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JÚLIO ASSIS SIMÕES
REGINA FACCHINI
Na trilha do arco-íris
D o m o v i m e n t o homossexual ao LGBT
100203151
ISBN 9 7 8 - 8 5 - 7 6 4 3 - 0 5 1 - 3
CDU 392(81)
CDD 301.2420981
Sumário
Introdução 11
Plano do livro 12
Sobre siglas, t e r m o s e n o m e s 14
Paradoxos da identidade 17
Visibilidade social e política 18
Brasil: paraíso ou inferno sexual? 24
A h o m o f o b i a e suas manifestações 25
Orientação sexual, g ê n e r o e identidades 28
• 9 '
Fundação Perseu A b r a m o
Instituída pelo Diretório Nacional do
Partido dos Trabalhadores em maio de 1996.
Assistente Editorial
Raquel Maria da Costa
Participação especial na
edição do t e x t o
Sandra Brazil
Preparação de t e x t o
Claudemir D. de Andrade
Revisão de t e x t o
Flamarion Maués
Letícia Braun
Coordenador da Coleção
Fernando Teixeira da Silva
Equipe Editorial
Alexandre Fortes, Antonio Negro,
Fernando Teixeira (editor deste volume),
Hélio da Costa e Paulo Fontes
Capa e p r o j e t o gráfico
Eliana Kestenbaum
Editoração eletrônica
Enrique Pablo Grande
Imagem de capa
Paulo Pinto /Agência Estado
a
1 I Parada do Orgulho GLBT (São Paulo, 2007)
© 2 0 0 8 b y Júlio Assis S i m õ e s e R e g i n a F a c c h i n n i
ISBN 9 7 8 - 8 5 - 7 6 4 3 - 0 5 1 O
I a edição: abril de 2009
Libertários na "abertura" 81
Saindo do g u e t o 82
D e b o c h e e dissenso 88
O Somos se assume 96
E n t r e tapas e beijos 103
O Lampião se apaga 108
N o v o s desafios 111
Notas 177
Bibliografia 185
• I O *
Introdução
Plano do livro
• 1 2 O -
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Algumas advertências precisam ser feitas desde já. A denominação LGBT aqui
usada segue a fórmula recentemente aprovada pela I Conferência Nacional GLBT,
N A TRILHA DO ARCO-ÍRIS
• 18o ••6i•
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
LAÇOS DE FAMÍLIA
civil pública p o r dano moral coletivo, subscrita por sete organizações de defesa
dos direitos LGBT contra a Rede TV! , p o r conta das "pegadinhas" apresentadas no
programa Tarde quente que ridicularizavam e humilhavam pessoas em razão de
sua orientação sexual. Sob ameaça de perda de concessão, a r e d e de televisão foi
obrigada a retratar-se publicamente, pagar pesada indenização e exibir, durante
o horário d o programa suspenso, programas de educação e m direitos humanos
produzidos pelas associações que tinham subscrito a ação.
Em 2004, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos do Governo Federal lançou
o "Brasil sem homofobia: programa de combate à violência e à discriminação contra
GLBT e de promoção à cidadania homossexual". Elaborado por meio de consultas en-
volvendo lideranças do movimento LGBT e uma comissão formada por representantes
do Ministério da Saúde e do Conselho Nacional de Combate à Discriminação, o pro-
grama se apresenta como uma agenda comum do governo e do movimento, prevendo
ações a serem executadas pelas diversas instâncias estatais gestoras de educação, saúde,
justiça e segurança, destinadas a apoiar projetos de fortalecimentos de organizações
não-governamentais de caráter público que atuam no combate à homofobia e na pro-
moção da cidadania LGBT; capacitar profissionais e representantes do movimento LGBT
que atuam na defesa dos direitos humanos; disseminar informações sobre direitos e
promoção de autoestima; e incentivar a denúncia de violação dos direitos humanos
contra LGBT. O programa preconiza a participação de ativistas LGBT nos conselhos
articulados junto aos diversos ministérios.
Em 2008 realizou-se, e m Brasília, u m a Conferência Nacional GLBT inédita,
c o m o objetivo de elaborar propostas para o Plano Nacional de Promoção da
Cidadania e Direitos Humanos de LGBT. Sob o tema"Direitos humanos e políticas
públicas: o caminho para garantir a cidadania de gays, lésbicas, bissexuais, travestis
e transexuais", a conferência foi resultado do reconhecimento da demanda do
m o v i m e n t o pelo Governo. Seu processo de construção, coordenado pela Secre-
tária Especial de Direitos H u m a n o s (SEDH), teve início a partir u m decreto de
convocação assinado pelo Presidente da República em 28 de novembro de 2007.
Esse processo contou, assim c o m o o c o r r e em relação a outros segmentos sociais,
com etapas municipais e estaduais, q u e envolveram e implicaram governos e
atores da sociedade civil em âmbito local c o m a temática LGBT. A etapa estadual,
realizada e n t r e março e maio de 2008, contou com cerca de 10 mil participan-
tes e resultou n u m conjunto consolidado de 510 propostas, que foram avaliadas
• 2 1 -
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 22 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
BUGRES E GUERREIRAS
• 23 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 24o •
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• 6i •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
•26o••6i•
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Dados obtidos nas pesquisas realizadas n o Rio de Janeiro, Porto Alegre, São Paulo
e Recife, e n t r e os anos de 2 0 0 3 e 2006, a p o n t a m para u m índice que varia de 5 6 % a
7 0 % de pessoas q u e relataram t e r sofrido discriminação e m razão de sua sexualida-
de. N o q u e diz respeito a experiências d e agressão, os dados são muito consistentes,
e ficaram e n t r e 5 8 % e 6 5 % nas quatro edições da pesquisa. O s n ú m e r o s m o s t r a m
t a m b é m dinâmicas d e homofobia diferenciadas a partir da identidade autoatribuída:
pessoas trans vivem percentuais bastante altos de vitimização, seguidos pelos homens
homossexuais e, a d e p e n d e r da modalidade, p o r h o m e n s bissexuais ou mulheres ho-
mossexuais. Essas pesquisas t ê m trazido t a m b é m u m dado i m p o r t a n t e sobre o caráter
da violência contra mulheres homossexuais: ela o c o r r e especialmente n o ambiente
doméstico ou na vizinhança, e n q u a n t o h o m e n s homossexuais ou bissexuais e traves-
tis e transexuais são mais agredidos e m locais públicos. U m a informação alarmante
é a de que u m percentual e m t o r n o de 3 0 % a 4 0 % das pessoas que afirmaram ter
sofrido agressão não a relataram a n i n g u é m , n e m m e s m o a u m amigo, ilustrando a
vulnerabilidade dessa população e a invisibilidade da homofobia.
D e 3 6 % a 4 7 % dos entrevistados a f i r m a r a m estar n a m o r a n d o ou casados, u m
Í n d i c e bastante expressivo, c o n s i d e r a n d o a concentração na faixa etária de até 29
anos. Nas pesquisas realizadas n o Rio d e Janeiro (2004), São Paulo e Recife, e n t r e
1 2 % e 17% dos entrevistados a f i r m a r a m ainda t e r filhos, biológicos ou adotados, da
relação atual ou de anterior. Tais n ú m e r o s e n f r a q u e c e m os estereótipos de promis-
cuidade relacionados aos LGBT, d e m o n s t r a n d o que boa p a r t e dessa população seria
beneficiada p o r garantias legais relacionadas à sua situação conjugai e parental.
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 28 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
•23•
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
FREUD E A HOMOSSEXUALIDADE
• 3 O -
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
• 3 4 -
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
* 3Í •
Uma trajetória da política de
identidades sexuais
A sexologia e o nascimento
da identidade homossexual
' 3 7 *
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 3 8 -
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
• 3 9 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
de uma "natureza masculina". Em seu livro Sexual Inversion, Ellis buscou afastar da
homossexualidade a pecha de "degeneração", aparentemente inaugurando a famosa
tática de enumerar as relevantes contribuições à civilização feitas por homossexuais
"de excepcional talento", numa lista que incluía Erasmo de Roterdam, Leonardo da
Vinci, Michelangelo, Alexander von Humboldt, Lord Byron, Oscar Wilde, Walt
Whitman, Paul Verlaine e Safo de Lesbos. Cabe notar, aliás, que as referências à
célebre poeta da Grécia Antiga estão entre as raras menções a relações sexuais entre
mulheres encontradas na literatura médica e legal da época.
•40 •
NA TRILHA DO ARCO-FRIS
OS RESPEITÁVEIS MILITANTES
• 42 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Uma nova onda de lutas desenvolveu-se a partir do final dos anos 1940,
tendo agora como foco principal os Estados Unidos. Em 1948, Alfred Kinsey
publicava o primeiro de seus famosos "relatórios" sobre c o m p o r t a m e n t o se-
xual, no qual demonstrava que as experiências homossexuais tinham incidência
muito mais freqüente e não estavam restritas a um segmento bem definido da
população. Nesse mesmo ano, articulou-se um núcleo de ativistas que viria a
fundar em Los Angeles, em 1951, a Mattachine Society, um grupo de homens
e mulheres homossexuais com características de sociedade secreta, do qual
posteriormente surgiram dissidências, entre as quais u m grupo formado exclu-
sivamente por lésbicas, fundado em São Francisco, e m 1955, as Daughters of
Bilits — n o m e inspirado no livro de poemas eróticos de amor entre mulheres Les
Chansons de Bilits, do escritor francês Pierre Louys (1870-1925). Agrupamentos
similares foram organizados no período pós-guerra na Europa, como o Cultura
en Ontspanningscentrum (coc), na Holanda, fundado em 1946 (é o mais antigo
grupo em atividade no mundo); Forbundet, na Dinamarca, em 1948; Arcadie,
na França, em 1954.
Ainda voltados à luta pela descriminalização das relações homossexuais, esses
grupos tendiam a adotar uma linha de atuação moderada e cautelosa, com ênfase
• 23 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
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NA TRILHA DO ARCO-IRIS
' 4 Í '
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
A REVOLTA DE STONEWALL
• 46 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
ditadura militar em 1976. A FLH teve uma publicação de curta duração chamada
Somos, cujo n o m e inspiraria o primeiro grupo brasileiro, criado em 1978.
O que veio a prevalecer, p o r é m , foi a perspectiva de tendências menos radi-
cais, que reencamparam a concepção de uma minoria gay e lésbica e, em vez de
falarem de r u p t u r a de papéis e identidades, reivindicavam aos gays os direitos de
inclusão equivalentes ao de grupos culturais minoritários. São Francisco, epicentro
da boêmia hedonista beatnik e da contracultura bippie nos anos 1950 e 1960, foi a
cidade em que esses desenvolvimentos se deram com intensidade exemplar, com
a formação de territórios urbanos ocupados de m o d o regular e predominante p o r
gays e lésbicas, e a conversão desses grupos e m u m a força econômica e política
importante' 1 . "Comunidades" homossexuais similares logo emergiram em outras
grandes metrópoles ocidentais, de Nova York a Sidney, desfrutando as vantagens
de u m crescente e diversificado mercado segmentado.
Questões de gênero
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HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
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NA TRILHA DO ARCO-IRIS
• 4 9 '
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 5° •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
O impacto da Aids
- S 2 >
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
" í3 '
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
A experiência brasileira
•S 4*
N A TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Esses são os termos encontrados nos processos da Inquisição para se referir aos
"sodomitas"brancos, índios e negros, respectivamente, quando os visitadores do San-
to Ofício instalaram seus tribunais na Bahia e e m Pernambuco entre os anos 1591 e
1620. De u m total de 283 culpas confessadas nestes tribunais, englobando blasfêmias,
superstição, judaísmo, luteranismo, bigamia, feitiçarias etc. — há 4 4 casos de sodomia,
sendo depois das blasfêmias o pecado m o r t a l mais freqüentemente praticado [...].
Os colonos brancos [eram] os maiores alvos da Inquisição. Observou-se que
os brancos m a n t ê m relações preferencialmente com mestiços. [...] Nestas ligações
homoeróticas heterocromáticas nem s e m p r e a iniciativa da relação parte d o branco
dominador. Assim foi o que o c o r r e u c o m Bastião de Moraes, pernambucano, filho
do juiz da vila de Igaraçu, 18 anos: dormia ele certa noite e m casa de seu tio, quando
u m mulato escravo da casa, D o m i n g o s , 22 anos, "veio à sua cama e o provocou a
pecarem de maneira que, com efeito, o dito D o m i n g o s virou a ele confessante com
a barriga para baixo e se lançou de b r u ç o s sobre suas costas, e com seu m e m b r o
viril desonesto penetrou no vaso traseiro dele, confessante, e dentro dele cumpriu,
fazendo com ele p o r detrás c o m o se fizera c o m mulher p o r diante, e isto m e s m o
fez t a m b é m ele confessante c o m o dito Domingos, d e maneira que ambos alterna-
damente consumaram na dita noite duas vezes o pecado nefando da sodomia, sendo
u m deles uma vez agente e outra paciente". [...]
Nas relações sodomíticas inter-raciais e n c o n t r a m o s t o d o um continiwm de
interações, ora os brancos e x e r c e n d o seu p o d e r e prepotência de casta superior,
ora os 'de cor' encontrando mil artifícios para serem eles os donos do poder, ao
menos neste microuniverso diádico ditado pelo h o m o e r o t i s m o .
MOTT, Luiz. "Relações raciais e n t r e homossexuais n o Brasil Colonial".
• ss •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
PASSIVOS E ATIVOS
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'57 '
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
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' S9 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
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NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
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HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
(Ls m o v i m e n t o político que surgiu n o final dos anos 1970 não foi o primeiro
esforço de articulação de pessoas e m t o r n o do interesse c o m u m na homosse-
xualidade n o Brasil. Desde os anos 1950, ou até m e s m o antes, encontramos nas
grandes cidades f o r m a s de associação dedicadas à sociabilidade, à diversão e à
paródia, aglutinando principalmente h o m e n s , que promoviam eventos c o m o
concursos de miss, shows de travestis e desfiles de fantasias. T a m b é m eram
produzidos e distribuídos p e q u e n o s jornais feitos artesanalmente, como 0 Snob,
veiculado e n t r e 1963 e 1969 no Rio de Janeiro, assim c o m o várias publicações
semelhantes e m outras cidades.
O p r o j e t o de politização abraçado pelo m o v i m e n t o homossexual definiu-se
e m grande parte p o r contraposição a essas associações presentes no "gueto", cuja
atuação era qualificada pelos militantes emergentes c o m o despolitizada e até mes-
m o reforçadora da vergonha e do preconceito que atingiam a homossexualidade.
Mas cabe reconhecer que essas associações e suas iniciativas eram formas criativas
e relevantes de informação, expressão e ligação das pessoas que sofriam com o
estigma da homossexualidade n u m a época de maior clandestinidade e repressão.
Elas realçam a diversidade das vivências individuais e grupais do h o m o e r o t i s m o
• 6 3 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
. * GIRLS
*
A volta da revista a Copacabana
ELOINA e MARIA LEOPOLDINA em *
(um musical de travestis)
Com Theo Montenegro- Stella Stevens - Fugika
Marisa Jones e Verushka
Atriz convidada :Nèlia Paula
Participação dos bailarinos Édson Farr>' *
e Eduardo A llende1
] 3?, 4f, 5.* feiras e domingos às 21h30min.
S ex ta e sàbad os às 22h f
Teatro Alaska — Posto Seis
Anúncio de show em Copacabana, em Lampião.
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NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
na l i t e r a t u r a , nas revistas d e d i c a d a s ao c u l t o d e c o r p o s m u s c u l o s o s e t a m b é m
p o r m e i o da p r e s e n ç a e m e v e n t o s c o m o os c o n c u r s o s de beleza e Miss Brasil,
n o s bailes d e carnaval e n o s fas-clubes das f a m o s a s c a n t o r a s da Era d o Rádio.
D e s e n h a - s e , assim, a c o n c e n t r a ç ã o e m locais q u e se t o r n a r i a m os p r i m e i r o s
t e r r i t ó r i o s , bares e b o a t e s de f r e q ü ê n c i a m a j o r i t a r i a m e n t e h o m o s s e x u a l nas
duas m a i o r e s cidades d o país.
U m aspecto ressalta n o d e s d o b r a r de t o d a essa m o v i m e n t a ç ã o h o m o s s e x u a l
masculina: a atração r e p r e s e n t a d a p e l o " c e n t r o " e pelas g r a n d e s cidades. N o
r a s t r o de investigações s e m e l h a n t e s feitas e m o u t r o s países, as m e n c i o n a d a s
pesquisas n o Brasil r e s s a l t a m a i m p o r t â n c i a da m i g r a ç ã o aos g r a n d e s c e n t r o s
u r b a n o s , e m especial São P a u l o e R i o d e J a n e i r o , na t r a j e t ó r i a d e vida d e j o v e n s
h o m o s s e x u a i s ao l o n g o d o p e r í o d o q u e a c o m p a n h a a e x p a n s ã o u r b a n a e indus-
trial n o país d e p o i s da Segunda G u e r r a M u n d i a l . Esse d e s l o c a m e n t o p e r m i t i a
q u e os j o v e n s se afastassem d o c o n t r o l e f a m i l i a r , ao m e s m o t e m p o q u e lhes
abria c a m i n h o p a r a ingressar e m u m a sociabilidade h o m o s s e x u a l m a s c u l i n a
já v i b r a n t e , p r e s e n t e t a n t o nas r e u n i õ e s e m a m b i e n t e s d o m é s t i c o s c o m o n o s
e n c o n t r o s e m espaços p ú b l i c o s .
Se as grandes cidades p r o p o r c i o n a v a m possibilidades c o n s i d e r a v e l m e n t e
ampliadas de vivências homossexuais, t o r n a v a m t a m b é m os jovens m i g r a n t e s
mais expostos à ação médica e policial. E m b o r a a h o m o s s e x u a l i d a d e não fosse
p u n i d a n o Código Penal brasileiro, as leis c o n t r a v a d i a g e m , p e r t u r b a ç ã o da
o r d e m pública e prática de atos obscenos e m p ú b l i c o davam espaço à r e p r e s s ã o
policial q u e atingia s o b r e t u d o os mais p o b r e s e os de p e l e mais escura. N o Rio
d e Janeiro dos anos 1950 e 1960, a p e r s e g u i ç ã o policial aos homossexuais era
u m a ameaça constante, encarnada na figura d o d e l e g a d o R a i m u n d o Padilha, q u e
encabeçou campanhas de prisão d e h o m o s s e x u a i s destinadas a "limpar" o C e n t r o
da cidade e a Z o n a Sul.
Muitos desses considerados "delinqüentes homossexuais" passavam das m ã o s
da polícia para a dos m é d i c o s e legistas de instituições, tais c o m o o Laboratório
d e Antropologia Criminal d o Instituto d e Identificações d e São Paulo. O s escritos
desses m é d i c o s e legistas, e m ação d e s d e as p r i m e i r a s décadas d o século xx, t ê m
o f e r e c i d o vasto material para a r e c o n s t r u ç ã o crítica das teorias p r e t e n s a m e n t e
científicas q u e descreviam a h o m o s s e x u a l i d a d e c o m o anomalia associada a p e r -
turbações congênitas de o r d e m física e m e n t a l , f r e q ü e n t e m e n t e atribuídas aos
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HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
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NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
FÃS-CLUBES
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HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
segundo depoimentos obtidos pela historiadora Nadia Nogueira, "tudo era muito
velado" e "praticado com extrema discrição". Uma entrevistada lembrou que u m
sinal distintivo entre elas era o uso de sapato mocassim: "pelos pés, uma reconhecia
a outra" 6 . Em São Paulo, nos anos 1960, o restaurante Ferro's Bar, situado próximo
à praça Roosevelt, na direção do bairro do Bixiga, tomou-se u m ponto conhecido
de freqüência de mulheres masculinizadas, tendo sua ambientação e suas persona-
gens evocadas nas histórias de amor proibido e paixão entre mulheres escritas p o r
Cassandra Rios, uma das campeãs de vendagem de livros nas décadas de 1960 e
1970, lida e admirada por muitas mulheres dessa geração.
Estava passando na cidade quando encontrei com A., que é m e u amigo. Nesse
dia ele m e disse que tinha conhecido u m rapaz que tinha um apartamento no largo do
Arouche e que ia dar uma festinha. A. m e convidou dizendo que estava c o m a idéia
d e pedir a todos os homossexuais que pusessem travesti... Fui para casa e telefonei
para o N. para irmos juntos. Mais tarde, peguei u m vestido de baile m e u e outro
d e minha mãe, e vários acessórios, chapéus, penas, luvas, jóias, seios de plástico e
m e u par de sapatos de salto alto. Passara o dia todo m e arrumando, fazendo mas-
sagem, máscara de beleza etc., de m o d o que m e sentia muito b e m . . . Chegamos
ao apartamento, arrumamos os comes e bebes e começamos a nos arrumar. Havia
u m a tia que não tinha roupa, então emprestei m e u vestido para ele usar. N. usava
u m vestido de baile, branco, estreito e longo, com detalhes em vermelho, e colocou
na cabeça u m topete de penas brancas e amarelas para disfarçar o cabelo. R. e A.
usavam vestidos curtos, de saias bem amplas. Os meus vestidos t a m b é m eram de
baile, muito bonitos e amplos. Os rapazes começaram a chegar e saímos do q u a r t o
depois de t e r m o s nos preparado. Foi u m espetáculo! Eles ficaram completamente
surpreendidos e começaram a nos cortejar. R. e N. deram um show, cantaram muito
b e m , foram aplaudidíssimos. Pena que R. não tenha dançado a r u m b a , que é a es-
pecialidade dele. As garotas desfilaram. A. fez u m pouco de pose de dança clássica,
e então cada um voltou ao seu pretendente. Foi uma noite encantadora!
SILVA, José Fábio Barbosa da. " H o m o s s e x u a l i s m o e m
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NA TRILHA DO ARCO-LRIS
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HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
SNOB MOVA PASE - AKO 7 - RIO DE JANEIRO. 31 <U m*lo M IttC» - Nf II - NOVA FASE - 5NOB
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NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
A Igreja M A peça
e os [ c j ú e Darcy Em São Paulo, a m o v i m e n t a ç ã o
homossexuais Penteado
A verdade
ainda se concentrava na região central.
I sobre o
carnaval
baiano
A b o ê m i a de classe média desloca-se
da Galeria Metrópole para a rua Nes-
COMO E N F R E N T A R A NOITE C A R I O C A
tor Pestana e a praça Roosevelt e, e m
Espaços públicos homossexuais são manchete de Lampião.
seguida, para o largo do Arouche e a
rua Vieira de Carvalho. O F e r r o ' s Bar conservava-se então c o m o importante
referência desse circuito, aparecendo t a m b é m em suas vizinhanças outros esta-
belecimentos freqüentados p o r mulheres. T o d o esse território seguia contíguo
às áreas de convivência masculina popular e de garotos de programa, na avenida
São João e na praça da República.
E m depoimento a Néstor Perlongher, u m freqüentador da cena homossexual
paulistana apresentou u m a descrição retrospectiva do ambiente do começo dos
anos 1970, ressaltando a mudança dos padrões de sociabilidade e das categorias
classificatórias e m operação no universo homossexual masculino:
Nos anos 1 970 houve o movimento hippie, underground, que foi absorvido
pelos gays. A Nestor Pestana era um local absorvido pelos gays sem ser de
características exclusivamente gays. Era um local assediado pelo pessoal que
fumava [maconha], transava LSD, ia maquiado com batom verde, purpurina
no cabelo, penas na cabeça. [...]. Aí já aparece claramente o gay como per-
sonagem. Foi um questionamento dos valores burgueses, um cansaço do
convencional. O pessoal procurou atividades alternativas: artesanato, artes.
Isso foi antes que aparecesse o movimento gay propriamente dito. Na ver-
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HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
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NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
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HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
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NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Os machos e os travestis são os dois extremos que iluminam o vasto centro gay.
Tem: as tias, os garotos e as meninas que vêm dos bairros e subúrbios em busca de
alguma grana ou de um pouco dos reflexos das luzes da cidade; as bichas loucas de
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HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
todas as idades que fazem o gênero jeunejille; os que estão à caça do verdadeiro amor;
os que só acreditam no dinheiro etc.; e os mutantes, como a deliciosa Sharon Tate,
que nasceu "Aderbal" e já passou por várias encarnações até chegar a "Sharon".13
Na segunda metade nos anos 1970, parte da ebulição criativa anterior foi
sanitizada e convertida e m f e n ô m e n o de massa. A principal expressão cultural
disso talvez tenha sido a disco-music norte-americana — uma combinação de estilos
musicais negros e latinos n u m padrão rítmico de f o r t e apelo dançante, gestada
nas boates e clubes gays ou freqüentados p o r homossexuais, que passava a atin-
gir o grande mercado da música e do espetáculo. Herdeiro do sucesso e f ê m e r o
dos Secos&Molhados, o cantor Ney Matogrosso retornava ao posto de estrela
popular, interpretando uma versão disco de uma canção do cultuado ícone da
música popular brasileira, Chico Buarque de Holanda, "Não existe pecado ao
sul do Equador". Composta para o censurado disco da peça Calabar, e m 1973, a
canção ressurgia seis anos depois c o m o o carro-chefe do espetáculo e m que Ney
Matogrosso a interpretava jogando bananas à platéia, em plena Galeria Alaska,
então a mais famosa área de "pegação" gay do Rio de Janeiro.
Já se disse que a segunda metade dos anos 1970 assistiu a uma "verdadeira
explosão discursiva" em torno da homossexualidade. Jornais caseiros continua-
ram circulando, ainda centrados especialmente nas fofocas do meio, mas c o m
algumas novidades: ao lado dos mimeografados cariocas Tiraninho e Conde Gay
e do artesanal Little Darling (que depois m u d o u seu n o m e para Ello), do baiano
Waldeyton di Paula, apareceram os folhetos paulistas Entender e Jornal do Gay,
assim como o carioca Gente Gay, dos pioneiros Agildo Guimarães e Anuar Farah.
Todos tiveram vida curta, mas o tema começava aos poucos a encontrar mais
espaço também na grande imprensa.
U m marco nesse sentido foi a "Coluna do Meio", assinada pelo jornalista
Celso Curi, no jornal popular Ultima Hora, de São Paulo, que então pertencia
ao G r u p o Folha. Era a primeira coluna explicitamente voltada para u m público
homossexual divulgada num veículo da grande imprensa, que noticiava tanto a
abertura de novas boates gays quanto informações ligadas ao m o v i m e n t o gay e
lésbico dos Estados Unidos e de outros países. Ao longo de seus três anos de
existência, de 1976 a 1979, a coluna sofreu processo movido pela União com base
na Lei de Imprensa, por suposta ofensa à m o r a l e aos bons costumes. O sucesso
• 7 8 -
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
• 7 9 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
aquela coisa mais social. Hoje, mais maduro, vejo que tem muita coisa mais
importante para se pensar, para pesquisar, saber as origens, buscar as raízes.
Assim que a gente muda. Naquele tempo, eu achava lindo fazer um desfile de
miss. Hoje, se eu fizer um desfile, como faço, é uma sátira.14
• 8 1 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
sexualidade n o Brasil. Não cabe dúvida sobre a importância de ambos. Mas vale
ressaltar que o reconhecimento que a eles se presta, hoje, se deve não tanto por
terem sido, respectivamente, o primeiro jornal e o primeiro grupo a tratar da
homossexualidade c o m o questão social e política, n e m p o r terem representado
(como efetivamente foram) uma experiência marcante na vida de seus partici-
pantes diretos e de todos aqueles que de alguma maneira estiveram à sua volta.
O fato de t e r e m sido alvo d e estudos e publicações bastante detalhadas, que,
sobretudo e m relação ao Somos 2 , documentaram suas atividades e examinaram
seu ideário e suas divergências internas, pesou decisivamente para transformar
o seu estilo de militância em m o d e l o — de época, pelo menos.
"Saindo do gueto"
• 102 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
O nome do jornal? Há uma lista imensa, mas o que me agrada é Lampião. Pri-
meiro, porque subverte de saída a coisa machista: um jornal de bicha com nome
de cangaceiro? Segundo, pela idéia de luz, caminho, etc. E terceiro, pelo fato
de ter sido Lampião um personagem até hoje não suficientemente explicado:
olha aí outro que não saiu das sombras.
Leitores em uma livraria de São Paulo, durante o lançamento do Lampião (abril, 1978).
•82•
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 84*
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
c o m o Jean-Claude Bernardet. João Silvério Trevisan, nos anos 1960, militara nas
organizações estudantis da esquerda católica e n o g r u p o Ação Popular (AP).
Nos anos 1970, Trevisan e João Antonio Mascarenhas travaram contato mais
intenso com os movimentos políticos homossexuais fora do país.Trevisan m o r o u um
ano nos Estados Unidos, em 1975, onde conheceu ativistas do Gay Liberation Front
e também vários estudantes de esquerda, inclusive um jovem formado em ciências
políticas, James Green, militante de uma organização trotskista, que, estimulado por
Trevisan, viria em seguida ao Brasil tornar-se participante ativo do Somos e colaborador
do Lampião. Mascarenhas teve acesso às informações sobre o movimento homossexual
internacional por meio da emergente imprensa gay britânica e norte-americana.
Em depoimentos ao historiador Cláudio R o b e r t o da Silva 4 , mais de vinte
anos depois, ambos recordaram alguns aspectos dessas experiências:
• 85 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
•86-
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
•87 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
Estava sozinho quando fui chamado à Polícia Federal, os outros já haviam deposto...
Depois daquele depoimento, eles me mandaram tocar piano numa outra depen-
dência. Foi muito desagradável! Não vou esquecer dos policiais me chamando de
gringo, acusando-me de corromper o Brasil, de estar poluindo a pureza brasileira.
Deboche e dissenso
• 8 8 -
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
• 89 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 90 •
NA TRILHA DO ARCO-IRIS
[... ] o medo irracional que acomete muitas pessoas hetero nas quais o homosse-
xualismo provoca um pavor, a sensação de já ter visto aquilo em algum lugar,
provavelmente no mais íntimo de todos os seus pensamentos.
Darcy abre a porta de sua casa para os dois travestis entrarem. Eles olham sem
conseguir disfarçar o deslumbramento diante dos quadros e luzes. Eu, Alice
Soares, Glauco Mattoso e Jorge Schwartz olhamos para eles não menos deslum-
brados. Nossos mundos parecem estar a quilômetros de distância.
Calmon: Nem todo bissexual, como afirma o senhor Penteado, usa a relação he-
terossexual como defesa diante da sociedade. Existem pessoas que simplesmente
gostam das duas coisas. Sempre afirmei publicamente meu homossexualismo
com orgulho, e sou bastante discreto com relação a meu lado heterossexual.
Faço isso por uma visão política antissistema, visão sofisticada demais para o
senhor Penteado e outras pessoas conservadoras... Alguém andou escrevendo
no Lampião que bissexualismo é coisa de esquizofrênico. O que é que ele (ela)
propõe: tratamento psiquiátrico, choques elétricos, campo de concentração?
E uma posição idêntica a de certas esquerdas que combatem a ditadura para
instalar um governo tão repressivo ou mais.
Darcy: Meu ataque (que você não quis entender) é ao bissexualismo que vem
sendo usado como escudo por conhecidos homossexuais de nome ou imagens
públicas, imaginando que este pega melhor que o homossexualismo declarado,
perante o seu público consumidor. Ora, isso não deixa de ser enrustimento!
•88-•9 3 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
Essa é a tal bandeira careta que citei, apesar de que, para mim, o bi é e será antes
de tudo um homossexual, até que as denominações desapareçam, substituídas
por um conceito genérico de sexualidade múltipla.
• 9 4 '
NA TRILHA DO ARCO-TRIS
também uma divergência mais profunda, que se traduzia numa grande desconfian-
ça não só quanto aos r u m o s da institucionalização, mas e m relação ao significado
da própria atuação política e m moldes institucionais.
João Silvério Trevisan, p o r exemplo, nos vários ensaios, críticas e repor-
tagens que publicou n o Lampião, defendia a postura de que era preciso resistir a
todas as formas institucionalizadas de organização e reivindicação, porque elas
conduziam inexoravelmente à absorção das individualidades e à redução de seu
potencial subversivo aos desígnios de u m a sociedade consumista e autoritária. Na
visão de Trevisan, os homossexuais compunham uma espécie de parte maldita
da sociedade, enraizada no caráter irremovível e transgressor de seu desejo,
cuja força residia justamente e m sua capacidade de revigorar constantemente a
própria maldição e assim manter um combate p e r m a n e n t e e insolúvel contra a
"normalidade instituída" e contra as "promessas de paraíso".
U m a ilustração de suas idéias, sempre expressas numa retórica apaixonante,
aparece no t r e c h o abaixo, retirado de seu artigo "Por uma política m e n o r : bichas
e lésbicas inauguram a utopia", publicado no n 2 25 (junho de 1980):
•95 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
O Somos se assume
• 102 •
N A TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Esse nome foi julgado atrativo por ser curto, afirmativo, forte e palindrômico.
Essa última qualidade do nome, que pode ser lido da esquerda para a direita e da
direita para a esquerda, foi provavelmente o que captou a imaginação de Glauco,
um entusiasta da poesia concreta, e dava uma interessante brincadeira com o
fato de ser o nome de um grupo de "invertidos"... O nome refletia também o
desejo de "assumir a homossexualidade", o que depois ficou reforçado com o
complemento "Grupo de Afirmação Homossexual". 7
• 9 7 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 98 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
.99 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• I oo •
N A TRILHA DO ARCO-ÍRIS
e certamente "incurável", sobre a qual não se tinha outro tipo de controle que
não fosse o seu reconhecimento. Acrescentava-se a isso o objetivo de combater
a desigualdade e a dominação nas próprias relações afetivas e homossexuais, que
costumavam ser associadas à predominância de estereótipos e caricaturas da
"bicha" e do "bofe", ou da "fancha" e da "lady". Esse combate deveria conduzir a
u m a mudança total do sistema social, para uma forma vagamente igualitária.
Esse conjunto de idéias e atitudes abrigava tensões e inconsistências, que às
vezes poderiam ser expressas pela mesma pessoa. Para ilustrar a diversidade de
pontos de vista presentes no Somos, consideremos algumas falas e m um debate
realizado c o m integrantes do g r u p o sobre homossexualidade e repressão. O
debate aconteceu em março de 1979, c o m a moderação do professor e crítico
literário Flávio Aguiar, e foi publicado n o m e s m o ano na coletânea Sexo êcpo-
der9, referência importante n u m a época em que crescia o interesse do m e r c a d o
editorial brasileiro p o r temas relacionados a g ê n e r o , sexualidade e política.
Questionado sobre a identidade e conceituação de homossexual, u m influente
m e m b r o do grupo disse:
Jorge — Os bissexuais são aqueles que vivem num esquema mais ou menos esqui-
zofrênico: por um lado tratam de preservar a imagem da família bem estabele-
cida. Por outro, têm lateralmente as suas atividades homossexuais. Há também
aqueles homossexuais com mentalidade machista; ao desempenhar um papel
"ativo", acreditam não ser contaminados pela homossexualidade. Para eles, os
homossexuais são os outros. São preconceitos machistas dentro de uma sociedade
que forjou esses mitos dentro do próprio pensamento homossexual.
• ioi •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 102 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Acho que as bichas pintosas, ou os travestis, ou as lésbicas tipo macho são pessoas
corajosas que subvertem o padrão hetero que nos é cobrado a cada instante. Não
importa o motivo que leva a isso — a busca de aceitação, ou a agressão, a identificação
com o outro sexo ou com um estereótipo. O que importa realmente é que são pes-
soas que estão procurando uma expressão mais verdadeira de si próprias, e assumir
publicamente essa postura é um ato revolucionário de grande importância.
• 103 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 104 •
NA TRILHA DO ARCO-IRIS
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HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
ATIVISMO
Isso t a m b é m é Brasil!
Lampião faz a
cobertura do Ia EBHO
• 104 •
NA TRILHA DO ARCO-IRIS
Não cabíamos no Somos enquanto mulheres... Temos que nos organizar sepa-
radamente para atender às nossas especificidades, o que não era absolutamente
o caso das bichas... Isso não significa, porém, que estamos fora do movimento
ou que sejamos apenas um grupo feminista... Trouxemos para o movimento
homossexual o cunho revolucionário do movimento feminista... Queremos
frisar que continuamos a ser um grupo lésbico e que o feminismo apenas nos
acrescentou novas frentes de luta... Enquanto estivemos ilhadas em um grupo
masculino, nossas atenções foram repartidas em função do inimigo comum: o
machismo. Com nossa autonomia, concomitante ao crescimento do grupo, as
diferenças entre nós se acirraram, já que passamos a nos preocupar com uma
série de diferenças que antes não tínhamos nem condições de aprofundar. Então,
se por um lado a autonomia nos deu maior liberdade de atuação e profundida-
de, por outro, também, aumentou a responsabilidade de nos reconhecermos
e de convivermos com uma série de divergências nunca afloradas, por falta,
inclusive, de um espaço específico.
• 106 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
O Lampião se apaga
• 108 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Peter Fry— Aquilo não teria acontecido se não fosse o Aguinaldo. O Aguinaldo jun-
tava tudo e levava até à gráfica. Naquela época não havia computador. Era tudo na
base de fazer o texto caber na página. Isso sempre dava brigas porque havia cortes
nos textos. Acusação de censura prévia. Coitado! O Aguinaldo sofreu muito. Foi
ele que juntou os trapos, levou-os à gráfica e fez aquilo acontecer.
João Antônio Mascarenhas — O Aguinaldo tomou o jornal. Não há dúvida nenhuma
que o Aguinaldo é um homem muito trabalhador, mas o que tinha sido proposto
deixou de ser. Ele ficou com a direção do jornal, com as assinaturas, com a
distribuição, com a pauta.
Antônio Carlos Moreira — O Aguinaldo editava o jornal, ele levava o Lampião nos
braços até o Jornal do Comércio para ser impresso, no carro dele! O jornal não
tinha como sustentar o aluguel, apesar do Lampião ser uma empresa. O Agui-
naldo alugava uma sede para o Lampião no Rio. Com esta estrutura, ele dava o
tom que queria ao jornal.
09 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• i io •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
N o v o s desafios
• I I I *
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
ANOS NT»
IJUVCPIÃO
Klodt J W t r „ . )q|*
ção, L i b e r d a d e S e x u a l de
Santo A n d r é ; d o N o r d e s t e :
A IGREJA EO os r e c é m - f o r m a d o s G r u p o
Gay da Bahia Grupo
HOMOSSEXUALISMO
(GGB), O
de A t u a ç ã o Homossexual
(20 anos de repressão) de R e c i f e / O l i n d a ( G a t h o ) ;
RICHETTI AGE EM S.PAULO.,
E FADILHA VOLTA A O RIO além do Beijo Livre, de
Brasília, e o T e r c e i r o A t o ,
de Belo H o r i z o n t e , per-
fazendo u m total de de-
• I I 2 •
N A TRILHA DO ARCO-IRIS
• 1 1 3 -
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
conseguiu estabelecer uma sede, no bairro da Bela Vista, região central de São
Paulo. O grupo procurou manter-se ativo, participando dos debates da campanha
eleitoral, promovendo festas, tentando produzir u m jornal alternativo, 0 Corpo, que
chegou a ter meia dúzia de edições, e organizar u m cineclube. Mas seus militantes
remanescentes dispunham de poucos recursos para tocar seus projetos e t o r n a r a
sede u m espaço atraente de sociabilidade, e m comparação c o m o desenvolvimento
cada vez mais acentuado do mercado de consumo e serviços voltados aos homosse-
xuais. A saída de mais militantes do Somos levou à formação de grupos de estudos,
que acabaram se dissolvendo e, a partir de alguns desses militantes, f o r m o u - s e o
Coletivo Alegria-Alegria, que se constituiu como "grupo de vivência" e teve curta
duração. Em 1983, problemas financeiros e dificuldades em conseguir novos m e m -
bros levaram o grupo Somos a abandonar sua sede e se dissolver.
O g r u p o O u t r a Coisa colaborou na discussão de t e m a s ligados à h o m o s -
sexualidade na campanha eleitoral de 1982 e foi o p r i m e i r o g r u p o paulistano a
divulgar, em julho de 1983, informações a respeito da Aids. Segundo E d w a r d
MacRae, em 1984, p o r dificuldades para pagar o aluguel da sede q u e dividia c o m
o GALF, O O u t r a Coisa e n c e r r o u suas atividades.
O GALF, após a separação definitiva do Somos, atuou em duas frentes: n o
m o v i m e n t o feminista, n o qual procurava incentivar que se desse mais atenção às
questões ligadas à sexualidade; e no gueto lésbico. N o c a m p o feminista, o GALF
• 114 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Uma vez que a relação afetiva/sexual se esgotava (o que ocorria algumas vezes
com rupturas violentas), o grupo se dissolvia ou se fragilizava pela permanência
de apenas uma das integrantes do casal, que nem sempre estava preparada ou
encontrava condições para manter o grupo "ativo". [...] Uma das integrantes do
casal fundador de um grupo extinto contou que, com a saída de sua ex-compa-
nheira e a sua, outras pessoas assumiram a liderança provisoriamente, mas não
conseguiram manter o grupo ativo. Ela, a partir daí, perdeu o controle sobre
o destino do grupo e sobre o que foi feito do precioso acervo documental de
que o grupo dispunha, inclusive um rico conjunto de cartas (algumas centenas)
enviadas por lésbicas de todo o Brasil.12
O Galf não fugiu a esse p a d r ã o organizativo, mas conseguiu evitar seu desa-
p a r e c i m e n t o . Foi o único dos g r u p o s paulistas da primeira onda que continuou
• 1 ií •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
ativo ao longo dos anos 1980 e chegou aos anos 1990 c o m o Rede de Informação
U m O u t r o Olhar, n o m e que passou a usar a partir do m o m e n t o e m que adotou
o f o r m a t o institucional de organização não-governamental - outra das novidades
das décadas seguintes, c o m o veremos a seguir.
Mas, além disso, a década de 1980 traria outro tremendo desafio: o trágico sur-
to da Aids, que ressuscitaria a velha associação entre homossexualidade e doença.
Atentos ejortes: a luta por
direitos diante da Aids
• 1 1 7 -
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• I 18 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
base. Poderia fazer da minha futura profissão não mais o sacerdócio religioso,
mas uma prestação de serviços ao bem comum. Participei ativamente dos
movimentos de protesto durante o curso universitário da USP. Fui a algumas
reuniões da Ação Popular (AP). Fui convidado para uma reunião da política
operária (Polop), mas nunca fui plenamente cooptado por algum grupo, fosse
político organizado, estudantil. Na universidade tive uma ação política não
organizada. Não participava ativamente de grupos, embora participasse ati-
vamente de passeatas. Terminada a faculdade, consegui uma bolsa na França,
para fazer o mestrado em antropologia. Gostei imensamente de viajar pela
Europa... tive liberdade! Tive oportunidade de ter uma vivência homossexual
bastante livre. Em 1970, encontrei a primeira revista homossexual, ainda
muito tímida, a Arcadie. A partir de 1972, se não me engano, existia a Frente
de Liberação Homossexual, mas não tive essas informações, assim como não
vi drogas na França. Esses fatos aconteceram logo depois de maio de 1968.
Havia uma grande agitação estudantil-política. Nessa fase, contudo, não tinha
consciência nem identidade homossexual.
• i 2o •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Mascarenhas — Certa vez fui a um congresso, acho que era na Casa do Estudante
Universitário e vi um sujeito do qual gostei. Ele me impressionou. Achei-o uma
pessoa séria: Luiz Mott, do Grupo Gay da Bahia. Entrei em contato e passei a
trabalhar com ele. Porém, eu atuava no Rio de Janeiro e ele em Salvador. Eu
fazendo pesquisas e escrevendo cartas para ele, dando palpites sobre orientação,
essas coisas todas. Quando foi em 198S, aproximava-se a questão da Consti-
tuinte, assim achei melhor me desligar do Grupo Gay da Bahia no sentido de
criar um grupo no Rio. Foi assim que nasceu o Triângulo Rosa.
Mott — Atualmente, sou o homossexual que durante mais tempo, ininterrupta-
mente, participa do movimento. Antes era o João Antônio Mascarenhas, que
considero uma personalidade importantíssima, apesar de sua personalidade
elitista, do seu perfeccionismo... Mas é muito generoso! Ele deu uma contri-
buição fundamental na organização do Grupo Gay da Bahia, assim como em
outras atividades do movimento homossexual.
• i 2i •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• I 2 3 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
O GGB foi pioneiro também em obter registro c o m o sociedade civil sem fins
lucrativos como agremiação de homossexuais, em janeiro de 1983. O Triângulo
Rosa valeu-se desse precedente e foi t a m b é m oficializado, no Registro Civil de
Pessoa Jurídica, em fevereiro de 1985.
O u t r a distinção está na prioridade concedida ao estabelecimento de relações
com o movimento internacional. João Antônio Mascarenhas, ainda durante a
existência do Lampião, esteve na conferência da então International Gay Asso-
ciation (IGA), posteriormente renomeada c o m o International Lesbian and Gay
Association (ILGA), que ocorreu em abril de 1980 na Itália. Pouco depois de seu
registro civil oficial, o Triângulo Rosa filiou-se à ILGA.
A pesquisa de Cristina Luci Câmara da Silva sobre o Triângulo Rosa t r o u x e
relatos de participantes que passaram por experiências anteriores de ativismo e
assinalam as diferenças em relação ao que vivenciavam no novo grupo.
24-
NA TRILHA DO ARCO-LRIS
questões pessoais. Tratava das questões externas: políticas, leis, fatos acontecidos
com outras pessoas. Seu caráter político era, talvez, a grande diferença.
Rosa — Tinha uma discussão diferente, talvez pelo fato desse primeiro momento
histórico já ter acontecido, ou seja, o Lampião, os primeiros grupos e tal. O
Triângulo Rosa não discutia a discriminação interna de cada um, discutia a ques-
tão mais social, política. O enfoque era basicamente este, a atuação foi política,
visava diminuir a discriminação via a política — partidos políticos, instituições,
organizações da sociedade civil, era a OAB, era participar da alteração do Códi-
go de Ética do Jornalista, participar da elaboração da Constituição Federal. A
preocupação era muito diretamente política. 3
• I2S •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 1 2 6 -
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
excluía uma parte significativa das vivências a ela relacionadas. Isso se revelou,
por exemplo, n o discurso proferido por João Antonio Mascarenhas no plenário
da Assembleia Nacional Constituinte, em 1987, citado pela pesquisadora Cristina
Câmara da Silva. Nele, Mascarenhas criticava o preconceito da mídia, que não
fazia distinção entre o "homossexual" e o "travesti", e m t e r m o s que repetiam a
posição que expressara anos antes, no Lampião:
O Triângulo Rosa optou por não trabalhar prioritariamente com a luta contra
a Aids. A forte associação de caráter negativo e n t r e a Aids e a homossexualidade,
que teve lugar logo no início da epidemia, parecia por demais conflitante c o m
a busca de legitimidade para a homossexualidade, tão presente na proposta de
atuação mais legislativa que predominou nesse grupo. N o entanto, o GGB e o Atobá
— o u t r o novo grupo, criado e m 1986, n o Rio de Janeiro — conseguiram conjugar
essa relação entre legitimidade da homossexualidade e atuação contra a epidemia.
Ambos aparecem, em d o c u m e n t o s e na bibliografia sobre a construção de u m a
resposta coletiva à Aids, como t e n d o u m a atuação destacada nesse sentido.
Q u a t r o encontros nacionais d e grupos homossexuais foram realizados entre
1984 e 1991. Neles toma parte u m n ú m e r o reduzido de grupos, entre cinco e
seis, a maioria proveniente do N o r d e s t e , entre eles o GGB e o Adé-Dudu, da
Bahia; Dialogay, de Sergipe; e o M o v i m e n t o Antônio Peixoto, de Pernambu-
co, este destinado à prevenção da Aids e ao auxílio a soropositivos. Do Rio,
• 1 2 7 *
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
As respostas à Aids
Em 1983, passei uma semana nos Estados Unidos. Quando cheguei a Nova York,
toda a defesa em nome do desbunde que li a respeito já não estava mais do mes-
mo jeito. As pessoas estavam preocupadas com obras assistenciais, acontecia o
oposto. Na imprensa gay americana se lia "A Festa Acabou". O movimento gay
estava todo voltado à questão da Aids. Então percebi que era uma coisa séria.
•128-
NA TRILHA DO ARCO-IRIS
Nesse período, uma das grandes posições defendidas pelo movimento homos-
sexual era questionar o discurso médico e a idéia do homossexual como doente
mental. Os médicos eram os propagadores de uma nova moral, não mais com
base teológica, mas com uma base médica que no final das contas percebía-
mos como totalmente preconceituosa. Havia um questionamento constante
da postura médica e não tínhamos a menor paciência para o seu discurso. No
Somos nunca se chamavam médicos para falar, no máximo as pessoas visitavam
o médico para curar uma gonorreia ou uma sífilis.
Quando voltei ao Brasil, a idéia era que se tratava de mais um complô médico.
A questão da Aids era vista como outra fórmula pseudocientífica para oprimir
os homossexuais, fazê-los retornar à margem. Muitos dos antigos militantes
defendiam esse parecer. Certamente, também teria tomado esta posição, mas
havia estado nos Estados Unidos e visto que o caso era sério. Os norte-ameri-
canos não estavam mais defendendo as antigas posições, então comecei a ver a
questão sob outro prisma. Assim, houve momentos em que ocorreram algumas
discordâncias entre eu e os militantes, mas eles eram pessoas inteligentes e logo
começaram a perceber os perigos que estavam correndo.
• 129 '
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
O que desaparece não é tanto a prática das uniões dos corpos do mesmo sexo
genital... mas a festa do apogeu, o interminável festejo da emergência à luz do
dia, no que foi considerado o maior acontecimento do século XX: a saída da
homossexualidade à luz resplandecente da cena pública, os clamores esplêndidos
do — diriam na época de Wilde — amor que não se atreve a dizer seu nome.
Não somente atreveu-se a dizê-lo, mas o tem gritado na vozearia do excesso.
Acaba, poder-se-ia dizer, a festa da orgia homossexual, e com ela termina-se
(não era, por sinal, sua expressão mais chocante e radical?) a revolução sexual
que sacudiu o Ocidente no decorrer deste acidentado século... Um declínio
tão manso que se a gente não olha bem não percebe: esse é o processo da ho-
mossexualidade contemporânea. Ela abandona a cena fazendo uma cena poética
e desgarrada: a da sua morte... Aos que agora sentimos esses acontecimentos
não pode escapar a sinistra coincidência entre um maximum (um esplendor) de
atividade sexual e a emergência de uma doença que utiliza os contatos entre
os corpos (e usou, no Ocidente, sobretudo dos contatos homossexuais) para
se expandir de forma terrificante, ocupando um lugar axial na constelação de
coordenadas do nosso tempo, em parte por se registrar aí a atraente (por ser
misteriosa e ambivalente) colusão de sexo e morte. 6
H o u v e , d e c e r t o , u m d e s l o c a m e n t o i m p o r t a n t e . A e p i d e m i a d e u ensejo
a u m a inusitada a p r o x i m a ç ã o e n t r e os ativistas h o m o s s e x u a i s e as a u t o r i d a d e s
m é d i c a s . C a b e ressaltar a i m p o r t a n t e participação d e pessoas q u e passaram
p e l o Somos e p e l o s o u t r o s g r u p o s d e São P a u l o , n o p r o c e s s o q u e fez surgir a
p r i m e i r a ONG-Aids brasileira, o G r u p o de A p o i o e P r e v e n ç ã o à Aids (GAPA),
na capital paulista, e m 1 9 8 5 , b e m c o m o a r e s p o s t a g o v e r n a m e n t a l configurada
n o p r o g r a m a estadual de São Paulo, o p r i m e i r o criado n o país. Sob a direção
d o m é d i c o P a u l o T e i x e i r a ( q u e tivera alguma p r o x i m i d a d e c o m o Somos-sp
n o s seus p r i m ó r d i o s ) , esse p r o g r a m a t o r n o u - s e u m r e f e r e n c i a l i m p o r t a n t e
d e o r i e n t a ç ã o n ã o d i s c r i m i n a t ó r i a e d e defesa dos direitos d o s afetados. D o
m e s m o m o d o , antigos m i l i t a n t e s d o Somos-RJ e d e o u t r o s g r u p o s cariocas ti-
• 1 3 0 -
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
• 131 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• I 3 2 -
NA TRILHA DO ARCO-IRIS
VULNERABILIDADE
• 1 3 4 -
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
A meu ver, o vírus da Aids realizou em alguns anos uma proeza que nem o mais
bem-intencionado movimento pelos direitos homossexuais teria conseguido,
em muitas décadas: deixar evidente à sociedade que homossexual existe e não
é o outro, no sentido de um continente à parte, mas está muito próximo de
qualquer cidadão comum, talvez ao meu lado e — isto é importante! — dentro
de cada um de nós, pelo menos enquanto virtualidade. [...] A sociedade passou
a debater amplamente argumentos a favor e contra sexo anal, sexo oral, per-
versões, quantidade de parceiros/as, uso da camisinha, sexo seguro e doenças
venéreas, métodos anticoncepcionais, casamento entre pessoas do mesmo
sexo, conveniência ou não da adoção de crianças em famílias não-padronizadas
etc. Deflagrou-se uma epidemia de informação, que não tem retorno porque
deixará marcas nas próximas gerações. 9
• 1 3 s-
A bandeira do arco-íris:
o movimento LGBT atual
. ,37 .
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
Se você ainda não relaxou, aprenda a se divertir. Saia de casa desencanado, nem
ligue se vai ouvir desaforos de algum aleijo. Não dá mais para ficar se sentindo
'inferior'. Essa postura ficou para trás, em algum lugar dos anos 1980. Você
está nos anos 1990, meu bem. É tempo de gozar (com camisinha!). E sentir
orgulho disso!.
• 138 *
NA TRILHA DO ARCO-IRIS
' 139 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
Não sensibiliza nem os "homens" que transam com gays e travestis, que
não consideram seus parceiros "homens", mas "bichas", deixando de atingir
igualmente boa parcela das próprias bichas e travestis, que não se identificam
como "homens". 1
• 140 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
• 141 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 1 4 2 •
NA TRILHA DO ARCO-IRIS
t r o , r e a l i z a d o n a q u e l e a n o n o R i o de J a n e i r o , t e v e a p r e s e n ç a de dois g r u p o s
lésbicos. O vil E n c o n t r o , e m C a j a m a r (SP), passou a incluir o t e r m o "lésbicas"
n o seu n o m e , t e n d o c o n t a d o c o m a participação d e q u a t r o g r u p o s lésbicos,
t o d o s t a m b é m d e São P a u l o . E m 29 d e agosto d e 1996, foi realizado n o R i o
d e J a n e i r o o p r i m e i r o S e m i n á r i o Nacional de Lésbicas (SENALE), a p a r t i r d e
iniciativa d o C o l e t i v o d e Lésbicas d o Rio de J a n e i r o (COLERJ). D e s d e e n t ã o ,
f o r a m realizadas seis e d i ç õ e s d o Senale. A data d o p r i m e i r o Senale foi consa-
g r a d a c o m o D i a N a c i o n a l da Visibilidade Lésbica.
A articulação c o m a C o o r d e n a d o r i a Nacional de DST e Aids foi f u n d a m e n t a l
t a m b é m para a ampliação da visibilidade e da organização das lésbicas. O p r i m e i r o
Senale r e s u l t o u da a p r o x i m a ç ã o d e lideranças lésbicas - até então dispersas, e m
sua m a i o r i a , e m g r u p o s mistos ( f o r m a d o s p o r gays e lésbicas ou p o r feministas
e lésbicas) - da C o o r d e n a d o r i a Nacional, c o m vistas a o b t e r m a i o r visibilidade
política a p a r t i r d o r e c o n h e c i m e n t o da vulnerabilidade lésbica p e r a n t e a DST e
Aids. C o m o m o s t r o u a pesquisadora Gláucia Almeida, a d e m a n d a p o r saúde sexual
c o n t r i b u i u d e f o r m a decisiva para p r o d u z i r u m a identidade lésbica emancipada da
i d e n t i d a d e h o m o s s e x u a l , abrindo c a m i n h o para a e m e r g ê n c i a e o f o r t a l e c i m e n t o
d e lideranças e m â m b i t o nacional, o s u r g i m e n t o de novos g r u p o s e a progressi-
va a u t o n o m i z a ç ã o d o m o v i m e n t o d e lésbicas. A c o n e x ã o é enunciada de f o r m a
bastante clara p o r u m a ativista entrevistada p o r Gláucia Almeida, ao d i s c o r r e r
sobre os t e m a s q u e n o r t e a r a m o p r i m e i r o SENALE:
• > 4 3 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
N° de
Ano Encontro Local
grupos
1980 i Encontro Brasileiro de Homossexuais São Paulo-sp 08
1984 n Encontro Brasileiro de Homossexuais Salvador-BA 05
1989 iii Encontro Brasileiro de Homossexuais Rio de Janeiro-Rj 06
1990 iv Encontro Brasileiro de Homossexuais Aracaju-SE 06
1991 v Encontro Brasileiro de Homossexuais Recife-PE 06
1992 vi Encontro Brasileiro de Homossexuais Rio de Janeiro-Rj 11
1993 vn Encontro Brasileiro de Lésbicas e Homossexuais Cajamar-sp 21
• 144-
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Corrida encerra a 17a Conferência Internacional de Gays e Lésbicas (Rio de Janeiro, 1995).
• J4Í *
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 147 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
• 141 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
Dos anos 1990 para cá, a expansão dos espaços de sociabilidade homossexual
t o m o u as características de u m mercado segmentado que contribuiu significativa-
mentemente para produzir novas expressões, simultaneamente comerciais e asso-
ciativas, da homossexualidade. Uma das inovações mais importantes, nesse sentido,
foi a popularização da sigla GLS, para designar Gays, Lésbicas e Simpatizantes.
A origem da sigla GLS está associada à primeira m e t a d e dos anos 1990 e ao
jornalista André Fischer, carioca radicado em São Paulo, u m dos principais idea-
lizadores de eventos c o m o o Mercado Mundo Mix ("feira m o d e r n a " que r e ú n e
expositores e público GLS) e o Festival de Cinema Mix Brasil da Diversidade
Sexual, além do primeiro portal GLS brasileiro, o Mix Brasil, no ar desde 1994.
O GLS afirma identidades reconhecidas pelo m o v i m e n t o , ao m e s m o t e m p o que
procura preservar o espaço de uma certa ambigüidade classificatória. Mais do
que simplesmente introduzir n u m contexto brasileiro a idéia norte-americana
de gayfriendly — um lugar onde gays e lésbicas são bem-vindos —, a categoria GLS
pareceu dar um novo formato a uma prática mais antiga: a de abrir o "gueto" das
homossexualidades para todos os que dele queiram participar.
Na esteira do GLS, articularam-se e m várias cidades, ainda que não de for-
ma homogênea, novas identidades e expressões de estética, festa e consumo
que retomaram o flerte com os estilos de vida associados à homossexualidade.
Modernos, clubbers, ravers, cybermanos passam a misturar classes sociais, idades e
orientações sexuais em eventos ou casas GLS, c o m roupas, acessórios e cabelos
multicoloridos, marcas corporais como piercings e tatuagens, bebida energética,
alucinógenos, estimulantes e música eletrônica. Adolescentes de ambos os sexos
passam a se identificar como "mix", o que parece implicar uma disposição de
abertura à experimentação erótica com pessoas do m e s m o sexo, sem r e c o r r e r
a classificações hetero, h o m o ou bissexual. Ainda na esteira do GLS, drag queens,
• 148 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Tem uma coisa que é o seguinte: é um mercado que eu acho que se você não é
gay, você não vai adiante. Por uma questão muito simples: não é um mercado
tão interessante assim como se faz parecer. [...] O que acontece é que quem é
gay, você tem isso quase como uma missão.. .Tudo tem um peso social na hora
de você fazer, que um hetero, quando está entrando no mercado, não tem. Eu
acho que essa é a diferença. Acho que negócio gay tocado por hetero é fadado
ao fracasso, porque ele lida com outro tipo de realidade, você não tem muito
anunciante. No exterior é impensável um negócio gay que não seja gerido e
de propriedade de gays. Esse é o princípio lá fora. Aqui não tem muito isso,
mas mesmo assim, você pega o S..., ele vai gastar um dinheiro fazendo show de
drag que um empresário hetero jamais gastaria, porque ele é gay, porque é da
cultura dele, porque ele acha o máximo. E ele vai fazer com fogos de artifício,
vai gastar pra fazer um show de uma noite, que pra ele é importante. Um cara
hetero jamais vai entrar numa coisa dessas. E isso faz uma diferença. 9
• 141 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• iço-
NA TRILHA DO ARCO-IRIS
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HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
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Consi dera çõesjinais:
conquistas e desafios
• if3-
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
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Deputada Marta Suplicy recebe flores de ativistas do GGB e do NGL-PT/SP, no Congresso, 1997.
' I Í 4 *
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
• I Í Í •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
Manifestação em frente à Embaixada do Egito, contra a prisão de 52 homosexuais naquele país. (Brasília, 2001).
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NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
!
• Í 7 '
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
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N A TRILHA DO ARCO-ÍRIS
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Cronologia (1978-2007)
• 1 6 1 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• 162 •
NA TRILHA DO ARCO-IRIS
• 1 6 3 *
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
C a r l o s T o s t a ( e x - i n t e g r a n t e d o g r u p o Somos), aprova m o d i f i c a ç ã o n o
C ó d i g o de Ética dos Jornalistas para a incluir a proibição de discriminação
p o r o r i e n t a ç ã o sexual.
F o r m a - s e a Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA), n o Rio
de J a n e i r o .
Organiza-se o P r o g r a m a Nacional de DST e Aids, n o Ministério da Saúde.
1987 Maio: João Antonio Mascarenhas realiza palestra na Assembleia Nacional
C o n s t i t u i n t e , reivindicando a proibição de discriminação p o r orientação
sexual na Constituição.
D e z e m b r o : E assassinado o diretor teatral Luiz Antonio Martinez C o r r ê a ,
n o Rio de Janeiro.
A i m p r e n s a de São Paulo r e p e r c u t e u m a "onda criminosa", r e l a t a n d o u m a
série de assassinatos de homossexuais.
O GALF passa a publicar o b o l e t i m Um Outro Olhar.
A rede GAPA expande-se para o u t r o s estados brasileiros: Rio de Janeiro,
Minas Gerais, Bahia, Santa Catarina e Rio G r a n d e do Sul.
1988 A nova Constituição é promulgada sem incluir a proibição de discriminação
p o r orientação sexual.
1989 Janeiro: Realiza-se o 3 a E n c o n t r o Brasileiro de G r u p o s H o m o s s e x u a i s
Organizados, c o m a participação de seis grupos, n o Rio de Janeiro.
Março: Forma-se o Grupo de Resistência Asa Branca (GRAB), e m Fortaleza.
J u n h o : Realiza-se o I a E n c o n t r o Nacional de ONGs/Aids, e m Belo Hori-
z o n t e . Em o u t u b r o , realiza-se o 2 a , e m P o r t o Alegre.
O escritor H e r b e r t Daniel funda o G r u p o Pela Vidda, n o Rio de Janeiro.
1990 Janeiro: Realiza-se o 4" E n c o n t r o Brasileiro d e G r u p o s H o m o s s e x u a i s
Organizados, c o m a participação de seis grupos, e m Aracaju (SE).
Fevereiro: È fundado o Grupo de Incentivo à Vida (GIV), O N G / A i d s formada
exclusivamente p o r soropositivos, e m São Paulo.
Abril: A R e d e de Informação U m O u t r o Olhar, sucessora d o GALF, passa
a funcionar c o m o sociedade civil.
Forma-se o Coletivo de Feministas Lésbicas, e m São Paulo.
1991 N o v e m b r o : Realiza-se o 5 a E n c o n t r o Brasileiro de G r u p o s Homossexuais
Organizados, c o m a participação de seis grupos, e m Recife.
Forma-se o g r u p o Nuances, e m P o r t o Alegre.
• 164 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
• 1 6 Ç •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• i66-
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• 1 6 7 .
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
• i 68 •
NA TRILHA DO ARCO-IRIS
Diversos grupos pelo país passam a criar livros de registro de união estável
e n t r e homossexuais.
Forma-se a Liga Brasileira d e Lésbicas (LBL).
• 169 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
•170-
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
• 1 7 1 *
Bibliografia comentada
FRY, Peter. Para inglês ver: identidade e política na cultura brasileira. Rio d e Janeiro, Zahar, 1 9 8 2 .
C o l e t â n e a que inclui dois ensaios clássicos d o a u t o r q u e balizaram o c a m p o d e pesquisas s o b r e
h o m o s s e x u a l i d a d e nas ciências sociais n o Brasil a p a r t i r da segunda m e t a d e d o s anos 1970. Suas
f o r m u l a ç õ e s a r e s p e i t o d o n e x o e n t r e hierarquias d e g ê n e r o , r a ç a / c o r e classe na p r o d u ç ã o das
categorias de classificação e i d e n t i d a d e h o m o s s e x u a l c o n t i n u a m inspiradoras e atuais.
WEEKS, Jeflrey. Sexualitj and its Discontents. Meanings, Myths and Modern Sexualitíes. Londres, Routledge, 1985.
Estudo a b r a n g e n t e das relações e n t r e t e o r i a s e políticas sexuais n o O c i d e n t e desde m e a d o s d o
século xix. Examina o n a s c i m e n t o da sexologia, os p r i m ó r d i o s da a b o r d a g e m antropológica da
sexualidade, a psicanálise e as políticas c o n t e m p o r â n e a s d e identidade sexual.
PERLONGHER, Néstor. O negócio do michê: a prostituição viril. São Paulo, Brasiliense, 1987. U m a nova
edição foi lançada e m 2 0 0 8 , pela E d i t o r a F u n d a ç ã o P e r s e u A b r a m o .
Densa pesquisa sobre o universo das relações h o m o s s e x u a i s masculinas mediadas pelo dinheiro.
O f e r e c e notável discussão e t n o g r á f i c a e crítica da n o ç ã o d e identidade sexual, ao desvendar as
trajetórias e r e l a c i o n a m e n t o s possíveis, q u e vinculam t r a n s i t o r i a m e n t e pessoas s o c i a l m e n t e
distantes, a p a r t i r de u m sistema c o m p l e x o e fluido de categorias e hierarquias sexuais.
• 173 •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
SILVA, Cláudio R o b e r t o da. Reinventando o sonho: história oral de vida política e homossexualidade no Brasil
contemporâneo. Dissertação de m e s t r a d o . São Paulo, U n i v e r s i d a d e d e São Paulo, 1 9 9 8 .
Pesquisa d e história oral q u e r e ú n e r i c o material de entrevistas e d e p o i m e n t o s d e lideranças e
participantes d o m o v i m e n t o h o m o s s e x u a l da p r i m e i r a o n d a .
GREEN, James N. Além do carnaval: a homossexualidade masculina no Brasil do século XX. São Paulo, Unesp, 2000.
G r a n d e e s f o r ç o de r e c o n s t r u ç ã o h i s t ó r i c a c o n c e n t r a d o n o p e r í o d o q u e vai d o final d o s é c u l o
xix ao c o m e ç o d o s anos 1 9 8 0 . O f e r e c e r i c o m a t e r i a l s o b r e as m u d a n ç a s na sociabilidade
h o m o e r ó t i c a masculina, c o m análises e x t e n s a s da p r o d u ç ã o m é d i c a d a p r i m e i r a m e t a d e d o
século xx, d o t r a v e s t i s m o na " a p r o p r i a ç ã o " h o m o s s e x u a l d o carnaval carioca e d a i m p r e n s a
caseira h o m o s s e x u a l .
CÂMARA, Cristina. Cidadania e orientação sexual: a trajetória do grupo Triângulo Rosa. R i o de Janeiro,
Academia Avançada, 2 0 0 2 .
Analisa a t r a j e t ó r i a d o g r u p o Triângulo Rosa, d o Rio d e Janeiro, e sua atuação e m prol da
inserção d o m o v i m e n t o h o m o s s e x u a l n o c e n á r i o político brasileiro n o s anos 1 9 8 0 . Discute
o esforço d e s p e n d i d o para legitimar a n o ç ã o d e o r i e n t a ç ã o sexual c o m o m e i o d e afirmação e
r e c o n h e c i m e n t o dos direitos h o m o s s e x u a i s , na c o n j u n t u r a da r e d e m o c r a t i z a ç ã o .
FACCHINI, Regina. Sopa de letrinhas? Movimento homossexual e produção de identidades coletivas nos anos 90.
Rio de Janeiro: G a r a m o n d , 2 0 0 5 .
Versão modificada de dissertação de m e s t r a d o d e f e n d i d a e m 2 0 0 2 . R e c o n s t r ó i a t r a j e t ó r i a d o
m o v i m e n t o homossexual brasileiro e analisa, p o r m e i o d e etnografia realizada a p a r t i r d o g r u p o
CORSA, processos de c o n s t r u ç ã o de identidades coletivas n o m o v i m e n t o paulistano da segunda
m e t a d e dos 1990. O m o v i m e n t o é t o m a d o a p a r t i r de suas " c o n e x õ e s ativas" c o m atores d o
Estado e d o m e r c a d o .
ALMEIDA, Gláucia Elaine Silva d e . Da invisibilidade à vulnerabilidade: percursos do "corpo lésbico"na cena
brasileira face à possibilidade de infecção por DST e Aids. Tese d e d o u t o r a d o — IMS. R i o de janeiro,
Universidade Estadual d o Rio d e Janeiro, 2 0 0 5 .
Esforço pioneiro de pesquisa centrado na configuração d o m o v i m e n t o c o n t e m p o r â n e o de lésbicas
n o Brasil, d o c u m e n t a n d o e analisando o m o d e l o de organização dos p r i m e i r o s g r u p o s e o processo
7 4 -
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
FRANÇA, Isadora Lins. Cercas e pontes: movimento LGBT e mercado GLS na cidade de São Paulo. Dissertação de
m e s t r a d o . U n i v e r s i d a d e de São Paulo, São Paulo, 2 0 0 6 .
D o c u m e n t a e analisa o d e s e n v o l v i m e n t o das Paradas d o O r g u l h o LGBT d e São Paulo e a p r o f u n d a
a discussão s o b r e as c o n e x õ e s e t e n s õ e s e n t r e o m o v i m e n t o LGBT e o crescente m e r c a d o voltado
a o público GLS.
•17 S '
Notas
Introdução
1 A bibliografia converge ao considerar o final dos anos 1970 c o m o marco do surgimento de "movimento
homossexual"no Brasil. Ver, entre outros: FRY, Peter. "Da hierarquia à igualdade: a construção histórica
da homossexualidade no Brasil". In: . Para inglês ver: identidade e política na cultura brasileira. Rio de
Janeiro, Zahar, 1982, p. 87-115; TREVISAN, João Silvério. Devassos no paraíso. São Paulo, Max Limonad,
1986; . 3A ed. revista e ampliada. Rio de Janeiro, Record, 2000; MACRAE, Edward. A construção
da igualdade: identidade sexual e política no Brasil da"abertura". Campinas, Unicamp, 1990; SILVA, Cristina
Luci Câmara da. Triângulo Rosa: a busca pela cidadania dos "homossexuais". Dissertação de mestrado. Rio
de Janeiro, Universidade Federal d o Rio de Janeiro, 1993.; SILVA, Cláudio Roberto da. Reinventando o
sonho: história oral de vida política e homossexualidade no Brasil contemporâneo. Dissertação de mestrado. . São
Paulo, Universidade de São Paulo, 1 9 9 8 . ; GREEN, James. Além do carnaval: a homossexualidade masculina no
Brasil do século XX. São Paulo, Unesp, 2000; GREEN, James. "Mais amor e mais tesão: a construção de u m
movimento brasileiro de gays, lésbicas e travestis". Campinas, Cadernos Pagu, n c 15, 2000, p. 271-295;
FACCHINI, Regina. Sopa de letrinhas? Movimento homossexual e produção de identidades coletivas nos anos 90. Rio
de Janeiro, Garamond, 2005; ALMEIDA, Gláucia Elaine Silva de. Da invisibilidade à vulnerabilidade:percursos
do"corpo lésbico"na cena brasileiraJace à possibilidade de infecção por DST e Aids. Tese de doutorado — Rio de
Janeiro, IMS, Universidade Estadual do Rio de Janeiro, 2005; FIGARI, Carlos. @s outr@s cariocas. Belo
Horizonte, Rio de Janeiro, UFMG/IUPERJ, 2007.
2 GREEN, "Mais amor e mais tesão", op. cit; FACCHINI, Sopa de letrinhas?, op. cit.
Paradoxos da i d e n t i d a d e
1 Ver a respeito SIMÕES, Júlio Assis e FRANÇA, Isadora Lins. " D o g u e t o ao mercado". In: GREEN, James et
al. Homossexualismo em São Paulo e outros escritos. São Paulo, Unesp, 2005, p. 309-336. FRANÇA, Isadora
. I?7 .
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
6 Além das referências citadas na n o t a anterior, ver: CARRARA, Sérgio e VIANNA, A d r i a n a . "As vítimas
d o desejo: os tribunais cariocas e a h o m o s s e x u a l i d a d e n o s anos 1980". In: PISCITELLI, A d r i a n a et al.
Sexualidade e saberes: convenções efrohteiras. Rio d e Janeiro, G a r a m o n d , 2 0 0 4 ; RAMOS, Sílvia. "Violência
e h o m o s s e x u a l i d a d e n o Brasil: as políticas públicas e o m o v i m e n t o h o m o s s e x u a l " . In: GROSSI, M i r i a m
Pillar et al. (org.). Movimentos sociais, educação e sexualidades. Rio d e Janeiro, G a r a m o n d , 2005; CARRARA,
Sérgio e VIANNA, A d r i a n a . "Tá lá o c o r p o e s t e n d i d o n o c h ã o : a violência letal c o n t r a travestis n o
m u n i c í p i o d o R i o d e Janeiro". Rio d e Janeiro, Physis, 16(2), 2 0 0 6 , p. 2 3 3 - 2 4 9 .
7 SILVA, Cristina. Triângulo Rosa, op. cit., p. 141.
8 ROBINSON, Paul. The Modernization of Sex. Ithaca, Cornell University Press, 1989, p. 1 - 4 1 .
9 WEEKS, Jeffrey. Sexuality and its Discontents: Meanings, Myths and Modem Sexualities. L o n d r e s , R o u t l e d g e ,
1 9 8 5 , p . 135, 1 4 8 , 1 4 9 - 1 5 6 .
10 LE VAY, S i m o n . "A D i f f e r e n c e in H y p o t h a l a m i c S t r u c t u r e Between H o m o s e x u a l and H e t e r o s e x u a l
M e n " . Science, n fi 2 5 3 , 1 9 9 1 , p. 1 0 3 4 - 1 0 3 7 ; LE VAY, Simon. Queer Science: the Use and Abuse of Research
into Homosexuality. C a m b r i d g e , MA,The MIT Press, 1996.
11 Para u m a crítica desses aspectos, ver: LÕWY, liana. "Universalidade da ciência e c o n h e c i m e n t o s 'situa-
d o s ' " . C a m p i n a s , Cadernos Pagu, n 2 15, 2 0 0 0 , p. 15-38.
12 KINSEY, A l f r e d et al. O comportamento sexual do homem. Lisboa, Meridiana, 1972; ROBINSON, Paul. The
Modernization of Sex, op. cit., p. 4 2 - 1 1 9 .
13 WEEKS, Jeffrey. " O c o r p o e a sexualidade". In: LOURO, Guacira ( o r g ) . O corpo educado: pedagogias da
sexualidade. Belo H o r i z o n t e , A u t ê n t i c a , 2 0 0 0 .
14 SEDGWICK, Eve Kosofsky. "A epistemologia do armário". Campinas, Cadernos Pagu, n c 28, 2007, p. 19-54.
15 Sobre arranjos familiares n o Brasil c o n t e m p o r â n e o , ver, e n t r e outros, SCOTT, Parry. "Família, moralidade
e novas leis" e FONSECA, Claudia. "Sexualidade, família e legalidade: questionando fronteiras". In: ÁVILA,
• 178 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
Maria Betânia et al. ( o r g ) . Novas legalidades e democratização da vida social:família, sexualidade e aborto.
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Flavio. Pais assumidos. Florianópolis, C a d e r n o s NIGS, 2 0 0 3 ; MELLO, Luiz. Novasfamílias. Rio d e Janeiro,
G a r a m o n d , 2005; SOUZA, Erica Renata d e . Necessidade defilhos: maternidade,família e (homo)sexualidade.
Tese d e d o u t o r a d o . Campinas, Universidade Estadual d e Campinas, 2 0 0 5 .
U m a t r a j e t ó r i a da p o l í t i c a d e i d e n t i d a d e s h o m o s s e x u a i s
1 Há u m a edição e m inglês q u e r e ú n e os d o z e v o l u m e s escritos p o r ULRICHS. The Riddle of Man-Manly Love:
the Pionnering Work on Male Homosexuality. A m h e r s t , NY, P r o m e t h e u s , 1994. Ver t a m b é m KENNEDY, H u b e r t
C. " ' T h i r d S e x ' T h e o r y of Karl H e i n r i c h Ulrichs". In: LICATA, Salvatore e PETERSEN, R o b e r t ( o r g s . ) .
Historical Perspectives on Homosexuality. Nova York, T h e H a w o r t h P r e s s / S t e i n & Day, 1981 (versão e m
livro da e d i ç ã o d o Journal of Homosexuality, 6 (5), (1980-1981).
2 Karl W e s t p h a l é o a u t o r d e u m a r t i g o c é l e b r e sobre as "sensações sexuais contrárias", p u b l i c a d o e m
1870, q u e o filósofo e h i s t o r i a d o r francês M i c h e l Foucault diz m a r c a r "a data natalícia" da h o m o s -
sexualidade c o m o "categoria psicológica, psiquiátrica e m é d i c a " . (Ver FOUCAULT, M i c h e l . História da
sexualidade 1 — a vontade de saber. Rio d e J a n e i r o , Graal, 1 9 7 7 , p. 4 3 - 4 4 . )
3 ALMEIDA, J o s é R. Pires d e . Homossexualismo (a libertinagem no Rio de Janeiro). Rio d e Janeiro, L a e m m e r t ,
1906. S o b r e esse "incrível p o t - p o u r r i d e l i b e r t i n a g e n s d e t o d o s o s tipos imagináveis", c o m o d e l e
disse P e t e r Fry, ver, e n t r e o u t r o s : FRY, " D a h i e r a r q u i a à igualdade", op. cit-, GREEN, Além do carnaval,
op. cit., cap. 1.
4 KRAFFT-EBING, Richard v o n . Psychopathia sexualis. São Paulo, M a r t i n s Fontes, 2 0 0 1 .
5 FREUD, S i g m u n d . Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. Rio d e Janeiro, I m a g o , 2 0 0 2 , p. 2 1 - 2 2 .
6 FALQUET, J u l e s . "Breve r e s e n a d e algunas t e o r i a s lesbianas". In: L A G O , M a r a et al. (org.). Interdiscipli-
naridade em diálogos de gênero. Florianópolis, M u l h e r e s , 2 0 0 4 , p. 3 9 .
7 Ver a r e s p e i t o , LAURISTEN, John e THORSTAD, David. The Early Homosexual Rights Movement (1864-1935).
Nova York, T i m e C h a n g e , 1974; FRY, P e t e r e MACRAE, E d w a r d . 0 que é homossexualidade, op. cit., p.
87.
8 MEYEROWITZ, J o a n n e . How Sex Changed: a History ofTranssexuality in the United States. C a m b r i d g e , M A ,
H a r v a r d U n i v e r s i t y Press, 2 0 0 2 , cap. 1.
' 1 7 9 '
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
12 RICH, Adrienne. "Compulsory Heterosexuality and the Lesbian Existence". Signs, 5(4), 1980. Para
uma crítica a Rich, ver WEEKS, Sexuality and its Discontents, op. cit., p. 201-208.
13 WITTIG, Monique. "One is N o t Born aWoman". In: ABELOVE, Henry et al. (org.). The Lesbian and Gay
Studies Reader. Nova York, Routledge, 1993, p. 103-109.
14 BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo 2: a experiência vivida. São Paulo, Difel, 1975, p. 9.
15 Um trabalho marcante a esse respeito nos Estados Unidos, estimulando a discussão sobre diferenças
de estilos de vida em relação à homossexualidade feminina como expressão de diferenças culturais
dentro da mesma sociedade, foi o das antropólogas KENNEDY, Elisabeth e DAVE, Madeline. Botts of
Leather — Slippes of Gold:The History of a Lesbian Community. Nova York, Penguim, 1993.
16 Para uma crítica a Wittig, enfatizando também o significado da reapropriação dessas categorias
estigmatizadas, ver BUTLER, Judith. Problemas de gênero. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2003,
p. 162-184.
17 MEYEROWITZ, How sex Changed, op.cit., p. 159-161. Para uma análise das estratégias de manipulação de
identidade praticada por Agnes, ver GARF1NKEL, Harold. "'Passing' and the Managed Achievement of
Sex Status in an 'Intersexed' Person". In: . Studies in Ethnomethodology. Englwood Cliffs, Nova
Jersey, Prentice-Hall, 1967.
18 GAMSON, Josua. "Deben los movimientos identitários autodestruirse? Un extrano dilema". In:
JIMÉNEZ, Rafael (org.). Sexualidades trangresoras: una antologia de estúdios queer. Barcelona, Icaria,
2002, p. 141-172.
19 Ver a respeito RUBIN, Gayle. "Thinking Sex: Notes for a Radical Theory of the Politics of Sexuality". In:
ABELOVE, Henry et al. (org). The Lesbian and Gay Studies Reader. Nova York, Routledge, 1993, p. 3-44.
20 GREEN, Além do carnaval, op. cit., p. 56-58, 172.
21 FRY, "Da hierarquia À igualdade", op. cit.
22 MOTT, Luiz. "Relações raciais entre homossexuais no Brasil colonial". In: . Escravidão, homossexu-
alidade e demonologia. São Paulo, ícone, 1988.
23 PERLONGHER, Néstor. 0 negócio do michê. São Paulo, Brasiliense, 1987. Uma nova edição foi lançada
em 2008, pela Editora Fundação Perseu Abramo.
Da m o v i m e n t a ç ã o ao m o v i m e n t o
1 Sobre esse caso, ver FRY. Peter. "Febrônio índio do Brasil: onde cruzam a psiquatria, a profecia, a
homossexualidade e alei". In: EULÁLIO, Alexandre et al. Caminhos cruzados, op. cit., p. 65-80. Para uma
visão geral das preocupações médico-legais com a homossexualidade na primeira metade do século
XX, ver, entre outros, FRY. "Da hierarquia à igualdade", op. cit.-, FRY e MACRAE, O que ê homossexualidade,
op. cit., p, 60-79; GREEN. Além do carnaval, op. cit. , cap. 3; FIGARI, @s outr@s cariocas, op. cit., cap. 4.
2 SILVA, José Fábio Barbosa da. "Homossexualismo em São Paulo: estudo de u m grupo minoritário".
In: GREEN, James et al. Homossexualismo em São Paulo e outros escritos. São Paulo, Unesp, 2005.
3 FRY, Peter. "História da imprensa baiana". Lampião, n c 4, ago./set. 1978, p. 4 .
4 Leonídio Ribeiro, o médico carioca que tratou do caso de Febrônio índio do Brasil, considerava a di-
ficuldade de comprovar a existência de comportamento homossexual entre mulheres. Aparentemente,
os médicos da época não acreditariam na existência de homossexualidade feminina, ou, quando muito,
a considerariam ser de incidência extremamente rara. Cf. GREEN, Além do carnaval, op. cit., p. 211 e 247.
• i8o-
NA TRILHA DO ARCO-LRIS
10 WHITAM, Frederick. "Os entendidos: Gay Life in São Paulo in the Late 1970's". In: MURRAY, Stephen O.
(org.). Latin American Male Homosexualities. Albuquerque, University of New México Press, 1995, p. 231.
11 BAHIANA, Ana Maria. Almanaque anos 70. Rio de Janeiro, Ediouro, 2006, p. 36.
12 LOBERT, Rosemary. A palavra mágica dzi: uma resposta difícil de se perguntar. Dissertação de mestrado.
Campinas, Universidade de Campinas, 1979.
13 Antonio Bivar, apud PERLONGHER Néstor, 0 negócio do michê, op.cit., p. 8 8.
14 FRY, "História da imprensa baiana", op. cit.
Libertários na "abertura"
1 "Saindo do gueto". Lampião, n" 0, abr. 1978, p. 2.
2 Sobre o Somos, referimo-nos especialmente a MACRAE, A construção da igualdade, op. cit. O u t r a
i m p o r t a n t e referência é TREVISAN, Devassos no paraíso, op. cit. (ver os capítulos sobre "A manipu-
lação da homossexualidade liberada"). A versão de Trevisan sobre a trajetória do g r u p o talvez
tenha tido mais repercussão do que a de MacRae, pelo menos j u n t o aos jovens ativistas de hoje
(enquanto A construção da igualdade teve até agora u m a única edição, em 1990, esgotada, Devassos
no paraíso já está em sua sétima edição revista e ampliada). Estudos c o m o os de Pedro de Souza
(Confidencias da carne. Campinas, Unicamp, 1997) e de N é s t o r Perlongher, já citado, exploraram
outros aspectos d o Somos. As pesquisas de Cristina Câmara Silva, sobre o grupo Triângulo Rosa,
e de Cláudio R o b e r t o da Silva, sobre o Lampião, t o m a r a m os relatos sobre o Somos como p o n t o
de referência.
3 O n o m e completo do jornal era Lampião da Esquina, sendo o complemento "da Esquina" acrescentado
por questões de registro comercial, já que existia então uma editora com o nome "Lampião". Os
exemplares, p o r é m , estampavam a palavra "Lampião" em letras garrafais, e foi por esse nome que o
jornal ficou conhecido. Por isso, sempre nos referiremos a ele aqui apenas dessa forma abreviada.
4 SILVA, Reinventando o sonho, op. cit. Todos os d e p o i m e n t o s dados a este autor, aqui citados, inclusive
os de Mascarenhas e M o t t provêm dessa fonte, se e n c o n t r a m nesta mesma referência.
5 O livro em questão teve uma edição brasileira: DANIEL, Marc e BAUDRY, André. Os homossexuais. Rio
de Janeiro, Artenova, 1977.
6 A referência a"Geni"se deve ao sucesso atingido, entre 1 9 7 9 e 1980, pela canção "Genie o Zepelim",
de Chico Buarque, que fazia parte da Ópera do malandro, uma adaptação da Ópera dos três vinténs, de
• I8 I •
HISTÓRIA DO POVO BRASILEIRO
7 MACRAE, A construção da igualdade, op. cit. Todas as citações de MacRae neste capítulo se e n c o n t r a m
nesta m e s m a referência.
8 Júlio Assis Simões baseia-se aqui e m suas m e m ó r i a s desse p e r í o d o , c o m o f r e q ü e n t a d o r das reuniões
gerais d o S o m o s , e de p a r t e das reuniões de seu G r u p o de Atuação, de maio a d e z e m b r o de 1979. O
leitor p o d e c o n f r o n t a r as versões opostas sobre essa dinâmica organizativa, apresentadas p o r Edward
MacRae (.A construção da igualdade, cap. 5) e p o r João SilvérioTrevisan (Devassos no paraíso, 3a ed. p a r t e
5, cap. 2).
Atentos e fortes
1 Este capítulo revisita e amplia os a r g u m e n t o s e dados apresentados p o r Regina Facchini n o capítulo
" M o v i m e n t o homossexual: r e c o m p o n d o u m histórico" d o livro Sopa de Letrinhas?, op. cit.
2 SILVA, Reinventando o sonho, op. cit.
3 SILVA, Triângulo Rosa, op. cit., p. 55.
4 PERLONGHER, Néstor. 0 que éAids. São Paulo, Brasiliense, 1987.
5 Para u m r e t r a t o vivido desse p e r í o d o e m São Paulo, ver ARRUDA, Roldão. Dias e ira: uma história verídica
de assassinatos autorizados. São Paulo, G l o b o , 2 0 0 1 .
6 PERLONGHER, Néstor. " O desaparecimento da homossexualidade". In: DANIEL, H e r b e r t et al. SaúdeLoucura
3. São Paulo, H u c i t e c , 1993.
7 GALVÃO, Jane. Aids no Brasil: a agenda de construção de uma epidemia. Rio de J a n e i r o / S ã o Paulo, ABIA/
Ed.34,2000.
8 GREEN, "Mais a m o r e mais tesão", op. cit., p. 292.
9 TREVISAN, João Silvério. Devassos no paraíso, 3a e d . , op cit., p. 4 6 2 - 4 6 3 .
A bandeira d o a r c o - í r i s
1 MOTT, L u i z . A cena gay em Salvador em tempos de Aids. S a l v a d o r , G r u p o Gay d a B a h i a , 2 0 0 0 ,
p. 14. C a b e o b s e r v a r q u e o m o v i m e n t o a t u a l m e n t e evita e m p r e g a r a categoria HSH i s o l a d a m e n t e ,
p r e f e r i n d o e m seu lugar a e x p r e s s ã o "gays e o u t r o s h o m e n s q u e f a z e m s e x o c o m h o m e n s " .
2 A avaliação citada está disponível na p á g i n a < w w w . a i d s . g o v . b r > . Ver FACCHINI, Sopa de letrinhas?,
op. cit., p. 1 6 6 .
3 ALMEIDA, Da invisibilidade à vulnerabilidade, op. cit., p. 208.
• 182 •
NA TRILHA DO ARCO-IRIS
4 Apud FACCHINI, Sopa de letrinhas?, op. cit., p. 1 35. As i n f o r m a ç õ e s dos parágrafos seguintes p r o v ê m da
mesma fonte.
5 Para u m a visão d i v e r g e n t e , n ã o só e m relação à ABGLT, m a s a várias das f o r m a s de organização e
reivindicações assumidas p e l o m o v i m e n t o , ver GOLIN, Célio. " O r i e n t a ç ã o sexual e novos sujeitos de
direitos". In: FONSECA, Claudia et al. Antropologia, diversidade e direitos humanos: diálogos interdisciplinares.
P o r t o Alegre, UFRGS, 2 0 0 4 .
6 Valemo-nos aqui de relatos de ativistas (Luiz M o t t para o x E n c o n t r o , e Toni Reis e Willian Aguiar,
para o XII E n c o n t r o ) , o b t i d o s p o r m e i o da consulta ao g r u p o d e discussão virtual Lista GLS.
7 FRANÇA, Isadora Lins. Cercas e pontes: movimento GLBT e mercado GLS na cidade de São Paulo. Dissertação de
m e s t r a d o . São Paulo, Universidade d e São Paulo, 2 0 0 6 .
8 Sobre drag queens, ver, e n t r e o u t r o s , VENCATO, Anna Paula. Fervendo com as drags: corporalidade e perform-
ances de drag queens na ilha de Santa Catarina. Dissertação de m e s t r a d o . Florianópolis, Universidade
Federal de Santa Catarina, 2 0 0 2 .
C o n s i d e r a ç õ e s finais: c o n q u i s t a s e d e s a f i o s
1 E n t r e os c r i m e s a r r o l a d o s c o n t r a a figura d o "cidadão h o m o s s e x u a l , bissexual ou t r a n s g ê n e r o s "
e s t ã o : atos d e dispensa d i r e t a o u i n d i r e t a , praticadas p e l o e m p r e g a d o r o u seu p r e p o s t o ( a r t . 4 o ) ;
impedir, r e c u s a r o u p r o i b i r o ingresso o u p e r m a n ê n c i a e m q u a l q u e r a m b i e n t e o u e s t a b e l e c i m e n t o
p ú b l i c o o u p r i v a d o , a b e r t o ao público ( a r t . 5 fl ); recusar, negar, impedir, preterir, prejudicar, r e t a r d a r
ou excluir e m q u a l q u e r sistema d e seleção educacional, r e c r u t a m e n t o o u p r o m o ç ã o funcional o u
profissional ( a r t . 6 C ); s o b r e t a x a r , recusar, p r e t e r i r o u i m p e d i r a h o s p e d a g e m e m hotéis, m o t é i s ,
p e n s õ e s ou similares ( a r t . 7 C ); p r o i b i r a livre e x p r e s s ã o e m a n i f e s t a ç ã o d e afetividade, sendo estas
e x p r e s s õ e s e m a n i f e s t a ç õ e s p e r m i t i d a s aos d e m a i s cidadãos o u cidadãs ( a r t . 8 Ü ).
2 UZIEL, Homossexualidade e adoção, op. cit., p. 200.
3 SOUZA, Necessidade dejilhos, op. cit.
4 Em agosto d e 2 0 0 7 , o Ministério da Saúde anunciou a inclusão das cirurgias de redesignação sexual
e n t r e os serviços p r e s t a d o s pelo Sistema ünico d e Saúde (sus), por d e t e r m i n a ç ã o da Justiça Federal
da 4 a Região (Sul). E n t r e t a n t o , o S u p r e m o Tribunal Federal cancelou o p r o c e d i m e n t o previsto e m
d e z e m b r o d e 2 0 0 7 , alegando falta de p l a n e j a m e n t o e e s t r u t u r a .
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Pagu, n" 28, 2 0 0 7 .
• i 88 •
NA TRILHA DO ARCO-ÍRIS
• 189 •
Na trilha do arco-íris Do movimento homossexual ao LGBT
foi impresso na cidade de São Paulo em abril de 2009
pela Bartira Gráfica para a Editora Fundação Perseu
Abramo com tiragem de 3.000 exemplares. O texto
foi composto e m Perpetua no c o r p o 1 2 , 5 / 1 S . A capa
foi impressa em Supremo 250g; o miolo foi impresso
em papel Pólen Soft 8Qg.