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BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________________________
Profa. Dra. Maria Zenaide Valdivino da Silva
(Presidente/Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - UERN)
___________________________________________________________________
Profa. Dra. Clarice Lage Gualberto
(1º Examinador Externo/Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG)
___________________________________________________________________
Prof. Dr. José Cezinaldo Rocha Bessa
(2º Examinador Interno/Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - UERN)
___________________________________________________________________
Prof. Dr. Marcos Nonato de Oliveira
(1º Suplente Interno/Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - UERN)
_____________________________________________________________________
Prof. Dr. Fabio Nunes Assunção
(2º Suplente Externo/Universidade Federal do Ceará - UFC)
Artigo publicado no jornal local, Avonlea Gazette, em junho de 1899.
A todas as mulheres, cis ou trans, que já foram
oprimidas por sua condição de ser e existir
nessa sociedade patriarcal,
Dedico.
AGRADECIMENTOS
A Deus, ao universo, aos orixás e às forças da natureza por me guiarem até aqui.
À minha mãe, Raimunda de Sousa, por ser o meu exemplo de força e otimismo durante as
minhas batalhas internas e externas. Gratidão por apoiar todos os meus sonhos!
À Lanielle Fonseca, minha grande incentivadora e apoiadora neste sonho. Obrigada por me
fazer acreditar em mim e não me deixar desistir. Você fez toda a diferença durante o meu
percurso de mestranda. Gratidão pela parceria!
À Liz (minha doguinha), por me acordar todos os dias com alegria e lambidas. Eu amo ter te
adotado e amo a nossa família. Gratidão por existir!
À professora Dra. Maria Zenaide, por todo o conhecimento compartilhado durante esses dois
anos do curso e no decorrer da pesquisa. Obrigada pela condução paciente do trabalho, pelos
insights acadêmicos e por contribuir com a minha formação profissional e empoderamento
pessoal. Gratidão pela confiança!
Ao meu amigo, Diego Gomes, pelas orientações que muito me ajudaram durante o processo
seletivo do curso, pelas conversas, nas quais, dividíamos as nossas aflições de mestrandos
pandêmicos e pela amizade estabelecida não importando a distância. Gratidão por mais essa!
À minha amiga, Jacqueline Marques, que foi minha professora e hoje é companheira de
trabalho na instituição onde a pesquisa foi realizada. Obrigada por me incentivar na realização
deste sonho e me avisar sobre a seleção em tempo hábil além do apoio durante o percurso e
feitura da pesquisa. Gratidão por tudo!
À minha companheira de curso, Ivone Estevam, por toda a troca de ideias no percurso do
mestrado, pelas conversas de incentivo e estímulo e pela disposição sempre que pedi ajuda.
Gratidão pela paciência!
Ao professor Dr. Marcos Nonato, por todo o aprendizado e incentivo durante as aulas. O
admiro pelo excelente profissional e, sobretudo, o grande ser humano que és. Gratidão pelos
ensinamentos!
À professora Dra. Clarice Gualberto, por ter aceitado o convite e participar desse momento
ímpar da minha vida assim como, as contribuições e sugestões dadas durante a qualificação do
nosso trabalho. Gratidão!
Ao professor Dr. José Cezinaldo, por também compor a banca examinadora e contribuir com
a melhoria do nosso trabalho durante a qualificação da pesquisa. Gratidão pelas contribuições!
Ao professor Dr. Fabio Nunes, por aceitar compor a banca como suplente externo. Gratidão!
RESUMO
Diante das profundas transformações nos processos de comunicação e nas nossas práticas
sociais, cabe à escola e aos professores atentar para essa pluralidade de signos denominada
multimodalidade. Considerando-a um traço característico da linguagem, e notadamente, dos
textos midiáticos, nossas concepções de texto e, consequentemente, de leitura se ampliam
significativamente. Sob essa perspectiva, voltamos o nosso olhar para o âmbito escolar e para
as possibilidades de construção de sentidos que esse espaço pode desenvolver na formação
discente. Para tanto, nossa pesquisa tem amparo teórico na Semiótica Social, na
Multimodalidade e na Pedagogia dos Multiletramentos, a partir dos postulados de Bourdieu
(1998), Kress e van Leeuwen (1996, 2006), Kress (2010), o manifesto do Grupo Nova Londres
(1996) e no modelo Show Me, proposto por Callow (2008, 2013). Este trabalho utiliza o seriado
Anne with an “e” como recurso didático na sala de aula de língua inglesa, com vistas a
investigar o potencial das séries de tv como ferramenta pedagógica à luz da multimodalidade e
do letramento visual crítico, explorando o papel social da mulher nas cenas e fomentando a
discussão sobre a desigualdade de gênero. Objetivamos explorar representações sociais da
mulher presentes na série Anne with an “e” na sala de aula de língua inglesa do ensino médio;
identificar como o uso da série Anne with an “e” contribui para o letramento visual crítico dos
alunos por meio do modelo Show Me de Jon Callow e verificar como a série pode estimular o
letramento visual crítico dos alunos para as suas práticas sociais, a partir dos sentidos
veiculados. Nossa investigação, de natureza aplicada, consiste em uma pesquisa/ação e tem
abordagem qualitativa, descritiva e interpretativista quanto aos procedimentos de análise. O
corpus da pesquisa se constitui das informações retiradas das gravações das aulas e do roteiro
de análise semiestruturado e tem a sala de aula do ensino médio de uma escola pública da rede
estadual do Ceará como locus para a intervenção. Através dos nossos resultados, percebemos
que, as séries de tv oferecem grande potencial como ferramenta pedagógica, visto que,
promovem o engajamento dos alunos. Considerando o roteiro de análise semiestruturado,
constatamos que, a leitura das cenas feitas pelos alunos se deu, majoritariamente, pelos nossos
estímulos durante a intervenção, ou seja, sem esses estímulos os estudantes focariam suas
interpretações no discurso verbal, além disso, identificamos que, os discentes tiveram certa
dificuldade em analisar criticamente o conteúdo veiculado nas cenas e relacioná-los às suas
vivências sociais. Diante disso, percebemos o quanto é necessário introduzir a abordagem
multimodal na prática pedagógica visando um melhor desempenho dos nossos alunos enquanto
leitores e produtores de sentidos.
Palavras-chave: Letramento Multimodal Crítico. Ensino de Língua Inglesa. Representações
Sociais. Anne with an “e”.
ABSTRACT
Faced with the profound changes in communication processes and in our social practices, it is
up to the school and the teachers to pay attention to this plurality of signs called multimodality.
Considering it a characteristic feature of language, and notably, of media texts, our conceptions
of text and, consequently, of reading are significantly expanded. From this perspective, we turn
our gaze to the school environment and to the possibilities of building meanings that this space
can develop in student education. Therefore, our research has theoretical support in Social
Semiotics, Multimodality and the Pedagogy of Multiliteracies, based on the postulates of
Bourdieu (1998), Kress and van Leeuwen (1996, 2006), Kress (2010), the manifesto of the
Nova Group London (1996) and in the Show Me model, proposed by Callow (2008, 2013).
This work uses the series Anne with an “e” as a didactic resource in the English language
classroom, in order to investigate the potential of TV series as a pedagogical tool in the light of
multimodality and critical visual literacy, exploring the social role of women in the scenes and
encouraging the discussion about gender inequality. We aim to explore the social
representations of women present in the Anne with an “e” series in the high school English
language classroom; identify how the use of the Anne with an "e" series contributes to students'
critical visual literacy through Jon Callow's Show Me model and verify how the series can
stimulate students' critical visual literacy for their social practices, from of the conveyed
meanings. Our investigation, of an applied nature, consists of a research/action and has a
qualitative, descriptive and interpretive approach regarding the analysis procedures. The
research corpus consists of the information taken from the recordings of the classes and the
semi-structured analysis script and has the high school classroom of a public school in the state
network of Ceará as the locus for the intervention. Through our results, we realized that TV
series offer great potential as a pedagogical tool, since they promote student engagement.
Considering the semi-structured analysis script, we found that the reading of the scenes made
by the students took place, mostly, by our stimuli during the intervention, that is, without these
stimuli the students would focus their interpretations on the verbal speech, in addition, we
identified that, the students had some difficulty in critically analyzing the content conveyed in
the scenes and relating them to their social experiences. In view of this, we realize how
necessary it is to introduce the multimodal approach in pedagogical practice aiming at a better
performance of our students as readers and producers of meanings.
Keywords: Critical Multimodal Literacy. English Langauge Teaching. Social
Representations. Anne with an “e”.
LISTA DE FIGURAS
1 INTRODUÇÃO................................................................................................ 16
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.................................................................. 22
2.1 A CONSTRUÇÃO DO PAPEL SOCIAL DA MULHER................................ 22
2.2 SEMIÓTICA SOCIAL: UM PANORAMA GERAL....................................... 28
2.3 MULTIMODALIDADE E ENSINO: CONCEPÇÃO DE TEXTO E
LEITURA.......................................................................................................... 32
2.4 MULTILETRAMENTOS NA SALA DE AULA: UMA PRÁXIS
NECESSÁRIA................................................................................................... 38
2.5 LEITURA MULTIMODAL: A RELEVÂNCIA DOS LETRAMENTOS
VISUAL E DIGITAL........................................................................................ 44
2.6 AS SÉRIES DE TV COMO FERRAMENTA PEDAGÓGICA NA AULA
DE LÍNGUA INGLESA.................................................................................... 55
2.7 O MODELO SHOW ME DE JON CALLOW................................................... 64
2.7.1 Dimensão Afetiva............................................................................................. 66
2.7.2 Dimensão Composicional................................................................................ 67
2.7.3 Dimensão Crítica.............................................................................................. 69
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.................................................. 73
3.1 A NATUREZA DA PESQUISA....................................................................... 73
3.2 O CONTEXTO DA PESQUISA....................................................................... 74
3.2.1 O corpus da pesquisa....................................................................................... 75
3.2.2 O locus da pesquisa.......................................................................................... 75
3.2.3 O perfil dos participantes da pesquisa........................................................... 76
3.3 OS PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E OS INSTRUMENTOS
PARA A COLETA DE DADOS....................................................................... 76
3.3.1 Instrumentos para a coleta de dados.............................................................. 82
3.4 CATEGORIAS PARA A ANÁLISE DOS DADOS......................................... 83
4 O LETRAMENTO MULTIMODAL CRÍTICO EM ANNE WITH AN
“E”: UMA PROPOSTA DIDÁTICO-PEDAGÓGICA.............................. 84
4.1 CONCEPÇÕES DISCENTES SOBRE REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA
MULHER........................................................................................................... 84
4.2 DIMENSÕES AFETIVA, COMPOSICIONAL E CRÍTICA NAS CENAS
TRABALHADAS.............................................................................................. 95
4.3 O LETRAMENTO VISUAL CRÍTICO E O CONTEXTO SOCIAL DOS
ESTUDANTES.................................................................................................. 107
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................... 132
REFERÊNCIAS............................................................................................... 137
APÊNDICES.................................................................................................... 141
APÊNDICE A.................................................................................................... 142
APÊNDICE B.................................................................................................... 143
APÊNDICE C.................................................................................................... 145
APÊNDICE D.................................................................................................... 146
16
1 INTRODUÇÃO
diferentes espaços que exigem a nossa leitura e compreensão em um segundo idioma associada
ao visual.
Conscientes de que a nossa investigação proporciona a análise e reflexão do conceito
de leitura assim como, a prática dos letramentos, defendemos a relevância dessa pesquisa para
a prática docente e para a formação dos alunos pela contribuição para o ensino de língua inglesa.
Endossando os nossos estudos, trazemos Bourdieu (1998), Kress e van Leeuwen (1996, 2006),
Kress (2010), a Pedagogia dos Multiletramentos defendida pelo Grupo Nova Londres (1996) e
o modelo Show Me proposto por Jon Callow (2008, 2013).
Para o desenvolvimento da pesquisa, centralizamos algumas questões norteadoras para
orientar a condução do trabalho. A primeira delas é: 1. Quais concepções sobre as
representações sociais da mulher os alunos identificaram nas cenas da série Anne with an “e”?
2. Como as dimensões afetiva, composicional e crítica foram interpretadas pelos alunos? 3.
Como o letramento visual crítico foi estimulado nas cenas dialogando com as práticas sociais
dos alunos?
De acordo com as questões levantadas, definimos os nossos objetivos em geral e
específicos para respondermos as questões norteadoras da pesquisa, sendo o objetivo geral:
Investigar a potencialidade das séries de tv como ferramenta pedagógica na sala de aula de
língua inglesa a luz da multimodalidade e do letramento visual crítico. Objetivos específicos:
1. Explorar as concepções dos discentes sobre representações sociais da mulher na série Anne
with an “e” na sala de aula de língua inglesa do ensino médio; 2. Verificar como as dimensões
afetiva, composicional e crítica foram identificadas pelos alunos; 3. Analisar como o letramento
visual crítico foi estimulado dialogando com as práticas sociais dos alunos.
Como parte do processo para o desenvolvimento da pesquisa, realizamos a revisão de
literatura em busca de teses, dissertações, monografias e artigos que se assemelhassem ao nosso
trabalho como fonte de referências, mas sobretudo, para conhecermos quais aspectos já foram
investigados dentro da temática das séries de tv. Como resultado desse processo, encontramos
trabalhos que envolvem desde a metodologia com séries a estudos sobre o comportamento dos
consumidores das produções audiovisuais, o que nos forneceu subsídios para traçarmos um
caminho inovador com a nossa pesquisa.
Na monografia de Lima (2013), encontrada no site da Universidade Federal de Juiz de
Fora (UFJF), intitulada De olho na tela: O consumo de séries de TVS norte-americanas através
da internet, a autora discute sobre como a internet é uma grande aliada para o consumo de séries
e também para suprir a função da programação da tv. O objetivo do trabalho foi analisar a
relação de fãs de seriados com a internet. A pesquisa apresenta um termo cunhado de
19
convergência midiática para explicar o consumo por meio da rede mundial de computadores.
Como metodologia, foi usada a revisão bibliográfica, a observação participante, recursos da
etnografia e a entrevista em profundidade. Os resultados encontrados traçaram o perfil dos
usuários ativos na internet e comprovaram que essa nova forma de consumo coloca o espectador
em evidência para participar de discussões em chats e fóruns destinados para tal atividade.
Na dissertação de Couto (2015), intitulada Um jogo de rainhas: as mulheres de Game
of Thrones e disponível no site da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), a autora analisa
as identidades da mulher representadas na série através de três personagens da primeira
temporada. O trabalho enfatiza que os meios de comunicação e os seus produtos são
fundamentais para a propagação de valores e fornecimento de subsídios para que o indivíduo
construa sua identidade. Para a pesquisadora, Game of Thrones é uma grande metáfora da
sociedade atual.
Já na dissertação de Ortis (2019), intitulada Representações femininas em Game of
Thrones: mediações entre os sete reinos e a contemporaneidade, disponível no site da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), temos a mesma série no centro dos
debates com questionamentos acerca de como são representadas as identidades femininas das
personagens Arya e Sansa Stark. De um modo geral, a pesquisa objetivou verificar através dos
elementos narrativos quais pautas feministas são acionadas pela série e como elas contribuem
para a construção da identidade da mulher contemporânea. A autora aponta para o contexto no
qual essas mulheres estão inseridas na produção televisiva para abordar como a série
problematiza violências contra o feminino, por exemplo.
Sob uma perspectiva semelhante, a dissertação de Terres (2019), Feminine power in
the HBO TV series Game of Thrones: the case of Daenerys Targaryen, disponível no site da
Universidade Federal de Santa Cataria (UFSC), traz uma discussão sobre a representação de
gêneros e relações de poder através de uma personagem específica na série. A análise das cenas
tem aporte teórico na Línguística Sistêmica Funcional de Halliday (1995), na Análise Crítica
do Discurso de Fairclough (2010) e na Gramática do Design Visual de Kress e van Leeuwen
(1996, 2006). Os resultados apresentados mostraram um empoderamento da personagem
através de sua representação verbal e visual.
Observou-se que a temática de gênero e representação da mulher tem crescido como
objeto de estudos fomentando a pauta de discussões sobre a desigualdade de gênero. No entanto,
esses trabalhos não tiveram como locus a sala de aula e o enfoque no ensino. Desse modo, essa
pesquisa vem a contribuir para o ensino enfatizando os múltiplos modos de texto e leitura, além
de investir na prática docente transformando a série de tv em uma ferramenta pedagógica.
20
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Neste capítulo, será apresentado uma breve discussão sobre a construção do papel
social da mulher ao longo da história e os principais conceitos da Semiótica Social,
Multimodalidade e Multiletramentos, mais especificamente, o letramento visual e digital, tendo
como principais aportes teóricos os pressupostos de Bourdieu (1998), Kress e van Leeuwen
(1996, 2006), a Pedagogia dos Multiletramentos (1996) e Callow (2008, 2013).
A princípio, será realizada uma contextualização histórica e reflexiva sobre a
construção do papel social da mulher com base na ideologia binária do patriarcado, visto que,
esse é o tema de debate e análise da intervenção multimodal. Logo após, será abordado a
relevância do letramento multimodal e a sua implementação no contexto escolar usando as
séries de tv como ferramenta pedagógica. Para sustentar a pesquisa, será apresentado também
o modelo Show Me de Callow (2008) nas suas três dimensões: afetiva, composicional e crítica.
O capítulo encontra-se estruturado da seguinte maneira: 2.1 “A construção do papel
social da mulher”; 2.2 “Semiótica Social: um panorama geral”; 2.3 Multimodalidade e ensino:
concepção de texto e leitura”; 2.4 Multiletramentos: uma práxis necessária”; 2.5 Leitura
multimodal: a relevância dos letramentos visual e digital”; 2.6 As séries de tv como ferramenta
pedagógica”; 2.7 “O modelo Show Me de Jon Callow sendo que, essa última, se desmembrou
em três subseções: 2.7.1 “Dimensão afetiva”; 2.7.2 Dimensão composicional” e 2.7.3 e
“Dimensão crítica”. Segue a ilustração das seções:
Foi nessa década, por exemplo, que a pílula anticoncepcional foi criada e que a
educação para mulheres começou a ser estimulada por faculdades e fundações que
incentivavam as mulheres a obterem títulos, oferecendo apoio financeiro e bolsas de estudo.
Porém, apesar desse início promissor, as mulheres ainda eram discriminadas nas profissões
intelectualizadas.
Ressalta-se que, a luta das mulheres no decorrer dos anos é a de torná-las atuantes na
história, de incluí-las como sujeitos do processo de construção de uma sociedade, dando-lhes a
devida importância e, acima de tudo, os direitos que lhe foram negados em detrimento dos
privilégios masculinos. Sabe-se também que o comportamento padrão para uma mulher era ser
educada para casar e ter filhos. A submissão feminina se dava por vários meios, como a
doméstica, financeira e sexual. O trabalho fora de casa era tarefa exclusiva dos homens, que
eram os provedores da família, desta forma, restava para as mulheres a educação dos filhos e
as tarefas domésticas.
Para inserirem-se no mercado de trabalho foi uma longa peregrinação, que teve como
divisor de águas, as guerras. As mulheres começaram a desejar mais autonomia, a palavra de
ordem era: liberdade. Esse desejo também foi refletido na moda da época que ditava qual peça
era mais adequada ou feminina, foi então que surgiu a mini-saia, que se tornou item preferido
da moda jovem. As mulheres abandonaram as saias rodadas e a moda passou a ser uma questão
de expressão, acima de tudo. O período de transição, da busca pelo novo, influenciou o
pensamento de mulheres que, até então, não enxergavam perspectivas de trabalho, carreira e
liberdade sexual.
O desenvolvimento do pensamento feminista acarretou profundas transformações de
ordem social, uma vez que, as relações de poder e gênero começaram a ser questionadas e a
mulher passou a buscar a equiparidade de direitos na sociedade. São muitos os fatores que
contribuíram para a dominação histórica sobre as mulheres. Segundo Engels (1987 apud
SOUSA; DIAS, 2013, p. 145), “A dominação do sexo masculino sobre o feminino não consiste
em uma questão absolutamente natural, mas em uma construção social originada pelo fator
econômico, mais precisamente, desde a divisão sexual do trabalho.”
É imprescindível destacar que, a inserção no mercado de trabalho foi uma força motriz
para legitimar o movimento feminista e, corroborando este pensamento, Engels (1987 apud
SOUSA; DIAS, 2013, p. 145) afirma que “a mulher só se emanciparia quando retornasse ao
trabalho produtivo social, condição esta que seria alcançada com a grande indústria moderna
que permitiria o trabalho feminino.”
24
Este modelo de sociedade perdura até hoje e sofreu variações de acordo com as
culturas, épocas e contextos históricos. Os efeitos deste modelo de educação ecoaram e ainda
ecoam na sociedade vigente e na forma como os homens enxergam as mulheres,
principalmente, na resistência de “ceder” espaço ao sexo feminino. É preciso entender que, o
feminismo tem um conceito bastante amplo no que se refere à luta pelos direitos das mulheres.
Assim,
Seja como for, mesmo que se entenda que o feminismo esteja restrito aos últimos dois
ou três séculos, trata-se de um movimento político bastante amplo que, alicerçado na
crença de que, consciente e coletivamente, as mulheres podem mudar a posição de
inferioridade que ocupam no meio social, abarca desde reformas culturais, legais, e
econômicas, referentes ao direito da mulher ao voto, à educação, à licença-
maternidade, à prática de esportes, à igualdade de remuneração para função igual etc.,
até uma teoria feminista acadêmica, voltada para reformas relacionadas ao modo de
ler o texto literário (ZOLIN, 2009, p.220).
de etiqueta para serem consideradas “decentes”, deviam falar baixo, serem submissas e
contidas. O papel da mulher estava, até então, muito bem definido, assim como o da figura
masculina. A relação de poder entre o dominador e o dominante nunca havia sido questionada,
como fora naquela década. Segundo Bassanezi (1996 apud CUNHA, 2001, p. 202):
Essas relações são definidas por um conjunto de normas sociais, mas aparecem em
termos de representações como naturais, desistoricizadas e válidas para todas as
classes. O casamento define direitos e atribuições com relação aos gêneros traduzidos
frequentemente em desigualdades e dominação do feminino pelo masculino.
Se a relação sexual se mostra como uma relação social de dominação, é porque ela
está construída através do princípio de divisão fundamental entre o masculino, ativo,
e o feminino, passivo, e porque este princípio cria, organiza, expressa e dirige o desejo
– o desejo masculino como desejo de posse, como dominação erotizada, e o desejo
feminino como desejo da dominação masculina, como subordinação erotizada, ou
mesmo, em última instância, como reconhecimento erotizado da dominação.(
PIERRE BOURDIEU (1998, p. 15).
Promover essa reflexão dentro da sala de aula construirá cidadãos conscientes das
questões sociais e, que poderão atuar em prol de uma sociedade mais igualitária. Apesar do
movimento feminista apresentar algumas vertentes, como o feminismo negro que tem como
grande representante no Brasil a filósofa e escritora, Djamila Ribeiro, a discussão do tema já se
encontrava na literatura como por exemplo: a inglesa Mary Wollstonecraft que, em 1972
publicou um dos clássicos da literatura feminista, A Vindication of the rights of Womam (As
reivindicações dos direitos da mulher). A obra pregava a liberdade de expressão feminina e o
direito à educação, para que as mulheres pudessem se desenvolver e se libertarem da opressão
masculina.
Outras escritoras que foram fundamentais para o movimento feminista foram: Virgínia
Woolf e Simone de Beauvoir. Woolf desenvolveu um tipo de narrativa já inovadora para a sua
época, que se baseava no monólogo interior e fluxo da consciência deixando sua marca na
literatura inglesa, mais especificamente, no ensaio A room of one’s own (Um teto todo seu)
26
publicado em 1929, em que a autora abordou a temática das mulheres e seu trabalho do ponto
de vista intelectual.
O ensaio apregoava a necessidade de um espaço próprio, de fato, “um teto todo seu” e
uma renda que garantisse a estabilidade financeira da mulher, para que a mesma tivesse
condições de trabalhar e criar. Isso já mostra o porquê de Virginia Woolf ser uma precursora
do feminismo. É evidente que a autora já abordava o tema da mulher sob a perspectiva da
igualdade, colocando a importância das mulheres nas artes, principalmente, na literatura,
criando a atmosfera de que mulheres escritoras também poderiam contribuir criticamente para
a sociedade.
Outra obra muito importante para o movimento feminista foi O Segundo sexo (1967),
de Simone de Beauvoir. A escritora abordou o feminismo de uma forma existencialista. O
feminismo defendido por Beauvoir criticava os padrões estabelecidos para a relação de gênero
homem e mulher. A ensaísta analisava e procurava explicar quais os responsáveis pelas relações
de propriedade e opressão, existentes entre homens e mulheres. Propondo assim, que o conceito
sobre mulher fosse algo criado pela própria sociedade, Zolin (2009) afirma que:
Para melhor exemplificar a ideia da escritora, tem-se a tão famigerada frase que se
tornou símbolo do movimento feminista “Ninguém nasce mulher: torna-se mulher”. A tão
célebre frase de Beauvoir apontava o cunho de seu estudo: a opressão sobre as mulheres e o
papel que a sociedade exercia para estimular ou emancipar a classe feminina. A obra de
Beauvoir causou na época de sua publicação grande polêmica, pois nela continha um conjunto
de ideias que exemplificavam a opressão das mulheres e promovia a reflexão da sociedade para
a discriminação feminina. Toda a obra era embasada em estudos, pesquisas e experiências
vivenciadas pela própria autora apresentando assim, um caráter social, econômico, filosófico e
etc.
Ao observar o contexto de várias sociedades, Beauvoir descreve a formação da
identidade feminina como um processo moldado pela comunidade na qual a mulher está
inserida. Desde seu nascimento, a educação que lhes era dada, propunha uma mulher frágil, o
que as excluía, justificando a supremacia masculina.
27
Como se pode observar, o feminismo é um movimento amplo, que pode até diferir em
alguns aspectos. Dependendo da abordagem que lhe é dada, ele pode apresentar-se como
feminismo radical, liberal ou socialista. Cada aspecto destes, apesar de possuir ideias e
discursos diferentes, tem o mesmo objetivo final: promover a igualdade das mulheres perante
a sociedade, os homens e ao mundo. Em 1970, mais uma obra de cunho feminista foi publicada
Sexual Politics, de Kate Millet, a autora discutia a opressão feminina pelo viés do patriarcado
e o fato de as mulheres sempre assumirem um papel secundário, ou serem vistas como inferiores
perante os homens. O movimento feminista, agora organizado e bem articulado, possuía
condições de luta e argumentação para buscar promover a igualdade de gênero, então, no final
de 1970, a política feminista promoveu grandes mudanças na sociedade.
No final dos anos 70, as disputas de gênero passaram a ocupar lugares de destaques
nos movimentos sociais, quando as mulheres ampliaram sua participação nos debates
e na liderança das organizações, reivindicando mudanças na divisão do trabalho
doméstico. Por um breve momento, o risco de desestruturação familiar provocada pela
não-submissão das mulheres parecia ameaçar o movimento. Após um primeiro
momento de desestabilização, tais movimentos ampliaram o debate sobre gênero e
família que alterou o status das mulheres em seus quadros e no interior das famílias
integrantes das organizações. A crise revelava um momento de questionamento dos
padrões culturais para a divisão do trabalho e das responsabilidades por sexo, no qual
elementos da cultura tradicional eram colocados em xeque, ao mesmo tempo em que
eram considerados parâmetros para a nova situação. (SANTOS, 2011, p.87)
A Semiótica Social, doravante SS, é a área maior que abrange os estudos sobre
multimodalidade e a construção dos sentidos, sendo importante compreender o que ela teoriza
e quais os seus principais conceitos. Segundo Bezemer; Jewitt (2009), diferentes versões da
semiótica social foram lançadas desde a publicação de Language as social semiotic, de Michael
Halliday (1978). Nessa obra, o autor propõe que os recursos semióticos sejam usados e
moldados pela forma como as pessoas constroem significados. Em 1988, tomando por base as
premissas de Halliday, Robert Hodge; Gunther Kress publicaram Social Semiotics
desenvolvendo, por sua vez, um olhar crítico sobre os postulados de Halliday problematizando
algumas noções que consideravam essenciais para os estudos da SS.
De acordo com Silva (2016), a teoria da Semiótica é o estudo dos signos e essa teoria
está concentrada nos sistemas de signos e em como eles fazem sentido. “Assim, um dos
conceitos básicos da Semiótica Social é o signo motivado (motivated sign), que se refere não
apenas ao signo como a junção de forma e significado, mas também aos interesses envolvidos
na sua produção (GUALBERTO, PIMENTA, SANTOS, 2018, p. 16).” Ela visa entender,
portanto, o contexto no qual os signos foram gerados e em como a comunicação foi
estabelecida. “O mesmo se aplica ao social na semiótica social. Ele só pode ganhar vida quando
a semiótica social se envolver totalmente com a teoria social. Este tipo de interdisciplinaridade
é uma característica absolutamente essencial da semiótica social” (VAN LEEUWEN, 1996, p.
14).1
Hodge; Kress (1988) debruçaram-se sobre noções que consideravam essencialistas
para o termo significado afirmando que, a semiótica tradicional atribuía características fixas ao
significado e que este poderia ser retirado do texto e decodificado. Esse é o ponto de divergência
em que, os supracitados autores, apontam que a semiótica social não é um conjunto de signos
pré-fixados ou previsíveis. Na verdade, o que permeia a produção de sentidos são as incertezas,
pois, não se pode esperar que os textos produzam exatamente o que o autor intencionou. A
representação/interpretação pessoal dar-se-á de forma intrínseca ao contexto de recepção do
1
The same applies to the ‘social’ in ‘social semiotics’. It can only come into its own when social semiotics fully
engages with social theory. This kind of interdisciplinarity is an absolutely essential feature of social semiotics
(VAN LEEUWEN, 1996, p. 14). Todas as traduções deste trabalho são de autoria da pesquisadora.
29
texto, portanto, a SS surgiu a partir desses estudos. Endossando as concepções sobre o signo
motivado, Descardeci (2002, p. 20) afirma que:
2
It studies the media of dissemination and the modes of communication that people use and develop to represent
their understanding of the world and to shape power relations with others (BEZEMER & JEWITT, 2009, p. 01).
30
comunicação uma mediadora desse processo. Segundo Bezemer e Jewitt (2009, p. 06)3, “a
semiótica social sustenta que o processo de produção de signos está sujeito ao interesse dos
produtores, sua disponibilidade de recursos semióticos e a adequação desses recursos aos
significados que desejam realizar”.
A respeito dos recursos semióticos, são meios para materializar o sentido e são
fundamentais para a multimodalidade, assim, todos são produtores de signos e a construção
significativa dos signos está atrelada a sua função e contexto social. Para nos comunicarmos,
criamos um signo fazendo escolhas através dos recursos existentes e essas escolhas são
socialmente localizadas e contextualizadas implicando na forma que construiremos a
comunicação e em como o receptor a entenderá.
Ao assistir a uma palestra, por exemplo, existem pessoas que preferem registrá-la
gravando um áudio; outras optam por tirar fotos dos slides; há, ainda, aquelas que
3
Social semiotics holds that the process of sign-making is subject to the interest of sign-makers, their availability
of semiotic resources and the aptness of those resources to the meanings which they wish to realize (BEZEMER
& JEWITT, 2009, p. 06).
4
The concept of semiotic resource offers a different starting point for thinking about semiotic systems and the role
of the sign maker in the process of making meaning. In this perspective signs are a product of a social process of
sign making. A person (sign maker) ‘chooses’ a semiotic resource from an available system of resources. They
bring together a semiotic resource (a signifier) with the meaning (the signified) that they want to express. In other
words people express meanings through their selection from the semiotic resources that are available to them in a
particular moment: meaning is choice from a system. But this choice is always socially located and regulated... ...”
(BEZEMER, JEWITT, 2009, p. 06).
5
Studying the semiotic potential of a given semiotic resource is studying how that resource has been, is, and can
be used for purposes of communication, it is drawing up an inventory of past and present and maybe also future
resources and their uses. (VAN LEEUWEN, 1996, p. 05)
31
O mundo semiótico contemporâneo coloca questões agudas sobre o texto. Cada vez
mais os fabricantes de texto utilizam vários modos de representação e, em muitos
textos, escrever não é o meio central para criar significado. A multimodalidade dos
textos está intimamente ligada a mudanças profundas nas relações sociais entre
aqueles que fazem e aqueles que se envolvem com o texto (BEZEMER ;KRESS,
2010, p. 10)6.
6
The contemporary semiotic world poses sharp questions about text. Increasingly text makers draw on several
modes of representation and in many texts writing is not the central means for making meaning. The multimodality
of texts is intimately connected with profound changes in the social relations between those who make and those
who engage with text. BEZEMER, KRESS, 2010, p. 10).
32
todos realizando os significados que fazem parte de seu potencial semiótico. Dessa forma, um
modo não se sobressai ao outro, mas o complementa, ou seja, na sala de aula o livro didático
continuará sendo usado como material didático, mas o professor pode complementar esse
recurso com outros modos semióticos que estão em voga atualmente.
Continuando com a apresentação do aporte teórico, será abordado na próxima seção,
os conceitos de texto e leitura sob a ótica da multimodalidade. Nela, será discutida as
concepções de texto e leitura e suas implicações para o ensino.
novas tipografias. O fato é que, a partir da década de 1990, impulsionadas pelas transformações
tecnológicas, a comunicação nível global começou a mudar e foi alçando voos cada vez maiores
até os dias atuais.
Apesar de não ser um fenômeno recente, a combinação de várias linguagens na
comunicação vem se acentuando, e, chamada pelo termo de multimodalidade, é objeto
de estudo e análise em diversas áreas de pesquisa como comunicação visual, artes e
design, análise do discurso, estudos de gêneros discursivos, e estudos de linguística
sistêmico-funcional (HEMAIS, 2010, p. 01).
Sob essa perspectiva, é evidente que a leitura dos textos visuais é um ponto
extremamente importante para que o letramento multimodal crítico seja estimulado. Na
dinâmica da sala de aula, explorar os textos visuais é uma forma de trabalhar com os alunos
aspectos estéticos que estão evidentes no contexto midiático.
7
Multimodal literacy also includes an aesthetic dimension, an ability to produce and appreciate the aesthetic uses
of layout, colour and typography that are, today, not only found in art, but also in many forms of everyday written
communication. And finally it includes a critical dimension, particularly with regard to the way contemporary
digital technology favours, or even imposes, modes of communication that suit the purposes of corporate culture
but may have drawbacks in other contexts (VAN LEEUWEN, 2017, p. 01).
35
A supracitada autora, reitera a definição de leitura com veemência defendida por Freire
(1989, p. 09), “a leitura de mundo precede a leitura da palavra”. Descardeci (2002), interpreta
o significado do termo leitura no contexto referenciado pelo educador brasileiro "o mundo",
segundo essa afirmativa, é algo que não está descrito em palavras. Leitura, nesse caso, não
significa "decodificação e interpretação do código escrito", mas a construção de significados
que já somos capazes de atribuir antes de irmos para a escola. “Muito antes de entrarmos em
contato com a forma sistematizada do “mundo da escrita”, vivemos experiências de interação
com outras representações do mundo, as quais precisamos compreender” (SOUZA, 2020, p.
27).
A visão do educador brasileiro defende que, as representações que os alunos levam
para o ambiente escolar devem ser valorizadas e tomadas como insumo para o desenvolvimento
de outras formas de comunicação e da aprendizagem. “Assim, antes da escolarização, não só
lemos o mundo, como escrevemos o mundo, ainda que não com a utilização do código
valorizado pela escola” (DESCARDECI 2002, p. 20).
Isso quer dizer que, ao entrar na escola, o aluno carrega, em sua bagagem, experiência
de leitura e de escrita que deve ser considerada e aprimorada, não substituída.
Podemos citar como exemplo, as habilidades de se expressar oralmente, a capacidade
que as crianças têm de fazer suas representações, através de desenhos e rabiscos
atribuindo-lhes significados (SOUZA, 2020, p. 28).
Minha proposta é de que a escola passe a trabalhar o conceito de leitura com uma
visão mais ampla, considerando como fatores interferentes no processo de ler outras
formas de representação da mensagem impressa. Preocupa-me o fato de que as
crenças escolares sobre leitura, limitadas à leitura do código escrito, têm subestimado
36
8
The semiotic changes are vast enough to warrant the term ‘revolution’, of two kinds; of the modes of
representation on the one hand, from the centrality of writing to the increasing significance of image; and of the
media of dissemination on the other, from the centrality of the medium of the book to the medium of the screen.
The fact that these occur as constellations—medium of book with mode of writing and now medium of screen
with mode of image—means that the effect has been experienced in an amplified form. The distinct cultural
technologies for representation and for dissemination have become conflated—and not only in popular
commonsense, so that the decline of the book has been seen as the decline of writing and vice-versa (KRESS 2005,
p. 06).
37
escrito. Pode-se afirmar que, as mudanças semióticas e comunicacionais têm como carro chefe:
as imagens. Para Oliveira (2006), estamos, cada vez mais, percebendo o mundo por meio de
imagens, ícones, símbolos, gráficos e desenhos e a junção dos modos semióticos é o que
acreditamos ser o melhor caminho “assim, recursos visuais como a imagem e o verbal se
fundem e constroem novos sentidos (SILVA, ARAÚJO, 2015, p. 314).
O texto visual permeia boa parte das nossas produções diárias, portanto, ler o visual
tornou-se uma necessidade já que “as novas noções de leitura estão trazendo mudanças no que
os leitores são, então novos usos modais e novas mídias estão tendo efeitos igualmente
profundos na escrita e na noção de autor e autoridade” (KRESS, 2005, p.18-19). As imagens
ganharam um espaço nas nossas relações porque “produzem e reproduzem relações sociais,
comunicam fatos, divulgam eventos, e interagem com seus leitores com uma força semelhante
à de um texto formado por palavras” (FERNANDES, ALMEIDA, 2011, p. 01).
Com o aparato das telas, nossas mensagens são constituídas em grande parte por
símbolos e imagens, devendo o aluno aprender a ler essas mensagens identificando as intenções
na sua composição. Essas mensagens multimodais têm seu processo de leitura pautado na não
linearidade, oferecendo uma leitura de forma mais ampla e dinâmica para compreensão das
informações” (SOUZA, 2020, p. 29).
Se o mundo pós-moderno exige essas leituras, então, cabe aqui o questionamento:
como elas estão sendo trabalhadas nas salas de aulas? A escola busca oferecer aos alunos acesso
à essas novas mídias? É na prática pedagógica que o trabalho com o texto deve ser rearranjado
sob a ótica da multimodalidade. Corrobora-se com Silva; Araújo (2015) ao afirmarem que,
lidamos diariamente com uma série de sistemas de comunicação visuais que exige que tracemos
novos rumos para as nossas práticas pedagógicas, em especial, se tratando do ensino de línguas.
Como essa pesquisa tem locus na aula de LI, a exploração dos textos visuais sob uma
abordagem multimodal é o cerne da discussão. “Diante disso, a leitura deve ser abordada numa
perspectiva ampla, considerando o desenvolvimento de letramentos adequados para a
realização de uma compreensão eficaz” (SOUZA, 2020, p. 30). Para essa condição de
criticidade através da leitura em seus mais diversos modos é o que se denomina como
letramento multimodal crítico.
Na próxima seção, nos aprofundaremos na Pedagogia dos Multiletramentos e nos seus
desdobramentos para a prática escolar, também fazemos a distinção entre alfabetização e
letramento assim como, desenvolvemos alguns aspectos que consideramos relevantes para
atribuir a pedagogia dos multiletramentos a condição de práxis necessária.
38
Nesta seção, exploraremos a teoria dos Multiletramentos perpassando por sua origem,
a distinção entre alfabetização e letramento assim como, conduzimos a discussão para a
necessidade de uma abordagem pedagógica que estimule os letramentos.
Por que propor uma pedagogia dos multiletramentos? Indaga Rojo (2012) que tem
feito importantes contribuições para o assunto no Brasil. No entanto, antes de adentrarmos
numa justificativa, Silva (2016) alerta que antes de surgir tal termo, era a noção de Letramento
que vigorava, definida por Anstey ;Bull (2006, p. 19), como “flexível e sustentável domínio de
um repertório de práticas com textos de tradicionais e novas tecnologias de comunicação via
fala, impressão e multimídia” e são os mesmos autores que apontam que o termo
multiletramentos é um conceito que evoluiu em resposta à preocupação sobre como o ensino
dos letramentos pode equipar os alunos para as mudanças no mundo onde eles vivem.
No centro dos debates, que duraram uma semana, estavam as mudanças emergentes
no cenário mundial, sugeridas em grande parte, pelo avanço da tecnologia. Numa perspectiva
vanguardista, o Grupo Nova Londres, doravante GNL, composto por dez acadêmicos (Courtney
Cazden, Bill Cope, Norman Fairclough, James Gee, Mary Kalantzis, Gunther Kress, Allan
Luke, Carmen Luke, Sarah Michaels e Martin Nakata) defendia uma proposta educacional que
tinha como principal compromisso proporcionar aos alunos uma aprendizagem que permitisse
a participação completa na vida econômica, comunitária e pública (SOUZA, 2020). Esse fato,
justificaria a proposta de uma pedagogia dos multiletramentos, ou seja, o foco na prática social
do aluno. Rojo (2012, p. 12), compartilha das ideias apregoadas pelo GNL:
Nesse manifesto, o grupo afirmava a necessidade de a escola tomar a seu cargo (daí a
proposta de uma “pedagogia”) os novos letramentos emergentes na sociedade
contemporânea, em grande parte — mas não somente — devidos às novas tics2, e de
levar em conta e incluir nos currículos a grande variedade de culturas já presentes nas
salas de aula de um mundo globalizado e caracterizada pela intolerância na
convivência com a diversidade cultural, com a alteridade.
A proposta apresentada pelo GNL converge com as ideias do educador brasileiro Paulo
Freire, pois, ambos advogam por uma educação dialógica movida pelas vivências que o aluno
traz para o processo de construção da aprendizagem. Freire (1987), afirma ser a dialogicidade
a essência da educação como prática da liberdade e, que através dela o pensamento crítico do
9
The first relates to the increasing multiplicity and integration of significant modes of meaning-making, where the
textual is also related to the visual, the audio, the spatial, the behavioral, and so on. This is particularly important
in the mass media, multimedia, and in an electronic hypermedia (NEW LONDON GROUP, 1996, p. 04).
10
Second, we decided to use the term "multiliteracies" as a way to focus on the realities of increasing local diversity
and global connectedness. Dealing with linguistic differences and cultural differences has now become central to
the pragmatics of our working, civic, and private lives. Effective citizenship and productive work now require that
we interact effectively using multiple languages, multiple Englishes, and communication patterns that more
frequently cross cultural, community, and national boundaries. Subcultural diversity also extends to the ever
broadening range of specialist registers and situational variations in language, be they technical, sporting, or related
to groupings of interest and affiliation (NEW LONDON GROUP, 1996, p. 13).
41
aluno seria estimulado. Em sua obra Pedagogia do Oprimido (1987), Freire se utiliza dos
termos codificação e descodificação da realidade como pilares para o que chama de:
significação conscientizadora.
Ao trabalhar as vivências dos alunos e proporcionar que eles olhem para o seu contexto
social, o professor trabalha o processo de descodificação através do letramento crítico
dissolvendo ideias cristalizadas pelo próprio sistema para que o aluno permaneça estático
socialmente, o que Freire (1987) chama de manobra de dominação. A educação, quando
desempenhada de forma isonômica a fim de promover a equidade, é a ponte que conduz o
estudante para uma prática social efetiva.
Freire (1987), ao defender a leitura de mundo que implica nos multiletramentos, já
trazia à tona a posição dos alunos como produtores de sentidos. Pensar a sala de aula como um
lugar de possibilidades é o que o nos motiva a investigar como as séries de tv são capazes de
potencializar as produções de sentidos e de colocar os alunos como centralizadores dessas
produções. “Em consonância com aqueles pressupostos, na pedagogia dos multiletramentos, os
alunos, como produtores de sentido, tornam-se agentes da comunicação e representação e, por
extensão, da própria aprendizagem” (BARBOSA, 2017, p. 94).
Sob essa ótica “por vezes, os textos escritos, quando comparados aos textos visuais, se
sobressaem no contexto educacional, isso ocorre pela crença de que textos visuais não possuem
potencialidade educativa” (MORAIS, 2020, p. 37). Considera-se essa visão um empecilho na
construção de um ensino que corresponda às demandas socioculturais exigidas pela sociedade
contemporânea. Cabe aqui, uma impo rtante ressalva nas conceituações de letramentos e
multiletramentos:
um tutorial no YouTube para aprender algo, todas essas ações são construções de sentidos que
exigem leituras e letramentos diferenciados, portanto:
11
Second, we decided to use the term "multiliteracies" as a way to focus on the realities of increasing local diversity
and global connectedness. Dealing with linguistic differences and cultural differences has now become central to
the pragmatics of our working, civic, and private lives. Effective citizenship and productive work now require that
we interact effectively using multiple languages, multiple Englishes, and communication patterns that more
frequently cross cultural, community, and national boundaries. Subcultural diversity also extends to the ever
broadening range of specialist registers and situational variations in language, be they technical, sporting, or related
to groupings of interest and affiliation (NEW LONDON GROUP, 1996, p. 09).
43
aproprie das diversas formas de linguagem no mundo contemporâneo para estabelecer suas
interações e capacidades de se expressar, falar, analisar, bem como, participar criticamente dos
aspectos sociais e políticos.
12
In this interpretation of the dynamics of today’s capitalism, how do we create a literacy pedagogy which
promotes a culture of flexibility, creativity, innovation and initiative? Even more clearly than was the case ten
years ago, the old literacy and its underlying moral economy, are no longer adequate on their own. In the pedagogy
of Multiliteracies, we have attempted to develop a literacy pedagogy which will work pragmatically for the ‘new
economy’, and for the most ordinarily conservative of reasons—what will help students get a decent job,
particularly if the dice of opportunity seem to be loaded against them. Literacy needs much more than the
traditional basics of reading and writing the national language; in the new economy workplace it is a set of supple,
variable, communication strategies, ever-diverging according the cultures and social languages of technologies,
functional groups, types of organisation and niche clienteles (COPE & KALANTZIS, 2006, p. 06).
44
Portanto, esses quatro pilares devem sustentar o trabalho na sala de aula para tornar o
aluno letrado no mundo pós-moderno. Nessa perspectiva defendida por Cope ;Kalantzis (2006),
o professor é um designer e cria combinações semióticas nas suas atividades para orientar os
alunos na construção da aprendizagem. O professor é um agente de transformação e a ideia é
que o ensino seja uma relação horizontal e não vertical. “Professores e gerentes são vistos como
designers de processos e ambientes de aprendizagem, não como chefes ditando o que aqueles
que estão sob sua responsabilidade devem pensar e fazer” (NEW LONDON GROUP, 1996, p.
10)13.
Anstey; Bull (2006, p. 19) nos oferecem uma definição do que seria uma pessoa letrada
deixando mais explícito, principalmente, para os professores como eles podem trabalhar para
atingir esse objetivo. A seguir, uma síntese adaptada (tradução nossa) dessa definição de pessoa
letrada, a qual que deve ser:
Flexível - é positiva e estrategicamente responsável com as mudanças no letramento;
É capaz de sustentar o conhecimento o suficiente para reformular o conhecimento atual
ou acessar e aprender novas práticas letradas;
Tem um repertório de práticas – possui uma gama de conhecimentos, habilidades e
estratégias para usar quando apropriado;
É capaz de usar textos tradicionais - usa impressão e papel e cara a cara em encontros
orais; e
É capaz de usar novas tecnologias de comunicação – usa textos digital e eletrônico que
têm vários modos (por exemplo, falado e escrito), muitas vezes simultaneamente.
Mediante o exposto, evidenciamos o quanto a pedagogia dos multiletramentos é uma
práxis necessária, e por que não, urgente de ser desenvolvida pelas escolas, tomando essa
última, a sua responsabilidade em atender às demandas da sociedade multimodal.
Na próxima seção, será abordado os letramentos visual e digital através de um breve
panorama histórico e comportamental que nos ajudará a entender o percurso que a sociedade
traçou no que se refere ao contexto tecnológico e aos níveis de comunicação que temos hoje.
13
Teachers and managers are seen as designers of learning processes and environments, not as bosses dictating
what those in their charge should think and do (NEW LONDON GROUP, 1996, p. 10).
45
Diariamente lidamos com textos visuais em diferentes espaços que exigem a nossa
interpretação. Nas redes sociais, na televisão, nos anúncios, nas ruas, o visual é um elemento
presente na maioria de nossas produções estabelecendo uma nova forma de comunicação. Basta
observar ao nosso redor para percebermos a quantidade de imagens que expressam momentos,
sentimentos, ideologias, valores e relações de poder.
Assim sendo, a pergunta central para a nossa discussão é: “como podemos ajudar
nossos alunos a ler criticamente tendo o texto visual como base?” Indaga Oliveira (2006).
Barbosa (2017), adota o termo letramento visual e letramento visual crítico para respaldar essa
inserção da habilidade comunicativa de ver as demais habilidades linguísticas como uma
resposta às exigências do cenário educacional do século XXI.
O leitor do século XXI não lê apenas texto escrito ou impresso, ele consome texto o
tempo todo, produz significado o tempo todo. De acordo com Lemke (2010, p. 456),
“documentos e imagens de notações verbais e textos escritos propriamente ditos são meros
componentes de objetos mais amplos de construção de significados.” Desenvolver essas novas
percepções é possível através de um conjunto de habilidades que compõem o letramento visual.
Analisar o porquê do uso de determinadas cores, o ângulo escolhido na imagem, a posição na
46
qual as pessoas estão dispostas, a tipografia escolhida e o seu tamanho, são alguns exemplos de
como explorar o letramento visual.
Mas então, o que é letramento visual e qual a sua importância enquanto competência
linguística para a sala de aula? De acordo com Bamford (2003, p. 01)14, “letramento visual é
interpretar imagens do presente e do passado e produzir imagens que efetivamente comuniquem
a mensagem a um público.” Para Barbosa (2017, p. 101), “letramento visual é a capacidade de
ler, entender, interpretar e utilizar informações visuais em eventos sociais comunicativos”
enquanto Newfield (2011, p. 82)15, entende “o letramento visual como a compreensão do pape
e da função das imagens na representação e na comunicação, especialmente na mídia”.
14
Visual literacy is about interpreting image of the presente and past and producing images that effectively
communicate the message to an audience (BAMFORD, 2003, p. 01).
15
Visual literacy is education that enhances understanding of the role and function of images in representation and
communication, especially in the media (NEWFIELD, 2011, p. 82).
47
De fato, do aluno será exigido também ler o conotativo (interpretar); ler o dito, mas
saber perceber o valor do que foi omitido, apontar motivos (avaliar), perceber
intenções (fazer inferências) e, tirar conclusões acerca do que foi lido, com a clara
intenção de atuar sobre situações, visando à sua transformação, tanto em meio
monomodal (texto linear tradicional) quanto e cada vez mais no meio multimodal
(OLIVEIRA, 2006, p. 22).
Tomemos a seguinte frase: “Uma imagem vale mais do que mil palavras.” Muitos de
nós, já ouvimos essa expressão para exemplificar uma situação, ideia ou pensamento. De fato,
essa frase reitera a força que uma imagem tem e o quanto ela pode representar em termos de
significado. Não é do nosso interesse que um modo se sobressaia em detrimento de outro
monopolizando a comunicação, durante a produção de sentidos, é o produtor de signos quem
deve escolher qual modo semiótico melhor atende aos seus interesses.
Dessa maneira, ensinar a leitura do visual significa uma abordagem que explore a
composição da imagem através das cores, dos tamanhos, das disposições dos elementos
imagéticos, enfim, tudo o que compõem a imagem e a sua significação. Entretanto, essa
abordagem passa pelas crenças que o professor tem a respeito do que é um texto. A maioria dos
docentes tiveram uma formação que separa imagem de texto, atribuindo a essa um mero papel
coadjuvante para a compreensão textual. O que se propõe com a essa discussão, é demonstrar
ao longo da análise que imagem e texto dialogam na construção de sentidos e se complementam
no processo ensino-aprendizagem.
Explorar as imagens na sala de aula pode ser uma atividade prazerosa utilizando o livro
didático ou outros recursos semióticos, tais como: memes, filmes e, no nosso caso, as séries de
tv. Analisar uma imagem vai muito além do que estamos acostumados a fazer. Oliveira (2006,
p. 18), nos apresenta alguns critérios para observarmos durante a análise imagética na sala de
aula.
Qualidades lexicais (ex. cores, saturação, nitidez);
Qualidades sintáticas (ex. aparência e movimento: linhas, padrões, tamanhos e
formas);
Qualidades semânticas (ex. objetos representados explicitamente ou apenas sugeridos
e como podem ser interpretados);
Qualidades pragmáticas (ex. inteligibilidade geral da imagem, utilidade, função) com o
propósito fundamental de construir interpretações socialmente significativas (cf.
Shneiderman, 1998).
Como se pode observar, o processo de decodificação do visual apresenta o que
chamamos de orientações. Na obra Reading Images: The Grammar of Visual Design (Lendo
Imagens: Gramática do Design Visual), doravante GDV, de Kress e van Leeuwen (1996), os
48
autores descrevem o uso das imagens na sociedade contemporânea ocidental com base na
Gramática Sistêmico-Funcional de Halliday com o intuito de orientar o processo de
compreensão do texto visual, ou seja, é possível desenvolver o letramento visual e o letramento
visual crítico no ambiente escolar estimulando os alunos, por exemplo, a identificarem o
contexto de produção das imagens e, consequentemente, suas intencionalidades.
Para tanto, a GDV apresenta uma metalinguagem intitulada de metafunções para
ajudar no processo de compreensão das imagens. A primeira delas é a metafunção
representacional, que explora as interações presentes na imagem bem como, entre o texto e o
leitor, subdividindo-se em narrativa e conceitual.
A segunda, é a metafunção interativa, que se constitui nas dimensões do olhar (de
oferta e de demanda), do enquadramento (distanciamento o dos participantes da imagem em
relação ao leitor) e a perspectiva (ângulos presentes na cena).
Por fim, a GDV apresenta a metafunção composicional, que trata da combinação de
elementos visuais com elementos verbais a fim de verificar a coerência dos sentidos presentes
nos textos. Essa metafunção subdivide-se em três sistemas: o valor da informação, a saliência
e moldura.16
É importante reiterar que nenhum texto é neutro. Todo texto serve a propósitos
definidos anteriormente pelos seus produtores. Um texto visual tem a capacidade de refletir
relações sociais, ideológicas e políticas, e é o desenvolvimento do letramento visual crítico que
possibilita a compreensão dessas ideias por trás das imagens. Assim sendo:
16
Para uma leitura mais detalhada da GDV, recomendamos a leitura do original presente nas nossas referências.
Além disso, vários são os trabalhos brasileiros que fazem uma descrição mais minuciosa da GDV, por exemplo:
Almeida e Fernandaes (2008), Gualberto (2013), Silva (2016) dentre outros.
17
Visual literacy involves developing a set of skills needed to be able to interpret the content of visual images,
examine the social impact of those images, and discuss purpose, audience, and ownership. It includes the ability
to visualize internally, communicate visually, and visually read and interpret images. In addition, students need to
be aware of the manipulative uses and ideological implications of images. Visual literacy also involves making
judgments about the accuracy, validity and value of images. A visually literate person is able to discriminate and
make sense of visual objects and images; create visual resources; understand and appreciate visuals created by
49
others; and visualize objects in your mind's eye. To be an effective communicator in today's world, a person needs
to be able to interpret, create and select images to convey a variety of meaning (BAMFORD, 2003, p. 01).
50
formas de trabalhar uma imagem e acreditamos ser no dia a dia da sala de aula, a melhor maneira
de os alunos internalizarem, gradativamente, que imagem é texto corroborando a ideia de que
ver é mais que apenas apreciar imagens (CALLOW, 2013). “Dessa forma, não há como
desvencilhar o letramento visual/multimodal do letramento crítico nas práticas cotidianas e
escolares” (SILVA, 2016, p 40).
Alinhada aos nossos propósitos e aos do GNL, Oliveira (2006) destaca em seu texto
que a pergunta recorrente deste século se refere ao tipo de ensino-aprendizagem que devemos
expor nossos alunos para que possam interagir e competir de forma positiva e bem-sucedida na
sociedade. Considerando que, o processo de formação está em constante adaptação, a sala de
aula nos ensina tanto quanto os nossos estudos e formação acadêmica. Sob essa ótica, devemos
estar sempre atentos para refletir, avaliar e mudar, quando necessário, a nossa prática
metodológica, o que significa olhar para o mundo e para o que ele exige em termos de
participação social dos alunos.
A partir desse olhar atento para o mundo que nos rodeia e que se reflete na sala de
aula, as mídias digitais se destacam como componentes importantes na exploração dos
letramentos. Elas revolucionaram a nossa comunicação e transformaram as nossas práticas
linguajeiras, assim, o visual caminhou junto com as mídias já que, elas proporcionam muitas
possibilidades no que tange a junção de modos semióticos.
Nos últimos anos, pudemos acompanhar a transição do meio impresso para as telas.
O código escrito foi cedendo lugar a outros modos, de maneira que, o texto ganhou novas
formas de produção, consumo e armazenamento. Essa transição, e já notadamente, revolução
tecnológica teve início em meados da década de 1990, período no qual, o GNL se reuniu para
discutir essas mudanças no cenário educacional e mundial. Foi nesse período também, que a
ideia de hipertexto começou a circular entre estudiosos e entusiastas da tecnologia, com os
primeiros computadores e celulares chegando ao mercado. “O hipertexto era visto como algo
capaz de fornecer um ambiente no qual a aprendizagem exploratória e por descoberta poderia
florescer. Os alunos poderiam tornar-se mais independentes como modeladores ativos do
conhecimento” (SNYDER, 2010, p. 05).
Em linhas gerais, o hipertexto é uma forma de escrita e leitura não linear, usado
inicialmente na informática, com blocos de informações ligados a palavras, partes de um texto
ou imagens, por exemplo. De acordo com Snyder (2010, p. 04), “o hipertexto era considerado,
por muitos estudiosos, como uma invenção excitante, que oferecia a leitores e escritores algo
totalmente diferente do texto impresso”, o autor também diz, que pesquisadores em educação
celebraram o potencial do hipertexto como ferramenta para melhorar o ensino e a
51
[...] os docentes têm pouco tempo para refletir sobre o que fazem, de modo que,
quando tentam trabalhar com as mídias digitais nas salas de aula, não há muitas
oportunidades para urdir parcerias criativas com os colegas e para fazer
experimentações com novos letramentos.
de boa parte dos discentes. A discrepância sobre o assunto se instaurou de vez no último ano
com a pandemia de COVID-19, momento no qual, o telefone celular tornou-se crucial para a
continuidade do ano letivo no modelo remoto.
Nessa empreitada, o discurso proibicionista se voltou contra os profissionais da
educação que, agora, levantam e defendem a importância do aparelho como ferramenta
pedagógica sem contar que, os docentes tiveram que “correr atrás do prejuízo” no que tange ao
letramento digital a fim de dar conta da logística do ensino remoto e mitigar uma defasagem no
processo de ensino-aprendizagem. O uso do aparelho celular envolve diretamente o letramento
digital, termo usado pela primeira vez por Paul Gilster (1997) em seu livro de mesmo nome.
Lemke (2010), delineia os letramentos como tecnologias e que eles nos dão condições para usar
tecnologias mais amplas:
Pode-se inferir que o letramento digital engloba outros letramentos, mas em síntese, é
a capacidade de ler, escrever e produzir sentidos a partir dos recursos tecnológicos disponíveis.
O consumo dos textos, por exemplo, sofreu uma mudança significativa, pois, o kindle cresceu
como um novo formato de leitura, sem contar que, os nossos celulares são capazes de armazenar
diversos livros no formato PDF. O letramento digital acabou por se tornar, juntamente com o
visual, necessário para os indivíduos. Sob essa perspectiva, o professor automaticamente
parece sempre estar atrás no que se refere às tecnologias digitais como se intrinsecamente um
pé no “passado” fizesse parte de sua formação (RIBEIRO, 2019).
De fato, precisamos destacar que modos tradicionais de ensino continuarão a existir
tendo a sua parcela de contribuição no processo educacional, afinal, não precisamos excluir
nenhuma metodologia, mas para que esse processo ocorra, suscitamos a dúvida de Prensky,
(2001, apud RIBEIRO 2019, p. 03) “Os nativos digitais devem aprender das velhas maneiras
ou os imigrantes digitais devem aprender a novidade?” Ribeiro (2019) nos fornece mais
reflexões sobre o tema:
O construto de Prensky em 2001 propõe novos rótulos para o que ele separa em dois
tipos de pessoas: as que têm contato desde jovens com as tecnologias digitais e as que
só têm esse contato tardiamente (à revelia delas, já que não têm culpa de terem nascido
cedo demais). As primeiras se tornariam experts nos usos das TDICs, além de se
tornarem seres diferentes das segundas pessoas, isso é, aquelas seriam mais ágeis,
mais rápidas na aprendizagem, menos lineares, multitarefas, sugerindo-se que estas,
mais velhas, são sempre e generalizadamente o contrário. Entre esses dois tipos de
54
seres, que têm entre si a barreira da idade ou da geração, haveria, segundo o autor, um
fosso, uma distância, para ele intransponível, que afeta o ensino, a aprendizagem e a
escola, de maneira preocupante (RIBEIRO, 2019, p. 16-17).
Então, esses professores (imigrantes digitais), que segundo Ribeiro (2019), é uma
metáfora inadequada usada por Prensky (2001), sobretudo, no contexto social contemporâneo,
precisam “correr” atrás do prejuízo para integrar nas suas práticas educativas as mídias digitais
e o letramento multimodal crítico. É fora da escola que o aluno começa a ler o visual e a interagir
no meio digital, contudo, será dentro do espaço escolar que ele se apropriará da prática do
letramento multimodal crítico de forma consciente. Nesse percurso crescente do visual e do
digital, a sala de aula, enquanto reflexo da sociedade, fica imbuída de ampliar as percepções
dos estudantes explorando para além do livro didático, que muitas vezes, não promove essas
habilidades.
A orientação para o professor de LI é, instigar o letramento multimodal crítico através
dos diferentes formatos de texto que os alunos encontrarão nas esferas sociais as quais estão
inseridos. Fazendo essas conexões com o mundo externo, o docente atribui sentido aos
conteúdos abordados em sala, sem contar na gama de possibilidades e recursos digitais para
dinamizar suas aulas, proporcionando também, o acesso a informações e mídias para aqueles
que se encontram em condição socioeconômica desfavorável.
Devido a pandemia de COVID-19, a educação perpassa um momento crítico sob o
viés logístico e de sistematização do modelo de ensino remoto. São muitas as fraturas que o
sistema educacional evidenciou nestes últimos meses, sobretudo, a desigualdade social do
Brasil, que interfere diretamente no processo de ensino e aprendizagem. A pandemia já é
considerada por alguns, um limiar histórico no que tange a comunicação. A educação, sentiu o
grande impacto do isolamento social, tendo em conta que ela sempre funcionou,
majoritariamente, no modelo presencial e podemos inferir também que as nossas práticas
sociais já estão em transformação por conta da crise sanitária. O The PanMeMic Collective
(2020)18 explica essa ideia:
18
Grupo de semioticistas de diferentes países do mundo que estudam a criação de significado, comunicação e
interação social.
55
Entretanto, esse ponto crítico não deve ser analisado de forma unilateral, pois, ele
pode ser uma ponte construída, involuntariamente, entre os professores e a necessidade de
novos letramentos no processo pedagógico. Para Lemke (2010, p. 456), “os letramentos
produzem uma chave entre o eu e a sociedade: o meio através do qual agimos, participamos e
nos tornamos moldados por sistemas e redes ‘ecossociais’ mais amplos. ”
Portanto, consideramos que os letramentos visual e digital se configuram em
habilidades necessárias para a formação discente, o que vai de encontro com a nossa pesquisa
que utilizará um recurso midiático que requer essas habilidades. Considerando que as séries de
tv é um recurso que está presente no cotidiano dos alunos, iremos explorá-la estrategicamente
para atingir os nossos objetivos.
Na seção a seguir, discutiremos o potencial das séries de tv como ferramenta
pedagógica e material didático para as aulas de LI com o intuito de promover o letramento
multimodal crítico dos estudantes.
19
Because the danger affects our bodies, and prevention attempts involve keeping bodies apart, changes in how to
carry out basic actions have involved everybody and all spheres of life, to a greater or smaller extent. The
dimensions of social interaction have changed their combinatory possibilities, as the times and paces, the spaces
and places of our activities and roles have had to change, as well as the media and semiotic resources through
which we carry them out (THE PANMEMIC COLLECTIVE, 2020, p. 05).
56
delineamos apenas alguns motivos que tornam o ensino do inglês indispensável frente a
necessidade de atuação de qualquer indivíduo no mundo globalizado.
Diante de uma educação que pede a cada dia mais inovação e adequação às novas
mídias, cabe ao professor manter a sua formação continuada e analisar constantemente a sua
didática colocando-se como aprendiz da sua prática, portanto, destacamos que o fazer
pedagógico tem viés político, pois, envolve as crenças e experiências dos docentes.
Esse processo de aprendizado certamente envolve não só a conscientização da
influência dos contextos sociocultural e institucional sobre suas ações na sala de aula
(encorajando determinadas práticas pedagógicas e desestimulando e até silenciando
outras), mas também a conscientização do impacto de suas escolhas e ações para os
alunos, a escola e a comunidade (TAGATA, 2014, p. 326).
57
Alinhado com esse pensamento, Morais (2020) também advoga para que os
professores identifiquem em sua prática o que precisa ser modificado, de acordo com as
exigências da sociedade contemporânea e, é a mesma autora quem assinala para o fato de que,
os discentes convivem diariamente com os avanços tecnológicos e é preciso fazer uso destes
recursos de modo que, o cotidiano esteja presente na sala de aula.
O professor socialmente atento consegue identificar que vivenciamos uma revolução
tecnológica e essa concepção, por si só, merece uma reflexão de como os alunos estão
construindo sentidos a partir dos diferentes modos e recursos semióticos veiculados na
sociedade multimodal, não mais somente pela escrita, mas pelo visual, pelo gestual, pelo
espacial e etc.
Com a massificação da internet e dos smartphones, temos, literalmente na palma da
mão, acesso a um universo de informações e possibilidades que tem como principal
característica: a velocidade. De acordo com Ribeiro (2019), o Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE) divulgou os resultados de uma pesquisa, na qual, constatou-se que há mais
telefones celulares do que habitantes no Brasil.
Faz-se necessário destacar também que, o uso da internet se dá, em boa parte, pelo
aparelho. Os jovens estudantes trazem para a sala de aula essa inquietação e sede por
informações rápidas. O contato precoce com as mídias os faz acreditarem que já dominam tudo
relacionado ao assunto, contudo, muitas vezes, esse domínio se restringe às redes sociais e não
a algum letramento específico.
Essa exposição às mídias digitais gera no aluno o anseio de estar sempre conectado,
portanto, ao utilizar recursos visuais o professor mostra-se atento ao mundo digital, mas
também, disposto a inovar a sua prática pedagógica. Nossa pesquisa tem o intuito de estabelecer
uma discussão em torno das potencialidades das séries de tv como material didático a fim de
estimular o letramento multimodal crítico. Todavia, ressaltamos que o uso das séries de tv nas
aulas de LI não deve ser feito de maneira aleatória, sem planejamento ou objetivos definidos.
A metodologia deve ser baseada de acordo com a realidade e as necessidades da turma, a partir
58
disso, movimentos, cores, expressões faciais, vestimentas e tantos outros pontos podem ser
subsídios para enriquecer a formação do aluno e o seu repertório cultural.
Outro fator de destaque que corrobora o uso das séries de tv na sala de aula é a
popularidade das plataformas de streaming, sendo a Netflix, a principal delas. A plataforma
oferece uma variedade de títulos como séries, filmes, documentários e reality shows e tem o
seu catálogo constantemente atualizado promovendo a rapidez e dinamicidade que atrai o
público adolescente.
Sendo assim, trabalhar os gêneros em sala de aula, visando à introdução das novas
tecnologias, além de garantir a função libertadora que a tecnologia promove, ainda inclui nos
currículos a grande variedade de culturas já presentes nas escolas, fazendo com que o aluno
se identifique e tenha sua diversidade contemplada. Hoje, os estudantes contam com novas
ferramentas de acesso à comunicação e informação, que acarretam novos letramentos de
caráter multimodal e hipermidiáticos, o que nos leva à ideia de “multiletramentos” (VANZ;
MELLO, 2019, p. 03).
Uma série de tv, por exemplo, é capaz de fomentar o letramento crítico através dos
aspectos sociais, políticos e ideológicos presentes na narrativa além de, ambientar o aluno
dentro de culturas diferentes trazendo-lhe novas perspectivas de mundo. Explorar cada uma
dessas nuances dentro da sala de aula, e mais especificamente, na aula de LI é possível sob a
ótica da multimodalidade e dos multiletramentos. Se atentarmos que a aula de LI é circunscrita
pela gramática, na qual, os alunos estudam regras e praticam com exercícios no livro didático,
veremos o quanto se perde no processo ensino-aprendizagem em termos culturais e de práticas
sociais.
O uso de séries televisivas pode, dessa forma, contribuir com o processo de ensino-
aprendizagem, pois desperta a curiosidade e o interesse dos alunos, colaborando para
com a sua aprendizagem e possibilitando uma nova forma de compreensão, visto que
serão capazes de assimilar que a língua aprendida está ligada a uma cultura, e que
ambas são diferentes da sua língua e cultura maternas. Fator secundário a esse, no
aspecto educacional, é contribuir para o findar do mito de que o uso de filmes e de
séries, recursos audiovisuais de modo geral é um mero tempo livre e/ou passar o
tempo (FERREIRA; MORAIS, 2019, p. 147).
59
A utilização deste recurso visual na sala de aula contribui para uma dinamicidade, tão
ausente nas aulas de LI e demonstra para os alunos e comunidade escolar em geral, que a
aprendizagem pode ocorrer com outras ferramentas, pois, os percursos metodológicos
engessados são justificados por uma resistência ao novo.
Deve-se observar que mudanças na prática pedagógica envolvem também o caráter
motivacional e flexível dos professores para que esses atentem que, o conhecimento adquirido
através da combinação de sentidos tem um maior potencial de aprendizagem, ou seja, os alunos
se engajam mais ao conteúdo quando as ideias são apresentadas por meio de outros recursos e
não só de palavras.
Diante da pandemia de COVID-19, a educação teve que lidar rapidamente com
metodologias ativas que dependem exclusivamente de recursos tecnológicos como o celular, o
computador e a internet. Os professores têm experimentado o ensino remoto, e em alguns casos,
o modelo híbrido, que acaba exigindo o uso das novas mídias como recursos pedagógicos.
Nossa proposta didática não antevê o futuro porque nós já estamos nele, no entanto,
ela se apresenta extremamente pertinente para o cenário educacional e para a implementação
do novo ensino médio. O que nos faz levantar a seguinte questão: que conhecimentos são
necessários para a formação do professor de LI do século XXI?
Apesar de serem um fenômeno na contemporaneidade, as séries de tv já existem há
bastante tempo. Pinwright’s Progress foi o primeiro seriado da história exibido em 1946, e
produzido na Inglaterra, no entanto, Lima (2013, p. 06) nos alerta que “os seriados, assim como
o cinema, são fortes produtos de exportação e de divulgação da cultura dos Estados Unidos para
o mundo”. De fato, nossos primeiros contatos com essas produções televisivas, todas de origem
americana, se davam pelos canais de tv aberta a despeito das constantes alterações de horário e
cronologia dos episódios. Diante desse contexto, a LI ganhou destaque por ser o idioma mais
utilizado nas produções audiovisuais, o que facilita a sua inclusão na prática pedagógica da sala
de aula de LI.
Na década de 1990, a chegada das emissoras a cabo no Brasil fez com que o hábito
de assistir às séries norte-americanas retornasse em pelo menos parte do público
brasileiro. A grande variedade de canais que dedicam quase toda sua grade de
programação aos seriados respeita a ordem sequencial de episódios e de temporadas
e transmite as séries em som original com legendas, contribuindo para a divulgação
desses conteúdos. A partir daí as séries conseguiram conquistar um público fiel, que
acompanhava as histórias do início ao fim (LIMA, 2013, p. 07).
e o modo de consumo. Segundo o autor, “esses fatores se consubstanciaram, nas duas últimas
décadas, para promover esse panorama em que as séries ocupam lugar destacado dentro e fora
dos modelos tradicionais de televisão” (SILVA, 2014, p. 243).
No percurso traçado pelos seriados, nos chama a atenção as mudanças que as narrativas
sofreram ao longo dos anos. Nesse ínterim, novos modelos de enredos, roteiros e gêneros foram
surgindo e ganhado cada vez mais espaço, especialmente, entre os estudantes de EM. Na década
de 1990, o formato sitcom (situation comedy – situação cômica), ou seja, uma abordagem do
cotidiano de maneira cômica, teve como expoente mundial a série Friends exibida entre os anos
de 1994 e 2004 no canal NBC. A série conta com um total de 236 episódios divididos em dez
temporadas. O enredo da narrativa girava em torno de seis amigos que moravam juntos e
vivenciavam situações de fácil verossimilhança com o nosso cotidiano, com temáticas que
permeavam: amor, amizade, consumo e etc, porém, devemos destacar que essas situações foram
extraídas e espelhadas na cultura norte-americana.
O formato sitcom foi adaptado de acordo com os gostos dos novos telespectadores, por
exemplo, as famosas risadas de fundo, conhecidas como claques, têm sido cada vez menos
usadas nas produções. Os roteiros têm sido pouco convencionais e abordam temáticas que
provocam as nossas concepções estéticas, morais, políticas e ideológicas bem como,
estabelecem relações simbólicas com o telespectador proporcionando a criticidade nas suas
práticas sociais e culturais. A identificação que os episódios geram através dos personagens, a
linguagem ou os lugares é uma excelente estratégia para atrair o público do EM e uma forma
de instigá-los numa aprendizagem colaborativa e contextualizada socialmente promovendo o
letramento multimodal crítico.
No que diz respeito ao contexto tecnológico, certamente, ele possibilitou um alcance
maior desses novos formatos de produções audiovisuais e as plataformas de streaming
ampliaram, consideravelmente, as opções do público espectador tirando, de certo modo, a
hegemonia da televisão. Evidenciamos também, o fator de migração do público da tv aberta
para a rede mundial de computadores, popularmente internet, onde as pessoas têm acesso
facilitado para consumirem seus seriados favoritos com maior rapidez assim que são liberados.
Nos dias atuais, é comum que se fale em convergência midiática. O tema tem sido
objeto de estudo para vários pesquisadores ao redor do globo e observamos a
aplicação prática desse termo no convívio social. As pessoas estão mais ligadas a seus
aparelhos eletrônicos e cada vez mais dependentes deles para se comunicar, pesquisar,
se informar e, principalmente, se divertir. Podemos observar que esse comportamento
social é o indicativo que melhor representa a organização na qual nos encontramos
hoje. Vivemos em uma sociedade que se baseia na informação e se estrutura através
dela. A internet desempenha um dos papéis mais importantes nesse processo que foi
61
Contudo, todo esse acesso às novas mídias não significa, necessariamente, que os
estudantes estão desenvolvendo os multiletramentos. O envolvimento dos estudantes enquanto
telespectadores dos seriados televisivos se apresenta no que Lima (2013) chama de
convergência midiática. Para a autora, a convergência midiática modificou o comportamento
dos consumidores em relação à busca por informações e entretenimento assim como, alterou a
forma como esses conteúdos se apresentam e são assimilados. Para Jenkins (2009), esse
processo de convergência midiática define desde transformações tecnológicas até aquelas
62
culturais e sociais. De acordo com a autora, a grande mudança ocorre em relação à função do
consumidor que também participa dos fluxos de conteúdos de mídia e, por isso, também se
torna produtor desses conteúdos.
Essas interações e produções que acontecem nas comunidades virtuais e que são
facilmente encontradas em fóruns online, sites sobre assuntos específicos, blogs, ambientes de
compartilhamento de fotos, vídeos e redes sociais, exemplificam como as séries de tv engajam
os telespectadores instigando-os a serem produtores de conhecimento através de suas
afinidades.
Nessas comunidades virtuais, popularmente chamadas de fandom, o público
consumidor se reúne em torno de seus gostos em comum, discutem os episódios e possíveis
soluções para os roteiros, criam histórias com os seus personagens favoritos (o que denominam
hoje de fanfic) e produzem, através de um letramento digital e metamidiático, vídeos de
divulgação das séries, ou seja, é inegável o papel das séries de tv na formação e construção de
sentidos na contemporaneidade. Sobre essas novas construções textuais, Lemke (2010, p. 461),
nos diz:
Habilidades de autoria multimidiática e análise crítica multimidiática correspondem
de forma aproximada a habilidades tradicionais de produção textual e de leitura
crítica, mas precisamos compreender o quão estreita e restritiva foi, no passado, nossa
tradição de educação letrada para que possamos ver o quanto a mais do que estamos
dando hoje os estudantes precisarão no futuro. Nós não ensinamos os alunos a integrar
nem mesmo desenhos e diagramas à sua escrita, quanto menos imagens fotográficas
de arquivos, vídeo clips, efeitos sonoros, voz em áudio, música, animação, ou
representações mais especializadas (fórmulas matemáticas, gráficos e tabelas etc.).
[...] a relação entre educação e tecnologia pode ser considerada a partir de duas
perspectivas: a socialização da inovação e a mediação no processo educativo. Por um
lado, para que novas tecnologias sejam utilizadas, é preciso que os usuários aprendam
as formas de apropriação dos recursos oferecidos para atender as necessidades das
pessoas. Assimilar a inovação resulta não só na familiarização do usuário com a
máquina, aparelho ou dispositivo, mas também na reorientação de relacionamentos,
valores e comportamentos; são aprendizagens que mudam nossa forma de pensar,
sentir e agir. Por outro lado, essas tecnologias podem ser utilizadas como ferramentas
mediadoras para auxiliar no processo educativo. Elas podem produzir mudanças na
forma de organizar o ensino; podem alterar a natureza do processo educacional e a
comunicação entre os participantes; podem provocar mudanças no comportamento de
professores e alunos; podem levar a um melhor conhecimento e um maior
aprofundamento dos conteúdos estudados; estes são alguns exemplos de mudanças
positivas para a educação.
Dessa maneira, advogamos para que os professores entrem em contato com esses
recursos digitais e midiáticos e os transforme em ferramenta pedagógica. Segundo Oliveira
(2020), essas mudanças representam grandes desafios para a educação no século XXI e, ao
mesmo tempo, significam um convite ao questionamento, a reflexão e a discussão acerca da
maneira como estamos ensinando e aprendendo.
Os recursos já existem, o desafio se concentra agora em o professor transformá-los em
metodologias ativas, ou seja, centrar na participação efetiva dos estudantes combinando os
recursos semióticos e explorando os multiletramentos.
Na próxima seção, abordaremos o modelo Show me criado pelo educador australiano
Jon Callow (2008) e suas contribuições ao unir teoria e prática para o desenvolvimento do
letramento multimodal/visual crítico nas aulas de LI.
no letramento multimodal crítico. Vale ressaltar, que esse modelo tem como base a Gramática
do Design Visual, doravante GDV, de Kress e van Leeuween (1996). Conforme Silva (2016, p.
82), “o modelo de Jon Callow não somente engloba a GDV, mas a amplia numa extensão que
contempla outras dimensões, no caso dimensões afetivas e críticas, tornando-a, a meu ver, mais
aplicável à sala de aula de línguas. ”
A GDV é uma grande referência para os estudos de multimodalidade na atualidade,
especificamente, no que tange ao letramento visual. No entanto, ela não foi pensada para ser
uma gramática pedagógica, tampouco normativa com direcionamentos para a sala de aula
(SOUZA, 2020). Em vista disso, trazemos a proposta didático-pedagógica de Callow, Show Me
Framework, para pautar a nossa pesquisa-ação e as nossas investigações. Nele, o autor
apresenta um modelo de exploração das imagens na sala de aula e propõe referências, exemplos
e tarefas para desenvolver o modelo no contexto escolar. Vale ressaltar que, o presente trabalho
se baseará, essencialmente, no modelo de Jon Callow, que já engloba a GDV, entretanto, em
alguns momentos, iremos retomar algumas classificações específicas da GDV.
Consoante com outros estudiosos como Kress (1996), Van Leeuwen (1996), e Jewitt
(2008), Callow (2008) nos mostra com o seu trabalho Show Me: Principles for Assessing
Students’ Visual Literacy (Mostre-me: Princípios para Avaliar o Letramento Visual de
Estudantes) a importância e a necessidade de promover o letramento visual nas escolas como
parte de um currículo que se adequa às novas práticas sociais contemporâneas. Dessa maneira,
Callow (2008) defende o ensino de LI sob uma abordagem multimodal que explore imagens,
ângulos, cores, tamanhos, tipografias, ou seja, o modelo é um guia para educadores
desenvolverem suas próprias práticas baseados em contextos, aulas e fontes de aprendizagem
disponíveis (SILVA, 2016).
Sob a ótica de Callow (2008), faz-se necessário ter uma linguagem para falar sobre a
linguagem (metalinguagem) e também para dar o devido espaço que as imagens devem ocupar
na construção de sentidos na aula de LI. A partir dessa premissa, poderemos, enquanto
educadores, desenvolver uma estrutura de avaliação voltada para o letramento visual sem cair
no monopólio verbal, que não deixa de ser uma zona confortável. Vejamos três pontos
considerados fundamentais por Callow (2008) para a compreensão do letramento visual:
Todos os textos são partes de mudanças locais e globais e contextos sociais;
As visões dos estudantes devem estar incluídas na criação e discussão de textos,
considerando os aspectos afetivos, composicionais e críticos;
Inclusão de aprendizagem sobre a construção de textos, usando o conhecimento dos
multiletramentos para redesenhar novos textos a partir da prática aplicada.
66
Para estudantes mais jovens, comentários sobre como o ilustrador não desenhou uma
cena claramente ou efetivamente pode ser precursor de críticas mais complexas de
escolhas feitas na ilustração. Estudantes mais velhos podem usar comentários mais
específicos, tais como falar sobre como as posições de uma imagem faz o observador
pensar ou sentir de forma particular (SOUZA, 2020, p. 55).
Veremos a seguir, o quadro produzido por Callow (2008) e adaptado por Silva (2016)
com as sugestões para o professor desenvolver o letramento com foco na dimensão crítica.
o multimodal. O modelo Show Me oferece ao docente o aporte teórico para a sua prática, de
modo a orientá-lo nesse percurso que será novo também para o professor.
Para esse autor, após diagnosticar que conceitos e metalinguagens os alunos já trazem
para as imagens, o professor pode planejar experiências de aprendizagem para auxiliar
no desenvolvimento destes como observadores, produtores e críticos de textos
multimodais e visuais (SILVA, 2016, p. 90).
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
coisas e às pessoas nas interações sociais e estas podem ser descritas e analisadas, prescindindo
de quantificações estatísticas” (CHIZZOTTI, 2003, p. 222).
Esse estudo foca na descrição detalhada das interações dos alunos com algumas cenas
pré-selecionadas da série escolhida de maneira que, a interpretação dos dados coletados nos
forneça subsídios para entender o processo de significação da realidade a partir das cenas
veiculadas bem como, o diálogo que o estudante faz com a sua prática social. Considerando
que a análise proposta para os discentes se restringe às representações sociais da mulher,
buscaremos descrever o que é reforçado, reivindicado ou criticado nas cenas trabalhadas
durante a aula de LI.
Expandiremos assim, a noção de affordances ao averiguarmos o potencial didático do
recurso semiótico: séries de tv. O desenrolar do trabalho se dá pelo caráter interpretativista ao
focarmos no “significado construído, não o significado esperado” (KRESS, 2010, p. 128).
Analisaremos como os alunos constroem sentidos a partir das cenas exibidas baseadas no
Modelo Show Me e em como eles configuram o papel social da mulher ante as suas vivências,
identificando pontos de aproximação, identificação ou outras ideias e experiências que surjam
a partir das cenas construindo assim o letramento visual crítico.
Outro aspecto importante para a feitura deste trabalho, é o pressuposto metodológico
pautado na pesquisa-ação. Temos o intuito de intervir na aula de LI ministrada pela
pesquisadora que atua na instituição, e suscitar reflexões e possíveis mudanças sob a perspectiva
de que, a nossa pesquisa venha a responder as questões baseadas na problemática encontrada
no ensino de LI. “A pesquisa-ação educacional é principalmente uma estratégia para o
desenvolvimento de professores e pesquisadores de modo que eles possam utilizar suas
pesquisas para aprimorar seu ensino e, em decorrência, o aprendizado de seus alunos” (TRIPP,
2005, 445).
Nosso trabalho, objetiva desenvolver o letramento multimodal crítico através das
representações sociais da mulher no seriado Anne with an “e”, tendo como aporte teórico os
conceitos sobre SS, multimodalidade e multiletramentos e tomando como principal referência
para a efetiva metodologia as dimensões afetiva, composicional e crítica do modelo Show Me,
de Jon Callow (2008, 2013).
segunda, a nossa intervenção em si. Por já ser uma produção consumida pela pesquisadora,
rever as três temporadas da série Anne with an “e” foi o primeiro passo. Ao revê-la, fomos
observando que a série apresentava em todos os seus episódios situações que poderiam ser
exploradas na sala de aula e suscitar algumas discussões com os alunos acerca das opiniões
emitidas pelas personagens e dos comportamentos evidenciados nas cenas.
Numa primeira seleção, tomamos nota de seis cenas para serem revisadas
posteriormente. Revendo as cenas escolhidas foi preciso restringir esse número de acordo com
o calendário escolar vigente, desse modo, selecionamos três que serão descritas mais à frente.
Nas três cenas escolhidas, a principal motivação para a nossa escolha foi trazer a questão de
gênero para o centro do debate na sala de aula a partir dos nossos estímulos com a finalidade
de construirmos, coletivamente, um novo olhar para os papéis sociais existentes.
A partir dessa premissa, selecionamos as três cenas que usamos na intervenção de
modo que elas contemplassem pontos que gerassem discussões e reflexões sob o olhar discente.
Segue uma ilustração que exemplifica o nosso percurso metodológico:
Como demonstrado na ilustração acima, o primeiro passo foi a seleção das cenas que
comporiam a nossa intervenção. A seguir, estão as três cenas escolhidas com a minutagem
78
descrita para o seu acesso e uma melhor leitura do trabalho assim como, a compreensão dos
nossos resultados.
Com as cenas selecionadas, partimos para a elaboração do nosso plano de ação conciliando-o
com o calendário escolar para que fosse possível a realização da pesquisa em tempo hábil.
Detalhamos o plano de ação a seguir, de acordo com a composição de cada aula:
1ª aula: exibição da primeira cena (01º episódio da 1ª temporada), discussão direcionada
e em seguida, a aplicação do roteiro de análise semiestruturado.
2ª aula: exibição da segunda cena (06º episódio da 2ª temporada), discussão direcionada
e em seguida, a aplicação do roteiro de análise semiestruturado.
3ª aula: exibição da terceira cena (09º episódio da 2ª temporada) e discussão
direcionada.
Para a exibição das cenas utilizamos notebook, caixa de som e datashow. Na primeira
aula, apresentamos a série de tv escolhida para a intervenção: Anne with an “e”. A série de tv
é uma produção canadense, exibida originalmente pelo canal CBC Television e pela plataforma
de streming Netflix, entrando no seu catálogo em 2017. A história é baseada nas obras de
literatura infantojuvenil Anne de Green Gables, cuja publicação original data de 1908 e foram
escritas pela autora canadense Lucy Maud Montgomery.
Portanto, trata-se de um roteiro adaptado constituído de três temporadas e vinte e sete
episódios no total. Na produção audiovisual, a protagonista que dá nome a série é uma garota
de doze anos que chegará na terceira temporada com dezessete anos, ou seja, no decorrer das
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Fonte:https://br.pinterest.com
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Fonte: https://br.pinterest.com
[...] a série é permeada de debates e temáticas que podem ser considerados pertinentes
para uso em sala de aula, ao mesmo tempo em que consideramos ser educativa, nesse
aspecto, por desencadear reflexões a partir de uma estratégia cognitiva muito peculiar
em narrativas cinematográfico-televisivas, ou seja, a capacidade de emocionar o
público (SILVA; GUIMARÃES, 2019, p. 114).
A divisão entre os sexos parece estar “na ordem das coisas”, como se diz por
vezes para falar do que é normal, natural, a ponto de ser inevitável: ela está presente,
ao mesmo tempo, em estado objetivado nas coisas (na casa, por exemplo, cujas partes
são todas “sexuadas”), em todo o mundo social e, em estado incorporado, nos corpos
e nos habitus dos agentes, funcionando como sistemas de esquemas de percepção,
pensamento e de ação.
85
serviços braçais da fazenda de Green Gables, em seguida, Anne discorda, para o espanto da
senhora Cuthbert, como demonstra a imagem acima.
Nossa intervenção começou com a preparação do material (datashow, notebook e caixa
de som) no birô da professora, também posicionamos o celular da pesquisadora para a gravação
da aula no fundo da sala visando um ângulo ampliado de toda a turma. Em seguida, distribuímos
os roteiros de análise semiestruturado individualmente e fomos explanando para a turma que,
ao assistirem a cena observassem todos os elementos que a compõem. Segue a fala da
pesquisadora:
PESQUISADORA: É importante dizer que na cena tudo é texto, todos os
elementos podem ser interpretados e querem passar uma ideia ou mensagem, tá bom?!
Então, vocês olhem tudo ao redor da cena, roupas, posturas, expressões faciais, ok?!
PESQUISADORA: Gente, e quais são essas ideias padrão que alguns de vocês
citaram?
AEM1: Como inferior ao homem, devendo fazer “coisas de mulher” como cozinhar,
cuidar da casa e dos filhos enquanto o homem era responsável pelo sustento da
família.
AEM2: Que a mulher não tem importância na sociedade, que ela não consegue
fazer as mesmas coisas que os homens, tendo uma posição submissa.
AEM3: Que não pode fazer nada além de fazer as coisas de casa (AEM).
Como ela era mulher tinha que ficar na cozinha e jamais poder fazer as mesmas
coisas que os meninos.
indiferença com a cena de acordo com a educação machista que nos é repassada. Nessa
educação patriarcal cabe a mulher um papel específico: o de submissão e fragilidade.
Observemos as seguintes palavras e expressões destacadas: inferior, não tem
importância, não consegue, não pode fazer, jamais poder fazer e abaixo. Todas essas
palavras denotam o senso de superioridade que a sociedade patriarcal prega. Como podemos
perceber, a palavra “não” se repete em algumas respostas e entendemos que, essa negativa
presente na maioria das respostas carrega consigo séculos de repressão e privação dos direitos
das mulheres.
De maneira impositiva, a sociedade foi sendo organizada por homens e para homens.
Deste modo, é possível afirmar que os privilégios e direitos que o sexo masculino desfrutou
amplamente, foram, impreterivelmente, negados ao sexo oposto. Evidenciamos que, embora os
alunos tenham elaborado em suas respostas o comportamento machista de uma mulher, eles
não citam o termo machismo para designar as concepções representadas nas cenas, no entanto,
compreendem suas implicações no contexto de desigualdade de gênero.
Já aqueles que deram uma única palavra como resposta, em sua maioria o próprio
termo “machismo”, não elaboraram mais do que isso, ficando então, o questionamento se esses
alunos tinham a consciência do que o termo cunhado significava. Acreditamos que, em níveis
diferentes, eles compreenderam que o machismo estava representado nas cenas. Um dado
importante que evidenciamos, por exemplo, é que em 08 roteiros de análise o termo
“machismo” foi dado como resposta para a pergunta de número 03 sendo 04 respostas do sexo
feminino, porém, ao escreverem apenas a palavra sem nenhum adicional, não podemos avaliar
em que nível de compreensão do termo os estudantes se encontravam.
Ainda sobre as palavras destacadas temos: padrão, coisas de mulher e ficar na
cozinha. É possível estabelecer uma ligação entre todas se pensarmos da seguinte maneira: que
ideias padrão a sociedade reproduz? A de que existem certas funções que são para as mulheres
executarem, neste ponto, ressaltamos que os serviços domésticos são tidos como uma qualidade
inata do sexo feminino, e podemos sublinhar esse comportamento como uma atitude
consolidada pela educação patriarcalista. Acreditamos que essas respostas foram bem
pontuadas diante das cenas apresentadas e que são exemplos da construção dicotômica e social
dos corpos. Uma fala que se ajusta perfeitamente a nossa afirmação é a de Bourdieu (p. 09,
1998):
A força da ordem masculina se evidencia no fato de que ela dispensa justificação: a
visão androcêntrica impõem-se como neutra e não tem necessidade de se enunciar em
discursos que visem legitimá-la. A ordem social funciona como uma imensa máquina
simbólica que tende a ratificar a dominação masculina sobre a qual se alicerça: é a
divisão social do trabalho, distribuição bastante estrita das atividades atribuídas a cada
88
um dos dois sexos, de seu local, seu momento, seus instrumentos; é a estrutura do
espaço, opondo o lugar de assembleia ou de mercado, reservado aos homens, e a casa,
reservada às mulheres; ou, no interior desta, entre a parte masculina, com o salão, e a
parte feminina, com o estábulo, a água e os vegetais; é a estrutura do tempo, a jornada,
o ano agrário, ou o ciclo de vida, com momentos de ruptura, masculinos, e longos
períodos de gestação, femininos.
AEM2: Na visão da mulher mais velha, a mulher é frágil e não tem capacidade pra
fazer os mesmos trabalhos do homem e na visão da Anne é o contrário.
Ao deixar claro para Anne que o casal de irmãos queria adotar um menino para ajudar
nos serviços da fazenda e que uma menina não seria útil, Marila, a mulher mais velha, reproduz
ideais machistas que para ela eram naturalizados na educação da época, a personagem
reproduzia discursos que reforçavam a desigualdade de gênero sem nenhuma criticidade porque
assim tinham lhe ensinado e Anne possivelmente foi a primeira pessoa a confrontá-la por esse
comportamento.
Segundo suas falas, Marila defende que mulher deve estar na cozinha e não fazendo
serviços fora dela, ou seja, a representação das “ideias padrão da sociedade” como respondeu
um de nossos participantes. É importante evidenciar que, nessa cena, os alunos reconheceram
que Anne pensava diferente mesmo sendo a mais nova na situação de conflito e que ela “lutava
por direitos iguais.”
89
AEM1: Que tem que ter cabelo comprido e seguir o padrão de beleza.
AEM2: Que precisa ter o cabelo grande pra ser uma mulher feminina.
Como citado por um dos estudantes, a mulher é pressionada para seguir o padrão de
beleza. Incutindo esse padrão de beleza, temos a indústria do consumo, que não existia na época
em que a série se ambienta, e que atualmente, bombardeia as mulheres diariamente com
propagandas que pregam a realização e satisfação através de algum produto. Já as redes sociais,
essas desempenham um papel crucial na opressão estética sofrida pelas mulheres. Observado o
nosso contexto atual, o cabelo é visto socialmente como uma fonte de feminilidade, porém, é
certo que uma mulher com cabelo curto pode ser tão feminina quanto uma mulher com cabelo
comprido.
As próprias características tidas como femininas reiteram a construção social de
gênero, pois, ao limitarmos o que é feminino e o que é masculino, não damos espaço para a
diversidade de modos da existência humana que rompem esse binarismo. Algumas dessas
características vão desde o comprimento do cabelo, a gestos suaves, voz mansa, postura
comportada, vestimentas ou cores básicas para citar algumas. A seguir um exemplo de como a
multimodalidade atua em nossas produções diárias, e em como uma cor pode estabelecer uma
comunicação temos a relação associativa que se faz de rosa para meninas e azul para meninos.
Naomi Wolf em seu livro O Mito da Beleza explica como essa composição da beleza feminina
é construída:
O mito da beleza não tem absolutamente nada a ver com as mulheres. Ele gira em
torno das instituições masculinas e do poder institucional dos homens. [...]As
qualidades que um determinado período considera belas nas mulheres são apenas
símbolos do comportamento feminino que aquele período julga ser desejável (WOLF,
2018, p. 31).
92
Isto posto, o padrão de beleza é definido por um grupo dominante visando os seus
interesses. Vale ressaltar que, em cada período da história o padrão de beleza sofreu mudanças.
Nesse sentido quem define o padrão de beleza a ser seguido? Claramente, não são as mulheres
que fazem essas escolhas, no decorrer dos anos, elas foram dissuadidas de poder escolher para
se sentirem obrigadas a seguir o que lhes era imposto. Por essa ótica, o padrão de beleza
funciona como mais um mecanismo da dominação masculina sobre o corpo feminino cerceando
as mulheres e as escolhas que envolvem os seus corpos. Fato que pode ser observado quando
Anne decide se vestir “como um menino” para experimentar o “outro lado”.
Figura 11 – Anne chega à Carmody com trajes masculinos.
Fonte: 02ª temporada, 06º episódio, 17min e 43s
Para Anne, já que a veriam como um menino devido o cabelo curto, vestir-se como
um lhe traria a experiência completa do sexo oposto. A personagem explana isso na sua fala:
“já que todos pensam que sou um menino, pensei que seria melhor se realmente fosse um.
” Essa fala é direcionada a Jerry que fica imóvel ao ver Anne vestida como um garoto, como
representado na cena acima. Foi então questionado aos participantes:
AEM2: As luvas, o chapéu, pois as meninas usavam outro tipo de chapéu e o cachecol
também.
Podemos constatar pelas respostas dos alunos, como eles identificaram e associaram
determinadas roupas ao sexo masculino. O principal exemplo dessa constatação é o uso de
calças pela protagonista, item essencialmente masculino no contexto da série. A partir da
composição das peças masculinas, Anne conseguiu facilmente se enturmar em esferas sociais
que excluíam as mulheres como: jogar bolas de gude com um grupo de garotos ou descarregar
uma pequena mercadoria por algum dinheiro. Para Anne, essas interações facilitadas pelo
gênero designado pelas roupas, a fizeram sentir-se livre nos apontando como a distinção entre
os gêneros pode limitar a inserção social feminina assim como, as atividades que as mesmas
podem desempenhar.
PESQUISADORA: Que emoções são representadas nessa cena da Anne vestida com
roupas masculinas?
AEM1: Ela está muito feliz, dá pra perceber pelo seu sorriso.
AEM2: O rosto dela mostra felicidade por estar vivendo outras coisas que antes era
proibido por ela ser mulher.
AEM3: Anne se sente livre por poder fazer qualquer coisa vestida como um menino.
eles: O vetor (linha do olhar), o ângulo da cena, a saliência (Anne se destaca na cena), as roupas
masculinas e as expressões faciais. No conjunto, a experiência de viver um dia como menino
foi prazerosa para a protagonista.
AEM1: Que Anne joga com um grupo de meninos, mas eles pensam que ela é um
menino.
AEM2: Que uma mulher pode fazer coisas com meninos, como praticar esportes e
futebol.
Nesta cena, o que de fato chamou atenção foram as respostas dos alunos no que diz
respeito a relação da prática esportiva na qual as mulheres são discriminadas ao realizar como
por exemplo: o futebol. Os patrocínios e incentivos ao futebol masculino são inúmeros
reiterado pelos salários altíssimos que os jogadores recebem o que, por sua vez, não acontece
com o futebol feminino. Nesse aspecto, observamos também que os alunos trouxeram para a
cena o seu repertório cultural, provavelmente, eles tenham conhecimento do mundo desportista
e traçaram essa relação no contexto que lhes foi apresentado.
95
Diante da conjuntura exposta através dos elementos constituintes das cenas exibidas e
analisadas, percebemos que, a identidade do corpo feminino e suas implicações subjetivas
passam pelo critério do patriarcado, um sistema que visa os interesses masculinos. “A cultura
estereotipa as mulheres para que se adequem ao mito, nivelando o que é feminino em beleza
sem inteligência ou inteligência sem beleza (WOLF, 2018, p. 94) ”. Esse pensamento, por sua
vez, promove a distorção da autoimagem das mulheres que “precisam” escolher entre uma
mente ou um corpo, ambos, não são permitidos.
Concluímos através das respostas dos discentes que, os mesmos são sujeitos que
reconheceram nas cenas, falas e comportamentos machistas, embora, esses alunos não tenham
demonstrado conhecer com mais afinco as características do termo cunhado. Para além da
etimologia da palavra, as respostas carregavam consigo a concepção da desigualdade de gênero
e uma compreensão dos efeitos que ela produz na sociedade.
significação e relevância para a nossa pesquisa. Deste modo, destacamos em negrito palavras
que nos chamaram a atenção e que consideramos essenciais para o nosso texto.
Na dimensão afetiva, observamos como os alunos se conectaram com as cenas
trabalhadas através das respostas dadas no roteiro de análise e pelas expressões faciais e gestuais
dos estudantes que foram, devidamente registradas durante a intervenção. Ao serem
questionados se conheciam a série, dois estudantes afirmaram que sim, expressando terem
gostado da produção canadense. Para os demais, a série era totalmente nova. Começamos com
a cena representada na figura abaixo.
Observamos que os olhares ficaram atentos durante a exibição das cenas, os alunos
mostravam-se interessados nos elementos visuais expostos em um primeiro momento. Durante
a exibição, foi frisado pela pesquisadora que, os estudantes se atentassem para todos os
componentes e para a importância deles na compreensão da série e do contexto. Em seguida,
finalizada a cena, questionamos:
AEM2: Ela tentando passar confiança para Marila para ela e o irmão adotarem ela.
A força e a coragem de Anne.
97
AEM4: Que por causa de um cabelo ela é tratada diferente, que ela precisou se vestir
igual um menino pra não sofrer preconceito.
AEM2: Por que ela sofria bullyng na escola por causa do cabelo curto.
AEM4: O modo que o menino olha para Anne quando ela se veste como homem.
AEM4: Anne está com uma postura bem firme e com um olhar bem confiante.
AEM5: Na primeira cena Anne tem uma postura e um olhar confiante, corajoso e
forte.
No que se refere à segunda cena, Anne aparece de cabelo curto depois de uma tentativa
frustrada de mudar a cor do mesmo, uma vez que, a garota não se achava bonita por não se
encaixar no padrão estético da época. Ao ser pedida para ir à cidade com Jerry, o ajudante de
Matthew na fazenda, cena já descrita anteriormente, a expressão do rosto da menina muda
bruscamente tornando evidente o desespero no seu olhar, interpretado pelos alunos como
aflição. Vejamos a imagem:
101
Como podemos percebemos, Anne apresenta uma expressão facial, na qual, podemos
identificar seus olhos, suas sobrancelhas e sua boca como elementos visuais. No entanto, os
alunos responderam sobre a cena focando, principalmente, na emoção que esses elementos
representavam na cena sem citá-los diretamente. Vejamos o diálogo:
PESQUISAORA: E aí, pessoal, como a Anne reage na cena que tem que ir comprar
comida na cidade?
AEM4: Na segunda cena, ela parece mais aflita, enquanto Marila é rígida, Matthew
é bastante paciente.
com Anne correndo para o celeiro amedrontada e fugindo de Marila. A personagem, então, se
esconde numa tentativa de não fazer o que lhe foi pedido. Esse momento, é apresentado com a
personagem encolhida em um canto e chorando.
Figura 20 – Anne se esconde para não ir à Carmody
Nesse ponto da cena, Matthew chega no celeiro e escuta o choro de Anne, em seguida,
ele vai ao seu encontro. Ao conversar com Anne, Matthew, extremamente pacífico,
característica essa explorada ao longo da série, aponta as qualidades da menina como forte e
corajosa, incentivando a garota a não se importar com o que pensarão a seu respeito por conta
do cabelo. Então, a menina se empolga com o discurso de Matthew e se convence a ir à
Carmody.
Constatamos que, essa cena apresenta modos semióticos que são capazes de nos
conduzir junto às emoções da personagem e observamos que, nesses momentos de angústia e
medo os alunos mostravam-se compenetrados com a cena, comovendo-se com a situação ali
descrita. Entendemos que, nos engajamos com uma imagem ou cena, de acordo com as nossas
vivências, particulares ou coletivas, e assim, a nossa interpretação de mundo interfere
diretamente nas nossas percepções.
Com base em Callow (2008), procuramos identificar a dimensão crítica nas respostas
dadas a pergunta de número 06 e como os alunos compreenderam essas cenas criticamente.
Embora cada aspecto da visualização seja importante, para Anstey; Bull (2000), a crítica
ideológica talvez seja a mais desafiadora para estudantes e professores. No que diz respeito a
103
uma análise crítica, os alunos não elaboraram respostas complexas ou contextualizadas acerca
das cenas, contudo, identificaram nas cenas, a exclusão das mulheres.
O letramento crítico na aula de LI torna-se então, uma necessidade para que os
estudantes possam refletir sobre os diferentes modos como construímos sentidos além da
escrita. Assim sendo, pensar em como podemos nos apropriar e transformar esses sentidos para
a nossa prática social configura-se no letramento crítico. Segundo Tagata (2014, p. 329):
Mais do que apenas ensinar regras gramaticais, o professor de inglês deveria, numa
perspectiva de letramento crítico, levar os alunos a refletir sobre o status dessas regras,
e como os usuários da língua inglesa se relacionam com elas, respeitando-as ou
modificando-as conforme seus próprios interesses, necessidades ou intenções
comunicativas em uma situação determinada.
A partir desse pensamento, entendemos que, a série Anne with an “e” pode contribuir
na prática escolar cotidiana a partir da abordagem multimodal e da pedagogia dos
multiletramentos. A dialética entre professor, aluno, gestão e comunidade escolar produzem o
conhecimento contextualizado, entretanto, na sala de aula esse fazer político ganha corpo e
robustez ao ser explorado pelo viés do letramento crítico.
O alunado já chega no ambiente escolar com a sua coleção (repertório sociocultural,
gostos e predileções), no entanto, ao ser exposto a uma nova linguagem, o aluno será instigado
a ler criticamente aquele texto e onde fazê-lo com o direcionamento necessário? Na escola,
espaço no qual, o professor pode estimular e transformar o possível consumidor acrítico em
analista crítico.
Isto posto, perguntamos aos estudantes se eles observaram inclusão ou exclusão de
algum grupo nas cenas trabalhadas de modo a identificar se os mesmos, foram capazes de
associar as ações representadas por Anne como enfrentamento a exclusão das mulheres na
sociedade da época. As respostas obtidas nos fornecem um parâmetro bem instigante.
AEM1: Exclusão das mulheres por acharem que não podem fazer o trabalho de um
homem.
AEM3: Sim, as meninas não podem fazer as mesmas coisas que os meninos então
ela era afastada nisso.
AEM5: Anne é excluída por ser menina já que na época o pensamento era bastante
machista, onde a mulher seria inferior ao homem e deveria fazer “coisas de mulher”
como ficar na cozinha e limpar a casa.
AEM6: Não. A Anne quer ser igual um homem, porque nós somos os melhores.
Essa definição de características constitui-se numa opressão social, uma vez que,
aqueles indivíduos que não se adequam a elas, são invariavelmente, excluídos. Podemos
entender que, os estudantes interpretaram que houve exclusão das mulheres nas duas primeiras
cenas trabalhadas, vide o próprio termo “exclusão” repetido nas respostas transcritas acima.
De acordo com Callow (2018), todos os textos fazem parte de contextos globais, locais e sociais
em constante mudança, portanto, a ideia que os alunos têm sobre o papel social da mulher
também sofre variações.
Alguns termos usados pelos alunos evidenciam a construção social dos gêneros e, por
conseguinte, as tarefas atribuídas a cada um como, por exemplo, os termos: “trabalho de um
homem, coisas masculinas e coisas de mulher”. Propomos as seguintes reflexões: o que eles
105
compreendiam por trabalho de um homem e o que seriam coisas de mulher. Se os alunos usaram
essas expressões, provavelmente, elas fazem parte do contexto social deles e são reproduzidas
no ambiente familiar ou em suas outras esferas sociais de convívio.
Salientamos que, esses termos não foram citados nas cenas, sendo expressões de
conhecimento prévio do aluno. Para o questionamento do que seriam “coisas de mulher” o
AEM2 respondeu “cozinhar e limpar a casa”, assim, consideramos importante essa fala que
demonstra como os papéis de gênero são reproduzidos na nossa educação e cultura.
É importante levantarmos a discussão sobre o porquê de o gênero feminino ser
atribuído a determinadas tarefas e partes da casa, independentemente, de sua escolha. A
justificativa a atribuição do gênero é tão arraigada culturalmente que, muitas vezes, as próprias
mulheres não se questionam sobre o assunto, apenas obedecem e cumprem o seu papel. Até
porque o próprio fato de questionar algo, não é um comportamento aceitável na cultura
patriarcal.
O efeito contrário também se dá na educação masculina. Para os homens, a virilidade
deve ser expressa na força física e, portanto, seu papel é usá-la nos serviços pesados como
mencionou o AEM1. Essa característica por si só, generaliza também o sexo oposto e podemos
observar essa construção nos discursos cotidianos. Aqueles homens que não seguem o padrão
de comportamento pregado pela sociedade patriarcal também serão discriminados.
Isto posto, acreditamos que esses alunos também foram educados para seguirem papéis
sociais determinados e nesse processo, não tiveram a oportunidade de refletirem sobre a questão
de gênero, o que a nossa intervenção oportunizou. Também destacamos que, nas discussões em
sala de aula é importante aproximar os discentes da sua função como cidadão e que, nós
formamos a sociedade, ou seja, também deve partir de nós, enquanto indivíduos vivendo em
coletividade, a transformação desses padrões danosos.
chega à comunidade de Avonlea e causa verdadeiro espanto por suas atitudes consideradas
incorretas para uma mulher no século XIX.
A pergunta de número 01 pedia para os alunos descreverem as cenas assistidas, assim,
focaremos nas cenas 02 e 03 para a nossa análise inicial a fim de encontrarmos conexões
implícitas ou explícitas que apontem para o contexto social dos participantes. Sendo a língua
um mecanismo para a disseminação de ideologias (KRESS, 2010), procuramos verificar até
que ponto os alunos de EM sistematizam esse conhecimento ao assistirem as cenas
selecionadas.
PESQUISADORA: Descreva as cenas que foram exibidas.
AEM4: Na terceira cena, a professora está numa bicicleta elétrica e os homens acham
estranho por ser uma mulher.
De acordo com a análise dos estudantes, Anne sente vergonha do seu cabelo curto e
acredita que será discriminada por isso, um fato que se faz presente na sociedade
contemporânea que continua atribuindo feminilidade ao cabelo longo. Sob a ótica multimodal,
entendemos que os alunos conseguiram analisar aspectos consistentes para as suas
107
interpretações através das expressões faciais de Anne que, como demonstra a imagem acima,
são expressões de angústia e medo identificadas pelo o seu olhar aflito, as sobrancelhas
franzidas e a postura encolhida.
Levar em consideração o contexto social, cultural e intelectual dos leitores é de
fundamental importância para que o texto possa cumprir o seu propósito comunicativo.
Segundo Morais (2020), para que um texto seja lido, interpretado e compreendido, é substancial
que os discentes possuam um conhecimento prévio sobre o tema abordado, para que o texto
seja assim, capaz de produzir significado aos leitores. Callow (2012), também ressalta que o
engajamento afetivo é um elemento poderoso quando os alunos interpretam um texto visual e
o mesmo autor salienta que, embora os alunos possam se conectar com um texto visual por uma
variedade de razões – desde referências à cultura popular ao imediatismo que uma imagem
visual oferece – o fator crítico é como o professor desenvolve isso como parte da experiência
do aprendizado. Observamos esse fator com a resposta de uma estudante a seguinte pergunta:
AEM1: Sim, minha irmã é lésbica e cortou o cabelo curtinho e todo mundo exceto
pai e mãe excluem ela.
sociedade e sexualidade, sua orientação afetiva, ou seja, por quem ele sente atração, portanto,
trata-se de uma questão mais abstrata e simbólica, assim nos diz Zinani:
Essa discussão vem ganhando espaço nas questões educacionais, dado que, a escola é
um espaço de convívio social politicamente demarcado pela pluralidade de contextos e
vivências. Nesse âmbito, torna-se importante conhecer essas distinções para que, o espaço
escolar não seja discriminatório reproduzindo aspectos socioculturais vigentes. Assim, o
suporte aos alunos que não se identifiquem com o binarismo estrutural será mais embasado e,
as situações de desigualdade de gênero, melhor combatidas.
Assim como Callow (2013), consideramos as imagens ferramentas de aprendizagem
em que, a atração imediata dos alunos pelo visual promove o envolvimento nas aulas. Então, a
partir da observação da segunda cena e dos modos semióticos atuantes nela como: o olhar, os
gestos e a postura assim como, o reconhecimento da situação evidenciada, a aluna engajou-se
visualmente refletindo criticamente e participando da nossa intervenção.
Callow (2013), divide o uso de recursos visuais pelos professores em duas categorias:
aprender por meio de recursos visuais e aprender sobre recursos visuais. Nesse caso, estávamos
estimulando os alunos a lerem o visual, portanto, eles estavam aprendendo sobre o visual.
Reiteramos que, a concepção de texto que se estende a toda produção de sentidos e a
nossa tentativa de promover uma leitura multimodal na sala de aula de LI nos mostrou a
dificuldade dos alunos em interpretar todos os elementos visuais como um texto. Como
observado nas respostas, o foco dos discentes se voltou para os modos semióticos mais
explícitos como: os olhares, as expressões faciais, as roupas, entonação da voz e os gestos sendo
importante ressaltar que essas observações foram sugestionadas pela pesquisadora.
Elementos como a iluminação da cena, o enquadramento ou efeitos de aproximação e
distanciamento da câmera não foram citados nas respostas. Vale ressaltar que, mesmo os modos
semióticos explícitos citados pelos alunos, precisaram ser estimulados oralmente durante a
intervenção ou sugestionados no roteiro de análise semiestruturado, do contrário, é provável
que as análises se concentrariam apenas no texto verbal.
109
PESQUISADORA: Gente, na época em que a série se passa, não era permitido para
as mulheres usarem calças, ou pelo menos não era comum ou conveniente, entendem?
Era uma peça usada somente por homens e as roupas das mulheres eram vestidos,
espartilhos, saias e etc.
Foi salientado para os estudantes que, no contexto histórico e social da série, não era
permitido ou conveniente às mulheres usarem calças, já que, elas eram uma peça
essencialmente masculina. Já os trajes considerados femininos para a época eram vestidos, saias
e espartilhos, por exemplo. Ao tomarem conhecimento, os discentes mostraram-se surpresos,
declarando não saberem dessa informação, ou seja, promover a contextualização histórica é
essencial para estimular o pensamento crítico.
Neste ponto, levantamos a reflexão crítica sobre como a dominação masculina se
estabeleceu e se estabelece atualmente reforçando padrões dicotômicos baseados no sexo
biológico e no uso das roupas como definição de gênero. As diferenças visíveis entre o corpo
feminino e masculino formaram o pilar da visão androcêntrica e, a partir dela, fomos
incorporando e naturalizando a dominação masculina. Baseado em Bourdieu (1998, p. 17), a
força da dominação masculina vem do fato de ela acumular e condensar duas operações: “ela
legitima uma relação de dominação inscrevendo-a em uma natureza biológica que é, por sua
vez, ela própria uma construção social naturalizada. ”
Tomando por base os conceitos da GDV sobre a metafunção representacional que
apresenta as três dimensões interativas, olhar (de oferta e de demanda), o enquadramento e a
perspectiva pudemos observar que, com relação ao enquadramento, a câmera aproxima os
leitores da cena, fazendo uso da metafunção interativa com o recurso de filmagem close-up
(ângulo fechado). Esse enfoque da câmera, prioriza o ângulo da bicicleta e da calça da
114
Paramos a cena nesse momento da figura 25, com enfoque em alguns elementos
específicos para a leitura dos estudantes. A cena é um exemplo de como os princípios de
composição das imagens são visualizados pelo espectador, de acordo com a GDV. No que tange
ao valor da informação, temos a bicicleta centralizada na cena dando ênfase ao veículo, o que,
por sua vez, se configura no aspecto da saliência, ou seja, uma hierarquia de importância entre
os elementos.
O foco dado a bicicleta coloca o leitor em perspectiva e sugere a transgressão
comportamental da professora, por fim, temos a estruturação da cena que se apresenta com a
parte do corpo da professora e a bicicleta em primeiro plano e o fundo totalmente desfocado.
Já a composição da cena 26, enquadra quatro personagens femininas. A professora
Stacy e a mãe que a recebe estão em um primeiro plano e as outras duas mães levemente
desfocadas em um segundo plano. Enquanto a professora Stacey se apresentava para a líder do
115
grupo de mães progressistas, é possível perceber os olhares curiosos e julgadores das outras
mães presentes direcionados à professora. Enquanto um modo semiótico, o olhar pode
comunicar e transmitir as mais variadas emoções como vemos na cena.
PESQUISADORA: Por que as mulheres estão olhando dessa forma para a professora
Stacey?
AEM1: Porque a professora está usando calças.
AEM2: Porque elas são preconceituosas.
AEM3: Porque para elas é estranho uma mulher usar calças naquela época.
As respostas foram semelhantes: o motivo dos olhares era o fato da professora estar de
calças, fator que, inclusive, a levará a ser tratada com hostilidade e discriminação pela
comunidade de Avonlea. Atualmente, as mulheres podem usar calças sem serem discriminadas,
já que, o item foi inserido ao guarda-roupa feminino. Todavia, no âmbito profissional, elas
continuam tendo que trabalhar arduamente para ocuparem espaços e, de certo modo, provarem
a sua competência. Ao não seguir as regras sociais, uma mulher é rapidamente excluída ou
vista de forma inferior, independentemente do tempo histórico, ou seja, no contexto da série ou
nos dias atuais, essa máxima prevalece.
Perguntamos aos alunos o que a entonação da voz de Marila e Anne significavam para
eles de acordo com o conteúdo da cena exibida, já que, elas falavam a mesma pessoa com
interesses diferentes. Os alunos destacaram alguns pontos relevantes para esse modo semiótico.
AEM1: Marila fala julgando a professora e Anne fala com alegria e admiração.
A mesma expressão - Meu Deus! - dita por Marila e Anne apresentava entonações
diferentes e, consequentemente, interpretações diferentes para a situação veiculada, o motivo
dessas entonações: o fato da professora Stacy estar vestindo calças. Enquanto Marila fala com
uma entonação de julgamento, Anne fala a expressão com empolgação e admiração, termos
usados pelos estudantes.
Outro ponto no discurso verbal da cena que foi suscitado se refere aos termos
aquilo/aquela. Marila se refere a professora como “aquilo” termo esse que objetifica a
professora e também delineia o seu espanto com a situação. Já Anne, sorrindo, se refere a
professora com curiosidade em conhecê-la com o termo “aquela” evidenciando uma admiração
pelo comportamento transgressor da professora. Na cena e no diálogo, as duas personagens
defendem ideias e opiniões pessoais através dos modos semióticos, discurso, entonação da voz,
expressão facial e movimentos.
Se nos voltarmos para o enquadramento da cena, vemos que ela distancia o observador
das personagens ao ampliar o campo de visão da imagem ao apresentar um ângulo que
118
centraliza a passagem da professora Stacy pela charrete dos irmãos Cuthbert. Segundo a
metafunção composicional da GDV, a imagem se configura no sistema de valor da informação,
visto que, cada elemento da imagem tem sua importância de acordo com a posição que ocupa
em relação aos outros. Kress e van Leeuwen (2000) argumentam que, a posição que os
elementos ocupam no visual lhes confere “valores informativos específicos” fazendo com que
esses elementos se relacionem entre si.
As imagens ou textos visuais têm o poder de reforçar ideologias, muito embora, a
maioria dos receptores não perceba conscientemente essa manobra, acreditamos que a
exposição constante a determinadas ideias pode produzir um efeito de manipulação nos
indivíduos, portanto, o letramento visual crítico torna-se importante para as nossas práticas
diárias. Kress (2010), chama essa relação de “a relação de poder implicitamente codificada em
modelos autoritários. ”
Corroborando a ideia de Kress (2010), está o quantitativo de participantes que
responderam “não” à pergunta de número 07 do roteiro de análise semiestruturado: Você se
reconheceu nas cenas? De que forma? Dos 29 roteiros analisados, obtivemos 21 respostas
negativas para a identificação com as cenas trabalhadas e 08 positivas. Das 21 respostas
negativas, 12 foram do sexo masculino e 09 do sexo feminino, dentro desse quantitativo
feminino, uma participante é transgênero, se identificando como mulher no roteiro de análise
semiestruturado.
Para as nossas análises, esses números foram surpreendentes nos fazendo levantar a
seguinte reflexão: seria a falta do letramento visual crítico um fator importante para esse
resultado? Acreditamos que, os alunos não fizeram a leitura crítica das cenas de acordo com as
ideologias, opiniões e situações que elas representavam, embora, tenham citado o termo
machismo em algumas das suas respostas, a compreensão de como esse sistema de
discriminação de gênero atua, ainda precisa ser esclarecido para o público da nossa pesquisa.
Para que haja a compreensão da mensagem pelo receptor, Kress (2010) apresenta uma
sequência que explica esse processo de significação que o leitor elabora. Segundo ele, o
interesse gera a atenção o que produz o engajamento, o engajamento leva a seleção de
elementos da mensagem o que promove a repartição desses elementos, e por sua vez, a
transformação e transmissão de um novo signo.
Desse modo, entendemos que, o processo de significação não se cumpriu pelos
discentes no ponto da transformação dos elementos da mensagem em uma nova produção de
sentidos. O trabalho semiótico de transformação e transmissão consiste na interpretação
(KRESS, 2010), portanto, interpretar as falas dos personagens, suas expressões faciais,
119
AEM2: Sim. Na forma que Anne defende as mulheres com seu posicionamento
feminista.
AEM3: De certa forma sim, por achar que sou mulher e não posso fazer certas coisas.
AEM1: Sim. Por ser menino e fazer trabalho de homem e não trabalho de mulher.
AEM3: Sim, pois como homem eu tenho certas vantagens na sociedade do que a
mulher como exemplo: emprego.
1. Expressões Faciais: 25
2. Discurso: 24
3. Olhar: 23
4. Vestimenta: 17
5. Entonação da Voz: 08
6. Movimentos Corporais: 07
Com base nas cenas trabalhadas, acreditamos que as imagens têm um forte apelo
comunicativo para o público adolescente, faixa etária dos participantes da pesquisa, sendo esse
fator um atrativo para explorar o visual dentro do contexto escolar. Qualificamos o engajamento
dos estudantes durante a nossa intervenção como positivo, visto que, todos os alunos presentes
nas três aulas ministradas não apresentaram resistência.
Evidenciamos também, como o trabalho com textos visuais pode promover uma
aproximação entre a escola e a condição social dos alunos fazendo-os refletir, questionar e
opinar sobre aspectos sóciocríticos das suas realidades, no nosso caso, aspectos das
representações sociais da mulher presentes nas cenas. O modelo Show Me é uma possibilidade
de amparo teórico-metodológico para os professores começarem a estimular o letramento visual
crítico, sendo assim, a proposta didático/pedagógica de Callow precisa ser mais disseminada
nas formações docentes, por exemplo.
Logo, nossa intervenção trouxe uma possibilidade de atividade que explore o
letramento multimodal crítico tão necessário na sociedade contemporânea. Propor a análise das
cenas sob uma ótica multimodal demonstrou aos discentes que as imagens podem funcionar
123
independentemente de texto escrito e que elas, não são apenas meros suportes do código verbal.
A seguir, apresentamos uma proposta de exploração das cenas em um formato de cartilha
pedagógica para auxiliar o professor na sua prática em sala de aula.
1 APRESENTAÇÃO
Sob essa perspectiva, esta cartilha levará para a sala de aula de língua inglesa uma
proposta didático-pedagógica com base nos aspectos propostos pelo modelo Show Me de Jon
Callow (2008, 2013), que contemplam as dimensões afetivas, composicionais e críticas. O
modelo, por sua vez, baseia-se na Gramática do Design Visual de Kress e van Leeuwen (1996,
2006). O intuito desta cartilha é fornecer um guia prático para os professores da área de línguas
explorarem nas suas aulas a abordagem multimodal objetivando assim, a ampliação do conceito
de leitura e interpretação dos estudantes através das séries de tv. Com as nossas sugestões de
atividades, o docente poderá adaptá-las e adequá-las de acordo com o seu contexto educacional
estimulando a criticidade dos discentes.
2 TEMA
4 MATERIAL DIDÁTICO
❖ Para esta proposta didática, selecionamos duas cenas da série Anne with an e,
disponível na plataforma de streaming Netflix. Na descrição abaixo, informamos a
temporada, episódio e minutagem das cenas selecionadas para que a atividade seja
realizada focada nesses recortes visuais.
❖ Para a realização da proposta é necessário o uso de datashow, caixa de som e
notebook.
1ª CENA
2ª CENA
5 OBJETIVOS
1ª DIMENSÃO: AFETIVA
3ª DIMENSÃO: CRÍTICA
7 PASSO A PASSO
1ª CENA e 2ª CENA
Após a exibição da cena, o professor pode estimular os alunos através das perguntas
sugeridas pelo modelo Show Me para cada dimensão:
1. Você pode me dizer o que está acontecendo ou o que a personagem está fazendo?
2. Como as personagens se comportam na cena?
3. O que as expressões faciais das personagens expressam?
4. Que tipo de ideia e/ou sentimento essa cena representa?
5. Como essa cena representa isso?
6. O que está acontecendo na cena?
7. Você pode dizer onde se passa essa história? Por quê?
8. Existem alguns elementos (como cores, formas, texturas) que se remetem a uma cultura em
especial? Quais? E qual cultura tentam representar? Por que você acha que a cena foi composta
dessa forma?
9. Essa imagem representa um tema, uma ideia ou sentimento? Qual?
10. Você pode me dizer quem está olhando por cima e quem está olhado por baixo?
11. Quem parece mais forte, a personagem que olha por cima, ou a personagem que olha por
129
8 CONCLUSÃO
Nesta proposta pedagógica, partimos do pressuposto de que as interações sociais estão
sofrendo mudanças significativas que exigem a nossa atenção. O avanço veloz da tecnologia
tem transformado a nossa comunicação e o uso de diferentes modos e signos representacionais
estão presentes em todas as esferas sociais. Compreender essa diversidade de modos e signos
tem se tornado uma necessidade diária.
Procuramos aqui, nortear o trabalho do professor de modo que este possa explorar na
sala de aula de língua inglesa as mais diversas formas textuais de forma crítica e consciente.
Com a propagação das séries de tv em alta, utilizá-las como ferramenta pedagógica é promover
o letramento multimodal crítico.
Com esta cartilha, o docente poderá adequar as nossas sugestões ao seu contexto
podendo fazer uso de outro seriado e selecionando as perguntas coerentes com os seus
objetivos. Nosso intuito é contribuir para um ensino crítico e contextualizado socialmente.
131
REFERÊNCIAS
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Ninguém além de você pode
determinar o seu valor.”
Anne with an “e”
pode e deve ser treinado para as novas composições textuais que estão surgindo. Observamos
que, os alunos não fizeram referência a determinados aspectos visuais presentes nas cenas,
embora a professora – pesquisadora tenha enfatizado antes e durante a intervenção que texto é
tudo aquilo que produz sentidos, logo, podemos fazer a leitura de tudo ao nosso redor.
Compreendemos também que, o monopólio do texto verbal em detrimento de outros modos
passa pela formação dos docentes que, por sua vez, reproduzem nas salas de aula
No que diz respeito à aula de língua inglesa, promover o acesso dos estudantes as
novas mídias é uma forma de dinamizar o material didático e estabelecer conexões com outros
contextos culturais sem sair do foco pedagógico. O uso do livro didático de língua inglesa, que
foi uma grande conquista para a educação brasileira, não precisa ser o pilar de todos os
conteúdos programados para o currículo escolar. Utilizar as séries de tv, que já estão inseridas
no cotidiano de boa parte dos discentes, promove o engajamento afetivo e o estímulo do
letramento visual crítico. A questão é: tornar os multiletramentos uma prática e não, uma
exceção na rotina escolar.
Concluímos que, as séries de tv, no nosso caso, a série Anne with an “e” oferecem
potencial como ferramentas pedagógicas para explorar o letramento multimodal crítico na sala
de aula de língua inglesa abordando o aspecto da linguagem, contanto que seja trabalhado
também, a definição de textos visuais. Consideramos os resultados positivos, a despeito de
nossas ressalvas já descritas, uma vez que, os estudantes, em escalas diferentes de compreensão
visual, demonstraram identificar situações de discriminação de gênero e as suas implicações a
partir dos sentidos representados nas cenas trabalhadas, interpretando o todo da composição
multimodal e não apenas o verbal.
Logo, nossa pesquisa fomenta a discussão da desigualdade de gênero tão enraizada na
nossa história até os dias atuais. Entendemos ser de extrema importância que os alunos tenham
contato com essas temáticas sociais que interferem diretamente nas nossas interações e em
como as relações de poder se estabelecem, visto que, os multiletramentos defendem essa
contextualização de conteúdos na sala de aula de modo que, a educação possa se alinhar com
as práticas sociais dos indivíduos formando leitores críticos do mundo e sujeitos atuantes na
sociedade multimodal.
Nossa pesquisa focalizou no letramento multimodal crítico através de cenas retiradas
da série de tv, Anne with an “e, por este motivo, consideramos relevante que futuras
investigações contemplem outros recursos semióticos e midiáticos assim como, seus potenciais
enquanto ferramentas pedagógicas a exemplo de: podcasts, videoclipes, aplicativos e o próprio
136
aparelho de telefone celular a fim de, compreender melhor como esses recursos atuam no
desenvolvimento do letramento visual crítico na sala de aula.
Por fim, desejamos que esta dissertação possa fomentar os estudos sobre
multimodalidade e possa contribuir para a discussão da representação social da mulher
contextualizada atualmente, promovendo a reflexão das limitações impostas pelo patriarcado.
Esperamos que, a leitura deste trabalho possa ajudar a desenvolver o olhar crítico dos leitores
para a questão de gênero e, a partir desse olhar, que consigamos construir uma sociedade que
impulsione as suas mulheres a ocuparem os espaços que lhe foram, historicamente, negados.
137
REFERÊNCIAS
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contemporâneas. 3. ed. Maringá: Eduem, 2009.
141
APÊNDICES
142
APÊNDICE A
Consentimento Livre
Concordo em participar desta pesquisa declarando, para os devidos fins, que fui devidamente esclarecido
(a) quanto aos objetivos da pesquisa e aos procedimentos aos quais meu filho (a) será submetido (a).
Foram garantidos a mim esclarecimentos que venham a solicitar durante a pesquisa e o direito de desistir
143
da participação em qualquer momento, sem que minha desistência implique em qualquer prejuízo a
minha pessoa ou a minha família. Autorizo assim, a publicação dos dados da pesquisa, a qual me garante
o anonimato e o sigilo dos dados referentes à minha identificação.
Assinatura: _______________________________________________________________________
Participante da pesquisa:
Assinatura: _________________________________________________________________
Pesquisadora responsável:
Assinatura: ________________________________________________________________
APÊNDICE B
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO
NORTE - UERN
CAMPUS AVANÇADO DE PAU DOS FERROS (CAPF)
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – DE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO
(PPGE)
APÊNDICE C
02 AULAS
METODOLOGIA: Inicialmente, será feita uma introdução à série Anne with an “e” a fim de
contextualizá-la para a turma. A professora/pesquisadora distribuirá o roteiro de análise
semiestruturado para cada aluno, orientando que os mesmos, façam as suas anotações e
146
observações durante e depois da exibição das cenas. Em seguida, as cenas serão exibidas e, ao
final da segunda cena será dado um tempo de dez minutos para os alunos concluírem as suas
percepções. A professora/pesquisadora recolherá os roteiros de análise. A aula será gravada.
APÊNDICE D
01 AULA
METODOLOGIA: Nesta terceira aula, será exibida a terceira cena da série Anne with an “e”
que tem, aproximadamente, 05 minutos. Em seguida, a professora/pesquisadora direcionará a
discussão sobre a cena focando nas dimensões afetiva, composicional e crítica, instigando os
alunos a dialogarem com os seus contextos sociais. Enquanto isso, a professora/pesquisadora
irá tomando nota das suas observações. A aula será gravada por dois aparelhos celulares.
RECURSOS METODOLÓGICOS: Data-show, notebook, caixa de som, quadro e celulares.