas nas diversas plantações pelos mesmos


colonos feitas, das quacs repartem com o dono do terreno metade
da producçâo bruta animal.
Em bomenagem a tal costume foi por despacho do ministerio da fa-
zenda de 19 de janeiro de 1885 t determinado: 1. que nas matrizes
prediaes e de lançamento da contribuiçào predial relativa aos pre-
dios em colonia no distrieto do Fuchal. fossem considerados os co-
lonos, com de direito o odo pelos seus coatractos, proprietarios das
casas que nas imesmas coloaias possuissem, paia serem inseriptas em
seus nomes na matriz a que pertencessem, em artigos distinetos,
e seguidamente àquelle em que fosse inscripta a parte rustica da
referida colonia, e rendeiros quanto á parte rustica cada um segundo
o que aa mesma colonia tivesse, sendo toda a parte rstiea in-
scripta em nome d dono do terreio em um s artigo, mas subdividido
em tantas partes quantas fossem as dos colonos, correspondendo
á parte de cada um d'estes um arrendamento; 2. que os possuidores
de betfeitorias rusticas em terreno alheio fossem considerados com-
proprietarios do predio e que essas bemfeitorias existissem, quando
do producto d'ellas nada tivessem a repartir com o proprietario do
terren, tendo daeste caso de ser iuscript em artigo distiíeto com
referencia ao mesmo predio a parte que a cada um pertencesse e
em nome d'aquelle a quem pertencesse; .3. que na formaçào das
matrizes, e tio laíçamento da contribuiçào predial, deviam por um
lado ser instriptos e collectados os predios em nome dos seus pos-
suidores, e por outro ser a contribuiçào repartida, no predio rus-
tico explorado por conta alheia. entre o senhorio e o explorador por
modo que cada um pagasse na proporçào do rendimento que aufe-
ria.
Nào tFem portanto sido applicadas as disposições modernas sobre
bemfeitorias aos coítractos de coloíias na ilha da Madeira cele-
brados antes da promulgaçào do codigo.
Pelo contrario tem-se julgado que os colonos não podem ser des-
apossados dos predios e privados das bemfeitorias a que têem direito
á
adquirido sombra da lei anterior; assim como já se julgou que
no devem ser applicadas as disposiç0es da lei nova, e sim as da Ord.,
liv. 4 , tit. 54., l", beítftitorias realisadas em arrendamentos
ls
interiores á promulgação do codigo, que eram regulados por legis-
laçào especial. I
lias toda esta jurisprudencia, quer do ministerio da fazenda quer
das decis8es judiciaes. menoas conforme ás disposiçues do codigo.

SOticio da Direcção Geral das Contribuições Directas de 26 de


janeiro de 1885, Direito, 17 ano, nm4, pag. 61.
i Accoedôo da Relaçào de Lisboa de 26 de abril de 1894, Gazeta
da Relaçâo de Lisboa, 8." anno, n° 78, pag. 617.
916 ARTIGO 1632.-

sUB-sEcçÃo Iv

Do despejo

Art. 1632.° A acção de despejo é sempre summaria.


Não reconhece o codigo de processo civil senão processo ordinario,
que é a regra, e processo especial, que é o admittido nos casos
taxativamente marcados na lei.
Pelo referido codigo o processo de despejo é especial.
A acção de despejo é só applicavel aos nrrendamentos 1, e só é
concedida ao senhorio contra o arrendatario.
O codigo civil em caso nenhum dá ao arrendatario o direito de
largar o arrendamento por o senhorio não cumprir as suas obriga-
çôes. Peruitte-lhe apenas intentar contra o senhorio a acção de res-
cisão do contracto e de indemnisaçio de perdas e damnos, nos colos
previstos na lei.
Tambem em direito velho só o senhorio ou seus herdeiros, e nunca
o adquirente por titulo singular, podiam recorrer á acçio de despejn;
e era até muito questionado se o arrendatario podia usar da acção
do despejo contra o proprio sublocatario.
Hoje, porém, compete a acção de despejo tambem ao novo adqui.
rente, que registou a sua transmissão previamente ao registo do ar-
rendamento.
Esta novidade foi introduzida pelo codigo de processo civil, que
reconheceu ao novo adquirente do predio a acção de despejo nas pa-
lavras do §2.° do artigo 500.- -salvo se, tendo sido o predio trans-
mitido depois do cndracto de arrendonseao,este não p) odvzir eflito
contra o noeo adrsirete-.
Pela lei vigente o comprador, para haver a posse desde que re-
gista o seu titulo, tanto póde recorrer á acçào de despejo, como lhe
basta um simples requerimento, instruido com o titulo de aquisiçãoe
com o registo da transmissào, para alcançar a posse judicial, contra
a qual podem aliás ser deduzidos embargos conforme o decreto de
15 de setembro de 1892 artigo 14.^
t Tambem só com fundameuto em contracto de arrendamento per-
feito e consummado, e não com fundamento apenas em promessa
de arrendamnento, ainda que o arrendatario se tenha apoderado do
predio, póde ser intentada a acção de despejo.
Duas acções especiaes de, despejo reconhece o codigo de processo
civil, ds quais so applicaveia os artigos 501.' a 505.' do mesmo co-
digo, uma para avisar o arrendatario para sahir no fim do arren-
damento, que é regulada nos artigos 498.°, 499. e 50Lp e outra para
obrigar o rendeiro a sahir antes de findar o arrendamento, que é
regulada no artigo 500.'

c Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de novembro


de 189á, Gazeta da Relação de Lisboa, 8.' anuo, n.° 39, pag. 308.
ARTIGO 16328. 217

Na hypothese do artigo 498." não carece de ser articulada a petição,


e na hypothese do artigo 500? sim.
ualsuer das duas acções ha de ser proposta no juizo da situação
dos predios, salva estiputção de domicilio particular para cumpri-
mento da respectiva obrigaçào, codigo de processo civil artigo 21.'
na 3?, e ý 3.' n.' 2., e não carece de ser instruida cos titulo es-
cripto de arrendamento, visto poder ser provado o contracto com tes-
tetunihas, conforme a regra geral estabelecida nos artigos 648.',
676? e 2506., que t inhum preceito especial alterou, e serem até
admittidos ao muijifesto por meio de declaração escripta perante o
escrivão de faizendi os aried:ionentos uão tituluidos.'
lela arçdo prescripta no artigo 498. do codigo de processo civil,
qu está coi 1 reiendida nas acções cosotinatarias provoca o se-
nhorio o injtilin adeduzir embargos ao despejo. que presumem ver-
dadeiros os factos allegados. e julga-se a coiíinaço por sentença
na falta de impugnçào, cffectomdo-se o despejo por simpl s man-
dado judicial á eusta do arrendatario, se elle não larga depois vo-
lutiari:tieote o pred tio fim do contracto.
N'esta materia fez a commsissào revisora largas e profidas altera-
çdes nos projectos elaborados pelo auctor do codigo de processo
civil.
O anctor do codigo s aos arrendamentos titulados, quer fosoe au-
thentico quer particular o titulo, applicava o processo marrado no
artigo 498." e seguintes, nos arrendamentos oerbaes perittia a
despedida com a simples intimaçd o verbal do interessado i'eraute
duas testímunhas conforme o disposto no artigo 7111 § 2. do pre-
sente codigo para evitar as despezas e os etibaraços da citaçdo judi-
cial nos arrendamentos de predios de pequeno valor. que ode muito
frequentes, e auctorisava o arrondatario a seguir os tcrms hoje
prescriptos nos artigos 498' a 500.' do codigo de processo civil para
o enlrio. 2
No codigo, porém, os mesmos são os termos para o despr o quer
seja escripto quer vrbal o arrrndamento, não póde o arrerdatario
recorrer a todos os processos concedidos ao senhorio, come iao póde
o senhorio usar de todas ose pedientes permittidos 00 arre ilataio,
nem lia notificaçtes para despejo seião judicines.
A acçdo de avisoou de despedida regulada no artigo 498. do co-
digo de processo ritvil só pde ser atacada por meio de e bargos,
ou se impugne o fundaento do pedido ou se reclamem bsmfíitorias.
Mas na acção de despejo regulada no artigo 500. o fuamento
do pedida sn póde ser impugnado por coateslado, e o pedido de
hemfeitorins só póde ser feito em smsoq/s.
1'r a lIi aso ' 'estiaar outro meio de npposição ao despejo re-
querido cem fndamento tio artigo 995 do codigo de p rocc=o civil
senão os embargos, já os tibunaes se téeca negado a auctorisar a
suspenã do despejo fóra do caso de embargos fundados em bem-
feitorias que auctorisem a retti ção tios termos do artigo 1614. do
presente cadigo 2

SAcecordão da Relação de Lisboa de 15 de fevereiro de 1882,


Reista de Legislaç o e ide Jurisprudeneis, de Coimbra, 16? atno,
u. 792, pag. 188.
Arcordso do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de novembro de
1895, Gazeta da RelaçBo do Lisboa, 10.' atino, .? 26, pag. °Oa6.
218 ARTIGO 1632.-

É porém contraria á lei semelhante jurisprudencia.


O artigo 499." do codigo de processo civil ndo diz que só com
embargos fundados em bemfeitorias póde ser impugnada a preven-
çio para despejo.
Pelo contrario permitte deduzir por meio de embargos qualquer
opposiçào.
A respeito de bemfeitorias o que diz é que os embargos, quando
fundados em bemfeitorias, só suspendem o despejo estando clas
comprehendidas no artigo 1614° do presente codigo, como posi-
tivamente determina o artigo 500.o § 4.^ do codigo de processo
civil. i
P,lo projecto primitivo do codigo de processo civil nào suspen.
diam effeetivamente o despejo os embargos senào quando fundados
em bemfeitorias, e só quando as bemfeitorias estivessem nos casos
do citado artigo 1614 do presente codigo, e só quando constasse
de titulo atheulicoou asthe,/ieado o arrendamento, pela presumpçdo
de que nem o juiz deferiria contra as estipulações do docamento,
nem o doeumento poderia ser atacado com prova testemunhal sendo
no caso de falsidade, nem o rendeiro teria em tal caso defesa que
não fosse bemfeitorias.
A commissto revisora tambem nos dois primeiros projectos no
admittia embargos com suspensdo do despejo, dispensando aliás do-
cumentos para instruir a acçào
E verdade que no ultimo projecto, em vez de dizer unicamente,
como nos anteriores, que os embargos suspendiam o despejo na hy-
pothese do artigo 16l4." do codigo civil, disse-quando fundados
em bemfeitorias - e no § 4." do artigo 500. do mesmo codigo, is-
troduzido de novo com outros preceitos que no vinham nos projectos
anteriores, negou redondoií,n:te a suspenso do despejo por embargos
h fundados em bemfeitorias que no auctorisassesl o direito de reten-
i çao.
Mas estas disposições respeitam ao caso de ser combatida a acçào
unicamente com o arguíeinto das beafeitorias; e não excluem a op.
posiçôo fundada ioutros factos que ndo sejam bemfeitorias.
D'esta form recomposto, o penaamento do 2. do artigo 499. é
como se for religi o assim:- Os embargos, quando fundados em
bemfeit'rias, sei suspendem o despejo, se ellas auctorisarem a re-
teuçdo tos termos do artigo l^14" do codigo civil -
Deduzidos embargos fundados cm posse, que nao seja a titulo de
1 arrendamento, mas sim a tifulo d usufrueto, ou de outro qualquer
direito, só péde ser ordenado o despejo, resolvido este ponto, por-
que ao caso não tem applicaçdo o artigo 499.° j 2. do codigo de
processo civil.2
A impugaçso directa do pedido, como a negaçâo do contracto de
arrend.iaento, ou da legitimidade do requereute. quer no caso do
artigo 498., quer no caso do artigo 500., no póde pois deixar de
suspender o despejo, ainda que se uo ajuete com a contestaçào do-

SAcecordào da Relação de Lisboa de 19 de dezembro de 1896,


Gazeta da Relaçdo de Lisboa, 10." anno, a" 60, pag. 473.
2 Accordào da Relação do Porto de 14 de novembro de 1882, Re-
vista de Legislaçso edeJorisprudescia,de Coimbra, auno 24", n.^ 115,
pag. 280.
ARTIGO 1682.0 219

cumento comprovativo do pagamento da renda. pois que não podem


reconhecer se effeitos is acçêes antes da sentença final senão nos
raios especificados na lei.
To rzoavel é expulsar do predio o arrendatario, que, findo o
arrendam nto, em vez de coobter o pedido em si ou por meio de
alguma excepçdo, allega simplesmente bemfeitorias sem direito de
reteço nos termos da lei civil, como absurdo seria não reconheer
outro meio de embaraçar o despejo sendo a allegoçâ o de benfeito-
rias cm direito d reteqção, porque então para pbr féra da proprie-
dade o proprio dono bastava um simples requerimento.
( orrenda t rio, que quizer contestar o despejo e eonjunctmente
pedir emcfeioias, ha de apresentar a impugnaçào e o pedido na
mesma ustiencitr, e n0 mesmo papel, mas em artigos separados, e
não rnglobdainte is benfeitorias comn oc artigos de impgnaçào
ao reqaerimento inicial, porque as bemfeitori:s, represetum um
pedido distmeto e intercalado no processo, que nada tes com o fundo
da acção.
Nas acções de despejo pddc ser deduzido como em oaesqoer ou-
tras o incidente de falsidade ; mas no podem ser oppostss embargos
de terceiro porque a lei os todo admitte senão nas execuções, nos ar-
restos, nos arrobunrntos, e na posse. t
Na aeçào de despejo por falta de pagamento de renda, o arrendata-
rio que não ajunetar doeumn to comprovativo do pa gamento logo com a
contestaçdt, nos termos do 2. do ortigo 500. do codigo de processo
civil, ainda mesmo que o senhorio não tenha ido receber ,t renda
no tempo e no legar ajustado, e que por culpa d'lle se não teha
etletutdo o pag mito, é imttdiatttentí expulso do predio ar-
rendado, cot quanto s-i ta sentença final se decida definitiotnente
a tiesto.
0 deposito ou pagametto da renda depois do dia do vencimento
j1 não releva do despejo 2, ainda mesmo que haja direito ao abati-
smeto da renda em consequencia de privação do uso do predio por
força maior.
Msa certidão do deposito feito no dia marcado para o paga-
mento vale, para o effeito de sustar o despejo, o documento eompro-
vativo de p1gamento exigido no ý 2.° do artigo 500. do coligo de
processo civil, antes mesmo de tplgado bom por setteaço, aitb fica ia
borado o arrendatario, a quem o senhorio recusasse receber o renda
no dia ajustado, por não ter tempo de concluir a aeção de deposito
até ã t-ra do pagamtnto.
O que jã se julgou foi que a consignação da renda rít deposito
que o senhorio não mandou receber, como se tinha estipulade, e que
e nm meio legal do devedor se livrar da obrigaçào feita antes da
citação para despejo, equivale ao documento a que allude o artigo dW).^
2.' do codigo de processo civil. e obsta ao despejo immediato em
seguida : contestação, porque o contrario equivaleria ao julga-
mento intempestivo da acção de deposito. 3

t Accordão da Relação de Lisboa de 1 de fevereiro de 1893, Direito


29. anno, n. 6, pag. 95.
2 Accordo do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de novembro de
1890, Bdel/'im dos Tribuiacs, C atno, n.' 224, pag. 185.
a Aceordão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de abril de
1896, Gazeta da Relação de Lisboa, 12.' auno, no 94, pag. 354.
220 ARTIGO 1632!

Nio pôde, porém, vingar a final a acção de despejo por falta de


pagamento de renda no dia ajustado, quando o arrendatario levou
a renda ao senhorio em tempo util, e este lhe pediu para a guardar
em seu poder.
O juizo competente para conhecer da consignação em deposito
é o do logar do pagamento', codigo de processo civil artigos 21.
n.° 2.- e 628. § 4.°
O dia competente para o arrendatario despejar e pôr escriptos,
tendo sido ordenado o despejo por sentença, é, no caso do artigo 498.y
do codigo de processo civil, o dia do contrato ou do costume da terra,
e nos casos dos artigos 500.O e 506.0 do mesmo codigo o dia marcado
pelo juiz em execução de sentença.
Se o arrendatario depois de ter posto voluntariamente escriptos,
independentemente de citação para despejo, não sahir do predio
em tempo util, é logo ordenado o despejo depois de justificado o facto
a requeimento do senhorio som eitaçào nem audiencia do inquilino
e sem dependenci de ristribuição. codigo de processo civil rrtigo502.P
Por outro lado nào pide o arreadaario vir metter-se de novo
no predio, que, com ou eem aviso, deixou findo o arrendamento,
sem correr o risco da penalidade et:Abelecida no artigo 380.^ ou no
artigo 445.' do codigo penal
A practica de proceder logo a despejo sem mais formalidades é
abertamente eontraria ao preceito do artigo 503.- do referido codigo,
que não permitte o despejo senào por mandado do juiz, quando o
arrendatario não tiver despejado no dia competente, regra que não
admitte excepção, nem mesmo nos casos do § 2.- do artigo 500.° do
citado codigo.
Nos arrendamentos de prerlios urbanos por mez, ou por perodo
de seis a doze mezes com renda nào excedente a 50É000 réis, lei de
21 de maio de 1896, póde ser citado a requerimento do senhorio para
elfeetrar o despejo até o ultimo dia do arrendamento o arrendata-
rio que não paga a renda ou não põe escriptos dentro de seis dias
depois de aviad,, desidament-.
Hão de ser indicadas uo requerimento testemunhas até tres, e
marcado uo mesmor despacho o cartorio onde ha de correr a causa,
e a ci tação faz-se, dispensada a distribuição, no praso de vinte e qua-
tro horas na pesea do arrendatario, ou de qualquer familiar, ou de
algum vizinho, quando aquelles não forem encontrados, amlixando-
se nota da citação na porta, e não é acsada em audiencia, e tem-
se por confessado o despejo se o arrendatario não deduzir opposiçào
dentro de vinte e quatro horas.
A pprnição ha de ser apresentada por meio de requerimento nos
autos, iudrpendetumente de despacho, com quasquer documentos,
e testemunhas até tres, e só poderá provar-se com recibo do senhorio
quando for o pagamento da renda o fundamento da impugnação.
No dia immediato se não for santificado será decidida verbal-
mente a causa.
O senhorio que for vencido na aeção de despejo por falta de pa-
gamento da renda, será considerado litigante de má fé, e voodemnado
em oudta de quantia egual r renda do mesmo predio correspondente
a um mez, e na indemnisação a que se refere o artigo 126.o do codigo

t Accordáo do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de julho de


1897,Gazela da Relação de Lisboa, 11. anno, na. 31, pag. 242.

a.
ARTIGOS 16383. E 1634.0 221

de processo civil, qui' é a pena que cabe ao arrendatario nos casos


em que for considerado litigante de m fé.
Coifi'sa.lo si julgado i despejo ha de o arrendatario despejar o
predio no dia em que terminar o arrendamento, sob pena de des-
pejo judicial no praso de vinte e quatro horas, observando-se na
parte applicavel os artigos 501° e 505.° do codigo de processo civil,
como ni praso iproeogavel de vinte e quatro horas ha de ser
cumprida a ordem d despejo contra o arrendatario que, tendo posto
escriptos, nào despejar o predio no fit do arrendamento.
Apenas se sobreesií no despejo o tempo que o medico repute in-
dispensavel para no perigar a vida da pessoa enferma, no caso de
doença grave do arrnudatrio ou de alguma pessoa de famíilia,
conpro ada por attestado de medico jurado e reconhecido.
Este processo pide ser instaurado e proseguir em todos os seus
termos durante as ferias e nos dias feriados que ndo forem saoeti-
ficados.
N'estas causas todos os salarios e emolumentos judiciaes são re-
duzidos á quarta parte qítodo o arrendatario no deduzir opposiçào,
artigo 85.° da tabella de 13 de maio de 18 6. 1
0 processo de despejo de predios arrendados é egoalmente
applicavel ao despejo de predios de parceria, sem embargo das ditff-
reças que ao arrendamento e à parceria agricola assignam os arti-
gs 1299.", 1595.' e 1596. do codigo, desde que são applicaveis
á parceria agricola as disposições dos arrendamentos, relativas aos
direitos e obrigaçes dos senhorios e dos arrendatarios, em tudo o
que não for regulado
t
por disposições especiaes artigo 1303. do
presente codigo.

SECÇAO III

Do aluguer

Ar. 1633.1 São susceptiveis de aluguer todas as cousas


moveis não fungiveis, qte estiverem em commercio.

(Vid. nota ao urtigo70.°)

Art. 1631U São applicaveis ao contracto de aluguer as


precedente, n'aqiLlo em que forem
disposiçýies tia secção
congruentes com a iudole d's objectos mobiliarios.
(Vid. nota ao artigo 1595.°)

t Accordào da Relação de Lisboa de 22 de julho de 1899 , Ga-


zeta da Relaçdo de Lisboa, 13.' anno, n. 9, pag. 73.
i Accordào da Relaço de Lisboa de 6 de maio de 1893, Direito
29.' auno, .- 14, pag. 221.
222 ARTIGOS 1635.°, 163E. 1637.s 1638.^, 1639.° E 1640.^
Art. 1635. A transferencia do direito de perceber, por
tempo e preço certos, quaesquer prestações ou rendas,
rege-se pelas disposições contidas nos artigos 785.1 a 795.1,
salvo o que nas leis fiscaes se ordenar em relação ás rendas
do estado.
(Vid. nota ao artigo 785.°)

CAPITULO XI

DA USURA

Ar[. 1636.0 Dá se o contr:icto de usura, quando alguem


cede a outrem dinheiro, ou qualquer outro objecto fungivel,
com obrigação de restituir uma somma equivalente ou um
objecto egual. mediante certa retribuição em dinheiro ou
em cousas de outra especie.

(Vid. nota ao artigo 1508.-)

Art. 1637.0 Se o objecto do contracto for cousa fungivel,


que não seja dinheiro, e o obrigado não restituir a consa
no praso convencionado, pagal-a lia em dinheiro, pelo preço
corrente d'ella nesse tempo.
(Vid. nota ao artigo 1530.^)

Art. 1638.0 Se o contracto versar sobre moeda certa es-


pecificada, será a restituirão feita em moeda da mesma
especie, e, não a havendo, applicar:se-lha o disposto nos
artigos 724.° e 725.°
Art. 1(39.° 0 que fica disposto nos dois artigos prece-
dentes não obsta a que os coutralentes estipulem o con-
trario.
(Vid. nota ao artigo 724.°)

Art. 1640.° Os contraientes poderão convencionar a re-


tribuição que bem lhes parecer.
unico. Nos casos em que tiver de fazer-se computação
Wr-.

ARTIGO 1641.° 223

ou calculo de juros, na falia de estipulação, serão estes


calctildos aíniati elc em cinco por cento do capital.
Em odio à usura, e sob a impressão erronca de que o capital ou
valor, dinheiro, não era productivo, dictavam as leis antigas cou-
tra os chamados rsutr tios peas severas.
Mas com a uxpericia se encarregasse de demonstrar a inefli-
cacia de remtedioa que, longe de comLaterem o sal, o aggravavam,
porque os mutuantes, à prLporçâo que a penalidade augmentava,
exigiabo dos mutuaios mais avultados sacrificios como indenti-
sação e competsaç o t risco a que se sujeitavam, foi-se introdu-
zindo a pratica, que todos os povos civilisados a final saíecionaram,
de conceder ao valor dinheiro. garantias e vantagens eguacs :s de
quaesquer outros valores.
O direito anterior, qu em materia civel não reconhecia juro su-
perior a 50s,a peirmittia em tegocios coummerciaes estipular a arbitrio
o juro, e para a falta de estipulação fixava-o et 60%.
O projecto primitivo ainda sanecionava a velha doutrina prohibi-
tiva da estipulação de juros a arbitrio das partes, em homenagem
a antigos prejtizos religiosos e economicos, pois no artigo (1728.)
correspnd'nte ao artigo 16410. do codigo preceituava o seguinte
- rOs estipulantes podeerà civencionar a itribuiçto que be Ilhes
parecer, couitato que o interesse tttual não passe de 5 por cento do
capital. § 1' Esta taxa tão terá logar nos ccutci ts a risco ou sem
garantia. 2.' Dá- se garantia sempre que o obrigado preste fiança
ou hypotheca, ou tenha bens por que responda pela sua divida.,-.
A corruissfo revisora, porém, eto nome dos principies reguladores
da liberdade das transacçócs, proscreveu logo nos trabalhos da pri-
meira revisão a excepção odiosa da restricção do interesse no con-
tracto de mutuo a dinhciro.
O novo codigo commercial no artigo 1023. reconhece juros em
todos os actos comereiaes em que for de onver;o ou de direito ven-
cerem se e nos ais casos especiaes marcados no niesmo codigo,
fixa-os em 50 o qu ando estipulados sem taxa ou devidos por disposi-
çào legal. o no permitte ajuste de taxa senào por esceipto.
J se julgou t que a taxa legal dos juros, ainda que o acto ju-
ridico fosse anterior ao novo codigo comnercial, é de 5 0 a segundo
o novo codigo, se a acção fui installada depois, e não de 6 0/0, como
era pelo antigo.
Mas a disposição do novo codigo não deve ser applieada ao juro
vencido, antes da sua promulgação.

Ai. 164i1.a 0 contracto de ustira é distraciavel a arbi-


trio do devedor, salvo se o dictu contracto for estipulado
por tempo certo, Psrquo, n'csse caso, cumprir-se-ita aquilo
que estiver convencionado. O mesmo direito leni o credor,
mas com a restricção de não poder usar d'elle sem d'isso

t Aecordão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de maio de


1897,Gazela da Relação de Lisboa, 1t.1 anno, n.' 53, pag. 420.
224 ARTIGO 1642,

prevenir o devedor, com antecipação de tinta dias pelo


menos.
(Vid. nota ao artigo 1527)
Dispensam alguns a prevenção ao devedor nos termos da se-
gunda parte do artigo quando elle está ausente em parte incerta,
com o fundamento de editalmente só se fazerem citaçes, de serem
pelo artigo 619. unico do codigo de processo civil applicaveis
ás notificaçGoe os artigos 13 - a 18?- e 1s?.- a 190.% e não os arti-
gos 194." e 197.^ relativos s citaçBes editaes. e de supprir a citação
edital para a causa a falta de prevenção edital.
Deverá, porém, fazer-se com a antecipação de trinta dias a preven-
ção ao devedor, quer esteja presente quer ausente, porque a gene-
ralidade do artigo nio permitte distincçòes.

Art. 1612.° Não são exigiveis os interesses vencidos de


mais de cinco annos, nem interesses de interesses, mas
podem os pcltuantes capilalisar por novo contracto os iít-
teresses vencidos.
(Vid. nota ao artigo 543.-)
Com o fundamento de pelo artigo "do serem exigireis os interesses
de mais de cinco anuos, de não estar portanto habilitado o credor a
receber sesão os interesses de cinco anos porque não ha obriga-
ção de pagar socao quando a lei assim o mandar, e de não serem
precisos os artigos 1642- e 1684. se fosse necessario invocar a
prescripçào. porque essa já estava invocada no artigo 543. n. 1-,
tem continuado a julgar-se que decorridos cinco anos está o de-
vedor desonerado do pagamento sem necessidade de argumentar
com a prescripção.
A regra pelo artigo 16-12. applicavel aos juros tem sido egual-
mente applicada aos foros 1 conforme o artigo 1684."
Na palavra interessrs eomprehende-se os juros.2
Até se julgou contra todos os principios de direito, que não é pre-
judicada polo reconhecimento da divida em inventario a prescripção,
e que para manter o direito além dos cinco ataos é sempre preciso
capitalisar os juros por novo contracto. 3
Hoje é jurisprudencia assente que o processado na causa, em que
se pedem juros depois de contestada a lide sem a juneçéo do com-
provativo do manifesto, é suspenso e não anallado, apesar d'uma de-

i Accordãos, do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de junho de


1896, e da Relação de Lisboa de 1de maio de 1897, Gazeta da Re-
ação de Lisboa, 10" anno, n. 91.
2 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de junho de
1897, Gazet, da flaaão de Lisboa, I1.- ano, n- 44, pag. 347.
3 Accordàos da Reltsçãode Lisboa de 30 de maio de 1896,
e de
27 de março de 1897, Gazeta da Relação de Lisboa, 10." asno, n. 70,
pag. 217, e n. 76, pag. 601.

Á
AltIIGOS 1645^, 1644.° E 1645. 225
eisio 1 em contrario que não constituirá direito, porque destoa do
preceito da lei, e da pratica constante.

Ari. 16i3.° A prova deste contracto é applicavel o que


fica disposto no artigo 153x.1 e seu §.
(Vid. nota ao artigo 1534.)

CAPITULO XII

DA timNIA OU CENsO CONSIGNATIVO

SECCA) 1

Da renda ou censo consignativo de futuro

Ari. (Mi Contracto


r de censo consignativo, ou renda,
t aqelle, pelo qual uma pessoa presta a outra certa somma
on capital, para sempre, obrigando-se aquelle que o recebe
a pagar certo inetresse annal, em getetos ou em dinheiro,
consignando em algnus, certos e determinados, immoveis,
a nbrigaç4r de slatisfazer ao encargo.
Art. 1li00 E da naureza deste contracto a cessão per-
petua do capital prestado; porém a obrigação de pagar o
irteresse estipulado pôde ser ou perpetua ou temporaria.

rVid. artigos 1648.' e 17063)


o censo conignativo t:ibem denominado renda perpetua, renda
oinples ou constiteitço de ron'a, por ser nima espccie de venda
visto n'clle se transittir a terceiro 0u direito por determinado
preço, sem todrin soer venda por não pír termo e antes manter en-
tre os pactiuiti rebgó"es jridiras editraçãs indefinida, só pede
reratir em coas dríorrninada iimmovel. A expressão imroies usada
no artigo 131.' e a palavra predio empregada no artigo 1706
-eelumr a constituiiçñ de censo sobre bens que no seao immo-
tiliarios por natme-
Esá aiibem comprehedid nos onns rees sujeitos a registo ar-
tigos 919.' e 111.

1 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de jullio ii


18'8, Gazeta d Leliado de Liiboa, 129 sano, n? 28, pag, 220,
Too III 15
22G ARTIGO 1645.-

E da natureza do censo consignativo aperpetuidade da ceessão do


capital prestado, perpetuidade aliis distractavel passados vinte as-
nos artigo 1648.° por não convir ao interesse publico aprisão perpetua
do devedor ri obrigoção.
Não é, porém, da natureza do contracto o pagamento do interesse
â perpetuidade.
A obrigação de pagar o interesse estipulado póde ser perpetua
ou temporaria; e não é incompativel a cessão perpetua do capital
com a obrigação temporariado interesse, sobre tudo quando o inte-
resse é elevado.
Tão differentes são na sua essencia os dois contractos do censo
consignativo e do censo reservativo, que até em duas partes distin-
etas d'elles tracta o codigo: do censo coisignativo em seguida á
usura, por á doutrina da usura estar sujeito o pagamento das pre-
ã
staçòes, artigo 1647., e do censo reservativo em seguida en'phy-
teuse por ser applicavel o regimes da emspl-teuse ao censo reser-
vativo de preterito, da qual apenas se distingue em se transmittir
na emphyteuse todo o dominio util e caber ai o direito de pre-
ferencia, e guardar se nos censos reservativos uma simples pensão,
sem direito de preferencia.
No censo consignativo recebe o proprietario o capital, conserva o
dominio dos bens, e paga uia prestação anmal, consignada em bens
determinados.
No censo reservativo troosmitte o proprictario o dominio dos bens
immoveis, não recebe o capital, e apenas reserva para si ou para
outrem uma renda, que lia de ser paga pelos fructos dos bens alie-
nados.
Pedro recebe de Paulo 1:000,i000 réis para lhe pagar pela sua
quitta de Frescate G0d0) réis anínaes, o censo é consignativo.
Pedro cede a Paulo a sua quinta de Frescate reservando 6i4i0 tjréis
annuaes para lhe serem pagos pelos fructos do predio, o censo é
reservativo.
Por facilmente se distinguirem as duas especies não prescreve o
codigo regras para em caso de duvida se resolver se o censo é
reservativo ou consignativo.
Pela semelhança do censo consignativo com o emprestim hypo-
thecario, pois tambem rio censo consignativo se recebe uni capi-
tal com ons sobre o predio, elittinou a commissão revisora, e lago
nos trabalhos da primeira revisdo. os artigos 1735.' a 1748. do
projecto primitivo que tractavam ala renda e do censo cousignatiru de
futuro, e deliberou, nota ao artigo 16b8Y do projecto de 1863, conser-
var somente os artigos necessarits para preceituar que n'estes con-
tractos seria regido, o pagamento das prestaçòes pela doutrina da
usura, e o encargo pela das hypotheceas.
Mas não estão sujeitos os contractos de censo consignativo a de-
cima de juros, porque não representam emprestimo de dinheiro, visto
ser cedido o capital ou somma perpetuamente, sem haver logar ao
reembolso a não ser por distracte ou empena, artigos 1648 "e 1649.
c sim a contribuição de registo como actos de transmissão de pro-
priedade immobiliaria, que ha de ser calculada sobre o preço da,
consignaçào, regulamento de 23 de dezembro de 1899 artigos 2.,
3. n. 7. e 11 § 5.^
Distingue-se o censo, do arrendameido em se transferir pelo arren-
damento apenas o uso das cousas, e di eotphytetse em se transmittir
pela emphy-teuse o dominio util.
Mas approxima-se mais da emphyteuse, porque tambeta não póde

a
ARTIGO I645.^ 227

o censuario dividir o predio censitico sem consentimento do censuista


artigo 11;47., nem reclamar reducçto da pensào pelo facto de se ter
inutilisado qualquer porçào do predio; e presume-se censitico o con-
tracto quanlo entrar em duvida se é censitico ou emphyteutico ar-
tigo 1709.
Foi o censo durante muito tempo o meio de levar capitaes á
agricultura.
Mas foi sempre tolerado com desfavor pois que, se por um lado
convertia em proprictarios muitos pobres á custa dos ricos que
preferiam passar a vida na ociosidade consumindo as rendas do
capital, sobrecarregava por outro lado a terra com estraordinarios
encargos e usuras, e desprendia desde logo da cousa immovel os
proprietarios a troco de pensões.
Por isso as legislaçJes modernas respeitaram apenas, e ainda
assim cou modifieaçes profundas, o censo consignativo.
0 nosso codigo, no intuito de libortar a terra, de ous e encargos
que lhe prejudicam a cultura e o desenvolvimento, ou antes das
complicaçòes e difficuldades que importa a divisâo dos direitos,
prohibiu de futuro a constituiçào do censo reservativo artigo 1707.-,
como prohibi o sb-emprazamento artigo 17010, e a constituição
de quinhrs artigo 2196)., sujeitando is disposições da propriedade
commm toda a propriedade a que por qualquer medo fosse dada
a firma de quinhão, e declarando emphyteticos os contractos de
futuro estipulados com o nome de censo reservativo.
Eltfectivamemte com o proibiçao de lasdemio, e de qualquer outro
encargo casual e cxiraordinrio em a nova organisaçSo emphyteu-
tiea, tornava se esensada a institoiçlo dos censos reservativos que
olo verddeios afor.menhos, quamto perpetnos, e arrendanteitos,
quando temporari, artigo IGý
O projecto primitivo, que aliás não continha disposição alguma
coi relaçáo á sub.Žmiphyteuse e ao quinhio, já dizia, como diz o
codigo, que entre o censo reservativo c a emphyteuse nio haveria
liffiríoça.
t censo consignativo mesmo si o reconheceu o codigo com o di-
reito d, distractc quando perpetuo ou por mais de vinte annos.
Além de acabar de vez com o frma de censos reservativos, ar-
tigo 1707.', pernittiu o codigo a remissão dos censos consignativos
de preterito, decorridos que fossem vinte annos, ou este praso se
completasse antes ou depois da sua promulgação, prescrevendo as
condiçdes da remissào, que são as mesmas ou o censo consignativo
tivesse sido pactuado sob o dominio da lei anterior ou depois da
promulgação da lei nova.
A remissào é regulado pelo artigo G0.' do codigo de processo
civil quando o ceusiista for incerto ou incapaz de receber, quando
mão quizer receber o capital ou dar quitação, ou quando for duvidoso
o seu direito, sendo competente para o deposito o juizo do logar do
pagamento da pensao censitica.
A remissão, porim, dos censos pertencentes As corporaçòes sujei-
tas ãs leis da desamortisaçào é por estas regida', e não pelas dis-
posições da lei comííum.

l Accordàos da Relação do Porto de 18 de junho de 1875 e


ti t dP Janeiro de 1900, liecista de Ltgisaç;o e de Jrispredrncia,
dc t oimbra, ni 501 pag. 5>58, e Rccista dos Tribniaes, 18,0
anuo,
wa 423, pag. 233,

ma:ý.
228 ARTIGOS 1646.0, 1647.^, 1648.", 1649.0 E 1650.0

Art. 1646. Este contracto só pode ser celebrado por


escriptura publica, e para produzir efteito, para com ter-
ceiros, deve ser registado.

(Vid. notas aos artigos 68(." e 949.-)

Art. 16W7.1 São applicaveis a este contracto as disposi-


ções estabelecidas nos artigos It4I.° e 1662.1

(Vid. notas aos artigos 1640." e ;62.

Art. 16'48.° 0 censo ou perpetuo, ou por mais de vinte


amtos, é distraclavel no fim d'este praso, querendo o cei-
suario, por meio da restituiçiio da somma prestada.

(Vid. nota ao artigo 1644)

Ar(. 164i9.° Se o rendeiro, oi censairio, deixar de iagar


o interesse por tres anos consecutivos, poderá o credr
exigir o reembolso do capital.

(Vid. nota ao artigo 672.1'

SECÇAO 1

Do censo consignativo de preterito

Art. 16:i0.° Os censos consi iatiuos, existentes na dlata


da pronmilgaço ('eslte codigo. podem ser remidos pelo
censuario, nos lermos seguines:
1.O Se tiverem sido convencionados por tempo certo,
que não exceda a vinte atios, podem ser remidos depois
de findo o praso estipulado;
2.° Se tiverem sido convencionados por mais de vinte
anros, só podem ser remidos no fim d'esle praso;
3.° Se tiverem sido conetcionados sem limiaiço de
tempo. e liccreti derorr'io tnros de vinte asnos, só po
dett ser retmidos depois de findo este praso;
4.° No caso do nqumeto attecedenle, se na data da pra

à
ARTIGO 1651.õ 229

mulgação do codigo já tiverem decorrido vinte ou mais


annos, pade dar-se a remissão quando o censurario quizer.

As palavras do e' 4° do artigo ano cano do numero antecedente.


com razuo se applicam sé ao numero 1., e não a todos os numeros
anteriores, por ser o n 3. o unico que regula a lypothese de
censo sem limitaçdo de tempo, e regerem os na. L. e 2." só hypothe-
ses de tempo determinado.
Eta todo o caso nào fica nunca distractado ipsojure o censo consi-
gnativo, ou tenha sido estipulado com o sem limitação de tempo, e
qualquer que seja o numero de amsos ajustado sem requerimento do
cínsuario, vista a redacçào dos artigos 1648." e 1650»
Tamabem é ophteuse o sr. Seabra applicava o principio da re-
missão csssigando tio artigo 1761.° do projecto primitivo, que se
seguia ao artigo correspoudeste aoartiro 1662. docodigo, oseguinte
preceito: ,Os prazos serão pcrpetuamncte remiveis excepto se for
estipulado que não possam ser remidos por un certo numero de eu-
nos, que não poderá exceder a vinte.,
Foi, porém, desde logo vivamente combatido este artigo especial-
mente pelo distincto lente de direito, Joaquim José Paes da Silva,
com o fundamento de ser um ataque ao direito da propriedade a
remissio forçada e de que a expropriação forçada applicada a esta
especie com egual razão poderia ser ampliada a quaesquer outros
direitos, e até a servidles que ão fossem da mais rigorosa neces-
ridads'.e -
iRespondia o ar. Seabra com a necessidade, reclamada pelo inte-
resse publico, de habilitar o cultivador a bmfeitorisar pela livre
disposição do producto do seu trabalho sem prejuizo do senhorio que
recebia o equivalente dos seus direitos uteis, e com o principio de
lue o direito de propriedade nunca podia ir até o prejuizo dos in-
teresses geraes.
MIs tio impugnada foi a remissão forçada com o fundamento de
representar um ataque ao direito de propriedade, que a commissdo
revisora logo nos trabalhos da primeira revisão eliminou semelhante
preceito.

Art. 1651.° A remissão consistirá na restituição do capital;


sas se não constar qual é a importancia deste, far-se-ha a
remissão na razão de vinte por tíni.

O legislador, sem tomar em conta as variantes no valor da moeda,


quer em si, quer em comparaçâo com outros valores, a fim de fa-
cilitar a remissão do encargo no interesse da liberdade da terra,
estabeleceu a base fixa da restituiçfo do capital para a avaliaçào
dos censos, partindo do principio de que o credor não ficava preju-
dicado com a remissâo recebendo em réis o mesmo capital que havia
dado.
Assim importando em 1:000ó000 réis o capital cedido, faz-se a
remissào entregando-se 1:000ì000 réis, isto é, restituindo-se o ca-
pital, ou a assma prestada, artigos 1648. e 1649.
As palavras restituição do capital indicam que se reatitue só o ca.
fital que se recebeu, como tambem resulta da fonte do artigo, que
os a regra primeira do artigo 1563," do projecto do codigo civil hesa-

-san"
irI~~~
1
ý IA

230 ARTIGO 1652.


1
panhol, onde se estabelecia que os censos podiam remir-se pagapópj
ei capital de la imposicion.
Além d'isso o artigo 727.0 do presente codigo declara satisfeita
a prestação em réis desde que se pague a mesma somma numetria,
ainda que o valor da moeda tenha sido alterado depois do contreto
preceito que, con quanto se refira apenas á alteração do valor ia.
trinseco da moeda, bem pôde ampliar-se por analogia à hypothese da
alteração do valor da moeda com relaçào a outros valores.
Se, porém, não é conhecida a somma do capital recebido multipli-
ca-se a pensão por vinte, e é o producto o capital a entregar: assim
da renda annual de 103000 réis distracta-se o censo com a entrega
de 2004000 réis ao credor.
O capital da remissão é assim o capital representado hoje pelo
censo apesar de diverso do primitivo em virtude da mudança occor-
rida nos valores, e não o capital prestado como alguns pretendem
com o fundamento de que seria uma espoliação e um ataque ao di-
reito de propriedade obrigar o credor a receber cinco pelo que
actualmente lhe vale dez.
Quaesquer, porem, que sejam os inconvenientes na base adoptada
para a remissão, é certo que a redueção dos generos em réis pelo
valor actual não prejudica o credor, que a lei não dá ao comprador
nem ao herdeiro direito á evicção por differença que proveio de causa
posterior, artigos 1051 n.0 3o e 2160.0, e que n'uma palavra a re-
dacção do artigo não admitte outra base.
Para esta liquidação lia de recorrer-se as regras geraes visto
não haver no codigo de processo civil fórmula especial, offere-
tendo-se em secuçao da sentença, que decretar a remissão, arti-
g's de liquidação conforme o artigo V09.0 e seguintes do memna
codigo sobre a base da tarifa camararia quando se tractar de ge-
nuros artigo 910.0 n.Õ 2., e recorrendo-se tambem ao arbitramento
conforme as circumstancias.
i Permittiu o decreto de 30 de setembro de 1892 tanto ao foreiro
como ao senhorio directo a remissão em determinadas condiçïesj
nos emprazamentos de bens particulares, e só de bens particulares
rusticos segundo a jurisprudencia dos tribunaes.
Acabou, porém, com a remissão obrigatoria qualquer que fossea
o valor do fóro e do laudemio o decreto de 10 de janeiro de 1895
cofirniado por lei de 14 de fevereiro de 1896.

Art. 165. 0 Aos censos de preterito é applicavel o que


fica disposto no artigo 1649.°

(Vid. nota ao artigo 672P)


ARTIGO 1653.' 231

CAPITULO X111

DO CONTRACTo DE EMIPRAZAMENTO

SECCAO 1

Dos emprazamentos de futuro

SUB-sECCÃO i

Disposições geraes

Art. 1653.° Dá-se o coutracto de emprazamento, afora-


mento, ou emphyleuse, quando o proprielario de qualquer
predio transfere o seu dominio util para outra pessoa, obri-
gando-se esta a pagar-lhe annualmente certa pensão deter-
minada, a que se chama fmro ou canon.

(Vid. artigo 1673.)


Duas especies de prazos reconhecia o direito velho: prazosperpe-
luos ou fteosias, sujeitos às mesmas regras que os bens livres, salva
a indivisibilidade por glebas sem consentimento do senhorio; e
prazos de radas, destinados a certo numero de pessoas ou de vidas,
ordinariamente tres.
Eram de livre soomeaço os prazos de vidas, quando o emphyteuta
por concessão expressa ou tacita da investidura podia nomear o
suecessor que quizesse, Ord., liv. 4.0, titt. 37.o e 38.', e de nomeação
reatricta, ou de parao e providencia na phrase dos praxistas, quando
a nomeação só em certa qualidade de pessoas podia recabir, e de-
pendia das clausulas insertas na investidura, que a mesma Ord.
mandava guardar.
Ainda se subdividiam os prazos de anomeação restrieta em duas
especies principaes, que eram as mais ordinarias, prazos familiares
puros ou de geração, em que a suceessào só podia recabir em pes-
soas da familia, ou da geração da primeira vida, e prazosfamiliarea
mixtos, em que a nomeaçào era livre na falta de filhos e descen-
dentes do emphyteuta.
Tambem quanto á prova do contracto, e ao tempo do commisso,
os prazos se dividiam em profanos e ecclesiasticos; distineção hoje
sem importancia, porque acabou a pena de commisso, artigo 1671.0,
e porque só pôde ser celebrado por escriptura publica, artigo 1655.',

M. -^ 4 .
232 ARTIGO 1653.

o contracto da emphyteuse, qualquer que seja a qualidade do pa-


etuante, e a natureza dos bens.
Diziam-se eelesiasticos quando era ecelesiastica a cousa empra-
zada, Ord., liv. 4., tit. 12,pr.- Emphyteusis esi ecclesioatica quando
conceditur res ad eclesiao, pertincso-.
Foram sempre considerados bens patrimoniaes do foreiro os prazos
fateosins. Mas os de vidas eram reputados bens de beneficio por
se entender que o prazo vinha do senhorio e não do nomeante, e foi
durante muito tempo jurisprudencia assente que o emphyteuta no
podia onerar estes prazos com encargos, porque har iam de ser de-
volvidos livres ao senhorio findas a= vidas da concessão.
Pouco a pouco, porém, foram os usos e costumes introduzindo em
beneficio do sueccessor ou representante do emphyteuta o direito
de renovação para evitar a devolnçào dos prazos ao senhorio findas
as vidas como era pela primitiva jurisprudencia, direito que depois
de longos trabalhos foi expressamente reconhecido na lei de 9 de
setembro de 1769, sendo por fim corrente entre os praxistas que
o emphyteuta podia onerar com encargos a nomeaçào dos prazos
de vidas.
Inspirando-se nas idêas do tempo, que não admittiam morgados,
e que portanto condemnavam os prazos de vidas que eram considera-
dos uma especie de morgados irregulares, e querendo por outro lado
simplificar a legislaço, acabou o codigo com os prazos de vidas,
reduzindo todos os emprazamentos a fateosins, ou hereditariospros
segundo a phrase do artigo 1696o
Denomina ainda em homenagema á tradiçào de seculos dominio
ulil o dominio do foreiro, e dominio directo o dominio do senhorio,
linguagem extremamente defeituosa, porque ambas as denomiaçes
po4em sem inconveniente applicar-se a qualquer dos dois domiaios.
E o foreiro o verdadeiro senhor do predio. Não é só usufructuario.
Tem direito de dispõr da propriedade como verdadeiro dono, ar-
tigo 1673.' Pôde portanto alterar-lhe a fórma e a substancia, re-
duzindo a vinha a olival, o olival a terras de pão, etc., comtanto
que não deteriore os bens nos termos do artigo 1672.°, e sujeito
apenas ao pagamento de uma pensão ao senhorio em compensação
do aforamento.
Não são sujeitos a contribuição de registo os aforamentos para
cultura de terrenos nas condiç,es dos n?' 9. a 1i do artigo 1.2 do
regulamento de 25 de agosto de 1881 sobre contribuição predial,
nem a primeira transmissio d'esses terrenos feita dentro de dez annos
contados do primeiro em que forem cultivados, regulamento de 23
de dezembro de 1899, artigo 7.' n. 16; como contribuição de registo
se não deve pela arremataçào dos predios do casal para pagamento
dos quimhdes hereditarios nos termos do artigo 718.° § 3. do codigo
de processo civil até onde chegar a importamrcia do quinhão, citado
regulamento de 23 de dezembro de 1899, artigo 3., porque n'este
caso o arrematante leva o predio, não a titulo- de compra, mas a
titulo de suecessào para pagamento do quinhão legitimario.
O laudemio não era computado no preço da compra do domi-
nio util para o efleito da contribuição de registo, por não ter pas-
sado nem para o regulamento de 1 de julho de 1887, nem para o

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de dezembro de


1898, Gazeta da Relaçdo de Lisboa, 12.' anuo, n. 73, pag 585.

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For__..

ARTIGOS 1654. z 1655.0 233

regulamento de 1 de julho de 1895' a disposição do j 8." do artigo


7.' do regulamento de 30 de junho de 1870, que assim o determinava.
Alas é agora computad conforme a lei de 29 de julho de 1899 no
artigo 2. na liquidação da contribuiçco de registo pela transmissão
por titulo oneroso da emphyteuse ou da sub.emphyteuse, quando a
liquidaçào se tizer em presença da declaração do contribuinte.
Todavia o regulamento de 23 de dezembro de 189h, artigo 11.0 § 4.,
onde manda tomar em conta o laudemio para o cffeito do pagamento
da coutribuição de registo é na transmissão dos dominios directos
coustituidos por emprazamento de preterito.

ArI. 1154.° 0 contracto de emphytetse é perpetuo. Os


contractos, que forem celebrados com o nome e fórma de
etuphleuse, mas estipulados por tempo limitado, serão
tidos corto arrendamentos, e como taes, regulados pela
legislação respectiva.
(Vid. nota ao artigo 1595.)

Art. 1655.1 0 contracto de emprazamento será celebrado


por escriptura publica, e só produzirá elfeito, em relaçso
a terceiro, sendo devidamente registado.
(Vid. artigo 1690.°)
Primitivamente só nos aforamentos de bens ecelesiasticos era
necessaria, e até substancial do contracto, a escriptura publica Ord.,
liv. 4, tit. 19., pr,.; e tão substancial, que a citada Ordenaçào pro-
hibia, liv. 2.0, tit. 20.0 aos escrivàes de altas dignidades e corpora-
ções ecelesiasticas lavrar as escripturas de prazos dos bens da
egreja.,
Nem o titulo de reconhecimento, nem mesmo os tombos das cor-
por:tçJes exinetas, conservados em qualquer estação publica, e
compilados em virtude de provisão regia e na férma por cila deter-
minada, que o artigo 2421.° 2.1 declara documentos authenticos
officiacs, podiam primitivamente supprir a falta de escriptura pu-
blica na constituiçào da emphyteuse ecelesiastica.
Porém, desde que a lei de 22 de junho de 1866 reconheceu a va-
lidade dos aforamnentos de bens da egreja com data anterior á pu-
blicação da mesma lei, embora não houvessem sido celebrados por
escriptura publica, uma vez que tivessem sido processados no juizo
ecelesiastico em fórma contenciosa nos termos das constituições
diocesanas, já se tem julgado que a certidào de emprazamento
extrabida lo livro do tombo civil regularmente processado é prova
tão plena da emptyteuse dos conventos como a exigida pela mesma
lei 2, e até que os emprazamentos eeclesiasticos de preterito podem
se provados por todos os meios legaes ordinarios sem necessidade

Ilespacho da Direcção Geral das Contribuiçbes Directas de 26


de janeiro de 1899, Direito, 31.' anno, n.° 10, pag. 156.
2 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de fevereiro
de 1878, Diario do Governo, n. 193, de 28 agosto de 1879,
w

234 ARTIGO 1656.'

de escriptura publica, visto serem equiparadas essas corporaçoes


em varios artigos do codigo para os efeitos juridicos aos particu-
lares. 1
Por isso desde que os tombos processados no juizo ecelesiastico
substituem a escriptura publica para prova dos aforamentos ecle-
siasticos, devem por maioria de razão substituil-a os tombos proces-
sados no juizo civil, pois que pela velha jurisprudencia sempre
foram considerados prova plena a favor dos senhorios os tombos
regularmente feitos com citaçào dos foreiros, e julgados por sen-
tença; e modernamente o § 7." do artigo . das instrucções regu-
laisentares de 26 de julho de 1666 e das instrucçres de 25 de
novembro de 1869, á falta dos titolos especificados para a remissão,
admittia outros titulos, como certides de tombos.
Finalmente se a posse de quarenta annos constitue pela prescri-
pçdo titulo de aforamento ecelesiastico, não la razão para o no
constituir o tombo processado no juizo civil.
O certo é que antes da promulgaçâo do codigo, salvo o caso de
precripçâo, só os tombos, quer do juizo ecelesiastico, quer do juizo
civil, podem supprir a falta de escriptura para prova dos empraza-
mentos de bens da egreja.
Depois da promulgação do codigo, porém, podem ser processados
por todos os meios legaes ordinarios cosforme o artigo 1690.° os
emprazamentos de bens ecelesiasticos, porque estão comprebendidos
nos 1ens partirlares a que se refere o artigo 1&S9.
Os aforamentos de beis profanos, anteriores á promulgaçào do
codigo, podiam ser provados por titulo particular, por testemuahas,
ou por qualquer outro meio ordinario z, com quanto na practica fos-
sem celebra los os contractos de aforamento por escriptura publica
mesmo quando a emphyteuse tinha por objecto bens profanos.
t. O codigo legalisou esta practica, não reconhecendo contractos de
t aforamento senão feitos por escriptura publica.
Tambem depois da lei de 3U de junho de 1860 é preciso para
é inteira validade de aforamento o pagamento da contribuição de re-
gisto, que é calculada em conformidade do artigo 11.1 á 4." do regu-
lamento de 23 de dezembro de 1899.

Art. 1656.° A qualidade e quantidade do fôro será re-


gtlada a aprazimento das partes, com tanto que seja certa
e determinada.

Introduziu tambem o codigo a novidade da pensão certa e determi-


nada artigo 1656.", acabando assim com as pensões do terço, do
quarto e do quinto dos fructos, etc., usadas nos antigos aforamíe-
tos. que levantaram uo sem numero de questnes, em que se profe-
riram decisões encontradas, julgando-se, ora que estas pensões eram
verdadeiros tributos, e por consequencia extinctas nos termos do

1 Accordão da Relação de Lisboa de 19 de janeiro de 1889, Ga-


sea da Relação de Lisboa, 3. anno, n. 82, pag. 692.
2 Accordão da Relação do Porto de 14 de fevereiro do 1871, Re-
vista de Legislaçào e de Jurispradencia,de Coimbra, 4." anno, n.° 1681
pag. 185.
115

ARTIGO 1657.' 235

decreto de 13 de agosto de 1832 e da lei de 22 de junho de 1846,


ora que estas penstes representasam um interesse tão justo e tão
legitimo, comi as pensòes sabidas e certas.
Não podem pois estipular-se nos emprazamentos de futuro pre-
staçi cs incertas,porque a pensão, ou em genros ou em dinheiro, lia de
ser sempre certa e determinada; o as incertas que ainda boje vi-
goram podem ser reduzidas a certas. artigo 1692.^ por justo arbitrio
de lourados, no vindo as partes a accordo amigavel
Nem em alternativa é hoje licito, como era por direito anterior,
estipular pensões r. g., quatro alqueires de trigo ou 2b000 réis
em dinheiro.
Por isso, e por ser obrigado a cumprir a sentença nos seus preci-
sos teImos, não pode o foreiro condemnado a pagar em genero com
tracto sucessivo substituir o pagamento em genero pelo deposito em
dinheiro nas obrigações que se forem vencendo no decurso da exe-
cução.t

Art. 1657.0 Não poderá convencionar-se encargo algum


extaordinario ou casual, a titulo de lucluosa, laudemio ou
qualquer outro.

(Vid. artigos 1693. e 1705.)


Permittiu o codigo aos interessados estipular como lhes aprou-
vesse encargos ordinariospor mais fortes que fossem.
Mas probibiu absolutamente a estipulação de todos os encargos
extraordiiarios ou casuacs, a que eram sujeitos os foreiros nas au-
tigas escripturas dos emprazamentos á sombra do velho direito
feudal, com quanto especiticasse a luctuosa e o laudemio por serem
os mais usados.
A luctuosa, assim chamada por ser feito o pagamento na occasião
do lielo e pranto, e assim o mais repugnante de todos os encargos,
que era a melhor cousa do foreiro que o successor devia entre-
gar ao senhorio á morte de cada enphyteuta, ficou logo prohibida
de futuro com a promlgação do codigo civil. 2
Idas continuava ainda em vigor nos cssprazamentos de preterito,
visto o artigo 2096 , comparado com o artigo correspondente (2269.-)
do projecto2 primitivo, que era redigido assim: -O valor do dominio
directo ser calculado ao importe de vinte pensões annuaes; e, se
além das pensões anaaaes, comprehender alguma prestação eventual,
como laudemio, ou luctuosa, accrescerá o importe de una d'essas
prestações.»
E, nas escripturas de reconhecimento das antigas empbyteuses po-
diam ser conservadas as clausulas da luctuosa visto serem man-
tidos os emprazamentos de preterito na frma dos respectivos titulos,
artigo 1689., apenas com as modificações estabelecidas nos art-
gos 1690.' e seguintes, e serem pelo artigo 1694.' applicaveis aos

1 Accordâo do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de julho de


1898, Gazela da Rela o de Lisboa, 12.' anno, n 15, pag. 118.
7 Accordâo da Relaçâo do Porto de 20 de julho de 1875, Direito,
9: anuo, n.' 9, pag. 140.
3 Aceordão da Relaçâo do Porto de 12 de novembro de 1872, Re-
viata de Legislação e de Juriarudencia,de Coimbra, a. 270, pag. 157,

5-'--
* rrww~
1

23(; ARTIGO 1657.

emprazamentos de preterito as disposiçbes dos artigos 1661.', 1662.0


e 16(3?, e não a do artigo 1657.0
hoje, porem, não só não pide estipular-se de faturo a lucteosa, mas
não póde mesmo exigir-se lns emprazamentos de preterito, visto o
artigo 3 do decreto de 10 de janeiro de 1895, confirmado por lei
de 14 de fevereiro de 1896, que ííão permitte estipular, nem exigir,
ainda mesmo em virtude de emprazamentos de preterito, outras pre-
staç$es além do foro e laudemio.
Tambem com a promulgação do codigo civil acabaram as entradas,
isto é., o dinheiro que o foreiro, a fóra a pensão e mais encargos per-
manentes a que se obrigava, dava ao senhorio no seto do empraza.
mento, e que este recebia a titulo de lucas, como então se dizia,
como a entrega de 500,ì000 réis no acto da assignatura do titulo de
aforamento, ainda reconhecidas no § 7.' do artigo 7.o da lei de 30
de junho de 1861>, que dizia assim: «Quando a transmissão se ef-
feetuar por meio de constituição de emphyteuse, a contribuição será
calculada sobre o valor do dominio directo acerescentado com a e-
trada, se a houver". 1
Semelhante contracto era verdadeiramente um minto de emphy-
teuse e de compra e venda.
Foi depois restaurado o direito de estipular entradas pelo regula-
mento de 1 dejulho de 1895, artigo 11.', § 3.
Mas o regulamento de 23 de dezembro de 1899 não reproduziu
semelhante disposição.
O laudemio era s, devido pela venda dos predios foreiros, e não
pela enda do dominio directo nem pela veada das peesões emphy-
teuti-as, por não haver n'este caso2
alienação de dominio util nem
mudança no suecessor do prazo.
Era inteiramente livre ãs partes estipular o landemio na percen-
tagem que bem quizessem, e tanto que havia laudemios, especial-
mente em favor de corporações religiosas, de 5 e até de 20, 25 e
30 por cento.
Mas na falta de estipulação era de quarentena ou de quadrigeima
ou 2 /2 por cento, porque era 1 por 40 do preço do prazo nas vendas
voluntarias e nas judiciaes, Ord., liv. 4', tit. 38. pr., e provisão
de 30 de junho de 1776, nas expropriaçies para obras publicas,
alvará de 13 de -'tembro de 1778, e nas trocas ou permutas, alvará
de 20 de agosto de 1779, 1.°
Em regra a imíportoícia do laudemio estava na razão inversa da
pensão foreira.
Nos emprazamentos onde era mais elevado o laudemio era mais
pequena a pensão foreira, e vice-versa.
Computa-se o laudemio sobre o valor total da propriedade com
desconto apenas do capital do foro, Ord., liv. 4', tit. 38.', e com in-
clusão das beufeitorias extraordinarias feitas pelo foreiro, que os
tribunaes téem algumas vezes mandado excluir do calculo do laude-
mio, e que mal podem ser excluidas, apesar do odioso da doutrina,
desde que a lei mandar pagar o laudemio do preço da venda sem
distineção entre o casco do predio e os melhoramentos feitos.

1 Oleeio da Direcçâo geral das contribuiçiues directas de 8 de abril


de 1869, Direito, 1.' anno, n.' 18, pag. 288.
t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de maio de 1892,
Boletim doe Tribunaes, 6. anno, n. 249, pag. 487,
ARTIGO 1657.- 237
Nos bnus particulares ha de ser pago o ludemin em conformi-
dade do titulo primitiv da investidura; nos foros da cora ou fa-
enda estabeleecilos por titulos especiaes é de qíuaeL-ta quaesquer
q ue sejam as condições da investidura, artigos 6:, 7. e 12° da lei
te 22 de junho de 1$46, e nos bens vendidis pelas leis de destnor-
tisaçlo seri o laudtmio reduzido na proporção do abatimento com
que se abrir a praça em que for arrematado o demini directo até
chgar d quarnt ta, lei de 28 de agosto de 1N69, artigo 13.-
E brigatori, o pagamento do laudemio, não s assignatura do
titulo da pressa de veoda, mas simples e unicamente na oceasião
da veda definitiva, porque s5 autào cst csusa moada a transmissão.
Antes da pronulgação do codigo civil julgava-se, cao fundameunto
nas Ortl. liv. 1:, tit. 62, § 48, e liv. 4 , lit. 3,., que era ao veade-
dor não i ao iemprador qu, ineuíibi o pagament' do laudemio
loje, poréni, é ao cmuprador que incumbe o pagamento, visto o
artigo 1i93. utico, comu qonita em definitivo seja o vendedor quem
haja di- síuportil-o, visto que o comprador lia de metter no seu
calculo .i ltendemi como elemento do custo.
O sell, no recibo d laudemio é na razão de 5 q,, e pago no
propri, titulo datransmissão do dmoini util pelo adqirirente que o
descontar ta importancia do laudmeio a pagar.
Cosm hoje o laudemio é rendimento do domiínio directo, e não com-
peusação pela dsistencia do direito de opção, e tanto que têem
di al taudemio, as pessoas moraes, qae aliás não podem pre-
-itu
ferir e que posset como usufruchriis e não como donos i, quando
está dividido o usufieto e a propriedade do preoe pertence o onu-
demio no usufrtetia-io e no to proprietario, apesar de derivar de
ltdaíndo, sue significa a approvaç3o do novo successoi do prazo, a
qual só p -r dada pelo proprietario, porque sb o ptrprietario
e não i isnfructuario pide usar do direito de preferencia.
Com raz'retinguiu o codigo o encargo do laudemio, que ditli-
eultava a transmissão da propriedade, porque obrigava o vendedor
a repartir co o senhorio o preço, que, apesar de pago pelo adqui-
rinte. r-sahia a fili sobre o vendedor, porque era tomadoe cm conta
na fixaçã do valor do predio, e que era sobretudo odioso nas vendas
judiciaes, e nas expropriaçdes forçadas, em que a propriedade não
era alienada pir iniciativa do vendedor-, e que para maior grtaie
era computado sobre o valor total da venda, sem exceptir as
bemfuitmias, por mais extraordinarias que fossem.
0 or. dr. Paes ainda sustentaa a cnservaçae di laudemio, redu-
zido t quaretena, nas vendas e tas trocas ios prazos.
Respolia lhe porém o sr. Seabra:
-No admittitos t laudmio nos emprazamentos de futuro, poríe-
entendido ua froa ordiuia é uma prc-stti3 iniqua na parte als
qlei comprehend as temfiitirias, e limitado ao valor do predio é
arbitrri, imsí ratz-,l da sua ri entítlidad ; as partes podem c devem
equilibrar meliot os seus interesses no regulamento das prestaçes
certas. A tixaçào da quarettena póde ser admittida como regra de
decidir quando o laudemio não é setriitdo na investidura em

Aecordis, do Supreím Tribunal de Justiça de 28 de novembro


1
de e de 23 de fevereiro de 187, (ttrea di Assesoci-ço dos
1837,
Adradoede fLib-, 1.' annt, pag 143, e 2.' asno, pag. 393.
2 Arcordlo do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de jiuho da
1887, Bolelim dos Tibunaeu, 2.' atno, n.' 82, pag. 326,

ÊLIL--
238 ARTIGOS 16589 e 1659.

quanto ao preterito, mas a lei não pôde nem deve admittir o laude-
mio de futuro, porque não parte de nenhuma razão autlTiciento».
Assim nos emprazamentos celebrados depois da promulgação do
codigo é calculado sem laudemio o valor do dominio directo.
Não vinha no projecto primitivo nem appareceu no primeiro pro-
jecto da commissão revisora, e só foi introduzido no projecto de
1861 em virtude da resolução indicada em a nota ao artigo 1735.^
do projecto de 1863, o artigo 1693. que conservou o laudemio esti-
pulado nos emprazamentos de preterito na fórma da estipulação.
Com quanto alguns sustentem, com fundamento nas palavras da
Ord.. liv. 4., tit. 38.--ou o conteúdo no seu contracto-que o
laudemio era elemento eventual da emphiytense. e não da essencia
do contracto, visto carecer de ser estipulado, é certo que no velho
direito foi sempre considerado o laudemio, não coseo encargo even-
tual mas como elemento essencial ou natural do contracto empb'-
tetico, que devia presumir-se ainda não estipulado.
l'orém, qualquer que fosse a onterpretação dada às Ordenaçães do
reino, ou por cilas fosse considerado elemento naural ou essencisl
da venda dos bens emprazados, é certo que hoje não se deve laude-
mio nos emprazamentos de i reterito. se não foi estipulado, porque
t
o ortigo 1G89 s manteve
o os emprazamentos de eos parHilarecs,
anteriores ao codigo na lúrcmi dos respelivos ti/ííos, e com as mo-
dificaçJcs estabelecidas na prese/le secçúo, urna das quaes é não
reconhecer a existencia do laudemio, que não tenha sido esipnlado
artigos 169:3. e 1705. e isto com referencia ao passado, porque para
o futuro acabou com elle de todo.
E:- Tmsbem os tribunaes, com o fundamento de serem mnutidos os
emprazamentos de bens particulares de preterito na frinou s/s res-
pectiro tiolos,. estão julgandoi que não é devido laudemio nos
afi ramuntos sem titulo, comao são os aforamentos baseados na pre-
scriprão, por ter sido conservado, artigo 1693.', nos emprazamen-
tís de pretcrito apenas quando es/ilulro.
Nem outra jurisprudencia admittem os artigos 1693.? e 1705.

Ai . 16:;8.° Se o emprazamento fér de predio urbano,


ou de cçlio para edificar, o fôro será sempre a dinheiro.
(Vid. nota ao artigo 15959)

Ari. 1G59 ° 0 predio dado de emprazamnloo será de-


ntínrjad, desriipli e citwrontado, de modo que os seus
limiles não possa confundir-se com os limites dos predios
circtmnvizinhos.
O preceito do presente artigo foi estabelecido para garantir sempre
a identidade do predio sujeito ao fero.

t Aicordãos. da Relação de Lisboa de 5 de novembro de 1898


e do ipriieso Tribunal de . ustiça de 22 de dezembro de 11!9, Ga-
te/st /5 ,rlo:o
de Liseoa. 129 ano, o-" 56, pag. 287, e 13.° anno,
n.° 60, pag 495.

-A
ARTIGOS 1660., 1661.» e 166:2. 239

0 projecto pritnitivo no artigo correspondente (1757^) dizia


assim: ,0 predio dado de emprazoaento será denominado, medido,
descripto e confronitado, de modo que os secs limites não possam
confundir-se com os limites dos predios rircumviziuos, e avaliado
com ddueção do importe do dominio directo.
.ý unico. A vedoria e avaliação deve ser feita por louvados nomea-
dos a aprazimento dos estipulantes, e inserta na investidura ou
escriptira.do contracto».

0
Art. I660. fôro será pago ao tempo e no logar con-
vencionados.
Art. <liI.° Não havendo dealaração sobre o logar, ou,
sobre o tetipo do pagtmentlo do ftro, observar-se-ha o se-
gut[)tuI:
1 O fro seri pago em casa do senhorio, morando
este ta parociia da siluçãco do predio.
F ±. Se o senhorio não residir ua parociiia, on ahi tão
iver íroí-rador, será o feiro pag ett casa do eíphyteuta.
5 I.o Consistindo u (cro ett fr-los, será pago tio im
da -espeelica colheita, e, cotsistindo em dinheiro, tio lm
do anno, cotado desde a data do contracto.

(Vdi. nota ao artigo 71'39.°)


A p rcIhia a que si refere o 1 do c artisi 1 1" . a fregezia cc-
eclesi:c-tica, porqi a ancxccci de frguczias -c tem is clrlitss ioli-
nistralc,,, mar-dos na lei.
Aciaodo-se cstipulao na investidura o pagamento em determi-
nado celleiio, se esse Cellciro já nco existir como acontece com os
enceirosoe antigas corporaçces de cào morta que foram vendidos,
pide o foreiro p gar co mesmo logar, p o rque a transmissã do do-
micin directo nãoo lhe alterou as obrigçies. IIas la de avisar o
senhorio muida i-as
lu clausulas do ciirainitc se no cocte seme-
lhate aciso p ara est p oder receber por si o u por seu proclrador.

Arlt 1662.° Os prazos são hereditarios, ctmo os tens


allodiaes; nto podem, porém, iidir-se por glebas, exceplto
se n'isso convier o senhorio.
I.° A repartição do valor entre os herdeiros far-se-ha
por estimação. enracecando-sc o prazo em um relles cal-
forte convierem intre si.
?.° Se não podrem acctrdar-sc, ser o prazo Iititado.
j 3.0 Se netlítuí dos herdeiros quizer o prazo, será este
vendid, e repartir-se-ha o preço.
?° Se o senhorio consentir tia divisão por glebas, cada
gleba ficará conti;tildo t prazo diverso, e o senhorio
sia poderá exigir o fcro respectivo de cada um dos oreiros,
conforme a destrinça qpíe se fizer.
5.o A divisão e a destrinça não terão validade, não

È :,
240 ARTIGO 1662.'

sendo feiras por acto authentico, que inclua o consentimento


escripto do senhorio.
6.° N'este caso poderá o fro, que tocar a cada her-
deiro, ser augmentado com a (Iuota, que o senhorio deva
receber pelo incommodo da cobrança dividida.
lVid. artigo 1696.)
Declarou o codigo livres e allodiaes os prazos de vidas nos termos
dos artigos 1698. e 1699", para serem repartidos como os fatersins
entre todos os herdeiros, e nào passarem precipuos a algum d'lles.
Mas deixa-os sujeitos a principio da indivisibilidade j irecoihe-
cida na lei velha,Ord, liv. 4rt , titt. ^i e 37, de modo que hoje
os bens emphytuticos como os eoitieos artigo 1;47 só se distin-
guem dos bens propri msntios híreditariis im não poderem ser di-
vidi,'os sem consntimnto do senhorio senão por estimaçào.
Com fundamento de que o artigo 714. do codigo de processo civil
exige a conferencia dos interessados para o encabeçamento dos
prazos antes da licitaço, porque no póde haver licitaçào sem se
verificar primeiro a impossibilidade de accordo entre os herdeiros
conforme o 2. do presente artigo, sem tornar dependente a confe-
rencia ie exeder nu mão o valor do prazo o quinhão hereditario de
qualquer dos interessados, está a jurisprudencia presere*ende
como indispensavel ainda a cesrstencia dos interessados para o
encabeçamento doa pr zos, easo caitiati por inteiro nos lotes respe-
rtivos, que não offendia o direito de indivisibilidade garantido ao
senhorio apesar do disposto
1
no artigo 2148" do presente codigo.
Com q[inito a pro rbiçto da divisão por glebias no seia ircom-
pativei com a licitaço do prazo em commnm por varios interessa-
dos tambem se tem julgado 3 que o prazo ita de ser encabeçado
n11m dos co-herdeiros, e io póde ser conservado em commnm entre
elles, porque o artigo 2185° do presente codigo e o artigo 716."
6 2^ do codigo de processo civil se referem, não a prazos. mas a
bens livremente divisiveis.
-Apesar de só 0os /erdiros se referir o artigo, no póde negar-se
o direito de encahoçament e de licitaçào ao cojiuge meeiro, que é
tambem interessado e tar, interessado na sucecssão indivisa que só
por si tem direito -gual ao de todos os outros reunidos: nem hoje
pôde haver duvida a tal respeito desde que o artigo 714." do codigo
de processo civil chama i conferencia para o encabecamento dos
prazos, nño os herdeiros, mas os ietressados.
No encabeçamento no influe o ter provindo o prazo do conjge
sobrevivr ou do pr-defritr, porque ou tenha proviirto de um ou de
outro, se o casamento fri segnd o eostsme do reino, tornr-se com-
mm, e é considerado como quaesquer outros ens allodiaes.

t Acordes da RPlação de Lisboa de 11; de agosto de 1883,


de 18 de tgoste de 1894, Direito. 15. asno, n 22, pag- 3.52, e Ga-
:/o da ielaçã de Lirbra, 8." anno, n. 13, pag. 182.
X
Ae-rdão da Relação do Porto de 12 de maio de 1896, Ievis/a
dos Trib--ec, 15y mo, n. .37, pag. G.
3 Accrdão, d Sprrmo Tribuual de Justiça, de 10 de julho de
1O91; e de 5 de novembro de 197, Gaze/a da r otào de Lxboa, 10,
puno, n d5, pag. 277, e 11. anuo, n 37, pag. 292,

_Z
rr",_

ARTIGO 1662. 241

Tambem quando houver interesses oppostos entre o pae e o filho


menor se deverá nomear tutor especial nos encabeçamentos como 1
se nomeia nas licitações, vistos os artigos 16.° e 153. do codigo civil.
Hoje pelo decreto de 10 de janeiro de 1895, confirmado por lei
de 14 de fevereiro de 1896, não é permittido ao proprio senhorio ou
censuista dividir os predios emphyteuticos ou censiticos senão
quando os prazos ou censos separados constituirem unidade culti-
vavel não inferior a vinte hectares, ou quando da divisão, se o pre-
dio é urbano, não resultar detrimento ao predio conjuncto; e poucos
serão os predios rusticos com a superficie minima de 40 hectares, e
rar9s os predios urbanos susceptiveis de divisão sem detrimento.
As mesmas condições sujeitou o referido decreto a divisão dos
predios onerados com censo, quer reservativo, quer consignativo.
Feito o accordo para a divisão fica cada gleba constituindo um
prazo diverso e especial, e o senhorio recebendo o respectivo fõro de
cada possuidor sem necessidade de cabecel.
Antes da lei nova era frequente no paiz a cobrança do fôro por
um si dos foreiros chamado cabeça, cabecel, ou cabeceiro, que era o
unico responsavel para com o senhorio.
Esta cobrança representava um encargo pesadissimo, não só pelo
grande trabalho pessoal a que obrigava, mas pelas grandes des-
pezas a que sujeitava o onerado que se via muitas vezes na dura
collisão de sustentar dispendiosos pleitos para baver insignificantes
quantias, ou de renunciar á cobrança e pagal-as do seu bolso.
Ainda assim tinha sido mantido o serviço de cabecel pela lei de
5 de abril de 1821, que o havia exceptuado da abolição geral dos di-
reitos banaes. Só no anno imnsediato foi extinceto pela lei de 9 de
junho de 1822, artigo 17.p
Restaurava-o, porém, o alvará de 5 de junho de 1824 § 5.n, cas-
sando todas as providencias respectivas a foraes, e mantendo a sup-
pressão apenas dos direitos chamados banaes, nos quaes se não
comprehendia o serviço dos cabeceis, que era serviço pessoal, e
expressamente exceptuado da abolição pela citada lei de 5 de abril
de 1821, que sómente considerava direitos banaes os direitos de
fornos, marinhas, lagares exclusivos, e os privilegies de boticas e
estalagens.
Continuára portanto a subsistir o encargo de cabecel ácerca do
qual nenhuma providencia tomára o decreto de 13 de agosto de
1832, que só revogou artigo 5.' as doações de direitos reaes que
estavam definidos na Ord., liv. 2.', tit. 29.-, e que não compreben-
diam taes serviços.
Acabou, porém, com os cabeveis, que não têem a natureza de
pensões, e que a lei de 20 de março de 1821 declarava serviços
pessoaes.
A lei de 22 de junho de 1846, que extinguiu os serviços pessoaes,
e todos os encargos que não tivessem a natureza de pensões emphy-
teuticas ou censiticas, sub-emphyteuticas ou sub-censiticas, mesmo
nas pensões e obrigações impostas em bens patrimoniaes por titulo
generico, si em bens da corôa depois alienados por titulo oneroso,
e que no artigo 7.' 4 3. sob a epigraphe : ,Em planto aosfóros,censos,
ou p-e-es da cora ou fazenda estabelecidos por titulos especiaes»,

' Accordão da Relação do Porto de 15 de novembro de 1898,


Revista dos Tribunaes, 17.° anne, n.o 396, pag. 188.
Too III 16

JUI- .
242 ARTIGO 1662.'

disse: «O direito dominical da luctuosa fica extincto n'estes con-


tractos, bem como o de córte de madeiras ou de pastagens reser-
vadas pelos directos senhorios, e todos os seriços pessoaes
Apesar de extincto pela lei de 22 de junho de 1846 o encargo de
cabecel imposto por titulo generico sobre bens patrimoniaes, ou
sobre bens da corôa mesmo que tivesse sido determinado por titulo
especial, muitos o julgavam subsistente nos fTros estabelecidos em
titulo especial sobre bens patrimoniaes, e como subsistente foi re-
conhecido na lei de 22 de fevereiro de 1861 artigo 2., na de 22 de
junho de 1866 artigo 1, § 5.o, nas instrucções de 28 de julho do
mesmo anno artigo 9.°, e no decreto de 25 de dezembro de 1869
para execução da lei de 28 de agosto do mesmo ano que no ar-
tigo 9.o dizia assim: -Quando os foreiros tivrem cabecel, cada um
dos co-emphyteutas poderá remir a quota de firo que lhe pcrtence>.
Só quando estes não quizerem usar do seu direito, poderá o cabect
requerer a remissão de todas as quotas do fóro ou d'aquella que
qualquer co-emphyteuta não quizer remir..
loje mesmo ainda se está julgando t que o e cargo de cabecel
não foi extincto com relação ao passado, porque é um direito pessoal,
e não um direito barwl, porque o artigo 1689^ mantem os empraza-
mentos de bens particulares de preterito na fórma dos respectivos
tItulos com as modificações estabelecidas n'aquella suc-secção, e
I porque o artigo 1694. na referencia ao artigo 1662." só pide abran-
ger as divisões feitas depois da promulgação do codigo, e não a
divisões realisadas sob o dominio da lei velha.
E certo, porém, que o serviço dos cabeças não só no póde esti-
pular-se de futuro, mas que acabou tambem de preterito por força
do disposto no artigo 16942
O artigo 1694.' applicando o artigo 1662. aos emprazamentos de
preterito, quiz evidentemente sujeitar aos seus preceitos as divisões
de prazos feitas com o consentimento do senhorio antes da proal-
gação do codigo como já se julgou 2; e o artigo 1689. mantendo os
emprazamentos de bens particulares, anteriores á promulgação do
codigo, só-com os codiicaçes estabelecidasna presente s¯eçóo ,
extinguiu o encargo pessoal de cabecel, ous odioso, e incompativel
com os principios da legislação vigente.
Além do que o codigo de processo civil, regulando nos artigos 559.'
a 563.° a destrinça dos fóros e censos, nco faz a mais leve refe-
rencia 4 eleição e ao serviço de cabecel nos prazos quer de presente
quer de preterito.
Hoje pois bem podem recusar-se os cabeceis ao desempenho do
encargo sem d'ahi lhes advir responsabilidade.

1 Accordãos, da Relação do Porto de 28 de julho de 1871, 19 de


abril, de 12 de novembro de 1872, de 23 de agosto de 1881, de 15 de
novembro de 1892, e de 10 de julho de 1891, Direito, 3. anno, n 43,
pag. 587, Revista de Legislaçóo e de Jerisp-udencia, de Coimbra,
6.' anno, n.' 270, pag. 157, e 21- auo. no 1065, pag. 39, e Re-ista
dos Tribscses, 12. ano, n. 287, pag. 359 e 13. ano, n. 299, pag.
169.
r Accordãos, do Supremo Tribunal de Justiça, de 15 de maio de
1874, e de 10 de abril de 1891, Gaze/a da Associação dos Idoogados
de Lisboa, 10.° anuo, pag. 592, e Boletim dos Tribunaes, 7? asno,
n.' 280', pag. 274.

'e
rp
ARTIGO 1662." 243

Bem podem as pessoas moraes, artigo 1679y consentir na divisão


dos prazos, porque essa auctorisaçào se comprehende nos poderes
de administraço.
Importa divisão em glebas, e justifica por isso o augmento do
fôro pela cobrança dividida, a auctorisação para a venda de parte
do prazo, continuando foreira tanto a parte vendida, como a não ven-
dida.
Deve-se contribuição de registo pelo augmento do fôro com a co-
brança dividida sobre a base do augmento multiplicado por vinte,
regulamento de 23 de dezembro de 1899.
Ainda que o artigo se refere unicamente á divisão dos prazoq em
acto de partilha, deve ampliar-se a disposicão por analogia a todos
os casos de divisão em glebas, como qualquer desmembração de va-.
lores pertencentes á emphyteuse, verii gratia a alienação de aguas,
qualquer que seja a razão ou o titulo.
Ilypothecas, servides e onus é que o foreiro pôde impôr os que
quizer sem consentimento do senhorio com tanto que não vã além do
valor do predio correspondente ao fôro e mais um quinto artigo 1676.0
Na divisão dos prazos antes da promulgação do codigo podem
ficar a cargo do foreiro as contribuiçôes pelo fôro em vista da lei
de 3 de abril de 1773, por não se tractar de emprazamento novo, e,
sim da divisão do antigo.
Se o senhorio directo e os interessados no dominio util se não
acordarem sobre a divisão do foro quando for dividido o prazo em
glebas, e se não cíntestar a natureza do prazo, nem a identidade
dos senhorios e emphyteutas, nem a divisão em glebas, pôde qual-
quer delles requerer a destrinça, observando-se o processo dos ar-
tigos 559 a 562.- do respectivo codigo. r
As mesms disposiçôes são applicaveis aos censos no caso de ser
dividido tambem o predio em glebas, citado codigo de processo civil
artigo 563
A divisão do prazo ou do censo em glebas pelos herdeiros do em-
phyteuta ou do censuario, com consentimento do senhorio ou do cen-
suistí, pôde ser feita n'm só acto auheutico sem necessidade de
tantos titulos quamtos são os novos possuidores, e é até mais natural
ficarem consignados n'um titulo só os novos emprazamentos ou cen-
sos, visto ser indivisivel a prestação do consentiiaento á divisão.
O acto autheutico para prova do consentimento do senhorio só é
indispensavel na divisão ou destrinça feita depois da promulgação
do codigo. O cnsentimento na divisão anteriormente feita pôde ser
provado por todos os meios ordinrios.
Não providenciom o codigo para a hypotheoe, aliás muito frequente,
da divisão do predio em glebas sei consentimento do senhorio ou
do censuista. Muito insistiu oi dr. Pans em se permittir ao senho-
rio, no caso de divisão pelos emphyteutas sem sua approvação, pe-
dir o fôro por imteiro a cada um dos consortes, ou requerer a eleição
de dois em dois anos de cabecel, que pagasse o fôro por inteiro, co-
brando dos outros as respectivas partes, a fim de não serem prejudi-
cados os senhorios por actos praeticados sem o seu consentimento,
assim como propoz que se estendesse aos censos egual disposição.
A estas observaçbes, poram, respondia o sr. Seabra: O additamento

1 Accordão da Relação de Lisboa de 3 de abril de 1895, Revista


de Legislação e de Jurisprudemeia, de Coimbra, 30. anno, n" 1366,
pag. 221.
1,

244 ARTIGO 1662.*

é necessario, mas não nos parece admissivel a alternativa do cabecel,


que traz comsigo graves inconvenientes, e mais justo e regular seria
a pena de commisso porque ha quebra e contracto. Poder-se-ba ar-
crescentar ao artigo o seguinte:
«Se o prazo for dividido por glebas sem consentimento do senhorio
poderá este rehael-o por commisso°.
Todas estas lembranças porém ficaram esquecidas. A commissào
revisora, examinando em sessão de 26 de abril de 1862 o respectivo
artigo (176.°) do projecto primitivo, approvou-o sem modificação,
estando aliás presente o sr. Seabra, que tinha reconhecido a neces-
sidade de um additamento.
Nem ao senhorio devia ser permittido, ainda no caso de divisão
do prazo em glebas sem o seu consentimento, ou a divisão tivesse
logar antes ou depois da promulgação do codigo, recorrer á pena de
commisso, que foi de todo proscripta, e que por circunstancia ne-
nhuma devia ser restaurada.
Differentes alvitres, porém, têem sido lembrados para salvar os
direitos do senhorio ou do censuista np caso de divisão do predio
sem o seu consentimento: ou demandar os possuidores das glehas
para elegerem cabecel que cobre de todos a sua direita parte e en-
tregue ao senhorio o fôro por inteiro, ou demandar qualquer dos com-
possuidores do prazo pela totalidade do firo, não pelo principio do
cabecel, mas pelo principio da solidariedade resultante da indivisi-
bilidade do prazo, ou registar hypõtheca no prazo todo pela divida
dos fóros em conformidade do disposto no artigo 907. do codigo e
requerer depois a expropriação do prazo, ou demandar cada uni dos
possuidores das glebas que compunham o prazo para reconhecer o
senhorio, e ficar cada gleba a constituir prazo especial com o au-
gmento de firo por analogia do disposto no 6.° do artigo.
O mais regular, porém, se o senhorio os censuista não quizer ra-
tificar a divisão feita sem a sua approvaçào é chamar á demanda
todos os com-possuidores do predio para serem declaradas sem effeito
as divisões realizadas sem a sua approvação, e para ser encabeçado
o prazo n'um só dos com possuidores ou vendido nos termos do ar-
tigo 1662.-, como se fôr vendida qualquer parcella do predio sem seu
consentimento póde reclamar a annullação do contracto, e o regresso
das cousas ao estado anterior para se manter unido o predio.1
Mas na falta de pagamento de firo ou de pagamento de fôro por
inteiro o mais simples hoje é recorrer á acção executiva, regulada
no artigo 615. do codigo de processo civil.
Para a divisão do dominio directo ou censitico, porém, não é pre-
ciso consentimento do foreiro ou censuario, como para a divisão do
prazo ou do censo é preciso consentimento do senhorio directo ou
do censuista, porque nenhum artigo, quer do codigo civil, quer do
codigo de processo civil, prescreve semelhante restricção; e as re-
stricções ao direito de propriedade não se presumem.
E a doutrina que naturalmente deriva do preceituado no presente
artigo e no codigo de processo civil. que nos artigos 714.° e 748.
manda reunir os interessados para tractar do encabeçamento dos
prazos, ou predios aforados, e nos artigos 559. a 563w estabelece
o processo para destrinça dos firos e dos censos, como consequencia
da divisão dos prazos ou censos em glebas pelos herdeiros sem coa-

1 Aecordão, da Relação do Porto de 3 de junho de 1892, Rerinta


dos Tribhoaes, 11, anuo, n 243, pag. 38,

ji
ARTIGO 1668.' 245

sentimento dos senhorios ou censuistas, se essa destrinça não for


feita amigavelmente, e que nenhum processo estabelece nem para o
encabeçamento nem para a divisão do dominio directo pelos herdei-
ros do senhorio.
Foi esta sempre a jurisprudencia, tanto antiga, como moderna.
Nem a divisão do dominio directo ou censitico importa maior
gravame para os emphyteutas ou censuarios, do que para os predios
servientes a transmissão do predio dominante a mais de um pos-
suidor 1, e todavia nunca ninguem se lembrou de exigir o consenti-
mento do dono do predio serviente para a divisão do predio
dominante.
No entretanto já se julgou que não póde ser feita a divisão do
dominio directo sem consentimento do foreiro, por não poder ser
obrigado o foreiro a pagar em parcellas e a differentes pessoas a pen-
são estipulada por inteiro.
Na remissão dos fóros sujeitos á desamortisação reconheceu o
decreto de 25 de novembro de 1869 artigo 9.- aos glebarios o di-
reito de preferencia no caso de haver cabecel.
Haja porém ou não cabecel, cada um dos glebarios tem direito de
preferencia com respeito á sua gleba no caso de venda do dominio
directo, porque cada gleba deve reputar-se um prazo.

Art. 1663.1 Na falta de herdeiros testamentarios, ou le-


gitinios do ultimo foreiro, será o predio devolvido ao se-
nhorio.

Por direito anterior só voltava ao senhorio directo o dominio util


sem indemnisação, nos casos de commisso, e de caducidade por falta
de successor ao empbyteuta.
Mas a devolução por caducidade era unicamente applicavel aos
prazos de vidas nos termos estabelecidos no § 26 ° da lei de 9 de se-
tembro de 1769, e na Ord., liv. 4.', tit. 36.', § 2°, porque era tem-
porario o contracto antes de ser decretada a obrigação de renovar
o prazo de vidas e não aos prazos fateusins que seguiam, como bens
patrimoniaes que eram tambem, a mesma ordem de successão dos
restantes bens patrimoniaes do foreiro.
Pelo codigo respeita o direito de devolução aos prazos fateusins,
nem hoje ha outros.
A má redacção do artigo 2006.', reconhecendo a surcessão do es-
tado na falta de herdeiros testamentarios e legitimos, quando na
categoria dos herdeiroslegitimos está comprehendido o estado pelo
preceito expresso do artigo 1969.', não altera a ordem da successão,
que é sempre do estado, na falta de herdeiros legitimos e testamen-
tarios, ou como herdeiro, ou por direito de soberania, ou por qual-
quer outro titulo, salvos os casos da devolução do prazo e da quéda
dos escriptos no dominio publico.
O estado tambem não succede na propriedade dos escriptos, que

1 Acordão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de julho de


1897, Gazeta da Relaçôo de Lisboa, 11.' anno, n.' 23, pag. 181.
x Accordãos, do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de janeiro
de 1896, e da Relação de Lisboa de 25 de novembro de 1896, Ga-
reta da Relação de Lisboa, 11.° anuo, n.° 27, pag 212, e n. 28,
pag. 217.
246 ARTIGO 1664.*

na falta de herdeiros ou representantes do aretor cahem no dominio


publico, que pôde publical-os e reimprimil-os, salvo o direito dos
credores a exigir todos os interesses e todo o producto da venda da
obra até se pagarem, conforme o artigo 591
A devoluçào do prazo ao senhorio na falta de herdeiros testamen-
tarios .ou legitimos que é excepção á regra geral do artigo 2006.- foi
determinada ou por ser o senhorio mais merecedor de haver o prazo
já dividido entre elle e o emphyteuta do que a fazenda que é intei-
ramente estranha ao contracto, ou por compensar o senhorio de o ui-
tos outros direitos de que a lei o privou.
No proprio inventario do emphyteuta fallecido o senhorio directo
póde requerer a entrega do prazo visto o artigo 2078.°, pagando a
respectiva contribuição de registo, de que não é dispensado sem
embargo de sueceder por vocação da lei, porque a devolução do
predio é verdadeira transmissão a titulo gratuito.
E, porém, responsavel pelo pagamento das dividas dentro das for-
ças do prazo quando os outros bens não chegarem, apesar de adqui-
rir, não a titulo de herdeiro, mas por titulo especial. No caso não póde
observar-se por analogia, como algnus pretendem, o disposto no ar
tigo 1475.' e na parte final do artigo 1177., porque nem a reversso.
regulada nos artigos 1177.' e 1475.', se parece com a devoluçôo por
caducidade, nem o direito, quer novo, quer velho, conhece herança
em quanto lia dividas, e no pôde duvidar se de que o prazo fazia
parte da herança do foreiro, com quanto o senhorio o não houvesse
a titulo de herdeiro. Nào é, porém, obrigado a custas o senhorio
directo recebendo, como recebe, não por direito successorio, mas por
direito de devolução ou de reversão, porque não tem interesse no
processo de inventario ou de arreeadaçào dos bens.1
Se respondem por castas os credores que pelo inventario recebem
os seus creditos, apesar de serem as custas em regra a cargo dos
herdeiros, dos tercenarios, do conjuge sobrevivo, e dos legatarios
no caso de por estes ser distribuida toda a herança, conforme o
artigo 112.° do codigo de processo, é pela disposição especial do
artigo 83. da tabella dos salarios e emolumentos judiciaes; mas a
tabella não previu a bypothese do artigo 1663.° do presente codigo. 2

SUB-SECÇÃO II

Dos bens que podem ser emprazados

Art. 1664.1 Só podem ser objecto de emprazamento os


bens immoveis alienaveis, salvas as seguintes disposições.
(Vid. nota ao artigo 894.')

1 Accordào do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de novembro


1893, Gazeta da Relação de Lisboa, 7.° ano, n.^ 65, pag. 517.
2 Accordão da Relação de Lisboa de 21 de janeiro de 1896, Ga-
seta da Relação de Lisboa, 6.- anno, o.- 63, pag. 497.

k
ARTIGOS 1665., 1666.-, 1667.', 1W8.- a 1669.° 247

Art. 1665.° Ao emprazamento dos bens de menores, e,


interdiclos, é applicavel o que fica disposto nos artigos 267.0
e seguites.
(Vid. nota ao artigo 267.0)

Art. 1666.° Ao emprazamento dos bens dotaes é appli-


cavel o que fica disposto nos § 2.° e 3.Õ do artigo 1149.°
(Vid, nota ao artigo 1149.')

srn-SEcCÃo I1

Dos que podem dar e receber de emprazamento

Art. 1667.1 Podem dar de emprazamento todos os que


podem alienar seus bens.
(Vid. nota ao artigo 894.')

Ar[. 1668.1 Os casados não podem, comtudo, emprazar


seus bens sem comnnun consentimento, seja qual for o seu
contracto de casamento.
(Vid. nota ao artigo 1119.')

Art. 1669.1 Podem receber de emprazamento todos os


que podem contractar, excepto:
1.1 As pessoas moraes, a não ser nos termos em que a
acquisição de bens immoveis lesépermittida pelo artigo 35.0;
2.1 Os que não podem comprar, conforme o que fica dis-
posto nos artigos 1562.1, 1564.O, 1565.1 e 1566.°

1.', etc.

(Vid. nota ao artigo 35.°)


2.°, etc.
(Vid. nota ao artigo 1562.')

...
248 ARTIGOS 1670.0, 1671.- a 1672.-

SUB-sECCÃO IV

Dos direitos e obrigações dos senhorios directos e dos foreiros

Art. 1670.° 0 senhorio directo é obrigado a registar o


encargo emphyteutico, para que este produza effeitos para
com terceiros, e ficar elle com privilegio mobiliario, para
pagamento dos fóros que vierem a ser-lhe devidos, nos
termos dos artigos 880.0 e 881.°
(Vid. nota ao artigo 880.0)

Art. 1671.0 Na falta de pagamento de fóros, o senhorio


directo não tem direito, ainda que o estipule, senão o de
haver os fóros em divida e os juros desde a mora.
(Yid. nota ao artigo 672.0)
E tão applicavel aos prazos ecclesiasticos como aos seculares a
disposição do artigo, porque a lei não distingue 1, e abrange tanto
os emprazamentos anteriores como os posteriores á promulgação do
codigo.
Por não ser contraria a direito a obrigação de collocar no predio
foreiro uma lapide para indicar a sua natureza e o nome do senhorio,
e ser muito frequente nos antigos aforamentos ecclesiasticos, passou
com o predio aos actuaes emphyteutas, salvo se a estipulação era
relativa só a certos e determinados senhorios ou a certos e determi-
nados emphyteutas, e nio a todos os successores. 2

Art. 1672.0 Se o foreiro deteriorar o predio, de modo


que o valor d'este não seja equivalente ao do capital cor-
respondente ao fóro e mais um quinto, o senhorio directo
poderá recobrar o dicto predio sem indemnisação alguma
ao foreiro.
(Vid. nota ao artigo 898.0)
Não se deve imposto de registo pela recuperação, já porque n'este
caso não ha propriamente transmissão a titulo gratuito, e apens

1 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça'de 9 de novembro de


1897, Gazeta da Re~açáo de Lisboa, 11.0 anuo, n.o 56, pag. 445.
2 Accordãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de maio e de
5 de novembro de 1897, Gazeta da Relação de Lisboa, 11.0 anuo,
o.° 67, pag. 532, e Revista dos Tribunaes, 16.° anno, n.o 374, pag. 211.
ARTIGOS 1673.-, 1674. E 1675.- 249

a recobrança do que era garantia e segurança do dominio directo,


já porque lei nenhuma prescreve este imposto para tal hypothese.

Art. 1673.° 0 foreiro tem direito a usufruir o predio, e


a dispôr d'elle como cousa sua, salvas as restricções ex-
pressas na lei.
(Vid. nota ao artigo 1653.-)

Art. 1674.1 Se o foreiro for perturbado no seu direito


por terceiro que dispute o dominio directo e a validade do
emprazamento, deverá chamar o senhorio directo á autoria,
se quizer ter regresso contra elle pelas perdas e damnos
que por ventura possa padecer no caso de evicção.
(Vid. nota ao artigo 1051.°)

Art. 1675.° 0 foreiro será obrigado a todos os encargos


e tribulos que forem lançados ao predio ou á pessoa em
razão do predio.
§ unico. O senhorio directo deverá comtudo abonar ao
foreiro as contribuições correspondentes ao fôro.
Na emphyteuse recalem as contribuições sobre o senhorio e sobre
o foreiro, competindo a cada um pagar as relativas ao seu direito,
porque ambos usufruem, o senhorio a pensào emphyteutica, e o fo-
reiro o excesso do rendimento real do predio; e são pagas pelo fo-
reiro, que depois desconta ao senhorio no pagamento do fóro o
imposto correspondente á pensão.
A disposição do artigo, applicavel tambem aos emprazamentos de
preterito por força do disposto no artigo 1694.0, levantou desde logo
vivas reclamações onde os foreiros pagavam a expensas suas, e sem
direito de abono, todas e quaesquer contribuições presentes e futu-
ras, correspondentes aos fóros devidos ao senhorio, não só em razão
das investiduras que a isso os obrigavam expressamente, mas tam-
bem por uso e costume independentemente de convençào expressa.
Nas ilhas dos Açores, onde desde tempo immemorial se pagava
sempre o dizimo, isto é, a decima parte do producto bruto da pro-
priedade rustica, era o imposto exclusivamente a cargo do cultiva-
dor, que era sempre quem pagava o dizimo, ou fosse senhor da pro-
priedade, ou rendeiro ou foreiro; e nem o rendeiro ou foreiro se oppu-
nha ao pagamento, nem exigia desconto ao senhorio que sempre
percebia o seu firo por inteiro, porque a condição do pagamento
pelo cultivador sempre tacitamente se subentendeu até que o dizimo
alli foi substituido em 1863 pela contribuiçào predial em virtude
das disposiçúes da lei de 11 de setembro de 1861.
Mas a final foi resolvida a questão pela lei de 3 de abril de 1873,
que dispoz o seguinte:
«Artigo 1." O senhorio directo é obrigado a abonar ao foreiro as
contribuiç5es correspondentes ao firo, nos termos do § unico do ar-
tigo 1675.^ do codigo civil, excepto havendo convençio em contrario,
250 ARTIGO 1675."

..Art. 2.» Nas ilhas adjacentes, onde por costume geral da terra o
pagamento do dizimo correspondente ao fóro estava a cargo do fo-
reiro, não poderá este exigir que o senhorio lhe abone senão o que
por cite pagar a maior, por efleito do aggravamento eventual da
contribuição que ficar substituindo o extincto dizimo.
«Art. 3. Ficam d'este modo declarados o artigo 1688. e o § unico
do artigo 1675.» do codigo civil, e revogadas as disposições em con-
trario.»
Nào prejudicou, porém, esta lei a estipulação de ficar a cargo do
foreiro a contribuição relativa ao dominio directo, quer seja anterior
quer posterior á lei de 3 de abril de 1873 o contracto de empraza-
mento; e em virtude d'ella, nas ilhas adjacentes, onde, por costume
da terra, o pagamento do dizimo correspondente ao fôro estava a
cargo do foreiro, não poderá o emphyteuta exigir do senhorio senào
o que por elle pagar a mais, por eifeito do aggravamento eventual
da contribuição predial, que ficou substituindo o antigo dizimo, re-
gulamento de 25 de agosto de 1881, artigo 106.» § unico.
Tambem os parochos hão de abonar aos foreiros as contribuições
correspondentes ao fâro, apesar de exemptos de contribuição predial
os dominios directos computados na congrua parochial pelas leis,
de 20 de julho de 1839 artigo 13.°, de 8 de novembro de 1841 ar-
tigo 40', e de 15 de julho de 1857 artigo 12, e pelos regulamentos
de 9 de uovembro de 1853 artigo 1. 2.», e de 25 de agosto de 1881
artigo 12 n.» 7.», como exemptos de contribuição predial são todos
os rendimeotos computados nas congruas, porque o § unico do ci-
tado artigo 1» do regulamento de 25 de agosto de 1881 expressa-
mente declara que as exempções, de que tractam os n' 3P a 13.»,
não comprebendem a contribuição predial que corresponder á ex-
ploração dos predios rusticos ou aos fóros, censos, pensões, ou quaes-
quer sutros encargos com que os predios estiverem onerados, porque
essa contribuição será devida na totalidade, e porque pelo mesmo
regulamento artigo 1002 § unico se deve abater do rendimento col-
lectavel do predio a importancia do encargo.
Até se tem julgado' que o foreiro, executado pelo senhorio, não
carece de pedir por embargos o desconto da contribuição, que lhe
deve ser abonada em qualquer estado da execução, apresentado que
seja documento do pagamento effeclivo 2; o que todavia não impede
o foreiro de por cautela recorrer ao meio de embargos para obter o
desconto das contribuições sempre que a firma ou o titulo do pa-
gamento esteja sujeito a impugnação.
Tambem os hospitaes e demais corporações administrativas de-
vem abonar aos foreiros os impostos geraes e os municipaes, e as
congruas lançadas aos fóros, salvo estipulação em contrario. s
No caso de recusa do senhorio a receber os fóros sem o desconto
das contribuições pôde o foreiro depositar a quantia devida, justifi-
cando com certificado do escrivão de fazenda a importancia do im-
posto, regulameuto de 25 de agosto de 1881, artigo 227., se o predio
estiver na matriz descripto como foreiro, deve promover na epocha

r Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de novembro


de 1879, Diar-o do Governo, n.» 284, de 15 de dezembro de 1879.
2 Portaria de 10 de setembro de 1874, Direito, 7.0 anno, n.° 17,
pag. 263.
3 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de abril de 1888,
£lireito, 24.» anno, n. 8, pag. 124.
ARTIGOS 1676.0 a 1677.0 251
da revisão das matrizes se o predio não estiver na matriz descripto
como foreiro a rectificaçào para obstar à repetição de erro para o
futro, e ha de recorrer á acçao ordinaria com relsç;ïo ao passado.
A obrigação de pagar o féro em determinado Jogar põe a cargo
do emphyteuta as despezas com o pagamento n'esse logar, mas não
o encargo de pagar pelo senhorio a contribuição correspondente ao
do 1ninio directo salvo convençào em contrario.

Art. 1676.° 0 foreiro pode hypolhecar o prídio e one-


ralo com qraesquer encargos ou servidões sem consenti-
mento do senhorio directo; com tanto qne a hypotlheca ou
o ois não abranja a parte do valor do predio, que cor-
responde ao foro e mais um quinto.
(Vid. nota ao artigo S95..)

Art. 4677.1 0 forciro pode doar ou trocar livremente o


predio, mas neste caso deverá fazei-o saber ao senhorio
dieci dentro de sessenta dias, contados desde o aclo da
transmissão. Se assim o não fizer, ficará solidariamente
responsavel com o cessionario pelo pagamento das presta-
ções devidas.
Pelo codigo, caio jA pela velha jurisprudencia, não ia na doação
direito de preferencia neim pagamento de laudemio, e apenas a obri-
gação de prevenir o senhoria de quem lhe ha de pagar os direitos
dosminicaes.
0 aviso ao senhorio, que pelo codigo civil podia ser verbal e
extrajudicial, pelo codigo de processo carece de ser judicial, mas
não tom distribuição a aotificaçlo, que é entregue depois de feita a
quem a tiver requerido, nem admitte opposiçào alguma, codigo de
processo, artigo 645.0
Por direito velho a pena pela falta de aviso era a de commisso,
e não unicamente a de responsabilidade solidaria do foreiro com o
adquirente pelo pagamento das prestações devidas.
A lei antiga reconhecia laudemio nas trocas, sem embargo das
opioiòes em contrario, porque a Ord., liv. 4.-, tit. 38 pr., assento
da materia, expressamente dispunha que o foreiro não poderia vender,
escaimbar, dar, neva alhear, a cousa aforada sem consentimento do se-
nhorio. E querendo-a vender, ou escaimbar, dizia a Ordenação, deve-o
primeiro noticar ao senhorio, e requerer, se a aer tanto por Ianto,
declarando-lhe o preço ou cousa que lhe dão por ella, e querendo-a o
een/orio por o tanto, haoel-a-lía, e omio outrem,. E a lei de 20 de
agosto de 1774 § 2. não permittia lavrar escripturas de venda
ou de permutação de prazos da Universidade, «sem o indispensael
alrará de licença da universidade, expedido pela junta de fazenda, e
o conhecimento em fórma original de que se meteu no cofre da mesma
junta a importancia do laudemio correspondente ao valor do prazo ven-
dido, ou permutado,.
Mesmo depois da promulgação do codigo é ainda obrigatorio o
lamdemio nas trocas em emprazamentos de preterito, onde foi es-
tipulado, apesar do disposto no artigo 1694.', porque nos empraze
252 ARTIGOS 1618.· a 1679.-

mentos de preterito ha de pagar-se na fôrma dos respectivos titulos


artigos 1689.° e 1693." o laudemio que na troca deve ser pago na
falta de convenção em contrario por ambos os permutantes, como na
venda é pago pelo adquirenle citado artigo 1693.- § unico.
Nada dispoz o codigo com relação á sub-emphyteuse e censo
reservativo, porque os prohibiu de futuro, artigos 1701.0 e 1107.0
Mas á sub-empbyteuse hoje restaurada devem applicar-se as mes-
mas regras prescriptas para a emphyteuse.

Art. 1678.0 Se o foreiro quizer vender ou dar em paga-


mento o predio aforado, deverá avisar o senhorio directo,
declarando-lhe o preço definitivo que lhe é oferecido ou
por que pretende alienal-o; e se dentro de trinta dias o
dicto senhorio não preferir e não o pagar, poderá o foreiro
realisar a alheação.
§ 1.° 0 direito de preferencia compete egualmente ao
foreiro, no caso de querer o senhorio directo vender o fóro
ou dal-o em pagamento. Para este efeito ficará o dicto se-
nhorio sujeito á mesma obrigação que n'este artigo é im.
posta ao foreiro em analogas circumstancias.
§ 2.1 Preferindo e pagando, quer o senhorio directo quer
o foreiro, fica extincto o emprazamento.
§ 3.° Este direito de preferencia não é admittido nas ex-
propriações voluntarias por utilidade publica.
(Vid. nota ao artigo 1566.°)
Só fica ao abrigo do disposto no artigo 1681.^ a venda, quer de
dominio util quer de dominio directo, quando precedida de notifica-
ção ao preferente em conformidade do artigo 641.° do codigo de
processo civil, notificaçào que não póde ser substituida pela prova
testemunhal de haver renunciado o preferente ao seu direito.'
Podem ser logo citados todos os interessados quando competir a
mais de uma pessoa successivamente o direito de preferencia para
no mesmo praso declararem se querem usar do direito de opção no
caso de vir a pertencer-lhes, codigo de processo civil artigo 641.-
i 1.
No nosso direito de seculos introduziu o decreto de 10 de janeiro
de 1895, confirmado por lei de 14 de fevereiro de 1896, a novidade
de opção a favor do senhorio directo e do censuista quando o fo-
reiro ou o censuario quizer dar de arrendamento por mais de dez
annos o predio ou parte do predio, de certo para obstar aos contra-
ctos fraudulentos de alienação sob a apparencia de arrendamento.

Art. 1679.° A disposição do artigo precedente não é,ap-


Vr plicavel ás pessoas moraes que. não gozarão do direito de
preferencia; mas o transmittente deve noticiar ao senhorio

t Accordão da Relação de Lisboa de 4 de fevereiro de 1899, Gi-


Reta da Relação de Lisboa, 12.1 anuo, n.' 66, pag. 527.
ARTIGOS 1680.0 E 1681.- 253

directo a transferencia, para não incorrer na responsabili-


dade comminada no artigo 1677.1
Nunca foi recebida em Portugal a extravagante Ambitione, titulo
-De rebsa ecclesiae son oliesandis,que prohibia as vendas e os afora-
mentos dos bens das egrejas e dos mosteiros sem licença da sé
apostolica, por ser de todo incompativel com os bons principios li-
buracs; pois até a legislação consignada nos estatutos da Universi-
dade determinava que os bens naturaes da egreja pela sua natureza
propria só do poder temporal eram dependentes.
Então depois da promulgação dos decretos de 30 de julho de 1832
e de ti de agosto de 1833, que precederam o estabelecimento defini-
tivo do regimen constitucional no paiz, seria uma verdadeira extra-
vagancia aquella prohibição.
Hoje todos os bens das corporaçêes ecelesiasticas, bem como os
de todas as associaçécs perpetuas, comprehendidas no artigo 35.n,
ainda ião religiosas, e tambem os passaes dos paroehos, são ven-
didos pylo thesouro nos termos das leis da desamortisaçdo de 4 de
atril de 1861, de 22 de junho de 1866 e de 28 de agosto de 1869. e
das respectivas instrucçòes regulamentares, independentemente de
interv-nção da auctoridade ecelesiastica.
Por isso depois da promulgação das referidas leis é absolutamente
prohibido o emprazamento dos bens d'aquellas corporaçes, salvo o
disposto no decreto de 30 de setembro de 1892, regulamentado pelo
decreto de 14 de dezembro do mesmo aso, que anetorisou as corpo-
raçJes de mão morta a dividir os seus predios rusticos em glebas
não inferiores a ui hectare para os vender ou aforar em hasta pu-
blica perante o administrador de concelho, quando um grupo de
proprietarios se obrigasse a adquiril-as todas.
Por não gosar do direito de preferencia a fazenda publica é des-
neuessario inserir nas escripturas de venda dos bens que lhe são
foreiros o certificado de licença prévia, a que se refere o artigo 4.
das instrucçêes approvadas por decreto de 26 de novembro de 1836. 1
0 que é preciso transerever é o recibo do laudemio, citado decreto
de 26 de novembro de 1836 artigo 4. e portaria de 21 de junho
de 1837.
0 artigo é applicavel, não só aos emprazamentos de futuro, mas
á
tambem aos celebrados anteriormente promulgação do codigo que
sé são mantidos na fórma dos antigos titulos com as modificaçòcs
a que se refere o artigo 1689.

Art. 1680 ° Abrangendo o prazo diversos predios, não


poderá o senhorio directo preferir uns e rejeitar outros.
Art. I681.° Se o foreiro não cumprir com o disposto no
artigo 1678.1, o senhorio directo poderá usar a todo o tempo
do direito de preferencia, havendo o predio do adquirente
pelo preço da acquisição.

t Despacho do ministro da fazenda de 20 de janeiro de 1873,


expedido em oficio da Direcção geral dos proprios nacionaes de 27
da fevereiro do mesmo ano, Direito, 5. ano, ., al, pag. 172.
lt' . iv

254 ARTIGO 1682' z 1683.'

§ 0 Egual direito compete ao foreiro, no caso do § 1.°


do artigo 1678.°
§ 2. Este direito prescreve em conformidade das re-
gras geraes.
Acabou o codigo n'este, como em todos os outros casos, com a pena
de commisso que a Ord., liv. 4., tit. 38.,1 § 1.o impunha ao foreiro, que
alienava o predio aforado sem o participar ao senhorio para este
usar querendo do direito de opção. Alas garantiu ao lesado o direito
de aninuliar a venda a todo o tempo em quanto o seu direito não es-
tivesse preseripto.
Podem assim usar do direito de preferencia nos fóros e nos censos
reservativos o senhorio directo, o emphyteuta, o sub-emíphyteuta, o
cenuvista e o censuario a todo o tempo em conformidade das regras
geraes da prescripção nos artigos 526.- a 53.' determinadas, que
é a significaçào das palavras «a todo o tempo» do artigo 1681.° ex-
plicadas pelo respectivo 2.-
A mesma regra la de ser observada na prescripçào do diÇeito de
qualquer outro preferente para que o codigo no marea praso es-
pecial, porque a prescripçào estabelecida para a venda de parte de
cousa indivisivel, como excepçlo à regra geral, uRo póde ser ap-
plicada a casos n'ella nào especificados, artigo 11.»
t preferente, qne quizer reclamar o predio ou o direito emphyteu-
tico por uào ter sido avisado da venda nos termos regulados no
artigo 641.' do codigo de processo civil, ha de intentar acçào ordina-
ria contra o adquirente, ainda que chame á demanda tambem o
alheador, e é obrigado a depositar ou a offerecer o deposito do preço
da venda, mas nao o da respectiva contribuiçào de registo e mais
despezas co1 o contracto, porque não seria razoavel isípér-llie no
ýt
silencio da lei semelhante encargo, com quanto tenha de o pagar a
final conjunctamente com o preço da acquisiçào e com o das bem-
feitorias que o adquirente possa reclamar nos termos de direito.
A acç4o ordinaria lia de recorrer tambem o senhorio directo se,
em vez do direito de opý'Ro, quizer antes o laudemio nos prazos an-
teriores á promiulgaçlo do codigo.
E tambem applicavel o artigo aos emprazamentos de preterito
por força do disposto no artigo 1694.»

Art. 1682." So o predio emprazado for penhorado por


dividas do foreiro. não poderá ser poslo eni hasta publica
sem que seja citado para o dia da praça o senhorio directo,
o qual terá a preferencia querendo haver o predio pelo
maior lanço.
Art. 1683.1 Se o predio posto em praça não tiver lança-
dor, querendo-o o senhorio directo, terá este a preferencia
tia adjudicaçao, pelo valor com que esta laja de fazer-se,
para o que, dentro de tres dias, contados desde o ultimo
dia de praça, lhe eumpre declarar qne qner usar do seu
direito, e bem assim pagar o preço da adjudicação dentro
de outros tres, contados desde aquelle em que lhe for jul-
gada,

Á
ARTIGO 1684.° 255

unico. Esta disposição não é applicavel áquelles que


não podem preferir.

Nos artigos 88.^ e 870. o codigo de processo civil nào só re-


gulametou os artigos 1i82.t e 1G83 do presente codigo, mas
ampliou
1 ainda as respectivas disposições.
Mrur on no artigo 848.' citar para a praça, na arrematação do pre-
dio rmphtrntico o senhorio directo, do predio sub-emphvteutico o
senhorio directo e o emphy t e uta, do predio onerado a censo reser-
vativ o ceonsuista, do dtominio directo o cmphyteuta e o sub-
emsphyteuta ltvetdo-o, do dominio emphytentico o sthtrio directo 00
e a sob-emphyteuta, do censo rervativo o cnsuario, da part do
consorte n cousa indivisa os comproprietarios, e no de algm quinhãs
0U na d posse cro posseiro os quinhoeiros, salvo quando fssem pes-
soas morres, porque estas são gosam do direito de preferencia.
Ordenou mais no artigo S48.- a citação por editos dos prcfcrerts
que residisscr frar do continente do reino ou das ilhas adjacentes,
mareou a praça em stguida à arrematação para os citados usarem
do direito de preferencia, e mandou seguir a licitação só cotre esses
prefrcotes qinrrdo n stpreosnassc a preferir mais de uma pessoa
com egual direito, adjudicando se os bens ao que maior lanço offere-
ccsse.
telo artigo 870 ^ do mesmo codigo de processo civil podem os
preferentes requerer a adjudicação até á segunda o terceira praça
e pirferem a qualquer credor pelo valor em que os bens tiverm ido
r praça. Dipois da terceira praça não podem jã requerel a. ls se
algum credor a requerer tIcno o direito de prefruir no praso de tres
dias, para o que são intimados os que tiverem ajunetado procu-
ração ou escolhido domicilio ra comarca; segue a licitação só
entre f
os preferentesqíutdo se apresentar a preferir mais de uma pessoa
conm egnal direito, adjudicando-se os bets ao que offcr-crr maior
lanço; etia o preferente adjudicatario em tudo equiparado ao ar-
remattm,, e só obrigado a depoitr o excesso sobre a importan-
eia liquida do seu credito estando habilitado para o concurso.

Art. t68't. 0 senhorio directo não póúle exigir as pres-


taçõles aírazadas de mais de cinco anos, senio por ori-
gação de divida, assigtala pel foreiro, com duas test-
onohas, ou Ioda escripta do seu punho. ou reeiohecida
em auto publico.
A jurisprudencia corrente, com o fundamento de que o senhorio
carece de legitimidade para exigir fóros de mais de cinco anos sem
o documento rio artigo designado, dispensa o foreiro de allegar a
preripção. porqus, se fosse neecssario invocal-a. bastava para isso
o artigo 543. O
Parte a, jurisprudencia forense do principio de que o artigo nega
absolutamente o acção ao senhorio que pretende fóros de mais de

o Accordão da Iielafo de Lisboa de t de maio de 1897. Gaseta


da Relação de Lisboa, 10. anno, ns 91, pag. 721,
256 ARTIGO 1685.-

cinco annos, sem para isso se haver legitimado com documento assi-
gnado pelo foreiro.
O artigo, porém, abrange só as penses emphyteuticas. Olaudemio
está sujeito á prescripçào geral.'

Art. 1685.° A acção por divida de fóros é summaria.


A execução, quando recabir nos bens do prazo, pode
fazer-se tanto nos rendimentos como na raiz, conforme
aprouver ao-senhorio.
Não é preciso para a acção o registo do onus real, que para o
preterito está dispensado, regulamento de 20 de janeiro de 1898
artigo 163.1 n. 4.1
Ultimamente estava-se julgando, aliás com fundamento na lei, que
não bastava o registo da transmissão do dominio directo que só
obrigava os que no respectivo titulo tinham intervindo para pedir
os fóros pela acção executiva, e que só o registo expresso e especial
do onus real da emphyteuse podia dispensar a acção ordinaria. 2
Talvez por isso o ultimo decreto sobre registo predial de 20 de ja-
neiro de 1898 artigo 151.- dispensa o registo dos onus reses a quem
tem registada a seu favor a transmissão dos mesmos onus, apesar de
continuar a julgar-se o contrario. 3
Em todo o caso, em face da lei por direito anterior, novissima re-
forma judicial artigo 283.% era a cobrança sujeita ao processo or-
dinario ou summario, segundo os fóros excediam ou não a tres annos,
e podia começar se, em logar da penhora, que se permittia no começo
da causa, por embargo ou arresto nos moveis e fructos que fossem
hypotheca legal da divida, se o auctor junetasse titulo, ou désse ou-
tra prova justificativa da posse de perceber taes rendas, embargo
que posteriormente era convertido em penhora.
O codigo civil, porém, acabou com a determinação do processo
pelo numero de annos a que respeitavam os fóros.
Prescreveu a mesma fórma de processo para as dividas de fóros,
qualquer que fosse o numero das pensies pedidas, porque não dis-
tingue o artigo, e legislou do mesmo modo para os fóros vencidos,
F tanto antes como depois da sua promulgação, comprehendendo os fé-
ros titulados em conformidade do artigo 1684, por não haver em tal
caso novação, visto não se contrahir nova divida em logar da antiga,
F e suppór sempre a nova divida nova causa de pedir.
Com a modificação do artigo 2830 da novissima reforma judicial
não privou o codigo ninguem de direitos adquiridos á sombra da
lei anterior, porque não alterou o genero de provas que a legislação
anterior admittia, e só modificou a fórma do processo, que não é

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de março de


1899, Rcsista dos Tribunaes, 18.° anno, n. 411, pag. 35.
2 Accordàos, da Relação de Lisboa de 20 de junho do 1893, do
Supremo Tribunal de Justiça de 10 de dezembro de 1897, Gazeta
da Relaçdo de Lisboa, 7.° anno, na. 34, pag. 269, e 11.- anno, n. 75,
pag. 623.
3 Accordão da Relação de Lisboa de 21 de outubro de 1899, Ga-
seta da Relação de Lisboa, 13, anno, n, 30, pag. 253.

A
w
ARTIGO 1685Õ 257

nem pôde ser objecto de direitos adquiridas para ninguem, e póde


no contrario ser livremente alterada pelos poderes publicos, uma vez
que se respeitem s actos cos ados.
> eidig de processo civil acabou com a acção summaria, que hoje
to sdmtitte nem para os firos, tim para o despejo, nem para qual-
quer outro direita porque não reconhece seio o meio orditrio e o
meio especial, e applicou o processo executivo A exigencia dos f[ros,
censos, penses, quinales ou reunIas, qualquer q u e seja a unmero de
annos eia divida, e a epoeha do renciments.
1laje o credor de fraos, ceusas, psnsies, quinhões ou rendas de
- ítaeoaíer bens iiunobiliariios, gsa da acçâà executiva, regiuada
ns artigos ti15." a 621. do eia go de processo civil, e pde logo
reiquirer piilora quer contra o devedor, quer contra os fiadores,
emlus siultiliii tis part sigimeti da divida, comçatli por aquel-
les ,m qpie tiver privibgio, desde que s- legitime cum titulo autlten-
tir ou s-bentirad, iu com regito.
asta juntar ou só o doeiuent tuttentio su aít hetii-ui sem
registo, ou si a simples certidão do registo que se presume feito em
presença de doíueuto authentico ou autheticado. Não é preciso
ajuntrar ambas as cousas.
Feita a penhora é citado o devedor para deduzir embargos, os
quaes admití-m tida a qualidade de defesa, inelssire a de não terem
sido pagos dura o tempo preciso para se completar a prescripçâo,
e. até a invocação da nullidade do registo i, dispensada neste caso
a auçuài ordinaria que o presente codigo exige para t ser atacada a
validade do registo, visto poder o citado deduzir a defesa que tiver.
No caso de ini poder legitimar-se com titiuo ítílísutico ai au-
tsentirado ou com certidAo ile registo, tem o interessado de recorrer
à sicçilo irdinaria.
As eceções por f«ros, rendas ou outras prestações, terôo tracto
successivo pari as que posteriormente se forem vencendo, quando as-
sim tiver sido pedido, crdigo de processo civil, artigos 7.o e 809.",
e os pedidos cum trarto successivo são excedentes a toda a alçada.2
Os referidos artigos sio egualmente tppliraveis aos fóros da fa-
zuta porque o coligo de procsso civil revogou toda a legisLaão
anterior, quer geril. quer especial, que recahisse nas material n'elle
comprrhendidas, e porque pelo presente codigo é o estado quanto ao
eaereici dos direitos civis enesiderato como um particular, arti-
gos 3., 382.", 513., etc.
ahiram deante das provisões do codigo de processo civil as dis-
posises da lei de 4 de junh de i 9 e as iistrueç8es regulmnentares
dc 27 de setembru du mesmo 31n1111, bem coua dereto com força
de lei de 22 de julho de 1870, apssr de se Jtar
jul aud constan-
temente o eeutrskrie.
Tagem mão pôde ser pplicado á cobrança dos fúros, eensos e
pensis da fazenda o Pru'-eso te arreesadaçiso dasitnibiiçea
puiiias, porque n'estes rendiumeítos não sa lançauento previo com

t Accordo do Supren- Tribunal di Justiça, de 9 te janeiro de


IS1bl, /iílu.i dos ITri/iui-, i; auno, n 235, pag. 26:3.
2 A(.orá- lio Supremo Tribunal de Justiça de 5 de julhs de
1872 e dI e ig nario te 173, 51,ia do Gioersna. a." 1C5 de 1872
. 100 de 18-7ï.
To TIl 17
258 ARTIGOS 1M86., 1687.0 E 1688.0

audieucia das partes e coi a facnldade de reclamar e de recorrer


q1e lixe u direito (ic exigir executivraríit as pi-s)es. 1
Já no relatorio do derto [e 3U d dezembro de 1892 cobre exe-
ençts lisces se dizia: «Por émista dioposiçào do artigo 6.^ (do
decreto de 22 de julho d<t 187W, rei coi as correlativas ia lei de
4 di junho de 1859, quanto à colrnra de dividas (de rendas, féros,
cens.s e penes dfazea t:i l puilic das crpoiraes administrati-
vas, rsto rctaInrite revogadas pilo coiligo de procsso civil,
devedo olerirvar-si os pr<c<itos do artigo 115.1 e .cguíiter do
mesmo coligo».
1), mesmo modo não é regida pelos decretos das excinções tiseaes
de 28 de m<<rço 4
d 185 e de 31 dc dezembro dc 1897 a cobrança
ceerci r de f1ruo, rendas e juros da, camrras mnicipaes, porque
não e c
rtio rmrprehedidos <aur contrihuiç s e r'ndirrrntoi a qr se
refere o artigo 8i." do mesmo decri-t 1, coro <,à é rcompetente para
o caso o agente di rit(rio publico, porque oirutigo 418 do <o-
digs administrativo respeita uricrament aos impostos e rendimentos
a que é applienvel o procescí de. cobirara coerciva das eontribuiçes
do estdo.
A cobrança coerciva das congruas prílhiaes está regrlada no
decreto de 31 de dezembro <e 1897.

Art. 1(86.0 A prescripção ú applircal os prazos da


mesma férma que o e aos ouIros bens immobiliarios.
(Vid. nota ao artigo 526.")

Ai. I687.° Se o pr'dio se destruir ou iíutilisar total-


1mente, por força maior ou caso fortuiio, ficará extitcio o
contraco1 .
Ar. 1i688. se, por orça tmair oí caso fortuiro, o pre-
dio emphyteutico se dslruir ouiniittlLisar, sr em parte, de
modo que o sell valor fique sci lertur ao que era na
epircla do empra;ltril, poder i foreiro requerer qu1e
o senhorio direto lhe reduza o frro, ou encampar o prazo,
se ellsesi oppozer redrçro.

Destruido totiilnte o predio por força maio <xtireto fica o cm


prazament9.h ainid no raso di erstipulrão em contrario porque falta
a isoe do co<treti, e destriido si em parte fica ao foreiro a liblr-
ide te prdir reducçi do ftr ou de encampar o prazo oe o se-
iiorio s. oppzer :S rcdm-ção.
Si, paiir: u, o cso no é de força maior, como se foi o foreiro que
deitou o fogoris casas emphyteuticas <ntinna elle sujeito a todas
as obrigaçes do aforamento, coo sc o prédio aforado rinda exis-
tisse.

Portaria do 3 de junho de 1879, Direit, 12." rano, n °1, pag. to.


ílidicio do ministirio do reino de 25 de junho de 1898, Direito,
31." anno, i.° 19, pag. 29.

1.,
ARTIGO 1689. 259

Não tem vcrdadeiramente o foreiro, como não tem o arreodatario,


a alternativa de pedir redacção da renda, ou rescisão do contracto
ncíso de prejuizo em parte do prédio. Qualquer d'elles póde apeías
pedir reducção na pensão; e só o foreiro póde além d'isso, se o se-
nhorio se oppozer à redueçâo, rescindir o contracto, isto é, encampar
o predio, o que alis não é purmittido ao arrendatario.
Tamem nos prazos da fazendo nacional póde o foreiro exercer
est direito, pruc tão
n lei faz distiueção.
E, p orém, indispeusavel quer para a redueção do fôro, quer para a
cncampaçào do prazo, que seja de effeitos pemaannte a distruição
ou nutilisação da propriedade e que fique inferior ao que era na
epocha d- emprazairento o valor do predio, como resolveu a com-
missão rs tsora, cota ao artigo (1727.) do projecto de 1863, corres-
pondlere ai artigo 1688.' do codigo.
Pela reduoeção ou encampação no caso do presente artigo não se
deve íontribuiçào de registo, regulamento de 23 de dezembro de
1!9 artigo 7.- u.° 20.
E, porém, devida contribuição de registo pela reducção do féro
em quaesquer dos casos, porque é considerada remissão parcial, como t
devida é pela reducção do censo ou pensão, citado regulamento de
23 de dezembro de 1899 artigo 56. 5P 0 imposto é representado
na imiportanciat da parte reduzida multiplicada por vinte.
Nã o pecrmitte o codigo como era pratica no direito anterior, p et-
cumpir í prazo ao iiniorio quando o fir em logar de lucro dá erda.
MAs fciiiente se livra do ctiarg,' o foreire, vendendo o prazo ainda
que por 20 réis a lum mendigo, deiois le o offerecer tanto por tanto
ao senhorio.

SECAO II

Dos emprazamertos de preterito

SIti-SECCa.O (

Disposiçóes geraes

AtI. 1689.° Os empraz:mertos de bens particulares, an-


teriores á promulgação do presente codigo, quer subsis-
lam por contracto, quer por outro qualquer titulo, serão
mantidos, ta fórma dos respectivos titilos, com as modifi-
caçes esiabelecidas na presente secço.
1
(Vid. artigo 1f91.')
Os bens dos corporaç,es ecelesiasticas como os bens das confra-
riast ratão comiehendidos nos aforamentos de bens particulares,

Acrordão da Relação de Lisboa de 19 de janeiro de 1889, Ga-


zeta da Relação
de Listou, 3» anto, n, 87, pag. 692.

bL,
,--.4i>

2c0 ARTIGOS 1690.0, 1691. E 1692.0

prescrevem as emphvteuses ecelesiasticas em conformidade do


direito commum, e bens paricelaresconsiderou o decreto de 14 de
dezembro de 1892 artigo 2.0 para os effitos do emprazamento os
que, tendo pertencido a corporaçJes de mio morta ou administrativas,
já lhes nio pertenciam à data do mesmo regulamento, com quanto
já se tenha julgado 1 que a empltvteuse ecclesiastica, anterior ao
codigo civil, não se comprehende nos bens particulares, e que nos
aforamentos ecelesiasticos o prso da prescripçao é de quarenta
annos com boa fé e justo titulo. 2
E certo que o artigo exclue só os emprazamentos de bens da corôa
e da fazenda.
Esses estão sujeitos é lei de 22 de junho de 1846.
Esta lei acabou com os foros impostos em bens provenientes da
corêa, considerando coomo tacs os lodos pelos reis, ou por qualquer
membro da familia real, ou consignados em tombos, desde qme fo-
ram doados por titulo generico, ainda que este fosse depoir ennver-
tido em titulos purticulares, se os domatarios se no eneartaram
dentro do praso marcado no artigo 20.^ da referida lei 3 e só fez a
concessão artigo 22.§ 3.- aos possuidores de fóros, censos ou pen-
soes impostas em bens da corôa ou fazenda que ficaram subsistindo
pelo artigo 6., e nâo aos fóros, censos ou pensdes impostos em bens
patrimoniaes, os quises são apenas comprehendidos na moratoria
artigo 15.'4

"1 Art. 100.° Os emprazamentos mencionados no artigo


precedente, podem ser provados por todos os meios legaes
ordinarios.
1' (Vid. nota ao artigo 1655.)

Art. 1691.° Quando se tiver estipulado, que os flros se-


jam pagos n'uma ou noutra espveie, será esta da escolha
do foreiro, não havendo declaração em contrario.
(Vid. nota ao artigo 733.)

Art. 1692.1 Todos os fóros, que consistirem em presta-


ções incertas, poderão ser reduzidos a prestações certas,
a requerimento dos foreiros.

1 Accordlos, da Relação de Lisboa de 10 de outubro de 1885, e


do Supremo Tribunal de Justiça de 9 mie julho de 1886, Gata da
Rllaç,o de Listna, a.- mino, n.° 50. pag. 4.0, e Boletim dos Trim-
f n5es. 1. anuo, n 38, pag. 600.
2 Accordão da Rela: io de Lisboa de 7 de fevereiro de 1871, Di-
reito, 4. anno, n' 20, pag. 318.
. eeordmoo d Supremo Tribunal de Justiça de 20 de junho de
A
1883, m/cma 1m Jel,, me .ibohas, 7. attm', n1. 7, pag. 51.
1 Ae,,rdI do Supremo ri omal de Justiça de 2 de março de 1883,
levista de Legiolmo. e de Jmrieprrmdenia, 25 anno, t.° 1183. pag. 11.

'"'.5.

4
11
r ARTIGO 1692.-

* Tem sido nuhit questionado se as raçóes ou quotas de fructos,


261

como o terço, o quinto, o oitavo, etc., foram ou oio extiieta pela


lei de 22 de junho de 1846, que aboliu todos os direitos impostos
por titulo generico, que no tivessem a natureza de pensóes reusi-
tieas, euphyteutieas, ou sub-eisphyteuticas.
Julgam alguns abolidas is raçes em geral, qualquer que seja a
natureza e origem dos bens em que foram impostas, e o titulo por
que se devam, com o fuiduento de serem verdadeiros tributos as
quotas na linguagem da Ordenaçào, que no liv. 23, tit.33.-, § 23.-falia
do 1(rço, quarto e quinto, como tribotos maiores que ajugada, de serem
verdadeiros encargos pesoaes as rações, porque o alvará de 24 de
novembro de 1764 falia das rações, odaos, ou outros encargos pes-
soacs das fazendas que possuirem nas terras onde pelos foraes so
obrigados os peões a pagar os referidos encargos, de estarem já
extinetos pelo artigo 4." unico da lei de 22 de junho de 1846 os
serriços pessoaes, e 9inalmee de excederem por muito pesados os
enargos, os limites das verdadeiras pensóes sípyhteuticas que por
sua natureza devem ser modicas.
Não procedem, porém, os argumentos.
A Ord., liv. 2., tractando das jgadas uo tit. 33.-, apeuas consi-
derava tributos as raçôes q uitdo impostas em bens reyseouyeiros
ou de egual natureza, porque no § 23- faltava dos lavradores que
lavram os regunsyos de que pagam os tributos do terço, quarto, quinto,
ou mais ou menos.
O alvará de 24 de novembro de 1764, além de chamar jfro de
gete plebea as raçdes, quando d'ellas no eram exemplos os clerigos
e os cavalleiros, citada Urd., liv. 2.', tit. 3., no artigo 2s., os quaes
forma sempre considerados nobres, tinha de ceder à disposiçào pos-
terior, lei de 25 de maio de 1776, que declarou verdadeiros encargos
reais as rações, as quaes haviam de sub.istir porque a lei de 22 de 1
junho de 1046 só extinguiu os encacgos pessoaes.
Esta lei manteve as raçoes, no só as impostas por senhorios par-
tieulares em bens seus patrimoniaes, altda que o fossem por titulo
generico se d elle constasse expressamente ou se os senhorios provas-
sem que eram patrimoniaes os bens, senào tambem as constituidas
por titulo generico que foram depois alienadas por titulo oneroso,
com tanto que tivessem o caracter de peusoes emphyteuticas ou ecn-
siticas.
A lei de 22 de junho de 1846, que para o efeito das prestações
impostas por titulo generico distinguia entre bens patrimoiaes e
bens da corda, e ainda considerava em separado os bens da coróa
segundo tinham ou não sido alienados a titulo oueroso, só extinguiu
as rações estabelecidas por titulo generico, e não as estabelecidas
por titulo especial e oueroso de emphyteuse t; e tanto reconheceu
a legitimidade e a existencia das rações, que no artigo 6.' 5. e no
artigo 8.- mandou reduzir as peosérs incertas a certas.
Além disso dos direitos baoaes ou serviços pessoaes só aboliu,
artigo 4., os que no tivessem a natureza de peosdes censiticas ou
emphyteuticas, salvo tendo sido impostos pelos reis ou pelos do-
¡'.

t
Aceordâo do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de dezembro
de 1113, Gazela da Aosoeiat;do tios Adeogaeols de Lisboa, 1-
anmo,
paz. 199.

L
r
26-2 ARTIGO 1693.-

natarios da corda em qualquer titulo generico, ainda que conver-


tido depois em titulo especial.
Verdadeiramente a referida lei só aboliu as raçêes que não haviam
sido impostas por titulo especial e que tinham a natureza de tributo.
Se estivessem totalmente abolidas as raçnes não teria razão de
ser o preceituado no regulamento de 9 de julho de 1861 para a exe-
cução da carta de lei de 4 de abril do mesmo anno, que mandou no
artigo 11. § 4.2 converter os fóros em generos ou incertos em di-
nheiro nos termos do artigo 9.' da lei de 22 de junho de 1846 para
poderem ser avaliados.
O que tem levantado graves duvidas é a determinação do que
seja titulo generico e titulo especial.
O decreto de 13 de agosto de 1832 só comprehendia os empraza-
mentos, sub-emprazamentos e censos no titulo especial.
Mas a lei de 22 de junho de 1846 ampliou até á concessãode pro-
priedades certas e determinadas.
Pelo artigo 6.2 d'esta lei ficaram subsistindo os fóros, censos,
pensões ou outros direitos dominicaes, que não haviam tido origem
no titulo generico extineto pelo artigo 3., e haviam sido pelo con-
trario estabelecidos pela concessão de certas propriedades ou pela
consignação d'ellas em contractos especiaes emphvteuticos ou cen-
siticos, e que estavam eneorporados na corda ou fazenda e á pu-
blicação do decreto de 13 de agosto de 1832 lhe pertenciam ou ás
pessoas, corporaçóes ou estabelecimentos a que tivesse succedido,
qualquer que fosse o modo pr que os tivesse adquirido, ou a pessoa
que os houvesse estipulado, ou a natureza dos bens em que houves-
sem sido impostos.
Silva Ferrão distinguiu o titulo generico do titulo especial pelo
genero de auctoridade com que tinham sido impostas as penses,
definindo titulo especial a consignação das pensões em certa pro-
priedade ou a reserva d'ellas feita por virtude do contracto es-
pecial censitico ou emphyteutico, e titulo generico todo o esta-
belecimento das referidas prestaçies feito por modo de imposição,
ordenamento ou determinação superior como acto de soberania ou
de supremacia.
Nós em presença da lei de 22 de junho de 1846 reputamos de-
terminadas por título especial as pensbes estabelecidas pela concessão
de certas propriedades ou pela cosignação d'ellas em contractos
especiaes emphyteuticos ou círsiticos, e determinadas por titulo ge-
nerico as impostas por qualquer outro titulo.
Finalmente a pensão incerta não póde considerar-se vexatoria, por-
que representa apenas a obrigação de pagar uma parte do que o
pensionado recebe, e não tudo o que o pensionado recebe, nem mais
do que recebe.
De quotas incertas, como de pensões sabidas, se reputou sempre
legitimo o arrendamento, e já a Ord., liv. 4.2, til. 45.°, se inscrevia
-Do que dó herdade a parceiro de meias, ou a terço, quarto, ou a
arrendapor certa quantidade-.
Subsistem portanto as raçées estabelecidas por titulo especial, ou
os bens sejam patrimoniaes ou da corda, e as raçêes estabelecidas
por titulo generico em bens patrimoniaes ou em bens da corda alie-
nados por titulo oneroso que representam verdadeira pensão emphv-
teutica ou eoesitica.
6aý

Art. 1693.' 0 laudemio estipulado nos emprazamentos

:=k
rr<"

ARTEIGOS 1694.', 1695.-, 1696.- : 1697.' 363

na fôrma da estipulação. Este


de preterito será conservado
laudemio será de quarentena, se por outro modo se não
achar determinado.
unico. A obrigação de pagar o laudemio incumbe ao
adquirente.
(Vid. nota ao artigo 1657.')

Art. 1694.° São applicaveis aos emprazamentos de pre-


terito as disposições dos artigos 1661.0, 1662.0 e 1663.0
e da sub-secção Iv da secção precedente.
(Vid. nota ao artigo 1689:)

Art. 1695.° Os foros vencidos ao tempo da promulgação


d'este codigo podem ser exigidos, não obstante a disposição
do artigo 168i.°, comlanto que o sejam to praso d'um anuo,
contado desde a dicta promulgação.
(Vid, nota ao artigo 543.")

sti-s*CCAo ii

Dos prazos fateunsins

Art. 1696.° Todos os emprazamentos fateusins, existentes


ao lempo da promngação t'este cotigo, são declarados
hereditarios puros, e á sua transmissão serão applicadas
as regras estabelecidas nos artigos 1662.1 e 1663.°
(Vid. nota ao artigo 1662.-)

SB-SECCAo til

Dos emprazamentos de vidas e de nomeação

Art. 1697.° Todos os prazos de idas, ou de nomeaçao,


quer esta seja livre, quer restricta, ou de pacto e provi-
dencia, revestirão a natureza de fateusins hereditarios puros
5~

264 ARTIGOS 1698.°, 1699.' a 1700."

em poder dos emphyteutas, que o forem ao tempo da pro-


mulgação do presente codi gii, salvas as disposições dos
artigos subsequules.
Art. 1698." Os prazos, que, ao tempo da promulgação
do presente cudigo, se acharem nomeados, ou transferidos
irrevogavelmente, e por instrumento authentico, mas com
reserva do usufructo, só tomarão a natureza de fateusius
heredlitarios, quaott vierem ao poder dos iomeados, ou
daquelles para quem o prazo liver sido transferido.
ArL. 1i9. Se a iomnicaro, ou a trasferencia, feita,
coe dicto í p.r ioclruntlo authentico, for revogavel,
produzir o ismO íllito, sé o íoícaute, ou o lratisferenle,
não a refogar.
Ari. 1700." Os prazos, a que se refere o artigo 1698.°,
continuarão a ser regidos pela legislação anterior a este
codigo, em quanto, nos termos do mesmo artigo, não to-
marem a natureza de fateusins.

(Vid. nota ao artigo 1109." n. 1.")


Era corrente no velho diritn que os prazos de vidas não faziam
parte da herança, e que até podiam ser nomeados os de livrenomen-
çào com preteriçào dos herdeiros legitimarios.
Julgou-se, porém, modernamente que tambem por direito anterior
os prazos de vidas constituiam patrimonio de familia em virtude do
direito de renovaçio concedido ao successor da ultima vida pela
lei de 9 de setembro de 1769, 0j 25" e'26."
Tal jurisprudencia, porém, sáe fóra dos limites da Ord., liv. 4.",
tit. 36." e til. 97. § 22.", reguladora do caso, e é contraria á antiga
n'o praxe de julgar.
A lei de 9 de setembro de 1709, reconhecendo o direito de ren-
vaçào, não alterou a natureza do prazo, nem a ordem da successão,
apenas auctorisou a eontiíuaçào do contracto e ampliou io 26°
aos collateraes até o quarto gráu a successão do legal do prazo
que a Ord., liv. 4 ", tit. 36.° j 2.0, na falta de nomeação só recoube-
eia aos descendentes e aos ascendentes.
Os praxistas nem o direito de representação admittem na sucres-
são dos prazos de vidas com o fundamento de não poderem sue-
ceder os sobrinhos havendo irmios no que não podiam succeder
os netos havendo filhos.

1 Aceordãos do Supremo Tribunal de Justiça de 6 dejulto de 1894


e de 20 de março de 1897, Gazeta da Relaçdo de Lisboa, 8." anno,
n.' 48, pag. 381, e 10.° anuo, a." 85, pag. 677.

as
r

ARTIGOS 1701.°, 1702.-, 1703." a 1704.- 265

SECÇAO 1I1

Da subemphyteuse ou subemprazamento

Art. 1701.1 E prohibido, para o futuro, o contracto de


sub-eumphyteuse ou sub-emprazamleito.
Art. 1702." Os ':oetílactos sub-emíphyleuticos de prelerito
coutiuarão a subsistir, seudo-lhes applicavel o que, nos
artigos 1689." a 1695., se acha estabelecido para a em-
phyteuse de preterito, com as seguintes modificações.

(Vid. notas aos artigos 1587." e 1689.")


Restaurou o decreto de 30 de setembro de 1892, depois regula-
mentado pelo decreto de 14 de dezembro do mesmo asno, a consti-
tuição da sub-empbyteuse perpetua, com as condiçòes, porém, de
se não estabelecer outro encargo além do fóro, de não serem sub-em-
prazadas propriedades inferiores a cinco hectares nem ficar na posse
do emphyteuta parc.lla inferior áquella área, de ser feito por escei-
ptura publica, e registado para produzir effeitos com relação a ter-
ceiros, o contracto, e de ficar cm tudo mais sujeito aos artigos 1702.-
a 1704.P do presente codigo.
Foi, psrém, modificada esta legislação pelo decreto de 10 de ja-
neiro de 1s95, confirmado por 1l i de 14 de fevereiro de 18%6, o qual
acabou com a remissão obrigatoria qualquer que fosse o valor do
fóro si do laudemio, permittiu a sub-empbyteuse de terreno inculto
quando o terreno desligado não fosse indispensavel ao grangeio do
prazo e o emphyteuta se obrigasse a arroteal-o e a cultival-o, e
deixou livre ao emphyteuta e ao senhorio o direito de promover a
rescisão do contracto se, decorridos cinco anunos, não estivesse feito
o arroteamento e aproveitamento do terreno.

Ari. 1703.0 Quando algum predio sub-emplyteutico for


vendido ou dado em pagamento, o direito de preferencia
pertencerá ao senhorio directo, e só, não querendo este
usar d'elle, pertencerá ao emphyteuta.
1." Quando for vendido, ou dado em pagamento, o do-
minio directo, o direito de preferencia pertencerá ao sub-
emphyteuta, e só, não querendo este usar d'elle, perteu-
cer ao emphyteuta.
i." No caso de ser vendido, ou dado em pagamento,
o dominiu emphyteutico, o direito de preferencia pertencerá
ao senhorio directo, e só, não querendo este usar d'elle,
pertêncer ao sub-emphyteuta.
Art. 1704.0 Para que possa elfeituar-se a disposição do
artigo antecedente, o sub-emphyteuta que quizer vender,

t 4.
1
266 ARTIGO 1704.-

ou dar em pagamento, o predio sub-emphyteutico, além da


noticia, que d'este facto é obrigado a dar ao senhorio di-
recto, nos termos do artigo 1678., deverá, quando o dicto
senhorio não use do direito de preferencia, fazer egual par-
ticipação ao emphyteuta pela mesma fórma.
unico. Identico procedimento haverá da parte do se-
nhorio directo, no caso de ser vendido, ou dado em paga-
mento, o dominio directo, e da do emphyteuta, no caso de
alienação do dominio emphyteutico por alguma d'aquellas
fórmuas.
Regula o codigo desenvolvidamente as condições de preferencia
nos tres direitos distinctos que ha a considerar na sub-empbyteuse,
o do senhorio, o do emphyteuta, e o do sub-emphyteuta.
Na sub-emphyteuse prefere sempre o senhorio directo ao em-
phyteuta e ao sub-emphyteuta, quer na venda do predio, quer na
venda da pensão empáyteutica.
Na alienação do dominio directo prefere o sub-emphyteuta ao em-
phyteuta.
Em concurso entre o emphyteuta e o sub-emphyteuta dá o codigo
com justa razão preferencia ao sub-emphyteuta, como já Ih'a haviam
dado na remissão dos fóros pertencentes ás corporações e estabele-
cimentos comprebendidos na desamortisação as leis de 22 de junho
de 1866 e de 28 de agosto de 1869.
Desde que a base da preferencia é a necessidade de libertar a
terra e de favorecer o predominio da propriedade perfeita sobre a
propriedade imperfeita, deveria sempre preferir o sub-emphyteuta,
i quer concorresse só com o emphyteuta, quer concorresse tambem
com o senhorio directo, porque a preferencia realisada pelo sub-
emphyteuta, tanto na venda do dominio directo, como na venda
do dominio emphyteutico, se não libertava completamente a terra,
marcava já um passo para a libertar, porque reduzia o encargo sobre
o predio.
t A preferencia reconhecida ao senhorio directo em concurso com
o sub-emphyteuta na venda do dominio emphyteutico não tem ex-
plicação plausivel em face dos principios que regem e determinam
o direito de preferencia, porque em nada attenua os encargos da
terra, que continuam os mesmos depois da opção pelo senhorio.
Tambem no concurso entre o emphyteuta e o senhorio directo á
venda do predio sub-emphyteuticado deveria ser preferido sempre o
emphyteuta ao senhorio, porque mais circumscripto ficava o en-
cargo sobre o predio.
Em conclusão devia em todos os casos preferir o sub-emphyteuta
ao emphyteuta e ao senhorio directo e o emphyteuta ao senhorio
l directo, em vez de preferir sempre o senhorio directo aos dois.
No entre tanto o que está no codigo e que ha de portanto cumprir-se
é que o senhorio prefere sempre tanto ao emphyteuta como ao sub-
emphyteuta.
Na sub-emphyteuse de sub-emphyteuse, de que ha alguns exem-
plos, devem observar-se por analogia as disposições estabelecidas
nos presentes artigos.
Assim, aforado um predio por Pedro a Paulo por vinte e cinco
itros de trigo, e sub-aforado por Paulo a Martinho por cincoenta,

À
ARTIGOS 1705.°, 1706.' E 1707.- 267

e por Martinho a Sandho por cem, em que Pedro é senhorio directo,


Sancho sub-emphyteuta, e Paulo e Martinho emphyteutas em pri-
meira e em segunda linha, na venda da soubemphyteuse não que-
rendo o seshorio preferir, pertence pelo systema do codigo o di-
reito de preferencia ao primeiro emphyteuta, Paulo, e, não querendo
este, ao segundo emphyteuta, Martinho, por estar o primeiro emphy-
teuta para com o sub-emphyteuta na razão de senhorio; na venda
do primeiro dominio emphyteutico, não querendo o senhorio directo,
pertence a preferencia ao sub-emphyteuta, e, não querendo tam-
bem o sub-emphyteuta, ao outro emphyteuta Martinho, e na venda
do segundo dominio emphyteutico de Martinho não querendo o
senhorio directo é tambem do sub-emphyteta a preferencia, e só
não querendo este pertence ao primeiro emphyteuta, Paulo.
A mesma regra deve seguir-se, qualquer que seja o numero de
grãus de aforamento, isto é, qualquer que seja o numero de emphy-
teutas intermediarios entre o senhorio directo e o sub-emphyteuta
ou possuidor do predio.
No concurso entre emphyteutas somete, pelo systema do codigo,
a preferencia é do primeiro gráu, e assim successivamente, com
quanto dejure costitueodo devesse observar-se a ordem inversa.
Competindo o direito de preferencia a mais de usa pessoa não é
obrigatorio notificar os preferentes para o exercido do direito de
opção successivamente pela ordem da preferencia, como prescreveu
o artigo 1704.' do presente codigo. Pelo contrario podem ser citados
logo todos para dentro do mesmo praso fazerem a sua declaração
codigo de processo civil artigo 641.' 1.'

Art. 1705." No caso de alienação do predio sub-empy-


teutico, observar-se-lha,qtanto ao laudemio, o que, com
annuencia do senhorio directo, se achar esiipulado no con-
tracto de emprazamento.
(Vid. nota ao arrigo 1657')

CAPITULO XIV

DO CENSO BESERVATIVO

Art. 1706.0 Diz-se censo reservativo o contracto por que


quaIluer pessoa cede algum predio, com a simples reserva
de terla pensão ou prestação annual, que deve ser Paga
pelos fruetos e rendimentos do mesmo predio.
(Vid. nota ao artigo 1641 °)

Art. 1707.° Ficam prohibidos para o futuro os contractos

Ka
268 ARTIGOS 1708., 1709.-, 1710." a 1711.-

de censo reservativo; os que se estipularem com este nome


serão havidos por empliyteuticos.
(Vid. nota ao artigo 1587.")

Art. 1708.° Aos censos reservativos de preterito é ap-


plicavel o disposto nos artigos 1678., 1679.°. 1680." e 1681.1
(Vid. nota ao artigo 1566')

Art. 1709.1 Havendo duvida âcerca do contracto, se é


ceusitico, ou se é emphyteutico, presumir-se-ha que é ceu-
sitico, em quanto não se provar o contrario.
A rado é por se presumir sempre o mais favoravel ao devedor,
e ser.cremo mais favoravel ao censuario do que a emphyteuse ao
fureire.

CAPITULO XV

DA TIrIANSACCAO

r ArL. 1710.1 A transacção e o contracto, pelo qual os


transigentes previnem ou terminam uma contestação, ce-
dendo um d'elles, ou ambos, de parte ias suas pretençues,
ou promettendo um ao outro alguma cousa em troca do
reconhecimento do direito contestado.
Art. 1711.° A transacção pôde ser judicial ou extrajudi-
cial, conforme a pendeucia se achar, ou não, em juizo.
Regulava o projecto primitivo a transacção em seguida á materia
do juramento, e sob o titulo «Da extineçào das Acções», sendo o ca-
pitulo relativo à transacçào, precedido de outro sob a epigraphe
«Disposições geres,, que continha um artigo só, redigido nos se-
guintes termos: «O direito de arçio extingue-se: 1." com o direito
que lhe pôde servir de fundamento, segundo o disposto no presente
codigo; 2." pela transacçào; 3. pelo julgamento,.
A conmissoo revisora, porém, climinaudo do codigo a materia das
acções, collocou n'este logar a transacçào, considerando-a como con-

E tracto, e nào como meio de extinguir acções.


Nio ha transacção sem contestação nascida ou por nascer, sem
contestaçào a prevenir ou a terminar, e sem estipulação de conces-
oõea reciprocas.
ýo

ARTIGOS 1712., 1713.° o 1714.- 269

É sô o objecto e não a frrma ou o nome que dá a natureza ao con-


tracto de transacção.
E da essencia da transacção cuo contracto oneroso cederem os
transigentes de parte de suas pretensôcs, ou promelcro-se alguma
ciusa em troca do reconhecimento do direito contestado, é nas
transacçìes que mais se usa das clausulas penaes de que falia o ar-
tigo G740, e frequentemete se encontra n'estes contractos a lausula
chamada depote!ars, pea qual se imple á parte a condiçlo de não
imppgnar a transacção sem depositar primeiro a quantia recebida.
E nu la a transacção sobre processo já teriniado se é desco-
nhecido o facto de ambas ou de uma sS das partes por uno bavoe já
contestação a prevenir ou a terminar, e pelo erro rm que estavam
as partes que reputavam ainda litigiosos o ens direitos.
Tambem se denomina judicial ou extra-judicial a transacço 55s-
ridaou por nascer, conforme se faz ou nino cai juizo artigos 24097. a
2416-, e codigo de processo civil artigo 141.

Art. 1712.° A transacçáo extrajídiíial pode ser feita por


escripto particular, ou publico, ou em auto de conciliação;
rias, versando sobre direito immobiliario, só pôde ser feita
por escriptura or por antr de conciliarIo.
(Vid. nota ao artigo GBr.^)

Art. 1713.° A líansacção judicial far-se-lia por escriptura


publica junta aos autos, ou por termo nos mesmos autos.
O codigo de processo civil, referindo-se à transacçâo judicial, per-
mitte rs partes confesar, desistir, ou transigir, em qualquer estado
da causa. com tanto qse o façam por termo no processo ou por escri-
ptr, com iitervençâío da parte, ou de procurador com poderes
especiace referidos n causa como se mostra dos artigos 140. e 141.
Os poderes especiaces bem podem dispensar-se quando a desistencia
respeitar á acção e nào ao pedido, e não prejudicar por fórma alguma
o pedido.
A transacção judicial, pois, quer verse sobre bens mobiliarios, quer
sobre bens immobiliarios, tanto pôde ser feita por termo no processo
como por escriptura publica.
É, por ir, nuall se importar alienarco de rens, renncia de tireito
ou e tinoeto d obigaç(es que a lei prohiba, citado codigo ar-
tigo 144., e nunca passará em julgado a sentença sobre ella pro-
ferida artigo 14n ", o que significa que fica sempre aerto contra
rita o recurso sem embargo de qualquer intimaçào, e que para ser
rescindida se não observam os termos do artigo 148° tio mesmo co-
digo, visto referir-se o artigo 148 do codigi de processo civil só rs
sentenças passadas fia jnigado, e não ás que ainda não passaram em
julgado, apesar de jt se ter decidido o contrario.

Ari. 171$.' A transacclo jnlicial só produzir< efleito,


desde que passar em julgado a sentença que a homologar.
iVid. artigo 1718.)
1toje até a Rtlaão c o Supremo Tribunal de Justiça so compe-

ii ï
270 ARTIGOS 1715., 1716.0 E 1717.0

tentes para homologar quando perante elles penda a acçào ou a


execução, sem necessidade de baixarem os autos ao juizo inferior,
devendo seguir o incidente de homologação os tramites prescriptos
nos artigos 1124- e 1125.' do codigo de processo civil perante
qualquer d'estes tribunaes.
Sem homologação nem a transacçãojudicialpode produzir os effei-
tos de cousa julgada para servir de base a execução, nem ao menos
sustar o andamento da causa, e fazer cessar a acção pendente entre
as partes transigentes.'
O artigo 714.' do presente codigo não reconhece effeito algum á
transacção judicial antes de homologada e o codigo de processo civil
artigos 141.' e 1463. expressamente exige a homologação, tanto na
transacçào judicial por termo nos antos, como na transacção por
escriptura publica, e tambem não dá etfeitos alguns à transacção
antes da sentença homologatoria.
Nas se eomprehende como practicamente havia de parar o pro-
cesso sem despacho do juiz, e esse despacho forçosamente havia de
ser homologatorio desde que reconhecesse a transacção.

Art. 1715.1 Aquelle, que transigir sobre direito proprio


e adquirir depois, por qualquer fórma, outro direito seííe-
Ilhante, não ficará obrigado, a respeito deste, pela anterior
transacção.
Art. 1716.° A transacção feita por um dos com-interes-
sados não obriga os outros, nem póde ser invocada por
elles.
Por transigir sobre direito proprio não fea ninguem inhibido de
fazer valer direito litigioso que posteriormentd lhe advenha ainda
(iqe seja semelhante, porque a transacção abrangeu unicamente os
direitos do transigente e não os qua cie depois adquiriu, e as trans-
ac:es limitam-se estrictamente ao seu objecto.
Não póde po, la mesma razão ser invocada contra os outros a trans-
acção feita por um. porque as clausulas dos contractos só obrigam
os ,que as estipularam.
E a regra da lei romana, applieavel ás transacçóes como a quaes-
quer outros contractos, - 'res inter aliou anta vel jadicata aluis non
nocet».

Art. 1717.° \ tratsacção sobre interesse civil, resultante


de delicto, não prejudica a acção do ministerio publico.
A punição do delicto pôde destacar-se perfeitamente da responsa-
bilidale pelo damno causado.
O damono causado pelo delicto prejudica só o offendido. Mas e
delicto como crime fere a ordem social.
Póde portanto o offeudido transigir, deixar de ser parte no pro-
cesso criminal, requerer pelo meio ordinario a reparaçào civil nos

1 Aceordâo do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de janeiro de


1894, Gazeta da Relação de Lisboa, 90 anno, n.' 15, pag. 11

1:
MF;

ARTIGOS 1718.-, 1719.-, 1720.0 E 1721. 271

termos dos artigos 2373. e 2374., e até renunciar á reparaçào


omo senhor do seu dircito. N
Mtas no pode prejudicar a acçào do estado contra o delinquente
4
e
que, perturbando a ordem publica, offendeu directamente a socie-
dade.

Art. 1718.° A transacção produz entre as partes o effeito


de cousa julgada.
ii
(Vid. nota ao artigo 1714.,)

Art. 1719.1 A transacção não pôde ser rescindida por


erro de direito; mas póde se -o por erro de facto, ou por
causa de dolo ou de violencia, tto, termos geraes de direito.
=i
(Vid. nota ao artigo 657.)

Ar. 1720.1 O descobrimento de tilulos novos ião inva-


lida a transacção feita ett boa fé; excep'o provando-se que
algum tios ttatsigeuteienhium direito tina sobre o objecto
da transacção.
Art. 1721.0 A disposição da ultima parte do artigo pre-
cedente não tem applicação às transacções geraes, que
abrangem diversos objectos, se a respeito de parte d'elles i
a transacção podér subsistir.
Não invalida a trai actçao uma vez feita em boa fé o desctuori-
ento tde noos documento, se não revelam earencia total de di-
reito da parte de algum doo transigentes. Desde que accuecm
augo,, direit presume-se na transa(ç5o a idéa de garantir o se-
gurar esse direito; e, se a transacção abranger diversos objectos, a
casescia de direito com relaçâo a un no t invalida nem affecta a n
transacção com relaçào aos outros.
O pensamento destes artigos foi garantir a certeza das trans-
acções.
A transacção em má fé invalida-se pelo simples facto da má fé
nos termos (o artigo 1719.", independentemente do descobrimento
de novos titulos que provem o nenum direito de algum dos transi-
gentes

@ t..

:r.
t
272 ARTIGO 1722.-

(A\PIT ULO XVt

DO iiaiSTO E TiiANSiiISSAO Di: BENS


4 E DinE1rios l\iti1 i1 AtiOS .

Art. 172.Õ Tuidas is transiissies de leiis OiU di'eitos


iuinobiliarius eislio sujeitas a registo, que será regulado
pelas disposiçiies estabeleridas nos artigos 9',9.° e seguintes.

(Vid. nota ao artigo 949.")

à
r
LIVRO Ill

DOS DIREITOS QUE SE ADQUIREM POR MERO FACTO DE OUTREM,


E DOS QUE SE ADQUIREM POR SIMPLES DISPOSIÇÃO DA LEI

TITULO I

DA GESTAO DE NEGOClOS

ArL. 1723. Aquelle que, seom anclorisação e volunlaria-


mente, se introunette na gestão de negocios de ountrem, tor-
na-se respousavel para com o proprieIario dos diclos ne-
gocios, e para com aqtelles com quem contractar em nome
d'elle.
(Vid. artigos 1730. e 1733 )
Está a essencia da gestào de negocios em se administrarem nego-
rios alheios cei auotorisacão do proprietario. Este facto juridico,
que ordinariamente se verifica na ausencia do proprietario, pôde
seriticar-se egualmente na presença. O caracteristico da gostào de
uegocios é a Igerencia iíliniiariana adiaini stração alheia sem man-
dato nem do proprietario sem da lei, e nào o estar o proprietario
logge ou perto dos seus negocios.
A admiistraçào alheia por obrigaço da lei, coro xi curadoria
e á ititla, applicami-se, nAo as regras relativas {í gestso de nego-
rens, mas au regras da arlitistraçe dos bens de pessoas incapazes
de por si se regerem r adui istrarem.
ti iiintii-i gestor é equiparado ao mandatario, quer nas obriga-
çocs para com o proprietario, quer nas obrigaçoes para com terceiro.
O que se intromette na gestào de negocios é obrigado a coneluil-a,
se o proprietario ns mandar o contrario, artigo 1733.; e assim o
que mandou cortar as uvas lia de fabricar o vinho e pl-o em segu-
rança depois de feito, isto é. collocando-se pelo proprio facto no lugar
do proprietario, deve fazer tudo quanto este faria.
Nem com o fuudamento de estar encarregado do negocio por
amizade pôde escusar-se de o concluir, porque o abandono do ser-
Tomo IH 18
274 ARTIGOS 1724.- E 1725.

viço antes de terminado póde em certos casos ser uma traição,


porque as inconsideraçoes ou reconsiderações do gestor não devem
prejudicar o proprirtario, e porque nem este nee o beneficio me-
rece se não é completo.
t)gestor desde que é obrigado a concluir o negocio nem á morte
do propriotario póde abadonal-o. la de continuar em quanto o
negocio se não conclue, ou os herdeiros do proprictario não provi-
denceim conforme o artigo 1366.°, sobre tudo podendo a estes advir
prejuizo da não continuação.
A lei declara consentidors o proprietario desde que elle tiver conhe-
cimento da gestão, e í gestão se não oppouer artigo 1730.°, com a
unica differença de na 0 ~e obrigado para com o gestor nos termos
em quo pelo artigo 131G." Lobrigado o constituinte para com o man-
datario, pois quo o constituinte tem de indemnisar o mandatario ou
tenha ou não recebido os proveitos que esperava, e o proprietario
é simples e unicamente responsavel para com o gestor quando tiver
reesbido proveito efectivo.

Art. 1724.° Se o proprictariu, ou aquelle a quem per-


tence o negocio, railivar a geslão, e quizer aproveilar-se
dos commodos e proveitos que tella provierem, será obri-
gado a indemnisar o gestor das despezas necessarias que
houver feito, e dos prejuizos que tiver padecido por causa
da dicta gestão.

(Vid. artigo 173k.)


Desde que o proprietario se aproveita dos serviços e dos cuidados
do gestor de negocios, ha de i demnisal-o das despezas necessarias
que fez, e dos prejuizos que com a gestão soffreu, ainda que o nego-
a tiorm gestor se houvesse intromettido nos negocios contra a vontade
declarada d'este, pela regra - Nero com alteriusdetricíoto locojple-
tari deLel-.
A obriga;ão de indemnisar nasce do simples facto de se apro-
veitar o proprietario dos comrmodos e proveitos da gestão, ou antes
n'este facto está a ractifi-ação da gestão.
Em caso nenh m é licito ao proprietario aproveitar se dos commo-
dos da gestão sem iidemnisar o gestor das despezas e prejuizos
soffridos com a gestão.
Mas, como era natural, foi o codigo mais rigoroso com o gestor
de negociou contra vontade dectorada do proprietario, porque o res-
ponsabilisa até pelas perdas ncrideutaes se não mostrar que teriam
acontecido egualmente se tal intervenção não houvera.
Assim como é justa e moral toda a equidade com o individuo
que se intromettu a adinistrar os negocios de outrem na ausencia
d'este, julgando prestar-lhe serviços, e evita-lhe prejuizos, assim
não ha rigor que possa taxar-se de demasiado para o que se intro-
mette na administração de regoeios contra a vontade declarada do
dono, entrando assim no caminho do esbulho e da violencia.

Art. 1723.° Se o proprietario não ratificar a gestão, e


esta tiver por objecto, não obler um lucro, mas evitar al-
ro7
A
ARTIGOS 1726 , 1727., 1728." E 1729" 275

gum damno imminente e manifesto, deverá em todo o caso


indemnisar o gestor pelas despezas feitas n'esse intuito.
(Vid. artigos 1727.- a 1729.")
Mesmo que nirio ratifique a gestão ha de o proprietario indemnisar
o gestor, que teve em vista evitar-lhe um damao imminente e ma-
nifesto.
Se a gestão consistiu em tirar o milho do relleir para o salvar
dos perigos de inudaão, o gestor, longe de ser obrigado a recolher
o milho de novo no ceileiro, tem direito a ser i"desm istdo das
despezas com aquallc servio ainda que r proprietario a nao ra-
tifique, porque artigo 1725. b applicavel ao caso; e com fundamento
u'este artigo já s.aí irraroo1 abonar as despesas de medico e de botica
com o doente, bem cono as d enterro quando elle faleceu, todas
feitas sem a competento auetorieselí, decisão justissima, vista a na-
tureza dos actos e a necessidade iradiavel das despezas, pois se
tractava de evitar daíno irreparavel.
Nera ha contradicção entre o presente artigo, que impe ao proprie-
tario, ainda não ratificando a gestão, a obrigação de indemnisar
das despezas feitas o gestor quando a gestão tiver por objecto evitar
algum damno imminente e manifesto, o artigo 1727.", que impe
genericam nte ao gestor, cuja gestão e desapprovada, a obrigação
de repr as cousas, Jsua custa, no estado em que clhis se achavamu,
indeinsisando o proprietario ds qualquer differença, porque o disposto
no artigo 1727. e nos dois seguintes ó a regro geral, e o preceito
do artigo 1725." é .excerçdo.

Art. 1726.a A ratificação da gestão produzirá os mesmos


effeitos que produziria o mandato expresso.
(Vid. nota ao artigo 1351.")

Art. 1727.1 Desapprovando o proprietario a gestão, de-


verá o gestor repôr as cousas, á sua custa, no estado em
que se achasam, indemnisando o proprietario do prejuizo
resultante da dillereuça que houver.
art. 1728.1 Se as cousas não podérem ser repostas no
antigo estado, e os beneficios excederem os prejuizos, o
proprietario tomará á sua conta tus e outros.
Art. 1729.° Se os beneficios não excederem os prejuizos,
poderá o proprietario obrigar o gestor a tomar todo o ne-
gocio sobre si, exigindo d'ele a devida indetnisação.
(Vid. nota ao artigo 17250)

r Acecorlão da Relação de Lisboa de 2 de dezembro de 1874, Re-


vista de Legislação e de Jrisprulecia, de Coimbra, 11." arno, n." 546,
pag. 414.

1s
276 ARTIGOS 1730, 1731., 1732., 1733.0 e 1734.

Art. 1730.° Se aquelle, a quem o negocio pertence, tiver


conhecimento da gestão, e não se oppozer a ella antes que
chegue a seu termo, será havido por consentidor; mas pão
ficará obrigado para com o gestor, se não houver elfectivo
proveito.
(Vid. nota ao artigo 1723.)

Art. 1731.° Aquelle que intervier em negocio de outrem,


contra sua vontade declarada, responderá por todas as per-
das e damnos, ainda accidentaes, se não se mostrar que
teriam acontecido egualmente, se tal intervenção não hou-
vesse; mas. querendo o proprietario aproveitar-se da ges-
tão, vigorará o que fica disposto no artigo 1724.0
(Vid. nota ao artigo 1724.-)

Art. 1732.0 0 gestor de negocios dará conta exacta e


fiel dos seus actos, e da receita e despeza que tiver havido
na gestão.
As funcçoes do gestor de negocios são equiparadas ás do manda-
tario, que por isso é obrigado como todo o administrador de negocios
alheios a prestar contas, as quaes seguem os termos de direito com-
mum, preccriptos no artigo 611p. e seguintes do codigo de processo
civil.

Art. 1733.1 Aquelle, que se intrometter na gestão de


negocios, será obrigado a concluil-os, se o proprietario não
mandar o contrario.
(\id. nota ao artigo 1723^)

Art. 1734.° Se alguem se intrometter em negocios alheios,


por serem estes de tal fórma connexos com os seus, que
não possa a gestão de uns ser separada da dos outros,
será havido por socio d'aquelle cujos negocios gerir conjun-
clamente com os seus.
§ unico. Neste caso o proprietario só é obrigado em pro-
porção das vantagens que obteve.
(Vid. nota ao artigo 1241.°)
r-"-

ARTIGO 1735. 277

TITULO II

liAs SLCESsuES

CAPITULO 1

Disposições preliminares

Art. 1735.1 Pôde qualquer succeder, por morte de ou-


trem, em todos os seus bens, ou em parte d'elles, tanto
quando for por disposição da ultima vontade, como quando
for em virtude da lei. No primeiro caso, dá-se a successão
testamentaria; no segundo, a snccessão legitima.
(Vid. artigo 1968^.)
Com quanto no uso vulgar, como na linguagem juridica, se use
indifferentemente o vocabulo herança ou snccessão para significar o
mesmo pensamento, é certo que no direito m'oderno emprega-se pro-
priamente a palavra -I/erança -para designar o conjuneto ou uni-
versalidade de bens, direitos e obrigações, qte pertenceram 4 pessoa
fallecida, e a palavra - ssccessão-esperialmente para exprimir o
modo legal como esses direitos e obrigaçes passaram aos represen-
tantes do fallecido.
Da saccessão é a morte da pessoa o motivo occasional e é a
perpetuidade do direito de propriedade o fundamento.
Em regra só na falta de disposição de ultima vontade é deferida
a herança em virtude da lei.
. Quamdi íotest e. testamnto odiri -ereditas, ab intestato non de-
ferior- -, é o que já dizia a lei romana 39, tit. 2y, liv. 29 Dig.
Nos tempos primitivos era desconhecida a successão testamentaria,
como tatnbem a successão abintostado, por não haver realmente
propriedade individual. A morte do individuo não influia no modo
de ser da propriedade, porque os bens eram da tribu ou da fasslia.
Na suecessão abintestado síbstitue-se a lei ao testador, presu-
mindo que a vontade do testador não fazendo testamento fara
corresponder aos sentimentos naturaes e de familia, e beneficiar as
pessoas que lhe estavam mais strietamente ligadas pelos vinculos
de sangue, porque aliás poderia ter escolhido outro successor.
E o preceito consignado no artigo 1368. , ao qual correspondia
no projecto primitivoo artigo 2120., assim redigido: ,.Se qualquer
pessoa se finar sem dispér de seus bens, ou se, havendo disposto, o
testamento se annnllar, ou ficar sem effeito por incapacidade, ou
renuncia dos instituidos, haverão seus bens os herdeiros legitimos,.
278 ARTIGO 1736.'

Da regra geral-que a successào se defere em virtude da lei só


quando o auctor da herança não dispoz-exceptua-se apenas a quota
reservada para os herdeiros legitimarios nos termos dos artigos 1781.I
a 1787.0, instituida para conciliar e harmonisar quanto possivel a von-
tade e os desejos do homem com os laços ro sangue e com os vis-
culos da natureza, que as leis juridicas devem attender e respeitar.
A successào leqgiia, que tambem se diz abintestado por ter logar
na falta de testamento, é assim chamada, menos por se referir a her-
deiros legitimos ou parentes legitimeos, do qor em contraposiçào á
successào tesfau,-taria, porque deriva ds lei, e ado da vontade
expressa do auctor da herança, ou porque este não testou, ou porque
o testamento foi ineticaz.
Pelo codigo pôde ser deferida a herança da mesma pessoa, e até a
favor da mesma pessoa, em parte por disposição da lei, e em parte
pela vontade do homem, artigo 2038". o sobrinho, unico herdeiro
legitimo a quem o testador deixa metade da sua herança sem coa-
templar mais ainguem, suecede n'essa parte por testamento, e
na outra metade por disposiçào de lei na qualidade de herdeiro
legitimo.
Póde tambem o auetor de heraooa prescindir da instituiçâo de
herdeiro no testamento artigo 183-, e dispôr de toda a sua fortuna
em legados, artigo 1794-
Por direito romano ninguem podia morrer parte testado e parte
intestado, porque, passaído integra ao herdeiro a personalidade do
testador, integro devia passar tambem o seu patrimonio; pois se
presumia que a personalidade do testador, longe de morrer, conti-
nuava sempre subsistindo na personalidade do herdeiro.
A primitiva legislação romana exigia como indispensavel a insti-
tuiçào de herdeiro para a validade do testamento, salva a excepçào a
favor dos militares, porque estendia a solidariedade nas pessoas
da familia até os direitos e as obrigações.
Hoje, porém, nem o herdeiro pelo facto de aceitar a herança
associa a fortuna propria aos bens da successào, nem as outras
disposições testamentarias fieam sem etfeito pelo facto de não aecei-
tar a successào o herdeiro instituido.

Art. 1736.° Diz-se herdeiro aquelle que succede na to-


talidade da herança, o em parte d'ella, sem delerminaço
de valor ou de objecto. Diz-se legatario aquelle, em cujo
favor o testador dispiie de valor, ou objecto determinados,
ou de certa parte d'elles.
(Vid. artigos 1791.- e 17 .) )
Herdeiro tem a sua etymologia na palavra latia haeres, que deriva
de ierus, que significava o chefe da familia, de certo por nos tem.
pos primitivos da velha Roma só os chefes de familia poderem fa.
zer testamento para escolher successor que continuaeoe a sua pessoa
juridica.
Em Roma era ncessaria a instituiçào de hIersd-iro como cabeça
e solemidade interna do testamento, porque a organização da fa-
milia íío permittia morrer parte testado e part- intestado, nem fazer
instituição com limitaudo de tempo, visto ter o herdeiro de conti-
nuas a personalidade do auctor da herança com todas as condições
de universalidade e de perpetuidade.

11
r
ARTIGO 1786.0 279

Neste systema a falta de instituiçào importava a nullidade ou a


inetlicacia do testamento
Htoje herdeiro é o contemplado com uma parte da hitrança, sena
designação de objecto ou de valor, qualquer que seja a quota que
tenha a haver na hierança.
Já o projecto primitivo no artigo 1868.°, correspondente ao ar-
tigo 1736s, do codigo. dizia erdeir aqielle emcrjo fasor o testa-
dor dispse por titulo universal, ou que pelo mesmo titulo lhe
suecede por mero etfeito da lei, e equtstrio aqus'le em cujo favor
o testador dispe por titulo particular, e definia titulo nierstl a
disposiçàs da genralidade dos bens do testador, ou de certa porção
d'essa generalid:ute, e titulo p}rirst/r a disposirão de certos e de-
terminados lens, ou sI' certas e determinadas sommas, ou de certa
universalidade de bens; pensamnt adoptado pela commissbo revi-
sora co nova redserão ei sessão de 7 de junho de 1862.
Assim, Pedro é /erleiro, ou o testador lhe deixe todos os seus bens,
ou a qsuarta parte dos seus bens, ou o rernaueseante dos seus bens; 7
e Pedro é leg/aréo, desde tnte o testador lIh deise objecto deter-
nrinado como a qinta de S. Míartiho, ou valor d etrsinado como
600-00 réis.
Não é preciso lixar nem esp e ciiíar a quantia ou objecto do le-
gado desde (1ie essa quantia ou esse objecto se indique por fórma,
que possa determinar-se sem necessidade de partilha, desde que
possam tors certos dterminatds os bens ainda que consti-
tuas uma univeosalidade, como o dinheiro ercontrado tno espolio do
testador, o os bens sitos sm certa localidade omo os bens sitos em
lIlafra, e até os bens cxistcntos em Portugal. t
A essescia da instituiçi ds serdeiro est! em deixar ao instituido
todos, ou o resto dos bess, ou uma iuota assignada em certa pro-
porçâo como 15, a 1/, etc., artigo 1791.
Não se distingue d legado a herança pela poreô de bens deixa-
dos, mas sim pela fra da stitsirti isto é, distisuire-se entre a
herança e o legado conforme é a titulo universal oi a titulo singular
a instituiçào. 2
N'uma erança de 0:000 Ws00 réis, se o testador deixa 18:0000')0
réis a Pedro e o resto dos lens a Paulo, é Paulo o herdeiro e Pedr
o legatario, não obstante ficar 1Pedro cos 0s4, da herança e Paulo
sé com </i. Mas é porque Pau fica suecessor in uýi erssom ius, com
o direito de propé acçeos em juizo sobre quaesquer contractos e
actos juridicos practieados pelo anttor da herança, com o direito de
acerescer, etc., e responde tumem ntes dosliegatarios pelas dividas
da hivrança até onde chegar o valor dos bens que receber.
Porque o ligstari represesta, parte definida da erança, e o
herdeiro porão ou quot, indefinida, é herdeiro o tercenario, pois que
suecede em parte sla herança sem especificação de valor ou de obje-
eto que só pudeiser determinado pula partilha, posto j,1 se ter jul-
gado com fundamento no artigs 176.- que o tirrenrr o é ligatario
e íio hsrdeir, quando s6 da terça dispe o testadora.

t Aecordio do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de junho de


1896, Gazeta da Relação de Lisboa, 10. asso, ay 65, pag. 516.
Aecordos do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de abril de 1873,
e de 5 de abril de 1878, Diario do Governo, a'- 105, de 1873 e 112
de 1879.
280 ARTIGO 1736."

O artigo 1795.- não veio, somo alguns pretendem, fazer excepção


ou modificação ao artigo 1736 , dando a natureza de legado á deixa
de certa e determinada parte da herauça pela simples circumstancia
de não haver disposto o testador da outra parte da lerança, nem re-
ferir-se á hypnthese da Otd., liv. 4., tit. 82.' de dispor sémente da
terça o pae sem fazer menção dos filhos.
Nem se comprehenderia que fossem herdeiros dez individuos a
cada um dos quaes o testador assignasse a decima parte da herança,
e o não fosse aquelle a quem o testador deixou a decima parte da sua
fortuna sé porque não dispoz das outras nove partes.
A parte certa e deteroinda do artigo 1796.° é differente da vola
proporcional artigo 1791.', e da parte da herança seml deteriaçâo
de calor ou de objecto artigo 1736.'
As palavras «coeta e d,'terminadaparte da herança» artigo 1796.'
equivalem á deixa de quantia ou de objecto determinado.
O artigo 1814. § 1.-, determinando que a perfilhação posterior ao
testamento não annulla a inotit<içdo de herdeiro, <as a limita d terça,
não permitte duvidar de que o instituido não deixa de ser herdeiro
por ficar reduzida á terça a deixa; e pela mesma razão não deixa de
ser considerado usufructuario universal, para ser considerado usufru-
etuario de cousa determinada artigos 2231. a 2233., o usufructuario
de <qaota da herança.
Além d'bso qacquer diverget«ias
3 rutre as artigos 1791.' e 17161',
copiados dos artigos 192 .' e t9.' do projecto primitivo, cessam
deatte da disposição clarisssma do artigo 1776 , onde a con<nissao
revisora consignau propositadamente o seu pensamento, alterando
o artigo correspondente do projecto primitivo.
Todas as duvidas desapparerram deante da resposta do sr. Seabra
ás observaçócs do sr. dr. Joaquim José Paes da Silva.
Dizia o sr. Seabra :o Observa o nosso illustre revisor que é diflicil
ás vezes distinguir o que é herança
1 73 6
ou legado, e que talvez sesmo
na applicação do artigo 1868." ( . do codigo) se encoutre ditE.
culdade, principalmente nas expressões 'certa porção d'essa g~era-
lidade, certa universalidadede rena»: e que por isso seria porventura
conveniente taxar uma quantia, além da qual as corporações não
podessem adquirir.
«O artigo 1868.' (1736. do codigo) define o que importam as pa-
lavras herdeiro e lega/urio. Esta definição é da mais alta i portancia,
porque os direitos dos herdeiros e legatarios dilIerem profundamente.
Tenham paciencia os inimigos das definiçòes, pois na maior parte dor
casos constituem direitos e obrigações, e são indispensaveis. Deixar
absolutamente aos termos de que usar o testador a determinação das
consequencias d'cstas tis) diversas situações. seria dar logar a inter-
muinaveis disputas, e prejudicialissimos equivocos. Era preciso pois
derivar a differença, não das palavras de que o testador ignorante
possa servir-se, mas da mesma natureza das cousas.
«Conformãmo-nos n'esta parte com o espirito da legislação franeexa,
conservando todavia a denominação de herdeiro, que sem maior ne-
cessidade é trocada no codigo franeez pela denominação de legatari
unirersaZ.
«Segndo a doutrita do mosso artigo, herdeiro é o sueecssor do
defunto por tituo universal, e legatario o successor por titulo parti-
calar. Tihdo universal, dizemos nós, é a disposição que comprehesde
a generalidade dos bens do testador, ou certa porção d'essa genera-
lidade.
'Assim, tanto á herdeiro aquelle a quem o testador deixa todos os

li
ARTIGO 1736.0 281

seus bens, eoqo aquelle a quem deixa um terço, im quarto d'esses


bens, embora lhe eboame legatario, ou se sirva da palavra ',legado.
'Ti/rla parti nlar, diremos, é a disposiço d certos e determina-
dos bens, de certas e determinadas sommas, de certa universalidade
de bens.
Assim, se o testador diz -deixo a Ticio a minha quinta da Pa-
nasqueira, a minha vinh dos Grillos, a minha casa do Caneiro -,
faz um legado, e institue um legatario. Se diz - deixo a Mevio
400,000 ruis, 201 alqurirs de trigo, ou outra quantia on somma
certa -, faz ainda n legado.
"Se diz - deixo a Sempronio o me fato de cabras, a minha ra-
nada de varras, o meu rebanho de ovelhas, a minha vara de porcos,
os urvris de minha casa -, etc., faz ainda um legado.
Parece-nos que lia em tudo isto a nccessaria clareza, nem vemos
como possa ocorrer ditliruldade na applicaçào da regra, uma vez que
se no perea de vista, que uma cousa rmas certa universalidade de
objectos, outra cousa uma certa porço de uia generalidade dI bens.
No primeiro caso o objecto é certo e determinado; no segundo pro-
porcional e incerto.
Poderi dizer si que algumas vezes virá o legatarioaachar-se
de melhor condiço que o herdeiro. E possivel; mas como a qualidade
de herdeiro não importa ncss ariamente vantagem a este respeito,
não póde tirar-se d'ahi argumento algum contra a regra. M3as ainda
nesse caso o herdeiro é favorecido a outros respeitos, v. g., pelo di-
reito de acrescer, e outros direitos de que gosa em geral."
Nuo deixam pois duvida as rxplicaç'es do sr. Seabra de que le-
gatario é o beiericiarlo ema valor ou objecto determinado, e herdeiro
o cotimplado com quota indefinida, qualquer que seja a percenta-
gem ou seja na terça ou u'outrai proporção.
Trabem o codigo de processo considera herdeiro o terecracio,
porque no artigo 712. lise manda cotinuar os autos de irrentario
com vista como ao meiro e ao herdeiro, e no artigo 115" manda
ratear as custas do inventa ri pelos herdeiros, terecasrio e cojuge
sobrevivo, oa pelos legstnros.
N'este sentido é iaje a jirisprudeneia. r
Nao é par isso limitado :Sterçra provavel, e pelo contrariap
simo sem restricço a certos e detcrmiados bens, o direito do ter-
enario a licitar rnra vez que se ol rige a entrar ra deposito co
o excesso do seu quinhão; nem o artigo 716. § 1. do codigo de pro-
cesso civil, impondo ao escrivio o dever de apresentar no acto da lici-
tação a nota dos valores hereditarios, teve em vista limil ar a qualquer
dos interessados o direito de licitar até o seu quinho, prejudicando o
disposto no artigo 2129." do presente codigo, e sim regular o exeedea te
á respectiva quota que o licitaute devia depositar.

iAc-ordaos, da Relação de Lisboa d 23 de fevereiro de 1878, da


rlniro- d ri de rise novembro
s r der14, e do Supremo Tribu-
nal de Jrstiçr de 2 de aruil de 1899, R rista de Legislriri e zle
.rririrudre:ia, de (Viabr 14." ano, ri'051 pag. 22, ris/a do
Tlri1uraes, 1G"' anno, n. 272, pag. 183 e Gazeta de Rela ro de Lis-
boa, 13.° anuo, nr 1, pag. 92
2 Accordo do Suprem T'ribunal de Justiça de 3 de dezembro
de 1878, lr'cista de Legislao e de Jurispradencia, de Coimbra, 18."
anuo, n! 895, pag. 17.

k
2>12 ART'IOs 1737? E 1738.°

Ar. 1737." A herança alraíge odos os hens, direitos


e obrigações do a;wlíor dcilia, que :i< forcei ioraluente
jessoas, ou exceptiuaios po disposição do dicsto auctoi,
oui da lei.
(Vid. nota ao artigo 70:.^)

Art. 1738.° Si o ;iíl<r da Ieiraíia, e os seus lerdeirus,


oui Iegtarlos, pe. <ei-eíui tloi nliesilti desastue<, oii o uifes-
1i1) diIm, sem lie si p<ssa averiguar iuaes fraii os qie
se liiaraim priiíiro, repuil'í-se-iio lidlecidos odos ao nwrs-
lio t0iiio, e <li se Nerilicari eltre riies a tralisííssãaí da
hieraniça, ou do legado.

('omw a resmertiva ürotiluig3o ranlueo o u tSllccimento do her-


dci ou do Legatario lanes elo teshador artigo 17;11" u.^ 1.", < a sobr-
vivenreia, lm i.ome<lto que si ja, Irais<itte ois <rdeiros o s
arigo 2011.", qu<si todaa is Iigislaçs<o, a coieçar no direito romano,
trem ixad rígra di solrevivrenia parao a eso de morrrerem o
<ular 1:, 1irança e os herdiros u ligatarias conjuietam<nte no
m ismo drastrC <<mo i'lgumi <i<<<r<gio, iueoudi, ruiia, cmuo do
latlha, etc., ou tio mesmc di. e tio ger:il presme sobrviventes
es que pelo seu six~ <arouil ou pela sua edad tinham robustez
paro rnistirem por ois tempo d <ortu.
2 O osi ei iigo, parem, no intuito de ,irto de evitar eímplica-
ç es e ditelldaíds, e seguiudo o diipoito io «odigo de llíllanda,
presue, loa fata da prova imentrari o ju incumle a yum <'isso
IA tiver inte-ris, terem morrido ao ieaim< tmpo os fallecidos o m
d<saltre, ou no mesmo dia para o eileito d no traísmittirem <<<is
aos outros qiiesu<er direito : e assim morrendo em naufragio p
e iilho sem poder areriguar se qual morreu primeiro, nem o pav sue-
cde o lilho nm o < ilho ao pae, e seguem os bel<s de eada uma
respecli s ierdir<s.
A<tes do registo «r<ado pelo preau<t coligo <no ora obrigatoria
a indiiaçao da <ara coutí hoje artigo 2483.- i 1P; pois que o d<-
ereto de '2 dr abril de 1802 artigo 1?<.° 1. mudavoi dla n
assiito de obito apenas o limo, mrz e dia, e si podendo ser a hora
do f<lleceimuto.
loj a prioridade da morte regula-se pela hora declarada no as-
,ento de oito salvo prova legal em contrario.

R:.
4
ýá
!7.
ARTIGO 1739.0 283

CAI'TULO 11

DA SUtOlSSAO ]TESTA7IENTAIIIA

SECCAO 1

Des testamentos em geral

Art. 17:39.1 Diz-se tostamotio o acto, pelo qual aligutm


dispte, para depois da sua morte, de todos, ou de parto
dos proprios bens.
(Vid. artigo 1754.?)
Mio vale a pena discutir, como fazem varios commentadores, se os
primiros vestigios do testamento se encontram no Egypto, se sta
instituição foi na origem dada por Royss aos Hebreus, e s, a im-
plantação d'ella na Greeia foi retardada pela absorvente tyrania
do estado sobre a propriedade e sobre a familia que deixava no
esquecimento o cidadio e parecia eliminar da vida civil o pae de
familia.
O que basta saber é que o testamento é acto pessoalissimls na sua
essencia.
Não define o codiso o tístamlnato. como o definiam os romanos,
acto sodrne, psrque ie as respectivas formalidades são de direito
particular sem o apparato das foriuilas de caracter publico que em
Roma faziam do testamento uma instituirão po/iica.
Tambem não se indica ia deliíião, coisa prescrevem algumas
legisiaçes, que o testamento deve ser feito com as formalidades
marcadas nalei, porque é
semileiite indicaçio verdadeira redun-
daneia.
Egualmiíeite se não inclue n: detiniçio a circuistancia da revo-
gabilidade, aliás expríssa na nlair parte das leis, e desenvolvida
por íuasi todos os praxistas orqí está mui terminateinate re-
cnhecida em varios srtigos do coligo.
ão reveste o testa ,eniu em eas algun caracter do contracto,
em que intervenami duas vontades, a te q.i'im prmei e e a de quem
a is; e írelicontrario pl sílape O t'et:iílíl nt niltim monto
reiogir a disposiçío, como plde o iustitoido reiíe ia, depoi da
morto do testador o direito ao bnliio, l
qp. ati, prodigalisara.
E tüo individual e du sito natreza tlo rivoga-r este a/o jtridico
que nem pilde sequer renunciar-se o direíito de revogação artigo
17:1?
E u testímento o acto, pdo qn'd iih]n5li dipie porque encerra um
esnqllcxo de (let erminaç3és í ordens, par depois do )orte porque
o testamento constitue apenas um projecto que só tem eflicacia
á morte do testador quee só
á hora da morte se reputa feito, e
1

284 ARTIGO 1740.^


porque não é aos bens que o testador possuia no acto de testar,
mas sim aos que possuia no acto de morrer que se attende, como ao
momento da morte deve attender-se para apreciar a quota disponi-
vel e para regular a capacidade dos instituidos em conformidade do
artigo 1T8 , de todos oe de parte dos bens, porque no direito vigente
não é essencial para a validade do testamento a instituição de her-
deiro, como cra por direito romano, que não permittia morrer parte
testado e parte intestado, e que marcava funíametal difraeraça
catre o testaento que devia conter necessariamente a instituição
de herdeiro, e o codicillo que não tinha semelhante instituição.
A Ord. no liv. 4., tit. 8G.^ pr. ainda dizia, como o direito romano,
oCodicillo é huma disposição de ultima vontade sem instituição de
herdeiro. E por isso se chama codicillo, ou cedula, per diminuição,
que quer dizer pequeno testamento, quando uma pessoa dispõe de
alguma cousa, que se faça depois de sua morte, sem tratar nelle de
directamente instituir, ou desherdar a algum, como se faz nos tes-
tamcitos».
Separava-se, porém, do direito romano o nosso direito em não con-
siderar nsllo o testamento por lhe faltar a instituição de herdeiro.
Não ermittia o direito romano, salva excepção para os militares,
que á sucres-ão da mesma pessoa concorressem herdeiros legitimes
e herdeiros testamentarios, porque devendo o herdeiro succeder is
Uoiersua jus def(ne/i, e ficar representando em tudo o auctor da
ierança, herdeiro testamcntario que concorresse com herdeirolegitimo
não sucedia ia sntersum jus, não era rigorosamente herdeiro, e
testamento sem instituição de herdeiro era cousa inadmissivel na
legislação romana.
Abraçaram as Ordenaçües do reino este systema, que foi respei-
tado até que a lei de 18 de agosto de 1705 só permittiu o uso do
direito romano quando este fosse conforme á boa razào, e a lei de
9 de setembro do mesmo anuo ao prebo, que o decreto de 17 de
julho de 1778 não suspendeu, reprovou expressamente a maxima que
singuem podia morrer pro parte testa/us et pro parle intestatuo, e
acabou de todo desde então entre nós a obrigação de instituir
herdeiro em testamento.
O codig ., porm, perísittindo dispor em testamento de todos ou
de parte dos beuns, e instituir herdeiro, ou repartir os bens por her-
deiros e legatarios, ou distribuir toda a herança em legados artigos
179-1 e 1839.', estabeleceu com toda a clareza uma doutrina siís-
pls e eminentemeute liberal

Art. 1O.7 0 testamento é acto pessoal, que não paíle


ser feito por procurador, nem deixar-se dependente do
arbitrio de outrem, quer pelo que loca a instittição de her-
deirs e de legatarios, quer pelo que respeita ao objecto
da Herançir, queto rtsalinette, pelo que pertence ao cumpri-
r mento, ou no cumprimento, do mesmo testamento.
nnifo. 0 testador ptde, todavia, cosimether a terceiros
a repartição da heratça, quando institue certa generalidade
de pessoas.

Iloje que o syste ma successorio assenta, não na ficçào romana que


não pormittia morrer parte testado e parte intestado, mas siso na
r
ýr4

ARTIGO 1740.^ 285

livre vontade do testador, pdde cada um dispõr de seus bens como


lhe aprouver ou a titulo de herança ou a titulo de legado, salvas as
legitimas.
Mas, por ser arto pessoalissimo a disposição dos hens para depois
da mete, nio póde em easo algum tirar a crgo de procriador nem
a arbitrio de terceiro a estlha, quer de herdeiro quer de legatario.
Por direito anterior, era muito questionado se a instituiço de her-
deiros ou de legatorios podia ser eomíaettida á escolha de terceiro
sempre ou pelo menos n'alguns casos.
Os mais auctírisados praxistas, fundando-se no direito romano, 34
Di. de /aertdt. I ee de -eb. det., e Iastitut. de leq, distinguiam
entre a escolha ititítt, ce dependente do arbitrio de terceiro, que
reputavam nulla, como a institaiião do herdeiro qae F. designasse,
e a escolha entre algiitas pessoas certas, ou cxpressamo te desi-
gnadas pelo testador, ou de possivel designação depois da morte do
testador. como a inetituiçìo iatuelle de seu, sobrinhos oe I'. esco-
lhesse, que rep utavam ,iilida.
Não era, porém, reconhecida pelas nossas leis, apesar de não ser
expressamente codemada, a formula, aliás frequente antes da pro-
nulgação do codigo cisil, de deixar ao testamenteiro ou a outra
pessoa a escolha do irstituido entre os parentes.
E o nosso direito anterior já eào permittia deixar a desiguação dt
herdeiro ou de legatario deptcdente de terceiro, quer para escolier
livremente, quer para optar entre certo numero de pessoas certas,
ou designadas por categorias.
las permittia commetter a terceiro, sobre tudo quando houvesse
instituição de geíeralidtde de pessoas, a designaçâo- dos bens em
quehavia de ser inteirado cada uuí dos instituidos.
hioje, porém, nem a distribuiçdo da terçapelo filho ou filhos do
conjuge o testador 1,íde commetter, porque, com quanto a pessoa
beneficiada se conte entre pessoas certas, fica em todo o caso a de-
termiaçâo da escolha ao arbitrio d terceiro. e
Por direito moderno são ullas todas as fôrmas de instituição em
que o testador directa ou indirectamente abdique do seu intransmis-
sivel direito de designar pessoas ou bens.
Pôde o testador, apesar das prohibiçes fideicommissarias, deixar
para todo o sempre prestaçdes em beneficio dos indigentes. ou para
dote de raparigas pobres, ou a favor de qualquer estabelecimento
ou fuídaçào de mera utilidade publica artigo 1872.0, em hoiíenagem
ao interesse publico. ic
Mas mão pôde appl ar o producto da hcrosí a obras de caridade
á eleiçâo de tereiro, que equivaleria isso a deixar dependente do i

arbitrio de outrcsi a designação de herdeiro ou de legatario, isto


é, das pessoatr beneficiada.
telti mesma razão não pde deixar a arbitrio de terceiro a desi-
gnação da pessoa a quem hio de passar os bens por morte do usu-
fructario; seguindo a propriedade. na falta de designaço em fírma
legal, para os herdeiros do testador á morte do usufructuario.
Não pôde tambem ser commettida aos testamenteiros a partilha

Aecordio da Relação do Porto de 8 de julho de 1881, Revis/a


ýI¡I
de Legislaçdo e de Jurisprdencia, de Coimbra, 15.o anuo, a.o 744,
pag. 247.

1x ;
-19

i,6 ARTIGO 1741"

dos bens, porque elles não tèem por lei senào as attribuiçúes fixadas
no artigo 1899 e não póde o testador auetorisal-os contra as pre-
seripçies legaes artigo 1894?
Pelo presente coiigo apenas podia ser commettida a uma pessoa
au a uni gespo de pessoas a repartiãào da herança entre herdeiros
generioa mente instituidos.
As palavras -roitmetter a tereriro a repartição da herana -
consignadas no § unico, evidentemente reconheciam ao testador,
quando intituisse una generalidade de pessoas, o direito de aueto-
Ii risar terceiro, no só a fixar a natureza dos bens que haviam de
compr o quinhão di cada uma, mas a designar o valar ou proporçào
eal que cada numa havia de receber.
Esta era a doutrina do o artigo 558?. do projecto de cosigo civil
hespanhol, fonte do preente artigo, e redigido nos seguintes ter-
Ines: .Ni iestatt, es ,,, wh, per.onalsiiim,: ss f, rmioiion Io
prde dçj1 rse en imdo ó et parte íl íarl>itrio de u teríero. 7ctompoco
pued d/ji al rirLia ri0 de an tercero la sasisi enia de aI iasitscion
de heredtro ; die Ia mnoatt, ui la deinaioi de s cantidad; pro si el
repartiííiento, cando la dil-sicist comprettne i toda ítua lase de
i persma.tt, c oio psriraie,, pores y criasos,
E Goyena em i nota águelli artigo dizia que a exrepço final
iàra tirada do artigo Gbi. do odigo stiriaco, que era redigido
assir:-«t Ictíítattsi peut absoner t sis heritier oi o uiti tias
la reprüi s d'li i/io iati liUlsesit d/ssr e Ir permns, tomsme
Par re., crpa,: ux ptrents, a.c rlciesijtires et aux pautes. En cria
d'iadterinoatís, c'es /'éritirilir ãui seu chase.
iEm todo o caso só a lírceiro e tio a qualquer dos herdeiros, podia
ser commettida a partilha, apesar de s' reputar cousa muito secun-
daria e muito ditierente da iistitui;ãio d, herdeiro ou de legatario.
i Julgava o legisldor que, no mais stricto rigor, repartir a successão
por hirdeiri instituido síi certa geeralidade, tão era o mesmo
qí eslhr d'essa generalidade os qu havi: m eisser cintemiplados
e.5
e os q u e haviun dr ser excluidos; ou era unia excepção ao principio
que o testamenso é ac/opessoal, que não péde ficar dependente do
arbitrio de outrem.
Meso em plena viginria do codigo civil s sustentou jue, ainda
no caso especial prevenido tio unieo do artigo, o testador só podia
delegar eta ti io o dircita r desiitnar a natureza tios bens em
que cada tsnt ht ia de ser inteirado mas que havia de fixar o valor
destinado a cada u i dos codtepla . Todavia o codigo civil, que
não pernittia ao testador coninetter a ninguem a designação da
quota hereditaria ou do valor do legado, auctorisav a-o a commetter
'ai a terceiro a reparstiçào da herança, e a desiguaço do valor ou do
objecto com que havia de ficar cada uma das pessoas instituidas em
generalidade quando instituisse uma classe de pessoas, como os pa-
rentes, os pobres, os creados, etc.
Mas essa mesma faculdade de commetter a terceiro a partilha
entre certa generalidade de pessoas foi annullada pelo codigo de
processo civil, que nào permiitte commetter a terceiro nem a escolha
das individuos a camteiplar, quando a herança é repartida por certa
11 generalidade de pessoas, pois que nos termos do artigo i69.- e
seguintes não píide ser feita a partilha sem preceder sentença que
dee isisiors sisO si o interessados.
Hoje instituida certa generalidade de pessoas é inta sentença, e
não terceiro, que determina os interessados, e o que a cada un ha de
caber em partilha.

Á
W,~

ARTIGO 171. 287 Av

hloje nem a districiciçao dos bens entre os designados por sentença M


pode ser cicnottida a terceiro.
pelo eodigo dc processo civil lia de o encarregado da repartiçdo
da hlerança declarar cm reqerimento as pessoas que reputa com-
prcehcdidas ca generalidade da instituição, e pedir a citação destas,
e a do icerts por editos, p cra asistircem aos termos di processo,
dos qua s uns e outros plem fferecer articulados e produir provas
1
jý1
e julgada a habiliticço, procrde-se a iroentario, salvo sendo todos
maiores e concordando ia partilha.
A nova doutrina do odigo de processo civil foi introduzida pre-
cisamente para tirar ao testador o direito de deixar ao arbitrio de
terceiro a distrilbcição dos lens no caso de instituir uma generalidade
de pss-as, co s pobre , s afilhados, os parentes, rs mreados, etc.
Jh1 os tribuaes julgarm suprida 1,a falta ce habilitycão de in-
certos pelo processo cspecial cread co n odigo de processo civil ar-
tigo 6iccc e seguintes, pela cabilitccço nos termos do artigo 597.c
do mesmo codigo por se não ter reclamdo em tempo contra as diffe-
reças secundarias que separam os dois processos.

Ari. 1741.0 Não produzirá eifeic algitt a disposir:io,


qle depeder dei iísrucces, ou do rercímúudaue, feitas
a outrem secrltatttcte, oi que se referir a docíi tos não
atheulticos, o1 n[to escriptos e assignados pelo tesador,
ou que, etim, seja feila a favor de pessoas incertas, que,
por algum modo. se não possam tornar certas.

SCo ncllcs as disposiçfls drpendntes de icstrurees secretas ou


com refeecnci a docucetos não daclenticos ou não escr i ptos e as-
signados pelo testador, porque equivalem a deixar ao arbitrio de
outrem a escolha dr herdeiro ou de lcgatario.
Se ao tesrcdcr fosse licito deixar os bens apessoa por elle sere-
tamente indicada n terceiro, seria a final o terceiro o verdadeiro ar-
bitro da instituico do hcedeir, ou do legatario, ficaria a valer não a
vontade do testd-r, e sim a vontade de terceiro a quem svessem
sido feitas as ruccoccedaçtcs secretas, podiam resultar graves de-
lietos oc icnoralidades de ser dispuesado n terceiro de dar contas
do cemprimc to das disposiycjes tetaimetarias, estava descoberto
o meio de illudir as leis sobre iccapacidade e sobre indignidade,
e dercoido o principio geral consignado cco artigo 1740.^
vontade
A do testador não póde ser representada por ninguec
Por não deverficar depediete da vontadede terceiro a effectivi-
dade da disposição iestccunari, se reputa nulla ou não escripta a
condiçlo de ser da vontade doherdeiro adeixa dolegado, poisnomeado
o legatario e designado o legado está feito tudo o qe a lei exige.

t Accordào da Relação de Lisboa de 17 de aoosto de 1898, Gazeta


da Relcd. Ie Lisboa, 12.r acno, c.c il, pag. 399.
z Accordos, da Relcçio do Porto de 1 de maio de 1982, e do
Supremo Tribunal de Justiça de au de março de 1886, Rerista de
Legslaçdo e de Jricsccrcnciu, de Coimbra. 22" anno, nA 1104,
pag. 457 e Boletie dos Tribosaes, 1.° atno, n.- 25, pag. 34.

ÊL .:
1
2188 ARTIGO 1741.

Vale, porém, a determinaço do testador, quer se tracte de her-


deiros, quer de legatarios, quer de distribuiçào da herança, desde que
se refira a documentos authenticos, ou mesmo não authenticos se
estão por elle escriplos e uassignados, porque não pode entâo ser illudida
iem f:lseada a sua vontade.
Assim valem as determiuaç-es em testamento ansullado, que tes-
tamento posterior confirma em simples referencia, considerando-se o
primeiro como documento autlhetico ou escripto e assignado pelo
testador, a que o segundo fez referencia, e portanto comprehendido
nos precisos termos do artigo.
Vale tambem a disposição testamentaria a favor de pessoa incerta,
cque pode tornar-se certa, como se o testador deixa os bens à pessoa
que casar com sua sobrinha, porque ainda neste caso é do testador
e não de terceiro a instituição de herdeiro ou de legatario, pois que
fioa dependente, oão do arbitrio de terceiro, e sim de uc facto, a
deteroionoçdo da pessoa Pela mesma razão vale a disposição testa-
mentaria em que o testador deixa o usufructo a uma pessoa, e a pro-
priedade aos filhos desta, se ela vier a casar, e os tiver.
E valida a instituição a favor de pessoas incertas, sempre que por
dgon modo podem tornar-se certas, contanto que esse modo não
seja o arbitrio de terceiro por ser tal modo absolutamente reprovado
em direito.
E valido o legado deixado ao sacerdote que representa a egreja
onde for sepoltalo o testador, porque o testamento, se não indi-
cou pessoa certa, deelaru o molo de a tornar certa.
Por ser permittida a instituição de pessoas incertas desde que
possam tornar-se certas, é valida a disposição em favor de nascei-
turos, desecendetes em primeiro grau de certas e determinaoas
pessoas, vivas ao tempo da onorte do testador, posto que venha á luz
o futuro toerleiro ou legatario fora do praso dos 300 dias contados
decsde a morte oio testador, artigo 1777
Não é obstaculo ã validade da instituição a impossibilidade de
tornar desde logo ecoss 0s contemplados incertos.
Apesar doas disposiçòes da lei na pratica tem sido reconhecida a
validade do legado aos operarios de u estabelecimento em que são
comprehendidos, além dos existentes, os que os
forem substituindo
ou antes todos os que trabalharem em o estabelecimento du-
quanto
rar, que se vão tornando certos cm oandar do tempo pelo facto de
virem tomar porte nos trabalhos, com quanto nâo possam desde logo
tornar se certos.
E o direito de instituir, alé,o dos que descse logo p odem tornar-se
cortos, tambem os que de futuro podércm troar-se certos. 07o é pre-
judicado pelo preceito do artigo 6oty de rodigo de processo civil,
que não persoitte a partilha da herança sem preceder sentença que
determine quais eao os interessados, pois que a sentença loa de re-
conhecer direito ao beneficio não s aos interessados certos ao tempo
do testamento, mas tambem aos que posteriormente podérem ser
comprehendidos nas elausulas do testamento.

t Accordão da Relação do Porto de 21 fevereiro de 1879, Rrista


de Legislaçào e de Jmrisprutoeci, de Coimbra, l15. ano, ." 757,
pag. 459.

'Md
,

ARTIGO 1742.0 289

A regra - quoies non appuret quis lacres institulus si, institutio


san ealet - é applicavel a toda e qualquer instituição, quer de her-
deiro, quer de legatario.
Jias a nullidade da instituição de qualquer pessoa incerta não
prejudica as restantes lisposições do testamento; as quaes ficam de
pé se por outro motivo não tiverem de cahir.

Art. li'2.Õ A disposição a favor dos parentes do testa-


dor, ou dos de outra pessoa, sem designação de quaes,
repuíaí-se-ha feita a favor dos mais proximos do testador,
ou da pessoa indicada, conforme a ordem da successão
legal.
(Vid. artigo 1708.0)
Para evitar questOes e diliculdades resultantes da desigeação em
termos vagos dos parentes instituides masda a lei seguir a ordem
1 ;gal
da successeo pela preiisupçâo de que o testadar, instituindo
promieuaííente os parrites, seus ou alheios, quizra beneficiar os
mais proximos em grau.
O artigo rege sd o caso de o testador se limitar a dispr a favor
dos parcares seus ou alheios ses mais desigoação.
NVeste caso succedem ossobrinhos conjnctamente com os irmãos
em virtude do direito de representação, pois o artigo chama os pa-
rentes mais proximos do testador coeframe a ordem legal da sueccssde,
e pela ordem legal da successão concorrem os filhos dos irmãos
do fallecido com os tios vivos artigo 1982., por serem para o effeito
da successão legal tão herdeiros os sobrinhos chamades por direito
de representoçáe, como os tios chamados por direito proprio t, e
porque em caso de duvida devem interpretar-se as disposiçôes testa-
meatariiasno sentido mais benigno e fauvravel aos herdeiros ab-
intestado, como era já pela jurisprudencia anterior, salva sempre a
manift-str5ço da vontade do testador conforme o conteido do tes-
tsmieto.
Esta era tambem a doutrina do projecto do codigo civil hespanhol
que no artigo 5G2, fonte do presente artigo, dizia assim: ,La dis-
posicoí líelda simple yC geneialinirle fa cor de los parientes del tes-
tador, se eítiende lecha ei faor de los rias próximos eu grado; Vero
lihri luigar al derecho de represeatacioi coa todos suas efectos, cos
arreglo al titulo seguinte.,
Pela mesma razão instituidos os irmãos em geral, e havendo-os
germaos, cosanguiaeos e uterinos, longe de se dividir a herança
eguatnente por todos, fica cada um dos germanos com quota dobrada
da que pertencer a cada um dos consanguineos ou uterinos, artigo
2001.'
Fundam alguns este preceito na presumpção de que o testador quiz
t'esta fórma especial de instituição attender a ordem da successão
legitima; fundamento aliás iíadmissivel, pois que para ser respei-
tada a ordem legal da successão eseusado era o testamento.

r Accordãos da Itelação de Lisboa de 19 de abril de 1893 e de


3 ei: junho de 1806, Gazeta da Helação de Lisboa, 8.' ano, a." ii3
e 54, pag. 417 e 425, e 1.' anuo, n." 4, pag. 25,
TOu 111 Wa
290 ARTIGO 1742.-

A razão do preceito legal é não se descobrir outro elemento para


a execução da disposição testamentaria.
Por maioria de razão succedem por direito de representação os
sobrinhos conjunetamente com os tios, quando o testador institue,
não os parentes, mas os herdeiros mais proximos; porque o testador
que chama os herdeiros mais proximos quer evidentemente confor-
mar-se com a ordem da suecessão legal r, com quanto já se julgasse
o contrario 2.
Se, porém, o testador dispõe, não simplesmente a favor dos pa-
rentes, mas a favor dos parentes mais proximos, succedem então
os irmãos com exclusão dos sobrinhos, por serem parentes mais pro-
ximos os irmãos do que os sobrinhos. 3
Já se julgou que a deixa em usufruecto á mulher e em propriedade
aos herdeiros d'elle ao tempo da sua morte, quando o testador sabia
que não tinha descendentes nem ascendentes, nem irmãos, nem des-
cendentes d'estes, não reverte em beneficio da mulher, apesar de ser
esta o herdeiro legal do marido, porque a intenção do 4 testador
foi
evidentemente contemplar os herdeiros de sangue , assim como
tambem já se julgou o contrario. s
Quasi todos os codigos permittem a instituição dos pobres em geral,
sem designação de pessoas e com ou sem designação de povo; e para
o caso de falta de designuação do logar declaram uns que são contem-
plados todos os pobres da parochia, e outros que o beneficio apro-
veita apenas aos pobres do logar que participam de soccorros
publicos.
O nosso codigo tambem permitte instituir os pobres como pessoas
incertas que podem tornar-se certas.
Mas o processo judicial marcado nos artigos 669.° e seguintes do
codigo de processo civil é unicamente applicavel ao caso de ter de
se repartir a herança por certa generalidade de pessoas nos termos
do artigo ã1ã0l Iunico do presente codigo.
A favor de indigentes, como a favor dos pobres em geral ou dos
pobres de tal freguezia ou de tal logar, podem ser deixadas perpe-
tuamente prestações em proveito, tanto dos existentes ao tempo da
abertura da herança, como dos que vierem depois, apesar de já se
ter julgado o contrario 6 com fundamento no artigo 1776., quando o
preceito applicavel é o do artigo 1872. que abrange todas as pre-
stações a favor dos indigentes, impostas aos herdeiros ou aos lega-
tarios.

r Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de março de


1895, Gazeta da Relação de Lisboa, 9° anno, n.° 2, pag. 11.
2 Accordão da Relação de 'Lisboa de 19 de abril de 1893, Gazeta
da Relação de Lisboa, 8. anno, n.- 53, pag. 417.
3 Accordão da Relação do Porto de 9 de dezembro de 1870, Revista
de Lrgislação e de Jurisprudencia, de Coimbra, 4. anuo, n. 183,
pag. 424.
4 Accordãos, do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de junho de
1897, e da Relação de Lisboa de 24 de fevereiro de 1898, Gazeta da
Relação de Lisboa, 119 anno, n." 34 e 70, pag. 269 e 553.
5 Accordão da Relação de Lisboa de 7 de outubro de 1896, Ga-
zela da Relaço de Lisboa, 10.m ao, n. 44, pag. 345.
s Accordão da Relação do Porto de 21 de novembro de 1873, Di-
reito, 6.$ anuo, n. 6, pag. 93.
ARTIGO 1743.s 291

Art. 1743. 0 testador pôde dispôr, quer pura e simples-


menle. quer om certas condições, comtanto que estas no
sejam irupussiveis, absoluta, ou relativamente, ou contrarias
à lei.
p unico. As condições impossiveis, absoluta, ou relati-
vamente, ou contrarias á lei, tèem-se por não escriptas, e
nIo prejudicam os herdeiros, ou os legatarios, ainda que
o lestador disponha o contrario.
As condiçoes physicancste impossiveis, quer absoluta quer rela-
tivaimete, como as contrarias is teis, reputam-se nio escriptas nos
testamentos onde iliantnr et non ritiant como dizem os doutores, e
aulam os contractos slvo se a impossibilidade é só relativa á
pessoa artigo 67Q.
Pr contrarias à lei reputam-se nào escriptas as condiçcs que
inhibirem o instituido de casar ou do deixar de casar, ou que o obri-
gareIs a tomar ou a deixar de toear o estado ecelesiastico ou certa
e determinada prolssào, artigo 10.
Contraria a direito é tambe a obrigação imposta aos legatarios
de viverem junetos e de possuirem em comuím o objecto legado
por ser ineompativel a obrigaçào da vida em commnm com¯ o di-
reito originario de liberdade, que é inalienavel e não admitte limi-
taçíe que no resultem da lei form:l e expressa artigos 364 ° e
368, e porque a lei aberta.nente condeina a clausula da indivisão
da propriedade artigo 2180.^
Contraria ião é, porém, à lei a condição de ser obrigado o in-
stituido a viver em certa e determinada casa, ou de no alienar bens
a favor de certa e determinada pessoa, como illegal não é a condiçào
de tomar o terdeciro ou o legatario o sobrenome do testador apesar
de respeitavris opiies em contrario.
A eiídiçâo de estar no serriço do testador o legatario ao tempo
da m.ort reputa-se cumprida ainda não o sendo sempre que o cum-
primscnto fôr impedido, nao por culpa do interessado, mas por força
maior, coíl se o legatario estiver fóra da casa ao tempo da morte
do testador para tractar-se de unia doença.
Não escriptas se reputam as condiçies inintelligiveis, inuteis ou
irrisorias, e as facaltativas ou dependentes da livre vontade do in-
stituido que são menos uma condiçào do que sima simples indicaçào
do desejo do testador. -
A razão por que a condição impossivel.prejudica a liberalidade em
doaçlo entre vivos e io prejudica a liberalidade cm disposição de
ultima vontade no é, como alguns pretendem, porque o ajuste de
clausulas impossiveis plysica ou moralmente nos contractos signi-
fique menos desejo de contralir lobrigamJes, e no testamento que é
acto serio deva attribuir-se, nào a presumipçso de gracejo, aias a
inadvertencia do testador.
Em boa logica não se encontra fundamento para as clausulas im-
possiveis deitarem a terra o contracto e deixarem de pé o testamento

1
Aceordão da Relação do Porto de 13 de março de 1683, Direito,
16; anno, n,' 28, pag, 867.
Ii
-i

292 ARTIGOS 1744., 1745^, 1746. E 1747:

Talvez o legisla or quizesse dispensar nos disposições de ultima


vontade o cumprimeíto de condiçòes impossiveis ou contrarias aos
bons costumes, não só por não intervirem os herdeiros e os lega-
tarios no testamento mas ainda por haver o testador epesar da con-
dição manifestado claramente o desejo de a cousa ser antes para
o instituido do que para os herdeiros legitimos, e considerasse nos
contractos a condição como causa uuica da convenção, e portanto
coro desapparecendo com o desapparecimento da condição o motivo
principal da obrigação.
O que, porém, do confronto de taoes disposições resulta é que o
legislador tracta agora como tem tractado sempre com especial favor
as disposições de ultima vontade.

Art. 174t'.° Se o cumprimento da condição for impedido


por alguem, que lenha interesse em que ella se não cum-
pra, ter-se-ha por cumprida.
Não perde o legatario o legado que lhe foi deixado com a condi-
ção,por exemplo, de auxiliar o herdeiro na liquidação e arrecadação
da herança se o herdeiro systematieímente lhe recusou os serviços,
como nos contractos deixa de responder por perdas e damnos o que
não cumpriu por facto do outro contrahente.

Art. 1745." A invocação de uma catsa falsa será tida por


não escripta, excepto se (lo proprio testamento restlttar,
que o testador não leria feito tal disposição, se conhecesse
a falsidade da causa.
Art. 1746.° A invocação de nina cansa, quer falsa, quer
verdadeira, conraria á lei, produz sempre a nullidade da
disposição.
Nada influe na instituição do herdeiro ou do legatario a invocação
de causa falsa, salvo quando só por essa casa foi determinada a in-
stituição como se o testador faz segundo testamento com o funda-
mento de ter morrido o instituido no primeiro por ignorar que elle
ainda vivia.
Outra é, porém, a solução se a causa invocada é contraria álei.
Se a razão que o testador dé da escolha do herdeiro ou do lega-
tario, é, por exemplo, ser o instituido insigne na pratica do crime,
é nulla a instituição, quer seta falsa, quer verdadeira a causa,
porque tal causa indica da parte do testador ou desarranjo mental,
ou sentimentos de immoralidade que a lei não deve garantir nem
reconhecer.

Art. 1747.° A designação do tempo, em que deva come-


çar, ou cessar o effeito da inslituição de herdeiro, ter-se-ha
l por não escripta.
(Vid. artigos 1810.' e 1849.)
Não auct&risa a lei nem a acceitação nem o repudio da herança
até certa epocha, ou desde certa epocha, artigo 2022.°

~1
*

ARTIGO 1747.0 293

Só dois modos de aeceitafão da herança o codigo reconhece, ou


pura e simplesmente ou a beneficio de inventario, artigo 2018"
Como consequeuria ainda da legislação romana que só ao herdeiro
e não ao legatario applicava o principio de nào se poder morrer parte
testado e parte intestado, ter-se por nào escripta a condição que
designa o tempo em que deve começar ao ecssar o efleito da insti-
tuiçlo de herdeiro.
A obrigação de conservar para transmittir não por morte, mas
passado oni perodo determinado, como de vinte, trinta ou quarenta
,nnos o' sem valor, porque a designação do tempo em que deva co-
meçir ou cessar o elfeito da institniçào de herdeiro tem-se por não
escripta.
á eni direito anterior não era permittida a instituição de tíer-
deiro ea die ou ad diem, poeque omissas como eram as leis patrias
sobre o caso regia como subsidiaria a legislação romana, e o direito
romano era incompativel coi taes instittiçóes, pois nào reconhecia
herdeiro testamentario para a breve trecho sersubstituido por
herdeiro legitimo, e vice versa.
Nada haveria que obstasse htje à fixação de tempo para começar
ou para cessar a instituição de herdeiro, porque a legislação me-
deria no obedece ao principio consagrado em Iloma-c-teo pro
parte teatIus el parle inteotatus moicltr et setel loaeres si míper
/larrs--.
t nosso coligo, porém, reproduziu a provisão da lei romana, nMo
eio gomniagem ao principio supersticioso de ninguem dever morrer
parte testado e parte intestado, e sim talvez para nào reconhecer
uaa especie de sucessão interina, in diei ou e die, que péde ser
pcrfoitente substituiíta peta tia do usfrocto em separado da
propriedade, quando legatario e credores téem todo o interesse em
que com promptidào se faça a aeceitaçào ou o repudio deßnitivo da
herança, artigos 1838.° 1 e 2041
Valida e noo fideieonnisstria é a clausula de reverso dos bens
para determinada pessoa se o instituido fallecer antes da maiori-
dade, porqu não importa a obrigação de conservar e transmittir
oeo a designação de tem po para começar a institniçào, e sim uma
dispiosiço dependente de evento incerto e futuro. i
Legal é tambem a substituiço do herdeiro instituido para o caso
oneste noo viver ao termo do usufructo, porque nem equivale esta
fórma de institnição à designação do tempo em que para o instituido
coeça a qualidade de herdeiro visto tractar-se de uma institniçào
condicional ?, nem é fdeicomissaria visto não ser encarregado o
instituido de conservar e de transmittir os bens por mrte, nem
importa a desiguação do tempo em que deve começar o efeito da
deixa.
São assim permittidas as deixas para o instituido toar conto dos

SAcecordào do Relação de Lisboa de 22 de novembro de 1893,


Gazeta da Relaçt de Lisboa,. 7. an'o, n.^ 51, pag. 40l.
2 Acriolas, do Supramo Tribunal de Justiça de 17 de outubro
de 1891, e de 18 de março d 1892, e da Relaçlo de Lisboa de 22
de novembro de 1893, lis/, dos Tribnes, 7. tono, n.' 271 , pag.
129 e 130 e n.' 2$9, pag. 424, Direito, 31.1 auto, n. 6, pag. 95.
294 ARTIGO 1747.-
bens só em certa edade', ou para serem capitalisados os rendimen-
tos e entregues ao instituido só em certa edade2, porque não fica de-
pendente a instituição de chegar o beneficiado a essa edade e sim
apenas suspenso durante certo tempo o goso dos rendimentos.
Mas vale o legado para ter ejleito só passado certo tempo, artigo
1849.0, como pela mesma razão vale para acabar passado certo
tempo e bem assim as doaçes feitas nos mesmos termos.
Por isso pôde ser deixado legado ao menor para qjaando chegar à
i maioridade, e não póde elle antes d'essa epocha exigil-o ainda que
se emancipe.
Mas a suspensão da execução por certo tempo não é o mesmo que
a designação do tempo em que deve começar ou cessar a instituição
de herdeiro.
A condição, que se limita a suspender por certo tempo a ereeoçâo
da disposiçôo, não impede nem o herdeiro nem o legatario de adqui-
rir o direito e de o transmittir ainda que falleça antes, artigo
1810.°; porque a condição, que apenas suspende a execucçã, não se
confunde com a condição de que depende a realisaçôoda instituição.
Não obsta á transmissão do direito para o instituido logo à morte
do auctor da herança, nem á nova transmissão do instituido para
os seus herdeiros, a condição que na apparencia representar um
acontecimento incerto e que no. fundo for apenas um meio de spen-
der a execurç da disposição.
Assim adquire logo á abertura de testamento os direitos succes-
sorios que4ransmitte a seus herdeiros o instituido para quando mor-
rer o pae do testador porque é certo que o pae do testador ha de
morrer.
Não produz, porém, efeitos alguns antes de verificado o acon-
tecimento incerto a instituição dependente da realisaçdo de con-
dição, visto dirigir-se semelhante cotlição, nóo simplesmente a sus-
pender a execução da disposição, e sim a impedir a acquisiçâo ou a
transmissão do direito em quanto se não verifica o acontecimento.
Assim a instituição do filho para o caso de passar a segundas
nupeias a mãe cria apenas una esperança que o instituido não trans-
mitte aos herdeiros se muorrer antes do segundo casamento da mãe
por obstar á transmissão a condição suspensiva; como caduca o
beneficio, e não é por isso transmissivel aos herdeiros, se a acqui-
sição do direito depender da chegada de navio que anda no alto
mar o o instituido fallecer antes do navio entrar no porto.
Não regula o codigo, por não ser necessario, as instituiçóes de
herdeiro sob condiçóo resolutiva que aliás permitte.
Mas é essencialmente differente a condição resolutiva da dsiq;?a-
çdo do tempo em que ha de cessar o effeito da instituição de herdeiro,
porque a condição resolutiva, longe de fixar o dia, mez e anno em
que o effeito da instituição ha de cessar, deixa-a dependente de
evento incert.
Daqui derivam as seguintes conclusós:
L Nóo é valida a institiiçào de herdeiro com a designação de
tempo para começar ou acabar, isto é, para principiar em 1 de ja-

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de junho de


1888, Boleti dos Tribsnacs, 4.° anno, n. 137, pag. 104.
2 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de abril de 1891,
Boletim dos Tribunaeo, 6,° anuo, a." 246, pag. 440.
ARTIGOS 1748. E 1749y 295

neiro de 1902 ou para acabar em 31 de dezembro de 1910. Mas póde


marcar-se nos legados, ão. só o tempo em que hão de ler efi cito,
seno tambei o tempo em que ho de acabar, isto é, pede determi-
nar-se que o pagamento da pensão ha de começar em 1 de janeiro
de 1902 ou que ha de cessar no dia 31 de dezembro de 1910.
2.' Não se confunde a iastituição sob condiçao suspensiva com a
suspensão da execuçào por certo tempo; pois na instituição sob condi-
ção suspensiva nada póde transmittir o instituido antes de realisada
a condiçào, porque antes disso tem apenas una expectativa que só
pelo adimplemento da condição pôde converter-se em direito adqui-
rido, e a simples suspensão da execuçâo não prejudica a aequisiçlo
do direito desde logo e a transmissão para os herdeiros ainda que
o instituido falleça antes de findo o periodo da suspensão.

Ari 1748. É nullo o testamento extorquido por violen-


cia, ou captado por dolo ou fraude.
Art 1749.° Quen, por dolo, fraude, ou violencia, impe-
dir que alguem faça as suas ultimas disposições, será pu-
nido nos lermos da lei penal; e, sendo herdeiro ab-intes-
tato, licará, além disso, privado do seu direito á herança,
que passará ás pessoas, a uem competiria, se tal herdeiro
já não existisse.
(Vid. artigo 1782.)
Regulam os dois artigos as duas bypotheses de ser extorquido ou
de ser impedido o testamento por violencia, dolo ou fraude.
A penas criminaes estão eaalmente sujeitos os que impedirem a
disposição da ultima vontade, quer obstando a testamento novo,
quer obstando a revogação de testamento ji feito.
Além d'isso ficam privados da successào ab intestato quando her-
deiros legitimos, como quasi sempre ha de acontecer porque ordina-
riamente é o herdeiro legitimo o que tem interesse em impedir o
testamento, como inhibido fica de aproveitar-se das respectivas dis-
posiçdes o que impedir a reiogação do testamento já feito, quer seja
herdeiro legitimo, quer pessoa ectranha, artigo 1782.'
Tambem o que obteve a revogação do testamento por meio de
fraude ou de violencia não póde depois aproveitar-se de quaesquer
vantagens que lhe tenham sido feitas em testamento anterior ar-
tigo 1978, apesar de só aos que impdeím o testador de fazer ou
de reiogar o testamento, e nio aos que alcançam testamento de
novo, se referirem os artigos 1749.' e 1782.', porque uma vez jul-
gado que o testamento foi obtido pela violencia ou pela fraude, ra-
dicalmente nullas são todas as suas disposições.
A privação da herança, porém, em qualquer dos casos menciona-
dos, só por sentença póde ser decretada, salvo com relaçào aos
condemnados par haverem attentado contra a vida do testador ou
por terem por qualquer fórma para isso concorrido, e com relaçào
aos que por ameaça, fraude, ou violencia tiverem impedido o tes-
tador de revogar o testamento, que ficam ipsofacto excluidos da sue-
cessào independentemente de acção civil.
O herdeiro legitimo que de qualquer fórma attentou contra a vida
do testador não carece de ser desherdado em testamento e com ex-
pressa declaraçâo da causa conforme os artigos 1876.i n, 1." e
-1101
296 ARTIGO 1750.0

1979.% desde que tenha sido condemnado nos termos do artigo 1782.0
que nós reputamos em vigor apesar de no codigo penal de 1886
tão vir mencionada entre os effeitos das penas artigo 74- a inca-
pacidade de succeder.
Mas, em quanto não for condemnado, como auctor ou cumplice,
por sentença com transito em julgado, nào perde a qualidade de
herdeiro o que assassinou, ou contribuiu para o assassinio do auctor
da herança, e póde mesmo dispêir do direito suecessorio salvo aos
interessados o direito de rescisào. Nào póde, porém. receber por
obito da victima os bens que lhe couberem em partilha sem as eo-
telas prescriptas no artigo 730.0 do codigo de processo civil, desde
que aos autos se junete certidão de estar pendente o processo cri-
mial.
Da pena civil ainda o testador póde relevar expressa ou tacita-
mente os delinquentes conforme o disposto no § unico do artigo
1782., como era já pela Ord. liv. 4.° tit. 84.°, mas da pena criminal

Não era táo com p leta a doutrina dO projecto primitivo que parecia
sujeitar o delinquete, quando herdeiro legitimo, simplesmente á
pena iril de privação do direito à herança, e no is penas crimi-
naes, como se mostra do artigo 1881.', corecpordente ao artigo 1719.'
do codigo, que eru redigido assim: ,O que, por dolo, fraude, 0u
violencia, impedir que alguet faça a sua ultima disposiçào, sendo
herdeiro ah iniestado. perderá o seu direito à herança; e. sendo qual-
quer outra pessoa, será punida com a pena de um a dois annos de
prisão..
Nas disposiçýes geraes dos artigos 328.°, 329.' e 379.o do codigo
penal está prevista a criminalidade dos que por violencia e ameaça
contra as pessoas extorquirem ou impedirem o testamento.
Mas no caso de fraude quando se 0:o verificarem todos os elemen-
tos constitutivos do crime nos termos do codigo penal fica o deliu-
quente sujeito só ás penas civis estabelecidas no presente codigo.
ilMais completas eram as providencias da Ordenaçào, que no liv. 4.',
tit. 81. se inscrevia : «Dos ioe prohiem a algumas pessoas tozerem
seus lístamentos, 000 aa cotterigen, a isso, no 1." determinava que
«imspedir fazer o testamento é sol sómrnte toler ao testadc afaoeddade
de livremente testar, mas tambem defender ao totelliào, ou i pessoa que
hosrer de escrever n trsoannto, que ndo entre onde o testador esti, ou
as testemnhas ecessarios, e chamadas parao tal icto, ou fÍoor-lhe
sobre isso omeaças., e no S 4.° applicava a quem constrange outrem
com medo, força ou ameaças a que faça testamento, e n'ele o institua
ou a outrem por herdeiro ou legatario, o disposto para os que tolhem
a outros fazer testamentos-.
O moderno codigo civil italiano no artigo 725>' considera ina-
pazes de succeder por indignos: 1.0 os que attentaram contra a vida
do auetor da herança; 2.' os que o accusaram de facto sujeito a
pena criminal, tendo sido depois declarada calumniosa a accusaçlo;
3.' os que o violentaram a fazer testamento, ou a alterar testamento
já feito; 4.' os que o impediram de fazer testamento ou de revogar
testamento já feito, ou que supprimiram, occultaram ou alteraram
testamento posterior.

Art. 1750.° A auctoridade admiíislrai-a, que liver no-


ticia de que algeam impede outrem de testar, apresenar-
se-ha, sem deííora, em casa da pessoa impedida, com um

4k
ARTIGOS 1751." z 1752" 297

tabeltião e as necessarias testemunhas; e, verificado o es-


tado de coacçauo, fará lavrar o competente auto, para ser
remeltido ao miíisterio publico, e collocrá a dicta pessoa
em estado de liberdade, para fazer as suas disposições.
E à auctoridadeadoinistratira,que tanto pode ser o administra-
dor do concelho, como o regedor de parochia, como qualquer outro
aete de ordem publica encarregado de velar pela liberdade pes-
soal dos cidadàos, que expressa e especialisete incumbe a obriga-
çào de garantir.o direito de testar, attribuiçào que a Ord., liv. 4.,
tit. 81.° dava aojsio da terra, porque noese tempo nào estavam de-
lititautas as fuitç,es judiciaes e administrativas e competiam aos
juizes attribuiçces de policia e de admiuietravàeo.
No 5.° dizia a citada Ord., liv. 4.°, tit. ."-E mandamos que
tanto que vier à noticia do juiz da terra, que ha alguia pessoa, que
deixa de fazer testamento por medo de seus parentes, estando doente,
ou lh'o impedem, ou de taesquer outras pessoas, posto que ninguem
io peça one requeira, d seu otlicio vá á casa d'esse doente, ou im-
pedido, e faça vir un tabellià,. e as testemunhas necesoarias, com
as quaes possa o testad' livrettente fazer sou testamento -
A lei nova, como a lei velha, impàr á auctoridade admii eratioa
a obrigaçáo, nào só de ir sem demora verificar o estado de coacçio
do cidaddo, mas de levar logo tabeltio e testemunhas para elle
poder exercer immeditamente o direito de testar, rapidez tanto
mais necessaria quanto que de ordinario é no caso de doença grave
em que o enfermo nào supporta grandes resistencias que mais
ntíímí sobre elle os herdeiros legitimes.
0 urtigo apesar de referir-se apenas ao facto de ser impedido o
testamento, talvez por ser mais frequente impedil-o do que extor-
quilo, abrange tambem o caso de ser comp//tdo o testador a testar
porque a razào é a mesma, pois o facto de impedir e de coítpellir,
além de ter a mesma gravidade aos olhos da razào e da cooscieícia
publica e de reclamar a mesma protecçào da auctoridade, é egual-
mente incriminado no artigo 329." do codigo penal, que pune como
priso de um 1ez a um anoe muta correspondent todo o particular
qie sem auctorisaçào legitima empregar actos de otffensa corporal
para obrigar outrem a que faça alguma cousa tu para o impedir
que a faça.

Art. 1751." E nulLo o testameuto, em que o testador não


expresse cumprida e claramenle a sua von/ade, mas sim
por signaes ou monosyllabos tão smente, em resposta a
perguntas que se lihe fizessem.
(Vid. nota ao artigo 1912.")
Art. 1752. 0 testador não pôde p rohibir, que se ini-
pngtíe o testamento nos casos em que'haja nullidade de-
clarada pela lei.
Reputa-se nào escripta a prohibiçáo de impugnar o testamento
eivadode nullidade decretada por lei por ser n/lo e no aproveitar
298 ARTIGOS 1753.° t 1754.-

a ninguem o que é feito contra direito expresso, Ord., liv. 3i,


tit. 35.- pr., assento de 9 de abril de 1772, alvarás de 24 de feve-
reiro e de 13 de novembro de 164, e artigo 10.' do presente codigo.
Dá a lei ao testador plenissimo direito de impêr encargos e con-
dições aos herdeiros e legatarios que atacarem o testamento. Mas
não lhe dá a faculdade de prohibir a impugnação do acto juridico
por falta de solemnidades prescriptas na lei como por falta de nu-
mero legal de testemunhas, porque as formalidades dos actos juri-
dicos, como pertencem á esphera do direito publico, não podem estar
dependentes da vontade dos particulares.
Não fica portanto privado do beneficio testamentario o que im-
pugnar a disposição de ultima vontade com fundamento em nullidade
declarada por lei, ainda que seja julgada improcedente ou não pro-
vada a impugnação, porque nenhum aggravo faz á memoria do
defuncto o que pretende pôr a claro a authenticidade e legitimidade
do testamento.

Art. 1753. 0 N9o podem testar no mesmo acto duas ou


mais pessoas, quer em proveito cotrmum, quer em pro-
veito de terceiro.
unico. Esta prohibição não abrange os testamentos de
mão comtuím, que tiveram data authentica ao tempo da
promulgação do presente codigo, e não forem revogados.

(Vid. nota ao artigo 1180.°)


Àcabou o codigo com os testamentos de mão rommum, que ape-
nas se differençavam dos outros em serem feitos n'oma só carta que
comprehendia tantos testamentos quantos os contestadores, que só
tinha força e transmittia direitos por partes á morte do respectivo
contestador, porque representavam um mioto de disposição por morte
e de contracto, o que era incompativel com a revogabilidade em ma-
teria testamentaria e prejudicava o principio de que o testamento
é acto individual ou pessoalissimo.
Tinham além disso outros inconvenientes, como a falta de espon-
taneidade de algum dos contestadores, os perigos de faceis sugges-
tòes e de evidentes captaçes, especialmente entre marido e mulher
dos quaes o mais debil era de ordinario victima de sedueção e do
engano do mais energico que impuha a sua vontade ou o seu capri-
cho, e finalmente porque não raras vezes suecedia dispôr o contes--
tador sobrevivo como queria de seus bens depois de se ter aproveitado
das disposiç(es do predefuucto, revogando pela sua parte o testa-
ment pelo principio de que tudo quanto era ordenado para o tempo
á
da morte podia ser revogado até morte, Ord., liv. 4., tit· 37.' pr.
Por isso is codigos, que ainda hoje arceitam esta fórma de testar,
cercam-na de todas as cautelas necessarias para evitara influencia,
a suggestão, e a coacção de uns sobre outros dos contestadores.

Art. 1754.1 0 testamento pôde ser livremente revogado,


no todo ou em parte, pelo testador, que não pôde renun-
ciar este direito.
(Vid. ntta ao artigo 1739.')

n;ál
ARTIGO 1753.0 **
Art. 1755.0A revogação, porém, do testamento, no todo
ou em parte, só pôde ser feita em outro testamento, com
as solemnidadas legaes, ou por escriptnra publica, ou pelo
facto de haver o testador alienado, antes da sua morte, os
objectos testados,
unico. Se o testamento revogatorio contiver tambem
disposição de bens, o, n'esta parte, for aunullado por falta
de alguma solemnidade, surtirá, comtudo, a revogação o
seu elieito, se elle poder valer como escriptnra publica.

Em regra só quando valido póde o segundo testamento romper o


primeiro, como já determinava o direito romano, e era seguido no
silencio do nosso velho direito pela maior parte dos praxistas, com
quanO no fosse uniforme a pratica de julgar.
Com fundamento na Ord. liv. 4.>, que no tit. 84.> § 2.> dispunha
que «tendo uma pessoa feito já seu testamento, se o quizesse revogar,
e os herdeiros instituidos ih'o impedissem, o que já tinha feito não
valeria cousa alguma, por quanto o testador tivera vontade declarada
de o revogar, se se lhe são impedira-, chegou a julgar se revogado
por testamnento posterior, t em que faltavam colemnidades leg aes, tes-
tmento anterior valido , como se a disposiç5o da citada Orde-
nação nào fosse especialissima e excepcional, destinada a castigar
a opposiçào feita pelos herdeiros á revogaçào do primeiro testa-
mento, que a nenhama outra hvpothese podia ser applicada.
O codigo, porém, sem deixar de reproduzir muitas doutrinas do
direito romano na materia, para cortar gaestes levantadas na
vigencia da lei anterior introduziu de novo o Ç unico, que não vinha
no prejeeto primitivo e que foi acerescentado pela cosamissoo revi-
sora logo nos trabalhos da primeira revisão, para permittir a revoga-
çào de testamento valido por testamento orllo quando o testamento
nullo pudesse valer como escriptara publica.
Não se respeitou aqui a maxina « Res eodem so/o dissoli debrent
8u foornt co/ligatae, ou antes não exigiu o legislador tantas for-
malidades para o testador voltar á ordem legal da suoecessão como
para se desviar d'ella.
Para revogar a disposição de ultima vontade em questão de dis-
posição de bens não á preciso pelo codigo titulo de categoria egual
ao necessario para fazer testamento. Basta documento com as foerma-
lidade de escriptura publica.
Assim o testamento pu b lico, coso o testamento cerrado cuja força
probatoria é a mesma artigos 2422.>, 2423.° 3.> e 2426.-, que são
vale como testamento se tiver, por exemplo, só quatro testemunhas,
revoga apesar de nullo o testamento anterior valido se retnir os
requisitos indispensaveis á eseriptora publica, como o revoga a sim-
ples escriptra publica ainda que não fosse feita para aquelle unico
e exclusivo fio, se o testamento revogatorio contiver tambem dispo-

o Aceordão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de agosto de


1858, Gateta dos Tribunaes, n.> 2:677.

ýìië
30! ARTIGO 175.

sição de bens, e se n'stapartefor anuallado por falta de alguma sole.


mnid:de.
Quanto ã disposição de bens, pois, o testamento nullo por falta
de formalidadee externas revoga o ts taimento anterior uma vez que
,xlha como escriptura publica; e mesmo ás escripturas anteriores
é promulgaçào do codigo é applieavel o artigo, visto não haver no
direito velho disposição em cantrario.1
E nem carece de ser expressa a revogação. Basta a incompatibili-
dade das disposições posteriores com as anteriores, como era pelo
projrctí do codigo civil líespanhl fonte mais abundante do nosso
codigo.
Pela mesma razão vale o legado de certa somma como devida ao
testador, ainda que devida não fosse, artigo 1818., desde que é c-n-
fessada ou reconhecida em testamento, apesar de só em cescriptura
publica poder ser confessada divida de certa quantia em diante,
nota ao artigo 1534
Dias nem mesmo escriptura publica é precisa para revogar o tes-
tamento, porque o artigo 1942. permitte alt rr o testamento in-
de pendentemente de escriptura publica e até de qualquer intrvenção
de otlieial publico simplesmente por letra do testador com resalva e
assiEnatura, e no só sobre disposio de bens como sobre qualquer
ponto elas determinações testamentarias, o que se explicará no lugar
competente.
O testamento nullo só póde revogar testamento anterior valido
quando contíver tambem disposição de bens, nesta parle for an-
nullado por falta de solemnidades, e reunir os requisitos de escri-
ptura publica.
Mas por emenda particular póde ser revogada em qualquer ponto
a disposição de ultima vontade sem outras formalidades que as pre-
seriptas no artigo 1942.-
A alteração do testamento por emenda particular do testador é
novidade no direito portuguez, e uma especie de testamento ologra-
pus reconhecido nalgumas legislaçòes.
Ila de, porém, prevalecer o artigo 1942.0 tanto sobre o artigo
l755^ como sobre o artigo 1922.° n. 4., porque é excepção és rcyrs
gemes prescriptas em cada um destes dois artigos; e assini esc e-
conhecido ia jurisprudenci dos tribunaes.
Tambem hie é corrente, que no testamento quer publico quer par-
tieular iRo póde o testador revogar coli ofensa de direitos de ter-
ceiro as confissòes ahi feitas, nem negar a perfilhiaçào que em
testamento fizera por uno dever estar dcpetdentc da instabilidade
do lomm a declarao da paternidade.

Art. 1756.° A feitura do segundo testaíenlo, que não


mencione o primeiro, só revogará esle na parIe que lhe for
contraria.

t Accordo do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de julho de


1872. Dirilo do Gorero, u.° 11;7 do mesmo ano.
7 Accordo da Relaçào do Porto de 27 de junho de 1820, fleista
doo Tribtutea; 18. atno, n 413, pag. 73.

d
6

ARTIGOS 1757. E 1758.- 301

unico. Se apparecerem dois teslamentos da mesma


dala, sem qe se pssa verilifar qual foi o posterior, e im-
plicarem conraidieção, ravei se lao por no esrriptas em
ambos as disposições contradlctorias.
Art. 1757. A revogação produzirá o seu effeito ainda
que o segundo testamento cadique pela incapacidade do
herdeiro o dos legatarios novamente nomeados, ou pela
renancia d'aquelle ou d'estes.
Art. 1758." O leslamento anterior recobrará, todavia, a
sua força, se o testador, revogando o posterior, declarar,
que r sua vontade, que o primeiro subsista.

JA pela jurisprudencia anterior i promulgaçào do codigo, confe-


renia da Associação dos Advogados de Lisboa de i de dezembro
de 18701 o testamento posterior que não revogava expressamente
o anterir só o invalidava na parte incompativel, por se considerar
o testamento rma lii, e não tirar a lei posterior força á anterior se-
no quando a revoga expressamente ou quando estabelece disposi-
çBes com ella incompativeis
Não deixa de ser revogado o testamento anterior valido pelo tes-
tamento posterior que cadaca por não poderem ou não quererem
os instituidos acceitar, porque a caducidade não importa falta das
solemnidades que constituem a prova legal e authentica da mudança
de vontade do testador.
De certo por ser rarissima a hypothese rão continha o projecto
primitivo a disposição cosignada ao § unico do artigo 1756 , intro-
dnzida pc la coirissão revisora logo nos trabalhos da primeira re-
visão, que declara não escriptas as disposições contradictorias
quando se oio podér averiguar qual dos testamentos 5 posterior por
terem ambos a mesmna (tta que nos testamentos cerrados é a do auto
de apprivação, pela mesma raz o por que se reputam não escriptas
as disposições testamentarias quando testador e instituido fallecem
no mesmo dia sem poder apurar-se qual falleceu primeiro, artigo
1738.°
Para dar de novo força ao testamento revogado nao é preciso
reproduzir as mesmas disposiçoes. Basta declarar o testador no tes-
tamento ultrior que quer que subsista o anterior.
Os preceitos dos tres artigos regem egualmente as doaçOes por
moste, não só por serem as mesmas as razúes de decidir, mas tam-
bem por se rem expressamente applicaveis as leis reguladoras dos
à
testa mcutos as doaçes que só têem effeito morte do testador salvo
o disposto para as doaçóes em casamento artigos 1179.° e 1457.°
Com o fundamento de não estar comprereadida 2 a esperto em
nenhum dos casos de caducidade marcados na lei já te julgou sub-

1 Boletim da Revista critica de Jurisprdeíicia geral e Legislação,


tom. 2., pag. 125.
SAcecordáo da Relaçào do Porto de 4 de fevereiro de 1879, Di'
reito, 12,- anno, n, 1, pag. 15.

Ã:ý_
--a

302 ARTIGO 1759.

sistente o legado feito em testamento anterior ao casamento segundo


o costume do reino, e se reconheceu ao legatario no caso de sobre-
vivecia ao testador o direito de levantar e legado além da meaçdo.
E, porém, inacceitavel tal jurisprudencia, porque o testador pelo
facto de entrar com o objecto legado em communhão de algumafórma
alienou a cousa legada artigo 1811.0 n.° 1.

Ar 1759.5 As disposições testamentarias caducam, e


ficam sem effeito, em relação aos herdeiros ou aos lega-
tarios:
4.° Finando-se estes antes do testador;
2.O Se a instituição de herdeiro ou o legado estiver de-
pendente de condição, e os herdeiros ou legatarios se fia-
rem, antes que esta se verifique;
3.° Se os herdeiros ou legatarios se tornarem incapazes
de adquirir a herança ou o legado;
4.° Se o herdeiro ou o legatario renunciar o seu direito.
(Vid. artigo 1778.°)
Não se annulla o testamento nos casos do artigo. Ficam apenas
sem efeito as disposições testamentarias com relaçdo aos herdeiros ou
aos legatarios pela recusa ou pela incapacidade ou pela falta dos
instituidos.
Caduca a disposição se o instituido recusou a deixa porque inito
noo datar beneficiam, ou se tornou incapaz, e. g., por haver atten-
tado contra a vida do testador conforme o artigo 1782.", ou se era
fallecido á morte do testador porque a morte quebra todas as rela-
çòes juridicas.
Pela morte do instituido antes do instituidor é absoluta e sem
restricçào de especie alguma a caducidade do testamento, salvas as
legitimas que oào deixam de ser transmittidas aos respectivos inte-
ressados aiuda que tenha fallecido o herdeiro directo do ameter da
herança, porque os herdeiros legitimarios recebem em virtude da
lei, e não pelo direito de representação que só pide influir na divisão
da quota legitimaria.
O instituido que morreu antes do testador nada transmitte a seus
herdeiros porque nada adquiriu, e nada adquiriu porque os direitos
successorios só se transmittem no momento da morte.
Nem pelo velho nem pelo novo direito pôde o instituido sob con-
dição suspensiva, transmittir aos herdeiros a deixa, fallecendo antes
de verificada a condiçào, com quanto já se julgasse que por direito
antigo o legatario instituido sob condiçào do fallecimento do her-
deiro sem descendencia legitima adquiria o legado logo á morte
do auctor da herança e o transmittia a seus herdeiros, posto que

t Accordàos. da Relaçio de Lisboa de 21 de outubro de 1891, e


do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de junho de 1893, Gazeta da
Relaçdo de Lisboa, 5.° anno, n.° 70, pag. 557, e 13.° anuo, n.° 25,
pag. 217.
ARTIGO 1760.' 303
se finasse antes da morte do herdeiro e portanto antes de realisada
a condição.
Peta mesma razão não póde o instituido sob coudição de fallecerem
sem successão os usufructuarios invocar direitos antes de realisada
a condição, como resulta dos artigos 1759.° n. 2.', 1778. e 1822.° do
codigo, e como era já direito anterior.
A condição de não ter filhos o primeiro instituido não se julga
realisada por haver a mulher attingido a edade de cincoenta annos,
visto não estarem accordes os escriptores de medicina legal sobre a
edade em que a mulher perde a faculdade de ter filhos, e serem
numerosos os exemplos de fecundidade tardia.2
Mas salvo o caso de condição não fica prejudicado o herdeiro pelo
fallecimento do legatario antes do testador, como uão fica prejudi-
cado o legatario por ter sobrevivido ao herdeiro o testador.
Por direito romano na vigencia da famosa regra catoniana qiod
ab initio vitiosumi est, nos potest tracti temporis couralescere, era
ainda necessario que o herdeiro fosse capaz ao tempo da feitura do
testamento; como pelo nosso direito é preciso ter em conta nas sue-
cessoes testamentarias oio só o tempo da morte do testador, senão
tambem o tempo da realisação da condição quando dependente de
acontecimento incerto a instituição porque é ento que êem de passar
ao poder da instituido os direitos que o auctor da herança lhe con-
feriu.
Na successão ab intestato para qualificar a capacidade do herdeiro
ou do legatario attende-se a Om tempo sómente, o da abertura da
herança.
Nas doaçnes, porém, recolhem os herdeiros do donatario os bens
ou elle morra antes ou depois do doador, porque a doação representa
u contracto perfeito que transmitte irrevogavelmente o direito.
Nas doaçies estipulam as partes para si e para os seus herdeiros
salvo reserva expressa, quando nos testamentos é só em favor do in-
stituido a disposição.
E verdadeiro caracteristico das doaçées em vida a irrevogabili-
dade, e tto é da essencia dos testamentos a revogabilidade.

Art. 1760.° Existindo filhos ou outros descendentes do


testador, que este não reconhecesse ou julgasse mortos,
ou tendo o testador filhos, que nascessem depois da morte
d'elle, ou ainda antes d'esta, mas depois de feito o testa-
mento, este só valerá em quanto á terça.
(Vid. artigos 1814.° e 1815.°)
E simples e clara a disposição do artigo isoladamente considera-
da, como simples e accessivel a todas as intelligencias é examinado
só em si o artigo 1814.', onde se encontra disposição similar.

t Accordio do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de abril de 1898,


Gazeta da Relação de Lisboa, 12.° anno, ni.' 9, pag. 69.
3 Accordão do Supremo Tribural de Justiça de 15 de novembro
de 1898, Revista de Direito e Juriqprudencia2." serie, o.' 30, pag. 4.
301 ARTIGO 1760.'

As difficuldades estão na conciliação do presente artigo que salva


sempre a terça, igiorando o testador a existeneia de filhos, quer
legítimos, quer legitimados, quer perfilhados, com o artigo 1814.^
que seguindo a velha Ordenação deita a terra todo o testamento
quando o testador tenha filhos legitimos ou legitimados sem o saber,
e que apenas salva a terça quando a disposição testamentaria se
rompe om virtude de perfilhação posterior ao testamento.
'lêem alguns procurado conciliar os dois artigos, applicando o ar-
tigo 1760 ao caso de designação da terça como legado, e o ar-
tigo 1814.' ao caso de instituição de herdeiro universal com ou sem
legados mas sem disposição especial da terça.
Têem pensado outros que o artigo 1814.', declarando caduca a io-
stituição pela superveniencia de filhos legitimos ou pela legitimação
de illegitimos, não teve em vista senão limitar o preceito do ar-
tigo 1760.° ao caso de haver sómente filhos perfilhados, e que não
deixa de pé nem a terça quando houver filhos legitimos ou legitima-
dos.
Têem finalmente outros argumentado que no caso de colliso entre
os dois artigos deve prevalecer o artigo 1814.", que contem dispo-
siçâo especial por estar colloeado sob a epigraphe-Da institvião
de herdeiros, etc. -, sobre o artigo 1760 que collorado, como está,
sob a epigraphe-Dos testamentos em geral-, contem disposição
geral, porque do contrario ficaria inutilisada a disposição do § 1.-
do artigo 1814.' e collocados os filhos legitimos e os legitimados
na mesma condiçào dos perfilhados. ,
Isto, porém, não é conciliar os dois artigos. E subordinar o ar-
tigo 1760.° ao preceito do artigo 1814.'
Nem a redacção do artigo 1760.- permitte applical-o só á desi-
gnaçào da terça sem instituição de herdeiro, nem o artigo 1814° é
restrieto só 1 instituição de herdeiro pois que muito expressamente
se refere no 2.o á instituição de herdeiro eonjuuctamente com a
deixa de legados, nem se descobre razão para annullar totalmeute
a quota disponivel quando o testador dispòe a titulo universal, e
respeital-a completamente quando elle dispõe a titulo singular.
A historia da diseussão e approvação dos respectivos artigos se-
gundo as actas das sessões da commissão revisora tambem não re-
solve absolutamente a questão.
Ora vejâmos:
Não vinha no projecto primitivo o artigo 1760., que foi introdu-
zido por ocecasio da disussào do artigo 1891 d'agelle projecto
correspondente ao artigo 1759. do codigo, tendo então, segundo a
acta da sessão de 28 de maio de 1862 e a nota ao artigo 1798. da
Ii adição de 1863, proposto o sr. Sbabra - «que se resolvesse até que
ponto devia considerar-se nullo o testamento, existindo filhos ou ou-
tros descendentes do testador, que elle julgava mortos ou não conhe-

Iç SAcecordãos, da Relação de Lisboa de 4 de outubro de 1871, da


Relação do Porto de 7 de julho de 1882, e do Supremo Tribunal
de Justiça de 30 de abril de 1892, Revista de Legislação e de Juris-
prudencia de Coimbra, 5.' anno, no 212, pag. 59, Direito, 16 ' anno,
n. 5, pag. 79, Revista dos Tribunaes, 15.o anno, n.o 349, pag. 182, e
Boletim doa Tribunaes, 7.' anuo, n.0 293, pag. 483.'
[1

j
r

ARTIGO 1760.0 305


ria, sobrevindo filhos do testador em sua vida ou posthumos, se devia
firar revogado todo o testamento ou sómmete rm quanto aos dois
terços.
«l tepois de alguma discussão em que tomaram parte os srs. Siras,
José Julio, Seabra, lil e Martens Ferrão, resolveu-se que subsistisse
em todos estes casos a disposiçio testamentaria até i terça, e que
se redigissem neste sentido os artigos neessaries, tendo os srs. Siras
e Marteus Ferrão declarado que votavam contra, excepto no caso de
superveiencia de filhos em vida do testador. -.
Parece pois ter sido introduzido o presente artigo 1760." exacta-
inote para revogar o preceito da Ord., liv. 4., tit. 82. § 5., que
com a supervieucia de filhos declarava totalmente nullo o testa-
mento sem salvar sequer a terça.
Os proprios vogacs, Simoas e Martens Ferrão, que votaram con-
tra o preceito geral do artigo, o aeceitavam no caso de super-
enienria de filtos em vida do testador, de certo pelo principio
do que o testador. que não revogava o testamento apesar de lhe
terem sobreNiudo filhos em vida, não queria contemplal-os com a
terça.
Vais longe foi a maioria, porque essa quiz salvar em todo o caso
ao instituido a quota disponivel rio testador, mesmo que fossem
posthumos os filhos supervenientes ao que existissem descendentes
que o testador não conhecesse mu julgasse mortos.
las aoroque se passou nr sesolo da cooa<iseâo revisora de 28 de
maio de 1862 por oecasido da disers-lo <lo artigo 1891. do projecto,
correspondete ao artigo 1759 lo rodigo, contrapeia alguns o que
se passou na sessào de 9 de juno seguinte em que foi mantido crm
ligeiras alteraees o artigo 1918' do projecto, correspondente ao
artigo 114. do rodigo, iitro<Lrido-se de novo a doutrina que hoje
se encontra o § 2. do artigo 1b14.
0 artigo 1948. do projecto era redigido assi,,: «A disposição,
ou seja por titulo universal, feita por pessoa que não tivesse filhos
ao tempo do testamento, ou ignorasse tel-os, caduca de pleno direito
pela supervenieucia de filhos ou descendentes legitimos, ainda que
postlumos, ou pela sua legitimação por subsequente matromonio";
e o «<ico do mesmo artigo correspoiidente ao d'lo artigo 1814."
dizia: «A supervenieucia de ourros quaesí<er fil os, ou a sua per-
ilhaçã<o, não importará a annrUllaçeo do testorcIao, salvos os direitos
que a lei concede aos filhos natraese.
Fi approvado o artigo dizendo-srs ,a instituição de herdeiro" em
logar de «a disposição por ti<lo universal.; e foi approvado o
dizeido-se "de filhos ilhiimos» Cii logor.ode otros qocejsr-JilUos 1
e «oaonllaçro di i,,stilui!io de herdeiro~ cm logar d ,aný;loç;o do
terr<rentos. ti
hinahoente em ulterior revisão na sessoãO de 22 de março dc
1865, tendo proposto o se. José Julio a suppresslo da palavra le-
gitiseo do artigo 1840
t
do rejpectivo projecto correspondente ao
artigo 1814." do co igo, e a substituição do § 2. por outra tendente
a estabelecer que a superveniencia de filhos espurios não aonnllara
a iosit;uiça, e tenIdo proposto o sr. Ferreira Lima a suppressâo do
1. do artigo, foram rejeitadas todas as propostas destinadas a al-
terar os preceitos do artigo 1814.- e
parece pois que a commoissão revisora, se na sessão de 28 de
maio de 1862 pugnava pela doutrina do artigo 1760.", nas sessdes
posteriores queria rm toda a sua plenitude os preceitos do ar-
tigo 1814.'
Temo III 20

L.,
1_"1
806 ARTIGO 1760.!

Ao que é preciso, porém, de preferencia attender é ao que na lei


ficou.
Não póde duvidar-se de que o artigo 1760. mantem até á terça
o testamento haja ou não menção da terça ou de legados no tes-
tamento porque a respectiva disposição é generica, existindo filhos
ou outros descendentes que o testador não conhecesse ou julgasse
mortos, ou tendo filhos que houvessem nascido depois da morte
d'elle ou mesmo antes, mas em todo o caso depois de feito o testa-
mento, e de que o artigo 1814. declara cadea de direito pela su-
perveniencia de filhos ou de outros desendenti s legitimos ainda
que posthumos ou pela legitimação dos illegitimos em virtude de
subsequente matrimonio a iustituição de herdeiro feita por pessoa
que não tinha filhos legitimos ao tempo do testamento ou que
ignorava tel-os, e apenas conserva de pé a instituição de her-
deiro, e ainda assim limitada á teiçe do testador, e sé para o caso
da superveniencia de filhos provir de perfilhação posterior ao tes-
tamento.
Pela regra de que ninguem pôde ter mais amor ao filho do que o
pae, é legitima a presumpçào de que o testador, se soubesse ao fazer
o testamento que tinha filhos, não tiraria aos filhos para dar a outrem.
Mas é indispensavel tombem reparar em que o pensamento do
legislador foi salvar as legitimas, reduzindo os legados dentro da
terça, tanto na supervenicucia de descendentes legitimos ou legiti-
mados como na perfilhação superveniente artigo 1814: ý 1.:
Não regulou o artigo 1814. a anrullação das disposiçes testa-
mentarias que isso ficára já prevenido no artigo 1760: O que regu-
lou foi a anulação da «ýinstitaiçào de Irerdeisra,.
Com quanto no fundo e na essencia o objecto dos dois artigos seja
o mesmo, é certo que cada m se refere a espee diiferente-por-
que o presente artig' respeita á validade do testamento e o artigo
1814. á validade rIa iautitaiçdo de herdeiro.
A superveiienria de filhos legitimos não rompe em caso algum a
disposição testamentaria na sua totalidade.
Fica sempre salva a terça, a titulo de legado se a supervenien-
eia é de descendentes legitimo- ou legitimados, e a titulo de herança
se a superveniencia é dc perfilhação de filhos illegitimos posterior-
mente ao matrimonio.
Quer sobrevenham filhos legitimos quer se legitimem ou se per-
filhtem filhos illegitimos, o erdeiro irstituido fica sempre com a
terça, com a unica diferena de ficar com a terça a titulo de lier-
liro perfilhando-se t'hros illegitimos, e de ficar com a terça a Ti-
tulo de legatario sobrevindo filhos legitimos ou legitimaso- se filhos
illegitimos.
O que caduca de di"ito pelo artigo 1814. não é o testamento. O
que caduca é a instituição de herdeiro. Os legatarios recebem até á
terça; e mantérm-se os legados até onde não sejam inofliciosos.
Logo que se considere que não é uma e a mesnma cousa receber a
terça a titulo de herança ou a titulo de lqado, pois que n'umrcaso
tia, por exemplo, o direito de acrescer e no outro não, está desco-
berto o meio de conciliar os dois artigos que não podem ser sacriti-
rados uns ao outro visto terem ambos a mesma força legal.
Fiualmente muito antes das alteraçães a que a commissão revi-
sora sujeitos o artigo 1948.' e unio do projeto primitivo, já o Sr.
k
Seabra ias correcçé,s e additanrentos ao seu projecto de 1858 tinha
disto emnrlrçã ao referido artigo 11 iã'
,A superveeniecia de filhos illegitimos e sua perfilhaçâo não im-
r
ARTIGO 1761.' .307

portará a annullação da disposição por titulo universal, salvos os


direitos que a lei lhe confere.
«A disposição por titulo particular nôo caduca em nenhum dos
casos sobredietos, mas poderá ser reduzida por inolficioss.
Nà é mais sagrado o direito dos descendentes legitimos a haver
a porção legitimaria do que o do auctor da herança a dispôr da
quota não obrigada a legitimas.
O artigo 1760.- declara sem valor o testamento quanto a dois ter-
ços da herança; e o artigo 1811.' declara inteiramente caduca a in-
stituição de herdeiro no caso de filhos legitimas ou legitimados, e
limitada á terça no caso de filhos perfilhados.
0 artigo 1814.-, deitando abaixo a iustituição de herdeiro, não
ataca a liberdade de dispôr da terça como legado; nem lia razão
para nã ser respeitada a disposição da terça deferida como legado
quando os legados são apenas reduzidos na parte inoflicioesa § 2.
do artigo 1814.'
Não pide admittir-se outra jnrisprudencia sem pôr completamente
de parte como não eseripto ou o artigo 1760.' ou o artigo 1814°; e
no sentido d'esta opinião são já numerosas as decisôes dos tribu-
,nacs.1

Arl. 1761.1 Em caso de duvida sobre a interpretação da


disposição teslameotaria, observar-se-ha o que parecer mais
ajustado com a intenção do testador, conforme o contexto
do leslamenlo.
(Vid. artigo 1837.')
Todas as regras estabelecidas na velha jurisprudeucia para inter-
pretar as disposiçôes testamentarias, como que os legados não podem
ampliar-se, e a herança sim, etc., foram substituidas por uma e
unica, a -inenção do testador--, mas a intenção do testador verifi-
cada pelo contexto do testaieto e só pelo contexto do testamento
com caluso absoluta de prova extranha, quer de testemunhas, quer
de docuíentos.
Para isso eliminou a comaíissôo revisora logo nos trabalhos da
primeira revisão as seguintes palavras com que terminava o artigo
correspondente (1892.'; do projecto primitivo '.e a prova auxiliar que
a esse respeito possa fazer.se,.
O mesmo preceito se encontra reproduzido no artigo 1801.O que
declara nullo o legado de cousa alheia salvo se do testamento se de-
prehender que o testador ignorava que lhe ão pertencia a cousa le-
gadla.
E a consequencia do principio - que nas disposiçes testamen-
taria só falla o testador, e não falia mais ninguem -.
Com o emprego de quaesquer elementos extranhos para a inter-

1 Accordàos, da Relação de Lisboa de 20 de agosto de 1899 e de


14 de janeiro de 1891, e da Rclaçào do Porto de 11 de março de 1890,
Gazela da Relaçào de Lisboa, 5.- anmo, n.' 15, pag. 113, e Rerista
dos Tribuaes, 8.° ano, n.o 177, pag. 133 e 134, e u.o 190, pag. 338.

..
308 ARTIGO 1762.õ
pretação do testamento poderia ser completamente destruida a ultima
vontade do testador.
Mas os juizes devem cingir-se strictamente ao pensamento que
resulta das palavras do testamento, em vez de se collocarem na po-
sição do testador para o effeito de imaginarem que o testador fez
não o que fez, mas o que devia ter feito.
Só para desfazer o equivoco a respeito do legatario ou da cousa
P legada, e que ficou permittido no codigo todo o genero de provas
para mostrar qual era a intenção do testador, artigo 137., por se
ter esquecido a commissio revisora, ao eliminar as palavras acioa
f. referidas do artigo 1892. do projecto primitivo, de emendar em
conformidade o artigo 1971' do mesmo projecto, correspondente
t
ao artigo 1837." do codigo.
6 Para mostrar que o testador, instituindo legatario o creado Manuel
quando este se chamava Antonio, e legando a sua caixa de ouro
quando ella era de prata galvanisada, quem queria beneficiar era
o creado Antonio e o que queria legar era a caixa de prata galva-
nisada, é que se admitte qualquer meio de prova.
Nio vicia, pois, irremasdiavelnente a instituiçito do legatario o
r' erro no nome, visto que para verificar-lhe a identidade não ha res-
tricçio nas provas.
Para apurar o verdadeiro legatario quando houver ditas ou mais,
pessoas com o nome d'aquella a quem é deixado ó legado deve at-
tender-se ao maior ou menor grtu de parentesco de consanguini-
dade ou de allnidade, :i amizade entre o testador e cada uma dellas,
os serviços que qualq u er d'llas lhe houvesse prestado, e ás de-
mais circumstancias que sirvat para descobrir a vontade do tes-
tador.
Quando entre aquelles a quem podia ser destinado o legado nio
podér apurar-se a identidade do contemplado é otílo o legado como
feito a pessoa incerta, pois o que o testador deixou só a um eio
pide sír dividido entre os varios que podiam ser considerados coo
beficiados, como não escripta ou nlia se reputa a disposição tes-
taíentaria, quando não podér ser compreíendida a intençýto do
testador só pelo contexto do testamento com exclasào absoluta de
qualquer outra prova.
Nos inventtrios s is interessados nào concordarem no paga-
mento do legado por equivoco no nome do legatario, e nào poder
determinar-se a identidade por meio de documentos nos teros do
artigo 724. do codis. de processo civil tem s iatessdo que fazer
11 valer o seu direito ris acção ordinaria, porque o meio de habilitaçdìo
presceripto no artigo 699.'
do codigo de processo é para apurar a
l1,itimidade e nào simplesmente a identidade.

.art. 1762.1 Os testamentos com data aithentica anterior


à promulgwíço do presente cOdigo, tie no forem cfotit-
mes com as disposições d¯elle. quanto a formulas outile-
mnidadlos externas, produzirão clfeilo, não sendo revogados,
se tiverem os requisitos exigidos pela legislação vigente ao
vei
tempo em que forem feitoo.

Vaicli os testamentos feitos antes e abertos depois da proíml-


gaçio do codigo se reunirem as solemnidades externas da lei ante-

kb
ARTIGO 1762.0 309

rior, como assignatuira da disposição de ultima vontade, apresentação


ao tabellido, numero de testemunhas, el caetera, ainda que lhes fal-
tem as fcrínalidades da lei nova 1, porque a fórma externa, como
acto solemne,5 produz o seu effeito desde que se ultima.
Mas no f rima interna hão de accommodar-se ás dioposiçdro do
codigo, não só quanto á capacidade ito testador, senão ainda quanto
á quota disponivel; pois á materia interna do testamento é applicavel
exclusiruaieite a lei vigente ao tempo da abertura da suecessão.
São por isso validos tendo data authentica ao tempo da promlga-
çnTo do codigo e as formalidades da lei velha, os testamentos de mo
cosinim §iuico do artigo 1753., os codicillos que eram uma dis-
posiçào de ultima voitde sem instituição de herdeiro Ord., liv. 4.^,
'
tit. 86., o testamento partirularaberto Ord., liv. 4.°, tit. 80^ § 3^
que era feito pelo testador ou por outra pessoa particular sem in-
strumento de approvaçìo e com intervetçào de cinco testemunhas
varões, e maiores de 14 asnos, aos quaes era lido para ser puibli-
cado depois da morte do testador, e o testamento incupatio 4.'
da citada Ord., liv. 4., tit. 80.', que era feito em artigo de morte,
de palavra, permute seis testemnhas, vardes ou femeas, e que fi-
cava sem valor convalescendo da doença o testador.
Mas tauto o testamento particular aberto como o testamento 7om- á
cupativo onde no havia certea de data por não estarem official-
aente authenticados, e que no eram actos perfeitos e consummados
nea produziam efeito algum juridico antes da redueçdo ou publi-
ea,:o judicial, já no podiam ser reduzidos depois da promolgaçdo
do codigo, salvo estando jc as respectivas acções em juizo ao tempo
d'essa promutgação, porque a propositura da acção ecárcr direitos
e obrigações que a lei nova não poderia offender sem retroagir ex-
pressamente.
A fôrma interna do testamento, porém, é regulada pela legislação
vigente ao tempo da morte do testador, ficando assim - sujeito às
disposiçêes da lei nova o fideicoitmisso deixado em testamento, feito
síctes e aberto depois da promulgaçás do codigo.
ieo podia o codigo ter subordinado a todas as forcíalidades da
lei nova os testamentos feitos, mas no abertos ao tempo da sua pu-
blicaçdo, sem com isso ferir o principio da no retroactividade, soe-
que nac ha retroactividade sem offensa de direitos adquiridos, e di-
reitos adquiridos no os tem o instituido cm quanto não está aberto o
testamento, pois o testamento antes de aberto é com relação ao tes-
tador oco mero projecto de dispôr, e com relação ao instituido unia
mera expectativa, e tudo tão precario, como deambulatoria est eo-
lautas homisti usque ad mortem.
Mas por transacção só sujeitou a materia interna ao regimen da
lei nova.
A incompetencia do official publico para fazer ou approvar o tes.

1 Accordios do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de novembro


de 1888 e de 22 de julho de 1890, Boletioi dos Tibunaes, 4.
anno,
na 139, pag. 131, e 5.° ano, n 215, pag. 645.
2 Accordão da Relação do Porto de 13 de março de 1872, Revista
de Legislação e de Jurisprudencia, de Coimbra, 7.^ ano,
pag. 25.
n. 314,

M
+I

Zi
310 ARTIGOS 1763.- e 1764.-

tamento é formalidade externa, vistas as palavras -fcrma eterma


dos Ieslanentos -, que se lêem na secção 8.° do cap. 2.^ do tit. 2' do
liv. 3.- do presente codigo, sob a qual estão collocado os artigos
1910." e seguintes.

SECCAO 11

Dos que podem testar e dos que podem


adquirir por testamento

Art. 1763.0 Podem testar todos aquelles a quem a lei


expressamente o não prohibe.

(Vid. nota ao artigo 643.1)

Art. 1764.0 E prohibido testar:


1.° Aos que não estiverem em seu perfeito juizo;
2 Aos condemnados, nos termos do artigo 355.°;
3.° Aos menores de quatorze annos, de um e outro sexo;
4.° As rei igiosas professas, em quanto se não seculari-
zarem, ou as suas commíunidades não forem supprimidas.
unico. Os cegos, e os que não podem ou não sabem
ler, não podem testar em testamento cerrado.

1.°, etc.

Para prova de que o testador não estava em seu perfeito juizo


admittem-se todos os meios de indagação, quer resultem do proprio
testamento, quer sejam extranhos ao testamento.
A fórmula brovo e synthetica -perfeito juizo -torna iucompativel
a disposição testamentaria com quaesquer alterações cerebraes, por
mais leves que sejam, e quaesquer que sejam as phases por que pas-
sem as faculdades meutaes.
Tão envolvidos estão na interdicção de testar os que padecem lou-
cura parcial como os que padecem loucura completa. A simples mono-
mania restricta a certo e determinado ponto é incompativel com
o juizo necessario para fazer testamento, porque não póde dividir-se
a razão humana.
Vale, porém, o testamento do louco com intermittencias quando
feito nos intervallos lucidos, como já dispunha a velha Ord., liv. 4.°,
tit. 81, pr., e §§ 1. e 2."

b,
r
ARTIGO 1764." 311

1teve, porém, fazer-se a prva mais nitida de luidez do espi-


rito do testador no acto de testar.
Algums codigos exigem formalidades extraordinarias como a in-
tervenção de testemunhas medicos para a validade do testamento
feito n'estas cirejmstancias.
tomo o imtervallo Incido no estado geral de perturbação mental
representa uma situação excepcional e accidestal, deve cercar-se de
todas as cautellas o testamento feito n'essa situaçào lucida a fim de
evitar abusos. Mas no pode negar-se atestamentifaçào a quem esta
ainda que momentaneamente em perfeito juizo.

2.°, ete.

Já a Ord., liv. 4.,, tit. 81., § 6.° dizia:


"tm qualquer pessoa, que por sentença for condemnada a morte
natural, não pôde fazer testamento; e se o fizer, não valerá cousa al-
guta E posto que em qualquer tempo da dita condemnação o te-
nha feito, tanto que for condeutado, logo o tal testamento perde
tola a sua virtude, e me por Direito de neshams vigor, assim como
se nunca fosse feito: porque a condemnaçào o faz servo da pena, em
que he condemnado, e por conseguinte he privado de todos os actos
civis, que requerem auctoridade do direito civil, assism como é o tes-
tamento".
Sem effeito declarava tambem o velho codigo penal no artigo 52.o
o tetament do condeomado à morte desde que passava em julgado
a sentença condematoria; e o projecto primitivo no artigo 1897.°,
correspondente ao artigo 1765., ainda accrescentava ao que está no
presente artigo, as seguintes palavras: «Excepto no caso do n." 2."
(1, rtigo 18915.- (correspondente ao n" 2." do artigo 1764."), em que
se attenderA ao tempo da morte do testador, e nào ao da factura do
testamento,; excepção coto que a commissâo revisora acabou em
scssão de 2 de junho de 1862.
Hoje mào têem as penas o effeito de privar de direitos civis o
condemuado, como já se explicou no logar competente.
(Vid. nota ao artigo 355.")

3.", etc.

Fixando nos 14 ansos a edade de testar para ambos os sexos, e


egnlando assim para este etteito a condição juridica do homem e
da mtlhier, o codigo apenas se distingue da lei anterior 'm não per-
mittir ás mulheres testar aos 12 annos como permittia a lei velha,
que dava a testtmentifaçào activa ao maior de 14 e ao maior de
12 anos conforme era varão ou femea.
Paro disptr por morte não se exige a mesma edade que para
doar em vida, porque o testamento obedece mais aos sentimentos do
coração e aos dictames da consciencia do que aos conselhos da re-
flexo, e na edade de 14 annos lia já o discernimento preciso para
aquilatar as affiçáos, e ainda porque o testamento, revogavel como
é a toda a oia, não creando desde logo relaçôes juridicas entre o
istitoidor e o instituido, como pelo contrario cria a doação entre o
doador e o donatario, não póde acarretar, como as doaçes, prejui-
zos para todo o sempre irreparveis.
Nunca entre nós como na antiga Roma a sujeiçio ao patrio poder
3112 ARTIGO 1764.'

inhibiu o menor de fazer testamento e de dispôr não só dos bens


castrenses e quasi castrenses, senão tambem de outros que por qual-
quer titulo lhe pertencessem.

4.^, etc.

(Vid. nota ao artigo 1779.1, n." 1.)

unico, etc.

(Vid. artigo 1923.°)


Era por direito anterior válida a disposição do cego em testamento
cerrado, porque nenhuma lei lhe vedava esta fórma de testar, e por-
que era permittida ao que não sabia ler nem escrever que em rela-
çào ao escripto no papel é tão cego como o verdadeiro cego.
Todavia para cercar de todas as garantias a liberdade de testar,
evitar fraudes, e quanto possivel pôr cobro a abusos aliás tão fre-
quentes, prohibiu o legislador absolutamente o testamento cerrado
aos cegos e aos que não sabem ou não podem ler ainda mesmo que
saibam escrever, e deu ao testador que sabe e póde ter o direito de
ler, elle proprio, o testamento publico e o instrumento de approva-
çào do testamento cerrado se não quizer contentar-se com a leitura
feita pelo ofticial publico em voz alta na sua presença e na das tes-
temunhas.
Não estão, pois, incluidos os cegos na prohibição de testar. Mas
só podem fazer disposiçes de ultima vontade em testamento publico.
Ainda que a cegueira tenha sobrevindo depois de uma educação
esmerada e de uma vasta illustraçào, e que o cego escreva como se
tivesse vista, não lhe permitte a lei testar em testamento publico.
Para obstar a fraudes e abusos não quiz o legislador admitttir uma
r
só excepço à regra geral - que os que não sabem ou não podem
ler não podem testar em testamento cerrado-.
A leitura é o minimo gráu de instrucção que as leis modernas
exigem para testar em testamento cerrado.
O codigo, depois de descrever na secção relativa á forma dos
testamentos as solemnidades e fórmulas externas do testamento pu-
blico e do respectivo auto de approvaçdo no testamento cerrado,
declara no artigo 1923. inhabeis para dispôr em testamento cerrado
os que não sabem ou não podem ler, e tractando nas duas secçbes
primeiras do presente capitulo - dos testamentos em geral, e dos
que podem testar e dos que podem adquirir por testamento- -, fecha
Lo com o artigo 1762.° a secção dos testamentos, collocando já na se-
gunda secção o artigo 1764.' § unico que nega o testamento cer-
rado aos cegos e aos que não sabem ler.
Effectivamente a circumstancia de -não saber ler nem escrever
F+s
é elemento da habilidade ou capacidade do testador e não solemni-
dade externa do testamento.
No entre tanto com o fundamento de estar comprehendida nas pa-
lavras se tiverem os reqositos e-igidos pela legislação vigeole ao
tempo que fr m feitos, empregadas no artigo 1762., a capacidade
juridica do testador, e de ser regulada a capacidade do testador
pelo estado em que estiver ao tempo da feitura do testamento, é a
jurisprudeneia pela validade do testamento cerrado do cego ou do

sa.

,41
ARTIGOS 1765." e 1766.- 313
que aio sabe ou não póde ler, feito na vigencia do direito anterior,
com quanto aberto depois da promulgação do codigo. 1

Ai. 1765.° A capacidade do testador será regulada pelo


estado em que se achar, ao tempo em que o testamento
for feito.
E regulada a capacidade do testador pelo estado em que estiver,
no no momento da abertura da herança mas sim no acto da feitura
do testamento, porque o testamento, com quanto possa ser revogado
até á morte, fica logo revestido de todas as solemnidades, e não ha
motivo para suppôr que o testador, persistindo em são juizo até á
morte, revogaria a disposição de sua ultima vontade legalmente
feita.

Art. 1766.1 Os casados segundo o costume do reino níío


podem dispôr determinadamente de certos bens do casal,
salvo se esses bens lhes tocarem ein partilha, ou no tive-
rtm entrado em communhão.
Dos bens proprios podem os casados dispôr coiso lhes aprouver
dentro da quota disponivel não só quanto ao valor artigos 1789.° e
1790,.,senão tambem quanto á qualidade artigos 2109.0 e 2142.° cor-
responlentes aos artigos 2282.0 e 2310.0 do projecto primitivo, qual-
quer que seja o regimen matrimonial e ainda que boja herdeiros
tegitimarios.
Não póde negar-se ao testador o direito de escolher para a terça
os bens proprios que quizer, os peiores ou os melhores, comtanto que
o valor nôo exceda a sua quota disponivel.
Preferia o sr. dr. Paes a jurisprudencia seguida no antigo fôro
que ao actor da herança com herdeiros legitimarios só permittia
dispôr de certos e determinados bens, com a coudiçlo de não dispôr
do melhor predio do casal para não transtornar a egualdade relativa
nas partilhas.
Dizia o sr. dr. Paes: «Parece-se ser preciso cortar a questão que
tem havido, se o pae pôde tomar na terça bens certos e designados;
e eutendo que sim, cottanto que fique salva a legitima dos mais filhos
em quantidade e qualidade, pois póde haver na familia grandes ra-
zões de conveniencia para dever ter o pae esta liberdade, e da parte

1 Aceordãos, da Relação do Porto de 16 de março de 1883, da Re


laçãs de Lisboa de 23 de abril de 1873, e do Supremo Tribunal de
Justiça de 25 de junho de 1886, de 8 de julho de 1887, de 4 de fe-
vereiro de 1896, e de 25 de novembro de 1898, Direito, 16.° anuo,
n" 27, pag. 431, e 5." anno n.° 34, pag. 543, Boletim doa Tribunaes,
1." asno, 5. 36, pag. 566 e 2.' anno, n." 80, pag. 51, Gazeta da Re-
lação de Lisboa, 9. anuo, n.° Sl, pag. 684, e 12.° anno, n" 99, pag.
792.
314 ARTIGO 1766."

do pae está sempre a mais forte presumpção em favor dos interesses


da familia.
líespenrlia lhe o sr. Seabra:-Esta questão parece-nos resolvida
nos artigos 1921.° e 1922.' (1729. e 1790.° do codigo), onde se pre-
supp-e esta faculdade sem prejuizo das legitimas.»
Effertivamente apesar de não se ter consignado no coligo civil
disposição expressa e especial auctorisando o testador com herdeiros
legitimarios a escolher á vontade os bens para preencher o valor
da sua quota disponivel, não deixam os artigos referidos pelo sr.
Seabra duvida de que qualquer dos conjuges pode dispôr como muito
bem qizer dos bens proprios sem outra restricção que não seja o
respeito pelas legitimas.
O artigo 1784 e § reconhece ao testador com herdeiros legitima-
rios o direito de dispôr da terça de seus bens sem lhe impõr a obri-
gação de não escolher os melhores predios, como ensinavam os anti-
gos praxistas, disposiçâo que não é prejudicada nem pelo artigo 2144.'
deste codigo, nem pelo artigo 714.° do codigo de processo, que res-
peita á formação de lotes para a egualdade da partilha e não á
escolha de bens para compõr quer a legitima quer a terça.
Não têem por isso os herdeiros legitimarios o direito de licitar
nos bens designados pelo testador para compôr a terça, e apenas o
de requerer nova avaliação. a
Nem os herdeiros legitimarios podem com razão queixar-se da
faculdade que tem o testador de escolher os bens para compôr a sua
quota disponivel, já porque no estado actual da siencia não ha
valores privilegiados, já porque as licitaçòes, como até certo ponto
as segundas avaliações, são correctivo bastante contra quacsquer
desegualdades.
O direito de qualqu , dos conjuges só é restricto pela inviolabili-
dade das legitimas e pPlo direito do outro nos bens de propriedade
eommm artigo 2177.
Porque o dominio e a posse dos bens communs está em ambos os
conjuges durante o matrimonio e até se fazerem as partilhas arti
gos 1117.° e 1122.°, não póde qualquer d'elles só por si dispdr deter-
minadamente dos bens que entraram em communhão, ou fosse ou
não segundo o costume do reino o casamento, pela mesma razão por
que no póde o com-proprietario dispôr especificadamente de desi-
gnada parte do objecto commum sem lhe ser assignado o seu quinhão
em partilha, porque ninguem póde dispôr senão do que é seu, e
nos bens communs não têem os com-proprietarios parte determinada
antes da partilha.
Não póde haver disposição de bens certos e determinados onde
a propriedade existe em commum r, ainda mesmo que a deixa seja
em nsofrseto, pois dispôr do usufructo é dispôr de certos bens apesar
dejá se ter julgado o contrario.3
E tão applicavel o artigo 17õ6.' ao marido cao á mulher, e tanto

r Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de agosto de


1888, Boletim dos Tribunaes, 4' anuo, n.' 132, pag. 21.
2 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de março de
1900, Cazeta da Relação de Lisboa, 13.' anno, o.- 81, pag. 635.
3 Accordão da Relação de Lisboa de 2 de março de 1896, GazeIa
da Relação de Lisboa, 11.- anuo n. 76, pag. 601.
r
ARTIGO 1766.- 315

aos bens mobiliarios como aos immobiliarios, porque os artigos 1118.


e 1148.0, que reconhecem ao marido o pleno direito de disp r dos bens
mobiliarios, referem-se uniea e exclusivamente á disposição em vida.
Tem todavia variado muito a jurisprudencia sobre a interpretação
e applicaçào do artigo 1766.0
Julgou-se a principio que o casado segundo o costume do reino só
podia dispór de bens determinados tendo-lhe estes tocado em par-
tilha anterior 1, e que a anuencia do conjuge sobrevivo á dispo-
sição de bens commes nio sanava a nullidade porque i morte do
testador passava immediatamente aos co-herdeiros o direito que
o conjuge sobrevivo não podia prejudicar com a sua declaração pos-
terior.
Julgou-se tambem que o legado em bens comamuns deixado pelo
conjuge era sempre válido, quer tocassem quer não depois ao tes-
tador na meação os bens legados; porque no primeiro caso devia en-
tregar-se
3 ao legatario o legado em substancia, e no segundo em
valor já por analogia com o disposto nos artigos 1801 . e 1804.0
que nas hypotlheset respectivas dão ao legatario o direito a haver
da herança o equivalente, porque o testador deixando bens deter-
minados quiz de certo contemplar com o respectivo valor o bene-
ficiado quando não podesse tornar-se effectiva a diposição dos bens
designados, já por nâo dever ficar dependente do juiz da partilha
a subsistencia ou a insubsisteneia do legado, e finalmente por não
haver razão para reconhecer o legado quando a cousa venha a per-
tencer ao testador por qualquer titulo posterior ao testamento, e
não o reconhecer no caso de ser assigsada em partilha por sua
morte ao conjuge sobrevivo.
loje na jurisprudencia corrente fica a arbitcio do conjuge testa-
dor a disposição de bens determinados se o coajuge sobrevivo a não
contrariar, porque semelhante caso não é de ordem publica, e sim
de interesse particular, e porque introduzido como foi o preceito da
lei em beneficio do conjuge sobrevivo só este póde arguir ou fazer
cessar a nulidade, § unico do artigo 10.° do presente codigo. 4
O artigo 1773., ferindo de nullidade a infraeção do disposto nos ar-
tigos 1767., 17680, 17690, 1771o e 17720, exclue das suas disposiçes
irritantes a providencia do artigo 1766.05

1 Aceordão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de dezembro


de 1889, Direito, 29.° anuo, a 5, pag. 69.
2 Accordãos, do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de dezembro
de 1889, e da Relação de Lisboa de 19 de julho de 1890, Boletim dos
Tribuoes, 6 0 anno, a1. 219, pag. 9, e Gazcla da Relação de Lisboa,
4oanuo, nA 89, pag. 708.
3 Aceordão da Rêlação de Lisboa de 27 de março de 1886, Gazeta
da Relação de Lisboa, 13 anno, n? 87, pag. 653.
4 Accordâo da Relação de Lisboa de 14 de julho de 1893, Direito,
30. anno, n.° 15. pag. 235.
5 Accordàos, do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de janeiro
de 1896, da Relação de Lisboa de 28 de novembro de 1891, e de 14
de junho de 1893, e da Relaçáo do Porto de 14 de junho de 1893, e
de 20 de julho de 1895, Gazeta da Relação de Lisboa, 1.° ano, n. 40,
pag. 317, Direito, 27. armo, n° 9, pag. 143, e Revista dos Tribunaes,
13. anno, n! 292, pag. 54, e 14.1 armo, oi. 322, pag, 153.

~
316 ARTIGOS 1767.", 1768.0, 1769.° z 1770.

Mas não pôde o instituido por um dos conjuges em bens com-


muns do casal intervir nas licitações sem primeiro se apurar se os
bens ficam na meaçào do testador. 1
Querem alguns que seja indemnisado do valor correspondente o
legatario quando a cousa legada não ficar na meação do testador.
Não tem, porém, o legatario direito ao respectivo valor se não
ficarem na meação do testador os bens communs por este deixados,
porque foram os bens, e não o valor que o testador lhe deixou z; e
na lei o que está é que não vale a deixa de bens commsss feita
pelo casado senão tocando-lhe os bens em partilha.

Art. 1767." O menor não póde testar em beneficio do seu


tutor, salvo se estiver emancipado, e o tutor tiver dado
conta da sua gerencia.
unico. Esta probibição não abrange os testamentos em
favor dos ascendentes e dos irmãos do menor.
(Vid. nota ao artigo 244.")

Art. 1768." Do mesmo modo é probibido aos menores


testar em favor de seus mestres, ou pedagogos, ou de
quaesquer outras pessoas a cujo cuidado estejam entregues.
Art. 1769." Não produzirão effeito as disposições do en-
fermo em favor dos faculativos que lhe assistirem na sua
molestia, ou dos confessores que, durante ella, o confes-
sarem, se morrer d'essa molestia.
art. 1770." A prohibição dos dois artigos precedentes
não abrange:
1." Os legados remuneratorios dos serviços recebidos
pelo menor, ou pelo enfermo;
2." As disposições, quer por titulo universal, quer por
titulo particular, em favor dos parentes do testador, até o
quarto gráu inclusivamente, não havendo herdeiros legiti-
marios.

Porque a ascendencia dos facultativos e dos confessores sobre o


espirito do enfermo, como a do tutor ou do mestre sobre o tutelado
ou sobre o do discipulo, deixaria a duvida se a disposição em favor
das pessoas mencionadas nos artigos 1767.^, 1768." e 1769.", longe
de ter sido dictada por affectos pessoaes, tinha sido extorquida por

t Accordào do Supremo Tribunal de Justiça de 31 de janeiro de


1893, Gazeta da Relação de Lisboa, 6." anno, n." 78, pag. 622.
2 Accordão da Relação do Porto de 10 de março de 1882, Revista
de Legislaçdo e de Jurisprdencia, de Coimbra, 20 anuo, n.9 1014,
pag. 410.

Â
rr
ARTIGO 1770. 317
suggestões, ou por considerações de respeito, a que o testador no
seu estado ou na sua posição não poderia ser superior, prescreveu
o legislador estas regras, que em determinadas circunstancias po-
derão ser violentas.
Quiz a lei obstar a que o confessor levasse o doente, a pretexto
do bem de sua aina, a esquecer os affectos de familia e as relações
do sangue e a deixar-lhe ou a pessoa da suo escolha os bens, sug-
gestão tanto mais facil quanto orais se avizinla a morte, pois que i
quinto maior é o perigo de vida maior é a influencia do confessor
sobre o moribundo cuja consciencia estâ dirigindo com o seu auxilio
espiritual.
Na probibição decretada no artigo estõo compreheadidos todos
os sacerdotes tanto ratholicos, como de qualquer outra religião, onde a
seja recebida a confissão, pois o pensamento do legislador foi evitar
qae o sacerdote abusasse da sua missão, dirigindo as suas attenções
mais para o mundo dai terra do que para o espirito e consciencia do a
doente. á
A mesma prohibição abrange os medicos que exercem egual senho a
maior preponderancia no espirito do doente.
Não abrange, porém, o artigo 1769.', nem os pharmaceuticos, nem
os sangradores, porque as disposiçes probibitivas não se ampliasi.
lias excepções reconheceu, porém, o artigo 1770.-, em lomena-
gem ao respeito que se deve à vontade do testador sempre que a
disposição poder expplicar-se por motivo justo e honesto.
Fira fóra da disposição irritante dos artigos 1768.' e 1769.' a dis-
posiçìo remreratoria, independentemente de parentesco do testador
com o beneficiado, porque se julga inspiraa pelo louvavel senti-
mento da gratido.
.A eclai-açõo expressa no testamento a de ser remuneratorio de
serviços o legado, nio impede nem dispensa os tribuna s de apre-
ciar a natureza remuneratoria do legado, tendo cio attenção a qua-
lidade dos serviços prestados e pela importaícia dos recursos do
testador, aliás facilmente seria illudida a prohibição.
Subsiste egualiaente a disposição testamentaria comprelredida
no artigo 1708 ou no artigo 1769., no caso de parentesco do tes-
tador com o beneficiado dentro do quarto gran, porque póde então
explicar-se o beneficio pelos laços do sangue e pelos carinhos de
familia, indcpcndentemenrte de suggestro maliciosa o frauduluita,
salvo se o testador deixou herdeiros legitimarios porque em tal caso
não pide beneficiar as pessoas referidas nos artigos 1768 e 1709.
ainda que parentes dentro do quarto grán.
Não se comprebendem nos pare, es os aflins, que não estão presos
ao testador pelos laços de sangue e que, salva disposição especial,
aio são nunca incluidos na classe dos parentes.
Não pude receber beneficio testamentario do enfermo o medico
que lhe assistir na ultima molestia ainda que seja o conjuge, a não se
verificar alguma das condições prescriptns em os n 1:' e 2/, do
ortigo 1770., vista a redac;o generica e absolrta do artigo 1769.'
A mesma conclusão nos leva a eliminaçàa, nos ultimos trabalhos

a Accordio do Supremo Tribunal de Justiça, de 17 de julho de


1896, Gazeta da Relaeão de Lisboa, 10. anno, n.' 28, pag. 220.
e,

318 ARTIGO 1770.0

da commissdo revisora, do n." 3." do artigo 1903.0 do projecto primi-


tivo, correspondente ao artigo 1770 - do codigo, que era redigido nos
seguintes termos: -3.o As disposiçòes feitas em favor do conjuge do
testador, que ainda fôra conservado nos projectos de 1863 e d, 1864.
Ou fosse eliminado por escusado visto não costumarem os medicos
tractar as doenças do consorte como tambem não tractam as suas,
ou por ser o conjuge o que mais influencia pode exercer no espirito
do doente, é certo que nem o conjuge escapa à saneção penal do
artigo 1769." não se verificando alguns dos casos especificados no
artigo 1t70.
Poderá ser duro em certos casos este preceito. 'Mas é o que está
no codigo.
O artigo 1769.", porém, é só applicavel à disposição feita durante
o tempo da molestia em favor dos facultativos e dos confessores que
lhe assistiram n'essa molestia de que o testador morreu', porque se
refere ás disposições do enfermo, e não ás disposições feitas no estado
de sande, e porque nem de outro modo teria razio de ser a provi-
são da lei.
Se já estava feito o testamento quando o medico ou o confessor
dispensou os seus serviços clinicos ou religiosos ao enfermo, cessa
a prolsibição porque cessa em ambos os casos o fundamento da co-
acção moral em que a incapacidade relativa se apoia.
Este era já tambem o pensamento do projecto primitivo que nos
artigos 1539." e 15140., que estavam collocados entre os artigos cor-
respondentes aos artigos 1479. e 1481." do codigo, dizia assim: «ds
facultativos que houverem tractado o enfermo na sua ultima mo-
lestia, não poderão haver d'esse mesmo enfermo, fallecendo da mo-
lestia, níais que a sua devida retribuiçào. Os ecelesiasticos qoe liou-
verem confessado e assistido ao enfermo na molestia de que falcer,
não poderão egualmente haver d'elle cousa alguma por doação".
Subsiste tambem a disposição testamentaria feita durante a
doença se o testador depois melhorou, e tendo oceasiào de a revo-
11 gar a nao revogou.
O pensamento da lei não foi limitar a liberdade do testador e sim
enfrear a cubiça dos especuladores.
Não probibe expressamente o codigo como algumas legislações a
disosiço em favor dos parents do tutor, dos confessores, dos me-
dicns, e do tabelliáo. pr estarem preveitidos nos artigo 1481.,
17 , e 241tm os abusos cim a instituição de pessoas ihabis,feita
quer simuladamente. quer por interposta pessoa.
Tamabem o codigo n3o amplia is doaçòes esta especie de incom-
patibilidades testamentarias. pois em vez de declarar, como o pro-
jecto de codigo civil hespanhol, capazes de receber por doação nos
mesmos termos e com as mesmas limitações todas as pessoas ca-
pazes de receber por testamento, permitte acreitar doaces a todos
os que no são 'isso csprcialmente inibidos por disposição da lei,
artigo 1477."
aã a projecto primitivo no artigo 1533., de que o artigo 1477." é
reproducção fiel, não feria da mesma incapacidade para receber por
doação que para receber por testamento.

t Accordão do Supremo Triunal de Justiça de 17 de julho de


1896, Gaeria d,, Reaço de Lisboa, 10" anuo, n." 28, pag. 220.

i
i

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14
-r .

ARTIGOS 1771.0 E 1772.- 319

Mais longe, porém, foi a commissão revisora, porque eliminou do


projecto os artigos 1539.t e 1540.t, que se seguiam ao artigo corres-
pondente ao artigo 1479.t do codigo, e que prohibiam a doação- a
favor dos ecelesiasticos e focaltativos que houvessem assistido e tra-
etado o enfermo ta sua ultima molestia, conservando aliás no ar-
tigo 17609. a disposição do artigo 1902.° do mesmo projecto pri-
mitivo que os inhibia de receber por testamento.
Finaltínte o codigo applica no artigo 1783. ás disposições tes-
tamentarias o preceituado no artig' 1481_° para as doações entre
vivos; mas em parte nenhuma applica ás doações em geral os pre-
ceitos relativos aos testamentos.
portanto as pessoas pelos artigos 1767t a 1771.- inhibidas de
receber por testamento, não sño pelos artigos 244., 245 e 262"
inhibidas de receber por doação, salvo o tutor e o pro-tutor, quando
alis estão nas mesmas circmstancias e quando as razões d'estas
exelusões testamentarias actuam com mais força nas doações que
são irrevogavOis.
Nao são, porém, abso/tas as incapacidades marcadas nos artigos
1767.° a 1769.0 como as das religiosas professas e as das corporações
de instituição eclesiastica artigos 1779.° e 1781.", e sobretudo as
das corporações que não gozam de entidade juridica.
São incapacidades relaticas que impossibilitam apenas de receber
certas e determinadas successões. As pessoas nestes artigos fridas
de incapacidade estão na plenitude dos seus direitos civcs. E por
cireumsaicias especiaes ou accidentacs que são incomtiiveis com
a sucessão testamentaria.

.rt. 1771 .1 0 conjtge adultero ião pôde dispulr a favor


do seu cumplice, se o adulterio tiver sido provado judicial-
mente antes da morte do testador.

(Vid. nota ao artigo 14800)


O adulterio, que pode existir sem concubinato porque não depende
da persistencia de relações illicitas, só exclue da successão por morte
quando tiver sido julgado em vida do testador, tavez para evitar
que se vã devassar a honra das famillias e infatuar a meorioa dc
pessoas que já no existem; e ha de ser feita em
vida do testador
a prova, nio só (to adultero, tas tambem do ,dultero, com quato
muitos .u~tentem que bem púde provar-s depois da torto do te-
tador quem foi o adultero quando na causa intentada em vida não
tenha sido declarado o mome d'elle.
As doaç;es feitas por homom casado á concubina é que bem podem
ser arguidas de nullidade conforme o artigo 1480. ainda que não
tmha havido questão sobre o concubinato em vida do testador.
)tQere alguns que o adultçro nem do conjugo offemdido possa
receber. Mas a redacção do coligo não permitte ampliar á successão
do conjuge tffendido a incompatibilidade marcada para a ruccessão
do conjugo delinquente.

.art. 1772. 0 testador não pitie dispôr em favor do ta-


bellião que lhe faz o testamento publico, ou auto de appro-
vacho do testamento e rrado, neti da pessoa que te es-
creve este, nem fiíaltaette das testeítunlias que intervem
es-e.

320 ARTIGO 17 2. qO

no testamento publico, ou no auto de approvação do tes-


tamento cerrado.
Art. 1773.° o que fica disposto tios artigos 1767.0, 1768.°,
1769.°, 1771. e 1772.0 só produz a nullidade da parte
das disposições testamentarias a que os mesmos artigos se
referem.
(Vid. artigo 2495.° nP 2.)
Por direito anterior, )rd., liv. 4", tit. 85., § 1., podiam ser os
legatarios testemunhas do testamento, e podia o proprio cscriptor
do testamento ser contemplado se a disposição a favor d'elle fosse
escripta pelo punho do testador.
No intuito, porém, de evitar fraudes prohibia o projecto primitivo,
como prohibiram todos os projectos da commisso revisora, as dei-
xas ás testemunhas nos testamentos, até que no projecto da ultima
revisão apresentado como proposta ministerial ás cr tes se cosiguou
no artigo 1773.°, correspondente ao artigo 1772.0 do codigo, em sessào
de 17 de novmbro de 1864, sob proposta do sr. Branco, que no
testanento cerrado podesseni ser contempladas as testemunhas, tal-
vez por nas ouvirem ler o escripto no testamento cerrado, e ser n
disposiçào de ultima vontade do testador completamente distineta
do auto de approvaçào que ellas sã, chamadas a authenticar com o
seu testemunho.
Foi a commissào de legislaçio da ramara dos deputados que al-
terou a resolução que admittia os leatrios como testeounas nos
testamentos, a qual podia na realidade encaminhar ao conluio e a
fraude, com quanto ficasse sem efleito a disposição que os favorecesse
por terem u'esta parte interesse directo no acto artigo 2511. n. 1
Deve por isso o talelliéo, ao exarar o auto de approvaçào de tes-
tamento cerrado, observar ao testador que mio psdem ser testemu-
nhas os que forem contemplados no testamento.
Não é nullo o testamento cm que o testador deixa ao tabeliião
senào na parte que ao tabelliào interessa, e é absolutlioire millo
testamento em que o testador contempla o conjuge, urmaos asccn-,
dentes e descendentes do tabelliio por consanguinidade ou por
atiiidade :rtiso 2,195.° n1. ., ou o consorte do descendente, do
ascendente, ou do irmão do tabellião, artigo 178i3.", em vez de tais-
bem ficar nulla simplesmente a deixa ao coijuge ou ao pareote do-
tabellião.
Querem alguns que tambem as deixas ar, conjugoe o os parentes
do talolliãio so importem a mollidade ou iiefliracia do testamento
na parte relativa a Osas deixas. por ser applicavel ãs disposiçoes
testamentarias por fori a do arti;o 1783. o artigo 1481." qiu so
aníulla as doaçJes feitas a inteipostas pessoas tia parte respectisa
a essas pessoas, e por estar subordinado o n. 2.0 do artigo 24iS
ao unico, que não deixa prejudicar as disposiç,es especiaes pelas
disposiçes geraes.
Todavia nem a nullidade da disposição em que intervêm o
conjuge, ou os parentes do tabelliào quer em linha recta quer na
collateral em segundo grãu, resulta de serem iterpiostas pelsoas e
sim das suas relaçées com o tabellião, nem o artigo 2495. unico
póde prejudicar a providencia espeial consigtíada no artigo 1772.'
A disposiçào do artigo 1773. que annulla unicamente a deixa em
favor do tabellião e das testemunhas conservando de pé o resto do
ARTIGOS 1774.Õ a 1775.^ 321

testamento ha de prevalecer como disposição especial sobre os ar-


tigos 2495.^ m^ 2.1 que annulla os documentos extra-ofliciaes se o
alicia publico é interessado no acto e 251 1. nY 1. que declara
inhabeis para testemunhas as pessoas com interesse directo na causa
ainda mesmo que o artigo 2511.0 se refira tambem aos actos ias-
trumentrios, pois já não teem interesse directo na causa o tabelliào
e as testemunhas, desde que ficam privados dos beneficios do tes-
tador.
Não pôde todavia deixar de reconhecer-se que declarar nullo AH1
unicamente na parte relativa ao respectivo beneficio o testamento
em que o herdeiro ou outro squalquer beneficiado intervem como tes-
temunha, e absolstamentr nullo o testamento em que intervem não
o proprio interessado mas os parentes, atlins, e mais pessoas com-
prehendidas cm os r.- 1. a 4.° do artigo 2511.°, é umoa incolíerencia
que provavelmeite resultou de não se ter liarmonisado com a dou-
trina do artigo 24955' n. 20^ o preceito do artigo 1i 73. introduzido
de novo pela commíissão revisora.
Como ficou, porém, o codigo, acceites as disposiçes dos artigos
1772.0, 1773.0 e 2495 0 2., s colido o testamento em que se dis-
pòe a favor do tabelliào menos a disposição a favor deste, e abso-
lutamente ííllo o testamento em que se deixa ao descendente, ascen-
dente irniáo ou conjugc do tabellião. ou ao consorte do descendente, 515
do ascendente ou do irmão do tabelliào.
Hoje, porém. s. os tribmaíes não duvidarem da legalidade do
decreto do notariado de 11 de setembro de 1900 pira alterar um
preceito da lei civil que só por lei pôéd ecr prejudicado, unico do
mesmo artigo 2495x, é absolutamente iullo tambem o testamento
em que se faça disposiçào a favor do tabelliào, visto ser a este pro-
hibido exarar ou auctorisar com a sua intervenção qualquer acto
do seu ollicio cm que seja interessado. quer directamentc, quer por
J
via de seus ascendentes, descendentes, irmãos e conjuge, seus ou de
algum d'elles, ou por ser procurador ou representante dos interes-
sadas.
Nas acções de aullidade do testamento está em prática admittir
o tabelliào como testemunha com o fundamento de ser indirecto e
não directo por respeitar ao acto e não á causa o seu interesse s,o
que em todo o caso não é admissivel ;quando o tabellião não for
chamado como parte á demanda.

Art. j774. As pessoas, obrigadas á prestação de legi-


tima, só podem dispôr da quota, que a lei lhes permute
testar.
(Vid. nota ao artigo 1784.0)

Ar. 177i.° Ninguem pôde determinar, que se consuma


em sutfragios por sua alma mais do que o terço da terça
dt lerns qne deixa.

t Accordào da li-laío de Lisboa de 21 de dezembro de 1858,


Gazeta da elaçco dei is/is, 12" ano, n.0 57, pag. 459.

Too III 21

áL-,
'9

322 ARTIG1 1775.

(Vid. artigo 1836.0)


O codigo civil, desembaraçando-se dos preceitos intrincados e
confusos do antigo direito sobre suffragios e serviço dos mortos. sub-
stituiu os velhos diplomas legislativos reguladores da instituieão
da alisa por herdeiro pela simples e unirca disposieàoe -lde o ae-
co- da herança dispôr para sol/vagios por sua alma até ao tero da
soua terça-.
Ou seam, p ermanentes e peipetuos ou por tempo limitado ou de
oceasio não podem ir os suffragios além do terço da terça do tes-
tador por virtude de testamento.
Os herdeiros, porém, não ficam impedidos de gastar voluntaria-
mente por alina do defunto o qui muito bem lhes parecer.
Na sentença, porém. do artigo estão comprhendidas todas as
despezas com os mortos tanto as do funeral que abrangem todo o
serviço até se dar o corpo à sepulta incluindo as missas do corpo
presente, como as de be, dralma que são oflicios e actos religiosos
pnsteriores, missas, rezas, anniversarios, etc.
E certo que os regulamentos da contibuiço de registo de 30 de
junho de 1870, de 31 de março de 1887, e de 1 de julho de 189i
pareciam distinguir entre fiiíer-al e sofravios, e que chegou a jul-
gar-se que da contribuicão de registo deviam ser descontadas as
despezas com o funera/, nai as slvpizas com os oíírvgéot
1'oréi,í nes a redacção di artigo 211(0 deixa luvida de que as
despezas com o funeral estuo comprehemlidas nos suffrgios, nem
haveria razão para distinguir na homenagem aos mortos entre os
actos anteriores e os actos posteriores ao enterr unto, quando em
serviço dos ortos são tanto uns como outros, e quando sao preisa-
inerte as despezas com actos que se dirigem ao serviço da aina que
o legislador quiz restringir.
Na disposição do artigo está comprehendida a deixa para laos-
pcrrnne, isto é, para a exposição d~ santissimo sacramento a ado-
raço dos fieis, por não ser destinada para obras de beneficencia
e de taridade, quer dizer a serviço dos vivo; como legado pio
foi ja considerado a deixa para compras de alfaias e ornamentos do
cl to. 2
Mas os legados para obras pias que trem a significaçào precisa
de legado para obras de beneficencia, de caridade, artigo 1836 ,
como os legados para obras do Bom Jesus do Monte, j se não com-
prelhendem nos sufiragios. porque a sufragios nào so destinados. 3
Mandam algumas legislaçes applicar a obras de benefiencia o
que os testadores destinam pira suragios além dos limites legaes,
em vez de deixarem como o nosso codigo o successxo legitima o
quç da síseessSo testane-ntaria uào pede ser cumprido.
E, porém, insustentavel semelhant solíçao, que equivale a testar
a favor de quem o testador não testra.

v
Decreto, sobre consulta do Siprvmo Tribunal Administrativo, de
13 de maio de 1892, Bioeidti dos Tribies, 7 anno, ni 300. pag0.606.
z Accordão da Relação de Lisboa de 4 de março de 1897, Gazeta
de/ Relação de Lisboa, 11 anno, n." 21, pag. 165. -
3 AccordAos da Relação do Porto de 13 de dezembra de 1872 e
de 14 de fevereiro de 187.3, Reista de Lgislação e de "Jirisyrinden-
cia, de Coimbra. 6. anno, n.o 297, pag, 586.

r
r
ARTIGOS 1776.- E 1777o 323
Apesar de não dever tocar-se nas congruas dos paroclos em quanto
não fôr definitivamente regularisada a dotação do culto e clero na
practica forense a são os parochos obrigados a contribuir para os
seminarios qíatdo aeceitam a íníeaçno e collaçdo com esse en-
cargo, por ser permittido tal accordo com os parocos novamente
nomeados para egrejis de rendimentos avíaltados, pelo alvará de 10
de maio de 1805, e por lei nenhuma proliibir a apresentação dos pa-
rochos com esta condição e antes o Concilio de Trento no seu ca-
pitulo 8.- sessio 23 permittir o encargo em beneficio dos seminarios,
egrejas, cathedracs, metropolitanas, e outras corporações.

Art. 1776.° Só podem adípnirir por testamentlo as crea-


tluras existentes, entre as qlaes é coutado o embrião.
títico. ieputa-se existente o embrião, que nasce com
vida e figura humana detlrn de trezentos dias, contados
desde a morte do testador.
Art. 1777.1 Será, comtudo, válida a disposiç3o a favor
dos tascituros, descetdenles em primeiro grát de certas
e determinadas pessoais vivas ao tempo da morte do testa-
dor, posto qute o futuro herdeiro ot legatario venha á luz
fira do praso dos trezentos dias.

1Vid. nota
ao artigo G.")
0 codigo, reputando nascido para todos os effeitos no que toca
aos seos interesseso que está apenas
concebido se nasce com vida
e com figuralnana, acabou com a questão muito debatida em di-
reito romno, se os naseituros podiam ou não ser instituidos her-
deires.
Nao cria a vida intro-uterina a capacidade civil que sé pelo nas-
cimento é determinada. Mas põe o nascituro sob a proteeçâo da lei,
protecção que já uno cessa sendo no caso do nascimento sem vida
ou semigura líuíana, porque é d'estas duas condições que depende
a acquisição da capacidade joridica.
Todavia por excepção á regra geral, que no admitte capacidade
surcessoria sem estar pelo menos concebido o individuo à abertura
da successao e nascer cam vida e cam figura humana, reconhece o
codigo a capacidade ao nascitiro para succeder ainda que não es-
teja conecliío ú abertura da successao, veriicando-se a circmistao-
cia de ser descendente de certas e dnterwinadas pessoas vivas ao
tempo da morte do testador.
NIs podem, porém, adquirir por doaiáo 2 os naseitíras ainda n o 1
concebidos. qíu aliás psditm receber por testamento estando nas
tircumstancias do artigo 1777.", porque nenhum artigo do codigo
faz excepção ao artigo 5." a respeito das doaçõs como faz o artigo
1777.^ a respeito dos testasnents.

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de junho de 1895,


lRsista dos Tribunes, 15." anno, n ^ 315 pag. 133.
P Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de novembro de
1899, Gazeta da Relaão d,, Lisboa, 13" anno, n. 44, pag. 365.

L
324 ARTIGOS 1778.° E 1779."

Não é preciso arguir de falso o documento para dar prova teste-


munhal contra as declarações sobre o nascimento sem vida e sem
figura humana, como sobre a filiação, estado, dia e hora do nasci-
oncuto ou do obito, por não revestireus um caracter incompativel
com a prova testemunhal, visto assentarem em informações de ter-
ceiro. 1
0 registo quer civil quer parochial, só faz prova plena com res-
peito aos factos passados na presença do funecionario publico, e
não com respeito áquellas declarações que apenas póde certificar
terem sido feitas na sua presença, sem sada poder affirmar ácerca
dos factos a que respeitam.

Art. 1778.1 A capacidade para adquirir por testamento


é a que o adquirente tiver ao tempo da morte do testador,
e, no caso de instituição de herdeiro com condição, ou no
de legado condicional, attender-se-ha, tambem, ao tempo do
cumprimento da condição.
(Vid. nota ao artigo 1759.°)

Art. 1779.° Não podem adquirir por testamento, salvo a


titulo de alimentos, ou por legado em dinheiro, ou em ou-
tras cousas mobiliarias:
1.° As religiosas professas, em quanto se não seculari-
sarem, ou as suas communidades não forem supprimidas;
Os condemnados, nos termos do artigo 35.°
1+.

(Vid. artigo 1764." o.° 4.°)


lege o artigo 1779." a hypothese da institoiçáo das religiosas in-
dividualmente, e rege o artigo 171." § unico a hypothese da in-
stituição da communidade.
Só ás religiosas professas faz a lei referencia, porque religiosos
professas que são estivessem secularisados nio havia já sm Portugal
ao tempo da promulgação do codigo, e mesmo para as religiosas
professas é meramente transitoria a disposiçlo, porque extinetas
como foram as ordens religiosas do sexo masculino, prohibidas as
profissões do sexo feminino, e despedidos todos os individuos em no-
viciado nos conventos e mosteiros para voltarem d classe da socie-
dade a que pertenciam antes da sua entrada, ficando os conventos
das freiras até á norte da ultima se primeiro se nào extinguissem
pela união de uns a outros, decretos de 5 e de 9 de agosto de 1833
e de 28 de maio de 1834, dentro em pouco terão desapparecido todos
os conventos das religiosas, e deixará de ser applicavel o n." 1.° do
artigo.
Os religosos professos vivendo em comsunidades ou congregações,
e sujeitos por votos solemnes ás regras monasticas conforme os seus

Accordão da Relação do Porto de 18 de abril de 1899, Revista


dos 'ibnaes, 18." anuo, n.° 410, pag. 25.
ARTIGO 1779.- 32U

institutos, posto que eostituissem individualidade juridica, como


ficavam extranhos â familia e morriam para o mundo pelo simples
facto do voto de profissão, foram excluidos da successao testanonta-
ria pela lei de 23 de julho de 1766, ficando habilitados apeeas a
receber por testamento alimentos até o valor alli determinado.
Posteriormente, porém, a lei de 9 de setembro de 1769 revogou
a Ord., liv. 2P, tit. 18, e todas as disposições legaes que permit-
tiam aos religiosos professos a sucesso ab intestato, e a acquisiçào ¡f
das heranças paternas e maternas salvo a obrigação de alienar I
dentro de anuo e dia, e suscitou a observancia da lei de D. Diniz
de 21 de março de 1291, que excluia inteiramente os sobredictos
religiosos, não só das suscessées ab inteotalo, mas das heranças pa-
ternas e maternas, por «não poder caber na boa razão, que os tilhos,
ou filhas, que pela profissão religiosa morreem para o mundo, tornem
a apparecer no mesmo mundo incompativelmente para n'elle inquie-
tarem as familias de seus pacs e parentes:... e porque os direitos
do sangue se julgam totalmente extinctos com os votos de profissão,
pelos quaes os religiosos e as religiosas, renunciando o mundo, se
apartam d'elle, quando entram nas ordens das suas respectivas filia-
çõess.
Mais tarde reconheceu- lhes o decreto de 27 de julho de 1778 o di
reito a serem contemplados individualmente com alimentos ou com
tenças vitalicias sem sujeição a valor determinado.
ias essas mesmas deixas indiciduaes reputavam-se feitas a favor
da communidade. e não em faor dos individuos, porque alli só em
cotemum podiam possuir-se bens, e tanto que a communidade ainda
hoje é obrigada a alimentar as religiosas que estiverem fóra da
clausura com licenca da auetoridade competente.
Cessavam, porém, as razões do disposto na citada lei de 9 de
setembro de 1769 e no decreto de 17 de julho de 1778, seculari-
sados que fossem religiosos professos, isto é, desligados que fossem
do cumprimento dos seus votos, ou por dispensa do poder compe-
tente, ou por voltarem ao mundo pela dissoluçào das suas coutiu-
nidades.
O decreto de 28 de maio de 1834 que extinguiu os conventos dos
monges, passando os religiosos professos à qualidade de clerigos
seculares e dotando-os apenas com uma pensão alimenticia, incor-
porou os respectivos bens nos proprios nacionaes2, como a primeira
lei da desamortísação de 4 de abril de 1861 e as instrucçàes de 31
de maio de 1862 passaram para o estado os rendimentos e os bens
das commnidades religiosas do sexo feminino á proporção que se
fossem extinguindo os conventos, porque ls corporações ecelesias-
tiras, mesmo antes das leis de desamortisaçâo, só foi reconhecido o 4
usufructo e nunca o dominio dos bens que possuiam por serem des-
tinados os bens a occorrer aos fins dos respectivos institutos.
Foi a lei de 30 de abril de 1835 que permittiu aos egressos secu-

a Accordio do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de maio de


1887. Roleti do 7ri/naes, 2.° anno, pag. 514.
2 Accordàos. do Supremo Tribunal de Justiça, de 20 de janeiro de
1891, e da Relação de Lisboa de 30 de janeiro e de 20 de fevereiro
de 1892, Revista dos Tribunaes 10.° anoo, n9 223, e Gazeta da Re-
lação de Lisboa, 5. anno, n, 96, pag. 720, e n.^ 92, pag. 733,

L:n
326 ARTIGO 1779.

larisados e a todos os religiosos d:s ordens extinetas adquirir, alie-


nar, testar, e por qualquer fórata dispor de seus bens ns termos
ea que as leis do reino o permiittiamu aos clerignos seclares, ex-
cepto o suecederem ah isteetsto para não prejudicor as legitimos
dos que a ellas tivessem direito, nel alterar m cousa algmoa n eco-
nomia das familias em que nasceram, suecedendo-lhes aliás os pa-
rentes segundo as regras geraes da suecessão.
Depois a lei de 13 de julho de 1855 melhorou-lhes a posição,
porque revogou a Ord., liv. 2.', tit. 18.' e a lei de 30 de abril
de 1835 na parte em que prohibiam aos clerigos, beneficiados, aos
secularisados egressos das ordens religiosas, e a todos os religiosos
das ordens extinetas, alhear bens de raiz em vida ou dispór d'elles
por morte em favor de pessoas qu ndo fossem leigas, e determinou
que ,os egressos secularisados e os religiosos das ordens extisetas
fossem chamados t suvcessão oh int-.stoo dos seus parentes para o
unico efeito de excluir o fisco», ou por parecer injusto passarem os
bens dos parentes á fazenda mscional ficando os egressos na pobreza,
ou por se julgar mais digna de favor a posição do egresso do que a
do fisco.
Com a promulgação do codigo, porém, entraram os egressos se-
cularisados no direito conmum, e acabou o resto da incapacidade
com que os feria a lei de 13 de julho de 1855, que o lente de direito,
1londeira de Neiva, ainda queria mantida, para elles não serem
chamdos i successão dos parentes segundo o gráu do parentesco
como outri qualquer individuo.
As palavras do n.° 1.° do artigo «ou as suas communidades não
forem supprimidas» foram escusadamente acerescentadas pela com-
missão revisora, porque a idêa por ellas significada estava já com-
prehendida nas palavras em quanto se no seclarisare, pois nos
elteitos juridicos nada influe o ter provindo a secularisação de uma
providencia politica como o decreto da suppressào dos mosteiros,
ou de um breve especial que houvesse feito a concessão.
O codigo não obstante negar ás religiosas professas a testamenti-
faço activa a passiva por se presumir terem mortido para o
mundo, permittindo-lhes receber legados a titulo de alimentos ou
eí dinheiro ou n'outras cousas mobiliarias sem determinação de va-
lor nem de quantidade por não julgar quebrado com isso o voto de
pobreza, teria habilitado o testador a deixar as corporaç"es toda a
sua fortuna, uma vez que a deixa fosse a titulo de alimentos. ou por
legado em disbeiro, ou em outras cousas mobiliarias, se a deixa ts
religiosas mesmno como indiriduos não fosse para o convento, pois
que ellas para si individualmente nada adquirem, e as corporaçáes
reclesiasticas não fossem excluidas de succeder além do terço da
terça.
Não se refere o codigo aos religiosos professos nem ás religiosas
professas extrangeiras, porque, não lhes podendo ser reconhecida
entidade juridica em Portugal, não podem ser instituidos senio nos
termos prescriptos em o n.' 1.0 do artigo para as religiosas professas
nacionaes, nem lhes pôde ser permittido testar ou adquirir por
testamento, por não poder admittir-se testamentifação activa nem
passiva a quem a lei não reconhece entidade juridica i,quaesquer

a Aceordão da Relação do Porio, de 30 dejaneiro de 1900, Recista


dos Tribunes, 18.' anno, n.° 423, pag, 264.

'iii
ARItGOS 1780. t: 1781.° 327

que sejam as preseripçoes do estatuto pessoal, pois que o preceito


do artig 27. do codigo deve enteídýerse sempre subordinado ao
racional priíeipio de u7o contrariar as rondiçý'es de edem publica
estalolecidas o paiz, arguiento do artigo 108 ." i 5.' do ~sdigo de
processo civil.

2., etc.

(Vid. nota ao artigo 355.0)

Art. 17 8 0 .a Perderão o que lhes for deixado em testa-


mento o tS;taetnlteir, ou o tutor iestamlentario, que se
escusarem, lu forem removidos pelos motivos especificados
no n. 3.° do arigo ?3ìi."
(Vid. nota ao artigo 232.-)

Art. 1781.0 As pessoas moraes podem succeder por les-


tametio, tanto a titulo de herdeiras, como de legatarias.
utiro. Exceptuam-se as corporações de insiitniçií ec-
clesiastica, as quaes sé poderão stcceder até o valir do
terço da terça do testador.
ii;l se publicou a lei de 9 de setembro in-
de 1769 que probibiu a
slituiçnt de almia por herdeira logo surgiram q uestdes sobre a amp1i-
tude daquella proibiç io, porque em muitos casos no era liquids
se os bens deixados i eorporação benefieiada eram destiuados para
a subsistcncia dos vivos ou para o serviç, dos mortos
Assim era por direito antigo tmito duvidoso se as misericordias
podiam ser instituidas herdeias, 9
porque a lei de de setembro de
17íO proiibia no § 21. a institíião da alma por herdeira, e o
assento da casa da supplieç» o de 29 de setembro de 1770 declarava
instituida a alma por herdeira quandose instituia alguma ordem,
irmaidade ou 0rporaç o.
Foi preciso que diversos assentos e alvarás viessem interpretar
e modificar o disposto na referida lei de 9 de setembro para se ir
encamíiíhando a jurisprudencia no sentido de se reconhecer plena
capacidade successoria ts misericordias, visto serem applicados em
beí,ficio dos vivos e nao em suffragios pelos mortos os bens a elías
destinados, e poderem ellas herdar bens de raiz, segundo o disposto
no alvarA de IS de março de 1806 § 2., com a condição apenas de
os não reter ai,,, de atino e dia sem licença regia.
Já smito antes da promulgação do codigo a nossa legislaçâo ia
destacando das eorpraçles religiosas as corporaçes de beneficen-
cia e de iustrueção, e tractsndo as irmaudades e confrarias como
corporaçles administrativas, e não como corporaçOes de iístituiçdo
echclsiostica.
A lei de 12 de dezembro de 1844 já exceptuava do imposto de
transmiss o as misericordias; e a lei de 30 de junho de 1860 dis-
pensou do pagamento de coutribuição de registo as misericordias,
iospitacs, casas ds expostos, asylos de mendicidade, e de primeira
328 ARTIGO 1781.0

infancia desvalida, casas de educação, e todos os mais estabeleci-


mentos de beneficencia auctorisads pelo governo, comtanto que
fossem gratuitos.
Finalimente a lei de 22 de junho de 1866 claramente estremava
das corporações religiosas os districtos, municipios, paroebias, casas
de misericordias, hospitaes, irmandades, confrarias, recolhimentos e
quaesquer outros estabelecimentos pios ou de beneficencia, nacio-
naes ou extrangeiros, e expressamente reconhecia no artigô 11.'
unico ás misericordias o direito de serem instituidas herdeiras.
Pelo codigo, porém, é fóra de duvida que só importa a instituição
de alma por herdeira a instituição de corporaçes de natureza pu-
ramente ecclesiasticas, como egrejas, cabidos e mosteiros, vistas as
palavras do 7 unico do artigo -corporações de iítiiliçdo eccleaias-
tica -.
Corporações. sem voto, nem clausura, como as confrarias de
Ordens terceira do Carmo e de S. Domingos, não são corporações
ecelesiasticas das comprehendidas no ý unico do artigo. t
No projecto primitivo o artigo correspondente ao artigo 17s1. do
codigo era ainda redigido nos seguintes termos: «As egrejas, cabidos,
confrarias e quaesquer estabelecimentos de caridade, beneficencia
ou instrueção publica, não podem adquirir par testamento senão a
titulo de legado particular. - § unico. Os bens de raiz, que lhes fo-
rem deixados, serào alienados dentro de atno e dia, sob pena de os
perderem em proveito da fazenda nacional».
Na sessào da commissdo revisora de 2 de junho de 1862 propoz o
secretario José Julio de Oliveira Pinto a seguinte substituição:
«As associações e corporações perpetuas. que tiverem por fim objectos
meramente religiosos, só poderão adquirir por testamento até á terça
da terça dos bens do testador. As que constituirea estabelecimentos
ou fundações de caridade, beneficencia e instrucção publica, podero
ser instituidas herdeiras ou legatarias, salvas as restricções que a
esta faculdade houverem sido estabelecidas em seus estatutos.-
unico. Entende-se que téem por fim objectos meramente religiosos
aquellas associações ou corporações que em suffragios ou actos de
culto consomem a totalidade ou pelo menos mais de ametade dos
seus rendimentos.
Adiada depois de algum debate a decisão entrou de novo em dis-
cussao o assumpto na sessto de 10 de dezembro do mesmo :nro,
presidida pelo sr. Seabra, e estando presentes os ars. Marreca, Fer-
reira Lima, Silva Ferrão, Antonio Gil, Ilereulano, e José Julio,
conjunctamente com a seguinte substituição apresentada pelo ser.
Ferreira Lima : -As egrejas, cabidos, confrarias e quaesquer esta-
belecimentos que não tenham por fias principal a instrucção pu-
blica ou actos de beneficencia e caridade, não podem ser instituidos
em parte superior á terça da herança do testadora.
«Tiveram a palavra os srs. Herculano e Antonio Gil, depois do que
se propozeram os seguintes quesitos, que foram todos votados aflir-
mativamente:
dI.^ Em geral as pessoas moraes podem succeder por testamento?

1 Accordào do Supremo Tribunal de Justiça de Sde dezembro de


1886, Diario do Governo, n. 60, de 17 de março de 1887, Direito>
24.« ano, n.a 20, pag, 305.

Á
ARTIGO 1781.- 32

.2. E podem succeder tauto a titulo de herdeiros como de lega-


tarios?
-_ Deve haver alguma excepção a e-te principio, com relação a
algumas pessoas moraes?
«4.° A excepção deve resultar da natureza das pessoas moraes?
«5. A excepçào deve limitar-se ás corporaçues de instituição ce-
elesiastica?
«6 Esta excepção deve consistir em não poderem estas corpora-
ser iustituidas herdeiras ou legatarias em mais do terço da terça
çóes
do testador?
«Resolveo-se que o artigo fosse organisado em harmonia com os
quesitos votados, e em seguida o sr. Ferreira Lima retirou o addi-
tamento que havia proposto,.
Por aquella votação ficaram de certo comprehendidos no unico
do artigo, não todos os estabelecimentos findados pela egreja, mas
só os estabelecimentos com fina ecelesiastico, posto que a palavra
institieão se prestasse a qualquer das duas significaçées, pois que
na commissão triumpharam de certo as opiniGes consignadas nas
propostas dos srs. José Julio e lerreira Lima visto ter o sr. Ferreira
Lima retirado a sua proposta depois da votação, não ter o sr. José
Julio sequer tomado a palavra n'esta sessão, e não haverem os srs.
]Ierculano e Antonio Gil, que usaram da palavra, sustentado senão
as doutrinas mais avonçadas.
Poderão assim definir-se corporaçàes ecelesiasticas as que se em-
pregam principalmente no serviço espiritual ou em sfragar as al-
mas em conformidade das propostas apresentadas pelos ara. José
Julio d'Oliveira Pinto e Ferreira Lima, que são o melhor commen-
tario ás palavras instituição ecclesiastica.
Portanto só não podem ser instituidas em mais do terço da terça
do testador as corporaçàes de natoreza ecelesiastica ou de fim ecele-
siastico, isto é, aquellas cujo fim principal é tractar do serviço dos
mortos conforme a jurisprudencia consignada no artigo 1775.^ que
foi introduzido pela coemissão revisora sob proposta do sr. Seabra
na mesma sessão de 2 de junho acima referida, e antes de discutido
o artigo, que foi substituido pelo artigo 1781., salvo se a deixa tiver
applicação especial e restricta a obras de beneficencia, como a hos-
pital por essas corporaçães sustentado.
A issociação denominada- irmãs da caridade -ou-irmãs de
S. Vicente de Paula-, auctorisada por decreto de 3 de setembro de
1858, nem na terça do terço pôde succeder, porque foi dissolvida
por portaria de 5 de março e decreto de 22 de junho de 1861, e os
bens incorporados nos proprios nacionaes, como absolutamente nulla
é a instituição collectivamente dos padres do Varatojo 1, pois ne-
nhuma associação religiosa estabelecida sem expressa auctorisaçào
do poder competente tem entidade juridica para herdar mesmo até
o terço da terça do testador, visto terem sido extinctas pelo ar-
tigo 1.« do decreto de 28 de maio de 1834 todas as corporaçées reli-
giosas como contrarias is mnximas de tiia sã poltica e dest-mctivas
doa fundamentos da prosperidade publica segundo declarou a por-
taria de 16 de julho de 1859, suscitando a observancia d'aquelles
preceitos.

1 Accordâo do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de janeiro de


1891. Direito, 3, asno, n.0 10, pag. 150.

à-
330 ARTIGO 1782.0

Ja a fundação de convento ou mosteiro de ordens religiosas, em-


bora carecesse da approvação da Sancta Sé, era tambem dependente
de permissão real, cartas regias de 22 de setembro de 1610, de 14
de fevereiro e de 2 de outubro de 1630 e de 10 de julho de 1631, de
2 de junho de 1632 e de 2 dv novembro de 1633.
Se alguma corporação religiosa ali existir, por tolerancia dos po-
deres publicos mas sem expressa auctorisação legal, não gosa de
personalidade juridica. porque vive em contravençào ás leis do paiz.
Explicam alguns a differença com que são tractadas as corporações
segundo o seu instituto é temporal ou religioso, por não requererem
em regra o fim das corporações ecclesiasticas, como egrejas e mos-
teiros, por sua natureza restrieto e limitado, augmento crescente de
riquezas. -e pelo contrario tantos mais serviços prestarem á huma-
nidade as municipalidades, os asylos, e em geral os estabelecimen-
tos de beneficencia e de instrucção, quanto mais avultados são os
seus recursos.
Mas a razão suprema por que foi decretada a incapacidade sucres-
soria das corporações de instituto ecelesiastico foi para obviar a que
cilas accumulassemn grandes riquezas que iam ser consumnidas es-
pecialmente no serviço dos mortos quando o fim racional do emprego
dos bens da terra é o serviço dos vivos, e sobretudo para cortar os
vôos ao immenso poderio que taes corporações iam adquirindo com
prejuizo dos direitos do imperante civil.
No caso de serem contempladas além do terço da terça varias
corporaçües.de instituição ecclesiastica ha de proceder-se a rateio
a siooiU do disposto no artigo 1494.° quanto á redueção dos legados
que não podem ser satisfeitos pela quota disponivel do testador, e
reverter o excesso a favor dos herdeiros legitimos ou instituidos
nos termos dos artigos 1852.° e 1853.y
Porém as corporações ecclesiasticas, que aliás não podem receber
em testamento mais do terço da terça do testador podem todavia
ser contempladas com doações como qualquer particular, além do
terço da terça do doador. porque as restricçes á acquisiçào por
titulo gratuito o+,rtis casa não se ampliam i acquisição por titulo
gratuiro inter ciros, visto não poder ser applicada a lei que faz ex-
cepção às regras geraes a nenhuns casos que não estejam especifca-
dos na mesma lei.
Repuoyna aos principios liberaes e ao estado de civilisaçào em que
nos achamos reconhecer ás corporações ecelesiasticas o direito de
haver por doação toda uma fortuna quando por successão não po-
dem haver mais do que o terço da terça.
E certo, porém, que a lei, não impondo as mesmas restrieções à
doação que ao testamento, implicitamente permitte a acquisiçào por
doação sem outra restricção além da obrigação de alienar dentro de
atno os bens inusobiliarios que não forem fundos consolidados, tal-
vez por ser menos etlicaz a sedueção para alcançar em vida do que
para obter por morte.

Art. 1 782.1 Os que forem condemnados por haverem


altentado contra a vida do testador, ou concorrido de qual-
quer forma para tal delico, e os que impedirem por vio-
lencias, ou coní ameaças, ou fraude, que o testador revogue
o seu testamento, não poderão aproveitar-se das disposi-
ções feitas em seu favor.

.4I
r
A llTGOS 1783 e 1784. 331

iunico. No caso, porém, de tentativa contra a vida do


testador, solrevivesulo este, será valida a disposição pos-
terior ao crime, se o testador teve conhecimento Welle,
bem como a disposição anterior poderá surtir effeito, se o
testador declarar, por modo aulhentico, que persiste n'ella.
(Vid. nota ao artigo 1749.)

Art. 1783.° E applicavel ás disposiçies testamentarias


o que fica ordenado no artigo 1481."

(Vid. nota ao artigo 1481.)

SECÇÃO til

Da legitima e das disposições inofficiosas

Art. 1784.0 Legitima é a porção de bens, de que o tes-


tador não pôde dispôr, por ser applicada pela lei aos Ler-
deiros em linha recta ascendente, ou descendente.
unico. Esta porção consiste nas duas terças partes dos
bens do testador, salva a disposição do artigo 1787.0

(Vid. artigos 1786. e 1787.-)


Nâo ha que faltar da historia da liberdade de testar nos tempos
primitivos, porque nos primeiros tempos não havia propriedade in-
dividual. Os bens pertenciam :i tribu, ú gens, ou à famillia.
Fez excepçào o povo romano, que, inscrevendo nas 12 taboas a
celebre lei -.- ateryamilias, uti legassit super aíilia, pecunia, tutela-
voe rei suae, ita jus esto-, deu ao pae de familias o direito de vida
e de morte sobre as pessoas e es bens dos filhos.
Em Roma chegou a ser consagrado o principio absoluto da liber-
dade de testar.
Mas deante da crueldade dos paes que, ao abrigo da lei, privavam
iniquamente da herança os filhos, levantou-se forte reacção que co-
meçou por dar a acção de inoOticiosidade, e por impôr em seguida
a necessidade da desherdaçio formal, e que acabou por introduzir o
sostema das legitimas que com o andar do tempo ganhou raizes
indostrctiveis em quasi todos os paizes civilisados.
Combatem muitos vivamente a instituiçào das legitimas por offen-
sivas do direito de propriedade que no seu caracter absoluto deve
abranger o direito de testar em toda a sua extensão, e por attenta-
torias da auctoridade paternal, e obstaculo á grande cultura e ao

LI, '
33z ARTIGO 1784.-
desenvolvimento da grande industria por causa da partilha das pro-
priedades que a legitima torna necessaria em periodos determi-
nados.
Funda-se porém a co-existencia das legitimas com a quota dispo-
nivel em que, por um lado a absoluta liberdade de testar deixaria
indefesos os filhos contra as paixóes e contra a fraqueza dos paes
e consentiria a arbitrariedade e o despotismo á sombra da liberdade,
e por outro não seria justo negar ao proprietario o direito de dispár
á vontade d'uma quota da sua fortuna nem deixar absorver o indi-
viduo completamente pela familia privando-o de cumprir deveres
pessoare e sagrados.
Deriva a legitima dos descendentes da obrigação natural que
têem os paes de não deixar abandonados e desarmados no meio da
sociedade aquelles a quem deram o sangue e a vida, e assenta a
legitima dos ascendentes na compensação dos sacrificios feitos com a
educação dos descendentes.
Está pois limitada a soberania do proprietario pela divida para
com os filhos e para com os auctores de seus dias.
Quem tem descendentes ou ascendentes nào póde inverter em libe-
rulidades arbitrarias a totalidade do seu patrimonio, porque não póde
preterir o auxilio mutuo que a familia se deve.
A razão, o carinho e o interesse de familia erguem a sua voz
em favor dos paes e dos filhos.
Já nos antigos foraes, onde aliás era largamente garantido o di.
reito ie testar, se encontram vestigios das legitimas.
Póde dizer-se que a legitima, junctamente com a isdissolhilidade
do vinculo matrimonial, fôrma a pedra angular do edificio da fa-
milia.
Abstrahindo, porém, da questào philosophica sobre as legitimas
que é inteiramente alheia ao nosso proposito, o certo é que está tão
enraizado nos hahitos e nos costumes do povo o direito á reserva,
que o legislador não se atreveria hoje a revogar este principio con-
signado na velha Ordenaçào, e já antes d'isso reconhecido nas nos-
sas leis.
Vai até o decimo gráu o direito de suecesso. Mas herdeiros legi-
timarios ou com direito a uma porção da suecessão, de queo auctor
da herança não póde prival-os senão nos casos especiaes expressos
na lei, são unicamente os descendentes e os ascendentes, nos quaes
se comprehendem nào sé os filhos perfilhados, que até concorrem com
os descendentes legitimos e legitimados, mas tambem os ascenden-
tes illegitimos conforme os artigos 1994.° a 1999.°
Já Coelho da Rocha denominava legitimarios, como hoje os deno-
mina o codigo, os herdeiros antigamente chamados necessarios ou
forçados, explicando-se a substituição da palavra necessarios ou for-
çados pela palavra legitimariospara excluir a idéa de que estes her-
deiros tenham obrigação ou necessidade de acceitar como aconte-
cia nos tempos da velha Roma com o haeres suus.
Tambem sobre a porção legitimaria é grande a divergencia entre
os diversos codigos a começar pelo direito romano onde a principio
era completa a liberdade de testar. É muito questionado se a reserva
deve ser fixada de modo invariavel ou se ha de variar segundo o
numero de descendentes, ou de ascendentes, ou segundo outras con-
siderações.
O moderno codigo civil italiano fixou a legitima em ametade da
successãopara os descendentes sem distincção de classe e n'um
terço para os ascendentes.

Jâ i
r -,

ARTIGO 1785. 333


A nossa ltgislaçlo antiga fixava em dois terços a importancia das
legitimas, qualquer que fosse a qualidade ou quantidade dos lier-
deiros necessarios, ascendentes ou descendentes, legitimos, legitima-
dos, ou perfilhados.
0 codigo, porém, adoptando em regra a quota marcada na legis-
laç4o velha, introduziu todavia algumas modificaçhes derivadas da
proximidade do gráu dos ascendentes, e da qualidade dos descenden-
tes que concorrem à sucessão.
Para os ascendentes além do primeiro gráu marcou apenas ame-
tade artigo 1787.^, e para os filhos perfilhados designou quota
differente segundo concorressem ou não com posteridade legitima, e
segundo tivessem obtido a perfilhação antes ou depois do matrimonio
que consagrou a posteridade legitima.
0 sr. dr. Paes combateu a desegaaldades da legitimas entre des-
cendentes e asceudentes, e pugnou pela continuação do direito de
reciprocidade na suecessio legitima por lhe parecer iijusto dar ao
descendente direito a receber de ascendente porção maior do que
este teria direito a haver d'elle.
Mas a isto respondia com razo o sr. Seabra, que a falta de reei-
procidade quanto aos ascendentes era justificada pela necessidade
de dar ao filho mais latitude na disposição dos bens que adquirira
independentemente da herança de seus ascendeítes, que em regra
devia suppâr-se ainda não recebida.

Art. 1785.1 Se o testador tiver, ao mesmo tempo, fiilhos


legitimtos, ou legitimados, e filhos perfilhados, observar-
se-ta o seguinte:
j.1 Se os filhos perfilhados o estavam ao tempo em que
o testador contrahi o malrilmOio, de que veio a ter os
filhos legitinios, a porção d'aquelles será egual à legitima
festes. menos tut tleto;
2.1 Se os filhos forem perfilhados depois de contrabido
o ttatrirnonio, a sua porção não excederá a legitima dos
outros menos tini terço, e sairá só da terça disponivel da
herança.
(Vid. artigos 1774., 1991. e 1992.°)
Dirante seculos esteve na maior parte dos povos vinculado á fa-
milialegitima o direito de succeso. Não havia fára da familia le-
gitima direito de successào, ei negava o legislador todos os eifeitos
civis ás uidos illegitimas, o que aliás não impedia o desinvolvi-
mento das geraçòcs illicitas, contribuindo para isso bastante a iíí-
possibilidade do casamento entre as diversas classes da sociedade,
pois m muitos povos era protibido ou pela lei ou pela opinião o
matrimonio entre o tnobre e o plebeo como se o amor conhecesse
semelhantes distineç es.
O legislador, a quem cumpre por motivos de ordem moral defeti-
der a familia legitima que é na actual organisaçdo a base de toda
a ordem social, e que por outro lado deve evitar que os filhos de
nides illegitimas supportem as culpas dos paes, chamou os filhos
illegitimos a compartilhar tambem na successdo sem todavia os
egualar aos filhos legitimos que seria talvez equiparar a conehiía
á mulher casada.

O0
334 ARTIG(I 1785.0

Mesmo entre os illegitimos não tractou do mesmo modo os filhos


de pessoas qnc entre si podiam celebrar o matrimonio ao tempo da
conce p ção e os de pessoas absolutamente impedida- de entre si ca-
sar; pois excluiu absolotamente os illegitimos provenientes de vicio
de origem condemnado pelas leis e pela consciencia publica, e cha-
mou á herança unicamente os filhos illegitimos que podeni execeer
direitos na suecessão sem offender os sentimentos da familia legi-
tima, nem rebaixar a grandeza do matrimonio.
Por isso uma das reformas mais discutidas na materia da sueces-
so ob iN/cto é a que reconhece direitos successorios a filhos de
concubinato legalmente perfilhados.
Tem sido censurado o legislador porque, cedendo a um movimento
de compaixão em favor dos filhos illegitimos, se torna eumplice de
uma revoltante immoralidade, precipitando mais a tendencia geral
para o concubinato que é a di'soluçdo da familia, e apagando por
esta fórma toda a didcrença entre a mulher honesta e a concubina
com prejuizo, no só da moral que deve ser a base de toda a socie-
dade, mas dos direitos dos parentes: e tem sido por outro lado
apodada de injusta em nome do principio da egualdade entre os fi-
lhos do mesmo pae a preferencia do filho legitimo, e sobretudo do
filho legitimado por subsequente matrimonio sobre o filho illegitimo
perfilhado antes do casamento, quando o filho natural devendo, como
o legitime, a existencia aos mesmos paes tem o mesmo direito a
participar na sua fortuna, e nos seus affectos. pelas condiòes geraes
da natureza.
Outros fitaltmente, seguindo uma opiniào media, sd querem re-
conhecer legitima aos filhos perfilhados tia falta de posteridade
legitima. quer seja anterior quer posterior ao matrimonio a perfilha-
çao.
Tambem não são conformes sobre este ponto os codigos das naçles
civilisadas.
Mas o que tem prevalecido em quasi todas as legislaçées moder-
nas é a doutrina do osso codigo como mais conforme com as exi-
gencias da justiça e com os conselhos da humanidade, porque tende
a reparar aggravos e injustiças feitas a desgraçados que não tive-
ra, culpa de haverem nascido fóra do matrimonio, e longe de admit-
tir egnaldade entre os filhos legitimes e os illegitimos, reconhece
pelo contrario a supremacia da legitimidade solere a illegitimidade
em homenagem e mural, e exclue absolutamente os illegitimos nas-
ridos de adulterio ou de incesto.
A propria revolução franceza, obedecendo aos costones publicos
e is conveniencias sociaes, não se atreveu a reconhecer direitos
successorios aos filhos de pessoas impedidas de contralir matri-
monio.
O sr. Sabra, que si inspirava no p}etin-nto d, coimar o res-
peito devido e dinidade do matrimonio e á legitimidade da prole
com os direitos imprescriptiv eis da natureza e do sangue, justificava
assim o seu novo setema sobre legitimas:
=Primeiro que tudo não devemos perder de vista, que na grande
maioria dos casos, segundo e systcma vigente, os filhos naturaes
succedem a seu paes promiscuamente com os legitimos. já se ve
pois que nesta parte o direito actual é mais. favoravel aos filhos
natnraes, que a disposiçà, do nosso artigo. E verdade que a dis-
posiçào da lei actual só comprehende os filhos de pedes, mas nao
é menos certo que esta classe é a mais numerosa da sociedade. N es.
tas circumstaucias era preciso, os fazer descer os filhos natoraes dos

i
r
ARTIGO 1785.r 335
eavalleiros t condição dos filhos naturaes dos peães, ou fazer subir
estes á condição d'aqoelles.
«Não fizemos nem uma cousa nem outra. Nenhuma d'essas alter-
nativas era acceitavel aos olhos da justiça, da moral e da cove-
niencia publica. Seguimos o meio termo; transigimos, resalvando
todos os direitos com a possivel ou necessaria ditlerença.
«Tal homem tem um filho natural; recolcece-o ou perfilha-o. 1'asa
depois e tem filhos legitimos. Será justo que este tilho perfilhado
antes do tatrimocio sejacompletamonte desherdado? Não tiua
elle uns direito adquirido, ou pelo menos uma justa espeotativa de
successão? Por outro lado não era já conhecido da astlter, que con-
trahiu o matrimonio com o pae desse iilho natural, que esse filho
existia e gosava de certos direitos'? 'arece-nos qoe a jntiça pedia
que estes filhos fossem em todo o caso contemplados, posto que
menos avantajadamento quc os legitictos, cui attenção ao favor com
que os ajustes npriars devem ser protegidos.
,Mas tal homem, que teve um tilho natural antes de casar-se,
vem só,mente a recouhecel-o, ou durante o matrimonio, ou dissolvido
elle, estará este filho no mesmo caso? De certo tão, aqui o direito
está todo da parte dos legitimos.
«O casaoeíto foi contraido na stpposição de que neulmas obri-
gaçáes ligavam o pae a outros filhes, e o fctc do reconhecisncto
posterior ¯não deve prejudicar os legititos. N'este sentido concedemos
sim ao filho perfilhado a sua legitima. mas sem prejsizo dos filhos
legiticms, fazendo-a sair da terça. E corrt talvez podesse o filho na-
tural vir a ter maior legitima que os filhos Icgitimos, o que seri:
monstrooso, decccrátos que em caso algum esta legitima podesse
exceder a dos outros, meuos um terço,,.
N'esta ordem ci idées concorrendo sós os flhos perfilhados téci
direito :í porção legitimaria po se foram lcgitimos ou legititodos,
e concorrendo com posteridade legitima ou legitimada ter'o l;i-
tima iíferior n'um terço, que além d-isso ha de sahir não dos dois
terços o.trisã,dos da herança mas da quota tispo nivei qu:do a per-
filhacão tiver sido feita posteriormente ao icatrimconio, sem que o
pae possa dispár senão do remanescente da terça depois de satisfeita
a legitima dos filhos perfilhados.
t qsialáo portanto dos filhos illegitimos que concorrem com des-
cendentes legiticcs rnca à superior ci legiticcís destes menos titi
terço. e pcde ser muito inferior quando a perfilhaç o teve logar
depois do matrimonio, porque ieste caso sci a legitima-O6 da
terça tispotoe/ da áerassa-.
As palavras - e sahir st da terça sisoe sda herança - vieram
subsrtitsir as palavras fina-s do projecto primitivo no ã2." do :urtigt
corre-jondente lio artigo 175."--sair da liaça leosl'ad ca
para evitar a duvida a que tal redacção s prestava se a Legitna
dos perfilhados só sabia da terça quand houvesse testador e tes-
tamento, já para obstar a que com perfilhaçes posteriores ao ma-
trimonio se illudissem doaçJes anteriormente feitas.
Já se julgou que a legitima do filho illeitimo, siando perfilhiado
depois do casamento, não pode ser composta com pre tiza d ter-

1 Aecordão do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de dezembro


de 1891, Direito, 31.° ano, n.r 4, pág. 55.

k
336 ARTIGO 1785.0

cenario t, que os perfilhados, ou a perfilhação seja posterior ou ante-


rior ao matrimonio, têem sempre direito á sua legitima conforme os
artigos 1295. e 1989.- a 1992i sem embargo de quaesquer doações
que não podem ser mantidas com prejuizo das legitimas em presença
dos artigos 1492', 1789.0 e 1790', como tambem em contrario se
julgou.
Mas nem uma nem a outra decisão é legal.
As liberalidades testamentarias em caso nenhum podem prejudi-
car as legitimas.
Por outro lado a perfilhação antes do casamento não rompe quaes-
quer doações irrevogavelmente feitas, quer a descendentes legitimôs,
quer a outras pessoas, em vista da disposição clara e terminante do
artigo 1785.° 2.°, que o filho perfilhado posteriormente ao matrimo-
nio só suecede na parte da terça de que o auctor da herançà ainda
poderia dispõr a tempo da morte. z
Se o pae perfilhante tiver doado ao consorte na escriptura de
casameuto todos os bens presentes e futuros ficam sem legitima os
perfilhados posteriormente ao matrimonio r; pois que os direitos dos
perfilhados começam na data da perfilhação ao contrario dos efifeitos
da legitimação que começam na data do casamento.
O pae que perfilhou depois do matrimonio póde ficar inhibido de
dispõr em testamento entre vivos, como ihibido fica de dispõr o que
doou todos os bens de sua terça, artigo 2111.' § 2.', pela simples
razão de já não ter que dar.
Pela superveniecia de filhos só podem ser revogadas doações
cossummadas, se estes forem legitimos sendo o doador casado ao
tempo da doação artigo 1482.0
A perfilhação superveniente ainda que judicial não invalida as
doações, porque a perfilhação judicial não póde ter mais efleitos do
que a voluntaria.
Não chegando a terça para assignar aos filhos perfilhados quinhão
egual ao dos legitimas menos um terço. é então rateada entre
os perfilhados a quota disponivel, e fica o par sem ter de que dis-
pôr, do que elle no póde com razão queixar-se porque se creou a
si mesmo essa posição com o reconhecimento posterior, quer vo-
luntario, quer judicial.
Só nas hypotheses de doações anteriores e de ser necessario com-
pôr legitimas é que péde ficar privado o auctor da herança de dispõr
por inteiro da terça. a
A referencia nas palavras do o.' 2' do artigo 1785. .são excederá
a legilima dos outros', é evidentemente aos filhos legitimos, apesar

r Accordào do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de junho de


1883. Direito, 19. anno., e.' 22, pag. 343.
z Accordào da lelação do Porto de 21 de julho de 1882, Rerista
de Legislação e de Jrispr-dencia, de Coimbra, 16.' anno, n^ 797,
pa". 23.
a -ecordão do Supremo Tribunal de Justiça de 31 de outubro de
1899 Ga-eta da Relmço de Lisoa, 3.' asno n.' 35, pag. 296.
Aceordãos, do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de dezembro
de 1891, e da Relação de Lisboa de 7 de dezembro de 1892, Reiisa
dos Tribmiaes, 11. anno, o.' 258, pag. 278. e Gazeia da Relação de
Lisboa, i' sano, n." 51, pag. 403.

11
r
ARTIGO 1785.- 337

de alguns não aciarem sufieintemente cl se é aos filhos per-


filhados antes do ímatrimosio. si é aos filhos legitimas por de us e
d sutros se haver fé[tido tnteriormte; poio n'aquelle numero não
pensou o legislador em fixar aos perfilhados posteriormente ao 'ma-
trimonio legitima maior o meor do que a dos perfilhados anterior-
mente, e sim em evitar que a quota dos illegitimos excedesse a dos
legitimos, como podia acontecer aí fossem poncos os filhos posterior-
mente perfilhados e muitos os le i timos.
Se fosse aos legitimos e tiâs aos perfilhados anteriormente ao aia-
trimonio a referencia, ficaria a porção dos pertilhados posteriormente
inferior n'u torço ú dos perfilhados anteriormente mesmb quando
na terç:a do pa lhes podcssi ciiabr quinhão eguail, fnando não havia
razão para iabitrar legitiima diffrente entre peritl dos detírminada
s6 pelas datas da perfilhtiot.
Podem os perfilhados depois do matrimonio receber menos do que
os perfilhados antes; mas é por tio dar para mais a massa heredi-
taria. e tão por ser menor a quota legitimaria d'aquelles do que a
d'estes.
Os filhos perfilhados posteriormente ao matrimonio recebem da
terça o preciso e só o preciso p:ura terem legitima egital a dos legi-
timos menos um terço, e rnda tais. t
Cíoorrorindo sés filhos perilhados a legitima é a mesma dos
1egitimos como resolveu a commoissão revisora em sesso de 5 de
ju io tIt2, alterando o irtigi 1s1G. do projecto primitivo que
de
precedia imiedia en te o artigo correspondete ao artigo 1785.
do codigo, e que fiava a legitima at wfaf dos bens se o testador
tivesse s filhos perfilhados.
Corcorrendo à herança filhos perfilhados conjunctanenrte com
posteridade legitima rpresnta-se cada filho legitimo pelo mune o
3 e cada filho portiihado pelo ímero 2, sommam se todos os valores
representativos de cada um dos filhos legitimos e de cada um dos
filhos perfilhados, toma-se depois esta soma como divisor de que é
dividendo a herança. e a legitima é o qutciente multiplicado por 3
ou multiplicado por 2 segundo se tracta de filhos legitimos ou de
tilhos perfilhados. sendo a porcçio dcotdat m dos filhos perfilhados
para a de cada um dos filhos li mos nrtazio de 2 para 3.
Por este processo na herança de IG:000000 réis concorrendo dois
tilhos legitimos e dois perfilhados, e repartidos os 16:00 000 réis
pelo numro 10 que é a soma do prodíto dte duas oezes trs
(simero dos filhos leeitimo ) e do produto de duas vezes dois (nu-
mero dos filhs pírtilhudos). é a legitimai de cada um dos filhos le-
gitimos o quociente 1:ít00c000 ris multiplicado por 3 ou 4:80000
réis, o a i-gitima dos filhos perItfétttsí- mesmo quociente multipli-
cado por 2 ou 3:200000 ri .
Na hro:tan d., 21:000000 réis concorrendo ties filho, dois legi
timos e um perfilhado antes do matrimonio, tem cada um dos legi-
timos 9:0003000 réis e o perfilhado f:000000 réis, e se o auctor
da herança houver disposto da terça, tem cada um dos legitimos
6:0003000 réis e o perfilhado 4:i[i f00 réis.

.Acceordão da Relação de Lisboa de 7 de dezembro de 1892,


Direito, 28.. anuo, n. 20, pag. 319.
Toto Iii 22
338 ARTIGO 1785.0

herança de 12:000x3000 réis coicorrendo dois filhos legitimos


Na
'o'i filhos perfilliados depois de coutrabido o matrimonio, levauta
cada 1u dos legitin s 4:5i03(.0 réis, i perfilhado s r só me
3:0003000 réis, e levanta cada tm dos legitimos 4:003(000 réis
cada ui dos perfilhados 1:0003000 reis se quatro são os perfilhados,
artigo 1992.
Da terça só que sMia a legitima dos perfilhados é sempre o mesmo
o processo de diviso da iLerança, estando sempre o qoinho dos
perfilhados na razão de 2 para 3 cm relação aos legitimos.
Assim na Lerança de 12:000; (00 reis a dividir por dois fi-
lhos legitituos e ut perfilhado não levanta o perfilhado mais de
3:000 100 réis, ou a totalidade da herança se reparta entre elle
e os dois irmios na rzoo de 2 para 3, ou se lhe é ltda terça
disponivel a legitima em preço egual menos m terço á porção das
legitimas.
Só derxa de observar-se
aquelle processo quando a divisão da terça
no dR aos perfilhados legitimas eguaes ds dos legitituos einos am
terço, porque entRo separa-se completamente
a terça do resto daie-
rança e rateia-se pelos perfilhados.
[sr exempo: ua herança de 12:000,000 réis, concorrendo dois
filhos legitiíos e quatro perfilhados depois do matrimonio, levauta
cada um dos legitituos 4;l00R000 réis. e riparte-se o resto cn-
te os quatro pertilhados, daido-:e a cada um 1:000,l'000 réis
visto nto produzir a terça dividida por 4 legitima egual menos
mu Ireo íos 4:000000 réis qw, coobleam a e'da num dos filhos
egitimos.
Já no d, porém, appliCavel este proe sso :i p artilha do usufrueto
legado ao par e est propriedade aos ícrdeiruos /e;litio.s do pac.
N'eota L, pothese ha de ser afsirmalada a propriedade em quiíltes
eguaes aos herdeiros legiitmo do pae. ainda que concorram filhos
perfillhtos cm filhos le'iti:í, on l itiiados. porque a disposiçào
'specidlis'í do .irtigt 175 aop- ser ípplicada aos casos ge-
racs, apes ít de já se ter julgado o cntr-rio.
O irtitro 1785.' limita-s a lixar a rserva legitimaria dos filhos
perfilhios quando com descendentes legititos onc'orram à lerança
do pac nada mis.
A Ordenaç ão do r :i. liv. 4. ti t. 92. s admittiai à successão ab
infstao de seus punsiaos htardus que eram filhos de pasea 1is,
preceito que foi mantido at i promulac lodo tioo rodi {o apesar
de com a carta constítseííinal, írtigo 145.° 12.' o 15 sermo declia-
rodos eguaes peraít- a lei todos os 'idados e tereí,í acabado todos
os privilegio, que n o estivessem essencilsentc iíerentes aos
'args por utilidade publica. já por nei e julgar prejudi ada pelo
ucti'i ,eeicii' la carta constittri'iil a dipo-içãi esprria dia lei
eivil. ji por ser imito duvidoso ' a provisto da Ord., liv. 4.' tit. 92.
representava um privilegio em favor dos nobres a cujos filhos se ne-
gava o direito de sucessào, se a favor dos plebeus a cujos iilhos se
concedia esse direito.
1oje, porém, os direitos dos filhos illegitimos de pae nobre, ainda

t Accordão da Relação de Lisboa do 't de outubro de 1898, Ga-


:ela da Relação de Lisboa, 12. anno, u." 33, pag. 257.


w>.,

ARTIGOS 1786y a 1787." 339

qe nascidos antes da promulgaçao do codigo desde que o pae te-


nha fallecido depois são regulados, não só quanto a acção, senho
tambem quant ao direito, pelas dsposiçtes consignadas na lei nova
que acalou co o impeditíent o á
suecessão que ao filho pae de
nobre punha aquella ordenação, visto regularem-se os direitos da
suecessão pela lei vigente ao tempo da abertura da herança, e não
pela lei vigente ao tempo do nascimento do iudividuo.
Os filhos perfilhados são obrigados como os legitimos a con-
ferir nos ternos dos artigos 20S8. e seguintes, e são equiparados
aos legitimos e aos legitimados para os effeitos da cottribuição de
registo.
Mesmo 1 suecessão dos bens desvinculados por virtude da lei de
19 de maio de 1863 tem já sido admittidos os filhos perfilhados',
sm embargo do preceito consignado no artigo 5' da mesma lei,
que diz assim: st'tor morte do 5ctual administrador e de seus im-
mediatos succeasores nao serso admittidos à stecessiio a intesltao
dos bens, de qe se compunham os vitcul'ts, pessoas extranhas á
linha por onde os mesmos vinculos provieram, quando existam n'essa
linha parentes até ao terceiro gri contado por.direito canonico,
já nascidos ao tempo (Ia promulgação d'esta lei', ou por se reputar
substitido pelo codigo civil o disposto no artigo 5.' da referida lei,
ou por na'' se cosiderar extraho ao sangue do instituidor o filho
perlilhado.
Os ilhos espurios é. que são considerados extranhos aos paes e ci
familia, quer para os effeitos civis. artigo 1353., quer para os effei-
tos ti.eaes, regulamento de 23 de dezembro de 1849, artigo 7.' t. 1P,
e artigo 9." 11-
Porem, ao passo que o viuvo de filho legitimo tem apenas direito
a alimmetos conforme os artigos 1231. e 1232.', e em caso nenhum
lhe succede, achando-se judicialmente separad de pessoas e bens,
artigo 2003.', o viuvo de tilho perfilhado fallecido seI posteridade
quer legitima quer perfilhada, pois o artigo 1994.' não distingue, tem
direito ao usufructo de ametade da herança artigo 1995.', embora
se ache separado d pessoas e bens por culpa sua, pois nos arti-
gos 1994. e 1995.' aio se encontra a restricçilo estabelecida para
o conjuge de filho legitimo no artigo 2003.'

Art. 1786.0 Se o testador, ao tempo da sua morte, não


tiver filhos, mas tiver pae ou mãe vvos, consistirá a legi-
tima dos paes nos dois tercos da herança.
Art. 1787.° Se o testador só tiver, ao tempo da sua
morte, outros ascendentes, que não segam pae, ou mae,
consistirá a legilima d'elles em metade dos bens da he-
ranca.
(Vid, nta ao artigo 1781h.)

Accordào da Relarão de L'sboa de 12 de juíní dt' 1891 . Gctr(tl

da Relação de Lisboa,5. anío, 1.- 43, pag. 341.

rt
r.ý

340 ARTIGO 1788y

Art. 1788.0 Se o teolador dispozer de certo usufructo,


ou de alguma pensão sitalicia, cujo valor exceda a sua quota
disponivel, poderão os herdeiros legitimarios cumprir o le-
gado, ou entregar ao legatario tão somente a quota dispo-
uive].

(Via. artigos 2145. a 2150:)


Desde que esteja reconhecido que os legados de certo usnfrncto
ou de pensìio cidlici,, vio além da quota disponivel ficam os her-
deiros legitimarios com a liberdade de cumprir o legado ou de en-
tregar a quota dispoivel do testador ao legatario; ino podem os
legatarios do uscfrncto ou da pensto iueixar-se porque recebem
tso aq u illo de que o testador podia dispõr.
Os herdeiros Io de naturalmente decidir-se pela entrega da inota
dispoivel ou pelo pagamento da pcnsào ou usufructo legado co-
forme for ainda nov e prometter longa vida ou for já avaiíado
em edade e não oferecer grande draçâo o legatario-
O ditiicil to caso é ociliar o preseto artigo com os artigos
2148.° a 2150." que na mesma hypothese estabelecem providencias
contradictorias.
O presente artigo impte aos herdeiros legitimarios a obrigaeéa
de entregar oc pcqro'redade a quota dispoivel do testador, como
está na sua fonte, o artigo 917." do codigo eitil franecz, que é
redigido nos seguintes termos: «oSi a disposjcac par cte entre
rsio oou par tcstment sl d'n, acfrucl i d'cne reste ricjre doo Ia
,alemr exdc' a qcccic/ dipoile, l hiritiêer, mc prfjit desejols la
loi tail coe rcserre, otrot ccptin u d'ero, or clle dipo/silio, o
de /aire raíclon de a prpriéL de Ia qoolíi disonille.
Mas a quota disponivel que a artigo 1788.° manda entregar em
propriedade, mandam os artigos 2148^ a 2150 entregar et asn -
i~cc/a, quando nio dcl para ser paga pensio vitalicia annual legada
por testador com herdeiros legitimarios menores ci semelha tes.
Assim o legatario a gno n, mio c pga a pensco por exceder a qota
dispocivel cio testalor, ao passo que pelo artigo 1788 totem direito
a haver essa qoota em p e rfeito domiínio. suifructo e propriedade,
pelo artigo 21511S tem direito a liasei -a apenas em tsufrocto.
A hvpotheo sobre qe recaecc estes ditcretes artigos éa mesma,
porque tanto o srtigo 1788. como o crtigo 2150." se refere a legado
ce pet-no vitalicia cujo capital excee a quota disloniel do testa-
dar, e que fica a cargo dc herdeiros Iec¡ilimarioo cier maiores quer
pneorea.
As actas das sessões da commissão revisora no pde ir bnscar-se
explicaçdo, porque no cocigo ficaram os mesmos artigos do primitivo
projeoto sr. S:obra com ligeiras alterações de redacço.
Vinha do projecto primitivo a desharmonia, e passou sem ccrr ecço
em todos o- projectos da c mnissoc revisora.
iara harmonisar as das disposicies referem lgns o artigo
1788." co legado de certo usnfrceto ou pcnsào vitalicia que eacedc
o cqcta dispoivel do testador sen, mais declaraçìco, e os artigos
2140: e 21.->0 ccio legado de pesa rialicia <canal cara ser pagia
ici por delermindO herdeiro o /egctlio, roas pela ero-c
Esta conciliaçâa, porém, nada onceilia.
Procuram outros eitar a oltradicco sustctilalo que a quot a
disponivil, quando inferior c itcpertucia do legado. ha dc ser cu-

Á
"1

A tIOS 1789" S1790.^ Il

tregue em capital ou emusofrue to conforme forem nliores ou meno-


res os ierdeiro l-gitiomrios; e que assim podem os interessados
quando menores ou semi-lhats livrar-se do legado pela entrega
da quota dispouirel em usufructo, e téem de optar ou pelo cumpri-
mento integral do legado ou pela entrega em propriedade da qa'ta
diponivcl quando maiores.
eiztm que o legislador tno (uiz ampliar aos maiores o beneficio
qte fez aos menores, e muito expressamente não qui, porque se
quizesse teria feito no artigo 2150.° refereeia aos artigos 21 18. e
2148.' em vez de sd ter feito referencia ao artigo 2148."
O que parece é que os artigos 2148." a 2150.- vieram apenas re-
gnlaicentar o artigo 1788.
O artigo 1788.' teve simplcsmede por fim auctorisar os herdeiros
a substituir o cumprimento do legado pela entrega da quota disponi-
vel do testador scem distinguir entre a entrega da quota em usufructo
e a entrega da quota ec propriedade, nem entre herdeiros maiores
e tíerdeiros menores, e que os artigos 2148.' a 2150 vieram depois
explirar qupara cumprir o legado de peusào superior a quota dis-
poie l tu testador bastava entregar ao legatario situplesmente cio
uitsrueto essa quota disponivel,
lu todo o caso estes artigos, com quauto se refiram apenas ao
pagamento de pensào citalicia, deem por identidade de razno ser
applicados à peusao por periodo definido e limitado.

arl. 1769.0 Se o tesíador houver doado, ou disposto de


otvis bens do ste ageles de que lhe é permiltido dispôr,
prslerão os herdeiros legilinrios requerer na abertura da
herança, CiIe a doaçãt, ou deixa, seja reduzida, nos termos
declarados tos artigos [49:. e [494.5
(Vid. uota ao artigo 1492')

Arti. 1790.0 0 calculo da terça, para o effeito da reducção,


será feito da maneira seguinte:
1.° Stitar-se-ha e valor de todos os bens, que o au-
ctor da Iterança houver deixado, feita a dedtcção das di-
vidas da [terança; ajunclar-se-ha á sommia restante o valor
dos bens, que e fallecido houver doado, e a quota disponi-
vel sera caltilada com relarao a esta soiuma total.
2.0 tvaeor dos bens doados será o que tiverem na
epcha em qte a doaão produzir os seuis effeitos.
3.0 Se a zons doasda houver perecido, sem que o
doiatario para isso concoresse diíectaleíte, não será
comprehelida tta massa da herança para o calculo das
legitimías.
Pelo codigo, como por direito velho, ' á hora da morte que se
avalia o activo e o passivo do auctor da herança. Sio os bens exis-
tentes ao tempo do obito que constituem a herança.
Por isso tambem só com relaçào aos bens ao tempo da morte, 4

MELÉ.,
342 ARTIGO 179.i

fixada a quota disponivel do auctor da herança.' - Mortis tempus


iuspiciltr, quia sulla rires/is succeoio, nila haeredias <5 -.
Os valores trazidos à collação é qe tanto l codigo como pela
legislação aiterior são apenas considerados paira o coi puto das e-
gitimas 2 e não para o calculo da terça.
Só no caso de reducçào por inoficiosidade é que o computo da
terça é regido pelas disposições do presente artigo, com quanto já
se julgasse 7 que a terça ha de ser sempre calculada do mesmo modo,
quer se tracte de reduzir doaçòes, quer se tracte apenas da liqui-
dação da legitima e da terça entre os herdeiros legitimarios.
O processo do artigo 1791.3, porém, é só empregado para reduzir
doaçòes quando inoliciosas como claramente indicam as palavras
-- pra o eeii/o da reducção-, como até se mostra da collotação
do artigo sob a secçào q ue tem por cpigraphe - da legitima e das
disposições inofficioos -.
A terça não é calculada em conformidade do artigo para alargar
a quota disponivel do testador a tio de ampliar o direito de fazer libe-
ralidades, nem para servir os credores, e nem mesmo os legatarios
que nada absolutamente lucram com a reducção porque o auctor da
herança já não podia dispor da quota que estava antecipadamente
absorvida pelas liberalidades entre vivos artigo 211. 2.3
Se o processo do artigo 1790.° fosse o do direito comomm não o
teria o codigo limitado ao caso de inofliciosidade; nem para marcar
a terça em ceoforíiiidade dU direito commum seriam precisas regras,
pois conhecido o odo da herança facil é tirar a terça independente-
mente de quaesquer calculos especiaes.
Não deixam a menor duvida de que só se calcula pela férma pre-
seripta no artigo 1790.° o terço, quando tem de responder pelas
doações inofliciosas, as explicações do sr. Seabra sobre o caso.
Dizia o sr. Seabra em resposta ao sr. dr. Paes sobre o artigo
do projecto, correspondente ao artigo 2098.^ do codigo: -Quando
se achar que o fallecido nas suas liberalidades excedeu a quota
disponivel, ou, por outras palavras, quando a terça dos bens exis-
tentes não chegar para suppril-as e algum herdeiro legitimario
se achar desfalcado, tem então logar a redução, e n'este caso fa-
zer-se o calculo na fôrma do artigo 1922.0 (correspondeute ao artigo
1790.^ do codigo)-.
Veste caso equivale a dizer que em caso differente, isto é, que
no caso de não haver logar a reducção por não serem inoflhciosas as
doaçòes, ha de calcular-se a terça não nos termos do artigo 1790,
mas sim sobre os bens deixados no seu patrimonio pelo auctor da
herança.

1 Aecordào da Relação do Porto de 22 de janeiro de 1875, Recista


de Legislação e de Jurispriudencia, de Coimbra, 10: anuo, n. 477,
pag. 135.
2 Acrordãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de junho
de 6 de novembro de 1574, e de 13 de julho do 1975, Gaze/a da
Associação d/os Advogados de Lisboa, 1. asno, pag. 636, e 2.3 alio,
pag. 233.
s Accordão da Rlelaão do Porto de 12 de junlo de 1677, Direio,
9.° anno, n., 26, pag. 413.
Pr-
ARTIGO 1790. 343

Só timn de observar se o processo do artigo 1790." quando haja


necessidade de rednrç:ìo nas doaçes ou sejam herdeiros legiti-
marios ou extranhos os donatarios, seja fiem fio- o dmtaario ar-
tigo 1492 "
O ~adigo no presente artigo no fez mais do que regular a ope-
raçao do calculo da terça quando as doaç,es são inotliciosas, e por
isso mnirIa inciir iictieaente na somm total as diaçdes para
melhor as garantir e esitar o logro que necessariamente soffreriam
os donatarios se a terça fosse computada só com relação aos bens
encontrados no patrimonio do doador a hora da morte, e ainda
cum dedueçào das dividas.
A operaço creada pela lei nova -, pois, mero calculo para achar a
quota disponivel do testador e ser assim até oude ha de ir a reducçà,
pois nem é pago o Ir ao pelos bens doados mtas sim e sómente pelos
bens que formavam o espolio do auctor da herança, rem os credo-
res podem prevalecer-se da reunio dos bens doados aos bens exis-
tentes no patrimonio do auctor da herança para serem pagos dos
seus ereditos.
Pa o eff ito da reducçao das doaç,es inofticiosas calcula-se a
terça do valor das doaçaes somísado com o valor dos bens encon-
trados no espolio do auctor da herança livre das dividas, porque
só se reputa bens o valor liquido, pois quem deve no tem, com
exclusão dos encargos impostos ruo proprio testamento e de despe-
zas como as do funeral que não se descontam no activo da herança
porque não existiami ao tempo da morte do testador.
Assim motando os bens existentes a 1 :00UOUi réis, as dividas
a 4:t00 000 réis, e as dumçéea a 7:000a00 réis, é o valor da he-
rança 15:0(0d000 réis, e o da terça 5:000:000 réis.
Accumulam-se a fortuna do auctor da herança os bens doados só
depois de deduzidas as dividas para não serem prejudicadas as doa-
çées pelos credores, porque se fossem deduzidas nào só dos bens
existentes na successao, mas tasemr r dos valores doados as di-
vidas, e, em vez deo importarem em 4:0004000 réis, importassem
em 20:000.3000 réis ficariam rio exemplo acima posto reduzidas a
zero as legitimas e a quota di sponivel !
Sempre que o passivo da herança exceder o activo reputam-se
zero os bens existentes no patrimonio do auctor da herança, e fica
constando a massa dividenda unicarmerte dos bens doados entre vi-
vos.
Só seria indifderente para o calenlo da terça a omna dos valores
doados com a somma dos valores existentes antes da deducçdo das
dividas quando os encargos excedessem o activo dos bens existen-
tes no patrimonio do auctor da herança, porque entao seria o resul-
tado sempre o mesmo, isto é, no exemplo posto seria sempre de
10:00iiO réis o valor das legitimas, e de b:00 100 réis o valor
da terça.
É ficticiorente que se accumulam os bens existentes com os bens
doados, porque não tem o donatario que desprender-se reaotníate
dos bens doados para os entregar á massa da herança, a fim de sobre
elles exercerem os seus direitos os credores.
Nao trem os credores outros direitos com relação ás doaçJes senão
os que lhes conferem os artigos 100 a 1035.-, 1469.' e 1470.:
0 principio das reducçóes foi introduzido, nào em beneficio dos
credores, e sim e sómente em beneficio dos herdeiros legitimarios,
como bem ponderava Rogron notas ao artigo 922.o do codigo civil
francez, e explicava o ar. Sçabra na resposta ds obscrvacacs do sr
344 ARTIGO 1790.*

Paes da Silva ao artigo 2276.- do projecto primitivo (2103.- do co-


digo).
Dizia o sr. Seabra: Aqui não la restituição effectiva dios bens doa-
dos á massa dividenda; ha sómente um calculo fieticio I ara achar o
excesso da terça, e por consequencia a reducção, que as doações
devem soffrer; nem os credores da herança podem tirar proveito
algum deste augmento ficticis: por quanto, ou os credores são
anteriores, ou posteriores ás doaçées; se são anteriores, podiam ter
prevenido esse prejuizo, e se o não fizeram, a si o imputem; e se
são posteriores, nenhum direito trm contra ns transmisores ante-
riores,.
Exemplo. Se o auctor da líerauça não deixou bens alguns, e
lia dois herdeiros legitimarios um dos quaes recebeu a doação de
24:000000 réis e o outro nada, repüe o co-herdeiro donatario ao
outro co-herdeiro legitimario 8:0U0 000 réis que tanto é o valor da
legitima, e fica para si com os 16:030000 réis, ametade como legi-
tima, e ametade como terça visto ser imputado sempre na terça o
excesso do valor dos bens doados artigo 2111.- gés; e os credooes
nada levantam da massa hercdiui .
Dizia o sr. Seabra explicando ote i processo: uA pratica seguida
entre nós é outra. A terça calcula-se unicamente sobre os bens exis-
tentes, deduzidas as dividas, e se as doaçües valem mais que a
terça, o beneficiado a maior indemnisa os prejudicados na sua le-
gitima. Este svsterna parece é primeira vista simples e sutHliciente,
e que não haveria razão para introduzir outro, mas effeetivamente
não e assim.
«Supponhamos que não ba bens existentes sobre que se forme o
calculo, e só ba doações. N'este caso necessariamente se ha de formar
o calculo sobre o importe das doações.
'Mas dir-se-ha que n'este presupposto não ba precisào de formar
a terça, porque basta que os legitimarios dividam com egualdade
entre si o importe das doaçües, e restituam o que tiverem de mais.
'Sem sempre será assim., Supponhamos que além dos legitimarios
lia extranhos beneficiados. E fora de duvida que estas doações podem
ser annulladas ou reduzidas.
«Mas em que proporçào? Que estas doações não podem ser intei-
ramente annulladas é evidente, pois que a legitima só se determina
por aiorte, e a quota disponivel é una idéa connexa com a de legi-
tima. O mais que a lei admitte em favor dos legitimarios é a redue-
ção., o que já não é pouco.
«E pois iudispensavel proceder ao calculo da terça.
'Este calculo faz-se, como dicto fica, sobre a massa das doações.
Exemplo: massa da íerança 9:000 cruzados; dividas 34:000.
«Os bens da herança tornani-se em zero, porque sio absorvidos
pelas dividas.
«E forçoso portanto recorrer ás doações.

1.° legitimario . 14:000 eruzados.


«2. legitimario.
«3.o extranho ... 10:000 »

Total. 24:00 o

'em à legitima dos dois 16:000 eruzados, e será o terço 8:000


cruzados.
r ~1
ARTIGO 1190. 345

«Haverá pois lagar á redueçao para inteirar o segundo legitimaria,


que nada recebeu dos seus 8:000 cruzados.
«Resta saber como devem contribuir o: donatarios. E o que se
acha regulado no artigo 1567.' (1493.' do codigo). Recorrer-se-La ás
doações em quanto for preciso, segundo a sua data, começando pela
ultima.
«Assim no exemaplo dado, suppondo que a doação mais recente é
a do extranho, ficará sómente com 2:000 eruzados. Se for a doação do
legitiíario, deduzir-se-ha do excesso de sua legitima. que são 6:000
cruzados; e como ainda ha falta, será supprida pelo extranho, que
ficará com 8:0U0 cruzados.
'De fórma que os beneficiados nunca podem lucrar mais que a
terça..
lntroduziu o codigo este systema unicamente
para salvar as doa-
ç"es ordinariamente feitas a herdeires
legitimarios.
0 velho direito Ord., liv. 4.' tit. 97., só obrigava a terça dos
pacs a refazer as doações aos filhos, dava aos donatorios nas
doaçãrs para casamento o privilegio de escolher a fortuna do
doador ao tempo da doaçã: ou ao tempo da morte pai s apurar
se a doação excedia a legitima e a terça. e aí,dava m quasqur
outras doações aos filhos ohL:jr ao que os bens do doador valiam ao
tajo ela ree, o que deixava completame te lugrados outros do-
tatarios que aliás não tinham concorrido para eventualidades pos-
teriores as doações.
Por direito novo corno por direito velbo hão de os herdeiros
legitinarios que pretenderem entrar na successão restituir á massa
tanto para a eguaação da paitilha como para o ealco/ da ker'«
os valores que lhes houverem sido doados pelo auctor da herança
artigo 2098.°, e repôr o excesso quando excederem a legitima e
a terça, artigo 2111 % pejjido ne.te caso sem ep ito a dispo;do da
terro.
0 herdeiro legitimario apesar da má redacçâo do artigo 2098.',
ainda que não queira entrar na suceessào, lia de repôr das doações
rercbidas o preciso para compór a legitima dos co-herdeiros corno
bem claramente dispem os artigos 2099." e 2111.'
A Ord., liv. 4.°, tio 97<, no §3. dizia assim:-- E se o filho, ou
filha. a que fér feita doação per o pai, ou orai, ou per ambos, assi
em casamento, cjo per qualquer outra maneira, não jnizer per
morte do pai, ou mai, ou de ambos entrar com os irmãos à herança
do pai, ou mai, ou de ambos, não será obrigado tornar a seus irmàos
a cousa que lhe foi dada; salvo se a doaçào fr tão grande, que
exceda a legitima d'esse filho, ou filha, a que foi feita, e mais a
terça da herança de seu pai ou mai, ou de ambos, se ambos lhe
fizeram a doação, per cuja causa a legitima dos outros filhos fique
em alguma parte diminuida; porque em tal caso, se á herança não
quizer entrar, será obrigado refazer aos irmãos toda sua legitima,
que tirada a terça lhes pertence haver dos bens do pai, ou de ambos,
se ambos fizeram a doaçào. E se elle ainda ão fòr entregue dos
bens, ou quantidade, de que lhe foi frita doaçào, náo poderã de-
mandar, rem haver mais que a que montar eíí sua legitima, e na
terça de pai, ou mai, que lhe fizeram a tal doação . Porque sempre
as terças do pai e mai, até onde abrangerem, são obrigados 11
refazer os casamentos, que promettem, e doações, que fazem a seus
filhos, ainda que expressameute não fossem obrigados, e posto que
os defonetos d'ellas ordenem outra cousa, -.
Ditferença-se n'este ponto o direito novo do direito velho em que

IL,
346 A RTIGO 17.O

o direito velho si nas doaçJes feitas aos filhos mandava perfazer a


daçïo pela terça, unando por direito novo a terça serve sempre para
completar as doações quer feitas aos filhos, quer a outros parentes,
quer a extranhos, e em que por direito velho a terça se computava
apenas .obre os beis existentes no espolio do auctor da herança
excepto nas doações para casamento que o donatario podia escolher
para salvar a doação a fortuna do doador ao tempo do casamento
ou ao tempo da morte, e em que por direito novo, desde que haja
doações isofliciosas, a terça s computa sobre todos os bens que fi-
caram no patrimonio do auctor da her:mça deduzidas as dividas,
sommados com os bens doados, quer sejam filhos quer não os dona-
tarios, quer fossem quer não para casamento as doações.
Para ficar bem claro que as doações conferidas, mesmo quando
inoticiosas, eram computadas, não só para as legitimas, mas tambem
para a terça, vistas as palavras -e egnalação da partilha-, intro-
duziu o codigo no artigo 2098. as palavras -para o calculo da
terça-, que se não encontravam na Ordenaçào, o que muito preju-
dicava os donatarios em razão de se computar só para as legitimas,
e nunca para o augmento da terça, os bens doados.
Pelo systema do codigo é ampliada a terça, não em beneficio dos
legatarios, mas só em beneficio dos donatarios, para ser menos sen-
sivel a reducção nas doações inotliciosas.
Os artigos 1790. e 2098. limitaram-se a estabelecer uma base
para a redacção por inoficiosidade, computando-se em tudo o mais
a terça sobre os bens existentes no patrimonio do doador ao tempo
da sua morte.
Sem as disposições d'estes artigos seria maior ou menor a terça
deixada em testamento conforme as doações tivessem sido feitas a
estranhos que as não conferem ou a herdeiros legitimarios que são
sempre obrigados a conferil-as.
Para não ser illudida a obrigação das legitimas reconheceu-se
o direito de reclamar contra as doações inodiiciosas aos herdeiros le-
gitimarios mas só aos herdeiros legitimarios.
Nem a viuva nem herdeiro não legitimario póde arguir a iuoti-
ciosidade das doações.
Ainda que só à terça se referem os artigos 1492.- e 1790., de certo
por ser em regra a terça a quota disponivel e só em caso excepcio-
nal a ametade, tambem o calculo da ametade para o effeito da re-
dueção deve fazer-se nos mesmos termos e pelo mesmo processo.
Tambem para o calculo da ametade se aggregam, pois que tambem
os ascendentes tôem o direito de arguir de inoficiosas as doações
sempre que ellas lhes prejudiquem as legitimas.
Aggregam-se aos bens da herança os bens doados a extranhos
para formar o activo ainda que não vêm á collaçào taes doações por
mais inoficiosas, porque esta aggregaçào é para o effeito de redu-
cçào e não para o effeito de collação, que são cousas inteiramente
distinctas; e tanto que pude haver collação sem reducçào como póde
haver reducçào sem collação.
Confere o herdeiro a doação, ainda que não haja lagar a reducçào,
para o computo da terça e egualaçào da partilha, e póde haver re-
ducçào para salvar as legitimas dos ascendentes, que aliás não são
obrigados à rollação quada concorrem a sucessão do descendente
doador, artigo 2102.
São obrigatorias as collações ou a restituição á massa em substau-
cia ou em valor dos bens doados, artigos ã119.°, 1õ00.i e 2107.-
A collação e a reducçào das doações ha de ser feita em confor-
iN

ARTItO 17i1s a 1 7l.- 347

midade da lei velha se a doação foi constituida e a herança aberta


antes da proiiiolgação do codigo civil. 1
1 eser, porém, "<ue se abra a herança na vigoocia do codigo civil
mesmo as doaçOes feitas autos, se computam tanto para o ¯calculo

da legitima como para o calculo da terça apesar de ser regida a


validado ou nullidade da dosiçào pela legisloçâo vigente ao tempo
em que se cifectoou o acto juridico 2, porque só à morte do doador
pide averiguar-se da otliciosidade ou não inofficiosidade da doação,
com quanto tambem já se tenha julgado que a reducção e a colla-
ção está em todos os casos sujeita a lei vigente ao tempo da doa-
ção.3
No eomputi da terça deixada pelo biubo á sua viava não são to-
madas em linha de coita as doações por elle feitas aos filhos do an-
terior matrimonio, já porque a espscie é regida não pelo artigo 209i.
mas pelo artigo 1235.. e já p0 ser tirada a terça só dos bens
encontrados em poder do testador à hora da morte se o tercenario
não é herdeiro legitimario.

SECCAO 1V

Da instituição de herdeiros, e da nomeação de legatarios,


e dos seus direitos e obrigações

Art. 1791.Õ Podem ser inslituidos herdeiros unia ou mais


pessoas, e não deixarão de ser havidos por taes, ainda que
as suas quotas ohes sejam assignadas em certa proporção.
(Vid. nota ao artigo 1736.1)

Art. 17 9 2.n 0 herdeiro responde por todas as dividas e


legados do auctor da herança, até por seus proprios bens,
salvo se acceitar a herança a beneficio de invenlario.

t Accordáo da Relaçào do Porto de 13 de julho de 1875, Direito,


7." an0, n.- 27, pag. 431.
2 Aecordão da Relação do Porto de 26 de fevereiro de 1878, Di-
rcito, 1O.° anuo, n.° 26, pag. 45ti.
3 Accordõos, da Relação do Porto de 14 de dezembro de 1875, e
do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de janeiro de 1877, erista
de Legislação e de .Jorisprdencia,de Coimbra, 10.' anuo, n.P 475,
pag. 108,
5.'

34.7 ARTIGO 17 13.

Âi. 1793.o O legalario, porém, uão responde pelos en-


cargos do legalo senão até onde chegarem as forças do
neauoo legado.
(Vid. artigos 1800. 2018. e 2019.)
Foi para evitar ao herdeiro o risco de pesar com tantos encargos
que não só l[e absorvessem os bens herdados mas ainda lhe entras-
seou pelo proprio patrimoiio e ao mesmo tempo para o salvar do
prejuizo de repudiar herança de que lhe podiam advir vantagens
que se ittroduziu a acceitação da herança a beneficio de inret'ario,
libertando o herdeiro do pagamento de dividas além do valor da
successão, e permittindo-lhe exonerar-se do pagamento dos dividas
e encargos pelo abandono de todos os bens aos credores e aos lega-
tarios.
A acecitação a beneficio de inventario não deixa coífudir os bus
do herdeiro com os da succssão, e muito menos a personalidade do
herdeiro com a do aactor da herança.
Pel' contrari' fica o herdeiro beneficiario habilitado a reivindicar
1 is seus. vendidos pelo auctor da herança, sem os e-mprad'res lhe
poderem oppJr a qua:lidade dr herdeiro nem reclamar iudle nisação
sendo pela suecessâo benficiaria a concorrer com os outros cre-
dores i massa da herança para se pagar dos seus creditos e até a
promover a nomeação de curador especial t sucessâo quado contra
ella quizer intentar acção porque não póde então represental-a.
A ace'itaçàão a beneficio de inventario para o herdeiro não res-
ponder por encargos superiores aos recursos hereditarios e salvar
sempre os bens proprios, foi durante largos annos e seculos inteira-
mente desconhecida entre nós.
No velho direito portuguez, continuação do direito rouauo, impor-
tava a arceitaçào da herança a sujeição a todos os encargos, quer
excedessem quer são os recursos da suceessào, com sarifirio dos
bens do herdeiro, houvesse ou nã" houvesse inventario, porque se
confundiam logo os bens proprios do herdeiro com os bens herda-
dos como se confundia a personalidade juridica do auctor da he.
rança com a nersonalidade juridica do herdeiro.
ii Portugal antes das grandes reformas de 1834, na falta de in-
veitaio. re-pondia o herdeiro oíesmo "tra rires haereditatis con-
forme as doutrinas da lei ult 4 ° col. de jur. delib. e da novel. 1.
cap. 2. a a:
Foram as reformas posteriores á implantação da carta constitu-
cional que introduziram expressamente ua nossa legislação civil o
beneficio de inventario, de que a principio era indispensavel assi-
gisar termo sob pe 'a de nìo aproveitar ao beneficiario.
O decreto de 18 de maio de 1832 artigos 18. a 20.- responsabili-
sava ainda o herdeiro puro e simples pelos proprius bens para satis-
fação dos encargos hereditarios, e mesmo a novissima reforma ju-
dicial artigo 408.: respoosabilisava o tutor pelo prejuizo que cau-
sasse aos menores em razão de não ter asceitudo a herança e
beneficio de ioventari'.
Foi a lci de 16 de junho de 1855 a primeira providencia que en-
tre nós reconheceu o beneficio de inventario a todos os herdeiros
maiores ou íuenores, ainda que não tivessem assignado termo com
essa clausula, nos casos em que lhes aproveitaria pela legislação em
vigor se o tivessem assignado.
Voltava, porém, de novo á legislação antiga recuando muito atraz
ARTIGO 1793» 349

-da lei de 16 de junho de 11355, o projecto primitivo do sr. Seabra em


quanto consignava no arti o 1924" correspondente ao artigo 1792.
do codigo e no artigo 2181. que no codigo está substituido pela ar-
tigo 201l9.", o seguinte : io
herdeiro qt orceita pura e simplesmente,
fica responsavcl a todos os encargos da horonça, tanto pelos bens
desta, coiso pelos seus proprios: o que acceitar a beneficio de in-
veitaio, exime-se de responder por seus bens aos dietos encargos, e
conserva todos os direitos que tivesse contra os bens do finado. '13
Segui-llh ainda o codigo os passos io artigo 1792. onde tambem
responsabi!isa paios proprios bens o herdeiro que acceitot para e
simplesmeit0, e no artigo 1it0. onde nega aos herdeiros, que nio
tivcret aceitado a beneficio de invr-tacio o direito de exigir dos
legntarios a iídeínííisaçìo das drapizas feitas com a administraçdo
da herança absor ida pelos legdos.
Emendou depois a coaisso revisora este preceito dispondo ter-
ainantemtetnte lio artigo 2019" que o acecitaç o, cu seja pura oti a
beneficio de inventariio, em caso nelom obrigi o herdeiro a encar-
ios aléi das forç,as da hirança.
Mas por descuido ou esqtecimento tio líarmonisou os artigos 1792»
e 1800.- com a nova redacção do artigo 21119., cuja desanrmoia
proveio de ter passado sem a mais le-e obsorvaço na se- da
commisso revisota de 7 de jimbo de 1802, a que assistiram apenas
os srs. Soare, Sealra, Ferreira Lima, Gil e José Julio, o artigo
1924. do projecto, e de ter sido approvada na sessão de 4 de de-
zembro do mesmso anno, rm que foi discatido o artigo 2181. do
tcsmo projecto, estando presentes to is eabra, Marreco, Ferreira
Linía, Simas, ller-lano, Gil, Silv, Ferrãe José Julio a seguinte
proposta d substitido do sr. Ferreira Lima: ti herdeiro caí
reqer nto é obrigado a encargos altm das forças da herançi que
ficou consignada no artigo 2013.' e iiuiic com a cliniinação apenas
das palavras «cai regro

Coíta egíahnent das actas que o sr. silva Ferrão retircai a ísía
proposta de¯ substituição ao artigo, que cra alis c 'o pequenas diale
cenças de redacção o que hoje se lê no uniao do artigo 2019.
Na jirispradencia práctica, por1 néa, tem prevalecido o artigo 2(0131
sobre o artigo 17923 1 como hia de prevalecer sobre o artigo 18011.0
já por ser o que mais fienlente exprime o pensamento da commiseio
revisora, ja por ser o que regulaa profc.sso o caso da acceitação de
herna, já por ser o íaíis raciona.
Fão precisa pois hoji * o herdeiro de assignar termo d -1citaçdo
de herança a benefici d inventario, nem pra s- eximir de rspon-
subilidade por dividas c legados além das forças da herança, nem para
exigir dos legatarios i,í(i' .nuisaçao das despezas feitas al'm das for-
Tas da herniça absorvida por iegados.
Sem falar nos effeitas seundar ias descriptns nas artigos 2014' a
20113^ aifrm-set hoj os ieitos principaas da acieitao pura Oh
a beneficio d inventario, cm que no primeiro r-so psa robre o her-
deiro e no segundo sobre os credorr- o nus dvap-o da insuffGciencia
dos tens da hera n para pagamento dos etncargos rui que nao co-
meça liem corre até ;í concisão do inventario a prescripçdo entre a

Accordo da Relação d' Lisboa de 4 de maio de 1832, Gfaicta


da JVelaço le lisboa. lia anti'. na 51, pag. 228.
350 ARTIGO 1793.

herança e o herdeiro beneficiario que está na posse effectiva da


successno.
O herdeiro, executado por dividas do auctor da herança que vão
além dos bens hereditarios, pôde fazer valer em embargos de terceiro
o direito que lhe reconhece o artigo 2019.
O legatario, como é contemplado com quantidade determinada cu
determinavel, é que são carece de recorrer ao beneficio de inventa-
rio para se exemptar de encargos além das forças da herança e para
exigir da indrmnisação dos encargos que satisfez como desempenho
da cousa legada, que é por conta da herança, artigo 1816°
Os legatarios apenas são obrigados ás dividas da successão depois
de esgottados os bens do herdeiro e só até onde chegarem as forças
do objecto legado.
Aos legatarios preferem sempre os credores porque os legados
séem da herança, e não tia verdadeiramente herança senão depois
de pagas todas as dividas, 'isi deducto are alieno.
E bem sabida a regra nemo lileralis,nisi liberatus.
Se, porém, o legatario, que em caso nenhum é obrigado a pagar en-
cargos além das forças do legado, depois de começar a pagar o legado
com encargos quizer requerer a reducção por se verificar que o
valer dos encargos excede o valor dos bens legados ha de usar de
acção ordinaria para provar que sem culpa sua os encargos são su-
periores ás forças do legado. n
0 unico do artigo 2019" tanto na sua lettra como na redacção
da proposta primitiva, dizendo "incuimbe aos credores, em vez de di-
zer 'incumbe aos interessados», é só applicavel aos credores, e í,o
aos legatarios, e tanto mais que na lierlnça e nos bes inoelariados
a que se refere o artigo 2019.° e j unico, se comprehendem os bens
destinados aos legatarios como os bens destinadus aos herdeiros.
Os proprios artigos que estamos commentando distinguem clara-
mente entre diridas e legados e entre encargos e legados.
Ao legatario, pois, incumbe a prova de haver na herança outros
bens além dos inventariados quando lhe fér contestada a entrega do
legado no todo ou em parte por falta de recursos hreditarios, de-
vendo recorrer conforme a circumstancia á acçào ordinaria ou ao
processo especial de inventario.
Por não responderem os herdeiros e os legatarios por encargos
superiores ás forças das heranças e dos legados artigos 1793",
2019.' e 2025., e por não ser obrigatoria a aceeitaçào a beneficio
de inventario senào quando ha herdeiros menores ou interdiets,
declarou a portaria do ministerio do reino de 21 de junho de 1870:
1 que para aeceitar Heranças ou legados não careciam de licença
do governo ou de outra aunctoridade as corporações administrati-
vas; 2.' qu em vista do disposto no artigo 2023. e outros tio
lhes era permittido repudiar heranças e que pelo contrario deviam
sempre acceital-as, não puramente mas a beneficio de inventario;
3. que não eram obrigadas a encargos além das forças da herança
ou do legado; 4.' que eram todavia obrigadas nos termos do ar-
tigo 35. à conversào dos bens immobiliarios que lhes fossem dei-
xados; e 5.' finalmente que só o poder judicial era competente para

Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de fevereiro


de 1896, Gu,:ea da Relogio de Lisboa, 9.' anuo, n.' 73, pag. 591.

A
+I,

ARTIGO 1794 351

resolver as q uestões tanto sobre a capacidade das corporaçies para


serem herdeiras ou Irgatarias nos termos do artigo 1781.- do codigo,
coeso para julgar se os bens legadeos podiam ou no com os encargos
com que tivesseg1 sido onerados.

Art. 179i.° Se a herança for toda distribuida em legados,


seríiu as dividas e encargos d'ella raleados entre todos os
legatarios, em proporfão dos sets legados, salvo se o tes-
tador haIiver ordenado o contramo.
Ainda distribuida toda a heruaça em legados é aos herdeiros legi-
timos que pertence qualquer legado cadieo e qualquer direito no
mencionado no testamento ou deseohecido, como dos lerdeiros Ie-
gitimos é a competencia para aníl lar contractos feitos pelo aneor
da herança, porque osIegatarios nio
podem aspirar a vais do que
o somma ou cousa determinada que lhes teni sido designada na
disposiçào de ultima voutade.
A instituiçlo de herdeiro, que alis já nio é precisa para a vali-
dade do testamento, é todavia essocuial para a transmiigraçâo emn-
pleta da personalidade juríidica do auetor da heraça. A distribuiao
de todo o patrimonio em legados não dfere aos legatarios os direi-
tos evestuaes porque repugna à determinaçlo de parte da herança
a sueerssan ia uiirersum ils.
Mias distribuida toda a herança eo legados aos legatarios pertence
o cumprimeto do testameto, já por ficarem com valares certos
quando os herdeiros leritimios su podem coutar com valores oreu-
luors, já pela regro de que quem tem os comííodos deve ter os icom-
modos, e ainda por tereu merecido ia is citiaíça ao testador os
1egatarios que elle benhieinu do que os herdeiros legitimos que ete
pre triu.
Taumbem so chamuados :to cargo de iinrentarialti ou de caleça
de casal os legatarios de p referencia aos herdeiros 1egitimos por-
que seria inadmissiel desde cie no la remanescente, dar o aidmi-
íistraçAo d: Leraíça a therdeiri legitimsi que nenhum l/eresse tem
no iv ntsrio e que pelo cintrario poderia prevalecer-se da sua po-
siç o para iíoenodar os lcgatarios.
Pelo mesmo motivo sdo pagas pelos legatarios as custas do iven-
tIrio conforme o edigo de processa civil artigo 112., apesar de
em regra serem pagas pela herança, isto é, pelos herdeiros, terecua-
rio, e conjuge sobrevivo nào si as eustas mas até as despenas com a
entrega do legado :rtiço 1842.0 do presente redigo, assim cormo
absorrida o erana pelo pssiva ou a omm ad um as custas,
sio pagas as eistas pelo credor ou credores o proporo do que re-
ceberami, e contadas em tal caso como se o inventario fosse de maiores,
artigo 83y da tabella dos salarios e emlumil tos judiiaes.
lstlo sujeitos a rateio todos os legados, quer sejam de o/jectos de
leronaiolos, quer dr ralores certos, apesar de já se ter julgado '

t Aecordlo da Relasção de Lisboa de 18 de agosto de 1897, Ga-


seta da Reloio de Lisboa, 11 ano, ni. 65í, pag. 514.
2 Accordío da Rlaçlíí do Porto de 17 de março de 1896, Berista
dos Tribnaes, 14. anno, i." 332. pag. 310.

L
352 ARTIGO 1795."

que só é compativel o rateio com as quantias em dinheiro e nào com


objecto certo, como o relogio ou o animal e que o legado de objecto
determinado é logo transmittido artigos 1826." e 1643." e pode ser
ríiyiidicado artigo 1857.
E certo que o testador destinando certo objecto para um legatario
significou o desejo de que por inteiro lhe fosse entregue esse objecto.
Mas no systema do codigo que si dá preferencia ao legado re-
míneratorio nào ha razão para sujeitar o legatario contemplado com
diíleiro ao risco de perder o legado todo para pagamento de encar-
gos e libilitar o legatario de objecto computado lo líesmno valer a
levantar sem dedueço o seu legado quando tambe o direito aos
legados de quantias se tran.imitte logo aos legatarios como o direito
aos legados de oljceo determinado, salva sempre a hypotbese de ser
otra a intenço do te.tador segundo o contexto do testamento.
Tambe deixada certa propriedade a varios legatarios com de.
termido numero de metros a cada íum, apurando-se que a superficie
do predio inferior à totalidade dos cetros designados se dise fazer
por íalogia redueção proporcional no quiiho de cada um , em
vez de preferic os legatarios pela ordem de íomeaçâo como com fuí
dame to no artigo 1807 .o9,',se 2 ijulgou.
Os legatarios que por lhes
pertencer cousa certí ou q uantidade
determinada não lêem, como o herdeiro, o meeiro, e o tere inr
slta para dizer sobre a fórma da partilha, são todavia chamados a
delbterar quando a bcrança for dividida toda em legados ou quindo
da approva:ão das dividas resultar redueçào nos legados. i

ar. 790. Se os bens da herança n o chegarem para


cobrir todos os legados, serão e<tes pagos pr-rata, salvo
os que forem díixados em recomnpensa de serviços; puis
nesse caso serão considerados como divida da herança.

A preferencia do legado de renilmeraç o de serviços sobre os


outros legados quando os bens hrediítarios nto chegam, paira paga-
mento integral de todos, funda-se na presumpção de ter querido
o teta,1or preferir aos legados de pura e absolii; liberalidade o
teýado r ncratsrio, visto retres ietar uma divida mural, usa di-
vida d ¢ratido.
Jlas uio perde por isso o caracter de liberalidade.
t leg;aío reiiuneratorio é dieida com realn, sos outros legados.
Mas nso é divida equiparida ás verdadeiras dividas.
A natureza de divida que a lei ih reconihi'ee tI confronto com
os outros legados em nada afferta os verdadeiros credores.
O codigo só considerou o legado remsneratorio como ilirida ta
heraa na hypotbese especial de não chegarem para cobrir todos

r n Accordão, da Relação de Lisboa de 1 de fecereiro de 199t,


Grtií da J"at7u de Lisboa, 13." ano, n.o 70, pag. 573.
Y Accírdào do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de fevereiro
de 1900 Gazeta di Relação de Lisboa, 13." anno, i." 70, pag. o65.
1 Aecordão da Reiaçrio de Lisboa de 21 de janeiro de 1893, Di-
reito, 29." ano, n" 5, pag. 8t.


r
ATlll Os 1796.1 e 1797." 353

os legados os bens da herança. isto é, para o tins de ser pago pri-


meiro que os outros legados quatdo não poderem ser pagos todos
integralmnte.
Portanto as dividas estio primeiro que os legados.
oipreliende-se a preferencia dos legados que representam re-
compensa de serviços sobre os po representam pura liberalidade.
Mas a obrigaçdo de remmierar não pode por -se a par da obrigação
de pagar.
Hão de tamboi snpportar os encargos com o pagamento das le-
gitimas e com as dividas da herança quando os outros legados nào
chegarem para cobrir essa despeza, como o bem claro no artigo
2059.

Art. 1796." Se o lestlaor thonver disposio só de cerla e


dtermiada pare ti Iierai, será esta tarte haviati
comio legado.
(Vid, nota ao artigo 1736)

Art. 17 9 7.O Se o testador no ar certos herdeiros indi-


vidiLnmieole e outros colectiua nitie, e, por txemplo. dis-
ser aistiiio por mensieideiros Pedro e Paulo e os filhos
de Francisco», sero havidos por iuini tiduaneite nomeados
os que o foram ctlleciiamente.

N'este e nos dois artigos segtintes consigna o codigo disposições


para casos ,pe ias-
No fòroa antigo era mais seguido que os collectivamen te nomea-
dos recebiam todos junctos si. nii q u inhão egual ao de cada um dos
tomeados indiriduailmnte; e assim na hypothese do artigo dividia-se
a herança em eros partes, tua para Pedro, outra para Paulo, e outra
para subdividir pelos tilhos de Francisco.
U codigo, porm, coísidra individualmente nomcad cada ííni dos
que constituem o grupo collectivionte instituido; e então ia hypo-
these de serem tre os filhos de Francisco divide-se a herança em
cinco partes eguaes, uma para Pedro, outra para Paulo, e cada uma
das outras tres para cada ím dos tres filhos de Francisco.
Presume-se que o testador quando não fixa a quantia que la de
ir para cada um quer pua os iístitidos partes eguacs ainda que
instituidos collectivamente: e a base da interpretação dos testa-
mentos é a vontade lo testador - dicld testator et erili., -.
O artigo regula apenas a hypothese da nomeação de uns herdeiros
itdividuahente e de outros collectivam nte.
dias o disposto para a hypothese de oteação individual colle- e
etiva ao mesmo tempo deve egualmente
applicar-se i hypotbese
de
nomeação collectiva sem nomeação individual.
Verificado pois o caso, tambm muito frequente na prietica, de
nomeação de liordeires co ll/irane ride como dos filhos de Francisco
e dos filhos de Manarl, segue-se a mesma regra, isto e, reputa-se cada
um dos filhos de Irancisco e cada um d os filhos de Mainuel indivi-
duaiimnte tomado e ha de dividir-se a herat;a, no em duas par-
tes, conforme o numero dos grupos instituidos, uia para os filhos
de Francisco e outra para os filhos de dianel, mas sim individual-
Toxo III 23
354 ARTIGOS 1798. , 1799y, 1800.° 1801.0

mente uma para cada um dos contemplados sem distineção entre


filhos de Manuel e filhos de Francisco, como na especie do artigo,
caso analoqo, a caducidade n'um grupo aproveita egualmente aos
iodividuos do outro grupo.
Na instituição dos sobrinhos não se comprebendem os filhos dos
sobrinhos fallecidos, apesar de já se ter julgado o contrario 1, porque
o direito de representação só é admittido em favor dos filhos de ir-
mãos quando concorrem com algum irmão do auctor da herança.
'Todas estas regras, porém, cessam «cose/icendo-se clarumente que
outrafoi a mente do testadoro, palavras do artigo 1929. do projecto
primitivo, correspondente ao presente artigo, que a commissão revi-
sora eliminou de certo por escusadas.

Art. 1798.° Se o testador instituir, em geral, seus ir-


mãos e os tiver germanos, consanguineos e uterinos, con-
ferir-se-ha a herança como se fóra ab intestato.
(Vid. nota ao artigo 1742.°)

Arl. 1799.? Se o testador chamar certa pessoa e seus


filhos, entender-se-ha que são todos inslituidos simullanea-
meíte e não successivanentle.
A instituição de Francisco e seus filhos não representa instituição
suecessiva, isto é, que os bens são para Francisco e só por morte
de Francisco para seus filhos, e sim instituiçào simultanea, isto é,
que a herança é desde logo dividida entre Francisco e seus tres
filhos, como simultanea é a deia da propriedade a certo indivi-
duo e a seus filhos se a esse individuo se não impõe a obrigação de
conservar os bens para os transmittir por morte aos filhos.

Art. 1800.° 0 herdeiro ou herdeiros que tiverem admi-


nistrado a herança absorvida.por legados, só terão direito
a serem indeímisados pelos legatarios das despezas que
houverem feito com a lerança, se a tiverem acceitado a
beneficio de inventario.

(Vid. nota ao artigo 1792.0)

Art. 1801.0 6; mííllo o legado de cousa alheia; mas, se


do testamento se deprehender que o testador ignorava que
lhe não pertencia a cousa legada, deverá o herdeiro adqui-

1 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de março de 1887,


Boltin dos Triuaes. 2.0 <nno, n. 64, pag. 326.
ww,- 1I

ARTI O 180.- 355

ril-a para cumprir a disposiçao, e se isto não for possivel


pagara ao legatario o valor d'ella.
seguiu o cdilo ui eta matenia o systma casuista da legislação
romaano. Regulou os casos de legado: de cousa alheia, de cosua do
herdeiro ou do legatario, de cousa só em parte do testador ou só
em parte do herdeiro ou do legatario, de cousa movei indeteri-
nada, de cousa empenha a ou hvpothecada, de credita de quitação
de divida, de cousas genericas e sie cousas uspecielh-s, de educa-
çdq, de pensões, de legados oseroos, de legados alteruativos, etc.
E sullo o legado de cousa alheia, como nulla é a venda ou a troca
de cousa alheia artigos 1555. 1o:L, porque ningem póde doar,
deixar, vender, ou trocar senào o que é seu.
Mas em homonageas à vontade do testador varias modiiicaçAes
soffre este preceito no capitulo das disposições testamentarias.
Assim vale o legado de cousa alheia se o testador estava persua-
dido de que ila lhe pertencia; e la de o onerado com o encargo
para cumprir a vontade do testador adquiri -a ou pagar ao lega-
tario o respectivo valor sheli for impossivel a acqisiço.
Nenhm direito, porém, pôde invocar o legatario se o testador sa-
bia que lie nào pertencia a cousa legada por se soppôr então irri-
soria a liberalidade.
Algumas legislaçòes, seguindo o direito romano, declaram valido
o legado mesmo quando o testador sabia que a cossa era alheia,
pela presmnpçdo de que elle impoz ao onerado a obrigaçdo de a
adquirir para o beneficiado' ou de pagar a este o valor. e por n o
se poder suppór que testador estivesse a brincar no acto mais
serio da sua vida.
A legislação fatncza, em homenagem aos principios de direito,
ou para evitar as dillivcldades da prova se o testador sabia ou igno-
rava que a cosa lhe pertencia, declara em todos os casos nulio
o legado de cousa alhei:
No presente artigo deve tambem reputar-se comprehendida a hy-
pothese de saber o testador que a cousa lhe pertencia, e ignorar que
no podia dispór d'ella a favor do legatario por no saber que a
tinha recebido com a condisão, por exemplo, de a ntso passar ai fa-
milia do legatario, pois sendoo direito de dispsr a essencia do do-
oinio, ignorar o testador que no podia dispõr da cousa é ignorar
que clIa lIhe o pertencia.
E ao legatario como interessado que inetmbe provar que o tes-
tador ignorava que a cousa lhe no pertencia; e nso admiitte o co-
digo outra prova senàoo a que resultar do texto do proprio testa-
mento em conformidade do disposto no artigo 1761»

Art. 1802. Se a cousa legada, que não pertencia ao tes-


tador no momento da feitura do teslamento, se tiver depois
tornado sua por qualquer titulo, terá eleilo a disposição
relativa a ella, como se ao tempo do testamento pertencesse
ao testador.
Pela mesma razão por que é realidada a venda de cousa alheia
se o vendedor depois a adquirir nos teros do artigo 1555. é valido
o legado de cousa alheia ou o testador soubesse ou ignorasse que

k.
W t'-7"¶r

356 AiTlifoS 1803. oE.0i"

a cousa legada era alheia ao tempo da feitura do testamento, se a


cousa estava to seu patrimonio ao tempo da morte, por se presumir
que o testador a adqtjiriu para tornar o legado uma realidade, e
ainda porque regulando-se pelo tempo da morte tudo o que respeita
à
. fórna iwíerna do testamento menos no que pertence capacidade
do testador artigo 17135., no lia motivo para nullidade quando a
cousa é do testad,'r ao tempo da abertura do testamento.

Art. 1803.° Se o testador ordenar, que o herdeiro ou o


legatario entregie a outrem cousa que pertença a qualquer
d'elles, serão obrigados a cumprir o disposto pelo dicto
testador ou a entregar o valor da cousa, se não preferirem
renunciar a herança ou o legado.
Art. 1804." Se o testador, o herdeiro ou o legatario, for
senhor tão sónlente de parte Ia cousa legada, ou só tiver
algum direito a essa cousa, não valerá o legado senão pelo
que tocar a essa parte ou a esse direito, salvo se constar,
que o testador estava persuadido de que a cousa lhe per-
tencia inlegralimeite, ou ao herdeiro, ou ao legatario; pois,
n'esse caso, se observará o que fica disposto no artigo 1801.°

(Vid. artigo 1847 .1)


Posto que a faculdade de legar cousa alheia, e portanto cousa do
herdeiro ou do legatario que só era logica no direito romano, onde
o herdeiro representava em tudo a pessoa do testador e os bens de
um e de outro se cofuidi:ím pela successão, seja pouco eompativel
com os principios do direito civil moderno. não póde negar-se o
herdeiro ou o 1, natario a entredlir a terceiro a cousa propria de que
o testador disp ez ou o seu valor sem renunciar o benetcio da sucres-
são, com a ditfereníça de que recahindo a obrigação sobre herdeiro
têem os outros co-herdeiros que indenuisar proporcionalmente por
pesar como divida da herança sobre todas os co-herdeiros salvo
determinação em contrario artigo 1H7l", e recahindo sobre legatario
nâ' póde este pedir iudeinisaçio alguma à herança por se reputar
encargo especial do legado.
Dispensa o artigo 1601." o herdeiro ou o legatario da obrigação de
pagar por inteiro o valor da cousa se esta Ie uào pertencia sdmente
em parte, salvo estando o testador persuadido de que a cousa lhe
pertencia integralmente.
Presume-se que testador, sabendo que ao herdeiro ou lega-
tario a' parte da cosa egala pertencia, apesar de dispr da tota-
lidade da cousa, quiz limitar o legado t parte que pertencia ao one-
rado com encargo.
O herdeiro ou o legatario, pois que é obrigado a adqoirir a prte
da cousa que uão tinha ou a 3pagar o respectivo
3
valor se o testador
iguorava que essa parte lhe ní pertencia, n o tem, obrigação de a
adquirir ou de pagar o set valor quando nenhumia parte tinha na
cousa.
E nulla a deixa de cosa que j4 pertencia ao instituido, em con-
formidade da regra geral da sullidade do legado de cousa alheia
salvas as excepçRes taxativamente expressas na lei, tendo a commis-
são revisora eliminado em sessão de 7 de junho de 1862 o artigo

Ã
r
ARTIGOS 1805, 1806. E 1807. 37

1940.0 do projecto primitivo immediato ao artigo e"rrespondente ao


artigo 1807.° do codigo que era redigido assim: «E nulo o legado
de cousa, qao pcrtna ao legatrii ao tempo da factura do testa-
mento; mas sco n 'gatario adquirir depois a licta cosa, haverá
o seu valoro.
Se o testador legou cousa deteritinada auctorinando outrem a ficar
com essa cousa e dar ao legatario cerbv quantia eim din iro, tem o
o legatario direito de fazer interpellar o preferente para realisar a
sua escolha sem este poder invocar o praso marcado ao testamen-
teiro no artigo 1903.", que nào é applicavel ao caso. t

Art. 1805.° 0 legado de cousa movei indeterminada, in-


cluida em certo geíero ou especic, será vtido, posto que
tal cousa não exista entre os bens do testador ao tempo da
sua morte.
Art. 1806.° Se o testador legar cousa propria, designan-
do-a singularmente, será níi lo o legado, se ao tempo da sua
morte tal cousa se íão achar na hleratça.
Ar. 1807.0 Se a cousa tíecioada no artigo precedente
existir na herança, mas não na jiaílidade ou porção de-
siguada, haverá o legatario o que existir, nem mais nem
menos.

(Vid. artigos 1817." 1827. e 128.)


Aeatou o codigo co as distinrçôes consagradas pelo direito ro-
mano, em materia de legados, entre cousas determinadas pela natu-
reza como am cavallo, e cousas deterííiíadas pelo trabalho do ho-
msc emomo nia casa; ' estabeleceu apenas separaçao entre cousas
moveis e imanoveis para o cffito de reconhecer validade ao legado
de cousas moveis incluidas no mesmo g.enero ou na mesma especic
ainda que d'esse genero ou d'essa especie as nào houvesse na he-
rança.
Para os effeitos jaridicos a distiaeçlo entre o legado de cousa mor1
indeterminada e dc cousa singularmectr designada é completa e
cabal.
No systema da coigo vale ou não vale o legado de cousa m-el
que não se encontre no patrimonio do testador, conforme é indeter-
minada incluida em certo genero ou especic ou é singularmente de-
signada.
Assim legado, sem mais designaçlo, um cavallo que é cousa movel
indeterminada incluida em certo ''"ro, ou sm eavallo acabe que
e cousa movel indeterminada incluida em certa e.peeic, é o herdeiro
obrigado a comprar o cavallo sc o tno houver na terança, porue o
legado é de causa move itrrmitada, incluida em certo geero
ou em certa eopecie.

r Aecordâo do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de março de


19011, Reista dos Tribnars, 18.' aano. u.' 428, pag. 307.
358 ARTIGO 1807p

Não confunde o artigo 1805." genro comr ecpeier, nem deixa de


comprehender no oeoero a e.pecie. 0 que faz o artigo é legislar do
mesmo modo e fixar a mesma resolução para o legado de cousas
moveis indeterminadas ineluidas em certo gecero e para o legado
de cousas movais indeterminadas ineluidas em certa especie.
Tambem ao legado de quantidade se podér ser determinada se
applica o disposto para o legado de corsa indeterminada, que póde
ser deterrminada por estar incluida em certo gestero ou em certa
especie.
Assim vale a legado de todo o milho ou de todo o vinho que é
costume receber no celleiro ou na adega da quinta da Condessa.
Se, porém, o legado for do cavallo A, assim singularmente desi-
gnado, e tal cavallo não apparecer na herança, não é o herdeiro obri-
gado a pagal-o por se presumir que a vontade do testador fôra
deixar ao legatario só certo e determinado cavallo.
Pela mesma razão, legadas dez pipas de vinho da colheita de
1840, e não existindo seno cinco à morte do testador, é o herdeiro
apenas obrigado a entregar as que existem, e não a pagar as que
faltam, por se presumir que fra intenção do testador contemplar o
legatario com certo e determinado vinho, e não com o valor d'esse
vinho.
Cousa movel indeterminada, pois, póde o testador legar tanto a que
tem, como a que não tem, uma vez (qoe possa ser determinada.
De cousa propria singularmente designada é nullo o legado se
não existe na herança, ou por a ninguem ser permittido dispôr senão
do que é seu, ou por ser o legado de cousa alheia, quer movel quer
immovel, regido pelos principios que ficam expostos; como radical-
mente nullo é o legado se a deixa é, por exemplo, de um animal
por não estar incluida a cousa legada em certa especie ou em certo
genero, e ser por isso não só indeterminada, mas insusceptivel de
determinação.
Determinada a cousa legada que seja propriedade de testador
adquire desde logo o legatario o dominio. Se efo é determinada, ou
se não pertencia ao testador, só depois da determinação ou da ar-
quisição pôde invocar direito o legatario.
Assim, legados papeis de credito com os numeros especificados e
portanto singularmente designada a cousa, tem o legatario direito
aos rendimentos desde a abertura da herança, e não se fazendo mei-
ção dos numeros, como no legado de cousa rovel indeterrinada
incluida em certo genero ou especie, só a contar da data em que
se tornar exigivel o legado pertencem ao legatario os rendimentos.
Ao contrario do que acootece com o legado de cousa morel é nullo
o legado de cousa immovel irdeterminada como de nrra vinha se na
successão do testador não ha vinha, ou por ter sido alienada, ou
por ter sido destruida, ou por qualquer outro motivo.
Ao legado de cousa alheia que o testador julga sua é applicavel
o disposto no artigo 1801.'
Legada cousa novel indeterminada, comprehendida entre outras
da mesma especie, designa o herdeiro a cousa, artigo 1827.-, porque
do devedor é a escolha na falta de declaraçào em contrario, e porque
em beneficio do devedor se interpretam as clausulas dos actos ju-
ridicos; como do herdeiro é a escolha quando o testador a tiver
deixado ao arbitrio do legatario, se no espolio do testador não al-
parecer cousa dessa especie, artigo i
O legatario só escolhe quando o testador o tiver assim determi-
nado e houver cousas da mesma especie rma herança.
ARTIGO 1808.0 359

Todavia na escolha, quer em nome da lei, quer por determinação


do testador, ou feita pelo herdeiro ou pelo legatario, lia de ter-se
em attenção, não o capital lereditario ou as qualidades essoaes do
p
beneficiado, como prescrevem algumas legislaç,es, mas sim e unica-
mente as qualidades da (onsa adoptando-se um termo medio, isto é,
não se escolhendo nem o melhor nem o peor, pela presunapçào de
que na falta de decclaraçào tivera o testador em vista o coímum
e ordinario, e ainda por ser esta conclusào dietada pelas regras da
mais pura equidade.
Estando a cousa indeterminada compreheudida, não na mesma
especie, mas no mesmo genero, devem observar-se por analogia, no
silencio da lei, as regras prescriptas para a cousa comprehendida
em certa eopecic, cooi quanto só ao legado de cousaa indeterminada
comprehendida na mesma especie, e não ao legado de cousa indeter-
minada compretiendida no mesmo genero, se refiram aquelles arti-
gos 1827.° e 1828.1
Não havendo na herança cousa da mesma especie ou do mesmo
genero não é obrigado o herdeiro a pagar o valor da cousa; e satis-
faz indo buscar féra outra cousa da mesma especie ou do mesmo
genero, como resulta do artigo 1805.°, e do artigo 1828." nas pala-
vras-stocará ao herdeiro escolher--es eonsa»-, que evidente-
mente se referem a cousas da especie ou do genero legado e excluem
a liberdade de escolher cousa differente.
Nos trabalhos da ultima revisão eliminou a commissão revisora,
de certo por inutil ou por ser da competencia da lei de processo, o
unico do artigo 1962.ý do projecto primitivo, correspondente ao ar-
tigo 1827.° do codigo, que ainda conservou nos seus projectos de 1863
e de 1864, e que era redigido assim :-,'No caso de contestação será
a duvida resolvida arbitraltente».

Art. 1808.° A condição, que inhibir o herdeiro ou o le-


gatario de casar-se ou de deixar de casar-se, excepto sendo
imposta ao viuvo ou viuva com filhos pelo conjuge fallecido,
ou pelos ascendentes ou descendentes deste, e, bem assim
a que o obrigar a tomar ou a deixar de tomar o estado
ecclesiastico, ou certa e delermitada profissão, haver-se-a
por não escripta.
Apesar das disposições já eoosignadas no artigo 1743:' declarou
muito especialmente o presente artigo não escriptas as condições
impossiveio ou contrarias à lei nos dois casos de prejudicarem a
liberdade natural de tomar ou de deixar de tomar o estado ecele-
siastico ou certa profissão, por serem de grande importancia practica
especialmente no primeiro.
D'antes nos testamentos era muito frequente a condição de tomar
ordens sacras, e de casar ou de nào casar, o que obrigava o instituido,
para não ficar privado do beneficio, a abraçar com prejuizo seu e da
sociedade uma vida para que não sentia vocação, e a conservar-se
no celibato que é contrario ãs leis naturaes e aos legitimos interes-
ses do estado.
Já em direito anterior se reputava contraria aos bons costumes
a condição -si soa nupsrit-: mas com fundamento na lei 7 Uod.
de condit. et sibst., reputava-se valida a clausula - se casar e tiver
360 ARTIGO 1808.-

filhos-, e inguem duvidava da validade da clausula - si in vidui-


tate peraserit - imposta a viuvo ou viuva com filhos, que repre-
sentava o justo fim do os favrecrr.
Para evitar que os bens deixados ao conjige snperstite sejam gosa-
dos em ulterior matrimnio pela pessoa que com maior ou menor
offensa da sua memori: vier occupar ta f isilia o posto do fallecido,
reconhece o codigo a validade da condir d de não casar imposta
pelo conjuge predefuneto ou pelos asceedentes ou descendentes
deste; mas só a validade da cótdiço de nâo casar, e não a vali-
dade da condição dti ci e-, apesar da mó redecção do artigo.
Na exee:)iie reconhecida no artigo compreiendese apenas a co-
dição de não casar e no a coililo de ctr.
A condiço- - de casar - reputa.se sempre nao escripta, como a
escripta se reputa sempre a condição de tomar ou deixar de tomar
certa e determinada profissão, qualquer que seja a posição do testa-
dor e do instituido e as suas relaç-es juridicas.
Explica-se a validade da condição de oào casar pelo desejo de
evitar aos filhos de anterior matrimonio o prejuizo, quer mural quer
material, que resulta
p quasi sempre dos segutdos casamentos; e nào
offende a moral bha por estar desde seculos recebida nos nossos
costumes, com quanto tviuvo a quem se prohibem as segundas
nupcias não tique impedido de viver na mais escandalosa mancebia,
e até de perfilhar filhos havidos de unies illicitas.
Vias só é obrigado 3 condição de não rasar o visvo ou viuva com
filhos quando tiver sido imposta ess acondição pelo conjuge falle-
cido ou pelos parentes diste em linha recta.
Ninguem mais, parente ou sio parente, tem direito a impôr
semelhante condiçào, porque só em pessoas tão chegadas poderá
reflectir-se a offensa à m-moria do tsírto, e ainda perque só estas
terãó verdadeiro interesse em que o viuvo consese integrahente
em favor de seus ascendentes ou descendentes os bens d'elles
havidos.
Claro é que o conjuge predefuncto só póde impór a referida coa-
dição quando os filhos do conjuge sobrevivo forem tambem seus
filhos.
A coudiçào de no casar imposta ao viuvo com filhos, estabelecida
a favor dos filhos, comí unicamente a favor dos filhos foram estabe-
lecidas as restrieçóes consignadas nos artigos 123.° e 1238.d não
póde ser ampliada ao caso iii netos, apesar te com os netos subsistir
a razão, porque as leis que restringem os direitos do cidadão não
podem admittir interpr tao xtetnsis a
Só fallecendo os filhos depois da morte do testador é que subsiste
em favor dos netos a cndiçdo, porque os filhos adquiriram um di-
reito que tratsii titírsm aos seus successores.
Com a disposição do artigo 1941. do prjiecto primitiv corespon-
dente ao presente artigo :A condi-ío que iííliba o herdeiro ou le-
gatario de casar-se ou deixar de casar-se, ou que o obrigue a tomar
ou deixar de tomar o estado cclesiastico, haver-se-ha por no
escripta», vinha o seguinte 9 unico: tA condição de vine- valerá
comtudo, se o testador deixar filhos ou descendentes tenores-, que
foi eliminado sob proposta do sr. Seabra na sessão de 9 de junho
de 1862, contra1
o voto di Ferreira Lisa e de José Julio, que que-
riam cons -d-o i com a subh.ituiç apenas
-to das palavras ,se o tes-
tador deixsrn por estinutras -- ' o iístilíiído tiver-.
Deixou assim de apparecer o preceito d'aquell s unico nos proje-
ctos da commissão revisora de 1863 e de 1864; e só reapparecu

ïS
ARTIGO 1808. 361

com as modificaçòes indicadas pelo sr. Ferreira Lima no projecto


de 1865, que foi apresentado como proposta de lei pelo governo ás
crtes.
Mas reputa-se no escripta só a condiçào que absolutamente
impõe ao lerdeiro ou ao legatario casar ou deixar de casar, ou
tambem a que lhe impee casar ou de deixar de casar com certa e
determinada pessoa ou em certa e determinada classe ?
Levantada na referida sesso de 9 de junho de 1862 esta questão
foi rejeitada a proposta do sr. José Julio para «se limitar o artigo
á coodição que inhibe abso íamete o herdeiro ou legatario de se
casar», como rejeitada foi a proposta do sr. Ferreira Linia, para
no caso de não ser votada a proposta do sr. José Julio, com que
elle concordava, ser retodelado o artigo nos seguintes termos :
«E nulla a instituição e legodo que for acompaiíoio de coodição
que por qualquer modo importe restricção i liberdade natural de
tomar ou deixar de tonr qualquer estado".
Estarào representadas estas resoluçdes da commissão revisora
nas palavras do artigo .a cotcdiçio ene i/itbir de caso, ou deixar
de casar-se», e significarão só a obrigação absoluta de casar ou de
deixar de casar-se, ou tambem a obrigação de casar ou de não casar
com certa e determinada pessoa ou com pessoa de certa e determi-
nada classe?
Rejeitaria a cosmmissao a proposta do sr. José Julio, com a qual
se conformava tambem o sr. Ferreira Lima, por julgar desnecessario
introduzir no artigo a palavra absotlitaente, visto referir-se a
emenda unicamente á probibiçào de casar e querer a commissào
que se reputasse não escripta tanto a condição de casar como a de
não casar?
No projecto de codi-' civil h-spauol, fotte abundante do nosso
codigo, só se tem por uào escripta a condiçào asoluta de não casar
e não a condição de não casar cota certa pessoa, ou com pessoa de
ceta classe.
E certo que a palavra absoluta se
no encontra nem
no codigo,
nem no protecto primitivo.
Por isso já se julgou tnão escripta a condição relativa de casar
oude não casar com certa e determinalala pessoa ou
com pessoa de
certa e dotermitada classe, decidindo-se que o artigo comprehen-
dia, tanto a condiçào t lti-, cotío a condição absolt de e-asar ou
de deixar de casar se, com o fandamento de ser tanto inuma como
noutra ferida a liberdade de casar ou de deixar de casar-se.
O artigo, porém. declara não escripta a ithibição absoluta de ca-
sar ou deixar de casar-se, porque se refere apenas a condit;ão vaga
e geral de casar ou de deixar de casar.
A condicão de ca-ar ou de n, casar cai certa determinada
-, não est. cmprehendida
pi's soa o tm csrua dtermiuada el
ta disposi; do irritante do artigo, porque não impo r ta a prohibição
de casar ou dc não casar.

r Accordão da Relação do Porto de 17 de tovembro de 1874, Re-


inata de Legislaoo e de Juriprud-lia,de Coimbra, 8.o ano, t.' 398,
pag. 544.
2 Accordão da Relação do Porto de 12 de fevereiro de 1901, lte-
rista dos Tribunaes, 19.' anuo, no 450, pag. 277.
362 ARTIGO 1808.'

A condição de não casar com o individuo A ou com individuo da


classe II, como a condição de casar com certa e determinada pes-
soa ou com pessoa de certa e determinada classe, cercéa inques-
tionavelmente a liberdade de escolha, porque importa a condemua-
ção ao celibato desde que ao instituido não agrade a pessoa indi-
cada, e a condição de casar ou de não casar mesmo só com relação
a certa e determinada pessoa é bem mais gravosa e mais offensiva
da liberdade do que a de tomar ou de deixar de tomar certa e de-
terminada profissão.
Mas por outro lado a condição de casar ou de não casar com certa
e determinada pessoa ou com pessoa de certa e determinada classe,
parece tambem inspirada no desejo de beneficiar ou de excluir essa
pessoa determinada ou essa classe determinada.
Fosse, porém. qual fosse o pensamento do legislador, o que ficou
na lei foi a inhibição de casar-se ou deixar de casar-se, e não a inhi-
bição de casar-se ou deixar de casar-se com certa e determinada
pessoa ou com pessoa de certa e determinada classe.
Não esta, porém, comprehendida na disposição irritante do artigo
a deixa dependente do estado de solteiro, de casado, ou de viuvo,
ao tempo da morte do testador.
O nosso direito tem sempre considerado valida a disposição em
propriedade ou em usufructo conforme o instituido for ainda solteiro,
ou já casado ou viuvo, á morte do testador, como a condiçào de
passarem os bens a terceiro se o instituido não casar e não tiver fi-
lhos, como a clausula de só entrar na posse da cousa legada o lega-
tario quando tomar novo estado, como a condição de casar em casa
dos paes ainda que sáia depois de casado, como a deixa de pensão
vitalicia para ser paga só durante o estado de solteiro, com quanto
já se reputasse tal declaração equivalente a inhibir o legatario de
casar em quanto quizer desfructar o legado.
Reconhecida é tambem na jurisprudencia a deixa para patrimonio
se o instituido vier a tomar o estado ecelesiastico, porque tal clau-
sula nem obriga a casar ou deixar de casar, nem impóe ao instituido
a condição de se ordenar.
Representa apenas uma condição suspensiva.s
Em todo o caso se a recusa parte da pessoa indicada para
casar com o instituido ou de outro que interesse em que o ca-
sassento se não faça não é com isso prejudicad o instituido,
porque a condição tem-se por cumprida quando o cumprimento
for impedido por quem tenha interesse em que eila se não cumpra,
artigo 1744.'

t Associação dos Advogados de Lisboa em conferencia de 2h de


julho de 1875, respectiva Gaosta, 2^ anmo, pagg. 547, 557, 657 e
673, e accordào do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de maio de
1900, autos de revista n.° 28:776.
2 Accordtos, do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de maio de
1895, e da Ilelaçào de Lisboa det 15 de fevereiro de 1896, Gazeta
da Retasço de Lisboa, 9. atno, n.° 14 e 66, pag. 108 e 521.
a Accordlm da Relaço do Porto de 17 de novembro de 1874,
Revista de Leqislaçit e de Jfrisprrdemia, de Coimbra, 8.' anno,
n." 398, pag. 544.

rui
ARTIGOS 1809.^, 1810. E 1811.0 363

Mas na doação entre vivos produzem todos os seus effeitos as


condiçâes de casar ou de não casar, porque o presente artigo E só
applicavel 3s disposições de ultima vontade.

Art. 1809.° E nulla a disposição feita sob condição, de


que o herdeiro ou o legatario faça egualmente em seu tes
tamento alguma disposição em favor do testador ou de ou-
trem.
E reprovada pela legislação de todos os povos a condição do tam-
bem dispór o instituido em favor de outrem, porque seria converter
o testamento em rigoroso contracto e prejudica o principio de que
a testamentifaç5o activa é pessoaliasisa e consequencia exclusiva
de determinação individual.
Já em direito romano eram prohibidas, e não produziam efleito
algum, as disposiçbes chamadas capsatorias- Coptuaoriac scriptu-
rae nerão in herediatibus, saeor is legatis vaent»-dizia a lei ro-
mana.
Para tirar todo o caracter contractual a semelhante instituição não
se limita o codigo a declarar não escripta a condição para manter a
disposição.
Pelo contrario invalida a disposição por causa da condição, isto é,
declara radicalmente nulla a disposição por ser radicalmente nulla
a condição.
Obedece este preceito ao mesmo principio que determinou a abo-
lição dos testamentos de mão coammum só porque podiam ter a côr
contractual com quanto não tivessem realmente essa natureza.

Art. 9810.1 A condição, que apenas suspender por certo


tempo a execução da disposição, não impedirá que o her-
deiro ou o legatario adquira direito á herança ou ao legado,
e o possa transmittir a seus herdeiros.
(Vid. nota ao artigo 1747.^)

Ari. 1811.0 O legado ficará sem elfeito:


1.° Se o testador alienar por qualquer fôrma a cousa
legada;
2.1 Se a cousa legada niio estiver em commercio;
3.° Se o testador transformar a cousa legada de modo
que não conserve nem a fârma, nem a denominação que
tinha;
4.° Se a cousa legada for evicta ou perecer de todo du-
rante a vida do testador, ou se for evicta ou perecer de-
pois, sem que o herdeiro para isso haja concorrido.
tunico. Aquelle, que é obrigado a prestar a cousa le-
gada, responderá, todavia, pela evicção, se esta cousa pre-
stada não houver sido determinada em especie.

LL
361 ARTIGO 1811.o

1.' etc.

Equivale à revogaçro do testamento a :,lienlção do objecto legado


por importar em todo o caso muiiura de vontade do testador.
As palavras por qoalqoer orcia acabaram com as listincçòes tios
velhos praxistas que, fundados na legislacào romana, declaravam
subsistente ou caduco o legado conforme haviam sido a titulo one-
roso ou a titulo gratuito as alienaçtis, com o fundamoento de que a
alienação a titulo oneroso representava apinas a necesoidale de des-
premler-se do objecto por falta de recursos, e de que a alienação a
titulo gratuito representava claramente a vontade de revogar o Ie-
gado, salva sempre a prova em contrario.
Não se presta, portsm, a semelhante distineçào o fórmula do coligo,
que declara sem etieito o legado, ou fosse por un ou por outro titulo
a alienaçào.
As palavras "por qool'' ,re fúirma do n? 1.° do artigo, como as
palavras «por rjquagr titoto en cujsa» do artigo 6853 correspondente
do projecto de codigo civil lespanhol, abrangem todo o modo legi-
timo de alienação, quer a titulo gratuito quer a titulo oneroso, sem
exceptuar a alienação por eifeiti da expropriaçâo, quer por utilidade
publica quer por execsção judicial.
E uma vez alienada a cousa ainda que por qualquer eircumstan-
eia ella volte ao poler do testador não revive o legado, como não
revive se for declarada nulta a alienação da cousa legada salvo de-
elaraçâo posterior em contrario, por haver o testador manifestado
abertamente a v,-ntade de revogar a verba tístamentaria no facto de
dispór da cousa em vida.
Apesar de haverem sido eliminadas pela commissào revisora as
palavras: .aiada que a atieíaçào se annulle, e volte a cosa ao
poder rIo testador., por que terminava o n. 1." do artigo 1944^ do
projecto primitivo correspondente ao u 1.' lo presente artigo, não
vale o legado ainda que volte de novo ao patrimonio do testador a
cousa alirnada, quer por nullidade de contracto, quer por outro
motivo, ao que nâo obsta o disposto no artigo 1802., que se refere
ao caso de não pertencer ao testador no acto da feitura do testa-
mento a cousa legada, e não ao caso de ser então do testador a
cousa e de lle a aliena depois.
No primeiro raso manifestou o testador tanta vontade de contem-
plar o legatario com a cousa 1egjda que lia deixou apesar de lhe
não pertencer; e no segundo bem elaramente revelou a intenção de
retirar o beneficio ao legatario, desfazendo-se da cousa que lhe le-
gára.
Itaduca egtalmente o legado de divida se o testador a pagar ao
legatario depois de feito o testamento, artigo 1819? j unico, por equl-
valer tal pagamento á entrega do legado em vida.

2. etc.

(Vid. nota ao artigo 370.°)

3.

Ou porque represente mdança de vontade do testador, ou porque


dificulte a determinação da cousa legada, ou porque torne impossi-

Mi
r
ARTIGO 1812." 365

vel o uemprimento do legado como elle foi determinado, é certo que


a traoforimaçâo da cousa legada faz caducar o legado.
Nào importa, pordm, trasformaç$o o oimples ettellezamento.
A luxuosa encadcraçio de um livro, o terraço construido no pre-
dio, como o augmento de estatus no palacio, posto que augmitem
o valor da couta Legada, n:'o itutilisam o legado, como o nào inutilisa
a simples alteraç o do nhme, mantendo-se a trma, isto e, os acciden-
tes exteriores do objecto, coto a figura, o aspecto, a cór, a consisten-
cia e a densidade; nem perde a íiesa ou a cadeira a sota >tureza
propria por se lhe dar ditominç o diflcrente da que lhe compete.
Sé prejiudica o legado a transforma,,ào que no conserve a fôrma
e a denomiaçíio da cousa legada.
Assim fica sem efleito a deixa, para peca, de uma lagêa que o
testador depois seceou pta empregar a superficie -na cultura de
cereaes, ou a deixa de pedras preciosas iinm aunel que o testador
depois aproveitot para alfinete de peito, ou a deixa de cortinas
de sala que o testador depois coíserteu ei estofos de cadeiras, ou
o legado de mtadeiras que o testador empregou n'uia construcção
depois de feito o testamento, porque estes factos são prova mani-
festa da mudança de cotade.
No preceito do ut" 2. do artigo não esto coímprehendidos os se-
moventes Curm as cor0as ftuígiveis por não serem susceptiveis de
transformçào.

4. etc.

Estatto limitada a obrigaoço do herdeiro entrega do legadono


estado em que elle estiver ti morte do testador, prejudicada fica a
disposição se i sida do testador tiver perecido, ou se tiver perdido,
ou tiver sido evicta a coma legada, por mio poder cumprir-se o
legado do que já não existe na suceesso, e mesmo que perecesse,
ou se perdesse, ou fosse evista depois da morte do testador, o
legatario já adquiriu direito á entrega, e o Locdeiro ficou na posição
de devedor e respoisavel, quando o herdeiro uào concorreu para a
evicção, ou para a perda da cousa, nem por attar em mora, nem por
outro qualquer motivo.
Alietíada, evista ou perdida si em parte a cousa ligada, pertence
é claro ao legatario a parte rcstaít desde que >d, fii determinada
em especie.
A evicção é o Lerdeiro ou legatario a cargo dc quem ficou a en-
trega da cousa s-ípre obrigado a prestal-a, se a cousa não liouver
sido deterinala ri> especie, coo é obrigado a prestal-a sempre,
mesmo quando a cousa foi deteríiada em especie, se directa ou lu-
directamente concorreu para a evíçeao.
Na hypothese especial do unico : palavrac.pcie significa uo
um r de cousas coo no artigo 10', >00s sim cousa singular-
mente designada a que é appliavel o artigo 1806."

Aril. 1812.> Se flrem legadas duas cusas alternai-


vamente, e pereCe
iaílgiuma d elas, subsisiri o legado na
restante. Pereced o s ptarjt de uma cousa, ser decido
o rest.
(Vid. nota ao artigo 721.)
*'1

366 ARTIGO 1813.0

Art. 1813.1 0 legatario não pode acceitar uma parte do


legado e repudiar outra, nem rejeitar unu legado onerado
e acceitar outro que o não seja; mas o herdeiro, que for
ao mesmo tempo legatario, pôde renunciar a herança e
acceitar o legado, e vice-Nersa.
Pelo direito hodierno não é herdeiro quem o não quer ser.
Hoje não lia herdeiros seus ou herdeiros necessarios, cois no
primitivo direito romano, obrigados a acceitar a suecessào quer
queiram quer não queiram.
Hoje é inteiramente livre ao herdeiro a acceitaçào ou o repudio
da herança, mas nào em parte, com tempo ou com coidiç,ses, artigo
2022.-, como ao legatario se não permitte acceitar tina parte do
legado e repudiar outra. nem acceitar o legado simples e repudiar o
aueroso, já para não ficar sem execução a vodade do testador ' que
se presume não haver feito o legado simples senão como compen-
sação das obrigaçáes impostas no oneroso, já porque nas regras de
direito quem acceita o util deve sujeitar-se ao prejudicial pela regra
ui cumus/se, ibi incnu,dsm.
Póde porém o legatario de dois legados simples escolher um e re-
pudiar o outro, como a contrario senso se infere do presente artigo, e
como é disposição expressa do artigo 707.° do projecto do codigo
civil hlespanhol, sua fonte, porque a cada um é licito renunciar a todo
ou a parte do seu direito: e assim, legada uia livraria e ui animal
de mero luxo, póde o legatario acceitar um e rejeitar o outro se com
isso não prejudicar a intenção do testador.
Pôde tambem o herdeiro, que for ao mesmo tempo legatario, re-
pudiar a herança e acceitar o legado ou repudiar o legado e accei-
tar a herança, artigo 20350, com quanto alguns julguem indigno do
legado o herdeiro que assim afronta com o repudio a vontade do
testador.
Póde tambem o herdeiro acceitar a herança já eflectiva e repudiar
a que o auctor ainda não tivesse acceitado, artigo 2033.-, por lhe
haver sido transmittida n'este caso, não a herança acceita, mas o di-
reito de a acceitar ou repudiar, artigo 2032., que é acto inteiramente
livre, artigo 2021., tanto em relação ao instituido como em relação
ao successor.
Pela mesma razão é permittido repudiar a herança e acceitar
quaesquer doações entre vivos ou caííau ,ortis.
Fica, porém, inhibido de acceitar a herança ainda não acceita
o que repudiou a herança existente, artigo 20330, porque só na qua-
lidade de herdeiro podia exercer o direito de acceitar, artigo 2032.,
e quem repudia a herança nunca foi herdeiro, artigo 2035.0
Presume-se tambem renunciar á herança o chamado por testamento
e abintestado que a repudia pelo primeiro titulo, porque não póde
a lei premiar a malicia do herdeiro que repudia o direito por testa-
mento, para haver depois abintestado os bens do testador, de cuja
vontade expressa no testamento zombou.

r Accordâo do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de fevereiro de


1888, Boletim dos Trihunaes, 3.o muno, n. 106, pag. 310.

j
r
ARTIGOS 1814.0 E 1815.- 367

Mas o repudio abintestado por falta de noticia do testamento não


prejudica o direito de acceitar depois por este titulo quando appa-
recer o testamento, artigo 2039.-
Finalmente o repudio da quota dispunivel do testador no importa
o repudio da legitima, artigo 2039.-, porque a legitima é divida de
que o herdeiro egitimario púde eão querer prescindir, e a quota
disponivel liberalidadeque elle púde nàl querer Rcceitar.
Fallecendo o instituido sem acceitar podem os seus representantes
acceitar uns e repudiar os outros o respectivo quinho, porque n'este
caso cada frarçâo do legado ou da herança representa uno legado ou
uma herança especial e separada.
Retrotrahem-se os effeitos da acreitaçlo ou do repudio até o dia
da abertura da herança, artigo 2043., que é o da morte do auctor,
desde a qual sicam todos os direitos e obrigaçôes pertencendo a quem
acceita, e entendendo-se que nunca foi herdeiro quem repudia, ar-
tigo 2035.0
Assim succedem por direito proprio, e não por direito de repre-
sentação, os immediatos ao repudiante, pois que não pde haver di-
reito de representoçdo de pessoas vivas, nes de pessoas que nada
representaam por se haverem privado pelo facto do repudio de
todos os seus direitos, como expressanuente determina o artigo 752o
do projecto de codigo civil hespatliol, fonte dos artigos 1972." e
2035.» do presente codigo.
Por isso os herdeiros imuediatos recebem a successo sem respon-
sabilidade pelas dividas e encargos do que a repudiou, pois que a
successào por direito proprio dispensa a satisfação dos encargos
do representado, a que obriga a suecess por direito de represen-
tação.
Paulo, filio de Pedro, que aci citou a herança do avd Martinho,
repudiada por seu pae, herda do avô Martinho por direito proprio e
uso como representante do pae.
A liquidaçRo da contribunçAo de registo, provado o repudio pelo
termo de que tracta o artigo 2034., faz.se na conformidade do re-
gulamento de 23 de dezembro de 1899, artigo 75.'

Art. 1814.0 A instituição de herdeiro, feita por pessoa


que não tinha filhos ao tempo do testamento, ou que igno-
rava tei-os, caduca de direito pela superveniencia de filhos
ou ouiros descendentes legitilos, ainda que posthumos, ou
pela legitimação dos illegitimos em virtude de subsequente
matrimonio.
S1.0° A perfilhação, posterior ao testamento, de filhos
illegitimos, havidos antes ou depois d'elle, não anuilla a
instiluição de herdeiro, 1uas limita-a ú terça do testador.
§ 3.° 0 legado não caduca por nenhum dos casos sobre-
diclos, mas psde ser reduzido por inolicioso.
Art. 1815." Se os filhos super'enienles fallecerem pri-
meiro que o testador, produzirã a disposição os seus effeitos,
se não for revogada pelo mesmo testador.

(Vid. nota ao artigo 1760.")

L
Y'* *P~ ~WVb1 s.T
V*

368 ARTIGOS 1816.0, 1817.^ e 1818

Art. 1816.° Se a cousa legada se achar empenhada, será


desempenhada por conta da herança.
(yid. artigos 1845^ e 2234.)
E a cargo da herança o desempenlo do objecto legado, quer em
usufructo quer em propriedade, artigo 2234.^, porque as dividas do
testador, como dividas da herança, hão de ser pagas pelo herdeiro;
e póde o legatario, para garantir o seu direito, registar o onus nos
bens sujeitos no encargo do legado conforme o artigo 906.^
lia de o herdeiro indrmnisar o legatario não só da perda do
usufructo ou da propriedade, artigos 1845. e 2234., senío tambem
do encargo da consignaçào de rendimentos e das dividas hypotheca-
rias e mais encargos que onerarem o legado, e nào forem inherentes
i cousa legada comuo os furos ou uinohòes 1, por não haver herança
sem estareis pagos os credires e os legatarios, artigos 201;.0 e
2051 2
Não póde o usufructuario fugir i expropriação hypothecaria, em-
bora não seja o devedor, visto ser posuidor e correr esta execaçào
contra o possuidor do predio, codigo de processo civil artigo 852.0 3
Mas fica obrigado o proprietario a indemnisal-o se for penhorado
ou vendid, judicialmente o predio legado. ou imsmo se o legatario
pagar sem osperar pila penhora ou pela venda. porque fica subro-
gado nos direitos do credor, artigo 7792

Art. 1817.0 0 legado de cousa ou quantidade, que deva


ser recebida em logar designado, si poderá ler effeito até
onde chegar a porrão que se encontrar nese mesmo logar.
(Vid. nota ao artigo 1805.)

Art. 1818.1 Se o testador legar certa cousa, ou certa


sotinta, como por lle devida ao legalario. será válido o
legado, ainda que tal somua ou cotsa realmente devida
não fosse, salvo sendo o legatario incapaz de a haver por
doacão.
A concubina, que pelo artigo 17712 poderia receber em testa-
mento qualquer beneticio no tendo sido judicialmente provado o
concubiuato ,m vida do testad r, nada póde receber usa especie do
presente artigo, porque nada póde receber por legado quem é inca-
paz de receber por doaçào, ainda que o adulterio só se prove depois

f
1 Accordâo da Relação de Lisboa de 14 de agosto de 1885, Gazeta
da mesma Relaçào, 1p anno, n.0 32, pag. 255.
2 Accordào do Supresmo Tribuna de Justiça de 21 de junho de
1887, Iole/ius dos Tri-itns, 2.0 anuo, n 79, pag. 579.
1 Accordo da Relaçào de Lisboa
0
de 18 dc julho de 1885, Gauoía
da mesma Reiaçào, 1." ano, is. 3G, pag. 291.
r
ARTIGO 1S1D.• 369

da morte do testador, pois o artigo 1450.^ permitte intentar a acção


dentro de dois unos depois de dissolvido o matrimonio para annul-
lar as doações feitas pelo conjuge adultero i sua concubimo qual-
quer que seja a fôrma e a eptch da doação.
Nào se conciliam os artigos 1771. e 1815 applicando, como algune
pretendem, o artigo 1771. só à instituição de hrdeiros e nào á
deixa de legados, porque tal interpretação daria o absurdo de se
tractar com maior favor a concubina herdeira do que a concubina
legataria.
O artigo 118" o que parece é mais u a restricço a capaci lade
successoria do adultero, e longe de contrariar
directame oteartigo
1771 . significa apenas que mesmo nãotendo sido proad o O adul-
terio em vida do testador no vale o legado se o legatario é inca-
paz de receber a cousa por dooçlo, pois que provado judícianente
o adulterio em sua vida, nao pôde o testador inquestionavIhsete
instituir o seu etuplice im herdeiro nem legatario.
Valem portanto os legados deixados pelo cotjuge adultero ao seu
eumplice no tendo sido
prosado judicialmente o
adulterio em vida
do testador salvo se o
legatrio ers ineapaz de receber por doação,
eem caso nenhum vale a deixa da herançapor homem easado i sua
concubina ainda que em vida nso tenha sido judieiahneute provado
o adulterio.
N'uma palavra o artigo 1818. deixa de pé todas as restricçies
creadas à capacidade successoria, e acrescenta mais que o legado,
mesmo nos casos em que o legatario é pelas disposi: òes legaes capaz
para o receber, não vale nem sob a forma de divida quando elle é
incapaz de o haver por doação.

Ar. 1819.° Se a divida depender de tenmo, nião será o


legatario obrigado a esperar, que chegue esse termo para
exigir o pagamento.
iuico. O legado licará, todavia, sem rffeits, se o les-
tador, sendo devedor ao tempo da feilura do lestamento,
pagar a divida depois.

O legado das dividas em geral abrange todas as dividas existentes


ao tempo da abertura da herança, e no simplesmente as existentes
ao tempo do testomento, salvo declaração em contrario.
Refere-se o artigo ao legado de soi ma ou cousa pelo testador
de'ida ao iegstario, e não ao legado de divida contra terceiro, por-
que a terceiro não pôde ser exigida s divida antes do termo porque
o não obrigam as determinaç'es do testador.
Não tem o legatario outra vantagemt com a deixa da divida senão
tornar logo liquida e exigivel a mesma divida sem necessidade de
esperar pelo praso marcado para o pagamento.
Quer seja terceiro quer o proprio legatario o devedor, o herdeiro
satisfaz sempre com a entrega dos respectivos titulo,, artigo 1821.
A divida legada só péde exigil-a judieiahneute o legatario se re-
nunciar ao legado, porque acexigencia ao mesmo tempo da divida
e do legado com caracter de divida importaria duplicação do bene-
ficio.
Caduca o legado da divida se depois do testamento for obrigado
judicialmente o devedor a pagal-a.
Tosm III 24
370 ARTIGOS 1820.°, 1821.°, 1822.0, 1823. E 1824.*

Art. 1820.1 O legado feito a um credor, sem que se re-


fira a divida do testador, não será considerado como com-
pensaeão da mesma divida.
(Vid. nota ao artigo 1386.)

Art. 1821.0 Se o testador legar algum credito que tenha,


quer seja contra terceiro, quer contra o proprio legatario,
ou dér a este quitação da divida, o herdeiro satisfará en-
tregando au legatario os titulos respectivos.
unico. Se o credito se mostrar compensado, no todo
ou em parte, poder o legatario exigir do herdeiro o equi-
valente do credito, ou da parte compensada; ruas se a ex-
tincção da divida provier de outra causa, não poderá exigir
cousa alguma.
(Vid. nota ao artigo 745.0)

Art. 1822.° Se o herdeiro for iisitíuido debaixo de con-


dição suspensiva, será posta a herança em administração,
até que se cumpra a condição, ot haja certeza de que não
poderá cumprir-se.
unico. A administração será entregue ao co-herdeiro
testamentario incondicional, se entre este e o condicional
podér dar-se o direito de accrescer.
Art. 1823.0 Se o herdeiro condicional não tiver co-her-
deiros, ou, se, tendo-os, não podér dar-se entre elles o di-
reito de accrescer, ser encarregado da administração o
herdeiro legitimo presumido, salvo se o herdeiro condicio-
nal tiver justo motivo de opposioão.
unio. o herdeiro condicional poderá tomar conta da
herança, prestando caução.
Ari. 1824A\s disposições dos dois artigos precedentes
são applicaveis as heranças deixadas aos nascituros.
A instituiço de herdeiro, que aliás não pôde ficar dependente de
terceiro ou oe termo, pôde fazer-se debaixo de codição suspensiva
ou resolutiva, cor m s a instituiç7o do herdeiro fica dependente de
voltar ou não voltar Pedro da Zambozia.
Nas deixas sob condição resolutiva entra logo o iustituido na posse
e administração dos bens, na qoal se conserva até se verificar a
condiça-o, e transmitte o seu direito ainda que morra antes de rea-
lisada a rondiçào, porque o direito é isomediatamente exigivel, e
é a resolur- o do direil que dependt de ircumstancia eventual.
A condição suspensiva pc o contrario impede a entrada do insti-
tuido na posse dos beus como o impede de transmittir qualquer di-
reito de expectativa, visto nada adquirir antes de preenchida a coa-
1
ARTIGO 1824. 371

diçâo, e por isso na istituiças codieic'al se reqer capacidade no


instituido no s na occsíiso da morte do a da herança,
libor senao
tombem, a epecha de se cumprir a condiço por ser 'iste <momento
qiue se consolidam os direitos nascidos da disposiçao condieinal.
Durante o estado provisorio em que o instituido nuo póde entrar
na posse dos bens, e que se nio sabe quem virá a ser herdeiro, isto
é, em quanto se nào cumpre a condiçio on rào lia a certeza de se
uào cumprir, como por chrýar a noticia de ter fallecido ou de ter
voltado Pedro da Zambolzia, como nào ho de ficar os bens em aan-
dono até essa eventualidade, conciliam-se os direitos do instiido
com a vontade do testador entregando a adtiinistiaç : 1.- no co-
herdeiro instituido puramente, se entro elle e o co-herdeiro condicio-
nal piotér dar-se o direito de acerescer, pr ser o herdeiro puramete
instituido o seu sucessor legitimo no se verificando cindi-o, e
portant o lmais interessado na boa sdministraçio dos bens; na
falta de co-herdeiros te <<<entariose, su não haoeido entre elles e
o herdeiro condicional .. direito de acerescer, ao herdeiro legitimo
presumido por ser o mais interessado visto pertenrer-lhe <ltuo a
successo conto herdeiro legitimo, salvo motivo de opposirào do her-
deiro condicional, como suspeita de m admiiistraç o ou qualquer
outra causa legitima.
O proprio herdeiro condicional póde ser investido na posse da he-
rança mediante eauçào prévia.
Mas prefere o herdeiro condicional tanto ao herdeiro incondicional
a quem por direito de acerescer haja de perteneer a cousa na falta
de cumprimento da condição, como ao hrdeiro legitimo tenha ou
nao tenha contra este motivo justo de opposiçlo, ou só prefere ao
herdeiro legitimo e só quando contra este tiver justo motivo de
opposiço?
Pelo projecto primitivo, artigo 1958.° coirespndente ao artigo
1823.° do coigo, que era redigido assim -Se o herdeiro condi-
cional não tiver co-herdeiros, on nào podér ter logar entre elles o
direito de acereseer, será encarresado da administraçio o herdeiro
legitimo presumido; salvo se o herdeiro coniicionl tiver justo -
tiro de opposiçào. - c <uico. N'este ultimo caso poderá o hmedeiro
condicional tomar conta da hernça prestando esaçào ou fiança.., só
na falta de co-herdeiros instituidos entre os qlaes podesse dar-se o
direito de acerescer e havendo contra o herdeiro legitimo justo mo-
tivo de opposiçlo, podia tomar conta da herança o herdeiro condi-
cional, e, ainda assim, n<<deante caçào, por ne as palavras ote
lio ele"" no admittiím outra iiterpretaçàl.
Mas com a suppressào das palavras iste íllinm cao, por <ne co-
meçava o citado ý unico do artigo 1958.' do projecto prumto,
quereria a csmmissdo revisora dar pr ferencia na adminiitrçc ao da
herança ao herdeiro condicional logo que prestasse cauça houvesse
ou nào houvesse herdeir ,s condicionaes com ou sem direito de acres-
cer e herdeiro legitimo presumido, com ou sem justo motivo para ser
exeluido da administraçãoY
Significará a snppressào das palavras - -sn'et, 'ldi/s caoes-apenas
a obrigaçho de prestar caeoi o herdeiro condicional para tomar
conta dos bens, eão só neste ultiíí, caso, o. e< ldos os c<.ea, em
que lhe seja confiada a administraçdo provisoria da herança?
Nem uma nem outra cousa está clara no codigo.
E' m verdade, se durante o estado provisorio póde ser commettida
e adr<i itres as co-herdeiro instituido com direito de acerescer
ou ao herdeiro legitimo sem motivo de opposiçâo, pela esperança ou

kl.
372 ARTIGOS 1825. E 1826.-

possitilhdad' de haverem a herança no se rificando a condiço,


pela mesma razão podia ser entregue a administração ao herdeiro
condicional, sobre tudo desde que se lhe impõe a obrigaçâo de prestar
canção, porque o seu direito de expectativa prima sobre o dos outros
herdeiros.
No entre tanto o que parece mais confórme á letra do artigo é que
o herdeiro condicional, ainda prestando cauçào, só póde reclamar
a administração dos bens na falta de co-herdeiro com direito de
accrescer e de herdeiro legitimo sem motivo de opposiçào, e assim
que sé é chamado em ultimo lagar ainda que se preste a dar
caução.
Não ficam, porém, dispensados de caução os outros administrado-
res, tanto herdeiro incondicional como herdeiro legitimo, apesar
de só ao herdeiro condicional se referir o § unico do artigo 1823.,
porque o artigo 1825.° os equipara aos curadores provisorios dos bens
do ausente, cuja situação é um pouco analoga, pois que se dos bens
do ausente não póde dispór-se em quanto se nso sabe se o proprie-
tario é morto, tambem dos bens deixados condicionalmente não
póde dispôr-se em quanto se não cumpre a condição, ou tia a certeza
de aio poder ser cumprida, e lambem cessa a administração quando
é cumprida a condição suspensiva como cessa quando comparece o
ausente.
Portanto quem tomar conta da herança, ou seja co-herdeiro com
direito de accrescer, ou seja herdeiro legitimo presumido sem motivo
de opposiçâo, ha de, como todo e qualgaer administrador inventa-
riar os bens, dar contas, defender os direitos hereditarios, prestar
caução, etc.
O legado com condição- suspensiva não é entregue ao legatario
ainda prestando caução, e aim administrado pelo herdeiro até se ve-
rificar a condição ou haver certeza de não se verificar, por ser ao
herdeiro que a cousa ou somma legada aproveita não se verificando
a condição, e por ser ao herdeiro que o codigo dá a administração,
artigos 1800.°, 1838. e 18é
RA. Finalmente, não se confundem as condições com as substitui-
çoes.
Assim a instituição de herdeiro ou de legatario para o caso de
não casar ou de não ter filhos o instituido, como a disposição que
chama terceiro aos bens no caso de fallecer o instituido antes de
certa edade, é condicional, e regulada pelos artigos 1822. e 1823.' e
não pelos preceitos relativos ás substituições.

0
Art. 1825. Os administradores, mencionados nos artigos
precedentes, telo os mesmos direitos e obrigações, que
os curadores provisorios dos bens dos ausentes.
(Vid. unota ao artigo 58.)

Art. 1826. 0 legado puro e simples confere ao legatario


direito transmissivel, cottado desde o dia em que o testa-
dor se finar.

(Vid. nota ao artigo 483.1)

-t
ARTIGOS 1827.-, 1828.°, 1829., 1830.' e 1831.' 373

Art. 1827.0 Quando o legado for de cousa indeterminada,


comprehendida entre outras da mesma especie, pertencerá
a escolha d'ella a quem dever prestal-a, devendo ser essa
escolha regulada por um lermo medio, pelo que toca ás
qualidades da cousa.
(Vid. nota ao artigo 1806.)

Art. 1828.0 Se a escolha for attribuida ao legatario por


disposição expressa do testador, escolherá o dicto legatario,
entre as cousas da mesma especie. a que bem lhe parecer,
e, se não houver cousa alguma da mesma especie, tocará
ao herdeiro escolher essa cousa que ha de prestar, e que
não será, nem da melhor, nem da peior qualidade.
(Vid. nota ao artigo 1805.)

Art. 1829.° Se o legado for alternativo, pertencerá ao


herdeiro a escolha, se esta não for conferida expressamente
ao legatario.
Art. 1830.0 Se o herdeiro, ou o legatario, não podér
fazer a escolha nos casos em que lhes é attribuida, passará
este direito aos seus herdeiros; mas, feita ella, será irre-
vogavel.
(Vid. nota ao artigo 733.1)
Nos legados alternativos em que se deixa uma ou outra cousa,
isto é, uma vinha ou um olival, para determinar e individualizar a
cousa legada ha de observar-se o disposto para as obrigações da
mesma natureza nos artigos 728', 729., 740.0, 744°, 1691. e outros,
que, como era já no nosso direito antigo e no direito de todos os
povos a começar pela legislação romana, dá, salva declaraçüo em
contrario, ao sujeito rla obrigação, que póde ser cumprida de diffe-
rentes fôrmas, o direito de escolher a fórma por que a ha de cumprir.
Contra essa escolha, cujo direito se transmitte como se transmitte
o direito de aeceitação ou de repudio da herança, artigo 2032.', não
pôde mais reclamar-se, como rso pôde mais reclamar-se contra a
acceitação ou repudio, artigos 2036.' e 2037.%, scno por dolo, vio-
lencia ou qualquer outro facto dos que viciam os actos joridicos.
Se, porém, uma das cousas legadas em alternativa não existir, sa-
tisfaz o devedor entregando a outra.

Art. 1831.° 0 legado de alimentos abrange sustento, ves-


tuario, habitação e, sendo o legatario menor, educação.
1.° Esta obrigação de subsidio para educação dura até
que o alimentado haja adquirido a pericia, ou a habilitação
regular no otficio ou profissão que tiver adoptado. Não
374 ARTIGOS 1832.°, 1833.0 E 1834.-

tendo adoptado algum officio ou profissão, cessará esta


obrigação.
2.1 À dicta obrigação é applicavel o que fica disposto
no artigo 181.°
3.0 A doutrina dos ýS antecedentes é applicavel ao le-
gado, deixado inicamente para despezas de educação.
(Vid. nota ao artigo 171.0)

Art. 1832.° Sendo legada unta casa com tudo o que se


achar dentro d'ella, não se entenderá que são tambem le-
gadas as dividas activas, ainda que na casa se encontrem
as escripturas e os documentos respectivos a taes dividas.
(Vid. nota ao artigo 378.')

Art. 1833.0 0 legado de usufrueto sem determinação de


tempo, entender-se-ha, que é feito para em quanto durar a
vida do legatario.
Art. 1834.° Se ü legatario do usufructo, sem determina-
ção de tempo, for alguma corporação perpetua, sel-o-ha por
espaço de trinta annos, e não mais.

(Vid artigo 2240)


Porque podia entrar em divida se era perpetuo o usufructo legado
sem designaçào de termo ás corporações perpetuas, e porque a per-
petuidade do usufructo, além de ferir o principio da desamortisaçào
nos bens immobiliarios, reduziria muito o valor do dominio sempre
prejudicado com a separação entre usufructo e propriedade, fixou o
legislador tempo determinado para a duração do usufructo legado
a corporacões perpetuas, artigo 2244.'
A lei romana tomando por base o praso mais largo da vida do
homem fixtra a duração do usuireto para as corporaçes em cem
asios -PlariI centtt annos tacndos esse unoieipeis, quia is fins ritae
leisaeci hominis &st-.
O nosso legislador, prem, marcou o praso de trinta annos para a
duração do legado de usufructo deixado a sociedades e corporaçes,
talvez por ser esse o period ordinario de duraýIo do usufrocto le-
gado a particulares, salvo se antes dos trinta annos se extinguir a cor-
poraçao que acaba ntão logo o usufructo, porque a extincç o da
corporação como a morte do individuo püe termo a todos os direitos
dependentes da existencia do homem.
Encurtou a lei moderna o praso, no si paro evitar a separação
entre o usufructo e a propriedade durante tão longo tempo, mas tam-
bem para cercear vantagens is corporaçües, e sobre tudo ás corpora-
ções perpetuas unicas a que . presente artigo se referia.
Foi o artigo 2244.' que ipliou o preceito tambem ás corporações
temporarias, e q u e, abrangendo na íeneralidade da sua redacção
toda a especie de associação, publica ou particular, civil, coemíer-
cial, etc., tornou disprnsavel o artigo 1834.'
'.1
FW'

ARTIGOS 1835.', 1836., 1837.o e 1838:- 375

Mas não ficam por isso desobrigadas as corporaçes perpetuas de


converter dentro de ano em fundos consolidados nos termos do ar-
tigo 35. o usufrocto de bens de raiz, que cst comprelíndido nos
bens immobiliarios como a propriedade.
Obrigava o projecto primitivo :i conversão no artigo 39., corres-
pondente ao artigo 35: do código, apenas as aequisiçbes de bens de
raZ. A comnmisso revisora, porém, logo nos trabalhos da primeira
revisão, ao examinar o artigo 2408: do projeeto primitivo, corres-
pondente ao artigo 2244.1 do codigo, decidiu como se li em a nota
ao artigo correspondente (2286.,) do projecto de 1863, applicar ao
usufruoto a obrigação da conversão, que pelo artigo 3 35 devia ser
feita dentro de ano, e abrangia todas as acquisiç es immobiliarias
das corporaçües perpetuas, quer bens de raiz, quer usufrííto, ou cín-
sos e f6ros, n'uma palavra, ampliou a obrigaçbo da conversão a todos
os bens e direitos immobiliarios.

Art. 1835.1 0 legado deixado a tini menor, para quando


chegar á maioridade, não puderá ser por elle exigido antes
desse tempo, ainda que emancipado seja.
(Vid. nota ao artigo 1747.)

Art. 1836.1 O legado para obras pias, sem outra decla-


ração, entender-se-ha, que é feito para ubras de beneticencia
e caridade.
(Vid. nota ao artigo 1775.')

Art. 1837.0 0 equivoco do testador a respeito da pessoa


do legatario, ou da cousa legada, não annllará o legado,
se podér mostrar-se claramente qual era a intenção do Les-
tador.
(Vid. nota ao artigo 1761.")

Art. 1838.° 0 legatario requererá ao herdeiro o cumpri-


mento do legado, se não se achar de posse da cousa legada.
1. Se os herdeiros se demorarem em tomar conta da
herança, poderão ser citados para que a acceitem ou a re-
nunciem.
S2.0 Se os herdeiros renunciarem a herança, poderão
os legatarios requerer, que seja nomeado curador á herança
jacente, e a este pedirão a entrega do legado.
é 3.5 Se o legado recair, como encargo, sobre outro
legado, deve ser pedido ao tegatario d'este.
(Vid. artigos 1857. e 2041.')

wti

MP

1"

376 ARTIGO 18386.

Os legatarios e os credores, como quaesquer outros interessados


na successào, para noo estarem á mercê da negligencia ou da má
fé do lerdeiro queira retardar o repudio ou a acoeitação da herança,
podem requerer ao juiz do domicilio passados nove dias depois da
morte do auctor da herança, isto é, passado o tempo do nojo, a
assignaçào ao herdeiro de um praso razoavel não excedente a trinta
dias para fazer a sua declaração sob pena de se haver por acei-
tada a herança como expressamente determinava o artigo 2041.,
hoje profundamente modificado pelo codigo de processo civil ar-
tigo 689.°
Pelo artigo 2011.0 do presente codigo sé os interessados eram ex-
pressamente auctorisados a requerer a citaçào do herdeiro para de-
clarar se acceitava ou repudiava a herança. e era o juiz do domicilio
do herdeiro o competente para conhecer do pedido.
Pelo codigo de processo civil muito expressa e especialmente se
deu legitimidade ao ministerio publico para requerer como os inte-
ressados declaração, e o requerimento, ou seja dos interessados ou
do ministerio publico, é feito não ao juizo do domicilio do herdeiro,
mas ao juizo da abertura da herança.
Ambas estas alteroçes feitas pelo codigo de processo civil são
razoaveis. Pôde o miisterio publico representar egualmente inte-
resses sagrados, e a competencia dada ao juiz da abertura da he-
rança evita as diticuldades de dilterentes herdeiros com domicilios
em diversas comarcas.
Contam-se pelo codigo de processo civil desde a citação os trinta
dias para a declaraço, que lia de ser reduzida a termo, e o termo
no caso de repudio lançado no livro competente.
Não podem ser citados ao mesmo tempo e sim suecessivamente
os representantes dos tifferentes graus até não haver quem prefira
á successào do estado, citado artigo 689." do codigo de processo civil
9 3.0
A falta de declaração no praso legal faz presumir acceitaçào. No
caso de repudio considera-se jacente a herança, e nomeia se-lhe
curador.
Nos mesmos termos se ha de fazer a citação do legatario quando
recabir o encargo sobre legado. Por appenso ao inventario pôde
pedir-se o legado e seus accessorios em con formidade do disposto
no artigo 8i4.° § 2." do codigo de processo civil.'
Pôde tambem o legatario de cousa determinada intentar directa-
mente acção de reivindiccçlo contra terceiro que tenha a cousa
legada em seu poder, artigo 877 ., quer seja mobiliaria, quer immo-
biliaria, sem necessidade de citação dos herdeiros para a acçãos,
nem de liaver eccrado na posse real e effctiva do legado, sim-
plesmente em nome do domnio ou da posse que lhe advem pela
morte do auctor ds herança, com a obrigaçRo apenas de pagar ou
de caucionar a devida contribuição de registo para tomar conta dos
bens.
Não é, porém, preciso o manifesto exigido pela lei de 18 de agosto

t Aecordam de Relação de Lisboa de 16 de janeiro de 1897 Gazeta


da Ieloção de Lisboa 10." acno o" t2, pag. 489.
r Accordào do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de dezembro de
1890, Boletci dos Tribunes, 6l. anno, n 229, pag. 163


ARTIGOS 1839. . 1840.^ 377

e regulamento de 8 de setembro de 1887, para seguir a acção pelos


juros do legado depois de findos os articulados, por não se tractar
de divida sujeita a manifesto. 1

Art. 1830.1 Se a herança tiver sido toda distribuida em


legados, e o testador não houver nomeado testamenteiro,
será havido por executor do testamento o legatario mais
beneficiado. Em egíaldade de circumstancias, será o que
for designado pelos legatarios, e, se não podérem accordar,
ou se houver entre os legalarios algum menor, ausente ou
interdicto, será o executor designado judicialmente.
(Vid. nota ao artigo 1794.0)
Póde qualquer dos interessados requerer a nomeação de-testa-
menteiro ou executor do testamento ao juiz quando a este compe-
tir, artigo 1893 do presente codigo, nomeação que o juiz só fará
depois de marcar aos interessados para responder o praso de cinco
dias a contar da citação, codigo de processo civil artigo 660.0
Os legatarios, que aliás não dizem no inventario sobre a fórma da
partilha, são todavia chamados a deliberar sobre as dividas e sobre
o modo de as pagar quando toda a herança fór dividida em legados, ou
quando da approvação das dividas resultar reducção dos legados,
codigo de processo civil artigo 715.°

Art. 1840.° 0 legatario tem direito, desde a morte do


testador, aos fructos e rendimentos da cousa legada, excepto
se este houver ordenado o contrario.
O codigo seguindo na esteira do codigo civil francez dá ao lega-
tario direito, desde a morte do testador, aos fructos e rendimentos
nos legados de cousa determinada, porque logo á morte do testa-
dor adquire a propriedade, e corre d'ahi em diante por sua conta o
augmento e a diminuição do valor.
Nos tegaslos em bens immobiliiarios pertencem aos legatarios, não
simplesmente os rendimentos a contar do seguinte anno agrícola,
mas todos os fructos pendentes á morte do testador, salvo estando
arrendados os bens, porque então divide-se a reada do ultimo anno
entre o legatario e o herd eiro pro rata t-,po ris.
Não importa renúncia aos rendimentos o recebimento do capital
sem reserva, porque o pagamento não se presume.
No legado codicioial tambcm se retrotráe ao tempo da morte
do testador o direito aos resdimetos, por alo distiuguir o artigo
entre o legado puro e o legado sob cosdição, salvo se outra fór a
vontade do testador.
Porém, nas instituiçNes a termo reconhecidas por lei, os institui-
dos, com quanto adquiram desde logo o direito, só o icem eltcctiuo ao

Accordão da Relação de Lisboa de 19 de setembro de 1893,


Direito, 30.0 anno n.o 1i, pag 173.

1,1
VI
378 ARTIGO 18407

chegar o termo, e no intervallo pertencem os rendimentos á pessoa


indicada na disposição de ultima vontade.
Não é sobre o direito do legatario aos proventos da cousa legada
desde a morte do testador nem sobre a divisão dos rendimentos co-
lhidos desde a abertura da herança até ; partilha em proporção
do quinhão de cada um dos interessados, que se levantam duvidas
porque sobre estes casos é muitissimo claro o preceito legal.
O que se discute é se tambem são devidos juros e desde quando do
dinheiro legado ou aformalado em partilhas, bem como das tornas
sobre tudo quando ellas correspondem a bens rendosos.
Por direito romano, lei 4, Cod. de episcopis e/ elericis e Nov. 131
cap. 12, só era obrigado o herdeiro a restituir os fructos desde opedido
dn legado, salvo lns legados pios.
No direito velho pagavam-se juros das tornas a dinheiro desde a
partilha com fundamento no alvará de 12 de outubro de 1775 § 9
com referencia ao § 12.- das resoluçóes de 1 de julho de 1770, e di-
vidiam.se pelos co-herdeiros os fructos e rendimentos vencidos ou
colhidos até á partilha por estar até então pro-i.<dirisoo casal.
O projecto primitivo no artigo 1974. correspondente ao artigo
1840.° do codigo só permittia exigir os fructos e interesses do legado
desde a móra, excepto havendo o testador ordenado o contrario ou
tendo o herdeiro occultado dolosamente o testamento.
Querem alguns que os juros dos legados em dinheiro corram
desde o termo do praso marcado pelo testador para o cumprimento
do legado, e, na falta de designaçdo de praso, findo o amno que
tem o testamenteiro para cumprir o teamento conforme o artigo
1903., e a mesma jurisprudncia applicam is tornas com o fun-
damento de que, dependendo de interpellação o pagamento dos
.ur. s, desappareceria a egualdade da partilha exigida no artigo
1142.". e viria o co-herdeiro que levasse a mais no quinhão here-
ditario a gosar a sua legitima e a legitima dos outros correspon-
dente ás tornas.
Multo variadas tlem sido as decises na especie, tendo-se já jul-
gado que as tornas e os legados em dinheiro vencem juros desde a
contestação da lide 1, ou desde a sentença ou do transito em julgado
da sentença sobre a partilha.2
Com qu a nto os juros não possam ser considerados pena e sim in-
demnaisação pela detenção e frui;ão do dinheiro alheio, é certo que
não são as mesmas as regras relativas ao pagamento dos rendi-
mentos e as relativas ao pagamento dos juros de quantias em di-
nheiro, porque mão ha analogia entre os rendimentos de bens que a
lei manda expressamente pagar ao possuidor, e os juros das tornas
que podmo não os vencer nas mãos do devedor.

1 Aceordão da Relação de Lisboa de 6 de maio de 1871, Revista


de Leqidtiçéo e de Jurisprudenci, de Coimbra, 4. anno, nP 163,
pag. 109.
2 Accordàos da Relaç o do Porto de 10 de janeiro de 1879 e de
19 de maio de 1882, e do Supremo Tribual de Justiça de 23 de
dezembro de 1881, Direito, 119 anno, si. 2, pag. 30, e 14." anso,
a." 27, pag. 128, e Rerista de Legislação e de Jmirisp r udencia, 22.'
anno, n.° 1:085, pag. 157 e 158.

1
m
r
ARTIGOS 1841. E 1842.0 379

Nos pagamentos em dinheiro, esteja ou não fixado o pras, não se


devem juros senão desde a interpellação, porque os artigos 790.° e
732. são applieavris, não só is obrigaçoes provenientes de contra-
etos, mas a todas e quaesquer outras, por força do disposto no ar-
tigo 2393., em tudo aquillo em que alo forem incompativeis com
a naturea d'elas, e nenhuma d'aquellas disposiçòes é repugnante
á indole das tornas ou dos legados a dinheiro, porque os mesmos
artigos não impürm an devedor de quantia de dinheiro seom juro a
obrigação de pagar os juros senão desde a interpellação, e linalsente
por uo haver no codigo disposição especial com relação a tacs
dividas, nem rm materia de Legados, nem em qualquer outra secção,
que vá de encontro ãquella regra geral.
0 devedor de tornas, como o de qualquer outra obrigação de di-
nheiro, uào deve juros senão estipulados.
Só ha obrigação de juros quando foram estipuldos ou julgados,
ou quando a lei os manda pagar.
Ora os artigos 711.° a.- 2.-, 720.' e 732.o são obrigam a juros
senão desde a interpellação, para não reconhecerem ao credor direito
de colher fructos da sua negligencia.
Se o credor quizer haver juros, constitua o devedor em mora pela
interpellaçào judicial.
Em conclusão, não se devem juros rlos legados em dinheiro nem
das tornas em dinheiro, que não forem estipulados, senão desde a
interpellaçào, porque assim o determinam os artigos 711.4, 720.° e
732.'
Se, porém, as tornas, que aliis sàã em geral pagas a dinheiro,
fores ronstituidas em bens. o que impropriamente se chama tornas,
pois que é verdadeiro ,is/soos bes, evidentemente o interessado
teia direito aos reodi/ooo5ss d'esses bors,,sje em todo o caso não
devem ser confundidos com juros.
Esta é tambem a jurisprudencia forense.

Art. 1S 1.0 Se o testador legar qualquerprestarão pe-


ridica, correrá o primeiro período desde a uuorte d'elle,
e terá o legatario direito á dica prestação, apenas reco-
mece novo periodo, ainda que falleça antes do termo d'elle.
unico. O legado não será, porém, exigivel, senão no
fim de cada período, excepto sendo a titulo ia alimentos,
nos termos do artigo 18.°
(Vid. nota ao artigo 184.0)

AiL. As despezas, qpe se lisremi com a entrega

t Acrordàos, da Eelação de Liisboa de 23 de abril de 1SSi, e do


Supremo Tribunal de Justiça de l de deerol dce 1881, de 12 de
maio de 1893 e de 17 de decmbr de. 197, Re is/o de Leuisis;ào
e de Joarsprudenciu, de Coimbra, '12. ano, i.- 1:085, oag. 158. Di-
rilo, 13. anno, n.° 5, pag. 7S, e 33.1 anuo, n.° 1:11, pag. 206. e
Gazela da Relação de Lisboa, 1:.P anuo, n.° 10, pag. 75.
380 ARTIGOS 1813.- E 114.

da cousa legada, ficarão a cargo da herança, se o testador


não dispozer o contrario.
(Vid. nota ao artigo 746.P)
Estas despezas abrangem encargos como os designados no artigo
1816.^, mas não o pagamento da contribuição de registo, imposto do
estado.1

Art. 1813.° A cousa legaca deve ser entregue com os


seus accessorios, no logar onde, e no estado em que estiver
ao tempo da morte do testador.
unico. Se o legado consistir em dinheiro, em joias ou
em outros valores, representados por titulos, qualquer que
seja a especie d'estes, será entregue no logar onde se abrir
a herança, salvo havendo disposição do testador ou con-
venção das partes em contrario.
(Vid. nota ao artigo 739.0)

Art. t84.° Se aquelle, que legar alguma propriedade,


lhe ajunctar depois novas acquisições, estas, ainda que cou-
tiguas, não farão parte do legado sem nova declaração do
testador.
§ unico. Isto não se entenderá, porém, a respeito das
benfeitorias necessarias, uteis ou voluptuarias feitas no pro-
prio predio legado.

Ou seja de moveis ou de immoveis o legado, só pertencem ao le-


gatario os acessorios, isto é, o que está incorporado ou anda annexo
ao principal de modo permanente.
omprehendem-se assim no legado de immovel quaesquer con-
strueç6es, porque o edifieio é accessorio de terreno.
O testador, legando a terra, legou todo o espaço acreo corres-
pondente.
«Si arene legalae do,,,os imposia si, debebit- legataeio, uisi testatr
mutarih rolountaem, dizia já a lei romana, Dig. de leg. 1.0 liv. 44,
§ 4.
Não é de presumir que o testador quizesse separar da terra a
casa para deixar cada cousa a sua pessoa.
las já se nau comprehendem nao legado de uma morada de casas,
as casas contiguas que o testador depois construiu ou comprou, que
não podem considerar-se aecessorio, visto assentarem em terra diffe-
rente.

1Acecordan do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de novembro


de 1897, Gazeta da Rela(çir' de Lisboa, 11.0 anno, n. 70, pag. 555.
r---

ARTIGOs 1845., 1346., 1847. a 1845. 381


A razão é porque ao contrario do que succede com o herdeiro, em
que a deixa é de valor iídefioido, não podem ampliar-sc os legados
além da cousa ou do valor determinado; e por isso l direito de
acerescer entre os herdeiros, artigos 1852. e 1853: , e não o entre
os legatarios, artigo 1854.

Art. 1845." Se a consa legada se achar onerada com al-


gum fòro, quinhão, servidão, ou qualquer outro encargo,
que lhe seja inherente, passara com o mesmo encargo ao
legatario.
unico. Se, porém, a cousa estiver obrigada por fúros,
quinhões, ou outros oius atrazados, serão estes pagos por
conta da herança.
(Vid. nota ao artigo 1816.)

Art. 1846.° Os iomoveis, que os herdeiros houverem


do testador, ficarão, nos termos do artigo 906.° n.° 8.' ,
hypothecariamente obrigados ao pagamento dos legados.
unico. Se, porem, algum dos herdeiros for especial-
renrte obrigado a esse pagamento, só poderá o legatario
exercer o.seu direito hypothecario sobre os immoveis, que
couberem em partilha ao dicto herdeiro.
(Vid. nota ao artigo 906. uo 8.,)

Art. 1847.° Se o testador legar cosa de algum dos co-


herdeiros, serão os outros obrigados a indetmisal-o pro-
porcionalmente, se o testador outra cousa não dispozer.
(Vid. nota ao artigo 1808.')

Art. f848.1 Se a herança ou o legado for deixado sob


a condição de que o herdeiro ou o legatario não dc ou não
faça tal cousa, poderão ser obrigados os dictos herdeiros
ou legatarios, a requerimento dos interessados, a prestar
caução de que assim o cumprirão, salvo o que fica disposto
no artigo 1808.
A caução exigida tanto para as obrigaçcGs negativas que consis-
tem em não dar ou em nio fozer, como para as obrigaçJes afirma-
tivas que consistem am dar ou fazer, não se ampli:i coidiçfo de
nào casar imposta ao viuvo cor filhos nos ternos cio artigo, nem a
que obrigar o instituido a tomar ou deixar de tomar o estado ecle-
siastice ou certa e determinada profissão, ou por se reputarem nao
escriptas taes condiç~es, ou pnrque o rompimento da condição quando
saio validas importaria logo a quebra do beneficio.
rr '"'rrww - - *

382 ARTIGOS 1849.0, 1850. r 1851.u

Art. 1840.° Se o legado For deixado condicionalmente,


ou s[ipara ler efleito Lassado certo tempo, poderá o lega-
tario exigir, que ajuelle que deve prestar esse legado dé
caução para segurança d'este.
(Vid. nota ao artigo 1747.)
Na vigeocia do direito anterior não era o herdeiro obrigado a
caucionar legado como é hoje se não for dispensada pelo testador;
e por isso não é applicavel o artigo s succcssées abertas antes da
promulgação do codigo. 1

Art. 1850.° Se o testamento for declarado unllo depois


do pagamento do legado, tendo esse pagamento sido feito
em boa fé, ficará quite o herdeiro nomeado para com o
verdadeiro herdeiro, entregando o resto da herança, salvo
o direito deste contra o legatario.
unico. A mesma disposição é applicavel aos legados
com encargos.

O herdeiro que em boa fé pagou, como o legatario que em boa fé


satisfez o encargo, ainda que depois se annulle o testamento, é em
virtude da sua boa fé relevado da obrigação de restituir o indevi-
damente pago, ficando ao prejudicado acção contra quem individa-
mente recebeu.

Art. 1851.° Se o legatario com encargo nio receber, por


culpa sua, todo o legado, será o encargo reduzido propor-
cionalmente, e se a cousa legada for evicta, poderá o lega-
ký lario repetir o que houver pago.
ýá

O legatario com encargo, que -cio culpa sua não recebeu o legado
todo, tem direito ao abatimento proporcional no mesmo encargo,
a repetir o que pagou no caso de evicção, aliás seria prejudicado,
em logar de beneficiado, com as disposiçes do testador.
Não se sabe porque a conuissão revisora introduziu no artigo
as palavras ,par culpa sua que não vinham no projecto primitivo,
1 e que sauccionam uam erro juridico, absolvendo do encargo por in-
teiro o legatario que 'por culpa sua- deixou de haver o legado por
inteiro, e tornando o beneficiado victima legal de culpas que sobre
elle tio impendem.
Já a redacçào do projecto primitivo, no artigo 1985.o correspon-
dente ao artigo 1851.0, era a seguinte: <Se o legatario com encargo
não receber todo o legado, será o encargo reduzido proporcional-
F'-

' Accordão da Relação de Lisboa de 8 de maio de 1872, Revista


de Legislaç ' ede Jurisprudencia, de Coimbra, i anno, n? 320,
pag. 122.
"SI

ARTIG'oS 1852.1, 1853- s 1854. 383


mente, e se for evicto, poderá repetir o que haja paga», apesar de
no ineluir as palavras-~per os/pa sua, parecia reconhecer ao
legatario o direito á reduecçao proporcional do encargo, ou por culpa
ou sem culpa nao houvesse recebido todo legado.
A commissão revisora votou inqestionaveloente o que tstá no
redigo, segundo consta da acta da sessão de 26 de janto de 1,8G2:
«Tiveram a palavra os srs. Ferrer,qil, Seabra, Jose Julio e ilerecu-
lano, depois do que se resolveu por proposta l'este ultimo que fosse
redigido pelo modo seguinte -Sc o legatario com encargo, neo re-
celer por culpa sua todo o legado aer, cte/
Mas o pensamento da commissão revisora foi de certo escrever as
pal vras ,-semr culpa sua, em vez das palavras ,por culpa sua»,
porque te o pde attribuir-se ao legislador a idêa de inverter a rdem
natural das cousas, pondo a carga de terceiro os effeitos da culpa
do legatario, o que representaria um erro juridico que nem o direito
nem o bom senso pecrmitte acceitar.
O redactor da Goma teos Trieunaes, sr. Gil, que fazia parte da
commissão revisora, e que esteve presente na referida sessão de 26
de junho de 1862, snstentou em o te» 4:120 d'aquella folha que o
pensamento do artigo era a reducção proporcional elo encargo, quando
não se recebesse o legado todo sem culpa do legatario.
E esta é a doutrina a seguir, devendo attribuir-se a erro a re-
dacção que ficou no codigo.

Art. 1852.° Se algum dos co-herdeiros instihidos falle-


cer primeiro que o testador, repudiar a heraiça, ou se tor-
nar incapaz de a receber, accrescer a sua parte aos outros
co-herdeiros, salvo se o testador houver disposto outra cousa.
Art. 1853.° 0 direito de accrescer tambem competira aos
herdeiros, se os legtlarios não quizerem utínão poddrem
receber o respectivo legado.
Art. 1854.° Entre os legalarios não haverá direito de
accrescer; mas, se a cousa legada for indiisivel, ou não
poder dividir-se sem deterioração, lerá o.co-legllario opção,
ou para conservar o lodo, repondo aos he(ídeiros o valor
da parle caduca, ou para haver d'elles o valor do que di-
reitamente Ilhe pertencer, regan-lhes
,. a cousa legada.
StniCo. Se, porém, sendo o legado onerado com alguns
encaog, este caducar, hierará o leatario o proveieo que
d'alli he resultar, se o lesladur ião tiver ordenado o con-
trario.

(Vid. nota ao artigo 1467 )


O direito de accrescer, que em Roma se explicava pela unidade
da suecessão por não caberem na mesma heraça herdeiros legi-
ti/uos e herdeiros testamenteiros visto não ser primeittido morrer
1 parte testado e parte intestado, tem no direito moderno por fui-
d eeceo a vontade presumida do testador que revelou /iais sffecto
pelos herdeiros que instituiu que pelos parentes que preteriu.
lia logar ao direito de accrescer sempre que o herdeiro instituido
fallece antes do testador, ou repudia a herança, ou se torna incapaz

11
,i-IR

384 ARTIGOS 1855." E 1856."

de a receber, salvo determisação do testador em contrario expressa


o0 tacita como se disp5e de metade da herança apenas.
A referencia do artigo 1852" aos outros co-herdeiros, depois de ter
faltado dos co-herdeiros instiruidos, nào deixa duvida de que os outros
co-herdeiros a que o mesmo artigo se refere são os eo-herdeiros livre-
mente instituidos, distinguindo assim como o artigo 1823.' entre
co-herdeiros is/itnid e herdeiros legitieos.
Entre os herdeiros legitimes não ha successào por direito de
acerescer, nem é preciso invocar enr caso algum na successão legi-
tima o direito de acerescer.
Nos mesmos casos accresce ao herdeiro ou herdeiros o legado,
visto não poder o legatario receber o respectivo legado e no haver
entre legatarios direito de acerescer, que o codigo civil hespanhol
aliás reconhece tambem aos legatarios e usufructuarios, como o co-
digo belga reconhece o direito de acerescer aos legatarios na nomea-
ção conjunecta ou no mesmo acto a varias pessoas sem designação
da parte de cada uma, ou quando a cousa não podér ser dividida
sem auctorisaçào.

Art. 185.5.0 Os herdeiros, que houverem o acerescido,


succederão em lodos os direitos e obrigações, que caberiam
áquelle que não quiz ou não pôde receber a deixa, se a
houvera acceitado.
(Vid. artigo 1864.°)
Tanto no direito de accerescer como nas sobstituiç5es vulgares,
artigo 1864.", toma para todos os effeitos o substituto a posição do
substituido nos direitos e nos encargos, salvo no que for puramente
pessoal, pois não pôde ser obrigado, por exempl, o substituto que
não é poeta a fazer uma ode que para o substituido era condição da
instituição.
Resolveu assim o codigo no sentido atlrmativo a questão, já ven-
tilada em direito romano, se a condição imposta na instituição havia
de julgar-se repetida na substitaição, por não poder presumir-se que
o testador quizesse favorecer mais o substituto do que o instituido,
si nos fueril eridens diersa rolemts, porque em materia de dispo-
siç5es testamentarias cede tudo á vontade do testador legalmente
manifestada.

Art. 18.56.° Os herdeiros, a quem a dicta porção accres-


cer, poderão repudial-a, se ella tiver encargos especiaes
impostos pelo testador; mas, neste caso, a dieta porção re-
verterá para a pessoa ou pessoas, a favor de quem esses
encargos houverem sido cotstituidos.
Ainda influenciado pelas doutrinas do direito romano o projecto
primitivo no artigo 1990.°, correspondente ao artigo 1856." do codigo,

r Accordâo do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de outubro de


1888,Boletim dos Tribunaes, 4." anuo, o." 140, pag. 148

J
ARTIGOS 1857.' E 1858.° 385
obrigava os herdeiros a acceitar a porção acereseida sob pena de
se absterem da herança se não eram legitimarios; e alguns codigos,
confundindo a instituição pelo testador com o accreseimo por vir-
tude da lei, não permittem renunciar o herança accrescida sem re-
nunciar ao directaíneote assignado pelo testador com o fundameto
de ninguemí poder aeceitar herança em parte.
Mas pela deliberação da commissio revisoa, que ficou no codigo,
podem os herdeiros repudiar o quinhão acerescido, que, se vier
onerado com encargos especiacs, segue para o pensionista, e não
para os herdeiros do testador, o que está mito em harmonia com
o disposto no artigo 1788.°

Art. 1857.° Os legatarios têem o direito de reivindicar


de qualquer terceiro a cousa legada, quer mobiliaria, quer
immobiliaria, com tacto que seja certa e determinada.

(Vid. nota ao artigo 1838.')

SEçCt.\ 't

Das substituições

Ar. 1858.' Pôde o testador substituir uma ou mais pes-


soas ao herdeiro. ou herdeiros insituielos, ou aos legatarios,
para o caso em que os herdeiros ou os legatarios iuo pos-
sam ou no queiram aceitar a herança ou o legado: é o que
se chama substituição vulgar ou directa.
uo ico. Esta substituição expira, logo que o herdeiro
acceite a herança.

Podem ser muitos os substitutos e ua só o substituido, e vice-versa


usi só o substituto e muitos as substituidos, na substituição vulgar.
A velha Ordenação do reino, que nao admittia substituiçcs se-
não de berdeiros, definia substituição a instituição de herdeiro feita
pelo testador em - -segado grau- ,
e reconhecia as mesmas iemco
fórmulas de shstihiçio - -vulgar, reciproca, pupillar, exemplar e
compendiosa-, reguladas na presente secção.
Tambem nas doações são permittidas as substituições nos mesmos
casos em que o são nas disposiç6cs testamenítarias, artigo 1473.^
A grande divisão a considerar em isateria de substituições é em
vulgar e fideieommissaria.
A substituição vulgar, para o caso de nâo chegar a ser herdeiro
o instituido-Si haeres tas crit-, fui u nais antiga em direito ro-
Tomo 111 25
386 ARTIGO 1859.0

mano, onde teve a sua origem, e onde tinha por fundamento princi-
pal a necessidade de cumprir condições dependentes da instituição.
A Ordenação, inspirada nas superstições do direito romano que
julgava menos decoroso morrer sem representate testamentario,
admittia a existencia das substituições spara que os testadores tives-
sem mais faciluente quem acceitasse os suas heraoças.
No direito moderno, poréms, que podem ser cumpridas quaes q uer
condições pelos herdeiros legitimos, como pelos herdeiros testa-
mentarios, a verdadeira causa da substituição é, quando não quize-
rem ou não podére aeceitar o beneficio os primeiros contempla-
dos, facultar ao testador a liberdade de ampliar as manifestações
do sou afecto a outras pessoas que lhe sejam tambem mais caras
do que os herdeiros legitimos, aos quaes na falta de substituição
teriam de passar os bens.
A substituição directa, que se chama rulgar por a poder fazer
qualquer testador ao seu herdeiro segundo explica a Ord. liv. 4."
tit. 87.p § 1.°, e que p'de definir-se no systema do codigo a desi-
gnação da pessoa paro quem deve passar a herança, o legado, ou a
doação, na falta do herdeiro, do legatario, ou do donatario, que não
aeceita ou por não querer ou por não poder, tinha na Ordenação a
seguinte fórmula: .Instituo a Pedro por meu herdeiro, e se não
for mes herdeiro, seja meu herdeiro Paulo» as quas palavras,
(continua a Ordenação) se Pedro no fór meu lerdeiro comprelendem
dois casos, por cada um dos quaes pôde acontecer, que o dicto
Pedro não seja herdeiro : o primeiro, se o não quizer ser, o segundo,
se não podér; e por qualquer delles que aconteça o Pedro, herdeiro
instituido, não ser herdeiro, haverá logar a substituição vulgar, e
Paulo substituto haverá a herança do testador".
Com quanto a fórmula conunum e ordinaria das substituições vul-
gares seja a da Ordenação, que abrange os dois casos de nio orcei-
tação por udo querer ou por ufo poder, vale a substituição feita
para o caso de neo poder ainda que o instituido não aceeite per
sno querer, e vale a subtituição feita para o caso de não querer
ainda que o instituido não arceite por não poder, apesar de não se
encontrar no codigo preceito equivalcnte á seguinte disposição da
citada Ord. liv. 4." tit. 87.- no 2.": 'lE o substituto vulgar n'aquelle
caso, que o testador sómíente especificou. tombem haverá aherança,
acontecendo o outro caso, de que o testador não fez menção».
A interpretação do codigo pela Ordenação é mais conforme 1 in-
tenção do testador artigo 171.-, pois uão pide presumir-se que no
animo do testador, desejoso de broeficiar o substituto, podesse de-
cisivamente influir o maotiro por que o substituido não acceitou a
herança.
Acceite a instituição cessa logo a substituição por se verificar a
condição que exclue a substituição, como dispóe o 5 unico do ar-
tigo que não vinha no projecto primittivo e que foi, introduzido pela
commussao revisora.

Ar. K39.1 0 testador, que tiver filhos ou outros des-


cendentes debaixo do patrio poder, os quaes não hajam de
ficar por morte do testador sob poder de outro ascendente,
poderá substiíuir-lhes os herdeiros e os legatarios que bem
lhe parecer, para o caso em que os dictos filhos ou outros
descetdeutes faileçam, antes que perfaçam quatorze annos
ARTIGOS 1860.-, 1861.- E 18612.- 387

de edade, sem distineção de sexo: é o que se chama sub-


slimuição pupillar.
Art. 1860.° A substituição pupillar ficará sem effeito,
logo que o substituido perfaça a edade mencionada no ar-
tigo presedente, o falleça deixando descendentes succes-
siveis.
Art. 1861.° A disposição do artigo 1859.0 é applicavel,
sem distineção de edade, ao caso em que o filho ou outro
descendente seja demente, com tanto que a demencia tenha
sido judicialmente declarada: é o que se chama snbstilnição
quasi pupillar.
Art. 1862.0 A sustiluição, mencioida no artigo pre-
cedente, ficará sem effeito, se o demente recuperar o
juizo.

Foi a substituição pupillar recada na legislação romana logo em


seguida á substituiçào vulgar para o caso de fallecer antes de che-
gar á puberdade, edade legal para fazer testamento, o descendente
sob o patrio poder-si Ii:eres aoi cri! et totcpsetrtatem decesserit-;
e chamou-ae «pupilhor- pnr se denominar ýaJapi<lo» o menor até á
edade de quatorze annos, epocha em que desde os tempos mais re-
motos começava a puberdade, salvo com relaçào ás mulheres para
as quaes peiritpiava Oos doze annos.
A substituiçio quasi pupiliar, no antigo direito conhecida por
exemplar pela sua semelhança cum a pupillar, foi por Justiniano
estabelecida á imitação da pupillar part o caso de fallecer o her-
deiro instituido com incapacidade mental para testar-si haeres
erit el ia furore decesseril.
A fórmula da substituiçào pupillar era, Ord. liv. 4.' tit. 87.0 ý 7.-:
-Se meu filho Pedro fallcer dentro da pupillar idade, seja seu her-
deiro Paulo; e a fórmula da substituiçào quasi pupillar era Ord.
liv. 4.t tit. 87.' no 11. : <Instituo a meu filho, ou a meu neto Pedro,
por meu herdeiro; e se fallecer, durando o furor, que tem, seja seu
herdeiro Paulo.
Concedia a lei velha tão amplas faculdades aos ascendemios para
proteger a pessoa do impubere contra as desmesuradas ambições
dos herdeiros legitinos, que n'aquelles tempos de depravaçiio do
costumes chegaram muitas vezes aos attentados contra a vida do
menor.
No regimen da lei antiga fundava-se a substituiçào pupillar no
patrio poder e a quasi pupillar no aflecto pelo iiapaz; e não havia
differença entre uma e outra senão quanto ts pessoas que podiam
fazel-a.
A substituiçào pupillr, como era consequncia do patrio poder,
s a podia fazer o pae e nào a mle nem outro qualquer ascendente,
pois coforme a lei do reino ficavam pelo casamento as filhas fóra
do poder de seus paes, e por colsíguiite fóra do poder de seus avds
ou de outros ascendentes por parte de seus paes os netos que de tal
filha nascessem.
A substituiçào exemplar, porém, qualquer ascendente ainda da
linha feminina a podia fazer; e até a Ord. liv. 4' til. 87.o no 1.
definia substituiçào exemplar -a que ui ascendente faz a seu

1
388 ARTIGO 1862.-

descendente, o qual não póde fazer testamento por causa de algum


impedimento natural e perpetuo, assim como se fosse furioso, men-
tecapto, ou surdo e mudo de nascimento-.
O codigo, porém, reconheceu ás mesmas pessoas o direito de fazer
uma e outra substituição, porque não se inspirou precisamente nas
mesmas razues que por direito antigo determinavam a substituição
pupillar e a quasi pupillar.
Em direito moderno funda-se a substituição, tanto pupillar como
quasi pupillar, no patrio poder, artigos 131.» e 322-, e tem uma e
outra por fim habilitar os paes a contemplar as pessoas que mais
serviços tiverem prestado ao menor ou ao demente, que as não podia
compensar por inhibido de fazer testamento.
Não dá o codigo, como dava a Ordenação, na substituição exem-
plar a todos os ascendentes a faculdade de substituir, mas sim e
sómente aos que téem o patrio poder; e o patrio poder só os paes o
têem, como só os paes podem nomear tutores aos menores e aos
interdictos artigo 193.»
Mas desde que só podem fazer a substituição os ascendentes que
têem descendentes sob o patrio poder, não póde reconhecer-se esse
direito a ascendentes que não sejam paes, porque além do pae e
da mãe nenhum outro ascendente gosa do patrio poder segundo a
disposição terminante dos artigos 137.-, 138.° e 166.-
O avó mesmo é simplesmente tutor, artigos 200.o .~ 1.0 a 3., 224.0
n.- 18.0, 1061. § 1., etc.
Como para fazer a substituição é preciso que o ascendente tenha
os descendentes sob o patrio poder, e como sob o patrio poder só os
tem o pae ou a mãe, é evidente que só ao pae ou á mãe péde ser
permittida a substituição pupillar e quasi pupillar.
Das palavras do artigo l859.--as quaes não hajm de ficar por
osrte do te.,ador sob poder de outro ascendente-, comparadas com a
redacção do artigo 193.° que regula caso analogo, tira-se ainda a
cansequencia de que só o pae ou a mãe póde fazer a substituição
pupillar e quasi pupillar.
Seria contrario a todo o systema do codigo dar a faculdade de sub-
stituir a ascendentes que não podem nomear tutor para velar pela
pessoa do mesor artigo 193., que nem a tutela podem exercer sem
a confirmação do conselho de familia, e que nem o casamento podem
auctorizar a não ser o av pela disposição especial do artigo 1061.°
§ 1.0
Não ha de o artigo 1859.», especial para os casos de substituição
pupillar, prevalecer sobre todos os artigos que constituem o systema
do codigo, que só aos paes reconhece o patrio poder.
E puro romanismo, sem apoio na legislação codificada, a dis-
posição enunciativa do artigo que reconhece ao ascendente patrio
poder sobre outros descendentes além dos filhos.
Em todo o caso não tem desculpa a commissão revisora de ter
aproveitado no artigo 1859.o a redacção do artigo 1994.» correspon-
dente do projecto primitivo, sem a aperfeiçoar, e de não ter appli-
cado as palavras -patriopodre» só aos paes, porque lime foi notado
este defeito de redacção pelo dr. Neiva nas suas observações sobre
o projecto de codigo civil.
Nos descendentes -debaixo do patrio poder» comprehendem-se os
pertilbados espontaneamente, como os legitimas e os legitimados.
Cessando a impuberdade ou a interdieção fica sem effeito a sub-
stituição, porque s-biíam coesa cessa eects, como sem effeito fica
a substituição pupillar deixando o menor descendentes successiveis
r ~1

ARTIGOS 1863.0 ® 1864." 389

legitimas ou perfilhados, como sem effeito deve ficar tambem apesar


do silencio do codigo a substitoição quasi pupillar, deixando o de-
mente descendentes successiveis que sejam herdeiros necessarios.
Não valo egualmente a substituiçdo se o demente fez testamento
antes de perder o juizo, como expressamente disp6e o codigo civil
hespanhol artigo 776t., porque a capacidade do testador é regulada
pelo estado em que se achar ao tempo da feitura do testamento, ar-
tigo 1765, ou se as faculdades lhe voltarem ao estado normal por-
que a instituição é sempre dependente da condição de não recupe-
rar o jizo.
Caduca finalmente uma e outra se morrer o substituto antes do
sobstituido porque o substituido é verdadeiramente o anctor da
herança de quem o ascendente se limita a fazer as vezes no testa-
mento.
Este caso tem de ser regulado, não pelo artigo 1810.° nem pelo
artigo 1822.- porque não se tracta de suspender o cumprimento do
testamento ou a entrega da herança, e sim pelo artigo 1759." que
torna sem effeito a instituição pelo facto de haver fallecido o insti-
tuido antes de verificada a condição O; nem o direito reconhece a
transmissão de herança de pessoa viva.

Art. 1863.1 A substituição mencionada nos artigos 1859.°


a 1861.1 só pôde abranger os bens, de que o substituto
poderia dispôr, não se achando impedido ao tempo da sua
morte, e que haja adquirido por via do testador.
Emendou inconvenientemente a commissão revisora a redacção do
artigo 1998" do projecto primitivo, correspondoente ao artigo 1863.'
do codigo, porque empregou para designar o snbstituido a palavra
substituto, quando substituido era a palavra propria e a que se lia no
projecto,
A velha Ordenação do Reino nenhuma condição impunha aos
ascendentes para a substituição exemplar, e só para a substituição
pupillar exigia que o pae fizesse primeiro testamento instituindo
herdeiro o filho, sob pena de ficar sem effeito a substituição pupil-
lar.
O codigo, porém, para evitar abusos não permitte ao ascen-
dente substituir o pupillo ou o demente na testamontifacção senão
com respeito aos bens que por ria d'elle testador o pupillo ou o
demente haja adquirido, vindo assim em definitiva a substituição,
tanto pupillar como quasi pupillar, a ser verdadeira substituição
vulgar.

Art. 1864.0 Os chamados à substituição recebem a he-


rança ou o legado com os mesmos encargos, excepto no

t Accordãos, da Relação do Porto de 30 de agosto de 1889 e do


Supremo Tribunal de Justiça de 17 de junho de 1890, Rerista doo
Tribnaes, 8." nno, u ° 177, pag. 135 e /Jlstim dos Tribuaes, 00
anno, n.° 211, pag. 586

Lii,
390 ARTIGO 1865.0

que for puramente pessoal, com que os receberiam os her-


deiros ou os legalarios substituidos, salvo se outra cousa
tiver sido declarada.

(Vid. nota ao artigo 1855.)

Art. 1865.0 Quando os co-herdeiros ou os legatarios por


partes eguaes forem substituidos reciprocamente, entender-
se-ha, que o foram tia mesma proporção.
unico. Se, porém, os chamados a substituição forem
mais que os iuslituidos, e nada se declarar, entender-se-ha,
que foram substituidos por partes eguaes.

Na velha Ord. liv. 4.' tit. 87 § 5.° comprehendia a substituição


reciproca muitas substituiçoes ditferentes por causa das pessoas
entre as qoaes se fazia, clamava-se reciproca por entre si se sub-
stituirem reciprocaiento maitos herdeiros instituidos, e tinha logar
quando o testador, depois de haver instituido muitos herdeiros em
seu testamento, acrescentava estas palavras: «os quaes subs/ituo etre
si, ou por outras semelhantes ordenava que sucredessem us aos
outros<.
Resolve o artigo a antiga questão se o substituto ha de perceber
da herança exactamente o que lhe pertenceria como herdeiro ou se
ha de receber o que ao institiido competia.
Com quanto só para a hy-pothese de co-lerdeiros ou legatarios
por partes eguaes o artigo mande guardar a mesma proporção, egual
regra deve observar-~e o tenha sido em partes eguaes ou em par-
tes deseguaes a instituição, porque tanta razão ha para ser na mesma
proporção a substituição quando a istituiçIo foi em partes eguaes
como quando foi em partes deseguaes; e não ha no codigo dispo-
sição expressa em contrario.
Assim substituidos entre si Pedro, Paulo e Martinho, que haviam
sido instituidos herdeiros cada um na sexta parte da herança, di-
vide-se à morte de um :o meio entre os outros dois sobreviventes
o que ao falleicdo pertencia; e, se pelo contrario tinham sido in-
stituidos herdeiros, por exemplo, os dois primeiros na sexta parte da
herança cada um e o ultimo ia terça parte, são à morte de Pedro ou
de Paulo dois terços para Martinho e o terço restante para o outro
sobrevivo.
Já por direito anterior era valida a substituição reciproca,
qualquer que fosse o numero das pessoas que umas ás outras se
substituissem, unia vez que existissem todas à abertura da he-
rança, por uão representar n'este caso graus ou geraçóes a sub-
stituição.
O § unico do artigo é totalmente iuapplicavel á substituição re-
ciproca onde o numero dos instituidos não é menor nem maior mas
sempre egual ao dos substituidos, porque são todos instituidos e to-
dos substituidos.
'roda e qualquer fórma de substituição o § unico poderá regular
menos a substituição reciproca.
Pelo artigo instituir tres herdeiros em partes eguaes e reciproca-
mente substituidos, divide-se á morte de um o seu quinhão por egual
r
ARTIGO 1866.- 391

entre os sobrevivos; e pelo j iio se os instituidos forem menos


que os substitutos e nada se declarar, divide-se ao fallecimento de
qualquer dos instituidos o quinhão d'alle por egual entre os subti-
tutos como se dividiria se o numero d'estes fosse menor.
Pela regra juridiva estabelecida na Instituta-Plures in unius
locam possont substitui vcl snois in plurius-, na substituição que
não é reciproca ou sejam em nsro maior ou em numero egual
ou em numero inferior os substitutos, deve sempre dividir-se os bens
por egual eitre os substitutos
A Ord. liv. 4. tit. S7: ý G.° cosidersva substituição vulgar
a substituição reciproca a favor de herdeiros que excediam a edade
pupillar, a qual iscluia a substituição pupilr se os herdeiros insti-
tuidos fossem todos filhos d testador e t'dos pupillos, de modo
que á morte de qualquer d'elles dentro da idade pupillar depois de
ser herdeiro sucedia o outro filho seu co-herdeiro, embora este sub-
stituto não fosse já pupillo e sim maior.
O codigo não adoptou a doutrina do referido § 6. da Ord, liv. 4.'
tit. 87.'

Art. 1866. A disposiite lestametlaria, pela qual alguir


herdeiro ou legatario é eíícr;stgado de conservar e trans-
miltir por sua morte a um terceiro a herança ou o legado,
diz-se substituição fdeicouumissaria ou 6ideicommisso.
No presente artigo e nas provisJes dos artigos 1870' a 18723
synthetisou o codigo as substituiç7es fideicounissarias e os ele-
mentos que as caracterism.
Apesar de não se exigirem palavras sacramentaes na constituição
dos actos juridicos, e de poderem assim ser substituidas por outras
equivalentes as palavras «esns rirs e rssssm.ssitlir por ,nrme. que
rresentam a verdadeira caracteristira das iusiituiçes fileicru-
missarias,js se tem sustentado em hoenageim á vontade do testador,
que a deixa a uni para á amorte d'ele passarem os bens a outro sem
expressr o encargo de conservar e transmittir é simplesmente usu-
fructo.
.Qualquer que seja, porém, a fórmula ou as palavras de que se sirva
o testador, sempre que as substitsiçes onerem um com o encargo
de conservar paia por morte ts-emittir a outro, ha fideiconmisso
reprovado em direito porque a instituição invs.Ie duas nomeações
sem separação de usufructo e de propriedade. 1
Só em caso de duvida se a instituição usufructo ou fideicom-
misso é que deverá decidir-se pela intenção elo testador.2
Da substituição Jideicoannisaris, assim chamada por ser ú fs' do
primeiro instituido que o testador commettia a entrega dos bens ao

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de dezembro


de 1889, Boletim dos Tribunaes, 5.- anuo, n. 188, pag. 215.
2 Accordãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de maio de
1885 e de 28 de fevereiro de í7FJ, tolsiss ls Tri Lassoes, 2.' anoo,
n. 74, pag. 503 e C.ie-a di 2l? m- d, Lisboa, s3. anuo n. 74,
pag. 587.
~1 1

392 ARTIGO 1866.'

substituto, tambem d'auntes conhecida pelo nome de compendiosa,


e de todas as substituições a mais importante, dizia a velha Ord.
liv. 4.0 tit. 87.' § 12.°: «Substittsiçào compendiosa é a que um tes-
tador faz ao herdeiro, que instituiu, quando quer que elle fallecer. E
chama-se assim, porque debaixo de am compendio de palavras con-
tém em si muitas substituições de differente natureza: a fórma, em
que se faz, é esta: Instilso por me« herdeiro a Pedro; e quando quer
que cIte fallecer, 0u depois de sa morte, ou por sua morte, seja her-
deiro Paulo,.
Representavam as substituições em muitos graus morgados irre-
gulares com grave prejuizo para o commercio e para a rirculaçào
dos bens, no só por estarem separados o usufrueto e a propriedade,
ma ainda e sobretudo porque, encarregado cosao era o instituido
de os cosserror para os troositlir,no eram possuidos os bens em
propriedade peré ão, e por falta de instituições que entào garantissem
os direitos prediaes contra os encargos da propriedade contra-
etava-se na persuasdo de ter o possuidor a propriedade perfeita, e
ficava muitas vezes arruinado o credor para recolherem os herdeiros
fideicsoaissurios grandes fortuuas.
Realmente, se em presença da boa philosophia e do principio ju-
ridico <onors omnnia osoito é já difilcil reconhecur ao proprietario
o direito de dispflr dos bens numa só geraçào paia depois da morte,
impossivel é descobrir razões politicas e economicas que o aucto-
rizem a marecar o destino dos bens eia gerações snecessivas.
A tal exeesso, porém, tinha chegado na antiga jurisprudencia
a faculdade de substituir, que muitos testadores se arrogavam o
direito de por ama só disposição regular a ordem de diversas sucres-
sões graduaes.
Mas foi-se modificando esta jurisprudencia de accordo com os bons
principios e com o exemplo de substituição mencionado n'aquella
mesma Ordenaçào: «Seja meu herdeiro Paulo e por morte d'elle
passem os bens para Pedro., de modo que nos tempos proximos á
promulgação do codigo já só um grau de substitoição fideirommis-
saria se reconhecia, não se permittindo que os bens depois de passa-
rem por morte de Paulo para Pedro passassem ainda para outrem
pela mesma disposição testamentaria.
Pelo codigo, porém, não pide o testador transmittir suces-
sivamente a duas pessoas o dominio de todos ou de parte dos seus
bens.
A instituição de Paulo exclue qualquer determinação sobre os bens
a favor de outra vida. Com a designação da primuira pessoa expira
completamente o direito do proprietario a dispôr, o que significa
que o codigo acabou com os fideicousnissos.
Tambem por direito moderno, como já era por direito antigo, não
pôde assignar-se ao encargo de transmittir os bens hereditarios nas
substituiçies fideicommissarias outro praso ou periodo que nao seja
o tempo da morte do fiduciario.
Commetter ao herdeiro o encargo de conservar a herança durante
um praso mais ou menos longo, mas sem a obrigação de a transmit-
tir por morte, seria udo, unia substituição fideicommissaria, e sim
uma instituição condicional sem valor, porque o artigo 1747.' declara
não escripta a designação do tepo em que deva começar ou cessas
o effeito da instituição de herdeiro.
Não podem as substituiçLes fideicommissarias abranger nunca as
legitimas, porque as legitisnas são verdadeiras dividas que o sactor
da herança tem de pagar e não pôde onerar.
r
ARTIGO 1867.- 393

Art. 1867.0 São proibidas para o futuro as substituições


fideicomuaissarias, excepto:
1.1 Sendo feitas por pae ou mãe nos bens disponiveis,
em proúeito dos netos, nascidos ou por nascer;
5.0 Sendo feitas em favor los descendentes, em primeiro

grau, de irlos do testador.

Pme excepção ainda permittiu o codigo as substitnições fideicom-


missarias, e as reversòes das doçôes a favor de terceiro artigo
1473.,, nos graus em que eram permittidas cosno regra pelo direito
anterior, mas só em proveito dos netos nascidos ou por nascer e
dos filhos de irmãos, excepçtes dirtadas no intuito de habilitar o
avô e o tio a conciliar os deveres de gratidão com os taços do san-
gue contemplando estranho sem pôr os bens fóra da familia.
Prohibeo-se assim em regra as substituiçces fideicommissarias e
as reversóes a favor de terceiro, que podem representar a satisfação
da vaidade do testador ou do doador que deseja transmittir sem
divisào a sua fortuna durante mais de unia geração, e permitte se
limitada a nm grau, para satisfazer a um sentimento muito louvavel
de familia, a sobstituição ou reversão dos bens em favor dos netos
ou dos sobrinhos depois de desfructados por utra pessoa a quem o
doador ou o testador quiz tambem manifestar as sunas affeições.
As substituições que aioerecem ao tio e ao avô o meio de favo-
recer os sobrinhos e os netos sem prejoizo do seu affecto para com
terceiro nada téem de odioso nem de inconveniente.
Não é indispensavel instituir em primeiro grau filho on irmão para
determinar o fideicommisso a favor de neto on de sobrinho, pois que
a mente do legislador foi, no propriamente acautelar a posteridade
contra a dissipação do pae, e sim beneficiar essa posteridade ainda
quando o testador ou o doador quizesse excluir do usufructo seus
filhos ou irmãos.
Porém, o fideicommisso que é valido â favor dos netos e dos sobri-
nhos já o nào é a favor do irmão ou do filho do testador, apesar
de collocados em mais alto grau na escala das presumidas affeiçôes,
porque as excepções á regra geral não podem ser ampliadas além dos
termos reconhecidos na lei.
Não aproveita tambem a substituição fideicommissaria aos filhos
do sobrinho já morto, nem mesmo aos filhos do neto apesar de gosa-
rem uns e otros do direito de representação, porque a substituição
é restrieta aos nomeados, e porque só na suceessão legitima ha logar
ao direito de representação artigo 1980.°
Podem tambem os irmãos, ou irmôs (palavra empregada no pro-
jecto primitivo e com razão eliminada por inutil pela commissào
revisora) estabelecer a clausula de reversão nas doaçies e a elau-
sula de fideirommisso nas instituiçbes em favor dos descendentes
por nascer em primeiro gra dos irmãos como os paes a favor dos
netos, apesar de não empregar em o n.i 2.- o artigo 1867.° a res-
peito dos sobrinhos as palavras - noéscidos a por nascer- - que aliás
emprega em o n.° l. a respeito dos netos.
Não pôde interpretar-se esta diversidade de redaceo pelas fontes
do artigo, porque nio se encontra nas fontes do codigo a disposi-
çfo do tn 2. que foi introduzida por iniciativa do aurtor do projecto
e sempre conservada pela commissào revisora sem jámais se lhe
harmonisar a redacçào com a do n.° 1

SI
0.'
Z^:
394 ARTIGO 1867.°

Porém, desde que o artigo 1777. permitte a disposição a favor de


naseituros descendentes em primeiro groo de certas e determinadas
pessoas vivas ao tempo da morte do testador posto que o futuro her-
deiro ou legatario venha à luz fora do praso dos trezentos dias, é
evidente que o tio, no seu direito de constituir fideicommisso a favor
dos sobrinhos, pôde instituir os por nascer como os nascidos.
Póde ser pois a disposição fideicommissaria, como a reversão, a fa-
vor de neto oi de sobrinho determinado ou a favor dos netos ou dos
sobrinhos que o testador ou o doador já tiver ou venha a ter, com
ou sem preferencia em razào do sexo ou edade, conforme a affeição
do testador ou do doador abranger uns ou outros.
Não pensaria de certo o legislador em obrigar o benfeitor, para
contemplar os que lhe mereciam afdYiçào e benevolencia, a contem-
plar outros que lhe merecessem odio e malquerença, ou a deixar de
beneficiar uns por não querer beneficiar os outros.
Muitos podem ser os substitutos e suitos os substituidos. Mas só
vale sim grau de fideicommisso, isto é, só a umoa geração póde ser
commettido o encargo de rserrare de trnsmitír por morte nos
restrietos casos em que o fid,-icommisso é permittido artigo 1867?
Contra semelhantes altraçes na instituição fideicommissaria re-
clamou logo o dr. Joaquim José Paes da Silva por se restringir
assim de mais a liberdade de testar, e porque o fideicommisso an-
tigo conciliava a liberdade de testar com a nào demasiada amor-
tisação da substituição só n'um grau.
A estas consideraçócs respondia peremptoriamente o sr. Seabra:
<Pelo contrario não nos parece neum justa, nem conveniente, simi-
lhante instituiçào (o fideicommisso fora dos casos exceptuados no
artigo 2003. do projecto (artigo 187. do codigo) Não ha convenie-
cia na instituiçào nem em relação aos beneficiados nem em relação
á sociedade: não em relação aos beneficiados, porque o fiduciario
que não é mais do que uma usufructu rio não póde recolher os pro-
veitos que resultariam da permanecia da propriedade, nem obter
credito algum sobre bens que de um dia para outro podem desappa-
reer do seu patricionio; no em relação as tidAecommissario, porque
virá a receber assirs una propriedade deteiorada pela ambição ou
negligencia do fideicoosíissario; não em relaçao à sociedade, porque
sempre é prejudicada pelo drsaproveil amento da propriedade, ou di-
minuição do seu producto, pela perda dos direitos durante a amorti-
sação, e, finalmente, pela intinidade de questres e demandas, que
estas desmembraçs do dominioiecessariasente produzes ;e acres-
centava <que seria gravissiso erro economico favorecer a amortisa-
ção da propriedade siimobiliaria por meio das substituiçbcs, quando
ella estava já tão amortisada pela instituiçào vincular que talvez
se conservasse ainda por longo tempo-
O ultimo argumento do sr. Seabra, que por signal era o mais fraco,
a breve trecho deixava deter valor, porqne felizmente pouco tempo
depois acabava a amortisaçào vincular por efeito das disposiç0es
das leis de 30 de julho de 1860 e de 19 de maio de 1863.
A reversão contractual ou testamentaria, por não terem tido ou
por deixarem de ter a applicaçào marcada pelo doador ou pelo tes-
tador os bens doados ou deixados as corporaçéer religiosas, ainda
garantida na lei da desamortisaçlo de 4 de abril de 1861, não é
substituição ou reversão suos tersos aqui consignados, e sim cone-
quencia de haver caducado a doação, por se ter verificado a con-
dição resolutiva que é permittida nas doaçéís artigo 672., 680.0 e
683., como nos testamentos artigos 1743.° e 1744

Â
1

ARTIGO 1838. 395

Art. 4868.° 0 fideicommissario adquire direito ã sueces-


são, desde o momento da morte do testador, ainda que não
sobreviva ao fiduciario. Este direito passa aos seus herdeiros.
(Vid. artigo 1873.0)
O artigo, aliás dispensavel em vista do artigo 1873.' que não
admitte questão sobre o spes debioa ire nos fideicoommissos, foi
introduzido sob proposta do sr. Seabra para satisfazer as instan-
cias do dr. Joaquim José Paes da Silva que queria cortada a questão
tão debatida em direito velho se morrendo o fideicommissario antes
do fiduciario passavam aos herdeiros d'aquelle ou se radicavam
n'este os bens tideicommettidos, e lis manifestava logo a opinião
de deverem passar aos lierdeiros do fideicommissario porque susten-
tava o principio de que o fideicommissario adquiria direito ao fidei-
commisso logo á morte do testador independentemente da morte do
fiduciario ou gravado.
Esfeotivamente no fôro antigo varias vezes se decidiu pela trans-
missão do fideicommisso aos herdeiros do fideicommissario fallecido
antes do fiduciario, conforme a opiniào do dr. Paes, com o funda-
mento de ser o tiducicrio simples sufructario, e de ser entre nós
inadmissivel a doutrina dos romanos que reconhecia a transmissão
do spes debilom ire nos contractos e não nas disposições de ultima
vontade; e já no regisoen do direito novo se interpretou o direito
velho pelas disposições lo codigo civil t
Porém na legislação anterior, apesar da analogia apparente, era
profunda e cabal a differoença juridica entre o fiduciario e o usu-
fructoario.
No usufructo passava ao mesmo tempo à morte do testador o di-
reito de usufruir ao sufructuario e o direito de propriedade ao
proprietario, e no fideicommisso passava inteiro «propriedade e usu-
frcto-» ao tiduciario com a clansula resoluvel de se transmittir ao
fideicommissario se este liho sobrevivesse.
A deixa do usufructo a nm e da propriedade a outro represen-
tava só uma institaiçào simultnea e não suecessiva, quando no
fideicomoisso havia doas iustitoições successivas e não simul-
taneas.
A jurisprodencia que nada transmittia aos herdeiros do fideicom-
missario fallecido antes do fiduciario apoiava-se na legislação ro-
mana, e designadamente na lei 11 ý 6. Dig. de legatis 3., fra
reconhecida pelo Supremo Tribunal de Justiça tanto na vigenia
do velho direito, accordãos de 8 de junho de 1846 e de 19 de no-
vembro de 1852, como modernamente', e tinha por si o parecer da
Associação dos Advogados de Lisboa

r Aceordão da Relação de Lisboa de 6 de novembro de 1897, Ga-


zela da Relação de Lisboa, 11.^ ano, n. 35, pag. 273.
2 Aecordãos, do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de março de
1890, de 5 de maio de 1393 e de 7 de junho de 1895, e da Relação de
Lisboa de 8 de fevereiro de 1899, Direito, 29. asno, n. 21, pag.
323, e Gazela da RelaRo de Lisboa, 71. anno, n.o 4, pag. 26, t.o ano,
n. 28, pag. 221, e 12.' ano, o.' 68, pag. 543.
396 ARTIGO 1868.

O fiduciario, longe de ser mero usufructuario, adquiria a proprie-


dade, com quanto resoluvel e dependente de sobrevivencia ao
fideicommissario, e o fideicommissario antes da morte do fiduciario
não tinha senào direito eventual, ou uma esperança a que os romanos
chamavam spes debitum ire que se desvanecia fallecendo elle antes
do fiduciario.
Por direito velho que era o direito romano, visto ser omisso sobre
o caso o direito portuguez, caducava o fideicommisso fallecendo o
fideicommissario antes do fiduciario por ser incerto o dia da morte
do fiduciario e ter uas disposições de ultima vontade o caracter de
condição a incerteza do dia-dies incertas conditionem in testamento
facit - - dizia a lei romana.
Eram condicionaes os direitos do fideicommissario por dependerem
da morte do fiduciario; porque a incerteza do dia da morte impor-
tava condição que não deixava transmittir direitos em quanto ella
se não verificasse.
No que todos estavam de acordo era em não admittir a reversão,
aos herdeiros do testador ou do doador, dos bens deixados ou doados
com clausulas fideicommissarias, sustentando uns que deviam ir para
os herdeiros do substituto se este fallecesse antes do instituido, e
opinando outros porque se radicava na pessoa do instituido ou do
donatario e passava aos seus herdeiros não sobrevivendo o substi-
tuto ao substituido, assim como estavam de aceordo em que a sub-
stituição ou reversão contra direito era havida por edo escripta e em
nada affectava a instituição ou a doação.
O codigo, reconhecendo positivamente ao fiduciario apenas a qua-
lidade de usofrurtuario, resolveu as duvidas que havia na vigencia
da lei velha sobre a natureza e extensão dos seus direitos.
Hoje é inteiramente indifferente a sobrevivencia ou não sobrevi-
vencia do fideicommissario ao fiduciario, visto passar logo ti morte
do testador a propriedade ao fideicommissario e o usufructo ao fidu-
ciario.
Não permitte o direito hodierno como permittia o direito antigo
transmittir os bens em duas vidas. Mas permitte transmitil-os a diffe-
rentes pessoas, que não representem mais que uma vida.
Porém, desde que se nega ao fiduciario a propriedade, mesmo re-
striceta e resoluvet sobre os bens fideicommettidos, e o fideicommisso
ainda nos casos do artigo 1867.0 representa apenas a deixa do uso-
froeto a um e da propriedade a outro, as substitoições fideicommis-
saras na nossa legislação civil não tiem razão de ser, ou antes
desappareceram de todo, porque fica logo o fiduciario reduzido a mero
usufructúario e o fideicommissario com a propriedade perfeita
O que o artigo 18G7 ° n. t- e 22 permitte como excepçao aos paes
e aos tios em favor dos netos e dos sobrinhos é, salva a differença
de palavras, o que o artigo 18702 permitte too regra geral a todos
e em favor de todos, porque as substitniçes fideicommissarias reco-
nhecidas em os nY 1.- e 2.- do artigo 1867.°, desde que o fiduciario
é considerado mero ostfrrctuarioartigos 1868. e 187.2, não repre-
sentam senão a deixa do usufructo a tm e da propriedade a outro.
São duas redacções com o mesmo pensamento mas com effeitos
juridicos inteiramente diversos, iedo ficado a substituição fideicom-
missaria no codigo apenas como causa perenne de demandas por
via de um jogo de palavras.
Se o testador diz: «Deixo os meus bens em osefrcto a Pedro, e em
propriedadea Paulo , é valida a instituição, ainda que sejam estra-
nhos ambos os instituidos.
r r
ARTIGOS 1869.0 E 1870.- 397
1

Se, porém, o testador emprega estoutra linguagem, aliás equiva-


lente: «DeLeo a minha herança a Pedro para a cowsercar e por sua
morte a iraiooiiiir a Paulo», já é nulla a instituição de Paulo, se
elle não é neto o sobrinho direito do testador.
Fica assim completamsente desnaturada a instituição fideicommis-
saria e assente em bases repugnates aos principios juridicos, e
ainda mais restricta do que o usufructo porque só admitte uma sub-
stituiçào, quando no usufructo podem estabelecer-se dezenas e ceu-
tenas de substituiç1cs com tanto que todos os contemplados vivam
ao tempo da constituiçâo do usufructo.
Só teria razão de ser a substituição fideicommnissaria, se ao fidu-
ciario pertencesse a propriedade dos bens, embora restricta e de-
pendente de sobreviver ao fideicommissario como era por direito
antigo.
Pelo codigo, pois, só quando a clausula fideicommissaria se reputa
não escripta que a substituição fideicommissaria fica reduzida a
instituição sem substituição, e que não ha então verdadeiramente
fideicommisso, é que se radicam os bens no primeiro nomeado como
se fóra instituido sem restricçées nem condiçes, e que fica dono dos
bens o fiduciario.
Só no caso de millidade da substituiçào é que o instituido fica
com a propriedade e deixa de ser simples usufructuario, porque a
nullidade da substituiçào exclue a idéa de herdeiro fiduciario e de
herdeiro fideicomissario.

Art. 1869.0 A nulidade da substituição fideicommissaria


não itvolverá a nullidade da insiituição ou do legado: ape-
nas se haverá por não escripla a clausula fideicommis-
saria.
Não invalida a instituição a nullidade da substituição, como,
apesar do silencio do codigo, a nullidade da instituição não preju-
dica a substituição, porque nem o util se vicia pelo prejudicial, nem
a substituição é accessorio da instituição, como a instituição não
é accessorio da substituiçâo, pois que o fideicommisso como deixa
do usufructo a um e da propriedade a outro representa duas institui-
çoes distinetas e independentes uma da outra, e finalmente porque
a intenção de beneficiar os dois, fiduciario e fideicommissario, não
ficou menos patente para um pelo facto de se não aproveitar do
beneficio o outro.
Assim os bens deixados em primeira mão ao conjuge adultero,
que é exeluido pelos preceitos dos artigos 1771.9 e 1978.", passam
logo ao substituto como se fora o primeiro iustituido.

ArI. 1870.° Não se reputará fideicommisso a disposição,


pela qual algum teslador deixe o usufructo de certa cousa
a uma pessoa, e a propriedade a outra, com tanto que o
usufructíario ou o proprielario não seja encarregado de
traísuíiííir a outrem, por sua morte, o dicio usufructo ou
a dieta propriedade.
(Vid. artigos 2199.° e 2250.°)
398 ARTIGO 1870.-

Nio se contentou o codigo com definir e synthetisar no artigo


1866.° os requisitos que caracterisam a instituição fideicommis-
saria.
Para não escaparem á prohibição algumas substituiçies, que são
havidas por fideicommissarias, e que não estão claramente compre-
hendidas na disposição geral, consignou o codigo nos artigos 1870.-
a 1872.° preceitos que são verdadeiro additamento ou esclarecimento
ao mesmo artigo 1866.
Para tornar mais unia vez saliente que a caracteristica essencial
da disposição fideicosnmmissaria é a obrigação de conserrar e trans-
mittir por morte declara no preseute artigo que a deixa do usufructo
a um e da propriedade a outro não importa fideicommisso, uma vez
que nem o usufructuario nem o proprietario seja encarregado de
tran-oidtir a outrem por sua morte.
Reveste, porém, logo o caracter de fideicoemisso tanto a deixa do
usufructo como a deixa da propriedade desde que ao instituido se
imponha a obrigação de transmittir por morte.
Na deixa do usufructo a um e da propriedade a outro não la
fideicmnmisso porque la duas deixas simultaneas, usa do usufructo
e outra da propriedade, e não substituição porque o instituido na
propriedade não é substituto do instituido no usufructo posto que a
ultima deixa não surta effeitos directos sem acabar a primeira.
São feitas na mesma data e na mesma data produzem os seus
effeitos ambas as doações.
Mas são duas transmisses differentes, dois factos juridicos intei-
ramente distinctos.
O usufructo qualquer que seja o numero de pessoas beneficiadas
aproveita a todas passando de umas para outras se ao tempo da con-
stituiçio do usufructo forem todas vivas, artigos 1776', 1777.,
2199^ e 2250.°
As proprias leis fiseaes reconhecem o usafructo em favor de mais
de uma pessoa suecessivamente, mandando pagar a contribuição
de registo tontas vezes quantas forem as pessoas beneficiadas com
o usufructo logo que este se verifique, regulamento da contribuição
de registo de 23 de dezembro de 189 artigo 13
Tambem o fiduciario desde que é equiparado ao usufructuario
ulo póde deixar de estar sujeito a caução para os effeitos civis e a
contriboiçio de registo para os effeitos fazeudarios.
Salva a declaração de seguir de umas para as outras acaba o usu-
fructo deixado a varias pessoas é proporção que cada usa fallece,
seguindo logo o respectivo quinhão ao herdeiro por não haver direito
de acerescer entre usufructuarios visto ser legado e não herança o
usufructo.
Nem o artigo 1870.' que reputa fideicommios, a deixa do usufructo
para ser tranísíittido a outrem s morte do usufructuario, nem o
artigo 1871.^ que ha por fideicomnisaria a disposição que impozer
o encargo de prestar a mais de unia pessoa successivamente certa
renda ou pensâo, collide com o disposto nos artigos 2199.' e 2250.'
que permittent o usufructo successiramente a favor de mais de unta
pessoa, visto ser condição do usufructo succesgivo existirem todos os
usufructuarios ao tempo em que se torna effectivo o direito do pri-
meiro usufructuario, isto é, ao tempo da constituição do usufructo.
Permittir o goso successivo do usufructo só a favor de pessoas
que existam ao tempo da abertura do direito do primeiro usufructua-
rio não é permittir a transmissão dos direitos por mais de uma vida,
e só ficam prohibidas as substituiçdes constituidas por muitas gera-
rp ARTIGO 1871.0 399
1W

ções, porque são contra a natureza do dominio e em prejuizo da bem


entendida economia que não consente longa separoçio entre o usu-
fructo e a propriedade.
Desde que s morte do testador existam todas as pessoas contem-
piadas verifica-se desde logo a transmisso collectira sem depen-
dencia de s]sttit/içdo, porque se t rnsmittem logo a morte do tes-
tador todos os direitos ainda lue desde logo se não tornem todos
effeetivos.
O proprietario que dispoz da sua quinta de Sete Ais em proprie-
dade para Mevio, e ei usufructo para Pedro, Paulo e Martinho
ou ao mesmo tempo ou pra começar a íyelectiidade n'um e conti-
uar suceessivamente nos sobrevivos e só á morte do ultimo passar
ao proprietario, constitmu una Pens ão ou usufructo vitalcio que
abrange mais de uma pessoa, mas que no abrange mais de una
vida.
A deixa do asufructo com reversão para os filhos do usufructua-
rio, e na falta d'elles para o filhos de outra pessoa, é tambesi usu-
fructo e não fideicommisso. a
As palavras- -usuorsto de certa cousa a uma pessoa-, não ei-
cluem nem a deixa de uiva universalidade de cousas indetersinadas,
como de uma herança oi de ussa quota parte d'ella, nem a deixa a
mais que a uma pessoa conjurtaseute, e antes comprehendem to-
das estas fórmas de dispôr.

Art. 1871.° Serão havidas por fideiconsmmissarias e, como


taes, defesas:
10 As disposições com prohibicão de alienar;
2.1 As disposições, que chamarem um teieiro ao que
restar da herança ou do legado, por morte do herdeiro ou
do legatario;
3.o As disposições, que impozerem ao berdeiro ou ao
legatario o encargo de preslar a mais de uía pessoa, sue-
cessivamente, ceria relida ou peíslo.
São casos especiaes em que a instituiçlo, apesar de não ser rigo-
roso fideicommisso por não vir acompaui/soda do encargo de conserar
e trismi/irpor aorte, é todavia havida por fideiconuissaria para
o effaito de ser defesa pirqie ~i qualquer dessas fôrmas de dis-
pôr ha instituição em duas vidas.
A prohibição de alienar equivale á imposição do encargo de con-
servar e trasmittir por morte, salvo tendo a lausula simplesmente
a natureza explicativo, isto é, servindo spenas para declarar que
o instituido fica só com o usufructo e não com a propriedade.
Na primeira disposição comprehende-se a probibição de obrigar
a dividas visto não fazer a lei distincçno alguma, e importar a pro-
hibiçìo de alienar a prolsibição d obrigar a di tidas

P
o Aceordão da Relaç3o do orto de 23 de jusho 0
de 1873, Revista
de Legislaçiio e de Jurisprudenia,de Coimbra, - 333, pag. 332.
400 ARTIGO 1871.

A segunda das disposições especificadas no artigo, que representa


o antigo legado ide eo quoed s'pererit, parece á primeira vista não
reunir todos os caracteres de verdadeiro fideicommisso, visto que
a pessoa instituida, longe de ser encarregada de conservar os bens
para os transmittir por morte, fica com a concessão expressa de os
alienar.
Auctorisar, porém, o primeiro instituido a dispôr do que bem lhe
parecer ficando para o outro só o resto é commetter a herança uào
á fé e sim ao arbitrio do primeiramente contemplado.
Em direito romano, como na Ordenaçdo do Reino, udo se consi-
derava fideicommisso o legado de residuo ou de eo quod supererit
por lhe faltar o caracterismo especial de conservar e transmittir.
Mas, com quanto não podesse reputar-se comprehendida na Ord.
liv. 4.° tit. 87 § L." semelhante féraa de dispôr, já no fôro antigo
era considerada fideicommiss ria por involver a instituiçào de duas
gerações.
Por isso se sdo é fideicommisso por lhe faltar o encargo de con-
serrar e trasm.sitir por morte, é havida como fideicommisso a dispo-
sição, porque a faculdade de alienar ainda só para o caso de neces-
sidade importa instituição ua propriedade, e não simplesmente no
usufructo t, e porque no chamamento ao resto da herança ha a insti-
tuição de duas vidas.
Tambem o codigo não reconhece os caracteres de fideicommisso
A fórma de dispôr no n. 3. Mas equipara-a ao fideicomisso para
todos os effeitos juridicos.
Por julgarmos iuapplicavel á pensão ou renda o que o artigo 2199.
dispõe para o usufructo só consideramos probibida a transmissão
suecessiva de pensão ou renda a favor de mais de ama pessoa quando
essa pessoa não estiver viva ao tempo da abertura da herança, pois
n'esta materia mandam as regras da analogia applicar á pensão ou
renda tudo o que as leis determinam para o usufructo.
Fideicommissaria é, e portanto prohibida, a instituiçdo com a clau-
sula de reversão dos bens para os filhos do testador fallecendo o
instituido sem descendentes, como são é permittida nas doaçtes entre
vivos a clausula da reversão senão em favor do proprio donatario,
artigo 1472.
Valida seria, porém, a reversão e favor dos netos, como em
favor dos netos é permittida a substituição fideicommissaria, artigo
1473.
Não se confunde com a instituição condicional nem a instituição
fideicoemmissaria nem a instituição havida por fideicommissaria, por-
que a instituição condicional, longe de se reputar não escripta, fica
dependente da verificação da coudiçào.
Deve finalmente reputar-se subordinada ao preceituado no ar-
tigo 1867. a disposição do artigo 1871" para o effeito de serem
tambem permittidas as disposições havidas por fideicommissarias
quando feitas em favor de alguma das pessoas mencionadas no ar-
tigo 1867.

1 Accordãos do Supremo Tribunal de Justira de 28 de maio de


1889, de 7 de março de 1890 e de 12 de julho de 1898, Gaera da
Relação de Lisboa, 4." anno, n. 13, pag. 101 e 12.- ano, r.
pag. 228 e Boletim rios Tribunaes, á" anuo, n.- 197, pag. 356.
29, ,
ARTIGOS 1872.- n 1873." 401

Art. 1872.° A prohibição io artigo precedente não abrange


as prestações de qualquer intia, impostas aos herdeiros
ou aos legatarios a favor dos indigentes, para dote de ra-
parigas pobres, ou a faor de quailuer estabelecimento ou
fundação de mera utilidade publica.
§ 1.° Neste caso, porém, o encargo deverá ser consi-
gnado em certos e determinados predios, e será sempre
licito ao herdeiro, oao legatario onerado, converter a
prestação no pagamento do capital correspondente em di-
nheiro.
S2.° Os herdeiros ou os legatarios obrigados a taes
encargos não ficarão, todavia, sujeitos a nenhuma ordem
especial de successão, que não seja a ordenada na lei
geral.

Não repugna a direito o legado com caracter de perpetuidade


quando é para fundação de mera utilidade publica, ou a favor dos
indigentes ou para dote de raparigas pobres.
Os indigentes e as raparigas pobres, se bem que pessoas incertas,
podem todavia tornar-se certas nos termos dos artigos Wi9.- a 674.«
do codigo de processo civil, que são applicavcis 4 individuaçào dos
beneficiados senão na sua letra, ao menos por analogia, mesmo
quando o testador na instituição de certa generalidade de pessoas
não commette a terceiro a repartiçio da herança.
Ou seja em beneficio dos indigentes. ou para dote de raparigas
pobres, ou em favor de estabelecimento publico, ha de ser consignado
o encargo em certos e determinados predios, em todos os tres casos
do artigo, ou estão todos comprehondidos lsas palavras do §3. -
neste caso -, que, salva declaração expressa do legislador, técm tanto
cabimento nas prestações a favor dos indigentes e para dote de ra-
parigas pobres como nas prestações em tavor de estabelecimento
publico ou fundação de mera utilidade publica.
Ao onerado é sempre licito pagar o capital em dinheiro, expur-
gando o predio nos termos do artigo 910.° do presente codigo e do
artigo 512." do codigo de processo civil, como remir pela entrega
do valor correspondente a prestação em fructos deixada para qual-
quer dos fins do artigo.
A conversão e remissão é requerida Is justiças ordinarias, e não
ao governador civil do respectivo distrieto, como dispunha o pro-
jecto primitivo no artigo 2007.' correspondente ao artigo 1872." do
codigo.
Em todo o caso, quer em nome do artigo 35." quer em nome do
artigo 1902.", deve ser desamortisado ou por qualquer outra fórma
alienado o predio ou qualquer direito imuobiliario cm que esteja
consignado o encargo.
Para evitar a coisnituição de fideicomissos porpetss a pretexto
de prestações perpetuas ordenou terminantemente o codigo que os
predios onerados nuo ficarso sujeitos a nenhuma ordem especial de
successão.

Art. 1873.° Os herdeiros ou os legatarios, cujas heranças


Toso III 26
402 ARTIGO 1874.-

ou cujos legados estiverem sujeitos a substituições fideicom-


missarias, serão havidos por meros usufructuarios.
(Vid. nota ao artigo 1868.1)

Art. 1874.0 Os fideicommissos temporarios de preterito


só produzirão o seu el&rito no primeiro grúu de substitui-
ção, achando-se abertos por morte do testador, ao tempo
da promulgação do preseute codigo.
O artigo, não admittindít mais de um gru nos fideicommissos de
preterito, abertos ao tempo da sua promulgoção, adoptou ajurispru-
dencia seguida na practica do fôro e as opiniões dos jurisconsultos
mais acreditados.
Assim as substituições com mais de uni gráu já abertas ao tempo
da promulgação do codigo, só produzem effeitos no primeiro grão
reputando-se não mencionados todos os outros, como succede nas
doaçes com a reversão a favor de terceiros, sem que a nullidade da
substituição ou da reversão prejudique a validade da instituição ou
da doação artigos 1473.0 e 1869.°
Muitos opinam que os fideicommissos abertos ao tempo da pro-
mulgação do codigo, attenta a generalidade dos artigos 1868.' e
1873.°, são em tudo regidos pelo direito novo salva a substituição
n'um gráu que ficou de pé adquirindo logo o fideicommissario o res-
pectivo direito que transmitte aos seus herdeiros, sobreviva ou não
ao fiuciario.
Limitou-se o artigo a garantir o primeiro grãu de substituição
nos testamentos abertos autes da promulgação do codigo, sem lhes
alterar a natureza e as condições que tinham por direito velho, e
respeitando-as pelo contrario em tudo o que não representasse mais
de uma substituição, pois que sem vir expressamente com a retro-
acção, não podia offender direitos adquiridos.
Inteiramente sujeitas a lei nova só ficaram as substituiçes fidei-
commissarias em testamentos ainda não abertos ao tempo da pro-
mulgação do codigo, nos (toes o codigo só respeita as fórmdas
ou soleonidades externas da lei anterior; e os grátis de substituição
pertencem 5 materia ou fórma interna do testamento que cai sob a
acção da lei nova.
Estão no artigo 1874.0 comprehesdidos todos os fideicommissos
temporarios, tanto os especificados no artigo 1867.0, como os defi-
nidos no artigo 1871 ^, e tambem as doações por força do disposto
no artigo 1473.0
Refere-se o artigo só a fideicommissos tempororios por não serem
usadas mesmo em direito velho senão em grãus limitados as substi-
tuições.
Mas seria egualmente applicavel a qualquer disposição com
numero illimitado de substituições.

-1
pra:

ARTIGOS 1875.°, 1876.^ E 1877., 408

SECÇAO VI

Da desherdação

Art. 1875. Os herdeiros legilinarios podem ser privados


pelo testador da sua legilima, ou desberdados nos casos
em que a lei expressamente o permitte.

(Vid. nota ao artigo 1488.)


Sé podem ser desherdados os herdeiros necessarios, isto é, os
parentes na linha recta, tanto descendente, como ascendente, por-
que só descendentes e asceodentes tecos direito a legitima.
A legislação anterior, resentindo-se ainda da velha instituição
do pater-familias dos romanos, mareava como causa de desherdação
tambem o casamento do filho sem consentimento do pae.
O codigo, porém, acabou com esse preceito por ser contrario á li-
berdade de casar.
Pelo codigo civil hIspanhol a reconciliação posterior priva o offen-
dido do direito de desherdar o offensor e faz caducar a desherdação
já declarada.
Mas pela nossa lei subsiste a desberdação em quanto não é revo-
gada pelo testador.
No codigo portugaez no se encontra disposição com a sombra
sequer do preceito do codigo hospahol.
Antes o caso especial de reconciliaçào dos paes prevista no artigo
1878. que impede a desherdaçào firma a regra geral em contrario.

Art. 1876.° Pôde ser desherdado por seus paes:


1.° 0 filho, que contra a pessoa d'elles commetter delicto
a que caiba pena superior á de seis mees de prisão;
2.° 0 filho, que juaicialmente accusar ou denunciar seus
paes por delicto que não seja contra a pessoa d'elle, ou
contra as de seus conjuges, ascendentes, descendentes ou
irmãos:
3.1 0 filho, que, sem justa cansa, recusar a seus paes os
devidos alimentos.

(Vid. nota ao artigo 1488.°)

Art. 1877.0 Os descendentes dos desherdados, que so-


breviverem ao testador, haverão a legitima, de que os seus

1.
404 ARTIGOS 1878.-, 1879.-, 1880. E 1881.-

ascendentes forem privados; mas não poderão estes gosar


do usufructo d'ella.
(Vid. nota ao artigo 143.°)

Art. 1878.0 Os paes podem ser desherdados pelo filho,


quando contra este practicarem algum dos factos mencio-
nados no artigo t876.°, aplplicando aos paes o que alli se
diz ácerca dos filhos: e bem assim o pae, se attentar con-
tra a vida da mãe, ou esta, se atientar contra a vida do
pae, e não se houverem reconciliado.
Art. 1879.0 As disposições dos artigos 1876.0 e 1878.°
são applicaveis tanto aos paes como aos outros ascendentes,
o tanto aos filhos como aos seus descendentes.
(Vid. nota ao artigo 1488.°)

Art. 1880.0 A desherdação só pôde ordenar-se em tes-


tamento, e com expressa declaração da causa.
Art. 1881.0 Sendo contestada a exactidão da causa da
desherdação, incumbe a prova della aos interessados em
que essa desherdação se verifique.
(Vid. artigo 1884.0)

Pela jurisprudencia de todos os secolos e de todos os povos sóem


testamento pôde ser ordenada a desherdação, e só por sentença
pôde ser julgada, porque os herdeiros legitimarios não hão de ser
privados do direito á legitima pela simples vontade do testador
Para conciliar a disposição do presente artigo, que impõe aos iate-
ressados na desherdação a proro da causa, com o artigo 1884.° que
11-
dó ao desherdado a acção de impugnação quando é ao auctor que
incumbe a prova e ao réo que compete a inpognaço, inventou a
lei de processo civil uma fórmola em que a acção do desherdado é
no fundo uma intimação judicial para o. interessado na desherdação
de4juzir a competente acçào a fi de poder ser impugnada.
E o que em direito velho se chamava um comminatorio, que pre-
screve dentro de dois annos contados desde a abertoro do testamento
porque dentro de dois ainos da abertura do testamento prescreve
a acçdo do desherdido para impugnar a desherdaçdo, artigo 1884.
Começa pelo requerimento do herdeiro legitimario desherdado,
instruido com certidão do testamento, a pedir a citação das pessoas
a quem aproveita a desherdação para provarem a causa, citação
que não admitte opposiçào de ,specie alguma porque todas as ques-
ties hão de ser discutidas e julgadas na acção pais prova da casa;
Ws e basta para se julgar sem effeito a desherdaçào não se apresentar
dentro de trinta dias a contar da audiencia da aceusação da citação
documento de estar distribuida a acção, artigo 64. do codigo de
processo civil.

Wl
ARTIGOS 1882.-, 1883.0 E 1884.- 405
Todavia nem o presente artigo nem o artigo 640." do codigo de
processo civil obriga o instituido a esperar pelo comminatorio do
desberdado para provar a causa da deslerdação e fazer valer o seu
direito e o seu interesse.
Ao contrario do que preceituava o direito velho, segundo se infere
da Ord, liv. 4." tit. 82." 2.§, é ao instituido que pertence a posse
da herança até á decisão do pleito, porque o testamento subsiste
até sentença final visto precisar o desherdado de contestar a exacti-
dão da causa da desherdaçuio.

Art. 1882.1 A desherdaç.ão feita sem causa expressa, ou


que se nãfo prove, o por causa illegitina, fará caducar só
as disposições do testador, que prejudicarem a legitima do
desherdado.
Ainda que não seja julgada procedente e provada a desherdução,
subsiste o testamento quanto á terça, como era tambem pela Ord.
liv. 4." tit. 82.°, pois que da quota disponivel dispôe o testotor a
arbitrio com prejuizo dos herdeiros legitimarios sem necessidade
de dar motivos, e o facto da desherdação prova que, se o testador
lhes não queria deixar nem o que lhes pertencia em nome da lei,
menos quereria que eltes gosassem o que sem a sua vontade expressa
ou tacita não poderiam haver.

Art. 1883.° 0 que se aproveita dos bens, de que foi ex-


cluido o desherdado, é obrigado a prestar alimentos a este,
se elle não tiver outros meios de subsistencia, mas não além
dos rendimentos dos dictos bens, salvo se por outra cansa
dever os dictos alimentos.
(Vid. nota ao artigo 179.")

Art. 1884.° A acção do desherdado para impugnar a


desberdação prescreve dentro de dois aunos, contados desde
a abertura do testamento.

(Vid. notas aos artigos 547." e 180.")


406 ARTIGO 1885.

SECÇAO Vi1

Dos testamenteiros

Art. 1883.° 0 testador pódo nomear uma ou mais pes-


soas que liiem encarregadas de fazer cumprir o seu tes-
tamento no todo ou em parte: estas pessoas são denomi-
nadas testamenteiros.

Até á eporha do Imperio não foi conhecida em Roma a instituição


do testamenteiro.
Até então eram os herdeiros os unicos repreoentantes da persona-
lidade do testador. Era mesmo incompativel a testamentaria com o
systemajuridico que só ao herdeiro dava a execução da vontade do
testador.
A instituição da testamentaria nasceu de certo da pouca confiança
que ao testador merecia o zelo dos herdeiros pelo cumprimento do
testamento, especialmente com relação ao funeral e ao bem d'alma
e á distribuição de esmolas, pois que nos :utigos testamentos figu-
rava sempre por muito o bem d'alma, retul:ado da fé nos primeiros
seculos do Christionismo.
Desde logo se confiou ao testamenteiro mais o serviço espiritual
do que o serviço temporal, já por ser o serviço espiritual o que
menos importaria em regra aos herdeiros, já por ser nas disposições
espirituaes que o testador havia de ter mais empenho.
Não póde haver testamenteiro sem testamento, porque o testa-
menteiro é nomeado precisa e unicamente para lazer cumprir o tes-
tamento.
Com quanto, porém, não haja exemplo de testamenteiro nomeado
fóra de testamento, nem o codigo falte de testamenteiros senão no
capitulo dos testamentos, pôde o testador nomear o testamenteiro
em qualquer titulo authentico posteriormente ao testamento, porque
a lei não diz da testamentaria, como diz da desherdação, que só
pôde ser ordenada em testamento.
A testamentaria apesar de revestida de condições especiaes e de
sujeita a regras muito particulares não deixa de ser mandato.
Mas mandato que não pôde ser delegado, o que todavia não exclue
a delegação de quaesquer serviços n'outra pessoa sob a responsa
bilidade do testamenteiro, e em que só depois da morte do testador
o testamenteiro pôde exercer as respectivas funeções, quando no
mandato em geral é precisamente com a vida do mandante que fin-
dam as funcções do mandatario.
Como mandato, que é, não pôde deferir-se a testamentaria a cor-
porações porque não são capazes de obrigar-se, e porque lh'o veda
wr.

ARTIGOS 1886:, 1887:, 1888. e 1889.- 407

o artigo 31. do presente codigo; salvo o caso de serem legatarias t


ou herdeiras, artigo 1893., porque n'estas circumstancias estão exer-
cendo direitos civis relativos ao se instituto.

Art. t886.° Só podem ser testamenteiros os que podem


contrahir obrigações.
(Vid. nota ao artigo 644:)
A incapacidade para receber a herança ou o legado no impede o
exercicio da testamentaria; porque no se estendem á testamentaria
as incapacidades para a testamentifacção passiva.
O medico, e o confessor que nao podem ser herdeiros, se assistiram
ao testador na ultima doença, podem todavia ser testamenteiros.

Art. 1887.° A mulher casada não pôde ser testameuteira


sem auctorisação de seu marido, salvo achando-se judicial-
mente separada de pessoa e bens. Essa auctorisação pôde
ser judicialmente snpprida, sekdo a mulher casada com se-
paração de bens.
Art. I888.1 Os menores não emancipados não podem ser
testamenteiros, ainda que sejam para isso auctorisados por
seus paes ou por seus tutores.
(Vid. nota ao artigo 1334.°)

Art. 1889.0 Os testamenteiros nomeados podem recusar


o encargo; mas, se, por causa da testamentaria, lhes for
deixado algum legado, não o poderão exigir.

(Vid. nota ao artigo 232.:)


Perde o testamenteiro o legado deixado por causa da testamenta-
ria quando recosar o csargo, como perde a retribuição por não exc-
cutar, podendo, o testamento dentro do praso marcado, artigo 1903:
3
Não importa, porém, a esensa da testamentaria a perda do legado
que foi deixado, não por coa da testooetarl, mas simplesmente
por motivo de amnizade ou por quaesqner outras razões extranhas
á execação do testamento.
Sobre o artigo 1780. que, impondo a perda do beneficio ao tes-
tamenteiro que se escusa, não exige claramente, como o presente
artigo, a condição de ter sido por causa da testamentaria a deixa,
ha de prevalecer o artigo 1889.', jã porque restrisge e aclara o
artigo 1780.', já porque é o assento da materia, e n'esta conformidae

1 Oflicio do ministerio do reino de 7 de Junho 1897 à Misericordia


de Lisboa, Direito, 3 anno . 19, pag. 296.

r
408 ARTIGOS 1890.° E 1891.

se encaminha a jurisprudencia pois já se julgou que o artigo 1780.0


é só applicavel á hypothese de ter sido deixado o legado por causa
da testcentariasegundo o conteúdo do testamento. r
A herança, porém, perde-a o testamenteiro que se escusa ainda
que lhe não fosse deixada com a condição da testdmentaria, porque
o legislador entendeu negar os beneticios da instituição ao instituido
que commettia a ingratidão de recusar o encargo de testamenteiro.
Perde portanto o testamenteiro que não cumprir o testamento a
retribuiçAo deixada para recompensa da testamentaria, perde o le-
gatario o beneficio que lhe foi deixado por causa da testamentaria
se d'ella se escusar, e perde o herdeiro a herança, vista a disposição
do artigo 1780 que nãc deixa a perda dependente de haver sido
condição da herança a testamentaria, e que não é quanto á herança
modificado pelo artigo 1889.0, que só respeita ao legado.
Exceptua-se sempre o caso de se deprehender do testamento que
outra era a intenção do testador, bem como caso de força maior,
porque a pena da perda é imposta não ao instituido que não pôde,
e sim ao instituido que se recusa ou que se escusa.
Não determina expressamente a lei se perdem o direito á remu-
neração fixada no testamento os testamenteiros que começaram e
mesmo adiantaram mas não concluiram o serviço por motivos su-
periores á sua vontade.
Salvo sempre o principio da divisão da remuneração por todos os
que trabalharam, se uns começaram e outros acabaram, não devem
ser obrigados os herdeiros a restituir o legado recebido pelo testa-
menteiro se este deixou de concluir a sua missão por ter fallecido.
Tambem os legados deixados aos testamenteiros estão sujeitos a
contribuição de registo decreto de 23 de dezembro de 1899 artigo
4.° n.°.°

Art. 1890.° 0 nomeado que pretender escusar-se, deve


fazei-o nos tres dias irumediatos áquelle em que tiver co-
nhecimento do testamento, perante a auctoridade a quem
o registo d'elle competir, sob pena de perdas e damnos.
Art. 1891.° O nomeado, que acceitar o encargo, não póde
demittir-se sem motivo justiftcado, precedendo audiencia
dos interessados, e despacho do juiz respectivo; aliás res-
ponderá por perdas e dautmos.
Os preceitos reguladores da testamentaria obedecem todos ao
principio do respeito devido ãs ultimas resoluções do moribundo e á
urgencia de dar cumprimento á sua vontade.
Por não admittir demora a execução do mandato do moribundo,
presume-se aceitar a testamentaria o nomeado que dentro de tres
dias depois que teve conhecimento do testamento não apresenta a
escusa perante a auctoridade, a quem competir o registo que é o
administrador do concelho do logar do fallecimento artigo 1933.1

r Accordão do Supremo Tribunal de Justiça, de 28 de maio de


1895, Gazeta da Relação de Lisboa, 10.° anuo, n.° 24, pag. 189.

I
ARTIGOS 1892.', 1893. 1894.' 409

Póde o testamenteiro recusar o encargo. Mas depois de o haver já


acceitado, que o mesmo é que não se esensar dentro de tres dias,
não pôde já largal-o sem motivo justificado.
.3-afdatam non suscipere enilibet libernuo est ; sceptho atem con-
sommandom est, oisi josta casa interposita.
Para se demittir depois de acceitar o encargo lia de o testamen-
teiro pedir escusa ao juiz, allegando motivo justificado que não
póde ser outro senão impossibilidade superveniente em razão de
molestia, ausencia prolongada, ou incompatibilidade com o exer-
cicio de algum cargo publico, e o juiz resolverl depois de dar aos
interessados o praso de cinco dias para responderem, codigo de pro-
cesso civil artigos 27.' e 661'
Corre o incidente no inventario quando inventario houvec, citado
codigo de processo civil artigo 664.'
A falta de recusa expressa como a falta de escusa em tempo habil
não obriga o testamenteiro a prestação de contas, porque contas não
pôde prestar quem não chegou a exercer o cargo, mas responsa-
biliza-o por perdas e damuos. t

Art. 1892.1 0 encargo de testamenteiro é gratuito, salvo


se alguma retribuição lhe foi assignada pelo testador.
(Vid. nota ao artigo 61.')

Art. 1893.° No impedimento, ou por escusa do testa-


menteiro, incumbe aos herdeiros o cumprimento do testa-
mento, com as seguintes declarações:
1. Se as porções iereditarias forem deseguaes, perten-
cerá o encargo ao mais a'aitajado;
2.1 Se forem eguaes, será encarregado da testamentaria
o que for designado por nomeação dos interessados, e, não
se accordando estes, ou sendo algum dos herdeiros menor,
interdicto ou ausente, o respectivo juiz nomeará uni dentre
elles.
A nomeação do testamenteiro ou executor testamentario poderá
ser requerida por qualquer dos interessados. Mas antes de se fazer
a nomeação hão de ser todos citados para sobre o caso responderem
dentro de cinco dias a contar da citação, codigo de processo.civil,
artigo 660.·

Art. 1894.0 Os testamenteiros terão as altribuições que


o testador lhes conferir, dentro dos limites da lei.

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de junho de


1899, Gazeta da Relação de Lisboa, 13.' anro, n.° 32, pag. 270.
410 ARTIGOS 1895.°, 1896., 1897.0 a 1898.'

Limitando-se o testador, como é muito frequente, a nomear testa-


menteiro sem lhe designar attribuiçZes fica a misslo da testamen-
taria reduzida ao cumprimento dos deveres especificados no artigo
1899.', isto é, principalmente a tractar do enterro do testador e a
pagar as despezas com os suffragios.
Tão pequenas foneçes quiz a lei confiar aos testamenteiros que
até especifica, artigos 1895.° a 1898.0 e 1900.° a 1901., aquellas de
que absolutamente os exclue.

Art. 1895.° Se o testador deixar herdeiros legitimarios,


não poderá auctorisar o testamenteiro para se apoderar da
herança, mas só ordenar, que esses herdeiros não possam
tomar conta d'ela, a não ser por inventario, com citação
do testamenteiro.
Art. 1896.0 Se o testador deixar herdeiros não legitima-
rios, poderá auctorisar o testamenteiro, para que se apodere
da herança, mas não dispeosal-o de inventario.
Art. 1897.° Os herdeiros, mencionados no artigo prece-
dente, podem evitar a detenção pelo testamenteiro, entre-
gando-lhe as sommas necessarias para supprimento das
despezas a seu cargo.

Não pôde o testador com herdeiros legiteinarios conferir a outrem


a posse da successão que squelles pertence por lei, artigos 483.,
2011.° e 2068.0. visto ser a legitima um direito sagrado e indepen-
dente da voutade da testador, e ser o encargo de cabeça de casal
tambem deferido por lei.
Pôde apenas ordenar inventario com citação do testamenteiro antes
da entrega da successlo para evitar que os herdeiros legitimarios
orcultem bens e lhe diminuam assim a sua quota disponivel, preju-
dicando por esta fórma as disposições de sua ultima vontade.
Se não deixa herdeiros legitimarios bem póde o testador commet-
ter ao testamenteiro a posse da herança, como poderia commetter-
lhe a propriedade, por não ter legitimas a respeitar.
Mas ainda assim não são obrigados os interessados como n'algu-
mas legislações a esperar pelo termo da testamentaria para entrar
na posse dos bens.
Para tirarem das mãos do testamenteiro os bens basta adian-
taremlhe o necessario para os encargos la testamentaria, ou mos-
trarem pagas essas despezas como decide expressamente o artigo
1027.' do codigo civil fraocez, fonte do prescute artigo, porque com
a entrega das sommas neccessarias para cumprir os legados e satis-
fazer as mais disposições testamuentarias cessa o motivo da deleoçâo
da herança pelo testamenteiro.

Art. 1898.0 Se não houver na herança dinheiro bastante


para as despezas a cargo do testamenteiro, e não qíizerem
ou não podérem os herdeiros adiantar as sommas necessa-
rias, serm licito ao dicto testamenteiro promover a venda
dos moveis, e, são bastando estes, a de algum ou de
ARTIGO 1898.- 411

alguns immoveis, mas sempre com atdiencia dos herdei-


ros.
§ unico. Se, todavia, algum dos herdeiros for menor,
ausente ou interdicto, a venda, tanto dos moveis como dos
immoveis, será feita em hasta publica.
Pelo presente artigo faltando na suecessão o dinheiro preciso e não
querendo ou não podendo os herdeiros adiantal-o, a venda de bens
para pagar os encargos-da testamentaria fazia-se com simples au-
diencia dos herdeiros, independentemente de praça salvo o caso de
interessados menores ou pessoas a estes equiparadas, sem embargo
de se ter julgado 1 com fundamento no artigo 2055.° que em praça
deviam ser vendidos os bens designados pelo testador para cumpri-
mento do testamento fossem ou nào maiores todos os interessados,
porque os artigos 2054.' e 2055.' legislam para a administração da
herança e não para a testamentaria que era regida pelo presente
artigo.
Mas hoje pelo codigo de processo civil, artigo 654.° § 3., é obri-
gatoria a hasta publica na testamentaria, como na administração da
herança, ainda que os interessados sejam todos maiores e capazes
desde que não concordem na venda particular, ainda que os bens
sejam moveis e de diminuto valor sem a mais leve restricção, talvez
pela necessidade de evitar os conluios dos testamenteiros, e de se
cumprir em toda a plenitude possivel a vontade do testador.
Pelo codigo do processo civil artigo 654.° o testamenteiro que ne-
cessitar de dinheiro para satisfazer as despezas a seu cargo nos
termos do testamento ou da lei ha de, coa certidâo do testamento,
com documento comprobativo de exercirio da testamentaria, e com
a conta das despezas feitas e a fazer, requerer a citação dos herdeiros
para até s terceira audiencia depois de accusada a mesma citaçào
lhe fornecerem os meios necessarios, ou designarem os bens a ven-
der. s
Este pedido será dependencia do inventario, quando inventario
houver codigo de processo civil artigo 655w
Os herdeiros, querendo impugnar, hão de primeiro depositar a
importancia das despezas auctorisadas no testamento ou que forem
necessarias para o testamenteiro cumprir as attribuiçes que a lei
lhe confere, e deduzir em requerimento a contestaçào; e o juiz re-
solverá com audiencia do testamenteiro, que não fica impedido de
levantar a quantia depositada antes de resolvida a impugnação se
prestar caução que serã processada por appenso, codigo de processo
civil artigo 655y
Os bens a vender serão designados, pelo testamenteiro se os her-
deiros os não designarem. Na falta de accordo entre os herdeiros
quanto á designaçào dos bens, ou não chegando o producto dos ven-
didos, o juiz designará os mais que forem necessarios, começando a
venda pelos moveis e d'entre estes pelos menos preciosos ou de

1 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de junho de 1893,


Gazeta da Relação de Lisboa, 7 anuno, n- 26, pag. 201.

k.
412 ARTIGO 199.Q

mais diflicil conservação, e observando-se em geral os preceitos


applicaveis ás arrematações, codigo de processo civil artigo 654.-
§1.", 2.oe4.
Não pôde ser obrigado o testamenteiro auctorisado pelo testa-
mento a applicar o dinheiro da herança ás respectivas despezas,
a depositar por inteiro as sommas que recebeu no arrolamento do
espolio do testador, mas simples e unicamente as sobras constantes
das suas contas até á decisão sobre o saldo apresentado 1, pois todas
as despezas feitas pelo testamenteiro com o testamento desde quc
se contenham em limites razoaveis devem ser pagas pela herança
porque no interesse da herança são feitas.
Estas disposições, porém, não prejudicam quaesquer providen-
cias necessarias para assegurar os direitos dos herdeiros e dos
credores.

Art. 1899.° Se o testador não especificar os deveres do


testamenteiro, consistirão estes no seguinte:
1.° Em cuidar no enterro e funeral do testador, e em
pagar as despezas e suffragios respectivos, conforme a dis-
posição do mesmo testador ou, na falta desta, conforme o
costume da terra;
2.° Em fazer registar no registo competente o testamento,
se o tiver em seu poder, dentro de oito dias, contados desde
que teve conhecimento da morte do testador;
3.0 Em vigiar pela execução das disposições testamenta-
rias, e em sustentar, se for necessario, a validade d'ellas
em juizo e f5ra d'elle;
4.1 Em facultar aos interessados o exame do testamento,
se o tiver em seu poder, e em permittir, que se extráiam
as copias legaes que forem exigidas.
.o, etc.

O funeral representa no uso commum os suffragios feitos no dia


do enterramento «feoseo, como as exequias solemnes com officios
do corpo presente, a respectiva encommendação ecelesiastica, missas,
e todas as orações religiosas até se dar o corpo á sepultura.
Os sufiragios feitos posteriormente ao enterramento, como missas,
orações e officios celebrados pela egreja, são bem d'alma.
Mas para desobrigar a herança de encargos com suffragios além
do terço da terça hão de sommar-se todas as despezas com suffra-
gios, quer do foseir, quer do bem de alma, ou tenham sido deter-
minadas pelo testador ou sejam reguladas pelo costume da terra.
No excesso do terça da terça é nulla a disposição artigo 1775.¶,

t Accordio da Relação de Lisboa de 4 de novembro de 1893, Ca-


zeta daRelação de Lisboa, 7. ano, n." 44, pag. 345.
Iv:

ARTIGO 1899.' 413

como era já pela lei de 9 de setembro de 17(39, que, suspensa pelo


decreto de 11 de julho de 1778, foi restaurada pelo alvará de 20
de maio de 1799, aliás facilmcente poderia ser illudida a prehibiçio
de instituir a alma por herdeiro.
As constituiçíes dos bispados, além de estarem cheias de erros
e de principios falsos a ponto de ter sido prouibida pela carta regia
de 12 de dezembro de 1615 a impressão antes de revistas no desem-
hargo do paço e de terem sido mandadas reformar pela carta regia
de 16 de maio de 1774, não podem prevalecer sobre as disposições
das leis civis, quer antigas quer modernas.
O velho direito contido nas disposições equivocas do alvará de
14 de janeiro de 1807 e da lei de 9 de setembro de 1769 cahiu
todo deante da legislação moderna.
O que o direito novo não derogou foram os decretos de 9 de maio
de 1715 e de 30 de julho de 1790 na parte em que, approvando os
usos e costumes sobre o bem de aliea, deixavam á consciencia dos
herdeiros proceder como entendessem com tanto que não prejudi-
cassem o direito dos parochos aos benesses que lhes fossem devidos;
pois estão fixados por lei até nova dotação do culto e clero as con-
gruas dos parochos, nas quaes se comprehenden os benesses do pé
d'altar, que os parochos podem inclusivamente reclamar perante os
tribunaes ordinarios.
Para compensar os desfalques nas congruas e evitar novos en-
cargos ao orçamento do estado veio o decreto de 23 de junho de
1870, pouco tempo depois da proulgaçào do codigo, suspender o
artigo 2116.', que, obrigando a herança só ás despesas do funeral
e a nenhumas outras salvo quando ordenadas em testamento dentro
dos limites do artigo 1775, estava em antinomia aberta com o
n.° 1.0 do presente artigo, que dava ao testamenteiro a attribuição
de cuidar do enterro e funeral e de pagar á custa da herança os
suffragios respectivos segundo a determinação do testonento ou cos-
tume da terra.
As attribuições do testamenteiro comprehendem a faculdade de
mandar fazer a sepultura para o cadaver do testador, porque a
edificação do tumulo pôde dizer-se a conclusão de enterro.

2." e 4.°, etc.

E obrigação do testamenteiro registar o testamento, se o tiver em


seu poder, dentro de oito dias desde que teve conhecimento da morte
do testador, facultar o exame d'slle aos interesssados e permittir que
se extriam as copias legaes, sem prejuizo do direito de interessados
e não interessados a requerer certidões do registo onde são lançados
todos os testamentos quer publicos quer cerrados.
Deve ser entregue o testamento, depois de registado e pelo menos
depois de concluido o serviço da testamentaria. aos herdeiros insti-
tuidos ou aos legatarios na hyp'these do artigo 1839.', que são de
certo os interessados a que se refere o artigo 1935.', pois a estes
é que aproveita o testamento.
Mas o interessado que pretender a apresentação do testamento
em poder do testamenteiro para o examinar ou d'elle extrahir copia,
ha de requerer ao juiz para fazer citar o testamenteiro, que será
remíovidoda testamentadia se ro praso designado deixar de apre-
sentar o testamento e não comprovar justo impedimento, codigo de
processo civil artigo 663.'

k
414 ARTIGO 1900.0

3.", etc.

O testamenteiro é executor das disposições testamentarias, e so-


bretudo encarregado de velar pelo cumprimento do testamento e de
defender a validade do mesmo documento sempre que o julgue
necessario.
Por isso com quanto a acção de nullidade do testamento deva ser
sempre dirigida contra os herdeiros e legatarios sem necessidade
de citação do testamenteiro pôde tambem ser chamado á causa e
tem em todo o caso inquestionavelmente direito de intervir para
defender as disposições do testador, e assim para disputar a habi-
litação de herdeiros em opposição ao testamento, e para recorrer
das decisões sobre a partilha quando entender que vão de encontro
ao determinado no testamento.'

Art. 1900.1 Sendo os herdeiros maiores, não procederá


o testamenteiro a inventario judicial, salvo se assim o re-
querer algtumn dos interessados.
§ unico. O testamenteiro não tomará, porém, conta dos
bets do testador, sem que os faça arrolar por um escrivão
ou tabellião, com citação dos interessados.
Não permitte o codigo ao testamenteiro proceder a ineotario ju.
dicial espontaneamente no caso de serem maiores e estarem na
livre administração dos seus bens todos os co-herdeiros artigos 2013.
e 2065", porque o inventario é sempre gravoso pelas despezas que
importa, e ás vezes odioso pela publicidade que dá á fortuna par-
ticular e ao estado economico da familia.
Só é obrigatorio o inventario quando os interessados estão sob a
protecção da justiça.
Já por direito antigo não podia o testador ou para evitar a insti-
tuição fraudulenta de incapaz, ou para lhe evitar oceasião de de-
linquir, dispensar de inventario o testamenteiro. De inventario o
não dispensa tambem o direito moderno quando é applicada certa
parte da herança ou mesmo a herança toda a qualquer fundação ou
applicução pia artigo 1902.°
Mas o inventario obrigatorio para o testamenteiro é pelo codigo
o simples arrolamento ou descripçào com avaliação dos' bens, que
é quanto basta para prevenir todo e qualquer extravio.
No artigo 1895." a palavra inventariosignifica apenas a descripção
e avaliação, on arrolamento que tem logar codigo de processo civil
artigo 680." como consequencia da imposiýdo de sellos, ou nos casos
de abandono de bens, herança jacente ou outros identicos, e se li-
mita a um um auto em que o escrivão descreve os bens em verbas
numerados com a declaração do valor que lhe der um avaliador
nomeado pelo juiz, auto que depois servirá de descripçdo no inven-

1 Accordãos do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de outubro de


1888 e de 5 de outubro de 1894, Direito, 29." anno, n-" 11, pag.163;
e Gazeta da Relação de Lisboa, 8. anno, n" 98, pag. 781.
ARTIGOS 1901. a 1902.- 415
tario a que porventura haja de proceder-se, entregando-se os valores
arrolados ao inventariante ou, não o havendo, a depositario pelo juiz
nomad que adminisírará os bens e dará contas ios termos dos
artigos 824.° e 825.- do mesmo cedigo.
O arrolamento, segundo o artigo 682.1 do codigo de processo civil
que regulamenta o § unico do presente artigo, ha de ser feito no
juizo da abertura da herança por escrivão ou tabellião da escolha
do juiz e sob a presidencia d'este quando algum interessado a reque-
rer, com citaçto dos interessados residentes na comarca e do curador
dos orplãos se algma d'elles estiver ausente da comarca, e na
presença de duas testemunhas quando os interessados não compa-
recerem e o juiz não presidir.
Não se confunde o encargo do testamenteiro com o encargo do
cabeça de casal.
O encargo de cabeça de casal vem da lei, e não do testador, ar-
tigos 2065.^, 2070./, 2u82.2, 2083.° e 2085., e o encargo do testamen-
teiro só o pôde dar o testador.
Os testamenteiros nem dividas podem pedir se elo foram aurtori-
sados a liquidar a herança, como nem dividas nem legados podem
pagar salvo incumbencia especial do testador.
A execução do testamento e as funções de iuventariante perten-
cm propriamente aos herdeiros, ou aos legatarios se a herança for
distribuida toda em legados, e ao testamenteirs incumbe princi-
palmeoto velar pelo cumprimento do testamento.

Art. 1901.° Havendo herdeiros on legatarios menores,


interdiclos ou ansentles, dará o testamenteiro conhecimento
da herança, ou do legado, ao respeclivo juiz.

(Vid. nota ao artigo 1895.)

Art. 1902. Se o testador houver encarregado o testa-


ííenteir( de empregar o product de certa parle da herança
em alguma fundação, tu applicação pia, ou de utilidade po-
blica, será o testamenteiro egualmente obrigado a proceder
ao inventario, e á venda dos dietos bens em hasta publica,
com citação dos iuteressalis, íu de seus legilimos repre-
seanles, e iutervetçáo do tiinisterio publico.
Nos tempos em que o poder ecclesiastico pela sua larga influencia
nos negocios pretendia exercer jtrisdicção em quasi todos os ramos
de administração publica, e invadir os dominios do poder teníporal,
chegou o abuso a ponto de se considerarem legados pios todas as
deixas em que o testador ou instituidor expressava a sua devoçãe
ou piedade, isto é todas as deixas comri applicação pia ou destinadas
a obra pia ou fossem missas e mais suffragios pelas almas dos defun-
rios ou esmolas a pobres.
Para pôr cobro t abusiva instituiçâo de capellas, que parecia
destinar todos os bens do mundo para as almas do purgatorio, orde-
nou quanto ao preterito a lei de 9 de setembro de 1769 no § 19.°
-«Que os actuaes gravames que excederem a decima parte do ren-
416 ARTIGO 1902."

dimento liquido dos bens encapellados sejam e 6quem desde a publi-


cação d'esta abolidos, reduzindo-se os sobredictos encargos á dieta
parte decima sómeste' -.
Esta lei, depois suspensa pelo decreto de 17 de julho de 1778, foi
pelo. alvará de 20 de maio de 1896 restabelecida em varios §§, com-
prehendendo o referido § 19.', o qual deve reputar-se applicavel não
só ao passado, senão tambem ao futuro desde que a lei de 26 de
julho de 1855 no artigo 1.' o ampliou a todos os encargos pios sem
attenção á natureza dos bens, fossem ou não vinculados.
Hoje, porém, a distincção entre legados com applieaçio pia ou
de utilidade publica e legados pios propriamente dictos em que é
interessado o hospital de S. José de Lisboa e outros estabelecimen-
tos de caridade é completa e cabal.
Hoje, conforme as deixas são para serviço doo vivos ou para ser-
viço dos mortos assim estão sujeitas á legislação civil ou á legisla-
ção especial de legados pios em tudo quanto for compativel com
as çisposições do codigo.
E legado pio a deixa de dinheiro destinado á compra de alfaias
e de ornamentos para a egreja t, por ser destinado unicamente a ser-
viço de mortos.
Não é, porém, legado pio o legado para obras pias, que é para
obras de beneficencia e caridade artigo 1836.°, nem a deixa para
a fundação de um asylo para pobres, nem a simples liberalidade
a favor dos p-bres ainda que as esmolas sejam deixadas aos doen-
tes do hospital, e aos presos das cadeias com a condição de assisti-
rem á missa por alma do testador, porque tudo isto é destinado a
utilidade do publico, e não a missas2 ou suffragios, apesar de já se
ter declarado uma e outra cousa.
Tambem não é legado pio apesar de julgado em contrario 3 e da
disposição da Ord. liv. 1.' tit. 62 § 41.', a deixa para curar enfermos,
i camas para elles, vestir ou alimentar pobres, remir captivos, crear
enjeitados, agasalhar caminhantes pobres, e quaesquer obras de
misericordia semelhantes.
Não vão os legados pios além das missas, anniversarios, respon-
sos, confissões, ornamentos e cousas que servem para o culto di-
r vino.
Ao hospital de S. José só foram coucedidos os legados pios não
cumpridos, quando os encargos estivessem registados nos livros da
contadoria do ho s pital, e consistissem em missas e officios man-
dados fazer e cumprir nos testamentos ou nas instituições de mor-
gados ou capellas. 4

v i Accordão da Relação de Lisboa


zeta da Relação de Lisboa, 11.' anuo,
de 4 de março de 1897,
n ' 21, pag. 165.
2 Oflicios do ministerio do reino de 1 de fevereiro de 1892, e de
8 de outubro de 1817, Annuario da direcção geral da administraçdo
Ga-

politica e ciril, 4. anno, pag. 506, e Direito, 31. anno, n.' 7, pag.
103.
3 Accordio da Relação de Lisboa de 20 de dezembro de 1890,
Direito, 25.' anuo, n ' 15, pag. 237.
4 Accordão da Relação de Lisboa de 12 de novembro de 1870,
Direito, 3.' anno, n.' 10, pag. 160.

j
FW

ARTIGO 1902.- 417

Mesmo as disposições especiaes sobre legados pios fallam apenas


de missas e mais sofragios, lei de 26 de julho de 1855 artigo 10."
§ 12
Não se occupou o codigo civil da materia dos legados pios se.
não para lhes restringir a applicação artigos 1775., 189y1 n. 1.2
e 2116.°
Só ás contas dos legados destinados a alguma fundação ou appli-
cação pia ou de utilidade publica se referiam os codigos adminis-
trativos de 6 de maio de 1887 artigo 2062 02 3. e de 17 de julho
de 1886 artigo 241. n.° 18.
De legados pios não fallava tambem o projecto do codigo de
processo civil, apresentado ás córteo, referindo-se aliás ás contas do
testamenteiro.
E certo, porém, que na practica continuou sempre em vigor sobre
legados pios a legislação anterior, no que não era incompativel com
as disposições do codigo civil, e que o codigo de processo civil com
as emendas feitas em cértes, apesar de ter sido desattendido pela
camara dos pares o seguinte additamento ao artigo 27s n 2.
-contioaoind a regola-sepelo legi"l çd eopeeiil resectivo -, clara
e terminantemente distingue n'aquelle artigo e numero entre as con-
tas da competencia das auctoridades administr ativas ea hypothese
do artigo 1905." unico do presente do codigo e as contas que respei-
tam ao csprimento de legados pios.
O codigo administrativo vigente, esse, claramente reconhece no
artigo 277." n2 19.°, a instituição de legados pios, dando ao admi-
nistrador de concelho competencia para a tomada de contas dos le-
gados pios ou destinados a applicaçõcs pias ou de utilidade publica
nos termos da legislação especial; como no mesmo artigo n" 2."
incumbe ao administrador do concelho participar ás corporações
administrativas, no praso de quinze dias contados do registo dos
testamentos, os legados com que tenham sido contempladas, para
evitar que sejam fraudadas nos seus interesses.
São reguladas pelo presente artigo todas as deixas para applica-
çles pias ou de utilidade publica, não só as posteriores i promulga-
çào do codigo civil, senão tambem as anteriores na parte executada
sob o dominio da lei nova.
A qualquer é permittido fundar estabelecimentos de utilidade
publica e até nomear as respectivas administrações. Mas são póde
exemptat-as da fiscalisação do estado.
Finalmente o inventario e a venda dos bens em basta publica é
obrigatorio sempre que o testamento tenha de empregar em funda-
ção pia o producto de certa parte da herança, para a venda correr
pela justiça, ou seja certa essa parte da herança ou represente uma
1 1
percentagem ou valor incerto, como 3 , 2, etc.
Se o legado fosse de objecto determinado ou de quantia certa em
réis como de uo ou de dois contos de réis, ete., bastaria ao lega-
tario registar sobre os bens da herança a hypotheca legal sem ne-
cessidade de inventario judicial. 1

t Accordão da Relaço do Porto de 24 de abril de 1883, Direito,


16.° asno, n." 28, pag. 446.
ToMo III 27
418 ARTIGO 1903.

Mas desde que seja preciso vender para empregar, o inventario é


inevitavel, ou o legado seja de cousa certa ou de precentagem.

Art. 1903.° Quando no testamento não houver sido assi-


guado praso para o seu cunprimento, deve o testamenteiro
cumpril-o dentro de um anino, contado desde o dia em que
tomar conta do dicto encargo, ou desde aquelle em que ter-
minar o litigio, que, por ventura, se haja suscitado sobre
a validade ou níllidade do testamento. -
§ 1.1 0 testamenteiro, todavia, conserva sempre o direito
de vigiar pela execução das disposições não cumpridas, e
de requerer as providencias conservatorias, que parecerem
necessarias
3.° 0 testamenteiro pôde, outrosim, no caso do artigo
1902.°, continuar na execução do testamento, pelo tempo
que for necessario para cumprir o legado, ou legados, se
o testador assim o houver delerminado.
§ 3.° Se o testamenteiro não executar, podendo, o seu
encargo, no tempo assignado, perderá a retribuição, que
lhe tiver sido deixada, e será executado o testamento por
aquelles a quem tocaria cumpri-o, se testamenteiro não
houvesse.
Já pela Ord. liv. 1.' tit. 62. §§ 1. e 27.' eram obrigados os tes-
tamenteiros, não havendo marcado outro praso o testador, a dar
contas dentro de um anuo salvo impedimento legitimo, por se jul-
gar sudiciente na generalidade dos eos este periodo para satisfa-
çào dos deveres da testamentaria.
Se dentro do praso não foi cumprido o testamento, ou por via
da liquidação do terço da terça da herança para a reducçio dos le-
gados pios, ou por litigio sobre a disposição testamentaria, ou por
quaesquer outras diligencias necessarias, não perde a remuneração
o testamenteiro que não foi culpado da demora, porque o § 3. do
artigo só commina a pena da perda da retribuição ao testamenteiro
que, podendo, não cumpriu o encargo dentro do praso assignado.
Dentro de um auno tambem deve cumprir o testamenteiro a quem
o testador auctorisou a pagar os legados quando lhe fosse possivel,
porque esta fórmula equivale a não determinar praso.
Mas salvo determinação expressa do testador não têem os testa-
menteiros direito a desfructar os bens durante o periodo da testa-
mentaria, porque não se confunde com o goso de um direito a desi-
gnação de praso para cumprimento de unia obrigação.2

1 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de dezembro


de 1900, Gaeta da Relação de Lisboa, 14. anto, n.° 88, pag. 700.
= Decreto sobre consulta do Supremo Tribunal Administrativo de
26 da abril de de 1894, Direito, 29.° anno, n. 14, pag. 221.
a,?

ArIGO 1904.- 419


Dos legados que não são deixados para serviço de utilidade pu-
blica só os interessados podem exigir o cumprimento.

Art. 19'.1 Se mais de um testamenteiro tiver acceitado


a testamentaria, e algun ou alguns, depois, se absliverem
de tomar parte na execução do testamento, valerá o que
os restantes fizerem; mas serão todos solidariamenle res-
ponsaveis pelos bens da herança, de que tiverem tomado
conta.
§ unico. Se os testamenteiros, que tiverem acceitado,
não podérem vir a accordo, luaue ao modo de executar o
testamento, caducará a ts1amentlaria, passando a execução
do testamento a quem competiria, se os testamenteiros [al-
tassem.
Por se confundir o mandato judicial ceo o mandato do testamen-
teiro, por não se attender a que, conquanto um e outro respeitem
a negocios alheios, é o mandatario encarregado de procurar em vida
e o testamenteiro encarregado de procurar por morte, já se julgou 1
nulla a nomeação de tres testamenteiros para exercer conjucta-
mente a missão de inventariantes com o fundamento de importar
tal disposição um mandato contra lei expressa artigo 1356.°
Ora aila, e radicaltente nulla seria a nomeação de inrexcariaie
por virem da lei artigo °0G8.°, e não do auctor da herança, as fun-
cções de cabeça de casal.
Mas a nomeação de varias pessoas para exercer eonjunctamente
as funeções de testamenteiro esti expressamente reconhecida no
presente artigo e unico e no artigo ã85s
0 unico do presente artigo não vinha no projecto primitivo, mas
foi introduzido logo nos trabalhos da primeira revisão para evitar
que se suspendesse a administração da ieraiça pelo forto do des-
aecordo dos testaoeurteiros quando mais de um tivesse acceitado
a testamentaria.
A incapacidade ou impe d imento do testamenteiro equivale para
os efeitos da caducidade da testamentaria á falta do testamenteiro.
Porque os executores testamentarios nomeados eiijuetamtte
não constituem senão uma pessoa esreoregado da exerução do tes-
tamento, deve cada um velar pela gerencia dos outros como se fâra
sua, porque todos são solidaria nte resposoveis, ainda que algum
'ão se tenha ingerido na administração da heraça, pelas bens da ie-
rança de que tiverem tomado conta, salvo se o testador Ihes dividiu
as responsabiliííades porque então é cada um responsilvel só pelos
bens que arrecadou e só pelos actos de gerencia que practiceu, ou
se o damno foi estranho ás frucçies da testamentaria porque rntaO
não pôde o interessado pedir indenisação senão áuelle que lhe
causou o prejuizo.

1 Acrordão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de novembro


de 1893, Gazeta da Helaçáo de Lisboa, 7.0 amo, n.o 50, pag. 3ã8.

1
420 ARTIGO 1905.-

A solidariedade na responsabilidade é restrieta aos bens da he-


rança de que tiverem tomado conta os testamenteiros.

Art. 1905.° Os testamenteiros são obrigados a dar conta


da sua gerencia aos herdeiros ou aos legitimos represen-
tantes d'estes.
§ unico. No caso do artigo 1902.0 as contas serão dadas
á competente auctoridade administrativa.
A competencia da auctoridade administrativa para tomar contas
aos testamenteiros no caso do artigo 1902.- e na hypothese dos le-
gados pios não collide com a obrigaçào que têem os testamenteiros
de as prestar àauctoridade judicial no juizo do inventario e a quaes-
quer interessados particulares em conformidade com o eodigo de pro-
cesso civil.
Para as cotas e execuçào do testamento, quer se tracte de dei-
xas para utilidade publica, quer de legados pios por antigo accordo
da auctoridade civil com a auctoridade ecclesiastica que ao hospital
de S. José e a outros estabelecimentos de caridade pertencem quando
não cumpridos, a auctoridade competente é o administrador do con-
celho do domicilio do testador, e não o do concelho onde foi regia-
tado o testamento por aLi se ter dado o fallecimento, seja ou não
da cabeça de comarca, com a unica restricçào de que em Lisboa é
a competencia do administrador do primeiro bairro e no Porto do
administrador do bairro a que pertencer 0a Santa Casa da Misericor-
dia, codigo administrativo artigo 219.^ n. 19.
Para os administradores do concelho passou este serviço dos au-
tigos provedores das comarcas, aos quaes a Ord. liv. 1.) tit. 62.
dava competencia para tomar contas aos testamenteiros dos legados
pios, obras pias ou obras meritorias.
Dos suffragios dos que fallecerem sem testamento não tem o admi-
nistrador do concelho que tomar conhecimento, como competencia
não tinham os antigos provedores para conhecer de legados que
nao respeitassem ao cumprimento dos testamentos, cedulas ou codi-
cilos Ord. liv. 1.0 tit. 62.' § 24.° sem embargo das constituições dos
bispados em contrario, as quaes nem obrigavam os seculares nem
tinham força sobre bens profanos que não eram sujeitos á auctori-
dado ecclesiastica.
Tambem não pôde o administrador do concelho tomar contas de
legados pios sem existencia legal, como o legado ro onus issarum
ou o legado pio perpetuo.
O legado pio de missas com encargo em bens de raiz, é absolu-
tamente nullo como já o era no antigo direito lei de 9 de setembro
de 1769 artigo 11.- e alvará de 14 de janeiro de 1807 t, ou porque

.Accordàos, da Relaçào de Lisboa de 2 de novembro de 1872, e


de 14 de junho de 1873, e da Relação do Porto de 23.de fevereiro
de 1892 e Portaria de 4 de março de 1875, Reista de Legislação e
de Jrisprudencia,de Coimbra. 7.o anno, n.0 334, pag. 347, e 8.° anuo
n.° 382, pag. 281, Revista dos Tribunaes, 10.0 anno, n.° 236,
pag. 312,
e Direito, 7.0 anno, n.- 34, pag. 539.
F:

ARTIGO 1905.- 421

representa instituição disfarçada de uma capella, quando as espellas


foram abolidas, e com ellas os legados pios que as oneravam, ou
porque o encargo de missas, longe de vir mencionado nos omus reca s
sujeitos a registo, artigos 906° e 949., deixou depois do codigo civil
de ter a hypotheca legal com que a legislação anterior assegurava
o cumprimento dos legados pios.
E verdade que já se julgou com fundamento no § 3.' do alvará
de 14 de janeiro de 1807 subsistente o encargo de missas perpetuo
que não pese sobre bens vinculados, por só terem sido abolidos pela
lei de 19 de maio de 1863 os legados impostos em capellas vincu-
lares.
Todavia tambem já foram julgados extinctos os encargos pios im-
postos em vincules abolidos por effeito do decreto de 4 de abril de
18321, que aliás não continha disposição egual á do artigo 10.° da
lei de 19 de maio de 1863; e em todo o caso o que é certo é que o
encargo pio perpetuo, reconhecido no decreto de 24 de dezembro de
1852 e na lei de 26 de julho de 1855 quer com encargo quer sem
encargo sobre bens, é hoje incompativel com os artigos 1775., 1871.-
e 1872.- do codigo.
Não póde hoje destinar-se pensão perpetua para suffragios, porque
os artigos 1871.° e 1872.° prohibem o encargo de prestar a mais
de uma pessoa suecessivamíente certa renda ou pensão, que nio
seja a favor de indigentes, ou de qualquer estabelecimento ou fun-
dação de mera utilidade publica, ou para dote de raparigas pobres,
e nem loa nos legados pios pessoa pensionista para se determinar a
duração da pensão pela duração da vida, nem o artigo 1775.' se re-
fere a suffcagios perpetos que importariam fideicommisso e sim a
suffragios por ocrasiUo do fallecimento de qualquer individuo.
Contraria a direito é tambem a pretensão que tem tido o juizo
ecelesiastico de chamar a si o processo da redueção e commutação
dos legados pios, quando este serviço é da exclusiva competencia do
poder civil independentemente da auctoridade ecclesiastica.
Nos bens jacentes, incorporados que sejam no estado ou em qual-
quer estabelecimento publico, ficam abolidos os encargos pios que
os oneram conforme o § 18.° do alvará de 9 de setembro de 1769 e o
alvará de 20 de maio de 1796 2, devendo reputar-se commutados na
obra pia a que o governo os applica.
Assim os legados pios impostos em bens de confrarias e irman-
dades se extinguem com a extineção das respectivas corporações;
porque no simples facto da applicação dada aos bens que essas cor-
poraçóes administravam, está a commntação.
A reducçào dos legados pios, que não for decretada por lei, ha
de fazer-se, não pelo processo marcado no artigo 311.- da novissima
reforma judicial, como alguns pretendem, porque o processo da no-
vissima reforma judicial não póde invocar-se depois da lei de 8 de
novembro de 1876, que deu força e vigor ao codigo de processo civil,
e sim em inventario judicial, como para verificar se o legado pio
excede ou não o terço da terça do testador, se ha de recorrer a inven-

t Accordãs do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de agosto de


1881, Direito, 17.' anno, n. 24, pag. 372.
9 Sentença da 1. vara de Lisboa de 31 de agosto de 1872, Di-
reito, 7.' anno, n. 8, pag. 111.

L
422 ARTIGO 1905.^

tario judicial 1, que póde ser requerido pelo ministerio publico, pelos
herdeiros ou legatarios, e até pelo testamenteiro que, apesar de não
ser herdeiro é encarregado de vigiar pelo cumprimento do testa-
mento dentro dos limites da lei, artigos 1894. e 1999
Pôde tambea o onerado com encargo pio excessivo aguardar a
citação para prestação de contas, e impugnar por meio de embargos
então a obrigação de pagar a totalidade do legado; e póde ajustiça
no julgamento dos embargos decretar logo a reducção.
Nos encargos dos legados devem contar-se para o effeito das re-
dueções as despezas com os documentos e com o processo da presta-
ção de contas.
A contas dos legados pios são obrigados só os herdeiros, ou tes-
tamenteiros, ou seus representantes, como obrigados eram antiga-
mente tambem os administradores ou possuidores de capellas one-
radas com esses encargos.2
Os proprios estabelecimentos de caridade, onerados com encargos
pios, são obrigados a prestar contas do cumprimento d'esses encar-
gos como qualquer particular.
Antes da entrega do legado não é obrigado a prestar contas o
legatario ouerado, quer seja pio o encargo 3, quer seja em beneficio
de qualquer fundação de utilidade publica.
As contas na falta de proso assignado pelo testador hão de ser
prestadas dentro de tm anno contado desde que o testamenteiro te-
nha tomado conta da testamentaria, ou desde que o litigio sobre o
testamento haja terminado, e de tres em tres amsos quando for per-
petuo ou de tracto successivo o encargo.
Contra a citação para prestar contas ou para qualquer execoção
por legados pios podem logo deduzir-se embargos, arguindo de
nul1o ou de caduco o titulo executivo conforme o artigo 4.1 do de-
creto de 24 de dezembro de 1852, o artigo 693.° do codigo civil,
e os artigos 912.° n 8t e 917.0 do codigo de processo civil 1; e ar-
guindo o embargante a sua illegitimidade ha de observar-se o dis-
posto no decreto de 6 de agosto de 1892 artigo 35n
Na execçào das sentenças sobre contas de legados 'pios deve
observar-se o regulamento das execuççes fiscaes administrativas
de 28 de março de 1895 artigo 81", visto o artigo 6. do decreto de
24 de dezembro de 1852 com referencia ao artigo 9. do decreto de
5 de novembro de 1851.
No caso de recusa a prestar contas e em todos os casos de contes-
tação deve ser remettido o processo ao contencioso judicial para
conhecer da recusa ou da contestaçào, ainda mesmo nas duvidas
originadas nas leis de 30 de julho de 1860 e de 19 de maio 18630,

r Portaria de 4 de abril de 1877, Direito, 10. anno, n." 6,


pag. 117.
2 Accordão da Relação de Lisboa de 11 de junho de 1884, Gazeta
da Relação de Lisboa, 1. ano, n? 20, pag. 158.
3 Accordào da Relação de Lisboa de 4 de março de 1885, Gazeta
da Relardo de Lisboa, 11. asno, n! 21, pag. 165.
z Accordão da Relacão de Lisboa de 29 de novembro de 1893,
Direito,31.° anno, n 11, pag. 171.
$ Decreto, sobre consulta do Supremo Tribunal Administrativo,
de 22 de dezembro de 1880.
ARTIGOS 1906., 1907.0 E 1908.0 423
visto não terem dado estas leis competencia especial para esse fim
a ninguem.
Antigamente todos os incidentes sias contas eram julgados pelos
administradores de concelho com recurso para os conselhos de dis-
trieto.
Hoje todas as questões suscitadas a respeito das coutas são envia-
das ás justiças ordinarias O; e mesmo as contas prestadas sem im-
pugnação o recurso da sentença é para o poder judicial.2
Para pagamento de legados pios podem ser penhorados os titulos
de divida do estado por nomeação expressa do exceutado; e são
exemptas de sêllo as causas por legados pios, tanto nos termos do
processo contencioso como nos documentos, salvo condemnação da
parte afinal verba n.° 387, da tabella n.^ 4., anexa à lei de 29 de
julho de 1899.

Art. 4906.° 0 encargo do testamenteiro não se transmitle


a herdeiros, nem pôde ser delegado.
(Vid. nota ao artigo 256.0)

Art. 4907.0 Se o testador houver legado aos testamen-


teiros conjunctos alguma retribuiço, a parte do que se es-
cusar, ou não podér acceitar o encargo, acerescerá à dos
outros.
(Vid. nota ao artigo 1467.)

Art. 4908.0 As despezas feitas pelo testamenteiro, no


cumprimento do seu encargo, serão abonadas pela massa
da herança.
§, unico. As despezas miudas, de que não é costume
exigir-se recibo, serão abonadas pela declaração jurada do
dicto testamenteiro.
Tem o testamenteiro, como o mandatario artigo 1344., direito
a todas as despezas com a testamentaria, porque os encargos com os
negocios devem ser pagos por quem u'elles tiver interesse.
Bem basta ser em regra gratuito o oficio dos testamenteiros
quanto mais supportareni elles ainda por cima as despezas da sua
missao.

A Decretos, sobre consulta do Supremo Tribunal Administrativo,


de 22 de dezembro de 1850 e de 6 de dezembro de 188, Revosta de
Legislação e de Jurisprudencia,de Coimbra, 20.0 anno,n.° 1024, pag.
571, e 23.0 alno, n. 1136, pag. 397.
2 Accordão da Relaç5o de Lisboa de 11 de junho de 1890, Gazeta
da Relação de Lisboa, 4o anno, n.° 93, pag. 737.
424 ARTIGO 1909.0

Ficam por isso a cargo da herança as contas de despeza, e bem


assim as ceustas do inventario e as das demandas que o herdeiro ou
o cabeça de casal tiver proposto ou de que se tiver defendido ar-
tigos 2063 e 2157.-, salvo o caso de condemnação pessoal por dolo
ou má fé porqué a pena não vai além da pessoa do delinquente.
Devem ser comprovadas com documentos legaes as despezas fei-
tas pelo testamenteiro colo por qualquer outro mandatario segundo
á de direito e de praxe.
Em direito velho eram cridos por seu juramento nas despezas
miudas e usuaes, que não excedessem todas a valia de 6 marcos de
prata, isto é, em que cada addição de despeza não passasse de 13950
réis Ord. liv. L tit. 620 § 21.- e alvará de 16 de setembro de
1814.
Hoje hão de fazer a prova das despezas de que não é costume
exigir recibo segundo o direito vigente, ficando a decisão final ao
prudente arbitrio do juiz.
A distribuição em esmolas do legado em dinheiro péde provar-se
por todos os meios de direito, e até pela rubrica da auctoridade
administrativa se estiver presente no acto do pagamento dos reci-
bos ou relaçües eomprobativos da entrega, portaria de 23 de agosto
de 1871.
Ao que o testamenteiro não tem direito, como o não tem qualquer
outro administrador de bens alheios, é a exigir juros das sommas que
gastar com a administração dos bens desde a data do desembolso,
porque lei nenhuma lhe reconhece tal direito, nem tambem a pagaI-os
das sommas recebidas desde a data da cobrança, porque lei nenhuma
lhe, impõe tal obrigação.
E na prestação de contas que deve ser apreciada a responsabili-
dade dos testamenteiros 1, o que todavia no exclue a acção ordina-
ria quando as circumstancias assim o aconselhem.
Por isso não péde negar-se ao testamenteiro o direito de guardar
os livros de receita e despeza da herança até ao julgamento das
contas da sua gerencia.

Art. 1909.° O testamenteiro, que se houver com dolo ou


má fé no cumprimento do seu encargo, será responsavel
por perdas e damnos, e poderá ser judicialmente removido
a requerimento dos interessados.
Ao passo que o mandatario propriamente dicto é responsavel, não
só pelo dolo, senão pela culpa tambem, o testamenteiro só responde
por perdas e damnos no caso de dolo ou saci fé, e não no caso de
culpa ou oegligencia, talvez por ser de natureza gratuita o seu offi-
cio.
Não é inamovivel o testamenteiro que acceitou, comquanto a ar-
bitrio não possa renunciar nem a arbitrio ser removido.
O processo da remoção depois de acceito o encargo está regulado
no codigo de processo civil artigo 662.0

1 Accordio do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de março de


1895, Gazeta da Relaçâo de Lisboa, 8,0 anuo, 0.0 82, pag. 652.
uso

ARTIGO 1910.° 425

0 interessado na remoção do testamenteiro ha de deduzir por


escripto os fundamentos do pedido e otierecer logo as provas, como
provas póde offerecer tambem o testamenteiro quando for citado para
dentro do praso de cinco dias responder. Mas inquirições por carta
a nenhuma das partes sio 1dmittidas por serem incompativeis com
a rapidez do processo.
É no inventario se o houver que corre o incidente da remoção do
testamenteiro citado codigo do processo civil artigo 664.

SECCAO VIII

Da fórma dos testamentos

SUB-SECCAO I

Disposições preliminares

Art.: 1910.° 0 testamento, quanto á sua fórma, pôde ser:


1.° Publico;
2.° Cerrado;
3.° Militar;
4.° Maritimo;
5.° Externo, ou feito em paiz extrangeiro.
A palavra-testamento-, que se compõe das duas latinas-tes-
tatio e mes-, ou testemunho de vontade, representa o acto mais
serio da vida humana por ser o documento em que o homem salda
as suas contas com o mundo e se prepara para dormir o somno da
morte.
Por isso subordinou o legislador o seu criterio na escolha das for-
malidades testamentarias, em seguida aos preceitos reguladores da
sueessio testamentaria, á necessidade de assegurar a verdade e a
authenticidade das manifestações de ultima vontade sem todavia
roaretar a liberdade de testar.
Tão grave e momentosa julgou a lei a questão da transmissão
dos bens além da vida em prejuizo da ordem legal da successão,
que cercou este acto de solemnidades extraordinarias para garantia
da vontade do testador contra as falsificações e simulações, decla-
rando na falta de qualquer d'ellas radicalmente nullo o testamento.
426 ARTIGO 1910.õ

Ha mais rigor nos testamentos do que nos actos entre vivos por
serem mais faceis e de mais didicil prova as falsificações n'aquelles
do que n'estes, e sobre tudo porque os testamentos só se discutem à
morte do testador, precisamente quando falta já a pessoa que melhor
podia esclarecer os factos.
Das cinco fórmas de testamento, que a lei nova reconhece, as
duas primeiras são as fórmas commns e as outras tres as fórmas
especiaes.
No testamento commum cumprem-se todas as solemnidades exigi-
das nas circumstancias ordinarias e normaes da vida. No testamento
especial prescinde-se de alguns requisitos que seria impossivel cum-
prir nas circumstancias excepcionaes do testador.
O que nos mares vê a morte diante dos olhos, o que nos campos
da batalha vê chegada a hora de deixar o mundo, e o que em paiz
extrangeiro sente necessidade de dispOr de seus bens ou de tomar
qualquer outra resolução para depois da morte, graves difficuldades
encontraria na disposição de sua ultima vontade se a lei não re-
conhecesse uma férma de testar adequada á sua situação especial.
Nenhuma d'estas fórmas especiaes de testamento, porém, repre-
senta hoje privilegias pessoaes e portanto odiosos como na legisla-
çio romana. Pelo contrario são permittidas todas a qualquer cida-
dão que se encontre nas circumstancias particulares prescriptas na
lei.
O testamento celebtado em paiz extrangeiro pelos nossos agentes
consulares artigos 1962.- a 1964.0, que os regulamentos consulares
já reconheciam quando a legislaçào civil ainda o desconhecia, era
reclamado pelo desinvolvimento das relações internacionaes com as
viagens e negocios frequentes entre os diversos paizes em virtude
da facilidade das communicações e do progresso da civilisaçio.
Não acceitou a commissão revisora nenhuma das duas fórmas de
testamento admittidas nos artigos 2094.° e 2095.0 do projecto pri-
mitivo, que dispensavam a intervenção de oficial publico, e reconhe-
ciam, como se por ofticial publico fira authenticado, o testamento
pelo testador escripto e assignado com a declaração perante tres
testemunhas idoneas de ser aquella a sua vontade, lançando uma
d'ellas por termo a data e a declaração do testador e assignando todas
por extenso, e atá o testamento cocripto por outrem de mandado do
testador, declarando este diánte de cinco testemunhas idoneas ser
aquella a sua ultima vontade, sendo lido em voz alta, datado e
rubricado pela pessoa que o testador designasse se elle o não podesse
fazer, e assignando todas as testemunhas e o proprio testador, com-
tanto que fosse depois judicialmente reduzido.
A fórma que dispensava a intervenção de oficial publico e se con-
tentava com a presença de tres testemunhas alguma semelhança
tinha com o testamento olographo dos francezes.
A que exigia a reducçâo judicial era verdadeiramente o nosso
antigo testamento particular aberto.
Não quiz, porém, a commissio revisora reconhecer nenhuma
d'estas duas fórmas de testar apesar de ser escripto, datado e assi-
gnado pelo testador o testamento desde que era absolutamente dis-
pensada a intervenção de oficial publico com o receio da extorsão da
ultima vontade pela violencia ou pela fraude, que é o que tem sem-
pre desviado dos nossos usos e costumes essa especie de testamen-
tos.
O testamento olograpáo, porém, habilitaria o testador a dispôr de
seus bens em plena liberdade e absoluto segredo que nem no testa-
r.
ARTIGO 1910.- 427

mento cerrado, com as variadas solemnidades de que é revestido póde


absolutamente conseguir-se, pois que, se póde occultar-se o conteúdo
do testamento, 1o é facil esconder o torto do testamento, e facili-
taria muito ao cidadão portuguez o direito de testar sobre tudo em
paiz extrangeiro.
Em França existe o testamento olographo desde o principio d'este
seculo sem o menor inconveniente; verdadeiro testamento ologra-
pho são as emendas simplesmente por letra do testador com resalva
e assignatnra artigo 1442.; e ditlicil seria falsificar o testamento,
todo datado e assignado pelo testador, desde que fosse condição da
sua validade o deposito no archivo testamentario official artigo 1927.°
O que exigem como ponto capital quasi todas as legislaçàes é que
seja semrpre eseripto o testamento.
Nem com isso, porém, se contenta o nosso codigo porque não re-
conhece testamento que, além de escripto, não seja authenticado
por official publico.
Uniformiso o codigo as condiçJes dos testamentos communs, dei-
xando-os todos sujeitos rs mesmas formalidades.
Assim acabou com o velho codicillo que dispensava o numero
regular de testemunhas por se referir só a legados, e não conter
instituição de herdeiro que era então o caput e o fundamento do
testamento, e que hoje nada influe na etlicacia da disposição de ul-
tima vontade.
Eliminado foi tambem o testamento particular aberto, miudamente
regulado na Ord. liv. 4.^ tit. 80. § 39 e bem assim o testamento
nuseupativo entre nós reconhecido desde sempre e no projecto pri-
mitivo ainda conservado, que era feito de palavra á hora da morte,
isto é, em perigo irrircntede vida, diante do receio de sobrevir a
morte antes de se preencherem as formalidades proprias dos testa-
mentos ordinarios, e que ficava de nenhum effeito se o testador con-
valescia da doença.
O testamento nuncupativo, que estava de todo arreigado nos cos-
tumes publicos, e era da maior importancia social nus paiz onde
tudo se reserva para dnorosid, teve de cahir diante da necessidade
de evitr fraudes que eram tão frequentes e a que tão bem se pre-
stava esta fórma de testar.
Com o testamento de mão comnum que, se não era fundado em
lei, estava na praxe de seculos, acabou tambem o codigo e a con-
tento de todos, por ser impossivel conciliar o principio da revoga-
bilidade, essencial ao testamento, com o contracto de honra que tal
testamento representava, e por não auctorisarem nem a moral nem
o direito uma iostituição em que o contestador sobrevivo alterava
depois a seu arbitrio as disposiçães consignadas no testamento de mão
commum sem o prenderem quaesquer pactos de lealdade feitos com
o predefuncto.
Tambem não admitte o codigo, como já não admittia o projecto
primitivo, porque nem hoje teria razão de ser, o testamento feito
em tempo de peste, reconhecido no nosso velho direito.
Contra a eliminoção d'esta fórma especial de testar reclamou o
dr. Paes, de Coimbra, com o fundamento de ter sido Portugal atacado
por differentes vezes de peste, do cholera e da febre amarella, e
de se haver estabelecido em muitas povoaçòes tanto medo de che-
gar aos doentes atacados da molestia que difficil seria reunir o nu-
mero ordinario das testemunhas para o testamento.
Respondia-lhe, porém, o sr. Seabra que esta necessidade estava
satisfeita nos artigos 2094." e 2095.0, que eram inadmissiveis testa-

e'.
428 ARTIGO 1911.-

mentos com menores garantias, que era menos mal deixar as heran-
ças á ordem legitima do que sujeitai as a fraudes e a usurpações, que
os interessados podiam prevenir-se com tempo, e finalmente que a
lei não era feita para os que dormiam.
Acabou tambem o coligo, artigo 5.o da lei de 1 de julho de 1867,
com o privilegio por el-rei D. Manuel dado ao cura da egreja do
hospital de S. José de fazer os testamentos dos doentes como ver-
dadeiro tabellião publico e com a assignatura de tres testemunhas
porque tacs funeções não passaram para o tabellião privativo do
hospital e escrivão tambem da tomada de contas dos legados pios
não cumpridos na comarca de Lisboa a que se refere o artigo 5.- do
decreto de 5 de novembro de 1851 confirmado pela carta de lei de
1 de junbo de 1853, por ser tabelliào só para os negocios em que o
hospital é parte principal estipulante, nos quaes poderá usar de signal
publico.
Continuaram, porém, mesmo depois da promulgaçio do codigo a
servir de tabelliies os escrivães das camaras municipacs conforme
o decreto de 9 de janeiro de 1832 nas escripturas em que as mes-
mas camaras são partes principaes estipulantes ou aceitantes, o
escrivão contador da fazenda do hospital das Caldas da Rainha con-
forme o alvará de 20 de abril de 1875 nas escripturas, arrendamen-
tos, aforamentos e arrematações do mesmo hospital, e o respectivo
secretario geral dos ministerios confórme a organisação das secreta-
rias d'estado nos contractos com o governo, como continuam depois
do decreto de 14 de setembro de 1900 que no artigo 1." § 2.- mantem
annexa aos empregos de notario as funcções notariaes que pela le-
gislação anterior eram inherentes a empregos estranhos á escriva-
nia.
Mas nenhum d'estes é tabellião senão para aquelles effeitos espe-
ciaes e determinados.

SUB-SECCIO 11

Do testamento publico

Art. 1911.° 0 testamento chama-se publico, quando é


escripto por tabellião no seu livro de notas.
Nio basta ser lido ao testador e ás testemunhas, para dizer-se
publico, o testamento. Para ser publico ha de ser tambem feito por
tabelliio, ou notario como hoje se diz, no seu livro de notas, e no
districto do seu odicio.
A competencia dos odiciaes de fé publica é restricta aos actos pra-
eticados dentro do seu districto, o que não impede os interessados
de lavrar os seus contractos e mais actos juridicos perante tabelliào
extranho á localidade, em territorio da sua jurisdicçáo por terem
n'elle mais confiança, ou por qualquer outra circmstancia.
É tabellião ou notario e olbcial publico encarregado de lavrar e
r
ARTIGO 1911.0 429
de authenticar os contractos e mais actos juridicos, ou o olicial com-
petente para todos os actos extrajudiciaes que para fazer prova
precisam de authentiridade.
Exercem ea toda a sua plenitude as funeções de notarios pro-
priamente dietos os ajudantes dos notarios, e os funecionarios que
na falta ou impedimento simultaneo do notario e do seu ajudante
estiverem servindo o cargo por nomeação quer do juiz de direito
quer do presidente da PRelaçào artigo 87. do decreto de 14 de setem-
bro de 19100.
Accummulam as funeçòes do tabellionato com as do seu cargo os
escrivies dos juizes de direito fóra de Lisboa e do Porto, e os es-
crivàes dos julgados municipaes e dos distrietos de paz e mais em-
pregados comprehendidos nos artigos 94., 95.', 96., 97.- e 100.- do
decreto de 14 de setembro de 1900.
Este decreto deixou de pé o artigo 142" da novissima reforma
judiciaria que tambem não tinha sido revogado pelo codigo civil
que uio tocra na organisaçào do tabellionado , o qual dava fun-
cções de tabelliâes aos escrivàes dos juizes de paz, mas só fóra de
Lisboa e Porto, e só j)ara o acto de approvaçâo dos testamentos cer-
rados.
O testamento publico e o auto de approvaçâo do testamento cer-
rado devem reunir, além dos requisitos communs ao documento au-
thentico extraolicial, todas as declarações e formalidades prescri-
ptas na lei civil decreto de 14 de setembro de 1900 artigos 70.'
e 71.0, e hlo ele ser sempre escriptos pelo punho do notario quando
todos os outros documentos authenticos extraofficiaes podem ser
escriptos pelos seus ajudantes ou amanuenses citado decreto ar-
tigo 72
Além d'isso são obrigados a sllo. tabella n. 1 classe 13 verba
194 e classe 14.' verba 235, das tabellas anuexas á lei de 29 de julho
de 1899, como a sêllo estilo sujeitos os livros de registo e os dos
autos de abertura e publicação dos testamentos citadas tabellas n.o 1
classe 1.° verba n.' 1.
Os notarios têem, pelo decreto de 14 de setembro de 1900 artigo
44., além de outros, os seguintes livros: de notas para actos e
contractos entre vivos, de notas para os testamentos publicos, e de
registo dos autos de approvaçào de testamentos cerrados, todos com
termos de abertura e encerramento assignados pelo respectivo juiz,
e rubrica de todas as folhas por elle tambem feita.
São considerados otficiaes dajustiça e como tae sujeitos â correição
dos juizes criminaes do distrieto em Lisboa e Porto e dos juizes de
direito respectivos nas outras comarcas do reino.
Com fundamento na tabella dos salarios e emolumentos judiciaes
de 30 de junho de 1864 artigo 81.0 e. 57.', e dela de maio de 1896
artigo 28.0 n.o 3.' já se julgou z que tambem os testamentos publicos
são incluidos na relaçào dos instrumentos que os notarios hão de
enviar mensalmente ao distribuidor do juizo ainda que sómente com
a nota do nome do testador.

t Accordào da Relaçào do Porto de 21 de junho de 1881, Direito,


16. anno, n.' 3, pag. 41.
' Accordào da Relação do Porto de 17 de maio de 1901, Revista
dos Tridanaes, 199 anno, no 456, pag. 383.

ýà
430 ARTIGO 1912.°

Mas semelhante jurisprudencia não póde manter-se depois do de-


creto de 14 de setembro de 1900 que não permitte artigo 77.' forne-
cer copias e certificados da eistencia do testamento em vida do tes-
tador senão a este ou a mandatario seu especial.
Insanavelmente nullo é o testamento que não for escripto em lio-
gua portugueza, tanto na disposição testamentaria, como no auto de
approvaçào, quando feito perante ofdicial portuguez, porque os docu-
mentos authenticos eatraofficiaes hão de ser escriptos em portuguez
decreto de 14 de setembro de 1900 artigo 74.°
Se algum ou alguns dos outorgantes não conhecer a lingua portu-
gueza intervirão interpretes, por rites escolhidos, que transmittirio
a declaração da sua vontade ao notario e a tradueçdo do documento
aos mesmos outorgantes, será acompanhado o original portuguez
de traducçào ou tradurções feitas pelos interpretes na lingua ou nas
linguas que os outorgantes faliarem, e serio escriptos o original e
a tradueçio ao lado um do outro, dividindo-se as paginas para este
effeito em columnas, e ambos serão assignados nos termos geraes,
artigo 74.' §§ do decreto de 14 de setembro de 1900.

Ari. 1912.° 0 testador, que quizer fazer testamento por


esta flrma, declarará a sua ultima vontade peratle qualquer
tabellião e cinco testemunhas idoneas.
(Vid. artigo 1751.')
Consagra o artigo mais uma vez o principio que o acto de testar
épessoal e não póde ser effectuado por iitermedio de outrem, e que
o testador ha de exprimir cumprida e claramente a sua vontade e
não por signaes ou monosyllabos em resposta a quaesquer pergun-
tas.
A declaraçâo da ultima vontade ha de ser feita pelo testador em
pessoa, em termos expressos e não por signaes ou por interrogações
de ,terceiro.
E, porém, valida a disposição testamentaria mesmo que o testa-
dor aio dicte o testamento, e responda apenas ás peiguntas do tabel-
liào, comtauto que não seja por monosyllabos a resposta, cimo io
são prejudicadas as disposições testametarias pelas deelaraçêes
do tabellião ou de outrem que tendam a esclarecer o testador, pois
que nada soffre a peruonalidadeda declaração com os esclarecimen-
tos ministrados ao testador no acto de testar para tornar mais clara
a sua vontade, comtanto que seja elle a dispôr e mão outrem a insi-
nuar-lhe a disposiçao.
Desde que o artigo no determina o modo como ha de ser feita a
declaraçâo, póde o testador dictar verbalente ou apresentar ao
tabellião qualquer apontamento escripto, sem necessidade de dietar
palavra por palavra na presença das testemuio:as, pois que decla-
rada pelo testador perante o tabellião e perante as testemunhas
a sua vontade está satisfeito o preceito da lei 1, que exige apenas
que o testador declare a sua ultima vontade perante qualquer ta-
belliio e cinco testemunhas idoneas.

t Accordào da Relação de Lisboa de 26 de agosto de 1885, Gazeta


da Relação de Lisboa, 1.' anno, n.^ 48, pag. 382.
rF
ARTIGO 1912.0 431

Ião é só diciando palavra por palavra que o testador pôde de-


clarar a sua vontade.
O apontamento escripto desde que o testador o reconhece como
expressão da sua vontade é verdadeira manifestação oral.
Tanto declara o testador a sua vontade, dictando de verbo ad ver-
bani, como dando o apontamento da sua disposição para o tabellião
o transcrever no livro das notas, e offerecendo depois o que alli está
escripto como seu testamento, ou ter na mão a minuta do testamento
e ir lendo e o tabellião redigindo.
Per outrem escrever o que elle diz ou escreve não deixa o testador
de declarar a soa vontade.
Nem o tabelliào é obrigado a servir-se exactamente das expressões
do testador. Pelo contrario deve proceder na redacção do testamento
como secretario intelligente, não prejudicando, porém, n'um apice
que seja, a manifestação de ultima vontade.
Tudo está em se accommodar a redacção do testamento á vontade
do testador e em se inteirarem as testemunhas da disposiçio tes-
tamentaria feita quer de palavra quer por escripto.
Com a leitura do testamento em voz alta e com a declaração do
testador perante as testemunhas de que aquella é a sua vontade, to-
das as faltas relativas é manifestação da vontade devem reputar-se
sanadas.1
Para a esbstancia e essencia do acto é indifferente declarar o tes-
tador a sua vontade por palavra ou por escripto.
Mas como do rigor da letra possa inferir-se que o testador deve
dictar verbalmente o testamento, e como já fosse julgado nullo um
testamento feito por apontamentos em vez de ser dictado de verbo
ad verbom perante as testemunhasm, cumpre ao tabelliào exigir do
testador que de viva voz, sem embargo de quaesquer apontamentos
por escripto, lhe declare e ás testemunhas as ultimas determinações
da sua vontade.
As clausulas ad cautelam como outrora se dizia, isto é, as declara-
ções do testador de não reconhecer como expressão da sua vontade
qualquer testamento posterior, o que equivaleria a revogar no mesmo
acto qualquer outra disposição posterior ou a renunciar de facto á
alteração do testamento, nunca foram recebidas no nosso direito
que sempre julgou sufliciente o testamento cerrado contra as sugges-
tles e pressões extranhas.
Quatro testemunhas sémente exigia o projecto primitivo no ar-
tigo 2049.-, correspondente ao artigo 1912. do codigo, e por isso
se contentava no artigo 2052.^ correspondente ao artigo 1915.0
só com a assignatura de duas por extenso.
A commissão revisora, porém, logo nos trabalhos da primeira re-
visão emendou aquelle preceito nos termos que hoje se encontram
no codigo.
Tanto no corpo do testamento publico como no auto de appro-
vação do testamento cerrado é preciso declarar os nomes por inteiro
das testemunhas instromentarias, o estado, a profissão, e a morada,

t Accordio do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de novembro


de 1893, Gazeta da Relação de Lisboa, 7.' ano, n.° 50, pag. 395.
2 Accordão do Suprenso Tribunal de Justiça
2 3
de 20 de março de
1891, Boletio dos Tribunaes,6. anuno, n.-. 4 , pag. 386.

'.5-
482 ARTIGO 1913.0

decreto de 14 de setembro de 1900 artigo 69.- n. 3.-, o que a lei


anterior não exigia 1; e ao tabellião cumpre exarar todas as circum-
stancias necessarias para não vir em duvida a identidade das teste-
munhas.

Art. 1913.° Tanto o tabellião como as testemunhas de-


vem conhecer o testador, ou certificar-se, por algum modo,
da sua identidade, e de que o mesmo testador estava em
seu perfeito juizo, e livre de toda e qualquer coacção.
Escusada era a providencia especial para o tabellião se certificar
da identidade do testador, e declarar o dia, mez, anuo e logar em
que foi feito o testamento publico, ou lavrado o auto de approvaçào
do testamento cerrado, porque essa obrigaçào é commum a todos
os documentos authenticos artigo 2495.° n" 3r e 6.0
Quiz, porém, alei que nos testamentos não só se certificassem tes-
temunhas e tabelliio de que o testador estava em seu perfeitojuizo
e livre de toda e qualquer coacção, mas tambem que d'esta circum-
stancia se fizesse especial menção.
Se não for em nome do tabellião e das testemunhas conjunctamente
a declaração da identidade do testador e de que estava em seu per-
feito juizo e livre de toda e qualquer coacção, é nullo o testamento;
e não pôde ser depois supprida semelhante falta pela prova teste-
munhal. '
Hão de certificar-se conjunctamente as testemunhas e o tabellião
porque o artigo exige estas duas garantias, e nio uma só, para
assegurar a identidade, e o estado de juizo e de liberdade do testa-
dor. 3
Pôde certificar-se o tabellião pelas testemunhas ou as teste-
munhas pelo tabellião, ou o tabellião e as testemunhas por terceira
pessoa.
Fica á sua prudencia o modo como hão de certificar-se.
Esta doutrina é applicavel, não só ao testamento publico, senão
tombem ao testamento cerrado, pois as palavras do 0.- 5. do artigo
1922.', que o testador foi reconlecido, em vez das palavras que elle
tabellido o reconheceu, não deixam duvida de.que tambem no auto
de approvaçio do testamento cerrado o tabelliào deve certificar tanto
em nome das testemunhas como no seu, que o testador era a propria
pessoa e estava em seu perfeito juizo e livre de coacção.
Não exclue, porém, prova em contrario a declaração do tabellião
por si e pelas testemunhas de estar em seu perfeito juizo o testa-

1 Accordão da Relação de Lisboa de 25 de junho de 1891, Gazeta


da Relação de Lisboa, 5. anno, n. 45, pag. 357.
3 Accordãos, do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de agosto
de 1886 e de 20 de março de 1891, e da Relação de Lisboa de 28
de fevereiro de 1896, Boletim dos Tribunaes, 2.° sano, n. 72, pag.
467, e 6.° anno, n.0 243, pag. 386, e Revista dos Tril unaes, 14.' anno,
no 332, pag. 311.
3 Accordão do Supremo0 Tribunal de Justiça de 14 de junho de
1881, Direito, 13 ano, n. 29, pag. 450.
r
ARTIGOS 1914.o a 1915.- 438

dor 3 por nio ter caracter de authenticidade a affirmação que se


resume em aventar juizos e não em constatar factos.
O tabelliào e as testemunhas instrumentarias têem valor incon-
troverso nas declarações sobre factos que càem sob a acção dos
sentidos, sobre o que viram e sobre o que ouviram, mas não sobre
factos do espirito, que escapam muitas vezes á acção dos sentidos
externos.
O tabellião só pôde portar por fé o que vê ou o que ouve, e não
apreciações meramente subjectivas.
Podem o tabelliào e as testemunhas afirmar que na sua presença
se exprimiu com inteira liberdade o testador, mas não podem com a
mesma segurançaasseverar que elle não veio fazer a disposição com
receio de males futuros, ou que não está, no acto mesmo de testar,
sob uma pressão violenta, que, como facto psychologico, escapa
facilmente á observação exterior.
Esta jurisprudencia é e foi sempre corrente.
Hão de as testemunhas ver e ouvir o testador, aliás não podem
testemunhar nem sobre a identidade da pessoa nem sobre a verdade
da disposição, sem que todavia importe nullidade o fazer o testa-
mento em quarto diverso d'aquelle onde estava o testador em razão
de ser gravissimo o seu estado com tanto que seja lido ao doente
e ás testemunhas.3
Pelo projecto primitivo §§ I. e 2.- do artigo 2050.0 corresponden-
tes ao artigo 1913" do codigo, e artigo 2061.- que se seguia ao ar-
tigo correspondente ao artigo 1923.0, não podendo verificar-se a iden-
tidade do testador pelo tabellião e pelas testemunhas, declarava o
tabellilo esta circumstancia tanto no testamento publico como no
testamento cerrado e acerescentava todos os signaes caracteristicos
do testador, devendo, porém, ser escripto e assignado o testamento
cerrado pelo testador na presença do tabelliào e das cinco testemu-
nhas, e ficando ainda assim dependente a validade d'elle da verifi-
cação da identidade do testador.
Foi, porém, eliminado tal preceito logo nos trabalhos da primeira
revisão com relação ao testamento publico.

Art. 1914. A disposição será datada, com a indicação


do logar, dia, mez e anno, escripta, e lida em voz alta, na
presença das mesmas testemunhas, pelo tabellião, ou pelo
testador, se o quizer, e assignada por todos.
Art. 1915.1 Se alguma das testemunhas não souber es-
crever, fará o seu signal; mas é indispensavel, que tres
testemunhas assignem com o seu nome por extenso.

SAceordãos da Relação de Lisboa de 29 de agosto de 1885 e de


13 de março de 1886, Gazeta da Relação de Lisboa, 1. anno, a.o 37,
pag. 294, e n.^ 83, pag. 620.
2 Accordâo do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de agostode
1587, Boletim dos Tribnaes, 2. anno, n.. 76, pag. 525.
3 Accordáo da Relação do Porto de 20 de dezembro de 1892, Re-
vista dos Tribnsaes, 12.° anno, n. 286, pag. 345.
Too EIU 28
434 ARTIGO 1916.0

Art. 1916.° Se o testador não souber, ou não podér es-


crever, o tabellião assim o declarará; devendo, neste caso,
assistir á disposição seis testemunhas, qualquer das quaes
assignará a rogo do mesmo testador.
A leitura é o primeiro de todos os requisitos para verificar no
testamento as manifestações da vontade do testador.
A leitura com quanto só se exija expressamente nos testamentos
e nos assentos do registo civil artigo 2447.^ tambem não pôde dis-
pensar-se nos outros documentos, coso a unica differença de que
n'estes a falta de menção da leitura não importa nullidade.
A leitura quer do testamento publico quer do instrumento de appro-
vaçio do testamento cerrado ha de ser feita sempre em voz alta.
Ler rm voo oltur não é ler só para si, é ler para que todos ouçam,
testador e testemunas.
Ou leia o testador, ou leia o tabelliào, ou leia outrem pelo testa-
dor, não ha de ser a leitura só para o que lê, loa de ser em voz alta
para ser ouvida por todos, testador, tabelliào e testemunhas, e na
presença de todos ao mesmo tempo, pois não deve ler-se a uns e
depois a outros, o que oio obsta todavia à susprnsos da leitura por
qualquer incidente até estarem todos presentes e perante todos poder
fazer-se de novo a leitura desde o principio até o fim.
As palavras- -que foi lido em coz alta-não sito sacramentues,
podem ser substituidas por outras, que enunciem claramente a cir-
cumstancia de terem ouvido todos a leitura do testamento publico ou
do instrumento de approvaço do testamento cerrado.
A declaraçào de ter sido feita a leitura em presença do testador
e das testemunhas equivale à declaração de ter sido lido em voz alta
o testamento porque a leitura em presença do testador e das tes-
temunhas, se não for em tou que cies ouçam, não é leitura.
Ha de designar-se o logar para verificar se o oficial publico estava
dentro do circulo das suas attribuições; e ba de finalmente mar-
ear-se a data para se apurar se no momento tinha. o testador ca-
pacidade para testar, o tabelliào competencia para lavrar o testa-
mento publico ou o auto de approvaçào do testamento cerrado, e as
testemunhas idoneidade para o desemopenbo da sua missão.
São egualmente applicaveis as disposições dos artigost 1914. e
1915., quanto á data, leitora e assignatura do testamen o publico,
ao testamento militar artigo 1945? S 2', e as do artigo 1914.' ao
testamento maritimo artigo 1949.; e no póde dispensar-se o pre-
ceito do artigo 1913.' nos actos de ultima vontade qualquer que seja
a fórma do testamento.
Instando o dr. Paes para se cortar expressamente a duvida se era
ou não permittido assignar de cruz nos testamentos visto continuar
o projecto a admittir a assignatmra de cruz nos contractos, respon-
deu-lhe o sr. Seabra que a duvida estava resolvida nos artigos
2057.' e 2059.' (1920. e 1922.' do codigo).
Effectivamente nào é permittida ao testador a assignatura de cruz
ou de signal no testasseoto cerrado, como permittida não é, nem no
instrumento de approvaçào, nem no testamento publico, como resulta
das palavras do s unico do presente artigo ndo sabendo, e as do artigo
2463. ndo souber, pois que a assignatura de cruz todos sabem fazei-a,
podendo haver impossibilidade mas não ignorancia de fazer o signal
de cruz.
Assim a lei nova distinguindo entre saber escrever e saber assignar
rF ARTIGO 1916.- 485

e exigindo .a presença de seis testemunhas sempre que .o testador


não souber escrever, cortou a questão muito ventilada em direito
anterior sobre a validade da assignatura de cruz do testador no tes-
tamento, não lhe permittindo assignar senão cosa o nome por ex-
tenso.
O codigo só ás testemunhas permitte assignar de cruz ou com o
signal de que usarem.
A testeíunha póde assiguar de cruz. O testador não. 1
Nem com as inicias o testador póde assignar porque a lei manda
asssnar o testamento, e assignar é escrever o nome e os appellidos
e naso simplesmente as letras iniciaes.
As letras iniciaes podem significar muitos nomes differentes, e
facilitar assim a falsificação.
Nem o legislador poderia permittir a assignatura do testador só
com as iniciaes, quando exige que tres testemunhas pelo menos assi-
gnem com o seu nome por extenso.
E o tabellilio obrigado, como pelo codigo civil francez artigo
973o, a declarar a causa que impediu o testador de escrever quando
este não assignou, isto é, a declarar se o testador não assignou por
não saber ou por não poder.
A assignatura de cruz é o modo por que em regra assigna quem
não sabe escrever, o que nóo obsta a que a testemunha se sirva de
outro signal, se outro tiver por costume usar, e até o signal do uso
dá mais garantias de verdade.
A introducção da assignatura de signal é uma innovoção impor-
tante do direito moderno. O direito velho não admittia assignatura
senão de nome ou de cruz.
E, porém, nuilidade substaucial deixar de fazer o seu signal a tes-
temunha quando não souber escrever, 2
Por direito anterior bastava a assignatura de cruz quando as tes-
temunbas não sabiam escrever, Ord. liv. 4.: tit. 80.;
Salvam-se, porem, da nullidade pela disposição do artigo 1762.:
os testamentos anteriores á promulgação do codigo em que todas as
testemunhas assignarmn de cruz.
A assignatura por extenso contrapóe-se á assignatura de signal,
isto é, significa a obrigação de escrever o nome e todos os appellidos
e a prohibiçâo de abreviaturas.
Desde que o testador nào saiba ou não possa escrever, ha de in-
tervir mais uma testemunha, ainda que o testador saibapintar o seu
nome, e effectivamente o pinte no testamento.
Não é nullidade a assignatura com a alcunha em logar do appel-
lido, porque fica do mesmo modo verificada a identidade do testador
ou das testemunhas, com quanto ajurisprudencia das cautelas acon-
selhe a escrever com os appellidos e com a alcunha.
Não se annulla tambem o testamento por não ser bem legivel a
assignatura do testador feita em presença das testemunhas e do ta-

1 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de novembro


de 1888, Jdeutimi dos Tribunaes, 4.° auno, n.o 142, pag. 178.
Y Accordão da Relaçôo de Lisboa de 11 de fevereiro de 1888,
Gazeta da Relação de Lisboa, 5 anuno, u.° 42, pag. 329.
s Accordão do Supremo Tribunal de Justica de 22 de julho de 1890,
Boletim dos Tribunaes, 5.: anno, n. 215, pag. 645.

a~.
486 ARTIGO 1917.·

bellião, salvo se a pretendida assignatura aceusar ignorancia de es-


crever.
Ás testemunhas só é permittido fazer o signal quando não souberem
e não quando não podérem escrever, e raro será o caso de estarem
imposibilitadas de escrever o seu nome sem estarem impossibilita-
das de fazer o seu signal e mesmo de concorrer ao acto teotamenta-
rio.
No entretanto como póde dar-se o caso de-estarem inhibidas de
assignar por não poderem escrever, conveniente será declarar o ta-
bellião se a testemunha não assignou com o seu nome por extenso
por não saber ou por não poder escrever.
Por direito anterior a testemunha que assignava pelo testador de-
via declarar que assignava por mandado d'elle, por elle não saber
ou não poder assignar; e mesmo que declarasse que assignava pelo
testador, se não especificasse se era por elle não saber ou por não
poder havia nullidade insanavel conforme a Ord liv. 4.° tit. 80.-
. e assentos posteriores, sem que semelhante falta podesse ser
supprida pela declaraçào do tabellião.
Eram muito terminantes os preceitos dos assentos de 17 de agosto
de 1811 e de 10 de junho de 1817, para sobre elles prevalecer a opi-
nião dos que sustentavam que a declaração de tabelliào não só sup-
pria, mas merecia ainda mais fé do que a da testemunha, sem atten-
tarem em que a lei havia marcado ao tabelliào e ás testemunhas
attribuiçZes differentes, que as illações dos interpretes não podiam
alterar.
No entretanto já com relação ao direito velho se julgou ' supprida
a falta de declaração do motivo da assignatura -a rogo-pela de-
claração do tabelliào no instrumento de approvação com o funda-
mento de não ter a declaração do tabelliào menos authenticidade
do que a da testemunha.
Hoje, porém, não tem a testemunha que fazer declaração alguma
em seguida á sua assiguatura; porque não é á testemunha que assi-
gna a rogo, e sim ao tabelliào, que incumbe declarar se o testador
não assignou por não saber ou por não poder.
Basta a assignatura de ires testemunhas com o nome por extenso
mesmo no caso de ser o testamento assignado por seis, posto que
o codigo pareça exigir a assignatura por extenso da maioria das
testemunhas, e posto que a sexta testemunha represente a assigna-
tura do testador que não póde ser de cruz nem no testamento pu-
blico nem no auto de approvaçào do testamento cerrado, porque
o codigo não exige expressamente que, sendo seis, quatro assignem
o seu nome por extenso.

Art. 1917.0 Quem for inteiramente surdo, mas souber


ler, deverá ler o seu testamento; e, se não souber ler, de-
signará a pessoa que o ha de ler em seu logar, sempre na
presença das testemunhas.

' Aecordãos, da Relação do Porto de 4 de julho de 1873 e do Su-


rremo Tribunal de Justiça de 2 de julho de 1875, Reuista de Legés-
ação e de Jurisprudencia,de Coimbra, 5.° anuo, n.- 375, pag. 167.
Fr a

ARTIGO 1918.- 437

A leitura por terceira pessoa s só admissivel verificadas cumu-


lativamente as duas circunstancias de ser inteiramente surdo e de
não saber ler o testador.
O antigo direito romano privava absolutamente da testamenti-
facção os surdo-mudos até que Justiniano lhes permittiu testar uma
vez que podessem expressar claramente a sua vontade, quer por
palavra quer por escripto.
Posto que n'essa epocha não houvesse escolas como as modernas
para o ensino dos surdo-mudos podia dar-se o caso de saber ler e
escrever o surdo-mudo por não ser de nascença o defeito e ter-lhe
pelo contrario sobrevindo já depois de saber ler e escrever.
Ao surdo, ainda que inteiramente surdo, é permittido o testamento
publico se sabe ler com a unica condição de fazer elle a leitura
ou de commetter a leitura a outra pessoa que não seja o tabellião
se não sabe, e por analogia se não póde ler, porque não seria facil
a combinação do tabelliào com o leitor para um não escrever o que
lhe fosse dictado e o outro não ler o que devesse estar escripto, e
com as testemunhas para certificarem como dicto pelo testador o que
um escreveu e o outro leu sem o testador aliás ter dicto o que se
leu e o que se escreveu, porque tudo ha de ser feito sesípre na pre-
sesça das testemsosus.
4 tabelliào que aliás é competente para escrever como particular
os testamentos cerrados e appproval-os depois como of icial publico,
não póde todavia ser encarregado nem da leitura do testamento
publico nem da leitura do auto de approvação do testamento cerrado
do surdo, que ha de ser feita por terceira pessoa se o surdo não
souber ler, como por terceira pessoa deve ser feita se elle souber
mas não podér ler.
No testamento do surdo é incompativel a funeção de leitor com o
mister do tabellião, e talvez com o mister da testemunha porque a
leitura na presença das testemunhas poderia levar á conclusão de que
o leitor é pessoa differente das testemunhas.
Não deve, porém, considerar-se nullidade a leitura feita por alguma
das testemunhas, uaa vez que seja indicada pelo testador, visto não
estar essa nullidade expressamente cosninada na lei.
Pelo artigo 75." do decreto de 14 de setembro de 1900, que dispòe
para todos os instrumentos publicos, quando for inteiramente surdo
um dos outorgantes, mas souber e podér ler, deve ler o documento
em voz alta, e não sabendo ou não podendo fazer a leitura, designará
quem o ha de ler em seu logar, na presença das testemunhas, fa-
zendo-se de tudo menção. O surdo ou surdo-mudo, que souber e podér
ler ou escrever, deve declarar por escripto no documento antes das
assignaturas, que o leu e reconheceu conforme á sua vontade.
Pelo mesmo artigo § 2.o quando for cego um dos outorgantes será
o documento lido sempre duas vezes uma pelo notario e outra pela
pessoa que o mesmo outorgante designar fazendo-se de tudo men-
ção.
O surdo só está sujeito ao regimen excepcional do artigo quando
for inteiramente surdo, porque se alguma scosa ouvir fica sujeito ás
regras geraes dos que ouvem e falam.

Art. 1918.0 Todas estas formalidades serão practicadas


em acto continuo, e o tabellião portará por fé, como todas
foram cumpridas.

1
r

438- ARTIGO 1918.

A prohibição de interromper a prática das formalidades legaes,


quer no testamento publico quer no instrumento de approvaçào do
testamento cerrado, não prejudica a faculdade de interromper o
testamento para satisfazer a alguma necessidade imperiosa do tes-
tador, do tabelliào ou das testemunhas, pois que para isso até se
interrompe a audiencia crime que tambem por lei deve ser con-
tinua, Nov. Ref. Jud. artigo 1086.-
As palavras acto continuo do artigo, traducçlo das latinas uno
conextu do § 3.- livro 2.? titulo 40." das Instituta de Justiniano,
significam apenas que em acto tão serio como a feitura do testa-
mento não póde intercalar-se qualquer outro serviço, como uma
escriptura ou um outro testamento, etc, e tanto que já se julgou t
valido um testamento em que uma das testemunhas saio, a vêr a
mãe moribunda, depois de concluido e lido o instrumento quando a
primeira testemunha estava para assignar, e veio depois assignar.
Esta unidade de tempo e de acção explicava-a nos seguintes ter-
mos a lei 21 § 3.' Dig. Qui testamenta aicere possut : «Uno contextu
actuos testari opportet: est ontem uno contextu nullm actum alienm
testamento intermiscere,quod si aliquidpe-rtinensadtestamerntms facial,
testamentum non viciatur».
A uniddade de contexto, de tempo, e de logar, isto é, a exigencia
da feitura do testamento uno eonlextu, ano eodem que die, et in eodem
loco, ainda poderia ter cabimento especial em Reoa onde o testa-
mento foi a principio considerado instituição politica.
Mas ahi mesmo já se transigia quanto ao primeiro requisito pois
que nos ultimos tempos já em Reina se toleravam interrupções mo-
tivadas por incidentes passageiros.
A lei 28 Cod. De testamenlis et uemuctodrrum testamenta ordinamtur
enumerava casos em que podia suspender-se momentaneamente o
auto de approvação do testamento cerrado sem d'ahi advir nulli-
dade ao testamento, como por serem obrigados o testador ou alguma
das testemunhas ou o tabellião a sair para satisfazer a qualquer
necessidade da natureza, ou por ser necessario dar repouso ao tes-
tador enfermo ou ministrar-lhe algum medicamento.
Não é formalidade essencial á validade do documento a falta de
declaração da feitura do testamento em acto contínuo; porque a lei
impõe ao tabellião o dever, não de certificar que foram praticadas
em acto sorttiooo todas as formalidades legaes, mas sim o dever de
certificar terem sido cumpridas todas depois de as especificar.'-
Mandar praticar todas as formalidades em acto continuo ou sem
interrupção não é mandar portar por fé que foram praticadas em
acto continuo, com quanto na pratica para evitar duvidas os tabel-
liàes tambem isto certifiquem, e devam continuar a certificar.
Não exigia a feitura do testamento publico em acto contínuo a
nossa lei antiga, Ord. liv. 4.° tit. 80.°
Foi o assento de 10 de junho de 1817 a primeira providencia por-

1 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de julho de


1884, Revista de Lrgisl,:ço e de Jurisprudencia,de Coimbra, 28.0
anno, n.^ 1302, pag. 281.
D Accordão da Relação do Porto de 5 de fevereiro de 1878, Revista
da Legislação e de Jurisprodencia,de Coimbra, 15.^ atino, n." 731,
pag. 43.
Ir
ARTIGO 1919.- 439.

tugueza que ordenou a presença das testemunhas a todo o acto


desde o seu principio até o ßim.
Uma vez especificadas no corpo do instrumento as soleímidades
legaes, corno já dispunha o assento de 10 de junho de 1817, não
é preciso reproduzil-as outra vez no fecho do auto ao portar por
fé que todas foram satisfeitas.
O artigo 972.° do codigo civil francez, fonte do presente artigo,
conclue nos seguintes termos: «Il est fait di- tout todion expresse»;
e a jurisprudencia dos tribunaes francezes impte ao tabellião o dever
de relatar o effectivo cumprimento de cada uma das formalidades exi-
gidas pela lei.
Seria preferivel reputar cumpridas as formalidades prescriptas na
lei para a validade dos testamentos, sempre que do proprio testa-
mento se evidenciasse o seu cumprimento, ainda que d'isso se não
fizesse declaração expressa.
Mas não o permitte o codigo.

Art. 1919.0 Faliando alguma das sobredictas formalidades,


ficará o testamento sem eifeilo, mas será o tabellião res-
ponsavel por perdas e damnos, e perderá o seu officio.

(Vid. artigos 19256., 1947. e 1960.')


A falta de algsma das solemnidades reputadas essenciaes, quer
no testamento publico quer no auto de approvação do testamento
cerrado, annulla irremissivelmente a disposição testamentaria, ar-
tigo 19256:
Na disposição irritante dos artigos 1925., 1947. e 1960.° com-
prehendem-se não só as formalidades que têem de ser praticadas
por tabellião senão tambem algumas de obrigação do testador; nem
a epigraphe da sub-secçiio-do testamento cerrado-permitte dis-
tinguir.
Assim a falta de assignatura ou de rubrica nos termos do artigo
1920.' é nullidade tão substancial como as faltas mencionadas no
artigo 1922w
O legislador sempre que em materia testamentaria quiz dispen-
sar alguma ou algumas das formalidades que especificára disse-o
expressamente como no caso do j2.o do artigo 1922.°
Só os testamentos militar e maritimo é que escapam iquelle ful-
minante preceito do artigo, e só no caso de não estar especialmente
considerada insanavel a falta da soleamidade artigos 1947.' e 1960.;
e mesmo essas formalidades, csja omissão não importa nullidade,
são verdadeiramente extranhas ao acto testamentario propriamente
dicto porque respeital principalmente á guarda e á publicação da
disposição de ultima vontade.
No testamento publico como no auto de approvaçhs do testamento
cerrado, a nullidade do acto juridico importa tambem a perda do
oflicio e a responsabilidade do tabellião por perdas e darnos, o que
não acontece ao escriptor do testamento militar e maritimo.
Com o tabellião levou o codigo o rigor ao extremo limite, não
se contentando só com a nullidade do acto juridico, porque o tabel-
lido pelo seu caracter de oiçd jubico tem outra obrigação de co-
nhecer as disposições da lei do que o escriptor do testamento mili-
tar e maritimo.
Decretou a perda do oficio e a responsabilidade do tabellião por

L
440 ARTIGO 1919.*

perdas e damnos, de que nem a mais reconhecida boa fé o póde salvar


posto não devesse impõr-se pena a tabelliào que não teve culpa, culpa
ubi non eril non pena esse debel, como já diziam as leis romanas, res-
ponsabilidade que vae até os herdeiros mas que não abrange as
testemunhas.
A perda do officio tanto póde ser decretada na causa de nulli-
dade do testamento se para ella o tabelliào tiver sido citado, como
em causa criminal, como em processo separado contra o 'abellilo
depois de julgado nullo por sentença o testamento.
Pelo decreto de 14 de setembro de 1900 sãó civilmente re iponsa-
veis os notarios, não só nos casos especificados no artigo 48.° mas
tambem quando a responsabilidade civil for connexa com a respon-
sabilidade criminal artigo 49.'; consiste a responsabilidade civil na
indemnisaçào de perdas e damnos, arbitrada pelos tribunaes com-
petentes artigo 51.-, e prescreve por tres annos quando não for
connexa com a responsabilidade criminal, contando-se o praso nos
termos do artigo 1967.0 do presente codigo, artigo 54.'
Na prática têem sido admittidas a depõr nas questões de falsi-
dade as testemunhas instrumentarías contra o que assignaram, e
até o escriptor do documento t, ou por ser o seu interesse muito
diverso do interesse directo na ceusa, ou por serem signatarias do do-
cumento artigo 2433.', ou finalmente meio de prova contra a argui-
çào de falsidade.
Em artigo nenhum o codigo manda portar por fé no auto de appro-
vaçào do testamento cerrado, como no testamento publico, que todas
as formalidades na lei prescriptas foram cumpridas, nem tal decla-
raçio tambem exige no auto de approvaçào do testamento cerrado o
codigo civil francez, que aliás no artigo 972.0 manda fazer decla-
ração expressa de terem sido cumpridas no testamento publico todas
as formalidades legaes.
No entretanto boa cautella será declarar tambem no instrumento
de approvaçio do testamento cerrado que foram cumpridas em acto
contínuo todas as formalidades legaes, visto terem de ser especi-
ficadas no instrumento de approvaçào do testamento cerrado, como
no auto do testamento publico.

r Accordãos da Relação do Porto de 16 de dezembro de 1881, de


23 de março de 1892, e de 28 de maio de 1901, Direito, 15.° anno,
n.° 9, pag. 144, e Revista dos Tribunaes, 11.° anno, n.0 244, pag. 54,
e 20.' anuo, n.° 457, pag. 4.
r

ARTIGO 1920.- 441

sUB-seCCÃo III

Do testamento cerrado

Art. 1920.° 0 testamento cerrado pôde ser escripto e


assignado pelo testador, ou por outra pessoa a seu rogo,
ou ser escripto por outra pessoa a rogo do testador e por
este assignado.
§ unico. A pessoa, que assignar o testamento, deve ru-
bricar todas as folhas d elle. 0 testador só pôde deixar de
assignar o teslamento, não sabendo, ou não podendo fazel-o,
o que no mesmo testamento será declarado.
Pôde ser escripto em caracteres imitativos de letra de imprensa
o testamento cerrado mas não póde ser impresso, porque a impres-
são tirar-lhe-ia o cunho individual de ter sido escripto por deter-
minada pessoa.
O testamento cerrado pôde -ser escripto e assignado pelo testa-
dor-ser escripto e assignado por terceiro a rogo do testador-e
ser escripto por terceiro e assignado pelo testador-.
Por melhor que saiba cacrever pôde o testador mandar escrever
por outrem o seu testamento. De o assignar,porém, em caso algum
é dispensado, salva a impossibilidade absoluta de escrever por não
saber ou por não poder, e fazendo-se d'esta impossibilidade decla-
ração expressa no mesmo testamento.
Por direito anterior, Ord. liv. 4.o tit. 80.o 1.0, bastava ser escripto
pelo testador o testamento ainda que por elle não fosse assignado; e
pela praxe do fôro podia ser assignado por terceiro tauto o testa-
mento como o auto de approvação logo que o testador o não assi-
gnasse, ou por não saber ou por não poder, posto que a Ordenação,
que aliás permittia a assignatura do auto de approvação por uma
das testemunhas não sabeodo ou não podendo o testador assignar, sé
permittisse a assignatura do testamento por terceiro não sabendo o
testador assiguar.
Não exige o codigo declaração de ter sido lido pelo escriptor o
testamento ao testador quando escripto por terceiro, nem do nome
que o escreveu e assignou a rogo, porque tudo isso é substituido pela
declaração do testador perante o tabellrão e as testemunhas.
A confiança absoluta que o testador depositou em quem lhe es-
creveu o testamento com a declaraçio no acto da apresentação de que
está alli a disposição da sua vontade é sufilciente garantia de que
o papel encerra a sua ultima vontade.
Não é nullo o testamento cerrado, em que por descuido do tabel-
lião o instrumento de approvação ou o involucro tem data anterior
á do mesmo testamento, porque a data authentica do testamento
é a do instrumento de approvação contra a qual é inadmissivel o
depoimento de testemunhas, salvo o caso de falsidade.
Aobrigação de rubrica de todas s folhas do testamento cerrado
442 ARTIGO 1920.

por quem o assignou, quer tenha sido assignado pelo testador quer
por terceiro t não abrange a pagina onde estiver a assignatura do
testador ou de quem a seu rogo assignou, visto valer mais a assi-
gnatura do que a rubrica; e até poderia dispensar-se a declaração
da rubrica desde que as paginas do testamento estivessem rubrica-
das, porque os factos falíam mais alto do que as palavras.
No entretanto a verdade é que o artigo não dispensa de rubrica
nem a folha onde está a assignatura, que já se julgou nullo um tea-
tamento escripto em uma só pagina por lhe faltar a rubrica do signa-
tario 2, e que o artigo 2057. do projecto primitivo, correspondente
ao artigo 1920. e § unico do codigo, já dizia .0 testamento cerrado
póde ser escripto pelo testador, ou por outra pessoa, a seu rogo,
mas será sempre rubricado, numerado e assignado pela pessoa que
o escrever».
Não pôde ser rubricado por terceiro o testamento lue o testador
ainda assignou mas já nâo póde rubricar, apesar de muitos sus-
tentarem que, valendo o testamento com a assignatura e rubrica de
terceiro quando o testador o no póde assignar e rubricar, por iden-
tidade ou por maioria de razão deveria valer quando o testador
o assignou e já o não póde rubricar. Se o testador não teve já
tempo para rubricar, tambem não teci tempo para assistir á appro-
vação do testamento que é posterior á rubrica.
É corrente que, fallecendo o testador antes de satisfeitas todas as
formalidades que a lei exige, é sem effeito o testamento por não
chegar a completar-se em sua vida o acto juridico.
Pelo codigo como era já por direito antigo assento 4. de 23 de
julho de 1811, pôde o proprio tabelliào escrever o testamento como
pessoa particular a rogo do testador3, e approval-o depois como pes-
soa publica, sem embargo de não o poder ler artigo 1922.» quando
lhe é apresentado na sua qualidade de oficial publico para lavrar
o instrumento de approvaçào; como por testemunha instrumentaria
póde ser escripto o testamento cerrado, e até pelo herdeiro ou pelo
legatario, com a unica diferença de ficarem sem effeito os benefi-
cios dispensados ao escriptor da disposição testamentaria.
Já a Ord. liv. 4.1, mencionando no titulo 85.0 as pessoas que não
podiam ser teste-munhas nos testamentos, não excluia o escriptor
do testamento cerrado, quando este não tinha sido instituido her-
deiro pelo testador.
Em direito anterior chegou a julgar-se 4 valida a disposição em
testamento cerrado a favor do proprio herdeiro ou legatario que o
tinha escripto, com o fundamento de não haver lei que o prohi-
bisse, de só ter ficado de pé pelo decreto de 17 de julho de 1778
o ! 18.» do alvará de 25 de janeiro de 1776. que no 1.» irrogava nulli-
dade ao testamento cerrado escripto pelo herdeiro instituido, e de

r Accordão da Relação do Porto de 27 de abril de 1877, Direito,


9.° anno, n" 20, pag. 315.
2 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de maio de 1881,
Direito, 13.» anno, nS 19, pag. 297.
3 Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 dejulho de 1884,
Boletim dos Tribuae, 1. anno, 11.- 7, pag. 103.
4 Acordáo da Relação de Lisboa de 2 de maio de 1874, Direito,
6.» anno, n.° 27, pag. 428.
ARTIGO 1921.' 443

só começar o acto solemne na declaração do testador que é aquelle


o seu testamento e não intervir d'ahi em desate o escriptor do tes-
tamento.
O que o tabellião não póde desempenhar cumulativamente são
as funeç5es de oficial publico e de testemunha.
Em todo o caso pelo codigo não é nullo o testamento em que for
contemplado o tabellião, as testemuehos ou o escriptor do testa-
mento, e apenas ineflikaz na parte em que os contempla artigos 1772.-
e 1773o

Art. 1921. 0 testador apresentará a qualquer tabellião


a sobredicta disposição, perante cinco testemunhas, decla-
rando como ella é a sua ultima voutade.

Pelo projecto primitivo artigo 2055?, correspondente, devia ser


apresentado o testamento cerrado pelo testador ao tabellião perante
duas testemunhas sendo escripto por elle, ou perante quatro sendo
escripto por outrem, e pelas emendas da commissão revisora perante
cinco testemunhas sendo escripto pelo testador, e perante quatro
sendo escripto por outrem.
Ei resposta iao dr. Paes que julgava inconvenientes taes inuova-
ções dizia o sr. Seabra:
«As razões que tivemos para esta innovação são as seg«intes: Se
o testamento é escripto pelo testador, são mais que sumcientes as
duas testemunhas e a fé do oticial publico. Se o testamento nào ó
escripto pelo testador, exigem se quatro testeanlhas, porque então
será mais facil a fraude. A dif'rença de uea testemunha nada si-
gnifica, e não convem multiplicar embaraços sem absoluta neces-
sidade.
.De resto, conformmno-nos com a disposição do codigo de Hol-
landa, artigo 97.' O codigo da Austria, artigo 579.', exige apenas
tres testemsnhs, ainda sem a presença do tabellião..
A final a commissãs dê legislação da camara dos senhores deputa-
dos acabou com semelhantes ditferenças marcando o mesmo numero
de testemunhas para a apresentação do testamento, quer tivesse
sido escripto pelo testador quer tivesse sido escripto por outrem.
Contenta-se o rodigo, seguindo n'esta parte o direito velho, com
o numero invariavel de cinco testemunhas no instrumento de appro-
vaçào do testamento cerrado saiba ou não saiba o testador escrever,
talvez por serem no testamento publico chamadas as testemnonas
a certificar o coteédo do docuimento e ser no instrumento de appro-
vaçdo do testamento cerrado limitada a sua intervençóo à apresen-
taç4o do testamento ao tabellião, e a verificação da identidade e
liberdade do testador.
O § 1' do artigo 1922., quando manda assignar o instrumento
de approvaço na conformidade do que fica disposto ia secção prece.
dente, é só áfórma da assiguatura, e não ao numero das testemu-
nbas, que se refere.
No entretanto a jurisprudencia das cautellas tambem ao acto de
approvaçào do testamento cerrado usanda assistir mais uma teste-
munha, quando o testamento é escripto e assignado por outra pessoa
a rogo do testador por este não poder assignar, como exige o co-
digo civil francez no artigo 977.' e como exige o nosso codigo pana o
testamento publico.
444 ARTIGOS 1922.
Na vigencia da lei antiga era muito questionado, se o testador na
occasiào de apresentar ao tabelliào o testamento cerrado e de de-
clarar que era aquella aua vontade devia acerescentar necessaria-
mente as palavras «que o havia por bom, firme e valioso», ou se estas
palavras, longe de serem sacramentaes, podiam ser substituidas por
outras; e o dr. Paes nas suas oservações ao projecto de codogo
julgava necessario resolver a duvida.
Respondeu, porém, com inteira razão o sr. Seabra que tacs pala-
vrao tanto não eram sacramentaes que nem menção d ellas se fazia
no direito novo, como sacramentaes não eram já pelo direito velho,
assento de 10 de junho de 1817.

Art. 1922.° Em seguida, e sempre na presença das so-


bredictas testemunhas, o tabellião, vendo o testamento, sem
o ler, lavrará um auto de approvação, que principiará logo
em seguida á assignatura do mesmo testamento, e será
continuado, sem interrupção, na mesma pagina e nas se-
guintes. Nesse auto declarará o tabellião:
4. Se o testamento é escripto e assignado pelo testador;
2.1 0 numero de paginas que contém;
3.1 Se está rubricado por quem o assignou;
4.° Se tem ou não algum borrão, entrelinha, emenda ou
nota marginal;
5.° Que o testador foi reconhecido, e que foi verificada
a sua identidade;
6.1 Que o testador estava em seu perfeito juizo, e livre
de toda e qualquer coacção;
7.1 Finalmente, que pelo mesmo testador lhe foi apre-
sentado o seu testamento, pelo modo que fica ordenado na
lei.
§ 1.e 0 auto será lido, datado, e assignado, na conformi-
dade do que fica disposto na sub-secção precedente.
§ 2.° Em seguida, e ainda na presença das mesmas tes-
temunhas, o tabellião coserá e lacrará o testamento, lavrando
na face exterior da folha, que servir de iuvolucro, uma nota,
que declare a pessoa a quem pertence o testamento alli con-
teúdo. O testador pôde prescindir d'estas formalidades ex-
ternas; mas, em tal caso, far-se-ha menção no auto de appro-
vação, de que ellas se omittiram por vontade do testador.

íL Ha de o tabellião a quem é apresentado aberto o testamento na


presença das testemunhas vel-o sem o ler para la.rar o instrumento
de approvaçào e entregal-o depois ao testador, porque se evita assim
a fraude e a coacção, e não fica duvida de ser aquelle o testamento
que representa a vontade do testador.
A entrega do testamento já cerrado impossibilitava o tabellião
de o correr pelos olhos, como era indispensavel para fazer as de-
clarações determinadas em os n." 1., 2.1, 3.- e 4.°; e podia além d'ismc
r
ARTIGO 1922.s 445

o papel que assim vinha fechado não conter a expressão da vontade


do testador.
Pela Ord. liv. 4.o tit. 80. § 1., como por direito romano, devia
o testador entregar cerrado e cosido o testamento ao official publico,
que lavrava o auto de approvação nas costas, de certo para evitar
que elle descobrisse a disposição testamentaria.
Podia perfeitamente entregar-se cosido o testamento cerrado no
regimen da Ordenação que mandava começar o instrumento de
approvação, não em seguida á assignatura do testamento, e sim nas
costas do proprio testaiessto, § 1., ou eni parte de alguma das folhas,
ei que alguma parte do testamento fosse escripta § 2.'
Todavia a prática seguida, e depois abonada pelas disposições do
assento de 10 de junho de 1817, foi sempre entregar aberto o tes-
tamento ao tabellião, que, só depois de concluir o instrumento de
approvação, que devia começar logo em seguida á assignatura do
testador, o cosia e lacrava e assim restituia ao testador.
Tambem o projecto primitivo, no artigo 2059.' correspondente ao
presente artigo, mandava coser e sellar o testamento em seguida á
apresentação, e lavrar depois o instrumento de approvação sobre a
face exterior do involucro.
Contra tal systema reclamou logo o dr. Paes; e a commissão revi-
sora, mandando começar o instrumento de approvação logo em se-
guida à assignatura do testamento, adoptou o systema menos sujeito
a fraudes; pois começando o auto de approvação logo caí seguida á
assignatura da pessoa que fez o testamento mais facilmente se evita
a viciação dos testamentos.
O auto de approvação. como não tem de principiar na mesma
folha e sim em seguida i assignatura,bem póde começar n'outra folha
pegada quando a assignatura estiver collocada na extremidade da
ultima folha do testamento, como n'outra folha, que se ajuneta, se
lavra o auto de abertura quando a folha exterior do testamento não
tem espaço artigo 1934. § unico, e como para aquella hypothese
já dispunha a Ord. liv. 4.- tit. 80. § 2.'
Por isso lembrava o sr. Seabra, pag. 102 da sua resposta ás
observações do dr. Paes, nova redacção do artigo formulando-se
o § 1.' nos seguintes termos: «Se o papel em que fór escripto o tes-
tamento tiver algum espaço em branco, será o termo escripto ou co-
meçado n'esse espaço; se não o tiver será exarado eu outra meia
folha, e se o testamento ndo for escripto pelo testador será rubricado
pelo tabelliio".

.- e 3.

0 tabellião é obrigado a declarar no


instrumento de approvação
se o testameote é escripto e testador, como é obrigado
aos-íyado pelo
a declarar se o testamento foi rubricado por quem o assignou.
O que não pôde é dizer o nome do terceiro quando foi terceiro
que o escreveu e assignou.
Se a lei quizesse a declaração do nome do escriptor e do signa-
tario do testamento tambem quando fosse terceiro o escriptor e s-
gnatario, em vez de mandar declarar no instrumento de approvaçto
se o testamento é escripto e assignado pelo testador, teria deter-
minado que no instrumento de aprovação se dissesse sempre por
que era escripto e assignado o testamento.
Boas razêes teria o legislador para não permittir a divulgação
446 ARTIGO 1922.

do nome quando fosse terceiro o escriptor e signatario do testa-


mento.
O tabellião é simplesmente obrigado ás deelaraçes especificadas
nos sete numeras do artigo, e só pela falta de alguma das sobredictas
formalidades é que fica sem effeito o testamento artigo 1925.0
Não pôde o tabellião enunciar nomes quando o legislador lh'o não
incumbe.
Não importa, porém, nullidade a revelação dos factos que o ta-
bellião não deve declarar, como nullidade não deveria importar a
menção de quaesquer circumstancias não especificadas na lei desde
que não prejudicassem as solemnidades essenciaes que o codigo
manda guardar.

2.0

Por não haver o perigo da substituição, que foi o que o legisla-


dor quiz evitar', não é motivo de nullidade a falta de menção do
numero de paginas do testamento quando a disposição está escripta
em paginas da mesma folha de papel dobrada, como motivo de nul-
lidade não deveria ser a falta de declaração do numero de paginas,
constando o testamento de lauda e meia e começando o instrumento
logo em seguida, nem a falta de rubrica na folha onde estivesse
a assignatura, nem a falta de declaração s o testamento era escripto
e assignado pelo testador, nem qualquer outra falta sempre que fosse
impossivel a substituição ou addiçào ao testamento.
Cois o fundamento de serem as entrelinhas, emendas ou notas
marginaes o que póde viciar e alterar a disposição, e não o borrão
que em regra não é o que escapa dos bicos da perna e sim o que
resulta de emenda ou substituição da primitiva escripta, já se jul-
gou: no importar nullidade a falta de declaração de não haver bor-
rão se o tabellião tiver declarado haver uma entrelinha e não haver
emenda ou nota marginal; como já estar satisfeita a disposição da
lei com a declaração de não conter o testamento borrão, entrelinhas
nem cousa que duidafaça, apesar de exigir a lei a declaração de
não conter o testamento borrão, entrelinhas, emendas, ou nota mar-
ginal; cão ser nullidade a falta de declaração de não ter o testa-
mento emenda quando o documento não a aceusa, nem a auctoridade
administrativa a menciona no auto que deve lavrar conforme os
artigos 1933.0 e 1939.; e até que as palavras no ha casousaque dorida
faça supprem todas aquellas faltas e que na declaração de não haver
emenda ou nota marginal vae a declaração de não haver borrão.2

t Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de março de


1896, Gazeta da Relação de Lisboa, 9. anno, ni 73, pag. 550.
2 Aecordãos, da Relação de Lisboa de 29 de agosto de 1888, da
Relação do Porto de 30 de abril, de 21 de juabo de 1881, e de 9
de fevereiro de 1897, e do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de
dezembro de 1897, Revista de Legislaçdo e de Jurisprudencia, de
Coimbra, 21.° anco, n. 1054, pag. 215, e Direito, 16.° anno, n? 3,
pag. 44, e 22. ano, nc 2, pag. 30, Reista dos Tribunaes, 15 anno,
n. 354, pag. 277, e Gazeta da Relação de Lisboa, 12. anno, nA 16,
pag. 122.
r
ARTIGO 1922.- 447
NAo deve annullar-se o testamento por se não ter fallado de nota
marginal, desde que o tabellião portou por fé que não havia
borrão,
entrelinha, o cnosa que duvida fizesse.
E rigor draconiano anutlar um testamento por não ter portado
por fé o tabellião que cmcudas, entrelinhs, nota ou burrão mio havia,
quando se não encontra realoente emenda, entrelinha, nota ou bor-
rão.
Porém, com quanto para authenticar o facto valha mais o proprio
facto do que a declaração, a verdade é que a letra da lei manda
declarar no instrumento de approvação o numero de paginas que
o testamento contem, se o testamento está rubricado por quem o
assignou, e se cuo ha borrão, entrelinha, emenda ou nota margi-
nal, ou para evitar que fossem apagadas as notas no caso de as ha-
ver ou que fossem introduzidas de novo por falta de declaração de
as não haver.
A rasura, emenda ou entrelinha no corpo do testamento cerrado
ainda não resalvada, por são ser auto publico o conteúdo da dispo-
sição, não importa nllidade uma vez que se mencione esta circua-
stancia no instrumento de approvação.
Mas nos testamentos publicos e nos iustcumentos de approvação
dos testamentos cerrados a falta de resalva das emendas, entreli-
nhas ou rasuras é nullidade isatavel, como a falta de assignatura e
signal do osicial publico, artigo 2495."
O que é verdadeira velharia ejá são tem razão de ser, com quanto
se eneontre ainda n'alguns antigos formularios, é a declaração do
.tabellião - -que approra e la por approcado o teslamento tonto guanto
lhe é permitlido pelo seu regimento
Tambem deve ser feito eno aclo conlituo o instrumento de appro-
vaçâo do testamento cerrado, porque tambem o artigo 1922.- se re-
fere á unidade do tempo e de acção exigida pelo direito romano e
pela Ord. liv. 4.° tit. 80.1 1.; e quando o testador souber ler mas
não souber escrever convira declarar no auto de approvação que
o testador sabe ler apesar de néo saber assignar, para não se
tirar depois argumento da ignorncuia da eseripta para a ignorancia
da leitura visto ser vedado o testaitinto cerrado ao que não sabe
ler.

5.s e 6.

0 modo de verificar a identidade e a liberdade do testador fica


já indicado no artigo 191 .', em confroumidade do qual devem ser
cumpridos os n.~ 5P e G, porque onde ha a mesma razão deve
suppôr-se a mesma disposição.
Para dar ao instrumento de approvaçào do testamento cerrado a
mesma authenticidade que tem o testamento publico é preciso cer-
ral o das mesmas formalidades.
Escusadas seoriau declaraçies sobre os requisitos 5.- e 6.^, pois
não póde presumir-se a approvaçào do testamento sem o tabellião
por alguma férma se haver inteirado da identidade do testador, e
nem o considerar em seu perfeito juizo, e livre de toda e qualquer
coacção.
A maior parte das formalidades presetiptas no artigo não são
esseciaes para authenticar a veracidade do testamento, pois sem
ellas passa o testamento olograpio admittido n'alguns povoa que é
apenas escripto e assignado pelo testador.

iL
448 ARTIGOS 1923.^ E 1924..

Deve, porém, o tabelliio em assumpto tio grave e com uma legis.


lação tio complicada em que nenhuma cautela é de mais, pôr espe.
cial empenho no cumprimento de todas as formalidades expressa ou
tacitamente prescriptas na lei por menos essenciaes que lhe pareçam.
O que ao tabellião cumpre ter sempre presente é que pela juris.
prudencia mais geral a falta de qualquer formalidade nos actos
testamentarios importa nullidade insanavel. 1

1., etc.

(Vid. nota ao artigo 1914.)

2.0, etc.

Quando o testador quizer ficar com o testamento em seu poder


aberto e sem nota alguma no involucro, ou para fazer depois qual-
quer emenda por sua mio conforme o artigo 1942.- sem o trabalho
de o abrir, ou por outra qualquer razão, faz-se a declaração de haver
o testador prescindido d'estas formalidades.
Não invalida, porém, o tes¢amento a falta da declaração apesar do
disposto no artigo 1926.0, porque as disposições geracs não preva-
lecem sobre as disposições especiaes, e porque nem o testamento é
annullado pelo facto de ter sido encontrado aberto quer no espolio
do testador quer em poder de terceiro sem nenhum outro viciamenta
artigo 1939.°, e vale até feito em pedaços sempre que podem re.
unir-se os fragmentos quando se provarplenamenteque o facto acon-
tecera depois da morte do testador, ou por elle fôra praticado em
catado de demencia, artigo 1943."

Art. 19 33.° Os que não sabem, ou que não podem ler,


são inhabeis para dispôr em testamento cerrado.
(Vid. nota ao artigo 1764 °)
Podem fazer testamento cerrado os que sabem ler ainda que não
saibam escrever, porque se pôde saber ler sem se saber escrever,
e o proprio codigo no artigo 1915.° toma como synonymos escrever e
asesgnar.

Art. 1924.° 0 surdo-mudo pôde fazer testamento cerrado,


comtanto que este seja todo escripto, assiguado, e datado
de sua mão, e que, ao apresental-o ao tabellião perante
cinco testemunhas, o testador escreva na presença de todos,
sobre a face externa do testamento, que aquella é a sua
ultima vontade, e que vae por elle escripta e assignada.

t Accordio do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de maio de


1881, Direito, 17.^ auno, n.° 11, pag. 164.
ARTIGO 1924.1 449

unico. O tabellião declarará, no auto de approvação,


como o testador assim o escreveu, e se observará o mais
que fica disposto no artigo 1922.1
Póde o surdo-modo ou simplesmente mudo fazer testamento cer-
rado se souber escrever mas não pôde fazer testamento publico por-
que eio pôde dictal-o artigo 1912., visto não reconhecer o codigo
manifestação de vontade senão feita cumprida e claramente por pala-
vras ou por escripto, e nunca por sigoaes ou mononosyllabos em
respostas e perguntas artigo 1751.
A manifestaçào da vontade por siguaes seria tm meio perigoso
de comnnicação porque se corria o risco de vir a testar menos o
surdo-mudo do que os ilterpretes dos signaes.
O testamento cerrado do surdo-mudo ba de ser todo escripto, assi-
guado e datado por sua mão, porque assim fica indubitavelmente
attestada a sua vontade. e supprida a falta de dietado no testomento
publico, ou no testamento cerrado eseripto por outrem.
Para supprir a dec]aração verbal d, s-r ageUla a sua outia ron-
tade, que é obrigado a fazer o testedor não surdo udo no acto de
apresentar o tetameitu ao tabellião perante as cinco testemunhas
para lh'o approvar, ha de o surdo- mdo escrever, no acto dc apre-
sentar o testamento, na presença do tabellião e das testemunhas ii-
strumentarias, sobre a face externa du testamento, que aquelta é a
sua ultima vontade, e que vae por elle escripta e assignada, de-
claração que não carece de asigsar, nem de díatr por ser ao ta-
bellião que incumbe rios termos do unio do artigo certificar no
auto de approvação que u sua presença e na das testemunhas es-
crevéra o testador na face externa do testamento, que aquella era a
sua ultima vontade, e que por elle ia escripta e assignada, nem a
assignatura e data da nota pelo testador dispensaria o tabellião de
mencionar no auto de npprovação a data e a assignatura da decla-
ração do testador.
Pelo projecto primitivo artigo 20629 tambem ao surdo-mudo era
permittido fazer testamento cerrado, com tanto que o escrevesse
todo por sua mão, assignasse e datasse, e escrevesse sobre a face
externa do testamento, no acto em que o aprescnuasse no tabellião
para este lhe lavrar o termo de enc-raieeuto, que aquella era a sua
ultima vontade, e que ia por elle escripta e assignada; e o artigo
2059. do mesmo projecto seguindo ia esteiro dos artigos 976.- e
979. do codigo civil francez, e dos artigos 5699 e 5701- do pcojecto
do codigo civil hespínhol, mandava coser e sellar o testamento cer-
rado, e sobre a face erl/rior da folIa que servisse de involuero lavrar
termo em que o tabellião declarasse como o testamento lhe flra apre-
sentado, por ser então inipossivel inserir ia disposição testamenta-
ria determinações estranhas 3 vontade do testador.
Emendado, porém, o artigo 205! 9 para o eTciito de ser lavrado o
auto de approvação logo em seguida 3 assiga:tíra do testamento e
comlçnr n'outra folha nnicamcite quando n'aqu-lla cio qu e itnaiise
o testamento não reste espaço em branco para principiar, tauleíi
tio testamento do surdo-mudo não é em seguida declaração do
testador na face externa do testamento de que aquella 3 a sua ultima
vontade que ha de principiar o auto de approvaçào, e sim em seguida
á assignatura do testamento porque o presente artigo no § umco
nmada obser car o iiso sue fica dispoos no artigo 1922'
Regulou, porém, o caso o decreto do notariado de 14 de setembro
Toso III 29

ík,
480 ARTIGOS 1925., 1926.0, 1927.0, 1928.° a 1929.^

de 1900 determinando no § unico do artigo 71. que a declaração do


surdo-modo nos termos do artigo 1924.- será escripta em seguida
i assiguatura do testamento e que a essa declaração se seguirá
immediataente o auto de approvaço.
Com as mesmas formalidades do testamento do surdo-mudo deverá
ser permittido testar em testamento cerrado ao impedido de falar, nio
por vicio permanente, mas por circurstancia accidental.
O surdo-mudo, a quem nlo é permittido fazer testamento publico,
póde todavia fazer doades, ou q'aesqucr outros contractos, se por
medo de signaes podér exprimir clararente a sua vontade artigo
648.°
Art. t,25.° 0 testamento cerrado, a que faltar alguma
das sobredictas formalidades, ficará sem efeilo, e será o
tabellião responsavel, nos termos do artigo 1919.0

(Vid nota ao artigo 1919.^)

Art. 1926.° Approvado e encerrado o testamento, será


entregue ao testador, e lançará o tabellião nota no seu livro
do logar, dia, mez e anuo em que o testamento foi appro-
vado e entregue.

Ha de o tabellião registar os autos de approvaçào dos testamentos


cerrados no livro respectivo decreto de 14 de setembro de 1900 ar-
tigo 44.° § 2.0 para evitar as fraudes de se forjarem documentos da
mesma natureza com falsa data.
Mas não induz rullidade a falta d'este registo, como nullidade não
induz a omissão das formalidades prescriptas no presente artigo.

Art. 1927.° 0 testador púde conservar o testamento na


sua mão, commelíer a guarda d'elle a pessoa de sua con-
fiança, ou deposital-o no archivo testamettario de qualquer
districto admiuistrativo.
Art. 198.° Para o fim inencionado no artigo precedente,
haverá na secretaria de cada governo civil um cofre forte
com duas chaves, uma das quaes estará na mão do gover-
nador civil, outra na nAVo do secretario geral.
Art. 1929.° 0 testador, que quizer depositar o seu tes-
tamento no archivo testamentario, apresetar-se-ha com elle
perante o governador civil, e este fará lavrar num livro de
registo, ordenado para tal effeito, ui termo de entrega, e
deposito, que será assignado pelo governador civil, pelo seu
secretario geral, e pelo testador.
unico. A apresentação e o deposito podem ser feitos
por procurador: neste caso a procuração ficará unida ao
testamento.
rýF
ARTIGOS 1930.°, 1931 ", ^E 1933.
1932.o 461

Art. 1930.0 0 testador póde retirar, quando lhe aprouver,


o seu testamento; mas a restituição far-se-ha com as mesmas
solemnidades com que é feito o deposito.
Entre as providencias para assegurar a execução de uma fórma
de testar destinada a por o segredo das disposides do testador ao
abrigo das iigratid½cs e do abandono dos que esperavsm ser con-
templados, e sobretudo para evitar a perda e extra io do testamento
quer por descuido do testador, quer por fraude dos interessados,
creou o codigo o archiuo testamcidario onde podem ser depositados
os testamentos cerrados, do que pde todavia prescindir o testa-
dor guardando em si o testamento o eintregando-o a pessoa da sua
particular confiança, com excepção dis testamentos militar. mari-
timo e eaterno, que sãO remet tidos oliciialmente para o archivo do
districto administrativo, urde porveitura tenha de abrir-se a sue-
cessão, artigos 1945., 1957 e 1963
Os testamentos publicas ordinarios téca já o seu archivo no livro
de notas do olficial publico, onde podem ir buscar-se traslados na
oeeasmo oppartina; e o testamento cerrado logo que se sumisse
seria difilcil e poderia ser impossivel substitiúl o.
A lei deixa ao testador ampla liberdade de escolher para deposito
do testamento cerrad ordiniiio o dietrito que lhe aprouver, tem
tornar obrigatorio o distriato do domicilio do testador, mesmo por-
que ao testador é sompre livre mudar de domicilio artigo 44., e pde
mesmo não ter domicilio fixo artigo 43.'
É, porém, no domicilio do seu auetor que se abre a herança e
onde tém de ser praticados todos os actos da exeaução do testa-
mento; e os test:íaentos que téai de ser remettidos oficialmeiite
devem ser depositados no archivo do distrieto onde no momento
tem domicilio ou residenei o testador.

Art. 4931. A procuração Lara a extracção do testamento


será feita por tabellião, e assignada por quatro testemnnlhas,
ficando registada no competente livro.
De solemnidades expociaes é revestida a procuração porque exce-
peional é a importancia do acto a que respeita.

Art. l932.1 0 testamento cerrado serii aberto, o publi-


cado pela fórma seguinte.
Art. 1933.° Verificada a morte do testador, ou no caso
do artigo 06,°, se o testanunto cerrado exislir em poder
de algum particular, o apparecer no espolio do finado,
será levado ao administrador do concelho, o qual, na pre-
sença do apresenlanle e de duas testennlhas, fuá lavrar
o auto de abertura, ou plbcação, onde se declarará o es-
tado em que o testamento é apresentado, e se está, ou não,
nos termos indicados n encerramento.
§ unico. Quando, por qualquer circumstancia, não for
possivel recorrer promptamente ao administrador do con-
452 ARTIGO 1984.-

celho, poderá o testamento ser levado ao regedor da paro-


chia, o qual, para o effeito d'este artigo, fará as vezes do
adminisiralor do concelho.
Airi 19:U.° 0 auto, inciionado no artigo precedente,
será laiçaio em um vivru unierado, rubricado e encerrado
pelo governador civil.
Sunico. Quando a abertura for feita pelo regedor de
parochia, lavrar-se-ha este auto na folha exterior do testa-
mento, ou, não havendo espaço nesta, em folha conjuacta;
e sera remeido o dicto testamento com o auto, deotUo das
vinte e (u.tio horas seguintes, ao administrador do con-
celio, para ser lançado no livro competente, e para os de-
mais effeitos, de que tracta o artigo 1935.0

A competeicia para a abertura do testamento nâo é fixada nem


pelo domicilio do testador, nem pelo concelho do obito.
O testametto ha de ser abert pela aietoridade do logar onde
fér apresentado, como claramente resulta das palavras do artigo
1933.° se existir em poder de ol/gto ptrticular ou appareCer no espolio
do finado será levado ao administrador do concelho, do artigo 1939.o
que manda apresentar como estiver na admiuistraçdo do respectieo
conelho o testamento que apparecer aberto em poder de ter-
ceiro, e do artigo 1936- q u e ««nda abrir em presença do gover-
nador civil o testamento depositado no archivo do distrieto admi-
nistrativo.
Nem o detentor poderia apresentar o testamento dentro de tres
dias artigo 1937.-, se tivesse de o levar a outra parte, a terra lon-
ginqua; nem poderia ser satisfeito o preceito da tei que exige a aber-
tura prompta do testamento, e antes mesmo do enterro podendo ser
para se cumprirem n'esta cojuntura solemne as ultimas disposições
do testador, e até para evitar qualquer subtraecçào ou viciaçdo do
documento.
Para evitar demoras na abertura do testamento introduziu a com-
misso revisora logo nos trabanhos da primeira revisào a providen-
cia do § unico do artigo 1933' dando competencia ao regedor de
parochia pora a abertura e publicação dos testamentos cerrados
quando não seja possivel recorrer de prompto ao administrador do
concelho, ao qual exclusivamente o projecto primitivo commettia
este serviço.
Nào importa, porém, nullidade a abertura do testamento pelo
regedor de parochia quando com a mesma promptidào podesse ter
sido aberto pelo administradnr do concelto, como á validade do
testamento nada importa a falta de remessa do testamento pelo
regedor de parochia ao administrador do concelho dentro de vinte
e quatro horas.
As faltas no auto de abertura ou publicaçào em caso nenhum
podem prejudicar o acto independente e cosummado do testa-
m,'nto, principalente desde que vale ainda apparecendo aberto
artigo 1939$, e mesmo achaudo se vieiado ou dilbcerado por pessoa
que no fose o testador artigos 1940- e 1943 , e que até podia
ficar aberto artigo 1922.' § 2.-
A preseripçto do unico do artigo 1933 como a do § unico do
ARTIGO 1935.' 453

artigo 1934.° apenas teve por fim evitar qualquer falsiflençio, dila-
ceração, ou mesmo a subtracção do testamento á sombra da demora.
Aberto ou publicado diz o artigo 1932. por não carecer de aber-.
tora e apenas de publicação o testamento cerrado, que é apresen-
tado aberto, e que aberto poderia ter icado por não ter sido feehado
no acto da approvação.
Na bypothese do artigo 1936.° é aberto o testamento na presença
de quem requerer a aboerloro, e são na presença dos ésleressados como
dizia o projecto primitivo, porque ontes de aberto o testamsíto cer-
rilo não se sabe gnem sru os inleressolos.
O auto de abertur, que o projecto primitivi mandava lavrar pelo
secretario do administrador do concelho, póde ser aivrado por qual-
quer empregado da admi1íistração, e at pelo escrivão do regedor
ou por pessoa por este nomeada quando presidir 6 diligencia, e será
assiguado pelo administrador daaenclho. ou pelo regedor de paro-
chia, conforme o que proceder abertura. por quem o escreveu, e
por duas testemunhas com a qiallidlde de instinnentarias artigos
1966. e2491.^ visto ser a abertura do testamento acto entre vivos e
não processo indicial.
O decreto de 22 de sarço de 1837 que commsettia aos regedores
de parochia, e aos juizes de paz e eleitas no impedimento d'aquelles,
a abertura e a leitura dos testamento, impiuh -lhes a obrigação
de declarar, na verba que n'elles traiiereressem em virtude no
29 do artigo 155." do codigo administraivo de 31 de deetmbro
de 1836, se os testamentos tinham ou 1,o emendas, razras, ettre-
linhas, ou algum outro defeito, e de meneioíar os vidlos que encon-
trassem, e as p ginas e as regras eim que se continham, sem pre-
jíizo da prova que os interssados podesem, otdecee perante a
justiça cerca do bom ou 0m.1is estado do testamento.
Mas hoje que o tabelliao ha do fazer estas declaroçýes io auto de
approvação do testamento cerrado, satisfaz a atctoridode, encrre-
gado da abertura do testamento, com a indicação de conformidade
do testamento com os termos do instrumento de approvação, ou com
a menção especificada de todos os vicios se não encontrar o testa-
mento nas condiç es descriptas n'aquelle aíto.
Não regula o codio, omo já tivemos oceasiáo de observar, as
aformalidades da abertura do testamento em vida do testador, quer
para ecelir da partilha algum preso de vidas, quer para deferir a
curadoria no caso de auseocia.
Na primeira hypothíes neílínas reg ros carecia de dar o legis-
lador porque a apresentação do testameitu depende da vontade do
testador; e nem a partilha só p r si prejudicaria o nomeado, se em
tempo nenhum e par fórma nenlnía fosse revogado.
No caso de aísencia, depois de julgada por sentença, manda o
codigo de processo civil w, artigo 411.- remettel-o ao respectivo
administrador do eneclh ou bairro para este o abrir, ou requisitar
do governo civil a abertura se o testamento estiver depositado no
archivo testamentario.
Como da nota do involucro artigo 1922.9 2.° consta oficialmente
quem é o testador, devia tambem annníciar-se na folha olicial a
eaistencia do testamento no deposito do governo civil, quando o
testador completasse noventa e cinco asnos.

Art. 1935.° Lançado no livro o auto de abertura, on pu-


blicação, fará o administrador registar o testamento no livro
451 ARTIl'GS 1938.

competente e devolvel-o-ha aos interessados com a nota


rubricada pelo mesmo administrador, de como foi aberto
"e registado, e se appareceu ou não cousa que duvida
fizesse.
§ unico. Se nio Ionver interessados, que reclamem o
testamento, será este archivado na administraç.ão do con-
celho com a devida segurança e sob responsabilidade do
administrador.
O registo dos testamentos é da competeicia de todos os adminis-
tradores de concelho, selam ou não cabeça de comarca, como as
contas dos legados pios, e abrange não só os testamentos cerrados
senão tisbem os testamentos publicos, pois, com quanto só ao re-
gisto dos testamentos cerrados se refira o codigo, e na validade do
testamento não inibua o registo, é todavia indispensavel para os
effeitos fiscaes e administrativos.
Por isso até o dia 8 de cada mez são os administradoes de
concelho ou bairro obrigados a enviar aos respectivos escrivàes de
fazenda copia dos testamentos das pessoas fallecidas no mez an-
tecedente regulamento da contribuição de registo de 23 de dezem-
bro de 1899 artigo 38.; e devem os escrives de fazenda, se os
administradores deixarem de cumprir esta obrigação, requisitar do
competente registo copia do testamento se já estiver registado, ou
intimar a pessoa, que o tiver e ainda o lio tiver registado, a te-
val-o ao registo dentro de tres dias sob pena de multa citado regu-
lamento artigo 42."
Registado o testamento lêem os traslados e certidões d'elle extra-
hidas a força probatoria do original.
Mas levantado o incidente de falsidade é no orginal que hão de
ser feitos os respectivos exames.
Nio póde o administrador do concelho negar o registo ao testa-
mento por duvidas sobre a validade do titulo que sea isso usurpar
faculdades aos tribunaes judiciacs unicos competentes para conhe-
ser das formalidades externas e internas dos documentos testamen-
tarios; e deve pelo contrario registar o testamento qualquer que seja
o vicio do documento, ainda que lhe tenha sido arrancada depois
de aberto alguma folha, unoa vez que o papel contenha disposção
completa e revista a férma de testamento, mencionando no res-
pectivo auto o vicio que encontrar.
Da recusa do administrador do concelho a registar o testamento
ha o direito de queixa ao superior legitimo, e cabe além d'isso re-
curso para o contencioso administrativo conforme os artigos 307.0
e 325. n. 2. do codigo administrativo.
Aberto e registado o testamento ha de o administrador do conce-
lho devolvel-o, não a quem lh'o apresentou se não for interessado,
mas aos interessados que segundo o disposto nos artigos 6S., t0.°,
79 ', 80.', 1891.', 1893", 1899.", 1900 ', 2010., 2052., 2056.°, 2093.°,
2126°, 2127." e 2132." são os que téem direito fundado a alguma
parte da herança, assim como pôde entregal-o ao testamenteiro
vista a disposição do artigo 1899?. n. 4." quando for este o encar-
regado da execução das disposições testamentarias.
Se, porém, surgirem reclamações dos interessados e ao adminis-
trador de concelho parecer que a justiça terá que intervir, só deve
entregar o testamento á ordem do juiz competente.

tom... ï
r
ARTIGOS 1936., 1937.' 1938. 455

Art. 1936.0 Se o testamento tiver sido depositado no


archivo do governo civil. ahi, verificaí a a morte do cestador,
será aberto na presença do governad(or civil, de quem re-
querer a abertura, e de mais duas teolemunhas, e se obser-
vará o mais pie a tal respeito fica disposto.
'rambem na abertura do testamento guardado no archivo do dis-
trieto, a que alm do gover nador civil deve assistir egialimente o
secretario geral que tem tita das chaves do cofre artio28 1. , e
que em regra lavra ou subscreve os autos feitos perante o gover-
nador civil, ha de observar se o muxi t«e a tal respeito fica disposto,
isto é, ha de declarar-se sie esta nos termos indicados no auto de
encerramento, ou o estado em que F apresentalo, menos entregar-se
aos interessados camo o entrega o administi ador do concelho quando
preside aabertura, porque ha de ser remettido ao administrador do
coucelho para o registar, lançando-se o termo da remessa no livro
de deposito a que se refere o artigo 1929.^, e é ao administrador do
concelho que compete depois entregal-o aos interessados.
A remessa ao administrador do concelho, quer pelo regedor de
parochia quer pelo governador civil, ha de ser feita outicialímente, e
nAo por via dos interessados, aos quaes em caso nenhum pôde ser
entregue o testamento, senão depois de registado, cei a unica dif-
ferença de que ao governador civil, atteíta a alta categoria d'esta
auetoridade, no se marca praso para a remessa, por no poder sup-
pôr-se que propositadamente o demore em si.
As palavras--erificara o iorte do tetador-no significam que
o testamento só deve ser aberto em presença da certidão de obito,
pois que então ficaria por cump-ir cm todas as determinaçóes rela-
tivas ao funeral e mais disposiçées que devessem ser cumpridas
antes da sepultura, e sim que o governador civil deve certificar-se
por qualquerftrma da morte do testador.

Art. 1937.° Toda a pessoa, que tiver em seu poder tes-


tamento cerrado, e, tío caso do artigo 66.°, não o apreaen-
tar, ou, no caso do fallecimento do testadílr, não o apre-
sentar dentro de ti-es dias, contados desde o conhecimento
do mesmo fallecimento, será responsavel por perdas e
damnos. Se a não-apresentação provier de dolo, perderá,
além d'isso, qualquer direito á herança do testador, que
por ventura tivesse, afúra ficar sujeito á punição, em que
nos termos da lei penal tiver hworrido.
Art. 4938.0 Às mesmas perdas e damnos, perda de he-
rança, e imposição de penas, ficará sujeito quem subtrahir
dolosamente o testamento do espolio do testador, ou do po-
der de qualquer pessoa, na mão da qual esteja depositado.
Só para o caso de morte do testador está fixado o praso de
apresentação do testamento. No caso de ausencia é marcado na inti-
mação judicial o praso para o depositario o apresentar.
Ae palavras do artigo- cse a tdo apresentação»- referem-se
456 ARTIGOS 1939.n E 1910,.
tanto ao caso de em tempo nenhum ser apresentado o testamento,
como ao caso de ser apresentado fóra do praso legal sem razão jus-
tificativa.
Basta a simples negligencia na apresentação do testamento den-
tro de tres dias desde o conhecimento da.morte do testador para
sujeitar a responsabilidade mesmo que se não prove dólo, por não
ser natural nem de presumir que o detentor ignorasse a existencia
do testamento em seu poder.
Para a imposição de pena é que se exige sempre o dólo, compa-
nheiro aliás inseparavel do furto, do rubo e do abuso de con-
fiança.
O que faz variar as penas é o ter havido ou não dólo na nto apre-
sentaçio ou na demora na apresentação do testamento, e ainda no
caso de dólo ter ou não o delinquente qualquer direito á herança
do testador.
Não incorre por isso em respossabilidade o testador que subtraiu
o testamento do poder do depositario, nem o interessado qno subtra-
hiu o testamento ao depositario que o ocecultava, para o apresentar
ã auctoeidade publica; como em responsabilidade criminal não
incorre o que rasga ou dilacera o testamento na persuasão de que
rasga ou dilacera outro papel. e fica apenas sujeito a perdas e
damnos para o que se não exige o dilo.
O detentor sem dólo, sasja ou não herdeiro abintestado, é simples.
mente responsavel por perdas e damnos; e nem por perdas e darmos
responde provando legitimo impedimento que o embaraçasse de apre-
sentar o testaisento
1 no proso legal.
Provado o d pois nem n'este ponto o legislador quiz afastar-se
do principio geral de direito que o dolo não se presume, fica o de-
tertor doloso sujeito a pena, tanto civil como criminal, pena que
bem merece quem occulta doesmento onde está manifestada a ultima
ventada do cidadão que foi sempre respeitada em todos povos e em
todos os tempos.
O detentor com dólo, além da responsabilidade por perdas e
damnos, está sujeito ir pena de furto. , de roubo ou á de abuso de
confiança, como ro caso couber, e a ser privado da sua quota here-
ditaria se é hrdeiro abintestado, ou de qualquer beneficio testamen-
tario se é contemplado no testamento.
Em responsabilidade civil e penal, além da obrigação de o resti-
tuir, incorre tambem o achador do testamento que o não entregou,
ou que, ignorando a quem pertencia, não fez a diligencia devida
para o entregar a seu dono artigo 4200 do presente codigo.

Art. 1939.1 Se o testamento se achar aberto, quer seja


no espolio do testador, quer seja em poder tie terceiro, mas
sem nenhum outro viciamento, não será annullado por isso.
unico. Neste caso será apresentado, como estiver, na
administração do respectivo concelho, onde se lavrará auto
d'isso mesmo, e se observará o mais que fica disposto nos
artigos 1933.', 1934.1 e 1935.°
Art. 1910.' Se o testamento apparecer aberto e viciado,
ou dilacerado, far-se-hão as seguintes distincções: se o
testamento se achar cancellado e obliterado, ou dilacerado,
quer seja no espolio do testador, quer seja em poder de
ýr
h ARTIGO 1940.- 457

outrem, de modo que se não possa ler a primitiva disposi-


ç5o, haver-se-ha por nao escriplo; mas, provando-se, que
o viciamento fôra operado por qualquer pessoa, que não
fosse o testador, será applicado á tal pessoa o que fica
disposto no artigo 1937.°, para os que dolosamente occul-
tam ou subtrahem testamento.
(Vid. artigo 1943-)
Ainda que o codigo, nas palavras do artigo 1939 «som nenhmi
outro viciamento., considere vicio apparecer aberto o testamento
quer no espolio do testador, quer em poder de terceiro, é certo que
tal cicio não produz effeitos juridicos como o proprio artigo declara,
e que o artigo 1940. distingue perfeitamente entre testamento
-aberto» e testamento «viciado
Importancia nenhuma ligou o codigo à eireumstancia de se encon-
trar aberto o testamento cerrado, desde que permittiu nao testador
prescindir das formalidades externas de se coser e lacrar o testamento
depois de lavrado o respectivo auto de approvaçào pelo tabelliào
competente.
Outra era a antiga jurisprudencia, pois que a Ord. liv. 4° tit.
80. j§ 1 e 2', seguiudo o disposto ro direito romano especial-
mente na lei 21, Cod. de testamentis et rujaacdmodí testamnenta ordi-
nantur, mandava coser e lacrar o testamento depois de lavrado o
instrumento de approvaçéo, e a opinião mais geral reputava valido
ou nullo o testamento cerrado que apparecia aberto amorte do tes-
tador, conforme era encontrado em poder de terceiro ou no espolio
do auetor da herança, presumindo-se aberto no primeiro caso pelo
deposita-io da testamento sem consentimento do testador, e no se-
gundo caso pelo proprio testador na intenção de o revogar; como
era entào corrente que a simples ruptura dos sélíos do testamento
pelo testador annllava a disposição testamentaria 1,porque revelava
o proposito de o inutilizar.
Se, porém, o testamento está cancellado, obliterado, ou dilacerado
de rodo que não póde ler-se reunindo-se os differentes fragmentos
da disposição primitiva reputa-se não escripto, não só por disposição
da lei como pela natureza das cousas, porque, desde que no pódo
ler-se, é como se não existisse.
Dos artigos 1940. e 1943' combinados resulta que é valido o tes-
tamento que appareça dilacerado sempre que reuidos os respertivos
fragmentos possa ler-se a primitiva disposição, ou o testamento appa-
reça no espolio do testador ou em poder de terceiro, ou a dilaceração
fosse feita antes ou depois do fallecimento do testador com tanto
que fosse feita sem determinação consciente deste.
Portanto o testamento ainda dilacermdo, isto é, feito em pedaços,
eamcerlío, isto é, com alguma ou algumas palavras destruidas ou
inutilizadas por meio de traços ou riscos, ou a/i/erado, isto é, com
rasuras em branco ou com letras apagadas, vale sempre que podér
ler-se, salvo se os estragos foram feitos por ordem do testador.

1 Aecordão da Relação de Lisboa de 2 de outubro de 1872, Re-


vista de Legislação e de Jurisprudencia, de Coimbra, 7. anuo, n" 326,
pag. 222,

ta.
458 ARTIGO 1940.-

O artigo 1940., apesar de fazer referencia expressa unicamente


ao artigo 1937. que falla apenas da ocenlteçôo, e não ao artigo
1938., que tracta da sbtraeção, de certo porque a commissão revi-
sora desdobrando o artigo 2076.^ do projecto primitivo que em si
englobava a materia dos artigos 1937.° e 1930., se esqueceu de
fazer referencia ao artigo 1938.v, como a fizera ao artigo 1937.,
deve reputar-se do mesmo modo applicavrl á subtracção prevenida
no artigo 1938.°, como á oceultaçilo prevenida ao artigo 1937.,
vista a referencia do artigo 1938.- ao artigo 1937."
É admissivel a reforma do testanento, que se perdeu, extraviou,
ou inutilisou?
Com o fuidameeto de no poder verificar-se se haviam sido guar-
dadas todas as formalidades legas, e de não poder ser sapprida
a prova testaieentaria por outra especie de prova e muito menos
por depoimento de testemunhas, por ser da essencia deste actojuri-
dico a escripta com as solomnidades legaes e a intervençào do ofli-
cial publico artigo 2428.^, jà se julgout improcedente a acção de
reforma do testamento que desapparecet ou foi subtrahido ou por
qualquer fórma inulilisado antes de publicado.
E é verdade que a comrissão revisora conservando o artigo 2079:
do projecto primitivo correspondente ao artigo 1940.^ do codigo, em
todas as ediçdes dos seus prejectos logo nos trabalhos da primeira
revisào lhe sopprimiu a referencia ao artigo 1893.° que se seguia ao
artigo correspondente ao artigo 171. e que era assim redigido:
«Se o testamento se perdor por evento desconhecido do testador,
ou por haver sido supprimido por outrem, poderão os interessados
requerer o seu cumprimento, se poderem demonstrar cumpridamente
o facto da perda ou suppressào, e o conteúdo no mesmo testamento»,
e a final foi o mesmo artigo 1993.^ eliminado pela commissâo de legis-
laçio da camara dos deputados.
Seria eliminado por desnecessario, ou por inacceitavel?
O codigo, estabelecendo miudamente penalidades tanto civis como
criminaes para os que inítilisam os testamentos, em parte nenhuma
allnde sequer à reforma d'estes instrumentos; e é certo que o tes-
tamento cerrado se foi extraviado ou perdido, antes de publicado
nos ternos dos artigos 1932. e 1933., a custo póde ser reformado
pela simples razão de difficilrente poder ser provado o seu conteúdo,
por isso mesmo que era cerrado ou secreto.
Não pôde porém, presumir-se que o legislador com a eliminação
do artigo lt93 do projecto primitivo quizesse privar o instituido
do direito que aquelle artigo lhe reconhecia.
O codigo expressamente garante ao interessado o direito de exigir
a reparação de perdas e daonems e a competente responsabilidade
ci-il e pessoal desde que possa fazer prova dos factos a que se refe-
ria o citado artigo 1893. do projecto primitivo; e essa prova é que
seria necessaria para a reforma do instrumento por meio de acção
ordinaria conforme o artigo 586. do codigo de processo civil.
Ora o direito a indemnisação de perdas e daunos, se o lesante é
falto de meios, pôde não cempensar a perda do beneficio testamen-
tario.

Accordão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de julho de 1881,


Direito, 17. anno, n 14, pag. 214.
i,.

ARTIGOS 194i E 1942.0 459


E certo que na reforma do instrumento não podem ser preenebidas
as formalidades ordinarias dos testamentos.
Mas o mesmo succide com a reforcaa dos outros documentos.
Além disso não é o mesmo o caso de ihcer testamento e o caso de
relariss judicialnete o instrumento testamentario perdido ou ex-
traviado.
Nio lia razdo para no direito de reformar judicialmente os instru-
mentos que se extraviarem ou perderem abrir uaa excepçdo para
os testamentos quer publicos, que eerrados, pois uns e Otros estào
comprehendidos no artigo 2423.° ý 3.-, porque o testamento cerrado
reveste pelo instrumento de approvaço a natureza de auto publico,
ou documento outlcítico apesar de na sua lettra só ao instrumeao
parecer referir-se o artigo 2429., porque instrumento e disposiçào
de ultima vontade 5 juridicamente inseparavel no testamcto.
Julgamos pois que o instrumento testamentario púde ser reformado
como qualquer outro documento feita que seja a prova necessaria
para a reforma.

Art. 191i.° O viciamlento presumir-se-lia feito pela pessoa,


a cuja guarda o teslamento estiver rotulado, em quanto o
contrario se não provar.
Como na maxima parte dos casos seria impossivel fazer prova
directa de quem óIra o auctor da abertura, do cancellameato, da
obliteraçào ou da dilaceração do testamento, factos praticados em
regra a oecultas, atttibue-se o viciamento á pessoa a cuja guarda
estiver confiado o testamento cerrado, e assim ao testador ou a
terceiro conforme for encontrado no espolio do testador ou em poder
de terceiro o testamento.
Esta presuaapçào legal póde collocar moitas vezes o depositario
na posiçIo de victima iaíocente de crimes alicios, pois que para se
livrar de responsabilidade carece de provar que foi outrem e não
elle quem viciou o testamento.
O odigo, porem, foi rigoroso com o viciamento das disposições
de ultima vontade, impo do assim a maior sollicitude ao depositario
na guarda do testamento.
O depositario, que foi victima do seu desleixo ou da sua demasiada
confiança, no guardando o testamento com todo o escerupulo, e dei-
xando que terceiro, interessado ou no interessado, o viciasse, a
si impute a responsabilidade proveniente de aào ter cumprido com
o devido zelo as suas obrigaçJes.

Art. 1942. Se o testamento se achar só alterado, ou


emendado em parte por letra do testador, com resalva e
assignatura, não será ancíllado por isso. e valerão as dietas
emendas, como se fossem parte d'elle.
O codigo depois de exigir tantas formalidades para o testamento
publico, e para o auto de approvaçlo do testamento cerrado, vem
afinal ao testaonto olographo, dispensando a intervençdo de ohi-
cial publico e de cinco testemunhas para verificar se o testador es-
tava em seu perfeito juizo o livre de coacção no momento de fazer
460 ARTIGO 1942-

a sua ultima disposição, e approximando-se assim do systema do


projecto primitivo onde cabia melhor este artigo; novidade contra a
qual se pronunciam todos os que julgam iwlispesavel a verificação
da liberdade e da espontaneidade do testador no acto solemne de
testar
A disposição do artigo não se parece sequer com as antigas me-
~oris te,/anentariasou documentos particulares em que o testador
fazia alguma alteração ou additamento ao testamento, quer estabe-
lecendo legados, quer impondo novas condições aos instituidos, quer
fixando regras para :s suecessão.
O que, porém, está na lei é que o tesador, que aliás não póde
fazer testamento sem tabelliào e sem testemunhas, póde todavia alte-
rar e emendar o testamento só por si, sem intervençâo de oflicial
publico e de testemunhas, com tanto que a alteração ou emenda
reuna os seguintes requisitos: 1.- recair em parte, e não no todo do
testamento; 2.o ser feita por letra do testador; 3t resalcar e asi.
gnar as alterações feitas.
A alteraçào e a emenda, que representam o mesmo pensamento
como se vê da propria letra do artigo - e ralerdoaos ditas emendas --
feitas com letra que não seja do testador, ou com letra do testador
mas sem resalva ou sem assignatsra do mesmo testador não preju-
dicam as disposiçles escriptas no testamento.
O artigo só declara validas as emendas feitas por letra do testador
com resalva e assignatura.
Limita o artigo a par/e do testamento o direito de o alterar, de
certo para não auctrisar expressamente por este meio indirecto o
testamento olographo
Mas tomado á letra pôde o testador mudar a instituição de herdeiro
e tudo o que for essencial no testamento, com tanto que deixe de pé
alguma disposição testamentaria por mais insignificante que seja, o
que no fundo equivale à revogação total do testamento.
Por isso já se julgou que a alteração, como não é restrieta a de-
terminada disposição, pôde abranger todo o testamento
Esta disposição, porém, vai de encontro à letra da lei, cujo pre-
ceito não pôde ampliar se visto representar uma excepção ao direito
commum.
Exige o codigo para a validade das emendas simplesmente a
resalva e a assignatura, e não a data, que em todo o caso ha de ser
posterior ao instrumento de approvaçào, pois que para auctorisar
o testador a alterar o testamento depois de approvado é que se intro-
duziu a disposição do artigo
Para o alterar antes não era precisa tal providencia.
Róde pois o testador usar da faculdade, que o artigo lhe confere,
ou lhe fosse entregue aberto, ou fechado, o testamento depois de
lavrado o instrumento de approvaço.
Mas só no testamento cerrado são admissiveis estas emendas, e
não no publico que está na nota do tabellião e que só pôde ser alte-
rado por outro testamento com as formalidades ordinarias.
No silencio do codigo, que não determina o modo de fazer a alte-
ração nem diz onde ba de ser escripta a resalva, bem podem ser

r Accordio do Supremo Tribunal de justiça de 5 de março de 1897,


Gazeta da Relaçdo de Lisboa, 10. anno, ni.- 74, pag. 586.
r ARTIGOS 1943.0 a 1944. 461

feitas as emendas, ou no corpo do testamento onde haja algum inter-


vallo em branco, ou por entrelioha, ou nas morgeos do papel, e até
depois do auto de approvaçio, que oaz parte integrante do testa-
mento, se houver espaço 'o se para a emenda ou alteraçào senão
tambem para a resalva e assignatura.
O decreto de 14 de setembro de 1900 no artigo 69.- n.o 8.o manda
fazer a resalva das emendas, entrelinhas, traços e rasuras antes das
assignaturas.
A resalva, porém, 0o e necessaria, porque só então é possivel,
quando as emendas forem em entrelinha.
Se a alteração for escripta em seguida ao auto de approvaçào ou
nas margens do testamento sem referoeia à parte alterada não ha
resalva que fazer, porque a resalva então é impossivel, ou sem si-
goificaçào.

Art. 943.° Se o testamento se achar dilacerado, ou feito


em pedaços, no espolio do testador, haver-se-a por não es-
cripto, ainda que possam reunir-se os fragmentos e ler-se
a disposição, excepto provando-se plenamente, que o facto
acontecera depois da morte do testador, ou por elie fôra
praticado em estado de demencia.
(Vid nota ao artigo 1940.o)

SUB-SECCA iv

Do testamento militar

Art. 1944.s Testamento militar é o que podem fazer os


militares, e os empregados civis do exercito em campanha
fira do reino, ou ainda detlro do reino, estando cercados
em praça fechada, ou residindo eí terra, cujas communi-
cações com outras estejam cortadas, se nessa praça ou terra
não houver tabellião.
O velho direito romano permittiu o testamento privilegiado ao
soldado que em moreia ou no campo da batalha não poderia testar
com as formalidades ordinarias, e levou a exnggeração pela dispensa
de formalidades a ponto de se contentar com a disposiçào escripta
com a ponta da espada molhada 0o sangue que emanava da ferida.
A origem d'esta feroua de testar, fosse ou oào instituido o testa-
mento militar, segundo o testeunho de Ulpiano, por Julio Cesar por
favor e graça especial ao soldado que andava sempre em iniaíens
pericilusoorti, deve attribuir-se a eircumstancias listoricas, porque
462 ARTIGO 1944."

eoincidiu com a preponderancia da classe militar em virtude da sua


importancia politica e da sua intervenção directa nas revoltas do
imperio.
O testamento maritimo aliás com os mesmos fundamentos do tes-
tamento militar foi creado mais tarde, por mais tarde se haverem
tortado frequentes e consideradas as viagens de mar.
As legislaçóes modernas regularisarasi as duas fórmas de testar,
mandaudo observar o direito commnmí na parte intrinseca do tes-
tamento quer militar quer maritimo, pois que ás prescripçes do
artigo 1763 e segintes estáo obrigados os militares como os que o
não são, e sujeitando um e o outro As mesmas regras e formalidades,
mutatis mutandis, sem todavia dispensar as solemnidades que a lei
reputou nrecessirias para assegurar a exactidão e autlíenticidade das
disposiçües testamcntarias.
Hoje o testamento militar não represeita ui privilegio, e sim uma
necessidade pública.
Não tem hoje o testamento militar a razão do privilegio nem na
excessiva imípericia do testador como era por direito romano Inst.
liv. 2° tit. 11.P pr., nem na remuneraçâo dos trabalhos e perigos de
vida como era pelo nosso antigo direito Ord. liv. 4. tit. S3. pr., e
sim nas circumstacias especises que impedem o testador de testar
pela fórma ordinaria, e tanto que no se concedem aos militares
tantos privilegios em materia testamentnria, como lhes concedia
aquella Ordenação nos §§ 2. e 4., pois só ficam permittidos estes
testamentos privilegiados nos restrietos termos do presente artigo
e do § 5° do artigo 1945.1
O testamento militar da velha instituiçio hoje só tem o nome,
por só a militares ou a empregados civis aggregados ao serviço do
exercito ser permittido.
O testamento militar, que deixou de ser uso privilegio de classe
para se converter em testamento especial de fórmas accommodadas
á situação dos que têem a vida em perigo para defender a patria
contra inimigos externos ou contra inimigos internos, só póde ser
usado desde que rompe a campanha, quer no continente, quer no
ultramar, quer no extrangeiro, porque só desde entào corre perigo a
vida do militar ou do emtpregado civil.
A commissoo revisora com razão emendou o projecto primitivo
que no artigo 2096.0, correspondente ao artigo 1541.0 do codigo, nó
aos militares e aos empregados civis do exercito em campanha fóra
do reino permittia o testamento militar; como avisadamente só ga-
rantiu aos uilitares em campanha, quer dentro quer fira do reino,
o testamento por esta fórma privilegiada no caso de estarem cerca-
dos em praça fechada, ou de residirem em terra com comtuiiicaçêes
cortadas, e de no haver tabelliáo n'essa praça ou terra, isto é, só
admittiu testamento privilegiado quando não fosse possivel recorrer
ao testamento commum e ordinario.
Por isso não póde recorrer ao testamnto militar quem está em
rampanha no reino se as commiuicaç'es no estão cortadas por
via de guerra, interna ou externa, e sim por via de peste, etc., e vale
o testamento militar feito durante a suspensdo de hostilidades se
o cerco se não levantou.
Do privilegio de testar por esta fórma especial gosam qíaesquer
corpos de guardas municipaes ou nacionacs. e de vontítarios, que
estejam militarmente organisados ou sob a inspecçâo do governo,
em campanha dentro ou fóra do paiz, e ainda mesmo em estado re-
volucionario porque o codigo no faz distineçào, bem como os mili-
r.
ARTIGO 1945.- 463

tares já despedidos do serviço e os commandantes das tropas já exo-


nerados do commando mas ainda dentro da praça.
A Ord. liv. 4.° tit. 83."° 8.P permittia testamento militar não só
aos soldados, mas tombem a quaesquer pessoas, posto que soldados
não fossem, que no exercito se achassem estando em terra de inimi-
gos.
O rodigo, porém, só reconhece o direito de testar por esta fórma
privilegiada aos empregados cici do exercito, como cirurgics mili-
tares, capelles, vivandeiras, engenheiros, negociadores, geogra-
phos, Listoriadores, e embaixadores, ou ministros, que por ordem do
governo acompanhem o exercito para qualquer serviço do estado.
Taombem aos prisioneiros de gLirra e aos refensreconhece o rodigo
da Prussia este testmento privilegiado, e egual provisão adoptou
o projecto de rodigo civil hespanhol no artigo 574.", e com uma
certa razão porque não pode dizer-se que para este efeito não este-
jam em campanha os retens e os prisioneiros de guerra.
Todavia o nosso codigo, que aliás teve por principal fonte o pro-
jecto de rodigo civil hlspanhlol, não faz menção expressa dos prisio-
neiros de guerra e dos refens, au por não poder o prisioneiro ou
refém manifestar livremente a sua vontade, ou talvez porque devendo
o testador no testamento militar declarar a sua ultima vontade
na presença de tres testemunhas idoneos, e do auditor da diéisão
respectiva, o, na falta d'este, na presença de algum ofttcial de pa-
tente, e ser remíettido o testamento com a possirel brevidade ao quar-
tel general e d'alli ao miiste, ia da guerra, liem alli tèCem os refens
o auditor da divisào respectiva, nem o seu testamento póde ser
remettido ao quartel general, e d'alii ao ministerio da guerra.

0
Art. 1945. militar, ou o empregado civil do exercito,
que quizer fazer tetalenlo, declarará a sua ultima von-
tade na presença de tres testemuuhas idoneas, e do auditor
da divisão respectiva, ou, na falta d'este, ta de algum
olfrcial de patente. O auditor, ou o oicial que supprir a sua
falta, escreverá a disposição testametlaria.
§ 1.0 Se o teslador se achar ferido onu doente, a falta de
auditor ou de oticial poderá ser supprida pelo capellão, ou
pelo facultativo do hospital onde estiver o doente ou ferido.
2.o A disposicão será lida, datada e assignada, con-
forme fica disposto nos artigos 1914.0 e 1915.°
3.° Este testamento ser remeltido, com a possivel bre-
vidade, ao quartel general, e dialli ao uinislcrio da guerra,
que o fará deposilar ao archivo testamentario do distrícto
administrativo, onde o dicto testamnto lia de ter elfeito.
S4.° Fallecendo o testador, fará o governo noticiar a
sua morte no periodico ollicial, designando o archivo onde
o testamerto se acha deposilado.
S5.° Este testamento ficará sem effeito passado um mez
depois do regresso do testador ao reino, ou de ter cessado
o cerco, ou a incomutmunicabilidade da terra onde o mesmo
testamento foi feito.
464 ARTIGO 1946."

Art. 1946.° Se -o militar ou o empregado civil souber


escrever, poderá fazer testamento por seu proprio punho,
com Lauto que o date e assigne por extenso, e o apresente,
abertlo ou cerrado, na presença de luas testemunhas, ao
aruiror, ou ao olficial de patente que para esse fim o sub-
stituir.
1.° 0 auditor ou o ollicial, a quem o dicto testamento
for apresentado, escreverá, em qualquer parte d'elle, uma
nota do logar, dia, mez e anuo em que foi apresentado;
esta nota será assignada por elle e pelas sobredictas teste-
ruinas, e dar se-Ia ao testamento a direcção indicada no
3.1 do artigo antecedente.
.° Se o testador estiver doente ou ferido, poderá o
crpelláo ou o facultativo fazer as vezes do auditor ou do
olicial.
4 3. É applicasel a esta especie de testamento o que
fica disposto nos §§ 4.1 e 5.° do artigo antecedente.

(Vid. artigos 1949.- a 1951.°)


Tem toda a analogia o testamento míaritimo com o testamento
militar, porque é a mesma a razdo que os justifica-o perigo que
corre a vida das pessoas e a impossibilidade de testar pela fórma
ordiuaria -.
Permittia a Ord. liv. 4. tit. 83.0 aos soldados, que iam para a
guerra ou estavam nos arraiaes, fazer testamento verbal, ou es-
cripto pelo seu proprio punho, que podia ser feito quando estives-
sem no comflicro da batalha, «co ehào com a spada, ou nos seudos,
ou nas spadas com o sangue das fcridas, ou em qualquer outra cousa".
alas ou de palavra, ou por escripto, requeria sempre a presença
de duas testemmnhas.
Pela impossibilidade de testar por escripto nestes lances reconhe-
cem alguns codigos o testamento verbal aos militares no momento
de perigo, em occasiões de assalto ou de combate.
Legislações ba que estabelecem duas fórmulas especiaes de tes-
tamentos militares determinadas pelos dois periodos distinctos da
vida militar em campanha - o periodo de perigo imaíiente de
morte durante uma batalha ou assalto de praça ou de bateria ini-
miga-e o perigo conmumis à campanha-; e só io primeiro caso
permittem o testameuto verbal.
Pelo nosso codigo, porém, nem o testamento militar nem o testa-
mento maritisao podem ser verbacs. Hào de ser necessariamente
eseriptos por quem faça as vezes de tabellido, ou pelo proprio punho
do testador, como era já pelo projecto primitivo, artigos 2097.,
2098." e 2101.° a 2103.', correspondentes aos artigos 1945.°, 1946.' e
1949.' a 1951.'
t codigo portuguez proscreveu de todo o testamento verbal quer
nas disposições ordinarias quer nas disposições privilegiadas, no
só para evitar as fraudes e as falsificações que se faziam com os
testamentos uincupativos, mas ainda porque uno é de certo o mo-
meoto do assalto ou do conflicto a occasiào propria para o soldado
pensar sequer em fazer testamento.
ARTIGO 1946.- 465

Como nio pôde ir um tabellião com cada força de exercito des-


tinada a entrar em combate, deu-se a competeneia de tabclliâo ao
auditor e a oticial de patente tia falta ou to impedimento d'aquelle,
por ser qualquer d'elles o mais proprio pelo caracter especial do
seu cargo para substituir o oflicial publico; e póde ser supprida a
falta d'elles pelo capellào ou pelo facultativo do hospital onde esti-
ver doente ou ferido o testador.
No testaetito maritimo será tabellião o escrivão da embarcação
ou quem suas vezes tirer na presença de tres totetnniias e do coto-
mandatte artigo 1949'; e quando for o cotnatadante ou o escri-
vão da embiarcação a testar tomarão o seu logar os que devem sub-
stituil-os artigo 1950., como por identidade de razão no testamento
militar, quando tiver de testar o auditor ou o otlìcial que suas vezes
fizer, deverào tomar para este effeito o seu logar os seus tegaes sob-
stitutos.
Para o testamento tanto militar coeo aitiito, quier publico quer
escripto pelo proprio testador, exigia o projecto prilitivoa ta,,is-
tencia do comodante do destacamento ota compohia no tes-
tamento militar, c do commandante da embarcação no testamento
maritimo, entidade quela contoissão revisoer, sm se saber ptrqo!,
dispensou nos testamentos militares e manteve nos testairntos ma-
ritimos, quando no testamento maritimo é que mais necessario era
dispensar a presença do comanddote da embarcação, não só porque
a constante vigilancia a que o obriga a natteza das suas funeçécs
olilciaes mal se casa com a obrigação de assistir á feitura de testa-
mentos, oias ainda porque a fé publica do escrivão da embarcação
torna escusada a pr e sença do cotmtandante.
Em momento de perigo é mesmo itopossivel o testamento maritimo,
porque não ha de o commandante abandonar as manobras do navio
e expór os navegantes O morte. para se entreter a authenticar tes-
taientos com a sua presença.
Tambem o codigo não exige a rubrica do testador tio testamento
militar e maritimo onde ella é mais necessaria, por ser ali mais facil
falsificar a letra do testador que póde estar já alterada pelas circum-
stancias anormacs em qte o testamento é feito.
O codigo, que no testamoento militar perante otlicial publico, parece
impór-lhe a obrigação de dictar o testamento conforme o artigo
1912.", exigindo artigo 1945'" que o testador dcllíre a sua vontade,
contenta-se no testameito maritimo com que seja escripto o tes-
tamento pelo escrivão da ciiarcação artigo 1949., com quanto o
olticial publico ínã dera escrever disposição que pelo testador não
seja apresentada o verrbahnette ou por escripto na presença d'elle
e das testeíuioas, ou saiba ou não escrever o testador.
Tres testemunhas são precisas tanto no testamento militar como
no testamento iiaritimo, que scjam todasidcteos, isto é, que reunam
as qualidades indicadas no artigo 19660; e dtas bastam além do
tabclliào se o testamento for escripto e assignado pelo proprio ponho
do testador artigos 1946? e 1951.
Mas as testemtnhas, que no testamento militar devem todas
assignar com o seu nome por extenso vista a referencia do artigo
1945 ° 2 aos artigos 914.' e 1915., no testamento maritimo podem
assigoar todas de cruz vista a referencia do artigo 1949. só ao
artigo 1914 °
Não carece de ser feehado o testamento, quer militar quer mari-
timo, escripto pelo testolor.
Desde que o testador o iyreseitíl como disposição de sua ul-
ToMo I11 80
r

466 ARTIGO 1946

,tima vontade ao empregado que serve de tabelliáo, está feito o abso-


lutamente indispensavel.
O codigo civil francez artigo 997.° prohibe no testamento maritimo
disposições a favor de officiaes, que no sejam parentes do testador;
restricçào que o nosso codigo n'o adoptou talvez por nào sppôr
possibilidade de abuso, na influencia exercida pelos officiaes sobre
os seus subalternos, com as formalidades de que é cercado o testa-
mento para sbstar á fraude.
Quem nào pôde receber do testador em virtude d'aquelle testa-
mento so os empregados que no testamento militar e maritimo fazem
as vezes de tabelliào, e as testemuuhas in-trumentarias.
Nilo é, porém, nullo o testamento militar ju o testamento maritimo
que foi interrompido por outros serviços, pois nem o codigo exige a
prática de todas as formalidades em acto coutiouo e sem interru-
pço, como no testamento commum, nem as cireumstancias do logar
e das pessoas que intervêm n'este acto juridico permittiriam, couco
indispensavel, uma solemnidade incompativel com os regulamentos
militares e com os regulamentos dos navios que não admittem ex-
cepçào alguma ao cumprimento dos deveres profissionaes, tanto
mais que acima de tudo estio as necessidades da salvaçào de
todos.
Sera remettido, pelo ministerio da guerra o testamento militar,
pelo ministerio da marinha o testmnento maritimo artigo 1957."'
e pelo ministerio dos negocios extrangeiros o testamento feito em
paiz extrangeiro artigo 1íi.°, ao districto administrativo onde dever
cumprir-se, isto é, ao districto do ultimo domicilio do testado , que
é o Jogar onde se abre a sucresso nos termos do artigo 2009," sem
que nos effeitos juridicos do testamento influa o local onde rle for
encontrado ou apresentado.
Fallecendo o testador, quer com testamento militar quer com
testamento maritimo, isto é, fallecendo o militar em campanba ou o
marinheiro no mar artigo 1959.0, deve o governo logo noticiar na
folha oticial a morte do testador e o archivo onde está depositado
o testamento.
Conta-se o mez de duraçào d'este testamento privilegiado, no tes-
tamento militar do regresso do testador ao reino ou da cessaçào do
cerco ou da incommunicabilidade da terra, e no testamento mari-
timo desde a chegada do testador a territorio portuguez ou antes
desde o desembarque em territorio portuguez artigo 1958.S, e nào
em territorio extrangeiro, porque só er territorio portuguez pôde
o testador fazer testamento cosi as formalidades ordinarias.
Se antes de findar o mez, quer no testamento militar quer no
testamento maritimo, de novo se vir o testador na necessidade de
recorrer a esta firma de testar privilegiada, isto é, se outra vez se
achar cercado ou col as comuniucaçes cortadas ou reembarcado,
só se conta o mez desde que elle de novo se encontre na situaçào
prevista e regulada no artigo 1945.° § 5.° e no artigo 1958."
Ainda que o periodico official, que poucos léem, uào satisfaz ás
condiçes de publicidade artigo 1945." 4.° e artigo 1959." reque-
ridas em acto tio importante, não ha obrigação de noticiar a morte
do testador, nem pela imprensa que porventura haja na capital
do districto ou no domicilio do testador, nem por editars aftixados
na respectiva parobia, porque os joruaes de provincia costumam
transcrever da folha official o que interessa ás localidades, e em
todo o caso porque só na folha official o codigo manda fazer a publi-
caçào.

a
P, '

ARTIGOS 1947.' s 1948.- 467


Com a publicação osicial da morte deve fazer-se tambem a pu-
blicação do deposito do testamento, ainda que o testador não morra
dentro do cerco, nem sobre as aguas do mar, pois que póde estar já
em liberdade o soldado e em terra portugueza o marinheiro, e ser
ainda completamente ignorado o facto do testamento.
A Ord. liv. 4.^ tit. 83. § 6, seguindo o § 3. do tit. 11. do liv.
2. das Inst., dava como o codigo da Baviera valor ao testamento
militar até um ano depois da baixa do testador, sendo honesta e
neceessaria, e não por erros ou culpas suas. Marcam outros codigos
o praso de seis mees da chegada do testador a logar onde possa
testar pela fórma ordinaria; e de tres meses era o praso marcado
pelo projecto primitivo artigo 2097.^ 5.', correspondente ao artigo
1945.°, como de tres mees é o do codigo de Italia e outros.
Effectivamente o praso marcado no § 3^ do artigo é demasiada-
mente curto. Mas é tambem o praso do codigo do Mexico.
Caduca o testamento terminada a situação anormal que motivou a
especialidade, porque deve cessar a excepção quando o testador
voltar ao estado ordinario.

Art. 1947.' 0 testamento militar, a que faltar alguma


das formalidades ordenadas nos artigos 1945.1 e § 1,0
e 2.1, e l9l6.° e §§ 1. e 2.°, não produzirá elfeito al-
gum.
(Vid nota ao artigo 1919.')

SUB-sECCÂO V

Do testamento maritimo

Art. 1948.° Testamento maritimo é o que é feito tio alto


mar, a bordo dos navios do estado, por militares ou em-
pregados civis em serviço publico.
O direito romano desconhecia o testamento maritimo. O testa-
mento dos capitães, pilot5s e marinheiros da armada, a que se refe-
ria a lei unic. Dig. de Con. posses. ex testam. mil., era o testamento
militar.
O povo romano preoceupava-se mais com as conquistas da guerra
do que com o desenvolvimento do commercio maritim.
Foram as naçes modrnas que introduziram na sua legislação o
testamento maritimo, no qual todavia, pelas ordenanças de mari-
nha da França, promulgadas no tempo de Luiz XIV, e depois re-
cebidas no codigo civil ftraneez, a ninguem era permittido dispôr
em testamento maritimo além dos efeites que tivesse no navio e das
soldadas que lhe fossem deidas.

É,_-
468 ARTIGOS 1949.0, 1950.°, 1951. E 1952.

Invocando estas ordenanças por ser applicavel nos casos omissos


em materias mercantís a legislação das nações cultas conforme a lei
de 18 de agosto de 1769 §9., é que os nossos praxistas começaram
de proclamar a validade do testamento maritimo entre nós.
O projecto primitivo no artigo 2100." correspondente ao artigo
1948.· do codigo, e assim redigido,-«'Testamento maritimo é o que
é feito no alto mar, a bordo dos navios da marinha real e nacional,
ou mercante»-, permittia o testamento maritimo a todas as pessoas
no alto mar, ou fossem militares ou empregados civis ou quaesquer
outras, quer cm serviço publico quer em serviço particular, ou fosse
da marinha real e nacional ouda marinha mercante a embarcação.
Pelo codigo só a bordo dos navios do estado ou antes sé a bordo
dos navios ao serviço do estado, e só no alto mar, e só aos mili-
tares e aos empregados ciris, e só aos militares e empregados civis
em serviço publico, é permittido o testasento maritimo, sem das
actas das sesses da commissâo revisora constar a razão de taes
alteraçles na essencia do artigo.
Apenas se conta8 na acta da sesso da commissão revisora de 17
de novembro de 1 62.-, que no exame do artigo 2100." do projecto
primitivo, propozera o sr. José Julio a eliminação das palavras ma-
rinha mercas/e tanto n'aquelle artigo como nos seguintes, que o sr.
Levy propozera a substituição das palavras marinha real e nacional,
que sobre proposta do sr. Simas féra approvado o artigo tal qual se
acha no codigo, e que o sr. Silva Ferrão declarra votar pela am-
pliaçâo da mesma disposiçâo aos degredados.
Em todo o caso é admittido o testamento maritimo a bordo de
navio do estado que sahiu a barra emquanto o navio se conserva
no mar alto ainda que só para experiencias ou exercicios praticos;
e tão amplo é o direito de dispór no testamento maritimo como no
testamento ordinario.

Ari. 1919. A disposição será escripta pelo escriv5o da


embarcação, ou por quem suas vezes fizer, na presença
de Ires testemunhas idoneas e do commandante, e será lida,
datada e assignada, como fica dicto no artigo 191i..°
Art. 19511." Se o commanrlante ou o escrivo gnizer fa-
zer testamento, tomarão o seu logar os que devem substi-
luil-os.
Art. 19 5 1.° Se o militar ou o empregado civil souber
escrever, poderá fazer testamento por seu proprio punho,
comianto que o date e assigne por extenso, e o apresente,
aberto ou cerrado, na presença de duas lestemunhas e do
commandante da embarcação, ao escrivão desta, ou a quem
suas vezes fizer.
unico. O escrivão da embarcação escreverá em qualquer
parte do mesmo testamento uma nota do logar, dia, mez
e anno em que foi apresentado, e esta nota será assigtada
por elle e pelas testemunhas, e rubricada pelo comman-
dante.
Art. 1952.° 0 testamento maritimo deverá ser feito em
ARTIGOS 195:4, 19: , 1956. E 1156 469

duplicado, guardado entre os papeis de bordo, e mencio-


nado no diario da embarcação.
Art. 1953.° Se o navio entrar em algum porto extran-
geiro, onde haja consul ou vice-consul portuguez, fará o
commandatte da embarcação depositar em poder do dicto
consul, ou vice-consul, um dos exemplares do testamento,
fechado e sellado, com uma copia da nota, que deve ter
sido lançada no diario da embarcação.
Art. 1954.Õ Aportando a embarcação a territorio portu-
guez, será o outro exemplar, ou ambos, se nenhum d'elles
for deixado em outra parte, entregue á aucloridade mari-
tina do logar, na forma declarada no artigo antecedente.
Art. 1955.° Em qualquer dos casos mencionados nos
dois artigos precedentes, o commandante do navio haverá
recibo da entrega, e o mencionará por cota no competente
logar do diario da embarcação.
Art. 1956.1 Os dictos consules, vice-consules, ou aucto-
ridades maritimas, farão, logo que recebam os exemplares
acima mencionados, un termo de entrega, e, com a pos-
sivel brevidade, o remetterão com os mesmos exemplares
ao ministerio da marinha.
Para prevenir o perigo da perda é sempre feito em duplicado o
testamento maritimo, quer seja escripto pelo proprio punho do tes-
tador, quer pelo escrivão da embarcação ou por quem suas vezes
fizer.
Tnambem para segurar a entrega e obviar a todo o risco de perda
ou de extravio se deve entregar uni dos duplicados, logo que o navio
entre em porto estrangeiro, ao agente consular que alli tivermos, e
reservar-se o outro para a respectiva auctoridade maritima do pri-
meiro porto portuguez, à qual se entregarào ambos os exmplares
aportando a embarcação a aguas portuguezas primeiro que a porto
estrangeiro.
Faz-se com este testamento o mesmo que com o registo de nasci-
mento e de obito occorrido em viagem de mar artigos 2472.° e
2486.°, que tambem deve ser entregue pelo commandante do navio
no porto extrangeiro a que a embarcaçào aportar ao nosso agente
diplomatico ou consular se abi o houver um dos autographos, e o
outro ao competente official do registo civil do primeiro porto
nacional onde entrar, a fim de subtrahir o documento aos perigos do
mar, com a unica differença de poderem ser entregues os assentos
de nascimento e de obito indifferentemente aos agentes diplomaticos
ou aos agentes consulares artigos 2472.° e 2436., quando o testa-
mento só deve ser entregue a agente consular, differença no fundo
sem importancia, porque não haverá de certo porto estrangeiro, em
que Portugal tenha agente diplomatico sem ter agente consular, ou
sem cumular as funcções consulares o agente diplomatico.
O que infue nas condiçôes da entrega é a circustancia de ser
nacional ou extrangeiro o porto onde primeiro fundeia a embarcaço,
e de n'elle haver ou não consul portuguez.
470 ARTIGOS 1951.0, 1958., 1959a 1960.0

As auctoridades territoriaes é que não se entrega o testamento


maritimo ainda que no porto extrangeiro não haja representante
consular do governo portuguez, salva convenção especial.
Do testamento o depositario é o commandante da embarcação,
porque é elle quem entrega os exemplares e cobra o recibo, como é
elle o encarregado de fechar e sellar o testamento, visto ser obri-
gado a entregal-o n'este estado segundo os preceitos dos artigos
1953.0 e 1954., e não incumbir a obrigação de o sellar nem ao tes-
tador que póde apresentai-o aberto ou cerrado artigo 1951", nem ao
escrivão da embarcação a quem o codigo não impõe semelhante de-
ver.
Fazem-se dois originaes do testamento, vistas as palavras feito em
duplicado, seguindo-se assim a jurisprudericia do codigo civil fran-
cez; sendo escriptos ambos os duplicados pela mesma pessoa e
observando-se n'um e n'outro as formalidades prescriptas na lei.
Mas a falta de duplicado, ou por não haver tempo de fazer senão
um original, ou por qualquer dutro motivo, não invalida a dispo.
sição, porque o duplicado tem por tini apenas obstar ao extravio
da disposição testamentaria, e porque segundo o artigo 960.' só é
nullidade insanavel nos testamentos maritimos a falta das solemni-
dades ordenadas nos artigos 1949.' a 19510, ficando assim excluido
da sua disposição irritante o preceituado no artigo 1952.'
Mesmo o testamento commum se faz muitas vezes em duplicado
para evitar todo o risco de extravio.
0 projecto de codigo civil hespanhol queria em vez dos dois tes-
tamentos originaes ima copia do testamento original, assignada
pelas mesmas pessoas que tivessem assignado o testamento no caso
de serem vivas e estarem a bordo da embarcaçào, o que era a final
o testamento em duplicado ou dois autographos do testamento
segUndo a linguagem do artigo 2472.0
Do testamento externo, regulado no artigo 1963., apenas se tira
copia para enviar ao governo.

Art. 4957. Por este ministerio será o testamento man-


dado depositar, na fôrma ordenada na ultima parte do § 3.0
do artigo 1945.0
Art. 958.0 0 testamento maritimo só produzirá effeito,
fallecendo o testador no mar, ou dentro d'um mez, contado
desde o desembarque do dicto testador em territorio por-
tuguez.
Art. 1959.0 Se o testador fallecer no mar, observar-se-ha
o que fica disposto no § 4.0 do artigo 4945.°

(Vid. nota ao artigo 1945.)

Art. 1960.0 0 testamento maritimo, a que faltar alguma


das solemnidades requeridas nos artigos 4949.0, 1950.°
e 4954., não produzirá effeito algum.

(Vid. nota ao artigo 1919')


Pr -s-1

ARTIGO 1961.0 471

StI-seCCto 'I

Do testamento externo ou feito em paiz extrangeiro


Art. 1961.° Os testamentos, feitos por portuguezes em


paiz extrangeiro, produzirião os seus eifeilos legaes no reino,
sendo formulados aulhenticamente, em conformidadade da
lei do paiz onde forem celebrados.

No interesse da testamentifacção dos portuguezes féra da patria
regula o rodigo, n'esta secção, o testamento feito por portuguez em
paiz extrangeiro em conformidade da lei d'esse paiz artigo 1961."
ou perante os nossos consules ou vice-consules em conformidade da
lei portugueza artigos 1962.° a 1964.o, e por outro lado determina "'6'
os effeitos no reino de testamento feito por subdito não portuguez
fóra de.Portugal artigo 1965.0
Os testamentos de portuguezes no extrangeiro perante os officiaes
publicos d'esse paiz hão de conformar-se com as leis do mesmo paiz
pelo principio locs regil actua.
Negam alguns codigos validade aos testamentos nuncupativos,
como aos testamentos de mão commum feitos onde sejam permit-
tidas estas fórmas de testar, porjulgarem incompativeis os primeiros
com a exigencia substancial do formulario escripto, e contrarias os "1!
segundos á ssncia da disposição testamentaria
Em virtude, porém, do principio leto ei forçoso é reconhecer effei-
tos em Portugal aos testamentos tanto nuncupativos como de mào
commum feitos no Brazil ou em qualquer paiz onde sejam permit-
tidos una vez que tenham as formalidades da respectiva lei extran-
geira. 1
Não deixa por isso de produzir todos os seus efFeitos legues em
Portugal, reunindo as formalidades exigidas pela lei respectiva, o
testamento feito por portuguez sem intervenço de oficial publico
em paiz onde a presença do official não seja neressaria para a va-
lidade da disposição testamentaria.
Ser formulado authl/icmenoe o testamento de portuguez em paiz
extrangeiro é ter a authenticidade determinada pelas leis do paiz onde
for celebrado, porque só assim faz completa prova em Portugal ar-
tigo 2430."
A disposição dos artigos 1961." e 1965., aliás especial para os
testamentos, está de accordo com o preceito geral do artigo 2430."

1 Accordào da Relação do Porto de 3 de maio de 1878, Revista de


Legislação ede Jurisprudencia, de Coimbra, 14. anno, n" 704, pag.
444.
1.
til

-55
1L
472 ARTIGO 1962.'

que dá aos documentos authenticos passados em paiz extrangeiro na


conformidade da lei d'esse paiz a mesma força probatoria que a do-
cumentos de egual natureza exarados ou expedidos no reino, e com
o principio geral do artigo 24. que acceita a fórma externa dos actos
conforme o estatuto do paiz onde forem celebrados salvo nos casos
em que a lei expressamente ordenar o contrario.
O que o codigo não regula é o testamento feito por extrangeiro
em Portugal perante o consulado da sua nação, ainda para ser
observado no reino, porque esse testamento é como se fosse feito
no paiz do testador.

Art. 1 9 6 21 Os consules ou vice-consules portuguezes


poderão servir de tabelliães, na celebração e approvação
dos testamentos dos sulditos portuguezes, comtanto qae
se conformem com a lei portugueza, excepto no que diz
respeito á nacionalidade das testemunhas, que poderão,
n'este caso, ser extrangeiras.
Era desconhecida do direito romano, e da nossa legislação civil
anterior a especie do presente artigo, a mais importante de toda a
secção.
Nem depois de publicado o codigo civil francez, que primeiramente
a regulou, se ocruparam d'esta materia as obras dos nossos juris-
consultos; e a lei de 18 de agosto de 1769 j a. como os estatutos
da Universidade liv. 2.' tit. 5.' cap. 2. § 16., só em materias poli-
ticas, economicas, mercantis e maritimas, declaravam subsidiaria a
legislação extrangeira.
O regulamento de 21; de novembro de 1851 dando aos nossos
agentes consulares, consules e vice consules competencia para os
actos do tabellionato em geral, e nomeadamente para lavrarem tes-
tamento publico e auto de approvaçào de testamento cerrado, impne-
lhea a obrigação de se conformarem comi a legislação portugueza,
salva a excepção consignada em o n.° 1. do artigo 19(6.°, e de obser-
varem as disposiçbes do mesmo regulamento e modelos annexOs por
não ser n'este caso regida a fórma externa pela lei loci.
Nestes testamentos, que se reputam feitos no reino por uma ficçào
de direito internacional, que concede a exterritorialidade á missào
diplomatica e consular, considerando-a parte do territorio da nação
a que os funcionarios pertencem, hão de os nossos consules ou vice-
consules cumprir á risca, o disposto nos artigos 1912.' a 1919.' se
o testamento é publico, e as preseripçées dos artigos 1921.° a 1925.°
se o testamento é cerrado.
O unico parito em que os nossos agentes consulares não são obri-
gados a conformar-se com a lei portugueza é em relação ás teste-
munhas que podem ser extrangeiras pela impossibilidade de muitas
vezes reunir o numero preciso de compatriotas para authenticar
o testamento feito por portuguez em paiz extrangeiro.
No projecto primitivo o artigo 2114.', correspondente ao artigo
1962.' do codigo, terminava ainda pelas seguintes palavras - adno
havends ao rloar portuguezes, quae jossam interir no acto,-.
A conuisao revieora, porém, segundo consta da acta da sessão
de 19 de novembro de 1862, eliminou esta excepção sob proposta
do se. Ferreisi Lima para evitar questes com a prova de haver ou
r
ARTIGOS 1963' E 1964.- 473

não no logar na ocrasido da feitura do testamento os portuguezes


necessarios para intervir no acto.
Nas testemunhas e. trcaqeirascompretendem-se, tanto os natnraes
do paiz onde o testamento é feito ou approvado, como os naturaes
de outro qualquer paiz, porque a lei não distingue, e porque a ra-
zão é a mesma.

Art. 4963.° Os consules ou vice-consules, logo que hajam


formulado algum testamento em nota publica, transmit-
tirão uma copia ao ministerio dos negocios extrangeiros,
que dará a esta a direcção indicada no § 3.° do artigo
9945.°
Art. 1964.0 Se o testamento for cerrado, o consul ou
vice-consul, que o houver approvado, lançará por cópia na
respectiva nota o termo de approvação, e assim o partici-
pará ao governo, pelo ministerio dos negocios extrangei-
ros.
§ unico. Se o testamento for dado a guardar ao consul
ou vice-consul, o depositario fará menção d'esta circum-
stancia, e passará recibo da entrega.

No espirito de guerra a toda a fórma de testar com a apparencia


de testamento olographo eliminou a commissão revisora, e logo nos
trabalhos da primeira revisão, o artigo 2117.- do projecto primitivo,
final d'esta secção, que permittia ao portuguez residente em paiz
extrangeiro escrever de proprio punho o seu testamento, contanto
que o datasse e assignasse por extenso, e o apresentasse ao consul
ou vice-consul para este em qualquer parte do mesmo testamento
escrever uma nota do logar, dia, mez e anuo em que lhe fâra apre-
sentado, assignada por elle e pelas testesmunhas, e o remetter com
a possivel brevidade ao governo para ser depositado no archivo
testamentario do districto administrativo, em que elle devesse pro-
duzir o seu effeito; e introduziu de novo o artigo 1965.^ cuja doutrina,
como a do artigo 1961., estava já reconhecida em principio no ar-
tigo 24.', visto o silencio do codigo no caso.
A menção da entrega do testamento cerrado quando o testador o
confiar á guarda do consul deverá ser feita no livro onde se tomar
nota da approvação do testamento, isto é, a declaração de ter ficado
o testamento em deposito no consulado ha de fazer-se no livro onde
se lançar o termo de approvaçào que é o indicado no artigo 1926.,
e ha de passar-se ao depositante recibo da entrega como determina
o § unico do artigo 1964.'
Ao ministerio dos negocios extrangeiros ha de ser remettida
copia do testamento publico e participada a approvaçào do tes-
tamento cerrado, para na publicação na folha oficial dos nomes dos
cidadãos portuguezes fallecidos vir a nota dos que deixaram testa-
mento.
Do testamento cerrado apenas dá parte o consul ou o vice-consul
porque péde o testador conserval-o em seu poder, ou confiat-o a
terceiro, e não o mandar para o archivo testamentario do respe-
ctivo districto.
r

474 ARTIGO 1964."

Devia por isso ter feito referencia o artigo 1963.° tambem ao § 4.


do artigo 1945.' como a faz ao 3 , por ser tão preciso no testa-
mento eterno, como nos testamentos militar e maritimo, noticiar com
a morte do testador no periodico oticial o archivo onde está de-
positado o testamento.
Póde o testador, mediante recibo como mediante recibo o entre-
gou, reclamar do consul ou do vice-consul, depositario, o testamento,
quando muito bem quizer, sem as formalidades prescriptas nos ar-
tigos 1930." e 1931.' que só são applicaveis á extracçâo do testamento
do archivo testamentario nos governos civis.
Para regular o exercicio das attribuiçes dos nossos funecionarios
consulares na celebração, approvação, deposito, transmissão e aber-
turas de testamentos de cidadãos portuguezes declarou a portaria
de 20 de novembro de 1883 que o consul ou vice-consul na celebra-
çào do testamento publico, ou na approvação do testamento cerrado
de cidadão portuguez, em viagem ou em residencia em paiz extran-
geiro, que no prefira formular a sua vontade em conformidade da
lei do paiz onde estiver, lia de observar as formalidades prescriptas
nos artigos 1912.' a 1918. ou 1921.' a 1924.' e no artigo 1966.' do
codigo, salva n'ui e n'outro caso a nacionalidade das testemunhas
que ó inditferente; que o consul ou vice-consul redigirá o testamento
publico ou o auto de approvação do testamento cerrado em lingua
de que tanto elle como o testador e as testemunhas tenham cabal
conhecimento; que celebrado um testamento publico ou approvado
um testamento cerrado transmittirá o consul ou vice-consul, logo
uma copia do testamento ou do auto de approvaçdo ao ministerio dos
negocios extrangeiros; que o consul ou vice-consul a quem for dado
a guardar testamento de cidadão portuguez formulado quer em
conformidade da lei portugueza, quer em conformidade.da lei terri-
torial, lavrará termo de deposito de que dará traslado ao deposi-
tante que póde ser constituido pessoalmente ou por procurador
ficando unida a procuração ao testamento; que o testador pôde reti-
rar do deposito o testamento quando lhe aprouver, lavrando-se
apenas termo da restituição, comparecendo pessoalmente, ou por
intermedio de procurador com procuração publica e especial que
ficará archivada; que o consul ou vice-consul a quem for entregue
um dos dois exemplares do testamento maritimo em conformidade
do disposto no artigo 1953', lavrará termo de entrega, 'do qual dará
um traslado ao commandante do navio, e remetterá outro ao minis-
terio dos negocios extrangeiros, e ainda outro junctamente com o
exemplar depositado ao ministerio dos negocios da marinha e ultra-
mar, lavrando termo da remessa do exemplar depositado, a qual
nunca poderá realisar-se por meio do mesmo navio a cujo bordo for
formulado o testamento; que em cada consulado e vice-consulado
haverá um livro especial onde se escrevam os testamentos publicos,
se lancem por copia os autos de approvação dos testamentos cerra-
dos, e se exarem os termos referidos; que o funecionario consular
que tenha intervindo no testamento publico ou no auto de approva-
ção do testamento cerrado, ou que tenha em deposito no posto con-
sular testamento de cidadão portuguez notificará ao ministerio dos
negocios extrangeiros, logo que lhe conste, o fallecimento do testa-
dor embora este tenha occorrido fóra do respectivo distrieto consu-
lar; que a abertura dos testamentos é da exclusiva competencia da
auctoridade territorial salvo o disposto nos tractados ou convenções,
mas que aos funccionarios consulares incumbe promover a abertura
e registo dos testamentos dos cidadãos portuguees fallecidos nos
rJF_

ARTIGOS 1965.• a 1966.- 475

seus districtos, e remetter depois ao ministerio dos negocios extran-


geiros copias authenticas dos referidos testamentos, devendo ser
publicadas no Diario do Gorerno as communicaçòes do caso recebi-
das no ministerio dos negocios extrangeiros.
Não prescreveu o codigo designadamnte as formalidades essen-
ciaes do testamento externo, como prescreves as do testamento mili-
tar, e as do testamento maritimo artigo 1960., por se tractar não
de testamento com fórmulas especiaes, e sim de testamento com-
muni com as solemnidades ordinarias do paiz ou de Portugal con-
forme é feito perante as auctoridades estrangeiras ou perante os
nossos consules ou vice-consules.

Art. 1965.° 0 testamento, feito por subdito não portu-


guez fóra de Portugal, produzirá n'este reino os seus effeitos
legaes, ainda com relação aos bens nelle existentes, obser-
vando-se no testamento as disposições da legislação do paiz
onde for feito.

(Vid. nota ao artigo 24.°)

sUn-SEcCço vil

Disposições communs ás diversas fôrmas de testamento

Art. 1966. Não podem ser testemunhas em testamento:


1. Os extrangeiros;
2.0 As mulheres;
3.° Os que não estiverem em seu juizo;
451 Os menores não emancipados;
5.1 Os surdos, os mudos, os cegos, e os que não enten-
derem a lingua em que for escripto o testamento, sendo
publico, ou o auto de approvação, sendo o testamento cer-
rado;
6.° Os filhos e os amanuenses do tabellião, que escrever
ou approvar o testamento;
7. Os declarados por sentença incapazes de serem tes-
temunhas instrumentarias.
§ unico. A edade legal para ser testemunha em testa-

(Vid. artigo 2492.)


476 ARTIGO 1966.

mento, ou em approvação felle, compre tel-a na conjun-


etura em que é feito o dicio testamento ou approvação.

Exceptuando o n.° 6.1 que foi introduzido de novo pela commissão


revisora continha o projecto primitivo no artigo 2119.^, correspon-
dente ao artigo 1966.-, as mesmas restricçòes ás qualidades da
testemunha instrumentaria.
As providencias especiaes dos n." 3., 4.^ e 5.4, podiam ter sido
eliminadas por estarem já comprehendidas na regra geral do artigo
2510., como por inutil foi eliminado pela commissào revisora logo
nos trabalhos da primeira revisão o seguinte artigo com que abria
esta secção o projecto primitivo : - «E defeza aos tabellies, ou
quaesquer outras pessoas, que hajam de redigir disposiçoes de ultima
vontade, servir-se de abreviaturas ou cifras, sob pena de 50ã000 réis
de multa sendo tabelliâo, e metade não o sendo.
De testemunhas, quer em actos juridicos quer em processos, saão
absolutamente excluidas as pessoas especificadas nos artigos 2510.1
e 2511., as primeiras por vicio natural e as segundas por incompa-
tibilidade pessoal.
Foi o codigo muito mais rigoroso na escolha das testemunhas para
os actos juridicos contra os quaes não prevalece prova testemu-
nhal senão nos termos dos artigos 2507. e 2508.', do que para as
inquirições em processos onde fica sempre ao juiz grande latitude
para a apreciação dos factos a que respeitam os depoimentos.
Pelas nossas leis todos os que podem ser testemunhas instru-
mentarias podem ser testemunhas em processos judiciaes ou admi-
nistrativos de qualquer especie. Mas nem todos os que podem ser
testemunhas em actos de processo podem ser testemunhas imstru-
mentarias.
Exigiu o codigo os mesmos requisitos nas testemunhas instrumen-
tarias, ou o acto do instrumento fosse entre vivos ou por morte.
Mías cercou de mais solemnidades os testamentos, onde todas as
cautelas são poucas, porque só vigoram depois que o seu auctor des-
a p parece da superficie da terra.
Nada providenciou o codigo sobre os effeitos do erro commum
ácerca de inhabilidade da testemunha.
O sr. Seabra ainda apresentou em sessão de 19 de novembro de
1862 uma proposta para a commissão revisora resolver se o erro com-
mun quanto ao estado e qualidade da testemunha podia escusar-se;
e a commissão reservou para deliberar quando se tractasse da ma-
teria de provas.
Mas nunca mais se occupou de tal assumpto.
Não deveria invalidar a disposição testamentaria o erro commum
ácerca da nacionalidade da testemunha, isto é, a intervenção de
testemunha extrangeira, estando o testador persuadido, bem como o
publico, de que essa pessoa era cidadão portuguez.
Não salva, porém, de nullidade o testamento, e nem talvez da
responsabilidade civil o tabelliào, a boa fé a respeito da capacidade
das testemunhas, porque á especie parece applicavel antes o artigo
656.0 do que o artigo 664.° que a julgar pela sua collocação se re-
fere tambem não ás formalidades externas nem á capacidade das
pessoas que devem figurar no titulo, e sim ao objecto dos contra-
eos ou antes ao consentimento nos contractos, e que em todo o caso,
se é applicavel aos contractos, não é applicavel aos testamentos.
Portanto a intervenção de testemunha instrumentariacomprehen-
ppr-

ARTIGO 1966.- 477

dida nas exclusões do artigo annulla radicalmente o acto juridico


ou se soubesse ou se ignorasse o defeito da testemunha. t
No entre tanto tambem já se julgou, e por uniformidade de votos,
com fundamento no artigo 664. válida uma escriptura em que era
extrangeira uma das testemunhas, mas geralmente reconhecida como
portugueza. 2
Para apreciar a edade legal das testemunhas, como para apreciar
a capacidade do testador arigo 1765., o que se toma em conta é a
data authentica dos instrumentos, isto é, a conjonetura em que se faz
o documento, que nos testamentos publicos é o dia em que são exa-
rados no livro de notas e nos testamentos cerrados o dia do auto
de approvação.

1. 'e 2.', etc.

Levou o legislador os seus escrupulos na escolha das testemunhas


para legalisar os actro instromentarios até excluir as mulheres e
os extrangeiros que aliás podem ser testemunhas uns e outros em
processo de qualquer ordem e natureza artigo 2509.°; e só por ex-
cepçào admittiu, nos testamentos feitos em conformidade da lei por-
tugueza pelos nossos consules ou vice-consoles artigo 1962, para
testemunhas instruoocatarias os estrangeiros que por direito anterior
nao eram incapazes de ser testemunhas tas disposições de ultima
vontade.
Pela Ord. liv. 4.' tit. 80.' 4.' e tit. 85" pr., além dos feridos por
incapacidade natural, só as mulheres eram impedidas de ser teste-
munhas menos nos testamentos nucupativos
O projecto primitivo ainda admittia as mulheres como testemunhas
instrumentarias mas só até duas, e só na falta de varàes nos testa-
mentos nuncupativos.
No direito romano foram sempre excluidas de testemunhas nas
disposições de ultima vontade as mulheres por via do caracter poli-
tico que ahi tinha o testamento.
No direito moderno, porém, a exclusão das mulheres do ofdicio de
testemunhas não é pela mesma razão da legislação romana, não é
por não gosarem de personalidade juridica pois que essa já lIh'a
reivindicaram os progressos da civilisação, uns sim por na grande
maioria não inspirarem em razão dos seus habitos, modo de vida, e
natural fraqueza, absoluta confiança de se manterem firmes na ver-
dade para authenticarem actos solemnes.
O certo é que depois da promulgação do codigo não podem ser

t Accordãos, da lelação do Porto de 3 de fevereiro de 1877 e do


Supremo Tribunal de Justiça de 14 de junho de 1893, Direito, 9.
anno, oi. 28, e Gozeta do Relaço de Lisboa, 7.° anuo, n.' 36, pag.
385.
a Accordãos, da Relaçáo do 'orto de 20 de março de 1900 e do
Supremo Tribunal de Justiça de 22 de fevereiro de 1901, Rerista
dos Tri,suns, 18. anuo, n - 430, pag. 343, e Direit,, 33.° aonu,
i.' 10, pag. 150,
478 ARTIGO 1966.»

testemunhas as mulheres, senão em processo civel ou crime, e até


já foi julgada nulla uma citação por ter assignado uma mulher como
testemunha. 1
Com razão eliminou a commissão revisora por desnecessarias as
palavras do projecto primitivo relativas ás testemunhas extrangei-
ros ---«que não se acharem naturalisadosno reina» -visto serem ci.
dadãos portuguezes os extrangeiros depois de naturalisados e gosarem
da plenitude de todos os direitos civis, e mesmo dos direitos politicos
com a inhibiçào apenas de serem deputados, ministros d'estado, e
conselheiros d'estado; como por desnecessaria eliminou tambem a
declaração do mesmo projecto de que a prohibição aos eitrangeiros
de serem testemunhas nos testamentos devia entender-ee sem pre-
juizo do determinado no artigo 2114.°, correspondente ao artigo
1962' do codigo.

3.°, 4.° e 5.°, etc.

(Vid. nota ao artigo 2510.»)


A redacção do n.° 5.» que no projecto primitivo era assim :- «Os
surdos, os mudos, os cegos, e os que não entenderem a lingua do tes-
tador. -, foi pela commissão revisora, e logo nos trabalhos da pri-
meira revisão, substituida pela que hoje tem no codigo, e que é in-
comparavelmente preferivel.
Os surdos e os cegos não são absolutamente inhibidas de ser
testemunhas quanto a factos que não dependam dos sentidos do
ouvido ou da vista artigo 2510.° n.» 2.», porque de testemunhar não
são impedidos por incapacidade natural em processos artigo 2510.°
Mas são absolutamente excluidos de testemunhas instrumen-
tarias.

6., etc.

Por direito velho, Ord. liv. 4.» titt. 56.» e 95.», até os filhos dos
tabelliâes podiam ser testemunhas nos instrumentos lavrados por
seus paes; e contra a prohibição introduzida no codigo foram desde
logo dirigidas varias representações ao governo, cujos fundamentos
principaes eram :
1.° Que nunca fóra prohibido, antes tinha sido prática constante
servirem os amanuenses dos respectivos tabelliàes de testemunhas
nos actos entre vivos e de ultima voatade;
2.° Que esta prática nunca produzira inconvenientes, nem dera
logar a queixas que justificassem a abolição;
3.° Que pelo contrario era de maxima conveniencia para o mais
prompto expediente dos negocios acharem os interessados logo nos
escriptorios dos tabelliàes pessoas que servissem para testemunhas,
sem necessidade de andar sollicitando e incommodando outras de
fóra para testemunharem os actos alli celebrados;

1 Accordão da R -lação de Lisboa de 22 de abril de 1871, Gazeta


dos Tribunaes, n.- 4:505.
Fr-

ARTIGO 1966.' 479

4. Que todo aquelle, que tem de celebrar qualquer acto perante


o tabelliào, tem sempre o direito de ir acompauhado de pessoas da
sua escolha para servirem de testemunhas;
5. Que os amanueuses não são impostos pelos tabelliães para tes-
temunhas, e servem como tacs porque os outorgantes os aceitam,
rogam e approvamt para esse fim;
6.' Que é sempre muito dilficil retnir e conservar presentes, como
testemunhas, durante qualquer acto da competencia dos tabelliães,
e principalmente em actos de ultima vontade, pessoas que não têem
obrigação de permanecer por necessidade dos seus empregos nos
escripturios dos tabelliàes.
Porém, no intuito de obstar aos abusos que poderiam reultar da
intervençlo de testemunhas influnciadas pelo tabellião nos instru-
mentos authetticos, apesar da dithculdade de eucontrar sempre o
numero de testemunhas neccessario ao testamento, exclue o codigo
de testemunhas os filhos e os oaoonenses do tabelliào, que são egual-
mente excluidos de assignar a rogo, porque testemunha é tambem a
pessoa que assigna a rogo do testador.
Muitos, porém, opinavam por que a restricçào preceituada para as
testemsulas não era applicavel aos que assignavam a rogo, e que,
se nos testamentos e nos assentos de casamento carece de ser feita
por testemnttha instrtumentria a assignofro rogo, é por virtude
de disposiçées especiaes artigos 10152 e 2477.' mieo que tão
invalidm as dis p osiçées gertes artigo 2495$° unico; e chegou a
julgar-se que, não sendo preciso reunir as cotdiçées de testemunha
instrumentaria para assignar a rogo, podia assignar a rogo o ama-
nuense e os empregados do cartorio do tabelliào 3 e até o menor de
21 atmos e maior de 14, elo emancipado 2, e o menor pubere se era
já maior ou emancipado 3 quando foi chamado a depór.
No entre tanto desde que o filho e o amanuense do tabellião não
podiam ser testemunhas do testamento, por maioria de razão deviam
ser excluidos de assignar a rogo.
Hoje, porém, eotl resolvida a duvida pela prohibição da assigna-
tura a rogo dos filhos e amanuenses do tabelliào, porque o decreto
de 14 de setembro de 1900 no artigo 68. 2 não admitte como
testemunha, interprete, abonador ot assigntr a rogo nos documentos
authenticos extra-ofliciaes, nos documentos particulares e em re-
conhecimentos, senão as pessoas que podem ser testemunhas em
testamentos nos termos do artigo 1966. do codigo civil.
A inhabilidade da testemunha, quer por ser amanuense do tabel-
liào quer por outro qualquer motivo, bem pude ser provada por tes-
temunhas.

SAcecordãos, da Relação de Lisboa de 5 de março de 1887. e da


Relação do Porto de 26 de novembro de 1889, Boletim dos Tribu-
naes, 7. anuo, o. 264, e Ga:eta da Relação de Lisboa, 2. atno,
n 58, pag. 478.
2 Aecordlo da Relaçào de Lisboa de 18 de maio de 1892, Gaeta
da Rela oj de Lisoa, 0. anuo, n.° 13, pag. 97.
3 Accortíão da Relação de Lisboa de 18 de imnho
de 1892, Gazeta
da Relaçdo de Lisboa, 6 anuno, n 19, pag. 145.
480 ARTIGO 1967.°

7.-, etc.

Explica-se a exclusão dos condemnados pela pouca confiança que


inspiram os que pelo seu procedimento mereceram a condemnação
em penas graves.
Pela legislação vigente. codigo penal artigo 79.°, fóra do caso de
suspensão do exercicio de todos os direitos políticos como nas by-
potheses dos artigos 199., 200.2 204., 284., 296. e outros do codigo
penal e mais disposições cerrelativas, a suspensão do direito de tecs-
temunha em qualquer acto solesne e authentico só tem logar quando
a lei expressamente assim o declse.
De ser testemunhas instrumentarias não são excluidos os prodigos,
que aliás o eram por direito velho Ord. liv. 4° tit. 85, que tam-
bem não são excluidos de testar, artigo 1764., porque não estão
interdictos dos seus direitos civis, e apenas inhibidos de administrar
os sens bens e ainda assim com as restricções marcadas na sentença
de interdicção.
Excluidos de testemunhas nos testamentos tambem não são os
fallidos, porque o artigo exclue os que não estão em seu juizo, e
não os que estão interdictos cm geral da administração de seus
bens.

Art. 1967.5 A acção de nullidade de testamento, por


defeito de fórmulas, ot de solemnidades externas, prescreve
por tres annos, contados desde que o testamento tenha sido
registado, nos termos do artigo 1935.°, ou começado a exe-
cutar, se não estiver sujeito a registo.
(Vid. nota ao artigo 547.)
Antes do codigo era de trinta amnos o praso para a prescripção;
e o projecto primitivo não consignava disposição especial a este
respeito.
Foi a comnissão revisora quem resolveu, segundo se lê em a nota
ao artigo 2014.° do projecto de 1863, fixar em artigo n'esta sub-secção
o praso de tres ansos para a preseripção da acção de nullidade do
testamento por defeito de fórmulas ou solemnidades exteras.
No projecto de 18G4 appareceu o artigo redigido nos seguintes
termos: «A acção de edlidade de testamento por defeito de fór-
mulas ou solemnidades externas prescreve por tres sanos a contar
da morte do testador.,-.
Mas foi no projecto de 1865 que se lhe deu a redacção que hoje
tem no codigo, e que é mais razoavel, pois que costado desde a
morte doa testador o praso ficariam os interessados na aonnullação
do testamento inteiramente privados do exercicio do seu direito,
logo que por qualquer circustancia o testamento podesse estar
durante tres annos subtrabido á publicidade.
Só depois do registo ou do começo de execução é que pide presu-
mir se que os interessados têem conhecimento do testamento.
Não pôde pois arguir-se decorridos tres annos a nullidade do tes-
tamento pelo facto, por exemplo, de ser extrangeiro uma das teste-
munhas instrimenttrias.
Se, porm. o testamento for impugnado, não por defeito de fórmulas
ou de solemnidades externas mas por falsidade ou vicio na fórma
interna. o praso da prescripçao é o osdinario,
ARTIGOS 196.S z 1969.Õ 481

Para a acção de nullidade do testamento devem ser citados todos


os interessados. tanto herdeiros, como legatarios, aliás só produzirá
cifoito a sentença contra os chamados a juizo, salvo se a base do
pedido fôr a falta de capacidade do testador, porque então a suntença
proferida contra qualquer d'elles prejudica todos os outros, nos
termos do § unco do artigo 2503.^

CAPITULO 111

DA sUCCESSÃO LEGITIMA

SECCAO I

Disposições geraes

Ar. 1968.0 Se qualquer pessoa se finar, sem dispr de


seus bens, ou dispozer si em parte, ou se, havendo dis-
posto, o testamento for annulado, ou caducar, os seus her-
deiros legitimos haverão os dictos bens, ou a parte d¯eles
de que o testador não dispozer.

(Vid. nota ao artigo 1735.)

Art. 1969.1 A suecessão legitima defere-se na ordem


seguinte:
1.° Aos descendentes;
2.° Aos ascendentes, salvo no caso do artigo 1236.°;
3.° Aos irmãos e seus descendentes;
4.° Ao conjuge sobrevivo;
5.° AiVs trausversaes não comprehendidos no n.° 3 ., até
o decino gráu;
6.2 A fazenda nacional.
(Vid. artigos 195, 19930, 1996. e 20(4{)
Herdam em primeiro ligar os descenitntes seio tinitaçào de grái,
de sexo, ou de primogenitura, e sem distieção de nmatrimonios.
Too I m 31

as
482 ARTIGO 1969."

Presume-se egual para todos os descendentes a affeição do auctor


da herança por ser egual o laço.
Manteve o codigo com firmeza o direito tradicional que antepóe
o descendente e o ascendente ao collateral qualquer que seja o grá,
pois até os filhos illegitiros desde que são perfilhados preferem aos
irmãos legitimes e ao proprio pae do auctor da herança.
Applicando o codigo civil ás possessões ultramarinas, o decreto
de 18 de novembro de 1869 resalvou os usos e costumes salvo o
accordo das partes em optar pelas disposições do codigo civil; e
salvo requerimento dos interessados é pelos usos e costumes da
China que se regulam as heranças dos chins naturalisados portu-
guezes decretos de 26 de novembro de 1862 e de 4 de agosto de
1880.
Era todo o caso profundas alterações introduziu o projecto primi-
tivo no nosso velho direito sucessorio, que havia adoptado para
base coro quasi todas as legislações posteriores as tres ordens de
successão designadas por Justiniano na Nov. 118, descendentes, as-
cendentes e collateraes.
Na parte relativa á primeira ordem seguiram no mesmo caminho
todas as legislações que tomaram para typo o direito romano. Todas
chamaram á herança em primeiro logar os descendentes.
Onde se accentuavar as differeças é na saccessão dos ascenden-
tes e dos collateraes.
Pelo projecto primitivo seguiam-se immediatamente aos paes os
irmãos e seus descendentes d- preferencie aos outros ascendentes, e
preferiam ao conjuge sobrevivo os transversaes até o decimo gráu
aisra não sendo irmãos nem descendentes d'cstes.
O artigo 2121^ do projecto primitivo, correspondente ao artigo
1969. do codigo era redigido assim: -«A successào legitima de-
fere-se na ordem seguinte: -t aos descendentes; 2.- aos paes;
3." aos irmãos e seus descendentes; 4." aos ascendentes não compre-
hendidos no n 2.,; 5. aos transversacs não comprehendidos no
n. 3.; 6." ao conjuge sobrevivo; 7." á fazenda nacional -.
Conformava-se o projecto primitivo colo a velha Ordenação em
quanto na falta de posteridade dava a herança inteira aos pars sem
admittir o concurso de outros parentes.
Afastava-se completamente da Ordenação emquanto chamava á
successão na falta de pae e de mie os irmos do auctor da herança
quer germanos quer oiilateracs sem distincço e os descendentes
d'estes sem limitação de gráu pois que a Ordenação exc luia da sue-
cessão todos os collateracs em quanto houvesse ascendentes, como
se afastava do direito romano que não preferia os irmãos geríanos
e os filhos dos predefunctos aos ascendentes e apenas os chamava
a concorrer com os ascendentes excluindo do concoso os irmãos
unilateraes
A idéa de preferir os irmãos aos avós suscitou logo grandes re-
elamações.
Sustentava o dr. Paes que as cinco ordens de successão legitima,
reconhecidas já no direito romano, descendentes, ascendentes, colla-
teraes, conjuges e fisco, eram tão antigas como a monarchia, que
só havia dilferença entre o direito romano e o portuguez em concor-
rerem por aquelle direito os irmãos e filhos d'estes junetamente com
os ascendentes, inclusivamente os paes, à herança do descendente
segundo a Nov. 1 h- capitulo 3", e entrarem pelo nosso direito os ir-
mãos só na falta de descendentes e de aseendentes Ord. liv. 4."
tit. 96." pr., extrabida já da Ordenação Manuelina liv. 4." tit. 17.",
r
ARTIGO 1969 483

e da Affonsina liv. 4.° tit. 107.', por ter n'esta parte seguido o
nosso direito o codigo wisigothico, que havia certa anomalia em pre-
ferir os irmaos aos ascendentes que são herdeiros legitimarios, ee
que a manter se a idéa da preferencia dos irmãos sobre os ascen-
dentes devia pertencer a estes o usufructo e aos irmãos a proprie-
dade.
Respondia o sr. Seabra que aquclla anomalia era determinada por
motivos attendiveis, que por via de regra a vida acabo para as as-
cendentes em segundo gra quando começa para os descendeítes,
que não esta na ordem natural cerrarem os avós os olbas aos netos,
que a conv aicncia social exige n'esta ultima situaçýlo mais mios
de vida e industria, que n'aquella avançada edade não ha já a neces-
saria garantia de boa administraçào, que elle considerava os filhos
nascidos dos mesmos paes quasi como ma s pessoa moral, em que
a affeicsão natural de uns para com os outros tão póde considerar-se
reciprocamente menor do que para os ascendetes, e que Itlime era
da mesma opiniio.
Etíteurliaose. Seabra que os iraíles e ao iralâs deveriams excluir
completamente os avós, por ser entre aquelles mais viva a afeição,
e ia até approvar o syvtema do codigo ciuil francez, que chama os
irmãos em oneorrenoa cm os paos por se dividir a affeiçào do
homem quasi egaalmente entre pae e irm os, e confessava que a
idèalembrada pelo Ir. Pites de dar aos ascendentes o usoFructo e aos
irmãos a propriedade, apesar de lhe são parecerem oafllcieíítemente
atteídiveis as razões, valeria no entretanto mais que o systema do
direito anterior.
Chegou ainda a obter a approvaçào da commissão revisora esta
idêa do dr. Paes, segundo se lê em a nota ao artigo 2i1G6.t do pro-
jecto de 1863, correspondente ao artigo 1964.1 do codigo, porque a
eommissão ainda chegou a decidir que na falta de descendentes e
de paes, deviam os avós ou outros ascedentes ter apenas o usufructo
havendo irmãos ou d'scendtes d'ets.
* Mas não chegou 1una a ser futtulada em preceito porque no
projecto de 1y64 vem já redigido o artigo como se encontra hoje no
codigo.
Na verdade a doutrina a final adoptada pela commissào revisora,
ou por mais accommodada ás relaçaes de sangue e A vontade pre-
sumida do suctor da herança, ou por estar profundamente enraizada
noa nossos habitos r costumes, nunar suscitou reclamaçý'es.
São preteridoo, por descendentes de irmios, parentes mito mais
proximos sem collislo com o arto 1)70.-, porque este artigo, deter-
minando a suoccsso pela proximidade do gri se refere ao grãa
mais proximo na rtespetií' ordoett ou classe de auocessio, e não á
proximidade do gráln em absoluto ali's virit a ser exclíido da sle-
cesso o neto pelo pae do auctor da herança.
No direito suíeasorio assigna o cídigo posiç o muito mais racio-
nal ao coíjuge do que lhe assig ntua o direito aterior,u e desde os
principios da monarchia só o chamava áu succeso na falta de pa-
rentes até o decimo grãu, como se infere da Ordeoaçbo A fonsina,
liv. 4.°, tit. 95.^, doutrina ainda acceite no projecto prn tivo ar-
tigo 2161."
A commissào revisora, porém, alterou eate sytcsma, ou por no
irem propriamente além dos irmos e seus descendentes os laços de
famíilia, como pelas leis vincula res, ou porque, assentando a sucres-
so legal ta vontade presumida do defluto, não é de mais collorar
o coujuge logo em seguida aos irmãos e ecuos descendentes.
484 ARTIGOS 1970.- e 1971.-

Finalmente pertencem os bens vagos á fazenda nacional, quer por


direito successorio, quer por direito de soberania.
Fisens post omnes. O que não pertence a qualquer pessoa deve
pertencer ao corpo social que representa a universalidade dos ci-
dadàos, mesmo para evitar as desordens que resultariam do direito
de adquirir se a herança jaecente, como cousa sellis, houvesse de
pertencer ao primeiro oecupante.
Reconhece o codigo a succeosibilidade até o decimo gráu de paren-
tesco, como era já por direito anterior, com quanto nas proximi-
dades do fim de tão grande numero de gerações já devam estar tio
enfraquecidos os laços do sangue, que mal poderão significar teste-
munho de affeição.
Pelo codigo civil hespanhol a successão ab intestado não vae além
do sexto grau na linha collateral.

Art. 1970.° 0 parente mais proximo em gráu excluirá


o mais remoto, salvo o direito de representação, nos casos
em que este vigora.
Art. 1971.° Os parentes, tte se acharem to mesmo gráu,
herdarã por cabeça ou em partes eguaes.
(Vid. artigos tté.", 1987.", 1997. e 199 )
Para os sflcitos da sucCessão s5 é attendido o parentesco de con.
sanguinidade, e não o de altinidade, e muito menoso espiritoal
entre o baptisado e o padrinho que não produz effeitos juridicos
de especie alguma.
As fôrmas de successão têem sido ires, por linhas, em que os pa-
rentes da linha paterna succedem no que é do pae e os parentes da
linha materna no que é da rmãe, guardando-se o principio da proxi-
midade do grau dentro te cada linha, por cabeça em que os bens
da herança se dividem em tantos quinhões quantas as pessoas cha-
madas á successào, e por stirpes em que se contam tantos quinhões
quantos os grupos de descendentes.
Não obedece o nosso systema de successão nem á srigem dos bens
para serem paternapaternis e omoeaou maternis, nem á natureza dos
bens para serem os moveis para uns e os iímnoveis para outros.
O codigo reconhece apenas a successão per capita ou por direito
proprio e a successão per otirpes ou por direito de representação,
e sem se importar com a prerogativa da linha nem com a origem
dos bens para a base da successão defere em harmonia com as tra-
dições do velho direito a successão segundo a proximidade de pa.
rentesco.
Sempre que estejam no primeiro grm artigo 198G." ou no mesmo
gráu, quer sejam da linha descendente quer da linha collateral,
succedem por cabeça os parentes mais proximos, porque herdam por
direito proprio, e não como representantes de outrem. t

t Accordão da Relação de Lisboa de 24 de fevereiro de 1875, e


de 22 de fevereiro de 1899, Direito 7 ano, n" 1:ý, pag. 208, e Ga-
zct dai Relço dr Lisbe, 12" ano, n.° 67, pag. 5a5.
1
ARTIGOS 1972., 1973., 1974.-, 1975.", 1976. E 1977.- 485
Tão respeitado é pelo novo direito o principio da proximidade do
gráa que Ia fimos unmlateraes. que por direito velho
só suceediam
na falta dos germanos, sfccedfm hoje coOfnctfffnte cof estes
com quanto em ametade só da porção que a estes pertença artigo
2001." Não herdam em partes eguaes, mas herdam por cabeça
em
razo de estarem no mesmo gráu.
O codigo, determinando mui positivamente a suecessào por cabeça
ou em partes eguacs entre parentes no mesmo gráa acabou coma 11
questão muito debatida em direito antigo, se os sobrinhos coneor-
rendo sós sem tio vivo herdavam iu otirpes ou per copita, isto é, se
herdaa cada grupo o que herdaria o pae ou se dividiriam todos
entre si egualmente a succcssìo.

Art. 1972.1 Se os parentes mais proximos repudiarem a


herança, ou forem insuccessiveis, passará a dieta herança
aos parentes do grát subsequente; mas, se tão somente
alguu dos coherdeiros repudiar a sua parte, esta accres-
cerá á dos outros co-herdeiros.
(Vid. notas aos artigos 1467.°)

Art. 1973.° Cada geração forma um gráu, e a serie dos


gráus constitue o que se chama linha de parentesco.
Art. 1974. A linha diz-se recta ou transversal: a recta
é constituida pela serie dos gráís entre pessoas que des-
cendem uias das outras; a transversal é constituid a pela
serie dos grátis entre pessoas que não descendem umas
das outras, bem que procedam d'um progenilor ou tronco
commum.
Art. 1975.1 A linha recta é ou descendente ou ascen-
dente: descendente, quando se considera como partindo
do progenitor para o que d elle procede; ascendente, quando
se considera como partindo do que procede para o proge-
nitor.
Art. 1976.1 Na linha recta, os gráus contam-se pelo nu-
mero de gerações, excluindo o progenitor.
Art. 1977.0 Na linha transversal, os grás contama-se
pelo numero de gerações, subindo por unma das litmhas ao
tronco, e descendo pela outra, mas sem contar o progenitor.
É a lioha de parentesco determinada pela serie de pessoas que
descendem da mesma origem ou do mesmo progenitor ou tronco com-
muro; e por isso são tantos os gráus quantas as geraçOes.
Não se contam tantos gráus quantas as pessoas que figuram nas
linhas de geração. Contam-se tantos gráus quantas as gerações ou
quantas as pessoas geradas, excluiudo-se sempre o tronco commum
para se apurar o numero de gráus.
Já Voet dizia: «Tot neofpe gradus esse quot sunt generationes, seu
quot sunt persoae, dempto stipite.
486 ARTIGO 1977..

Geração não dá uma idêa tão clara e precisa. Pessoa gerada é que
tira pretexto a quaesquer duvidas. Todos comprehendem como se
contam os graus pelo mnero das pessoas, excluindo o progenitor ;
e nem todos comnprehenderão como, contando-se os grás por ge-
rações e comprerlendendo estas o progenitor e a pessoa gerada, se
ordena ao mesmo tempo a exclusào do progenitor para o computo
dos gráus.
Por isso o projecto de codigo civil hespanhol no artigo 749.° se
exprimia assim: «En todas las lineas iay lautos grados, custas soa
las personas, des-satada la del tronco», e o direito romano Instil.
liv. 3.° tit. G. § 7.^ dizia: Eemper gecnerata persona graduni adji-
et».
Vale portanto gerações o mesmo que pessoas geradas.
Taííbem por direito canonico se contam os gráus, não pelos ge-
radores, mas pelas gerações ou pessoas geradas, com exclusão do
tronco commum.
Na contagem dos grãos, quer por um quer por outro direito, nào
se inclue nem podia incluir-se o tronco commum, porque procreante
e procreado constituem só uoa geração ou só um gráu.
Para constituir um gráu nào se conta o tronco commum isolada-
mente mas ligado com o procreado, pois é assim que se constitue uma
geração.
Vejamos agora a differença na contagem dos gráus por direito
canonico e por direito civil em face de um exemplo para maior cla-
reza.
Em direito civil o processo de contar tantos grás quantas as pes-
soas de que se compõe a linha, excluindo sempre utna d'ellas, é o
geralmente seguido.
No exemplo
Pedro

João Manuel

Antonio Paulo

em que as pessoas da linha são ires, Pedro, João e Antonio, ou Pedro,


Manuel e Paulo, excluida uma da contagem, dão as restantes o
verdadeiro numero de gráos.
De Antonio a Pedro vão dois grás, porque de Antonio a Joào
vai uma geração e de João a Pedro outra; e assim o neto Antonio
está com o avô Pedro no segundo griu, por haver de um ao outro
duas gerações, uma em que Antonio foi procreado e João o pro-
creante, e outra em que João foi procreado e Pedro, tronco commum,
o procreante.
Na linha transversal contam-se os gráus subindo por uma das
linhas e descendo pela outra com exclusão do progenitor. Assim
Antonio está com Paulo em quarto gráu, porque de Antonio a João
vai um gráu, de João a Pedro dois, de Pedro a Manuel tres, e de
Manuel a Paulo quatro.
Pelo mesmo processo está Antonio com Manuel em terceiro grá,
e estão no terceiro gráu tio e sobrinho, no quarto gráu primos co-
irmeas. e assim successivamente.
Em segundo gráu estão os irmãos porque representam duas gera-
ções, lma constituida por um dos irmios e pelo tronco commum, e
outra constituida pelo outro irmão e pelo tronco coumumn.
'r
ARTIGO 1978.0 487

Outra é por direito canonico a contagem dos gráus, a qual é tam-


bem indispensavel conhecer principalmente por via das dispensas
de casamento que são cotcedidos pela auctoridade ecelesiastie nos
termos dos leis da egreja, por via de questões cíveis anteriores á
promulgação do codigo, e ainda por se fazer referencia ao parentesco
segundo direito canonico em muitos contractos posteriores to codigo
civil.
Por direito canonico a contagem dos grãus na linha recta é como
pelo codigo civil. Mas na linha transversal contam-se os grãus de
um lado só; e regula a linha mais comprida se as linhas forem des-
eguaes.
No exemplo acima Antonio está com Paulo em quarto gráu por
direito civil porque se contam as geraçécs de ambas as linhas, e em
segundo grán por direito caonico porque se contam as geraçòcs
de uma só linha, como em segundo gráu por direito canonico está
Antonio com Manuel porque se contam só os gráus da linha mais
comprida.
Hoje, como em todos os assumptos temporaes, tambeí em materia
fiscal é admissivel a contagem dos gráus conforme o codigo civil,
regulamento para a contribuição de registo de 23 de dezembro de
1899 artigo 9.° § 2
Salvo nas questões que houverem de ser resolvidas por direito
canonico estão os irmãos em segundo e não em primeiro
0
grãu, ape-
sar da redacção defeituosa do artigo 122. § 2.0 a. 2°, que nas pala-
vras-os filhos dos parentes por consanguinidade até o segundogrdu
inclusirŽ da linha transversal-parece indicar a possibilidade de
parentesco em primeiro gráu na linha collateral.
Aquella redacção provem do habito de falhar sob o regiten exclu-
sivo do direito canonico, e não prejudica os preceitos claros d'esta
secção onde se tracta "x professo da materia da contagem dos gráus,
como os não prejudica o artigo 1073.0 fallando em o n.- 2.0 de paren-
tes em segundo gráu na linha collateral porque evidente e incon-
troversamente se refere aos irmãos.
Desde que se contam os gráus por ambos os lados não póde haver
parentes em primeiro grau na linha collateral. Por isso já o direito
romano, que foi adoptado pelo nosso codigo, dizia: «E transverso,
sive a lalere, sílus est jirius gradus, et ideo incipit a secundo, lei 1!
1.° Dig. de grad. et afti.
Já o regulamento da contribuição de registo de 30 de junho de
1870 considerava parentes em segundo gráo os irmãos, como se
mostra do artigo 4.° redigido assim : - «Nas transmissles por
titulo gratuito a contribuição é de 2 por cento entre conjuges e a
favor de ascendentes, de 3 por cento entre collateraes no segundo
grá, de 6 por cento entre collateraes no terceiro e quarto grãu,
etc. »-.
Nem é absurdo contar segundo grãu apesar de na linha collateral
não haver primeiro, porque, se não ha primeiro grãn na léínha trans-
versal, lia-o na linha recta tanto ascendente como descendente.
O codigo, alterando a contagem dos gráus segundo direito cano-
nico que era desde seculos a legislação entre nós vigente em ma-
teria de successes, introduziu, como consequencia, importantes
modificaçles no direito successorio na linha collateral.

Art. 1978.° As pessoas incapazes de adquirir por testa-


mento tambem não podem adquirir por suocessã0 legitima.
488 ARTIGO 1978.'

Distinguiam os 7
velhos praxistas, como ainda hoje distinguem
algumas legislaç es entre iacapizes propriamente taes que eram
absolutamente inhibidos de sureder, como os religiosos professos,
e idigmus que só eram inhibidos de participar em determinada
successào por actos pessoaes anteriores ou posteriores á instituição,
como os condemnados por haverem attentado contra a vida do tes-
tador.
No projecto primitivo o artigo 2129., correspondente ao artigo
1978, era redigido nos seguintes termos: <As pessoas incapazes
de adquirir por testamento segundo o disposto nos artigos 1907.°
(1776? do codigro, 1909° (1779. do codigo), e 1913^ primeiro ver-
siculo (artigo 1782.' do codigo, nas palavras «os que forem conde-
amados por haverem attentado contra a vida do testador, ou concor-
rido de qualquer fói ma para tal delicto) tambm nào podem adquirir
por successào legitima».
Tendo, porém, a commissão revisora approvado em sessão de 22
de novembro de 1862 aquelle artigo 2129.' do projecto primitivo
com a eliminaçào das palavras desde asegundo... até versiculo
inclusivamente, atravessou o artigo assim modificado todos os pro-
jectos de revisão, e assim ficou no codigo.
Na sessto immediata, 24 de novembro, propoz o sr. Seabra que
se fizesse distincção entre incapazes e indignos, compreendendo-se
ambas as especies na disposiçá do artigo 2129.' (19'78. do codigo).
Tiveram a palavra os srs Silva Ferrão, Seabra e José Julio, e a final
resolveu-se que não havia necessidade de alteraçãou.
D'esta cxpaosição resulta que na disposição do artigo 2129. fica-
ram eomprehendidos por accordo de todos tanto os incapazes pro-
priamente dictos como os indignos.
Por incapazes são excluidos da successào as religiosas professas
e as creaturas não existentes.
Por indignos são excluidos os cumplices da successão do conjuge
adultero, se foi provado judicialmente o adulterio antes da morte do
testador, e os que attentaram ou concorreram para o attentado con-
tra a vida do auctor da herança, etc.
Comprcehendia-se a doutrina do projecto primitivo que especifi-
cava. como incapazes de sueceder ab intestato os incapazes de adqui-
rir por testamento, as creaturas não existentes, as religiosas profes-
sas, os condenmados por terem assassinado o testador ou concorrido
de qualquer fórma para o delicto, e os que por vias de facto impe-
diram o testador de revogar o testamento.
0 projecto de codigo civil hespanhol no artigo 7450, fonte do
artigo 1978.' do nosso codigo, permittia a successo ab intestato aos
facultativos e aos confessores aos quaes aliás negava redondamente
a successào testamentaria; e Goyena sustentava que escusado era
consignar tal permissão, porque os proprios artigos que prohibiam
aos facultativos e aos confessores a successão testamentaria mostra-
vam que as razões da prohibição não eram applicaveis ás sueces-
sues ab iatestato.
Em face da letra e da historia do artigo parecem inhibidos de re-
ceber ab intestato os que não podem receber por testamento, quer
incapazes quer indignos, quer seja absoluta quer relativa a incapa-
cidade.
Porém do preceito legal assim entendido resultaria o absurdo de
ser privado da successão legitima o facultativo ou o ecelesiastico
que tivesse prestado os seus bons oflicios ao parente na ultima doença,
o que equivaleria a convidar os parentes, facultativos e ecclesiasticos,
ARTIGOS 1979., 1980.0 1981. s 1982.0 489

a abandonar o enfermo nas horas amargas da vida para nuo ficarem


excluidos da sueesso, e a castigar com iogratido os serviços rece-
bidos.
Para attensar semelhante iniquidade já se pensou em excluir das
disposiçòes irritantes dos artigos 1768.' e 1769., á sombra do artigo
1770.0 os parentes até o quarto gráu, ficando assim feridos pelo pre-
ceito do artigo 1978.0 só os parentes desde o quinto até ao decimo
grau e o conjuge.
Mas nem era justa tal restricçào, nem se presta a semelhante dis-
tineção o artigo. Preferivel é entIo a soluçõo que reputa implicita
n artigo 1978. a exeepçiio relativa aos farolttieos e confessores,
reconhecida na respectiva fonte, artigo 745P do projeeto de codigo
civil tespanbol, como explicámos em a nota ao artigo 146.°, e que
parece ter entrado já na jurisprudencia pois j4 se julgou que só não
podem adquirir por successâo legitima as pessoas incapazes de
adquirir por testamento que estáo comprertendidas nos artigos
1776.^ e seguintes do presente codigo. t

Art. 1979.° A incapacidade tio herdeiro termina nelle.


Os seus filhos e descendentes, havendo os, succedem como
stccederiani, se o incapaz houvesse fallecido, e não tivesse
havido tal incapacidade.
(Vid. nota ao artigo 146.-)

SECÇAO II

Do direito de representação

Art. 1980.1 Dá-se o direito de representação quando a


lei chama certos parentes duma pessoa fallecida i succeder
em todos os direitos em que esta pessoa succederia, se
viva fosse.
Art. 1981.0 O direito de representação dá-se sempre na
linha recta descendente, mas nunca na ascendente.
Art. 1982.1 Na linha transversal só se dá o direito de
representação em favor dos filhos de irmãos do fallecido,
quando concorrem com algum irmão do dicto fallecido.

t Accordào do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de novembro


de 1898, Gazeta da Relação de Lisboa, 12.° anno, n.° 52, pag. 419.
4911 ARTIGOS 1983.· e 1984.-

Art. 1983.° Os representantes só podem herdar, como


taes, o que herdaria o representado, se vivessse.
Art. 198'1.1 Sendo varios os representantes da mesma
pessoa, repartirão entre si, com egnaldade, o que teria de
caber ao representado, se fosse vivo.

So na suecessão legitima e nunca na successào testamentaria lia


logar ao direito de representação. As disposições testamentarias que
caducam por algum dos motivos especificados no artigo 1759.o
acerescem aos co-herdeiros, se o testador não houver disposto outra
cousa, conforme os artigos 1852.° a 1854.' 1
Nem a collocação da materia nem a redacção do artigo permittem
o direito de representação na successão testementaria.
É a representação, conforme o codigo belga, uma ficção que dá
entrada ao representante no logar no gráu e nos direitos do repre-
sentado, ou, conforme o nosso codigo, o direito dos filhos de gráu
ulterior a serem collocados no gráu que o pae ou mãe eccupava na
familia do auctor da herança.
Tambem se não confunde a representação com a transmissão. Na
transmissão passam os direitos que pertenciam ao auctor da herança,
e na representação toma o individuo o logar e os direitos, que outro
teria mas tíse nunca adquiriu por haver fallecido antes da abertura
da herança.
Não pode haver direito de representação senão com respeito a pes-
soas fallícidas.
Só nos casos de incapacidade de desberdação ou de qualquer
fórma de indignidade é que pôde representar se pessoa viva por
disposição especial da lei artigo 1979.° que chama os descendentes
como se o incapaz ou o indigno houvesse tallecido.
Porque seria iniquo estender á posteridade inuocente o castigo
inflingido aos indignos, e aos iucapazes equiparam as leis a inca-
pacidade e a indignidade á morte para onceder o direito de repre-
sentação aos filhos do incapaz e do indigno.
O filho excluido da herança do pae como indigno por facto só
relativo ao pae, n7o deixa de vir á herança do avó a respeito do
qual não é considerado indigno.
Por isso os netos, apesar de suecederem ao avó por direito de
representação e de deverem trazer á collação o que os paes deves-
sem conferir, não são obrigados a pagar as dividas do pae com os
bens do avó; como não perdem a herança do avô por terem renun-
ciado á herança do pac artigo 2020.
Na renuncia não ha logar ao direito de representação, porque não
deixa presumir a não existencia do parente que está comprovada
no proprio facto da renuncia.
No caso de repudio herdam os do gráu immediato por direito pro-
prie, e não em representação do repudiante artigo 2035.'
É de jurisprudencia universal o direito de representação na linha

1 Aceordão da Relação de Lisboa de 1 de julho de 1885, Gazeta


da Relação de Lisboa, 1.' anuo, n.- 20, pag. 163.
.1
r
ARTIGO 1984.' 491

recta descendente até ao infinito, porque o amor e a ternura dos


ascendentes cresce á proporção que se prolonga a linha descendente,
especialmente quando a morte vem romper algum grúu intermedio.
Uniformes são tamben os codigos em negar a representação na
linha recta ascendente, por ser contraria ao curso ordinario dos
acontecimentos a suecessão dos ascendentes, e não poder ter logar
senão turbato ordine mortalitatis, ou, como diz Iuc: «Quast á la re-
presentation, elle ne peut pas tre admisse en ligne ascendente, parce
que l'afection ne reioante pas"
Dizem os praxistas que o affecto, como a agua, desce sempre e não
sóbe nunca.
Na linha collateral varia o direito de representação com a legis-
lação dos povos.
O codigo do Chili exclue absolutamente a representação na linha
collateral.
O nosso codigo reconhece o direito de representação sem limita-
çoes na linha descendente, nega-o absolutamente na linha ascen-
dente, e permitte-o na linha transversal unicamente a favor dos filhos
de irmãos ou sejam germanos ou unilateraes, mas só quando con-
correm com tios.
Na linha collateral á morte de A que deixou vivos dois irmãos,
B e C, uo filho de outro irmão D já fallecido, e tres netos de outro
irmão E tambe, já fallecido, divide-se a herança ens tres partes,
duas para os dois irmãos, unia para cada um, e unia para o sobrinho
filho do irmão D, porque aos netos de E já não approveita o direito
de representação.
Já na jurisprudencia anterior com fundamento na nov. 118 cap. 3.°
se não reconhecia o direito de representação aos filhos dos irmãos
senão quando concorriam à herança com tio vivo, por ser tal regra
mais conforme á boa razão e 4 vontade presumida do auctor da
herança.
Mas no projecto primitivo o artigo 2133., correspondente ao artigo
1982. do codigo, com a seguinte redacção :- "Na linha transver-
sal sómente terá logar o direito de representação em favor dos filhos
e descendentes de irmãos do fallecido, ou sejam por pae e mãe, ou
ómente por um d'elles, concorrendo com outros irmãos do dicto falle-
cido ou seus descendentes» -longe de limitar o direito de represen-
tação na linha collateral aos filhos de irmãos, estendia-o a todos
os descendentes de irmãos, ou o fossem por pae e mãe ou sómente
por um dos paes concorrendo com outros irmãos ou descendentes do
fallecido.
Reclamou logo o dr. Paes contra o direito de representação a
favor dos descendentes de irmãos na mesma indefinida extensão que
na linha recta descendente, novidade do direito francez, porque o
direito de representação, ou fosse beneficio como lhe chamava Jus-
tiniano ou fosse ficção como o considerava o codigo civil francez,
era verdadeira excepção á regra da proximidade do grãn que por-
isso não devia ampliar-se.
Respondia o sr. Seabra que a regra da proximidade do grão se
fundava n'sma presumpção, a de maior affeição do fallecido, mas
que a regra devia ceder sempre que essa presumpçdo não existisse
ou podesse prejudicar outras presumpções mais fortes ou eguaes, e
acerescentava:
«Supponhamos que Primas teve mais dois irmãos, Secudus e Ter-
tius. Primus fallece abintestado, Secundus, morto antes, deixou um
filho. [Tertius, tambem morto, teve uns filho; mas este filho, tambem
492 ARTIGO 1984.0

fallecido, deixou um filho. A questão reduz-se a saber, se o neto de


Terius ha de ser excluido da herança, porque teve a desgraça de
perder seu pae antes da morte de Primus.
«0 nosso douto revisor, com Justiniano e com muitos outros gra-
vissimos auctores, decidem que seja excluido, porque está em pri-
meiro logar a regra da proximidade do gráu; e nós entendemos que
é uma grande iniquidade a concorrencia de irmãos e filhos de ir-
roxos.
«Se a distribuição da herança é fundada na affeição presumida do
defunto, é preciso que ponhamos de accordo o efeito com a cansa,
como dizia lierlier no conselho d'estado de França. No caso figurado
é certo que todos estes sobrinhos haviam partilhado as attençées e o
amor do fallecido. Collocados em torno d'elle, promiscuamente com
seus proprios irmãos, tanto mais interessantes, quanto menos afor-
tunados, como é possivel que incorressem na sua absoluta indifferen-
ça, e merecessem ser desherdados se orrvessè disposto de seus bens?
N'este circulo circumscripto de parentes tão chegados, não vemos se-
não uma familia, um identico vinculo de affeição, e a representação
torna-se a nossos olhos um direito indispensavel e dictado pela pro-
pria natureza».
Mas a commissão revisora logo nos trabalhos da primeira revisão
alterou a doutrina do projecto para manter o direito velho que
viera de Justiniano, o qual, fundando o direito de representação
na vontade presumida do auctor da herança, e explicando essa
vontade pela affeição que o homem naturalmente tem aos seus mais
proximos parentes, não quiz na linha csllateral levar a ficção além
dos sobrinhos.
Sobre a disussào e votação do artigo diz a acta da sessão da
commissão revisora de 22 de novembro de 1862 :
«Tiveram a palavra os srs. José Julio, Simas, Gil, Ferreira Lima
e Seabra, depois do que foi approvado o artigo pela fórma seguinte:
'<Na linha transversal sómente terá logar o direito de representação
em favor dos filhos de irmãos do fallecido, quando concorrem com
algum irmão do dieto fallecido,. O sr. Ferreira Lima declarou que
votava porque tivesse logar a suacessão «per stirpes» entre filhos
e irmnos, concorressem ou não com tio vivo. O sr. Gil fez identica
declaração".
Na acta da sessão de 24 do mesmo mez e anuo diz-se: -Foi lida
e approvada a acta da antecedente. Em seguida o sr. Seabra pon-
derou que lhe parecia inconveniente a resolução tomada na sessão
anterior com relação ao artigo 2133.r (1982.« do codigo), quanto
a ser dado o direito da representação sómente aos filhos de irmãos
e não a outros quaesquer descendentes d'elles. Fallaram a este
respeito os srs. Gil, Marreca e Ferreira Lima, resolvendo-se em
seguida que, mantendo-se a votação feita, comtudo este objecto
fosse novamente considerado em outra sessão».
ARTIGOS 1985.°, 1986.^, 1987.0 E 1988.' 493

SECAO III

Da successão dos descendentes

SUB-SECÇ0O I

Da successão dos descendentes legitimos

Art. 1985.' Os filhos legitimos e seus descendentes sue-


cedem aos paes e demais ascendentes, sem distineç-io de
sexo nem de edade, posto que procedam de casamentos
diversos.
(Vid. nota ao artigo 1969.0)

Art. 1986 ° Se os descendentes se acharem todos no


primeiro gráu, succederão por cabeça, dividindo-se a he-
rança em tantas partes, quantos furem os herdeiros.
Art. 1987.' Se concorrerem todos, ou parte delles repre-
sentativamente, surcederão por estirpes, ou formando ramos,
pelos quaes seta distribaida a herança, e subdividida nos
ramos em que nouver mais dnm herdeiro, observando-se
sempre a mesma regra de egualdade.
(Vid. nota ao artigo 1970.°)

Art. 1988.1 São comprehendidos entre os filhos legitimos


os legitimados por subsequente matrimonio, conforme o
que fica disposto no artigo 119.°
(Vid. nota ao artigo 119.0)
494 ARTIGOS 1989° E 1990.0

SUB-SECCO I1

Da successão dos filhos illegitimos

Art. 1989.0 Para os filhos illegitimos succederem ab-intes-


tato a seus paes devem ser perfilhados, ou reconhecidos
legalmente.
Art. J990.° Se o filho illegitirno, perfilhado ou reconhecido
não concorrer com posteridade legitima, herdará todos os
bens de seus paes.

Nas palavras «perfilhados ou reconhecidos legalmee» comprehen-


de-se o reconhecimento judicial coao o reconhecimento espoatanco,
pois qualquer das fórmas de perfilhaçào basta para ser admittido o
filho illegitimo à sucessão.
Muitas e respeitaveis auctoridades negam aos filhos perfilhados
antes da promulgaçào do codigo, cuja perfilhaçào é por este pro-
libida, o direito a entrar nas successões abertas depois da referida
promulgaçào, por serem pela lei nova considerados entranhos aos
paes e á familia e não os habilitar a sueceder ab intestato a seus
paes a legislação anterior Ord. liv. 4P tit. 93., resolução regia de
16 de novembro de 1798, proviso de 18 de janeiro de 1799, por-
taria de 1 de junho de 1838 e decreto de 29 de setembro de 1852,
por serem outorgadas as cartas de perfilhação só para os fins reco-
nhecidos nas leis e nos estvlos do reino sem prejuizo dos direitos
adquiridos por qualquer terceiro a quem para sustentação dos
mesmos direitos ficavam sempre salvas as acções ordinariasperante
os tribunaes de justiça com audiencia e discussão contradictoria, e
pmr não se inserir nos alvarás de perfilhação a clausula da successão
ah intestato nem sortir efleito legal tal clausula, nem poderem ser
declarados pelo governo e sim pelo poder judicial os direitos de
successão que háo de ser regulados pela lei vigente ao tempo da
abertura da herança.
Embora reconheçamos o peso d'estes argumentos, como havemos
de seguir uma opinião, inclinamo-nos a que, desde que o codigo se
refgre generieaoiente e sem distineção alguma aos filhos perfilhados,
devem ser chamados á successão do mesmo modo que os perfilhados
pelo codigo os perfilhados no velho regimen, quer sejam puramente
naturaes, quer incestuosos ou adulterinos, o assim se tem julgado. 1

> Accordão da Relação de Lisboa de 18 de junho de 1890, Direilo,


24.' ano, ti.' 5,pag. 79,
P19..

ARTIGO 1990.' 495

Longe de dar como o codigo todos os bens do pae ao filho per-


filhado, não havendo posteridade legitima, chamava o projecto pri-
mitivo os ascendentes successiveis a concorrer com os filhos perfi-
lhados. dando a estes asetade da herança.
Mas a cosmíissão revisora nem com ilhos perfilhados quiz alterar
a graduação e preferencia marcada nas tres ordens de successão,
descendentes, ascendentes e collateraes.
O que tem sido muito questionado na imprensa juridica e no fóro
é a successão legal dos filhos perfilhados aos demais ascendentes
além do pae.
Muitas vezes se julgou que o filho perfilhado suecedia por virtude
da lei ao avó e demais ascendentes como ao pae, com os fundamentos,
de ser reciproco o direito suceessorio es succederem os ascendentes
sem limitaçio de grAn ao filho perfilhado, de tambem a Ord, liv. 4.
tit. 95. tanto no testo como nas epigraphes só reconhecer expressa-
mnarte aos filhos naturaes a successão a seus paes e appliear-se to-
davia desde a mais remota antiguidade egialmente aos outros aseen-
dentes além dos paes, de no ter feito o codigo mais do que legalisar
este antiquissimo costume e direito do reino, de não fazer o artigo
2005.' a mais leve referencia ao direito suceessorio dos ascendentes
dos paes, regulando alids a successão dos perfilhados aos transver-
saes de seus paes quando a successão dos ascendentes está primeiro
que a dos collaterses vindq assim d'ali a presumpçáo de que a
sccessão aos ascendentes estava já interiormsente estabeleida e
em mais favoraveis coidiçües, e finsísnente de nào fazer o artigo
1981.', que concede sempre o direito de ropresentisçào se linha reta
descendente, distineção entre descendentes legitiinos e descendentes
perfilhados, como a no fazem os artigos 1760, l786^ e 1%9.1"
n. 1
Não é esta, porém, a doutrina que ficou iso codigo.
O artigo 129. especificando os direitos do filho pertilhado men-
ciosa o direito de sueceder a seu pae e não o do seucceder tambem
aos outros ascendentes; e não ha successão legitima sessão em vir-
tude da lei artigo 1735.'
Os filhos perfilhados nem podem pedir aos avós alimentos, que
alias podem pedir aos irmãos artigo 175.'
A secçào 4., que se inscreve da successão dos ascendentes, occupa-se
na sub-secção 1. da successão dos paes legitimos, na sub-seeçóo 2
da successão dos paes //l7/risimos, e na sub-secção 3.1 da ssses-
são dos ascendedes do segund grá e seguintes, ao passo a
secçào 3., que se inscreve da successão ds dscendenats, oti m apenas
duas secçóes com a isscripção, primeira da successão dos d-s5ar-
destes legitimes, e a segunda da soccessao dos fi/os illegitimos, refe-
rindo-se a primeira aos filhos e a todos os mais descendentes legi-
timos, e referindo-se a segunda aos 0IMos illegitimos sómente.
A comparação do artigo 1985.', collocado na snb-secção 1,, com
o artigo 1989., collocado na sub-secção 2. não deixa duvida de que
a suceessão ai inaetao dos descendentes illegitim s é restrista aos
paes, pois o primeiro d'aquelles artigos diz: aos filhos legitimos e seus
descendentes sucredem aos paes e demais acendentes, sem distineça
de sexo nem idade., etc.; e o segondo diz: para os ilihos illegi-
timos succederem ab intestalo a seus paes, devem ser perfilhados, ou
reonhecidos legalsente.-
E manifesto que o artigo 1989.' aos filhos illegitimos só concede
o direito de sueceder aos paes, quando o artigo 1985. reconhece aos
legitimos o direito d scceasso aos paes oe demais ascendentes.
496 ARTIGO 1990.

E não proveio de descuido, mas sim de deliberação reflectida, a


restricçào no direito successorio dos filhos illegitimos; pois tratando
o legislador na secção 3. da successão dos descendentes e inscrevendo
a l.A sub-secção da successào dos descendentes legitimos, em har-
monia com essa epigraphe já não inscreveu a 2. sub-secção da sue-
cessão dos descendentes illegitimos e sim da successão dosfilhos ille-
yitioos, excluindo por esta fórma bem claramente os outros descen-
dentes.
Contra preceitos tão expressos e categorias não pôde servir de
argumento a interpretação extensiva que davam os nossos praxistas
ao disposto na Ordenação do reino, que concedia aos filhos naturaes
o direito de succederem a seus paes, porque nem todos eram de
accordo em que os filhos naturaes suecediam aos ascendentes do
pae, nem o codigo civil veio para continuar a doutrina pura da Orde-
nação.
Não pôde tambem argumentar-se com o direito de representação,
porque a successão por direito de representação importa a successão
por direito proprio; pois o neto legitimo que faltando o pae, tendo
outros filhos o avô, vai à successào representativamente com seus
tios apesar de mais proxinsos em grão, não tendo filhos o avô succede
por direito proprio e io herdeiro necessario.
Se o neto não podesse ser chamado á successão por direito proprio,
não poderia ser tambem chamado por direito de representação.
Não aproveita pois o direito de representação aos filhos perfilha-
dos, porque o direito de representação só aproveita aos parentes
que a lei chama por direito proprio, e dos descendentes illegitimos só
são chamados por direito proprio os filhos e não os outros descenden-
tes.
O artigo 1999. nem regula a successão dos filhos perfilhados e
sim a successão dos ascendentes, nem podia prejudicar as restricções
que são expressas no codigo, ou que se deduzem como consequencia
necessaria de preceitos clarissimios.
Finalmente não é tão absoluta a regra da reciprocidade no direito
de successào que não tenha limitações. porque tambem os filhos re-
conhecidos por sentença judicial suecedem aos paes como se por
estes focam perfilhados quando os paes só suecedem aos filhos tendo-os
perfilhado voluntariamente, e tambem os ascendentes concorrem à
successão dos filhos perfilhados com a restricção prescripta no artigo
1995." quando os filhos succedem aos pies sem restricção alguma a
não ser a differença na quota artigo 1785."
O codigo civil franeez exclue os filhos illegitimos de sueceder aos
avós como exclue os avós de sueceder aos netos artigos 756., 765."
a 768
Mais positivo foi ainda o codigo civil italiano, que no artigo 749."
expressamente estabelece a exclusão.
Talvez o legislador reconhecesse a successão a todos os ascen-
dentes do pertilhado. por não represetar neste caso a succeosão
mais do que a restituição do que o respectivo ascendente haveria do
pae se o filho perfilhado não existira.
O nosso codigo, de accordo colo todos os codigos modernos que
negaram aos filhos illegitimos os direitos de sangue talvez para mais
consagrar o respeito pela constituição da familia legitima, manteve-
lhes os direitos reconhecidos na Ord. liv. 4.o tit. 92."; mas cerceou-
lhes a quota legitimaria artigo 1785.", e excluiu-os da successão aos
asre.ndentes do pae
E verdade que chamados, coio são, pelo artigo 2005." os filhos
"5.

ARTIGOS 1991" n 1992." 497

perfilhados a succeder aos transversacs de seus paes, por maioria de


razão deviam ser admittidos á successto dos ascendentes.
Mas tambem a Ord. liv. 4.° tit. 93.- dava aos filhos de coito da-
nrnado o direito de succeder aos transvers aes por parte da me,
neando-lhes aliás a successão ao pae e : mãe.
Em tedo o caso Isso valem argumentos de analogia a materia de
srucessecs visto que vem da lei a successao.
Iloje é io rinstante a jurispridincia de Supremo 'Tribunal de
Justiça e dos tribunaes de segunda instancia to sentido de iio re-
conhecer ao ti l]h( peilhado direito á successro dos a 1, nem por
direito propri nem poi direito de representação. que nao raie a
pena estar a citar accordos neste sentido, devendo apenas ntar-sa
que rara será a deriso em que são excluidos os perfillsdos de sue-
recsão legal aos avós, q u e ndo contenha algíua ou alguas assi-
giaturas rencido-em fator da suceso do illo ii ilegitimo aos
demais ascendentes illegitimie além do pa.
O que priniipalmiiicitr creou estas duvidas foi initrdiair-se no
final do artigo 2005." do projecto, apresentado como proposta de li
ás côrtes, as palavras---excepto em ambos os casos, nuo havendo
outros parentes dentro do decimo griu-, que no vinham nos pro-
jectos anteriores nos quaes todos terminava o artigo corí as palavras
,os filhos ilegitimos posto que perfilhados ,1 reconhecidos uii o sue-
edem ab intastao aos traísversars de seus paes, nem estes parentes
aos filhos illrgitimiose, e repugnar a muitos juizes fque os filhos ille-
gitimos sejam chamados i suceesso dio transversaes dos paes, e
não possam succeder cos avs.
Effectivamntte mal se comprehend q ue os tilhos illegiimos, que
aliás succedme aos transvrsas de scus paes como os tras ersues
de seus paes succedm aos filhos illegitimos silo batendo outros pa-
rentes dentro do decimo griu artigo 2005.", não possam succeder
aos ascendentes além do piae que aliás lhes surcedem a elles.
Mas é o que esta na lei. E o que estd na lei é que lia de rííii ir-se.
Sias succedems I os filhos legitimos do filho perfilhado ao av, re-
presentando o pae, com quíto não suceedam aos outros ascenden-
tes, porque os seus direitos não podem ir maisli ge do que os do
proprio pae, com dispnhla o prajecto primitivo no artigo final da
sub sreçdo que foi eliminado pela commiseo revisora de certo por
escusado logo rios trabalhos da primeira revisao,e e que era redigido
assim: - «Somente os descendentes legitimos dos filhos illegitiímíís
poderão reclamar os direitos conferidos a seus paes"-.
Em Hespanha não succede o filho illegitimo aos parentes do pae,
nem os parentes do pae ao filho illegitimo.

.art. 1991 . o filho illsgiulio concorrer a Ierança com


legitimos, herdará na pioporçdo e nos lermos
filho ou filhos
declarados no artigo 1785.1
Art. 1992.° Se, por serem muitos os filhos illegitimos,
não chegar a terça para o complemento das porções assi-

i Aecordão do supremo Tribunal de Justiça de 30 de outubro de


1899, Guaeta da Rei;r e Lisboa ,13.u ano, ti." 33, pag. 281.
Tom III 32
498 ARTIGOS 1993., 1994.- E 1995.^

gnadas no § 2.° do artigo 1785.1, nem por isso terão


direito a mais cousa alguma, e será a terça rateada entre
elles.
(Vid. nota ao artigo 1785.°)

SECL:AO IV

Da successão dos ascendentes

stu-sECCo 1

Da successão dos paes legitimos

Art. 1993. Se o filho legitimo fallecer sem descendeutes,


succeder- lhe-liSo seu pae e sua mãe por partes eguaes, ou
na totalidade da herança, se existir só aigum d'elles.
§ unico. Exceptua-se da disposição d'este artigo o que
fica disposto no artigo 1236."

(Vid. notas aos artigos 1109.- n.- 3. e 1969.)

sU-SECCÃo 11

Da successão dos paes illegitimos

Ari. 1994.° Se o filho illegitimo fallecer sem posteridade,


e sem consorte sobrevivo, devolver-se-ha a herança por in-
leiro aos paes que o houverem reconhecido.
Art. 1995.° se, porém, ao filho illegitimo fallecido sem
posteridade sobreviver consorte, haverá este, em quanto
vivo for, o usufructo de metade da herança.
Seria prýfundamente iziquo reconhecer o direito sZCCessOrio bem
como o pauto poder aos paes que contestaram a paternidade, per-
9
ARTIGOS 1996., 19979, 19989 s 1 99.- 499

mittindo-lhes aproveitar-se d'uma sentença que os condetmou a


recoolecer os laços de sangue que elles insistentemente negoram.
Mas, posto que o artigo 1999^ applique íi herança do filho perfil iado
ou reconhecido o disposto para a successão do ascendente salra a
limitaço do artigo 1995", e posto que a incapacidade do lierdeiro
termine n'elle artigo 1979., é certo que a contestaçto da patcroi-
dade torna a linha do par inteiramente extranha ao ti lio sempre que
dos interesses d ella se traete, excluindo da sereessão do filho ille-
gitimo não só o par, seno tombem os ascendecntces do segundo grot
e seguintes. que não podem ser chamados a succeder-lhe visto nào
provir a esclusso do pae de incapacidade ou de iídigaidade ios
tersos do artigo 1979e
A lei tracta com mcnos favor como era natural o ascendente ille-
gitimo do que o sscendente legitimo, porque garante ao consorte de
filho illegitimo que falleceu sem posteridade o usufrueto de ametade
da herança em quanto vivo for.

sUtI-SEUAO 111

Da successão dos ascendentes de segundo grau e seguintes

Art. 4996.° Na falta de paes, será a herança do falle-


cido conferida aos ascendentes do segundo grán e dos se-
guintes.

(Vid. nota ao artigo 1969.')

Art. 1997.° Si os ascendentes sobrevivos estiveret todos


no mesmo grata, será a herança repartida entre eles por
eguaes porções, seja qual for a linha a que pertençam.
Art. 1998.0 Se os ascendentes se não acharem to tesmo
gráa. será a herança conferida ao mais proximo, sem dis-
tini ção de linha.

(Vid. nota ao artigo 1970)

Art. 999. U que tica disposto nesta secção e applicavel


á herança de ilho perfilhado ou recnuhecidu, salva a limi-
tação to artigo 1999.°

(Vid, nota ao artigo 1995.)


500 ARTIGO 2000."

SEtC:AO v

Da successão dos irmãos e dos seus descendentes

Art. 2100.1 Se o fallecido não deixar descendentes nem


ascendentes, e não dispozer de seus bens, herdarão os
irmãos legitimos e os descendentes destes.

(Vid. artigo 2002.)


Regulam os artigos 2000." a 2005." a ordem da snccessào do
conjugo sobrevivo, e dos coilateraes legitimos da maneira seguinte:
1- os irmãos perfilhados e os descendentes legitimos destes ar-
tigo 20(0.- e 203.?; 2. os iriãos perfilhados mas já não os des-
cendentes d'estes artigo 2002?; 3. o conjuge sobrevivo; 4. os
outros transversaes legitimos dos paes até o decimo gráu artigo
2004.-; 5? entre filhos illegitimos e transversaes illegitimos artigo
'20o5.-
Da herança é absolutamente excluido o filho espurio que, como
extranho aos paes e á familia d'estes artigo 135.-, não lhes péde
suceder como elles lhe não podem sueceder a elle; e nem a
lei chama á suceessào filhos illegitimos que não estejam perfi-
lha doo.
Na linha collateral não suceedem os illegitimos havendo parentes
legitimos salvo os irmãos perfilhados que preferem a todos os col-
lateraes legitimos que não sejam irmãos legitimos ou descendentes
d':loes artigo 2002?
Nas expressões irsídos legétimos referem-se os artigos 2000? e
2002.- ao caso de ser filho legitimo o anetor da herança. pois o irmão
perfilhado, por isso mesmo que a sua filiação é illegitima, não tem
irmãos legitimos; assim como as palavras d'aquelles dois artigos
e do artigo 2003' -dscend-tes destes e deseindeotcs ocos -- aran-
gem apenas os descendentes legitimos de irnmSos legitimos.
No entre tanto tem-se já sustentado que os filhos illegitimos são
chamados á snceessào dos tios em coneorrencia com irmãos ou com
descendentes d'estes invocando-se os seguintes argumentos:
1- A redacção generica e absoluta do artigo 2000." que chama
o síícesso os irmãos legitimos e os descendentes d'estes sem dis-
tinguir entre deseeadeates legitimos e descendentes illegitimos como
o artigo 2002? distingue entre irmãos legitimos e irmãos perfi-
lhados;
2? Estarem comp r ehendidos na denminaçào- trans'ersnes-, a
que os filhos illegitimos no síecede salvo na falta de outros pa-
rentes dentro do decimo grau artigo 2005 , s' os parentes aloi dos
irmãos e descendentes d'estes, visto separar o artigo 1969." n."' 3?
e 5." completamente da successão dos transversacs a successào dos
irmãos e dos seus descendentes.
ARTIGO 2001.' 501

E já uia vez se julgou t que os filhos illegitimos concorrem á


herança do irmão do pac perfilhante com os filhos legitimos de
irmào legitimo, com o fundimento de ser regido o caso pelo artigo
2000.^ que nào distingue entre descendentes legitimos ou illegiti-
mos de irmão legitimo, e tio pelo artigo 2002.' que se refere á sue-
cessao dos irmos perfilhados do auetor da herança, nem pelo ar-
tigo 2005.° que tracta de suecessão dos trausversaes anteriormente
uào declarados.
O artigo 2000.° refere-se .t herança de irmão legitimo que deixou
trmas legitimos ou descendentes destes, porque os perfilhados não
podem ter irmãos legitimos; e o artigo 20112.° só chama á successão
os irmàos illegitimos ta falta de irmos legitimos, como o artigo
2005.° só chama os filhos illegitimos á sucessào dos trausversaes
de seus paes quando não houver p;orentes dentro do decimo gráu.
Os filhos illegitimos não concorram á herança dos tios com irmàos
legitimos ou descendentes legitimos, porque não suceedem aos tran-
sversaes de seus paes em quanto houver outros parentes dentro do
decimo gráu artigo 2005.2
Nada salvaria o absurdo de ser admittido o sobrinho illegitimo
á successào de que é aliás excluido o irmão illegitim, porque seria
dar preferencia aos sobrinhos illegitimos que estão em gráu mais
afastado sobre os irmàos illegitimos que estão em grãu mais pro-
ximo.
O artigo 1969.' separou dos outros transversaes os irmãos e os
descendentes dos irmãos unicamente para estabelecer as diversas
ordens de successào, e intercalar entre a classe 3.' e a 5.- a sue-
cessão do conjuge sobrevivo que foi uma grande conquista do direito
civil moderno.
As disposiçàes dos artigos 2002.o e 2005. devem considerar-se
explicativas ou restrictivas do artigo 1969^ n" 3.' para o effeito de
ser entendido este artigo por ellas e não ellas por elle.
Conseguintemeate os irmos perfilhados não succedem aos iretsoa
de legitimo matrimonio do pae perfilhante senão na falta de irmãos
legitimos deseetdentes d'estes; como são excluidos os irmos legiti-
da herança do filho perfilhado pelos irmãos perfilhados.

Art. 2001.' Se o fallecido deixar, ao mesmo tempo, ir-


mãos germanos e irmãos consanguineos ou uterinos, have-
rão os irmãos germanos dobrada parte da herança.

t Accordão da Relação de Lisboa de 1 de março de 1893 Direito,


29.' atno n.' 8, pag. 127.
2 Accordãos, do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de março de
de 1879, de 26 de maio de 1893 e de 5 de junho de 1896, e da Re-
lação do Porto de 28 de agosto de 1878, de 22 de março de 1878,
de 23 de outubro de 1888, de 7 de maio e de 20 de agosto de 1895,
e da Relação de Lisboa de 19 de julho de 1893, Recista de Legis-
laçro e de Jurisprudencia, de Coimbra, 12.' anno, n? 577, pag. 74,
Gazeta da Relação de Lisboa, 7.' anuo, n. 3 e 25, pagg. 19 e 197
e 10.' ano, n. 65, pag. 516, e Revista dos Tribunaes, 7.' anno, n.
155, pag. 168, 13.° anno, n. 312, pag. 373 e 14.' anuo, n.' 309,
pag. 109.
502 ARTIGO 2001.

unico. A mesma disposição se observará, quando con-


correrem descendentes de irmãos germanos com descen-
dentes de irmãos consangaineos ou uterinos.
A sueccessào de filho de legitimo matrimonio sem irmãos legiti-
mos, nem descendentes d'estes, são cliamados os irmidos perfilhados
na férma prescripta no artigo 2001., isto é, cobrando os irmãos ger-
manos dobrada parte do que couber aos consanguiieos ou uterinos.
Seria iniquo iípôr aos irmãos gemanos perfilhados o encargo dos
alimentos de preferencia aos consanguin-os ou uterinos, quer legi-
timos quer reconhecidos artigo 175, e dar a estes egual proveito
na successo.
As palavras ido mesmo modo» do artigo 2002.", que tambem não
vinhaío no projecto primitivo artigo 2156. correspondente ao artigo
2002. do codigo e foram introduzidos pet coimmissoo revisora, refe-
rem-se apenas à doutrina do artigo antecedente e do respectivo
unico; isto é, ao caso de concorrerem irmos perfilhados bilateraes
com irmãos perfilhados unilatraes.
Por direito ant.rior nuua os bens de irmão havidos do pae com-
mum, ou por parte d este, podiam ir aos irmãos de outro leito, ha-
vendo irmàos do mesmo leito que sobrevivessem ao pac binubo,
porque, fallecendo o irmo durante a vida do pae binubo seguia logo
a propriedade para os irmíos grrmnos. pertencendo ao pac só o
usufruto, e fallecendo dipnis da morte do pae binubo nada herdavam
os irmos de outro leito, visto que pela nov. 118 entre nós recebida
os irmios germanos excluiam absolutamente os irmàos consangui-
neos e os uterinos, dando se preferencia ao sangue inteiro sobre o
meio sangue por se considerar o duplicado vinculo que liga os ger-
mans como penor de mais viva aifdiçào.
A novella 11s no capitulo 111 dizia assim: Si defuncus neyue des-
cendentes neue ascendentes reliqnerit,primos ad Ieredilatrei rocams
ratres, et sorores ex codi palre el ex eadeí more natos... Ilis
auteiinon exisentius, ia secundo ordine illos fraires ad hereditalem
eocauis, qui ex uno parente conjííícti soíi deruncto sire per palrem
sice per atrem.
Egual principio foi adoptado pelo codigo da Prussia.
Assim pelo nosso antigo direito perteucia sempre aos irmàos ger-
manos a propriedade dos bens do irmão fallecido, havidos do pae
prsdífulcto ou por parte d'este, ou o irmo fallecesse em vida ou
depois da morte do pie Linubo.
MaNieve o codigo n mesmo principio para o caso de sobrevivencia
do pae binubo ao irmão. Mas se ao fallccimento do irmo o pa é já
morto repartem-se os bens do fallecido, incluindo os que elle houve
da pae predefuícto e por parte d'este, entre os filhos de todos os lei-
tos com a uaica differença de terem os irmàos germanos o dobro do
que tocar aos irmàos consanguineos e aos uterinos.
Nilo é, como alguns pretendem, limitado o preceito do artigo 2001.°
pela disposição do artigo 1236". para o effeito de levantarem os
irmàos germanos por inteiro os bens que o irmào fallecido houve por
parte do pae ou mãe predcfuncto ainda que o falleciíiento tivesse
logar depois da morte do pae binubo, e haverem quinhão dobrado
nos adquiridos.
Nem a combinação dos artigos 1236° e 2001.^ admitte semelhante
concluso, nem proscripta, como foi, a doutrina do direito anterior
que preferia os irmãos germanos aos consanguineos e uterinos, e reco-
ARTIGO 2002í 503
nhecia aos irmãos de leito anterior o direito a concorrer com irmãos
germanos de leito posterior, seria justo excluir os irmãos de leito pos-
terior de concorrer com os irmãos germanos de leito anterior.
A «dobrada parte da áeraaoç, ou,, dobro da herança ha de calco-
lar-se com relação a cada ui dos iramos indicidualiente,e não com
relação às duas classes em geral de irmãos bilateraes e unilateraes:
isto é, concorrendo por exemplo um irmão germano com tres irisos
unilateroes, não recebe o irmão germano dois terços da herança, e
os irmãos anilateraes un terço para ser dividido por todos tres, e
pelo contrario deve ser o quinhão do irmão germano o dobro do qui-
nhão de cada ui dos irmãos unilateraes.
Calculado o dobro da herança não com relação a cada aio dos ir-
mãos individualmente, mas com relação aos dois grupos de irmãos,
germanos ou unilateraes, podia dar-se até o caso de ser maior a quota
hereditaria dos unilateraes do que a dos bilateraes, como nihvpo-
these de concorrer um irmão unilateral com tres irmãos germanos
que ficariam estes com dois terços da herança para os dividirem
entre si e o irmo unilateral com o terço restante sé para si; quando
o pensamento do legisldor foi dar aos irmãos por dois lados vincu-
lados ao auctor da herança o dobro do que tocasse aos que lhe es-
tavam vinculados por um lado só.
Esta é tasbem a interpretação de Goyena ao artigo 768." do
projecto de codigo civil hespanhol, pondo o exemplo de uma herança
de 12:000 duros, e tres herdeiros, um irmão germano e dois uterinos,
e declarado que ao irmão germano pertencem 6:000 duros, e a cada
um dos uterinos 3:000 duros.
O nosso codigo seguiu o projecto do codigo civil hespanhol, que
no artigo 760." está redigido assim: el eecto del doble vinculo será
dar es la hersncia una porcio doble de ia qsi liene el pariente de ura
solo lado; isto é aos irmãos germauos, quando concorrem com ute-
riuos ou consanguineos, pertencerá pela nossa lei dobrada parte da
herança.
O processo para esta partilha é sommar o numero dos irmãos,
contando por dois cada um dos irsmãos germanos, dividir pelo resul-
tado da somma o valor da herança, e dar a cada irsíso unilateral a
importancia de sim quociente e a cada irmão bilateral a importancia
de dois quocientes.
Assim n'uma successão de 90:004000 réis, a que concorrem quatro
irmãos germanos e um consanguineo, divide-se em nove partes ou
10:000s 0 réis cada nona parte, e dão-se duas partes ou 20:0004000
réis a cada irmão germano, e uma parte ou 10:0004000 réis ao irmão
consanguineo.
Outras legislaçàes chamam à successâo os irmãos consanguineos
e uterinos conjunctamente com os germanos mas para receberem
quinhão só na sua linha.
Assim o codigo civil francez não excluiu os irmãos consaguineos
e uterinos, quando concorressem com os germanos artigo 733., mas
deu-lhes quinhão apenas na sua linha salva a excepção do artigo
752., ao passo que aos germanos dava parte na successão de aibas
as linhas, de modo que por direito francez, valendo 12:0004000 réis
a successão e sendo os herdeiros um irmão germano e dois uterinos,
pertencem áquelle 8:000000 réis, 6:0003000 réis pela linha paterna
e 2:0000 réis pela materna, e a cada um d'estes 2:000000 réis.

Art. 2002.0 Na falta de irmãos legitimos e de descendentes


504 ARTIGO

seus, herdarão do mesmo modo os irmãos perfilhados ou


reconhecidos.

(Vid. nota ao artigo 2000)

SECCAO vi

Da successão do conjuge sobrevivo e dos transversaes

Art. 2003.° Na falta de descendentes, ascendentes, e


irmãos e descendentes d'estes, soccederá o conjuge sobre-
vivo, excepto achando-se judicialmente separado de pessoa
e bens por culpa sua.

O artigo, etamando á herança o conjuge sobrevivo na falta de ir-


mos e descendentes d'eses, nào comprehende nos descendentes os
perfilhados, aliás estaria em contradicção aberta com os artigos
anteriores e com os seguintes.
0 artigo ha de entender-se assim
«Ya falta de descendentes, de ascendentes, de irmãos quer legi-
timoa qcer perfilhados e de descendentes de irmàos legitios,suceede
o conjuge que nào estiver separado por culpa sua,.
Apesar do artigo 2003." no dizer como o artigo 2000", irmàbs
/egitimos o descendentes destes, e sim irmãos e descendentes destes,
prefere o conjuge aos descendentes illegitimos dos irmos.
Dos illegitimos só o irmão perfilhado lhe 1refere.
Só preferem ao conjuge artigo 2004.- os transversaes designados
preeedentemente; e os descendentes de irmàos perfilhados em nenhum
dos artigos anteriores furam designados nem a elles houve refereo-
cia sequer.
Do contrario continuaria o conju-e na posição do direito velho,
que só o chamava á herança na falta de parentes até o decimo
gráu.
A incapacidade successoria affecta só o conjuge condemnado como
res1 ltta das palavras-por culpa sua-.
E a condemnaçdo o reconhecimento da culpa.
N5o basta para excluir o conjuge sobrevivo a pendencia da acçào
de separação.
Só depois de passar em julgado a sentença de separação de pes-
soas e bens é que está definitivamente decretada a exclusào do con-
juge .ue foi culpado da separação, porque os direitos e as obrigaçóes
entre conjuges só terminam pela dissolução do matrimonio, ou pela
separação judicial que sem sentença final ndo está decretada.
A exclusão da successdo legitima, poréns, não prejudica a succes-
sao testamentaria, como a exclusào da ecmmunhdo udo importa a
exclusão da successào reciproca entre os conjuges, e como a deixa
ARTIGOS 2004.- 2005.° 505

a mta dos conjuges com a condição da não incommunicabilidade


com o outro ou nos bens ou nos rendimentos não obsta a que o
excluido os possa haver em sucessão, quer legitima quer testamen-
taria.

Art. 200'.° Não falta de todos os parentes e do conjuge,


mencionados no artigo antecedente, serão chamados à he-
rança os transversaes não designados precedentemente,
achando-se dentro do decimo grãu.
(Vid. nota ao artigo 19139.")

Art. 2005.° Os filhos illegitimos, posto que perfilhados


ou reconhecidos, não succedem ab-intestato aos transversaes
de seus paes, nem estes parentes aos filhos illegitimos,
excepto, em ambos os casos, não havendo outros parentes
dentro do decimo gráu.
A suecessào do perfilhado hão de ser chamados os perfilhados,
como á suecessào dos legitimos hão de ser chamados os parentes
legitimos.
A legitimidade exclue a illegitimidade e vice-versa.
Na perfilhação os parentes do pae não são parentes do filho.
O pue do perfilhado tei p arentes. 0 perliliado não.
O filhpopfilhada não outra na familia.
O filho pefilhado adquire simples e strictamente o direito de usar
do appellido dos paes, e o direito a alimeutos e à suecessão nos
termos do artigo 129. do codigo civil.
Até la organizaçào do conselho de vizinhos está a prova de que
os perfilhados não téem parentes.
Para os legitimos é o conselho de familia, composto dos parentes
mais proximos do menor artigo 207.° porque o menor legitimo tem
parentes.
Para os perfilhados ha o conselho de vizinhos, composto não de
parentes do menor artigo 273., porque parentes não tem o filho ille-
gitimno, mas de cinco vizinhos d'eutre os amigos ou parentes do pae
ou da màe.
Negava o sr. Seabra no seu projecto absolutamente a suecesso
reciproca na linha collateral entre filhos illegitimos e transversaes
dos paes fóra os irmãos; e esta doutrina foi seguida pela commissão
revisora nos seus dois primeiros projectos.
O artigo, 2163." no projecto do sr. Seabra, 2054.' no projecto da
commissão revisora, e 2039.0 no segundo projecto da mesma commis-
são, correspondente ao artigo 2005.' do codigo, era redigido assim:
Os filhos illegitimos, posto que perfilhados ou reconhecidos, não
suecedem abintestado aos transversaes de seus paes, nem estes pa-
rentes aos perfilhados» -.
No systeíoa do projecto primitivo e dos dois primeiros projectos
da commissão revisora, pois, só tinham preferencia os perfilhados
sobre os collateraes legitimos quando eram irmãos, como hoje pelo
artigo 2002." do codigo na falta de irmãos legitimes e de descen-
dentes d'estes são chamados os irmãos perfilhados.
506 ARTIGO 2005.-

Mas além de irmãos não ia a successão reciproca entre parentes


legitimos e filhos perfilhados na linha collateral.
Foi a eeumsiseão revisera na ultima revisão, em sessão de 1 de
abril de 1865, quem acabou com o interdicto reconhecendo o direito
de successão reciproca entre os perfilhados e os transversaee dentro
do decimo grau, com a seguinte addiçào ao artigo: ,excepto, cm
ambos s casos, não havendo parentes dentro do decimo gráu.
Duas hypothescs regula o artigo 005"- ser auctor da herança
algum transversal legitimo do par de filho illegitimo-ser auctor
da herança algum filho illegitimo -.
Na primeira hypothese não suecede o filho illegitimo por não ser
parente do transversal do par, em quanto houver transversal legi-
timo dentro do decimo gráu porque não ha de preferir aos parentes
quem parente não é.
Mas na segunda hypothese quaes são os sats parentes que não
podem ser preteridos pelos transversaes legitimos, visto sucrederem
os transversaes do pae ao filho illegitimo só não havendo outros
parentes dentro do decimo grau?
Esses ofros não podem ser senão os illegitimos, visto resultar
claramente do artigo que tambem os transversaes legitimos das paes
não succedem aos filhos illegitimos, tendo estes saíros parentes den-
tro do decimo grúu.
Fez o codigo duas escalas abertamente separadas, uma para os
filhos illegitimos, e outra para os transversaes dos paes, adoptando
em ambas a mesma regra.
Deu preferencia aos illegitimos na successão dos illegitimos e deu
preferencia aos transversaes legitimos na successâo dos parentes
legitimas.
A herança de transversal legitimo não é chamado filho illegitimo
em quanto houver transversal legitimo dentro do decimo grãu, e á
herança de filho illegitimo não são chamados transversaes legitimos
em quanto houver outros parentes dentro do decimo grãu, isto é, es:
quanto houver perfilhados dentro do decimo gráu, porque outros
parentes que não sejam os transversaes legitimos não podem ser
senão os perfilhados.
N'outros termos: a successão dos transversaes legitimos é para os
transversaes legitimos e a successão dos filhos illegitimos é para os
filhos illegitimos em quanto na respectiva classe os houver dentro do
decimo grá.
Na falta de descendentes, de ascendentes, de irmãos legitimos, de
irmãos perfilhados, e de descendentes de irmãos legitimos, succedem
dentro do decimo grãu os legitimos aos legitimos e os perfilhados
aos perfilhados, e s¯ubsidiariamente os perfilhados aos legitimos e os
legitimos aos perfilhados, ficando assim perfilhados e legitimas no
mesmo pé de egualdade dentro da sua respectiva classe.
Deu o legislador especial attenção á legitimidade na linha colla-
teral em quanto se tractava de irmãos e de descendentes de irmãos.
Mas já se não importou em grãu mais remoto com a preferencia
entre legitimidade e illegitimidade, e assim destinou a successão dos
legitimos para os legitim¯os e a successão dos perfilhados para os per-
filhados, chamando apenas subsidiariamente uma classe quando na
outra não houvesse tinguem dentro do decimo grãu.
Esta é a conclusão a que nos leva a approximação e confrontação
dos artigos relativos ao caso.
Na secção 5.°, que se inscreve- -da successão dos irmãos e dos seus
descendentes,- -destaca-se o artigo final (2002.), que na falta de ir-
1

ARTIGOS 200(;." : 20u7* 507

mos legitimos e de descendentes seus chama a herdar do resmo


modo os ir,,,dos perflitado o,, recmhecido.
Logo a seguir no artigo 2003.' é chamado a successao o conjuge
sobrevivo, salvo acoando-se separado de pessoa e bens por culps
sua, na falta de descendentes, ascendentes, e irmãos e descendentes
d'estes, e portanto na falta tambem de irmãos perfilhados os reco-
oheeido.s, que pelo artigo anterior 2002 vinham à successão na
falta de irmãos legitimos.
Ainda o artigo 2004. se refere aos mesmos parentes, descendentes,
ascendentes, irmãos legitimos e descendentes seus, e irmãos perJi-
udo, chamando á herança na falta de todos aquelles parentes te-
gitimos perfilhados os transversaes dentro do decimo gráu no artigo
anterior não mencionados.
Vem depois o artigo 2005.-, e chama os transversaes legitimos
á successão dos filhos illegitimos, como chama os filhos illegitimos á
successão dos transversaes legitimos, faltando na respectiva classe
parentes até ao decimo gráu.
Tem-se, porém, sustentado que nas palavras finaes do artigo-não
havendo outros parentes dentro do decimo gráu-estão eomprehen-
didos apenas os transversaes legitimos, e não os illegitimos; e tem-se
julgado ora que na herança do illegitimo preferem sempre a quars-
quer parentes illegitimos os transversaes legitimos dentro do decimo
grãu; ora que na herança de filio illegitimo não sucedem trans-
versaes legitimos em quanto houver parentes illegitimos dentro do
decimo grâu. 2

SECCA0 V'l

Da sucessão da fazenda nacional

Art. 2006.° Na falta de todos os herdeiros testamentarios


ou legitimos, succederá o estado.
Art. 2007.Õ Os direitos e obrigações do estado, relativa-
mente à herança, serão os mesmos que os de qualquer
outro herdeiro.

1 Acecordâos do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de novembro


de 1897, e de 22 de maio de 1900, Reita dos Tribsnaes, 17»- anno,
n.° 385, pag. 5, e Gazeta da Relção de Lisboa, 14.o ano, n.o 9,
pag. 70.
2 Accordãos, do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de maio de
1884, e da Relação do Porto de 10 de fevereiro de 1899, Revista de
Legislação e de Jurisprdencia, de Coimbra, 27. anno, n. 1253,
pag. 43, e Revista dos Tribunaes, 17. auno, n.° 406, pag. 342.
}-_

508 ARTIGO 2108"


Transmitte.se a posse ao estado, como a qualquer particular logo
á morte do aietor da herança porque os direitos não podem estar
suspensos, limitando-se a scntrnça judicial a tornar real e etfectiva
a mesma posse.
Assenta a successão do estado n'uma base natural, como é a re-
compensa dos serviços que a patria presta ao cidadão, e o presu-
mido aieeto do cidadão pelo seu paiz.
Em todo o caso, ou seja eliaiado a suceeder como herdeiro artigo
1919., ou pelo direito de soberania, na falta de herdeiros testamen-
tarios, de parentes e do coujuge sobrevivo, queslo theorica que no
vale a pena discutir, tem o estado os direitos e as obrigações de
qualquer outro herdeiro, excepto encargos fiscaes.
E assim obrigado a pagtr as dividas e os legados pelo producto
dos bens da herança, mas sem deducção alguma para pagamento
das custas do processo que equivaleria isso á condemnaçào da fa-
zenda em custas que do montante d'ellas ficaria egualmente privada
ou se deduzissem logo ou se pagassem depois de entrar o producto
da herança nos cofres do estado.
Em Ilespanha destinam-se as heranças vagas para os estabeleci-
mentos de instrucção e de beneficencia.

Art. 2008.° O estado não poderá tomar posse da herança,


sem qie preceda sentença que declare o seu direito, tios
termos do codigo de processo.
O codigo de processo civil, regulamentando nos artigos 689.° a
094 ° o artigo 2008." do codigo civil, sobre a herança jacente assim
chamada porque descança em jacel sem ninguem a ter acceitado ou
na posse d'ella ter sido investido, deu competencia ao ministerio
publico, e a qualquer interessado ou credor para requerer ao juiz
a determinação de praso para os herdeiros declararem se acceitam
ou repudiam a herança quando elles, sendo conhecidos, nem a accei-
tam expressamente, nem praticam acto que importe acceitaçào, e
para promover o arrolamento ou arrecadação da herança não estando
já feito, nomeando-se administrador provisorio em caso de necces-
sidade, e procedendo-se em seguida a citação edital se os herdeiros
não forem conhecidos.
Reputa-se acceite a herança se os citados não vierem dentro do
praso, que não pdde ir além de trinta dias, fazer declaraço; e serão
sucessivamente citados no caso de repudio os herdeiros conhecidos
que se seguirem até não haver quem prefira á successão do estado.
Se ninguem comparecer dentro do praso dos editos ou for julgada
improcedente a habilitação com relação a todos os habilitantes é de-
clarada vaga a herança para o estado.
Antes da sentença final s6 paderão vender-se os semoventes ou os
moveis, e nem mesmo esses valores se algum interessado impugnar
a venda, e se responsabilisar pela guarda e conservação d'elles.
Póde o credor do herdeiro que repudia acceitar a herança para
ser pago pelos bens d'ella, deduzindo o pedido do seu credito em
acção ordinaria contra o repudiante e contra aquelles para quem
deverem passar os bens por efeito do repudio, e executando-se de-
pois a sentença na herança.
Declarada vaga a herança procede-se à liquidação, avaliando-se
e vendendo-se os bens, pagando.se as dividas e adjudicando-se ao
P

ARTIGO 2008.- 509

estado o remanescente, tudo em conformidade do disposto nos diffe-


rentes , do artigo 693 do codigo de processo civil.
Não impede, porém, a sentença, que declara vaga a herança para
o estado. de reclamarem mais tarde os seus direitos á successào os
verdadeiros herdeiros que não vieram ao processo de habilitaào,
recorrendo aos meios ordinarios para obter a rescisão da sentença
proferida a favor da fazenda. ý
Já na prática se tem confundido o processo da entrega da hcraaça
jacente com o processo da entrega do thesouro, quando aquelle é
judicial e este administrativo, e quando na hlerança jarente é cara-
eteristico conhecer-se o auctor d'ella e comprehender certa univer-
salidade de direitos, e no thesoro ignora-se quem seja o dono e
abraoge porçoo restricta de bens.
Na herança jacente citam-se os credores para se verificar a exis-
tencia e legalidade de soas dividas, e na arrecadaçào de thesouro
não póde isso fazer-se porque, alo se conhecendo o dono, não pode
saber-se quem são os credores.
Thesais, dizia o jurisconsulto Paulo na lei 31 dih. de aa 1 aie.
rcr. doin. est rei qauada deljositio pecuni , ajus no extat memo-
ria, rt jam dominam nonraeat.

t Acordàos, do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de janeiro e


de 4 de dezembro de 1891, e de 15 de novembro de ]898, e da Re-
laçào do Porto de 15 d novembro de 1899 Ioaleti, ros Triaes,
7. atno, n. 275, pag. 201, e a.- 245, pag. 353e,]i/a de Direito e
de Jrio lradencia, 2' serie, n. 30, e leirta, doo 1'ilouneoa, 21 also,
na.458, pag. 21.

FIM DO VýOLUiIE til


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