Você está na página 1de 23

INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA

CURSO DE DIREITO

Direito Aduaneiro Angolano: Regime Jurídico das Mercadorias

Autor: Eduardo da Paixão Franco Pedrosa.


Orientadora: MsC. Maria Guadalupe.

Luanda – 2023
TERMO DE APROVAÇÃO

Eu, Eduardo da Paixão F. Pedrosa certifico que este trabalho é original__________________.

Direito Aduaneiro Angolano: Regime Jurídico

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


ao Instituto Superior Politécnico de Ciências e
Tecnologia como parte dos requisitos para
obtenção do grau de Licenciado em Direito.

Esta monografia foi avaliada e aprovada para obtenção do grau de Licenciado no curso de
Direito.

Membros do Júri

____________________________________________
Prof.ª Ms.C. Maria Guadalupe.
Orientadora.

____________________________________________
Prof.ª Ms.C.
Presidente da Mesa do Júri

____________________________________________
Prof. Ms.C.
Arguente.
____________________________________________
Prof. Ms.C.
Arguente.
Luanda – 2023
DEDICATÓRIA

A DEUS, o Todo-Poderoso por tudo que faz por mim e a todos os que sempre me apoiaram e
que ainda acreditam em mim.
RESUMO

O presente estudo traz um conjunto de factores e elementos do ramo de Direito Aduaneiro que
são fundamentalmente mecanismos que permitem a fluidez do sistema aduaneiro, tendo foco
nas infracções e as suas respectivas penalidades, entretanto, apresentou-se os instrumentos
internacionais de maior relevância que versam sobre a matéria das aduanas, bem como o regime
jurídico angolano. As abordagens aqui contempladas são de importância indiscutível num
panorama mundial de constante volatilidade, por outro lado, a realidade angolana leva cada vez
mais aos interessados pelo ramo e não só, à um constante desafio diário seja para os estudantes
como para o que exercem a actividade de importação e exportação, elementos igualmente
analisados na pesquisa. Contudo, concluiu-se com considerações que levam o leitor à um
exercício de reflexão útil e exequível, não só do ponto de vista de estímulo a novas pesquisas,
mas também, numa visão de elevação do actual cenário aduaneiro angolano.

Palavras-chave: Aduaneiro; Direito; Jurídico; Regime; Angola.


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 7
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ............................................................................ 9
2.1. Direito Aduaneiro e seus Elementos .............................................................. 9
2.2. Regime Jurídico do Direito Aduaneiro ................................................................ 10
2.3. As Funções da Aduana ........................................................................................ 17
2.3.1. O Controle Aduaneiro ...................................................................................... 17
2.3.2. A Aplicação de Restrições ............................................................................... 18
2.4. Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio ............... Erro! Marcador não definido.
2.5. Contencioso Fiscal Aduaneiro ............................................................................. 19
3. CONCLUSÃO ........................................................................................................ 22
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 23
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ASEAN – Associação de Nações do Sudeste Asiático


NAFTA – Tratado Norte-Americano de Livre Comércio
CEEAC – Comunidade Econômica dos Estados da África Central
MERCOSUL – Mercado Comum do Sul
SADC – Comunidade de Desenvolvimento da África Austral
COMESA – Mercado Comum da África Oriental e Austral
AGT – Administração Geral Tributária
CRA – Constituição da República de Angola
CA – Código Aduaneiro
GATT – Acordo Geral sobre Aduanas e Comércio (em inglês, General Agreement on Tarif
and Trade)
INCOTERMS – Termos Comerciais Internacionais (em inglês, International Commercial
Terms
OMC – Organização Mundial do Comércio
INTRODUÇÃO

O Direito Aduaneiro é pouco estudado entre nós e por esta razão antes de se discorrer
pripriamente sobre o regime jurídico das mercadorias no sector aduaneiro, apresentaremos
breves considerações sobre a vertente substantiva deste ramo do direito público. O Direito
Aduaneiro posiciona-se no domínio da política comercial do Estado, donde resultam interesses
opostos entre o Estado e os outros entes com que se relaciona no cômputo do comércio
internacional, principalmente de natureza aduaneira.

Em primeiro lugar, para o Estado, o fluxo e tráfego de mercadorias e produtos no seu espaço
territorial deve atender, inevitavelmente, à protecção de interesses políticos, económicos,
sociais, da saúde, do ambiente e da segurança. Por isso, ao Estado, reconhecem-se por um lado
poderes para fiscalizar, controlar e examinar todos os bens ou mercadorias que entrem a saiam
do seu território aduaneiro, e por outro, a faculdade de criar, através da incidência, determinados
impostos ligados à importação e exportação de mercadorias ou produtos (impostos aduaneiros),
fixar/lançar e colectar impostos e taxas aduaneiras.

Em segundo lugar, reconhece-se ao particular a faculdade e o direito de exercer livremente a


sua actividade económica, podendo transaccionar os seus os seus bens no mercado internacional
ou adquiri-los no exterior. Mas este ente público ou privado, que pode ser uma multinacional,
tem interesses opostos aos do Estado, já que as empresas em busca de rentabilidade procuram,
entre outros, minimizar os encargos fiscais” (Claro, 2021).

Problemática

É num ambiente de crescentes vicissitudes e poucas abordagens científicas actuais facto que
contribui para o pouco domínio dos agentes aduaneiros sobre a matéria das mercadorias e suas
naturezas, entretanto, tem suscitado uma espiral de situações e questões relativamente às
normas e procedimentos adoptados na actividade de controlo/fiscalização aduaneira, em que
várias são as vezes que nos deparamos com restrições de bens/produtos permitidos pela lei e
permissões de bens/produtos que a lei impõem determinada limitação na sua tramitação. Tais
actos (desconhecimentos) que são praticados por agentes públicos actuantes no sector

7
aduaneiro, acabam por prejudicar por um lado a vida do utente/cidadão que pretende ter a sua
mercadoria importada ou exportada, e por outro lado, na perspectiva da segunda situação
supracitada, lesam os interesses do Estado nos casos em que determinada mercadoria não deve
sair ou entrar no nosso território aduaneiro. Assim sendo, é neste âmbito que se abraça a
necessidade de conhecer o regime jurídico das mercadorias em Angola, temática que nos
propusemos tratar.

Pergunta de Partida

Qual é a importância de conhecer o regime jurídico das mercadorias em Angola?

Objectivo Geral
• Apresentar uma visão global do regime jurídico angolano das mercadorias.

Objectivos Específicos
• Conhecer os termos e conceitos;
• Apresentar os tipos de mercadorias no âmbito do Direito Aduaneiro;
• Depreender sobre a importância do conhecimento dos elementos do Direito Aduaneiro.

Justificativa
Do direito aduaneiro angolano, pretende-se aqui alcançar uma visão e compreensão globais
sobre este ramo de direito, precisando assim de maior atenção sendo que o estudo desta matéria
tem sido voltado a um incompreensível ostracismo pela generalidade da doutrina fiscal, facto
que torna imprescindível o interesse do autor, de igual modo, o presente estudo servirá de
instrumento para consulta pelos entes públicos e actores do sector aduaneiro, estudantes e
profissionais.
A metodologia utilizada terá como base a análise teórica da doutrina nacional e internacional,
das normas legislativas em vigor e dos acordos e demais diplomas internacionais existentes
no ramo do Direito Aduaneiro.

8
CAPÍTULO I - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.1. Definição de Termos e Conceitos

1.1.1. Direito Aduaneiro

O Direito Aduaneiro é constituído por um conjunto de princípios, normas, procedimentos e


práticas comerciais harmonizadas que regem a actividade de comércio internacional,
concretamente as operações de entrada de mercadorias no território nacional ou a sua saída para
o exterior do País.

Noutra abordagem o Direito Aduaneiro é “um conjunto de normas e princípios que regulam
juridicamente a política aduaneira, com a intervenção pública no intercâmbio internacional de
mercadorias, formando um sistema que possibilita o controlo e a criação de barreiras com
finalidades públicas”, tal como foi definido por Freitas (2004).

No mesmo sentido, Cala (2016) entende o Direito Aduaneiro como o “plexo de normas jurídicas
que regulam os fluxos de entradas e saídas de mercadorias do território nacional”.

Enquanto que, para Garcia (2014) é um ramo do Direito Público que consiste no controlo do
movimento ou da circulação internacional de mercadorias, sempre que estas cruzem as
fronteiras de um determinado país.

Assim, o Direito Aduaneiro trata das normas, procedimentos e práticas comerciais


harmonizadas e da tributação sobre as importações e exportações, no âmbito das relações de
comércio entre países.

9
1.2. Direito Aduaneiro e seus Elementos

Para caracterizarmos uma operação comercial como internacional, ela deve ocorrer transpondo
o limite territorial ou político de um ente soberano. Caso contrário, o que ocorre é uma operação
de comércio interno, onde as normas aplicadas deverão ser exclusivamente de direito interno.
Já naquelas, a operação comercial sujeita-se às normas de Direito Internacional Público e
Privado.

De acordo com Ricardo Xavier Basaldúa (1988), para denominarmos uma matéria como
aduaneira é indispensável encontrar seus pressupostos básicos, que são a existência de um
território aduaneiro, a existência de uma mercadoria, e sua entrada ou saída, denominada de
importação e exportação.

O primeiro elemento essencial do Direito Aduaneiro é o território. Não nos referimos àquele
conceito geográfico ou político apenas, mas no seu âmbito aduaneiro: o território aduaneiro.

1.3. Regime Jurídico do Direito Aduaneiro

A volatilidade do Direito Aduaneiro é fortemente influenciada com base aos acordos


multilaterais aprovados pelos sujeitos internacionais, nomeadamente, países, blocos
económicos e regionais ou zonas integradas de comercio livre e organismos internacionais do
comercio internacional.

Este ramo do direito apresenta-se com uma causa vocationis (razão da vocação) internacional
e harmonizadora com alcance comercial a nível mundial que se assenta na necessidade de
integrar as economias dos vários Estados, bem como de sistematizar as suas práticas e
procedimentos. A actividade do comercio internacional é operada por vários actores,
justificando a sistematização e a uniformização numa perspectiva de aplicação prática, quer
para a facilitação no processo de interacção entre os Estados e organismos multilaterais, quer
para os operadores do comercio internacional. Por exemplo, a sistematização e a uniformização
da nomenclatura pautal e classificação de mercadorias ou fixação do valor aduaneiro –
necessidades de ordem prática.

10
Baseado nesse espírito filosófico, procedeu-se à aprovação do Acordo Geral sobre
Tarifas/Pautas (onde se contemplam os direitos aduaneiros) e Comercio, frequentemente
designado por GATT 1947-1994 (em inglês, a General Agreement on Tarif and Trade).

Este acordo se figurou um marco nas relações comerciais internacionais, considerando que
resulta “no âmbito do surgimento e papel das Nações Unidas (1945) que é o de garantir a paz
mundial – que cedo se apercebeu de umas das principais causas das guerras sendo a busca do
«espaço vital», ou seja, a busca de recursos naturais, o domínio das fontes energéticas e de
matérias-primas de outras naturezas, pelo que, o professor Cremildo Félix Paca1 considera que
«o fortalecimento das regras comerciais devia ser também um dos objectivos das Nações
Unidas», porém nós entendemos que tal meta se insere no 10.º Objectivo de Desenvolvimento
Sustentável (ODS, 2020-2030) das Nações Unidas, que consiste na Redução das Desigualdades
versada no interior dos países e entre países2. Em suma, com base nesses factos surgiu o GATT
e, mais tarde, a Organização Mundial do Comercio (OMC) em 1994.3

1.4.Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio

O Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio ou Acordo Geral sobre Aduanas e Comércio (em
inglês, General Agreement on Tariffs and Trade, GATT) foi um acordo
internacional estabelecido em 1947, visando promover o comércio internacional e remover ou
reduzir barreiras comerciais, tais como tarifas ou quotas de importação, e a eliminação de
preferências entre os signatários, visando obter vantagens mútuas. Trata-se de um conjunto de
normas tarifárias destinadas a impulsionar o livre comércio e a combater práticas
proteccionistas nas relações comerciais internacionais. Os 23 (vinte e três) membros
fundadores foram África do Sul, Austrália, Bélgica, Birmânia (ou Myanmar), Brasil, Canadá,
Ceilão, Chile, China, Cuba, Checoslováquia, Estados Unidos, França, Holanda, Índia, Líbano,
Luxemburgo, Nova Zelândia, Noruega, Paquistão, Reino Unido, Rodésia do Sul e Síria.

1
PACA, Cremildo Félix, Justiça Administrativa, Fiscal e Aduaneira, 1.ª Edição, Luanda, 2017, p. 408
2
https://brasil.un.org/pt-br/sdgs/10, 2015
3
Angola aderiu à Organização Mundial do Comercio (OMC) através da Resolução n.º 4/96, de 15 de Março, da Assembleia
Nacional.
Quanto às funções, objectivos, estrutura e órgãos de decisão da OMC, suas características, membros da
Organização e tomada de decisões por consenso, vide ANTÓNIO, D. F. Gilberto/LUANSI, Lukonde, A
Facilitação do Comercio e outras Decisões de Bali – Perspectiva Angolana, Lisboa, Edição de Autores, 2014, p.
51-59

11
O GATT surgiu num contexto, nomeadamente para disciplinar as relações comerciais
internacionais com base nos seguintes princípios de actuação (Medeiros, 2001, pp 51-59).
i) diminuição gradual dos direitos aduaneiros e eliminação das preferências pautais de
caracter bilateral;
ii) aplicação da clausula da nação mais favorecida com vista a promover as trocas num
plano livre e não discriminatório, significando com isto o reconhecimento do
princípio da vantagem comparativa;
iii) edificação de um sistema multilateral que propagasse a segurança nas relações
económicas internacionais, garantindo o acesso de novos países aos mercados
externos; e
iv) afastamento de obstáculos não pautais, condenando as medidas públicas diferentes
das dos direitos aduaneiros que criam distorções nas trocas comerciais.

Outros diplomas que merecem destaque são a Convenção Internacional sobre o Sistema
Harmonizado de Designação e de Codificação de Mercadorias, também designada por
Convenção do Sistema Harmonizado.

Por outro lado, a Convenção Internacional para a Simplificação e Harmonização dos Regimes
Aduaneiros, igualmente conhecida por Convenção de Quioto, a Convenção sobre o Transporte
Internacional de Mercadorias, os Termos Comerciais Internacionais (International Commercial
Terms – cujo acrónimo é INCOTERMS) e finalmente a Convenção das Nações Unidas sobre
os Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias.

Aos mesmos instrumentos de suma importância estão associados, os acordos regionais


constituídos pelos blocos económicos, como são os casos, à giza de exemplo, a Comunidade
Europeia, a NAFTA, a ASEAN, a CEEAC, a MERCOSUL e sem deixar de mencionar no nosso
contexto angolano e africano, a SADC, a CEEAC e a COMESA, entretanto, os acordos por
estes celebrados no domínio do comercio.
Cremildo Félix Paca (2017) refere-se “a formação dos blocos económicos regionais ou zonas
integradas de comercio livre, como tendo sido constituídas fundamentalmente para integrar ou
agregar as economias nacionais dos blocos económicos ou zonas de livre comércio a que

12
pertencem; Eliminar ou anular tarifas, ou também chamadas barreiras aduaneiras dos países
membros dos blocos económicos ou zonas integradas de comércio livre; Criar zonas de
comércio livre e alargado, a fim de expandir o circuito comercial a novos mercados e aumentar
a taxa de consumidores.”

Em suma verifica-se que estes espaços económicos integrados permitem vantagens


comparativas entre países ou sectores produtivos, baseados em custos de produção marginais
em comparação aos mais baixos, tal qual na obtenção de economia de escala.

A Convenção de Quioto Revisada4 define o território aduaneiro como sendo o território onde
se aplica a legislação aduaneira de uma Parte Contratante. Trata-se de um território delimitado
por uma fronteira aduaneira. Diferente do conceito de território político, no qual a soberania é
elemento determinante, no conceito aduaneiro o território pode estar compreendido na
comunhão de vários entes soberanos, como no caso de uniões aduaneiras (o exemplo da
Comunidade Europeia é o mais forte), ou mesmo dentro de um território político e geográfico,
como nos casos das zonas francas.

Cremildo Paca (2017) considera que “há uma relação intrínseca entre o território nacional este
que o Estado exerce a sua soberania e o território aduaneiro.”

Em harmonia com a Constituição da República de Angola, bem como no âmbito dos tratados
internacionais, o território nacional é o historicamente estabelecido pelos limites geográficos
existentes, tendo como ponto de referência a data da independência de Angola (11 de Novembro
de 1975) e sobre o qual o Estado angolano exerce a sua soberania.

No contexto angolano, tendo o feito uma extracção dos preceitos contemplados na Constituição
da República, nomeadamente nos artigos 3.º, nº 2 e 3, e 5.º, n.º 1; o território compreende a
extensão do espaço terrestre, as águas interiores e o mar territorial, bem como o espaço aéreo,

4
A Convenção Internacional para a simplificação e a harmonização dos Regimes Aduaneiros, também
denominada de Convenção de Quioto Revisada é um instrumento reconhecido pela Organização Mundial das
Aduanas (OMA) como um compêndio de práticas aduaneiras ideais e necessárias para um comércio global
legítimo, simplificado e harmonizado.

13
o solo e o subsolo, o fundo marinho e os leitos correspondentes. A soberania abrange de igual
modo, a zona contígua, a zona económica exclusiva e a plataforma continental.

No que diz respeito ao território aduaneiro, cuja aduana ou também chamada de alfandegas
angolana – em que cabe a Administração Geral Tributaria (AGT) o desenvolvimento desta
tarefa, exercendo a jurisdição de controlo, prevenção, detecção e investigação das infracções
de natureza aduaneira – abrange nos termos do artigo 20.º do Código Aduaneiro (também
designado CA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 05/06, de 04 de Outubro).

Após diferenciarmos o território aduaneiro do território geográfico e político, as demais


considerações para a caracterização do comércio internacional devem ser observadas: apenas
nos casos em que a operação comercial é feita transpondo a fronteira do território, no caso
aduaneiro, a operação pode ser caracterizada como uma operação de comércio exterior, do
ponto de vista específico de um país, com sua conotação aduaneira.

Outro elemento essencial para o Direito Aduaneiro é a mercadoria. Considerando o comércio


internacional como objeto de estudo do Direito Aduaneiro, chega-se à mercadoria, o objeto
material da atividade comercial.

A doutrina aduaneira é unânime ao definir mercadoria, para fins aduaneiros, como todo objeto
suscetível de tráfego internacional e passível de controle. Nesse conceito, temos como
mercadoria não apenas o objeto sujeito à comercialização, mas uma acepção mais ampla, como
aqueles objetos sujeitos ao tráfego internacional por qualquer outro motivo. A individualização
da mercadoria, por meio de sua codificação, permite o controle por parte das autoridades
aduaneiras, e a imposição de restrições ao tráfego e a sua tributação. Sem o conhecimento da
mercadoria objeto do comércio internacional, a autoridade aduaneira não pode exercer sua
função.

Por este motivo, associado à tradição, alguns doutrinadores defendem que apenas o que for
passível de controle por parte da Aduana poderia ser considerado como objeto do comércio
internacional, dentro do conceito estrito de mercadoria.

14
Esses autores partem da figura histórica (e ainda presente) do posto aduaneiro na fronteira, que
faz a conferência física de todas as mercadorias que ultrapassam a fronteira, sem considerar as
limitações desse tipo de controle na atualidade derivado do volume de comércio exterior do
país (e mesmo da unidade aduaneira de controle), e sem considerar a evolução do comércio
internacional, que apresenta outros itens passíveis de comercialização, como por exemplo, os
serviços e os intangíveis.

Considerar que a Aduana, na atualidade, tem como objeto apenas a mercadoria física por ser a
única passível de controle e apreensão é limitar sua atuação, restringindo a atuação aduaneira a
uma época que já faz parte da história.

O Código Aduaneiro contempla no seu artigo 3.º a definição de mercadorias bem como dos
seus tipos «vv) “Mercadoria” ou “mercadorias”: todos os produtos naturais, matérias-primas,
artigos manufacturados, produtos semi-acabados, produtos acabados (obras), animais, moedas,
substâncias ou outras coisas, incluindo, nomeadamente, meios de transporte, equipamentos,
peças e acessórios, salvo se do contexto resultar outro sentido;

ww) “Mercadorias da mesma natureza ou da mesma espécie”: mercadorias classificadas num


grupo ou numa gama de mercadorias produzidas por um ramo de determinada produção, ou por
um sector particular de um ramo de produção, e compreende as mercadorias idênticas ou
similares;

xx) “Mercadorias demoradas”: quaisquer mercadorias mantidas em local de depósito


temporário por não ter sido cumprida, nos termos e prazos estabelecidos na lei, a obrigação de
apresentação de uma declaração aduaneira, ou a obrigação de pagamento de direitos e demais
imposições aduaneiras devidos, ou, ainda, a obrigação de remoção das mercadorias
desalfandegadas do local de desalfandegamento;

yy) “Mercadorias”: mercadorias de que se pode dispor sem restrições aduaneiras;

zz) “Mercadorias estrangeiras”: as mercadorias que não se integrem nem no conceito de


mercadorias nacionais nem no âmbito das mercadorias nacionalizadas;

15
aaa) “Mercadorias idênticas”: mercadorias que são as mesmas sob todos os aspectos, possuindo
as mesmas características físicas, a mesma qualidade e o mesmo prestígio comercial, não
obstando a que sejam qualificadas como idênticas as pequenas diferenças de aspecto que as
mercadorias eventualmente apresentem;

bbb) “Mercadorias nacionais”: as mercadorias produzidas no território nacional; ccc)


“Mercadorias nacionalizadas”: as mercadorias disponíveis no País após desalfandegamento,
destinadas a entrada em livre circulação e que tenham sido importadas mediante o pagamento
de direitos e demais imposições aduaneiras devidos ou que deles estejam isentas por disposição
legal;

ddd) “Mercadorias produzidas”: as mercadorias cultivadas, fabricadas ou extraídas; eee)


“Mercadorias proibidas”: mercadorias cujo trânsito, importação ou exportação é proibido nos
termos da legislação aplicável;

fff) “Mercadorias similares”: mercadorias que, apesar de não serem iguais sob todos os
aspectos, apresentam características semelhantes, como, por exemplo, qualidade, prestígio
comercial e existência de uma marca, sendo compostas de matérias semelhantes, o que lhes
permite preencher as mesmas funções e ser comercialmente permutáveis;

ggg) “Mercadorias sujeitas a restrições” ou “mercadorias de importação ou de exportação


restrita”: mercadorias cuja importação ou exportação está sujeita, nos termos da legislação
aplicável, a condições ou restrições especiais.»

Por fim, temos os elementos dinâmicos do Direito Aduaneiro: a importação e a exportação.


Sem essas operações comerciais, a mercadoria não terá relevância para o Direito Aduaneiro.
Apenas quando ocorrem as operações de importação e exportação, em suas diversas etapas e
procedimentos, iniciam-se os fatos que terão repercussão aduaneira. O movimento da
mercadoria, na entrada e saída de um determinado território aduaneiro, configura esse terceiro
elemento essencial do Direito Aduaneiro.

16
1.5. As Funções da Aduana

Apresentam-se, a seguir, as clássicas funções aduaneiras: controle, aplicação de restrições e


tributação.

1.5.1. O Controle Aduaneiro

Segundo Ricardo Xavier Basaldúa, a função essencial da Aduana, cuja ausência a


descaracteriza, é o controle que deve exercer sobre as mercadorias objeto do tráfego
internacional, ou seja, sobre as importações ou exportações.

Trata-se do princípio da universalidade do controle aduaneiro, sem o qual não existe função
aduaneira, que retrata a soberania do território. A Convenção de Quioto Revisada define
“Controle aduaneiro” como o conjunto de medidas tomadas pelas Alfândegas com vista a
assegurar a aplicação da legislação aduaneira.

Para Rosaldo Trevisan, o exercício do controle aduaneiro sobre as mercadorias procedentes ou


destinadas ao exterior é o papel essencial da Aduana, ou seja, “regular o fluxo de comércio
exterior, estabelecendo incentivos ou restrições, e fiscalizando-os, para garantir sua correta
aplicação”.

A Convenção de Quioto Revisada prevê, no seu Anexo Geral, Norma 6.1, que todos os bens
que sejam introduzidos no território aduaneiro ou dele saiam, estão sujeitos ao controle
aduaneiro.

O controle pode ser exercido em três momentos:

a) antes da chegada da mercadoria;


b) no momento da apresentação da mercadoria às autoridades aduaneiras; e
c) após o desembaraço aduaneiro das mercadorias.

17
Não se trata de uma verificação absoluta de toda mercadoria importada ou exportada, visto que
tal verificação é feita por amostra, mas a sujeição de todas as mercadorias ao controle, ou seja,
a possibilidade de que em algum momento as mercadorias poderão ser verificadas e as
operações efetivamente controladas.

“Verificação das mercadorias” significa a operação pela qual as Alfândegas procedem ao exame
físico das mercadorias a fim de se assegurarem de que a sua natureza, origem, estado,
quantidade e valor estão em conformidade com os dados da declaração de mercadorias, segundo
definição da Convenção de Quioto Revisada.

Podemos considerar o Controle Aduaneiro como o bem jurídico tutelado pelo Direito
Aduaneiro, representando o poder soberano do Estado e seu poder de polícia, atuando na
proteção da sociedade, através do combate à importação de mercadorias de importação restrita
ou proibidas, como instrumento de combate ao tráfico de drogas, de armas e lavagem de
dinheiro, e ainda, como proteção à sociedade no que diz respeito à saúde pública e proteção do
meio ambiente.

Reflete também outra característica do Direito Aduaneiro: a formalidade requerida nos atos
praticados junto à AGT, não como mera obrigação acessória e burocrática, mas como medida
de controle e segurança dos actos aduaneiros praticados.

1.5.2. A Aplicação de Restrições

A segunda função clássica da Aduana é a aplicação de restrições e proibições à importação e à


exportação. Essa função aproxima o Direito Aduaneiro do Direito Econômico, como
instrumento de política aduaneira, que define a forma e o grau de interação comercial do Estado
com o resto do mundo, e as prioridades da política econômica traçadas pelo governo, com base
nas demandas econômicas e sociais do país.

A abertura comercial do país, derivada da globalização e internacionalização da economia,


tende a ser direcionada pela política econômica, na qual a política aduaneira está incluída, com

18
a definição do grau de abertura, dos setores econômicos que serão impactados com a abertura
comercial, considerando os reflexos sociais e econômicos dessa abertura.

A implantação de medidas de protecionismo comercial (proibições e restrições à importação)


são o extremo dessa função aduaneira. Mas também se refere às medidas microeconômicas,
como restrições a itens específicos destinados a determinados setores que apresentam
problemas concorrenciais ou mesmo de preço, de forma temporária. Trata-se de medidas
aduaneiras na proteção da economia.

1.6. Contencioso Fiscal Aduaneiro

Relactivamente ao Contencioso, passamos a citar o preceituado legalmente no Código


Aduaneiro:

«PARTE V CONTENCIOSO FISCAL ADUANEIRO

TÍTULO I Das infracções fiscais aduaneiras


CAPÍTULO I Das infracções em geral
SECÇÃO I Disposições gerais

Artigo 141.º (Âmbito de aplicação e objecto)


O regime jurídico definido nesta parte aplica-se às infracções à legislação aduaneira em
vigor no País, incluindo a que respeita aos regimes aduaneiros suspensivos e de benefícios
fiscais, de importação ou exportação.

Artigo 142.º (Noção e tipos de infracções fiscais aduaneiras)


1. Infracção fiscal aduaneira é o facto ilícito declarado punível pelo Código ou por lei
avulsa.
2. As infracções fiscais aduaneiras classificam-se em crimes e transgressões.
Artigo 143.º (Lugar da prática da infracção fiscal aduaneira)
1. O Código é aplicável, seja qual for a nacionalidade do infractor, às infracções fiscais
aduaneiras cometidas no território aduaneiro, e ainda, salvo convenção em contrário,

19
às infracções que, tendo sido praticadas fora deste território, nele tenham produzido o
seu resultado típico.

2. A infracção fiscal aduaneira considera-se cometida ou praticada no lugar em que, total


ou parcialmente, o infractor tenha actuado, ainda que sob qualquer forma de
comparticipação, ou no lugar em que o resultado típico se tenha produzido, e, em caso
de omissão, no lugar do serviço aduaneiro em que devia ter sido cumprido o dever
violado ou no lugar onde o infractor devia ter actuado.

Artigo 144.º (Concurso de infracções)


1. Se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e transgressão, o infractor é punido
a título de crime, sem prejuízo das sanções acessórias previstas para a transgressão.

2. Os factos que forem qualificados, no todo ou em parte, como infracções fiscais


aduaneiras por mais de uma disposição legal são punidos pela disposição que estabeleça
pena mais grave.
3. Quando o mesmo facto constituir simultaneamente infracção fiscal aduaneira e de outra
natureza, as sanções previstas para ambas as infracções são cumuláveis, desde que
tenham sido violados interesses jurídicos distintos.

Artigo 145.º (Presunção de fraude)


A presunção de fraude admite sempre prova em contrário.

Artigo 146.º (Punibilidade da tentativa)


A tentativa da prática de qualquer infracção fiscal aduaneira legalmente prevista é punível
nos mesmos termos da infracção consumada.

Artigo 147.º (Actuação em nome de outrem)


1. Fica sujeito à aplicação das sanções correspondentes à violação das normas aduaneiras
quem age voluntariamente como titular dos órgãos de uma pessoa colectiva, sociedade ou
mera associação de facto, ou em representação legal ou voluntária de outrem, mesmo
quando o respectivo tipo de infracção exija:

20
a) Determinados elementos pessoais e estes só se verifiquem na pessoa do representado;
b) Que o infractor pratique o facto no seu próprio interesse e o representante actue no
interesse do representado.

2. A ineficácia do acto que serve de fundamento à representação não impede a aplicação


do disposto no número anterior.

4. Não há responsabilidade do representante que prove:

a) Que não participou no facto ilícito praticado pelo representado ou por terceiro;
b) Que, não tendo participado no facto ilícito, mas tendo tido conhecimento da sua
prática, comunicou às alfândegas essa prática;
c) Que agiu com diligência em todos os momentos do processo aduaneiro.

Artigo 148.º (Cúmplices e encobridores)

1. Aos cúmplices devem ser aplicadas penas iguais às que hajam sido aplicadas aos
autores.
2. Os encobridores são punidos com as penas aplicáveis aos autores, especialmente
atenuadas.»

21
CONCLUSÃO

Conclui-se que a mercadoria, dentro de um conceito amplo é o objeto principal do Direito


Aduaneiro, sobre o qual incidirá toda a normatização aduaneira quando ultrapassar os limites
do território aduaneiro.

É imprescindível a harmonização do direito aduaneiro da SADC. Se esta via não for possível,
achamos que a união aduaneira da zona tridimensional, COMESA-EAC-SACU, é a melhor
opção à médio e longo prazo. O nosso desiderato, a curto prazo, é propor a transformação da
SADC numa organização de cooperação política (para proporcionar a resolução dos assuntos
sobre paz e segurança na região austral), e que os assuntos económicos da SADC fossem
transferidos para a SACU – Southern African Customs Union, o acordo que criou a União 53
Aduaneira da África Austral; para que finalmente seja alcançada uma União Aduaneira, entre
os restantes países da SADC (não membros da COMESA e da EAC), com os da SACU.

22
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

• Barreira, E. C., La Relación Jurídica Tributaria y Relación Jurídica Aduanera. Revista


de Estudios Aduaneros, Buenos Aires, v.18, p.55-74, 2007.
• Basaldúa, R. X., Introducción al Derecho Aduanero. Buenos Aires: Abeledo-Perrot,
1988.
• Cistac, G., Aspectos Jurídicos da Integração Regional, Escolar Editora, Maputo, 2012.
10.
• Decreto-Lei n.º 5/06, de 4 de Outubro (2006). Código Aduaneiro - Imprensa Nacional
• (Diário da República, I série nº 120)
• Decreto Presidencial n.º 324/14, de 15 de Dezembro. Cria a Administração Geral
Tributária – Imprensa Nacional (Diário da República, I série nº 220)
• Cunha, L. P., o Sistema Comercial Multilateral e os Espaços de Integração Regional,
Coimbra Editora, 2008.
• DGA-AT, Pauta Aduaneira de Serviços, Imprensa Nacional, Maputo, 2010.
• Dosser, D. “Economic Analysis of Tax Harmonization, In Fiscal Harmonization in
Common Markets, vol. I. Theory, ed. C.S., Columbia University Press, New York and
London, 1967.
• Entrevista da TVM (Televisão de Moçambique) com Professor Gilles Cistac,
apresentada no Telejornal na véspera da realização da Primeira Conferência
Internacional sobre as Questões da Integração Regional e o Direito da SADC, realizada
em Maputo, de 23 a 25 de Abril de 2008.
• Jornal Diário de Moçambique, SADC: as Causas do insucesso, de 07 de Dezembro de
2005.
• Paca, C. F., Justiça Aduaneira, 2017

23

Você também pode gostar