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03/01/2022 18:44 Brasil: a luta da Defensoria Pública em meio à crise | World Prison Brief

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Brasil: a luta da Defensoria Pública em meio à crise

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Officers also report inmates' mental healt…
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Patrick Cacicedo é Defensor Público em São Paulo, Doutor pela Universidade de São
Paulo e pesquisador em matéria prisional. Nesse texto, Patrick reflete sobre o trabalho
da Defensoria Pública durante a crise sanitária e a situação alarmante das prisões
brasileiras.

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O sistema prisional brasileiro nunca foi um exemplo de boas práticas


humanitárias, mas a situação piorou consideravelmente nos últimos anos.
O aumento avassalador da população prisional do país contribuiu de
maneira determinante para esse quadro: em três décadas o número de
presos saltou de 90.000 para 900.000. O principal resultado do
encarceramento em massa brasileiro foi o agravamento na superlotação
dos presídios, cujo déficit de vagas é superior a 300.000.

Com percentual de superlotação prisional na casa de 170%, a piora nas


condições de aprisionamento era um resultado previsível. Em trinta anos,
as más condições de vida nas prisões se converteram em catástrofe
humanitária. As violações aos direitos humanos são de toda ordem: péssimas condições de saúde,
escassas vagas para estudo e trabalho, violência, racionamento de água e alimentação, dentre
outros problemas de semelhante gravidade.

Covid-19 nas prisões, uma tragédia anunciada

À emergência humanitária das prisões somou-se a emergência sanitária da Covid-19, cuja medida
básica de contenção é o distanciamento social, incompatível com as prisões brasileiras, quase
todas compostas por celas coletivas. O ambiente fechado das prisões, por si só propício para a
proliferação do vírus, se agrava ainda mais em razão das condições específicas da vida carcerária
brasileira: superlotação, falta de equipes mínimas e programas de saúde, racionamento de água e
fornecimento precário de produtos de higiene.

A tragédia que se anunciava motivou a pressão da Defensoria Pública e de organizações não


governamentais de direitos humanos para que o poder público tomasse medidas eficazes para
evitar o risco de morte nas prisões. Ocorre que, ao contrário de medidas tomadas em outros
países - como solturas antecipadas para pessoas dos grupos de risco, programas de saúde
preventivos, prioridade na vacinação, por exemplo – no Brasil prevaleceu a inércia, inclusive na
realização de exames para detecção do vírus.

A gestão de enfrentamento da pandemia no Brasil é notoriamente reconhecida como uma das


piores do mundo, especialmente pelo negacionismo propagado pelo Presidente da República. Com
efeito, a negação ou minimização da gravidade da doença foi a maior marca do governo em
relação à pandemia do coronavírus. Ela se concretizou, dentre outras medidas, com o boicote às
ações preventivas, subnotificação dos dados epidemiológicos, incentivo a tratamentos
terapêuticos sem validação científica, ausência de estratégias nacionais de saúde e, na maior
parte do tempo, a tentativa de retirar credibilidade da vacina. O negacionismo não foi diferente
em relação aos presídios, especialmente em relação à falta de testes para detectar o vírus na
população prisional e, com isso, negar a urgência e gravidade do problema.

Reações do Judiciário

Sem medidas concretas dos Poderes Executivo e Legislativo, o Poder Judiciário concentrou as
demandas individuais e coletivas de tutela de direitos dos presos, sobretudo levadas pela
Defensoria Pública. Tais demandas foram fundadas na única medida significativa levada a efeito
para o enfrentamento da pandemia no sistema prisional: a Recomendação n. 62, de março de
2020, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Através desse documento, o CNJ recomendou aos
juízes a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus no
âmbito dos sistemas de justiça penal e juvenil, como, por exemplo, a reavaliação das prisões

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provisórias e a concessão de saída antecipada para determinados grupos de risco citados no


documento.

A medida, que se mostrou alvissareira logo após sua edição, revelou prontamente sua fragilidade:
a recomendação não tem efeito vinculante e não gerou maiores impactos na vida prisional. Salvo
exceções pontuais, os juízes ignoraram a recomendação e, inclusive, a população prisional
brasileira cresceu durante a pandemia. Até mesmo a Suprema Corte brasileira negou em massa
pedidos de liberdade fundados na recomendação do próprio CNJ.

A maioria desses milhares de pedidos foram veiculados por habeas corpus impetrados por
defensores públicos. A via coletiva do habeas corpus também foi utilizada por mais de uma vez:
idosos, mulheres grávidas, pessoas do grupo de risco para a Covid. A Suprema Corte, contudo,
negou a possibilidade de tais pessoas cumprirem pena em prisão domiciliar. Foram excepcionais
os casos acatados pelos tribunais brasileiros.

O que revelam as inspeções da Defensoria

A luta da Defensoria Pública não se restringiu aos pedidos de liberação de pessoas do grupo de
risco. Em São Paulo, estado que concentra quase um terço da população prisional brasileira, a
Defensoria Pública ajuizou ações para implantação de equipes mínimas de saúde nos presídios e
também para instalação de telefones públicos e organização de visitas virtuais. Além disso, instou
o Presidente da República para que concedesse indulto humanitário a pessoas do grupo de risco.
De todas essas medidas, apenas as visitas virtuais foram realmente implementadas.

Outra atividade desenvolvida pela Defensoria Pública de São Paulo foram inspeções de
monitoramento em diversos presídios, muitas vezes a partir de denúncias de familiares de presos.
Vinte e uma prisões foram inspecionadas e o levantamento de dados das quatorze primeiras
revelou que:
a) a prisão com menor taxa de superlotação tinha 122% de ocupação e a com maior apresentava
230%;
b) 86% das unidades racionava o fornecimento de água, sendo que uma delas não fornecia água
havia cinco dias;
c) o fornecimento de produtos de higiene era precário e em 31% das prisões os presos relataram
que nunca receberam tais produtos;
d) todas as unidades inspecionadas fornecem apenas três refeições diárias, de baixo valor
nutricional, e há 13 horas de diferença entre a última refeição de um dia e primeira do outro;
e) a insalubridade é generalizada, há pouca iluminação e ventilação nas celas;
f) nenhuma prisão possui equipe de saúde completa e quatro delas não há qualquer atendimento
por médico.

Um apelo urgente à mudança

Mesmo diante desses casos, a postura do poder público brasileiro segue negacionista. A inércia
das autoridades nacionais levou a Defensoria Pública de São Paulo a requerer audiência temática
junto à Comissão Interamericana de Direitos Humanos com o objetivo de expor a realidade das
prisões brasileiras na pandemia e instar o Estado brasileiro a prestar esclarecimentos.

O apelo internacional indica novas possibilidades de mudança do quadro apresentado, muito


embora não falte constrangimento internacional ao governo brasileiro no trato da pandemia.
Somos o pior modelo de gestão da pandemia dentro e fora das prisões. Dentro deste contexto, as

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desigualdades se amplificaram e a violação de direitos se tornou ainda mais aguda. Mais do que
urgente, a mudança é vital. A Defensoria Pública segue na luta.

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