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UNIVERSIDADE

AbERTA
. . www uab pt

09
Metodologia
da Investigação
Guia para autoaprendizagem
3 .- Edição

Hermano Carmo I Manuela Malheiro Ferreira

eUAb I Coleção Universitária


METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO
Guia para autoaprendizagem
a
3 Edição
Hermano Carmo | Manuela Malheiro Ferreira

UNIVERSIDADE ABERTA | 2015


Copyright © UNIVERSIDADE ABERTA — 2015
Palá cio Ceia • Rua da Escola Politécnica, 147
1269-001 Lisboa - Portugal
. .
www uab pt

Coleção: eUAb | Coleção Universitá ria; N.° 09


ISBN: 978-972- 674-759-8
INDICE

NOTA À EDIÇÃO

AGRADECIMENTOS

UNIDADE 1 - INTRODUÇÃO
Objetivos da unidade
1. CONTEXTO E JUSTIFICAÇÃO
2. PR É-REQUISITOS E OBJETIVOS DO SEMINÁ RIO E DO GUIA
3. REGIMES DE TRABALHO E PROGRAMA
4. SISTEMA DE AVALIAÇÃO
5. RECOMENDAÇÕES PARA AUTOAPRENDIZAGEM
In ício da aprendizagem
Planeamento e organiza çã o da aprendizagem
Manter um ritmo de estudo
Tirar partido dos recursos dispon íveis

I . VISÃO PANORÂ MICA | HERMANO CARMO

Unidade 2 - 0 projeto de investigação em Ci ê ncias Sociais

Objetivos da unidade
1. DUAS QUESTÕES PR ÉVIAS
1.1. A questã o da informa ção dispon ível
Uma atitude de recordista
Atividade 2.1
Recolha preliminar de informaçã o
Atividade 2.2
J á se escreveu tudo sobre determinado assunto?

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í ndice

0 nevoeiro informational
Atividade 2.3
.
1.2 A questão da gestão do tempo
Atividade 2.4
Atividade 2.5
2. ELEMENTOS PARA O PLANEAMENTO DE UMA INVESTIGAÇÃO
.
2.1 Investigar o quê? (Delimitar o objeto de estudo)
Atividade 2.6
.
2.2 Definir o objetivo da pesquisa
Atividade 2.7
.
2.3 Programar a pesquisa
Atividade 2.8
.
2.4 Identificar e articular os recursos necessários
.
3 FERRAMENTAS METACOGNITIVAS PARA INVESTIGAÇÃO
.
3.1 Os mapas conceptuais
O que é um mapa conceptual?
Passos para a elaboraçã o de um mapa conceptual
Clarificar conceitos
Desempacotar um conhecimento complexo
Conceber um campo semântico
3.2. Outros diagramas estruturadores cognitivos
3.3. O Vê heurístico, epistemológico ou de Gowin
Atividade 2.9
Síntese
Teste formativo

Leituras complementares

Unidade 3 - Pesquisa documental

Objetivos da unidade

.
1 PAPEL DA PESQUISA DOCUMENTAL NO CONTEXTO DO PROCESSO DE
INVESTIGAÇÃO

.
2 DOCUMENTOS ESCRITOS
.
2.1 Onde procurar?
Bibliotecas e arquivos

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í ndice

Atividade 3.1
Primeira triagem
Atividade 3.2
2.2. Exploração do texto
A economia da leitura
Estratégias de exploração de texto
2.3. Registo de dados
Fichas bibliográficas
Fichas de leitura
Sistemas de classificação
2.4. Documentos oficiais
Publicações oficiais
Documentos não publicados
Atividade 3.3
.
2.5 Estatísticas
Virtualidades
Limitações
Princípios orientadores
Atividade 3.4
2.6. Documentos pessoais
Virtualidades
Limitações
Princípios orientadores
Atividade 3.5
2.7. Documentos escritos difundidos
O jornal como fonte de dados
Análise de impacto

.
3 DOCUMENTOS NÃO ESCRITOS
.
3.1 Objetos
.
3.2 Registos de som e de imagem
Síntese

Teste formativo

Leituras complementares

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í ndice

Unidade 4 - Técnicas de observaçã o

Objetivos da unidade

1. 0 QUE É OBSERVAR?
1.1. 0 testemunho dos deficientes
.
1.2 Os ensinamentos de Baden Powell
.
1.3 As lições de Conan Doyle
.
1.4 A experiência dos socorristas
Atividade 4.1
.
2 QUE ASPETOS OBSERVAR?
2.1. Os indicadores como filtros de informação
Questões conceptuais
Indicadores demográficos e económicos
Indicadores Sociais
Critérios para a construção de indicadores sociais
.
2.2 Guiões de observação e sistemas de registo
Atividade 4.2
.
3 TIPOS DE OBSERVAÇÃO
.
3.1 Observaçã o não-participante
.
3.2 Observação participante despercebida pelos observados
3.3. Observação participante propriamente dita
Atividade 4.3
.
4 ASPETOS RELEVANTES DA OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE
4.1. A questão do observatório
Negociação e escolha do papel
O horizonte de cada papel
.
4.2 A quest ão da intensidade do "mergulho" (ou do envolvimento do
investigador)
A Janela de Johari
Mergulho (envolvimento) restrito
Mergulho (envolvimento) profundo
Atividade 4.4
.
5 PROBLEMAS DEONTOLÓGICOS
Atividade 4.5

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í ndice

Síntese
Teste formativo

Leituras complementares

Unidade 5 - Inquéritos por entrevista e por questionário

Objetivos da unidade

.
1 O QUE É UM INQUÉRITO?
.
1.1 0 inquérito em Ciências Sociais
.
1.2 Tipos de inquéritos em Ciências Sociais
Atividade 5.1
2. INQUÉRITOS POR ENTREVISTA
.
2.1 A interação direta, questão-chave na técnica de entrevista
Influência do entrevistador no entrevistado
Diferenças culturais entre entrevistador e entrevistado
Sobreposiçã o de canais de comunicação
.
2.2 Quando recorrer à entrevista ?
.
2.3 Tipos de entrevistas
2.4. Aspetos de natureza prática
Antes da entrevista
Durante a entrevista
Depois da entrevista
Atividade 5.2
.
3 INQUÉRITOS POR QUESTIONÁRIO
.
3.1 A interação indireta, questão chave do inquérito por questionário
Formulação das perguntas
Diversidade de canais de comunicação
Prevenção das não-respostas
A questão da fiabilidade
3.2. Aspetos de natureza prática
Fase preliminar (antes)
Construção das perguntas
Apresentação do questionário
Atividade 5.3
O decorrer (durante)
Fase subsequente (depois)

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í ndice

.
4 EM SÍNTESE: VIRTUALIDADES E LIMITAÇÕES DA ENTREVISTA E DO
QUESTIONÁRIO
Teste formativo

Leituras complementares

Unidade 6 - 0 Relatório de Pesquisa

Objetivos da unidade

.
1 INTRODUÇÃO

2. REFLEXÕES PRÉVIAS AO ATO DE RELATAR


2.1. 0 que é que se quer transmitir?
2.2. A quem se destina o relatório?
.
2.3 Quando e onde se desenrolou a pesquisa?
Condicionamentos espaço-institucionais
Condicionamentos temporais
.
2.4 Como se desenrolou a investigação?
Atividade 6.1
3. ELABORAÇÃO DO RELATÓRIO
.
3.1 Conteúdo do Relatório
Problematização da questão
Itinerários e processos de pesquisa
Resultados alcançados
Consequências dos resultados
.
3.2 Construção e forma do relatório
Dois princípios básicos indispensáveis: clareza e rigor
Esquema de apresentação: o travejamento temático
O corpo do texto
Atividade 6.2
Síntese

Teste formativo

Leituras complementares

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í ndice

II. APROFUNDAMENTO TEMÁTICO | MANUELA MALHEIRO FERREIRA

Unidade 7 - Métodos Quantitativos e Métodos Qualitativos

Objetivos da unidade

.
1 INTRODUÇÃO
2. PARADIGMAS QUANTITATIVO E QUALITATIVO
Métodos e técnicas de investigação em Ciências Sociais
Métodos quantitativos e métodos qualitativos

3. CARACTERÍSTICAS DOS MÉTODOS QUANTITATIVOS


Atividade 7.1
.
4 OS MÉTODOS QUALITATIVOS
4.1. Características dos métodos qualitativos
Atividade 7.2
4.2. Tradições teóricas em investigaçã o qualitativa
Atividade 7.3
.
5 POSSIBILIDADE DE UTILIZAR UMA COMBINA ÇÃO DE MÉTODOS
QUANTITATIVOS E QUALITATIVOS
Atividade 7.4
Síntese

Teste formativo

Leituras complementares

Unidade 8 - Técnicas de Amostragem

Objetivos da unidade

.
1 INTRODUÇÃO
2. AMOSTRAGENS PROBABILÍSTICAS
2.1. Amostragem aleatória simples
.
2.2 Amostragem estratificada
.
2.3 Amostragem de cachos (clusters)
.
2.4 Amostragem por etapas múltiplas
.
2.5 Amostragem sistemática
.
2.6 Determinação da dimensão da amostra

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í ndice

Atividade 8.1
.
3 AMOSTRAGENS NÃO PROBABILÍSTICAS
.
3.1 Amostragem de conveniência
.
3.2 Amostragem de casos muito semelhantes ou muito diferentes
.
3.3 Amostragem de casos extremos
3.4. Amostragem de casos típicos
.
3.5 Amostragem em bola de neve
.
3.6 Amostragem por quotas
.
3.7 Utilidade das amostragens não probabilísticas
Atividade 8.2
Síntese

Teste formativo

Leituras complementares

Unidade 9 - A Prática de Investiga ção

Objetivos da unidade
1. CLASSIFICAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO
.
1.1 Classificação quanto ao propósito
.
1.2 Classificação quanto ao método
.
2 INVESTIGAÇÃO HISTÓRICA
3. INVESTIGAÇÃO DESCRITIVA
3.1. Inquéritos
.
3.2 Estudos relativos ao desenvolvimento
.
3.3 Estudos complementares
3.4. Estudos sociométricos
.
4 ESTUDO DE CASO
Histórias de vida

.
5 ESTUDO ETNOGRÁFICO

6. INVESTIGAÇÃO CORRELACIONAL
7. INVESTIGAÇÃO EXPERIMENTAL

.
8 INVESTIGAÇÃO CAUSAL-COMPARATIVA
Atividade 9.1

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í ndice

Síntese
Teste formativo

Leituras complementares

Unidade 10 - A Aná lise de Conteúdo

Objetivos da unidade

.
1 DEFINIÇÃO DE ANÁLISE DE CONTEÚDO
2. TIPOS DE ANÁLISE DE CONTEÚDO
Análise de exploração e análise de verificação
Análise quantitativa e análise qualitativa
Análise direta e análise indireta
Atividade 10.1
3. A PRÁTICA DA ANÁLISE DE CONTEÚDO
.
3.1 Definição dos objetivos e do quadro de referência teórico
.
3.2 Constituição de um corpus
Atividade 10.2
3.3. Definição das categorias
.
3.4 Definição das unidades de análise
Atividade 10.3
.
3.5 Quantificação
.
3.6 Interpretaçã o dos resultados
.
4 FIDELIDADE E VALIDADE

Síntese
Teste formativo

Leituras complementares

Unidade 11- Princípios Éticos e a Apresentação do Projeto e do Relatório de


Investigaçã o

Objetivos da unidade

.
1 PRINCÍPIOS ÉTICOS

2. A ELABORAÇÃO DO PROJETO E DO RELATÓRIO DE INVESTIGAÇÃO


2.1. O Projeto de Investigaçã o

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í ndice

2.2. 0 Relatório de Investigação


2.2.1. Organização do Relatório de Investigação
2.2.2. Análise Crítica de um Relatório de Investiga ção
Atividade 11.1
Leituras complementares

BIBLIOGRAFIA GERAL

Pequena lista de bibliotecas on- line ( meramente exemplificativa )

ANEXOS

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NOTA À EDIÇÃO

Ao longo dos seus já dezasseis anos de vida, o presente manual tem sido usado por
uma grande diversidade de pessoas, ultrapassando em muito o público-alvo inicialmente
previsto. Com efeito, quando no final dos anos noventa escrevemos o livro, procurámos
responder às necessidades de aprendizagem dos estudantes do Mestrado em Relações
Interculturais da Universidade Aberta, esperando que a sua utilidade fosse reconhecida por
outros estudantes de 2 o ciclo de cursos de Ciências Sociais, desta e doutras instituições
de ensino superior.

A verdade é que fomos surpreendidos com uma procura bastante mais ampla, tanto no
que se refere ao ciclo de aprendizagem (alargando-se a procura ao primeiro e ao terceiro
ciclos), como no que concerne à proveniência dos utilizadores que, segundo as informações
que tiveram a amabilidade de nos dar, abrangeram domínios como os das Ciências da
Educa ção, da Psicologia Social, da Enfermagem, de v ários cursos ligados à intervenção
social (Política Social, Serviço Social, Educação Social, Animação sociocultural), etc.

Se, naturalmente, este reconhecimento nos tem causado grande satisfação, também
constitui um desafio, no sentido de não o deixarmos desatualizar. Não podendo fazê-
-lo neste momento integralmente, como o ótimo é inimigo do bom, decidimos, na 2 a
edição ( 2008), proceder a uma atualiza ção parcial, cingindo-se às primeiras seis unidades
{ introdução e visão panorâmica) e à bibliografia.

Em termos de forma, procurou-se usar os dois tipos de citação usuais (identificação


completa e autor/data), reservando o primeiro para as obras que não constam na
bibliografia final, por não serem indispensá veis ao estudo desta matéria.

As atualizações de conteúdo foram as consideradas estritamente necessárias, de modo


a respeitar a identidade original do livro, mantendo-o vocacionado para o estudo pós-
-graduado. As principais alterações foram as seguintes:
• atualizou-se a bibliografia e as notas com algumas fontes valiosas entretanto
publicadas e com uma ou outra clássica e fizeram-se pequenas atualiza ções do
texto, no sentido de o tornar mais claro;

• na unidade 2, introduziu-se uma nova secção, sobre ferramentas metacognitivas


para a investigaçã o;

© Universidade Aberta 14
Nota à edição

• na unidade 3, deu-se maior relevância à chamada literatura cinzenta, no


contexto da pesquisa documental;

• na unidade 4, introduziu-se a imagem da janela de Johari, já anteriormente


descrita no texto;

• na unidade 5, inseriu-se um exemplo de escala, a fim de clarificar a exposição.


Na Parte II de Aprofundamento Temático atualizámos em todas as unidades as leituras
complementares e procedemos à revisão do texto.

As mais importantes alterações dizem respeito à unidade 11, cujo título foi alterado,
atendendo a que se deu um maior desenvolvimento à apresentação do projeto e do
relatório de investigação.

Na bibliografia geral foram também introduzidas novas obras que julgamos relevantes para
a investigação de temáticas específicas abordadas na segunda parte deste manual.

Esperamos que o manual continue a ser útil tanto aos estudantes em regime presencial
como aos de ensino a distância. A todos, os autores querem expressar o seu agradecimento
pelas sugestões e incentivos que têm tido ao longo destes dez anos.

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AGRADECIMENTOS

Nenhuma obra nasce de geração espontânea. Em regra, resulta da acumulação de trabalho


de muita gente, de que o autor é face visível.

Para a efetivaçã o deste Guia, os autores não foram exceção, sendo várias as pessoas
que indireta ou diretamente contribuíram muitas vezes sem o saber. Em particular
queremos agradecer aos que nos apoiaram mais de perto com o seu estímulo e com o
seu trabalho:

À Professora Doutora Maria Beatriz Rocha Trindade que nos incentivou a elaborá-lo, com
características que possibilitassem o estudo em situação de Ensino Aberto e a Distância
para estudantes de Mestrados em Rela ções Interculturais, quer lecionados na Universidade
Aberta quer nas diversas Instituições de Ensino Superior da rede ERASMUS de que esta
Universidade faz parte. Para além do estímulo que sempre nos deu, devemos-lhe a
laboriosa revisão final.

Também queremos expressar a nossa gratidão pelo trabalho de revisão de partes do texto
à s Mestres Margarida Carmo, Paula Coelho, Una Morgado e Isabel Barros Dias.

Às Dr.as Carolina Cunha e Madalena Carvalho devemos o apoio bibliográ fico e a localiza ção
de algumas obras de Metodologia na rede dos Centros de Apoio da Universidade
Aberta.

Finalmente, os autores querem expressar o seu profundo agradecimento à Mestre


Fátima Silva, pelo modo profissional e civicamente empenhado com que acompanhou a
produção desta edição em e-book. Sem ela o produto final não poderia ter a qualidade
que julgamos possuir.

© Universidade Aberta 16
UNIDADE 1 - INTRODUÇÃO

Sumário

Objetivos da unidade

1. CONTEXTO E JUSTIFICAÇÃO

2. PR É- REQUISITOS E OBJETIVOS DO SEMIN ÁRIO E DO GUIA

3. REGIMES DE TRABALHO

4. APRESENTA ÇÃ O GENÉ RICA DO PROGRAMA E DA BIBLIOGRAFIA

5. SISTEMA DE AVALIAÇÃO

6. RECOMENDAÇÕES PARA AUTOAPRENDIZAGEM

Início da aprendizagem

Planeamento e organiza ção da aprendizagem


Manter um ritmo de estudo

Tirar partido dos recursos disponíveis

Regras de comunicaçã o

Objetivos da unidade

No final desta unidade o estudante deverá estar apto a :


1. distinguir três fases de aprendizagem da metodologia da investiga ção no ensino
superior;

2. identificar os pré requisitos do seminário (e do guia) )

3. identificar o objetivo geral do seminário (e do guia) )

4. identificar os objetivos específicos do seminário (e do guia) )

5. reconhecer os dois diferentes regimes de trabalho em que esta unidade letiva pode
ser aprendida;

6. enunciar os principais pontos do programa;

7. explicitar o sistema de avaliaçã o adotado;

8. reconhecer diversos procedimentos destinados a melhorar a qualidade da


aprendizagem.

© Universidade Aberta 17
Unidade 1 - Introdução

1. CONTEXTO E JUSTIFICAÇÃO

A aprendizagem da metodologia da investigação no ensino superior requer do estudante


uma caminhada por etapas, à semelhança duma escada que se sobe.

O primeiro degrau corresponde à apropria ção de instrumentos teóricos e metodológicos


básicos que lhe permitam uma autonomia cada vez maior no seu processo de aprendizagem
relativamente ao currículo do curso e ao magistério dos professores que o lecionam. Nesta
primeira etapa, o estudante deve começar por aprender os procedimentos bá sicos
que a comunidade académica em geral utiliza para recolher, tratar, interpretar e
difundir informaçã o científica considerada relevante.

Após este primeiro degrau propedêutico em que vai aprender a estudar melhor e a
expressar adequadamente os resultados desse estudo, está em condições de começar
a aprofundar as estratégias e tá ticas de captura do saber praticadas na área
disciplinar em que pretendeu especializar-se. Esta segunda fase culmina com a aquisição
do grau académico de licenciado1 que, de acordo com Adriano Moreira, é o grau que
confere licença para estudar sozinho.

Num curso de pós- gradua ção, conducente à obtenção do grau de Mestre,o processo
de autonomiza ção tem de ser ainda maior de modo a permitir que o estudante,
ao fim dos dois anos regulamentares, produza uma dissertação em que demonstre, não
só, conhecimentos aprofundados numa dada área do Saber, mas também um domínio
claro dos procedimentos metodológicos. Foi neste terceiro contexto que nasceu o
Seminário sobre Metodologia da Investigação, no elenco curricular do Mestrado em
Relações Interculturais da Universidade Aberta a pedido dos seus próprios estudantes.

Tendo começ ado como unidade didática extracurricular nos dois primeiros anos de
funcionamento, foi integrado no programa do curso de pós-gradua ção a partir de 1994/95.
Como qualquer unidade curricular dos vários mestrados da Universidade Aberta, este
seminário foi ministrado em regime presencial até 2006/ 2007,tendo sido lecionado em
Lisboa, Porto e Macau. Desde 1996/97, parte do primeiro bloco foi lecionada para o
Porto através de videoconferência, com uma taxa de sucesso semelhante à que ocorreu
no grupo que teve apoio presencial. Com a aplicaçã o do novo modelo pedagógico da
Universidade Aberta e, no contexto da adequaçã o do curso à estratégia de Bolonha, esta
unidade curricular passou a ser também oferecida online.

1 Oii o seu equivalente Diploma de Estudos Superiores Especializados ( DESE).

© Universidade Aberta 18
Unidade 1- Introdução

No sentido de tornar os estudantes cada vez mais autónomos neste domínio e de


possibilitar a muitos que tinham dificuldade de se deslocar às aulas um instrumento de
trabalho que permitisse a sua autoaprendizagem, a Diretora do Mestrado propôs aos
autores que concebessem um Guia com uma estratégia andragógica2 para ensino a
distância. É esse o principal desígnio deste manual.

2. PRÉ-REQUISITOS E OBJETIVOS DO SEMINÁRIO E DO GUIA

Por se tratar de um seminário inserido num curso de mestrado é exigível, como pré-
- requ í sito, uma preparação prévia no domínio da metodologia geral de investigação,
já adquirida nos curricula da formação inicial. Neste contexto, é conveniente o estudante
ler uma obra geral de metodologia da investigação em Ciências Sociais a fim de reavivar
o que aprendeu3.

0 seminário e, por consequência, o guia, estão organizados em três blocos atrav és dos
quais se procurará, num processo de aprofundamento temático em espiral, atingir o seu
objetivo geral que pode ser assim enunciado: no final dos três blocos, o mestrando
deve ser capaz de elaborar o anteprojeto da sua disserta ção de mestrado. Para
atingir o objetivo geral, o estudante deverá atingir três objetivos espec í ficos:
• no final do primeiro bloco, o mestrando adquire noções gerais sobre
planeamento de um projeto de investiga ção, recolha de dados e apresentação
dos resultados. (Ótica dominante: panorâmica);

• no final do segundo bloco, o mestrando interioriza conhecimentos


e técnicas especí ficas orientadas para a pesquisa que irá desenvolver.
(Ótica dominante: aprofundamento temático, nomeadamente nos campos do
tratamento e aná lise de dados);

2
O conceito de andragogia (etimológicamente educação do homem por contraposição ao
de pedagogia que significa educação da criança) chama a atenção para a especificidade
da metodologia da educa ção de adultos. Este termo foi vulgarizado ao longo dos anos
sessenta, sobretudo a partir da obra de Knowles, Malcolm S. (1980), The modern practice
of adult education. From pedagogy to andragogy, New York, Cambridge, The Adult
Education Company.
3
Há diversas obras com estas características na Bibliografia recomendada. Eis um exemplo duma
particularmente acessível quer no estilo quer na dimensão: Quivy, Raymond e Campenhoudt,
Luc Van ( 1992), Manual de investiga ção em Ciências Sociais, Lisboa, Gradiva.

© Universidade Aberta 19
Unidade 1 - Introdução

• no final do terceiro bloco, o mestrando concebe um anteprojeto de


disserta ção. (Ótica dominante: aplicação num caso concreto)-.

3. REGIMES DE TRABALHO E PROGRAMA

Os conteúdos deste manual podem ser lecionados em regime presencial, misto ou


online. No primeiro caso, poderá ainda decorrer em regime de presença física ou virtual
(por videoconferência). No segundo, os dois primeiros blocos serão feitos recorrendo
à plataforma de e-learning; o último bloco consistirá na apresentação e discussão dos
trabalhos, feita em modo presencial, através de vídeo (ou áudio) conferência, ou ainda
pela introduçã o de um dispositivo comunicacional adequado, síncrono ou assíncrono, na
plataforma.

O programa do seminário é o que consta no índice deste guia.

4. SISTEMA DE AVALIAÇÃO

Tanto para os estudantes do regime presencial como para os que desenvolverem a sua
aprendizagem em regime de ensino a distância, a avaliação final do seminário poderá ser
baseada nos seguintes elementos:
• Para o bloco I: recensão de uma obra geral de metodologia das Ciências
Sociais (máximo de 5 pá ginas datilografadas a espaço e meio).

• Para o bloco II: recensão de dois artigos em que se relatem trabalhos de


investigaçã o e onde seja indicada a metodologia utilizada (máximo de 10 páginas
datilografadas a espaço e meio, 5 para cada artigo).

• Para o bloco III: anteprojeto de dissertação ( apresentação oral - máximo de


10 minutos - e trabalho escrito, este com uma dimensão má xima de 10 pá ginas
datilografadas a espaço e meio)

• Participação nas aulas ou na plataforma de e-learning.

A classifica ção final em cada m ódulo poderá ser expressa sob diversas formas, de acordo
com a regulamentação vigente e no quadro normativo de Bolonha .

4
Não é obrigatório que o anteprojeto apresentado no seminário seja o anteprojeto da dissertação.
Sendo desejá vel que o seja, de modo a potenciar o conhecimento acumulado e a não dispersar
energias do mestrando, admite-se que este possa mais tarde, de comum acordo com o seu
orientador, conceber um projeto de dissertação diferente. Para a equipa docente do seminário
o anteprojeto funciona como um exercício de simulação.

© Universidade Aberta 20
Unidade 1- Introdução

5. RECOMENDAÇÕES PARA AUTOAPRENDIZAGEM

Para o estudante que vai trabalhar em regime de ensino online, vale a pena salientar
alguns procedimentos que podem melhorar a qualidade da sua aprendizagem. A sua
experiência como estudante de ensino presencial pode vir a ser-lhe extremamente útil, se
souber tirar partido dela. Sugerimos-lhe, no entanto, algumas alterações do seu método
de trabalho, a fim de poder tirar partido de algumas vantagens que o ensino a distância
tem e minimizar as suas limitações.

As recomendações que se seguem não pretendem ser exaustivas. O intuito é fornecer-lhe


pistas práticas para poder ter mais êxito no seu programa de aprendizagem. Pedimos-
-Ihe, por isso, que assim como lhe estamos a dar estas sugestões, partilhe connosco a
sua experiência, as suas dificuldades e os seus êxitos, que decerto virã o a ajudar outros
estudantes a organizarem melhor a sua aprendizagem.

Vejamos então alguns padrões de atuação que se têm revelado corretos.

Início da aprendizagem
Antes de mais, sugerimos-lhe a leitura cuidadosa da informação sobre o mestrado que
lhe poderá servir de orientação geral no que respeita ao seu relacionamento com os
serviços da Universidade.

No módulo de ambientação, procure tirar todas as dúvidas em relação ao uso da


plataforma. Esse módulo serve justamente para o ( a) ajudar a usar essa ferramenta com
naturalidade.

Como acima foi referido, esta unidade curricular exige, para que o estudante ou formando
tenha bons resultados, a atualizaçã o de alguns conhecimentos prévios que servirão
como ponto de partida para a aprendizagem. Sugere-se, por isso, que se aconselhe
junto da equipa docente sempre que sinta dificuldades na sua progressão, a fim de ser
orientado(a) a tempo em estratégias de reciclagem. Este procedimento é extremamente
importante uma vez que a formação inicial dos estudantes num mestrado (e neste em
particular) é muito heterogénea.

Planeamento e organiza çã o da aprendizagem


H á toda a conveniência em elaborar um horá rio de trabalho semanal. Para o
planeamento do seu trabalho, deverá contar com tempo para a realização das seguintes
tarefas:
• estudar o manual;

© Universidade Aberta 21
Unidade 1- Introdução

• elaborar um dossier com as atividades propostas; se o fizer exaustivamente o


seu anteprojeto de dissertação construir-se-á naturalmente quase sem dar por
isso;

• responder aos testes formativos insertos no final de cada capítulo e corrigi-los;


• consultar a bibliografia recomendada;
• consultar os professores do seminário sempre que sinta necessidade de tirar
dúvidas no espa ço próprio da plataforma;

• realizar as atividades propostas para cada tópico no tempo previsto.


Manter um ritmo de estudo
Uma vez iniciado o seu estudo, faça o possível por seguir o plano proposto pela equipa
docente. A experiência tem mostrado que a manutençã o dum ritmo de trabalho regular
permite uma melhor aprendizagem.

Tirar partido dos recursos disponí veis


Uma das limitações que tem sido apontada ao ensino a distância é a de ser um sistema
de aprendizagem solitário. Este problema foi solucionado no modelo pedagógico da UAb,
proporcionando-lhe três tipos de intera çã o que deverá explorar exaustiva mente:
• Interação com os materiais disponíveis na plataforma, aos quais deverá
acrescentar elementos de estudo pessoal, recorrendo à Internet e a
materiais em suporte scriptoe audiovisual.

• Interação com a equipa docente, procurando responder aos seus desafios e


tomando a iniciativa de a questionar sempre que sinta necessidade.

• Interação com os seus colegas, de modo a transformarem o grupo de


aprendizagem numa verdadeira equipa. A experiência online dos últimos
anos tem mostrado que a prática colaborativa em contexto letivo tem levado
muitos grupos a transformarem -se em verdadeiras comunidades de prática,
que perduram muito para além do período de duração da unidade curricular,
tornando-se um valioso suporte para a fase seguinte, em que cada um está a
desenvolver investigação específica.

© Universidade Aberta 22
I. VISÃO PANORÂMICA
HERMANO CARMO

Unidade 2 - 0 projeto de investiga ção em Ciências Sociais

Objetivos da unidade

No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a :


1. identificar e criticar dois mitos típicos de quem começa a desenhar um projeto de
pesquisa, o do terreno virgem e o do tudo já foi estudado;

2. entendera importância prática de alguns valores humanos no processo de produção


científica, nomeadamente a humildade intelectual, a autocompetitividade, a
curiosidade e o espírito de coopera ção;

3. definir estratégias de captura de um saber preliminar, suscetível de tra çar as


fronteiras do objeto de estudo e a explicitação de objetivos para a investigação
nomeadamente no que respeita à análise crítica da teoria e da produçã o empírica
existente;

4. estabelecer critérios de seleção de informaçã o que lhe permitam evitar situações


de sobreinformação, de subinformação e de pseudoinforma ção;

5. identificar algumas importantes razoes que levam a considerar o tempo como


variá vel estratégica no processo de investigaçã o;

6. listar, articular e calendarizar as diversas fases e tarefas que integram uma


investigação;

7. identificar três tipos de erro que dificultam a delimitação do objeto de estudo e


as correspondentes estratégias de prevenção;

8. caracterizar e discutir alguns critérios, para além da pertinência científica, que


permitem chegar a um objeto de estudo;

9. distinguir os estudos exploratórios dos sociográ ficos e dos verificadores de


hipóteses causais;

10. desenhar brevemente um programa para a sua pesquisa e o correspondente


cronograma;
11. identificar os recursos necessários à realiza ção de uma dissertação;

12. usar algumas ferramentas metacognitivas para a investiga ção.

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I. Visão Panorâmica

1. DUAS QUESTÕES PRÉ VIAS

Independentemente do tipo de investigação a realizar, existem duas questões de grande


importância que exigem a atenção de quem pretende desenvolver um projeto:
• a questã o da informação disponível e
• a questã o da gestão do tempo

1.1. A questã o da informa ção disponí vel

Duas atitudes típicas e ingénuas que se observam em estudantes de Mestrado no


momento em que são confrontados com a necessidade de produzir uma dissertação final
são a de que o terreno que v ão explorar é completamente virgem ou, pelo contrário,
que já se escreveu tudo sobre determinado assunto. Ambas as posições sã o apriorísticas
necessitando de desmontagem.

A primeira denota, habitualmente, que o estudante ainda não fez um estudo exploratório
sobre o tema em questão, encontrando-se fascinado por uma área que acabou de descobrir
ou pela qual manifesta interesse já há algum tempo sem no entanto a ter trabalhado com
intuito científico. Perante esta atitude, dois objetivos devem ser atingidos pelo estudante,
tão depressa quanto possível:
• adquirir uma atitude adequada perante o estudo que vai desenvolver;
• proceder a uma recolha preliminar de informação que lhe permita ter uma
primeira ideia acerca dos diversos contributos existentes sobre o assunto.

Uma atitude de recordista


Em termos de atitudes, é indispensá vel combater a arrogância de quem pensa que
descobriu caminhos nunca dantes trilhados e que pode iniciá- los sem a ajuda de ninguém.
Frequentemente este modo individualista de encarar o processo de investigação conduz a
situa ções sem saída, pois quem se posiciona deste modo competitivo face à comunidade
científica semeia desconfianças e atitudes da mesma natureza, que se revelam altamente
ineficientes e ineficazes. Ineficientes porque, para atingir os objetivos de investiga ção,
o estudante será obrigado a contar apenas com os seus recursos gastando muito mais
energias que se o fizesse contando com a cooperação de colegas e professores. Ineficazes
porque, dispondo de menos meios, mais dificilmente atingirá as metas que se havia
proposto alcanç ar.

A experiência tem demonstrado que a única competição desejável num processo de


pesquisa é aquela que o investigador tem consigo mesmo, numa postura de recordista de
alta competição. Adquirir mais conhecimentos ou desenvolver melhor as suas estratégias

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I. Visão Panorâ mica

de apreensão de conhecimentos sã o deste modo, desígnios mais interessantes e positivos


que simplesmente querer fazer melhor que os outros.

Esta atitude de recordista implica, antes de mais, uma curiosidade nunca satisfeita
traduzida numa motivação sempre realimentada para aprender com os outros - comunidade
académica, informadores qualificados e população-alvo da investigação - com as diversas
fontes de informação e com a realidade em geral.

Implica, por outro lado, uma postura de sá bia humildade intelectual, corolário da
curiosidade, que permite capturar informa ção pertinente em fontes menos habituais,
como em certa literatura não legitimada pela comunidade científica1ou em interlocutores
não académicos.2

Permite, finalmente, a constituição progressiva de redes de coopera çã o no seio da


comunidade científica e entre esta e outros interessados - pessoas e instituições - pelo
maior aprofundamento do saber na área em questão.

Atividade 2.1
Descreva em tópicos (não mais de meia página A4), as características que melhor
o(a) definem face ao conhecimento: arrogante, tímido(a), curioso(a), humilde,
competitivo(a) ? Dê exemplos que ilustrem o seu autorretrato. Seguidamente
confronte a sua reflexão com colegas ou professores e peç a - lhes que critiquem
o seu trabalho.

Recolha preliminar de informa ção


Uma vez possuidor de uma correta atitude face ao conhecimento e à comunidade dos
que o procuram, o investigador deve proceder a uma recolha preliminar de informação
que lhe permita fazer uma primeira ideia acerca dos diversos contributos já disponíveis
sobre o assunto.

Em primeiro lugar, há que procurar colher elementos sobre as teorias existentes. Temos
observado, com frequência, uma atitude de reserva face à teoria, considerando-a algo

1
A bibliografia e a videografia de ficção podem ser excelentes fontes de informação e de
hipóteses científicas. A Cidade da Alegria de Lapierre, sobre o quotidiano de comunidades
abaixo do limiar de pobreza absoluta, Os Capitães da Areia de Jorge Amado, que relata as
estratégias de sobrevivência das crianças de rua baianas, ou O Pixote, filme brasileiro que
retrata magistralmente uma subcultura de pobreza, são exemplos de boas fontes de informação
não ortodoxas.
2
Os antropólogos há muito contam com informadores, muitos sem quaisquer habilitações
académicas que, no entanto, se revelam indispensáveis como fontes de informação de alta
qualidade.

© Universidade Aberta 25
I. Visão Panorâ mica

de esotérico, sem qualquer utilidade prática para o exercício do trabalho empírico.


Reconhecendo fundamento em certas críticas, uma vez que algumas autodesignadas
teorias não passam de especulações doutrinárias concebidas por vezes sem a prova
do confronto com o real, nunca é demais salientar a enorme economia de informação
sistematizada numa boa teoria, o que permite ao investigador gerir melhor os seus recursos
e orientar as suas estratégias de pesquisa. Uma boa teoria funciona como bússola, não
como espartilho, de qualquer processo de investigação.

Em segundo lugar, há que indagar que pesquisa tem sido feita no domínio em questão
e com que métodos foi desenvolvida. Para isso, revela -se de grande utilidade o recurso
a bases de dados com informaçã o indexada sobre monografias e artigos, na sua versão
integral ou em formato resumido, assim como a realização de diversas entrevistas
exploratórias a especialistas.

A aná lise crítica dos métodos adotados em investigações anteriores é particularmente útil
pois permite-nos fazer uma ideia sobre a fiabilidade dos seus resultados. Tal análise não
deve ceder a seguidismos de modas académicas. A comunidade científica é constituída
por gente mortal e imperfeita (ainda que nem sempre haja consciência disso) e como tal,
também os académicos - cientistas e professores - estão sujeitos à pressão de modas.
Para ilustrar isto bastará recordar três obsessões frequentes cuja prática indiscriminada
pode levar a erros metodológicos:
• a obsessão pelo mais recente,o que nem sempre conduz a resultados satisfatórios
uma vez que se perde informação de boas fontes clássicas ignorando que nem
sempre o antigo é antiquado assim como nem sempre o moderno é inovador;

• a obsessão pelo quantitativo, que decorre da mitificação de toda a informação


que integra números, considerando como não científica qualquer investigação
de outra natureza; tal moda tem conduzido por vezes a autênticas aberrações
analíticas uma vez que pressupõe como certas informações completamente
deformadas na origemâ; e

• a obsessão pelo qualitativo, tendência inversa atualmente muito em voga de que


tem resultado, por vezes, trabalhos especulativos com alguma falta de rigor.

3
Sobre isto, vale a pena ler o excelente artigo de Fúlvia Rosemberg sobre os dados deformados
acerca da dimensão do fenómeno crianças de rua na América Latina: ROSEMBERG (1994), A
.
Ret órica Sobre a Crianç a de Rua na Década de 80, in Medina e Greco (orgs ), Saber
-
plural, S. Paulo, ECA/ CJE/ CNPq, pp. 135 136.

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I. Visão Panorâ mica

Atividade 2.2
Elabore uma lista de leituras e contactos a fazer para a elaboração de um pré-
-estudo exploratório sobre um tema que lhe pareça interessante como dissertação
de mestrado.
Uma vez feito esse trabalho, proceda a uma primeira recolha de dados.
Seguidamente, tente escrever as suas intenções de pesquisa com fundamento
no estudo que iniciou (má ximo uma pá gina A4). Dê a ler a colegas e submeta-
-se à sua crítica sem receio. Tentem em conjunto responder a duas questões: O
texto está claro ? Está rigoroso?

Já se escreveu tudo sobre determinado assunto ? -

No final desta fase, o investigador que pensava estar a entrar em terreno virgem, pode
ficar com a ideia oposta, altamente desanimadora, de que tudo já se escreveu sobre o
assunto. Esta sensação angustiante e vertiginosa é típica de quem desenvolve investigação
na nossa época.Com efeito, o primeiro sentimento que nos assalta quando pretendemos
entender o Mundo em que vivemos, é a perplexidade perante a transitoriedade, a
novidade e a diversidade com que a vida social se nos apresenta, configurando um quadro
desconhecido, por vezes mesmo assustador.

Margaret Mead, já em 1969, intuía o que hoje vivemos, utilizando a imagem dos imigrantes
no tempo5:
hoje em dia, todos os que nasceram e foram criados antes da segunda grande guer ¬

ra são imigrantes no tempo - como os seus antepassados o foram no espaço - que


lutam para apanhar as condições estranhas da vida numa nova era. Como todos os
imigrantes e pioneiros, estes imigrantes no tempo são portadores de culturas mais
. . ...
antigas A diferença hoje é que eles representam todas as culturas do mundo ( )
Quem quer que sejam, estes imigrantes cresceram em céus através dos quais nunca
brilhou nenhum satélite. (...) Neste sentido, portanto, de nos termos mudado para
um presente para o qual nenhum de nós estava preparado {...), deixámos os nossos
mundos familiares para vivermos numa época em condições que são diferentes de
qualquer das outras que nós já conhecíamos.

4
.
O texto que se segue foi apresentado originalmente em CARMO, H ( 1996), Ensino Superior
a Distâ ncia. Contexto Mundial. Modelos Ibéricos, Lisboa, Universidade Aberta, cap 1, .
ponto 0.
5
MEAD, Margaret (1969), O Conflito de Gerações, D. Quixote, Lisboa, pag . 133 e sgs.

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Com o mesmo olhar perplexo, Edgar Morin, defendia há poucos anos que estamos a
entrar na Idade do Ferro Planetária6, em que o Homem tem cada vez mais consciência
da mundialíza ção, a qual, no entanto, é convulsiva e dilacerada pelas contradições que
a integram:

somos obrigados a considerar que ainda estamos na pré-história do espírito humano


.
e que não saímos da idade de ferro planetária Estamos numa era agónica, de morte
e nascimento, onde, como nunca até hoje, as ameaças convergem sobre o planeta,
a sua biosfera, os seus seres humanos, as nossas culturas, a nossa civilização. O
mais trágico, ou cómico, é que todas estas novas ameaças (desastres ecológicos,
aniquilamento nuclear, manipulações tecnocientíficas, etc.) provêm dos próprios
desenvolvimentos da nossa civilização'-.

Perante este quadro, o investigador social do nosso tempo, confronta -se com o tremendo
desafio de tentar descrever uma realidade social complexa e em vertiginosa mudanç a,
de que ele próprio faz parte, com instrumentos toscos, tais como os dos nossos avós,
da Idade do Ferro.

O nevoeiro informacional
Para complicar um pouco mais o seu trabalho de cartógrafo da sociedade contemporânea,
confronta -se com frequência, com aquilo a que Morín chamou "nevoeiro informacional"2,
que se traduz num conjunto de três tipos de filtros que o impedem de visibilizar
convenientemente a sociedade que pretende estudar:
• Ao primeiro, chama Morin sobreinforma çã o, que se traduz no excesso de
informações em que é imerso no seu quotidiano profissional. Ilustremos este
fenómeno apenas com um exemplo: o crescimento exponencial do número
de livros e de revistas científicas, de jornais, de abstracts e de abstracts de
abstracts, que alguns autores consideram haver-se multiplicado por dez em
cada cinquenta anos, faz com que "seja cada vez menos possível ao cientista
ter um conhecimento completo da literatura publicada, já não no domínio global

6
De acordo com Morin, com a expansão europeia iniciada no séc. XV, inicia-se a era planetária,
em que o fenómeno da mundialízação se expande progressivamente gerando-se uma cada
vez maior integração dos subsistemas do planeta. MORIN, E. et.al. (1991), A Idade de Ferro
Planetária , in Os Problemas do Fim de Século, Editorial Notícias, Lisboa, pag. 17 e sgs.
7
. .
MORIN, Edgar ( 1991), op cit, pag 22. .
8
MORIN, Edgar (1981), As Grandes Questões do Nosso Tempo, Editorial Notícias, Lisboa,
. .
pag 19 e sgs Outros autores têm chamado a atenção para esta questão da falta de transparência
.
da sociedade contemporânea Pierre Rosanvallon, por exemplo, defende que o desenvolvimento
da visibilidade social é uma das quatro estratégias indispensáveis à ultrapassagem da crise do
Estado Providência. ROSANVALLON, P. (1984), A Crise do Estado Provid ência, Inquérito,
Lisboa .

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I. Visão Panorâ mica

da ciência, (...) mas, muito mais dramaticamente, sequer no do seu ramo


especializado de investigação' -.

•A par da sobreinformação, o cientista social confronta -se muitas vezes com


o problema aparentemente contraditório, da subinformaçã o, semelhante
ao dos cartógrafos do século XIX que, para não fantasiarem os seus mapas,
tinham que representar espa ços imensos a branco. Com efeito, dada a rapidez
com que a sociedade contemporânea muda, bem como pela sua complexidade
crescente, o cientista social, confronta -se muitas vezes com uma substancial
falta de informaçã o sobre o seu objeto de estudo. Exemplo de subinformação,
foi a reação de perplexidade geral e até de indignação de alguns decisores
políticos quando, em 1985, foram divulgados os primeiros resultados do estudo
sobre a pobreza em Portugal, que concluía que 35% das famílias portuguesas
se encontravam abaixo da linha de pobreza absoluta1®. Para além da resposta
política de quem sentiu a crueza dos resultados daquele estudo como um
julgamento à sua política social, o que tal reação pareceu demonstrar foi a
ignorância dos vários atores sociais sobre o fenómeno.

• O terceiro filtro com que o investigador se defronta, é o da pseudoinforma ção,


ou seja, o conjunto de informação, deliberada ou involuntariamente deformada,
ou mesmo falseada, sobre a realidade social. São exemplos de pseudoinformação,
as emitidas pelos sistemas de publicidade económica, propaganda política, e
os mecanismos de boato. Mas também o são, muitas vezes, as informações
produzidas pelos mass media e as que legitimam certas representações
coletivas.

O quadro que se acaba de descrever, serve para explicar que, talvez maior dos problemas
metodológicos com que um investigador se debate ao longo de qualquer processo de
pesquisa, seja o da seleção e gestão da informação disponível obrigando-o a um triplo
esforço para reduzir os efeitos de nevoeiro informacional:
• em primeiro lugar, procurar não se afogar em informação inútil tendo em vista
o objetivo do trabalho;

9
CÂMARA, J. Bettencourt da (1986), A III Revolução Industrial e o Caso Portugu ê s, in
Vários ( 1986), Portugal Face à III Revoluçã o Industrial - Seminário dos 80, ISCSP,
Lisboa, pag. 63 e sgs.
10
.
COSTA, A Bruto da; SILVA, Manuela; et al (1985), A Pobreza em Portugal, Caritas, Lisboa.
Estudos publicados mais recentemente, já não tiveram a mesma reação uma vez que a
subinformação sobre o fenómeno se havia reduzido. Vide por exemplo, COSTA, A. B.; SILVA
M., et al (1989), Pobreza Urbana em Portugal, Caritas, Lisboa; e, SILVA, M. (1991), A
Pobreza Infantil em Portugal, Comité Português para a UNICEF, Lisboa.

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I. Visão Panorâ mica

• em segundo lugar, tentar explorar os espaços de subinformação, através do


cruzamento de técnicas diversas;

• finalmente, tentar reduzir os perigos da pseudoinformação através da análise


contrastiva das fontes.

Atividade 2.3
Submeta o trabalho que iniciou na atividade 2.2, a uma nova crítica interrogando-
-se: o tema escolhido será pertinente? Que tipo de informa ção recolhi até agora ?
Que elementos de nevoeiro informacional encontrei na pesquisa preliminar?
Redundâncias (sobreinformação)? Zonas brancas (subinformação) ? Contradições
(possíveis elementos de pseudoinformação) ?

1.2. A questã o da gestã o do tempo

Sendo o tempo um dos recursos mais escassos que o investigador tem ao seu dispor pois
contrariamente ao desejado no popular fado, o tempo não tem hipóteses de voltar para
trás, é curioso notar a pouca relevância que lhe é conferida quando se está numa fase
preliminar de pesquisa. No entanto ou por razões de natureza legal - caso dos prazos
impostos para a conclusão de mestrados - ou de índole contratual— , a verdade é que o
tempo se tem vindo a posicionar como uma variável estratégica em qualquer processo
de pesquisa . E isto por várias razões de que se salientam três:
• porque o nevoeiro informacional acima referido determina gastos consideráveis
de tempo;

• porque a comunidade académica tem vindo a estabelecer inúmeras pontes com


o mundo não académico, nomeadamente com as empresas, tendo de adaptar-
-se aos seus critérios mais rigorosos de prazos e custos;

• porque o encurtamento do ciclo de vida do saber— não se compadece com ciclos

11
O exemplo típico é o dos prazos apertados com que os investigadores se têm vindo a debater
nos projetos com financiamento externo.
12
O ciclo de vida do saber é o período que decorre entre o seu nascimento e a sua morte
.
por desatualização Tomemos o exemplo do frigorífico: o ciclo de vida do saber que lhe deu
origem começou quando alguém descobriu que se podia transformar eletricidade em frio;
numa segunda fase, alguém percebeu que tal descoberta podia ser usada para a conservação
de alimentos; num terceiro momento, outra pessoa terá concebido um modo de comercializar
ífico; finalmente dir-se-á
a ideia sob a forma de um armá rio estanque a que chamamos frigor
que o ciclo de vida terminou quando se inventar um outro sistema mais prá tico e barato de
conservar alimentos em nossas casas.

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I. Visão Panorâ mica

de pesquisa demasiado longos que conduziriam inevitavelmente à divulgaçã o de


resultados desatualizados à nascença.

Qualquer destas tendências apela claramente para a noção de tempo útil de pesquisa
que se assume como condicionador importante da determinaçã o do objeto de estudo
e da metodologia a adotar. Vejamos um simples exemplo: o limite de um ano para a
apresentação de uma dissertação de mestrado após a conclusão do programa académico
obrigar á provavelmente o mestrando que tinha um particular gosto em estudar a
comunidade indiana em Portugal a restringir o seu estudo à região de Lisboa e o seu foco
de análise a grupos praticantes de religião hinduísta .

Atividade 2.4
A este propósito leia o texto que se segue, e procure responder às questões
que se lhe anexam.
"Um efeito imediato do surgimento da sociedade de informação, foi a aceleração
do metabolismo social, em resultado da compressão do tempo. Com efeito, se
compararmos a diferença temporal dos processos de comunica ção tradicionais
como o correio, com o tempo decorrido entre a emissã o e a receção de um fax
ou de uma mensagem em suporte telemático, facilmente nos aperceberemos
deste fenómeno". (CARMO, 1996, 67-69)
• Em que medida sente que a sociedade de informação já entrou na sua vida
(no seu dia a dia profissional, no seu espaço doméstico, etc.) ?
• Tem ideia de quanta informação teve de assimilar no último mês?

Constituindo uma evidente dificuldade para quem enceta um processo de investigação a


variável Tempo, se respeitada, pode ser transformada em oportunidade pela autodisciplina
a que obriga, podendo assumir-se como um elemento de controlo de qualidade da
investigação e como um acelerador de resultados. Ao condicionar o investigador a alcançar
um má ximo de resultados num mínimo de tempo, chama a atenção para o seu papel
social e para o seu sentido cívico que apela a que não desperdice recursos que não são
seus mas dos financiadores da pesquisa (contribuintes, mecenas, etc.).

Uma boa maneira de começ ar a lidar com a questão do tempo é listar as principais fases
e tarefas de investigação, calcular quanto demorará cada uma delas, como se articulam
entre si (isto é, se a tarefa A antecede necessariamente a tarefa B, sucede a ela ou
podem ser desempenhadas independentemente uma da outra) e encadeá- las de forma
regressiva a partir de um dado momento no futuro que constitui a data limite de conclusão

© Universidade Aberta 31
I. Visão Panorâ mica

da pesquisa. As técnicas de programação, como o PERT e o CPM13 há muito usadas pela


gestão podem ser usadas com grande proveito nesta fase.

Atividade 2.5
Releia as atividades anteriores e registe as respostas às seguintes perguntas
(por esta ordem):
1. até que data tenho de apresentar a minha dissertaçã o de mestrado em
formatação final ?
2. para atingir o objetivo anterior, até que data deverei submeter a minha
versão completamente redigida ao orientador ? (contar com tempo para ele
ler, discutirem e fazer as emendas finais)
3. para atingir o objetivo anterior, até que data deverei concluir a análise dos
dados? (contar com tempo para redigir totalmente o texto do relatório de
pesquisa)
4. para atingir o objetivo anterior, até que data deverei concluir o tratamento
dos dados?
5. para atingir o objetivo anterior, até que data deverei concluir a recolha dos
dados?
6. para atingir o objetivo anterior, até que data deverei concluir o planeamento
da pesquisa?
Provavelmente no momento em que terminou a sua atividade 2.5 o leitor ficou
algo desanimado, uma vez que pode ter chegado à conclusão que não dispõe de
tempo para empreendera pesquisa que ambicionava (ex: a resposta à pergunta
6 situa -se no Passado). Para resolver este problema, aliás muito frequente,
recomendo-lhe os seguintes procedimentos:
• não ignorar a questão; se o fizer apenas irá adiá-la;
• rever cuidadosamente a atividade 2.5 sem encurtar artificialmente o tempo
estimado para cada uma das tarefas, mas procurando observar se pode, no
mesmo período de tempo, desempenhar tarefas diferentes; por exemplo,
será que a redaçã o do relatório final tem de ser feita no fim? nã o poderá
acompanhar todo o processo de investiga ção através de um registo em-
- formato-quase-finaI?
• se se mantiver a situação, ou seja se através desta previsão regressiva de
tempo necessário, chegar à conclusão que, para atingir os objetivos que
se propõe necessitaria de ter começado a investigação anteriormente ao

13
Cfr. por exemplo Belchior (1970).

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momento presente, recomendo-lhe o ato corajoso de aparar o objeto de


estudo.

2. ELEMENTOS PARA O PLANEAMENTO DE UMA INVESTIGAÇÃO

Uma vez feita uma reflexão séria sobre a disponibilidade desses dois recursos indispensáveis
à pesquisa, a informa çã o e o tempo, estamos em condições de continuar a planear o
trabalho que a integrará . Recorde-se que planear é definir rumos e que sem se conhecer
o rumo da pesquisa não se pode dizer que ela venha a alcançar qualquer bom porto.

2.1. Investigar o quê? ( Delimitar o objeto de estudo )

A primeira questão a definir é o que se quer investigar. Tomemos o exemplo anteriormente


referido: a primeira delimitação do objeto de estudo que havia conduzido o mestrando a
eliminar comunidades indianas residentes fora da região de Lisboa e de religião católica e
muçulmana (ismaelita) ainda não é suficiente, uma vez que apenas identifica quem constitui
o objeto de observa ção, não nos diz ainda o que, onde e quando vai investigar.

Em Ciências Sociais a determinação do campo que se vai investigar não deve ser feita ao
acaso ainda que este desempenhe um papel importante. Sugestivamente Raymond Quivy
compara o processo de pesquisa nas Ciências Sociais ao da prospeção petrolífera ( Quivy,
1992: 13), Ninguém de bom senso defende que se façam perfurações indiscriminadamente
no terreno: qualquer perfuração deve ser precedida de um estudo geológico prévio, Do
mesmo modo, mergulhar cegamente num processo de recolha de dados sem delimitar
minimamente o objeto de estudo resulta numa perda de tempo e energias que reduzem
naturalmente as condições objetivas para uma pesquisa bem sucedida.

Na fase inicial da investigação, ainda de acordo com este autor, é extremamente importante
evitar três tipos de erros:
• a gula livresca ou estatística, que nos pode fazer afogar em sobreinformação;
• o desprezo pela disciplina que nos recomenda a prévia conceção de hipóteses
e/ ou de questões-bússola que funcionem como orientadoras da pesquisa,
fazendo-a demorar mais e aumentando a imprevisibilidade dos resultados;

• o gongorismo arrogante de quem considera que quanto mais hermético for o


discurso mais científico será, revelando, sob a capa de pretensa erudição, uma
deficiência de capacidade comunicativa decorrente de frequente imaturidade
cognitiva e afetiva.

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Deste modo, é recomendá vel :


• a precoce constituição de um corpo de perguntas ou de um conjunto de hipóteses
que delimitem com progressiva clareza o objeto de estudo, funcionando como
referências para a posterior definição dos rumos de investiga ção;

•a definição de uma estratégia de recolha de informação orientada por tais


perguntas e hipóteses ainda que deixando algum espaço ao inesperado— ;

• a preocupa çã o, desde o primeiro minuto, com a definição rigorosa mas também


clara das intenções da investigação traduzidas num discurso simples.

A experiência aponta alguns critérios úteis para a definição do objeto de estudo para
além, naturalmente, da sua pertinência científica.

Um primeiro critério, que podemos identificar como critério da familiaridade do objeto de


estudo, mostra-nos que é vantajoso que o trabalho a empreender se enraíze na experiência
anterior do investigador.

Se este critério se desenha de forma natural em mestrados unidisciplinares ou cuja


estrutura curricular é uma extensão lógica ou uma especializa ção da formação inicial,
não emerge de forma tão evidente em programas de pós-graduação interdisciplinares ou
transversais. Neste caso é frequente observar-se nalguns mestrandos, a tendência para
quererem dar saltos demasiado longos dos campos disciplinares onde mergulhava a sua
formação inicial para áreas recém-descobertas na pós-graduação.

Frequentemente, a consequência de tal procedimento é a produçã o de estudos


sincréticos sem suporte teórico e metodológico suficiente. Querer fazer um trabalho
predominantemente sociológico, antropológico ou politológico, abandonando uma
formação original no domínio da linguística ou da literatura, ou pelo contrário, pretender
fazer um estudo no domínio da linguística ou da literatura tendo uma formação inicial
completamente diferente, é desperdiçar capital cognitivo adquirido e arriscar-se a não
ter bons resultados nem num campo nem noutro.

A estratégia mais prudente, tendo em conta a interdisciplinaridade exigida mas também


a exiguidade do tempo disponível, parece decorrer do lanç amento de pontes para áreas
disciplinares menos familiares ao investigador a partir daquela em que se sente melhor
posicionado.

14
De acordo com Peter Drucker, uma das figuras mais importantes da Teoria e da Metodologia da
Gestão, a gestão do facto, do fracasso e do êxito inesperado, constituem uma das principais
fontes de inovação.

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Um segundo critério, o da afetividade, recomenda que a seleção do campo e do tema


específico da investigação deva resultar de uma forte motivação pessoal. Ninguém investiga
bem um assunto de que não gosta. Contrariamente ao que muitos não-investigadores
poderão pensar, a investigação científica tem muito de transpiraçã o e bastante menos
de inspira ção.

Um terceiro critério, que podemos chamar o dos recursos, resulta, mais prosaicamente
da antevisão de facilidades na captura de meios necessários à investigação imaginada.
Perspetivas de acesso a boas fontes (documentais ou vivas), a financiamentos mais
abundantes ou a maiores possibilidades de publicação, podem condicionar fortemente a
pesquisa tanto na delimitação do seu objeto como na definição das suas metas.

Atividade 2.6
Leia um livro que relate como nasceu e se desenvolveu um processo de pesquisa .
Tente sublinhar os critérios que determinaram a escolha do objeto de estudo.
Será vantajoso que desenvolva esta atividade com outros colegas lendo diferentes
obras e partilhando impressões. A título de exemplo aponto-lhe os seguintes
livros:
• Goodfield, June (s/d) Um mundo imaginado, Lisboa, Gradiva, Ia ed. de
1981
• Benedict, Ruth (1972) O crisântemo e a espada, S. Paulo, Editora Perspectiva,
(1° capítulo apenas)
• Silva, Agostinho da (1989) Vida de Pasteur, Lisboa, Ulmeiro
• Wallace, Irving (s/d), As três sereias11, Lisboa, Portugália Editora.

2.2. Definir o objetivo da pesquisa

Uma vez delimitado o objeto de estudo, há que definir claramente que meta ou metas
quer o investigador alcançar. Pretende-se fazer um levantamento de dada situação num
campo ainda pouco estudado a fim de vir a levantar hipóteses de investigação futura ?
Tem-se em vista retratar uma realidade social determinada com intuitos essencialmente
descritivos a fim de entender a estrutura e a dinâmica dessa realidade? O objetivo é
verificar uma dada hipótese? De acordo com as opções feitas quanto aos objetivos, Selttiz,
Jahoda, Deutch e Cook (1967) classificam os estudos em três tipos:

15
Apesar de se tratar de um livro de ficção, esta obra ilustra de forma bem documentada como se
desenrolam certas investigações antropológicas no terreno desmistificando de forma notável a
figura do cientista e problematizando brilhantemente a questão da relação entre investigador
e objeto de estudo .

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• estudos exploratórios cujo objetivo é, como o nome indica, proceder ao


reconhecimento de uma dada realidade pouco ou deficientemente estudada e
levantar hipóteses de entendimento dessa realidade;

• estudos sociográficos ou descritivos, em que a intenção é descrever


rigorosa e claramente um dado objeto de estudo na sua estrutura e no seu
funcionamento14;

• estudos verificadores de hipóteses causais, que partem de hipóteses para


a sua verificação.

É importante denunciar o preconceito frequente de quem menos familiarizado com a


Metodologia das Ciências Sociais tende a considerar apenas como científicos os estudos
verificadores de hipóteses causais, desprezando os outros dois tipos. Este preconceito,
provavelmente decorrente de uma atitude seguidista face ao modo de abordar a realidade
habitual em ciências com forte componente experimental, ignora que sem trabalhos
pioneiros de índole exploratória e sem estudos prévios de natureza sociográ fica os estudos
verificadores de hipóteses não passariam de meras especulações doutrinárias.

Um exemplo disto é o que se passou na História da Antropologia: para que a teoria


antropológica amadurecesse foi preciso que muitos estudos de natureza etnográ fica fossem
realizados por missionários, viajantes administradores coloniais e também, naturalmente,
antropólogos. Em resumo, são os estudos de natureza exploratória e sociográfica que
criam terreno propício à realização de trabalhos de verificação de hipóteses pela massa
crítica de informação que coligem. Os três tipos de trabalho têm pois igual estatuto de
cientificidade.

Atividade 2.7
Observe os três objetivos seguintes:
A. Verificar a seguinte afirma ção: o comportamento intolerante dos skinheads
resulta mais da socializaçã o familiar, do que de grupos de pares ou da TV.
B. Identificar hipóteses de explicação para o sucesso escolar das crianças de
minoria chinesa em Portugal.
C. Descrever as estratégias de integra ção social dos jovens ativistas timorenses
após chegarem a Portugal via embaixadas de países amigos.
Classifique estes três objetivos de acordo com a tipologia de Selltiz.
Em meia pá gina tente identificar o objetivo que quer atingir na sua disserta ção.
Identifique-o de acordo com a tipologia referida. Operacionalize-o sob a forma

16
Situam-se neste tipo os estudos de natureza monográfica .

© Universidade Aberta 36
I. Visão Panorâ mica

de uma intenção (exemplos B e C), de uma hipótese (exemplo A) ou de uma


interrogação (o exemplo B podia ser formulado do seguinte modo: que razões
explicam que, em Portugal, as crianç as de minoria chinesa tenham melhor
aproveitamento escolar que as da maioria de origem europeia?).
Seguidamente, desmultiplique esse objetivo geral em metas cada vez mais
concretas.

2.3. Programar a pesquisa

Uma vez definido o objetivo ou objetivos da investiga ção há que desmultiplicá - lo(s) até
à sua concretização em tarefas precisas, bem definidas, articuladas e calendarizadas.
Vejamos algumas questões a responder nesta fase12:
• em função da árvore de objetivos definida e operacionalizada em variáveis e
indicadores,

• que técnicas de recolha de dados vou utilizar: pesquisa documental, observação,


inquérito por entrevista ou por questionário, escalas de atitudes?

• como tenciono tratar e interpretar os dados: que estratégia adotar, sobretudo


quantitativa ou qualitativa?

• que modelo de análise utilizarei e com que elementos?


• que estratégia vou usar para difundir os meus resultados?
• apenas o discurso scriptol
• usarei gráficos? tabelas? diagramas? audiovisuais? software educativo? de que
tipo?

• como situar cada uma das tarefas no tempo?


Atividade 2.8
• Elabore um resumo de programa de trabalho para a sua dissertação, de
acordo com os tópicos acima indicados

• Esboce o cronograma correspondente (Cfr. a figura 2.1 que apresenta um


exemplo de cronograma possível)

17
Cada questão deve ser operacionalizada desmuitiplicando as perguntas de acordo com a
clá ssica proposta de Lasswell: o quê, quando, onde, quanto, como e porquê .

© Universidade Aberta 37
1. Visão Panor â mica

Maturação Teórica [
Proposta Initial
I1
I.
:r ::Jh [nt |
Aprovação pelo C, Cientifico

Estudo Exploratório

1 Trabalho de Campo (Galiza )


°

D
jD
2° Trabalho de Campo ( Extremadura)

3o Trabalho de Campo ( Madrid )

Trabalho de Campo UAb

Redação

Fim da Ia versão

( •) N D J F M A M J j A S 0 N D J F M A M J J A S 0 N D J F M A M J J A 5 0 N D J F

1372 /90 1991 19$ Z 1993 E 994

: Preparação

j R ealização

Figura 2 , 1 - Cronograma de uma pesquisa (Carmo, 1995 )

© Universidade Aberta 38
I. Visão Panorâ mica

2.4 . Identificar e articular os recursos necessários

Seguidamente há que identificar e articular os recursos necessários ao suporte da


investigação. Cortrariamente ao que se possa pensar a tarefa de identificar recursos exige
bastante imaginação. Como refere Drucker (1986) um recurso é algo para que descobrimos
uma dada utilidade. O petróleo, antes de ser percecionado como um recurso indispensá vel
à economia mundial, foi considerado um líquido peganhento e malcheiroso que estragava
a agricultura. Muitas plantas medicinais foram mondadas como ervas daninhas antes de
serem identificadas como recursos. Os velhos, nas sociedades industriais, sã o olhados por
certas comunidades como problemas, enquanto outras os consideram e utilizam como
recurso para a sua coesão e desenvolvimento.

Quando se planeia uma investigação, há que saber identificar os recursos necessários à


sua concretiza ção inventando soluções para as necessidades que se anteveem— . Vejamos
resumidamente alguns aspetos a não esquecer:
• Instalações
- onde se vai realizar a pesquisa? em casa ? na Universidade? em laboratório?
em meio natural?
- que instalações serão necessárias à realização do trabalho?
• Equipamentos
- que tipo de hardware vou necessitar para o meu estudo (computador - com
que capacidade de disco, com que memória RAM - impressora, scanner,
modem, telefone, gravador de vídeo ou de áudio, câmara fotográfica ou de
vídeo - com que características)?
- que tipo de software será preciso (processamento de texto, folha de c álculo,
base de dados, gráfico, estatístico, para telecomunicações, etc.) ?
• Apoio financeiro
- que patrocínios será possível obter para este tipo de estudo?
- que bolsas?
• Apoio logístico
- expediente (cartas, recados, fax, arquivo)
- apoio administrativo ( fotocópias, contabilidade)

18
Um mero exemplo ilustrativo: uma das dificuldades com que o autor deste texto se debateu
quando estava a redigir a dissertação de doutoramento, foi a falta de um escritório em sua
casa, onde pudesse trabalhar sem interrupçõ es. O problema foi resolvido com a compra de uns
auscultadores. Quando necessá rio, o autor criava o seu escritório w/tt/a/ ligando a aparelhagem
e ouvindo música enquanto trabalhava , isolado da realidade doméstica que o rodeava sem
incomodar os outros elementos do agregado familiar e sem por eles ser interrompido .

© Universidade Aberta 39
I. Visão Panorâ mica

• Apoio documentalístico
- bibliotecas, centros de documentaçã o e arquivos
- documentalistas
* Orientação científica
- quem quero convidar para orientador(a) ?
- que tipo de orientação pretendo? mais ou menos diretiva ? mais centrada nos
conteúdos ou na metodologia da investigação ?

3. FERRAMENTAS METACOGNITIVAS PARA INVESTIGAÇÃO

No início deste capítulo, salientou-se que o investigador deve ter uma atitude adequada
ao trabalho a realizar, caracterizada por ser competitiva consigo (de permanente busca de
aperfeiçoamento, característica dos recordistas) e cooperante com os outros. Dissemos
também que tal atitude exige uma curiosidade insaciá vel e uma forte motiva ção para a
aprendizagem. Esta última característica merece ser sublinhada: com efeito, o investigador
deve assumír-se, antes de mais, como um aprendente do Mundo e da Vida12. Se assim
é, então é fundamental que o investigador ganhe competências de aprendizagem, isto é,
aprenda a aprender cada vez melhor.

É neste contexto que se perfilam algumas propostas de ferramentasmetacognitivascujo


objetivo é, justamente, ajudar o investigador a gerir melhor a informação e transformá- la
em conhecimento— .
De entre elas vamos seguidamente e de modo abreviado21, fazer referência aos mapas

19
Na fase final da investigação, em que irá partilhar o que aprendeu com a comunidade
científica, terá de assumir-se como seu ensinante, devendo para isso, adquirir competências
de comunicação, como será referido na unidade relativa ao relatório de pesquisa.
20
De acordo com D1NIS,1 , 2005, Guerra da informação - perspetivas de segurança e
-
competitividade, Lisboa, Sílabo, pp. 23 25, os conceitos dedados, informação, conhecimento
e saber são pedras basilares que caracterizam o funcionamento da sociedade de informação.
Dados são conjuntos de elementos discretos, não organizados, compostos por números,
palavras, sons ou imagens independentes, e que podem ser facilmente estruturados.(...)
Informação éum conjunto de dados organizados, padronizados, agrupados e/ou categorizados
que dizem respeito a uma descrição, definição ou perspetiva.(...) Conhecimento é informação
associada a uma experiência, que compreende uma estratégia, uma prática, um método ou
uma abordagem. (...) Saber ou sabedoria exprime um princípio, discernimento, costume ou
arquétipo, correspondendo a uma dada competência. É neste quadro semâ ntico que se afirma
que o investigador tem de transformar informação em conhecimento (negrito nosso).
21
Para um estudo aprofundado desta matéria veja-se na bibliografia, Novak e Gowin (1996),
Moreira e Buchweitz (1993) e Novak (2000).

© Universidade Aberta 40
I. Visão Panorâ mica

conceptuais e a outros diagramas estruturadores cognitivos22, de entre os quais


salientaremos o Vê heurístico, epistemológico ou de Gowin.

3.1. Os mapas conceptuais

O que é um mapa conceptual?


Um mapa conceptual é uma ferramenta de representação do conhecimento (Novak,
2000) que assume a forma de um diagrama bidimensional que procura mostrar conceitos
hierarquicamente organizados e as relações entre esses conceitos num dado campo de
conhecimento (Moreira e Buchweitz, 1993: 15) . Este tipo de diagrama deve-se a Joseph
Novak, psicólogo educacional da corrente construtivista (Universidade de Cornell, EUA),
que defende uma aprendizagem de qualidade decorrente da aquisição de conceitos claros
e rigorosos, ancorados nos conhecimentos prévios do aprendente.

Passos para a elaboração de um mapa conceptual


Para a sua elaboração são recomendados os seguintes passos Buchweitz, 1984, út. in
Buchweitz e Moreira, 1993:29):
1. Localizam-se os conceitos

2. Catalogam-se os conceitos segundo uma ordem hierárquica ( dos mais gerais para
os mais específicos)
3. Distribuem-se os conceitos em duas dimensões

4. Traçam-se as linhas que indicam as relações entre os conceitos

5. Escreve-se a natureza da relaçã o

6. Procede-se à revisão e refaz-se o mapa

7. Prepara-se o mapa final

Um aspeto importante é que um mapa conceptual deve ser sempre encarado não como
uma representação definitiva de um dado campo de conhecimentos { o mapa conceptual),
mas como uma representaçã o possível de um conhecimento, sempre suscetível de ser
aperfeiçoada. O termo mapa, pretende justamente salientar a natureza instrumental e
orientadora do diagrama .

Melhor do que uma longa dissertaçã o sobre as virtualidades dos mapas conceptuais,
será apresentar alguns exemplos significativos devidamente comentados, e propor-lhe,
seguidamente, que experimente elaborar um.

22
Chamamos estrutura d ores cognitivos aosdiagramas que permitem uma melhorestruturação
da informação possibilitando a sua transformação em conhecimento.

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I. Visão Panorâ mica

Nesse sentido, vejamos alguns exemplos de mapas conceptuais, concebidos com o


intuito de clarificar conceitos complexos (exemplo: exclusão social), desempacotar
um conhecimento complexo (Por exemplo: uma conferência) e conceber um campo
semântico (exemplo: educa ção para a cidadania e um dos seus módulos, a educação
da personalidade).

Importa salientar que nem sempre o autor deste texto seguiu à risca as recomendações
de Novak para construir os mapas conceptuais, uma vez que considera que estes não
devem ser entendidos como espartilhos mas como bússolas para organizar melhor o
conhecimento.

Clarificar conceitos
Com o propósito de clarificar a diferença entre os conceitos de pobreza e de exclusão
social, num trabalho recente (vide fonte) construiu-se um mapa conceptual a partir de
uma investigação publicada por uma equipa brasileira em 2004, que propôs a criação de
um índice agregado de exclusão social a partir de diversos índices disponíveis nas Nações
Unidas— (Fig. 2.2).

Como se observa no mapa, o conceito de exclusão social, de acordo com aqueles autores,
envolve a ideia de uma situação sem qualidade de vida ( vida digna), experimentada por
um dado agregado social com baixos índices de qualificações ( conhecimento) e elevados
problemas de segurança ( vulnerabilidade).

Para objetivar a primeira dimensã o, os autores recorreram aos índices de pobreza,


desemprego e desigualdade. Para a segunda, os índices de alfabetização de adultos e
a taxa de escolarização superior. Para a terceira, os índices de população infantil e de
violência.

23
.
POCHMANN, Mareio et al, (organ ), 2004, A exclusão no mundo: Atlas de exclusão social,
S. Paulo, Cortez.

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I. Visão Panorâ mica

Exclusão socia

Vulnerabilidade
yida
djgna Conhecimento

^
Pobreza Desemprego

% de populaçao c/
Desigualdade Alfabetização

Rend, dos 10% + ricos / rend


Escolarização
superior
População
infantil
Violê ncia

N° de homicídios
rend, < 2 USídol/dla dos 10% + pobres % de população porr 1C mil
100
ativa com habit
% de desempregados na % > 15 anos formação superior % de populaçao < 15
população ativa alfabetizados anos

Fonte: Carmo, H ( 2005), O combate è pobreza como afirmação dos Direitos


Humanos, Conferências Abertas, Coimbra, inédito.

Figura 2.2 - Elementos integrantes do conceito de exclusão social

Para além de clarificar os conceitos que integram o campo semântico do conceito de


exclusão social, o mapa mostra que o conceito de exclusão social é mais abrangente que
o de pobreza.

Para além dessa primeira leitura, estimula a formulação de diversas hipóteses, relacionando
cada uma das outras variá veis (desigualdade, alfabetização, etc.) com o conceito de
pobreza e permite a análise crítica do conceito (por exemplo: será que em vez da simples
percentagem de popula ção inferior a quinze anos no total da população, não valeria
a pena incluir também a população com idade superior a 65 anos? Se assim fosse, o
índice respetivo teria de ser substituído pelo índice de dependência, robustecendo e
universalizando o índice agregado de exclusão social).

Observa-se, deste modo, que a construção do mapa conceptual, estimula a imaginação


sociológica do investigador, permitindo-lhe uma multiplicidade de olhares que o ajudam
a construir outras hipóteses e sugerir teorias.

Desempacotar um conhecimento complexo


Outra utilidade dos mapas conceptuais é desempacotar conhecimentos, na feliz expressão
de Gowin (Buchweitz e Moreira, 1993:90), documentados sob diversas formas, isto é,
permitir a análise mais clara e rigorosa de documentos de diversa natureza. É o caso da
conferência intitulada Trópicos da Europa, de Adriano Moreira, cujo mapa conceptual se
apresenta na figura 2.3.

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I. Visão Panorâ mica

Colonização

Agressores dos tempos modernos

Lusotropicalismo Iberotropicalismo Eutropicalismo

Descolonizaçã o

Teologia de Dependencia Política Poder


mercado migratória securitaria

Terrorismo
Trópicos na Europa

Sociedade cosmopolita

Colónias interiores Mitos raciais


\ /
Papel da Universidade

Conceptualízar Interpretar Assumir-se como


macrotendências incidentes críticos instrumento de coesã o
e de orientação

Figura 2.3 - Desconstrução da conferência Trópicos da Europa

A construção do mapa, permitiu, antes de mais, clarificar o texto que é extremamente


denso, permitindo salientar as linhas mestras do pensamento do autor, os conceitos que
selecionou para pintar um fresco notá vel sobre a problemática da imigração na Europa do
século XXI, sobre as políticas públicas em competição para fazer face a este problema social
de desorganização social e de anomia e sobre os riscos que se perfilam, contextualizados
numa sociedade desequilibrada por aquilo que chama teologia de mercado.

Adriano Moreira começa por recordar em breves traços a História Mundial recente, a
partir dos processos de colonizaçã o (simbolizada pela expressão Europa nos trópicos) e
de descolonização. Seguidamente, refere-se à sociedade cosmopolita, querendo com isto
chamar a atenção para o processo de globalização e para alguns dos seus desequilíbrios
observá veis, nomeadamente, na situação dos imigrantes ( Trópicos na Europa) registando-
-se a emergência de graves problemas sociais como o das colónias interiores e o do
renascimento de mitos raciais.

Fonte: MOREIRA, Adriano ( 2002), Os trópicos da Europa, Lisboa, Academia Internacional


da Cultura Portuguesa . Termina, defendendo a necessidade de atribuir à Universidade o
papel de conceptualízar macrotendências, de interpretar incidentes críticos e de se assumir

© Universidade Aberta 44
I. Visão Panorâ mica

como instrumento político de coesã o e de orientaçã o social.

Conceber um campo semântico


Para al ém de excelentes instrumentos que facilitam o desempacotamento de
conhecimentos, os mapas conceptuais também servem para os empacotar. Dito de outra
forma, sempre que o investigador precisa conceber um conjunto de conceitos articulados
entre si, a fim de escrever relatórios de pesquisa, artigos ou ensaios, fazer conferências
ou comunica ções, ou ainda organizar materiais educativos de diversa ordem para difundir
a sua investigação pela comunidade académica, pode recorrer com proveito à construção
de mapas conceptuais.

Os exemplos que se seguem resultam de um esforço deste tipo. No primeiro (figura 2.4.),
procurou-se integrar diversos conceitos com que temos vindo a trabalhar nos últimos
anos, em matéria de teoria da educação para a cidadania. No segundo, (figura 2.5),
elaborou-se um mapa conceptual a partir de um subsistema do primeiro, a educação da
personaiidade.

Este mapa conceptual sugere, em primeiro lugar, que a educa ção para a cidadania integra
duas dimensões incontornáveis: a educação para o desenvolvimento pessoal24, e para o
desenvolvimento social.

O desenvolvimento pessoal, abrange a educação para a autonomia e para a


solidariedade. Para que um indivíduo venha a ser um ser autónomo, é necessário ser
sujeito a um processo educativo que estimule a construçã o de uma personalidade
rica e que possibilite dotá-lo de competências de liderança sobre o seu destino. Para
ser solidário, terá de ganhar competências sociais de solidariedade com as gera ções
passadas presentes e futuras. É nesse contexto que se insere a educa ção para a
defesa do património e para educação ambiental.

24
Sugerindo que uma educação para a cidadania exige que o educando, antes de mais, seja
educado como pessoa singular em construção.

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1. Visão Panor â mica

Educa ção para a cidadania

Eixo 1 Eixo
xo i2

Desenvolvimento pessoel Desenvolvimento social

vertente 1 vertente 2 vertente 3 vertente 4

Autonomia Solidariedade Diversidade Democracia

-
área cheve 1 área - chave 2 área - chave 3 área-chawe 4 área- chave 5 -
área chave 6 -
áreas chave 7, ® e 9 área ^chave 10

m &

Personalidade Liderança P/ c / gerações Pf cf gerações Pf cf gerações Mudança PlurálíW» Como meta Como método
passadas vivas futuras cultural e social
*31 w

fc .
Educaçao Complementaridade Diálogo
.
Ht 2012, « 01 ííe género intengeí acionai
W1 -I1

Fonte: Carmo, H. ( 2014)

Figura 2 , 4 - Vertentes da educaçã o para a cidadania ( Io nível )

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I. Visão Panorâ mica

O desenvolvimento social , integra a educaçã o para a diversidade, uma das


caracterí sticas estruturantes da nossa época, e a educa çã o para a democracia, o
melhor sistema que se conhece. Para se situar nesta sociedade heterogénea, o indivíduo
necessita de ganhar competências para encarar a mudança, o pluralismo cultural e,
em particular, a nova distribuiçã o de papéis e de estatutos em função do g énero. Para
poder compreender a democracia e assumir-se como um cidadão ativo, terá de aprender
as características da democracia (a democracia como meta ) e o modo de agir numa
sociedade democrática ( a democracia como método ).

Na base deste mapa conceptual (MC), estão assinaladas várias remissões para outros
MCs, que objetivam alguns conceitos deste (mapas a outra escala).

Ilustremos com um exemplo apenas: a educação da personalidade, que remete para o


MC11 que aqui se reproduz (figura 2.5).

© Universidade Aberta 47
1. Visão Panor â mica

Educaçã o da personalidade

dKefwoht'Wem dois

Contextos

de naCure /a de rtalun&3 Oue »n í iwuwn a


*
Interpessoal influenciao contexto Inpapessoal contnbuem para a (o*iwç3oda Pessoa

ao nível ao nível
mow

grupai organisational ] Beomunitário regional naoonal |


| internacional planetário traços de personalidade

i'-loyrd

GAtoncr, 1995 c fonte cognFtivcsr emocionais e sociais açhar e rtarstofl, 2lXH e ron-tes; aaiolõgicos ou éticos
Goteman, IMS, MM * OflWanu, 2W0 mcrigíntia evvteiíial (Gardner )
espintuflJ ( Setor o HarS»n>

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Foníe: Carmo, H. ( 2014 }

Figura 2 , 5 - Vsrtentes da educação para a cidadania (MCll - 2 n ível)


°

© Universidade Aberta 48
I. Visão Panorâ mica

A leitura deste mapa sugere que


• a personalidade é a resultante de uma série de traç os que moldam a identidade
de uma dada pessoa .

• ao longo do processo de socialização existe um conjunto de constrangimentos


que vão influenciar a construção da personalidade, nomeadamerte os grupos e
organiza ções a que pertença, as regiões e países a que pertença e onde tenha
estado e, naturalmente a consciência que tem (ou não) de pertencer a uma
família comum, a espécie humana.

• Os tra ços que integram a personalidade são vários, desenhando em cada


pessoa um perfil único, decorrente do maior ou menor desenvolvimento de cada
um deles. Para a sua enunciação recorreu-se à teoria das inteligências múltiplas
de Gardner, ao conceito de inteligência emocional de Goleman e à conceção das
dimensões éticas do Dalailama .

Um MC deste tipo, tanto pode ser usado como grelha de an álise sobre o modo como um
dado agregado (família, escola, comunidade, país) educa a personalidade dos seus mais
jovens, como de estrutura base para desenhar intervenções com esse objetivo.

3.2. Outros diagramas estruturadores cognitivos

Para além dos mapas conceptuais existem muitos outros instrumentos metacognitivos que
permitem ao investigador, de um modo claro e sintético, exprimir, partilhar e desenvolver
o seu pensamento sobre um dado campo de conhecimentos.

A título de exemplo vejamos dois, um sob a forma de um diagrama sistémico que permite
analisar o conceito de intervenção social e descrever alguns dos seus principais tipos
e dimensões (figura 2.6), o outro que representa os vários passos do seu processo
(figura 2.7).

A figura 2.6 procura sintetizar os diversos níveis de complexidade da intervenção social,


partindo do seu conceito operacional:

Qualquer processo social em que uma dada pessoa, grupo, organização, comunidade
ou rede social - a que chamaremos sistema-interventor - se assume como recurso
social de outra pessoa, grupo, organização, comunidade ou rede social - a que
-
chamaremos sistema cliente - com ele interagindo através de um sistema de
comunicações diversificadas, com o objetivo de o ajudar a suprir um conjunto de
necessidades sociais, potenciando estímulos e combatendo obstáculos à mudança
pretendida (Carmo, 2000: 61).

© Universidade Aberta 49
I. Visão Panorâ mica

Para isso, distinguem-se claramente dois níveis de intervenção social:


• no primeiro nível, situado num plano interpessoal, grupai ou organizacional
(nível micro e meso), situam-se três tipos de intervenção social: os cuidados
de proximidade, as atividades de observatório social e as de laboratório
social;

• no segundo nível,situado no plano sociopolítico,identificam-se diversas políticas


sociais, na ótica das políticas públicas e das políticas dos parceiros sociais.

O equacionar deste modo o conceito, permite diferenciar os níveis (e os tipos)


complementares da intervenção social, sugerindo uma estrutura analítica que possibilita
analisar programas de intervenção social e estruturas curriculares de formação dos
profissionais deste domínio, sem confundir planos de atuação.

© Universidade Aberta 50
1. Visão Panor â mica

Níveis de complexidade
da intervenção social

Sistema interventor Intera ção Sistema cliente Contexto

+
Pessoa
Grupo
-
. Cuidados e servi ços de proximidade
( Interven ção te ndencia lm ente
h
Pessoa
Grupo
+
Micra:
Interpessoal
personalizada
Profissões cuidadoras: Traharho / serviço Grupai
social, educaçã o ou pedagogia social, psicologia
Organização comunitária, animação sociocultural, medicina,
Parceria enfermagem ... (á tica pnedominanbemente
Organização
Comunidade Mesa.
Comunidade micro e meso )
. Observatório sodaJ (Diagnó)stico de Organizacional
recursos e necessidades sociais
. Laboratório social ( experimentação de
práticas e de polí ticas inovadoras)

Macro.
Administração Pública . Pol ítica Social: Administração Pública
( Intervenção tendenctalmente geral
Estado abstrata e tipificada, com uma ótica Estado Comunitário
predominante de n í vel mesoe macro ) Metropolitano
Entidade supraestatal Entidade supraestatal Regional
Traduz-se numa estratégia de coesão social Nacional
orientada para a defesa dos direitos humanos e Internacional
para o desenvolvimento, concretizada em Global
polí ticas públicas de educação e formação,
segurança social e familiar, saúde, habitação
social, ambiente, cultura e desenvolvimento
económico ...
Recurso Processo de ajuda Necessidades sociais
Fonte: Carmo, H. (2Q0È)

Figura 2.6 - Dimensões da intervençã o social

© Universidade Aberta 51
I. Visão Panorâ mica

Como foi referido há pouco, a figura 2.7 representa qualquer processo de intervenção
social seja qual for o seu nível de complexidade ou tipo, sob a forma de um
fluxograma:

Identificação
do problema

Paradigma de
intervenção
Há n
de Peter
Análise do
1

N o
consenso ? problema Ketner

Definição de
Há sim
objetivos,
consenso ? programas e
a ç oes

Implementação e Sim

seguimento das
contrato?
normas do contrato

Não X Programas X 5im Objetivos


cumpridos? alcançados?

Sim

Avaliação

i
Encerramento

Fonte: Carmo, 2001: 73

Figura 2.7 - Um exemplo de fluxograma

Em Metodologia e ideologia do trabalho social, (1982) Vicente de Paula Faleiros refere


um sugestivo paradigma de intervençã o proposto por Peter Ketner (...) Para a análise do
fluxograma chama-se a atenção para os seguintes aspetos:

© Universidade Aberta 52
I. Visão Panorâmica

• a distinção que se deveobservar, ao longo detodo o conjunto de procedimentos


que integram o processo de intervenção social, entre tarefas que implicam
ações (retângulos) e tarefas que implicam decisões (losangos);

• uma coerência lógica de procedimentos, iniciados com a identificação e


análise do problema, seguidos da definição de objetivos, programas e ações,
e da sua implementação e avaliação;

• a necessidade de cada procedimento só ter início depois de verificado se os


procedimentos anteriores foram realizados (setas sim/não) o que obriga a
uma coerência cronológica;

• a necessidade da obtenção de consensos adequados entre sistema-cliente


e sistema-interventor sobre a identificação e a análise do problema, o que
implica a participação do primeiro desde o início do processo, evitando uma
relação paternalista/infantilizadora entre ambos mesmo na fase de estudo e
diagnóstico da situação-problema;

• a ideia de contrato psicológico entre os protagonistas da intervenção social,


com a explicitação do pape! que cabe a cada um no decorrer do processo
(Carmo, 2000: 72).

3.3. O V ê heurí stico, epistemológico ou de Gowin

De acordo com Buchweitz e Moreira (1993: 87), Gowin (1981), vê a investigação científica
como uma maneira de gerar estruturas de significados, ou seja, de estabelecer ligações
entre conceitos, eventos e factos.

(...) Os conceitossão definidos (...) comos/gnos/símboios que apontam regularidades


em eventos e que utilizamos para pensar, pesquisar, aprender, enfim para dar
respostas rotineiras e estáveis ao fluxo de eventos. Os sistemas conceptuais são
conjuntos de conceitos logicamente ligados, geraimente permitindo um padrão de
raciocínio ao relacionar uns conceitos com os outros. Os princípios e teorias podem
ser interpretados como sistemas conceptuaismaisabrangentes { Buchweiz e Moreira,
1993: 87).

Com base nestes pressupostos, Gowin concebeu um esquema a que chamou Vê heurístico
ou epistemológico, também conhecido na comunidade científica por Vê de Gowin, que
pretende representar qualquer campo de conhecimentos.

De acordo com este autor, um campo de conhecimentos integra dois domínios específicos: o
domínio conceptual - filosofia (s), teoria(s), princípios, sistemas conceptuais e conceitos

© Universidade Aberta 53
I. Visã o Panorâ mica

- e domínio metodológico - registos, dados, transformações, asserções de conhecimento


e de valor. Para além disso, qualquer campo de conhecimentos procura responder a um
conjunto de questões bá sicas sobre um dado objeto ou evento.

Com base nesta proposta, e procurando-a aplicar ao tema deste capítulo, o projeto de
investiga ção, observe-se a figura 2.8, que representa sob a forma de um Vê de Gowin as
peças fundamentais de qualquer projeto:

Planeamento e avaliação de projetos de investiga ção


Domínio conceptual Domínio metodológico

Questã o- Chave: Juí zos de valor:


Conceções do Mundo e da Definir com clareza e rigor uma ou Identificar o valor acrescentado da pesquisa
Vida: v árias perguntas que identifiquem o que se antevá, para o desenvolvimento da
Identificar e discutir as conceções do objetivo da pesquisa , teoria, da metodologia e/ ou da pr ática .
Mundo e da Vida (crenç as, estereótipos,
preconceitos) do investigador que possam Dialética
afetar a investigação
Juí zos cognitivos (resultados):
Identificar os resultados que se esperam obter
sob a forma de questões respondidas,
Teorias: hipó teses levantadas, caracterizações feitas,
Identificar as teorias que vão hipó teses verificadas.
fundamentar a investigação.
Fazer revisio da literatura sobre o
assunto. Transformações: Definir estratégias de recolha,
tratamento e interpretação de dados
Modelos:
- Estratégias de recolha de dados (tipo de amostra,
pesquisa documental, observação, inquéritos por
Caracteiizar os modelos de observação
ou de análise que eventualmente irão
,
entrevista ou por questionário etc,}
- Estratégias de tratamento de dados (tabulações,
ser adotados.
gráficos, diagramas, testes estatísticos, éte. )
- Estratégias de análise de dados [ análise quantitativa
Conceitos: e / ou qualitativa) .
Identificar os principais conceitos a
utJlzar, relacioná-los e hlerarquí ?á-los
sob a forma de um mapa conceptual, Registos:
Conceber instrumentos de registo de informação
Note bom; apó s a realização das Fichas bibliográficas e de feitura, roteiros de
10 tarefas, deverá testar a observação, gulas de entrevista, questioná rios, etc.
coerência do projeto relacionando
cada uma com todas as outras

Objeto de estudo:
Identificar um objeto de estudo observ ável, coerente com
os recursos disponíveis (tempo, Informação disponível,
recursos materiais, humanos, financeiros, etc.)
CARMO, H . ( 1997)
( versão 1- 4 )

Cfr, NOVAK, Joseph; GOWIN, Bob (1996), Aprender a aprender Lisboa, Plátano, Ia ed. de 19&4 Ou MORE]RA,M, A .; BtJCHWElrnZ, B. (1993), Novas
estrat égias de ensino e aprendizagem: os mapas conveptuais e o v ê epistemológico, Lisboa, Plátano; NOVAK, Joseph ( 2000) , Aprender , criar e
utilizar o conhecimento - mapas conceptuais como ferramentas de facilitação nas escolas e empresas, Lisboa, Plátano .

Figura 2.8 - Aplicação de um Vê ao projeto de investigação

• Objeto de estudo: antes de mais dissemos que o investigador deve identificar


um objeto de estudo observá vel, coerente com os recursos disponíveis { tempo,
informaçã o disponível, recursos materiais, humanos, financeiros, etc.).

• Questão chave: seguidamente, há que definir com clareza e rigor uma ou


várias perguntas que identifiquem o objetivo da pesquisa ( a meta a alcançar).

• Conceções do Mundo e da Vida: Identificar e discutir as conceções do Mundo


e da Vida ( crenças, estereótipos, preconceitos) do investigador que possam
afetar a investigação.

• Teorias: Identificar as teorias que vão fundamentar a investigaçã o. Fazer

© Universidade Aberta 54
I. Visão Panorâmica

revisão da literatura sobre o assunto.

• Modelos : Caracterizar os modelos de observação ou de análise que


eventualmente irão ser adotados.

• Conceitos: Identificar os principais conceitos a utilizar, relacioná-los e


hierarquizá-los sob a forma de um mapa conceptual.

• Registos: Conceber instrumentos de registo de informação. Fichas bibliográficas


e de leitura, roteiros de observação, guias de entrevista, questionários, etc.

• Transforma ções: Definir estratégias de recolha, tratamento e interpretação


de dados.
- Estratégias de recolha de dados (tipo de amostra, pesquisa documental,
observação, inquéritos por entrevista ou por questionário, etc.)
- Estratégias de tratamento de dados (tabulações, grá ficos, diagramas,
testes estatísticos, etc.)
- Estratégias de análise de dados (análise quantitativa e/ou qualitativa).

• Resultados: Identificar os resultados se espera obter sob a forma de


questões respondidas, hipóteses levantadas, caracterizações feitas, hipóteses
verificadas.

• Valor acrescentado: Identificar o valor acrescentado da pesquisa que se


antevê, para o desenvolvimento da teoria, da metodologia e/ ou da prática.

Conforme é referido no Vê, após a realização das dez tarefas, o investigador deverá testar
a coerência do projeto relacionando cada uma com todas as outras (por exemplo: será
que os resultados que se pretendem obter, têm a ver com a pergunta de partida, com as
teorias, modelos e conceitos explicitados no projeto? As opções de recolha, tratamento
e análise de dados são consistentes com os resultados que pretendem obter?)

Atividade 2.9
Procure esboçar o seu projeto de investigação através de um V ê de Gowin.
Faç a seguidamente uma lista dos conceitos principais de que se irá socorrer e
elabore um mapa conceptual procurando articulá - los.

S í ntese

Neste capítulo procuraram equacionar-se alguns aspetos relevantes do planeamento de


uma investiga ção. Em particular, discutiram -se as questões da seleção da informação e da
gestão do tempo, da delimita ção do objeto, da definição dos objetivos, da programação
e da organização da pesquisa.

© Universidade Aberta 55
I. Visão Panorâ mica

Teste formativo
1. Que atitudes apriorísticas há que evitar quando se inicia uma dissertaçã o?
2. Que significa defender-se que o investigador deve interiorizar uma atitude de
recordista de alta competição?

3. Que vantagens práticas existem da assunção de uma atitude genuína de curiosidade


e de humildade intelectual?

4. Comente a célebre frase de Kurt Lewin, um dos fundadores da psicossociologia,


não há nada mais prático do que uma boa teoria.

5. Em seu entender que lhe parece ser a atitude mais eficaz para a investigaçã o: a
competitiva ou a cooperativa ? Justifique

6. Em que consiste a obsessão pelo mais recente? qual o seu erro?

7. Em que consiste a obsessão pelo quantitativo? qual a sua limita ção?

8. Em que consiste a obsessão pelo qualitativo? qual o perigo em que incorre?

9. O que é o nevoeiro informacional?

10. Que elementos o integram como filtros de informação? Caracterize-os


11. Que efeitos práticos tem o nevoeiro sobre as estratégias do investigador ?
12. Porque é que o tempo é uma variá vel estratégica da investigaçã o? Indique três
razões

13. Que perguntas deve o investigador fazer na fase de planeamento?


14. Enuncie os três erros frequentes que ocorrem no início de uma investigação de
acordo com Raymond Quivy e os correspondentes modos de os evitar

15. Refira três critérios considerados importantes para a definição do objeto de estudo,
para além da pertinência científica

16. Que tipo de estudos conhece em Ciências Sociais? Distinga-os uns dos outros.
17. O que é uma árvore de objetivos?

18. Refira em tó picos os principais elementos a ter em conta no processo de programação


e organização de um projeto

Após ter trabalhado este capítulo, procure responder às perguntas acima enunciadas sem
recorrer imediatamente a ele. Após este trabalho poderá confrontá-lo com o texto onde
encontrará facilmente todas respostas às questões formuladas.

© Universidade Aberta 56
I. Visão Panorâ mica

Leituras complementares

AMARO, Fausto ( 2008), Grounded Theory: uma introduçã o, in Meirinho Martins,


Manuel ( 2008, org,) Comunicação e marqueting político: contributos pedagógicos,
Lisboa, ISCSP.

BELCHIOR, Proc ópio (1970), PERT / CPM . Técnica de Avaliação, Revisão e Controle
de Projetos, Rio de Janeiro, Edições de Ouro.

CARMO, Hermano (1996), Ensino Superiora Distância. Contexto Mundial. Modelos


Ibéricos, Lisboa, Universidade Aberta, introdução.

CARMO, Hermano ( 2014), Educação para a cidadania no século XXI: trilhos de


intervençã o, Lisboa, Escolar Editora.

MOREIRA, Carlos Diogo (1994), Planeamento e Estratégias da Investigaçã o Social,


Lisboa, ISCSP, 219 p., pp. 7-90.

MOREIRA, M. A. e BUCHWEITZ, B. (1993), Novas estratégias de ensino e


aprendizagem : os mapas conceptuais e o Vê epistemológico, Lisboa,
Pl átano.

NOVAK, Joseph e GOWIN, Bob (1996), Aprender a aprender, Lisboa, Plátano, Ia ed.
de 1984.

NOVAK, Joseph ( 2000), Aprender, criar e utilizar o conhecimento: mapas


conceptuais como ferramentas de facilitação nas escolas e empresas,
Lisboa, Plátano.

QUIVY, Raymond e Campenhoudt, Luc Van (1992), Manual de Investiga çã o em


Ciências Sociais, Lisboa, Gradiva, pp. 1-154.

ROCHA-TRINDADE, Mar í a Beatriz (1995), Sociologia das Migra ções, Lisboa,


Universidade Aberta, pp. 108-134.

SILVA, Augusto S. e PINTO, José M., org. (1986), Metodologia das Ciências Sociais,
Porto, Afrontamento, pp. 9-78.

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I. Visão Panorâ mica

Unidade 3 - Pesquisa documental

Objetivos da unidade

No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a :


1. Identificar a importância da pesquisa documental no processo de investigação em
Ciências Sociais;

2. Descrever os diversos tipos de documentos escritos habítualmente usados na


investigação em Ciências Sociais;

3. Definir uma estratégia para a recolha de dados existentes em documentos escritos


tendo em conta as várias fontes disponíveis;

4. Fazer um estudo exploratório documental economizando tempo e energias


centrando-se na informação pertinente;

5. Conhecer diversos modos de registar e organizar a informação recolhida e construir


um sistema adequado ao seu trabalho concreto;

6. Identificar e tirar partido de documentos em suporte áudio, vídeo, e digital como


fontes de dados;

7. Identificar e tirar partido das estatísticas como fontes de dados;

8. Identificar e tirar partido dos documentos pessoais como fontes de dados;

9. Identificar e tirar partido de outros documentos escritos difundidos como fontes


de dados;

10. Identificar e tirar partido de documentos em suporte áudio, vídeo e inform á tico
como fontes de dados.

1. PAPEL DA PESQUISA DOCUMENTAL NO CONTEXTO DO PROCESSO


DE INVESTIGAÇÃO

Na unidade anterior sublinhou- se a importância de que se reveste um projeto de


investiga ção elaborado com clareza e rigor para prevenir perdas de tempo e energia.
Na mesma linha de preocupa ções, iremos refletir sobre a importância de uma pesquisa
documental adequada. Antes de mais esta visa selecionar, tratar e interpretar informação
bruta existente em suportes estáveis ( scripto, áudio, vídeo e informo) com vista a dela

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I. Visão Panorâ mica

extrair algum sentido. Por outro lado tem por objetivo executar essas mesmas operações
relativamente a fontes indiretas.

Do que acima foi referido deduz-se que um processo de investigação é algo de semelhante
a uma corrida de estafetas: para atingir os seus objetivos, o investigador necessita de
recolher o testemunho de todo um trabalho anterior, introduzir-lhe algum valor acrescentado
e passar esse testemunho à comunidade científica a fim de que outros possam voltar a
desempenhar o mesmo papel no futuro. Neste sentido a pesquisa documental assume-se
como passagem do testemunho, dos que investigaram antes no mesmo terreno, para as
nossas mãos. Estudar o que se tem produzido na mesma área é, deste modo, não uma
afirmação de erudiçã o académica ou de algum pedantismo intelectual, mas um ato de
gestão de informa ção, indispensá vel a quem queira introduzir algum valor acrescentado
à produçã o científica existente sem correr o risco de estudar o que já está estudado
tomando como original o que já outros descobriram. Tal valor acrescentado escorar-se-á
assim em suportes sólidos anteriormente concebidos e testados.

2. DOCUMENTOS ESCRITOS

2.1. Onde procurar?

Relativamente aos documentos escritos o primeiro aspeto a considerar é onde procurá-los.


Sem a preocupa ção de esgotar o assunto, vejamos alguns locais (físicos ou funcionais)
onde se pode encontrar informação escrita pertinente.
• Bibliotecas e arquivos
• Bibliografias
• Enciclopédias, dicionários e vocabulários
• Livros e revistas especializadas
• Ficheiros em suporte scr
íptoe bases de dados em suporte digital.

Bibliotecas e arquivos
Os primeiros locais que naturalmente ocorrem ao investigador são as bibliotecas e os
arquivos públicos e privados. No entanto, para respeitar o princípio da economia de tempo,
há que proceder a uma seleção prévia dos centros de documentação, ainda que se possam
frequentar, com proveito, bibliotecas gerais como por exemplo a Biblioteca Nacional.

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I. Visão Panorâ mica

Na área das relações ínterculturais25 vale a pena começar pelas bibliotecas das instituições
de ensino superior, nomeadamente as que lecionam cursos de graduaçã o ou de pós-
-graduação neste domínio específico ou em áreas afins ( Antropologia, Sociologia, Psicologia
Social, Ciência Política, Comunicação Social, Ciências da Educação e outras) como as
seguintes26:
• Universidade Aberta. No âmbito do Centro de Estudos das Migrações e das
Relações ínterculturais, tem vindo a ser coligido um património documental
e em suporte mediatizado de grande valor para os investigadores desta área.
Sendo prioritariamente para uso dos académicos desta Universidade (docentes
e discentes de pós-graduação) tem-se assumido como (bom) costume abrir o
acesso a investigadores de fora dentro das possibilidades espaciais e materiais
da instituição. As mais de quinhentas dissertações já produzidas no âmbito do
Mestrado em Relações ínterculturais constituem património único de grande
valor neste domínio.

• Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) da Universidade Técnica


de Lisboa. Sendo a escola de Ciências Sociais mais antiga do país, tem um valioso
património documental nas áreas da Antropologia Cultural, particularmente no
que respeita a regiões tropicais, Política e Serviço Social, Sociologia, Ciência
Política e Comunicaçã o Social.

• Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE). Possui uma


biblioteca muito atualizada nos domínios da Sociologia e Antropologia.

• Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. Tem um bom património


documental nos domínios da Antropologia, Sociologia e outras Ciências Sociais.

• Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da Universidade Nova de


Lisboa. (Áreas da Antropologia, Sociologia, Comunicaçã o Social e Linguística)

• Departamentos de Sociologia, de Antropologia e de Comunicação Social das


várias Universidades.

• Institutos Superiores de Serviço Social do Porto e Coimbra (Serviço Social,


Política Social e Sociologia)

25
Este manual foi inicialmente concebido para o apoio de estudantes do Mestrado em Relações
ínterculturais, da í a especificidade do exemplo. Para outros domínios este critério de adequação
mantém-se.
26
A lista que se segue é meramente indicativa, não tendo pretensõ es de esgotar a informação
sobre o assunto. A equipa docente deste seminá rio solicita a todos os estudantes que
contribuam com informação adicionai a fim de aperfeiçoar futuras edições deste Manual.

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I. Visão Panorâmica

• Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA) e Faculdades de Psicologia e


Ciências da Educação (Psicologia e Ciências da Educaçã o).

• Escolas Superiores de Educa ção dos vá rios Institutos Politécnicos (Ciências de


Educação).

Para além das instituições de ensino superior, pode encontrar-se muita documentação
relevante em diversos organismos públicos e privados que se têm dedicado ao estudo
ou à intervenção nesta área:
• Biblioteca da Fundação Calouste Gulbenkian (Ciências da Educação)
• Biblioteca da Sociedade de Geografia (Antropologia Cultural, Etnografia e
Histó ria)

• Centros de Documentação de diversos Ministérios e Secretarias de Estado com


atuação nesta área (Ex: Emprego, Formação Profissional, Solidariedade Social,
Educação, Comunidades Portuguesas, etc .).

Atividade 3.1
Faç a uma lista das bibliotecas e centros de documentação onde gostaria de fazer
a pesquisa bibliográfica sobre o tema que planeou na unidade anterior.
Informe-se (telefonicamente) sobre o acesso a documentação, condições de
leitura e empréstimo e horários de funcionamento

Primeira triagem
Antes de começ ar a consultar indiscriminadamente documentos sobre o objeto de estudo
cedendo à tentação da gula livresca para que nos previne Quivy, o investigador deve
proceder por aproximações sucessivas, selecionando progressiva mente conjuntos de
documentos até chegar a uma dimensã o manuseá vel. Se assim nã o proceder arrisca-se
a perder tempo com documentação de menor qualidade, negligenciando outra que não
lhe escaparia se tivesse uma estratégia de aproximação mais prudente.

Um modo de selecionar com alguma facilidade conjuntos abundantes de documentação


escrita é através da consulta de bibliografias já publicadas22.

Também a consulta de enciclopédias, dicionários e vocabulários especializados é de


grande utilidade uma vez que os seus artigos apresentam os assuntas de forma resumida,

27
No campo das migrações em Portugal, por exemplo, é de grande utilidade a consulta de
ROCHA-TRINDADE, Maria Beatriz e ARROTEIA, Jorge (1984), Bibliografia da Emigraçã o
Portuguesa , Lisboa, Instituto Português de Ensino a Distância, para publicações editadas
antes dos anos oitenta do século XX.

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contendo frequentemente indicações bibliográficas adicionais interessantes. Este trabalho


é particularmente útil quando precisamos de clarificar conceitos ou de criar conceitos
operacionais.

A consulta de bases dados, quer os catálogos em suporte scr


ípto (nas clássicas fichas em
cartolina) quer em suporte microfilmado e digital23, revela-se uma etapa indispensá vel.
Qualquer que seja a base de dados a consultar, é recomendá vel que a consulta seja
previamente preparada a fim de não se perder tempo a inventar critérios de seleção no
momento da recolha de dados.

Neste sentido o investigador deve pensar com antecedência se tenciona fazer uma pesquisa
por assuntos, por autores, por títulos ou por datas, ou por outro qualquer critério. Se vai
fazê-lo por palavras-chave (descritores) é conveniente que anteriormente tenha elaborado
uma lista. Ainda que ao longo da pesquisa lhe possam surgir outros descritores pertinentes,
a preparação prévia de uma lista de palavras-chave reduz o tempo de pesquisa no local
(que custa caro) e torna a procura mais eficaz. Atualmente há dois modos principais de
aceder a bases de dados:
• em suporte local, para além dos suportes clássicos ou em microfilme, através
de conjuntos de CD Rom encontram-se excelentes indicações bibliográficas
tanto em formato de simples resumo, podendo muitas vezes os textos integrais
ser encomendados à editora, como em formato integral obtendo-se cópia em
suporte scr
ípto (por impressão) ou informo (por cópia para disquete);

• em suporte remoto, é possível e fácil aceder a bases de dados em qualquer


parte do Mundo através da Internet.

Um risco a prevenir é o desnorteamento. Perante a situação de sobreinformação que


emerge de uma triagem desta natureza, ou o investigador sabe bem o que quer e, nesse
caso está em condições de fazer uma navegação segura por entre o extenso leque de
opções com que é defrontado, ou nã o planeou sufícientemente a sua consulta e perde-se
num turbilhão de nevoeiro informacional.

28
Desde 2003 que os investigadores dispõem de uma base de dados de natureza particular,
.
resultante da rede de pesquisa sobre atitudes sociais na Europa, o European Social Survey
Trata-se de uma base de dados com os resultados da investigação extensiva realizada em
22 países europeus pelos elementos da rede, disponíveis para tratamento e aná lise, por
quem esteja disposto a fazê-lo. Pode ver-se um exemplo de tal exploração em VALA, Jorge e
TORRES, Aná lia, (2006, organizadores), Contextos e atitudes sociais na Europa , Lisboa,
Universidade de Lisboa. Instituto de Ciências Sociais.

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Outro critério de seleção que se afigura de grande utilidade é o recurso a uma prévia
identificação de revistas especializadas. A partir da sua consulta e cruzamento de
informação, o investigador consegue com alguma rapidez selecionar monografias e artigos
centrados no seu objeto de estudo.

No trabalho exploratório de escolha de informação documental relevante, é útil recorrer


aos documentalistas, figuras muitas vezes negligenciadas como informadores qualificados.
A experiência tem demonstrado que uma entrevista, bem preparada e bem conduzida,
ao especialista de documenta çã o de determinado centro de recursos documentais
(documentalista, bibliotecário, arquivista), poupa um tempo imenso ao investigador
dando-lhe uma orienta ção preciosa.

Para finalizar esta primeira aproximação é conveniente referir que uma das áreas mais
promissoras para a reprodução do conhecimento na sociedade de informação integra a
chamada literatura cinzenta, constituída por um conjunto cada vez maior de relatórios
de pesquisa, produzidos em contexto académico de graduação e de pós-gradua ção,
não publicados, mas validados por júris qualificados de professores especialistas em
diversos domínios, que desempenham um papel equivalente aos referees das revistas
de especialidade.

Muitos destes trabalhos, até há alguns anos ignorados pelo facto de não estarem
publicados, têm sido crescentemente valorizados, devido a dois tipos de fatores:
• por um lado, a informatizaçã o dos catálogos dos centros de documentação,
permitiu a sua identificação em tempo real, com evidentes vantagens para os
seus utilizadores, em termos de seleção, organiza ção e acesso a informação
relevante;

• por outro, a universalização da Internet e de vários poderosos sistemas de


busca (ex: Google), propiciou que tais facilidades tendessem a tornar-se
disponíveis para um número crescente de utilizadores sem barreiras espaciais,
ajudados em muitas situações pelo estreitamento das relações entre centros de
documentação, que têm possibilitado o empréstimo mútuo e a cópia autorizada
em formato analógico e digital.

Constitui, portanto, uma boa pr á tica, a identificação e seleção da literatura cinzenta


disponível sobre o assunto da investigação, nomeadamente no que respeita a relatórios de
pós-doutoramento, teses de doutoramento, dissertações de mestrado e mesmo trabalhos
finais de licenciatura (dissertações e relatórios de estágio).

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Atividade 3.2
• Procure saber junto dos doeumentalistas das bibliotecas que selecionou se
existem bibliografias publicadas sobre o seu objeto de estudo.
• Fa ça uma lista de conceitos e palavras-chave que vai usar no seu trabalho.
Verifique como é que as enciclopédias, dicionários científicos e vocabulários
especializados disponíveis tratam esses conceitos e descritores
• Consulte uma boa base de dados cruzando os diversos descritores. Quando
chegara uma listagem suficientemente pequena de títulos (abaixo da centena)
leia os títulos das publicações selecionadas. Dessa listagem selecione apenas
os títulos que lhe pareçam pertinentes.
• Fa ça uma lista das revistas especializadas que gostaria de consultar. Elabore
igualmente uma lista provisória de monografias sendo conveniente que
ambas tenham uma organização temática. Por exemplo, imagine que vai
fazer uma dissertaçã o sobre a integra ção escolar das crianç as ismaelitas
em Lisboa. Neste caso poderá elaborar as suas listas bibliográficas usando
uma tipologia deste género: integração escolar, desenvolvimento da crianç a,
islamismo/ismaelitas, Sociologia Urbana, Sociologia das Migrações, etc., para
além naturalmente do título sempre presente de metodologia.
• Com os dados anteriores coligidos solicite a opinião do documentalista da
instituição.

2.2. Explora çã o do texto

Uma vez feita a dupla triagem de informa ção acima referida - a dos locais onde procurar
e a das unidades de informação a selecionar (monografias artigos, relatórios, etc.), a fase
seguinte consiste na exploração destas últimas.

A economia da leitura
Também esta operação deve ser efetuada com algumas preocupações económicas,
tendo em atenção o reduzido tempo disponível para a pesquisa. Não se fique, com isto,
com a ideia que o autor é um tecnocrata empedernido com exclusivas preocupações
de engenharia social. Bem pelo contrário, ele tem defendido o extraordinário valor das
leituras e conversas vadias (parafraseando Agostinho da Silva), como catalizadores de
inovação e de processos cognitivos divergentes. A questão que aqui estamos a debater,
no entanto, é bem específica: não se trata de uma pesquisa qualquer, é uma dissertação
de mestrado que dispõe de um tempo muito limitado para ser realizada requerendo
cuidados particulares de gestão desse recurso tão escasso. Por outro lado, não se pense
que esta estratégia espartana obedece apenas a uma opção de mal menor: baseia-se
na convic ção que a interiorização de uma disciplina rigorosa de seleção de informação

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e de gestão de tempo não reduz a criatividade mas aguça -a, desde que o investigador
mantenha a abertura de espírito, pordo-a ao serviço do processo de investigação.

Estratégias de explora çã o de texto


Neste contexto de preocupações, não parece muito eficiente que o estudo de uma
monografia ou de um artigo seja feito sem interrupções, do princípio ao fim. Se o fizermos
arriscamo-nos a ler muita informação inútil para o nosso trabalho o que não só gasta
tempo como produz ruído ínformacional.

Eis algumas sugestões que a experiência tem legitimado:


• Comece por observar atentamente o título da unidade de informação ( artigo,
monografia ou outra qualquer). Se por vezes é mal escolhido ou não tem
grande valor como informação, a maior parte das vezes funciona como cartã o-
-de-visita do documento em causa, fornecendo elementos valiosos sobre o seu
conteúdo— .
• O nome do autor, naturalmente fornece indica ções sobre a qualidade do trabalho,
partindo do conhecimento do valor de trabalhos anteriores da sua autoria. Há,
no entanto, que usar este critério com alguma reserva para que não sejamos
induzidos por efeitos de haloM.

• A data e o local das várias edições dão-nos elementos valiosos sobre o contexto
espácio-temporal em que ocorreram o que nalguns casos, particularmente
quando se examinam obras clássicas com vá rias edições, é extremamente
importante para o entendimento do documento.

• O nome do editor é por vezes um indicador de fiabilidade do documento.

29
Grande parte dos títulos são descrições sintéticas dos conteúdos, apresentadas de forma direta
.
ou metafó rica Um exemplo de metá fora extremamente sugestiva escolhida para título é o da
clá ssica investigação de Ruth Benedict sobre a cultura japonesa: O Crisântemo e a Espada ,
que espelha a dicotomia dialética omnipresente naquela cultura, entre o culto da estética,
da harmonia e da paz interior simbolizadas pela flor, e a exaltação de tudo o que a espada
simboliza: a violência e a desvalorização do indivíduo como fenómeno que não se repete.
30
O efeito de halo é a tendência de valorizar um determinado fenómeno, situação ou resultado
presente, de acordo com informações passadas e não de acordo com o quadro atual Este .
efeito, pode fazer com que um bom aluno que deixou de o ser demore a baixar as notas
pelo facto dos professores ainda o verem como bom aluno, assim como pode fazer com que
um investigador fascinado pelo brilhantismo { ou pela sua falta) da obra anterior de um dado
autor, classifique uma dada obra atual de acordo com a imagem que dele retém de trabalhos
anteriores.

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I. Visão Panorâ mica

• Das badanas (orelhas) e da contracapa dos livros podemos extrair uma visão
resumida sobre o autor e a obra (da responsabilidade do editor), pelo que
devem ser examinadas com cuidado.

• Abrindo o livro, o primeiro elemento a observar com cuidado é o índice que


fornece informa ções interessantes sobre a estruturação do trabalho.

• Seguidamente, e provavelmente só após observar com cuidado as conclusões e


a introdução, o investigador deve selecionar os capítulos ou os fragmentos de
texto que quer examinar cuidadosamente por serem os pertinentes para o seu
objeto de estudo.

A exploraçã o de um artigo ou de uma monografia é assim um processo não contínuo


mas helicoidal em que o investigador mergulha Q.B. naquele mar de informação a fim
de extrair apenas a que necessita.

2.3. Registo de dados

A questão que a seguir se põe é a de criar um bom sistema de registo de dados. Já em 1964
afirmava o grande mestre de investiga ção histórica que foi o Professor Silva Rego:

"(...)Vão longe os tempos - felizmente - em que se anotavam no mesmo caderno


apontamentos dos mais variados assuntos: históricos, literários art í sticos, etc. Hoje
reconhece-se a absoluta necessidade de colocar as notas em folhas volantes, em
fichas, fáceis de distribuir e de classificar." ( Rego, 1964: 61).

Com o desenvolvimento da informática, o suporte de registo de dados documentais


diversificou-se. Havendo quem ainda prefira usar fichas em cartolina ou em folhas soltas
de papel, começa a observar-se certa tendência para o registo direto em bases de dados já
preparadas para o efeito ou formatadas por medida pelo próprio investigador. A vantagem
deste segundo tipo de suporte é a de se poupar tempo e melhorar a qualidade da gestão da
informação registada, permitindo procedimentos de busca, classificação, análise e uso dos
dados disponíveis, muito mais rápidos e por vezes mais rigorosos. Parece prudente, todavia,
não ceder a tentações de novo-riquismo tecnológico, com uma conversão demasiado
apressada aos novos suportes. Também aqui o critério económico é determinante: cabe
ao investigador pesar os custos (em tempo, sobretudo) dessa aprendizagem tecnológica
e compará-los com os benefícios esperados. Uma coisa é certa: um sistema de registo
de dados nã o é mais do que um instrumento de trabalho que o investigador pode e deve
personalizar. Referindo-se às fichas, dizia o supracitado autor:

"(...)o que se deseja é que cumpram o seu dever e que sirvam docilmente o seu
dono e senhor ( ...)".

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Existem dois tipos de fichas particularmente úteis a quem está a fazer uma dissertação,
as fichas bibliográficas e as fichas de leitura. As primeiras contêm a identificação básica
do documento enquanto que as segundas, como o nome indica, registam o resultado de
um trabalho de tratamento, análise e síntese de informação.

Fichas bibliográ ficas


Apesar da sua função eminentemente instrumental recomendar uma adequa çã o
personalizada, há elementos informativos que todas as fichas bibliográ ficas devem possuir,
funcionando como uma espécie de bilhete de identidade do documento. As normas que
a seguir se enunciam são as que se têm usado na Universidade Aberta e que se têm
mostrado adequadas aos tipos de pesquisa até agora efetuadas— .

Três tipos de documentos sã o habitualmente objeto de fichas bibliográficas: monografias,


artigos de revistas e unidades (partes, capítulos e secções) de obras coletivas.

Um formato que se tem revelado adequado a uma ficha bibliográ fica que pretende
identificar uma monografia é o seguinte: apelido do autor, primeiro nome (data de edição),
título da obra, local da edição, editora, outras observações (exemplo 1).

Exemplo 1
GRAWITZ, Madeleine (1993 ), Méthodes des sciences sociales, Paris, Dalloz,
870 pp., com um excerto da lição de abertura do Cours de science sociale (1888)
de E. Durkheim, prefácios da autora às Ia e 9 a edições.

Chama -se a atenção para os seguintes pormenores:


• O último apelido do autor pode ser registado em maiusculas ou não, seguido
do respetivo nome; no entanto, e isto aplica-se a qualquer outra indicação, o
critério de registo deve ser uniforme para todo o trabalho;

* Quando se trata de uma obra de autoria coletiva é costume adotar-se os


seguintes critérios:
- até três autores, mencionam-se os três nomes separados por ; (exemplo
2):
Exemplo 2
ABADIA, António Farjas; COLLAZO, Carmen Madrigal (1989), Sociologia del
Estudiantado y Rendimiento Académico, Madrid, UNED.

- para mais de três autores mas com um principal, basta mencioná - lo e


acrescentar et al. (e outros) (exemplo 3):

31
Há outras normas que habitualmente se encontram na bibliografia consultada, como a APPA e
a Norma Portuguesa.

© Universidade Aberta 67
I. Visão Panorâ mica

Exemplo 3
DOERFERT, Frank et al. (1989), Short descriptions of selected distance
education institutions, Hagen, FernUniversitat.

- para mais de três autores com a menção de um coordenador ou editor,


regista-se o nome da figura pivot seguida da indicaçã o abreviada (coord, ou
ed.) do seu papel (exemplo 4):
Exemplo 4
BOUDON, Raymond, coord. (1990), Dicionário de Sociologia, Lisboa, D.
Quixote.
- para mais de três autores sem menção de um coordenador ou editor, anota-
-se a designaçã o AAW (autores vários) ou WAA (vários autores) ( exemplo
5):
Exemplo 5
AAVV, (1990), Ciências da Educaçã o em Portugal, Porto, Sociedade
Portuguesa de Ciências da Educa ção.

• Nos exemplos anteriores a data foi colocada entre parêntesis a seguir ao


autor, por se revelar um elemento de interesse imediato; há muitos autores, no
entanto, que preferem colocá- la no fim ou sem ser entre parêntesis.

•O título, campo seguinte, dada a sua importância identificadora costuma


frequentemente ser destacado, umas vezes a negrito, outras a itálico, outras a
sublinhado, outras ainda iniciando os nomes e verbos por maiuscula; também
aqui o importante é usar um critério uniforme.

• O local de edição e a editora (sem ed.), devem aparecer em seguida; quando


se trata de uma coediç ao ou de um livro publicado simultaneamente em vários
locais, essa informa ção deve figurar separada por uma barra (exemplo 6):
Exemplo 6
CEREZO, Sérgio Sánchez (coord.) 1983, Diccionario de las Ciências de la
Educación, Madrid, Diagonal/ Santillana .

• Nalgumas bibliografias torna-se útil, como elemento informativo adicional, fazer


referência ao número de páginas da obra.

• As outras observações sã o separadas por vírgulas sem qualquer parêntesis.


• Para mencionar um departamento (Serviço, Divisão, etc.) pertencente a um
organismo de maior dimensão, este último aparece em primeiro lugar separado
com um ponto da unidade orgânica dependente; por exemplo, uma publicação

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I. Visão Panorâ mica

editada pelo Centro de Estudos de Migrações e Relações Interculturais da


Universidade Aberta, ficará registada Universidade Aberta . CEMRI.

* Quando falta alguma informação bibliográfica essencial a ficha deverá registar


esse facto (sem autor = anónimo; sem data = s/d; sem título = sem título; sem
editor = s.n.; sem local de edição = s.l.

Para artigos de revistas ou outras publicações periódicas, o formato usual de uma ficha
bibliográ fica é o seguinte: apelido do autor, primeiro nome (data de edição), título da
obra, nome da revista entre aspas, local da edição, editora, volume (n ), data, localização
°
(pp. xx-yy), outras observações (exemplo 7):
Exemplo 7
COSTA, A. Bruto da (1984), Conceito de Pobreza, "Estudos de Economia",
Lisboa, (3), Abril-Junho, pp. 275-295.

Quando se trata de unidades (partes, capítulos e secções) de obras coletivas, a ficha


bibliográ fica deve conter os seguintes elementos: apelido do autor, primeiro nome (data
de edição), título da obra, a designa ção in, título da obra coletiva entre aspas, autor(es)
da obra coletiva, local da edição, editora, outras observações ( exemplo 8):
Exemplo 8
CÂMARA, J. Bettencourt da (1986), A III Revoluçã o Industrial e o Caso
Português, in AAVV, "Portugal Face à III Revolução Industrial; Seminário dos
80", Lisboa, ISCSP, pp. 63-111.

Há casos em que é necessário fazer registos de legislação. Nessas circunstâncias, a


ficha deve conter os seguintes elementos: tipo de norma ( Constituição, Lei, Decreto-Lei,
Decreto, Portaria, ou Despacho), código (numérico ou alfanumérico), data, autor, fonte
em que foi publicada e conteúdo resumido. No caso de se tratar de uma publicação em
Diário da República, h á que identificar claramente o seu número, data de publicaçã o e
série (exemplo 9):
Exemplo 9
Despacho n° 98/R/91, de 12 de agosto, do Reitor da Universidade Aberta, DR
II Série n 199 de 30 de outubro. (Cria o Regime de Disciplinas Singulares para
°
Professores)

Em qualquer dos casos anteriores é fundamental nao deixar de registar na ficha bibliográfica
a identificação do centro de documentação onde foi consultado o documento e a respetiva
cota, precaução que prevenirá perdas de tempo em futuras consultas.

© Universidade Aberta 69
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Fichas de leitura
Enquanto que a ficha bibliográ fica contém apenas a identifica ção do documento, a ficha
de leitura integra já um valor acrescentado, fruto do trabalho do investigador. Neste tipo
de ficha é comum :
• Resumir parte do que se leu
• Citar passagens consideradas importantes
• Anotar ideias que surjam como eco da reflexã o sobre o texto (Rego, 1964:
65).

O trabalho de resumo é uma operação complexa que exige um bom treino. No sentido de
gerir o melhor possível o tempo disponível, é conveniente o hábito de escrever diretamente
no processador de texto os resumos da documentação estudada32.

É claro que isto só é exequível quando os documentos estejam no mesmo local do


computador. Existem já bastantes bibliotecas com computadores à disposição dos
utilizadores e alguns destes que possuem computadores portáteis. Sempre que possível
vale a pena registar diretamente a informação no computador o que permite não só um
único registo de informa ção mas também a possibilidade da sua posterior utilização em
texto definitivo. Quando se resume uma dada unidade de informação, interessa ter sempre
presente o objetivo da recolha de dados uma vez que um resumo é um ato de seleção
da informação pertinente e só dessa .

As cita ções deverão figurar na ficha entre aspas, com o local de onde foram extraídas
devidamente identificado (obra e página, mesmo em relação aos documentos nã o
publicados). (...)—

32
Lima alternativa ao resumo em texto corrido é a diagramação da informação, sob vários
formatos (mapas conceptuais, vês heurísticos, fluxogramas etc.), conforme se salientou no
ponto 3 da unidade 2. Este modo de desempacotar conhecimento obriga um esforço maior de
análise mas, em contrapartida, permite uma aprendizagem mais significativa dos conteúdos
em questão .
33 Deve haver um particular cuidado no registo das citações, não só por imperativos de rigor
científico, mas também por razões de natureza legal, uma vez que o uso indevido de texto
alheio sem a enunciação da fonte configura o crime de plágio, punido pela lei geral e pela
Academia. Nunca é demais sublinhar que, para além de constituir uma fraude e, por isso
constituir um ato eticamente condená vel, o plágio exprime um comportamento cientificamente
estúpido, uma vez que a citação da fonte é usualmente valorizada pela Academia.

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Os comentários e ideias do investigador deverão ser cuidadosamente anotados na ficha de


leitura, enquadrados por um sinal convencional, por exemplo com um P de particular — .

A organiza ção espacial da ficha pode ser de v árias formas de modo a preencher
adequadamente os requisitos da pesquisa, Tanto pode apresentar-se sob a forma de um
texto corrido (neste caso é fundamental distinguir claramente a identificação do documento
e os três tipos de elementos que se acabam de enunciar) como podem reservar espaços
próprios para cada tipo de informação como o exemplo 10 mostra:

Exemplo 10
Identificação da obra

Comentários pessoais Resumos

"{... jcitações (pág. n)"

Sistemas de classificação
Quanto maior o volume de informaçã o registado mais se torna premente um bom
sistema de classificação dessa mesma informação: à velha classificação decimal universal
(CDU) sucedeu um conjunto diverso de sistemas que usam palavras-chave para descrever
sinteticamente um dado documento (por isso mesmo chamadas descritores). No exemplo
11, observa -se que a ficha bibliográfica selecionada apresenta treze descritores, a que
corresponderiam se o suporte fosse de papel ou cartolina, treze diferentes fichas. Como
neste caso o ficheiro é em suporte informático, sempre que a base de dados for interrogada
com um dos referidos descritores a ficha será selecionada. Num suporte ou noutro os
sistemas de descritores permitem um trabalho muito mais produtivo.

Exemplo 11
Miranda, Joana Catarina Tarelho de (1994), Grupos étnicos em Portugal. Os
estereótipos dos "portugueses", Lisboa, s.n., 197 pp, tese de mestrado em
relações interculturais.
Psicologia Social, Interculturalismo, Comportamento, Juventude, Identidade,
MRI, Questionários, Grupos étnicos, Portugal, Relações intergrupos, Estereótipo,
Racismo, Xenofobia.

34
(Rego, 1964: 66). Sobre as vantagens de um bom arquivo de ideias a partir de fichas de
leitura, vale a pena ler a já clássica A Imaginação Sociológica , (Mills, 1969), sobretudo o
apêndice intitulado O Artesanato Intelectual.

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2.4. Documentos oficiais

Para muitos estudos torna -se necessária a consulta de documentos oficiais que podemos
tipificar em dois grupos: as publicações oficiais e os documentos não publicados.

Publica ções oficiais


O Diário da Rep ública é uma fonte riquíssima de informações para variados estudos— dado
ser o órgão oficial em que se publicam as principais normas jurídicas. Ao desenvolver a
sua pesquisa documental, o investigador deve ter em conta, não só a análise da primeira
e da segunda séries, em que se publicitam leis, decretos-leis, portarias bem como diversos
despachos e atos administrativos, mas também a da terceira série em que se publicitam
diversos normativos respeitantes a entidades não estatais e à relação do aparelho de
Estado com a sociedade civil (E.g.: concursos públicos).

Também o Diário das Sessões da Assembleia da República constitui uma fonte essencial
de informa ção. Se, através do Diário da Repú blica (antigamente chamado Diário do
Governo), o investigador tem acesso às principais decisões e delibera ções dos órgãos do
Poder Político e Administrativo, analisando o Diário das Sessões perceciona a dinâmica
da construção de deliberações em sede de Parlamento. Imagine-se, por exemplo, que
se está a estudar a política portuguesa relativamente aos refugiados. Neste caso, é tão
importante analisar o quadro normativo vigente através do estudo da legisla ção publicada
em Diário da República, como investigar a posição dos diversos partidos sobre o assunto.
Este segundo aspeto da questão pode ser clarificado fazendo a análise de conteúdo do
Diário das Sessões, no respeitante aquelas em que a legislação sobre os refugiados foi
debatida e aprovada.

Tal como as fontes anteriores, as publica ções oficiais oriundas da Administra ção Central
(Ministérios e Secretarias de Estado), Regional (dos Órgãos descentralizados das Regiões
Autónomas) e Local (dos municípios) podem fornecer informações interessantes ao
investigador.

Documentos não publicados


Muitas vezes, há necessidade de recolher informação em fontes oficiais não publicadas
(regulamentos, circulares, normas internas, etc.). Nessas circunstâncias, é frequente
depararmo-nos com algumas dificuldades uma vez que o acesso aos arquivos públicos

35
Um exemplo ilustrador é a dissertação de doutoramento de João Pereira Neto que utiliza como
principal fonte para o estudo da política portuguesa de integração racial o Boletim Oficial de
Angola, publicação com funções equivalentes às do, então, Diário do Governo ( hoje Diário
da República) para aquele território. NETO, João Pereira (1964), Angola: Meio Século de
Integração, Lisboa, ISCSPU.

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é condicionado36.

Na espectativa de ter de recorrer a arquivos públicos, o investigador deve, por isso munir-se
de uma prévia autorização dos respetivos decisores para o que lhe é conveniente possuir
uma credencial passada pelo orientador da dissertação ou pela instituição que legitima
a sua investigaçã o.

Atividade 3.3
• Faça uma lista da legislação que pensa utilizar na sua dissertação. Seguidamente
abra uma pasta com separadores (1, 2, 3, ... n) e com uma folha de rosto com
o respetivo índice. Sugiro que registe a identificação completa da legislação
no índice da pasta, de acordo com o exemplo 9.
• Faça idêntico trabalho relativamente ao Diário das Sessões, a outras publicações
oficiais e a fontes oficiais nã o publicadas identificando-as de acordo com os
exemplos atrás mencionados.

2.5. Estatísticas

As estatísticas podem também ser excelentes fontes de informaçã o. No entanto, há que


ter consciência que não passam de simples instrumentos ao serviço do investigador tendo
potencialidades e limitações e devendo ser usadas adequadamente como qualquer outra
ferramenta.

Virtualidades
Dados provenientes de Censos, de Anuários ou de Estatísticas Especiais, podem constituir
elementos valiosos por exprimirem grandes tendências nos campos demográ fico, social,
económico e cultural, de outra maneira dificilmente percecioná veis.

Por outro lado as estatísticas fornecem de forma económica, informação sobre grandes
agregados populacionais, permitindo visões de conjunto indispensáveis a quem pretende
entender certos fenómenos sociais complexos numa perspetiva holística.

Limita ções
Ao recorrer à s estatísticas, o investigador deve ter em conta diversos aspetos que
condicionam o seu uso.

36
O fenómeno a que Adriano Moreira chama clandestinidade do Estado (1979, Ciência Política,
Lisboa, Bertrand) traduz-se, mesmo nos Estados em que a Democracia tem fortes raízes, num
manto secreto e/ou sagrado com que a informação é coberta face aos cidadãos exteriores
ao aparelho de Estado, o que naturalmente dificulta o trabalho de qualquer investigador.
Isto, apesar da legislação conducente a dar maior transparência ao trabalho da Administração
como, entre nós, o Código de Procedimento Administrativo.

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Em primeiro lugar as estatísticas são concebidas por pessoas, com critérios de categorização
e arrumação discutíveis, nem sempre suficientemente explícitos. Polémicas frequentes
em torno do modo como se concebem e analisam as taxas de inflação e de desemprego,
mostram que nem sempre a fundamenta ção conceptual das estatísticas é consensual,
permitindo margens de interpretação demasiado amplas para serem fiá veis em termos
absolutos.

Em segundo lugar há que não esquecer que, por vezes, as estatísticas sã o concebidas
não para clarificarem a realidade mas para justificarem prévias interpretações sobre essa
mesma realidade. A posição do investigador perante os dados estatísticos deve ser, por
isso, acompanhada de uma atenção crítica constante, sobretudo no que respeita aos
critérios de categorização e de c álculo. Um exemplo: há anos, alguns decisores políticos
pretendiam privatizar diversas instituições de educação especial com o argumento destas
terem um custo unitário mais elevado que as particulares. Quando interrogados sobre a
base de cálculo do indicador custo per capita de cada estabelecimento informaram- nos
que se baseava na seguinte fórmula :

Cpc = CT/U, em que

Cpc era o custo per capita, CT correspondia ao custo total da instituição e U ao número
de utentes.

Não tendo qualquer objeçã o quanto ao numerador da fórmula (custo total), tivemos
ocasião de salientar que a base de cálculo do denominador estava subvalorizada uma
vez que muitas instituições oficiais, para além dos utentes permanentes, tinham utentes
incluídos em programas especiais— .

Em terceiro lugar os conceptores das estatísticas não têm os mesmos interesses que os
investigadores o que os leva a não terem em conta os mesmos critérios classificatórios. A
simples categoriza ção de grupos culturais inserta na base de dados Entreculturas ilustra

37
Um caso que acompanhámos de perto e que agora pode servir de exemplo foi o do Instituto
Antó nio Feliciano Castilho . Para além das cerca de sessenta crianças deficientes visuais e
multideficientes que eram acompanhadas em permanência, a instituição tinha programas
especiais de reabilitação para cerca de doze jovens (média anual) que tinham perdido a visão
há pouco e a quem era prestado do mesmo modo apoio sob a forma de acompanhamento
psicológico, técnicas de locomoção, atividades de vida diária (AVD) e iniciação ao Braille; por
outro lado, funcionava como centro de formação e de estágio para cerca de cem profissionais
por ano (professores, terapeutas ocupacionais e da fala, psicólogos e assistentes sociais).
Somando os 112 utentes referidos ao denominador, provou- se que aquela instituição oficial
tinha um custo mais baixo que outras instituições particulares com idênticas valências .

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as dificuldades que se podem encontrar nestes domínios, sublinhando o cuidado com que
as estatísticas devem ser manipuladas3®.

Princípios orientadores
Em função do exposto constituem medidas de prudência:
• escolher como fontes estatísticas as provenientes de instituições credíveis;
• mesmo neste caso, refletir criticamente sobre o modo como os indicadores
foram concebidos e calculados ( cfr. nota 3 do capítulo anterior);

• utilizar a imagina ção sociológica para tirar partido das estatísticas, cruzando
a matéria prima informativa desta proveniência com informações oriundas de
outras fontes documentais e obtidas com base noutras técnicas de recolha de
dados (ex: observação e inquérito por entrevista e por questioná rio).

Atividade 3.4
• Fa ça uma lista das estatísticas que pensa utilizar na sua dissertaçã o.
Seguidamente abra uma pasta com separadores (1, 2, 3, ... n) e com uma
folha de rosto com o respetivo índice. Registe a sua identificaçã o no índice
da pasta .
• Reflita sobre cada um dos indicadores interrogando-se sobre a credibilidade
das fontes, o modo como foi construído e se corresponde à s suas necessidades
de investigação. Registe em tópicos o resultado da reflexã o pois irá ser-lhe
útil como memorando na análise de dados e na posterior fundamenta ção
metodológica.

2.6. Documentos pessoais

Autobiografias, diários, correspondência, dissertações académicas nã o publicadas—


e outros documentos pessoais, constituem também valioso património ao serviço do
investigador. O estudo de Thomas e Znaniecki, no âmbito do que é designado por Escola
de Chicago, feito em 1919 sobre os camponeses polacos que emigraram para os Estados
Unidos ilustra com clareza a riqueza e também as limitações deste tipo de documentos.

38
Sobre o caso concreto da base de dados Entrecuituras, vale a pena ler uma elucidativa reflexão
em CORDEIRO, Ana Paula (1993), Grupos Culturais Minoritários: Universo e Situaçã o
Escolar //oMulticulturalismo e Educação: O Contributo da Comunicação Educacional
na Implementaçã o de Prá ticas Educativas Interculturais, Lisboa, Universidade Aberta,
dissertação de mestrado em Comunicação Educacional Multimedia, pp. 74-111.
39
Seguimos aqui a categorização de Jahoda et al (1967) que integram as dissertações académicas
não publicadas nos documentos pessoais (a literatura cinzenta atr á s referida).

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Pretendendo fazer luz sobre a teia de experiências de um emigrante desde que toma a
decisão de procurar outras paragens para viver até à sua integra ção definitiva (ou não) na
sociedade de acolhimento, aqueles autores assentaram a sua investigação na análise de
dois tipos de documentos pessoais: cartas a que tiveram acesso e relatos escritos pelos
próprios emigrantes em que era descrita toda a experiência migratória 40.

Virtualidades
0 interesse deste tipo de documentos reside sobretudo em dois aspetos:
• possibilita aceder a informação que não se encontra noutras fontes podendo
extrair-se informação única, sem a qual dificilmente se poderiam entender certas
facetas da realidade social.

• permite dar voz aos que normalmente não a têm, possibilitando a difusão
da versão de acontecimentos e processos sociais relevantes, contados pelos
próprios protagonistas com as suas palavras e estilo.

Não seria possível, por exemplo, entender a complexidade do processo pelo qual um cego-
-surdo pode conseguir vencer o mundo do silêncio e da insularização social e integrar-se
totalmente na sociedade que o rodeia, sem o valioso contributo de Helen Keller que, na
sua autobiografia, descreve a espinhosa caminhada que conseguiu fazer, poderosamente
apoiada numa mestra excecional que foi Anne Sullivan.

O mesmo se poderia dizer, noutros campos, no que respeita, por exemplo, a autobiografias
de emigrantes, refugiados, prostitutas, exploradores, missionários, administradores
coloniais e políticos: possuidores de um património existencial único, não se poderia
entender em profundidade o peso de tal experiência na sua vida e na dos agregados com
os quais interagem, sem o seu testemunho pessoal, por maior que fosse a empatia 41 dos
cientistas sociais.

40
Entre nós, vale a pena referir Pulo Monteiro que utilizou a mesma abordagem para proceder à
aná lise sociológica do abandono de nove lugares agro-pastoris da Serra da Lousã : MONTEIRO,
P. (1985), Terra que Já Foi Terra , Lisboa, Edições Salamandra.
41
Utilizamos o termo empatia no sentido rogeriano do termo, expressando a ideia de o
investigador entender o modo como o Outro (neste caso o investigado) vê e experimenta o
Mundo e a Vida, tendo no entanto consciência que não se é o Outro. Para ilustrar o conceito
de empatia, Gisela Konopka numa obra clássica cita um provérbio índio que diz: Nunca julgue
um homem sem antes ter caminhado com os seus moccasins durante uma lua. KONOPKA, G.
(1972) Servi ço Social de Grupo: Um Processo de ajuda, Rio de Janeiro, Zahar, 2a edição,
da edução original de 1963, pp. 111-112.

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Podemos encontrar variados exemplos, mais recentes, de cientistas que recorreram


a documentos pessoais para alicerçar a sua pesquisa. É o caso do antropólogo Oscar
Lewis que, após uma longa investigação no terreno sobre aquilo que chamou cultura da
pobreza— , selecionou uma família a que deu o pseudónimo de Sanchez, tendo pedido
a cada um dos seus elementos que contasse a sua história pessoal. O resultado dessa
pesquisa é relatado em duas obras extremamente interessantes que fazem luz sobre o
modo como se vive e morre numa cultura da pobreza— .

Limita ções
O estudo de Lewis permite também ilustrar as limitações dos documentos pessoais
assinaladas por v ários autores. Em síntese é importante ter em conta que:
• como expressões subjetivas dos atores sociais, estão limitados pelos preconceitos,
estereótipos e ideologias dos autores; valendo como testemunhos privilegiados
de quem viveu dada realidade, nã o a retratam com objetividade mas com os olhos
de quem a viveu por dentro, por vezes em situa ções de grande envolvimento
emocional com os inevitá veis filtros percetívos de natureza afetiva e cognitiva;

• por vezes não constituem documentos sociográficos (ainda que subjetivos) mas
autojustificações mais ou menos fundamentadas do comportamento dos autores
(bastante frequente em autobiografias de celebridades);

• dada a singularidade de algumas informações que os integram, é difícil provar


a sua veracidade;

•a análise quantitativa deste tipo de documentos sendo possível atrav és por


exemplo de análise de conteúdo é, no entanto, muito trabalhosa.

Princípios orientadores
Tal como em relação às estatísticas existem alguns procedimentos desejáveis para
tirar partido do valor dos documentos pessoais sem correr demasiados riscos. É, pois
recomendado:
• verificar os factos, sempre que possível, cruzando a informaçã o proveniente de
documentos pessoais com a oriunda de outras fontes documentais ou vivas;

• proceder a uma rigorosa crítica externa, averiguando se o documento terá sido


escrito pelo autor manifesto;

42
. . .
LEWIS, O ( 1968), A Cultura da Pobreza , in Blaustein, A e Woock, R , (organizadores), O
Homem Contra a Pobreza: III Guerra Mundial, Rio de Janeiro, Expressão e Cultura .
43
. .
LEWIS, O (1970), Os Filhos de Sanchez, Lisboa, Moraes, ed original de 1961; Lewis, O .
(1970), A Death in the Sanchez Family, New York, Vintage Book/ Random House.

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• fazer uma cuidadosa crítica interna, cotejando a coerência do texto com a


realidade conhecida, de forma a apurar a sua veracidade. Em caso de prova de
falta de veracidade, indagar se tal se deve à vontade do autor que, neste caso
mentiu sobre os factos, ou a uma deformação decorrente dos seus preconceitos,
estereótipos ou falta de informação, pelo que se aconselha:
- averiguar as intenções do autor ao produzir o documento: descrever,
interpretar ou justificar o acontecimento?
- determinar a distância espacial e temporal que medeia cada relato do
respetivo acontecimento;
- determinar o grau de confidencialidade do documento;
- determinar o grau de familiaridade do autor com a realidade que descreve.

Em suma, poder-se-á dizer com alguma segurança que a informação fornecida pelos
documentos pessoais podendo ser fonte valiosa para a investigação, tem de ser combinada
com a informação proveniente de outras fontes, dadas as limitações acima referidas.

Atividade 3.5
• Faça uma lista dos documentos pessoais que julga útil analisar na sua
dissertaçã o, quer já existentes ( cartas, diários dissertações não publicadas),
quer concebidos por si e propostos a informadores privilegiados (histórias
de vida, relatos pessoais). Seguidamente abra uma pasta com separadores
(1, 2, 3, ... n) e com uma folha de rosto com o respetivo índice.
• À medida que os for consultando faça a sua ficha de leitura (de preferência
diretamente no computador com um software compatível com o processador
de texto que pensa usar na feitura do relatório) e registe a sua identificação
no índice da pasta .
• Registe a sua crítica sobre cada um dos documentos pessoais interrogando-se
sobre a veracidade e credibilidade das fontes, o modo como foi construído e
se corresponde à s suas necessidades de investigação.

2.7. Documentos escritos difundidos

Jornais, publicações, periódicas ou não, produzidas pelos meios de comunicação social,


assim como cartazes, panfletos, graffiti e documentos escritos de natureza diversa,
constituem boas fontes de informa ção, aplicando-se- lhes basicamente os critérios
atrá s mencionados para uma utilização eficaz (crítica externa e interna e verificação de
informa ção através de fontes alternativas).

Relativamente a este tipo de documentos, há que ter em conta as suas particularidades


próprias, nomeadamente o facto de terem diferentes motivações de publicação. Tomemos o

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caso de um jornal: o mesmo número pode ter unidades de informaçã o com características
diferentes: notícias com a finalidade de informar o público, crónicas cujo objetivo é exprimir
uma opinião sobre determinada situação, artigos claramente apontando para um objetivo
formativo, anúncios com intenções comerciais, institucionais ou políticas, etc.

Se numa crónica, num anúncio ou mesmo num artigo é de esperar uma intencionalidade
do autor que lhe sublinha a sua condição de discurso construído sobre o real mas que
dele por vezes se afasta, no caso da notícia o leitor desprevenido tende a confundi-la
com o real esquecendo que, ao longo do seu ciclo de vida — e ainda que tenha havido
particulares preocupações de objetividade, a informação sofre progressivas filtragens
afastando-se muitas vezes da realidade que pretendia descrever. O investigador tem de
estar consciente de todos estes fatores para os poder ponderar devidamente na análise
da autenticidade e validade dos dados.

O jornal como fonte de dados


Dada a importância que assume na investigação documental, o jornal merece uma reflexão
um pouco mais detalhada. Quando se debruça sobre um jornal com o intuito de o analisar
o investigador quer frequentemente atingir um de três objetivos:
• colher informações brutas sobre um dado fenómeno social;
• salientar o conteúdo da informação difundida;
• revelar o tipo de impacto que dado tipo de informaçã o difundida tem sobre os
segmentos de opinião.

Já vimos que o primeiro objetivo deve ser visto com alguma reserva uma vez que a
informa ção difundida é o resultado de sucessivas decantações que lhe podem alterar a
fiabilidade. Por seu turno a questão da análise de conteúdo será referida na segunda parte
deste Manual. Salientemos entã o muito sucintamente alguns aspetos a ter em conta na
análise de impacto de uma unidade de informação.

Aná lise de impacto


Para fazer uma ideia aproximada do impacto de uma dada unidade de informação (UI),
seja ela notícia, crónica, artigo, anúncio ou outra qualquer, há que ter em conta algumas
variá veis:
• o nome do jornal fornece informações sobre o controlo a que está sujeito (por
parte de agentes pú blicos ou privados, de grupos de interesse ou de pressão,

44
O ciclo de vida de uma notícia começa com a recolha da informação, passando por um
complexo processo de verificação, elaboração, paginação, difusão, receção e reação dos
diversos segmentos de opinião terminando com a sua morte por esquecimento .

© Universidade Aberta 79
I. Visão Panorâ mica

de partidos políticos ou de movimentos sociais, etc.);

•a data da difusão permite avaliar a importância dada pela opinião pública à


informação difundida comparando-a os relatos de acontecimentos ocorridos
na mesmo altura ( que podem contribuir para sublinhar ou neutralizar o seu
impacto);

• a página em que a UI é colocada é um bom indicador do seu impacto. Com


efeito, apesar da hierarquizaçã o das páginas variarem ligeiramente de jornal
para jornal, é relativamente consensual a seguinte hierarquia: primeira, última,
centrais, ímpares e finalmente, pares;

• o lugar que a UI ocupa na página é também normalmente hierarquizado dando-


-se maior importância às que se situam em cima e nas colunas da esquerda.
•a grandeza do título constitui um indicador de bastante importância dada a
competição existente entre as várias UI relativamente à atenção do leitor;
tal grandeza deve ser vista tanto em valor absoluto (número de colunas que
abrange, altura e superfície) como relativamente à dimensão dos outros títulos
da pá gina;

• no que respeita ao conteúdo do título há que ter em conta a concordância ou


não com o texto, a acentuação de determinadas ideias mestras, bem como a
vizinhança de títulos que neutralizem ou sublinhem a mensagem daquele.

Na seleção da mensagem a ler o leitor é normalmente recetivo à apresenta ção da mesma .


Assim, para avaliar o grau de impacto que uma UI tem no público, há que ter em conta
também as variáveis seguidamente listadas:
• Ilustrações. A notícia é acompanhada de ilustrações? Se é, de que tipo? (fotos,
diagramas, desenhos, caricaturas, tabelas, gráficos, etc.) Que superfície absoluta
e relativa ocupam? Qual o conteúdo das mesmas? (Concordam ou neutralizam
o texto; têm dinamismo; a legenda forma um todo adequado com a ilustração
e com a UI no seu conjunto?)

• Tipografia. A UI está dividida em partes com carateres diferenciados?


Sublinhados? Caixas?

• Estrutura. Está a mensagem contida numa só página ou fragmentada em duas


ou mais? Está subdividida em unidades inteligíveis? Tem lead45? Qual o seu
conteúdo e coerência relativamente ao conjunto?

45
O lead ê a síntese que não excede normalmente as trinta palavras apresentada imediatamente
a seguir ao título.

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I. Visão Panorâ mica

• Origem. Qual a origem da informaçã o? (Agência informativa; corpo redatorial;


outro órgão de informa ção; cidadãos comuns; entidades oficiais; etc.)

• Seleção. Que aspetos dos factos conhecidos pelo investigador foram sublinhados
ou omitidos?

Relativamente aos jornais em formato digital, as variáveis atrás assinaladas devem ser
tidas em conta com as devidas adaptações (por exemplo, em vez do nú mero da página
em que está inserida a unidade de informação, poder-se-á considerar que esta terá tanto
mais impacto, quanto menos diques obrigar o utilizador a fazer, ou seja, quanto mais
fácil seja o acesso).

3. DOCUMENTOS NÃO ESCRITOS

3.1. Objetos

Sendo o objeto uma criaçã o cultural, em certo tipo de investigações, como as de índole
antropológica, há necessidade de proceder à sua recolha e análise. Através do estudo
dos objetos pode reconstituir-se a estrutura e o funcionamento de um dado agregado
social.

Não cabendo neste Manual o aconselhamento de investigadores em matéria de recolha


deste tipo de material— chama-se a atenção para o facto de qualquer objeto observado
com relevância para o estudo dever ser devidamente catalogado e analisado. Uma forma
típica de iniciar este processo é fazer uma espécie de ficha de leitura com os seguintes
elementos: descrição, localização no espaço e no tempo, funcionalidade.

O mesmo objeto pode desempenhar diferentes funções em culturas diferentes. Um


exemplo vivenciado no início dos anos setenta ilustra bem esta afirmação: surpreendida
com o grande nú mero de recetores de televisão que detetou num bairro de lata, uma
equipa de investigadores descobriu que a TV era usada sobretudo como meio de controlo
social. Com efeito, uma desculpa frequente das jovens adolescentes para saírem à noite
era irem ver a televisão ao clube do bairro. Sabendo que aquele local era um centro de
aliciamento de adolescentes para a prostituição, muitos pais com um enorme esforço

46
Este tipo de aproximação é mais próprio dos arqueólogos e dos antropólogos culturais que
estudam culturas tradicionais. Numa dissertação sobre Relações Interculturais provavelmente
o investigador observará objetos e classificá -los-á mas não necessitará de os recolher. Para
quem precisar de o fazer é recomendável a leitura de um livro dessas especialidades. Cfr. por
exemplo Mauss, Mareei (s/d) ou Ribeiro (2003).

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I. Visão Panorâ mica

financeiro que implicava por vezes endividarem -se, compravam um televisor para reterem
as suas filhas em casa — .
3.2. Registos de som e de imagem

A análise de informação de registos de som e de imagem bem como a que existe em suporte
informático requer uma especialização que não cabe no âmbito deste manual. No entanto,
para quem necessite de analisar informação nestes tipos de suporte, recomenda -se:
• a leitura atenta da bibliografia da disciplina de Antropologia Visual do Mestrado
em Rela ções Interculturais da Universidade Aberta, nomeadamente Ribeiro
(2003);

• os mesmos procedimentos relatívamente às correspondentes cadeiras do


Mestrado em Comunicação Educacional Multimedia da mesma Universidade;

S í ntese

Neste capítulo procurou-se apresentar um conjunto de recomendações que permitem


realizar uma pesquisa documental mais adequada e eficaz. Salientou-se, seguidamente,
a necessidade de proceder a uma seleção de informa ção por aproximações sucessivas,
de a registar e organizar convenientemente.

Finalmente, foi feita referência a um conjunto de fontes documentais mais utilizadas,


discutindo-se a sua validade as suas limitações e indicando-se alguns procedimentos que
a experiência tem recomendado.

Teste formativo

1. Quais os objetivos da pesquisa documental?

2. Porque se pode comparar o processo de investigação a uma corrida de estafetas?

3. Em que consiste a estrat é gia das aproxima ções sucessivas na pesquisa


documental?

4. Que vantagens existem, para o investigador, da consulta de enciclopédias, dicionários


e vocabulários especializados?

5. Enuncie cinco critérios possíveis a utilizar pelo investigador quando recorre a uma
base de dados.

47
CARMO et al (1971), Estudo Exploratório de um Bairro de Lata de Lisboa, Lisboa, s.n.

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I. Visão Panorâ mica

6. Que suportes de documentação escrita conhece?

7. O risco de desnorteamento é constante em pesquisa documental. Indique alguns


modos de o evitar.

8. A figura do doeumentalista é muitas vezes negligenciada por alguns investigadores.


Explique porquê.

9. Identifique, em tópicos, uma estratégia económica de exploração de um texto.

10. Faç a a ficha bibliográfica de uma monografia, de um artigo e de um capítulo de uma


obra coletiva à sua escolha. Confronte com os exemplos referidos no texto e, se
necessário, corrija.

11. Faç a a ficha de leitura de um artigo è sua escolha de acordo com os critérios atrás
recomendados. Identifique-a através de um conjunto de descritores não inferior a
cinco nem superior a dez.

12. Refira alguns exemplos que provem a utilidade da análise das publicações oficiais
para o investigador.

13. Dê dois exemplos de documentos oficiais nã o publicados e refira um modo de


ultrapassar as dificuldades de acesso à sua consulta.

14. Sumarize as principais virtualidades e limitações do uso das estatísticas bem como
alguns procedimentos a adotar para as usar com maior segurança.

15. Faç a idêntica reflexão relativamente aos documentos pessoais.

16. Faç a uma listagem dos principais fatores a ter em conta na análise do impacto de
uma notícia

17. Refira a importância da análise dos objetos numa investigação sobre a cultura de um
dado grupo social.

18. Se precisar de proceder à an álise de registos de som e de imagem a que fontes pode
recorrer?

Leituras complementares

GRAWITZ, Madeleine (1993), Méthodes des Sciences Sociales, Paris, Dalloz, pp.
503-531.

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I. Visão Panorâ mica

QUIVY, Raymond e CAMPENHOUDT, Luc Van (1992), Manual de Investigação em


Ciências Sociais, Lisboa, Gradiva, pp. 45-67.

SELLTIZ, JAHODA, DEUTCH e COOK (1967), Métodos de Pesquisa nas Rela ções
Sociais, S. Paulo, Herder, pp. 355 -386.

N.B. Algumas universidades permitem a consulta, através do seu sítio na Internet, à


listagem das obras de literatura cinzenta, disponíveis nas respetivas bibliotecas. Esse
procedimento reduz substancialmente o tempo gasto e possibilita o acesso a informação
muito valiosa, não publicada nos circuitos comerciais.

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I. Visão Panorâ mica

Unidade 4 - Técnicas de observação

Objetivos da unidade

No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a :


1. distinguir as operações de olhar e vere de ouvir e escutaratravés da introdução
de procedimentos de atenção que permitem selecionar informa ção pertinente;

2. identificar três condições bá sicas para uma observa ção com qualidade;

3. consciencializar a necessidade de treinar a atenção para aprofundar a capacidade


de observar;

4. definir e discutir o conceito de indicador;

5. dar exemplos do uso de indicadores em diferentes situações;

6. enunciar a utilidade dos indicadores demográ ficos, econ ómicos e sociais;

7. dar exemplos de indicadores sociais qualitativos e quantitativos;

8. identificar as principais funções de um indicador social;

9. definir o que é um indicador social;

10. identificar três modos de conceber indicadores sociais;

11. referir a importância de um guião de observação;

12. identificar quatro tipos de instrumentos de registo da observaçã o;

13. explicitar as vantagens e limita ções de um diário de pesquisa em suporte


informático;

14. fazer uso correto do bloco-notas e do diário de pesquisa;

15. identificar, caracterizar e explicitar as virtualidades e limitações da observação não


participante;

16. identificar, caracterizar e explicitar as virtualidades e limita ções da observação


participante despercebida;

17. identificar, caracterizar e explicitar as virtualidades e limitações da observação


participante propriamente dita;

18. identificar dois elementos relevantes na negociação para a escolha do papel-


observatóricr,
-

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19. explicitar a importâ ncia da identificaçã o do horizonte de cada papel;

20. explicar o modelo da janela de Joharr,

21. identificar as virtualidades e limitações de um mergulho restrito à luz da janela


de Joharr,

22. identificar as virtualidades e limitações de um mergulho profundo à luz da janela


de Joharr,

23. definir observação militante e explicitar as suas limita çõ es num trabalho


académico;

24. identificar alguns problemas deontológicos postos pela técnica de observação.

Nas unidades anteriores foi abordado o planeamento de uma investigação e o processo


de pesquisa documental, tendo entã o procurado também chamar a atenção para a
necessidade de ser tomada, por parte do investigador, uma atitude profissional, o
que o obriga a uma severa disciplina pessoal. O investigador deverá assumir, assim,
o papel de um verdadeiro gestor do projeto de investigação pelo qual é responsá vel,
o que implica delinear rigorosas estratégias de a ção e planear as consequentes tá ticas
de pesquisa.

Na presente unidade procurar-se-á salientar a mesma preocupação, começando por


chamar a atenção para algumas características básicas da observação, técnica que exige
um treino global cuidado e uma adequação específica a cada caso. Seguidamente falar-
se-á de diferentes tipos de observação usuais em Ciências Sociais. Termina -se dando
especial realce à observação participante, pela frequência com que esta técnica é usada,
sublinhando ainda alguns aspetos relevantes no desenvolvimento da sua aplicação.

1. O QUE É OBSERVAR?

Por se tratar de uma palavra banalizada na linguagem comum valerá a pena, antes de
mais, clarificar o que se entende por técnica de observação. Para isso recorrer-se-á a
quatro diferentes contextos em que a palavra é utilizada.

1.1. O testemunho dos deficientes

Em 1977 decorreu no Instituto António Feliciano de Castilho, uma escola para crianças
cegas, em Lisboa, um curso sobre técnicas de locomoção indispensá veis ao dia a dia de
um cego, destinado a sensibilizar para elas os profissionais de educação especial. Dado
tratar-se de um m ódulo de inicia ção, os procedimentos ensinados circunscreveram -se à

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aprendizagem de modos corretos de as pessoas se poderem movimentar sem bengala,


técnica usada em pequenos espaços fechados, em sítios já conhecidos pelo invisual.

Em dada altura, já na fase final do módulo, o grupo foi dividido em pares propondo-se-
-Ihes o seguinte exercício:
• em cada par foi atribuído a um dos elementos o papel de guia e ao outro, o de
cego;

• para o efeito cada um dos que desempenhou o segundo papel foi devidamente
impedido de ver, por colocação de uma venda nos olhos;

• cada par tinha de deambular durante meia hora pelo bairro de Campo de Ourique,
zona onde se situava o local de formação, caracterízada esta por uma quadrícula
de ruas de geometria regular, aparentemente sem pontos de referência para os
forasteiros se poderem orientar;

•o parceiro que desempenhava o papel de guia conduziria o que simulava


ser cego por onde quisesse, observando rigoroso silêncio, preocupando-se
exclusivamente em preservar a sua segurança, usando para isso as técnicas
aprendidas para guiar um cego;

• o segundo, à medida que a caminhada decorresse, iria descrevendo todo o


ambiente circundante com os pormenores que pudesse;

• ao fim de meia hora trocariam de papéis sem comentar a experiência;


• finalmente, em plenário, proceder-se-ia à discussão do exercício.
Os resultados da experiência foram espetaculares: a primeira surpresa revelou-se ao fim
de trinta metros de caminhada, por ter sido reconhecido a chegada a um cruzamento,
pela diferença de correntes de ar e pela mudança significativa de ruídos do trá fego. A
partir daí as descobertas sucederam-se: a perceção de estarmos passando ao lado de um
barbeiro, pelo cheiro a água de colónia e pelo barulho ritmado da tesoura; da estação
de serviço, atrav és do característico cheiro misturado de gasolina e óleo queimado; a
descoberta do lugar pelo cheiro das hortaliças e legumes e pela conversa entre clientes
e lojista, etc.

Na avalia ção do exercício, para além da comprovação de que o invisual tem muito mais
possibilidades de orienta ção espacial do que à partida um normovisua!possa pensar, foi
ainda sublinhada através de uma descoberta por todos experimentada de que ver não
é só olhar e escutar não é só ouvir.

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I. Visão Panorâ mica

Com efeito, este jogo de simulação ilustrou que a capacidade de observar se encontra
frequentemente inibida. A passagem do olhar para o vere do ouvir para o escutar, ou
seja a criação de uma atitude de observa ção consciente passa por um treino da
atenção de forma a poder aprofundar a capacidade de selecionar informa ção
pertinente através dos órgã os sensóriais.

1.2. Os ensinamentos de Baden Powell

A segunda aproximação ao conceito de observação é- nos trazida pelos ensinamentos


de Lord Baden-Powell of Gillwell (1857-1941), fundador do movimento mundial do
escutismo. Tendo servido por raz ões profissionais em várias regiões do Império Britânico
- no Afeganistã o, na índia e mais tarde na África do Sul - aprendeu com os batedores
das unidades a que pertenceu ao longo da sua carreira militar, a tirar partido dos mais
pequenos indícios para poder extrair orientações úteis ao seu trabalho.

Com os pisteiros zulos, sobretudo, desenvolveu e aprofundou a sua notável capacidade


de observar. Com eles aprendeu também a deduzir (através da observação das pegadas,
de ramos partidos de á rvores e arbustos e outros sinais quase impercetíveis para olhos,
ouvidos e narizes menos prevenidos) a passagem de pessoas e animais por vezes ocorrida
muitas horas antes, identificando o seu número e outras características importantes
(tamanho e tipos de animais, contingente e armamento de tropas inimigas, etc.).

No seu escrito fundamental, o Escutismo para Rapazes, em que procurou transmitir


aos jovens escuteiros princípios e procedimentos que considerava essenciais ao forjar
de uma personalidade equilibrada, sublinha a importância das faculdades de observação
dizendo a certa altura:

Uma das coisas mais importantes que um escuteiro— tem de aprender, quer seja
escuteiro de guerra, quer caçador, quer escuteiro de paz, é que nada escape à sua
.
atenção É indispensá vel que veja as coisas mais insignificantes e as interprete .

48
BADEN - POWELL ( 1977), Escutismo para Rapazes, Lisboa, Corpo Nacional de Escutas,
5a edição revista, Ia edição de 1908, pp. 137-150.
49
O termo sroòísignifica literalmente batedor, explorador, observador militar, sentinela avanç ada.
Quando criou o seu movimento juvenil, BP, como carinhosamente os escuteiros lhe passaram a
chamar, passou a designar por scout o jovem pertencente ao movimento, cujas qualidades de
argúcia, coragem generosidade e espírito de serviço pretendia que se assemelhassem às dos
pioneiros e batedores que tivera o privilégio de conhecer ao longo da sua vida . Em português
a palavra foi traduzida por escoteiro (designação adotada pela Associação dos Escoteiros
de Portugal) e por escuteiro ou escuta (tradução convencionada pelo Corpo Nacional de
Escutas).

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Exige-se muita prática para que um novato adquira o hábito de fixar tudo e não
deixar que nada lhe escape à vista. Esta prá tica tanto se adquire na cidade como
no campo.

De igual modo deve notar todos os rumores, ou cheiros especiais, e procurar averiguar de
onde prov êm. Se não se habituar a reparar nestas pequeninas coisas, não terá elementos
para raciocinar e tirar conclusões e pouco valerá como escuteiro.511

Dos ensinamentos de Baden-Powell pode-se extrair uma segunda característica do


conceito de observação: é a de que saber observar, implica confrontar indícios
com a experiência anterior para os poder interpretar.

Para qualquer investigador, este procedimento implica, três operações:


• saber identificar indícios, o que requer um treino continuado da atenção;
• possuir uma experiência anterior adequada, o que implica possuir uma boa
prepara çã o teórica e empírica;

• ter capacidade para comparar o que observa com o que constitui a sua experiência
anterior e a partir daí poder tirar conclusões pertinentes, o que obriga a uma
formação metodológica sólida .

1.3. As lições de Conan Doyle

Qualquer dos exemplos atrás referidos sublinha a importância do treinamento da


observa ção. Recorrendo à ficção, vale a pena trazer à mem ória a imortal figura de
Sherlock Holmes, personagem criada por Conan Doyle que tanta influência teve nos
métodos da polícia científica moderna51. No seu primeiro caso intitulado Um estudo em
vermelho, é significativa a gostosa passagem em que aquela personagem defende este
ponto de vista:

Toda a vida é uma grande cadeia cuja natureza se revela ao examinarmos qualquer
dos elos que a compõem. Como todas as outras artes, a Ciência da Dedução e Aná lise
só pode ser adquirida por meio de um demorado e paciente estudo e a vida não é
tão longa que permita a um morta! o aperfeiçoar- se ao má ximo nesse campo. Antes

50
Baden-Powell, op. cit. pág. 138.
51
BARRETO, Mascarenhas (1985 ), Prefá cio a Doyle, Sir Arthur Conan (1985), Um Estudo em
Vermelho, Lisboa, Livros do Brasil, pp. 42-43. A primeira edição desta obra foi publicada no
Beeton's Christmas Annual de Londres em 1887 tendo sido pela primeira vez editado em livro
-
no ano seguinte, pp. 16 17.

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de passar aos aspetos morais e mentais de um assunto que apresente as maiores


dificuldades, o pesquisador deve principiar por assenhorear - se dos problemas mais
elementares. Ao encontrar um semelhante, aprende a distinguir imediatamente qual
a história do homem e a atividade que exerce. Por mais pueril que este exercício possa
parecer, aguça as faculdades de observação. Pelas unhas de um homem, pela manga
do seu casaco, pelos seus sapatos, pelas joelheiras nas calças, pelas calosidades do
seu indicador e polegar, pela sua expressão, pelos punhos da camisa ... em cada uma
destas coisas a profissão de um homem é claramente indicada. Que o conjunto delas
não esclareça um indagador competente é virtualmente inconcebível— .

1.4. A experiência dos socorristas

A observação é, por conseguinte, um meio indispensável para entender e interpretar a


realidade social. Por maioria de razão se compreende que sem uma observação cuidada,
feita de modo sistemático, não é possível uma intervenção social eficaz. A Medicina já
há muito entendeu isto, investindo muitas das suas energias nas técnicas de diagnóstico
que apelam substancialmente à capacidade do clínico atuar como observador53.

Mesmo em campos elementares como no do socorrí smo, o treino da observaçã o é


indispensável como suporte à ação subsequente. Os exemplos poder-se-iam multiplicar,
bastando agora referir apenas dois para imediata ilustração: o diagnóstico de estado
de choque e o de traumatismo craniano. Chega -se ao primeiro pela observa ção da
temperatura e humidade da pele, pelo ritmo e superficialidade da ventila ção e pelo ritmo
e intensidade da pulsaçã o cardíaca; ao segundo, pela dimensão das pupilas oculares e
pelo aspeto nauseado da vítima. Qualquer destes indicadores são facilmente percetíveis
a um socorrista com um curto treino e o seu conhecimento tem salvo muitas vidas.

Noutros domínios da Ciência Aplicada, sobretudo nos campos das Ciências Sociais e da
Educa ção, não é tão evidente a necessidade de uma cuidadosa observaçã o, uma vez que
facilmente se toma quase como natural aquilo que é culturalmente construído, agindo
muitas vezes os profissionais com base em representações estereotipadas da realidade
social.

Isto acontece, por exemplo, no interior de uma sala de aula, em que o processo de ensino-
-aprendizagem se desenvolve num quadro multicultural com protagonistas apresentando

52
. . . .
Op cit pág 19
53
Mesmo no exercício da Medicina em países aitamente industrializados, as técnicas de observação
revelam -se indispensáveis não só como meio fundamentai de diagnóstico mas também como
instrumento metacognitivo de combate à tecnodependência manifestada por alguns
daqueies profissionais.
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diferenças físicas e culturais visíveis, conhecendo-se mal e muitas vezes chegando mesmo
a recear-se reciprocamente. Daqui decorrem outras duas características importantes no
treino da observação: a capacidade para o observador se distanciar do objeto de
observa ção, ainda que este pertença à sua própria cultura, de modo a ganhar uma
conveniente perspetiva, e a capacidade para interpretar um dado comportamento
à luz da diversidade cultural. É neste contexto que um especialista como Javier Garcia
Castano recomenda :

Entender !o que ocurre en un aula escolar requiere la capacidad metodológica de


dejar de lado las próprias concepciones y estar dispuesto a cuestionar todo lo que
ocurre en ella. (...) La comprensión de lo que es el proceso educativo pasa por ei
conocimiento de la diversidad y variedad de tal proceso entre las también diversas y
variadas sociedades humanas— .
Resumindo os pontos anteriores, pode-se dizer que observar é selecionar informa çã o
pertinente, atrav és dos órgã os sensoriais e com recurso à teoria e à metodologia
cientí fica, a fim de poder descrever, interpretar e agir sobre a realidade em
questão.

Atividade 4.1
A partir dos exemplos anteriores, elabore um plano de treino pessoal que lhe
permita estar atento a indícios significativos captados no ambiente onde vai
decorrer a sua pesquisa e nas pessoas com quem vai contactar.
Um modo de começar poderá ser através da construção de uma grelha de
observa ção, em que procurará selecionar os indicadores a que vai estar
particularmente atento( a). Por exemplo, imagine que está a fazer um estudo
sobre o insucesso escolar e vai fazer uma entrevista a casa da família de uma
criança pertencente à sua amostra. Que aspetos deve observar enquanto decorre
a conversa?

Mesmo que seja possuidor de treino básico em matéria de técnicas de observa çã o,


para cada projeto específico o investigador tem necessidade de planear a estratégia
de observação a adotar de modo a recolher os dados adequados com economia de
meios.

Esta prepara çã o da observação implica, antes de mais, responder à s seguintes


questões:

54
CASTANO, Javier Garcia ( 1994), Antropologia de la Educación: el Estúdio de la
Transmí sión- Adquisición de Cultura, Madrid, Eudema, pp. 18.19.

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• observar o quê?
• que instrumentos se deverão utilizar para registar as observa ções
efetuadas?

• que técnica de observação escolher?


• no caso de opçã o pela observação participante que papel assumir, como
observatório, e qual o grau de envolvimento a manter com o objeto de
estudo?

• que questões deontológicas terá de gerir?


• que dificuldades particulares antevê no processo de observaçã o e como
pensa ultrapassá-las?

2. QUE ASPETOS OBSERVAR?

Na unidade 2 já se fez referência ao envolvimento do investigador por densas camadas


de nevoeiro informational, integradas por situa ções de sobreinformação, subinformação
epseudoinformação, que apelam à necessidade de construção de instrumentos capazes
de lhe permitir selecionar a informa ção relevante necessária à resolução do seu problema
de investigação.

2.1. Os indicadores como filtros de informação^

É neste contexto que se impõe uma breve reflexã o sobre a construçã o e/ou seleçã o de
indicadores, de modo a funcionarem como instrumentos de filtragem de informação, que
permitam uma orientação mais segura no terreno.

Questões conceptuais
A palavra "indicador ", ensina- nos a Enciclopédia Britânica, designa um instrumento que
revela condições ou aspetos da realidade, que de outra maneira não seriam
percetí veis à vista desarmada. Descodificando esta definição em partes inteligíveis
observa -se que:

Io Se trata de um instrumento, i.e. n ão é um fim em si próprio. Desta natureza


instrumental, emerge a preocupação de combater o frequente erro, de gastar
demasiadas energias e tempo na sua conceção, energias e tempo esses que poderiam

55
0 texto inserto nesta secção resulta da adaptação de uma secção de um outro trabalho:
CARMO, H. (1986), Análise e Intervençã o Organizacional, Lisboa, Fundetec, cap. 1.

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ser utilizados para atingir os objetivos principais da pesquisa. É o que acontece,


por exemplo, com complicados índices utilizados nalguns estudos que ocuparam
demasiado tempo na sua conceção tendo benefícios insignificantes em termos de
valor acrescentado à investigação previamente existente.

2 o Outro aspeto da definiçã o de indicador que nos parece significativo é a sua faceta
de revelador : tal como o revelador fotográ fico, que é uma substância que
permite o aparecimento da imagem na chapa impressionada, de outro modo não
percepcionável, o indicador faz emergir informaçã o, doutra maneira dificilmente
inteligível.

Todavia, não se limita a fazê-lo cega mente. Se se tratasse toda a informa çã o que
percecionamos, ficaríamos afogados no nevoeiro informacional já acima referido. No
meio deste turbilhão informacional, é necessário ao investigador recorrer a processos de
seleção da informa ção útil. O próprio significado da palavra "indicar " faz luz sobre
este potencial revelador dos indicadores: apontar, dar a conhecer, revelar, significar, dar
sinal de, determinar...

A partir do que se acaba de referir, pode-se definir operacionalmente indicador como um


instrumento construí do com o objetivo de revelar certos aspetos pertinentes
de uma dada realidade, de outro modo não percetíveis, com o fito de a estudar,
de a diagnosticar e ou de agir sobre ela .

À primeira definição referida, acrescentou-se a ideia de construção, sublinhando que


o indicador é sempre um instrumento artificial, acentuando a sua faceta seletiva e
pragmática, fazendo ressaltar a sua natureza informativa para a a ção. Esta última ideia
merece ser sublinhada: com efeito, em toda a nossa vida quotidiana utilizamos indicadores,
se bem que muitas vezes não nos apercebamos que o são:
• por exemplo, o médico, para diagnosticar o padecimento do cliente, utiliza
indicadores quer de cará ter qualitativo (palidez ou rubor da pele, dimensão
da pupila e outras queixas feitas pelo doente) quer quantitativos (tensão
sanguínea, velocidade de sedimenta ção, quantidade de glóbulos, percentil do
peso e da altura, etc.);

•o meteorologista, por seu turno, não poderia exercer a sua profissão se


não recorresse aos indicadores da pressão atmosférica, da temperatura, da
humidade, da quantidade de precipitação e de tantos outros;

• o simples motorista, e muitos de nós o somos, utiliza indicadores de nível de


gasolina e óleo, da velocidade, das rotações do motor, entre outros, para uma
condução mais eficiente e segura.

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Ora se os indicadores são tão úteis no nosso viver quotidiano, por maioria de razão o
serão para entendermos o sistema social onde estamos inseridos, cuja complexidade e
diversidade necessita ser descodificada, sistematizada, avaliada e, se possível, medida
para ser inteligível.

Indicadores demogr á ficos e económicos


Os primeiros neste campo, a serem sistematicamente recolhidos e tratados foram
os indicadores demográ ficos, que permitiram a investigadores e administradores
aperceberem-se com maior rigor e clareza de aspetos relacionados com a estrutura da
popula çã o, na sua distribuição espacial e funcional, e retratar a sua dinâmica, através
dos indicadores de natalidade, mortalidade e migrações. A resultante prática da utilização
dos indicadores demográ ficos foi tão grande, que há autores que a referem como um
dos pilares fundamentais sobre o qual assentou o Esta do-Providência.54 Sem o seu uso,
as Ciências Sociais dificilmente dariam os passos que deram. Recordemos por exemplo,
o já clássico estudo de Durkheim sobre o suicídio (1897), baseado essencialmente em
indicadores deste tipo.

Paralelamente e respondendo às necessidades de analisar as grandes crises económicas


dos dois últimos séculos desenvolveram-se os indicadores económicos que todos os
dias são publicados e publicitados pelos media.

Indicadores Sociais
Os indicadores demográ ficos e económicos, contribuíram significativamente para a
compreensão do sistema social. No entanto, havia problemas extraeconómicos trazidos
pela organização social e pela mudança que lhes escapavam. Houve então que criar
instrumentos que permitissem revelar com clareza e precisão o que se estava a passar. É
desta necessidade que emergem os primeiros estudos sobre indicadores sociais. Estes,
tal como no caso dos anteriores, podem ser quantitativos ou qualitativos.

Um exemplo de indicador quantitativo é a taxa de mobilidade intergeracional calculada


por Birnbaum e a sua equipa, construído para revelar a fraca mobilidade social existente
na classe dirigente francesa nos últimos 30 anos:— Para a construir, Birnbaum começou
por agrupar as diversas profissões em diferentes níveis de status social. Seguida mente,
interrogou a sua amostra, construída por pessoas que detinham posições de poder nas
organizações públicas e privadas francesas, sobre a sua profissão e sobre a profissão do
pai. Com base nestes elementos construiu o indicador referido, a taxa de mobilidade

56
ROSANVALLON, P. (1985), A Crise do Estado- Providência, Lisboa, Inquérito.
57
BIRNBAUM, P. (1978), La Classe Dirigeante Française, Paris, P.U.F.

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intergerací onal que, como o nome indica, se destina a revelar a mobilidade social no
espaço de uma gera ção, considerando:
• haver mobilidade vertical quando a posição social do filho fosse superior à do
pai (ascendente) ou inferior (descendente);

• existir mobilidade horizontal, quando pai e filho pertencessem a profissões


diferentes mas do mesmo nível;

• hereditariedade social quando pai e filho tivessem exatamente a mesma


profissão e o mesmo nível hierárquico.

De acordo com aqueles critérios, Birnbaum observa que em França, nos 30 anos que
antecederam o estudo, se havia verificado uma diminuição substancial de mobilidade
ascendente, ocorrendo com cada vez maior frequência a situa ção de dirigentes, quer
do setor privado quer do setor público, serem filhos de outros dirigentes ou de ex-
-dirigentes.

Os indicadores qualitativos nã o sã o menos importantes na produçã o científica


contemporânea. Um exemplo ilustrativo é o quadro de várias dezenas de indicadores de
que Oscar Lewis se serve para caracterizar a cultura da pobreza, (Lewis, 1968, op. cit),
e que podemos observar na fig. 4.1.

Tanto os indicadores sociais quantitativos como os qualitativos, são construídos para atingir
quatro objetivos concretos: retratar a realidade social nas suas facetas estrutural
e dinâmica, revelar as perceções dos diferentes grupos sociais sobre o sistema
social, planear a intervençã o social e, finalmente, para avaliar essa intervenção
com clareza e rigor.

Utilizando o conceito operacional anteriormente definido, poderá dizer-se que, os


indicadores sociais são instrumentos construídos com o objetivo de revelar certos aspetos
pertinentes da realidade social, de outro modo não percecionáveis, com o fito de a estudar,
de a diagnosticar e de sobre ela poder intervir.

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I. Visão Panorâ mica

I - Rela ção com a sociedade envolvente II - Natureza da comunidade


.
1 Falta de recursos económicos 33. Má s condições habitacionais
.
2 Medo .
34 Amontoamento ( sobreloca çã o)
.
3 Suspeita .
35 Fraca organização
4. Discrimina ção .
36 Consciência de pertença face ao exterior
5. Apatia
6. Salários baixos III - Caracteriza çã o da fam í lia
.
7 Desemprego e subemprego crónicos 37. usência de infância como fase protegida
8. Rendimentos baixos .
38 Inicia ção sexual prematura
9 . Ausência de posse de propriedades .
39 Uniões livres em casamentos consensuais
10 * Ausência de posse de economias .
40 Alta taxa de abandonos
11* Ausência de reservas alimentares no lar 41* Alta taxa de famílias chefiadas por mã es
12 * Ausência de dinheiro no dia a dia 42 * Maior conhecimento do parentesco materno
13 * Alta taxa de uso de penhores para crédito 43 * Maior autoritarismo
.
14 Alta taxa de uso de agiotas locais .
44 Falta de vida privada
.
15 Cr éditos locais espontâneos 45 * Ênfase verbal sobre a solidariedade familiar,
16. Uso de roupas e mobiliário em 2a mão desmentida na prá tica
17. Pr ática de compra de pequenas quantidades de
géneros IV Aspetos individuais
-

18 * Baixa produção e baixo consumo 46 * Forte sensaçã o de marginalidade, desamparo,


.
19 Baixa taxa de alfabetiza ção dependência, inferioridade, resignação e fatalismo
.
20 Baixa participação nos sindicatos 47* Alta incidência de privaçã o materna e de
21* Baixa participação nos partidos políticos oralidade
22 * Baixa participação associativa 48 * Estrutura fraca do ego
23. Baixa utilização dos bancos 49 * Confusã o quanto à identificaçã o sexual
.
24 Baixa utilizaçã o dos hospitais 50 . Falta de controle sobre os impulsos *
.
25 Baixa utilização de grartdes lojas Espontaneidade comportamental
.
26 Baixa utilização dos museus e galerias 51* Orientação quase exclusiva para o Presente *
.
27 Ódio à polícia Fraco sentido de Passado e Futuro do Exterior
28. Desconfiança face à hierarquia da "outra cidade" 52. Machismo
(governo, administração, etc.) 53 * Toler ância quanto a patologia fisioló gica
29. Desconfiança face à Igreja 54. Ausência de consciência de classe
30. Consciência dos valores da classe média, mas 55. Baixo nível de aspirações
sem os praticarem 56. Exalta ção da aventura como um valor
.
31 Alta taxa de casamento consensual 57. Presença quotidiana da violência
.
32 Alta taxa de jus materno

Fonte : CARMO, H * ( 1986), op. cit


Figura 4.1 - Quadro de indicadores qualitativos indiciadores da cultura da pobreza,
segundo o antropólogo americano Oscar Lewis ( 1968)

Critérios para a construção de indicadores sociais


O primeiro critério referido por diversos autores para a construção de indicadores sociais
é o do reconhecimento da sua utilidade: com efeito, ao construir um indicador, há que
questionar se ele poderá ser útil quer para a análise da realidade quer para a
intervençã o dos atores sociais.
Os caminhos utilizados para a sua elaboraçã o são, assim, variados podendo-se:
• partir de dados já disponí veis e utiliz á- los em bruto (por exemplo:
número de alunos de uma minoria que frequentam uma determinada escola)

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I. Visão Panorâ mica

• construir índices a partir da sua combina ção (por exemplo: nú mero de


alunos de uma minoria étnica que frequentam uma determinada escola sobre
o número total de alunos vezes cem, o que permite ver o seu peso relativo no
total da população discente);

• recolher dados brutos através de pesquisa direta para responder a certas


questões (por exemplo, presença de indicadores de subcultura de pobreza no
,

grupo considerado de acordo com a listagem referida na fig. 4.1).

2.2. Guiões de observação e sistemas de registo

Quando se planeia uma observação no terreno é do terceiro tipo de indicadores que se


trata. O critério da utilidade deve estar sempre presente, devendo construir-se um guião
de observa çã o que inclua um conjunto de indicadores necessá rio para retratar
o objeto de estudo mas não excessivamente abundante de modo a poder criar uma
situa ção de sobreinformação.

Para se conceber tal instrumento, é conveniente tirar partido das leituras e contactos
efetuados no estudo exploratório bem como a um reconhecimento prévio no terreno a
.
observar É extremamente importante que o investigador não v á desarmado
para o campo. Se o fizesse, correria sérios riscos de colecionar informação inútil para
além de, por certo, lhe escapar muita informaçã o pertinente ao seu estudo.

Feita a observação, torna-se indispensá vel o seu rápido registo sob pena de se perder
elementos valiosos. Para além do uso dos próprios guiões de observa ção que podem
funcionar como instrumentos de registo, é usual recorrer-se a outros elementos como
os seguintes:
• bloco-notas;
• diário de pesquisa;
• gravações em áudio ou em vídeo58.
0 bloco- notas deve ser uma companhia permanente do investigador. É nele que
são anotadas as primeiras impressões, sob a forma de tópicos, diagramas e breves
memorandos, de modo a auxiliar a memória do investigador quando este vier a registar
mais detalhadamente os resultados da sua observação. Certos grupos reagem de modo
negativo a um desconhecido que na sua presença faz anotações. Quando prevê este tipo
de reaçã o, o investigador não deverá utilizá-lo, tentando memorizar a sua observação,

58
Sobre o uso de gravaçõ es á udio e vídeo, vide Ribeiro ( 2003, 2004).

© Universidade Aberta 97
I. Visão Panorâ mica

só a registando logo que lhe for possível52.

Este primeiro apontamento é necessário mas não é suficiente tendo de ser completado
com um relato mais detalhado em que se registem os factos observados, interpretações
que nos mereceram, hipóteses que se nos levantaram fruto da observa ção, bem como
outras informações úteis a não esquecer ( ex: nomes de pessoas contactadas ou a
contactar, bibliografia a revisitar, etc.). É com essa função que vários autores recomendam
a elaboração de um diário de pesquisa.

Trata -se, como o nome indica, de um autêntico diário de bordo, em que o investigador
vai assentando por ordem cronológica os vários procedimentos da sua investigação, os
resultados das observações efetuadas, os acontecimentos relevantes, etc. É conveniente
que a sua formatação permita a inserção de diversos tipos de documentos anexos como
fotografias, mapas, gráficos, tabelas e outros, pelo que não é aconselhá vel o uso de
cadernos e blocos que dificultam a inserção desse tipo de informa ção adicional.

Se o investigador optar por usar um diário de pesquisa em suporte scr


í pto, uma solução
prática é o uso de um dossier com folhas soltas, em que se podem entremear os elementos
anexos diretamente ou em pastas transparentes.

Se a escolha recair em suporte informático, isto é, se se quiser escrever diretamente


num computador, ou é possível dispor de um scannera fim de guardar ímediatamente em
memória os documentos adicionais, ou se fazem remissões no texto do diário de pesquisa
para um dossier devida mente organizado onde figure esse material. O registo imediato
do diário de pesquisa em suporte informático tem, a nosso ver, algumas vantagens sobre
o clássico dossier:
• em primeiro lugar, permite construir texto que pode vir a ser recuperado
facilmente na elaboração do relatório final da investigação;

• em segundo lugar proporciona uma pesquisa rá pida da informa ção


registada através do recurso à s ferramentas do processador de texto60;

• em terceiro lugar, permite um arquivo seguro e organizado dos dados

59
Pode recorrer- se a diversos processos para atingir este objetivo. Nas investigações que fizemos
em bairros de lata, criámos a rotina de tomar as nossas primeiras notas num café que ficava
á beira do bairro. Mais tarde, na pesquisa para o doutoramento, usá mos um gravador portátil
com o mesmo objetivo. 0 essencial é que as primeiras notas sejam tomadas em cima dos
acontecimentos observados.
60
Por exemplo, no vulgar word for windows pode-se pesquisar as palavras- chave de um texto
usando edit find.

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recolhidos o que não é de desprezar para quem tem de lidar com quantidades
tã o grandes e tã o dispersas de informação

Em qualquer dos casos, a experiência recomenda alguns procedimentos na feitura de


um diário de pesquisa :
• o registo deve ser feito tanto quanto possível no mesmo dia do registado a fim
de não se perder informação relevante;

• as anotações devem ser registadas por ordem cronológica;


• a formata ção do diário deve permitir que, numa leitura posterior, o investigador
possa destrinça r os factos observados, dos juí zos de valor, interpreta ções
e hipóteses que lhe tenham ocorrido;

• periodicamente o diário deve ser usado como fonte de reflexão e cuidadosamente


anotadas novas ideias que surjam desse procedimento; duas leituras são
possíveis e úteis: uma leitura por ordem cronológica permite ao investigador
tomar consciência da sua caminhada dando-lhe pistas para uma monitorização
da sua pesquisa e para a introdução de correções a fazer; uma leitura temá tica
possibilita-lhe a apropriaçã o progressiva de cachos de ideias por processos de
comparação, justaposição e combinaçã o de informações colhidas em momentos
e locais diferentes.

• para uma leitura temática eficiente é conveniente que o investigador, sobretudo


se trabalhar em suporte scripto, elabore um índice analítico do seu diário de
pesquisa.

Atividade 4.2
1. Reveja os objetivos que definiu para a sua dissertaçã o
2. Com base no trabalho anterior fa ça um quadro com as seguintes colunas:
Ia coluna: objetivos da pesquisa
2a coluna: aspetos a observar traduzidos por variá veis
3 a coluna: indicadores a observar
4a coluna: onde observar?
5 a coluna: sistema de registo a utilizar
3. Preencha o quadro. O objetivo é construir um roteiro de observação que lhe
sirva de guia para as diversas situa ções da sua pesquisa.
4. Discuta o seu trabalho com outros colegas e introduza as correções
decorrentes.

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3. TIPOS DE OBSERVAÇÃO

Existem várias formas de tipificar as técnicas de observa ção. Uma forma usual de o fazer
é distingui-las de acordo com o envolvimento do observador no campo do objeto de
estudo.

3.1. Observação não- participante

Se o observador não interage de forma alguma com o objeto de estudo no momento em


que realiza a observação, não poderá ser considerada como participante.

Imagine-se, por exemplo, uma pesquisa sobre comportamentos racistas em sala de aula.
Se o investigador optar por observar a dinâmica do grupo em situação de aula, oculto por
detrás de um painel espelhado, está a fazer uma observa ção nã o-participante.

Este tipo de técnica, possui características interessantes por:


• reduzir substancialmente a interferência do observador no observado;—
• permitir o uso de instrumentos de registo sem influenciar o grupo-alvo;

• possibilitar um grande controlo das variáveis a observar.


No entanto, a sua aplicaçã o é limitada nã o só porque o equipamento adequado apenas
está disponível em algumas instituições (Escolas Superiores de Educação, por exemplo)
mas também porque só se adequa a alguns objetos de estudo. Grande parte das pesquisas
exige um trabalho de campo em situação natural nâo se podendo simular em laboratório
situa ções de alta complexidade com grande número de atores e de variáveis. Para tais
situações o investigador tem de recorrer a técnicas de observação caracterízadas pelo seu
envolvimento através da assunção de um dado papel social junto da população observada:
são as técnicas de observaçã o participante .

3.2. Observação participante despercebida pelos observados

Em certas investiga ções deste tipo, o papel que o investigador assume é ténue, passando
completamente despercebido à população observada, sem que esse facto possa considerar-
-se incorreto do ponto de vista deontológico uma vez que as situações observadas ocorrem
em ambiente aberto, como nas situações que a seguir se enumeram:
• estudo do comportamento de claques de futebol;

61
Não reduz totalmente a interferência uma vez que, por imperativo ético, o observador deve
previamente colher a autorização dos elementos do grupo-alvo da observação.

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I. Visão Panorâ mica

• padrões de atuaçã o de vendedores ambulantes ciganos em feiras;


• expressões associativas de grupos minoritários;
• padrões de ocupação de tempos livres de cabo-verdianos.
No primeiro exemplo, poderá o investigador assistira diversos jogos, de lugares contíguos
aos das claques, observando o seu comportamento sem que a sua presenç a seja tida em
consideração. O mesmo se poderá dizer relativamente às outras situa ções, bastando para
tal que o observador visite assiduamente os locais frequentados pelo grupo-alvo ( feiras,
festas, locais de lazer) sem dar a conhecer o seu papel de observador.

Em locais ou situa ções de acesso condicionado, a questã o deontológica já se põe, uma


vez que o papel de investigador não lhe dá o direito de assumir um estatuto semelhante
ao do infiltrado, permitido a algumas polícias criminais.

3.3. Observação participante propriamente dita

Em grande parte das situações o investigador deverá assumir explicitamente o seu papel
de estudioso junto da população observada, combinando-o com outros papéis sociais
cujo posicionamento lhe permita um bom posto de observa ção. Como o desempenho
desses papéis o faz de algum modo participar da vida da população observada, dá -se a
esta técnica o nome de observaçã o participante. O exemplo que se segue ilustra as
suas vantagens e inconvenientes.

De outubro de 1970 a julho de 1971 foi realizado um estudo exploratório sobre um bairro
de lata de Lisboa com o duplo objetivo de fazer um levantamento sociográfico sobre o
estilo de vida da popula ção e de levantar algumas hipóteses sobre as suas estratégias
de sobrevivência®2. Como estratégia de base para a recolha de dados, cada um dos
oito elementos da equipa assumiu um papel reconhecido como socialmente útil pela
comunidade: três inscreveram-se como professores dos cursos noturnos para adultos, que
faziam parte do programa da instituição particular de solidariedade social implantada no
bairro63; outros três assumiram o papel de rececionistas do seu posto médico, onde eram
facultadas consultas de diversas especialidades e donde estava a ser desencadeada uma
campanha de saúde pública; os dois restantes, ofereceram-se para o serviço de bufete do
clube do bairro, local de encontro habitual da juventude e de alguma população adulta.

62
Incidindo sobre um bairro hoje desaparecido, a Quinta do Bacalhau, o trabalho foi desenvolvido
no âmbito da disciplina de Metodologia das Ciências Sociais, do currículo das licenciaturas em
Serviço Social e em Ciências Sociais e Política Ultramarina do ISCSPU/ UTL.
63
Denominava-se Centro de Ação Social Universitá rio (CASU).

© Universidade Aberta 101


I. Visão Panorâ mica

No fim de cada semana, a equipa fazia uma reuniã o em que era comparada a informação
registada nos respetivos diários de pesquisa e discutida a sua fiabilidade. Esta técnica,
complementada naturalmente com pesquisa documental e com entrevistas a informadores
qualificados permitiu, ao fim de um ano, atingir os objetivos acima referidos.

Da avaliação deste caso sobressaem as principais vantagens e limitações da técnica de


observação participante:
• a possibilidade64 de entender profundamente o estilo de vida de uma popula ção
e de adquirir um conhecimento integrado da sua cultura é, sem dúvida, a sua
principal vantagem;

• como limitações dominantes salientam-se a morosidade que tal técnica exige e


as dificuldades que levanta a uma posterior quantificação dos dados.

Atividade 4.3
Em função dos objetivos previstos para a sua dissertação elabore uma breve
reflexão escrita (n ão mais de meia pá gina A4) em que defenda o uso (ou o não
uso) de cada uma das três técnicas de observação atrá s referidas.

4. ASPETOS RELEVANTES DA OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE

Há muito utilizada pelos antropólogos em estudos sobre pequenas comunidades, a


observação participante tem vindo a ser cada vez mais usada em trabalhos de natureza
sociológica, interdí sciplinar ou em antropologia das sociedades complexas65, quer como
ferramenta exploratória quer como técnica principal de recolha de dados, quer
ainda como instrumento auxiliar de pesquisas de natureza quantitativa.

Dada a sua utilidade vale a pena refletir um pouco sobre duas questões a ter em conta
no seu uso, a fim de dela melhor se poder tirar partido:

64
Tal conhecimento não é autom ático. Exige da parte do investigador uma profunda vigilâ ncia
relativamente aos seus preconceitos de raiz etnocêntrica ou não. Vide sobre este perigo, a
obra de ficção de Irving Wallace, As três sereias, op. cit.
65
Vejam-se como exemplos, dois trabalhos produzidos em épocas bem diferentes: WHITE, W .
F. ( 1970), Street Corner Society, the Social Structure of an Italian Slum, Chicago,
.
University of Chicago Press, 13 a edição, ed original de 1943 ( ver sobretudo o apêndice
metodológico pp. 279-358); e ROCHA-TRINDADE, Maria Beatriz (1973),Immigré s Portugais,
Lisboa, ISCSPU, pref. Alain Girard, ( ver sobretudo o capítuio de fundamentação metodológica).
Sobre o seu uso em Antropologia da Educação vide MA1LLO, H.; CASTANO, 3.; e RADA, A.
(1993), Lecturas de Antropologia para Educadores, Madrid, Trotta.

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• a questã o do papel social que se vai desempenhar como observatório


• a questã o da intensidade do mergulho.

4.1. A questã o do observat ório

No estudo exploratório sobre a Quinta do Bacalhau, atrá s referido, tirou-se partido do


facto de ser uma equipa diversificada e numerosa, assumindo cada um dos estudantes um
papel diferente. Este procedimento permitiu cruzar informações e ganhar uma visão crítica
atrav és de uma análise contrastada das fontes de informa ção utilizadas, na construção
final do conhecimento.

Negociação e escolha do papel


Numa dissertação de Mestrado, como aliás acontece na maior parte das vezes, isto não é
possível realizar, uma vez que o investigador está a trabalhar sozinho. Neste caso tem de
se ter especial cuidado na negocia çã o, desenvolvida com a populaçã o-alvo, e ponderar
seriamente sobre o papel social que se propõe desempenhar .

Uma vez que o investigador é habitualmente considerado como intruso, a sua presença
desperta no mínimo alguma perplexidade e, frequentemente, desconfiança, sentimento
que é necessário vencer com habilidade e perseverança. De facto, o investigador é
objetivamente um forasteiro que precisa de ganhar a confiança do grupo ou da comunidade
onde se vai integrar. Para isso é recomendá vel a assunçã o de um papel que seja
simultaneamente claro para a população-alvo - por exemplo que não seja identificável
com papéis antipá ticos ou temidos6 * - e de utilidade social reconhecida.
No exemplo acima referido, os papéis assumidos eram facilmente inteligíveis e
reconhecidamente úteis, dado ter sido dado a conhecera nossa dupla condição: estudantes
que precisavam de apresentar um trabalho académico e que haviam querido conciliar tal
necessidade com o desempenho de um trabalho voluntário na comunidade, professores,
rececionistas ou voluntários no apoio ao clube do bairro.

Após uma cautelosa fase inicial, por parte da popula ção residente no bairro, em que os
testes à nossa autenticidade foram constantes e revelaram a verdade dos nossos discursos,
a equipa foi adotada sem reservas, desenvolvendo-se uma relação de grande franqueza
e, nalguns casos, mesmo de amizade, o que permitiu a nossa presença assídua no bairro

66
A suspeita de que o investigador poderá ser um polícia infiltrado, em comunidades com
problemas de comportamento desviado, ou que é um aliado dos outros, em zonas dominadas
por diferentes fações locais, constitui um sério obstáculo à realização de uma investigação que
requeira a realização de trabalho de campo.

© Universidade Aberta 103


I. Visão Panorâ mica

a qualquer hora do dia ou da noite sem qualquer precaução particular de segurança .

O horizonte de cada papel


Na escolha do papel social a desempenhar pelo investigador, quando em trabalho de
campo, é preciso ter consciência que este cria um espaço que vai funcionar como
observatório. Isto significa que alcança um horizonte limitado e, sobretudo, que não
permite visibilizar uma outra parte da realidade social.

0 papel de professor de adultos exercido na Quinta do Bacalhau, por exemplo, que era
extremamente adequado para observar em profundidade os processos e as dificuldades
de aprendizagem de uma população adulta de trabalhadores manuais não qualificados,
não permitia obter informações significativas no respeitante ao modo como geriam os
seus tempos livres, uma vez que havia um objetivo conflito de interesses entre o tempo
consagrado ao estudo e o pouco que destinavam ao lazer. Esta situa ção levava a uma
certa reserva quando eram interrogados sobre o que faziam fora das aulas.

Em suma, a escolha de cada papel social tem benefí cios e custos que é preciso
ter em conta, devendo ser feita de acordo com o objetivo da pesquisa.

4.2. A questã o da intensidade do "mergulho " ( ou do envolvimento do


investigador )

Uma vez definido o papel social que vai legitimar sua presença junto da comunidade
e que lhe permite criar um observatório adequado, o investigador deve interrogar-se
sobre a questão do seu envolvimento com o grupo-alvo ou seja, sobre a intensidade do
mergulho que quer dar sobre o objeto de estudo. As consequências da sua opção são
extremamente relevantes como adiante se poderá ver.

A Janela de Johari
Para perceber claramente a relev ância desta questã o vejamos o modelo proposto por
Joseft Luft e Harry Hingham conhecido por Janela de Johari— .

Este modelo representa o grau de lucidez nas rela ções interpessoais, classificando os
elementos que influem nessas relações em quatro áreas, relativamente a um dado ego:
área livre, aqueles que integram a informação conhecida pelo ego e pelo outro,- área
cega\ os que são conhecidos apenas pelo outro (ex: a imagem não verbalizada que o
outro tem do ego); área secreta: os que, pelo contrário, o ego conhece sem os partilhar

67
LUFT, J. e INGHAM, H. (1955), The Johari Window, a Graphic Model for Interpersonal
Relations, Los Angeles, University of California, (UCLA), Western Training Laboratory for
Group Development.

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I. Visão Panorâ mica

com o outro; área inconsciente, os elementos que condicionam a relação mas dos quais,
nem o ego nem o outro têm consciência.

0 modelo da Janela de Johari pode aplicar-se à interaçã o entre um indivíduo e um grupo,


um indivíduo e uma organização, ou às relações entre grupos e organizações. No caso
vertente a situação é a da relação de um investigador com um dado objeto de estudo
(grupo, organizaçã o, comunidade ou outro sistema social mais amplo). Tomemos um
caso como exemplo64:

Outro Conhecido Desconhecido


Próprio pelo outro pelo outro

Conhecido Área
Área livre
pelo próprio secreta

Desconhecido Área
Área cega
pelo próprio inconsciente

.
Fonte: LUFT, J (s/d), Introdução à Dinâmica de Grupos, Lisboa, Moraes .
Figura 4.2 - Janela de Johari

Ao iniciarmos o nosso trabalho (de campo aquando da pesquisa para a dissertação


de doutoramento), tínhamos consciência de dois tipos de limitações que poderiam
funcionar como filtros comunicacionais ao longo do processo.

A primeira, decorria do diferente observatório em que nos colocávamos para estudar


cada uma das organizações que constituíam o nosso objeto de estudo:
• relativamente à LINED, posicionávamo-nos como observador exterior, o que
acarretava a evidente vantagem de podermos interpretar a informação que
sobre ela recolhêssemos com um olhar distanciado e eventualmente menos
comprometido; esta vantagem era simultaneamente um inconveniente, na
medida em que a nossa condição de investigador externo não nos permitiria
objetivamente— aceder a alguma informação importante. Dito de outro modo,
e utilizando o conhecido modelo da Janela de Johari, o nosso observatório
permitia- nos o f ácil acesso à área cega da UNED mas dificultava- nos o
acesso à sua área secreta;

68
. . .
CARMO, H (1995), op cit , Introdução.
69
Com o termo objetivamente, quer sublinhar-se que as consequências desta situação seriam
independentes da boa vontade dos nossos informadores.

© Universidade Aberta 105


I. Visão Panorâ mica

• a posição de observador mergulhado na Universidade Aberta, possibilitava,


pelo contrário, o acesso à área secreta da instituição— mas dificultava
aceder à sua área cega21; por outro lado, se o papel de coordenador de ensino
nos colocava numa boa posição para observar o funcionamento da UA, criava
uma situação de ambivalência sociológica 21 devido às diferentes exigências
dos papéis em jogo - o de investigador e o de dirigente— ; (...)

Mergulho ( envolvimento ) restrito


Como se pode ler na citação, o posicionamento distanciado do investigador pode trazer-
-Ihe o benefício de aceder mais facilmente à área cegado objeto de estudo do que
aqueles que nele estão envolvidos. Aquele caso, em concreto, permitiu ao investigador
perceber que a instituição observada apresentava três características ameaçadoras pouco
percetíveis para alguns dos que nela trabalhavam:
•o seu gigantismo, que lhe estava a ocasionar alguns problemas de coesão
interna e rapidez de resposta aos desafios da mudanç a;

• um modelo demasiado dependente de tutorias presenciais, o que obrigava a


aumentar particularmente os custos cada vez que se aumentava a oferta de
disciplinas;

• uma tensão perigosa entre centro e periferias, fator de redução de eficiência e


de eficácia.

No entanto, há que ter consciência que quanto maior for o distanciamento do


investigador menor será o seu acesso à área secreta do objeto a observar. Na
pesquisa em consideração tivemos consciência que o posicionamento distanciado que

70
Esta situação, em parte facilitadora da pesquisa ievantava-nos, em contrapartida, a questã o
ética da utilização da informaçã o, o que implicava um esforço adicional da sua seleção.
71
Fosse qual fosse o ponto de observa ção em que nos situássemos, este seria fonte de miopia
organizacional, termo que designa o conjunto de filtros que impedem o observador de
percecionar a organização na sua dinâmica. CARMO, H. (1986), Análise e Intervençã o
Organizacional, Lisboa, Fundetec.
72
Sobre a noção de ambivalência sociológica vide MERTON, Robert (1979), Ambivalência
Sociológica , Rio de Janeiro, Zahar.
73 Um problema evidente era o da clássica interferência do observador no objeto de estudo. Esta
questão, no entanto, pareceu-nos de importâ ncia relativa, porque a postura meso e macro em
que nos coloc ávamos, distanciava-nos da nossa interferência como coordenador de ensino.
Sobre a universalidade desta questão, mesmo para as Ciências Físico-Naturais, vide SANTOS,
Boaventura Sousa ( 1991), Um Discurso Sobre as Ciências, Porto, Afrontamento (5a ed.
Edição original de 1987), pag. 23 e sgs.

© Universidade Aberta 106


I. Visão Panorâmica

assumimos, limitou o nosso horizonte, não permitindo observar aspetos de maior detalhe
da dinâmica interna da LINED (circuitos de decisão, estrutura informal, rede comunicacional,
padrões de cultura organizacional, etc .)

Mergulho ( envolvimento ) profundo


A opção contrária, isto é, a escolha de um papel em que o investigador se envolve
com maior profundidade com a população a observar tem também, como é óbvio,
os benefícios e os custos contrários à situação acabada de descrever: o acesso à área
secreta do objeto de estudo é facilitado enquanto a observação da sua á rea cega
fica substancialmente dificultada.

Esta foi a situa ção em que nos encontrámos ao observar a nossa própria instituição,
permitindo o acesso a informação reservada aos de dentro mas retirando-nos a perspetiva
do observador exterior.

A situação de observador participante é portanto muito complexa, contendo em si dois


papéis em constante dialética - o de observador e o de participante - exigindo por
parte do investigador uma constante autovigilância se quer manter o equilíbrio prec ário
conferido pela sua dupla condiçã o.

Tal equilíbrio apesar de difícil é possível como o demonstram trabalhos clássicos como
os de Moreno, Lewin, Lebret, e tantos outros que conseguiram aliar a objetividade da
observação científica à militância da intervenção social.

Em 1913, Jacob Levi Moreno, o pai da Sociometria e de várias estratégias psicoterapêuticas,


decide apoiar um grupo de prostitutas do bairro vienense de Spittelberg, de forma
a melhorarem a sua autoestima 24. Apesar do seu profundo envolvimento como
psicoterapeuta, a sua preparaçã o teórica e metodológica permitiu-lhe recolher dados
objetivos da experiência, os quais contribuíram para a elaboração da sua teoria sociométrica
(Carmo, 2000).

Do mesmo modo Kurt Lewin, um dos autores mais significativos da psicossociologia,


construiu todo o seu edifício teórico a partir do cruzamento de experiências laboratoriais,
nas quais assumia um papel distanciado do objeto de estudo, com experiências em que
participou com envolvimento mais significativo— .

Foi também a partir do seu papel de participante mergulhado nas comunidades de


pescadores da Bretanha em que exercia o seu magistério, que o padre Lebret, uma

74
DREYFUS, Catherine ( 1980), Psicoterapias de Grupo, Lisboa, Verbo, p. 20.
75
Idem, p. 46 e sgs.

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I. Visão Panorâ mica

das figuras mais interessantes e mais esquecidas no domínio da teoria e da prática


da intervençã o social, implementou a metodologia do inquérito-participação como
instrumento de desenvolvimento de comunidades. Foi igualmente refletindo sobre a sua
prática que, aquele que veio a ser um dos principais peritos do Concílio Vaticano II em
matéria de Desenvolvimento, marcando com o seu pensamento documentos fundamentais
como a Constituição Pastoral da Igreja no Mundo Contemporâneo (Gaudium et Spes),
elaborou uma teoria do Desenvolvimento que quase quarenta anos mais tarde mantém
uma surpreendente atualidade— .

Nalguns casos, como nos de Paulo Freire22 e de Camilo Torres24, a relação existente
entre o papel de observador e o de participante tende a desequilibrar-se claramente em
favor do segundo chamando alguns autores a esta situação a de observação militante.
Independentemente dos perigos de perda de objetividade científica que são muito
evidentes, sendo uma posição civicamente respeitá vel, em contexto de investigaçã o para
a obtenção de um grau académico é uma opção perigosa pois dispersa o investigador e
afasta -o objetivamente desse objetivo de curto prazo.

Atividade 4.4
1. Refira sucintamente o uso que pensa fazer da técnica de observa çã o
participante para a sua dissertaçã o, como técnica exploratória, como técnica
principal ou como instrumento auxiliar.
2. Caracterize alguns papéis que poderá vir a desempenhar junto da populaçã o-
-alvo e discuta as suas virtualidades e limitações.
3. Explicite como pensa ultrapassar as limitações do seu observatório.

76
Cfr. LEBRET, Louis ( 1964), Suicídio ou Sobrevivência do Ocidente?, S. Paulo, Livraria
Morais, ia ed. 1958.
77
Andragogo brasileiro desenvolveu uma eficaz metodologia de alfabetização e educação cívica
.
de adultos cuja aplicação o levou ao exílio na altura da ditadura militar O seu método tem
sido utilizado em todo o Mundo quer por organismos transnadonais como a UNESCO quer
.
por entidades estatais e ONGs Apesar dos muitos escritos que produziu o seu pensamento
pode sintetizar-se em duas das suas obras: FREIRE, Paulo ( 1972), Pedagogia do Oprimido ,
Lisboa, Afrontamento; e (1971), L'Education: Pratique de la Libert é, Paris, CERF.
78
Nascido em 1929 em Bogotá numa família da classe alta e ordenado em 1954, o padre Camilo
Torres, após ter realizado estudos superiores na Universidade de Louvain ocupou em 1958
o lugar de professor de Sociologia na Universidade de Bogotá . Após quatro anos em que
conseguiu articular a sua atividade de docente e de investigador com a de militante dos direitos
civis, entrou em rotura com o sistema após a crise estudantil de 1962, acabando por aderir à
guerrilha em 1965 e ser morto em 1966. A sua principal obra sociológica foi postumamente
compilada em TORRES, C. (1968), Ecrits et Paroles, publicada em Paris pelas Éditions du
Seuil.

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I. Visão Panorâ mica

5. PROBLEMAS DEONTOLÓGICOS

Partindo do princípio que todos os aspetos técnicos da observação estão controlados é


fundamental que o investigador, antes de iniciar a recolha de dados e no seu decorrer,
tenha em conta a questão deontológica levantada por eventuais conflitos de interesses
entre si e a população-alvo.

Ao ganhar a confiança da populaçã o observada, o investigador passa a ter acesso a


um conjunto de informações secretas e eventualmente sagradas sobre a sua
cultura— . Em contrapartida, compromete-se implicitamente a respeitar certas
regras de controlo de informa ção obrigando-se a só divulgá- la quando autorizado.

Um caso particular que naturalmente agudiza esta questão é o dos estudos sobre
grupos de acesso restrito como alguns agregados políticos e económicos (movimentos
sociais, elites, grupos de pressão e partidos), comunidades étnicas e religiosas, grupos
com estatuto socialmente desvalorizado (homossexuais, delinquentes, prostitutas) e
associações secretas. Nessas situações é previsível ocorrerem resistências ao trabalho
do investigador devido às suas características pessoais (género, idade, classe social,
religião etc.). Quando as barreiras são vencidas e a confiança estabelecida a filtragem da
informa ção a difundir é de primordial importância.

Esta importante questã o leva à necessidade de uma prévia negociação com a populaçã o-
-alvo sobre os limites até onde pode exercer o seu papel de investigador, não sendo
desejável qualquer ação que possa conduzir à sua identifica ção como ladrão de
informação. Tal situaçã o não só seria eticamente condenável como vacinaria a população
contra trabalhos a efetuar futuramente por outros investigadores.

Podendo por vezes assumir contornos difíceis, tal negociaçã o é possível, como o provam
estudos clássicos como o já citado de William F. Whyte sobre os bandos de esquina, ao
qual poderiam acrescentar-se muitos outros como a que Allinsky fez sobre o bando de AI
Capone80 ou, entre nós, como a que Olímpio Nunes realizou sobre os ciganos81.

Em suma qualquer investigador deverá ter a maturidade emocional e a integridade moral


suficientes para saber gerir a situação de ambivalência sociológica —
que o confronta
com o dilema da dupla fidelidade, à comunidade académica que lhe pede resultados

79
Correspondentes à sua área secreta.
80
cit. in HESS, Rémi (1982), Sociologia de Intervenção , Porto, RÉS.
81
NUNES, Olímpio (1981), O Povo Cigano, Porto, Livraria Apostolado da Imprensa.
82
O termo é usado no sentido que lhe dá MERTON, Robert (1979), Ambivalência Sociológica ,
Rio de Janeiro, Zahar.

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I. Visão Panorâ mica

cientificamente interessantes e à populaçã o-alvo que em si confiou um património de


informa ções de acesso reservado.

Atividade 4.5
1. Fa ça uma breve reflexão sobre os principais problemas deontológicos que a
sua investigação pode levantar. Resuma o resultado em tópicos.
2. Discuta as questões a que chegou com o seu grupo de trabalho.
3. Sumarize as tarefas a realizar para ultrapassar tais problemas.

S í ntese

Através de um percurso de análise em que foram considerados diferentes casos procurou-


-se, em primeiro lugar, chegar a um conceito operacional de observa çã o sublinhando
os elementos básicos que o integram.

Seguidamente, e no contexto da discussão sobre a necessidade de conceber instrumentos


de seleção de informação pertinente para a investigação, foi discutido o conceito de
indicador e feita referência a diversos tipos de indicadores.

Foi depois explicada a necessidade da construçã o de guiõ es de observa ção e de


instrumentos de registo dos dados observados, tendo-se sublinhado a importância do
diário de pesquisa .

Caracterizados os principais tipos de observação, discutiu-se maís detalhadamente sobre


duas vertentes da observação participante, a questão da escolha do observatório
(local de observa ção) e a do envolvimento do observador com o grupo-alvo.

O capítulo termina com a referência à necessária reflexão sobre problemas deontológicos


levantados no uso desta técnica.

Teste formativo

1. Após leitura aprofundada do texto do capítulo e feitas as respetivas atividades, abra


o manual na pá gina intitulada objetivos da unidade.

2. Tente atingir os 24 objetivos, escrevendo as suas respostas sem recorrer ao texto do


interior do capítulo.

3. Confira as suas respostas com o texto e corriga-as.

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I. Visão Panorâ mica

Leituras complementares

GANS, Herbert J. (1999), Participant observation in the era of "Ethnography", "Journal


of Contemporary Ethnography" ( 28), disponível online in http: //ice,sagepub.com

GOODE, William e HATT, Paul. K. (1960), Métodos em pesquisa social, S. Paulo, Ed.
Nacional. Capítulo sobre observação.

MILLS, C. Wright (1969), A Imagina ção Sociológica, Rio de Janeiro, Zahar, Apêndice
final.

NOGUEIRA, Oracy (1968) Pesquisa Social, Introduçã o às suas Técnicas, S. Paulo


Companhia Editora Nacional, pp. 88-110.

SELLTIZ, JAHODA, DEUTCH e COOK (1967) Métodos de pesquisa nas rela ções
sociais, S. Paulo, Herder (USP), pp. 223-261.

ITURRA, Raúl (1986), Trabalho de Campo e Observa çã o Participante em


Antropologia, in Silva, A. 5. e Pinto, J. M., org. (1986), Metodologia das
Ciências Sociais, Porto, Afrontamento, pp. 149-163.

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I. Visão Panorâ mica

Unidade 5 - Inquéritos por entrevista e por questionário

Objetivos da unidade

No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a :


1. explicar a etimologia da palavra inquérito;

2. identificar dois critérios orientadores que permitem caracterizar os tipos de


inquérito;

3. escolher o nível de estruturação do inquérito em função das contingências da


pesquisa;

4. distinguir um inquérito por entrevista de um inquérito por questionário;

5. explicitar o objetivo de uma entrevista a partir do modelo da Janela deJohari)

6. identificar três vertentes da fase de apresentação numa situaçã o de entrevista;


7. referir três problemas a gerir em qualquer situação de entrevista;

8. referir alguns cuidados a ter para evitar a influência do entrevistador no


entrevistado;

9. discutir a questão do eventual choque cultural entre os interlocutores numa situação


de entrevista;

10. identificar os diversos canais de comunicação em presença numa entrevista e


referir alguns cuidados a ter no seu controlo;

11. explicitar as situações em que é conveniente optar pela entrevista;

12. descrever a tipologia de entrevistas de Madeleine Grawitz;

13. distinguir os vários tipos de entrevista de acordo com seis variáveis;

14. referir os principais procedimentos a ter em conta antes da entrevista;

15. discutir as principais tá ticas a desenvolver durante a entrevista;

16. fazer referência a alguns cuidados a ter após a entrevista;

17. identificar os vários tipos de perguntas que podem integrar um inquérito por
questionário;

18. caracterizar diversos canais de comunica ção usados entre inquiridor e inquirido;

19. descrever alguns cuidados a ter na utilização de cada canal de comunicação;

© Universidade Aberta 112


I. Visão Panorâmica

20. identificar alguns fatores que condicionam a taxa de respostas;

21. explicitar os cuidados a ter num inquérito por questionário, no que respeita à
construção das perguntas;

22. explicitar os cuidados a ter num inquérito por questionário, no que respeita à
apresentação do formulário;

23. explicar a necessidade do uso do pré teste;

24. descrever o processo de pré-testagem;

25. enunciar as precauções a ter durante o lanç amento de um inquérito por


questionário;

26. identificar as atividades a desenvolver após a receçã o dos questioná rios;

27. comparar as virtualidades e limitações dos inquéritos por entrevista e por


questionário.

1. O QUE É UM INQUÉRITO?

Se formos a um dicionário procurar saber o que significa a palavra inquérito, encontramo-


-la definida como um conjunto de atos e diligências destinados a apurar aiguma coisa,
aparecendo como seus sinónimos inquirição, interrogatório, sindicância; e registando
como exemplo de situações possíveis, associadas à sua realização o inquérito administrativo,
o judicial, o policial e o científico. Da etimologia da palavra extrai-se a ideia de que é um
processo em que se tenta descobrir alguma coisa de forma sistemática .

1.1. O inquérito em Ciências Sociais

Em Ciências Sociais esta expressão é usada de uma forma precisa para designar processos
de recolha sistematizada, no terreno, de dados suscetíveis de poderem ser comparados. Há
mesmo autores que quando se referem a inquéritos se circunscrevem aos que permitem
uma posterior aná lise quantitativa identificando -os erradamente com o conceito de
inquérito por questionário.

Esta perspetiva quantitativista é, quanto a nós, profundamente redutora, uma vez que o
que define um inquérito não é a possibilidade de quantificar a informação obtida mas a
recolha sistemática de dados para responder a um determinado problema. Aliás, conforme
o têm demonstrado diversos autores, o critério da quantificação não é diferenciador porque
que cada vez mais é viável quantificar informação aparentemente difícil de der submetida

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I. Visão Panorâ mica

a tal tratamento®3. Um delírio de um doente mental, por exemplo, pode ser quantificado
desde que haja por parte do investigador o cuidado prévio de conceber um modelo de
análise com variáveis e indicadores significativos, registar rigorosamente as observações
efetuadas ( em vídeo, por exemplo) e proceder às necessárias operações de tratamento
e an álise dos dados de acordo com o modelo previamente construído.

1.2. Tipos de inquéritos em Ciências Sociais

Tendo em vista estudar os procedimentos prá ticos no ato da inquirição, podemos diferenciar
os inquéritos, em Ciências Sociais, segundo duas variá veis:
• o grau de diretividade das perguntas
* a presenç a ou ausência do investigador no ato da inquirição

O resultado do cruzamento das duas variá veis conduz - nos a quatro tipos de inquérito
(fig . 5.1):

Grau de directividade Situaçã o do investigador no ato da inquirição


das perguntas Está presente Está ausente

Menor diretividade
A - Entrevista pouco estruturada C- Questionário pouco
estruturado
Maior diretividade B - Entrevista estruturada D - Questionário estruturado

Figura 5.1 - Tipos de inquéritos de acordo com os critérios do grau de directividade das
perguntas e da interação estabelecida entre o investigador e a população inquirida

Tanto os inquéritos realizados por entrevista como os inquéritos realizados por questionário
podem ter graus de estruturaçã o diferente.

Imagine que lhe é pedido um estudo sobre as estratégias de sobrevivência dos refugiados
romenos em Lisboa. Para diferentes fases do seu trabalho poderá usar com proveito cada
um dos quatro tipos de inquérito.

Na fase exploratória da pesquisa, convém inquirir informadores qualificados ou seja


pessoas cujo conhecimento da popula çã o em questão - o conjunto dos refugiados
romenos - poderá vir a ser útil para uma descrição preliminar do grupo e do seu modo de
vida. Uma vez que ainda possui pouca informação sobre o objeto de estudo, não deverá
cometer o erro de estruturar demasiado o inquérito para nã o condicionar excessivamente

®3
Veja-se, a este propósito BARDIN, Lawrence ( 1979), Análise de conteúdo, Lisboa, Edições
.
70, p 35, em que este autor mostra o amplo conjunto de domínios aos quais se podem aplicar
as técnicas de análise de conteúdo.

© Universidade Aberta 114


I. Visão Panorâmica

os respondentes eliminando informa ções eventualmente importantes . O inquérito


deveria ser, portanto, pouco estruturado. Acontece no entanto que para além dos
informadores qualificados residentes em Lisboa, os quais poderia inquirir através de
inquérito por entrevista ( situação A), o investigador planeou colher informações junto
de especialistas estrangeiros de países com forte imigração romena. Nã o seria prático
nem eficiente deslocar-se a todos esses países. Para atingir esse objetivo poderia optar
por um inquérito por questionário ( situação C).

Numa fase posterior, já detentor de informação suficiente para estruturar os instrumentos


de recolha de dados, poderia conceber um guião de entrevista com questões mais
precisas que aplicaria a uma amostra da população-alvo ( situação B ).

Munido(a) dos resultados do inquérito por entrevista, que eventualmente lhe tivessem
suscitado um conjunto de hipóteses interessantes, poderia verificá-las através da aplicação
de um inquérito por questionário muito estruturado (situa ção D).

Assim, como adiante se verá, o principal fator distintivo entre um inquérito por
entrevista e um inquérito por questioná rio é o primeiro ser realizado em situação
presencial, enquanto que o segundo ser administrado a distâ ncia . A presenç a ou
ausência do investigador no ato da recolha de dados é assim determinante no que respeita
aos procedimentos técnicos de conceção e de administração dos inquéritos. Essa, a razão
da sua distinção, que se procura ilustrar nos pontos seguintes.

Atividade 5.1
Relativamente aos objetivos que definiu para a sua dissertação, elabore uma
listagem de informações que carecem de inquirição a fontes vivas. Seguidamente
interrogue-se sobre o tipo de inquérito que lhe parece mais adequado para
alcançar as respostas que deseja:
- entrevista pouco estruturada ?
- entrevista muito estruturada?
- questionário pouco estruturado?
- questionário muito estruturado?

2. INQUÉRITOS POR ENTREVISTA

2.1. A intera ção direta, questã o- chave na técnica de entrevista

A intera ção direta é uma questã o-chave da técnica de entrevista. Recordando o que se
í, a situação habitual no início
disse na unidade anterior relativamente à janela deJohar
de uma entrevista é a da presença de dois interlocutores (duas janelas) cuja interação

© Universidade Aberta 115


I. Visão Panorâ mica

apresenta áreas livres muito reduzidas, áreas cegas relativamente grandes e áreas
secretos igualmente extensas84. Dito de outro modo, quando vai começar uma entrevista
o investigador partilhou habitualmente pouca informa çã o com o entrevistado { área
livre pequena), sabe pouco sobre ele (grande área cega do entrevistador e secreta do
entrevistado) encontrando-se este último na mesma situa ção (extensa área cega própria
e secreta de quem o vai entrevistar).

Em termos globais o objetivo de qualquer entrevista é abrir a área livre dos


dois interlocutores no que respeita à mat é ria da entrevista, reduzindo,
por consequ ê ncia, a área secreta do entrevistado e a á rea cega do
entrevistador.

Para atingir tal meta uma estratégia habitualmente eficaz é a de começar por reduzir a
nossa área aplicando uma regra fundamental das relações humanas, a regra
da reciprocidade. Uma primeira forma de o fazer é através de uma apresenta ção
bem-feita a qual assume três vertentes:
• a apresentação do investigador
• a apresentação do problema da pesquisa
• e a explica ção do papel pedido ao entrevistado .
Ao abrir a sua área secreta, o entrevistador fornece ao entrevistado dados que lhe
permitem entender a sua importância como fornecedor de informação e, por consequência,
a sua utilidade para a investigação em curso. Quando é criado este tipo de entendimento,
o entrevistado tem tendência a colaborar (co- laborare = trabalhar com), sentindo que não
está a ser simplesmente utilizado ou mesmo manipulado. Tal como se disse na unidade
anterior, pretende-se criar um ambiente de partilha voluntária de informação e não de
aquisição coerciva da mesma85.

A circunstância de ser uma situação em interação direta ou presencial faz com que no
ato de entrevistar se tenham de gerir três problemas em simultâneo:
• em primeiro lugar, a influência do entrevistador no entrevistado;

84
Não é relevante falar-se das áreas inconscientes uma vez que estas não se alterarão
significativamente numa entrevista deste tipo.
85
Diferente seria se estivéssemos em presença de um inquérito policial, administrativo ou judicial
em que a relação entrevistadores/entrevistados é assimétrica. Nestes casos, os primeiros têm
daramente mais poder que os segundos, o que se traduz numa atitude de captura coerciva de
informação no ato da entrevista.

© Universidade Aberta 116


I. Visão Panorâ mica

• em segundo lugar, as diferenças que entre eles existem (de género, de idade,
sociais e culturais);

• em terceiro lugar, a sobreposição de canais de comunicação.


Influência do entrevistador no entrevistado
Apesar de ser desejá vel criar uma situação simétrica no estabelecimento do diálogo
entre o entrevistador e o entrevistado, a verdade é que existe, regra geral, uma objetiva
assimetria entre os dois interlocutores: o entrevistador possui um dado estatuto diferente
do do entrevistado, que pode limitar a comunicaçã o quer inibindo este último de colaborar
abertamente (por desconfiança), quer levando-o a responder às questões que lhe são
postas de acordo com o que pensa que o entrevistador deseja que ele próprio responda
(por efeito mimét/co).

O risco aumenta se o entrevistador for pouco cuidadoso na forma como coloca as


perguntas, induzindo as respostas com formas enfáticas de perguntar ou com modos
de excluir respostas possí veis. Vejamos dois exemplos:
• uma pergunta começada por uma expressão deste tipo: "o Sr. não acha que..." é
uma forma indutora por via enfática conduzindo o entrevistado a uma resposta
esperada pelo entrevistador;

• quando se pergunta ao entrevistado se concorda ou não com determinada


situação, admite-se apenas uma de duas respostas - sim ou não - quando
podem existir outras como "não sei, nunca tinha pensado nisso" ( entrevistado
não familiarizado com o problema) ou "depende da circunstância X, Y ou Z"
(entrevistado muito familiarizado com o problema e com as suas nuances).

Diferenças culturais entre entrevistador e entrevistado


As diferenças culturais86 entre entrevistador e entrevistado podem constituir também
sérios obstáculos à comunica ção.

Uma pergunta perfeitamente inocente numa dada cultura, como inquirir « que idade tem?»
pode ser considerada por um entrevistado de outra cultura um atentado à sua privacidade.
Para as gerações mais velhas, sobretudo em certos estratos sociais é considerado falta
de educa ção perguntar a idade a uma senhora.

Outras vezes surgem questões que são extremamente claras para o entrevistador uma vez
que fazem parte da sua cultura, mas que não fazem parte do campo de conhecimentos

86
Usa-se aqui o conceito de cultura na aceção usual das Ciências Sociais, sem qualquer conotação
valorativa.

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I. Visão Panorâ mica

do entrevistado, obrígando-o a especular improvisadamente sobre o assunto e a dar


respostas que não correspondem à sua experiência.

Imagine-se, por exemplo, que se está a inquirir uma popula ção de imigrantes cabo-
-verdianos e quer-se indagar da sua familiaridade com a literatura do seu país. Se a
pergunta for demasiado aberta (ex: que pensa sobre a literatura cabo-verdiana?) as
respostas serão demasiado ambíguas ou laterais. Para atingir o objetivo, haverá que
elaborar um conjunto de perguntas concretas sobre o conhecimento de escritores, de
artistas e de obras que permitam funcionar como indicadores de conhecimento sobre a
literatura cabo-verdiana. Se as perguntas forem objetivas as respostas serão por certo
mais verdadeiras.

Outra situação: perguntar a professores que não usam o computador no seu quotidiano
qual a sua opinião sobre a aplicabilidade da videoconferência como instrumento pedagógico
é um convite a especulações desenfreadas e à explicitação de ideias pré-concebidas sobre
o assunto.

Em ambos os exemplos não se teve em conta o campo de experiência do entrevistado


induzindo neste respostas artificiais ocasionadas pela sua incompreensão ou, pelo menos,
pela interpretação incorreta dos objetivos e alcance das questões formuladas. Os resultados
deste erro podem ser desastrosos em termos de investigação.

Sobreposição de canais de comunicação


Outra questã o a ter em conta numa situação de interação direta é a sobreposição de
canais de comunicação. Quando se faz uma pergunta, não se explicita verbalmente,
apenas, uma interrogação: a questã o pode ser formulada com vários tipos de entoação
que revelam a expectativa do entrevistador quanto à resposta; pode ser sublinhada ou
neutralizada pela sua postura, pela sua mímica ou por lapsos inconscientes.

Deste modo, ao preparar uma entrevista, o investigador tem de ter em conta que o modo
como põe as questões e como as enquadra em termos nã o-verbais é tão importante como
o seu conteúdo específico devendo ter tantos cuidados com a estratégia formal a adotar
como com a estruturação do guião.

2.2. Quando recorrer à entrevista ?

Como qualquer outra técnica de recolha de dados, o inquérito por entrevista deve ser
escolhido em certos contextos e evitado noutros. Duas situações típicas em que o uso
da entrevista é recomendá vel são as seguintes:
• nos casos em que o investigador tem questões relevantes, cuja resposta não
encontra na documentação disponí vel ou, tendo-a encontrado, não lhe

© Universidade Aberta 118


I. Visão Panorâ mica

parece fiá vel, sendo necessário comprov á-la82;

* em situações em que o investigador deseja ganhar tempo e economizar


energias recorrendo a informadores qualificados como especialistas no campo
da sua investigação — ou líderes da população-alvo que pretende conhecer.

Em qualquer dos contextos mencionados é fundamental ter consciência que ao ser


selecionada uma qualquer fonte de informa çã o estão a rejeitar-se outras,
que podem ser igualmente importantes. Um informador qualificado é um recipiente de
informa ção relevante, mas é também um filtro da própria informa ção. Num estudo de
comunidade, por exemplo, é fundamental cruzar as informações de vários líderes locais,
obtidas por entrevista, e todas elas com outro tipo de informação proveniente de outras
fontes, a fim de testar a sua fiabilidade. Se não se tiver esta precaução, o investigador
correrá o risco de se limitar a funcionar como caixa de ressonânciados seus informadores,
os quais têm uma perceção filtrada (necessariamente parcial) da realidade®3.

2.3. Tipos de entrevistas

De acordo com as múltiplas situações em que podem ocorrer, as entrevistas assumem


diversos formatos de modo a adequar-se convenientemente às contingências do ambiente
e aos objetivos que o investigador se propõe atingir. Para ter uma noção da diversidade que
pode assumir a estrutura e a estratégia de uma entrevista vejamos a tipologia já clássica
proposta por Madeleine Grawitz que se apresenta sob forma diagramada na figura 5.2.

87
Um exemplo deste tipo de questões: na pesquisa sobre os sistemas ibéricos de ensino
superior a distâ ncia não se encontrou, na documentação escrita, qualquer alusão significativa
às resistências à criação da Universidade Aberta, ocorridas durante os diversos anos da sua
gestação. Para se responder a esta questão, foi necessário recorrer a entrevistas a informadores
qualificados.
88
Na referida pesquisa sobre os sistemas ibéricos de ensino superior a distância, as entrevistas
realizadas aos dirigentes das duas universidades e dos centros associadosúa UNED, constituíram
fontes indispensá veis de informação que permitiram poupar muitos meses de trabalho mesmo
tendo em conta o tempo mais tarde despendido em cruzar algumas das informações obtidas
com outras fontes .
89
Esta questão que nos levaria à discussão sobre a representatividade das fontes e às técnicas
de amostragem, será discutida na segunda parte deste manual.

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I. Visão Panorâ mica

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1
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34
J 5 6

Fonte: Grawitz (1993, 572)


Figura 5.2 - Tipoiogia de Madelaine Grawitz

De acordo com esta autora pode-se classificar as entrevistas de acordo com um continuum,
variando entre um máximo e um mínimo de liberdade concedida ao entrevistado
e o grau de profundidade da informaçã o obtida. A partir desses dois critérios foi
construído o diagrama com um segmento de reta vertical, que representa o nível de
profundidade de informações que a entrevista pode fornecer; e o esboço de um polígono
que progressivamente se vai fechando tornando-se num hex ágono, correspondente ao
decrescente grau de liberdade de resposta proporcionada ao entrevistado.

A tipoiogia resultante apresenta seis tipos de entrevista que Grawitz classifica em


três grupos: entrevistas dominantemente informais, entrevistas mistas e entrevistas
dominantemente formais.

Entrevistas dominantemente informais


1 - Entrevista clínica
2 - Entrevista em profundidade
Entrevistas mistas
3 - Entrevista livre
4 - Entrevista centrada
Entrevistas dominantemente formais
5 - Entrevista com perguntas abertas
6 - Entrevista com perguntas fechadas

Figura 5.3 - Tipos de entrevista

A entrevista clínica (tipo 1), como o nome indica, é utilizada habitualmente em contextos
terapêuticos, caracterizando-se por uma liberdade quase total dada ao entrevistado

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I. Visão Panorâ mica

na sua resposta e na grande abundância e profundidade3® de informa ções que são


partilhadas.

A entrevista em profundidade (tipo 2), típica de situações de aconselhamento como


as que se realizam utilizando o método de Serviço Social de Casos ou as que decorrem em
situa ções de aconselhamento vocacional, apresenta ainda um grande grau de liberdade
no diálogo e profundidade na forma da abordagem temática por parte do entrevistado,
ainda que inferior à clínica.

Num grau intermédio de informalidade, encontram-se a entrevista livre (tipo 3) e a


entrevista centrada (tipo 4). Ambas são características dos estudos exploratórios,
diferindo entre si pelo nível de estruturação em torno das temáticas específicas que são
tratadas.

Características dominantemente formais têm as entrevistas estruturadas com perguntas


abertas (tipo 5) ou fechadas (tipo 6). Nestas últimas, típicas em situação de sondagem,
feitas a populações de muito grande dimensão, o grau de liberdade do respondente é
claramente reduzido bem como a profundidade da informação obtida.

Tipo de Número de Ordem das Forma das Focagem das Situa çã o Possibilidades
entrevista questões questões questões questões Comunicadonal de aná lise
+ abertas no Quase monólogo + qualitativa
1. Clínica <« <« entrevistado
2. Em
<< <<
profundidade

3. Livre < <


4. Centrada > >
5. Com
perguntas >> >>
abertas
+ fechadas nos conhe ¬
Quase diálogo + quantitativa
6, Com cimentos do
perguntas >>> > >> entrevistado
fechadas

Figura 5.4 - Variá veis caracterizadoras do tipo de entrevista

A fim de melhor caracterizar os seis tipos de entrevista observe-se a figura 5.4 em que
se procura diferenciá-las de acordo com seis variáveis : o número das perguntas, a
sua ordem, a sua forma, a sua focagem dominante, o grau de intera ção entre
entrevistador e entrevistado e a facilidade de aná lise das respostas.

90
Madeleine Grawitz utiliza o termo profundidade, no sentido de quantidade de informação de
acesso reservado.

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I. Visão Panorâ mica

A leitura horizontal do quadro permite caracterizar facilmente cada um dos tipos de


entrevista acima referidos.

Assim, por exemplo, a entrevista clí nica (tipo 1) de dura ção tendencialmente longa,
caracteriza-se por um número de perguntas muito reduzido, quase sem ordenação,
apresentando uma forma quase sempre aberta, focadas dominantemente sobre a
vivência pessoal do entrevistado o que conduz a respostas eminentemente subjetivas.
0 grau de interação entre entrevistador e entrevistado apresenta -se sob a forma de um
quase -monólogtIa1 e a facilidade de aná lise quantitativa das respostas é reduzida .

No outro extremo do continuum, situa-se a entrevista com perguntas fechadas, de


duração tendencialmente curta, que se caracteriza por um número de perguntas em
regra mais elevado, com uma ordenação muito rigorosa, apresentando uma forma
quase sempre fechada, focadas dominantemente nos conhecimentos e opiniões
do entrevistado. 0 grau de intera ção entre entrevistador e entrevistado apresenta-se
sob a forma de um quase-diá!og&- e a facilidade de aná lise quantitativa das respostas
é grande.

2.4. Aspetos de natureza prá tica

Independentemente do tipo de entrevista a realizar experiência resultante do trabalho


de campo aconselha a adoção de um conjunto de padrões de atuaçã o que se tornaram
habituais, e devem ser tidos em conta antes, durante e depois da entrevista (fig.
5.5) .

Antes da entrevista
Como qualquer outra tarefa de investigação a entrevista exige um planeamento cuidadoso.
Desse planeamento devem constar os procedimentos que a seguir se enumeram de forma
sumária.

Definir os objetivos. O planeamento de uma entrevista deve começar por integrar a


explicitação dos objetivos que se querem alcançar. Um modo de testar a sua clareza e
rigor é interrogarmo- nos, após a sua conceção se, quando terminar a recolha de dados,

91
Quase-monólogo uma vez que o entrevistador tem uma intervenção extremamente reduzida.
0 termo quase, exprime a interação do entrevistador que, ainda que reduzida, intervém na
produção do discurso com a sua simples presença.
92
Quase-diálogovisto que a situação de entrevista é artificia!. Apesar da dinâ mica interativa gerada
pelo conjunto perguntas/respostas ser semelhante a um diá logo vulgar, a sua formalização
retira -lhe a espontaneidade; dai a expressão quase.

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I. Visão Panorâ mica

estaremos em condições de afirmar rigorosamente que os objetivos foram ou não foram


atingidos.

Antes:
Definir o objetivo
Construir o guia de entrevista
Escolher os entrevistados
Preparar as pessoas a serem entrevistadas
Marcar a data, a hora e o local
Preparar os entrevistadores (formação técnica)
Durante:
Explicar quem somos e o que queremos
Obter e manter a confiança
Saber escutar
Dar tempo para "aquecer " a relação
Manter o controlo com diplomacia
Utilizar perguntas de aquecimentos, focagem
Enquadrar as perguntas melindrosas
Evitar perguntas indutoras
Depois:
Registar as observações sobre o comportamento do entrevistado
Registar as observações sobre o ambiente em que decorreu a entrevista

Figura 5.5 - Aspetos a ter em conta na utilização da técnica de entrevista

Construir o guiã o. Após a definição clara e rigorosa dos objetivos da entrevista, há que
os operacionalizar sob a forma de variá veis. Por exemplo, ao objetivo definira origem
social\ o perfil profissional e a situação académica à entrada para um determinado
programa de formação profissional, devem corresponder diversas variá veis que o
vão operacionalizar ( ex: sexo, idade, lugar de nascimento, residência, profissão dos
pais, estado civil, número de filhos, antecedentes académicos familiares, profissão,
habilitações académicas à data da inscrição)— . Após este procedimento, o investigador
vai ter de operacionalizar as variáveis em perguntas adequadas às metas que
pretende atingir. Por exemplo a variável idade pode ser formatada no guião de vá rias
formas:
- Que idade tem?
ou
- Em que ano nasceu?

93
Adaptado de ARETIO, L. G. ( 1985), Licenciados Estremenos de la UNED: Memorial de
Licenciatura, Badajoz, Universidad Nacional de Educación a Distancia. Centro Regional de la
Estremadura, pp. 20-21.

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I. Visão Panorâ mica

ou
- A sua idade está incluída em qual dos seguintes grupos
Menos de 20
Entre 20 e 24
Entre 25 e 29
Entre 30 e 34
Mais de 34
ou ainda
Menos de 20
Entre 20 e 29
Entre 30 e 39
Entre 40 e 49
Mais de 49

Para o guião de entrevista ficar pronto a ser utilizado haverá ainda que encadear as
questões de forma adequada ao objetivo da pesquisa34.

Escolher entrevistados. Tal como na seleçã o e encadeamento das perguntas, a escolha


dos futuros entrevistados deve ser adequada aos objetivos da pesquisa. Tal adequação
pode ser personalizada, no caso de amostras intencionais em que se procura inquirir
um conjunto de informadores qualificados, ou feita aleatoriamente dentro do universo
correspondente ao objeto de estudo®5.

Preparar os entrevistados. A fim de garantir a disponibilidade dos entrevistados no


ato da entrevista é aconselhável, sempre que possível, contactá- los previamente. Os
objetivos dessa diligência são os seguintes:
• informá-los sobre os resultados que esperamos obter daquela entrevista;
• explicitar os motivos de os havemos escolhido para serem entrevistados,
mostrando o valor acrescentado que as suas respostas podem trazer à
investigação em curso;

• informá-los sobre o tempo de duração previsto para a sua realização;


• combinar a data, a hora e o local para realizá-la.

94
Para um aprofundamento da questão do encadeamento das questões veja o ponto relativo aos
inquéritos por questionário, que se segue.
95
Para uma melhor compreensão desta questão veja na segunda parte deste manual a secção
correspondente à técnica de amostragem. Veja também Clegg, Frances ( 1995, 159- 172}.

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I. Visão Panorâ mica

A experiência tem demonstrado que o contacto pré vio com os entrevistados (que pode
ser feito presencialmente mas também pelo correio, telefone, fax, correio eletrónico ou
outro qualquer canal) n ão é um gasto inútil de energias mas constitui, pelo contrário, um
investimento . Ao ter esse procedimento o investigador não só fica com mais garantias
sobre a disponibilidade física e psicológica— da pessoa escolhida mas também se lhe
apresenta com uma imagem de profissionalismo e demonstra ter respeito pelo
seu tempo, o que, decerto, irá ter efeitos positivos no ambiente em que a mesma irá
decorrer.

Durante a entrevista
É comum vermos e ouvirmos, na televisão e na rá dio, situações de entrevista que retratam
exatamente o que um entrevistador em contexto de investigação científica nã o deve
fazer. Esta afirmação não envolve necessariamente uma crítica global aos jornalistas,
uma vez que o contexto e os objetivos de tais entrevistas são completamente diferentes
dos de uma entrevista que serve os fins de uma dada pesquisa científica . Veja -se então
alguns padrões de atuação que têm vindo a revelar-se indutores de eficácia e de eficiência
numa entrevista em contexto de investiga ção.

A questã o inicial . Ao iniciar a entrevista e após uma breve síntese enquadradora


lembrando as informações já partilhadas no contacto prévio, torna-se importante escolher
uma questão inicial que coloque o entrevistado no tema da conversa e que o ajude a
aquecero ambiente relacional. Os especialistas em negocia ção afirmam que os primeiros
momentos são cruciais por determinarem a cria ção de um clima de confiança ou de
desconfiança difusa que se vai refletir ao longo das negociações. Isto aplica-se claramente
à situação de entrevista, uma vez que se está em presença de uma negociação, ainda
que implícita, cuja matéria prima é a informação.

Saber escutar . Contrariamente ao jornalista que, pressionado pelo tempo de antena e


pelo consequente ritmo que tem de imprimir ao programa, interrompe frequentes vezes
o entrevistado, o investigador em Ciências Sociais (provavelmente como o jornalista
de investiga ção) tem de assumir uma atitude de escuta, evitando cortar a palavra ao
entrevistado. Esta atitude implica, antes de mais, dar-lhe tempo para se adaptar -

96
O efeito habitual da ausência de contactas prévios é a entrevista não se realizar ou, o que
é pior, decorrer em ambiente tenso com o entrevistado a despachar o entrevistador com
respostas estereotipadas por ter outras coisas agendadas conferindo ao entrevistador o papel
de intruso ou de ladrão do seu precioso tempo.

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I. Visão Panorâ mica

espontaneamente22 ou recorrendo a perguntas de aquecimento - e deixá-lo exprimir-


-se pelas suas próprias palavras e ao seu ritmo pessoal. É importante, sobretudo em
entrevistas pouco estruturadas, saber respeitar os silêncios que por vezes ocorrem no
discurso do entrevistado, permitindo-lhe assim refletir sobre o que fala. As situações de
silêncio são difíceis de aguentar podendo afirmar-se que o saber geri- las adequadamente
constituí um sinal sólido da experiência e tecnicidade de um investigador.

Controlar o fluxo de informação . É comum observar-se, no entanto, que após um


período de inibição inicial, em que as respostas são dadas de forma curta e incompleta,
obrigando o entrevistador a perguntas de suporte ou de focagem para obter a
informa ção pretendida, o respondente ganha confiança e aumenta excessivamente o
fluxo de informação. Nessas circunstâncias é necessário manter o controlo do fluxo de
respostas com diplomacia, especí almente se se tratar de uma entrevista mais estruturada
(vide supra, entrevistas de tipo 5 e 6).

Enquadrar as perguntas melindrosas. Por vezes o entrevistador tem de fazer perguntas


melindrosas. Tais questões devem ser posicionadas no fim da entrevista, altura em que
existe um maior clima de confiança. Se ainda assim desencadearem uma reação negativa
no entrevistado, a desconfiança criada não terá prejudicado a entrevista . As questões
delicadas devem assim ser cuidadosamente enquadradas por perguntas preparatórias.
Não é tarefa fácil, temos que reconhecê-lo, razã o pela qual os entrevistados têm que ser
cuidadosamente escolhidos e preparados para o seu desempenho.

Depois da entrevista
Após a entrevista é sempre útil registar as observações sobre o comportamento verbal
e não verbal do entrevistado, bem como sobre o ambiente em que a mesma
decorreu. Tal registo permitirá levantar hipóteses mais seguras sobre a autenticidade das
respostas obtidas e sobre o grau de liberdade com que foram dadas. Numa entrevista feita
em público, por exemplo, o respondente está sujeito a um conjunto de constrangimentos
sociais que poderá não ter se tal entrevista for efetuada na intimidade da sua casa, sem
a presença de espectadores.

Atividade 5.2
Faça o planeamento da recolha de dados para cada uma das situações de
entrevista que identificou na atividade 5.1, considerando os seguintes fatores:
• apresentação ao entrevistado

97
Um recurso habitualmente usado para dar confiança ao entrevistado é o uso de técnicas de
...
reforço através de expressões como "estou a ver ", da repetição pardal e da reformulação do
discurso do entrevistado.

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• prevenção da sua influência no entrevistado e do facto de pertencerem a


(sub)culturas diferentes
• eventualidade de poder obter a informação por outros meios (ex.
documentais)
• tipo de entrevista a adotar
• aspetos práticos a ter em conta

3. INQUÉRITOS POR QUESTIONÁRIO

Como dissemos atrás, o inquérito por questionário distingue-se do inquérito por entrevista
essencialmente pelo facto de investigador e inquiridos nã o interagirem em situação
presencialM.

3.1. A intera ção indireta, questã o chave do inquérito por questioná rio

Deste modo, assim como a intera ção direta é um dos principais problemas com que
o investigador se debate quando faz uma entrevista, a intera ção indireta constitui o
problema -chave que acompanha a elabora ção e administração de um inquérito por
questionário. Duas questões devem ser examinadas a este respeito: o cuidado a ser posto
na formula ção das perguntas e a forma mediatizada de contactar com os inquiridos.

Formulação das perguntas


Se na entrevista, como se viu atrás, deve haver uma cuidadosa preparação, o planeamento
de um inquérito por questionário exige, também, especiais atenções uma vez que não há
hipótese de esclarecimento de dúvidas no momento da inquirição.

Antes de mais, o sistema de perguntas deve ser extremamente bem organizado, de


modo a ter uma coerência intrínseca e configurar-se de forma lógica para quem a ele
responde. Deve ser organizado por temáticas claramente enunciadas, reservando-se as
questões mais difíceis ou mais melindrosas para a parte final pelas razões atrás apontadas.
Habitualmente um questionário integra vários tipos de perguntas:
• perguntas de identificaçã o que, como o nome indica, sã o as que se destinam
a identificar o inquirido, nã o nominalmente (muitas vezes os questionários são

38
Tal como no inquérito por entrevista quando se escolhe o inquérito por questionário como
instrumento de recolha de dados deve respeitar- se o conjunto de procedimentos habitual
para qualquer investigação: definir rigorosamente os seus objetivos; formular hipóteses e
questõ es orientadoras, identificar as variá veis relevantes, selecionar a amostra adequada de
inquiridos, elaborar o instrumento em si, testá -lo e administrá-lo para depois poder analisar os
resultados.

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I. Visão Panorâ mica

anónimos), mas referenciando-o a certos grupos sociais específicos (de idade,


género, profissão, habilitações académicas, etc.);

• perguntas de informação, que têm por objetivo colher dados sobre factos e
opiniões do inquirido;

• perguntas de descanso ou de preparação, muitas vezes sem tratamento


posterior, que servem para intencionalmente introduzir uma pausa e
mudar de assunto, ou para introduzir perguntas que ofereçam maior
dificuldade manifesta ou inibam o respondente pela sua natureza
melindrosa;

• perguntas de controlo, destinadas a verificar a veracidade de outras perguntas


insertas noutra parte do questionário.

A forma mediatizada de contactar com os inquiridos exige particulares cuidados ao


investigador, no que respeita aos canais de comunicação selecionados, à s técnicas
utilizadas para evitar a recusa ao fornecimento de respostas e ao esforço para garantir
a sua fiabilidade.

Diversidade de canais de comunica ção


Os canais de comunicação entre inquiridor e inquiridos podem ser vários, exigindo cuidados
adequados à sua natureza pois variam em cada caso. Os questioná rios enviados pelo
correio devem ser acompanhados por envelope para resposta, devidamente endereçado
e selado ou com resposta paga, a fim de reduzir as não respostas. Por seu turno, os que
forem enviados por portador, exigem a prévia preparação de quem os leva, uma vez que
essas pessoas assumem frequentemente o papel de agentes realizadores de entrevistas
estruturadas. Em investiga ções sobre organizações é habitual enviar os questionários
pelos circuitos burocrá ticos usuais. Neste caso é importante que a imagem do
investigador não fique colada à de qualquer grupo pertencente à organização (patrões,
sindicatos, etc) de modo a que as respostas não venham falseadas por esse motivo.

Hoje, com as autoestradas da informação, é possível lançar inquéritos por via telemá tica .
Apesar do fascínio que este canal possui, vale a pena recordar que para muitas situações
não parece ser o canal indicado uma vez que não está acessível a toda a populaçã o a
inquirir, pondo-se fortemente a questão da representatividade das respostas. Como se
sabe os cibernautastêm um perfil específico, não sendo ainda um grupo que cubra a
totalidade dos universos a inquirir. Se o problema se pode colocar em termos de amostras
representativas, o mesmo não acontece no que respeita à s amostras intencionais,
nomeadamente em inquéritos a especialistas: usando as autoestradas da informação,

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I. Visão Panorâmica

o investigador pode em muito pouco tempo obter respostas a questões específicas, por
parte de um número significativo de utilizadores das redes telem á ticas de qualquer parte
do mundo.

Prevençã o das não-respostas


Um dos grandes problemas dos inquéritos por questioná rio é a elevada taxa de não-
-respostas. Vários autores têm feito referência à existência de fatores condicionadores
do nível de devoluções dos questionários:
• natureza da pesquisa: se a pesquisa tem uma natureza em que a sua utilidade
seja evidente para o inquirido, a taxa de respostas tende a aumentar;

• tipo de inquirido: os inquiridos com maior nível de habilitações académicas


tendem a responder com mais frequência; em contrapartida, populações com
baixa instrução tendem a não responder;

• sistema de perguntas: quanto mais simples for o sistema de perguntas


quer em matéria de objetividade quer de clareza, maior é a probabilidade de
aumentar a taxa de respostas;

• instruções claras e acessíveis: prendendo-se à variável anterior, quanto mais


fáceis e claras forem as instruções de preenchimento, mais êxito se prevê no
número de respostas; instruções demasiado complicadas e longas constituem
um excelente dissuasor de colabora ção;

• estratégias de reforço: cartas de anúncio do lançamento do inquérito, cartas


de legitimação da sua utilidade social ou científica feitas por entidades credíveis
e cartas aos não respondentes dando-lhes uma segunda oportunidade para
o fazerem, sã o estratégias de reforç o que normalmente aumentam a taxa de
respostas.

A questã o da fiabilidade
De um modo geral, a tecnologia do inquérito por questionário é bastante fiável desde que
se respeitem escrupulosamente os procedimentos metodológicos quanto à sua conceção,
seleção dos inquiridos e administração no terreno. No entanto, é convergente a opinião
de que as questões objetivas são mais fiáveis que as questões subjetivas.

3.2. Aspetos de natureza prá tica

Tal como em relação à entrevista (vide supra, ponto 2.4.), a elaboração de um inquérito por
questionário carece de certos cuidados. Seguí damente referir-se-ão alguns procedimentos
habituais em inquéritos por questionário, que poderá estudar mais detalhadamente nas
obras referidas no final do capítulo.

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I. Visão Panorâmica

Fase preliminar ( antes)


A conceção e administra ção de um questionário exigem alguns padrões de atuaçã o tanto
quanto à construção das perguntas como no que se refere à apresentação do questionário
(fig. 5.6).

Construçã o das perguntas


Reduzidas ao Q.B. Quem tenha por passatempo a gastronomia conhece a sigla Q.B.
que significa quanto baste sendo habitualmente usada para fazer referência à introdução
equilibrada de temperos nas receitas de culinária. Num inquérito por questionário a noção
de Q.B. é indispensável quando se reflete sobre o número de quest ões a introduzir: se
forem em número excessivamente reduzido podem não abranger toda a problemática que
se pretende inquirir; se, pelo contrário, forem demasiado numerosas, não só se arrisca
a ser de análise impraticá vel no tempo disponível para investigação como têm um efeito
dissuasor sobre os inquiridos aumentando a probabilidade de não resposta. O número de
perguntas de um questionário deve ser, por isso, o adequado à pesquisa em presença
e não mais que esse quanto baste.

Tanto quanto possível fechadas. Um modo de objetivar as respostas e de não permitir


que estas sejam ambíguas é fechar as perguntas. Fechar uma pergunta é, como se
sabe, apresentar ao respondente um nú mero limitado de respostas típicas que este pode
escolher. Neste procedimento h á algumas regras elementares a obedecer.
• O número de respostas- tipo não deve ser excessivo, a fim de não dispersar
os respondentes, nem demasiado baixo, de modo a permitir uma discriminação
analítica posterior.

• As instruções sobre o modo de responder a cada pergunta devem ser


claras e precisas. Por exemplo: Coloque uma cruz na resposta escolhida
(uma só opção ... ou ... duas opções) ) assinale a sua opinião relativamente
às afirmações seguintes do seguinte modo: concordo totalmente ; concordo
parcialmente ; nã o tenho opinião formada ; discordo parcialmente ;
discordo totalmente .
• Quando se pede ao inquirido ponha uma única cruzna resposta correspondente
à sua escolha as respostas-tipo devem ser mutuamente exclusivas.

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I. Visão Panorâ mica

QUANTO À S PERGUNTAS:
- Reduzidas ao Q. B.
- Tanto quanto possívei fechadas
- Compreensíveis para os respondentes
- Não ambíguas
- Evitar indiscrições gratuitas
- Confirmar-se mutuamente
- Abrangerem todos os pontos a questionar
- Relevantes reiativamente à experiência do inquirido

QUANTO À APRESENTAÇÃO DO QUESTIONÁRIO:


- Apresentaçã o do investigador
- Apresentaçã o do tema
- Instruções precisas quanto ao seu preenchimento
- Envelope selado para resposta
- Qualidade e cor do papel
- Disposição gr áfica
- Quadros
- N° de folhas

Figura 5.6 - Cuidados a ter na construção de um inquérito por questionário

Compreensí veis para os respondentes. Isto significa que a pergunta deve formalizar
uma interrogação cujo significado seja percebido pelo inquirido mesmo que este não
saiba responder- lhe. Quando há essa hipótese, a resposta -tipo correspondente (ex: não
sei ) deve figurar como opção.

Não ambíguas. As respostas padrã o não podem ser amb íguas ou terem leituras
subjetivas. Por exemplo, imaginando que se quer questionar a frequência de idas ao
cinema de uma dada popula ção, deve-se evitar respostas tipo como Vou muitas rezes D
Vou raramente Não vou nunca , uma vez que cada respondente tem a sua medida
pessoal. Neste caso seria mais adequado apresentar um conjunto de respostas-padrão
do tipo No último mês... fui mais de oito vezes ao cinema ; ... fui entre 4 e 8 vezes
ao cinema ; ... fui entre 1 e 3 vezes ao cinema não fui ao cinema .
Evitar indiscrições gratuitas. Nota -se por vezes, sobretudo em investigadores com
pouca experiência, uma curiosidade mórbida em querer saber coisas sobre a população
inquirida, traduzida num excesso de perguntas melindrosas ou indiscretas. Para além de
se tratar de um procedimento deontologicamente reprov á vel, funciona como dissuasor
de resposta.

Confirmarem- se. Nalguns casos é conveniente, como atrá s se referiu, construir


perguntas de controlo, destinadas a verificar a veracidade de outras questões insertas
noutra parte do questionário.

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I. Visão Panorâ mica

Abrangerem todos os pontos a questionar. Isto significa que o investigador deve


verificar cuidadosamente, antes do lançamento do questionário, se este abrange todos
os portos da problemática a inquirir.

Pertinentes relativamente à experiência do inquirido. Conforme se referiu ra


secção consagrada à entrevista, não tem sentido questionar uma populaçã o sobre uma
matéria que está fora do seu campo cognitivo.

Escalas de atitudes. Por vezes as questões podem ser colocadas sob a forma de uma
escala de atitudes, permitindo ao investigador medir atitudes e opiniões do inquirido.

Pede-se a um indiví duo para reagir positiva ou negativamente em relação a uma série de
proposições que dizem respeito a ele próprio, a outros indivíduos, a atividades diversas, a
instituições ou a situações. Deste modo características qualitativas podem posterior mente
ser trabalhadas de forma quantitativa.

Existe uma grande variedade de escalas que poderão ser aprendidas na bibliografia de
especialidade. A título de exemplo, apenas se referem duas muito usadas.
• Escalas de Likert: consistem na apresentação de uma série de proposições,
devendo o inquirido, em rela ção a cada uma delas, indicar uma de cinco posições:
concorda totalmente, concorda, sem opinião, discorda, discorda totalmente.
As respostas são seguidamente cotadas, respetivamente com as cotações de
+2, +1, 0, -1 e -2, ou com pontuações de 1 a 5. No entanto, se a proposição
é negativa, a cotação tem de ser invertida. Por exemplo concordar com a
afirmação "não gosto de matemática porque a matéria não tem relação com
a realidade", significa uma atitude negativa relativamente à Matemática. Nesse
caso a resposta concorda totaimente recebe uma cotação de -2, concorda será
-1 e assim sucessivamente.

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1. Visão Panor â mica

Exempto de preenchimento : por favor Coloque uma crur, ( apenas uma ) no quadrado que melhor se adequar è sua resposta, na coluna da direita e outra cru; na coluna da
esquerda
O que acontece O que deveria acontecer

Nunca Quase Algumas Quase Sempre Nunca Quase Algumas Quase Sempre
nunca Vezes sempre nunca Vezes sempre
Ando fardado de acordo com as regras do fardamento
X 22 X
em vigor

0 que acontece 0 que deveria acontecer


Nunca Quase Algumas Quase Sempre Nunca Quase Algumas Quase Sempre
nunca Vezes sempre nunca Vezes sempre
28 Envio "status" para a central de emergê ncia
29 Procedo ao exame da vítima de acordo corn o protocolo
30 Avalio a gravidade e a extensão das lesões
Procuro recolher informações junto da vítima, seus
31
familiares ou testemunhas do sucedido
32
Verifico no local da ocorr ência a existência os meios
suficientes e adequados
33 Efetuo o diagnostico preliminar da vítima
Informo a central, via rádio, acerca dos dados
34
recolhidos e do possí vel diagnóstico preliminar
Informo o médico, no local da ocorr ência, dos dados do
35
doente e da atuação da equipa
Discuto com o m édico no local da ocorrê ncia, o
36
diagn óstico da ví tima
Atuo de acordo com as indicações fornecidas pela
37
central ou médico no tocai
Tenho a liberdade para decidir quais os procedimentos
38
a adotar
; 39 Efetuo a£ técnicas de SBV
40 Sempre que se justifique coloco a vitima em PLS
41 Avalio os Sinais Vitais da vitima
Se necessá rio coloco em curso um soro, em veia
42 periférica, mesmo que ainda não tenha recebido
indicação medica
Fonte: MATEUS, Bá rbara (2GQ5), A comunica çã o em equipas de emerg ê ncia pr é hospitalar , Mestrado em Comunicação em Saúde, Universidade Aberta .
Figura 5 - 7 - Um exemplo da escala de Ukert

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I. Visão Panorâ mica

• Diferenciais semânticos (Osgood, Suei 6 Tannenbaum, 1957). Consiste na


apresenta ção de diversos pares de adjetivos bipolares (antónimos) separados por
uma linha geralmente dividida em 7 ou 5 partes. O inquirido deverá colocar uma
cruz no intervalo correspondente à sua atitude relativamente a um determinado
tópico. Por exemplo, e ainda relativamente à disciplina de Matemática:

Interessante Aborrecida

Útil Inútil

É dada uma cotação a cada par de adjetivos (ex: de 6, no caso de assinalar o intervalo
mais próximo de do adjetivo positivo, a 0, no caso oposto). Faz-se o somatório das
cotações para ter uma apreciação quantitativa relativa à atitude do inquirido face ao
tópico considerado.

Apresentação do questionário
A apresentação formal e física do questionário é muito mais importante do que se
possa imaginar. Com efeito, como as empresas comerciais que vendem pelo correio já
descobriram há muito, a apresenta ção funciona como elemento legitimador (ou não),
tendo uma quota parte de responsabilidade no êxito ou inê xito de um inquérito por
questionário. Vejamos alguns elementos práticos a não esquecer.

A apresenta ção do investigador deve conter os elementos indispensáveis para o


credibilizar aos olhos do inquirido.

A apresentação do tema, por sua vez, deve ser feita de forma clara e simples, mostrando
o valor acrescentado que o inquirido pode trazer à investigação com as respostas que
forneça.

As instruções devem ser precisas, ciaras e curtas: quando são ambíguas ou demasiado
complicadas tornam-se contraproducentes, como nos diz a nossa experiência de cidadão
quando temos, por exemplo, de preencher certos impressos que constituem autênticas
charadas.

Sempre que enviado pelo correio, o questionário deve ser acompanhado de um envelope
selado ou com resposta paga . A qualidade e a cor do papel devem ser adequadas
ao público-alvo. A qualidade do papel deve ser suficientemente boa, para que as perguntas
possam ser impressas no verso e reverso da folha.

A sua disposiçã o grá fica deve ser tã o clara quanto possível e adequada ao público-alvo.
Por exemplo não é conveniente usar quadros de duas entradas num formulário para ser

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I. Visão Panorâmica

preenchido por uma popula ção que não está familiarizada com esse tipo de suporte de
informa ção. A mancha grá fica deve ser aberta e visualmente atrativa.

O formulário deve ser alvo de uma rigorosa revisão grá fica evitando gralhas ortográficas
e erros sintáticos que naturalmente fazem baixar a credibilidade do inquérito aos olhos
do respondente.

O número de folhas deve ser reduzido ao mínimo, para evitar reações prévias negativas
por parte do inquirido. É conveniente informá - lo do tempo médio previsto para a
resposta,

Em suma, a construção de um formulário deve obedecer a dois critérios: clareza


e rigor na apresentação e comodidade para o respondente

Atividade 5.3
Faça o planeamento da recolha de dados para cada uma das situações de
inquirição que identificou na atividade 5.1, considerando os seguintes fatores:
• formulação e estruturação das perguntas
• diversidade dos canais de comunicação possíveis
• prevenção das não respostas
• apresentação do questionário

O decorrer ( durante)
Quando uma primeira versão do questionário fica redigida, é necessário garantir a sua
aplicabilidade no terreno e avaliar se está de acordo com os objetivos inicialmente
formulados pelo investigador. A primeira versão tem, assim, que ser testada para se
verificar, entre outros aspetos,
• se todas as questões são compreendidas pelos inquiridos da mesma forma, e da
forma prevista pelo investigador;

• se as respostas alternativas às questões fechadas cobrem todas as respostas


possíveis;

• se n ã o haverá perguntas inúteis, inadequadas à informaçã o pretendida,


demasiado difíceis ou a que um grande número de sujeitos se recusa a responder,
por serem tendenciosas ou desencadeadoras de reações de autodefesa;

• se não faltarão perguntas relevantes;


• se os inquiridos nã o considerarão o questionário demasiado longo, aborrecido
ou difícil.

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I. Visão Panorâ mica

Esse procedimento, designado por pré- teste, poderá também permitir averiguar as
condições em que o questionário deverá ser aplicado, a sua qualidade gráfica e a adequação
da carta e das instruções que o acompanham.

Poderá ser administrado primeiramente a um pequeno número de pessoas que conheçam


o tema do questionário, em condições de identificar os seus maiores problemas e dar
sugestões para o melhorar, preferencialmente através de entrevista.

Seguidamente, deverá ser aplicado a uma pequena amostra de indivíduos pertencentes


à populaçã o do inquérito (mas que não faç am parte da amostra selecionada) ou a uma
popula ção similar (no caso do questionário ser administrado à totalidade da população
considerada). Esta amostra deverá ser encorajada a fazer observações e sugestões que
digam respeito ao questionário no seu todo e a cada uma das suas perguntas. Após
uma análise cuidadosa das respostas dadas dever-se-á proceder à redação definitiva do
questionário.

Após este procedimento o inquérito deverá ser enviado por um dos vários canais atrás
referidos sendo conveniente (quando possível) o investigador ter a precaução de controlar
se chegou aos seus destinatários.

Fase subsequente ( depois)


Uma vez recebidos os questionários devidamente respondidos, devem ser alvo de uma
primeira leitura pelo investigador, a fim de verificar a fiabilidade das respostas e de
codificar as que resultam de perguntas abertas8®.

Seguidamente, está em condições de proceder ao tratamento e análise dos dados quer por
via manual quer informática. Sempre que possível, é vantajoso usar meios informáticos pela
rapidez e potência de cálculo que o trabalho computacional permite. Existe atualmente no
mercado software bastante poderoso para este tipo de trabalho— , valendo a pena gastar
algum tempo a aprender a manejá-lo, ou, pelo menos a conhecer as suas potencialidades
para saber encomendar os elementos que se necessita a operadores qualificados.

99
Quando o questionário é lançado já deve ter havido um trabalho de pré-codificação de todas
as respostas fechadas e um esboço de codificação das perguntas abertas. No entanto, só
após a recolha de dados, é possível a codificação final das perguntas abertas e a afinação de
alguns códigos das perguntas fechadas, estas últimas em virtude da ausência de certo tipo
de respostas.
100
Por exemplo o SPSS para tratamento estatístico e o NUDIST para aná lise de conteúdo.

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I. Visão Panorâ mica

4. EM SÍ NTESE: VIRTUALIDADES E LIMITAÇÕES DA ENTREVISTA E


DO QUESTIONÁ RIO

Em jeito de síntese pode dizer-se que qualquer destes dois instrumentos de recolha de
dados apresenta virtualidades e limitações, que procuramos sumariar na figura 5.8:

Técnica PRÓ S CONTRAS

Inquérito por - Flexibilidade quanto ao tempo de duraçã o, - Requer maior especialização do


entrevista adaptaçã o a novas situações e a diversos tipos investigador
de entrevistados (ex : analfabetos)
- Custa mais caro
- Profundidade ( Permite observar o entrevistado
e colher informações íntimas ou de tipo - Gasta mais tempo
confidencial)
Inquérito por - Sistematizaçã o - Dificuldades de conceção
questioná rio -
Maior simplicidade de analise - N ã o é aplic á vel a toda a
população
- Maior rapidez na recolha e análise de dados
- Elevada taxa de não respostas
- Mais barato

Figura 5.8 - Prós e contras da entrevista e do questioná rio

Teste formativo

1. Após leitura aprofundada do texto do capítulo e realizadas as respetivas atividades,


abra o Manual na página intitulada objetivos da unidade.

2. Tente atingir os 23 objetivos, escrevendo as suas respostas sem recorrer ao texto do


interior do capítulo.

3. Confira as suas respostas com o texto e corrija-as.

Leituras complementares

BOUDON, Raymond (1973), Les M é thodes en Sociologie, Paris, PUF.

CLEGG, Frances (1995), Estatística para Todos, Lisboa, Gradiva, pp. 159-172.

GHIGLIONE, Rodolphe e MATALON, Benjamin (1993), O Inquérito. Teoria e Prá tica,


Oeiras, Celta.

GRAWITZ, Madeleine (1993), M é thodes des Sciences Sociales, Paris, Dalloz, 9 a


edição, pp. 569-631.

HILL, Manuela e Andrew (2000), Investiga çã o por questionário, Lisboa, Sílabo.

© Universidade Aberta 137


I. Visão Panorâ mica

MERTON, Robert King; KENDALL, Patrícia L. ( 1946), The focused interview, "The
American Journal of Sociology, vol. 51, n 6, May, pp. 541-557,
°
MERTON,Robert King,(1987),Thefocused interviewand focusgroups: continuities
and discontinuities, "The Public Opinion Quartely, vol. 51, n 4, Winter, pp. 550-
°
566.

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I. Visão Panorâ mica

Unidade 6 - 0 Relatório de Pesquisa

Objetivos da unidade

No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a :


1. explicitar a importâ ncia do relatório no contexto do processo de pesquisa;

2. identificar as questões sobre as quais o investigador deve refletir antes de elaborar


o relatório da pesquisa efetuada;

3. explicitar as principais componentes de um relatório científico;

4. identificar as três principais motivações que levam à elaboração de um projeto de


investigação;

5. distinguir algumas características comunicacionais diferenciadoras de relatórios


destinados a diferentes públicos-alvo;

6. identificar alguns condicionamentos espa ç o -institucionais e temporais da


investigação;

7. reconhecer a importância de uma reflexão epistemológica e metodológica sobre


o modo como decorreu a pesquisa e a sua explicitação no relatório;

8. identificar as principais componentes de um relatório científico;

9. explicitar a importâ ncia da apresentaçã o do problema de investiga çã o no


relatório;

10. reconhecer a natureza substantiva da apresentação de resultados no relatório;

11. referir a import â ncia da identifica çã o das consequências da pesquisa no


relatório;

12. identificar e discutir os princípios básicos que enformam a elaboraçã o de um


relatório de pesquisa;

13. explicitar a importâ ncia da estrutura ção do relatório;

14. discutir as vantagens e inconvenientes de diversos sistemas de estruturação;

15. enunciar duas diferentes estratégias de construção de um relatório;

16. identificar e discutir diversos procedimentos para introduzir maior rigor e clareza
num relatório.

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I. Visão Panorâ mica

1. INTRODUÇÃO

Pesquisas cuidadosamente planeadas, com dados interessantes recolhidos, tratados e


interpretados de forma correta, não têm frequentemente junto dos públicos-alvo a que se
destinam um impacto proporcional ao esforço despendido e aos resultados alcançados. Isto
deve-se, muitas vezes, ao pouco cuidado posto pelo(s) autor(es), no relato e apresentação
desses resultados, razão pela qual, nesta unidade, nos iremos debruçar sobre a forma de
elaborar o relatório da pesquisa efetuada.

O objetivo de um relatório, seja ele qual for, é pôr em comum uma determinada ação
do autor e partilhar um conjunto de informações por ele consideradas relevantes. Isto
implica, antes de mais, que a preocupa ção dominante de quem tem a incumbência de
produzir um qualquer relatório deve ser a de ter uma estratégia de comunica ção
adequada ao público a quem esse documento se destina.

No caso particular do relatório de um dado projeto de investigação científica1111, este deve


assumir-se como um espelho da pesquisa efetuada que permita aos leitores, não
só entender os problemas que estão em jogo e os resultados alcançados, mas também
os procedimentos metodológicos escolhidos a fim de os poderem verificar para confirmar
ou infirmar os resultados do autor.

2. REFLEX ÕES PRÉVIAS AO ATO DE RELATAR

Antes de iniciar o relatório, é conveniente que o investigador reflita sobre alguns


aspetos fundamentais do seu trabalho, que se podem equacionar sob a forma de quatro
questões:
• O que é que se quer transmitir?
• A quem se destina o relatório?
• Quando e onde se desenvolveu a pesquisa?
• Como foi realizada a investigação ?

2.1. O que é que se quer transmitir?

Antes de mais, é preciso ter consciência da informa ção que se quer obter e como se que
difundi- la. Também na elaboração de um relatório se aplica o princípio da economia de

101
Exemplos típicos de relatórios deste tipo são as dissertações de mestrado e de
doutoramento.

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I. Visão Panorâmica

informação que temos vindo a defender nas anteriores unidades. Isto significa que nunca
se deve transmitir tudo o que se fez e como se fez ao longo do complexo percurso
da pesquisa, uma vez que esse procedimento iria produzir nevoeiro informacional nos
recetores, para além de lhes fazer gastar tempo inutilmente. Há, por isso, que saber
selecionar a informação pertinente (e não mais que essa) a difundir no relatório.

Independentemente do teor da pesquisa efetuada é relativamente consensual considerar


que qualquer relatório científico deve conter informação sobre os seguintes aspetos:
• objetivo da pesquisa (com indicaçã o dos resultados previstos)
• objeto (traduz o campo bem delimitado sobre que incidiu a investigação)
• rela ção entre a problemática investigada e a teoria existente
• resultados efetivamente obtidos
• apresenta ção dos resultados não alcançados e justifica ção dos motivos que
impediram atingi-los

Os conteúdos da investiga ção e o modo como são explicitados sob a forma de relatório
devem ser, por outro lado, coerentes com a motivaçã o que presidiu à conceçã o do
projeto:
• saber mais (ex: comprovar uma teoria);
• saber fazer melhor ( ex: conceber e administrar uma política de urbanização,
de saúde, de educação ou de segurança social, etc.);

• saber situar-se melhor (ex: perante conflitos raciais, perante problemas


novos como o da integração de certo tipo de refugiados, etc.)

2.2. A quem se destina o relatório?

A segunda interrogaçã o prende-se à caracteriza çã o dos utilizadores do relatório,


uma vez que o investigador não escreve para si próprio. Na unidade 2 foi referido que
um processo de investigaçã o é semelhante a uma corrida de estafetas, uma vez que
para atingir os seus objetivos, o investigador precisa de recolher o testemunho de todo
um trabalho anterior, introduzir- lhe algum valor acrescentado e passar esse testemunho
à comunidade científica a fim de que outros possam voltar a desempenhar o mesmo
papel no futuro.

Assim como a pesquisa documental se deve assumir como a passagem do testemunho


dos que investigaram antes no mesmo terreno, para as mãos do investigador, o relatório
da pesquisa efetuada corresponde à devolução do testemunho, pelo investigador à

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I. Visão Panorâ mica

comunidade científica, corporizado na mais valia introduzida com o seu trabalho. O relatório
deve concretizar, por isso, uma estratégia comunicacional adequada aos grupos- alvo a
que se destina (figura 6.1).

Se o público utilizador integra sobretudo elementos da comunidade científica, a forma do


relatório deve obedecer aos critérios formais por ela adotados, apresentando-se sob a
forma de um discurso conceptualmente rigoroso, bibliograficamente escorado e com uma
minuciosa explicaçã o metodológica, admitindo-se, por vezes, que se afaste das exigências
próprias de uma aplicaçã o prática. O rigor do discurso académico não deve dispensar
a sua clareza se bem que a homogeneidade do público-alvo implique uma terminologia
codificada para o público a que se destina. Um exemplo disso é a minúcia e o rigor da
sua estrutura representada no índice.

Para organizações públicas e Para a comunicação


Aspetos a ter em conta : Para a Universidade
privadas social
Clareza + ++ +++
Rigor +++ ++ +
Terminologia Codificada para a Codifica ção de acordo com o Simplificada
comunidade científica tipo de organizaçã o- cliente
Estrutura Rigorosa e minuciosa Relativamente simplificada Apelativa

Figura 6.1 - Adequação do relatório aos públicos-alvo

Se se trata de um relatório destinado aos financiadores da investigaçã o, é conveniente


que retrate a congruência dos resultados alcançados com os interesses que levaram os
investidores a financiar a pesquisa e utilizar uma linguagem adaptada à sua maneira de
comunicar.

Investigações encomendadas por entidades públicas ou privadas, cuja principal motivação


é resolver problemas concretos, devem culminar com relatórios cuja informação possa ser
ível por decisores e técnicos, que não são necessariamente académicos,
facilmente diger
como matéria útil para o desenvolvimento prático da sua ação profissional.

Deste modo o discurso deve ter uma terminologia codificada de acordo com a organização-
- cliente sendo a sua estrutura normalmente mais simplificada que a usada para
comunidades académicas.

Finalmente, se o público-alvo é integrado por órgãos de comunicação social ou se os


resultados obtidos se destinam a ser difundidos pelo público em geral, a informação
contida no relatório deve assumir uma forma clara e sucinta, sem as escoras teóricas e
metodológicas indispensáveis para públicos de natureza académica ou técnica. O que
para uns é sinal de rigor científico para outros é considerado pretensioso, confucionista
e ilegível. A terminologia é simplificada, por vezes sacrificando o rigor à clareza, e a

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I. Visão Panorâ mica

estrutura deve ser apelativa.

2.3. Quando e onde se desenrolou a pesquisa?

Uma terceira questão prende-se ao conjunto dos condicionamentos espaço-institucionais


e temporais que envolveram o desenrolar da investigação.

Condicionamentos espa ço- institucionais


Se Ruth Benedict (1887- 1948), figura de proa da Antropologia Cultural americana, tivesse
sido contactada para fazer um estudo sobre a cultura japonesa por uma qualquer instituição
académica numa altura em que o Japã o e os Estados Unidos não estivessem em guerra,
provavelmente teria feito um trabalho bem diferente do que resultou do seu clá ssico O
Crisântemo e a Espada. O facto desta obra lhe ter sido encomendada pelo Estado Maior
Americano durante a Segunda Guerra Mundial, com o intuito de entender o comportamento
dos soldados japoneses nos teatros de operações, considerado então paradoxal— , impôs-
-Ihe um conjunto de condicionamentos, de entre os quais se salientam:
• do ponto de vista metodológico, foi obrigada a não utilizar a técnica designada
como observaçã o participante, habitual em investigação antropológica, enquanto
meio de recolher dados sobre o objeto de estudo; em sua substituição, teve
de recorrer a uma engenhosa combinação de entrevistas a informadores
qualificados e a cidadãos americanos de origem japonesa, à análise de conteúdo
das emissões de propaganda da Rádio T óquio, e ainda, a uma árdua pesquisa
de natureza documental;

• relativamente à motiva ção que havia presidido à encomenda daquele estudo,


teve de efetuar uma pesquisa de grande complexidade no exíguo tempo
disponível;

Estudos sobre prisões, hospitais psiquiátricos, internatos, investigações efetuadas sobre


grupos com comportamento desviado, trabalhos em organizações burocráticas sobre
simplificação administrativa, estudos sobre grupos fechados, etc., são alguns exemplos de
pesquisas com fortes condicionamentos institucionais (ou grupais), limitações essas que
devem ser consciencializadas pelo investigador e por ele partilhadas no relatório final a
fim de que os seus resultados possam ser alvo de uma avaliação contextuai adequada.

102
Um exemplo que poderá clarificar o que se afirma : contrariamente ao soldado ocidental que
quando em situação militar de derrota eminente apresentava uma baixa motivação para
combater, o militar japonês parecia ganhar combatividade, o que evidentemente tinha efeitos
práticos graves em termos de baixas nos aliados.

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Condicionamentos temporais
Também os condicionamentos de natureza temporal devem não só ser explicitados
no relatório, como proporcionada ao leitor, por parte do investigador, a justificação do
ocorrido.

Em consonância com a época em que vivemos, em que a degradabilidade do Saber obriga


a um encurtamento do tempo de investigação sob pena desta se desatualizar ainda antes
de divulgada, há estudos, como os que se destinam è elaboração de dissertações de
Mestrado, que, por imperativos legais, têm prazos bastante reduzidos. Conforme se referiu
na unidade 2, este constrangimento obriga a um rigoroso planeamento da pesquisa e
consequente administração dos meios disponíveis, de entre os quais a consideração do
tempo assume um papel relevante.

No ato de relatar, esta limitação deve ser explicitada claramente, não como legitimação dos
resultados que não se alcançaram mas como indicador de custo (tempo) / qualidade
(resultados obtidos) da pesquisa .

2.4. Como se desenrolou a investiga çã o?

Uma última reflexão que é conveniente fazer é sobre a metodologia adotada e as


dificuldades encontradas na sua execução. Esta auto e heterocritica metodológica
é indispensável a quem pretende apresentar um trabalho sério e ter consciência sobre o
seu valor acrescentado e sobre as suas limita ções. Tal balanço que deve fazer parte do
relatório, permitirá ao leitor não só apreciar com mais justeza os resultados alcançados mas
também ultrapassar mais facilmente esse tipo de obstáculos em futuras investigações.

Em suma, a reflexão prévia proposta nos pontos anteriores destina -se a ter presente
o enquadramento material, pessoal, espaço-temporal e metodológico que enformou a
pesquisa.

Atividade 6.1
De acordo com os pontos anteriores fa ça um exercício de simulação tomando
como referência a dissertação que vai realizar. Tente responder com objetividade
às quatro questões acima discutidas e que colocará a si prório(a):
• o que é que quero transmitir?
• a quem se destina o resultado da pesquisa?
• que constrangimentos espaciais, institucionais e temporais antevejo?
• que escolhas metodológicas irei fazer?
• Seguidamente registe por escrito as suas respostas que, por certo,
constituirã o uma boa base no diálogo que irá estabelecer com o seu orientador
científico.
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I. Visão Panorâ mica

3. ELABORAÇÃO DO RELATÓRIO

Feito o conjunto de reflexões acima enunciadas, falemos um pouco mais detalhadamente


do conteúdo e da forma do relatório.

3.1. Conteúdo do Relatório


• Quanto ao conteúdo e independentemente de padrões institucionais particulares
e da natureza da investigaçã o é consensual que qualquer relatório de pesquisa
deva conter os seguintes elementos:

- apresentação do problema
- processos de pesquisa
- resultados alcanç ados
- consequências dos resultados

Problematiza ção da questão


Para a apresentação do fenómeno que a investigação visou estudar e compreender, o
relatório deve explicitar claramente a delimitação do objeto da pesquisa, os seus
objetivos e a moldura teórica ( quadro conceptual, teorias e hipóteses) em que o
mesmo se enquadra .

Naturalmente que a elaboração desta parte do relatório é fortemente facilitada se o


investigador tiver tido o cuidado de planear cuidadosamente o seu trabalho e de registar
exaustivamente o resultado desse planeamento. Por vezes surgem em provas dissertações,
com grande abundância de dados de valor empírico apreciável mas carentes de uma
meditação teórica e metodológica que lhes dê sentido científico.

Itinerários e processos de pesquisa


A explicitação dos problemas epistemológicos com que o investigador se confrontou, os que
se prendem com a metodologia adotada, com as técnicas escolhidas, com as dificuldades
encontradas e com modo como todos eles foram ultrapassados é, como acima se disse,
um elemento indispensável de qualquer relatório científico. A sua apreciaçã o permite ao
utilizador avaliar a solidez do caminho empreendido e, se necessário, refazê- lo, a fim de
verificar os resultados obtidos.

Por outro lado, aos investigadores que, no futuro, poderão vir a debruç ar-se sobre a
mesma problemática, a clareza e o rigor dos procedimentos metodológicos adotados e
as eventuais sugestões para a realização de outras pesquisas que, por vezes, integram
também a sec ção metodológica de um relatório, constituem preciosos instrumentos para
meditação sobre as suas próprias escolhas e padrões de atuação.

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I. Visão Panorâ mica

Resultados alcançados
É extremamente importante o investigador estar ciente de que os resultados alcançados
pela investigação (positivos e negativos), constituem a parte substantiva de qualquer
relatório. Acontece com alguma frequência, sobretudo em trabalhos produzidos por
investigadores inexperientes, registar-se um desequilíbrio considerável entre uma volumosa
compilação de dados produzidos por outrem, correspondente ao enquadramento teórico
e empírico, e uma exígua apresentação dos resultados alcanç ados pela investigação em
presença.

Para além da inevitável desqualificação académica traduzida em classificações inferiores


à s que os candidatos esperariam, tal desequilíbrio tem como consequência um desperdício
de informação interessante que poderia ter sido partilhada com a comunidade científica,
retirando valor acrescentado ao trabalho.

Consequências dos resultados


Finalmente, é conveniente que o relatório contenha uma meditaçã o sobre esse valor
acrescentado, permitindo evidenciar as consequências, nos planos prático, teórico ou
metodológico, do trabalho desenvolvido. Tal reflexão constitui uma peça fundamental
deste documento, uma vez que aponta pistas tanto para futuras investiga ções como para
a definiçã o de políticas e decisões. Em suma, o conteúdo do relatório deve abranger os
dez elementos que integram o Vê de Gowin referido na unidade 2 (reveja a figura 2.8)
e que aqui se recordam:
• Na vertente conceptual; Objeto de estudo, objetivo (questão-chave),
conceções extracientíficas do investigador que possam ter afetado a investigação,
teorias, modelos e conceitos que a tenham fundamentado.

• Na vertente metodológica : registos, transformações (estratégias de recolha,


tratamento e interpretaçã o de dados), resultados obtidos e valor acrescentado
da pesquisa efetuada para o desenvolvimento da teoria, da metodologia e/ou
da prática.

3.2. Construçã o e forma do relatório

Uma vez que um relatório de pesquisa é, antes de mais, um instrumento de comunicação,


a forma como é apresentado é tã o importante como o seu conteúdo. A negligência dos
aspetos formais conduz não só a uma reduçã o da credibilidade junto do público-alvo mas
também à perda de qualidade comunicacional e, por consequência, a uma menor eficácia
como instrumento de trabalho científico.

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I. Visão Panorâmica

Dois princípios bá sicos indispensá veis: clareza e rigor


Qualquer relatório tem de obedecer simultaneamente a dois princípios básicos: o da
clareza e o do rigor.

O princípio da clareza obriga, antes de mais, a um discurso morfológica, sintática e


lexicalmente correto. Por outro lado, implica extremo cuidado no desenvolvimento do
pensamento do autor que, no ato da escrita tem de ter sempre presente o recetor e
a sua capacidade percetiva. Isto implica, por exemplo, a fuga a lugares comuns e a
chavões que, constituindo muíetas de comunicação do autor, fazem frequentemente
tropeçaro leitor ou, pelo menos, têm efeito distrativo no ato da leitura. O uso de palavras
despropositadamente difíceis ou ambíguas é sempre de evitar, pois confundem o leitor
e fazem-lhe inutilmente perder tempo, num acrescido trabalho de interpreta ção. Como
refere Quivy (1992: 21), por vezes investigadores principiantes (nós acrescentaríamos
que nã o só esses) para assegurarem a sua credibilidade, julgam útil exprimir-se de
forma pomposa e ininteligível e, na maior parte das vezes, não conseguem evitar
raciocinar da mesma maneira.

O princípio do rigor assenta no valor, defendido por qualquer ramo da Ciência, da busca
da Verdade. Sem um pensamento estruturado com rigor, concretizado na sua partilha
oral ou escrita com a comunidade científica, não é possível contribuir para o verdadeiro
desenvolvimento das ciências. O rigor do discurso científico concretiza -se, num relatório,
em conceitos bem definidos, numa distinção clara entre juízos de valor e juízos de facto,
na separa ção inteligível entre descrição e interpretação da realidade estudada, etc .

Seguidamente apresentam-se algumas sugestões ao leitor no sentido de aplicar os dois


princípios referidos na elaboração de um relatório de pesquisa.

Esquema de apresentação: o travejamento temá tico


Tal como 0 corpo humano um relatório científico tem como base de sustentação um
esqueleto que, na sua fase final, assume a forma de í ndice Geral ( esquema geral que
remete às páginas onde se encontram tratados os assuntos), organizado em unidades
estruturais (partes, capítulos, secções, pará grafos, etc.).

0 í ndice Geral, espelho da sistematização das ideias contidas no relatório, resulta de


um processo de estruturação progressiva que se inicia desde a fase de planeamento da
pesquisa.

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I. Visão Panorâ mica

É conveniente que, o mais precocemente possível, o autor elabore um esquema provisório


da estrutura do relatório final. Ao fazê-lo, obriga -se a organizar — melhor a informação
disponível e, por consequência, a clarificar o seu pensamento sob o objeto de estudo.
Tal esquema vai sofrendo, ao longo de todo o processo de investigaçã o, sucessivas
atualizações que correspondem a outros tantos aperfeiç oamentos estruturais do relatório
final. Em todo este processo é importante salientar que o esquema funciona como
uma espécie de bú ssola, com funções orientadoras, e não como um espartilho
à criatividade do investigador — .

Um esquema pode obedecer a uma classificação numérica, alfanumérica ou alfabética.


Sendo indiferente a opção tomada é fundamental, no entanto, ter em consideração que
deve apresentar um critério uniforme de estruturação. Uma forma usual é a numérica
hierarquizada que se apresenta sob o formato seguinte, por todos conhecido:
1.

1.1.

1.2 .
1.2.1.
1.2.1.1.
1.2.1Ã
*“
1.2. 2.

1.3 .
2.

2.1., etc.

103
Recorde-se que organizar é articular recursos de forma adequada . Neste caso, as
informações disponíveis que integram aquela que o investigador já possui e a que vai
recolhendo e produzindo, constituem os seus recursos principais que devem ser articulados
sob pena de desperdício de tempo e perda de energia.
104
Apenas para ilustrar este processo de metamorfose, pode referir-se que o autor do presente
texto reelaborou a estrutura da sua dissertação de doutoramento nove vezes e que esta ideia
f utuanteWw. permitiu ir tendo, em cada momento, uma ideia melhor estruturada
de esquema í
da informação que dispunha sobre o seu objeto de estudo e do caminho que ainda lhe faltava
percorrer.
105
Atenção: só tem sentido criar um nível inferior de estruturação quando se pretende subdividir
a unidade temática de nível superior em pelo menos duas subunidades. N ão teria sentido, por
exemplo, integrar no ponto 1.2.1. apenas um ponto 1.2.1.1. se não houver pelo menos um
ponto 1.2.1.2.

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I. Visão Panorâ mica

Tendo a evidente vantagem de destrinç ar e hierarquizar as unidades temáticas, a


estruturação numérica, quando muito minuciosa, pode acabar por ter o efeito perverso
de obscurecer a visão estruturada do relatório. Para ultrapassar esta dificuldade, há
investigadores que usam uma estruturação numérica hierarquizada clá ssica para os
esquemas de apoio ao processo de investigação, alterando a estrutura final para uma
formatação mais legível. Para o exemplo dado teríamos:

Ia Parte

Capítulo 1

Capítulo 2

1 .
1.1.

1.2.

2.

Capítulo 3

2 a Parte

Capítulo 3, etc.

Em suma, a não utilização de um esquema estruturador do relatório tem frequentemente


como consequência o perigo de dar lugar a uma sequência confusa, a uma argumenta ção
frágil, pouco estruturada e com evidentes deficiências de comunicação que espelham
normalmente o estado desorganizado do pensamento do autor. Um procedimento prático
para aperfeiçoar a sua capacidade de estrutura ção consiste em pedir que outras pessoas
critiquem o esquema. Críticas oriundas de especialistas (por exemplo do orientador
científico) permitir-lhe-ão aperfeiçoar a estrutura em termos de precisão e rigor. Opiniões
de não especialistas não são de negligenciar, uma vez que frequentemente conduzem a
um aperfeiçoamento do esquema em termos de clareza.

O corpo do texto
Uma vez possuidor desse instrumento poderoso que é o esquema, o investigador pode
escolher um de dois caminhos: ou escreve o relatório final apenas ao terminar todo
o processo de investigação ou vai progressiva mente escrevendo sucessivas versões
provisórias paralelamente ao processo de pesquisa.

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I. Visão Panorâ mica

O modo clássico de trabalhar aconselha que só quando se possuam todos os dados


recolhidos tratados e interpretados se deverá passar à fase de redação, Tal estratégia
obriga, no entanto, a procedimentos intermédios de organização da informaçã o, que
passam pela criação e registo em suportes adequados (fichas, diários de pesquisa, cadernos
de campo, etc.) de toda a informação bruta e trabalhada.

Sendo uma opção respeitá vel, tem o inconveniente de gastar muito tempo inutilmente
com operações redundantes de registo de informação. Em muitos contextos de pesquisa
este procedimento pode hoje ser substituído com vantagem pela segunda opção que, no
entanto, pressupõe a estruturação prévia cuidadosa atrás referida. A vulgarização dos
computadores pessoais veio facilitar extraordinariamente esta opção tanto no que respeita
ao processamento de texto, como à organização e tratamento de dados.

Em vez do processo clássico de redação, que poderá ser descrito como o enchimento de
um recipiente, a segunda opção assemelha-se à construção de um puzzle, inserindo
previamente a estrutura do relatório e escrevendo texto provisório em várias partes do
esquema. Nesta fase, o investigador pode não ter grandes preocupações formais com
o texto que vai produzindo, uma vez que na revisão final irá ter esses cuidados. É, no
entanto, vantajoso que se rotine essa prática, desde o início, assumindo um estilo que
facilite tal operaçã o. Vejamos algumas sugestões que se têm revelado úteis.

Dimensão dos pará grafos e períodos. Deve ser suficientemente pequena para permitir
uma fácil leitura.

Formata çã o da mancha ( retirados, alíneas, espaços, etc.)- Deve apresentar-se


arejada criando, através da combinaçã o de diferentes corpos de letra, de sublinhados e
de espaços abertos, espaços de concentração da atenção e pausas visuaisque permitem
ao leitor fixar-se na mensagem essencial.

Pés de página . O pé de página ou nota de rodapé pode ser usado com êxito para
comentários a propósito e referências ao pensamento de outros autores que, no entanto,
iriam tornar o discurso excessivamente pesado ou que desviariam o leitor do essencial se
fossem postos no corpo do texto. Convém, no entanto não abusar das notas de rodapé,
o que lhes retiraria a função referida e as transformaria em afirma ções presunçosas de
erudição, retirando eficácia comunicacional ao texto.

Quadros, grá ficos, diagramas, mapas, fotos e outras ilustrações. Podendo e


devendo ser usados como instrumentos de clarificação e de escoramento do texto, é bom
não esquecer que não são mais do que isso mesmo, instrumentos, devendo servir o texto
e não contrariá-lo, tornando-o confuso. Como critério geral para a sua inclusão ou não,
deve pensar-se que servem para ilustrar e para clarificar o texto, e não para complicar

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I. Visão Panorâ mica

a leitura. As ilustrações que introduzam um valor acrescentado imediato devem ser


incluídas no corpo do texto. Todas as que constituam informação complementar deverão
ser remetidas para anexo. Quando se lida com quadros numéricos demasiado complexos
será um procedimento prudente decompô-los em unidades mais simples, adequadas ao
texto. Cada ilustração deverá ser convenientemente titulada e a fonte de onde foi retirada
indicada junto, com referência específica do autor da identificação da fonte e da data
da sua produção. Por vezes, há necessidade ainda de introduzir notas e legendas que
devem ser curtas e claras.

Em suma: o material ilustrativo a inserir tem de constituir um todo, articulando-


- se com o texto e tem de estar doseado em funçã o do objetivo da comunica ção
a transmitir.

Sínteses parciais e conclusão. A fim de conferir solidez ao texto, em relatórios de


maior dimensão, pode-se recorrer a sínteses de final de capítulo, que têm o objetivo de
sublinhar as principais ideias do trabalho. O relatório deve terminar com uma conclusão
que tem a função de fornecer ao leitor uma síntese global do trabalho efetuado, bem
como o de levantar, infirmar ou confirmar hipóteses, fazer recomendações, dar pareceres,
formular políticas, de acordo com a sua natureza e os fins que se propõe servir.

Introdução. Estamos de acordo com o saudoso investigador Silva Rego quando


aconselhava os seus alunos a deixar a introdução para o fim da redação, uma vez que
funciona como apresenta ção geral do trabalho. Uma introdução deve conter informação
sobre o objetivo da pesquisa, sobre a delimitação do problema (problemática, metodologia
adotada, dificuldades encontradas), uma avaliaçã o genérica dos resultados e os
agradecimentos do autor.

Anexos. Como atrás foi referido, deve ser incluída em anexo a informação que, não fazendo
parte integrante do texto, lhe serve, apesar de tudo, como complemento indispensá vel.
Do nosso ponto de vista, um relatório de pesquisa nã o deve ser sobrecarregado com
informa ção excessiva, incluindo apenas aquela que se apresenta com utilidade imediata
para o leitor e a que, dada a sua raridade ou originalidade, enriquece o texto principal.
Poder-se-á incluir em anexo, por exemplo, gráficos e cá lculos numéricos, questionários,
registos de entrevista, etc.

Glossá rios. Trabalhos que tenham de recorrer a vocabulário especializado e mal


conhecido, a conceitos polémicos, bem como a siglas e acrónimos, devem incluir um
glossário para esclarecimento do leitor.

índices. Para além do índice Geral, é conveniente que os relatórios que contenham
quadros e ilustrações de v ária ordem, apresentem os índices correspondentes. Em

© Universidade Aberta 151


I. Visão Panorâ mica

estudos de maior dimensão incluem-se também índices analíticos que constituem um


valioso apoio.

Bibliografia . Na unidade 3 já se fez refer ência ao modo de elaborar uma ficha


bibliográ fica. No final de um relatório de pesquisa toda a bibliografia consultada deve ser
referenciada com a identificação correta e com um critério uniforme. Em nossa opinião,
só a documentação efetivamente utilizada deve ser referenciada na bibliografia. O modo
de organizar esta parte do relatório varia de acordo com os autores. Há quem a organize
por capítulos ou por temáticas. O modo mais habitual é, no entanto, a mera arrumação
por autores seguindo a ordem alfabética. Investigadores que tenham usado documentos
especiais (ex: legislação) ou em outros suportes (áudio, vídeo, informático, iconográfico)
deverão listá - los devidamente identificados (Ex: usando subtítulos como Videografia,
Filmografia, Iconografia, etc.) depois da Bibliografia Geral.

Título. Muitas vezes descurado o título constitui, quando bem escolhido, um excelente
cartão de visita para uma pesquisa, tendo um efeito de atração ou de repulsão sobre
os potenciais leitores. Deve por isso corresponder ao conteúdo da obra, ou através de
uma simples descrição eventualmente com um subtítulo clarificador (Ex: Metodologia da
Investigação: Guia para Autoaprendizagem) ou recorrendo à metáfora (Ex: OCrisântemo
e a Espada).

Atividade 6.2
De acordo com os pontos anteriores e tendo em consideração a dissertação que
vai realizar elabore uma primeira estruturação do seu relatório de pesquisa .
Seguidamente, submeta-a à crítica de colegas (podendo desempenhar papel
idêntico em relaçã o ao trabalho que eles irão desenvolver). A versão corrigida
da sua estrutura de dissertaçã o poderá constituir uma peça útil a integrar no
projeto de pesquisa, que deve entregar no final do Seminário.

S í ntese

Nesta unidade foi procurado, em primeiro lugar, chamar a atenção do leitor para a
importância do relatório de pesquisa como instrumento fundamental de comunica ção
entre o investigador e a comunidade científica . Seguidamente identificou-se e discutiu-
-se um conjunto de questões prévias ao ato de relatar e que condicionam a estratégia
comunicacional do relat ório. Por fim, apresentaram - se diversos procedimentos
recomendá veis na feitura de um relatório tanto no que respeita ao seu conteúdo como
à forma que o mesmo deve assumir.

© Universidade Aberta 152


I. Visão Panorâ mica

Teste formativo

1. Após leitura aprofundada do texto do presente capítulo e realizadas as atividades


propostas, abra o Manual na página intitulada objetivos da unidade.

2. Tente atingir os 16 objetivos, escrevendo as suas respostas sem recorrer ao texto do


interior do capítulo.

3. Confira posteriormente as suas respostas com o texto do mesmo e corrija-as.

Leituras complementares

AZEVEDO, Carlos A. e G., Ana (1994), Metodologia Científica . Contributos Prá ticos
Para a Elaboração de Trabalhos Acad émicos, Porto, C. Azevedo.

CEIA, Carlos (1995), Normas Para Apresenta ção de Trabalhos Cientí ficos, Lisboa,
Presença.

FRADA, João (1995),Guia Prá tico Para a Elaboração e Apresentação de Trabalhos


Cientí ficos, Lisboa, Cosmos.

MOREIRA, Carlos Diogo (1994), Planeamento e Estratégias da Investigaçã o Social,


Lisboa, ISCSP, pp 195 -202.

NOGUEIRA, Oracy (1968) Pesquisa Social, Introdução à s Suas T écnicas, 5. Paulo,


Companhia Editora Nacional, pp. 160-168.

SELLTIZ, JAHODA, DEUTCH e COOK (1967) M étodos de Pesquisa nas Rela ções
sociais, S. Paulo, Herder (USP), pp. 457-511.

© Universidade Aberta 153


II. APROFUNDAMENTO TEMÁTICO
MANUELA MALHEIRO FERREIRA

Unidade 7 - Métodos Quantitativos e Métodos Qualitativos

Sumário

Objetivos da unidade
1. INTRODUÇÃ O

2 . PARADIGMAS QUANTITATIVO E QUALITATIVO

3. CARACTERÍ STICAS DOS MÉTODOS QUANTITATIVOS

Atividade 7.1
4. OS M ÉTODOS QUALITATIVOS

4.1. Características dos métodos qualitativos

Atividade 7.2
4.2. Tradições teóricas em investigação qualitativa
Atividade 7.3
5. POSSIBILIDADE DE UTILIZAR UMA COMBINA ÇÃ O DE M É TODOS
QUANTITATIVOS E QUALITATIVOS
Atividade 7.4
Síntese

Teste formativo

Leituras complementares

Objetivos da unidade

No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a :


1. Distinguir as principais características dos paradigmas qualitativo e
quantitativo;

2. Indicar as principais características dos métodos quantitativos;

3. Distinguir as principais fases da investigação quantitativa;

4. Enumerar os objetivos da investiga ção quantitativa;

5. Explicar as vantagens da investigação quantitativa;

© Universidade Aberta 154


II. Aprofundamento Temático

6. Distinguir os problemas inerentes à utiliza ção dos métodos quantitativos em


investigação em Ciências Sociais;

7. Indicar as principais características dos métodos qualitativos;

8. Distinguir as principais fases da investigação qualitativa;

9. Enumerar os objetivos da investiga ção qualitativa;

10. Explicar as vantagens da investigação qualitativa;

11. Explicar as desvantagens da investigação qualitativa;

12. Indicar as vantagens da utilização conjunta dos métodos quantitativos e


qualitativos em investigação em Ciências Sociais;

13. Indicar os problemas que se põem à utilização conjunta dos métodos quantitativos
e qualitativos em investigação em Ciências Sociais;

14. Definir triangulação;

15. Enumerar tipos de triangulação;

16. Aplicar os conhecimentos adquiridos à análise de artigos que relatem trabalhos


de investigação.

1. INTRODUÇÃO

Métodos e técnicas de investiga ção em Ciências Sociais


No que respeita aos métodos e técnicas de investigação existe uma grande diversidade
de definições, pois estas variam de autor para autor.

Madeleine Grawitz (1993) menciona a extrema desordem que existe neste domínio
e refere várias definições de métodos. A autora define métodos como um conjunto
concertado de opera ções que são realizadas para atingir um ou mais objetivos, um corpo
de princípios que presidem a toda a investigação organizada, um conjunto de normas
que permitem selecionar e coordenar as técnicas. Os métodos constituem de maneira
mais ou menos abstrata ou concreta, precisa ou vaga, um plano de trabalho em função
de uma determinada finalidade.

As técnicas são procedimentos operatórios rigorosos, bem definidos, transmissíveis,


suscetíveis de serem novamente aplicados nas mesmas condições, adaptados ao tipo de
problema e aos fenómenos em causa. A escolha das técnicas depende do objetivo que
se quer atingir, o qual, por sua vez, está ligado ao método de trabalho.

© Universidade Aberta 155


II. Aprofundamento Temático

A autora refere ainda que dessa interdependência nasce muitas vezes uma confusão
entre os termos método e técnica que convém distinguir. A técnica representa a etapa de
operações limitadas, ligadas a elementos práticos, concretos, definidos, adaptados a uma
determinada finalidade, enquanto o método é uma conceção intelectual coordenando um
conjunto de opera ções, em geral várias técnicas.1

Métodos quantitativos e métodos qualitativos


Tradicionalmente a investigação quantitativa e a investigação qualitativa estão associadas
a paradigmas. A distinção entre paradigmas diz respeito à produção do conhecimento e ao
processo de investiga ção e pressupõe existir uma correspondência entre epistemologia,
teoria e método. No entanto, a distinção é usualmente empregada a nível do método. Cada
tipo de método está portanto ligado a uma perspetiva paradigmática distinta e única.

Nas últimas décadas têm sido objeto de discussão n ã o só as vantagens e inconvenientes


relativos à adequada utilização de métodos quantitativos e de métodos qualitativos em
trabalhos de investigação em Ciências Sociais, como tem sido encarada a possibilidade
de utilizar uma articulação de ambos.

1
.
M Grawitz ( 1993) refere que a maior parte dos autores fazem a distinção entre m étodo e
.
m étodos, { pp 301-302) .
a) O método no sentido filosófico - No sentido mais elevado e mais geral do termo, o
método (no singular) é constituído pelo conjunto das operações intelectuais através das
.
quais uma disciplina procura atingir as verdades, as demonstra e as verifica Esta conceção
do método no sentido geral de procedimento lógico, inerente a toda atividade científica,
permite considerá-lo como um conjunto de regras independentes de qualquer investigação
-
e conteúdo particulares, tornando acessível a realidade que se quer compreender. Trata se
.
de pontos de vista filosóficos que definem a posição do espírito humano perante o objeto
b) O método, atitude concreta em relaçã o ao objeto - Neste caso a posição filosófica está
mais ou menos subentendida. Neste caso, o método dita sobretudo maneiras concretas de
encarar ou de organizar a investigação, mas de forma mais ou menos imperativa, mais ou
menos precisa, completa e sistematizada. No entanto, nem todos os m étodos influenciam
da mesma maneira, as mesmas etapas da investigação. A autora refere que o método
experimental é imperativo tanto na etapa de observação, como na de recolha dos dados,
enquanto outros métodos não o são, como o método clínico que visa um diagnóstico e uma
terapêutica, interessa-se pelos resultados, mas corresponde sobretudo a uma atitude mental
e a nenhuma manipulação em particular.
c) O método ligado a uma tentativa de explica ção - Liga-se mais ou menos a uma posição
filosófica e pode influenciar uma etapa da investigação.
-
d) O método ligado a um dom ínio particular - o termo método justifica se quando ligado
a um domínio específico e inclui uma maneira de proceder que lhe é própria. Exemplos: o
método histórico, o método psicanalítico.

© Universidade Aberta 156


II. Aprofundamento Temático

Neste capítulo são indicadas as principais características dos dois paradigmas, assim como
alguns dos problemas resultantes da associação de métodos quantitativos e de métodos
qualitativos no desenvolvimento da investigação em Ciências Sociais.

2. PARADIGMAS QUANTITATIVO E QUALITATIVO

Embora muitos investigadores adiram a um paradigma e ao método que lhe corresponde,


outros combinam nos seus trabalhos de investiga ção os dois métodos característicos de
cada um dos paradigmas.

Reichardt e Cook (1986) afirmam que um investigador para melhor resolver um problema
de pesquisa não tem que aderir rigidamente a um dos dois paradigmas, podendo mesmo
escolher uma combinação de atributos pertencentes a cada um deles. O investigador
também nã o é obrigado a optar pelo emprego exclusivo de métodos quantitativos ou
qualitativos e no caso de a investigação assim o exigir, poderá mesmo combinar o emprego
dos dois tipos de métodos.

Outros autores põem em evidência as dificuldades de os utilizar conjuntamente numa


mesma investigação. Julia Brannen (1992), por exemplo, salienta que a utilização conjunta
de métodos quantitativos e de métodos qualitativos tem implicações de natureza teórica,
atendendo a que a utiliza ção de diferentes métodos de investigaçã o tem também como
base diferentes pressupostos, entre outros, acerca da realidade social e da natureza dos
dados recolhidos. A mesma autora salienta ainda que o procedimento correto deverá ser
o de relacionar cada conjunto de dados com a teoria que lhe está subjacente e analisar
de que modo os diferentes conjuntos de dados são complementares ou apresentam
contradições uns em relação aos outros.

Os autores já acima referidos (Reichardt e Cook, 1986) indicam quais as características


usualmente atribuídas a cada um dos paradigmas, o que será apresentado num quadro
que seguidamente se reproduz (Quadro 7.1).

© Universidade Aberta 157


II. Aprofundamento Temático

Quadro 7.1 - Características dos Paradigmas Qualitativo e Quantitativo


Paradigma Qualitativo Paradigma Quantitativo
Advoga o emprego dos métodos qualitativos . Advoga o emprego dos métodos
quantitativos .
Fenomenologismo e verstehen (compreensão) Positivismo lógico "procura as causas dos
" interessado em compreender a conduta fenómenos sociais, prestando escassa atenção
humana a partir dos próprios pontos de vista aos aspetos subjetivos dos indivíduos" .
daquele que atua" .
Observação naturalista e sem controlo. Medição rigorosa e controlada.
Subjetivo . Objetivo .
Próximo dos dados; "perspetiva a partir de À margem dos dados; perspetiva "a partir de
dentro". fora".
Fundamentado na realidade, orientado para Não fundamentado na realidade, orientado para
a descoberta, exploratório, expansionista, a comprovação, confirmatório, reducionista,
descritivo e indutivo . inferencial e hipotético-dedutivo .
Orientado para o processo . Orientado para o resultado .
Vá lido: dados "reais", "ricos" e "profundos”. Fiável: dados "sólidos" e repetíveis.
Não generalizá vel: estudos de casos isolados. Generalizá vel: estudos de casos múltiplos.
Holístico. Particularista.
Assume uma realidade dinâ mica. Assume uma realidade estável.

Fonte: (Reichardt e Cook, 1986, 29)

Em resumo, afirmam os citados autores que o paradigma quantitativo postula uma conceção
global positivista, hipotético-dedutiva, particularista, orientada para os resultados, própria
das Ciências Naturais, enquanto o paradigma qualitativo postula uma conceção global
fenomenológica, indutiva, estruturalista, subjetiva e orientada para o processo, própria
da Antropologia Social.

Como anteriormente foi referido, cada tipo de método está portanto ligado a uma
perspetiva paradigmática pr ópria. Seguidamente apresentar-se - ã o as principais
características dos métodos quantitativos e dos métodos qualitativos, cuja distinçã o é
feita, fundamentalmente, no que diz respeito ao processo de recolha de dados e ao modo
como estes são registados e analisados.

3. CARACTERÍSTICAS DOS MÉTODOS QUANTITATIVOS

A utiliza çã o de métodos quantitativos está essencialmente ligada à investiga çã o


experimental ou quasi-experimental o que pressupõe a observação de fenómenos, a
formula ção de hipóteses explicativas desses mesmos fenómenos, o controlo de variáveis,
a seleção aleatória dos sujeitos de investigação (amostragem), a verificação ou rejeição

© Universidade Aberta 158


II. Aprofundamento Temático

das hipóteses mediante uma recolha rigorosa de dados, posteriormente sujeitos a uma
análise estatística e uma utilização de modelos matemáticos para testar essas mesmas
hipóteses. O objetivo é a generalização dos resultados a uma determinada popula ção
em estudo a partir da amostra, o estabelecimento de relações causa-efeito e a previsão
de fenómenos.

A investigação quantitativa implica que o investigador antes de iniciar o trabalho elabore


um plano de investigação estruturado, no qual os objetivos e os procedimentos de
investiga ção estejam indicados pormenorizadamente. A elaboração do plano deverá
ser precedida de uma revisão da literatura pertinente, a qual é essencial não só para a
definição dos reais objetivos do trabalho, como também para a formula ção de hipóteses
e para a definição das variá veis.

Os objetivos da investigação quantitativa consistem essencialmente em encontrar relações


entre variáveis, fazer descrições recorrendo ao tratamento estatístico de dados recolhidos,
testar teorias.

Quer se trate de uma investigação experimental, quer se trate da caracterização estatística


de uma determinada populaçã o (por exemplo, mediante a administração de um inquérito
por questionário ou por entrevista estruturada), procede-se à seleção de uma amostra
que deverá ser representativa da popula ção em estudo, para que os resultados possam
ser generalizados a essa mesma população, o que implica a seleção aleatória dos sujeitos
de investigação.

Para a testagem de hipóteses (verificação ou rejeição) existe uma grande variedade de


testes, cuja eficácia é reconhecida, citando-se, a título de exemplo: o teste t, o teste de
Mann-Whitney, a análise da variância ( ANOVA) ou a análise da vari ância multivariada
(MANOVA), entre os mais utilizados.

Uma das principais limita ções da utilização dos métodos quantitativos em Ciências
Sociais está ligada à própria natureza dos fenómenos estudados: complexidade dos seres
humanos; estímulo que dá origem a diferentes respostas de acordo com os sujeitos; grande
número de variá veis cujo controlo é difícil ou mesmo impossível; subjetividade por parte
do investigador; medição que é muitas vezes indireta, como é por exemplo o caso das
atitudes; problema da validade e fiabilidade dos instrumentos de medição2.

2
Validade de um instrumento diz respeito à sua adequação para medir o "objeto” em estudo;
fiabilidade de um instrumento representa a sua capacidade para que diferentes investigadores
obtenham resultados iguais.

© Universidade Aberta 159


II. Aprofundamento Temático

Atividade 7.1
Dos artigos que lhe foram dados durante a parte curricular de Mestrado e que
relatam trabalhos de investigação em Ciências Sociais escolha um em que foram
usados unicamente métodos quantitativos. Fa ça um resumo da metodologia
utilizada nesse trabalho de investiga ção.

4. OS MÉTODOS QUALITATIVOS

4.1. Características dos métodos qualitativos

Sem pretensão de uma enunciação exaustiva das características dos métodos qualitativos,
entendemos ser, no entanto, importante para a sua compreensã o indicar algumas
delas:3

Indutiva - Os investigadores tendem a analisar a informação de uma "forma


indutiva". Desenvolvem conceitos e chegam à compreensão dos fenómenos a
partir de padrões provenientes da recolha de dados. Não procuram a informação
para verificar hipóteses. A teoria é desenvolvida de "baixo para cima" ( em vez
de cima para baixo), tendo como base os dados que obtiveram e estão inter-
-relací onados. Esta teoria designa-se por "teoria fundamentada" (Glaser e
Strauss, 1967);

Holí stica - Os investigadores têm em conta a "realidade global". Os indivíduos,


os grupos e as situações n ã o são reduzidos a variá veis mas são vistos como um
todo, sendo estudado o passado e o presente dos sujeitos de investigação;

Naturalista - A fonte direta de dados são as situações consideradas "naturais".


Os investigadores interagem também com os sujeitos de uma forma "natural"
e, sobretudo, discreta. Tentam "misturar-se" com eles até compreenderem uma
determinada situação, mas procuram minimizar ou controlar os efeitos que
provocam nos sujeitos de investigaçã o e tentam avaliá-los quando interpretam
os dados que recolheram;

Os investigadores são " sensí veis ao contexto " - Os atos, as palavras e os


gestos só podem ser compreendidos no seu contexto;

O " significado" tem uma grande importâ ncia - Os investigadores procuram


compreender os sujeitos a partir dos "quadros de referência" desses mesmos

3
Vide por exemplo Bogdan e Bikien (1984 ); Patton ( 1990).

© Universidade Aberta 160


II. Aprofundamento Temático

sujeitos. Tentam viver a realidade da mesma maneira que eles, demonstram


empatia e identificam-se com eles para tentar compreender como encaram a
realidade. Procuram compreender as perspetivas daqueles que estão a estudar,
de todos na sua globalidade e não apenas de alguns. O investigador deve
"abandonar ", "deixar de lado" as suas próprias perspetivas e convicções;
Os métodos qualitativos são "humanísticos" - Quando os investigadores
estudam os sujeitos de uma forma qualitativa tentam conhecê- los como pessoas
e experimentar o que eles experimentam na sua vida diária (nã o reduzem a
palavra e os atos a equações estatísticas);

Os investigadores interessam- se mais pelo processo de investigaçã o do


que unicamente pelos resultados ou produtos que dela decorrem;

Em investigação qualitativa o "plano de investigação é flexí vel";

A investigação qualitativa é "descritiva". A descrição deve ser rigorosa e resultar


diretamente dos dados recolhidos. Os dados incluem transcrições de entrevistas,
registos de observa ções, documentos escritos (pessoais e oficiais), fotografias e
gravações vídeo. Os investigadores analisam as notas tomadas em trabalho de
campo, os dados recolhidos, respeitando, tanto quanto possível, a forma segundo
a qual foram registados ou transcritos;

O investigador é o "instrumento " de recolha de dados; a validade e a


fiabilidade dos dados dependem muito da sua sensibilidade, conhecimento e
experiência. A questão da objetividade do investigador constitui o principal
problema da investigação qualitativa;

Em investigação qualitativa dá-se uma grande importância à validade do trabalho


realizado. Neste tipo de investiga ção tenta-se que os dados recolhidos estejam
de acordo com o que os indivíduos dizem e fazem;

Em investigação qualitativa " a preocupaçã o central nã o é a de saber se os


resultados são suscetí veis de generaliza ção, mas sim a de que outros
contextos e sujeitos a eles podem ser generalizados" .
( Bogdan e Biklen, 1994 ).

As técnicas mais utilizadas em investigação qualitativa são a observação participante, a


entrevista em profundidade e a análise documental.

© Universidade Aberta 161


II. Aprofundamento Temático

Atividade 7.2
Dos artigos que lhe foram indicados durante a parte curricular de Mestrado,
que relatam trabalhos de investigação em Ciências Sociais, escolha um em que
tenham sido usados unicamente métodos qualitativos. Faç a uma análise resumida
da metodologia utilizada nesse trabalho de investigação.

4.2. Tradições teóricas em investiga ção qualitativa

A investigação qualitativa não é uniforme devido a existirem diferentes tradições teóricas


e orientações metodológicas.

Patton (1990) refere as principais, que estão indicadas no Quadro seguinte:


Perspetiva Origem disciplinar Questões centrais
1 - Etnografia Antropologia Qual é a cultura deste grupo de
indivíduos?

2 - Fenomenologia Filosofia Qual é a estrutura e a essê ncia da


experiência deste fenómeno para estes
indivíduos?

3 - Heurística Psicologia Humanística Qual é a minha experiência deste fenómeno


e a experiência essencial de outros que
também tiveram uma experiência intensa
deste fenómeno?
4 - Etnometodologia Sociologia Como é que os indivíduos atribuem
sentido às atividades diárias, de modo
a comportarem - se de uma maneira
sodalmente considerada como aceitá vel?

5 - Interacionismo Psicologia social Qual o conjunto comum de símbolos e


Simbólico conhecimentos que se criaram para dar
sentido às interações entre indivíduos?
6 - Psicologia Ecológica Ecologia, Psicologia Como é que os indivíduos tentam alcançar
os seus fins mediante comportamentos
específicos em ambientes determinados?
7 - Teoria sistémica Interdisciplinar Como e porquê este sistema funciona
como um todo?

8 - Teoria do caos: Física teórica, Ciências Qual é a ordem subjacente (no caso
dinâmica nã o linear Naturais de existir alguma ) aos fen ó menos
desordenados?
9 - Hermenêutica Teologia, Filosofia, Crítica Quais são as condições em que se realizou
Liter ária uma atividade humana ou um produto
foi elaborado de tal forma que se possa
interpretar o seu significado?

10 - Qualitativa ória das Ideias,


Hist Como é que uma dada perspetiva
rientacional Economia Política ideológica se manifesta (ou se manifestou)
neste fenómeno?

Fonte: (Patton, 1990, 88)

© Universidade Aberta 162


II. Aprofundamento Temático

A cada uma destas tradições correspondem práticas de investiga ção diferentes.

Atividade 7.3
Faç a leituras para aprofundar os conhecimentos sobre a perspetiva que maior
interesse lhe desperta e que esteja mais de acordo com a sua forma çã o
disciplinar.

5. POSSIBILIDADE DE UTILIZAR UMA COMBINAÇÃO DE MÉTODOS


QUANTITATIVOS E QUALITATIVOS
Como se referiu anteriormente alguns autores põem em evidência as dificuldades de utilizar
conjuntamente numa mesma investigação os dois métodos. Brannen (1992) salienta que
a utilização conjunta de métodos quantitativos e de métodos qualitativos tem implicações
teóricas; Smith e Heshusus (1986) (cit. Bogdan e Biklen, 1994) salientam que as duas
abordagens se fundamentam em pressupostos diferentes. Autores como Reichardt e Cook
(1986) afirmam ainda que um investigador não é obrigado a optar pelo emprego exclusivo
de métodos quantitativos ou qualitativos e se a investigação o exigir poderá combinar a
sua utilização. Denzin (1978), Cronbach etal. (1980), Miles e Hubermann (1984) e Patton
(1990), entre outros, utilizam também, conjuntamente, os dois métodos.

Patton (1990) afirma que uma forma de tornar um plano de investigação mais "sólido" é
através da triangulaçã o, isto é, da combinação de metodologias no estudo dos mesmos
fenómenos ou programas. Tal significa, de acordo com o mesmo autor, utilizar diferentes
métodos ou dados, incluindo a combinação de abordagens quantitativas e qualitativas.
O autor cita Denzin (1978) que identificou quatro grandes tipos de triangulação:
1. triangulaçã o de dados - o uso de uma variedade de fontes num mesmo
estudo;

2. triangula çã o de investigadores - o uso de v á rios investigadores ou


avaliadores;

3. triangula ção de teorias - o uso de várias perspetivas para interpretar um mesmo


conjunto de dados;

4. triangulação metodoló gica - o uso de diferentes métodos para estudar um dado


problema ou programa.

A lógica da triangulação é que cada método revela diferentes aspetos da realidade empírica
e consequentemente devem utilizar-se diferentes métodos de observação da realidade.

© Universidade Aberta 163


II. Aprofundamento Temático

Reichardt e Cook (1986) indicam as vantagens de combinar métodos, nomeadamente


quando se trata de trabalhos de investigação com propósitos múltiplos, pois o facto de se
utilizarem métodos diferentes pode permitir uma melhor compreensão dos fenómenos,
do mesmo modo que a triangulação de técnicas pode conduzir a alcançar resultados mais
seguros, sem enviesamentos.

No entanto é referido por todos os autores que o facto de se combinarem métodos


quantitativos e qualitativos apresenta vários problemas relativamente ao:
• custo
• tempo
• experiência e competência do investigador na utilização dos dois tipos de
métodos pois raramente ele domina de igual modo cada um desses tipos de
métodos de forma a poder utilizá- los eficazmente.

Atividade 7.4
1. Dos artigos que lhe foram dados durante a parte curricular do Mestrado, que
relatam trabalhos de investigação em Ciências Sociais, escolha um em que
tenham sido usados métodos quantitativos e métodos qualitativos. Exponha
resumidamente a metodologia utilizada nesse trabalho de investigaçã o.
2. Indique quais as vantagens que resultaram para esse trabalho de investiga ção
a utilização dos dois métodos.
3. Indique, igualmente, se a utiliza çã o dos dois tipos de métodos levantou
quaisquer problemas ao investigador.

S í ntese

Indicaram-se as características dos paradigmas quantitativo e qualitativo e foram expressas


sugestões sobre a necessidade de um investigador aderir a um dos paradigmas e ao
método que lhe está associado.

Seguidamente, indicaram -se as características dos métodos quantitativos, as fases da


investiga ção quantitativa, os objetivos deste tipo de pesquisa, as suas vantagens e os
problemas que se põem à sua utilização no âmbito das Ciências Sociais.

As características dos métodos qualitativos, as fases da investiga çã o qualitativa, os


objetivos deste tipo de pesquisa, as suas vantagens, e os problemas que lhe são inerentes
foram igualmente enumerados.

Discutiu-se por fim a possibilidade de utilizar uma combinação de métodos quantitativos


e de métodos qualitativos.

© Universidade Aberta 164


II. Aprofundamento Temático

Teste formativo

1. Após leitura aprofundada do capítulo e executadas as respetivas atividades, abra o


Manual na pá gina onde estão enumerados os objetivos da unidade.

2. Tendo em conta esses objetivos desenvolva o seguinte tema "A utilização dos métodos
quantitativos e qualitativos em investigação em Ciências Sociais; características dos dois
métodos, vantagens e desvantagens de cada um deles, possibilidades de combinação
de ambos." Não ultrapasse as 30 linhas.

3. Confira se indicou as características dos dois métodos, as vantagens e desvantagens


de cada um deles e as possibilidades de combinação de ambos em investiga ção em
Ciências Sociais.

Leituras complementares

BOGDAN, Robert e BIKLEN, Sari,


1994 Investigação Qualitativa em Educação. Uma Introdução à Teoria e aos
Métodos, Porto, Porto Editora, pp. 52-74.

BRANEN, Julia
1992 Combining qualitative and quantitative approaches: an overview in Branen,
Julia "Mixing Methods: Qualitative and Quantitative Research", Aldershot,
Avebury, pp. 3-37.

CRESWELL, John W.
2009 Research Design: qualitative, quantitative and mixed methods approaches
(33 ed.) . Thousand Oaks. CA, Sage.
2014 Projeto de Pesquisa - Métodos Qualitativo, Quantitativo e Misto, Artmed
Editora, Ltda, Porto Alegre, RS, Brasil (Tradução brasileira)

DENZIN, N. e Lincoln, Y.S. (eds.)


2000 Handbook of Qualitative Research, 2nd ed., London, Sage.

FLICK, Uwe
2005 Métodos Qualitativos na Investigação Científica, Lisboa, Monitor.

PATTON, Michael Q.
1990 Qualitative Evaluation and Reseach Methods, Newbury Park, Cal. Sage
Publications, pp. 67 - 89 e 187-189.

© Universidade Aberta 165


II. Aprofundamento Temático

REICHARDT, Charles S. e COOK, Thomas D.


1986 Hacia una superacion del enfrentamiento entre los métodos cualitativos y los
cuantitativos in Reichardt, Charles S. e Cook, Thomas D. "Métodos cualitativos
y cuantitativos em investigación evaluativa", Madrid, Ediciones Morata, pp. 25-
-52.

SALKIND, N . J.
2012 100 questions (and answers) about research methods, Los Angeles, CA, USA,
Sage Publications.

© Universidade Aberta 166


II. Aprofundamento Temático

Unidade 8 - Técnicas de Amostragem

Sumário

Objetivos da unidade

1. INTRODUÇÃ O

2. AMOSTRAGENS PROBABILÍSTICAS

2.1. Amostragem aleatória simples

2.2. Amostragem estratificada


2.3. Amostragem de cachos (clusters)

2.4. Amostragem por etapas mú ltiplas

2.5. Amostragem sistemática


2.6. Determinação da dimensão da amostra

Atividade 8.1
3. AMOSTRAGENS N ÃO PROBABILÍ STICAS

3.1. Amostragem de conveniência

3.2. Amostragem de casos muito semelhantes ou muito diferentes


3.3. Amostragem de casos extremos
3.4. Amostragem de casos típicos

3.5. Amostragem em bola de neve

3.6. Amostragem por quotas

3.7. Utilidade das amostragens não probabilísticas


Atividade 8.2
Síntese

Teste formativo

Leituras complementares

© Universidade Aberta 167


II . Aprofundamento Temático

Objetivos da unidade

No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a :


1. Definir popula çã o ou universo;

2. Definir amostra e dimensão da amostra ;

3. Distinguir entre amostragens probabil ísticas e não probabil ísticas;

4. Identificar os passos comuns à s diferentes técnicas de amostragem ;

5. Explicar as vantagens das técnicas de amostragem probabí lística ;

6. Indicar as características de cada uma das técnicas de amostragem probabil ística :


• Amostragem aleató ria simples,
• Amostragem estratificada ,
• Amostragem de cachos,
• Amostragem por etapas m ú ltiplas,
• Amostragem sistem ática;

7. Aplicar os conhecimentos adquiridos sobre técnicas de amostragem probabil ística


à seleçã o de amostras a partir de uma dada popula ção;

8. Identificar problemas relacionados com a dimensão de uma amostra;

9. Indicar as caracter ísticas de cada uma das técnicas de amostragem n ã o


probabil ística :
• Amostragem de conveniê ncia,
• Amostragem de casos muito semelhantes ou muito diferentes,
• Amostragem de casos extremos,
• Amostragem de casos típicos,
• Amostragem em bola de neve,
• Amostragem por quotas;

10. Exemplificar estudos onde seria ú til utilizar té cnicas de amostragem n ã o


probabil ística .

1. INTRODU ÇÃO

Patton (1990) afirma que provavelmente nada põe tão bem em evidê ncia a diferença
entre m étodos quantitativos e m étodos qualitativos como as diferentes lógicas que estã o
subjacentes às técnicas de amostragem . A investiga çã o quantitativa tem como base
amostras de maiores dimensões selecionadas aleatoriamente, enquanto a investiga çã o

© Universidade Aberta 168


II. Aprofundamento Temático

qualitativa tipicamente focaliza -se em amostras relativamente pequenas, ou mesmo casos


únicos, selecionados intencionalmente.

População ou universo é o conjunto de elementos abrangidos por uma mesma


definição. Esses elementos têm, obviamente, uma ou mais características comuns a todos
eles, características que os diferenciam de outros conjuntos de elementos. O número de
elementos de uma população designa-se por grandeza ou dimensã o e representa -se por
N (os estudantes universitários portugueses, os imigrantes cabo-verdianos residentes em
Portugal, podem constituir exemplos do que designámos como populações). A população
deve ser definida em pormenor, de tal forma que um investigador possa determinar se
os resultados que se obtiveram ao estudar uma dada população podem ser aplicados a
outras popula ções com características idênticas.

Na prática, em grande nú mero de casos, como os indicados anteriormente, o número


de elementos de uma populaçã o é demasiado grande para ser possível, dado o custo e
o tempo, observá - los na sua totalidade, sendo então necessário proceder-se à seleção
de elementos pertencentes a essa população ou universo. A técnica designada por
amostragem (processo de seleção de uma amostra) conduz à seleção de uma parte
ou subconjunto de uma dada população ou universo que se denomina amostra, de tal
maneira que os elementos que constituem a amostra representam a população a partir
da qual foram selecionados. O número de elementos que fazem parte de uma amostra
designa -se por dimensão ou grandeza da amostra e representa-se por n. O propósito
da amostragem é obter informaçã o acerca de uma dada populaçã o; sendo raro um estudo
incidir sobre a totalidade da população. De facto, em grande número de casos nã o só
não é possível utilizar a totalidade dos elementos que constituem a população, como
também não é necessário fazê- lo. Se a população é constituída por um grande número
de elementos, ou se estes estão geograficamente dispersos, o facto de se estudar toda
a população implicaria um grande gasto de tempo e de dinheiro. A seleção da amostra
pode ser feita de tal forma que esta seja representativa do conjunto da populaçã o que
se pretende estudar.

Existem dois grandes tipos de técnicas de amostragem: a probabilí stica e a não


probabilí stica . Amostras probabilí sticas são selecionadas de tal forma que cada um
dos elementos da popula ção tenha uma probabilidade real (conhecida e n ã o nula) de
ser incluído na amostra. Amostras não probabilí sticas são selecionadas de acordo com
um ou mais critérios julgados importantes pelo investigador tendo em conta os objetivos
do trabalho de investiga ção que está a realizar (não está garantida uma probabilidade
conhecida e não nula de cada um dos elementos da população ser selecionado para fazer
parte da amostra).

© Universidade Aberta 169


II. Aprofundamento Temático

Seja qual for a técnica utilizada, ao realizar uma amostragem devem ser dados os passos
seguintes:
• Definição da população;
• Determinaçã o da dimensão ou grandeza da amostra necessária;
• Seleção da amostra.

2. AMOSTRAGENS PROBABILÍ STICAS

As amostragens probabilí sticas implicam que a seleçã o dos elementos que vão
fazer parte da amostra seja feita aleatoriamente. Procede-se à seleçã o de amostras
probabilísticas com o objetivo de poder generalizar à totalidade da população os resultados
obtidos com o estudo dos elementos constituintes da amostra, devendo assim ser estes
representativos dessa popula ção.

Existem cinco técnicas básicas de amostragem probabilí stica . A saber:

2.1. Amostragem aleatória simples

Na amostragem aleatória simples cada elemento de uma dada população tem uma
igual probabilidade de ser selecionado. Todos os elementos da população fazem parte de
uma lista que, em cada caso considerado, inclui a sua totalidade e o número de elementos
que constituem a amostra são selecionados aleatoriamente a partir dela.

Para exemplo de uma seleção aleatória de sujeitos, considere-se:


1. Num curso de Ciências Sociais a população é constituída por 530 estudantes;

2. A dimensão da amostra que se pretende selecionar é de 20%, tendo por conseguinte,


que ser selecionados 106 estudantes;

3. A partir da lista de estudantes atribui-se a cada um deles um número entre 000 e


530;

4. Utilizando uma tabela de números aleatórios4, da qual se reproduz, a título ilustrativo,


uma pequena parte, selecionam-se os estudantes que constituirão a amostra.
99116
15696
97720
11666

4
Neste Manual inclui-se em anexo uma tabela de números aleatórios.

© Universidade Aberta 170


II. Aprofundamento Temático

71628
40501
22005
11731
10811
00408
5. Como o total da população é de 530 estudantes, interessam apenas os 3 últimos
dígitos;

6. O primeiro estudante a ser selecionado é aquele a quem foi atribuído o número 116
( 3 últimos dígitos do número 99116);

7. O número seguinte, constante da tabela de nú meros aleatórios, é o 15696. O


número constituído pelos três últimos dígitos é 696. Não existe nenhum estudante
com esse número uma vez ser o total de 530;

8. Procedendo como indicado em 6 e 7 selecionam -se em seguida os estudantes


números 501, 005 e 408 e assim sucessivamente até ser completada a seleção da
totalidade dos 106 estudantes que fazem parte da amostra.

2.2. Amostragem estratificada

A amostragem estratificada é o processo de selecionar uma amostra de tal forma


que subgrupos ou estratos previamente identificados na população em estudo estejam
representados na amostra em proporção idêntica à que existem na população em estudo.
Os elementos pertencentes a cada um dos estratos, depois de numerados, deverão ser
selecionados aleatoriamente (utilizando uma tabela de números aleatórios). Tome-se um
exemplo para maior facilidade de compreensão:

A população é constituída por estudantes de uma Faculdade de Ciências Sociais


pertencentes a três diferentes cursos: Sociologia, Economia e Antropologia.
Considerou-se que as variá veis a) sexo e b) curso tinham uma grande importância
para o estudo empreendido, pelo que se constituíram subgrupos ou estratos em
relação a cada uma dessas variáveis.
População
970 Estudantes da Faculdade de Ciências Sociais
.
C Sociologia C. Economia C. Antropologia Total
Sexo Fem , 170 220 140 530

Sexo Masc. 150 160 130 440

Total 320 380 270 970

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II. Aprofundamento Temático

Amostra (20%)
194 Estudantes da Faculdade de Ciências Sociais
C. Sociotogí a C * Economia C. Antropologia Total
Sexo Fem. 34 44 28 106

Sexo Masc . 30 32 26 88

Total 64 76 54 194

A amostra será portanto constituída por 34 estudantes do sexo feminino do curso de


Sociologia e por 30 estudantes do sexo masculino do mesmo curso; 44 estudantes do
sexo feminino do curso de Economia e 32 estudantes do sexo masculino do mesmo curso;
e 28 estudantes do sexo feminino do curso de Antropologia e 26 estudantes do sexo
masculino do mesmo curso. Elementos que integram a amostra na mesma proporção em
que existem na população total.

2.3. Amostragem de "cachos" (clusters)

Na amostragem de "cachos" (clusters) cada elemento da população pertence a um


dado grupo ou " cacho” (cluster). Os grupos ou "cachos" têm características semelhantes.
Selecionam-se aleatoriamente os "cachos" e a amostra assim constituída inclui todos os
elementos que fazem parte dos "cachos" selecionados. O "cacho" é neste caso um conjunto
que se identifica com a unidade de amostragem, que não é, portanto, constituída por
cada elemento individual da populaçã o estudada.

Utiliza -se esta técnica de amostragem quando os "cachos" estão geograficamente dispersos
tal como o caso de escolas dispersas pelo País, prédios de residência inseridos em diversos
locais de uma cidade, etc. Tome-se, como exemplo, a situação seguinte:

Suponhamos que se quer selecionar alunos do 7o ano de escolaridade para


proceder à experimentação de novos programas. Selecionam -se em primeiro lugar
e aleatoriamente as escolas e depois todos os alunos do 7o ano pertencentes às
escolas já selecionadas constituem a amostra sobre a qual irá recair o estudo.

2.4. Amostragem por etapas múltiplas

A amostragem por etapas múltiplas resulta da extensão do conceito de amostragem de


cachos. A forma mais simples é o processo de amostragem ser realizado em duas etapas,
mas por vezes faz -se em várias etapas de seleção. Tome-se o seguinte exemplo:

Seleciona -se aleatoriamente uma dada percentagem de escolas do País e em


cada escola selecionada é escolhido um determinado número de turmas. Os
alunos dessas turmas é que irão fazer parte da amostra.

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II. Aprofundamento Temático

2.5. Amostragem sistemá tica

Na amostragem sistemática os elementos são selecionados a partir de uma lista dos


elementos da população. Aleatoriamente escolhe-se o primeiro elemento a ser selecionado
e seguidamente, com intervalos iguais, os restantes elementos. (Por exemplo, a escolha
poderá recair sobre o 40°, o 80°, o 120°, o 160° elemento de uma dada popula ção). A
escolha do intervalo depende do número de elementos que constituem a população total
e da dimensão da amostra que se pretende constituir. A maior diferença relativamente
ao processo de amostragem aleatória simples é que de facto todos os elementos da
população nã o têm uma probabilidade independente de serem selecionados. Uma
vez escolhido o primeiro elemento a ser selecionado os outros elementos são em fase
subsequente automaticamente determinados. Apesar disso, uma amostragem sistemática
pode ser considerada aleatória se a lista da popula ção for ordenada aleatoriamente. Se os
elementos da lista não tiverem sido ordenados aleatoriamente a amostra nã o representa,
com a mesma qualidade, a população considerada comparativamente às outras técnicas
indicadas anteriormente. Quando não se dispõe de uma lista com as condições indicadas,
existe a possibilidade de excluir da amostra certos subgrupos da população.

A vantagem deste tipo de amostragem é a facilidade como são selecionados os elementos


para constituiçã o da amostra quando se está, por exemplo, a realizar trabalho de
campo.

2.6. Determinaçã o da dimensão da amostra

A resposta à pergunta qual deverá ser a dimensão da amostra é difícil. Se ela for de muito
pequena dimensã o, os resultados do estudo podem não ser generalizá veis à população
considerada. Os resultados podem apenas ser válidos para a amostra e poder-se-iam
obter diferentes resultados se fosse estudada a totalidade dos elementos dessa mesma
popula ção.

Usualmente considera-se que quanto maior for a amostra mais possibilidades tem de
ser representativa da população. A dimensão aceitá vel da amostra varia com o tipo
de investigação. Para um estudo descritivo, uma amostra que integre 10% do total da
popula ção considerada é julgado como a dimensã o mínima a obter. Se a população
é pequena, pode ser necessário uma amostra de 20%. Para um estudo correlacionai
são necessários pelo menos 30 sujeitos para estabelecer se existe ou não uma relação
entre duas variáveis. Para estudos experimentais e causal-comparativos é geralmente
recomendado um número mínimo de 30 sujeitos por grupo. Por vezes é necessário
utilizar amostras maiores, por exemplo em estudos experimentais, quando se espera que
a diferença entre o grupo experimental e o grupo de controlo seja pequena, pois se a

© Universidade Aberta 173


II. Aprofundamento Temático

amostra nã o for suficientemente grande a diferença pode nã o ser evidenciada. Existem


no entanto técnicas estatísticas relativamente precisas, que podem ser utilizadas para
estimar qual a dimensão necessária da amostra para um dado estudo experimental; o
uso de tais técnicas exige que se conheçam determinados factos acerca da população,
tais como as diferenças esperadas entre grupos. O aumento da dimensão da amostra
diminui a possibilidade de erro e portanto de variabilidade da amostra.

No entanto, para determinar a dimensão da amostra deve ter-se em considera ção, entre
outros, o problema do custo que acarreta a sua constituição, o erro considerado tolerá vel,
o plano de investigação no seu conjunto.

Atividade 8.1
Numa revista onde estejam publicados artigos de investigação, escolha um
que relate uma pesquisa onde tenha sido utilizada uma técnica de amostragem
probabilística. Identifique-a e faça um resumo dos procedimentos utilizados pelo
autor.

3. AMOSTRAS NÃO PROBABILÍ STICAS

As amostras nã o probabilí sticas são utilizadas em muitos projetos de investiga ção.


Amostras não probabilísticas podem ser selecionadas tendo como base critérios de escolha
intencional sistematicamente utilizados com a finalidade de determinar as unidades da
popula ção que fazem parte da amostra. Muitas vezes são utilizadas para fazer estudos
em profundidade. A dimensão e os elementos escolhidos dependem dos objetivos do
estudo.

Enumera -se, a título ilustrativo, sete das técnicas de amostragem não probabilística mais
frequentemente utilizadas:

3.1. Amostragem de conveniência

Na amostragem de conveniência utiliza - se um grupo de indivíduos que esteja


disponível ou um grupo de voluntários. Poderá tratar-se de um estudo exploratório cujos
resultados obviamente não podem ser generalizados à população à qual pertence o grupo
de conveniência, mas do qual se poderão obter informações preciosas, embora não as
utilizando sem as devidas cautelas e reserva .

© Universidade Aberta 174


II. Aprofundamento Temático

3.2. Amostragem de casos muito semelhantes ou muito diferentes

Nestes estudos os elementos selecionados são normalmente em pequeno número e


portanto os recursos necessários para fazer o estudo são limitados, mas é evidente que se
levanta o problema querendo generalizar os resultados para além dos casos estudados.

Tome-se como exemplo: querer selecionar estudantes de Sociologia que obtêm boas
classificações ou querer selecionar simultaneamente estudantes que obtêm boas
classificações e estudantes que obtêm más classificações.

3.3. Amostragem de casos extremos

Esta técnica de amostragem consiste em selecionar elementos em que o fenómeno em


estudo se manifesta em grau muito elevado. A lógica que subjaz a este tipo de amostragem
é a de que os resultados obtidos ao estudar casos extremos possam contribuir para
explicar casos mais típicos.

Tome-se como exemplo: selecionar os estudantes que obtêm as melhores classificações,


ou os que obtêm as piores classificações.

3.4. Amostragem de casos típicos

Este tipo de amostragem é o melhor exemplo de técnica de amostragem utilizada quando


existem grandes limitações em tempo e nos recursos disponíveis, o que torna impossível
efetuar uma amostragem de tipo probabilístico. O investigador seleciona intencionalmente
alguns casos considerados como comuns. Para aumentar a autenticidade do estudo, casos
que sejam considerados únicos ou especiais não serão, obvia mente incluídos na amostra.
Esta técnica de amostragem implica que o investigador conheça bem a população em
estudo de modo a poder selecionar casos que considere como típicos. A suspeita de que
um ou mais deles não são típicos vai afetar o reconhecimento da cientificidade quo o
estudo reveste.

3.5. Amostragem em bola de neve

Este tipo de amostragem implica que a partir de elementos da população já conhecidos se


identifiquem outros elementos da mesma população. Os primeiros indicam os seguintes
e assim sucessivamente. A amostra cresce como uma bola de neve. Frequentemente
esta forma de selecionar a amostra é utilizada quando se torna impossível obter uma
lista completa dos elementos da populaçã o que se quer estudar. Tome-se o seguinte
exemplo:

© Universidade Aberta 175


II. Aprofundamento Temático

Identificar as "crianç as da rua". Umas crianças vão indicando outras até se chegar
a um número previamente definido e considerado como desejável.

3.6. Amostragem por quotas

Com esta técnica pretende -se atingir um objetivo idêntico ao que se consegue na
amostragem aleatória: constituir uma amostra que seja um modelo reduzido da população.
Começa-se por se estabelecer um inventário das proporções estatísticas correspondentes
à combinação de diferentes modalidades dos carateres retidos. Deste modo a população
é dividida em subgrupos, por exemplo grupos de homens e de mulheres, definição de
escalões de idade, enumeraçã o de grupos étnicos de pertença, etc. Seguidamente, tendo
como base as percentagens de indivíduos necessários para a amostra final, é indicada aos
entrevistadores uma quota ou seja, o número de sujeitos pertencentes a cada subgrupo
que têm que selecionar e entrevistar.

Exemplo: Se numa localidade tivermos 20000 ativos, dos quais 2000 pertencem ao sector
primário ( sendo 600 mulheres e 1400 homens), 8000 ao sector secundário (sendo 3000
mulheres e 5000 homens) e 10000 ao sector terciário (sendo 6000 mulheres e 4000
homens), uma amostra de 1000 sujeitos deverá incluir:
600 x 1000 / 20000 = 30 Mulheres pertencentes ao sector primário,
1400 x 1000 / 20000 = 70 Homens pertencentes ao sector primário,
3000 x 1000 / 20000 = 150 Mulheres pertencentes ao sector secundário,
5000 x 1000 / 20000 = 250 Homens pertencentes ao sector secundário,
6000 x 1000 / 20000 = 300 Mulheres pertencentes ao sector terciário,
4000 x 1000 / 20000 = 200 Homens pertencentes ao sector terciário.
30 + 70 + 150 + 250 + 300 + 200 = 1000

Este tipo de amostragem apresenta similaridades com amostragens de car á cter


probabilístico, especialmente com a amostragem estratificada, mas difere dela num
importante aspeto: os sujeitos sã o escolhidos por entrevista. Aos entrevistadores são
dadas instruções específicas sobre os sujeitos que deverão selecionar para realizá- la,
mas esta seleção pode ocasionar enviesamentos na amostra, pois muitas vezes os
entrevistadores têm tendência a entrevistar pessoas pertencentes à sua rede de relações
pessoais ou então indivíduos detentores de determinadas características que os tornam
mais facilmente contactáveis.

Por outro lado, o problema da não resposta não existe, porque quando um sujeito se recusa
a responder ou o entrevistador não encontra ninguém em casa procura outro sujeito com
as mesmas características para ser entrevistado. O entrevistador obtém sempre o número
de sujeitos inicialmente previstos, mas o número de sujeitos difíceis de contactar pode

© Universidade Aberta 176


II. Aprofundamento Temático

ficar mal representado. É possível impor aos entrevistadores um determinado itinerário,


dependendo neste caso a representatividade da amostra da pessoa que estabelece o plano
de estudo. Se o processo de seleção for mal definido não há nenhum método estatístico
válido para estimar o erro de amostragem, o que constitui um perigo a ter em conta.

A amostragem por quotas não é tão dispendiosa como a amostragem aleatória estratificada,
mas apresenta grandes inconvenientes relativamente a esta, nomeadamente no que
diz respeito à representatividade da amostra e, consequentemente, à possibilidade de
generalização dos resultados.

3.7. Utilidade das amostragens nã o probabilí sticas

0 processo de constituiçã o de uma amostra por seleção nã o probabilística é uma técnica


de amostragem útil em determinadas circunstâncias, algumas das quais já indicadas
anteriormente. Retom á - las-emos de forma sistematizada:
• Quando se estudam determinadas populações cuja listagem completa é
impossível de obter. Tome-se como exemplo: os " sem-abrigo", as "crianças da
rua", os toxicodependentes. A amostragem em bola de neve é quase a única
técnica possível de ser aqui utilizada com ê xito em casos como os citados;

• Quando o investigador está interessado em estudar apenas determinados


elementos pertencentes à populaçã o, de características bem recortadas;

• Numa fase exploratória do processo de investigação, quando o investigador


quer averiguar se um problema é ou não relevante.

É necessário não esquecer que devido ao cará cter subjetivo que envolve o processo de
seleção, põe-se o problema da validade externa (relativo à generalizaçã o dos resultados
obtidos). Não é possível saber-se se os resultados alcançados seriam os mesmos no caso
de os elementos da população selecionados serem outros.

Quando utiliza um processo de amostragem não probabilística o investigador deverá


explicar pormenor ízadamente como procedeu à seleção dos elementos da populaçã o em
estudo, que deverão também ser descritos com o maior rigor possível.

Atividade 8.2
Numa revista onde estejam publicados artigos de investigaçã o, escolha um que
relate uma pesquisa onde tenha sido utilizada uma técnica de amostragem não
probabilística . Identifique-a, critique-a e faça um resumo dos procedimentos
utilizados pelo investigador.

© Universidade Aberta 177


II. Aprofundamento Temático

Síntese

Fez-se a distinção entre amostragens probabilísticas e não probabilísticas.

Seguidamente explicaram-se as vantagens das técnicas de amostragem probabilística e


as caraterísticas de cada uma delas.

Procedeu-se de igual modo relativamente às técnicas de amostragem não probabilística,


tendo sido indicadas as suas caraterísticas e a sua utilidade.

Teste formativo

Após leitura aprofundada do presente capítulo considere o seguinte trabalho de


investiga ção:

Num concelho onde existem duas escolas do 3 o ciclo do ensino bá sico verificou-se que
há problemas de racismo. Na escola A existem 1600 alunos distribuídos nas seguintes
proporções: lusos ( 70%), cabo-verdianos (20%), angolanos (5%) e guineenses (5%)
e na escola B 900 alunos distribuídos nas seguintes proporções: lusos (60%), cabo-
verdianos ( 25%), angolanos (10%) e moçambicanos (5%). O investigador pretende
primeiramente administrar um questionário a 20% dos alunos para averiguar a situação,
quais os problemas existentes nas escolas e tentar compreender as causas que os motivam.
Seguidamente tem a intenção de observar duas turmas onde os confrontos raciais são
mais graves.
1. Indique que técnica de amostragem probabilística utilizaria para selecionar os alunos
que irão constituir a amostra a quem vai ser administrado o questionário. Justifique
a resposta.
2. Indique que técnica de amostragem não probabilística utilizaria para selecionar as
turmas que irão ser observadas como amostra. Justifique a resposta.

Leituras complementares

ALMEIDA, João F. e PINTO, José M.


1995 A Investigação nas Ciências Sociais, Lisboa, Editorial Presença, pp. 114-123.

GHIGLIONE, Rodolphe e MATALON, Benjamin


1993 O Inquérito. Teoria e Prática, Oeiras, Celta Editora, pp. 27-68.

HENRY, Gary T.
1990 Practical Sampling, Newbury Park, Sage Publications.

© Universidade Aberta 178


II. Aprofundamento Temático

REIS, Elizabeth
2008 Estatística Descritiva, 7a ed., Lisboa, Edições Sílabo.

SILVA, Cecília M.
1994 Estatística Aplicada à Psicologia e Ciências Sociais, Lisboa, McGraw-Hill, pp.
1-21. (Aconselhado a mestrandos que tenham conhecimentos matemáticos, ao
nível do 12 ano de escolaridade).
°

© Universidade Aberta 179


II. Aprofundamento Temático

Unidade 9 — A Prática de Investigação

Sumário

Objetivos da unidade

1. CLASSIFICA ÇÃO DA INVESTIGAÇÃ O

2. INVESTIGA ÇÃ O HISTÓRICA

3. INVESTIGA ÇÃ O DESCRITIVA

3.1. Inquéritos
3.2. Estudos relativos ao desenvolvimento
3.3. Estudos complementares
3.4. Estudos sociométricos
4. ESTUDO DE CASO

5. ESTUDO ETNOGR Á FICO

6. INVESTIGA ÇÃ O CORRELACIONAL

7 . INVESTIGA ÇÃ O EXPERIMENTAL

8. INVESTIGA ÇÃ O CAUSAL-COMPARATIVA

Atividade 9.1
Síntese

Teste Formativo

Leituras Complementares

Objetivos da unidade

No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a :


1. Caraterizar a investigaçã o histórica, a investigaçã o descritiva, o estudo de caso, o
estudo etnográfico, a investigação correlacionai, a investiga ção experimental e a
investiga ção causal-comparativa;

2. Indicar as suas finalidades;

3. Distinguir os procedimentos utilizados;

4. Enumerar as vantagens e limitações;

© Universidade Aberta 180


II. Aprofundamento Temático

5. Aplicar os conhecimentos adquiridos à escolha dos métodos e procedimentos


ma is adequados ao trabalho de investigação que se propõe fazer no âmbito do
Mestrado.

1. CLASSIFICAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO

Já anteriormente { unidade 7) tinha sido referida a dificuldade de definir métodos e, do


mesmo modo, a sua classificação levanta grandes problemas (vide Almeida e Pinto, 1995).
No entanto, para facilitar a prática de investigaçã o, numerosas obras de Metodologia
incluem uma classificação que varia segundo os autores.

Embora com algumas adaptações, apresenta-se a classificação de L. R. Gay que foi


elaborada relativamente à investigação em Ciências de Educação, mas que pode ser
extensiva a outras Ciências Sociais.

O referido autor classifica a investigaçã o:


• Quanto ao propósito - Esta classificação é baseada fundamentalmente na
aplicabilidade dos resultados e no grau em que estes são generalizá veis à
populaçã o em estudo. Ambos os critérios são funçã o do controlo da investigação
exercido durante a conduçã o do estudo.

• Quanto ao método - O autor põe em evidência que embora muitos trabalhos de


investigação tenham aspetos em comum, apresentam um método ou estratégia
caraterístico. Isto, apesar de terem em comum, ao longo do seu itinerário, as
mesmas etapas: definição do problema, recolha de dados, análise dos dados
e formula ção das conclusões. As diferenç as existentes entre eles são devidas
ao método de investigação, pois cada um deles foi concebido para responder a
uma determinada questão.

1.1. Classificação quanto ao propósito

Quanto ao propósito da investigação o autor considera cinco categorias:


a) Investigaçã o básica - Na sua forma mais pura, a investigação básica tem como
propósito desenvolver a teoria e estabelecer princípios gerais. A investigação básica
fornece a teoria relevante para a resolução de problemas sociais.

b) Investigaçã o aplicada - Como o nome indica, é conduzida com o propósito


de aplicar ou testar a teoria e avaliar a sua utilidade na resolução de problemas
sociais.

© Universidade Aberta 181


II. Aprofundamento Temático

c) O mesmo autor põe em evidência que frequentemente é difícil distinguir a


investigação básica da investigação aplicada porque existe entre elas um continuum.
Alguns trabalhos localizados no meio desse continuum tentam integrar ambas as
abordagens através de uma investigaçã o com controlo de variáveis.

d) Investigação em Avaliação - O propósito da investigação em avaliação é recolher


e analisar dados com o fim de facilitar tomadas de decisão que digam respeito a
duas ou ma is ações alternativas. Os dados deverão ser assim recolhidos em função
de um ou mais critérios.

Tome-se como exemplo: será o novo currículo de História do 7o ano de escolaridade


"melhor" que o antigo currículo? É evidente que a avaliação depende do critério de
sucesso obtido pelos estudantes nessa disciplina. Poder-se-ia obviamente utilizar
como critério de sucesso as classificações obtidas pelos alunos. Um outro a utilizar
poderia ser, por exemplo, o de considerar as atitudes de professores e de alunos
face ao novo currículo.

Avaliar a eficácia de um projeto é ainda mais complexo porque envolve naturalmente


juízos de valor.

Alguns investigadores defendem que a avaliação é uma investigação, enquanto outros


defendem que é uma disciplina individualizada. Na realidade, a separação entre
investigação e avaliação é ténue, porque em avaliação adota-se frequentemente um
plano de investigação. Investigação e avaliação incluem conjuntamente as tomadas
de decisão e as etapas caraterísticas do processo de investigação científica . Por outro
lado, muitos trabalhos de investigação são conduzidos na situação real e envolvem
problemas de controlo da mesma maneira que muitas avaliações. Embora o problema
não esteja resolvido, com maior frequência a avaliação aparece classificada como
uma investigação cujo propósito é facilitar tomadas de decisão.

e) Investigação e Desenvolvimento (I & D) - O principal propósito de I & D é


desenvolver produtos para serem utilizados com determinados fins e de acordo com
especificações pormenorizadas. Uma vez elaborados, os produtos são testados e
revistos até que um nível de efic ácia pré-determinado seja atingido. O processo é
dispendioso mas pode resultar na elaboração de produtos de qualidade elevada.
Exemplo de produtos: materiais de aprendizagem e materiais multimédia.

f) Investiga çã o- Açã o - O propósito desta investigaçã o é resolver problemas


de caráter prático, através do emprego do método científico. A investigação é
levada a cabo a partir da consideraçã o da situação real. Não tem como objetivo a
generalização dos resultados obtidos e portanto o problema do controlo não assume

© Universidade Aberta 182


II. Aprofundamento Temático

a importância que apresenta noutras investiga ções. A sua principal finalidade é a


resolução de um dado problema para o qual não há soluções baseadas na teoria
previamente estabelecida.

1.2. Classificação quanto ao método

Quanto ao método de investigação o autor acima referido considera cinco categorias de


investiga ção: investiga ção histórica, investigação descritiva, investigação correlacionai,
investiga ção experimental e investiga ção causal-comparativa.

2. INVESTIGAÇÃO HISTÓRICA

A investigação histórica envolve o estudo, a compreensão e a explicação de acontecimentos


passados. O propósito da investiga çã o histórica é testar hipóteses ou responder a
questões que digam respeito às causas, aos efeitos ou às tendências de acontecimentos
passados, que possam ajudar a explicar acontecimentos atuais e a prever acontecimentos
futuros.

As etapas da investigação histórica são as mesmas de outras investigações e um estudo


histórico deverá compreender a definição de um problema; a formulação de hipóteses
ou de questões de investiga ção; a recolha, organização, verificação, valida ção, análise e
seleção de dados; a testagem de hipóteses ou a resposta às questões; e a redação de
um relatório de investigação.

Uma das principais diferenças da pesquisa histórica relativamente a outras é a de que


nela se utiliza informa ção já existente. As fontes de informação podem ser de dois tipos
fundamentais: primárias e secundárias. As fontes primárias fornecem informação
direta (em Ia mão) e podem ser de vária natureza: por exemplo - artefactos, tais
como: esqueletos, fosseis, armas, utensílios, edifícios, quadros, mobiliário, moedas e
obras de arte; ou documentos e relatos orais de quem testemunhou ou participou nos
acontecimentos, obtidos frequentemente por entrevista. Os documentos podem ser
manuscritos, legislaçã o, registos, ficheiros, cartas, minutas de reuniões, memorandos,
memórias, biografias, publica ções oficiais, testamentos, jornais, revistas, mapas,
diagramas, catálogos, filmes, pinturas, inscrições, grava ções, transcrições, agendas e
relatórios de investiga ção, entre outros, capazes de intencionalmente ou não transmitir
a descrição de um acontecimento.

As fontes secundárias não sã o fontes originais, mas sim relatos escritos por alguém
que não presenciou um acontecimento, mas a quem foi relatado esse acontecimento,

© Universidade Aberta 183


II. Aprofundamento Temático

muitas vezes não por quem o presenciou, mas por alguém a quem já tinha sido por sua
vez relatado, o que frequentemente dá origem a distorções do que realmente se passou.
Inclui também citações, manuais, enciclopédias e reproduções de materiais, informações,
pinturas e réplicas de objetos de arte. Obviamente que sempre que for possível, será
preferível utilizar fontes primárias, mas não se deverá minimizar, de modo nenhum, o
papel que as fontes secundárias podem desempenhar.

Definição do problema - É importante definir um problema sobre o qual seja possível


realizar investigaçã o, isto é, um problema relativamente ao qual haja informaçã o
disponível pois, caso contrário, se nã o há informa ção suficiente, o problema não poderá
ser corretamente estudado, e as hipó teses levantadas não poderã o ser adequadamente
testadas, É do mesmo modo preferível estudar um problema mais restrito, bem definido,
para o qual seja possível formular hipóteses ou colocar questões de forma concreta, em
vez de investigar um problema mais amplo relativamente ao qual se formulam hipóteses
ou questões de uma forma imprecisa. As hipóteses ou questões formuladas orientam a
recolha de informação. Tome-se como exemplo: Sanches, em 1990, realizou um trabalho de
investigação sobre a educação durante o período comumente designado por "Estado Novo",
em que formulou a seguinte hipótese: "O principal objetivo do Estado Novo em relação
à educação da populaçã o portuguesa tinha sido o de inculcar atitudes de passividade e
um comportamento conformista através da desmobilização e despolitização",

Aná lise dos dados - Todas as fontes históricas deverão ser sujeitas a uma cr í tica
externa para determinar a sua autenticidade e a uma crí tica interna para determinar o
rigor do conteúdo. A idade de um documento pode atualmente ser estabelecida utilizando
testes físicos e químicos, mas para determinar o rigor do documento, há pelo menos
quatro aspetos que deverão ser considerados:
• Conhecimento e competência do autor. Dever-se-á determinar se o autor
do documento tinha a competência necessária ou possibilidades de ter tido
conhecimento do acontecimento que relatou;

• Tempo que passou entre o desenrolar do acontecimento e a data do relato


do mesmo. Quanto mais longo for esse período de tempo maiores são as
probabilidades de haver distorções dos acontecimentos relatados;

• Enviesamentos e motivações do autor. Frequentemente as pessoas relatam ou


registam incorretamente informação. Tal distorção pode ser ou não intencional.
Pessoas tendem a recordar-se daquilo que lhes interessa e não do resto, e
por vezes tendem a aumentar ou acrescentar pormenores para tornar o
acontecimento mais interessante. O maior problema consiste na alteração

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II. Aprofundamento Temático

intencional da verdade dos fatos feita pelo autor devido a motivações de vária
natureza (pessoais, profissionais, ideológicas, etc.);

* Consistência dos dados. Cada documento deverá ser comparado com outros
para determinar o grau de concordância entre a informação que deles consta.

S í ntese dos dados - Após a aná lise e crítica dos dados recolhidos estes deverão ser
organizados procedendo-se à elaboração de uma síntese e à formulaçã o (se possível)
de conclusões e generaliza ções. Em investigação histórica levanta-se o problema de ser
ou não possível generalizar os resultados da investigação, dado que os acontecimentos
nunca se poderão repetir da mesma maneira; daí a necessidade dessa generalização,
ao ser efetuada, dever revestir grandes cuidados. No entanto, este problema põe-se
também relativamente aos outros domínios de investigação na área das Ciências Sociais.
Porque se trata de seres humanos nunca se pode repetir exatamente o mesmo estudo
nas mesmas condições, ainda que este compreenda um rigoroso controlo de variáveis.
Em investiga ção histórica, como noutras investiga ções, quanto mais similar for uma nova
situação relativamente à anterior, mais aplicáveis poderão ser as generalizações baseadas
no passado.

Atendendo a que a síntese histórica compreende fundamentalmente uma análise lógica,


o investigador deverá ser o mais objetivo possível para nã o cometer os erros de eliminar
dados precisos que contrariem a hipótese formulada ou dados que a confirmem, embora
obtidos sem o rigor que deve ser caraterístico da sua recolha .

3. INVESTIGAÇÃO DESCRITIVA

Esta área de investigação implica estudar, compreender e explicar a situação atual do


objeto de investigação. Inclui a recolha de dados para testar hipóteses ou responder a
questões que lhe digam respeito. Os dados numa investigação descritiva são normalmente
recolhidos mediante a administraçã o de um questionário, a realização de entrevistas ou
recorrendo à observação da situa ção real. A informação recolhida pode dizer respeito,
por exemplo, a atitudes, opiniões, dados demográficos, condições e procedimentos. A
investigação descritiva compreende as mesmas etapas anteriormente referidas para outras
investiga ções: definição do problema, revisão da literatura, formulação das hipóteses ou
das questões de investiga ção, definição da populaçã o-alvo e escolha da técnica de recolha
de dados, determinação da dimensão da amostra, seleção da técnica de amostragem
adequada e seleção ou desenvolvimento de um instrumento de recolha. Dado que são
formuladas questões que não tinham sido postas anteriormente ou que se procura obter
dados que não estavam disponíveis, esta investigação exige frequentemente a elaboração

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II. Aprofundamento Temático

de um instrumento apropriado para obter a informação necessária. É possível, no entanto,


utilizar um instrumento já existente desde que este se revele adequado. A construção de
um novo instrumento é, no entanto, geralmente baseada em instrumentos já utilizados
anteriormente. Este deverá ser testado e corrigido antes de ser administrado aos sujeitos
que constituem a amostra. Os procedimentos de administração, assim como de análise
dos dados recolhidos, deverã o ser cuidadosamente planeados.

Há vários estudos incluídos nesta categoria:

3.1. Inquéritos

Nestes estudos utilizam-se questionários e entrevistas para recolher dados. O leitor


encontrará na unidade 5 o inquérito por questionário e por entrevista e na unidade 8 as
principais técnicas de amostragem.

3.2. Estudos relativos ao desenvolvimento (" Developmental Studied ) 1

Em Ciências Sociais, nomeadamente em Ciências da Educação, são na maioria dos casos


estudadas variáveis comportamentais em diferentes escalões de idade. As variáveis podem
dizer respeito ao desenvolvimento cognitivo, psicomotor, afetivo ou social dos sujeitos.
Os estudos podem ser longitudinais ou transversais ("cross-sectionaf ).
1

Nos estudos longitudinais um mesmo grupo de sujeitos é seguido durante um período


de tempo mais ou menos longo, com o objetivo de poder analisar a evoluçã o das variáveis
em estudo. Tome-se como exemplo o estudo da evolução do desenvolvimento moral
de um grupo de crianças desde a sua entrada no ensino pré-escolar até ao final da
escolaridade obrigatória. As mesmas crianças deverão ser observadas periodicamente
desde os 5 aos 15 - 16 anos de idade. O principal problema destes estudos diz respeito
ao facto de ser difícil manter o nú mero inicial de crianças, durante um período de tempo
muito prolongado, devido a diferentes razões, tais como mudanç a de residência ou
desistência em colaborar no estudo ao fim de alguns anos, e de igual modo, exigem um
envolvimento do investigador durante o mesmo período, o que muitas vezes se torna
difícil ou impossível devido a motivos pessoais ou profissionais.

Nos estudos transversais ("cross-sectional' ) grupos de crianças em diferentes estádios


de desenvolvimento são estudadas simultaneamente. Retomando o exemplo anterior
poder-se-iam estudar grupos de crianças frequentando cada um dos anos de escolaridade
obrigatória. A vantagem destes estudos relatívamente aos anteriores será as possibilidades
que oferecem de estudar grupos de crianças mais numerosos. No entanto, verificam-
-se, entre outros, os problemas de seleçã o de amostras de crianças, que apresentem o

© Universidade Aberta 186


II. Aprofundamento Temático

desenvolvimento moral considerado como característico de um determinado escalão de


idade e a dificuldade de controlo de um grande nú mero de variáveis.

3.3. Estudos complementares (" Follow-Up Studied' )

Estes estudos são levados a cabo para averiguar qual a situação dos sujeitos de investigação
após um dado período de tempo. Tome-se a título de exemplo a situação seguinte: num
instituto de formação pretendeu-se averiguar qual o efeito de um programa destinado a
promover a integração social de um determinado grupo de sujeitos. Após a conclusão do
programa os sujeitos demonstraram melhor adaptação ao meio em que viviam, mas foi
considerado necessário verificar se, após algum tempo, os efeitos do programa se tinham
ou não mantido. Anteriormente, tinha -se constatado em relação a outros programas
que os seus efeitos benéficos tinham-se atenuado ou mesmo desaparecido após um
período de tempo mais ou menos longo. Procedeu-se então à recolha de dados relativos
à situação dos sujeitos e às opiniões e atitudes dos mesmos em relação ao curso que
tinham frequentado.

Note-se que um programa poderá não ter efeitos imediatos, mas estes poderão vir a
verificar-se mais tarde. De igual modo, a recolha de dados poderá pô-los em evidência.

3.4. Estudos sociométricos

Sociometria consiste na avalia ção e an á lise das relações interpessoais dentro de um dado
grupo de sujeitos. Através da análise das escolhas ou preferências expressas dos diferentes
membros do grupo pelos outros membros do mesmo grupo, poder-se-á determinar o grau
de aceita ção ou rejeição de um sujeito pelos outros membros do grupo. A cada membro
do grupo será pedido que indique outros membros do grupo com os quais gostaria,
preferencialmente, de executar um trabalho, ou desenvolver uma dada atividade. Por
exemplo, poder-se-á pedir a cada um dos membros do grupo que indique, por ordem
de preferência, três outros membros com quem gostaria de trabalhar num determinado
projeto. Obviamente a escolha dos membros do grupo poderá variar de acordo com a
atividade realizar em conjunto, pois os sujeitos com quem preferencialmente se gostaria
de executar uma tarefa poderão não ser os mesmos com quem se preferiria executar
uma outra tarefa.

As escolhas feitas pelos membros do grupo são representadas num gráfico denominado
sociograma que põe em evidência as escolhas mútuas dos membros do grupo. Na sua
construção poderá, no entanto, utilizar-se diferente simbologia e este poderá apresentar
diversas formas. Um sociograma mostra aqueles que são escolhidos por muitos membros

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II. Aprofundamento Temático

do grupo, aqueles que ninguém escolhe e pequenos grupos cujos membros se escolhem
mutuamente.

As técnicas sociométricas são utilizadas com fins práticos ou para investigação no caso de se
pretender estudar relações entre membros de um grupo e características comportamentais.
Estes estudos podem dar uma contribuição para o desenvolvimento de teorias que digam
respeito a relações interpessoais dentro de um grupo.

4. ESTUDO DE CASO

O estudo de caso tem sido largamente usado em investigação em Ciências Sociais,


nomeadamente em Sociologia, Ciência Política, Antropologia, História, Geografia, Economia
e Ciências de Educação.

Definição - Yin (1988) define um estudo de caso como uma abordagem empírica
que:
• Investiga um fenómeno atual no seu contexto real; quando,
• Os limites entre determinados fenómenos e o seu contexto não são claramente
evidentes; e no qual

• São utilizadas muitas fontes de dados.


De acordo com o mesmo autor esta definição permite distinguir o estudo de caso de outras
investiga ções: experimental, que deliberadamente separa o fenómeno do seu contexto;
histórica, que estuda acontecimentos passados; e descritiva, onde se procura estudar o
fenómeno e o contexto, mas em que o estudo do contexto é extremamente limitado. O
investigador nesta última investigaçã o tenta, por exemplo, limitar o número de variá veis
a analisar (e, portanto, o número de questões para as quais quer encontrar respostas),
de acordo com o número de sujeitos que tenha possibilidade de inquirir.

Yin (1988) põe ainda em evidência que o estudo de caso constitui a estratégia preferida
quando se quer responder a questões de " como" ou "porquê"; o investigador não pode
exercer controlo sobre os acontecimentos e o estudo focaliza-se na investiga ção de um
fenómeno atual no seu próprio contexto. Além destes estudos de caso cujo objetivo é a
explicação de fenómenos, o mesmo autor refere ainda a existência de estudos de caso
exploratórios e descritivos. Em estudo de caso pode ainda estudar-se um caso único ou
casos múltiplos e os dados recolhidos podem ser de natureza qualitativa, quantitativa
ou ambas.

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II. Aprofundamento Temático

Merriam (1988) resumiu as características de um estudo de caso qualitativo:

particular - porque se focaliza numa determinada situação, acontecimento,


programa ou fenómeno; descritivo - porque o produto final é uma descrição
"rica" do fenómeno que está a ser estudado; heurí stico - porque conduz à
compreensã o do fenómeno que está a ser estudado; indutivo - porque a maioria
destes estudos tem como base o raciocínio indutivo; holí stico - porque tem
em conta a realidade na sua globalidade. É dada uma maior importância aos
processos do que aos produtos, à compreensã o e à interpretação.

A planificaçã o de um estudo de caso varia segundo se trata de um estudo de caráter


essencialmente qualitativo ou quantitativo.

Yin (1988) põe em evidência a necessidade de definir as questões de investigação :


as proposições que focalizam a atenção do investigador sobre algo que deverá ser
observado durante o estudo; a(s) unidade( s) de aná lise que poderão ser um ou mais
programas, acontecimentos, indivíduos, processos, instituições ou grupos sociais conforme
se trata do estudo de um caso ú nico ou de casos mú ltiplos; a lógica que liga os dados
às proposições; e os crit érios para interpretaçã o dos resultados. No entanto, o
autor sublinha que atualmente ainda não há uma orientação precisa para os dois últimos
componentes, que representam as fases de an álise de dados.

Merriam (1988) referindo-se ao estudo de caso de natureza qualitativa, afirma que


primeiramente o investigador deverá definir o problema de investigação, o qual será
com frequência proveniente da sua própria experiência ou de situações ligadas à sua
vida prática, mas que pode também resultar de deduções a partir da teoria, da revisão
de literatura, ou de questões sociais ou políticas. Seguidamente formulará as questões
de investigação que não deverão ser muito específicas, acerca de processos (porque é
que algo acontece e como) e da tentativa de compreensão dos acontecimentos ( o que
aconteceu, porquê e como) . A escolha da unidade de análise ou "caso" é o passo seguinte.
Existem várias técnicas para seleção de casos ( já anteriormente referidas na unidade 8
dedicada à amostragem ), sendo as não probabilísticas as mais apropriadas para estudos
de caso qualitativos.

A revisão da literatura respeitante à área de estudo, quer de natureza teórica, quer de


natureza investigatíva (por exemplo, relatórios de trabalhos de investigação já realizados),
constitui um componente fundamental do processo de investigação, pois poderá contribuir
para a conceptualização do problema, a realização do estudo (por exemplo, poderá orientar
a escolha das técnicas de recolha de dados) e a interpretação dos resultados.

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II. Aprofundamento Temático

Em estudo de caso utilizam -se diferentes técnicas de recolha de dados tais como: a
observação, a entrevista, a análise documental e o questionário.

Uma rigorosa análise de dados é fundamental em qualquer investiga ção e no caso de um


estudo de caso qualitativo o investigador deverá proceder à análise dos dados à medida
que procede à sua recolha. O produto final é uma descriçã o "rica" e rigorosa do caso que
constitui o objeto de estudo.

Nos estudos de caso, como em quaisquer outros estudos, torna -se necessário assegurar
a validade e fiabilidade do estudo. A validade interna diz respeito à correspondência
entre os resultados e a realidade, isto é, à necessidade de garantir que estes traduzam a
realidade estudada. A fiabilidade diz respeito à replicaçã o do estudo, isto é, à necessidade
de assegurar que os resultados obtidos seriam idênticos aos que se alcançariam caso o
estudo fosse repetido.

A validade interna pode ser assegurada de diferentes maneiras: por triangulação -


utilizando vários investigadores, várias fontes de dados ou diferentes métodos; verificando
se os dados recolhidos estão de acordo com o que os participantes disseram ou fizeram
e se a sua interpretação foi coRretamente feita; observando o fenómeno em estudo
durante um período longo ou realizando observações repetidas do mesmo; discutindo
os resultados com outros investigadores; envolvendo os participantes em todas as fases
da investigação.

A fiabilidade pode ser garantida sobretudo através de uma descrição pormenorizada e


rigorosa da forma como o estudo foi realizado, a qual implica, não só uma explicitação
dos pressupostos e da teoria subjacentes ao próprio estudo, mas também uma descrição
do processo de recolha de dados e da forma como se obtiveram os resultados.

A possibilidade de generaliza ção dos resultados a outras situações - validade externa


- continua a ser debatida.

0 componente final diz respeito à redação do relatório e disseminação dos resultados.


Yin (1988) indica 5 características de um bom estudo de caso: ser relevante, completo,
considerar perspetivas alternativas de explicação, evidenciar uma recolha de dados
adequada e suficiente e ser apresentado de uma forma que motive o leitor.

Histórias de vida
São um tipo de estudo de caso, em que o investigador mediante entrevistas em
profundidade tenta coligir uma narrativa de um indivíduo. Em Psicologia são utilizadas
para a compreensão de aspetos bá sicos do comportamento humano. Em Sociologia
procura-se reconstituir a carreira dos sujeitos, dando relevo ao papel das organizações,

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II. Aprofundamento Temático

acontecimentos marcantes e indivíduos que tiveram neles uma influência significativa,


comprovada na moldagem das definições de si próprios e das suas perspetivas sobre a
vida (Bogdan e Biklen,1994). Em Ciências de Educação têm sido igualmente realizadas
histórias de vida, visando sobretudo utilizá- las na (auto) formação de professores.

5. ESTUDO ETNOGRÁFICO

Em v ários domínios das Ciências Sociais tem-se registado um crescente interesse pelos
estudos etnográficos, com a intenção de dar resposta a problemas que os métodos
tradicionais não têm vindo a resolver de forma satisfatória.

Os estudos etnográ ficos pressupõem uma extensa recolha de dados durante um período
de tempo mais ou menos longo, de uma forma naturalística, isto é, sem que o investigador
interfira na situação que está a estudar.

A ideia de cultura é central para os estudos etnográ ficos. Qualquer grupo humano que
viva em conjunto durante um certo período de tempo, desenvolve uma cultura própria,
entendida como um conjunto de padrões de comportamento e crenças que permitem
compreender o modo de agir dos elementos do grupo em questão.

Na investigação etnográ fica a técnica utilizada consiste, fundamentalmente, na observação


participante (na tradição da Antropologia), a qual implica trabalho de campo prolongado,
de modo ao investigador ficar imerso na cultura em estudo. Inicialmente utilizados pelos
antropólogos para estudar culturas de povos de economia recolectora e agro-pastoril, têm
vindo a ser posteriormente aplicados à compreensão de qualquer grupo humano, mesmo
vivendo em países de economia moderna. Estes estudos foram largamente aplicados
ao estudo de organiza ções, tendo em vista o seu desenvolvimento; em avaliação de
programas (porque os programas dão origem a culturas, tal como as organizações) e em
investiga ção educacional aplicada.

Iniciando o seu trabalho pela recolha de dados, através da observação participante, o


investigador recorrerá posteriormente a outras técnicas: entrevistas, questionários e
escalas de atitudes, análise documental, recolha de artefactos, gravações vídeo e áudio,
etc.

Tendo como ponto de partida um interesse pelo estudo de uma dada organizaçã o ou
grupo, vai recorrer inicialmente à observação, e progressivamente irá definindo com
maior rigor o problema de investiga ção e tomando decisões sobre os elementos da
organização que deverá preferencialmente observar e entrevistar. Após interagir com
estes elementos, poderá tomar outras decisões em relação à continua ção do estudo. O

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II. Aprofundamento Temático

investigador procura "imergir " na organizaçã o e tenta compreender os comportamentos


dos sujeitos, não através dos seus pontos de vista, mas do ponto de vista daqueles que
observa . Finalmente, a interpretação e aplicação dos resultados do seu estudo serão
realizadas numa perspetiva cultural.

A unidade de estudo num estudo etnográ fico é uma organiza ção, uma escola (ou uma
turma), um programa. O comportamento e as crenç as dos sujeitos que pertencem a
uma determinada organiza çã o serão melhor compreendidos no contexto da própria
organização.

Este tipo de estudos exige um período de tempo relativamente longo para a recolha de uma
grande variedade de dados, cuja interpretação, frequentemente, se reveste de dificuldades.
O investigador deverá possuir experiência não só como observador, mas também de análise
de dados; experiência que poderá ser garantia de maior objetividade e rigor na recolha
e interpretação dos dados. Quando bem conduzidos, os estudos etnográ ficos permitem
uma compreensão da cultura de uma dada organiza ção, da maneira como os seus
elementos interagem uns com os outros e da influência do contexto no comportamento
dos indivíduos, de uma forma que talvez nenhum outro estudo permita.

6. INVESTIGAÇÃO CORRELACIONAI.

O propósito de um estudo correlacionai consiste em averiguar se existe ou não relação


entre duas ou mais variáveis quantificáveis.

Variá veis cujo grau de correlação é forte podem estar na base de estudos causais-
comparativos, experimentais ou quase-experimentais, estudos esses conduzidos com
o objetivo de verificar se as relações existentes entre variáveis são de natureza causal.
Pode haver um grau de correlação forte entre duas variáveis sem que uma das variá veis
seja a "causa " da outra pois neste caso, será uma terceira variá vel a "causa " das duas
variá veis que apresentam um grau de correla ção forte. Por exemplo, se o investigador
chegar à conclusão que existe uma forte rela ção entre sucesso académico e autoestima,
isto não significa que a autoestima seja a "causa " do sucesso académico ou vice-versa,
mas poderá apenas significar que os bons alunos têm um grau de autoestima mais elevado
do que os maus alunos, os quais têm um grau de autoestima menos elevado. Ambas as
variáveis podem eventualmente ter como causa uma terceira variá vel, como por exemplo,
a estabilidade familiar.

A investigação correlacionai apenas estabelece que h á uma relação entre duas variá veis
mas não estabelece uma relação "causa -efeito ".

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II. Aprofundamento Temático

No entanto, o estabelecimento de uma correlação entre duas variáveis poderá ser utilizado
na previsão dos valores de uma delas a partir do conhecimento dos valores da outra.

Definição do problema - As relações entre variá veis que irão ser investigadas deverão
ser provenientes da teoria ou da experiência, supondo-se indutiva ou dedutivamente, que
existe uma relação entre elas. Dever-se-á, portanto, partir da formulação de uma hipótese
ou hipóteses de relação entre uma ou mais variá veis, relação que irá ser testada, pelo
que o estudo não deverá ser conduzido a partir de variá veis escolhidas ao acaso.

Amostra e seleçã o do instrumento - Usualmente é aceite que um estudo correlacionai


não deverá ser feito com um número de sujeitos inferior a 30.

Como em qualquer outra investigação, os dados recolhidos têm que ser precisos, daí
a importância do instrumento de recolha (testes ou questionários), pois caso os dados
referentes às variá veis não sejam corretos, as medidas de correlaçã o calculadas a partir
deles também o não serão. Deste modo, poder-se-á afirmar que existe uma correlação
(por exemplo moderadamente positiva) entre duas variáveis sem que na realidade a haja.
Os instrumentos têm que ser vá lidos para as medições relativas às variá veis em causa.

Recolha, aná lise e interpreta çã o dos dados - Como foi anteriormente referido,
recolhem-se dois ou mais conjuntos de dados referentes a cada um dos sujeitos previamente
selecionados por amostragem. De acordo com a natureza do estudo, recolhem-se dados
relativos a duas ou mais variáveis e podem utilizar-se cálculos estatísticos de complexidade
variá vel.

O grau de correlação entre duas variá veis é geralmente expresso como um coeficiente
cujo valor varia entre 0.00 e +1.00 ou -1.00. Duas variá veis que est ã o altamente
correlacionadas apresentam um coeficiente perto de + 1.00 ou de -1.00; no caso de não
estarem correlacionadas apresentam um coeficiente perto de 0.00.

A correlação pode ser classificada, quanto ao sentido, em positiva ou negativa. Uma


correlação positiva indica que os sujeitos que obtiveram valores altos numa das variá veis
também obtiveram valores altos na outra variá vel ou, inversamente, se obtiveram valores
baixos numa variá vel também obtiveram valores baixos na outra variá vel (e, neste caso,
a correlação também é positiva). Uma correlação positiva pode ser exemplificada através
da rela ção existente entre anos de escolaridade e vencimentos, pois em geral quanto mais
longa é a escolaridade maior é o valor dos vencimentos anuais auferidos por um indivíduo.
Uma correlação diz -se negativa quando os sujeitos obtêm valores altos numa variá vel e
valores baixos na outra variável. Um exemplo de correlação negativa é a relação entre o
nível socioeconómico de um agregado familiar (expresso em valor dos rendimentos anuais)
e o número de retenções de um aluno ao longo da escolaridade obrigató ria. Crianças

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II. Aprofundamento Temático

cujo agregado familiar é mais desfavorecido tendem a ter maior insucesso escolar, muitas
vezes traduzido por retenções; portanto, quanto menores são os vencimentos do agregado
familiar, maior é o número de retenções e ví ce-versa.

A correlação apresenta valores baixos quando não h á relação entre duas variáveis, como
por exemplo entre a altura do aluno e a aptidão para o desenho (o exemplo dado é
propositadamente muito evidente).

a b C

50 r = 0.80 50
_ r = -0.20
40 . 40 -
i
. '

Y 30
20
Y 30
20
_ •

10 10 * . V
•1
1 1 1 1 1 i i i i j_ - i
a

10 20 30 40 50 10 20 30 40 50
X X X

Fig. 9.1 - Diagramas de dispersão

Uma correlação positiva ou negativa representa um tipo de rela ção linear.

Na fig. 9.1 estão representados diagramas de dispersão (a) e (b), que são representações
gráficas da relação entre variá veis. A totalidade dos pontos destes diagramas resulta do
"cruzamento" dos valores assumidos pelas variáveis relativamente a cada um dos sujeitos.
Nos dois diagramas os pontos aglomeram-se em torno de uma linha reta imaginária,
tratando-se no diagrama (a) de uma correlação linear positiva forte e no diagrama (b)
de uma correla ção linear negativa fraca.

Existem, no entanto, correlações que não são lineares mas curvilíneas e que indicam
que uma variável aumenta à medida que a outra aumenta também, até que ocorre uma
"reversão ", e a partir daí, uma das variáveis começa a diminuir, enquanto a outra continua
a aumentar, como é o caso do diagrama de dispersã o (c) da fig. 9.1. Um exemplo de
uma correlação curvilínea é a existente entre a velocidade de corrida e a idade. Com o
aumento da idade aumenta a velocidade de corrida até uma determinada idade (20, 21,
22 ... anos) em que se atinge o má ximo de velocidade e depois dá -se a "reversão" e a
velocidade de corrida passa a diminuir à medida que a idade aumenta.

Levin (1987) em relaçã o à correlação linear classifica a força e o sentido da correlação


de acordo com os coeficientes de correlaçã o linear, seguintes:

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II. Aprofundamento Temático

-1.00 Correlaçã o negativa perfeita


-0.95 Correlaçã o negativa forte
-0.50 Correlaçã o negativa moderada
-0.10 Correlaçã o negativa fraca
0.00 Ausência de correlaçã o
+0.10 Correlação positiva fraca
+0.50 Correlação positiva moderada
+0.95 Correlação positiva forte
+1.00 Correlação positiva perfeita
Observa-se, pois, que em termos de grau de associação, quanto mais próximo de 1.00
em ambos os sentidos, maior a força de correla ção. Como a forç a é independente do seu
sentido, poder-se-á dizer que - 0.50 e +0.50 são idênticos quanto à força, pois são ambos
moderados, embora de sentidos diferentes (negativo e positivo), respetivamente.

A interpretação de um coeficiente de correlação depende da forma com vai ser utilizado,


ou seja, qual o valor necessário para ser útil para um determinado estudo. Num estudo
cujo propósito consiste em explorar ou testar hipóteses sobre rela ções entre variáveis,
um coeficiente de correlação será interpretado em termos da sua significâ ncia estatística.
Diz -se que há significância estatística quando um determinado coeficiente de correlação é
realmente diferente de zero e reflete uma verdadeira relação, não uma relação unicamente
devida ao acaso; a significância é definida para um dado nível de confianç a (também
chamado nível de significância), nível esse que representa a probabilidade com que a
hipótese experimental possa ser rejeitada ou aceite com confiança. Para determinar a
significância estatística, é necessário consultar uma tabela que indica qual o valor que deve
assumir o coeficiente para ser significante para um determinado grau de probabilidade e de
dimensão da amostra. Para o mesmo grau de probabilidade, ou nível de signific ância, são
necessários coeficientes mais elevados para pequenas amostras. É evidente que o problema
não se põe da mesma maneira se estivermos a estudar a totalidade dos elementos de
uma população, em que o valor da correlação representa o grau de associação entre as
variáveis consideradas, seja ele alto ou baixo. O problema do nível de signific ância põe-se,
portanto, relativamente a amostras. É, no entanto, necessário não confundir significância
com força de associação. Seja qual for o nível de significância, um coeficiente de correlação
baixo representa uma fraca associaçã o entre variáveis. O nível de significância apenas
indica a probabilidade de uma dada correlaçã o ser verdadeira, seja esta forte ou fraca.
Existem diferentes coeficientes de correlaçã o que são utilizados de acordo com o tipo
de variáveis em estudo. Dado estar fora do âmbito deste trabalho a apresentação das
características e do modo de calcular esses diferentes coeficientes, remete-se o leitor
para a consulta de uma obra de Estatística aplicada às Ciências 5ociais.

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II. Aprofundamento Temático

No que diz respeito a fazer previsões, apesar de se ter determinado que existe um nível
de significance aceitá vel, isto não basta. Se o coeficiente de correlaçã o for muito baixo,
este não permite fazer previsões. Isto é, se foi calculado o coeficiente de correlação
entre duas variáveis e se relativamente a um sujeito do qual conhecemos o valor de uma
das variáveis queremos prever qual o valor que assume a outra variável, tal não será
possível. Um coeficiente de correlação abaixo de 0.50 não é suficiente para a previsão de
resultados de um grupo de sujeitos ou de um sujeito, no entanto a combinação de variá veis
pode permitir fazer previsões satisfatórias com valores abaixo de 0.50. Coeficientes de
correlação de 0.60 ou 0.70 são geralmente considerados adequados para previsões que
dizem respeito a um grupo de sujeitos, e coeficientes superiores a 0.80 para a previsão
de valores que digam respeito a sujeitos individuais.

O estabelecimento de uma correlação entre duas variáveis pode, portanto, ter utilidade
na previsão do valor de uma delas a partir do conhecimento dos valores da outra. A
técnica empregada em tais previsões é conhecida por análise de regressão . Dada a
sua apresentação estar igualmente fora do âmbito deste trabalho, remete-se mais uma
vez o leitor para a consulta de uma obra de Estatística aplicada às Ciências Sociais.

7. INVESTIGAÇÃO EXPERIMENTAL

O objetivo da investigação experimental é o estabelecimento de relações causa-efeito.


Usualmente o método experimental é descrito como aquele que é conduzido para rejeitar
ou aceitar hipóteses relativas a relações causa-efeito entre variáveis.

No final desta secção o leitor encontra uma descrição das variáveis que usualmente são
consideradas em investigação experimental.

Num estudo experimental, o investigador manipula pelo menos uma variá vel
independente, controla outras variá veis consideradas relevantes e observa o efeito
numa ou mais variá veis dependentes (a variável independente é também designada por
tratamento). A manipulaçã o da variá vel independente é a característica que diferencia
a investiga ção experimental das outras investigações. Como exemplos de variá veis
independentes podem referir-se: a adoçã o de um novo programa de aprendizagem,
a introduçã o de um novo sistema informático ou a introdução de uma nova máquina
numa unidade de produção. A variável dependente é a mudança ou diferença resultante
da manipula ção da variá vel independente. É designada por variá vel dependente pois
"depende” da variável independente. A variá vel dependente deverá poder ser medida.
Relativamente aos exemplos anteriormente indicados, poder-se-á medir, através da
administraçã o de um teste, a eficácia de um novo programa de aprendizagem; poder-se-á

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II. Aprofundamento Temático

calcular a redução do número de horas para executar uma tarefa administrativa devido à
introdução de um novo sistema informático; e poder-se-á calcular o aumento de produção
originado pela introdução de uma nova máquina numa unidade de produção.

As etapas da investiga çã o experimental sã o basicamente as mesmas das outras


investigações: definição de um problema, seleçã o de sujeitos e de instrumentos de
medida, escolha de um plano experimental, execução dos procedimentos, análise dos
dados recolhidos e formulaçã o das conclusões. A experimentação é conduzida de forma a
verificar uma hipótese ou hipóteses previamente definidas, que serã o verificadas (aceites
ou rejeitadas) de acordo com os resultados obtidos.

Um plano experimental normalmente compreende dois grupos, o grupo experimental


e o grupo de controlo (no entanto poderá haver um só grupo, ou três ou mais
grupos). Ao grupo experimental será administrado o tratamento cujos efeitos se quer
medir, enquanto ao grupo de controlo não será administrado nenhum novo tratamento
e mantem-se como até aí; ou ao grupo experimental será administrado um tratamento
e ao grupo de controlo um tratamento diferente. (Por exemplo, enquanto o grupo de
controlo adotará o novo programa de aprendizagem cuja eficácia se quer medir, o grupo
de controlo continuará com o antigo programa ou cada um dos grupos experimentará
um programa diferente). O grupo de controlo é necessário para comparar a efic ácia do
tratamento introduzido no grupo experimental relativamente à situação anterior ou para
verificar, no caso de serem introduzidos dois tratamentos diferentes, se um tratamento
é mais eficaz do que o outro.

Para que seja possível verificar qual o efeito da variável independente sobre a variá vel
dependente é necessário fazer o controlo de outras variáveis, ou seja, o investigador deverá
assegurar-se que os dois grupos são tão equivalentes quanto possível no que respeita a
todas as outras variáveis, exceto quanto à variá vel independente. O controlo de variáveis é
fundamental para que no final do estudo se possa afirmar que a diferença que se verificou
entre o grupo experimental e o grupo de controlo (no caso de essa diferenç a se verificar)
foi devida à manipula ção da variável independente. (Por exemplo, a maior eficácia da
aprendizagem, traduzida pelos melhores resultados obtidos pelo grupo experimental,
teria sido devida à adoção do novo programa) . No entanto, em estudos experimentais
conduzidos no âmbito das Ciências Sociais, apesar de existirem diversas técnicas para se
proceder ao controlo de variá veis, atendendo ao facto da experimentaçã o ser conduzida
em seres humanos, esse controlo reveste-se de grandes dificuldades.

O controlo é necessário não só para que se possa afirmar que as diferenças observadas
na variá vel dependente sã o unicamente devidas à manipulaçã o da variável independente,

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II. Aprofundamento Temático

ou seja para assegurar que a investigação tenha validade interna, mas também para
que seja possível generalizar ou aplicar os resultados obtidos num dado contexto, a outros
contextos, ou seja para que se possa garantir que tenha também validade externa .

No caso da investigação ter validade interna e externa, poder-se-á esperar que os


resultados do estudo, a relaçã o causa -efeito, possam ser confirmadas noutros grupos,
noutros contextos, noutras ocasiões, desde que as condições sejam similares àquelas em
que o estudo tinha sido conduzido.

No entanto, um problema subsiste, o de maximizar a validade interna sem que seja posta
em causa a validade externa, pois se efetuarmos um controlo muito rígido sobre os sujeitos
de investiga ção e sobre as condições experimentais, a situação experimental afasta-se
da realidade e os resultados não se tornam generalizáveis para além do contexto onde
se realizou a experimentaçã o. Mas, por outro lado, é difícil conduzir uma experimentação
e controlar variá veis em condições reais. O investigador terá que escolher entre um
controlo muito rigoroso das condições experimentais ou conduzir a experimentação em
condições reais, podendo neste último caso surgirem amea ças à validade interna da
experimentação.

O trabalho de Donald T. Campbell e Julian C. Stanley (1963) sobre a utilização do método


experimental em Ciências Sociais é considerado um dos mais completos e organizados. O
primeiro dos autores Donald T. Campbell, associado a T. D. Cook, escreveu outro trabalho
em 1976, no qual reformulou e alargou o tema, nomeadamente em relação aos métodos
quase-experimentais. A terminologia, notação e conceitos básicos utilizados por estes
autores têm hoje uma aceitação generalizada. Um dos aspetos sistematizados por estes
autores diz respeito às ameaças à validade em estudos experimentais.

Amea ças à validade interna


Campbell e Stanley identificaram oito principais ameaças à validade interna:

História - refere-se à ocorrência de um acontecimento estranho ao estudo


experimental mas que pode afetar o efeito que se observa na variável dependente.
Tome-se como exemplo: realizou-se uma experimenta çã o com jovens num
bairro onde se tinham vindo a verificar frequentes confrontos entre elementos
pertencentes a diferentes grupos étnicos, com a finalidade de promover a
tolerância e melhorar as relações entre eles. Durante o período em que estava
a decorrer a experimentação, surgiu no mesmo bairro um grave problema entre
adultos pertencentes a dois grupos étnicos diferentes. Este acontecimento
refletiu-se obviamente nos efeitos do programa.
No entanto, embora o experimentador possa nã o ter a possibilidade de controlar

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II. Aprofundamento Temático

os acontecimentos estranhos ao estudo, pode selecionar um plano que permita


neutralizar os seus efeitos.

Maturação - diz respeito à s modifica ções físicas ou mentais que ocorrem nos
sujeitos durante o período da experimentação, especialmente quando esta se
prolonga por vários meses. Isto é particularmente importante com crianças e
jovens ( dependendo no entanto, também da natureza do estudo a realizar) e
com adultos sujeitos a efeitos de socialização organizacional.
Tal como no caso anterior, embora o experimentador não tenha controlo sobre a
maturação, pode selecionar um plano que permita neutralizar os seus efeitos.

Testagem - ocorre quando se administra aos sujeitos o mesmo teste, em


geral antes e depois de levar a cabo a experimentação (pré-teste e pós- teste).
A melhoria dos resultados que se verifica no pós-teste em relação ao pré-teste
poderá, em parte, ser devida ao facto dos sujeitos repetirem o mesmo teste.
Este problema surge principalmente quando o período que medeia entre a
administração do pré-teste e do pós-teste é curto. No entanto, este efeito pode
variar segundo o estudo realizado, por exemplo, a sua importância pode ser
grande no caso do pré- teste e do pós-teste incluírem essencialmente informação
factual.
Poder-se-á, como veremos, não administrar um pré-teste ou elaborar um pré-
-teste diferente do pós-teste. De qualquer modo, são problemas que deverão
ser ponderados ao elaborar o plano de experimentação.

Instrumentação - resulta da administração de testes que não são fiá veis, que
dão resultados diferentes em diferentes aplicações, de pré-testes e pós-testes
de diferente dificuldade ou de observações que nã o sã o sistematicamente feitas
da mesma maneira ao longo da experimentação.

Regressã o estatí stica - refere-se ao facto de serem selecionados para um


estudo experimental sujeitos que obtêm classificações (scores) extremas no
pré-teste, quer sejam sujeitos que obtiveram classificações muito altas ou muito
baixas, pois os sujeitos cujas classificações foram muito altas no pré-teste tendem
a ter classificações mais baixas no pós-teste e vice-versa ( sujeitos que obtêm
classifica ções muito baixas no pré-teste tendem a ter classifica ções mais altas
no pós- teste). Em resumo, sujeitos que obtêm resultados extremos no pré-teste,
têm tendência a regredir para a média no pós-teste.

Seleçã o - ocorre quando se selecionam grupos já anteriormente constituídos


para grupo experimental e grupo de controlo, grupos que já eram diferentes.

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II. Aprofundamento Temático

Esta diferenç a inicial pode ter influência nos resultados do pós-teste. Caso seja
necessário escolher grupos já anteriormente formados, devem selecionar-se
grupos o mais idênticos possível e administrar um pré-teste para que na análise
dos resultados venham a ser tidas em conta as diferenç as iniciais entre esses
grupos.

Mortalidade - diz respeito a determinados sujeitos abandonarem o estudo


durante o seu decurso, sujeitos que tinham determinadas características e cuja
saída de um dos grupos vai afetar os resultados. Mais uma vez o experimentador
deverá ter em conta esta possibilidade, e se considerar que é importante para o
estudo em causa, deverá adotar um plano experimental adequado, que permita
neutralizar os seus efeitos.

Intera ções com a seleção (intera ção sele çã o- matura çã o, interação


seleçã o- história, intera ção seleçã o- testagem ) - A mais comum é a
intera ção seleção - maturação. Quando se utilizam grupos já formados, um
grupo pode ter sujeitos de diferente maturidade relativamente ao outro, o que
vai produzir efeitos espúrios nos resultados da experimentação. Mais uma vez o
experimentador deverá ter o cuidado de formar grupos equivalentes ou escolher
um plano que permita neutralizar para a ocorrência desta ameaça.

Na investigação experimental a seleção aleatória dos sujeitos que irão constituir o


grupo experimental e o grupo de controlo permite neutralizar a maior parte das ameaças
à validade interna.

Quando se trata de estudos quase- experimentais, em que a experimentação é feita


utilizando grupos já constituídos anteriormente, o investigador tem que controlar uma a
uma as amea ças à validade interna.

Amea ças à validade externa


Há várias ameaç as à validade externa que podem pôr em causa a generalização dos
resultados obtidos na experimentação à população em causa e da qual tinham sido
extraídos os sujeitos que constituem o grupo experimental e o grupo de controlo.

Efeito da interação da testagem (interação pré- teste tratamento ) - esta interação


ocorre quando os sujeitos reagem diferentemente a um tratamento, por lhes ter sido
administrado um pré-teste que os sensibilizou ou alertou para a natureza do tratamento.
Neste caso, os resultados poderiam ter sido diferentes se os indivíduos não fossem sujeitos
a um pré- teste. Deste modo, os resultados n ã o podem ser generalizados à populaçã o.

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II. Aprofundamento Temático

Este pode ser um problema grave, dependendo dos sujeitos, da natureza dos testes, da
natureza do tratamento e da duraçã o do estudo. Estudos que envolvam mudanças de
atitude são muito sensíveis a esta ameaça, outros não o são tanto. Crianças podem não
ter a perceção da relação entre o pré-teste e o tratamento. Se o pré-teste for administrado
algum tempo antes de começar o tratamento, os seus efeitos podem ser atenuados. No
caso de se prever que o pré-teste possa ter efeitos importantes nos resultados do estudo,
o experimentador deverá selecionar um plano que permita neutralizar a sua ocorrência
ou determinar a sua importância.

Intera çã o seleção- tratamento - é semelhante à ameaça à validade interna que


designámos por seleção e surge quando os indivíduos não são selecionados aleatoriamente.
O facto de os indivíduos não serem selecionados aleatoriamente limita a possibilidade de
generalização dos resultados, porque está em causa a representatividade da amostra.
Mesmo que os grupos experimental e de controlo sejam selecionados aleatoriamente,
existe a possibilidade do grupo experimental ser diferente do grupo de controlo. A não
representatividade dos grupos pode resultar numa interaçã o seleção-tratamento, de
tal maneira que os resultados do estudo só digam respeito aos grupos envolvidos na
experimentação e não possam ser generalizáveis à população. O investigador deverá fazer
uma descriçã o o mais rigorosa possível da forma como procedeu à seleção dos sujeitos
de investigação, para que o eventual leitor do relatório de investigação possa ajuizar da
importância da ameaça interação seleção-tratamento.

Especificidade das variá veis - diz respeito ao aspeto já anteriormente referido de


um estudo experimental estudar um problema muito específico, utilizando instrumentos
de medida muito específicos, num período de tempo muito específico, sob condições
igualmente muito específicas. Esta especificidade põe também em causa a possibilidade
de generaliza ção dos resultados.

Efeitos reativos dos arranjos experimentais - Com a preocupa ção de fazer


um controlo muito rigoroso das variá veis, o experimentador pode criar um ambiente
experimental altamente artificial, o que põe em causa a generaliza ção dos resultados
para outros ambientes não experimentais.

O facto dos sujeitos de investigação terem conhecimento de que fazem parte de um grupo
experimental também pode afetar os resultados do estudo, pois o comportamento do
grupo experimental modifica -se não só devido ao tratamento, também ao facto de terem

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II. Aprofundamento Temático

conhecimento de que fazem parte de um grupo experimental5.

Outro problema está relacionado com a novidade, pois o grupo experimental pode obter
melhores resultados porque está a utilizar algo de novo. O facto de ser uma novidade
aumenta a motivação e portanto a participa ção e o tratamento pode nã o ser mais eficaz
em si mesmo. Para obviar este efeito o experimentador deverá prolongar a experiência
até que se atenue o efeito de novidade6.

Interferência dos tratamentos múltiplos - resulta da aplicação de vários tratamentos


aos mesmos sujeitos dado não ser fácil eliminar os efeitos de tratamentos anteriores.

Para minimizar a interferência de tratamentos sucessivos, caso não seja possível fazer
uma experimentação com um único tratamento, o investigador deverá deixar mediar
um período de tempo considerado adequado entre tratamentos sucessivos e investigar
diferentes tipos de variá veis independentes.

Controlo de variáveis - Para eliminar as ameaç as à validade de um estudo experimental


é necessário fazer o controlo de variáveis. Podem utilizar-se diferentes procedimentos
para realizar esse controlo, dos quais se mencionam seguidamente alguns:
a) Seleção aleatória dos sujeitos ( vide unidade 8). Sempre que possível é conveniente
não só proceder à seleção aleatória dos sujeitos que vã o colaborar na experiência,

5
Este efeito é usualmente designado por efeito Hawthorne ou Mayo, visto ter sido posto em
evidência numa experiência levada a cabo na Fábrica Hawthorne da Western Electric Company
em Chicago, por Elton Mayo. Os operá rios tinham conhecimento de que estavam a colaborar
numa experiência, mas não do seu teor. A experiência consistia em averiguar de que maneira
a intensidade de iluminação poderia afetar a produção. Os investigadores aumentaram a
intensidade da iluminação e a produção aumentou, seguidamente aumentaram ainda mais a
intensidade da iluminação e a produção tornou a aumentar, finalmente diminuíram a intensidade
da iluminação e a produção continuou ainda a aumentar !
6
Existem ainda outros efeitos que poderão afetar os resultados da experimentação:
Contamina ção e efeito de halo:
Designa -se por contamina ção o facto da familiaridade do investigador com os sujeitos de
investigação poder vir a afetar os resultados da experimentação; o investigador pode exercer
influência no seu comportamento ou ser subjetivo na avaliação desse mesmo comportamento.
O efeito de halo diz respeito a ser valorizado o comportamento de um sujeito que previamente
tinha tido um comportamento muito bom ou excelente. Se o investigador conhece os membros
de um grupo pode tender a ser enviesado na aná lise dos resultados desse grupo .
O problema da objetividade põe-se em qualquer tipo de investigação e portanto o investigador
deve, por um lado, evitar situações que a possam pôr em causa e, por outro lado, não deverá
comunicar ao grupo experimental que as suas expectativas são as de que este obtenha melhores
resultados do que o grupo de controlo.

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II. Aprofundamento Temático

como selecionar aleatoriamente dentre eles os sujeitos que fazem parte do grupo
experimental e do grupo de controlo. A escolha aleatória dos sujeitos de investigação
é a maneira de criar grupos equivalentes e representativos da população estudada.
Se for verificado no final do estudo que os grupos têm resultados diferentes, esta
diferença poderá ser atribuída ao tratamento, ou seja, à variável independente.
Quanto maiores forem os grupos maior será a confiança que se poderá ter nos
resultados obtidos. (Num estudo experimental, 15 sujeitos por grupo é o número
mínimo considerado aceitável para o realizar).

b) Algumas variáveis podem ser controladas, fazendo com que existam em iguais
condições nos dois grupos, tais como: anos de experiência de exercício de uma
dada profissão, habilitações académicas ou profissionais. Por exemplo, todos os
sujeitos possuírem o mesmo número de anos de experiência e a mesma formação
profissional. Metade dos sujeitos deverá fazer parte do grupo experimental e a
outra metade do grupo de controlo (a divisã o dos sujeitos pelos dois grupos deverá
ser feita aleatoriamente). No entanto, esta técnica poderá levantar problemas em
relação à generaliza ção dos resultados, nomeadamente, porque se restringiu a
variabilidade dos sujeitos.
Poder-se-á, ainda, formar grupos que apresentem todos os níveis da variá vel ou
variáveis em estudo, por exemplo, diferente número de anos de experiência na
profissão ou forma ção profissional.
Proceder a uma amostragem estratificada constituirá, do mesmo modo, uma técnica
adequada, caso o investigador queira averiguar se a variável independente afeta a
variável dependente a vários níveis da variável de controlo.

c) Emparelhamento - Poder-se-á utilizar uma técnica que permita tornar os grupos


equivalentes no que diz respeito a uma ou mais variá veis consideradas como tendo
influência nos resultados. Deste modo, se for considerado que a variável anos de
experiência na profissão deverá ser controlada, dever-se-á atribuir a cada grupo
de investigaçã o sujeitos em condições semelhantes. Suponhamos que os sujeitos
apresentam diferenças no que diz respeito a anos de exercício de uma determinada
profissão, por exemplo, quatro sujeitos têm oito anos de experiência, dois sete anos
de experiência, um seis anos de experiência, etc. Dos quatro sujeitos com 8 anos
de experiência, dois farão parte do grupo experimental e os outros dois do grupo
de controlo (a atribuição a cada um dos grupos deverá ser feita aleatoriamente);
dos dois sujeitos com 7 anos de experiência, um fará parte do grupo experimental
e o outro do grupo de controlo; se só há um sujeito com 6 anos de experiência
dever-se-á procurar outro com o mesmo número de anos de experiência e se tal
nã o for possível, este não deverá participar na experiência. O processo poderá ser

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II. Aprofundamento Temático

mais complicado se tivermos que ter em conta várias variáveis simultaneamente,


por exemplo poderemos querer controlar as variáveis sexo, formação profissional
e anos de experiência . Se um dos sujeitos for do sexo masculino, possuir uma
licenciatura em engenharia química e sete anos de experiência na profissão, ter-se-á
que encontrar outro com as mesmas características, caso contrário terá que ser
eliminado do estudo. Os inconvenientes desta técnica é que deste modo poder-se-
-ão eliminar muitos sujeitos.
c) Administrar sucessivamente o mesmo tratamento aos dois grupos. Este processo
poderá contribuir para eliminar diferenças entre grupos, pois os mesmos sujeitos
são submetidos a ambos os tratamentos. É evidente que em muitos casos tal não
é possível.

d) A análise de covariância (vide uma obra de Estatística aplicada às Ciências Sociais)


permite tornar equivalentes, em relação a uma ou mais variá veis, grupos constituídos
por seleção aleatória. Poderá também ser utilizada para grupos que não tenham
sido constituídos aleatoriamente, mas é mais adequada aos primeiros. Tome-se um
exemplo da utilizaçã o da análise de covariância: apesar de se terem constituído
dois grupos por amostragem aleatória, estes apresentam diferenças significativas
no pré-teste; a análise de covariância irá permitir ajustar ("corrigir ") os resultados
do pós-teste em relação a diferenças iniciais no pré-teste.

Planos experimentais - A escolha de um plano experimental adequado ao estudo


é muito importante e depende nã o só das hipóteses que v ão ser testadas como das
condições de que o investigador dispõe.

Há dois tipos fundamentais de planos experimentais: planos com uma só variá vel, que
compreendem uma só variável independente, a qual é manipulada, e planos fatoriais,
os quais compreendem duas ou mais variá veis independentes, das quais pelo menos
uma é manipulada.2

Os planos com uma só variá vel podem ser pré-experimentais, experimentais


puros ou quase- experimentais, dependendo do controlo que se faz às ameaças à
validade interna e à validade externa .

Nos planos pré- experimentais não há um controlo adequado das ameaças à validade
interna e externa. Estes planos só têm utilidade para uma investigação preliminar de um
problema, para sugerir hipóteses.

7
Existem ainda pianos experimentais com um só sujeito cujo estudo nã o se enquadra no âmbito deste
trabalho.

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II. Aprofundamento Temático

Nos planos experimentais puros há um controlo adequado de variáveis. Em qualquer


destes planos não só a seleção dos sujeitos é sempre aleatória, como há pelo menos um
grupo de controlo.

Sempre que for possível dever-se-á utilizar um destes planos.

Nos planos quase- experimentais n ão h á seleçã o aleatória de sujeitos, o que levanta


problemas relativos ao controlo de variá veis que podem constituir ameaç as à validade
interna . No entanto, quando só é possível utilizar este tipo de planos, é preferível fazê- lo
a renunciar à realização da experimentação ou a empregar planos pré-experimentais.

Os planos fatoriais sã o elabora ções dos planos experimentais puros e permitem


investigar uma ou mais variáveis, individualmente ou em interação umas com as outras.
Após uma variável ter sido estudada utilizando um plano com uma só variável, torna-se
muitas vezes útil estudá-la em combinação com uma ou mais variá veis. Dados estes
planos compreenderem uma ou mais variáveis, há um número quase infinito de planos
fatoriais.

Neste Manual não serão analisados os planos pré-experimentais dado o seu muito reduzido
interesse.

Para proceder à análise dos diferentes planos utilizar-se-á a nomenclatura de Campbell


e Stanley (1963), que propositadamente foi simplificada para tornar a sua compreensão
mais fácil.

Assim, designar-se-á por:


A - a seleção aleatória dos sujeitos
O - uma observaçã o (pré-teste ou pós- teste)
X - o tratamento; XI, X2, X 3 referem-se a tratamentos diferentes

Planos experimentais puros

(1) Plano pré-teste- pós- teste e grupo de controlo


A O X O grupo experimental
AO O grupo de controlo

Este plano tem as seguintes características :

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II. Aprofundamento Temático

• Os sujeitos são selecionados e distribuídos aleatoriamente por um grupo


experimental e por um grupo de controlo;8

•A ambos os grupos é administrado um pré- teste em relação à variável


dependente;

• 0 grupo experimental é sujeito a um tratamento novo ou não tradicional;


• A ambos os grupos é administrado um pós-teste.
Os resultados do pós-teste dos dois grupos são comparados para determinar a efic ácia
do tratamento. O pré-teste é utilizado para verificar se os grupos são equivalentes em
relação à variá vel dependente. Se são equivalentes, os resultados do pós-teste podem
ser diretamente comparados usando um teste t, se o não são, os resultados do pós-teste
podem ser analisados mediante a análise de covariância.

Controlo das ameaças:


Ameaças à validade interna:

A combinação da seleção aleatória dos sujeitos e a existência de um pré-teste e


de um grupo de controlo permite controlar todas as ameaças à validade interna.
A seleção aleatória dos sujeitos permite controlar a regressão e a seleção; o
pré-teste a mortalidade; a seleção aleatória dos sujeitos e o grupo de controlo
a maturaçã o; o grupo de controlo a história, a testagem e a instrumentação.

Ameaças à validade externa:

A única amea ça a este plano e que pode afetar a generalizaçã o dos resultados,
é a possível intera ção entre o pré-teste e o tratamento, a qual poderá ter como
consequência que os resultados só sejam generaliz á veis a outros grupos a
quem seja igualmente administrado o pré-teste. O investigador deverá referir
no relatório de investigação que a interação entre o pré-teste e o tratamento
poderá constituir uma possível amea ça à validade externa.

6
Este plano poderá ser alargado para mais de dois grupos, ou seja , em vez de ter unicamente
um grupo experimental e um grupo de controlo, poderá ter trê s ou mais grupos.
Para três grupos, por exemplo, poderia apresentar uma das seguintes formas:
a) A O Xj O b) A O X, O

A O X2 O A O X2 O
AO O A O X3 0
Em a) a dois grupos experimentais são administrados dois novos tratamentos diferentes um do
outro, enquanto ao grupo de controlo não é administrado nenhum tratamento novo.
Em b) é administrado um tratamento diferente a cada um dos trê s grupos.

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II. Aprofundamento Temático

2 ) Plano pós- teste e grupo de controlo


AX 0
A 0

Este plano tem as seguintes características:


• Os sujeitos são selecionados e distribuídos aleatoriamente por um grupo
experimental e por um grupo de controlo3;

• 0 grupo experimental é sujeito a um tratamento novo ou não tradicional;


• A ambos os grupos é administrado um pós-teste.

Os resultados do pós-teste dos dois grupos podem ser comparados usando um teste t
para determinar a eficácia do tratamento.

Controlo das ameaças:


Ameaças à validade interna:

A combina ção da seleção aleatória dos sujeitos e a existência de um grupo de


controlo permite controlar todas as ameaças à validade interna com exceção
da mortalidade. A mortalidade nã o é controlada devido à inexistência de um
pré-teste. A mortalidade pode ou não constituir um problema de acordo com o
estudo, mas particularmente, se é de curta dura ção pode nã o haver mortalidade.
A inexistência de um pré-teste pode não constituir um problema se os dois
grupos forem inicialmente equivalentes relativamente à variá vel dependente
(por exemplo, nã o possuíam qualquer conhecimento relacionado com esta
variável).

Ameaças à validade externa:

Dado não haver pré-teste, nã o existe a ameaça (anteriormente referida para o


plano pré-teste-pós-teste e grupo de controlo) de uma possível interação entre
o pré- teste e o tratamento.

3 ) Plano Solomon de quatro grupos


A O XO
A O O
A XO
A O

9
Este plano poderá igualmente ser alargado para mais de dois grupos, isto é, em vez de ter
unicamente um grupo experimental e um grupo de controlo, poderá ter três ou mais grupos.

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II. Aprofundamento Temático

Este plano tem as seguintes características :


• Os sujeitos são selecionados e distribuídos aleatoriamente por quatro grupos;
A dois dos grupos é administrado um pré-teste em rela ção à variável dependente
e aos outros dois grupos não;

• Dois grupos, um ao qual tinha sido administrado o pré-teste e outro ao qual


não tinha sido aplicado pré- teste, são sujeitos a um tratamento novo ou não
tradicional;

* Aos quatro grupos é administrado um pós-teste.

Este plano é uma combinação dos dois planos anteriores.

A análise dos resultados deverá ser feita mediante uma análise de variância 2x2 dos
resultados do pós-teste. Esta análise permite saber se o tratamento foi efetivo e se
houve interação entre o tratamento e o pré- teste. No caso de não ter havido interação,
os resultados obtidos poder ã o generalizar-se com maior confiança à população em
estudo.

Controlo das ameaças:


Ameaças à validade interna e à validade externa :

Como este plano é uma combina ção dos dois planos anteriores, o resultado é
um plano que controla as duas ameaç as referidas para os planos anteriores;
interação pré- teste-tratamento e mortalidade.

Apesar das vantagens que este plano apresenta, ele exige um maior número
de sujeitos de investigaçã o. A escolha do plano deverá ser feita de acordo com
a natureza do estudo que se pretende realizar e as condições em que vai ser
feito. Deste modo, para muitos estudos um dos planos anteriores poderá ser
igualmente adequado.

Planos quase- experimentais - Por vezes não é possível proceder à seleção aleatória
dos sujeitos (por exemplo, quando se tratam de turmas de alunos que já estavam
constituídas), o que levanta problemas relativa mente ao controlo das ameaças à validade
interna. Campbell e Stanley (1963) apresentam vários planos, dos quais descreveremos
três. (Vide também o trabalho de Campbell e Cook, 1979)

(1) Plano com grupo de controlo não equivalente


0 X 0
o o

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II. Aprofundamento Temático

Este plano é semelhante ao plano pré-teste - pós-teste e grupo de controlo e tem as


seguintes características:
• Um grupo experimental e um grupo de controlo, ambos submetidos a um pré-
-teste e a um pós-teste;

• Não há seleção aleatória dos sujeitos de investigação e portanto os grupos não


são equivalentes.

Depois de escolhidos os grupos, dever-se-á, sempre que for possível, atribuir aleatoriamente
o tratamento novo ou não tradicional a um dos grupos10.

Ameaças à validade interna:

Dado não haver seleção aleatória dos sujeitos de investigação, podem surgir
ameaças à validade interna da investigação, regressão e interação entre seleção e
variá veis como a maturação, história e testagem. O investigador deverá procurar
controlar estas ameaças escolhendo grupos o mais semelhantes possível.

Amea ças à validade externa:

No que se refere à validade externa, as ameaç as sã o idênticas aos do plano


experimental puro plano pré-teste - pós- teste e grupo de controlo, ou seja,
a possível interação entre o pré-teste e o tratamento, o qual pode ter como
consequência que os resultados só possam ser generalizá veis a outros grupos
a quem tenha sido igualmente administrado o pré-teste e n ão à totalidade da
popula ção. O investigador deverá referir no relatório de investigação que a
interação entre o pré-teste e o tratamento poderá constituir uma possível ameaça
à validade externa.

( 2) Séries temporais interrompidas


0 0 0 0 X 0 0 0 0

As caraterísticas deste plano são as seguintes :


• Existe apenas um grupo experimental ao qual são repetidamente aplicados
pré- testes, seguidamente é sujeito a um tratamento e por fim é submetido
repetidamente a pós-testes.

10
Da mesma maneira que para o plano pré-teste - pós-teste e grupo de controlo, este piano
.
poderá ser alargado para mais de dois grupos A cada um dos grupos pode ser aplicado um
tratamento, diferente, podendo não ser administrado um tratamento novo a um dos grupos.

© Universidade Aberta 209


II. Aprofundamento Temático

Se um grupo experimental que obtém várias vezes resultados semelhantes em pré- testes,
for sujeito a um tratamento e posteriormente obtiver repetidas vezes em pós-testes
melhores resultados do que nos pré-testes, o investigador poderá atribuir com maior
confiança a mudança verificada ao tratamento que tinha sido aplicado do que se a esse
mesmo grupo tivesse sido apenas aplicado um pré-teste e um pós- teste. A análise dos
resultados decorrentes da aplicação deste plano exige estatísticas avançadas.

Ameaças à validade interna:

A história pode constituir um problema com este plano, dado o per


íodo de tempo
que medeia entre o primeiro pré-teste e o último pós-teste e um acontecimento
durante a experimentação poder-se-á confundir, nalguns casos, com o efeito do
tratamento. Instrumenta ção, especialmente no caso de o investigador alterar
os instrumentos durante a experimentação, poderá igualmente constituir uma
ameaça. A intera ção do pré-teste com o tratamento pode também constituir um
problema em relação à validade interna.

Ameaças à validade externa:

O efeito experimental pode ser específico do grupo observado, havendo portanto


problemas relacionados com a generalizaçã o dos resultados à população.11

(3 ) Plano contrabalançado
Este plano tem as seguintes características:
x1 o x2 o x3 o
x3 o o x2 o
X2 0 X3 O X1 o

Todos os grupos recebem os mesmos tratamentos mas numa ordem diferente.

0 número de grupos deverá ser igual ao número de tratamentos. A ordem segundo a


qual os grupos recebem os tratamentos é definida aleatoriamente.

11
Este plano apresenta vá rias variantes que foram analisadas por Campbell e Stanley. Uma
dessas variantes é designada por séries temporais interrompidas múltiplas que inclui um
grupo de controlo. Esquematicamente o plano ficará assim representado:
OOOOXOOOO
0000X0000
Esta variação permite controlar as ameaças à validade interna da história e da instrumentação.
Este plano adapta -se a situações escolares em que os alunos são habitual e periodicamente
sujeitos a testes ou à indústria onde os operários podem ser observados repetidamente. A
análise dos resultados decorrentes da aplicação deste plano exige estatísticas avançadas.

© Universidade Aberta 210


II. Aprofundamento Temático

Embora possa ser administrado um pré-teste, este plano é geralmente utilizado para
grupos intactos, não equivalentes e quando a administração de um pré-teste não é
possível ou aconselhá vel.

O exemplo apresentado refere-se a três grupos e a três tratamentos, mas podem participar
na experiência qualquer número de grupos (dois ou mais grupos).

Neste exemplo, o primeiro grupo recebe o tratamento 1 e é submetido a um pós-teste,


seguidamente recebe o tratamento 2 e é submetido a um pós-teste, finalmente recebe o
tratamento 3 e é submetido a um pós- teste; o segundo grupo recebe o tratamento 3 e é
submetido a um pós- teste, seguidamente recebe o tratamento 1 e é submetido a um pós-
-teste, finalmente recebe o tratamento 2 e é submetido a um pós-teste; o terceiro grupo
recebe o tratamento 2 e é submetido a um pós-teste, seguidamente recebe o tratamento
3 e é submetido a um pós-teste, finalmente recebe o tratamento 1 e é submetido a um
pós-teste. Ao mesmo tempo cada grupo está a ser submetido a um tratamento ou a um
pós-teste diferente. No final da experiência podem ser comparados os resultados dos
pós-testes referentes a cada um dos tratamentos e a cada um dos grupos.

Ameaças à validade:

A principal amea ç a diz respeito à possível interfer ência entre tratamentos


múltiplos. Assim, este plano só deverá ser usado quando este problema não se
coloca. No entanto h á análises estatísticas sofisticadas que podem ser aplicadas
para determinar quer os efeitos dos tratamentos quer da ordem pela qual são
administrados.

Planos fatoriais - Os planos fatoriais compreendem duas ou mais variáveis independentes,


sendo pelo menos uma delas manipulada pelo investigador. J á foi anteriormente referido
que estes planos permitem investigar uma ou mais variáveis, indívidualmente ou em
interação umas com as outras e de que há um número quase infinito de planos fatoriais.
A designação fatorial refere-se ao facto do plano compreender v ários fatores e cada fator
ter dois ou mais níveis. Por exemplo, o fator métodos de ensino-aprendizagem pode
ter vários níveis (pois existe uma grande variedade de métodos, podendo no entanto
ser considerados apenas dois - ensino presencial e ensino a distância, ou podendo ser
considerados mais níveis), da mesma maneira motivação também o pode ter ( podendo
igualmente ser considerados apenas dois níveis - alunos muito motivados e pouco
motivados ou mais níveis).

O mais simples dos planos fatoriais é o que compreende dois tratamentos (dois fatores),
cada um deles com dois níveis. É designado como um plano fatorial 22 ou 2x2 , porque
tem 4 células. Três variá veis independentes, com dois níveis cada, produzem um plano

© Universidade Aberta 211


II. Aprofundamento Temático

23, com 8 células. Nã o é no entanto necessário que todos os fatores tenham o mesmo
número de níveis. Planos fatoriais com maí s do que três fatores são raramente usados,
embora teoricamente seja possível, mas não só se torna difícil analisar todas as interações
entre eles, como cada fator faz aumentar o número de sujeitos necessários para realizar
a experiência.

Num plano fatorial os sujeitos são distribuídos aleatoriamente pelas diferentes células.

O propósito de um plano fatorial é determinar se os efeitos de uma variável experimental


são generalizá veis a todos os níveis de uma variável de controlo. Também, pode demonstrar
relações que um plano com uma só variável não pode, isto é, permite determinar os
efeitos da interação, ou seja, da ação conjugada de diferentes variáveis independentes.
Para determinar esses efeitos utiliza-se a análise de variância usualmente designada por
ANOVA.

No caso do leitor pretender utilizar um plano fatorial no seu trabalho de investigação,


aconselha-se a leitura de obras da especialidade.

Tipos de variá veis


Variáveis são quaisquer características que variam numa situação experimental.—

Numa investigação experimental consideram -se vários tipos de variá veis:

Variável independente - é uma variá vel estímulo ou input. É o fator que é medido,
manipulado ou selecionado pelo experimentador para determinar a sua relação com
um fenómeno observado. É a variável que é manipulada ou alterada para causar uma
modificaçã o noutra variá vel.

Variável dependente - é uma variável resposta ou output. É o fator que é observado


e medido para determinar o efeito da variá vel independente, ou seja, aquele fator que
aparece, desaparece ou varia quando o experimentador introduz, remove ou varia a
variável independente. É a variá vel que se modifica em função das altera ções introduzidas
na variável independente. É designada por dependente porque o seu valor depende do
valor da variá vel independente. Representa a consequência ou a alteração no indivíduo
ou situaçã o estudada.

12
"Variável é um conceito operacional e classificatório que, atrav és da partição de um conjunto
teoricamente relevante, assume vários valores". ( Almeida e Pinto, 1995). Os mesmos autores
. .
indicam as quatro fases da construção de variáveis, segundo P Lazarsfeld ( 1965) ( Vide op .
cit. p. 142-143)

© Universidade Aberta 212


II. Aprofundamento Temático

É necessário pôr em evidência que muitos estudos experimentais não envolvem apenas
uma variá vel independente e uma variá vel dependente mas várias; além destas outras
variá veis são usualmente consideradas as denominadas variá veis moderadoras, variá veis
de controlo. Muitas vezes infere-se ainda a existência de outras variá veis designadas por
intervenientes.

Variável moderadora - é uma variá vel independente secundária selecionada para


determinar se afeta a relação entre a variável independente principal e a( as) variável(eis)
dependente(s). É definida como o fator que é medido, manipulado ou selecionado pelo
experimentador para descobrir se modifica a relaçã o da variável independente com um
fenómeno observado.

Tome-se o seguinte exemplo: um investigador quer comparar a eficácia da utilização de um


videograma em relação a um audiograma na aprendizagem de uma determinada unidade
de ensino de língua portuguesa. O investigador suspeita que enquanto um método pode
ser melhor para alunos que aprendem melhor através da vista, o outro será melhor para
alunos que aprendem melhor ouvindo. Após o estudo da unidade os alunos são sujeitos
a um teste, os resultados das duas abordagens parecem semelhantes; mas quando os
alunos que aprendem melhor através da visão, são separados daqueles que aprendem
melhor através da audição, as duas abordagens podem dar resultados diferentes em
cada subgrupo de alunos.

Variável independente - media utilizado (videograma vs. audiograma)

Variável dependente - efic ácia da aprendizagem

Variável moderadora - (modo como o aluno aprende melhor - visual ou auditivo).

Variáveis de controlo - Ao realizar um estudo experimental não é possível estudar


todas as variá veis relativas à situação ou aos sujeitos de investigação; algumas têm
de ser neutralizadas ( controladas) para garantir que não têm efeito na relaçã o entre a
variá vel independente e a variá vel dependente. São as chamadas variáveis de controlo,
que podem ser definidas como os fatores que são controlados pelo experimentador para
neutralizar qualquer efeito que possam ter no fenómeno que está a ser observado. As
variá veis relativas aos indivíduos que aparecem frequentemente como de controlo são,
entre outras: o sexo, a idade, a situação socioeconómica e as habilitações literárias; as
relativas ao contexto variam muito de estudo para estudo.

O experimentador na fase de planeamento do seu estudo terá que decidir quais as variá veis
que irá estudar e quais as que irá controlar.

© Universidade Aberta 213


II. Aprofundamento Temático

É de notar que enquanto os efeitos das variá veis moderadoras são estudados, os efeitos
das variá veis de controlo são neutralizados.

Variável interveniente - Pode-se defini- la como o fator que teoricamente tem efeito
no fenómeno observado, mas o qual não pode ser visto, medido ou manipulado; os
seus efeitos só podem ser inferidos através dos efeitos das variáveis independentes e
moderadoras no fenómeno observado.

Tome-se o seguinte exemplo: um investigador pretende estudar a reaçã o de crianças que


são frequentemente reprimidas pelos pais e impedidas de fazer determinadas atividades,
relativamente a outras que o nã o são.

Variável independente: repressão exercida ou não sobre as crianças

Variável dependente: nú mero de respostas agressivas relativamente a situações criadas


experimentalmente

Variável interveniente: frustração.

8. INVESTIGAÇÃO CAUSAL-COMPARATIVA ( ex post facto)

Um investigador ao realizar uma investigação causal-comparativa, tal como na investigação


experimental, tenta estabelecer rela ções causa-efeito procedendo à comparação de
grupos. A maior diferença entre as duas é que na investigação experimental a variável
independente (a "causa") é manipulada e na investigação causal-comparativa não o
é, porque já ocorreu. O investigador, depois de observar que determinados grupos
diferem relativamente a uma variável ou variáveis, procura investigar qual o fator ou
fatores que provocaram essa ou essas diferenças, ou seja, estuda a variável ou variá veis
independentes em retrospetiva, procurando a sua relação e os seus efeitos na variável
ou variá veis dependentes. Designa -se esta investigação por post-facto, porque a causa e
o efeito já ocorreram e são estudados retrospetivamente. Tome-se o seguinte exemplo:
um investigador quer identificar as causas que levam a que os alunos que frequentam o
Io ano da universidade mostrem diferentes graus de dificuldade de adapta ção ao ensino
superior. Deste modo, o investigador vai estudar os alunos do Io ano de um dado curso
universitário e tentar averiguar as causas da adaptação ou inadapta ção à universidade e
ao curso. Poderá dividi-los em dois grupos, um constituído pelos alunos que se sentem
bem adaptados e outro constituído por aqueles que se sentem inadaptados. As causas
podem ser, entre muitas outras:

o facto de não estarem a frequentar o curso que gostariam ou não possuírem

© Universidade Aberta 214


II. Aprofundamento Temático

a preparação adequada para o frequentaram, sentirem a falta da fam ília e dos


amigos por estarem longe de casa.

Vantagens deste tipo de estudos - Estes estudos são apropriados quando não é
possível fazer um estudo experimental e proceder à seleção aleatória de sujeitos, controlar
e manipular os fatores necessá rios para estudar relações causa -efeito, ou quando o
controlo de todas as variáveis com exceção de uma só pode tornar o estudo irrealista e
artificial, pois evita a interação normal com outras variáveis que podem ter influência nos
resultados. Este tipo de estudos pode também levar à identificaçã o de relações que serão
posteriormente estudadas em investigação experimental, facilitam tomadas de decisão
e são menos dispendiosos do que os estudos experimentais.

A investigação causal-comparativa é particularmente adequada a estudos de caráter


sociológico e educacional, por exemplo a relação entre filiação partidária ou crença religiosa
e atitudes, ou relações entre sucesso escolar e origem socioeconómica, etnia, sexo.

As variáveis independentes num estudo causal comparativo são variáveis que não podem
ser manipuladas (como a origem socioeconómica, o sexo, a deficiência física ou mental),
causas que não deverão ser manipuladas (como a toxicodependência), ou que poderiam
ser manipuladas mas não o são (como o modelo de ensino-aprendizagem).

Desvantagens deste tipo de estudos - O primeiro problema reside na falta de


controlo porque o investigador não pode manipular a variá vel independente e proceder
à seleçã o aleatória dos sujeitos de investigaçã o A interpretação dos resultados deverá
ser feita com extremo cuidado, porque o que pode parecer como causa pode não o ser
efetivamente. Por vezes, tal como na investigação correlacionai, é estabelecida uma
relaçã o, mas não uma relação causa -efeito. O que é considerado como causa pode na
realidade ser efeito, ou pode haver uma terceira variá vel que seja a causa dos supostos
causa e efeito. As relações causa -efeito estabelecidas mediante estes estudos são ténues,
não são estabelecidas como nos estudos experimentais.

Planifica ção e procedimentos - Em estudos causal-comparativos a definição e


seleção de grupos sã o muito importantes, os grupos deverão ser claramente definidos
operacionalmente. Neste tipo de investigação os grupos já existem, e já receberam o
"tratamento " (variável independente) e, como se referiu, há a possibilidade de eles
diferirem noutra variá vel importante que não seja apenas a variá vel independente,
e que essa seja a verdadeira causa da diferença entre os grupos. Existem métodos
estatísticos e não estatísticos para obviar a este problema: um já referido anteriormente
é o emparelhamento, comparar grupos que são homogéneos em relação a essa variável,
ou utilizar a análise de covariância.

© Universidade Aberta 215


II. Aprofundamento Temático

Para a análise dos dados sã o utilizadas estatísticas descritivas, como a média e o


desvio padrão; entre as estatísticas inferências, o teste t, a análise de variância e o qui-
-quadrado.

Na interpretação dos resultados deverá haver muito cuidado na identifica ção da verdadeira
causa, daquela que ocorreu em primeiro lugar.

Atividade 9.1
Estudou a investigação histórica, a investigaçã o descritiva, o estudo de caso, o
estudo etnográ fico, a investiga ção correlacionai, a investigação experimental e
a investigação causal-comparativa. Fa ça um resumo onde deverá indicar:
- as finalidades de cada um (uma);
- os procedimentos utilizados;
- as vantagens e limita ções.

S í ntese

Primeiramente apresentou-se a classificação de L. R. Gay aplicada à investigação em


Ciências da Educa ção.

Seguidamente, apresentaram-se as características, as finalidades, os procedimentos


utilizados, as vantagens e desvantagens de diferentes investigações: histórica, descritiva,
estudo de caso, estudo etnográ fico, correlacionai, experimental e causal-comparativa.

Teste formativo

Brevemente irá elaborar o seu projeto de investiga ção. Considerando os conhecimentos


adquiridos durante a parte curricular do Mestrado, os seus interesses, a natureza do
trabalho de investiga ção que se propõe realizar, os recursos e o tempo de que dispõe,
indique o método e os procedimentos que melhor se adaptam a esse estudo e justifique
a resposta.

Leituras complementares

AFONSO, Natércio
2005 Investigação Naturalista em Educação. Um guia prático e crítico, Porto,
Edições ASA .

ALMEIDA, João F. e PINTO, José M.


1995 A Investigação nas Ciências Sociais, Lisboa, Editorial Presença, pp. 141-149.

© Universidade Aberta 216


II. Aprofundamento Temático

BRYMAN, Alan e CRAMER, Duncan


1993 Análise de Dados em Ciências Sociais, 2a ed., Oeiras, Celta Editora.

CLEGG, Frances
1995 Estatística para todos: um manual para Ciências Sociais, Lisboa, Gradiva.

COHEN, Louis e MANION, Duncan


2011 Research Methods in Education, 7th ed., London, Routledge. (Existe uma
tradução em Espanhol)

CRESWELL, John W.
2013 Qualitative Inquiry and Research Design. Choosing Among Five Traditions,
3 rd ed., Thousand Oaks, CA, USA.

FERREIRA, Virginia
1986 O Inquérito por questionário na construção de dados sociológicos, in Silva,
Augusto Santos e Pinto, José Madureira (orgs.), "Metodologia das Ciências
Sociais", 5 a ed., Porto, Edições Afrontamento, pp. 165-196.

FLICK, Uwe
2009 Introdução à Pesquisa Qualitativa, 3a ed., Artmed Editora, RS, Brasil.

FODDY, William
1996 Como Perguntar. Teoria e Prática da construção de perguntas em entrevistas
e questionários, Oeiras, Celta Editora.

GAY, L. R.
1981 Educational Research: Competencies for Analysis & Application, 2 a ed.,
Columbus, Ohio, Charles E. Merrill Publishing Company, pp. 142-271.

GHIGLIONE, Rodolphe e MATALON, Benjamin


1992-93 O Inquérito. Teoria e Prática, 2a ed., Oeiras, Celta Editora.

JESUÍNO, Jorge C.
1986 O Método Experimentai em Ciências Sociais \w Silva, Augusto S. e Pinto, José M.
(orgs.) "Metodologia das Ciências Sociais", 5a ed., Porto, Edições Afrontamento,
pp. 215-249.

© Universidade Aberta 217


II. Aprofundamento Temático

LESSARD- H É BERT, Michelle; GOYETTE; Gabriel e BOUTIN, Gé rald


2008 Investigação Qualitativa. Fundamentos e Práticas, 3a ed ., Lisboa , Instituto
Piaget.

LIMA, Marin ús Pires de


1987 Inquérito Sociológico. Problemas de Metodologia, 3a ed ., Lisboa , Editorial
Presen ça .

LEVIN , Jack
1987 Estatística Aplicada às Ciências Humanas, 2a ed ., Sã o Paulo, Editora Harbra .

MERRIAM , Sharan B.
1988 Case Study Research in Education, Sã o Francisco, Jossey-Bass Publishers.

PUNCH , Keith F.
2003 Survey Research. The Basics, London, Sage.

THOMAS, Gary
2011 How to do Your Case Study. A Guide for Students & Researchers, London ,
Sage.

YIN , Robert K .
1988 Case Study Research. Design and Methods, Newbury Park, Sage
Publications.

© Universidade Aberta 218


II. Aprofundamento Temático

Unidade 10 - A Análise de Conteúdo

Sumário

Objetivos da unidade

1. DEFINIÇÃ O DE ANÁLISE DE CONTEÚDO


2. TIPOS DE ANÁLISE DE CONTEÚDO

Atividade 10.1
3. A PR ÁTICA DA ANÁLISE DE CONTE ÚDO
3.1. Definição dos objetivos e do quadro de referência teórico
3.2. Constituição de um corpus
Atividade 10.2
3.3. Definição das categorias
3.4. Definição das unidades de análise

Atividade 10.3
3.5. Quantifica ção
3.6. Interpreta ção dos resultados
4. FIDELIDADE E VALIDADE
Síntese

Teste Formativo

Leituras Complementares

Objetivos da unidade

No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a :


1. Definir An álise de Conteúdo;

2. Distinguir as várias etapas da An álise de Conteúdo;

3. Indicar como se procede à constituição de um corpus,

4. Indicar como se procede à definiçã o das categorias;

5. Distinguir as unidades de análise;

6. Indicar procedimentos destinados a garantir a fidelidade da Análise de Conteúdo;

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II. Aprofundamento Temático

7. Indicar procedimentos destinados a garantir a validade da An álise de Conteúdo;

8. Aplicar os conhecimentos adquiridos a casos concretos de Análise de Conteúdo.

Em capítulos anteriores foi referida a necessidade de proceder à Análise de Conteúdo de


documentos, registos de observações, transcrições de entrevistas e respostas a perguntas
abertas incluídas em questionários.

1. DEFINIÇÃO DE ANÁLISE DE CONTEÚDO

Berelson, (1952,1968), por exemplo, definiu Análise de Conteúdo como "uma técnica
de investigação que permite fazer uma descrição objetiva, sistemática e quantitativa
do conteúdo manifesto das comunicações, tendo por objetivo a sua interpreta ção " .
Pormenorizando:

Objetiva - porque a análise deve ser efetuada de acordo com determinadas regras,
obedecer a instruções suficientemente claras e precisas para que investigadores diferentes,
trabalhando sobre o mesmo conteúdo, possam obter os mesmos resultados. Isto pressupõe
que eles cheguem a acordo sobre os aspetos a analisar, as categorias a estabelecer e a
utilizar e a definição operacional de cada uma dessas categorias.

Sistemá tica - porque a totalidade do conteúdo deve ser ordenado e integrado em


categorias previamente escolhidas em função dos objetivos que o investigador quer
atingir.

Quantitativa - uma vez que na maior parte das vezes é calculada a frequência dos
elementos considerados significativos.

Posteriormente foram propostas outras definições. Por exemplo, Cartwright (1953), para
além do "conteúdo manifesto da comunicação", estende a Análise de Conteúdo a "todo
o comportamento simbólico" e Stone (1966) define-a como: "uma técnica que permite
fazer inferências, identificando objetiva e sistematicamente as características específicas
da mensagem ". A Análise de Conteúdo orienta -se para a formaliza ção das relações entre
temas, permitindo traduzir a estrutura dos textos.

Noutras definições, ainda, a referência à quantificaçã o desaparece.

Como Grawitz (1993) põe em evidência, a inferência corresponde ao alargamento da


técnica, a qual permite daí em diante pôr em relação aspetos literais e aspetos sociológicos.
Desaparecem as exigências de manifesto no que diz respeito ao conteúdo e de descrição
quantitativa, e aparecem as noções de forma e de estrutura.

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II. Aprofundamento Temático

Como salienta Bardin (1977), a Análise de Conteúdo nã o deve ser utilizada apenas para
se proceder a uma descrição do conteúdo das mensagens, pois a sua principal finalidade
é a inferência de conhecimentos relativos à s condições de produção (ou eventualmente
de receção), com a ajuda de indicadores (quantitativos ou não).

Se a descrição (a enumera ção resumida após tratamento das características do texto)


constitui a primeira etapa de realização numa Análise de Conteúdo e se a interpreta ção
(o significado atribuído a essas mesmas características) é a última etapa, a inferência é
o procedimento intermédio que permite a passagem, explícita e controlada, de uma à
outra .

Podem fazer-se inferências sobre a origem da mensagem (o emissor e a situação em que


se encontra) e, nalguns casos, sobre o próprio destinatário da comunicação (a última
inferência levanta no entanto problemas de rigor).

De acordo com o mesmo autor, esta técnica de pesquisa pode considerar-se como a
articulação entre:
•o texto, descrito e analisado (pelo menos em relação a certos dos seus
elementos característicos), e

• os fatores que determinaram essas características, deduzidos logicamente,


constituindo estes a especificidade da Análise de Conteúdo.

2. TIPOS DE ANÁLISE DE CONTEÚDO

Utilizando, mais uma vez, o que Madeleine Grawitz (1993) escreveu sobre o assunto,
apresenta -se seguidamente a distinção dos vários tipos de Análise de Conteúdo:

Aná lise de exploraçã o e análise de verifica çã o


Corresponde à distinção entre a análise de documentos que tem como finalidade a
verifica çã o de uma hipótese, cujo objetivo é bem definido e conduz à quantificação
dos resultados; e aquela cuja finalidade é fundamentalmente explorar. Uma análise
quantitativa que não tem como base hipóteses previamente definidas não conduz
geralmente a resultados apreciáveis. No entanto, uma análise fortemente sistematizada,
dirigida, apresenta inconvenientes pois podem ser deixados fora do campo de estudo
elementos essenciais que não foram previstos antecipa damente.

Aná lise quantitativa e análise qualitativa


A principal distinção entre as duas é que na análise quantitativa, o que é mais importante
é o que aparece com frequência, sendo o número de vezes o critério utilizado, enquanto

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II. Aprofundamento Temático

que numa análise qualitativa, a noção de importância implica a novidade, o interesse, o


valor de um tema .

Aná lise direta e análise indireta


A análise quantitativa emprega na maior parte das vezes a medida de uma forma direta .
Este é o modo mais simples de proceder. Tome-se, como exemplo, a comparação entre
dois programas eleitorais no que diz respeito à política ambiental: a análise de conteúdo
por medida direta pode incluir unicamente a comparação entre o número de vezes que
certos temas, palavras ou símbolos-chave referentes a essa política aparecem nesses
programas.

A análise indireta que procura uma interpretação do que se encontra latente sob a
linguagem expressa é geralmente considerada como característica de uma análise de
tipo qualitativo; mas, por vezes a partir de uma análise quantitativa indireta, para além
do que é manifesto num discurso, por inferência, pode chegar-se a conclusões sobre o
que propositadamente não foi dito ou escrito.

Atividade 10.1
Escolha um artigo que relate uma pesquisa onde tenha sido utilizada a técnica de
Análise de Conteúdo e tente identificar o tipo de análise. Justifique a resposta .

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II. Aprofundamento Temático

3. A PRÁTICA DA ANÁLISE DE CONTEÚDO

A Análise de Conteúdo compreende no seu percurso um certo número de etapas:—


• Definição dos objetivos e do quadro de referência teórico;
• Constituição de um corpus,-
• Definição de categorias;
• Definição de unidades de análise;
• Quantifica ção (não obrigatória);
• Interpretação dos resultados obtidos.

3.1. Definiçã o dos objetivos e do quadro de referência teórico

Como qualquer outra técnica de investigação a Análise de Conteúdo implica que sejam
definidos objetivos e um quadro de referência teórico. Dado a definição de objetivos e o
papel da teoria no desenvolvimento da investiga ção já terem sido abordados em capítulos
anteriores não serão aqui novamente desenvolvidos esses aspetos.

13
Bardin ( 1977) considera as seguintes fases na aná lise de conteúdo:
-
1) Pré análise;
2) Exploração do material;
3) Tratamento dos resultados, inferência e interpretação.
0 autor diz que na fase de pré-análise o investigador deverá proceder à escolha dos
documentos que vão ser sujeitos à análise, à formulação das hipóteses e dos objetivos da
investigação e à elaboração de indicadores nos quais se deverá apoiar a interpretação final,
estando estas catividades interligadas, pois a escolha dos documentos depende dos objetivos
ou, inversamente, a formulação das hipóteses e dos objetivos só será possível em função
dos documentos disponíveis; os indicadores serão construídos em função das hipóteses e a
formulação das hipóteses será fundamentada na presença de certos índices.
As hipóteses poderão, no entanto, ser ou não estabelecidas na fase preparatória, (não sendo
obrigatório que o sejam). Os índices podem ser escolhidos em função das hipóteses no caso de
estas serem formuladas. Os índices deverão ser organizados em indicadores precisos e fiáveis.
Por exemplo, o índice poderá ser a menção explícita de um tema num texto, o indicador
correspondente; caso se trate de uma análise temática quantitativa, será a frequência desse
tema . Nesta fase deverão também ser determinadas as operações a realizar de divisão do
texto em unidades comparáveis, de categorização para a aná lise temática, e de codificação
para o registo dos dados.

© Universidade Aberta 223


II. Aprofundamento Temático

3.2. Constituição de um corpus

0 investigador deverá proceder à escolha dos documentos que vão ser sujeitos à an álise.
A escolha pode ser feita de duas maneiras: determinada a priori (por exemplo, por análise
sistemática de todos os números de uma revista que só foi editada durante quatro anos)
ou os documentos podem ser escolhidos de acordo com os objetivos da investiga ção em
curso (por exemplo, o investigador pretende analisar a evolução da importância dada
nos programas do Ensino Básico a questões ambientais, nos últimos 10 anos; para isso
pode escolher e analisar os programas de Biologia e de Geografia deste nível de ensino).
Constitui-se assim o corpus ou seja o conjunto dos documentos escolhidos para se
proceder posteriormente à Análise de Conteúdo.

Essa escolha deverá ser feita tendo em atenção certas regras, tais como: a exaustividade
(o que implica considerar todos os elementos do conjunto, no exemplo dado todos os
programas das duas disciplinas dos últimos 10 anos); a representatividade (o que
implica proceder à análise de uma parte dos documentos, devendo a parte selecionada
ser representativa do conjunto dos documentos); a homogeneidade ( os documentos
escolhidos devem obedecer a critérios de escolha rigorosos e não apresentar demasiada
singularidade relativamente a esses critérios de escolha); a pertinência (ou seja, os
documentos escolhidos devem ser adequados como fonte de informação para corresponder
ao objeto da análise que sobre eles irá recair). (Bardin, 1977).

Atividade 10.2
Relativamente ao mesmo exemplo de Análise de Conteúdo que escolheu
anteriormente resuma como o( a) autor( a) procedeu à constituição do corpus.

3.3. Definiçã o das categorias

As categoriassão "rubricas significativas, em função das quais o conteúdo será classificado


e eventualmente quantificado" (Grawitz, 1993). A definição das categorias pode ser feita
a priori ou a posteriori.

No primeiro caso foram formuladas hipóteses e o investigador pretende verificá-las, tendo


para tal definido antecipadamente as categorias de análise. A Análise de Conteúdo permitir-
-Ihe-á detetar se as categorias estabelecidas estão ou não presentes nos documentos que
constituem o corpus. Por exemplo, pode ser este o caso de um inquérito por entrevista
em que na fase de pré-testagem se puderam definir as categorias.

No segundo caso as categorias não foram definidas antecipadamente. Este tipo de análise
é designado por "procedimento exploratório".

© Universidade Aberta 224


II. Aprofundamento Temático

A escolha das categorias é fundamental na Análise de Conteúdo. As categorias devem


ter as seguintes característícas:

Exaustivas - o que significa que todo o conteúdo que se tomou a decisã o de classificar
deve ser integralmente incluído nas categorias consideradas, sendo no entanto possível,
de acordo com os objetivos, não considerar alguns aspetos do conteúdo, caso em que
se torna necessário justificar por que razão esses aspetos não foram considerados. (Por
exemplo, entrevistados relatam por vezes factos ou emitem opiniões sobre aspetos que
estã o fora dos objetivos da investigação);

Exclusivas - os mesmos elementos devem pertencer a uma e não a várias categorias;

Objetivas - as característí cas de cada categoria devem ser explicitadas sem ambiguidade
e de forma suficientemente clara de modo a que diferentes codificadores classifiquem
os diversos elementos, que selecionaram dos conteúdos em análise, nas mesmas
categorias;

Pertinentes - devem manter estreita relação com os objetivos e com o conteúdo que
está a ser classificado. Note-se que quando se definem categorias a priori pode-se pôr
em risco a pertinência da sua inclusão.

De facto as categorias devem provir de duas fontes: do próprio documento em análise


(por exemplo, das respostas no caso de se tratar de uma entrevista, ou das finalidades,
intenções, significados do emissor no caso de se tratar de um texto) e de um certo
conhecimento geral do domínio a que diz respeito. Dever-se-á também ter sempre em
conta, em alguns casos, elementos cuja ausência poderá também ser significativa.

A categoriza ção apresenta problemas que o investigador tem por vezes dificuldades em
ultrapassar. Como foi referido, categorias definidas a prioripoáe.n\ levar a que não se tenha
em consideração aspetos importantes do conteúdo; a definição de categorias a posteriori
deve ser feita com muitos cuidados, após leituras sucessivas do texto e tendo em atenção
os objetivos da investigação; as categorias não devem igualmente ser numerosas, nem
demasiadamente pormenorizadas ou, pelo contrário, serem em n úmero insuficiente e
demasiadamente englobantes e, por conseguinte, de fronteiras imprecisas.

Um problema levantado por muitos autores incide sobre a possibilidade de definir um


conjunto de aspetos da realidade comuns a muitas análises, de forma a facilitar e a
normalizar a Análise de Conteúdo, apesar das diferenças de objetivos que encerram e
dos textos que lhe venham a ser submetidos.

Reconhecendo a importância que revestem, enumeram-se alguns desses aspetos que


podem constituir objetos da análise ( Grawitz, 1993):

© Universidade Aberta 225


II. Aprofundamento Temático

Maté ria - importa saber de que trata a comunicaçã o ( assuntos que nela sã o
abordados);

A direçã o da comunicação - que pode ser por exemplo, favorá vel, neutra, desfavorá vel,
entre outras;

Os valores - procuram explicar a orientação da comunicação pelo reconhecimento dela


ser favorá vel, neutra ou desfavorável, revelando as finalidades que os indivíduos nela
implicados procuram alcanç ar;

Os meios - dizem respeito aos instrumentos de comunicaçã o utilizados para os recetores


aderirem aos valores do emissor (por exemplo, em discursos, a ameaç a, a persuasão, a
negociação, etc.).

O atores - trata -se de definir as características individuais dos atores intervenientes, como
por exemplo: a idade, o sexo, a profissão, o nível de instrução, o nível socioeconómico,
a nacionalidade, a naturalidade, a religião.

A origem - diz respeito à origem dos textos utilizados, tais como: artigos de revistas ou
de jornais regionais, nacionais ou internacionais, etc.14

3.4. Definiçã o das unidades de aná lise

Após a definição de categorias torna -se necessário proceder à definição de três tipos de
unidades:
a) Unidade de registo é o segmento mínimo de conteúdo que se considera necessário
para poder proceder à análise, colocando-o numa dada categoria. A escolha da
unidade de registo depende pois dos objetivos estabelecidos e do quadro teórico
orientador da investigação.

A unidade de registo pode ser de natureza e de dimensões muito diversas, sendo


a distinção mais habitual entre unidades formais, que podem ou não coincidir
com unidades linguísticas, e unidades semâ nticas.

14
Ghiglione e Matalon ( 1985), referindo-se ao que os autores designam por procedimentos
fechados ou seja técnicas de aná lise de conteúdo baseadas em categorias previamente
fixadas, análise associada a um quadro categorial empírico ou teórico, consideram cinco tipos
de modalidades categoriais: psicológica, psicolingu ística, psicossociol ógica, linguística
e documental e, relativamente a procedimentos que designam por abertos (exploratórios),
consideram a contagem frequencial, a análise tem á tica, as concomitâ ncias temáticas,
a análise por cachos e a análise por campos sem â nticos, (vide op. cit., pp. 213-244).

© Universidade Aberta 226


II. Aprofundamento Temático

Podem conslderar-se unidades formais a palavra, a frase, uma personagem, um


qualquer item ( designação esta empregue para unidades muito diferentes tais como
um livro, um filme ou um discurso, que são utilizados como "unidade” quando as
variações dentro do item considerado são menos relevantes do que as variações
entre itens diversos).

A unidade semântica considerada mais comum é o tema (a título de exemplo:


a democracia, o sucesso escolar, a imigraçã o). O tema é também uma das unidades
de registo mais utilizadas, no entanto, verifica -se frequentemente discordância entre
codificadores sobre onde começa e acaba um dado tema (por exemplo, ao efetuar
a aná lise de um discurso), o que põe problemas quanto à fidelidade do estudo.

b) Unidade de contexto constitui o segmento mais longo de conteúdo que o


investigador considera quando carateriza uma unidade de registo, sendo a unidade
de registo o mais curto. Por exemplo, se a palavra for considerada a unidade de
registo, a unidade de contexto poderá ser a frase. É assim importante considerar
a unidade de contexto para assegurar a fidelidade e a validade da análise.

Unidades de registo e de contexto muito longas levantam dificuldades à sua validade


interna.

c) Unidade de enumeração é a unidade em função da qual se procede à quantificação.


Por exemplo, num dado discurso quando se pretende distinguir a importância que
foi prestada a v ários temas, a unidade de registo será traduzida pelo número de
vezes que aparece em cada um dos temas e a unidade de enumeração o número
de linhas dedicadas a cada um deles.

As unidades de enumera ção dizem respeito ao tempo e ao espaç o: parágrafo,


linha, centímetro, minutos de registo. A escolha das unidades de enumeração deve
ser cuidadosamente feita e devem ser indicados os critérios que a orientaram.
Normalmente considera -se que uma maior frequência de uma categoria corresponde
ao maior interesse que o autor de um discurso lhe atribuiu. A realidade pode no
entanto ser outra, porque ele pode intencionalmente omitir de forma estratégica
objetos a que dá real importâ ncia .

Atividade 10.3
Relativamente ao mesmo exemplo de Aná lise de Conteúdo que escolheu
anteriormente resuma como o( a) autor(a) procedeu à definição das categorias
e das unidades de análise.

© Universidade Aberta 227


II. Aprofundamento Temático

3.5. Quantificação
Está fora do âmbito deste Manual indicar toda a variedade das técnicas de quantificação
na Análise de Conteúdo, técnicas que evoluíram muito e se diversificaram devido não só
ao desenvolvimento da an álise estatística aplicada ao campo das Ciências Sociais como
à utilização do próprio computador15 1®. -
3.6. Interpretaçã o dos resultados

A interpretação de resultados obtidos, feita à luz dos objetivos e do suporte teórico,


é fundamental. Além da descrição, a Análise de Conteúdo deverá não só possibilitar a
compreensão do fenómeno que constitui objeto de estudo, como fazer o investigador
chegar à sua explicação e podendo mesmo nalguns casos, fazê-lo chegar a formas de
previsão. No entanto, para assegurar a validade de qualquer previsão que venha a ser feita,
torna-se necessário fazer o cruzamento com os resultados obtidos por outras técnicas.

4. FIDELIDADE E VALIDADE

A fidelidade diz respeito ao problema de garantir que diferentes codificadores cheguem a


resultados idênticos (fidelidade inter-codificadores }, e que um mesmo codificador ao longo
do trabalho aplique de forma igual os critérios de codificação (fidelidade intra -codificador) .
Para que tal aconteça é necessário que o investigador explique pormenorizadamente
os critérios de codificação por ele utilizados e que estes sejam aplicados com o maior
rigor.

15
Vala ( 1986) diz que em termos esquemáticos uma aná lise de conteúdo quantitativa pode
tomar três direções:
a ) Aná lise de ocorrê ncias - visa determinar o interesse da fonte por diferentes objetos ou
conteúdos. A hipótese é a de que quanto maior for o interesse do emissor por um dado
objeto maior será a frequência de ocorrência no discurso dos indicadores relativos a esse
objeto.
b) Análise avaliativa - é o estudo das atitudes da fonte reiativamente a determinados objetos,
recorrendo à escala de atitudes de Thurstone ou à Aná lise das Proposições Avaliativas
(Evaluative Assertion Analysis) elaborada por Osgood (1959) (Bardin, 1977, descreve esta
técnica).
c) Análise estrutural - visa fazer inferências sobre a organização do sistema de pensamento
da fonte implicado no discurso que se pretende estudar. Foi Osgood ( 1959) que a iniciou,
tendo-a designado por Análise Associativa.
16
O computador permite tratar o texto (análise linguística) e os resultados (análise numérica).

© Universidade Aberta 228


II. Aprofundamento Temático

A validade díz respeito à quilo que o investigador pretendia medir. Uma Aná lise de
Conteúdo será válida, quando a descrição que se fornece sobre o conteúdo tem significado
para o problema em causa e reproduz fielmente a realidade dos factos. Para isso, é
necessário que todas as etapas que integram o processo de análise sejam corretamente
executadas.

S í ntese

Primeiramente, foram apresentadas definições de Análise de Conteúdo e, posteriormente,


indicadas as características dos diferentes tipos que pode revestir.

As várias etapas da Análise de Conteúdo foram seguida mente caracterizadas: definição


dos objetivos e do quadro de referência teórico; constituição de um corpus, definição de
categorias; definição de unidades de análise; quantificação e interpreta ção dos resultados
obtidos.

Finalmente, foram discutidos os problemas da fidelidade e da validade da Análise de


Conteúdo.

Teste formativo

Após leitura aprofundada do presente capítulo, escolha na biblioteca da Universidade que


lhe estiver mais próxima uma Dissertaçã o em que o autor tenha feito Análise de Conteúdo
de documentos, transcrição de entrevistas, etc., e faça um resumo dos procedimentos por
ele utilizados nas várias etapas do processo de análise e de como assegurou a fidelidade
e a validade do estudo.

Leituras complementares

BARDIN, Laurence
1977 L'analyse de contenu, Paris, P.U.F. (Existe uma tradução em português referida
na bibliografia) .

GHIGLIONE, Rodolphe e MATALON, Benjamin


1993 O Inquérito. Teoria e Prática, Oeiras, Celta Editora, pp. 197-251.

GRAWITZ, Madeleine
1993 Méthodes des Sciences Sociaies, Paris, 9a ed., Editions Dalloz, pp. 532- 565.
(Existe a 11a edição).

© Universidade Aberta 229


II. Aprofundamento Temático

GUERRA, Isabel C.
2006 Pesquisa Qualitativa e Análise de Conteúdo. Sentidos e Formas de Uso,
Estoril, Principia Editora.

VALA, Jorge
1986 A Análise de Conteúdo \ n Silva, Augusto S. e Pinto, José M. (orgs.), "Metodologia
das Ciências Sociais", 5a ed., Porto, Edições Afrontamento, pp. 101-128.

© Universidade Aberta 230


II. Aprofundamento Temático

Unidade 11- Princí pios Éticos e a Apresentação do Projeto


e do Relatório de Investigação

Sumário

Objetivos da unidade

1. PRINCÍPIOS ÉTICOS

2. A ELABORA ÇÃ O DO PROJETO E DO RELATÓRIO DE INVESTIGAÇÃO

2.1. 0 Projeto de Investigação


2.2. O Relatório de Investigação

2.2.1. Organiza ção do Relatório de Investiga ção

2.2.2 . Análise Crítica de um Relatório de Investigação

Atividade 11.1
Leituras Complementares

Objetivos da unidade

No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a :


1. Enunciar as fases de elaboração de um projeto de investigação;

2. Indicar as fases de elaboração de um relatório de investigação;

3. Enunciar os aspetos a considerar numa análise crítica de um relatório de


investiga ção;

4. Aplicar os conhecimentos metodológicos adquiridos à crítica de um relatório de


investiga ção.

1. PRINCÍPIOS ÉTICOS

A realização de uma qualquer investigação implica por parte do investigador a observância


de princípios éticos, geralmente aceites pela comunidade de investigadores em Ciências
Sociais, que o obrigam a:
1 - Respeitar e garantir os direitos daqueles que participam voluntariamente no
trabalho de investigaçã o.

© Universidade Aberta 231


II. Aprofundamento Temático

2 - Informar os participantes sobre todos os aspetos da investigação que podem ter


influência na sua decisã o de nela colaborar ou não e explicar- lhes todos os aspetos
da investigação sobre os quais possam vir a ser postas questões.

3 - Manter total honestidade nas relações estabelecidas com os participantes. Põe-se


muitas vezes a questão de dar a conhecer os principais ou mesmo a totalidade dos
objetivos da investigação em curso embora tentando evitar que esse conhecimento
vá afetar os próprios resultados do estudo. Nesse caso dever-lhes-ão ser explicadas
as razoes porque nã o se torna conveniente indicar-lhes os verdadeiros ou a
totalidade dos objetivos subjacentes à investigação, o que os poderá entã o levar
a optar por colaborar ou não.

4 - Aceitar a decisão dos indivíduos de não colaborar na investigação ou de desistir


no seu decurso.

5 - Antes de iniciar a investiga ção estabelecer um acordo com os participantes de


forma a que fiquem explícitas conjuntamente as responsabilidades do investigador
e a deles próprios.

6 - Proteger os participantes de quaisquer danos ou prejuízos físicos, morais e


profissionais no decurso da investigação ou causada pelos resultados que venham
a ser obtidos.

7 - Informar os participantes dos resultados da investigação e do mesmo modo,


esclarecer quaisquer dúvidas que estes possam vir a levantar aos participantes.

8 - Garantir a confidencialidade da informaçã o obtida, salvo se os participantes não


se opuserem a tal e solicitarem eles próprios a sua divulgação.

9 - Solicitar autorização das instituições a que pertencem os participantes para estes


colaborarem no estudo.

A estes princípios orientadores a que devem obedecer as relações do investigador com


os participantes, juntam-se outros que o devem levar a ter a obrigação de fazer uma
rigorosa explicitação das fontes utilizadas quer estas sejam documentais ou não; de ser
autêntico quando redige o relatório da investigação, nomeadamente no que diz respeito
aos resultados que apresenta e à s conclusões a que chega, mesmo que por razões
ideológicas ou de outra natureza os mesmos não lhe agradem.

Fidelidade aos dados recolhidos e aos resultados a que chega, não enviesamento das
conclusões constituem regras fundamentais de toda a investigação científica.

© Universidade Aberta 232


II. Aprofundamento Temático

2. A APRESENTAÇÃO DO PROJETO E DO RELATÓRIO DE


INVESTIGAÇÃ O

2.1. O Projeto de Investigação12

Foram anteriormente referidos os principais elementos a ter em conta na elabora ção de


um projeto de investigação em Ciências Sociais e indicamos neste capítulo final as seções
que um projeto e um relatório de investigaçã o devem conter. No entanto, é necessário
referir que algumas instituições portuguesas do ensino superior têm normas próprias para
a elaboração desses documentos.

Como se mencionou anteriormente, a elaboração do projeto de investigação exige que


o investigador possua:
a) Forma ção adequada para o desenvolvimento do tema escolhido e preferencialmente
algum conhecimento prático da área de investigação que poderá estar relacionada,
nomeadamente, com a sua experiência profissional;

b) Motivação de ordem pessoal (profissional ou afetiva) para desenvolver o tema


selecionado.

c) A escolha do problema de investigação deverá ser feita de acordo com:

d) O interesse pessoal do investigador, que pretende por exemplo,encontrar explicações


e respostas para acontecimentos com que se depara na sua vida profissional ou
social;

e) A disponibilidade de recursos, nomeadamente bibliografia, acessibilidade ao local


de investigação para recolha de dados, aceitaçã o dos sujeitos de investiga ção em
colaborarem, recursos financeiros, entre outros;

f ) As competências que o investigador possui para desenvolver os métodos e as


técnicas de investigação que pretende utilizar;

g) O tempo necessário para desenvolver a investigação.

O problema deve ser relevante do ponto de vista teórico ou prático e inovador, mas o
investigador poderá optar por replicar um estudo anterior cujos resultados e conclusões
carecem de confirmaçã o por parecerem contraditórios com a teoria ou a prática.

0 investigador deve mencionar as motiva ções que o levaram a escolher um determinado


problema, assim com a relevância da investigação que se propõe realizar.

17
Aconselha-se a leitura da unidade 2.

© Universidade Aberta 233


II. Aprofundamento Temático

As limita ções que levaram o investigador a optar por um determinado problema e a


selecionar determinados métodos e técnicas de investiga çã o devem igualmente ser
mencionadas.

O problema é preferencialmente traduzido numa pergunta de partida e esta deve ser


explicitada mediante a formulação de questões ou hipóteses de investigação.

Um projeto de investigação deve incluir também um plano detalhado do trabalho que o


investigador pretende realizar. Este inclui a indicação do âmbito da revisão da literatura,
os procedimentos metodológicos, assim como as referências bibliográficas que permitiram
elaborar o projeto de investigação.

O projeto de investigação deve conter 4 secções:

Título (provisório)

1. Objeto da Investigação
1.1. Explicitaçã o do problema de investiga çã o e formula çã o da pergunta de
partida;
1.2. Motivações do investigador
1.3. Relevância do estudo;
1.4. Limitações do estudo;
1.5 Questões ou hipóteses de investigação incluindo as variáveis que vão ser
investigadas;
1.6. Definição de termos (palavras-chave do estudo).

2. Revisão da literatura

Indicação do enquadramento teórico e sumário de trabalhos de investigação, já realizados,


que estejam relacionados com o tema a estudar e sua importância e implicações para o
trabalho de investigação que o investigador se propõe efetuar.

3. Procedimentos metodológicos
3.1. Explicita çã o do plano de investiga ção (com indicação e descriçã o do plano
experimental, se para ele houver lugar);
3.2. Indicação da popula ção em estudo e do processo de amostragem, incluindo a
justificação da sua escolha;
3.3. Técnicas e instrumentos de pesquisa a serem utilizados para recolha de
dados;
3.4. Atividades a desenvolver (descriçã o em pormenor do que se vai fazer, quando,
onde e como);
3.5. Validade (como vai ser assegurada a validade interna do estudo);

© Universidade Aberta 234


II. Aprofundamento Temático

3.6. Aná lise dos dados ( com explicitaçã o dos procedimentos de organiza ção e
tratamento);
3.7. Calendarização.

4. Referências bibliográficas.

2.2. O Relatório de Investigaçã o

A elaboração do relatório de investigação reveste-se da maior importância dado ser a


sua leitura que vai permitir avaliar a pertinência, o rigor e o valor científico do trabalho
de investigação realizado.

Em 2.2.1. indicam -se os aspetos fundamentais que um relatório de investigação deverá


conter. No entanto, não se pretende que todos os Mestrandos apresentem a mesma
organização do relatório da pesquisa que efetuaram, atendendo a que está dependente
do trabalho realizado e refletir as características do seu autor. Rigor e criatividade são as
condições essenciais para a realiza ção de um trabalho de investigação, que o relatório
de investigação deverá traduzir através de uma descriçã o pormenorizada, precisa e
imaginativa.

Em 2.2.2. apresentam -se os principais aspetos que deverão ser tidos em conta ao efetuar
a revisão crítica de um Relatório de Investigação. A leitura crítica de relatórios de pesquisas
já realizadas no âmbito de Mestrados em Ciências Sociais deverá ajudar o Mestrando a
elaborar e redigir o seu próprio trabalho de investiga ção.

2.2.1. Organiza çã o do Relatório de Investiga çã o1^

Título

Resumo em Português, Inglês e Francês (uma página A4)

índice Geral
índice das Figuras
índice dos Quadros
Introduçã o
Objeto da Investigação
Problema de investigação e pergunta de partida
Relevância do estudo

18
Aconselha-se a leitura da unidade 6 e chama-se a atenção para as normas da instituição no
âmbito da qual a dissertação foi realizada .

© Universidade Aberta 235


II. Aprofundamento Temático

Limitações do estudo
Questões ou hipóteses de investigação
Metodologia do estudo (indicação sumária de métodos e técnicas utilizadas na
recolha e aná lise de dados)
Definição de termos (palavras-chave do estudo)

Parte I - Enquadramento teórico


Revisão da literatura - enquadramento teórico e estado da arte13 relativo ao tema de
investiga ção). Esta parte poderá incluir um ou mais capítulos.

Parte II - Metodologia e resultados


Metodologia
Descrição do plano de investigação
Explicitaçã o da população em estudo e do processo de amostragem
Descriçã o das técnicas e dos instrumentos utilizados para recolha de dados
Descrição das atividades desenvolvidas
Discussão da validade interna
Discussão e justificação da análise dos dados efetuada

Resultados
Descriçã o e interpretaçã o dos resultados relativos a cada uma das questõ es ou
hipóteses.

Conclusões— e Recomendações
Discussão à luz da teoria das implicações dos resultados e seu significado
Recomendações de caráter científico ou prático
Sugestão para futuros trabalhos de investigação

Referências bibliográ ficas


Anexos (por exemplo, guiões e transcrições de entrevistas; formulários de questionários
e cartas de envio dos mesmos; documentos vários, etc.).

2.2.2. Revisã o crí tica de um Relatório de Investigação


1 - O problema de investiga ção está convenientemente definido e a pergunta de
partida adequadamente formulada?

19
Estado da arte - resumo atualizado da investigação já realizada sobre o tema.
20
Alguns autores aconselham a incluir antes da discussão das implicações dos resultados um
breve sumá rio das questões de investigação, dos procedimentos adotados e dos resultados
obtidos.

© Universidade Aberta 236


II. Aprofundamento Temático

2 - A relevância do estudo é evidenciada? É lógica ? É suficiente? É indicado como


é que os resultados do estudo terão implicações tanto ao nível teórico, como
prático?

3 - As questões ou hipó teses de investigação estão claramente formuladas? São


apropriadas?
É possível responder à s questões de investigação?
As hipóteses de investigaçã o podem ser testadas?

4 - Os conceitos utilizados e termos empregues sã o claros e nã o oferecem qualquer


ambiguidade na interpretação?

5 - A revisão da teoria é adequada e atual?

6 - A investiga ção realizada anteriormente acerca do mesmo assunto é


convenientemente referida? Existe articulação entre ela e o tema da presente
investigação?

7 - 0 plano de investigaçã o está bem apresentado e descrito? Parece adequado


à investiga ção que foi realizada ?

8 - Se o tipo de estudo exigiu ou foi aconselhável a constituiçã o de uma amostra,


que tipo de amostra foi utilizada? É uma amostra aleatória ? Se o não for, está
claramente definido o processo de seleção utilizado? 0 autor recomenda implícita
ou explicitamente a generaliza ção dos resultados a uma dada população? No
caso afirmativo, a população está bem determinada ? São discutidas as eventuais
limitações do estudo, nomeadamente no que respeita à generalizaçã o dos
resultados?

9 - As técnicas e os instrumentos de pesquisa utilizados estão devidamente


caracterizados? São indicadas a sua validade e fiabilidade? Em que medida é que
inferências baseadas nos instrumentos merecem credibilidade científica?

10 - 0 autor faz uma descrição pormenorizada das atividades realizadas?

11 - Quais as ameaças evidentes à validade interna do estudo? Foram devidamente


controladas? Ou, pelo menos, discutidas?

12 - Os instrumentos e os processos de recolha e an á lise de dados estã o


convenientemente descritos?

13 - Os dados estão sintetizados e foram apresentados com clareza? As estatísticas


(descritivas e inferenciais) foram bem utilizadas? A sua interpretação é correta ?
São discutidas as respetivas limitações?

© Universidade Aberta 237


II. Aprofundamento Temático

14 - Os resultados e a discussão dos mesmos estã o claramente apresentados? A


discussão tem em conta a teoria e os resultados de anteriores investigações?

15 - As conclusões são satisfatórias? 0 autor integra o estudo num contexto mais


vasto? Reconhece as suas limitações? Apresenta explicações e interpretações
para os resultados consistentes com os conhecimentos existentes?

16 - O autor apresenta recomendações e sugestões pertinentes para futuras


investigações?

17 - A linguagem é clara e rigorosa ?

18 - A apresentação gráfica é adequada?

19 - A bibliografia relevante para o tema é citada? As referências bibliográficas


aparecem convenientemente apresentadas, respeitando o adequado ordenamento
sequencial?

20 - Nos anexos estão incluídos todos os documentos necessários para que se possa
fazer um juízo crítico dos procedimentos adotados e dos resultados a que o autor
chegou?

Atividade 11.1
Procure encontrar uma dissertação de Mestrado sobre um tema que lhe interesse
e tente fazer a sua crítica atendendo aos aspetos anteriormente indicados. Se
não conhece em profundidade o tema da disserta ção ser- lhe-á difícil realizar
uma crítica aos pontos 5 e 18, mas isso não o impedirá de fazer uma avalia ção
metodológica ao seu conteúdo tendo em atenção os restantes aspetos. Este
trabalho deverá ajudá -lo a elaborar o seu próprio trabalho de investigação.

Leituras complementares

ECO, Umberto
1991 Como se faz uma tese em Ciências Humanas, 5 a ed., Lisboa, Presença.

FRAENKEL, J. R . e WALLEN, N. E.
2006 How to design and evaluate Research in Education, New York, McGraw-Hill.

LOCKE, L. R, SPIRDUSO, W. W. e SILVERMAN, S. J.


2007 Proposals that work: A guide for planning dissertations and grant proposals,
Thousand Oaks, CA, USA, Sage.

© Universidade Aberta 238


II. Aprofundamento Temático

RUDESTAM, Kjell E . e NEWTON, Rae R .


2007 Surviving Your Dissertation - A Comprehensive Guide to Content and Process,
3 rd ed., Thousand Oaks, CA , USA, Sage.

SOUSA, Maria J. e BAPTISTA, Cristina S.


2011 Como Fazer Investigação, Dissertações, Teses e Relatórios Segundo Bolonha,
2 a ed., Lisboa, Pactor.

SWETNAM, D. e SWETNAM, R.
2010 Writing your Dissertation, 3rd ed., How To Books, Oxford .

© Universidade Aberta 239


BIBLIOGRAFIA GERAL

AFONSO, Natércio ( 2005), Investigação Naturalista em Educaçã o. Um guia


prá tico e crí tico, Porto, Edições ASA, 223 pp.

ALMEIDA, João F. e PINTO, José M. (1995), A Investigação nas Ciências Sociais,


Lisboa, Presença, 170 pp.

ALZINA, Rafael B. ( 2004), Metodologia de la Investigación Educativa, Madrid,


Editorial La Muralla, 459 pp.

AMARO, Fausto ( 2008), Grounded Theory: uma introduçã o, in Meirinho Martins,


Manuel (2008, org.), Comunicação e marqueting político: contributos
pedagógicos, Lisboa, ISCSP.

AZEVEDO, Carlos A . (1994), Metodologia Cientí fica. Contributos Prá ticos para a
Elabora çã o de Trabalhos Académicos, Porto, C. Azevedo.

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Duculot, 160 pp.

BARANANO, A. ( 2004), Métodos e Técnicas de Investigação em Gestão, Lisboa,


Sílabo.

BARDIN, Laurence (1977), L'analyse de Contenu, Paris, P.U.F., 233 pp.

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BOGDAN, Robert e BIKLEN, Sari (1994), Investigaçã o Qualitativa em Educação.


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Bibliografia geral

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Sociologue, Paris, Mouton, 357 pp.

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• Proquest: http: //search.proQuest.com / socialsciences/ index?accountid= 44269

• Biblioteca do conhecimento on-line: http: //www.b-on.pt/


• Repositório da Universidade Aberta : http: / /repositorioaberto.univ-ab.pt/
• Pá gina da Universidade de Aveiro com catálogo coletivo; pesquisa em catálogos
de muitas universidades/ bibliotecas portuguesas e estrangeiras): http: / / cc.doc.
.
ua pt

• Catálogo coletivo do Ensino Superior francês: www.sudoc.abes.fr


• Catálogo coletivo do Ensino Superior britânico: http: / /copac.ac.uk
• Catálogo coletivo do Ensino Superior espanhol: http:/ /rebiun.crue.org
• Catálogo da British Library: http:// cataloaue.bl.uk
• Catálogo da Biblioteca do Congresso: http:// cataloq.loc.gov
• World Values Survey: http:/ / www.microsofttranslator.com/
bv.aspx?ref= SERP&br = ro&mkt =pt-PT&dl = pt&lp= EN PT&a = http%3a% 2f% 2f
worldvaluessurvev.ora% 2f

• European social survey: http : / /www.europeansocialsurvev.ora /

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• Biblioteca Nacional de Portugal: www.bn.pt
• Biblioteca Virtual: bva.udc.es
• California Digital Library: californiadiQitallibrary.org
• Human Rights: wwwl.umn.edu /humanrts
• IDRC Library (Desenvolvimento: www.idrc.ca/library
• Internet Public Library: www.ipl.org
• eBooksbrasil: www.ebooksbrasil.com

• John F. Kennedy: www.cs.umb.edu/ifklibrarv


• LibDex (índice para localizar mais de 18 mil bibliotecas do mundo todo e seus
sites): www.libdex.com

• Oxford Digital Library: www.odl.ox.ac.uk


• The British: www.bl.uk
• The New Zealand Digital Library (arquivos sobre questões humanitárias): www.
sadl.uleth.ca / nz/ cai-bin /librarv

• LIT Library Online (mapas): www.lib.utexas.edu

© Universidade Aberta 250


ANEXOS

O CONTRIBUTO DO ENSINO DO INGLÊS PARA A AQUISIÇÃO


DE UMA COMPETÊNCIA INTERCULTURAL POR PARTE
DOS ALUNOS DO 3° CICLO

SÍ LVIA DA CONCEIÇÃO JÓIA ALMEIDA

1. TÍTULO:

O Contributo do Ensino do Inglês para Aquisição de uma Competência Intercultural por


parte dos Alunos do 3o ciclo.

2. DEFINIÇÃO DO PROBLEMA:

Pergunta de Partida: A abordagem cultural no ensino atual da língua inglesa promove


uma compreensão do universo cultural dos povos anglófonos ou uma simples memorização
de estereótipos?

Os objetivos, os conteúdos e a metodologia adotados para o ensino das línguas


estrangeiras têm sido sujeitos a alterações. Estas modificações encontram-se dependentes
principalmente de/ da:
1. Circunstâncias políticas, económicas e sociais;

2. Desenvolvimentos teóricos no que concerne à natureza da língua e à sua


aquisição;

3. Experiência, intuições e opiniões dos professores em relação à sua prática.

Torna-se difícil medir a influência que cada um destes fatores exerce na organizaçã o do
ensino das línguas estrangeiras, pois eles próprios se encontram interrelacionados. No
entanto, tem-se dado uma maior ênfase à ligação entre o segundo fator e as mudanças
verificadas na pedagogia das línguas.

Com o intuito de obtermos uma visão global dessa relação, tentarei esquematizar o
percurso de ambos os fenómenos realizado no século XX.

© Universidade Aberta 251


Anexos

Como se pode verificar pela análise do quadro, as correntes tradicionalista, estruturalista


e behaviorista privilegiavam a forma em detrimento do uso que só mais tarde, com as
teorias dos mentalistas, e mais nomeadamente dos sociolinguistas, vingaria no ensino das
línguas. A abordagem do potencial cultural dos povos, cuja língua era ensinada, diversificou
de acordo com as correntes teóricas e os respetivos métodos de ensino.

TEORIAS SOBRE A NATUREZA DA


M ÉTODOS DE ENSINO
LINGUAGEM E SUA AQUISIÇÃ O

—> Até aos anos 20:

Corrente Tradicional: 0 M étodo da Gram á tica Tradicional ou Estilo


A língua era o fruto do uso de um conjunto de regras Académico:
.
gramaticais Um bom domínio destas resultaria numa
Obietivo aeral :
correta utilizaçã o da língua.
0 aluno deve adquirir uma competência linguística
Privilegiava-se o có digo escrito, pois a linguagem
atrav é s de um bom conhecimento das regras
falada tinha a tendência para degenerar em formas
gramaticais.
coloquiais.
Técnicas:
, ,
Recorria -se no ensino ao uso de uma gramática
prescritlva, através da qual se julgava a correção/a
- Leitura de textos.
incorreçã o da produçã o do aluno . - Explicação de pontos gramaticais .
.
- Exercícios escritos de gramá tica
- Tradu çã o de textos ou de listas de
vocabulário.

- 0 professor é visto como fonte de conhecimento;


controlando todo o processo desenvolvido na
aula.
De 1920 a 1950:

Corrente Estruturalista : 0 M étodo Tradicional continuou a ser uma


A Eíngua não é considerada por aquilo que está escrito .
constante neste período No entanto, modificações
.
mas sim pelo que é falado 0 conjunto de regras devidas à perspetiva estruturalista iam sendo
gramaticais da língua devem provir dum estudo sobre integradas atravé s da ado çã o de uma gramá tica
a linguagem falada. estrutural/ descritiva e exercícios com tabelas de
Passa - se da gramá tica prescritiva para a descritiva . substituição que já promoviam a pr á tica oral.
Definem -se unidades linguísticas com determinadas
fun çõ es que quando s ã o combinadas segundo
padr ões sistemá ticos (lei da frequência ) são capazes
de formar frases .

© Universidade Aberta 252


Anexos

De 1950 a 1970:

Corrente Behaviorista: O Método Audiolingual:


A natureza da língua continua a ser perspetivada
Objetivo Geral:
segundo princípios estruturalistas. O aluno deve usar oralmente as estruturas
linguísticas adequadas à s situações do dia a
A inovaçã o reside na ideia de que as estruturas da
língua sã o adquiridas pelo homem através de uma
.
dia
pr ática de repetiçã o do modelo que motiva a criação
Técnicas:
.
de há bitos linguísticos
- Audição de diálogos.
- Repetiçã o e representa çã o dos diá logos
ouvidos.
- Repetição de estruturas gramaticais e algum
vocabulário .
- Exercícios com tabelas de substituição .
- O professor controla todas as atividades.
— > de Finais dos Anos 60:
Corrente Mentalista: Q Método Comunicativo:
- Chomsky : A aquisição da linguagem não depende
basicamente de estímulos ambientais/ sociais Objetivo geral:
mas é o resultado da interiorização do sistema O aluno deve ser capaz de conhecer a linguagem e
da lí ngua que permite ao homem produzir frases saber usá -la adequadamente à situação (adquirir
.
originais Cada ser possui um mecanismo interno uma competência gramatical e social).
da aprendizagem da língua que o ajuda a reter
inconscientemente as regras gramaticais que ele Técnicas:
usar á na construção do seu discurso. - Criar um contexto comunicativo o mais similar
possível ao da realidade .
- Promover a comunicaçã o, desde o início,
Corrente Funcionalista: através de uma fase de "aquecimento ': recurso
1

- Halí iday: A dimensão social da linguagem nã o deve às experiências dos alunos.


ser descurada, A linguagem é um sistema social . - Apresentar vocabulário ou uma estrutura por
Cada um de nós faz escolhas ao falar, estando estas meio de uma contextualizaçã o em forma de
dependentes da situação. Estas escolhas sã o feitas um texto ou de uma audição de uma entrevista
de acordo com as funções que queremos que a ou conversa.
linguagem cumpra, - Explorar a compreens ã o por meio de
- Austin e Sarle: A linguagem possui um poder questões.
.
performativo N ó s fazemos coisas com a - Praticar as estruturas relevadas de uma maneira
linguagem . gradativa .
- Hymes : O homem n ão possui apenas uma - Utilizar as estruturas em situações criadas de
compet ê ncia gramatical, tal como Chomsky comunica çã o ( podendo incluir- se atividades
comprovou, mas também tem interiorizada uma escritas como por exemplo a escrita de uma
competência comunicativa, isto é, um conhecimento carta).
de como usar a linguagem apropriada à s atividades/ - O professor modifica o seu papel gradualmente
.
as situações às quais o indivíduo quer participar de controlador a orientador,

Uma breve aná lise do programa de inglês ministrado em Portugal a partir de 1954 parece
confirmar a tendência metodológica manifesta nas correntes mencionadas. No que respeita
à parte linguística, revela-se o recurso a uma metodologia tradicional mas já inspirada
pelos preceitos estruturalistas. A gramática prescritiva já não é modelo na medida em
que o aluno deveria adquirir a língua que se falava e escrevia na Inglaterra. Interessante
notar que a escrita e a oralidade são os "skills" que deveriam ser exercitados. Embora

© Universidade Aberta 253


Anexos

seja dada uma atençã o particular ao ensino da fonética (influência estruturalista), as


atividades de "listening" (audição) sã o completamente inexistentes , o que nos indica um
afastamento de uma prática audíolingual. Contudo, tendências behavioristas revelam -se
claramente através do recurso à repetição oral de fonemas, palavras e expressões difíceis.
-^
A cópia também figurava no role das estratégias de repetição f memorização em "moda"
na pedagogia das línguas.

Com o intuito de não fugir à questão cultural no ensino das línguas, denota-se, neste
programa, um certo alheamento à veicula ção de informa ção cultural no 2o ciclo, que
compreendia o 3o, 4o e 5o anos do liceu, e uma grande preocupação no cumprimento
dessa tarefa no 3o ciclo, ou seja, nos 6o e 7o anos. Tal como o programa propõe:

"Neste curso pré-universitário procura- se dar ao aluno conhecimento mais profundo


da língua inglesa e revelar-lhe os aspetos gerais da civilização e da cultura da
Inglaterra, incluindo as suas projeçõ es nos Estados Unidos da América ." (p. 86)1

Contudo, esse conhecimento não parece incluir uma interpreta ção cultural profunda
veiculada pelo confronto com a cultura do próprio sujeito da aprendizagem. Esta observação
advem da interpreta ção do seguinte comentário que, embora esteja relacionado com a
língua, deixa transparecer a atitude dos pedagogos perante a cultura que pretendiam
esboçar:

"Quanto ao sentimento nacional e próprio da língua " (refere-se à língua inglesa )

"(...) não será isso, por certo, objetivo possível de alcançar no â mbito dos estudos
liceais" (p. 75).

Os programas colocados à experiência em 1975 e entrados em vigor em 1982 foram


construídos com base nos desenvolvimentos teóricos da linguística. A sua organização
sugere o uso do método comunicativo. Quanto à preocupaçã o cultural, ela é manifesta
atrav és das áreas tem á ticas cujos textos deveriam incidir.

Encontramos vários aspetos designados como culturais para abordar no 8o ano, como por
exemplo: os monumentos, os usos e costumes, as festividades, os feriados, os desportos,
etc.. Todavia, nos objetivos que o aluno deve atingir, não existe qualquer menção à
aquisição de uma competência cultural.

Numa avaliação feita por Maria do Carmo Clímaco ao programa de inglês do Ciclo
Preparatório, em 1986, nota -se que a estereotipagem ainda era uma constante no ensino
da língua no nosso país:

1 s . a. (1954 ) : Programas do Ensino Liceal, Lisboa, Imprensa Nacional de Lisboa .

© Universidade Aberta 254


Anexos

"Embora se diga (...) que o aluno através da aprendizagem deve «participar do


modo de viver do povo cuja língua está a aprender», a língua não aparece nem
como instrumento de comunicação nem como veículo de uma cultura, mas como
.
pretexto de Informação cultural a memorizar A perspetiva integrativa é ignorada,
ou seja, não se parte das experiências culturais do próprio aluno para a compreen
¬

são das culturas estrangeiras."-

Este parecer crítico deve ter sido tomado em consideração na feitura dos novos programas
de inglês, tanto para o nível básico como para o secundário. O que de mais inovador
surge nesta proposta programática é a ideia de uma aprendizagem da língua como um
processo de autoconhecimento atrav és de um confronto com os outros/com o mundo.
Será que estamos perante a perspetiva integrativa que a autora atrás mencionada referiu
no seu comentário ?

O grande tema organizador do ensino da língua inglesa é O MUNDO EM QUE VIVEMOS.


Com o intuito de se orientar o aluno para o processo de autoconhecimento a que ele
deverá ser sujeito, o programa propõe um percurso gradativo que tenha por base a ÁREA
DE EXPERIÊNCIA DO ALUNO. Neste caso, o 2 ciclo deverá dedicar ao Eu e a minha
°
comunidade: espaços epessoas, o 3o ciclo: Eu ea comunidade alargada: organização e
formas de relacionamentoe o secundário: Eu, cidadão dopais, da Europa e do Mundo.
Os campos de incidência nestas áreas de experiências são no 2o ciclo: Identidade, no 3o
ciclo: Identidade versus Diferença e no ensino secundário: tradição versus modernidade
e heterodoxias.

Mais do que nunca, o que subjaz à aquisição de uma competência comunicativa é uma
série de outras competências, na qual se inserem a competência sociolinguística e a
intercultural. Sem a aquisição destas, a competência comunicativa nã o se alcança ou é
deficiente.

Gail Nemetz Robinson, professora norte americana, demonstra, na sua obra Crosscuiturai
Understanding, a esperança de através do ensino das línguas estrangeiras se poder
promover a interiorização de princípios de compreensão mútua entre culturas. Esse grande
objetivo deverá ser conseguido pela elaboração de currículos que perspetivem a língua
como cultura, aliás porque a competência comunicativa inclui conhecimento de certos
fenómenos socioculturais.

A referência bibliográ fica incluí da nestes novos programas não indica que os seus autores
tenham lido as ideias de Gail Robinson; no entanto, as mesmas encontram eco claro na

2
An á lise da Situação Programas, p. 213.

© Universidade Aberta 255


Anexos

organização do programa, nos objetivos do ensino e na orientação metodológica para o


desenvolvimento curricular:

"A aprendizagem da língua inglesa, pela apropriação de competências de tipo


comunicativo, determina ainda uma abordagem intercultural, em que o aluno parte
da sua própria língua e cultura para a descoberta da língua e das culturas dos povos
de expressão inglesa. Deste modo, desenvolve a sua competência sociocultural, o
que é imprescindível ao desenvolvimento da sua capacidade de comunicar, visto
que a utilização de uma língua implica o recurso a um quadro de referências que
é, pelo menos parcialmente, determinado pelo contexto sociocultural no qual essa
língua é utilizada pelos nativos. Para além disso, a análise contrastiva que faz da sua
realidade e da dos povos de expressão inglesa permite-lhe um melhor entendimento
de uma e outras, do que resulta por um lado uma atitude de tolerâ ncia e respeito
pelas diferenças e por outro a relativização dos valores e dos significados da sua
. .
pró pria cultura " { p 64)3

3. QUESTÕES/ OBJETIVOS DA INVESTIGAÇÃO:

Através das poucas leituras e breves análises feitas, pude observar que o ensino da língua,
até há pouco tempo, renunciava a uma abordagem cultural e, quando a promovia, acabava
por ser superficial e por criar /ensinar estereótipos.

Os novos programas de inglês enfatizam a importância de um conhecimento cultural dos


outros povos mas sob uma perspetiva mais profunda e realista.

A análise fulcral do estudo empírico terá de focalizar principalmente a descrição de uma


situa ção inicial, ou seja o conhecimento que os alunos terã o da cultura dos povos, cuja
língua aprendem, e as suas atitudes perante essas culturas.

Em seguida, tornar-se-á pertinente observar como esta abordagem sociocultural proposta


nos programas novos é feita nas aulas e como reagem os alunos.

Por último, deverá ser verificado novamente o conhecimento sociocultural que os alunos
possuem e as atitudes perante os outros povos e a sua cultura. Se houver mudanç as de
comportamento, pressupõe-se que a aplicaçã o do programa é viável, não só do ponto
de vista metodológico, como pelos objetivos que propõe. Se não houver mudanças
observadas, poderá significar principalmente falhas no processo de ensino, provavelmente
devidas:

3
Departamento de Educação Bá sica ( 1995): Programas de Inglês - 3o Ciclo LE I e II, Lisboa,
Ministério da Educação.

© Universidade Aberta 256


Anexos

- à falta de compreensão dos professores do novo programa;


- à falta de consciencialização ou prepara ção dos professores para operacionalizar
esta conceptualização do ensino da língua.

Antes da realização do trabalho empírico, terei de cumprir os seguintes objetivos para


que me proporcionem um quadro de referência teórico à investigação:
a) Comparar como as diferentes formas de perspetivara língua estrangeira focalizaram
a componente sociocultural.

b) Verificar de que maneira os manuais escolares atuais refletem os objetivos de


vertente sociocultural expostos nos novos programas ( Análise dos manuais com os
quais as turmas objeto de observaçã o trabalham).

c) Realçar/Destacar indicadores de observação para as diversas variáveis.

E como objetivos gerais para uma segunda parte:


d) Analisar como o conteúdo sociocultural é abordado na aula.

e) Analisar os resultados desta transmissão sociocultural na atitude dos alunos perante


os outros.

4. RELEVÂNCIA DO ESTUDO:

a) Aumentar o número reduzido de trabalhos de investigaçã o na área das didáticas


das línguas estrangeiras.

b) Realçar a importância do ensino da língua como meio de educação intercultural.

c) Clarificar a organização dos novos programas, permitindo a sua utilizaçã o de uma


forma prática e correta.

d) Ajudar a desmontar hábitos acomodativos de perspetivar a língua estrangeira.

5. REVISÃO DA LITERATURA (teses de mestrado ):

Na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação existem várias teses de mestrado


cujo enfoque tem á tico se direcionou para a educação; no entanto praticamente nenhum
destes trabalhos se centralizou no ensino das línguas. O único estudo encontrado nesta
área denomina -se Prepara çã o de Professores de Inglês para fins específicos: Uma
Necessidade?. Esta tese foi elaborada por Maria Júlia Ferreira Barros Guarda Ribeiro,
defendida em 1991, e destinava-se essencialmente a analisar a situação do ensino da

© Universidade Aberta 257


Anexos

língua inglesa que incide sobre áreas temáticas específicas como a de ciências e a de
tecnologia. Tal como o próprio título indica, a preocupaçã o da autora incidiu sobre a falta
de professores formados para estes cursos de inglês.

Embora o estudo se revele inovador e executado com profundidade e rigor, ele é pouco
pertinente para o trabalho que pretendo realizar. A faceta sociocultural que se pretende
desenvolver no ensino básico e secundário não é incluída no role de objetivos para
estes cursos especializados. Contudo, questões levantadas nesta análise poderão servir
igualmente como objeto de exploração na minha dissertação, salvaguardando a devida
adaptação ao tema; são elas:
• A preparação dos professores.
• A relevância e adequação dos materiais.
•A pertinência das atividades desenvolvidas na sala de aula para os fins
desejados.

• O resultado do ensino nos alunos.


Uma outra dissertaçã o de mestrado à disposição na mesma faculdade e que mereceu
ser alvo de alguma atenção intitula -se Caracterização de Aulas de Tipo Interrogativo -
Contributo para a Pesquisa dasFunções dos Alunos, elaborada por Maria Teresa de Jesus
da Silva do Rio Carvalho. A autora desta tese intentou verificar até que ponto as aulas de
tipo interrogativo colocam realmente o aluno no centro do processo de aprendizagem.
Após uma análise metodológica baseada na observação direta, a autora descreve o método
interrogativo como uma ilusão pedagógica. Conclui que:

"As interrogações parecem assim terem, muito mais, o objetivo de manterem o


aluno atento do que fazê-lo efetivamente participar na sua própria formação e na
. . .
construção do saber " (p 206)

Esta deduçã o revela-se importante para a organização do meu estudo principalmente


por duas razões:
• Em primeiro lugar colocar-me-á a questão se a técnica da interrogação,
muito regularmente usada nas aulas de inglês, não promove a aquisição de
uma competência sociocultural. Deste modo, esta estratégia de ensino deverá
constituir um objeto de observa ção no meu trabalho empírico.

• Em segundo lugar, esta tese reforça nã o só a ideia da adequa ção da observação


direta no estudo de aulas como também coloca a disposição modelos de grelhas
de observação que serão tidas em conta na feitura da grelha mais pertinente
para os fins do meu estudo.

© Universidade Aberta 258


Anexos

Na Faculdade de Ci ências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa foi


defendida, em 1996, uma tese de mestrado cujo conteúdo, intitulado O Ensino das
Línguas no Secundário - Para uma Metodologia do Intercuiturai, a relaciona com o
meu projeto, uma vez que ambos abordam a aquisição de uma competência intercuiturai
por parte dos alunos. Este trabalho recente, elaborado por Ludmila Dismanová, analisa
as pontencialidades dos projetos de intercâmbio escolar e de cará ter internacional para
a formação de uma competência intercuiturai no aluno.

A autora deste estudo observou a concretização de um projeto de intercâmbio entre uma


turma de francês do 11 ano da Escola Secundária Marquês de Pombal, em Lisboa, e
°
uma outra do liceu Camille Jullian, em Bordéus; e concluiu que projetos desta natureza
promovem, entre outros aspetos positivos, o desenvolvimento das capacidades de
comunicação numa outra língua e a construção de uma personalidade culturalmente
consciente de si própria e do outro diferente de si.

Apesar do meu projeto diferir deste estudo na medida em que se direciona para o modo
como a competência intercuiturai é potencializada no espaço de sala de aula e no ensino
básico, a consulta a esta tese auxiliar-me-á com algumas pistas organízativas para :
• a construção de um enquadramento teórico do tema;
• a observação de atividades de aula descritas como promotoras de uma formação
intercuiturai.

6. FONTES POSSÍ VEIS DE CONSULTA:

Instituiçõ es Professores

Universidade Aberta Prof. a Doutora Laura Pires

Universidade de Aveiro Prof.a Doutora Isabel Alarcã o


Escola Superior de Educaçã o de Viseu Prof.a Doutora Mar ía José S á Correia

Universidade Católica Profa Doutora Isabel Casanova


Faculdade de Letras/ UL
Faculdade de Psicologia e Ciências da Educa çã o/ UL

Instituto Britânico

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas/ UNL


Lincoln Research Center
ISCTE

Universidade do Minho

© Universidade Aberta 259


Anexos

7. METODOLOGIA:

A ) Tipo de Investigação:
A investigação que mais se adequa a este estudo parece ser a qualitativa, pelas seguintes
razões:
•A aquisição de uma competência intercultural proposta nos novos programas
tem como fim uma mudança de comportamento. Se o fulcro da investiga ção é
captar como os alunos vã o encarando/ interiorizando as realidades que lhe são
apresentadas, tornar-se-á demasiado redutivo adotar um método unicamente
quantitativo, cujos instrumentos de recolha não só sã o incapazes de captar
vários aspetos do comportamento verbal e gestual, como também limitam a
espontaneidade e diversidade de opiniões.

B ) Instrumentos:
Com o intuito de analisar o conhecimento prévio dos alunos e bem como o conhecimento
posterior à abordagem sociocultural, pretendo elaborar questionários de perguntas
fechadas construídos de acordo com uma seleçã o de indicadores que proporcionem a
captação das atitudes que pretendo analisar.

As observações diretas ser ã o utilizadas na fase de observaçã o à s aulas. Estas


observações terão como instrumento orientador uma grelha de observação.

C ) Amostra / Sujeitos da Investiga çã o:


Se for possível, trabalharei sobre o processo de ensino/ aprendizagem de 2 turmas do
7o ano e 2 turmas do 8o ano de escolaridade. Sã o estes os anos do 3 o ciclo que estão
sujeitos à operacionaliza ção dos novos programas. Ainda dentro do campo das conjeturas
está o facto de pretender observar turmas que trabalhem com os manuais escolares mais
escolhidos pelas escolas do concelho de Sintra. A escolha das escolas estará dependente
da proximidade da minha residência. Quanto à s turmas, estas serão escolhidas de uma
forma aleatória.

D ) Análise e Tratamento de Dados:


Os resultados dos dois questionários serão descritos quantitativamente e sujeitos a
uma an álise comparativa para que se possa detetar a existência ou inexistência de uma
mudança de comportamento.

O tratamento da observação direta das aulas irá permitir compreender os mecanismos


que conduziram à mudança ou à inexistência da mesma.

© Universidade Aberta 260


Anexos

E ) Procedimentos:
Os procedimentos a seguir estão delineados no ponto três: "Questões e Objetivos da
Investigação" e nas alíneas anteriores a esta e que estã o enquadradas na Metodologia.

8. DEFINIÇÃO DE TERMOS:
* Programa; Curr ículo; Cultura; Competência; Competência Comunicativa;
Competência Linguística; Competência Sociolinguística; Competência
Sociocultural; Competência Intercultural; Estereótipos; Estereotipagem;
Interculturalidade.

9. REFERÊ NCIAS BIBLIOGRÁFICAS RELATIVAS:

A) AO TEMA:

s.a.
1996 Programas do Ensino Liceai, Lisboa, Imprensa Nacional de Lisboa.

BELL, ROGER T.
1981 An Introduction to Applied Linguistics - Approaches and Methods in Language
Teaching, London, Bastford Academic Eduacational Limited.

BRUMFIT, C. J.
1982 English For International Communication, Oxford, Pergamon Press.

BRUMFIT, C. J. e JOHNSON, K
1979 The Communicative Approach to Language Teaching,Oxford, Oxford University
Press.

CANALE, M.
1983 From Communicative Competence to Communicative Language Pedagogy,
London, Longman.

CANDLIN, C. N.
1981 The Communicative Teaching of English: Principles and an Exercise Typology,
London, Longman.

© Universidade Aberta 261


Anexos

CARREL, R, J. Denive e D. Eskey


1985 Interactive Approaches to Second Language Reading, New York, Cambridge
University Press.

CLARKE, A.
1988 The Rote of English in the 215tCentury; in E.L.T. Documents 128, The British
Council.

COOK, V.
1991 Second Language Learning and Language Teaching, London, Edward Arnold .
DAMEN, L.
1987 Culture Learning: The Fifth Dimension in the Language Classroom, Savignon,
Addison Wesley Publishing Company, Reading.

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO BÁSICA


1995 Programas de Ing/ês - 3o Cicio LEI e II, Lisboa, Ministério da Educação.

DIVISÃO DE PROGRAMAS E MÉTODOS


1982 Ensino Secundário - Inglês, Lisboa, Ministério da Educa ção.

ELLIS, R.
1992 Second Language Aquisition and Pedagogy, Clevedon, Multilingual Matters.

FISHER, G.; JUSTINO, L. J.; MARQUES, M. E. R.; PERALTA, M. H.; FIGUEIREDO, M. J.;
BARROSO, M. R.; BELO, M. T.
1990 Didática das Línguas Estrangeiras, Lisboa, Universidade Aberta.

GRANT, N.
1989 Making the Most of your Textbook, New York, Longman.

HUTCHINSON, T.
1987 "What's Underneath? An Interactive View of Materials Evaluation", in E.L.T.
Documents 128, The British Council, pp. 37-44.

JOHNSON, K.
1982 Communicative Syllabus Design and Methodology, Oxford, Pergamon Press .
JOHNSON, K.; MORROW, K.
1981 Communication in the Classroom, London, Longman.

© Universidade Aberta 262


Anexos

JOHNSON, R.
1989 The Second Language Curriculum, Cambridge, C.U.P.

KRAMSCH, C.
1993 Context and Culture in Language Teaching, Oxford, Oxford University Press,

LEGUTKE, M.; THOMAS, H.


1991 Process and Experience in the Language Classroom, Essex, Longman.

LOVEDAY, LEO
1982 The Sociolinguistics of Learning and Using a Non-Native Language, Exeter,
Pergamon Press.

MORRIS,I.
1956 The Art of Teaching English as a Living Language, London, Macmillan.

MORROW, K. e SCHOCKER, M.
1987 "Using Texts in a Communicative Approach", in ELT Journal, British Council
41/ 4:248-256.

MYRON, W. L; KOESTER, J.
1993 Intercuiturai Competence, New York, Harper Collins College Publishers.

PRESTON, D. R.
1989 Sociolinguistics and Second Language Aquisition, Oxford, Basil Blackwell.

RIVERS, W. M
1981 Issues in Second Language and Cross - Cultural Education: The Forest
Through the Trees, Boston: Heile & Heile Publishers, Inc.

ROBINSON, G. L.
1978 Language and Multicultural Education, An Australian Perspective, Sydney,
Australia and New Zealand Book Company.

ROBINSON, G. L. N .
1988 Crosscuiturai Understanding, New York, Prentice Hall.

SAVILLE, T.
1978 A Guide to Culture in the Classroom, Washington D.C., Center for Applied
Linguistics.

© Universidade Aberta 263


Anexos

SEELYE, H.
1978 Teaching Culture: Strategies for Foreign Language Educators, National
Textbook Co. in conjunction with ACTFL.

STEVICK, E. W.
1990 Humanism in Language Teaching, Oxford, O.U.P..

5TRECHT-RIBEIRO, O.
1990 Como se aprende uma língua estrangeira: crianças e adultos, Lisboa, Livros
Horizonte.

TARONE, E.; YULE, G.


1989 Focus on the Language Learner, Oxford, O.U.P..

TOMALIN, B.; STEMPLESKI, S.


1993 Cultural Awareness, Oxford, O.U.P.

VALDES, J. M.
1986 Culture Bound, Cambridge, Cambridge University Press.

VANEK
1986 "The Promotion of Autonomy", in Self Assessment of Foreign Language Skills,
Council of Europe Strasbourg, pp. 71- 79.

V ÁRIOS
1986 Análise da Situação - Programas, Lisboa, Ministério da Educação e Cultura
Gabinete de Estudos e Planeamento.

WIDDOWSON, H. G.
1978 Teaching Language as Communication, Oxford, Oxford University Press.

WIDDOWSON, H. G.
1990 Aspects of Language Teaching, Oxford, Oxford University Press.

WHORF, B. L.
1956 Language, Thought and Reality, Boston, M.I.T. Press.

ZARATE, G.
1993 Représentations de Pétranger et didactiques des langues, Paris, Didier.
1986 Enseigner Une Culture Etrangère, Paris, Hachette.

© Universidade Aberta 264


Anexos

B ) À METODOLOGIA DE INVESTIGAÇÃ O:

BRANNEN, J.
1994 Mixing Methods: Qualitative and Quantitative Research, Aldershot, Avebury,

BOGDAN, R.; BIKELEN, S.


1994 Investigação Qualitativa em Educação, Porto, Porto Editora.

COHEN, L; MANION, L.
1992 Research Methods in Education, Nova Iorque, Routledge.

ESTRELA, A .
1986 Teoria e Prática de Observação de Classes - Uma Estratégia de Formação de
Professores, 2o ed.,Lisboa,I.N.I.C.

FORTUNA, V.
s.d. Curso de Estatística, Lisboa, ISCSPU.

GHIGLIONE, R.; MATALON, B.


1993 O Inquérito. Teoria e Prática, Oeiras, Celta.

LEVIN, J.
1987 Estatística Aplicada a Ciências Humanas, S. Paulo, Harper and Row do Brasil.

PATTON, M.
1987 Qualitative evaluation and research methods, 2a ed., Newbury Park, Sage

SILVA, A. S.; PINTO, J. M.


1986 Metodologia das Ciências Sociais, Lisboa, Edições Afrontamento.

SILVERMAN, D.
1993 Interpreting qualitative data: methods for analysing talk, text and interaction,
Londres, Sage.

© Universidade Aberta 265


Anexos

10. CALENDARIZAÇÃO:
• Trabalho Exploratório: outubro, novembro, dezembro.
• Problemática e Construção do Modelo de Análise: janeiro e fevereiro.
• Observação: fevereiro e março.
• Análise das Informações: abril, maio e junho.
• Conclusão: julho e agosto.

© Universidade Aberta 266


Anexos

IMIGRANTES CABO- VERDIANOS EM ESPANHA .


QUE INTEGRAÇÃO?
BENVINDO DO ROSÁRIO

INTRODUÇÃO

Sempre tivemos como fito ao inscrevermo-nos neste Mestrado a elaboração de um trabalho


sobre a diá spora cabo-verdiana. Vivendo nós em Portugal, conhecendo razoavelmente bem
as características da comunidade cabo-verdiana aqui residente, e porque a informação e
os contactos estarão, naturalmente, mais disponíveis, a conjuga ção dos fatores facilidade
de acesso à informação/ tempo disponível levar-nos-ia a desenvolver um trabalho sobre
os cabo-verdianos residentes em Portugal.

Porém, e uma vez que desde há doze anos temos mantido, por via de relações de amizade
muito estreitas e de viagens frequentes, contactos com Espanha, país que para nós
sempre significou "bom vento" não obstante a imagem que nos foi transmitida por um
orientado ensino da História encerrar alguns preconceitos que retiram objetividade aos
factos, mudámos o rumo e começou a germinar a ideia de analisarmos as características
da imigração cabo-verdiana neste país.

Decidimos, assim, embora mantendo o interesse em trabalhar com a nossa comunidade


de origem, desviar a atenção um pouco mais para leste e debruçarmo- nos sobre uma
realidade eivada de um certo mistério para a maioria dos cabo-verdianos que se preocupam
com estas questões - em Espanha, com particular destaque para as minas escondidas nas
montanhas de EI Bierzo, León, para a costa norte da Galiza, para a sua capital, Madrid, e
para Saragoça (neste caso não conseguimos disfarç ar a surpresa) vivem cabo-verdianos
que, levados pelos ventos do acaso, alguns, voluntariamente, outros, trabalham, sofrem,
riem, dançam ao som das mornas e das coladeiras e comem catchupa e cuscuz. E falam
das suas ilhas.

PRÉ- PROJETO DE DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

1. Título (provisório )

PERCURSOS DE INTEGRAÇÃO DA COMUNIDADE CABO- VERDIANA


DE EL BIERZO, LEÓN, ESPANHA

© Universidade Aberta 267


Anexos

2. Definiçã o do Problema

Cabo Verde é um país de emigração. As condições climatéricas do arquipélago,


particularmente adversas devido à seca, ditam o afastamento de muitos cabo-verdianos
que partem " para terra iongé’ à procura de melhores condições de vida. Esta imensa
diá spora, que leva a que residam no estrangeiro mais cabo-verdianos do que aqueles que
vivem em Cabo Verde, tem-se espalhado pelos quatro cantos do globo, com particular
destaque para Portugal (cerca de 40 000 imigrantes legalizados e cerca de 100 000
clandestinos e naturalizados, segundo estimativa recente feita por Arnaldo Andrade,
sociólogo e deputado Cabo-verdiano pela Emigração), país para onde o grande movimento
de entrada de migrantes cabo-verdianos se iniciou nos finais dos anos 60, como forma
de colmatar a saída de emigrantes Portugueses para Franç a e a ida de soldados para a
guerra colonial; Holanda e EUA são outros países onde a comunidade cabo-verdiana é
significativa.

Este afastamento físico não é sinónimo de afastamento total; por regra o cabo-verdiano
continua muito ligado à sua terra natal. Expressão do apego que os cabo-verdianos têm
à sua terra é o grande peso que as remessas dos emigrantes têm na economia do país.

A diáspora cabo-verdiana, a exemplo de muitas outras, tem as suas características próprias,


sendo mais ou menos coesa, mais ou menos participativa nas sociedades recetoras (em
Portugal os cabo-verdianos são particularmente ativos e dinâmicos, tendo o movimento
associativo um peso considerável na forma como se organizam), mantendo ou não os
valores culturais, integrando-se ou excluindo-se. No que se refere ao caso português, e sem
eliminar a possibilidade de existência de grupos com outras características que não estas,
poder-se-á falar de dois grupos distintos: aqueles que estão perfeitamente integrados na
sociedade recetora, embora mantendo os seus valores culturais (v.g. a música, a língua,
a culinária...) e aqueles que estão marginalizados económica e socialmente.

As comunidades imigrantes são caracterizadas de acordo com a imagem que delas é


feita : os imigrantes portugueses em França, por exemplo, têm fama de trabalhadores.
Sobre a comunidade cabo-verdiana nos Estados Unidos, diz Deirdre Meintel:" In America,
ícan community has been a successful one from the point of
the Capeverdean-Amer
view of the wider American society and from that of the immigrants as well. They
avoided welfare, became homeowners, and gained a reputation for hard work and
dependability' -. Esta não será, por outro lado, a imagem que existe do cabo-verdiano
em Portugal, uma vez que aquela foi ditada ao longo dos anos por uma visã o deturpada

4
Meintel, Deirdre. Race, Culture, and Portuguese Colonialism in Cabo Verde, Syracuse University,
New York, 1984.

© Universidade Aberta 268


Anexos

e muitas vezes explorada de forma algo inconsciente pela própria imprensa, através de
notícias que punham em destaque a origem étnica de quem cometia os desacatos.

No que diz respeito aos cabo-verdianos residentes em Espanha, embora nã o sejam


expressivos em termos numéricos, a sua distribuição está perfeitamente definida em
termos espaciais, sendo as áreas onde existem em maior número e as respetivas ocupações
dominantes as seguintes:

Castilla y León - mineiros (o núcleo mais expressivo em termos numéricos);

Madrid - imigra ção maioritariamente feminina (a exemplo do que acontece com


a imigra ção cabo-verdiana para Itália), sendo a maioria domésticas;

Saragoç a - trabalhadores da construção civil;

Lugo - pescadores.

O fator tempo, aliado a outros de n ã o menos importância, não nos permite debruçarmo-
-nos sobre todos os núcleos a que nos referimos. Assim sendo, optámos por direcionar o
nosso trabalho para a comunidade cabo-verdiana de EI Bierzo, zona situada no noroeste
da província de León, núcleo constituído na sua quase totalidade por mineiros e analisá-
-la na perspetiva da sua adapta ção à sociedade recetora, ou seja, pretendemos saber
quais as formas e percursos de integração destes imigrantes nos núcleos em que estão
inseridos. Esta delimitaçã o do objeto de estudo também tem a ver com o facto de estar
a ser elaborada tese sobre os cabo-verdianos residentes em Laciana (leste da província)
por uma investigadora espanhola.

3. Questões / Objetivos da Investigaçã o

As diferentes formas de reação coletiva ou individual no que concerne à inserção dos


imigrantes nas sociedades recetoras, têm sido analisadas por diversos autores. Desde a
assimilação até à marginalização, várias são as atitudes, quer seja da parte dos autóctones,
quer seja do lado dos próprios imigrantes, que levam a que se definam as formas de
relacionamento dos distintos grupos de acordo com aqueles princípios e que condicionam
a inserção dos estrangeiros num novo esquema de rela ção social e económica, numa
nova realidade. No que se refere aos modelos de integração são comumente aceites dois
conceitos5:

5
Aragon Bombin, Raimundo "Hacia una política ativa de Inmigración',
' in Revista de Economia y
Sociologia, n 11, p. 101, Madrid, março 1991.
°
© Universidade Aberta 269
Anexos

Modelo puré- O objetivo é conseguir um conjunto o mais homogéneo possível, no


qual as diferenças tendam a diminuir, conseguindo-se uma aceitaçã o generalizada
dos valores predominantes na sociedade de acolhimento. É o chamado melting
pot

Modelo salada - Pretende-se conseguir uma mistura harmoniosa, em que se


combinem as diversidades culturais, linguísticas e sociais, sem se imporem
regras ou valores sociais sobre outros, por forma a conseguir-se uma sociedade
diferenciada, respeitadora das minorias e animada pela variedade linguística,
cultural e social.

Obviamente que estes modelos não se esgotam em $i próprios, pelo que na prática
coexistirão, por vezes, elementos de ambas as perspetivas. A inserção das comunidades
imigrantes, passa, assim, pelo maior ou menor envolvimento desses grupos no seio
da sociedade recetora e pela rejeição/aceitação/adaptação dos valores dessa mesma
sociedade. A integração plena - podendo isto significar concomitantemente a preserva ção
dos valores de origem e a adaptação dos da sociedade recetora - depende, em larga
medida, do primeiro impacto, da predisposição em assumir essa integração e, nã o menos
importante, das razões que motivaram a saída: no caso em análise a imigração é na sua
totalidade económica, logo, forçada e motivada pela procura de melhores condições de
vida.

Ao pretendermos, com este estudo, analisar os sistemas de integra ção dos imigrantes
cabo-verdianos da zona de EI Bierzo, província de León, pretendemos, concomitantemente,
avaliar o grau de integração percebido por essa mesma sociedade, através de indicadores
vários, como sejam:

De natureza económica - p. ex.: acesso ao mercado de trabalho;

Social - Participação social efetiva na sociedade recetora, aceitação/recusa


das normas sociais, número de casamentos mistos, intenção de residência
permanente no país...;

Educativa - Duas citações dão conta da extrema importância desta variá vel no
processo de adaptaçã o dos imigrantes ao meio que os acolhe:

" (...} alguns estudos têm demonstrado que entre as variáveis consideradas; o nível
de instrução parece ser aqueie factor que mais influencia o estatuto ocupacionai, a
mobilidade social e o rendimento dos migrantes';6

6
Rocha-Trindade, Maria Beatriz, Sociologia das Migrações, p. 102, Universidade Aberta, Lisboa,
1995.

© Universidade Aberta 270


Anexos

íntegrazione, in una societá cosi compiessa


" Cosdenti che 1'ostacolo prindpale aif
come que/fa italiana, é costituito da! basso livello scotastico, te immigrate
esprimono un interesse sempre maggiore per 1'istruzione í
fnalizzata alia formazione
professionale.' -

Qual o nível de instrução dos imigrantes? Quais os mecanismos (a existirem) que permitem
a igualdade de acesso à educaçã o e o colmatar das diferenças sociais a que, por natureza,
os imigrantes estão sujeitos?

Linguística - Lugar da língua e cultura maternas, apoios concedidos as crianças


imigrantes [ no sentido de ultrapassarem eventuais dificuldades de domínio do
castelhano ]; apoios concedidos pelos Governos Português e/ ou Cabo-verdiano no
ensino do Português,^ que língua(s) falam os cabo-verdianos em Espanha? - existe
um fenómeno semelhante ao caso português em que as regras gramaticais do criouio
são aplicadas ao castelhano, transformando ambas as línguas numa terceira?

Porque igualmente paradigmática da importância desta questão [linguística],


gostaríamos de citar A. M. Correia de Matos: "Não dominar a língua do país receptor
representa, no caso do imigrante, um duplo estatuto de dominado: não só se é
estrangeiro ( reforçado peio facto de se ser etnicamente diferente) como também
não se possui os instrumentos - recursos intelectuais e económicos - que possam
minimizar aquela distância (entre estrangeiros e autóctones)” * .

4. Relevância do Estudo

Alguns dos núcleos que compõem a diá spora cabo-verdiana têm sido, ao longo dos anos,
objeto de análises sociológicas, antropológicas e linguísticas. No que diz respeito a Espanha
não foi feito nenhum estudo global e aprofundado desta comunidade migrante.

7
Jesus, Maria de Lourdes, Marzot, Mario, et all, Capo Verde, Una Storía Lunga Died Isole,
.
D'Anselmi Editore, Milano, 1989
8
Numa das nossas passagens por Espanha contactámos os dirigentes de uma Associação
Caboverdeana da zona de León que nos deram conta dum projeto de alfabetização de adultos
(portugueses e caboverdeanos) a ser apoiado pelo governo português.
9
Matos, Ana Maria Saint-Maurice Correia de, Reconstrução das Identidades no Processo de
. .
Emigração A População Caboverdiana Residente em Portugal Tese de Doutoramento, ISCTE,
Lisboa, 1994.

© Universidade Aberta 271


Anexos

Dado o escasso tempo para levar a efeito esta investigação e a dispersão geográfica da
imigraçã o cabo-verdiana em Espanha, seria utópico pensar em termos de caracterização
de "toda " a comunidade cabo-verdiana residente em Espanha. Nesta ótica, estamos em
crer que a investiga ção em curso permitirá aprofundar os conhecimentos já obtidos em
estudos anteriores (embora noutra perspetiva) sobre a emigração cabo-verdiana para
León e, consequentemente, compará -la com outras correntes migratórias cabo-verdianas,
desigradamente aquelas sobre as quais existe informação qualitativa e quantitativa. A
outro nível poderá servir de contributo para futuros estudos que venham a realizar-se
com outros núcleos migratórios cabo-verdíanos, nomeadamente aqueles a que fizemos
referência.

5. Revisã o da Literatura

No que se refere à bibliografia sobre o tema e aos dados disponíveis sobre o número
de cabo-verdianos residentes em Espanha, poem-se, à partida, dois tipos de problemas
que têm a ver com a delimitação, quer seja do número, quer seja das características da
imigração cabo-verdiana neste país:
a) Algumas obras referem-se à imigração portuguesa e à cabo-verdiana
indistintamente;

b) Nos dados oficiais sobre imigração, Cabo Verde é, em algumas rubricas, colocado
na categoria "Resto de África".

No que concerne aos movimentos migrató rios para a província de León, também é comum
agregarem-se os cabo-verdianos, quer seja aos portugueses, quer seja ao "Resto de
Á frica".

Nã o obstante este pequeno "obstáculo", e tanto quanto pudemos apurar até ao momento,
não há nenhuma tese que verse este tema. Existem, isso sim, dois artigos - "Inmigrantes
Caboverdeanos en EI Bierzo" ( Polígonos, Revista de Geografia, n° 4, pp. 99 -105),
escrito em 1994 por Carlos Aranda Vasserot, em que o autor faz uma breve abordagem
das diferentes fases da chegada de imigrantes cabo-verdianos a León, as atividades
desenvolvidas por estes, sua procedência e a trajetória que habitualmente fazem até
chegarem a León; "Portugueses y Caboverdianos en Espana" (Estúdios Geográ ficos,
n 210, pp. 75 -96), escrito em 1993 por Lorenzo Lopez Trigal e Ignacio Prieto Sarro,
°
docentes e investigadores do Departamento de Geografia da Universidade de León, os
quais fazem igualmente uma análise das características da imigraçã o portuguesa em
Espanha, considerando-a semelhante à cabo-verdiana no que diz respeito ao percurso,
ocupaçã o, etc. -. Da autoria de Lopez Trigal, existe igualmente um livro, cujo título, La

© Universidade Aberta 272


Anexos

Inmigración Extranjera en León, dá conta das características do movimento migratório


para esta Província Espanhola, onde existem muitas minas (principalmente de carvão)
e onde os portugueses representam a maior comunidade migrante, sendo o número de
cabo-verdianos percentualmente significativo.

Relacionado com o tema em estudo existe bibliografia variada, a qual será objeto de
análise atempada, quer seja em Portugal, quer em Espanha.

6. Fontes possíveis de Consulta

6.1 ESPANHA
• Imigrantes Cabo-verdianos;
• Consulado de Cabo Verde em Madrid;
• Biblioteca Nacional (Madrid);
• Associa çõesCulturais e Recreativas de Cabo-verdianos em León,
nomeadamente:
- Associação Cultural "Amílcar Cabral" Bembibre, León;
- Associação Cultural "Los Unidos de Cabo Verde", Villablino, León;

• Instituto Universitário de Estúdios sobre Migraciones, Universidade Pontifícia


Comillas, Madrid;

• Laboratório de Estudos Interculturais da Universidade de Granada;


• Departamento de Geografia da Universidade de León;
• Delegacion Diocesana de Inmigrantes, Madrid;
• Coletivo IOE, Madrid;
• Dirección General de Migraciones (Madrid);
• Entidades Oficiais da Área da Imigração;
• Outras fontes (investigadores universitários, autoridades locais, habitantes,...)
passíveis de nos fornecerem informação relevante para o estudo em causa.

6.2 PORTUGAL
• Embaixada de Cabo Verde em Portugal;
• Instituto Cervantes (Lisboa);
• Centro de Documentaçã o da Universidade Aberta;

© Universidade Aberta 273


Anexos

• ISCSP;

• ISCTE;

• Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.


6.3 CABO VERDE
• Instituto de Apoio ao Emigrante.

7. Metodologia

7.1 Tipo de Investigação


De acordo com o objetivo que definimos, e uma vez que pretendemos "responder a
questões que dizem respeito à situação atual do objeto de estudo [ sistemas de integração/
inserção dos imigrantes cabo-verdianos do município de EI Bierzo, província de León -
Espanha ]" esta investigação é descritiva.

Dada a natureza do trabalho ( estudo exploratório), bem como as condicionantes de ordem


geográfica, a metodologia centrar-se-á, acima de tudo, na investiga ção documental,
sendo o trabalho de campo limitado a um período muito curto. Teremos, assim, no que
concerne à metodologia, o seguinte esquema:

1- Análise documental : emigração cabo-verdiana, particularizando esta análise para a


emigraçã o cabo-verdiana para Espanha (como/ quando/porquê), para a província de
León e para a zona de EI Bierzo; analisar (embora de forma sumária) a legislação
espanhola concernente a esta matéria; abordar as características da emigração para
Espanha.

2 - Entrevistas:

a) Informantes Oficiais (cônsul, emigra ção...);

b) Patrões, empresários;
c) Trabalhadores emigrantes e colegas;

d) Habitantes da comunidade;
e) Professores (embora o trabalho se centre nos sistemas de integraçã o da popula ção
adulta, pretendemos abordar igualmente a integração da 2 a geraçã o e os aspetos
ligados à aprendizagem do castelhano).

3 - Observação participante (dinâmica de trabalho, horários, atividades, festividades).

4 - Biografia (uma a duas, no má ximo)

© Universidade Aberta 274


Anexos

Levaremos em corta, na elaboraçã o do trabalho, os aspetos que, a priori, consideramos


relevantes para a elaboração do relatório do mesmo, e que são os seguintes:
• León - como/ quando/ porquê (redes...)
• Constituição de famílias
• Integração (habitaçã o, saúde, emprego...)
• Ocupação (condições, formação, salário...)
• Intenção de regresso (p/ Cabo Verde, Portugal...)
• Segunda geração (escola, língua - preservação do crioulo -)
• Legalidade (aspetos mais relevantes)
7.2 Procedimentos
Depois de alguns contactos estabelecidos com Associações Cabo-verdianas para lhes dar
conta do nosso objetivo, por forma a facilitar a nossa inserção nessas comunidades e efetuar
a recolha de dados e outra informação, regressaremos a Espanha no sentido de prosseguir
a pesquisa bibliográfica, designadamente no Laboratório de Estudos Interculturais, da
Universidade de Granada, na Universidade Pontifícia de Madrid e na Universidade de
León. Depois de sistematizada a informação existente sobre regulamentação na área da
imigração, iniciaremos o trabalho de campo.

8. Operacionalização de conceitos
• Cabo-verdiano
• Assimilação
• Aculturação
• Marginalização
• Imigrante
• Integra ção

9. Referências Bibliográ ficas

9.1 Relativas ao tema:


Na sequência das pesquisas efetuadas até ao momento, selecionámos alguma bibliografia,
a qual não consideramos, obviamente, completa, uma vez que pretendemos continuar a
fazer pesquisa bibliográfica em Portugal e Espanha.

© Universidade Aberta 275


Anexos

ADROHER BIOSCA, Salomé e CHARRO BAENA, Pilar


1995 La Inmigración, Derecho Espano! y Internacional, Barcelona, Bosch Casa
Editorial, S.A.

ALONSO PEREZ, Francisco


ídico dei Extranjero en Espana, Madrid, Ministério de Justicia e
1995 Regimen Jur
Interior.

ANDICIAN, S., CATANI, M. et al


1983 Vivir Entre Dos Culturas, Serbal/Unesco, s/l.

ARANDA VASSEROT, Carlos


1994 "Inmigrantes Caboverdianos en Espana", in Polígonos, Revista de Geografia,
n° 4, pp. 99-105, León, Universidade de León.

ARAGON BOMBIN, Raimundo


1991 "Hacia una Política Activa de Inmigración", in Economiay Sociologia dei Trabajo,
n° 11, març o 1991 (pp. 97-108).

Boletim Oficial del Estado n 47 ( 23/02/ 96), "Ley y Reglamento de Extranjeria".


°
CARREIRA, António
s.d. Migrações nas Ilhas de Cabo Verde, Lisboa, Universidade Nova de Lisboa.

ESTRADA CARRILLO, Vicente


1993 Extranjeria, Comentários a la ley orgânica y reglamento de extranjeria. Madrid,
Edit. Trivium, S.A.

GORTÁZAR, C. e RUIZ HUIDOBRO, J. Ma. (coord.)


1994 Recursos Legales Contra ia Discriminacion Racial y los Ataques Racistas,
Madrid, Delegacion Diocesana de Inmigrantes de Madrid.

GOZÁLVEZ PÉREZ, Vicente


1996 "L'im migration étrangère en Espagne (1985-1994)", in Revue Européenne des
Migrations Internationales, vol. 12, n° 1, pp. 11-38, Poitiers.

IZQUIERDO ESCRIBANO, A .
1991 "La Inmigración Ilegal en Espana", in Economia y Sociologia dei Trabajo,
n° 11, març o, (pp. 18-38).
1996 La Inmigración Inesperada, Madrid, Editorial Trotta,

© Universidade Aberta 276


Anexos

LOPEZ TRIGAL, Lorenzo


1991 La Inmigración Extranjera en León, Léon, Departamento de Geografia de la
Universidad de León (col. "Monografias", n 1).°
LOPEZ TRIGAL, Lorenzo
1996 "La Migration Portugaise en Espagne", in Revue Européene des Migrations
Internationales, vol. 12, n° 1, pp. 109-119, Poitiers.

LOPEZ TRIGAL, Lorenzo e PRIETO SARRO, Ignacio


.
1993 "Portugueses y Caboverdianos en Espana", in Estúdios Geográficos, vol 54,
n° 210, janeiro-março 93, (pp. 75 -96), Instituto de Economia y Geografia,
Madrid.

MARTIN ROJO, Luisa; GÓMEZ ESTEBAN, Concepcion, et all. (edit.)


1994 Habiar y Dejar Hablar (Sobre Racismo y Xenofobia), Madrid, Ediciones de la
Universidad Autónoma de Madrid.

MATOS, Ana Maria Saint-Maurice Correia de


1994 Reconstrução das Identidades no Processo de Emigração. A População
Caboverdiana Residente em Portugal, Tese de Doutoramento, Lisboa, ISCTE .
Ministério da Administração Interna (compil.)
s/d. "Acordo de Schengen".

Ministério da Administração Interna (compil.)


s/ d. "Entrada e Permanência de Estrangeiros".

Ministério da Administração Interna (compil.)


s/ d. "Nacionalidade por Naturalização e Estatuto de Igualdade".

Ministério del Interior, Comision Interministerial de Extranjeria


"Anuário Estadístico de Extranjeria" (vários anos)

PRIETO SANCHIS, Luí s e DE LUCAS, Javier, et al.


1994 Derechos de las Minorias y de los Grupos Diferenciados, Madrid, Escuela Libre
Editorial (col. "Solidaridad", n° 6).

RAMÍREZ GOICOECHEA, Eugenia


1996 Inmigrantes en Espana: vidas y experiences, (Cap. II), Madrid, Siglo XXI de
Espana Editores, S.A.

© Universidade Aberta 277


Anexos

ROCHA-TRINDADE, Ma Beatriz
1995 Sociologia das Migrações, Lisboa, Universidade Aberta.

SILVESTRE, Alda
1994 Cabo Verde na Rota da Internacionalização, s/l, Grupo de Cooperação de
Língua Portuguesa do Instituto Internacional de Caixas Econ ómicas.

TODD, Emmanuel
1996 £7 Destino de Los Inmigrantes. Asimiiación y Segregation en tas Democracias
Occidentaies, Barcelona, Tusquets Editores.

9.2 Relativas à Metodologia de Investigaçã o :

A exemplo do que referimos para a bibliografia relativa ao tema, tamb ém aqui


apresentamos a bibliografia "possível" até ao momento, levando em conta, quer as
indicações bibliográ ficas referidas ao longo do curso pelos professores da cadeira, quer
as pesquisas bibliográficas que efetuámos:

BRYMAN, Alan
1988 Quantity and Quality in Social Research, Routledge, Londres e Nova Iorque.

GHIGLIONE, Rodolphe e MATALON, Benjamin


1993 O Inquérito, Oeiras, Celta.

GRAWITZ, Madeleine
1984 Méthodes des Sciences Sociafes, Paris, Dalloz.

MARCONI, Marina de Andrade e LAKATOS, Eva Maria


1990 Técnicas de Pesquisa, S. Paulo, Editora Atlas.

QUIVY, Raymond e CAMPENHOUDT, Luc Van


1992 Manual de Investigação em Ciências Sociais, Lisboa, Gradiva.

RODRIGUEZ OSUNA, Jacinto


1991 Métodos de Muestreo, Madrid, Centro de Investigaciones Sociológicas,
Madrid.

© Universidade Aberta 278


Anexos

DATA LOCAL / ENTIDADE OBJETIVO

junho/ 96 Instituto Cervantes ( Lisboa) Pesquisa Bibliogr á fica

Biblioteca Nacional ( Madrid) Pesquisa Bibliográ fica

ju!ho/ 96 Biblioteca Nacional ( Madrid) Pesquisa Bibliogr á fica


Léon, Ponferrada, minas de EI Bí erzo Contactos com imigrantes, dirigentes
associativos e autoridades locais,
docentes e investigadores da
Universidade de Léon para apresentaçã o
do projeto.

.
set /out / nov /96 Universidade de Granada Pesquisa bibliogr á fica e recolha de
informações - com apoio de docentes
e investigadores do Laborat ório de
Relaciones Interculturales - red
migradones y educadón

Madrid Recolha de informaçõ es junto de


dirigentes associativos cabo -
verdí anos;
Pesquisa bibliográ fica junto da Dirección
General de Migradones, Instituto
Universit á rio de Est ú dios sobre
Migradones, da Universidad Pontifícia
Comillas, caritas, Colectivo IO É e
Universidad Autónoma de Madrid;
Rotterdam Congresso de Comunidades Cabo-
verdianas na Europa
nov7dez / 96. Lisboa Sistematiza çã o da informa çã o
recolhida
janeiro/ 97 Cabo Verde ( Instituto de Apoio ao Recolha de dados estatísticos e outro tipo
Emigrante de informações junto das autoridades
oficiais cabo-verdianas
fev./ mar ço/ 97 Espanha (Granada, León, Madrid) Trabalho de campo, continua çã o da
pesquisa bibliogr á fica
abrtl/ 97 Espanha / Lisboa Per íodo reservado a esclarecimentos e
dúvidas que eventualmente surjam
maio/ junho/ julho/97 Reda çã o das conclusões
outubro/ 97 Apresenta çã o da dissertaçã o

© Universidade Aberta 279


Anexos

PERCURSOS DE INSERÇÃO: REFUGIADOS EM PORTUGAL,


SÓS OU ACOMPANHADOS?
UM ESTUDO SOBRE AS DIFICULDADES
DE INSERÇÃO DE REFUGIADOS EM PORTUGAL
LÚCIO SOUSA

.
1 O TEMA EM ESTUDO

Percursos de Inserção: refugiados em Portugal, sós ou acompanhados?

Um estudo sobre as dificuldades de inserçã o de refugiados em Portugal.

2. PROBLEMATIZAÇÃO

Adentro do contexto migratório, o fenómeno da inserção dos migrantes tem sido objeto de
estudos clássicos. Por outro lado, o estudo do processo de inserção dos migrantes forçados,
denominados como refugiados, nomeadamente para a Europa Ocidental, não tem tido a
mesma projeção. No entanto, face ao cada vez maior número e variedade étnico-cultural
dos candidatos ao asilo e dos refugiados reconhecidos, tem vindo a aumentar sobre eles a
pesquisa, muito em especial de natureza política e jurídica, permanecendo em aberto um
vasto campo para abordagens de natureza socioantropológicas consideradas essenciais
para um mais completo conhecimento do fenómeno.

Reconhecidas as causas forçadas que motivaram estas deslocações, coloca -se a questão
de averiguar como se desenvolve o processo da sua inserção nas sociedades recetoras e
até que ponto os antecedentes involuntários que as produziram são determinantes nas
fases subsequentes dos respetivos percursos.

Em Portugal, país com uma vasta experiência ( e)migratória e crescente convivência (i)
migratória, o fenómeno das migrações tem vindo a constituir uma base de trabalho
solidamente estabelecida que suscita um interesse constante e permite a inovaçã o
na sua abordagem científica. Embora tenham aumentado os estudos sobre a situação
dos imigrantes residentes no país, a questão do percurso migratório dos refugiados na
sociedade portuguesa nã o tem merecido significativo interesse, permanecendo assim
em claro o apuramento de situações e problemas que se ligam à sua inserção, que não
é certamente idêntica à dos imigrantes de tipo económico.

© Universidade Aberta 280


Anexos

3. QUESTÕES DE INVESTIGAÇÃO:

.
1 Percursos migratórios dos refugiados em Portugal:
• motiva ções de partida;
• itinerários de inserção;
• expectativas de fixação ou de regresso.
.
2 Deteção das dificuldades de inserção decorrentes de agentes internos e/ou externos
aos refugiados:
• circunstâncias e motivações pessoais em que ocorre o refúgio;
• reagrupamento familiar;
• "choque de culturas";
• não reconhecimento das competências académicas e profissionais adquiridas no
país de origem;

• desinteresse face a expectativas de regresso;


• dificuldades devidas à forma de apoio prestado, ou nã o, por entidades
responsá veis e instituições de apoio.

.
3 Dificuldades expressas pelos refugiados na sua inserção em Portugal.

.
4 Estratégias de sobrevivência desenvolvidas pelos próprios.

4. OBJETIVOS DA INVESTIGAÇÃO:

.
1 Obter elementos que contribuam para a fundamenta ção teórica do fenómeno,
permitindo aprofundar o conhecimento sobre esta realidade social.

.
2 Desenvolver um trabalho que revista um duplo interesse:
a) para as entidades oficiais e privadas (ONG's);

b) para os próprios refugiados.

5. RELEVÂNCIA DO ESTUDO

Citando Anthony Richmond, pode afirmar-se que a inserção dos refugiados constitui uma
matéria pouco estudada.

© Universidade Aberta 281


Anexos

" When questions of absorption in receiving countries are considered, the experiences
of refugees are rarely distinguished from those of economic migrants." (Richmond,
1988, p. 9).

Conhecer este fenómeno em Portugal, contribuirá não só para o seu conhecimento


científico, mas também para a sua utilização prática num esforço de resolução de problemas
individuais e sociais.

Ideia reafirmada por Danièle Joly e Robin Cohen (1989, p . 6) que dizem a este
respeito:

"Refugees are subject to a different regime from that of immigrants both in respect of
admission and settlement. Little theoretical work has been developed to understand
the differences and similarities of refugees and immigrants."

A temática proposta foi identificada pelo European Research Forum on Migrations and
Ethnic Relations como um dos assuntos relevantes de análise no contexto dos "(...)
Impactos da Crise Mundial dos Refugiados (...)", sendo no seu âmbito uma das áreas que
oferece maior interesse a da integração. (Rocha-Trindade, 1995, p. 290).

Não pode, no entanto, deixar de se apontar ainda o facto dos refugiados se estarem a
transformar num paradigma para a avalia ção da sociedade em que vivemos. Richmond
(1992) coloca esta questão em termos da Nova Ordem Mundial, considerando determinantes
as variá veis Estado, Violência, Globaliza ção e Direitos Humanos, que relaciona entre si.
Como resultado do confronto entre estas variá veis e as suas contradições está -se perante
um número cada vez maior de pessoas que não têm direito a "status de refugiado" e
passam a ser, nas palavras de um responsável da ONU, citado por Richmond (1992, p.
19) non-persons (...) subject to exploitation or racial antagonisnf . Isto é, em
nossa opinião, pessoas a quem quase é retirada a condição de ser humano, pela falta de
reconhecimento de direitos, regalias e dignidade que lhes deveriam ser inerentes.

Neste contexto, qual a política de inserção existente em Portugal para o Asilo e para
o Refúgio? Com que base de trabalho operam aqueles que lidam com estas questões?
íade " PODER, DEVER E QUERER' (Rocha -Trindade, 1996, p. 44) encerra o difícil
A tr
equilíbrio entre pessoas e os que por se encontrarem tantas vezes sem direitos, quase
poderiam ser designados, ainda que simbolicamente, por «não-pessoas». Cremos que o
contributo deste trabalho possa ser relevante em termos de conhecimento teórico e em
aplicações sociais de natureza prática.

© Universidade Aberta 282


Anexos

6. REVISÃO DA LITERATURA

A revisão da literatura que se segue é o fruto das primeiras leituras feitas com base
numa seleçã o bibliográfica especializada em curso. Procurou-se seguiras seguintes pistas
tem á ticas: migra ções forçadas (ou involuntárias), refugiados, inserção (abordando as
facetas da integraçã o, acultura ção, adaptação), contextualizadas nos Estados Unidos,
no Canadá e na Europa, e muito em especial, em Portugal. Desta forma, o objetivo
será enquadrar o tema do ponto de vista teórico-conceptual, comparando socialmente a
situa ção entre Portugal e os países com situações semelhantes, no quadro da respetiva
inserção geográ fica.

A migraçã o é o " (...) movimento de uma população, temporário ou permanente, de


um local físico para outrd'. (Jackson, 1991, p. 7). Para o mesmo autor a migração pode
ser voluntária, caso em que " a hipótese seja colocada ao indivíduo como decisão livre
e de sua inteira responsabilidade (Ibid, p. 10). As migrações forçadas " (...) implicam
deslocações resultantes da necessidade de salvaguarda da sua vida e da Uberdade
do indivíduo (Ibid, p. 10).

Por sua vez, o conceito de emigração é, em Rocha-Trindade (1995, p. 31), " (...) deixara
pátria ou a terra própria para se refugiar, trabalhar temporariamente ou estabelecer
residência em país estranho Esta definição enumera '"refugiar" como um ato
de migração, sendo as motivações de ordem "política" e de "emergência", procurando
desta forma destrinçar o conceito de asilado político do conceito mais abrangente de
refugiado no sentido coletivo em que as causas são mais vastas, exemplo de guerras,
fome, terramotos, etc.

Estas duas obras de referência (Jackson, 1991 e Rocha-Trindade, 1995) não aprofundam
a problemática dos refugiados em particular, exceto nos aspetos legais, caso do último
trabalho referido.

Trabalho pioneiro sobre a imigração em Portugal, o coordenado por Maria do Céu Esteves
(1991), não se refere aos refugiados sen ão através da enumeração dos dispositivos legais
que sancionam a sua entrada e estadia.

Num trabalho recente, Pena Pires (1993, p. 183) referindo-se também à imigração
em Portugal, indica a migraçã o de refugiados como " ( ) direct result of political
changes, in many cases accompanied by conflicts of ethnic or religious nature, and
by implying that the actors freedom is restricted as regards the decision to migrate
associando à situação portuguesa a presença de refugiados políticos de origem angolana
e moçambicana.

© Universidade Aberta 283


Anexos

Mais implicitamente ligados a uma abordagem do fenómeno dos refugiados estão os


trabalhos de Anthony Richmond e os de Danièle Joly e Robin Cohen. Richmond (1988)
apresenta uma resenha das teorias da migração internacional. No que se refere aos
refugiados é importante o comentário sobre a regularidade dos seus movimentos. Estes
não são para o autor tão espontâneos e imprevisíveis como se crê geralmente, ideia
concordante com a exposta por Zolberg (1986), citado pelo próprio autor. Richmond
introduz uma interessante inovação, insurgindo-se contra o próprio conceito de refugiado
meramente político, também designado como refugiado - convenção, avançando com
um conceito mais abrangente, conceito que subjaz à teoria reforç ada no seu trabalho
de 1992.

A relação entre condicionantes estruturais e escolhas individuais situa -se num continuum
que engloba fatores económicos, passando pelos ecológicos até aos puramente políticos.
A questão de migra ção voluntária e involuntária não é fácil de caracterizar nem de
contrastar. Para operacionalizar a sua análise, Richmond (1988, p. 17), idealiza dois
conceitos: migração "proactive" (próativa) e a migraçã o "reactive" (reativa). A primeira
situa ção - "proactive" ocorre quando:

"Under certain conditions, the decision to move may be made after due consideration
of all relevant information, rationally calculated to maximize net advantage, including
both material and symbolic rewards".

A segunda situação - "reactive" situa-se no outro extremo, quando:

«(...) the decision to move may be made in a state of panic facing a crisis situation
which leaves few alternatives but escape from intolerable threats».

Entre estes dois extremos, muitas das decisões dos migrantes "económicos" e "políticos"
são respostas " difusad' no continuum já referido, caracterizado pela dinâmica relacional
entre quem promove as situações e quem atua em resultado delas.

Quarto a Joly e Cohen em trabalho introdutório ao livro que editam em 1989, apontam
interessantes pistas para uma abordagem do percurso migratório. Embora considerando
limitado o modelo "Kinet" de Kuntz (tal com Richmond), consideram que o conceito de
"pull-push" pode ter uma utilidade, nomeadamente nas atitudes subjetivas e opiniões
pessoais. Chamam a atençã o para o facto de muitos refugiados não desejarem sair e os
efeitos ou circunstâncias traumáticas da saída que podem afetar a sua inserção, referem
ainda as expectativas do regresso e o modo como a perceção da sua estadia (tanto
temporária como definitiva) poderá afetar também a respetiva inserção, nomeadamente
se estes desenvolvem uma atividade de militância política tendo em vista a mudança do
país de origem.

© Universidade Aberta 284


Anexos

Entende-se dever referir ainda dois trabalhos de autores portugueses sobre a situação
dos refugiados.

O trabalho de Macaísta Malheiros (1995) é um estudo comparativo entre a situação de


dois grupos de refugiados angolanos: um em Lisboa e outro em Madrid, face às políticas
de receção de ambos os países e às perspetivas que oferece a sua integra ção.

Trata -se do único trabalho apurado até ao momento sobre a inserção de refugiados desta
nacionalidade. As conclusões em relação ao nosso país nã o são de todo positivas, pois
as suas políticas de receção estão, na opinião do autor, menos desenvolvidas que em
Espanha. Em relação ao processo de integra ção, os indicadores de dificuldades utilizados
são: tratamento de documentação, procura de trabalho, racismo/ exploração, equivalência
de títulos e outras.

Como estratégia, é relevante referir a existência em Lisboa de uma rede informal de


apoio, com base na comunidade imigrante angolana. O facto de alguns dos refugiados
em Madrid provirem de Lisboa, tem efeito na consciência que têm de si próprios. Questão
pertinente que o autor coloca com resultados interessantes - em Lisboa, 81% consideram-
-se refugiados, contra 54% em Madrid.

O trabalho de Barra da Costa (1996) é uma aturada compilação de dados de natureza


sociodemográ fica, de cariz quantitativa, sobre os refugiados em Portugal no período entre
1974- 1996. Apresenta também um estudo de caso sobre três grupos refugiados, mas
numa ótica macro, analisando as situações que a montante deram origem aos fluxos de
refugiados para o nosso país. Trata-se de uma fonte privilegiada de informações, muitas
delas difíceis de encontrar de forma tão sistematizada noutro qualquer local.

Retivemos por agora a indicação de existirem em Portugal, para o período de 1974-1993,


10990 pedidos de asilo, aos quais foram atribuídas: 898 concessões de estatuto de
refugiado de acordo com o conceito da ONU (incluindo agregado familiar) e 7173 recusas
e 2919 foram arquivados ou estã o em fase de investigação.

7. METODOLOGIA

Dada a quase inexistência em Portugal de trabalhos de investigação nesta área, o


presente trabalho será desenvolvido numa metodologia própria dos estudos exploratórios,
com cariz essencialmente qualitativo. Quer isto dizer que está longe do propósito do
investigador a recolha de dados estatísticos, de caráter oficial, que tão somente servirão
como orientadores do trabalho que propomos realizar. Reside o principal interesse desta
investiga ção no levantamento dos fenómenos psicossociais, que só a abordagem de um

© Universidade Aberta 285


Anexos

antropólogo, desenvolvida em "trabalho de campo ", em que são privilegiados os contactos


diretos e seguidos no tempo, permitirá a obtenção dos dados procurados.

As técnicas a empregar na investigação são:


a) pesquisa documental;

b) pesquisa de campo.

a) Pretende-se com a pesquisa documental a recolha de bibliografia especializada acerca


de processos metodológicos relevantes para o projeto proposto e sobre o tema da
investigaçã o, pretende-se assim dar continuidade às primeiras leituras efetuadas,
visando um maior aprofundamento do conhecimento desta temática. A recolha de
estatísticas, documentaçã o avulsa e "literatura cinzenta" de instituições oficiais ou de
arquivos privados (ONG's) reveste-se também de todo o interesse no âmbito deste
levantamento bibliográfico.

No âmbito da pesquisa documental, o recurso a suportes telemáticos tem permitido o


acesso a dados de pesquisa especializados e atualizados, caso da Internet - acesso a
centros de documentação, resumos de teses e de projetos em curso.

Até ao momento foram consultadas, ou contactadas, as seguintes fontes:

UNIVERSIDADE ABERTA - Centro de Estudos das Migrações e Rela çõ es


Interculturais (CEMRI) (Centro de Documentação: Documentos livro, CD-ROM /
ProQuest Dissertation Abstracts,Internet - University Centre for Research in Ethnic
Relations / Warwik e Refugee Studies Programme / University of Oxford;

UNIVERSIDADE NOVA - Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (Centro de


Documentação de Antropologia e Biblioteca);

INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS DO TRABALHO E DA EMPRESA


(Biblioteca);

INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS (Biblioteca);

UNIVERSIDADE DE LISBOA - Faculdade de Letras (Instituto de Geografia);

ALTO COMISSARIADO DAS NA ÇÕES UNIDAS PARA OS REFUGIADOS;

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS - Centro de Documentação;

UNESCO (Organização das Na ções Unidas para a Educação, Ciência e Cultura);

UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância);

INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO; CENTRO JEAN MONET,


Lisboa.

© Universidade Aberta 286


Anexos

Estando afeto ao Centro de Estudos das Migrações e Rela ções Interculturais { CEMRI),
terei acesso às redes europeias de que este Centro é parceiro com Universidades que
têm importante trabalho desenvolvido nesta temática. Exemplo de redes em que o
Centro tem trabalho desenvolvido são: ERASMUS, SOCRATES, TEM PUS E ARION.

b) A pesquisa de campo será realizada tendo em conta os seguintes princípios


orientadores:

Procurar-se-á realizar um tipo de entrevista aberta, colhendo-se diretamente dados


de «informantes qualificados», pessoas que, pela sua experiência de vida, atividade
profissional ou desempenho de funções de natureza social, convivam com refugiados
e conheç am toda a problemática que os envolve.

São informa ções que nã o podem ser obtidas de outro modo e que requerem um grande
cuidado por parte do investigador, de modo a não selecionar de forma sectária ou
enviesante o conjunto de informadores que irá entrevistar.

O trabalho de campo centrar-se-á essencialmente em observação que, tentativamente,


se procurará transformar em «participante», na medida em que o investigador ganhe
a confiança dos que constituem o seu objeto de estudo.

Para além do exposto, será elaborado um conjunto de questões que serão introduzidas
de modo mais formal nos "guiões de entrevistas", aos quais se pretende, no entanto,
conferir um caráter aberto.

O universo conceptual desta pesquisa é constituído por refugiados reconhecidos


como tal, isto é, aqueles a quem é conferido o estatuto de refugiado de acordo com
a lei em vigor (v.d. definição de conceitos).

Quanto à seleção dos entrevistados; que constituirão a «amostra», são por demais
conhecidas as dificuldades inerentes à sua constituiçã o quando o estudo se centra sobre
populações migrantes. O fenómeno da clandestinidade e a salvaguarda da privacidade
individual deste tipo de população conduz à inexistência de estruturas de amostragem
ou, quando existam, torna difícil o acesso à sua consulta.

No trabalho preparatório para a planificaçã o desta pesquisa foi-nos aventada a


hipótese de fazer conhecer o nosso objetivo junto de um vasto público de refugiados,
procurando aliciar o seu interesse no contacto com o próprio investigador. Há, no
entanto, que ter presente que determinadas situações individuais podem motivar ou
inibir a vontade de contacto e de tradução oral dos problemas próprios por parte de
cada um dos refugiados.

© Universidade Aberta 287


Anexos

Só o trabalho de campo poderá fazer-nos refletir na efetiva orientaçã o metodológica


do trabalho. O recurso a um processo de constituição da amostra por «bola de neve»
será de extrema importância, fazendo valer os contactos e conhecimentos informais
entretanto estabelecidos.

Enumeramos finalmente os critérios que subjazem à eventual seleção dos


entrevistados, embora tomando a precaução de lembrar que se trata da tentativa de
construção de uma tipologia:
1. sexo;

2. idade;

3. situação do agrupamento familiar: no país de residência atual casais que entraram


juntos, casais que se reagruparam posteriormente;

4. espaço de origem: refugiados com proveniências diversas (Ásia, África, América


do Sul, Europa);

5. tempo de estadia: refugiados com mais tempo de permanência, refugiados com


menos tempo de permanência (um ano pelo menos).

Estes critérios são relativos. Ao longo do trabalho, face aos contactos efetuados, a situa ção
de escolha (a definir na primeira parte do trabalho) será otimizada.

Perfeitamente consciente do que se afirma, o «acaso» poderá fazer-nos confrontar com


situações, agora imprevistas, mas que encerram grandes potencialidades, riqueza e
informa ções para futuros ajustes das ideias suscitadas e para a sua reformula ção mais
ajustada.

Creio ser necessário, face ao exposto, apresentar um conjunto de princípios de caráter


ético que deverão sempre estar presentes:
• Participação voluntária por parte do refugiado;
• Consentimento na utiliza ção da informação obtida;
• Confidencialidade;
• Referência ao risco - informaçã o de objetivos e patrocínios (caso os obtenha ).
(Adaptado: Willingen, 1986, p. 42)

© Universidade Aberta 288


Anexos

8. DEFINIÇÃO DOS CONCEITOS:

Os conceitos que vamos definir devem ser considerados como operatórios. As pesquisas,
leituras e críticas que vão ser feitas permitirão reavaliar as ideias agora expostas. O autor
Selim Abou foi intencíonalmente utilizado, pela clareza da sua exposição e pertinência
dos conteúdos que integram os conceitos que elabora .

Refugiado - Vamos considerar, para efeitos do presente estudo, refugiado «(...)


qualquer pessoa que, receando com razã o ser perseguida em virtude da sua ra ça,
religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou das suas opiniões políticas, se
encontre fora do país de que tem a nacionalidade e não possa ou, em virtude daquele
receio, não queira pedir proteção daquele país» (C.P.R, 1994, p. 9). Trata-se do conceito
definido pela Convenção de Genebra de 28 de julho de 1951 e protocolo adicional de 31
de janeiro de 1967.

É o conceito restrito de refugiados - face ao qual, como referimos, o conceito sociológico


se assume como mais abrangente. Com base nesta definição o número de refugiados
existentes em Portugal é de 898.

Inserçã o - Segundo Abou (1988), o processo de inserção dos imigrantes no país de


acolhimento compreende três processos distintos que se desenvolvem simultaneamente
mas a três ritmos diferentes, a três níveis do real: são os processos de adaptação,
integração e aculturação.
• adaptação: acomoda ção ao meio físico do país de acolhimento, englobando
«(...) 1'aménagement de 1'espace auquel procèdent les immigrés dans le but de
réduire la différence qualitative angoissante entre I'habitat nouveau et 1'ancien.»
( Ibid, 1988, p.127).

• integração: «(...) désigne I'insertion des nouveaux-venus dans les structures


économiques, sociales et politiques du pays d'accueil.» (Ibid, 1988, p. 128).

• aculturação: «(...) désigne 1'ensemble des interferences culturelles que les


immigrés et leur enfants subissent, à tout les niveaux, de 1'adaptation et de
I'integration, par suite de la constante de leur culture d'origine avec celle de la
sociéte d'accueil.» (Ibid, 1988, p. 128)

9. EVENTUAIS LIMITAÇÕES:

Um estudo sobre as experiências de vida dos outros é também uma reflexão sobre a
própria vida por parte do investigador, um estado descrito por Morris (1995) como de

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Anexos

"personal transition". As grandes limitações para um estudo decorrem assim da capacidade


e personalidade do investigador, da competência científica e da empatia que se estabelece
no contacto. Espero superar ambos.

Outras limitações previsíveis prendem-se com as limitações temporais - um ano, o que


vai implicar uma correta gestão do tempo e das oportunidades.

A interação com as instituições e entidades oficiais constituem dimensões importantes


para a realização de qualquer trabalho; os constrangimentos de horários, as deslocações,
implicam esperas e demoras que têm de ser previstas.

No plano do contacto pessoal com os refugiados não pode deixar de ser mencionado o
fator comunicação, nomeadamente com os refugiados mais recentes - quer em relação
ao seu domínio do Português, quer no domínio que o investigador tem da sua língua .

As limitações apontadas são mais prementes quando de momento ainda não se sabe onde
se irá ser colocado no próximo ano letivo. Este fator, a definir até setembro do corrente
ano de 1996, irá determinar em parte o local de trabalho e a disponibilidade horária. De
qualquer forma, a localizaçã o da atividade laborai (em caso de colocação) situar-se-á na
área da grande Lisboa - região onde se concentra a esmagadora maioria dos refugiados,
segundo indicações de uma entidade oficial contactada.

O preenchimento horário da atividade profissional que venho exercendo (Professor


provisório de Geografia do 3 o Ciclo Básico) é muito apropriado à realização do trabalho
de campo, dados os intervalos não letivos que se intercalam nos tempos letivos.

A exposição do meu programa de pesquisa às entidades responsáveis pela instituição


em que lecionarmos e uma boa articulação, que espero vir a ter com colegas, permitirá,
assim o espero, troca de horários e flexibilizações que facilitem a realizaçã o do trabalho
de campo.

10. RECURSOS NECESSÁRIOS

Para a execução do projeto em curso é necessário ponderar recursos humanos e materiais,


a saber:

© Universidade Aberta 290


Anexos

Recursos humanos Tarefa Data prevista

Colaboradores - leitura crítica do relatório de progresso 4 a semana de mar ço 97

- leitura cr
ítica da disserta çã o julho 97
Colaboradores - passagem final no computador agosto 97

Reprografia - impressão da tese setembro 97

Recursos materiais Tarefa Data prevista

“ Gravador portátil - entrevistas .


out /96 - março 97

- Cassetes de gravador - entrevistas out./96 - março 97

- Pilhas - gravador out /96 - março 97

- Computador - reda çã o de texto 96/97

- Disquetes de computador - registo do trabalho 96/97

- Impressora - impressão trabalhos 96/97


“ Tinteiros - impressão trabalhos 96/97

- Má quina fotográ fica (?) - registo fotográ fico (?) jam - mar ço 97

- Roios P/ B - Slides - registo fotogr á fico (?) jam - mar ço 97


- C âmara de vídeo ( ?) - registo videográ fico ( ?) jam - mar ço 97

- Cassetes de vídeo - registo videográ fico (?) jan. - mar ço 97

CRONOGRAMA , DISSERTAÇÃO DE MESTRADO - 96/97

Entrega do projeto de dissertação de 30


mestrado
Recolha de dados e
pesquisa bibliogr áfica

Dados de
Entrevistas a
Informantes
estrutura
qualificados
Elaboraçã o de
entrevistas
semidirigidas
Tabalho de campo,
Dados de
entrevistas e
din âmica contactos
15
Relatório de progresso

Tratamento de dados

Redação e crí ticas

Redação final

Preparação e Impressão, correção e


reimpressão
Entrega do relatório final de 9
dissertação
set. out. nov . dez. jan. fev. mar. abril maio Jun. jul. agos. set. out.
199 E 1997

© Universidade Aberta 291


Anexos

11. BIBLIOGRAFIA

11.1 Metodologia da Investigação:

CARMO, Hermano
1995 Métodos de Investigação — Bioco I / Mestrado em Relações Interculturais,
apontamentos.

FERREIRA, Maria Manuela Malheiro


1995 Métodos de Investigação — Bioco II / Mestrado em Relações Interculturais,
apontamentos.

MOREIRA, Carlos Diogo


1994 Planeamento e Estratégias da Investigação Social, Lisboa, ISCSP.

POIRIER, Jean; CLAPIER-VALLADON S. e RAYBAUT, Paul


1995 Histórias de Vida Teoria e Prática, Ia ed.f Oeiras, Celta.

QUIVY, Raymond e CAMPENHOUDT, Luc Van


1992 Manual de Investigação em Ciências Sociais, Ia ed., Lisboa, Gradiva.

SILVA, Augusto Santos e PINTO, José Madureira (orgs.)


1986 Metodologia das Ciências Sociais, Porto, Edições Afrontamento.

WILLIGEN, John Van


1986 ApHied Anthropology an introduction, Ia ed., South Hadley, Bergin & Garvey.

11.2 Tema de Pesquisa:

ABOU, Sélim
1988 L 'insertion des immigrés. Approche conceptueiie, in: Les Étrangers dans ia
VHie. Le Regard des Sciences Sociales, Paris, L'Harmattan.

Conselho Português para os Refugiados


1994 Guia dos Refugiados, Lisboa, C.P.R.

COSTA, José Martins Barra da


1996 Exílio e Asilo (A questão Portuguesa 1974-1996), Lisboa, Universidade Aberta .

© Universidade Aberta 292


Anexos

ESTEVES, Maria do Céu (org.)


1991 Portugal, País de Imigração, Lisboa,I.E.D.

JACKSON, John
1991 Migrações, Ia ed., Lisboa, Esher.

JOLY, Danièle e COHEN, Robin (ed.)


1989 Reluctant Hosts: Europe and its refugees, Aldershort, Averbury (Research in
Ethnic Relations Series).
MALHEIROS, Jorge Macaista
1995 Refugees in Portugal and Spain: a preliminary approach on receptions
policies and integration prospects, in: Avenues to Integration, refugees in
contemporary Europe, Italy, University of Rome - «La Sapienza»/ The European
Association for Refugees Research / Iper Medium.

MORRIS, John Keith


1994 Talking to Friends Talking To me; An Interpretation of Refugee Experiences
in Re/Establishing in Toronto (Ontario), Yourk University (Canada), PHD,
Advisor: Greer-Wootten, Bryn, in: ProQuest - Dissertation Abstracts.

PIRES, Rui Pena


1993 Immigration in Portugal A Tipoiogy Essay, in: Recent Migrations Trends
in Europe, Lisboa, Universidade Aberta/Instituto de Estudos Para o
Desenvolvimento.

RICHMOND, Anthony H.
1988 Sociological Theory of International Migration: the case of refugees, in:
Current Sociology, n 30/ 2.
°
1992 Sociological Perspectives on Refugees Movements. Migration Trends in the
90's: Old Themes, New Issues; Lisbon, 6 - 8 April (policopiado).

ROCHA-TRINDADE, Maria Beatriz et al.


1995 Sociologia das Migrações, Lisboa, Universidade Aberta.

ROCHA-TRINDADE, Maria Beatriz


1996 Poder, Dever e Querer, in: O Asilo em Portugal, Vol. 2, Lisboa, S.P.R.

© Universidade Aberta 293


Anexos

11.3 Bibliografia a consultar:

De momento listam -se aqueles que parecem ser alguns dos materiais recolhidos mais
relevantes:

RICHMOND, Anthony H.
1994 Global Apartheid Refugees, Racism, and the New World Order, s. ed., Toronto,
New York, Oxford, Oxford University Press.

ROGERS, Rosemarie e COPELAND, Emily


1993 Forced Migration Policy Issues in the Post-cold War World, Medford, Tufts
University - The Fletcher School of Law and Diplomacy.

RUTTER, Jill
1994 Refugee Children in the Classroom, London, Trentham Books.

ZOLBERG, Aristide R .; SUHRKE, Astri e AGUAYO, Sergio


1989 Escape From Violence Conflict and the Refugees Crisis in the Developing
World, New York, Oxford, Oxford University Press.

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Anexos

PROFESSORES DAS MINORIAS ÉTNICAS:


AS REPRESENTAÇÕES DOS PROFESSORES DO l.° CICLO
DOS CONCELHOS DE ALMADA E SEIXAL

ABEL SIMÕES VIRGÍ LIO

1. OBJETIVO DA INVESTIGAÇÃO

1.1. Problema da investiga çã o

A integração multiétnica, multicultural e multirracial não é dinâmica exclusivamente escolar.


No entanto, encontra nas escolas um espaço e um tempo privilegiados de desenvolvimento,
e nos PROFESSORES os elementos promotores de valores, de forma ção ética, moral e
cívica, de entreajuda, de respeito pelas diferenças e, sobretudo, de apoio aos grupos das
minorias, quaisquer que elas sejam, desde as étnicas até às do domínio das necessidades
educativas especiais.

É significativa a presença nas Escolas primárias dos concelhos do sul do Tejo (Almada
e Seixal) de alunos provenientes de populações etnicamente minoritárias e socialmente
desfavorecidas.

Compete aos professores desses alunos promover, no âmbito dos objetivos e dos princípios
orientadores do sistema educativo, as estratégias e atividades pedagógicas que visem a
educa ção para os valores da tolerância, do diálogo e da solidariedade entre as crianças
das diferentes culturas e etnias, na valorização e consideração do direito à diferença.

A responsabilidade que leva esses docentes a assumir enfrentar um modelo de educação


multicultural nas suas salas de aula não deve ser só um mero estádio profissional. Deverá
ser muito mais um verdadeiro estado de espírito, fundado em alicerces profundos de
convicções de antirracismo, de tolerância, de solidariedade, de formação cívica e pessoal
e de aceitação dos outros e de cada um.

O nosso estudo propõe interessar-se pelos professores do Io ciclo do ensino básico das
escolas dos concelhos de Almada e Seixal que têm turmas com crianças das minorias
étnicas. Vamos efetuar uma pesquisa quantitativa de investigaçã o primária, para, através
dela, conhecermos as representações daqueles professores relativamente a preconceitos,
imagens e atitudes, positivas ou negativas, que tenham em relação à s crianças que
estiveram ou estão atualmente nas suas salas de aula.

© Universidade Aberta 295


Anexos

O termo "representaçã o " foi tomado pelos pedagogos para ser utilizado no sentido
lato de teorias implícitas, conhecimentos comuns, conhecimentos práticos, raciocínios
espontâneos, pré-modelos, pré- conceções, conceções espont â neas... Trata-se de
conhecimentos e regras de a ção que indivíduos ou grupos elaboraram à luz da sua vivência
direta ou indireta (influência dos média), do significado que deram aos acontecimentos,
aos fenómenos, aos conceitos. O ambiente cultural exerce uma forte influência em todos
os indivíduos, inclusive nos professores.

Os conhecimentos assim forjados acompanham-se de atitudes positivas ou negativas


em relação ao tema e oferecem uma forte resistência a quem as quiser mudar. As
representações podem ser mesmo comuns a um grupo socioprofissional ou cultural.

1.2. Justificação da relevância do estudo

O estudo do processo através do qual se concretizam as expectativas do professor e a


referência que ele tem na classe social e no grupo étnico a que pertence o aluno pode
proporcionar informações muito úteis sobre os processos de discriminação em situação
de sala de aula.

Algumas questões são suscitadas nas escolas frequentadas por essas minorias étnicas,
como, por exemplo, como é que se processa a rela ção na sala de aula ao nível dos alunos
e das suas diferenças? Em que fatores se baseiam as expectativas dos professores? Como
é que o professor constrói e forma pontos de vista sobre os alunos? Quais os critérios
em que o professor se baseia para fazer a apreciação cognitiva e socioafetiva dos seus
alunos e, designadamente, dos alunos das minorias étnicas?

A justificação da relevâ ncia deste estudo será a de evidenciar a import â ncia das
representações dos professores em relação aos estratos sociais dos seus alunos e,
obviamente, na construção de práticas sociais. Foi evidente para todos nós adultos,
quando estivemos em situação de alunos, que os nossos professores possuíam alguns
estereótipos daquilo que eles consideravam "bons alunos" ou "maus alunos" e que era
muito mais difícil eles aceitarem que um "mau aluno" um dia pudesse obter uma boa
avaliação, do que justificarem que um dia um "bom aluno" derrapasse para uma episódica
má classificação.

Estas vivências, baseadas nas representações sociais dos professores, são o dia a dia
das nossas escolas.

Segundo Isabel Guerra, as pesquisas têm concluído que os professores formam uma
imagem do aluno nas primeiras semanas e que a imagem, depois, é bastante estável. A

© Universidade Aberta 296


Anexos

variável classe social e grupo étnico parecem ser duas variáveis fundamentais na formação
dessas imagens.

1.3. Limitações do estudo

Este estudo foi limitado a professores do Io. Ciclo do ensino básico (antes designado por
escola primária). Limita-se a professores deste ciclo porque é lugar comum a sociedade
dizer que têm o papel importantíssimo de preparar os alunos com a formação de base
necessária para uma adequada inserção social, num tempo de mudanças e de dimensão
pluriétnica e pluricultural.

Dentre as escolas do Io. eido, este projeto de pesquisa limita-se a estudar as representações
dos professores em apenas dois concelhos do distrito de Setúbal ( Almada e Seixal).

1.4. Questões de investigaçã o

O problema subjacente a este projeto de pesquisa é saber quais serão as representações


dos professores do Io. ciclo do ensino bá sico dos concelhos de Almada e Seixal, face
à presenç a de alunos de minorias étnicas nas suas salas de aula. Depois concluir-se-á
da influência que as representações sociais desses professores podem ter no ato de
ensino-aprendizagem de alunos de minorias étnicas a frequentar as suas salas de aula/
escolas.

As variáveis a investigar prendem-se com a idade dos professores, a sua antiguidade


profissional, a sua educaçã o sócio-familiar enquanto jovens, a sua forma ção inicial e
contínua e, finalmente, a sua ligação pessoal ou social com territórios de origem das
minorias étnicas ou da emigração que frequentam as suas salas de aula/ escola.

Estas variá veis foram consideradas de interesse, na medida em que podem permitir
determinar os seus efeitos na relaçã o entre os professores da amostra e a presença de
minorias étnicas nas suas escolas.

1.5. Definiçã o operacional dos termos

Seguidamente, apresentamos alguns termos cuja definiçã o teremos que dar


antecipadamente, para melhor fazermos o percurso do nosso projeto de investigaçã o.

INQUÉRITO - é a técnica de construção de dados que mais se compatibiliza com a


racionalidade instrumental e técnica que tem predominado nas ciências sociais e na
sociedade em geral. (GHIGLIONE e MATALON, 1978).

© Universidade Aberta 297


Anexos

MINORIAS ÉTNICAS - grupos minoritários no país de acolhimento, que possuem uma raiz
cultural comum, história, mitos e memórias e que partilham um sentimento de unidade.
0HORTA, Ana Paula Beja - Diversidades Culturais - MRI 94 - 95)
POPULAÇÃO - ( conceito estatístico) - conjunto de elementos de que se quer conhecer
ou investigar alguma ou algumas das suas características. (INCHAUSTI, 1975, p. 65)

PORTUGALIDADE - consciência de pertença a uma comunidade que tem mais coisas


comuns que diferenças. { RAVEAU, François, Seminário de 27.03.95 - U. Aberta - 4o.
MRI 94-95)

REPRESENTAÇÃO SOCIAL - é um conjunto de conceitos, proposições e explicações,


criado na vida quotidiana no decurso da comunicação interindividual. São o equivalente
na nossa sociedade dos mitos e sistemas de crenças das sociedades tradicionais; podem
ainda ser vistas como a versão contemporânea do senso comum. ( MOSCOVICI, On Social
representations, 1981, p. 181)

REPRESENTAÇÃO - é a interiorização de imagens, modelos e opiniões por parte dos


sujeitos, de que vão fazer a descrição, face a situações concretas, colocadas no enunciado
do questionário (instrumento apropriado e tecnicamente credível para esse fim);
"fonctionnant comme des modèles ou des mémoires, les représentations organisent ou
structurent, de manière interne au sujet, les contenus du réel". { FLORIN, 1987, p. 31)

ou,

"A resposta de um indivíduo quando é interrogado por meio de técnicas apropriadas


acerca de um objeto significativo; (...) a organização das reações dum indivíduo
quando é chamado a descrever ou a definir um objeto numa dada situa ção". { ZAZZO,
in ESTRELA, 1990, p. 9)

ou,

"As representações desempenham a importante função de orientar o nosso


relacionamento quotidiano com os diversos objetos que fazem parte do nosso
mundo". { BORGES DOS SANTOS, 1992, p. 3)

2 . REVISÃO DA LITERATURA

Sobre as representações sociais dos professores já há vários trabalhos publicados em


Portugal.

© Universidade Aberta 298


Anexos

Por exemplo, e no que respeita a professores do l. ciclo do ensino bá sico, há uma


°
investiga ção feita no distrito de Portalegre, que serviu de dissertação de Mestrado do
Mestre Hermenegildo Correia, com orientação da Professora Doutora Ana Benavente. Este
estudo teve importância para nos suscitar interesse pela abordagem da problemática das
representações sociais dos professores; todavia, o investigador estudou as vertentes da
formação de professores e do insucesso escolar, enquanto nós pretendemos a abordagem
da problemática das minorias étnicas.

As representações dos professores, mas já a nível do ensino secundário, também foram


investigadas em 1991-1992, na região autónoma dos Açores, pelo Mestre Jorge Manuel
Ávila de Lima, sob orientação da Professora Doutora Conceição Alves Pinto. Nesse trabalho
o autor investigou as características morfológicas e representações do corpo docente
relativamente ao lugar ocupado no espaço social e também à determinaçã o da distância
social entre as principais categorias dos professores.

Da responsabilidade da mesma orientadora há uma outra investigaçã o da Mestre Maria


Leonor Borges dos Santos sobre representa ções de alunos das Escolas Superiores de
Educa ção, investigando o papel das representações e das estratégias na construção das
práticas sociais.

Os Professores Jorge Vala, Maria Beatriz Rocha-Trindade e Ana Maria Saint-Maurice Correia
de Matos também têm de ser referenciados nesta revisão da literatura; o primeiro pela
investiga ção que tem desenvolvido no campo das representações, sobretudo no estudo da
representação social da violência, e as segundas no estudo das migrações, das minorias
étnicas, da identidade social destas, e das relações étnicas.

3. PROCEDIMENTOS

3.1. Plano de investiga ção

3.1.1 - Entrevistas livres exploratórias a seis professores com vivências relacionadas com
o problema suscitado.

3.1.2 - Análise do conteúdo do registo das entrevistas para a elaboração de um pré-


-questionário.

3.1.3 - Aplicação do pré-questionário, para testagem do instrumento, a um grupo de


professores de escolas de concelho diferente dos abrangidos pelo estudo.

3.1.4 - Construção do questioná rio definitivo com base na interpretação dos dados
resultantes da aplicação do pré-questionário.

© Universidade Aberta 299


Anexos

3.1.5 - Identificação dos sujeitos de investigação.

3.1.6 - Aplica çã o do questioná rio (ter em conta procedimentos éticos e morais,


definição de prazos, recomenda ções de uso, garantias de anonimato e total
confidencialidade).

3.1.7 - Execução do plano de recolha de dados.

3.1.8 - Execução do plano de tratamento, análise e interpretação de dados.

3.1.9 - Preparação do relatório da pesquisa ( redação dos resultados, conclusões e


recomendações).

3.2. Sujeitos de investigação

A pesquisa abrange um universo de estudo de 193 professores do Io ciclo, dos quais 98


estã o colocados em escolas do concelho de Almada e 95 no concelho do Seixal.

A seleção dos professores a quem é aplicado o pré-questionário é feita de forma aleatória,


apenas considerando os das escolas que são frequentadas por crianças de minorias étnicas
em quantidade significativa e de forma proporcional ao número de professores colocados
nas escolas dos dois concelhos.

3.3. Técnicas e instrumentos

O plano de investigação inclui uma entrevista exploratória a 6 professores; um pré-


-questionário administrado a 20 professores; um pré-questionário administrado a 20
professores selecionados aleatoriamente e a aplicação de um questionário ao universo
em estudo de 193 professores.

3.4. Atividades ( já desenvolvidas à data da publica çã o deste manual)

Depois de delimitado o campo, iniciou-se a atividade com entrevistas livres exploratórias


a 6 professores que falaram para um gravador áudio das suas pré-conceções, raciocínios
espontâneos e estereótipos ligados às minorias étnicas da área envolvente das escolas
onde estão colocados; falaram ainda dos conhecimentos, imagens e normas que retiveram
nas suas vivências, diretas ou indiretas, com as minorias étnicas; disseram das influências
que sofreram dos familiares, dos amigos, do meio e da comunica ção social.

Foi feita depois uma análise do conteúdo do registo das entrevistas que serviu de base
à construção dum pré-teste com 72 questões, obedecendo aos normativos habituais
para este tipo de instrumento de pesquisa: a prepara ção, a formulação e a redação das
perguntas.

© Universidade Aberta 300


Anexos

A atividade de testagem que se lhe seguiu foi a da aplica ção do pré-questioná rio a 20
indivíduos selecionados aleatoriamente, todos professores do l.° ciclo, colocados em
escolas fora dos concelhos de Almada e Seixal, mas com idêntica caracterização no que
respeita à frequência de minorias étnicas.

Depois de feita a análise das respostas dadas ao pré-questionário, a atividade seguinte


centrou-se na afinaçã o final de construção do questionário definitivo.

Finalmente, como atividade, procedeu-se à aplicação do questionário ao universo em


estudo de 193 professores.

3.5. Validade

A validade interna é a qualidade fundamental do teste. A validade evidencia o grau em


que o questionário mede aquilo que se pretende medir numa pesquisa; portanto, é o
critério que determina a pertinência do questionário.

A validade interna do estudo foi assegurada por uma forma de validaçã o operacional,
baseada no coeficiente de homogeneidade.

3.6. Aná lise dos dados

Os questionários foram analisados para converter em dados informações ali fornecidas


pelos indivíduos inquiridos. Antes tinha sido construída uma escala de Lickert, de cinco
intervalos (concordo plenamente - concordo - indeciso - discordo - discordo plenamente)
que aparecia nos questionários e que mereceu a sinalização pelos indivíduos sujeitos da
investiga ção.

Para o tratamento dos dados foi escolhida uma prova estatística que, no caso deste
estudo, foi uma prova estatística não paramétrica; para a aplicação dessa prova usou-se
um programa de computador (Statgraph).

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Anexos

3.7. Calendariza çã o

0 cronograma deste estudo de pesquisa foi o seguinte:

- Estudo exploratório - trabalho de campo ( 6 entrevistas) out./ nov.

- Construção do pré-teste dez.


- Aplicação do pré -teste trabalho de campo ( 20 indivíduos) fev*

- Construção do questionário definitivo trabalho de campo março/abril/maio

- Execução do plano de recolha, aná lise e tratamento dos dados (193 junho/julho
professores)
- Prepara ção do relatório da pesquisa (redação dos resultados, conclusões set./ out.
e recomendações)

4. REFERÊ NCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Tese de doutoramento - Un. de Louvain, Fac. de Psychology et Sciences de
1'Éducation.

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Produção

UNIVERSIDADE ABERTA

edição eletrónica, 2015


I'

I H

1 Manuela Malheiro Ferreira é licenciada em Geografia pela Fac,


Letras - Univ. Lisboa , doutorada em Didática da Geografia e das
Ci ê ncias Sociais peta Univ. Paris VII - Denis Diderot e em Ciências
* de Educaçã o - Desenvolvimento Curricular pelo Instituto de
Educa çã o - Univ. Londres, Professora Associada da Univ. Aberta
até 2011 Atualmente i nvestigadora do CEM RI - Centro de
I Estudos das Migra ções e das Rela ções Interculturais da UAb.

UNIVERSIDADE

AbERTA www. uab. pt

09
ISBN: 978 -972- 674-759- 8

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