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Sintaxe e Semântica

do Português
ARTUR OSVALDO DOS SANTOS
Funções sintácticas
1. Funções sintácticas ao nível
da frase e do predicado
Sujeito
• Concorda em pessoa e número com o verbo:
Os meninos viram o filme.
*O menino viram o filme.

• É um SN ou uma frase:
[ SN Os meninos] viram o filme.
[F Que tu tenhas chorado] surpreendeu-me muito.
• Pode ser substituído por um pronome nominativo
(ou demonstrativo, se for uma frase):
Eles viram o filme.
Isso surpreendeu-me muito.

• Na construção passiva, ocupa a posição de agente


da passiva:
O filme foi visto pelos meninos.
Complemento directo

• É um SN ou uma frase:
Os meninos viram [SN o filme].

Os meninos disseram [F que o filme foi muito divertido].


Complemento directo
• Pode ser substituído por um pronome acusativo:
Os meninos viram-no.
Os meninos disseram-no.

• Na construção passiva, ocupa a posição de sujeito:


O filme foi visto pelos meninos.
Complemento indirecto

• É um SP introduzido pela preposição a:

Os meninos atiraram a bola [SP aos amigos]


• Pode ser substituído por um pronome dativo:

Os meninos atiraram-lhes a bola

• É interrogado por a quem e, quando é pseudo-


clivado, a frase é introduzida por a quem:

A quem atiraram os meninos a bola? – Aos amigos.

A quem os meninos atiraram a bola foi aos amigos.


Predicado
Os meninos [SV viram o filme]
• Substituição (por um verbo intransitivo):
Os meninos tossiram (vs. *Os meninos tossiram o filme)

• Pergunta-resposta:
O que fizeram os meninos? – Viram o filme

• Coordenação:
Os meninos viram o filme e comeram pipocas.
• Deslocação à esquerda:
Ver o filme, os meninos fizeram-no na escola.

• Clivagem:
Foi ver o filme o que os meninos fizeram.

• Pseudo-clivagem:
O que os meninos fizeram foi ver o filme.
Complemento oblíquo
• É tipicamente um SP:

Os meninos assistiram ao filme.

• Para identificar o complemento oblíquo, usam-se


os testes para identificação do predicado (porque o
complemento oblíquo é constituinte obrigatório do
predicado).
• Substituição (por um verbo intransitivo):
Os meninos tossiram.
*Os meninos tossiram ao filme.

• Pergunta-resposta:
O que fizeram os meninos? – Assistiram ao filme.
*O que fizeram os meninos ao filme? – Assistiram.
• Deslocação à esquerda:
Assistir ao filme, os meninos fizeram-no (na escola)

*Assistir, os meninos fizeram-no ao filme (na escola).

• Clivagem:
Foi assistir ao filme o que os meninos fizeram.
*Foi assistir o que os meninos fizeram ao filme.

• Pseudo-clivagem:
O que os meninos fizeram foi assistir ao filme.
*O que os meninos fizeram ao filme foi assistir.
Modificador ou adjunto do predicado
• A categoria é variável:
Os meninos assistiram ao filme [SP à tarde].
Os meninos escreveram [SAdv cuidadosamente].
Os meninos tossiram [SN esta manhã].

• Não é seleccionado pelo verbo (não é argumento do verbo).

• Para identificar o modificador, usam-se os testes para


identificação do predicado (porque o modificador é constituinte
opcional do predicado).
• Substituição (por um verbo intransitivo):
Os meninos tossiram.
Os meninos tossiram na escola.

• Pergunta-resposta:
O que fizeram os meninos? – Assistiram ao filme
na escola
O que fizeram os meninos na escola? –
Assistiram ao filme.
• Deslocação à esquerda:
Assistir ao filme na escola, os meninos fizeram-no.
Assistir ao filme, os meninos fizeram-no na escola.

• Clivagem:
Foi assistir ao filme na escola o que os meninos fizeram
Foi assistir ao filme o que os meninos fizeram na escola.

• Pseudo-clivagem:
O que os meninos fizeram foi assistir ao filme na escola.
O que os meninos fizeram na escola foi assistir ao filme.
Dois níveis de predicado
• Predicado básico: é constituído pelo verbo e
pelos seus complementos.

• Predicado alargado: é constituído pelo


verbo, pelos seus complementos e pelos seus
modificadores (ou seja, pelo predicado básico
e pelos modificadores).
SV1

SV2 SP (MODIFICADOR) sv1=


Predicado
alargado
na escola
SV2=
V SP (COMPLEMENTO) Predicado
básico

assistiram ao filme
Exercícios
Indique a função sintática dos constituintes sublinhados nas
frases abaixo, justificando.

1. Ontem chegou a tia Joana.

2. Desejo que estejas bem.

3. Alegra-me que estejas bem.

4. A tua atitude agradou-me.

5. A tua atitude ajudou-me.

6. O João levou o filho à escola.

7. O João conduz com pouco cuidado.


2. Funções sintácticas ao nível
do sintagma nominal
Os constituintes do sintagma nominal
Determinantes/Quantificadores

• fixam a referência do SN ou quantificam o SN (o, um,


este, … / algum, muitos, todos, …)

Núcleo
• determina a categoria, o género e o número do SN;
• pode seleccionar complementos.
Os constituintes do sintagma nominal
Complementos

• pode ser um SP ou uma oração

Modificadores
• pode ser SP, SA, SN ou uma oração relativa;

• pode ser restritivo ou apositivo.


Complementos vs. modificadores

[SN os pescadores [SP de sardinha] [SP de Luanda]]


Complementos vs. modificadores
• Os nomes (deverbais) seleccionam os mesmos argumentos que
os verbos correspondentes:
pescar [SN sardinhas] (mostra que [de sardinhas] é
complemento do nome)
*pescar [SN Luanda] (mostra que [de Luanda] não é
complemento do nome)

 Os complementos nominais dos verbos são (geralmente)


realizados como complementos preposicionais dos nomes.
Complementos vs. modificadores

• Quando há um complemento e um modificador


(preposicional), o complemento ocorre
preferencialmente antes do modificador:

Os pescadores [SP de sardinha] [SP de Luanda]

??Os pescadores [SP de Luanda] [SP de sardinha]


Complementos vs. modificadores
• Podem coordenar-se dois complementos:
Os pescadores de sardinha e de carapau.

• Podem coordenar-se dois modificadores:


Os pescadores de Luanda e de Cabo Verde.

• É menos aceitável coordenar um complemento e um adjunto (a


menor aceitabilidade mostra que os dois SPs têm funções
sintácticas diferentes):

??Os pescadores de sardinha e de Luanda.


Complementos do nome
Pode ser um SP:
[ o pescador [ de sardinha]]
SN SP

• Pode ser uma oração:


[ a proposta [ de nós irmos ao cinema]] foi bem
SN F

aceite por todos.

[SN a proposta [F que nós fôssemos ao cinema]] foi


bem aceite por todos.
Complementos do nome
 Que nomes têm uma estrutura argumental (ou seja,
que nomes seleccionam complementos)?

• Nomes derivados de verbos:


pescar -> (o) pescador (de sardinha)
jogar -> (o) jogador (de andebol)
eleger -> (a) eleição (do deputado)
construir -> (o) construtor (da ponte)
propor -> (a) proposta (de eleições)
Complementos do nome
• Nomes derivados de adjetivos:

fiel -> (a) fidelidade (aos seus princípios)

inteligente -> (a) inteligência (da menina)

veloz -> (a) velocidade (do carro)


Complementos do nome

• Nomes relacionais:

(o) pai (da Maria)


(o) amigo (da Teresa)
(o) vizinho (do Paulo)
Complementos do nome
Nomes icónicos (ou que representam produtos
artísticos ou intelectuais):

(o) quadro (de Paula Rego) [Agente]

(a) fotografia (de Sebastião Salgado) [Agente/ Tema]

(o) livro (de João Tordo) [Agente]


Complementos do nome
• Pode ser um SP:
[SN um pescador [SP de Luanda]]

• Pode ser um SA:


[SN um pescador [SA habilidoso]]
[SN um [SA bom] pescador]

• Pode ser uma oração relativa:


[SN o pescador [F que me vendeu este peixe]]
Complementos do nome
 Os modificadores podem ter uma função restritiva ou
não restritiva.
• Modificadores restritivos (restringem a referência do SN;
são necessários para identificar o referente do SN)
[SN o aluno[SA atrasado]] não acabou o teste .
[SN o aluno [F que chegou atrasado]] não acabou o teste.

 Há vários alunos e este é o único aluno que chegou


atrasado.
Complementos do nome
• Modificadores não restritivos, explicativos ou apositivos
(o modificador não é necessário para identificar o
referente do SN)
[SN o aluno, [SA atrasado]], não acabou o teste.
[SN o aluno, [F que chegou atrasado]], não acabou o
teste.
 Só há um aluno ou o aluno que chegou atrasado já
foi identificado.
Exercícios
Nas seguintes frases, diga qual a função sintática
desempenhada pelos constituintes sublinhados, e justifique
brevemente.

1. Os fabricantes de brinquedos de Benguela estão em


greve.

2. O livro do João ficou na biblioteca.

3. O combate contra a crise financeira não está a resultar.

4. Na festa conheci um pintor de naturezas mortas de cabelo


grisalho.
Referências

Duarte, Inês (2000) Língua Portuguesa. Instrumentos de


Análise. Lisboa: Universidade Aberta, cap. 4.

Mateus, Maria Helena, Ana Maria Brito, Inês Duarte &


Isabel Hub Faria (2003) Gramática da língua portuguesa.
Lisboa: Caminho, 278-295.

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